o nacionalismo e o universalismo na cultura_fernando azevedo

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109 I S e há eterna infância e juventude nos homens e se riqueza de vida interior realmen- te a possuem os que não só não perdem as qualidades das fases anteriores da existência, mas a um tempo as conservam e as superam, devem residir na criança e no adolescente que guardamos em nós, a força, a pertinácia e a importância das primei- ras impressões das idades ultrapassadas e distantes. Nenhuma presença, de fato, mais envolvente e mais comunicativa do que as recordações da infância. Ainda agora, são essas vozes, cândidas ou ardentes, as primeiras que me falam, no rumor de uma colméia de imagens e de lembranças, e as mesmas que me habituei a ouvir sempre que meu pensa- mento se voltava para o Itamarati ou acontecia conduzir-me a esta casa o dever de uma cortesia, uma espécie de nostalgia de um convívio nunca experimentado ou a submissão a um desses apelos que constituem uma honra e a que seria um desprimor renunciar. É que, na idade mais sensível ao mistério do tempo, do espaço e das coisas, e em que nos O nacionalismo e o universalismo na cultura * Fernando de Azevedo (São Gonçalo do Sapucaí-MG, 1894 – São Paulo-SP, 1974) * Conferência pronunciada no Ministério das Relações Exte- riores, quando da instalação do Instituto Rio Branco. Publicada originalmente na RBEP v. 7, n. 21, p. 421-441, mar./abr. 1946. 1ª PARTE R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 86, n. 212, p. 109-123, jan./abr. 2005.

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I

Se há eterna infância e juventude nos homens e se riqueza de vida interior realmen-te a possuem os que não só não perdem as qualidades das fases anteriores daexistência, mas a um tempo as conservam e as superam, devem residir na criança

e no adolescente que guardamos em nós, a força, a pertinácia e a importância das primei-ras impressões das idades ultrapassadas e distantes. Nenhuma presença, de fato, maisenvolvente e mais comunicativa do que as recordações da infância. Ainda agora, são essasvozes, cândidas ou ardentes, as primeiras que me falam, no rumor de uma colméia deimagens e de lembranças, e as mesmas que me habituei a ouvir sempre que meu pensa-mento se voltava para o Itamarati ou acontecia conduzir-me a esta casa o dever de umacortesia, uma espécie de nostalgia de um convívio nunca experimentado ou a submissãoa um desses apelos que constituem uma honra e a que seria um desprimor renunciar.É que, na idade mais sensível ao mistério do tempo, do espaço e das coisas, e em que nos

O nacionalismo e o universalismo na cultura*

Fernando de Azevedo(São Gonçalo do Sapucaí-MG, 1894 – São Paulo-SP, 1974)

* Conferência pronunciada noMinistério das Relações Exte-riores, quando da instalação doInstituto Rio Branco. Publicadaoriginalmente na RBEP v. 7, n.21, p. 421-441, mar./abr. 1946.

1ª PARTE

R. bras. Est. pedag., Brasília, v. 86, n. 212, p. 109-123, jan./abr. 2005.

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parecem ilimitadas as possibilidades de ima-ginar, de criar e de ver em grande, a vossacarreira – a diplomacia – foi, como a Mari-nha, uma das que sobre mim exerceram maiorsedução, ficando por alguns anos um dessessonhos da adolescência que costumamsugerir as inspirações mais características efecundas da idade madura.

Os jovens tendem com freqüência a fu-gir à disciplina e à limitação dos horizontese procuram, mais ou menos intensamente,dar à sua vida um sentido que a ultrapasse eseja mesmo capaz de revesti-la do caráter deuma missão. Quando, em horas de isolamen-to, em que o espírito mergulha no passadopara atingir as profundidades do nosso serou à procura de paz, pela evasão do presen-te e de nós mesmos, em esforço por com-preender o que me despertara e mantinhaessa aspiração, parece-me que, em vossaforma de vida e de atividade, o que sobretudome atraía eram exatamente as perspectivasde viagens, o espírito de aventura e o gostodo desconhecido.

Era esse impulso, romântico e místi-co, de uma natureza inquieta que me faziaoscilar entre carreiras tão diversas, como adiplomacia e a armada, que julgava, porcertos aspectos comuns, me satisfazerem avocação para a liberdade, o novo e o ideal,com suas promessas de paisagens estranhase de mundos ignorados, e, portanto, de alar-gamento de horizonte em todas as dire-ções... Não foi, porém, a despeito dessesimpulsos, nem à vossa carreira nem à domar que me levaram as circunstâncias davida, tão caprichosa nas suas solicitaçõescomo o destino nos seus desígnios secretos.Vivendo, na minha pobreza, à margem deuma sociedade desprevenida, amável egalante, inebriada de festas e de prazeres,nunca chegou a interessar-me a tendênciade minha geração, apaixonada de literaturae de arte, mas falsamente estética, inclina-da, na sua boemia literária, antes a atrair ea seduzir do que a convencer e a lutar, eque, só depois da Primeira Guerra Mundial,foi despertada e impelida para a ação.

Na vida religiosa por algum tempo,como depois do humanismo que é um pon-to de vista universal e “um meio de dar àvida humana um conteúdo de eternidade”,refugiara-se então meu espírito atraído porseus pensamentos graves, por seu sentidoecumênico, suas mensagens de paz, seusplanos de conquista de almas, seu gosto pelavida interior, suas fugas para o mundo so-brenatural e a sentimento dessa presençatantas vezes sentida, do eterno no ser hu-mano. Somente mais tarde, no termo daguerra de 1914, quando já me havia integra-do numa corrente, vigorosa e idealista, im-buída de espírito crítico, penetrada da ciên-cia e da natureza e sacudida para os deveresdo pensamento e da ação, um oferecimentoexpressamente formulado por quem podiafazê-lo, me abria, para a carreira diplomáti-ca, o caminho que desejava tomar, mas emque não tardou a surgir um obstáculo deordem particular e irremovível às minhasantigas aspirações. A lembrança de um so-nho de adolescente que, em 1918, quase serealizou na sua plenitude e não podia estarpresente no convite com que vos dignasteshonrar-me, para vos falar da altura desta tri-buna, e essa repercussão prospectiva, tãopoderosa, das reações das primeiras idadesda vida tinham, pois, de dar ao meu senti-mento mais calor e vibração, ao encerrar ociclo de vossas conferências, como já havi-am influído nas minhas simpatias, váriasvezes manifestadas por uma das últimas e,certamente, das mais belas criações destacasa – o Instituto Rio-Branco.

