o mundo anorexico e a violencia bulimica maria ramalho...

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1 XXV CONGRESSO LATINOAMERICANO DE PSICANÁLISE FEDERAÇÃO PSICANALÍTICA DA AMÉRICA LATINA “O MUNDO OBJETAL ANORÉXICO E A VIOLÊNCIA BULÍMICA EM MENINAS ADOLESCENTES” EIXO III – PSICANÁLISE DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES MARINA RAMALHO MIRANDA SOCIEDADE BRASILEIRA DE PSICANÁLISE DE SÃO PAULO BRASIL - 2004

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XXV CONGRESSO LATINOAMERICANO DE PSICANÁLISE

FEDERAÇÃO PSICANALÍTICA DA AMÉRICA LATINA

“O MUNDO OBJETAL ANORÉXICO E A VIOLÊNCIA BULÍMICA

EM MENINAS ADOLESCENTES”

EIXO III – PSICANÁLISE DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES

MARINA RAMALHO MIRANDA SOCIEDADE BRASILEIRA DE PSICANÁLISE DE SÃO PAULO BRASIL - 2004

2

INTRODUÇÃO

Manifestações de um sofrimento psíquico, anorexia e bulimia são por mim

entendidas como perturbações paradoxais da alimentação, que se revezam

morbidamente no psiquismo, especialmente de jovens do sexo feminino, foco

deste estudo, revelando tensões entre o ato de comer e o não-comer, pois o

alimento recusado, temido e expurgado constitui-se como o objeto da paixão

dessas meninas, formando-se, então, uma relação