II

Mas, como o Ministério em que se fun-dou e que, sendo das relações exteriores, é ocentro por excelência da cooperação interna-cional, o vosso instituto de ensino, de cultu-ra e de pesquisas tem ainda para mim, pelasorigens e finalidades, uma significação parti-cularmente grata a todos os que não perde-ram o culto do humanismo, considerado

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como um instrumento de libertação. Se en-tre as quimeras de minha mocidade, atraídamuito cedo para mundos desconhecidos,antigos e modernos; se na minha própriaexperiência religiosa, que tanto contribuiupara desenvolver a idéia de igualdade doshomens, o sentido de catolicidade e a cons-ciência da dignidade da pessoa; se, entre asmiragens da ação e as contradições da luta,alguma “constante” existe, superior a todasas contingências de uma força singular, écertamente esse gosto do universal, esse sen-tido do humano, essa preocupação de resta-belecer, sobre as bases de uma nova concep-ção de vida e de pensamento, o valor e a“atualidade” de uma tradição que se perdeu– a do humanismo, que é, afinal, na justaobservação de Estelrich, uma “contribuiçãoindispensável à vida do espírito internacio-nal”. Ora, esse sentimento agudo da com-plexidade, esse sentido do relativismo his-tórico, esse espírito de finura, que dá afreqüentação maliciosa da diplomacia, essapesquisa do universal sob as diferenças queseparam e particularizam os povos, essa pro-cura das zonas de concordância, para cortaros conflitos pela submissão de todos à regrajurídica, à moral e à razão, não tendem adesenvolver essa herança prestigiosa dohumanismo, sempre renovado e alargadopela experiência e, portanto, a compreensãoe a solidariedade humana? Não constituema essência da função deste Ministério e nãoresidem à base de vossas atividades a crençana compatibilidade dos nacionalismos como culto do humanismo e a confiança funda-da nessa crença de dar ou restituir à ordeminternacional uma significação e uma forçaque a mantenham viva e fecunda e permi-tam à humanidade, pela coordenação dosinteresses e interpenetração das culturas,elevar-se até à civilização universal?

Pois é dentro desse espírito e fiel à tra-dição ilustre desta casa que Instituto, cria-do sob a invocação de Rio-Branco, um deseus numes tutelares, não só tomou inicia-tiva desses cursos, professados por autori-dades eminentes, mas entendeu pôr-lhes à

base ou dar-lhes, como coroamento, as re-flexões sobre o problema da cultura, nosseus aspectos nacionais e humanos ou dasrelações do humanismo e do ideal nacio-nal. Problema de suma importância que tocaà própria essência da cultura e para o qualvos atraiu a vossa vontade de síntese, culti-vada na inteligência das diversidades nacio-nais e na freqüência dos contatos e das tro-cas culturais, a que obriga a vossa profissãoe que não só constituem ocasiões de tomarconsciência de nós mesmos, de nossas sin-gularidades (pois é opondo-nos que nosdescobrimos e nos afirmamos), como nosconvidam a desprender o universal do con-tingente e a elevar-nos, pela pesquisa dassemelhanças, ao terreno comum em quepodem encontrar-se e pôr-se de acordo oshomens de todas as épocas e de todas aslatitudes. Mas também problema complexo,esse que não pode ser compreendido se aanálise do processo de elaboração da cultu-ra não se estender desde as raízes que mer-gulham na vida da comunidade, tomada emseu conjunto, na variedade de suas forças ede suas instituições, até o esforço criador esucessivo das livres atividades e iniciativasindividuais com que se desabrocha a cultu-ra, como numa esplêndida flor da história,na idéia tão complexa e fecunda dacivilização. É, de fato, do papel dacomunidade e do indivíduo na elaboraçãoda cultura e das ações e reações entre as ma-nifestações da vida espiritual ou ideológicae as condições da vida social, econômica epolítica, que nos esquecemos freqüentementequando estudamos a cultura de um povo –tomada esta palavra não no sentido em queé corrente na antropologia cultural, isto é, oconjunto das reações materiais e sociais deum grupo humano, mas na acepção em queagora a empregamos, de conjunto de valoresespirituais e das atividades e conquistasintelectuais, no domínio da filosofia e daciência, das letras e das artes.

No entanto, os fenômenos culturaisque, como os fenômenos físicos, têm suasdependências e condições, estão por tal

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modo ligados às formas de vida social e aosdemais fenômenos do grupo, religiosos,morais, econômicos e políticos, que somen-te em face e à luz do sistema social geral épossível compreendê-los nos seus carac-teres, nas suas mudanças de ritmo, desentido e de direção. Se se admite a noçãofundamental da interferência dos fenôme-nos, cada um dos quais reage diversamen-te sobre os outros, sofrendo de maneiradesigual suas influências e repercussões;se os grupos e as instituições estão ligados,numa comunidade, pequena ou grande,étnica ou nacional, para exercerem ativida-des que são concorrentes e cujos ritmos sãoou tendem a ser harmônicos; se é verdadeque toda sociedade tem muitos sistemasculturais heterogêneos, mas que se influ-enciam uns sobre os outros segundo osmodos mais diversos, é por certo no corposocial inteiro que é preciso analisar os fe-nômenos de cultura, esclarecendo-os pelointerior, se se quer compreender os movi-mentos que agitam suas partes, seu senti-do e suas direções. Pois não é exato – paradarmos um exemplo – que uma sociedadede tipo feudal tem uma personalidade bemdeterminada e que as regras do direito, asformas de exploração da terra, o regime decavalaria, as relações entre os indivíduos ea literatura dos troveiros e dos trovadoresdependem estreitamente uns dos outros?Não encontramos no espírito de autorida-de, no sistema de relação entre os sexos,no tipo de educação, na submissão à lógicajurídica e às suas fórmulas, no desprezopelo trabalho manual e pela técnica, no gos-to da literatura e da erudição, outros tantosefeitos ou repercussões da estrutura da fa-mília brasileira, apoiada na escravidão eformada sob o regime da economiapatriarcal? As sociedades industriaismodernas não apresentam todas, ao ladode diferenças ligadas às condições especi-ais de cada meio, traços comuns pelos quaisse poderá facilmente reconhecê-las? Parece-me, pois, estarem com a razão os sociólogosque, crendo na ordem profunda dos

fenômenos sociais, não somente num sistemafechado, religioso, doméstico ou técnico, masigualmente numa sociedade inteira, acham quesó a análise de uma sociedade em seu con-junto pode projetar luz bastante sobre qual-quer das manifestações da vida social quetomarmos para objeto de nossas pesquisas.

III

De todas essas manifestações, as maisdifíceis talvez de dominar, nas influênciasque sofrem do meio como nas suas reper-cussões sobre ele, na seiva que por elascircula de suas raízes embebidas nas tradi-ções locais como no impulso para ouniversal, pela imensidade do horizonte queas rodeia, são certamente as da cultura – asatividades dessa camada intelectual que seforma acima e fora das classes e se caracteri-za pela sua função social, não só de criaçãoe de crítica, mas de difusão, organização etransmissão dos bens e valores espirituaisque constituem a herança, sempre amplia-da e renovada, de uma sociedade, de umpovo, ou de uma nação. É aí, nessas emi-nências em que, misturando-se indivíduosde todas as classes, se forma uma elite soci-al, mais ou menos densa e às vezes extre-mamente reduzida, de quantidade e quali-dade variáveis, que a cultura, expandindo-se com mais força, constrói e organiza, comsuas criações espirituais mais altas, os ele-mentos de sua mobilidade e de seus pro-gressos. É aí, nesse altiplano social, que,numa atmosfera mais livre, se desenvolvemos gérmens que produzirão os frutos da es-tação nova; é aí que reinam, na sua plenitu-de, a eterna inquietação e renovação do es-pírito, a dúvida fecunda, o desespero secre-to da meditação, o culto do pensamento, ogosto da especulação e da pesquisa que le-vam às descobertas e permitem aos homenspassar da simples aceitação passiva de rela-ções já criadas à verdadeira cultura que con-siste na “elaboração pessoal de relações ori-ginais”. É nesse pequeno setor da vida social,

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que trabalham, na obscuridade ou naglória, na liberdade ou sob um regime deopressão, sábios, pensadores e artistas cujasobras transcendem à própria nacionalida-de dos criadores e têm assegurada sua sig-nificação absoluta na sua universalidade.Mas, em contraposição a essa cultura supe-rior – obra de poucos, por sua natureza –, aque é inerente um princípio aristocráticoou de qualidade e que é elaborada pelas eli-tes do pensamento, cujas atividades se ca-racterizam pela sua tríplice função social deproduzir, de julgar e de transmitir os valo-res espirituais de um povo, forma-se, nascamadas populares das sociedades civili-zadas, uma cultura eminentemente tradici-onal, de usos e costumes, contos, lendas ecanções, práticas sem doutrinas e crençasserra teorias.

Nesse saber vulgar a que hoje chama-mos folclore, que é obra coletiva, produzi-da por longa sedimentação nas camadas po-pulares, acumulam-se sobrevivências de fa-tos ou resíduos de culturas extintas, conhe-cimentos e superstições, técnicas e artes,tudo o que se transmite por tradição oral ese articula, na vida social, às suas condi-ções mais primitivas. Resultado de umaacumulação permanente, obra de incessan-te elaboração em que é tão difícil a pesquisado individual, nenhuma cultura definemelhor o povo do que essa que trabalha suascriações à base do empirismo e do senti-mento, sendo ou parecendo ser, todavia,idêntica a todos os homens, apesar de suasextraordinárias diversidades de formas li-gadas às diferenças dos povos. Essa diver-sificação de duas culturas, em países decivilização mais complexa – uma, à base davida social, a do povo, e outra, a doscriadores – , é um aspecto particular dessemesmo processo de diferenciação social deque resultam a distinção de classes e a for-mação das elites. Mas, enquanto uma – acultura popular, em que é tão reduzido opapel do indivíduo – é anônima, espontâ-nea, coletiva, impermeável ou fechada àsinfluências externas e se identifica com a

tradição, a outra, a das elites, a qual tende aapoiar-se cada vez mais nas diferenças indi-viduais, é mais aberta às influências de ou-tras culturas e, por isto mesmo, suscetívelde se enriquecer e de renovar-se, de reduziras forças uniformizadoras da tradição querecua por toda parte em que o trabalho sedivide, diante das conquistas do individu-alismo. Estas camadas superiores podemlevar uma vida isolada, desarraigada do ele-mento social e da vida do povo, como entrenós no período colonial e no império, oupodem, ao contrário, abrir-se às suas influ-ências, sobretudo religiosas, literárias e ar-tísticas, tornando-se então a cultura obra detodo um povo, e a um tempo aristocrática –duplo caráter que é, na observação deBardiaieff, profundamente inerente àsépocas orgânicas.

Assim, pois, quando essa camada cul-tural não é penetrada pela vida social e pelacultura popular a que se sobrepõe, atingeao máximo a transcendência das elites emrelação à infra-estrutura espontânea; e, quan-do se abrem possibilidades e tendências àpenetração pela vida social e culturasubjacente, abaixa ao mínimo aquelatranscendência, como no caso do movimentode literatura e de arte moderna, maisachegada hoje, em nosso país, às fontespopulares. É o problema que estudouBardiaieff, da fusão entre essas camadas e aelite aristocrática, como a que se operou, naGrécia, graças ao contato religioso, e da rup-tura e do divórcio entre os criadores e opovo, como na Renascença. As influênciasda tradição pela qual exprime o temperamen-to nacional e que dá unidade original à cul-tura de cada país, se se fazem sentir em linhadireta, sobre as próprias elites, depositáriasda cultura superior, e que se sucedem e serenovam a cada geração, à maneira de elosde uma cadeia, podem ser exercidas tam-bém, de baixo para cima, como a seivaque sobe nas árvores, quer por umapermeabilidade maior das camadas intelec-tuais às influências da vida popular, querpela comunhão das massas com a cultura.

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Se, pois, o papel da comunidade é fun-damental na elaboração da cultura que semela não poderia existir, esse papel – porqueo esforço que a engendra não pode ser se-não o fato de um indivíduo – é diversa-mente limitado, conforme as condições so-ciais, econômicas e políticas, em cada época.Os indivíduos, à medida que as condiçõeslhes favorecem a libertação, não são apenaselementos, mas agentes e inventores sociais.Com o seu esforço criador, com suaspesquisas e suas descobertas, com otelefone, o cinema, o rádio, a aplicaçãoindustrial da energia infra-atômica, e outras,capazes de introduzir inovações que a es-trutura da sociedade jamais poderia prever,e de mudar ou precipitar curso dos aconte-cimentos e da história, o papel dos indiví-duos, de alcance revolucionário, não seriacomparável a “essas mutações bruscas quefazem surgir formas novas de vida”?

IV

Certamente, mais limitado nas socie-dades homogêneas e nas épocas de tradi-ção e, portanto, de culto da uniformidade ede horror às diferenças, o papel dos indi-víduos não assume essa importância senãonos períodos críticos ou de discussão emque culturas divergentes ou antagônicas sepõem em contato numa unidade nacionalou no interior de uma civilização. Se aemancipação progressiva do indivíduo,como pensa C. Bouglé, se explica por mu-danças produzidas na estrutura social e,especialmente, pela formação, no interiordas sociedades, de grupos diversos, cujoentrecruzamento favorece a diferenciação devalores, essa libertação da pessoa humanae essa expansão individualista, tomam novoimpulso nos períodos críticos que perma-necem necessários ao progresso e implicamuma ruptura ou um abalo na tradição. Osgrandes movimentos, de ebulição intelec-tual, não se realizam nas idades em que im-pera a tradição, que é estática, por definição,

e se caracteriza pela resistência ao movimentoe pela ausência de iniciativa, mas nessasépocas em que, sob a pressão de fatoresmúltiplos se estabelecem contatos, trocas econflitos entre culturas diferentes e se cho-cam com os padrões antigos, elementos cul-turais novos, rejeitados quase sempre à pri-meira tentativa de introdução e afinal assi-milados ou repelidos, conforme as reaçõesmais ou menos intensas em que revela opoder das forças em presença, tradicionaise renovadoras. É, segundo as variações dojogo de forças e de culturas de diversas na-turezas, de sua oposição, colaboração e con-corrência, que se ordenam os momentos deefervescência coletiva, de comunicações fe-cundas entre os indivíduos e de circulaçãode culturas. Os contatos de heranças cultu-rais diferentes, as misturas de correntes so-ciais e de civilizações e a difusão, que é afonte precípua de todas a dinâmica cultu-ral, constituem, por certo, o fator mais im-portante dessas transformações que se ope-ram e de que resulta a passagem de umaforma social que implica antes de tudo a tra-dição, para essas ‘sociedades de cooperação,heterogêneas e diferenciadas, que admitemo livre exame, o espírito crítico e a discussão.

Na variedade de influências coletivascom que se alarga o campo às intervençõesindividuais e se abre o caminho à apreen-são e à criação do universal, é fácil distin-guir pela sua importância esses fenômenosde trocas, de contribuições mútuas e deinterpenetração de cultura. Por maior queseja a resistência às inovações, opostas pelatradição e variável conforme as estruturassociais que reagem diversamente umas so-bre as outras e sofrem de maneira desigualas influências exteriores, nunca se produ-zem fenômenos dessa natureza sem que seoperem concentrações de energias esparsas,transformações mais ou menos profundasno conteúdo e na concepção de cultura enas relações entre a cultura e a personalida-de. Foi assim na Grécia, cuja civilizaçãonutrida dos mais diversos elementos orien-tais, encontrou sua época de esplendor na

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Atenas democrática, aonde afluíam, comonum estuário, povos e culturas diferentes,assimiladas e ultrapassadas pelo gênio gre-go; foi assim em Roma, quando, vencedorada pequena península em que se desabro-chara, com as ciências e as artes, a mais belaflor da civilização, se deixou penetrar dasinfluências e seduções poderosas do povovencido; foi assim na Idade Média em queàs universidades, fundadas pelos papas paraserem centros de cristandade e de uma soci-edade universal, acudiam professores e es-tudantes de quase todos os países europeuse em que, sob o influxo do cristianismo, sedesenvolveu o espírito de catolicidade. Foiassim na Renascença com os humanistas,quando as descobertas dos manuscritos, gre-gos e latinos, lhes abriram, ao clarão da lâm-pada antiga, mais largas perspectivas para omundo. As repercussões, entre nós, das idéi-as dos enciclopedistas na organização do Se-minário de Olinda, em 1798; a influência daRevolução francesa na revolta liberal de 1817e na proclamação da Confederação do Equa-dor, em 1824; quase todos os movimentosliterários, desde o Romantismo até as cor-rentes modernas; o germanismo da Escolade Sergipe e as idéias positivistas dos fun-dadores da República, e todas as influências,americanas e européias, que desde a primeiraguerra mundial se cruzam mais intensamentee se entrelaçam, disputando-se a primazia,não esclarecem, no impulso que adquirirame nas oposições que suscitaram, essesproblemas ligados com a inércia e a dinâmicada cultura?

V

A cultura, que é um fenômeno própriodas aglomerações urbanas, tende sempre adifundir-se transbordando dos limites es-treitos da cidade em que se concentra, parase estender, com a formação dessas indivi-dualidades históricas a que chamamos na-ções, diferenciando-se de uma para outra,mesmo no interior de uma civilização.

As cidades foram sempre e permanecem osprincipais focos de cultura, nas suas maiselevadas manifestações espirituais. A razão,em que colocamos a expressão mais alta denossa personalidade, é sob a influência davida e das concentrações coletivas que sedesenvolveu, constrangindo cada um a ten-der à objetividade e à universalidade. Nãofoi em Atenas e em Roma – para lembrarsomente duas cidades antigas – , nestes Es-tados-Cidades, que a cultura atingiu o maisalto grau, alargando-se para esse sentidohumano da vida que impelia Sócrates a con-siderar-se “cidadão do mundo” e dilatava,até à visão de uma sociedade universal, opensamento de Cícero, sem perder, masantes acusando os caracteres peculiares aosdois povos? Certamente, ao culto do pensa-mento puro, ao sentido da beleza, à ordem,à proporção e medida, à justeza e flexibili-dade da forma adaptada exatamente ao queela quer exprimir, ao espírito de finura e aogosto da precisão – uma “invenção” dos gre-gos, como mostrou Bergson e que sem eles“nunca talvez teria aparecido no mundo” –,a todas essas qualidades do gênio grego,opõem os romanos, ainda através das pes-quisas de pura elegância, tão discretamentedissimuladas sob a gravidade do pensamen-to, qualquer coisa de sólido, de duro, deresistente, ou, para dizer tudo, de campo-nês senão mesmo de plebeu, que caracteri-zava esse povo de agricultores e soldados.Mas, sob essa qualidade rústica, essa perse-verança obstinada, com a qual traz o roma-no consigo não uma brilhante e múltiplaerudição, mas três ou quatro grandes sul-cos até o seu termo, como a nitidez no ata-que, a economia de palavras, o rigor no ar-gumento, uma total ignorância das habili-dades e das elegâncias, sob essa robustamentalidade em que se ganhava em saúde eem solidez o que se perdia em nuanças eem colorido, a cultura romana, tão marcadacomo a dos gregos, com seus caracteres esuas singularidades, já não se dilatava, comoa planta à procura de luz, para a civilizaçãouniversal a que serviu e em que se

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incorporou com suas criações originais noplano moral, jurídico e político?

A formação das nacionalidades, cujaunidade surgiu, como um resultado histó-rico, da fusão progressiva de populações eprovíncias, línguas e costumes, concorreumais recentemente não só para acelerar esseprocesso de alargamento de cultura a co-munidades mais vastas, como também paramarcar, pelas fronteiras mais ou menos fe-chadas, as idiossincrasias das culturas par-ticulares, opondo-as umas às outras. Sejamquais forem os fatores determinantes danação – a raça ou maior homogeneidade decomposição étnica, a língua, a forçaorganizadora das dinastias, as conveniên-cias geográficas, a unidade de religião, a co-munidade de interesses, de lembranças ede tradições –, que todos eles contribuíram,em proporções variáveis, para a formaçãotão recente, mas largamente preparada nocurso da história, das unidades nacionais,é certo que esses e outros poderosos agen-tes de unificação, fundindo as culturas ur-banas e alargando, dentro de fronteiras, asinfluências de uma cultura nacional, orgâ-nica e homogênea, não serviram menos parafazer prevalecerem as diferenças sobre assemelhanças, entre nações e as suas res-pectivas culturas. A língua, por exemplo –organismo vivo, produto social e histórico,de elaboração coletiva, tão freqüentementeutilizada, por isso, como fundamento aoprincípio das nacionalidades – , se a anali-sarmos na sua estrutura íntima, isto é, noque ela revela sobre a mentalidade, as con-cepções e os sentimentos dos povos que aempregam, é uma espécie de marca de fá-brica imposta pela natureza aos diferentesagrupamentos étnicos ou nacionais de queela forma um dos caracteres distintivos. In-comparável fator de assimilação, no interi-or das comunidades nacionais, a linguagemtende naturalmente a ser uma barreira en-tre elas; a não ser para aqueles que, porseus conhecimentos, são capazes desobrepujá-la. Certamente nos países aber-tos à circulação normal de estrangeiros,

como de suas mercadorias e de suas idéiasprocessa-se uma transformação constante dacultura, no interior das unidades nacionais,não só pelas possibilidades criadoras e pelaatividade autônoma desses povos, como porempréstimos de outros elementos culturais,por migrações e por misturas dos povosportadores desses elementos. As singulari-dades e idiossincrasias, ligadas ao meio fí-sico, à mistura de sangue e, portanto, aostemperamentos nacionais, e à formação so-cial e histórica governam, porém, a limita-ção desses contatos e determinam a aceitaçãoou rejeição de numerosas influênciasexternas.

Mas todo o movimento de expansãocultural, resultante de uma nova concepçãode vida e de cultura em que, como numa sín-tese, se dissolveram os antagonismos, impor-ta, por sua natureza, num progresso no sen-tido da colaboração e da compreensão entrecidades e regiões de um país, entre povos nointerior de uma civilização ou entre civiliza-ções diversas. É um fenômeno constante,embora mais facilmente observável nos perí-odos críticos, esse da difusão da cultura,dentro de uma nação ou de uma para outra,não através de aspectos de certo modo tran-sitivos, mas de realidades fundamentais.A tendência a ultrapassar as fronteiras, a res-pirar os quatro ventos do espírito – tendênciavariável conforme as épocas – provém, so-bretudo, dessa necessidade de colaborar e decomunicar, que se estende da cidade à re-gião, da região ao país inteiro e, acima dasfronteiras, a outras nações, apesar da diver-sidade de línguas e fortes oposições inter-nas. Compreende-se que esses contatos e tro-cas culturais sejam mais freqüentes entrepovos aparentados uns com os outros, comoos latinos, todos de origem muito misturada,cuja língua saiu de Roma e que se preten-dem co-herdeiros da tradição, ou essas soci-edades nacionais, cujo conjunto constitui afamília ou o bloco ocidental e que são maisou menos aproximadas por filiação a partirde uma fonte comum e por contatos ou in-fluências prolongadas. Essas sociedades,

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quando as comparamos umas com as ou-tras, verificamos que guardam, de fato, den-tro de um círculo de civilização, numerosostraços comuns, predominando sobre traçosdiferenciais das diversas psicologias nacio-nais. Mas, apesar de resistências mais vi-vas, essas influências dispersas, porém fe-cundas, sempre se fizeram sentir, desde outempos antigos, entre civilizações diferentes,como a oriental, mais sutil e refinada, a oci-dental, de pensamento mais racional e cla-ro, e a africana, mais rude com seu estiloparticular, de uma poderosa originalidade,em cujo interior Leo Frobenius descobriu,entre os etíopes e os hamitas, uma oposiçãosemelhante à que exprime o dilema Oriente-Ocidente, a saber, que os primeiros são mís-ticos que se submetem ao mundo e se per-dem no cosmos e os segundos, muito maisconscientes de sua existência pessoal, seseparam do mundo e a ele se opõem, comoos europeus, para dominá-lo. A precisãoque, para Bergson, como há pouco vos lem-brava, foi “invenção” dos gregos, continua aser o privilégio de uma certa parte da huma-nidade; e é talvez porque se mantém impre-cisa, que não entrou em contato com a nossa,a inteligência oriental, por mais brilhante queseja... Mas, a despeito dessas oposições,ainda nos períodos em que se mantiveramobscuras e em sistemas mais ou menosfechados, as civilizações européias, asiáticae africana permutaram influências, refletindosuas imagens como os corpos, por suasradiações invisíveis, insensíveis sobre a re-tina, a que os físicos chamavam luz negra,imprimem constantemente sua imagem umsobre o outro, mesmo quando colocadosnuma completa obscuridade...

VI

A cultura, pois, quer entendida no con-ceito antropológico, isto é, todo o modo deum grupo humano, quer tomada no seusentido restrito e de nosso ponto de vistaocidental, como a descoberta e a valorização

da pessoa humana, o domínio e a utilizaçãodas forças naturais e a transmissão conscientedos valores e das conquistas espirituais atra-vés de gerações (o time-binder, de Korzybski),está sempre marcada pelo caráter de cada povo,que é uma função de sua história, de suastradições e de seus ideais. A cultura, na ob-servação de Warner Jaeger, em Paideis, é umagente plástico que se aplica do modo imedi-ato sobre o indivíduo, mas pressupõe sempreum substratum social e tem uma finalidadesuperindividual ou coletiva. Ao lado das di-ferenças que fazem de cada um de nós umapersonalidade irredutível, não é possível des-conhecer os traços que nos são comuns a to-dos e pelos quais cada um de nós pertence,na própria humanidade, a um povo que temo seu gênio e sua cultura tradicional. Todasociedade supõe um fundo comum a todosos seus membros e a sensibilidade própria decada um dos indivíduos que a compõem podecertamente modificar esse fundo, mas nãosuprimi-lo. A ironia, o humor, o sentido docômico, o ideal do gentleman e o fairplay, dosingleses, o seu bom senso e respeito à tradi-ção, essa desconfiança para com o pensamen-to racional e as construções puramente lógi-cas, que sempre lhes parecem suspeitas, o seuexperimentalismo e a sua submissão aos fatos;a gravidade do alemão, o seu sentido dotrágico, o seu espírito geométrico e de siste-ma, sua paixão pela obediência, a sua habitu-al adoração pelo chefe, pela disciplina e pelouniforme, sua tendência mística, tão perigosana política, e sua musicalidade que, na justaobservação de Ludwig, “sobe dos elementosmísticos da natureza e tem ajudado a fortalecê-los”; a devoção cavalheiresca do francês pelaliberdade, seu forte individualismo, o cultoda inteligência, o gosto da análise e o espíritode finura, sua tendência para as idéias gerais,os grandes princípios e para “tudo que se con-cebe muito clara e distintamente” e que se pren-de ao racionalismo, uma das manifestaçõesparticulares salientes do espírito francês; nãosão traços distintivos e fundamentais, liga-dos às mentalidades particulares dessespovos, tão diferenciados no interior do

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círculo de uma mesma civilização, e pelosquais se pode facilmente reconhecê-los ecompreender-lhes as respectivas culturas,nos seus caracteres próprios, na resistên-cia a certas inovações, nos seus conflitosinternos e nas suas tendências?

Mas, se o conjunto desses traços, ele-mentos ou ideais que caracterizam e pelosquais se exprime a mentalidade de cada povo,penetra as diferentes culturas, imprimindo-lhes um cunho nacional e distinguindo-as,portanto, uma das outras, há elementos que,ao contrário, tendem a fundi-las, pelas ca-madas mais altas, e que se baseiam na expe-riência, na unidade fundamental ou nas con-quistas do espírito humano. Ao lado donacionalismo, o universalismo, como ten-dências diferentes e aparentemente opostas.As pesquisas, verdadeiramente fecundas,realizadas para a análise do “nacional” nacultura, isto é, dos traços e ideais que fazemprevalecer as diferenças sobre as semelhan-ças, devem ser, pois, acompanhadas da in-vestigação metódica do “universal”, dos tra-ços e tendências que fazem preponderar assemelhanças sobre as diferenças entre osgrupos sociais. Todas as culturas, por maisdiversas que sejam, magnificamente limita-das, quando atingem um alto nível nas suascriações, contribuem por esse modo, emproporções variáveis, para a civilização, emcuja estrutura inicial ou básica se misturam,no Ocidente, a idéia da missão e o sentidoda vida interior, herdados dos israelitas, oculto do pensamento puro que lhe veio dosgregos, e o sentido jurídico e político dosromanos. É exatamente em conseqüênciadessas diferenças específicas dos povos ede suas culturas, e, portanto, da diversida-de de tipos intelectuais que as sociedadesse esforçam por realizar e da variedade e ri-queza de suas contribuições originais, pro-veniente de todos os pontos do horizonte,que têm sido tão notáveis, em todos os seto-res, os progressos para a civilização univer-sal, constantemente enriquecida nas fontesmais diversas. Através de gerações sucessi-vas, em todos os povos e nas mais variadas

formas de civilizações, corre a civilização uni-versal como um rio milenar que se escondeàs vezes. para ressurgir depois, nos sumi-douros das idéias bárbaras; que se aperta nasgargantas ou se precipita nas cachoeiras, dasguerras e revoluções, mas se desenvolve,entre dificuldades e acidentes, alimentado poroutros rios mais ou menos densos, nascidosem fontes diversas, e que acrescentam a for-ça das concepções e das descobertas novasao volume regular do curso das águas.

Esse acervo ou resíduo de universali-dade, proveniente de todas as culturas na-cionais e que constitui o fundo comum, cadavez mais rico da civilização universal, nãoestá apenas ligado ao acréscimo incessantede conquistas e verdades adquiridas, mas àprópria natureza humana – agente da cultu-ra e matéria em que ela trabalha – e que, emessência, permanece idêntica através dostempos, sob a extrema variedade de seus ti-pos éticos e mentais. A capacidade de difu-são de certas tendências pelos povos maisdiferenciados, sob a pressão da vida e dascondições coletivas mostra a persistênciadesse fundo comum, tão pouco investiga-do, através da multiplicidade das formas decultura e de civilização. Não é, de fato, aidentidade fundamental do espírito huma-no que explica, por exemplo, as oscilaçõesperiódicas, em sociedades tão diferentes,entre os dois pólos do romantismo e doclassicismo, ligados à luta que existe no in-terior de todo o espírito, sempre que estejadotado de um fundo vital exuberante, e doqual, se nele triunfam a medida e a norma,nasce uma obra clássica tanto mais bela quan-to mais rebelde tenha sido a matériatrabalhada? Demais, se na variedade deformas de inteligência se encontram espíritosmais sensíveis às sugestões do ambiente,tocados do genius loci, que vivem ese inspiram do meio, para penetrá-loe compreendê-lo, ou procuram galvanizar asformas locais das culturas tradicionais, comoentre nós, Euclides da Cunha, na literatura,e Almeida Júnior, entre os pintores, outrosrevelam, como Joaquim Nabuco e Rui Barbosa

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tendências mais universalistas, com seus“impulsos para horizontes ilimitados, paraas idéias gerais e as largas visões de con-junto. Mas, em todo o caso, nas própriasobras dos grandes criadores de valores, detradições e de tipos sociais e humanos, comoHomero e Virgílio, Dante e Shakespeare,Cervantes, Racine, Goethe ou Dostoiewski;nessas obras geniais que se diriam escritassob espécie aeternitatis e que valem na me-dida em que “aproximam o homem do tem-po do homem da eternidade”, não se ob-servam tão marcados, apesar da riqueza deseu conteúdo humano, os caracteres daépoca e do meio em que foram criadas, etão viva a luz das atmosferas, em que sebanharam, das mais diversas culturas?

VII

Essas duas correntes, igualmentesociais – a que se transpõe ao primeiro pla-no, na hierarquia dos valores, os fins na-cionais, e a outra, que nos leva a subordi-nar a estes ideais os fins humanos ou an-tes a harmonizá-los – , tão longe estão dese oporem, por sua natureza, que se com-pletam, na evolução do pensamento. Defato, no mundo contemporâneo, comoacentua Paul Fauconnet, “cada nação temo seu humanismo que se reconhece nofundo de seu próprio espírito”. Se há civi-lizações que nos impelem antes aohumanismo, seja o de fundo religioso, dassociedades cristãs, seja o da Renascença,pelo retorno à tradição antiga, o de inspi-ração romântica, como o que se inaugurouno século 19, em conseqüência das via-gens e explorações, ou de espírito racionale científico, da civilização atual, outras fa-zem triunfar na cultura os ideais nacionais,deslocando para estes o seu centro degravitação. Ao ideal que implica uma idéiade totalidade e de síntese e se opõe, por-tanto, à idéia de especialização e de parti-cularidade que se esforça por ultrapassar;a esse ideal que nos leva a ver os outros

homens entre nós e a reencontrar-nos ne-les, a considerar-nos “concidadãos de todoo homem que pensa”, segundo o famosoverso de Lamartine, ou cidadãos do mun-do, na velha aspiração de Sócrates, pode,portanto, ajuntar-se ou contrapor-se, con-forme os casos, sob a pressão das forçascoletivas, o ideal nacional que tende, nassuas formas agressivas, a sobrepor ao ho-mem o cidadão, a impelir a nação a alimen-tar-se de sua própria substância, recusan-do-se aos contatos e às trocas culturais, e aprocurar, dobrando-se sobre si mesma, acoesão interna e a homogeneidade dogrupo, num regime de autarquia e de isola-mento mantido pela exaltação do sentimentonacional. Foi o que se observou em algunspaíses, como entre outros, na Alemanha,na Itália e no Japão, com suas tendênciasfascistas, no período que mediou entre asduas guerras mundiais. A preponderânciado universalismo sobre o nacionalismo, oudeste sobre aquele, depende, pois, das for-ças de que, no momento dado, o ideal, o“social” dispõe, do impulso histórico queo dirige, do estado das instituições econô-micas e políticas no meio das quais opera,e da maneira porque são grupadas ou sedividem as correntes de pensamento e deopinião, em cada sociedade, numa épocadeterminada.

Mas, se, para a compreensão de proble-ma tão complexo; é preciso acompanhar ojogo dessas forças e instituições sociais, cujaação, lenta e constante, desprende pouco apouco no homem da natureza o homem dacidade, no homem da polis o cidadão, e nocidadão o homem universal, não é menosnecessário verificar em que condições sãopossíveis os fluxos e refluxos dessas duascorrentes, os movimentos de exaltação e de-pressão que sofrem o nacionalismo e ouniversalismo, no curso da história. Essesdiversos movimentos não tomam, aos nossosolhos, toda a sua importância real, a não serquando analisamos e conseguimos penetraras causas que os fizeram nascer ou lhesfavoreceram a propagação. A passagem do

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cosmopolitismo ao ideal nacional, e donacionalismo ao ideal humanístico, liga-se a fatos e condições especiais, cujoestudo, retomado várias vezes, esperaainda resultados mais vastos, fundadosem análises mais profundas. Todos, noentanto, concordam em pensar que osmovimentos de idéias e os modos decomunicação que evoluíram paralelamenteem função uns dos outros; o surto de dou-trinas e de religiões, de tendênciasuniversalistas, como o cristianismo, tãovigorosamente impelido pelo espíritoecumênico ou de catolicidade; a misturade raças e de culturas; a difusão das idéiasdemocráticas e do racionalismo científicoe tecnológico, são outros tantos fatos queconcorreram para o desenvolvimento dohumanismo, de fundamentos diversos énos aspectos sucessivos que, nele, histo-ricamente se podem distinguir. Para osque não compreendem a vida e o poderdas idéias e não sabem acompanharsua repercussão sobre os fenômenoseconômicos e políticos e a influência des-tes sobre as idéias, não será fácil a apre-ciação, no seu conjunto, dos esforços edas obras próprias a assegurar o acordoe a harmonia entre os homens, e dos meiospróprios a preparar o homem para rece-ber essas obras e conquistas do espíritohumano. Pode bem ser que as idéiasdependam das necessidades e de suasatisfação, mas nem por isso elas existemmenos; e essas forças, ora refreadas oraem sua livre expansão, não é possívelignorá-las.

Nas rotas de migrações em que ospovos são estimulados pelo intercâmbiode mercadorias como de conhecimentos,abrem-se e alargam-se perspectivas para ocosmopolitismo, pela interpenetração deraças e de raças de cultura e, portanto, peladifusão de idéias. O intercâmbio e a mis-tura de padrões culturais na antiguidademediterrânea, em que se acenderam, emAtenas e em Roma, os focos de duas gran-des tradições literárias; a expansão do cris-

tianismo, cujas universidades na idademédia, destinadas a todos os europeus, flo-resceram sob a proteção da Igreja, que nãoconhecia fronteiras; a emigração para aItália, dos sábios bizantinos, depois datomada de sua capital pelas hordas turcas;o movimento da Renascença, em que oespírito ocidental se achegou, para reno-var-se, às fontes da cultura antiga que pre-tendeu rejuvenescer; as viagens de explo-radores e naturalistas no século 19; o êxodode sábios, pensadores e artistas, acossadosde seus países, pelas guerras e revoluções,e que encontraram, em nações, como oMéxico e os Estados Unidos, não só refú-gio mas as condições favoráveis a seus tra-balhos e pesquisas; as missões científicase técnicas que cruzam os ares e os oceanosem todas as direções, para levarem a ou-tros povos seu espírito e seus métodos, mos-tram como sempre foram fecundas para ohumanismo as migrações, o intercâmbiocomercial, os contatos e a difusão de cul-turas diferentes, a circulação de estrangei-ros ilustres e o saber que disseminararn,estimulando, como o antagonismo de ten-dências rivais, a vitalidade de outros povose provocando suas reações criadoras. Emrazão mesmo dessa intensificação da vidainternacional que reside à base dohumanismo e lhe favorece a expansão, podeacontecer também, como já se observouentre 1918 e 1939, que as nações, ao invésde se abrirem às trocas econômicas e cultu-rais, se esforcem, ao contrário, por concen-trar-se sobre si mesma, a fim de melhorse, afirmarem em sua independência eoriginalidade. Na crise pela qual passou acultura individualista e de que o misticis-mo e o nacionalismo foram a duplamanifestação, o Fausto moderno procuroua alma mediável no “messianismo” daspátrias. Mas, se com a criação das ideolo-gias nacionais, a explosão dos nacionalis-mos abalou tão profundamente vários paí-ses, em dois continentes, não chegou a atin-gir senão superficialmente, e através de re-sistências pertinazes, os povos americanos.

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Em nosso país, como nos Estados Unidos,a formação secular do povo, à base de umaconstante miscigenação, de raças e de cul-turas, o processo de democratização socialque daí resultou, e o “sentido nacional”do brasileiro que se formou, em conseqüên-cia, como observa Gilberto Freyre, “tempe-rado por uma simpatia tão larga pelo es-trangeiro que importa em universalismo”,constituíam um sistema de garantias con-tra a irrupção e a preponderância do nacio-nalismo exagerado sobre as tradiçõestendenciais universalistas.

VIII

Em conseqüência das descobertas ci-entíficas e das invenções, como das vitóri-as dos democráticos, parece-me que essastendências já se acentuam por toda parte ese inaugura uma nova época de humanismoem que tudo conspira para fazer desabro-charem, na cultura, as idéias e crençasuniversais. As transformações que ocorre-ram, no tempo de nossa geração, como oautomóvel, o cinema, a aviação, e o rádio e,mais recentemente, a utilização industrialda energia intra-atômica, de aplicações difí-ceis de prever, e que importam num mara-vilhoso progresso das técnicas de transportee de comunicação de idéias, tenderão a en-curtar cada vez mais as distâncias, aproxi-mando povos e culturas, e alargando o ca-minho à civilização universal. O livro, ocinema, o rádio e a televisão propagam decada país e por todas a parte todas essasinquietações e angústias, alegrias e esperan-ças, às quais sábios e artistas, escritores epolíticos, emprestam uma voz para as faze-rem concorrer à transmissão e à conserva-ção do que constitui em nós a humanidade.O que se afigurava pura utopia, como aformação de um sistema de segurança in-ternacional, uma moeda comum de cursogeral na América ou mesmo em todos ospaíses, uma língua universal, já passou doreino das quimeras para o das cogitações

graves nos conselhos dos povos que concorremou aspiram a contribuir eficazmente, numregime de liberdade e de justiça social, para areedificação da cultura democrática.

Nunca, em qualquer época da história,se adquiriu consciência tão viva da série deprogressos tanto materiais como morais eintelectuais, realizados pela humanidade noseu conjunto, num sentimento tão profun-do do alcance de todas essas transformaçõestécnicas e econômicas que, modificando amentalidade, prepararam uma nova concep-ção de vida e de cultura, criam novos valo-res sociais e instalam por todos os países,apesar das diferenças, e oposições, novasformas de convivência humana. E se à basedesse novo humanismo reside a ciência, nãoserá somente pelo prestígio de suas desco-bertas, e pela esperança de descobertas maisaltas, nem somente porque, tendendo cadavez mais à especialização, faz por isso mes-mo realçar a necessidade e desenvolver oespírito de cooperação. É sobretudo por sero espírito científico um método geral de pen-samento, de cuja difusão e vitória se podeesperar essa união dos espíritos que dobrao poder de uma nação e alarga cada vezmais o campo da civilização universal: “Pormais diferentes quanto a doutrinas e crençasque possam ser homens vindos de todos ospontos do horizonte intelectual, a aceitaçãodessa mesma disciplina do espírito, escreveFrancisque Vial, forma, de fato, um terrenosólido de verdades adquiridas sobre o qualpodem encontrar-se e pôr-se de acordo”.

Seja qual for o ponto de vista em quenos colocamos para apreciá-las, não é pos-sível desconhecer a importância e a difusãodessas tendências positivas da nova era queacharam a fórmula precisa e corrente no es-pírito científico, nos seus métodos e nassuas verdades fundamentais. É por isso que,para um filósofo como Léon Brunschvicz,o problema do humanismo não se pode nãosomente resolver mas nem mesmo pôr, a nãoser que comecemos por meditar longamentea herança de sinceridade, de precisão e deprofundidade que o feliz esforço da ciência

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conquistou para nossos filhos. Para aqueles,porém, que, julgando não cultivar a ciên-cia, senão o espírito de análise que a pro-duz, não esperam possa ela constituir umaarmadura ideal, própria a sustentar uma sín-tese orgânica do pensamento; para aquelesque entendem, apoiados na idéia deFrobenius, que, tendo passado, no cursodos séculos, da emoção e da participação,ao conhecimento e ao espetáculo, convémao homem, se ele quer compreender-se a simesmo, fazer o caminho inverso, do pen-samento para a emoção, da análise para aintuição, a aproximação de círculos de ci-vilizações tão diversas, como o africano, oasiático e o europeu, poderá abrir, com asoportunidades de contatos mais íntimos deculturas, relativamente assimiláveis, umlargo campo de observações, capazes de nosdarem respostas a essas e outras questões.É possível, com efeito, perguntar se a hu-manidade, no ocidente, não padece de umabuso de análise de um respeito exageradodas idéias claras, e em que medida, umacivilização, como a oriental, tão rica de sen-tido poético e religioso da vida e que entre-viu a ação de forças obscuras de que perde-mos o segredo, poderá modificar a mentali-dade racionalista e positiva do ocidenteou transformar-se sob suas poderosasinfluências. Pela primeira no mundo se põea um tempo, e em todos os continentes, oproblema do contato e do conflito dessasduas grandes civilizações, de natureza, vi-talidade e atividade muito diferentes, quetêm de reagir fortemente uma sobre a outra,quando postas em presença ou misturadaspela conquista, pelo desenvolvimento docomércio e das técnicas ou mesmo simples-mente pela difusão dos meios mais moder-nos de expressão e de comunicação deidéias. Talvez o homem de nosso tempo,“sorvendo na sua própria fonte as inspira-ções originais do espírito ocidental”, venhaa tentar o esforço de lhes renovar o poder,combinando-as ao fogo do pensamento, coma vasta matéria fornecida pela experiênciaoriental.

IX

Mas, a todos esses problemas de conta-tos e aproximações internacionais, de trocase relações entre tipos de civilização, nenhu-ma instituição pode ser mais sensível do queeste Ministério, em que a idéia de coopera-ção é erigida em sistema e uma de cujas fun-ções é exatamente a de ativar a colaboraçãointernacional, em todos os domínios, e favo-recer, por esta forma, a mútua compreensãodos povos. Pela natureza de vossas ativida-des que vos obrigam a contatos diretos e fre-qüentes com as realidades estrangeiras e aconfrontos das mais diversas experiências,estais, de fato, em condições especiais paraapreciar melhor o papel considerável do ele-mento internacional na cultura das elites enas instituições do ensino superior, como ovosso Instituto, de criação ainda recente;apreender, com mais segurança, através dediferenças profundas, a vida comum dahumanidade, que nunca foi mais rica, maisintensa, mais solidária do que em nossos tem-pos; observar se as grandes correnteshistóricas do leste para o oeste retomaramsua marcha, deslocando, como já parece aalguns, da Europa para a América, o centrode cultura ocidental, e seguir o pensamentohumano através de suas formas e evoluções,marcar-lhes as partes caducas e a ascensãoprogressiva para maior clareza, amplitude ecompreensão. Por mais viva, porém, que sejaa sensibilidade de vossas antenas para captaratravés do contingente o universal e o sentidoda nova civilização, é no amor de nossafamília particular – fração ponderável e, paranós, a mais querida da grande família humana– que continuarão a alimentar-se as nossasenergias e a procurar inspirações nas nossasatividades. A palavra grega que ainda reper-cute em nossos ouvidos, quando nos inter-rogamos sobre nossos deveres sociais – “omais seguro dos oráculos é defender sua pá-tria” – , sempre se juntou à voz da Américae à do mundo para orientarem nossosembaixadores e ministros, como o Barão doRio-Branco, em quem tão intimamente

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andavam associadas a idéia da universali-dade que lhe ditou os princípios gerais e osmétodos e o sentimento profundamentenacional que o levou a aplicá-los em defesade nosso país, na solução pacífica de seusproblemas de fronteiras. Bela e fecunda, naverdade, quase sem desmaios, é a lição se-cular que se desprende da vida, das ativida-des e do espírito tradicional desta casa, peloseu respeito à razão e pelo seu culto da

justiça e do direito, de que foi o intérpretemais completo esse admirável homem deEstado, cujo descortínio, na frase de Euclidesda Cunha, “depois de engrandecer-nos noespaço, engrandeceu-nos no tempo”; que fezda decisão arbitral uma religião e cujo amorao Brasil se alargava para esse ideal humanoque, nas suas próprias palavras, não era “oda formação de dois mundos rivais, mas deum só mundo unido”.

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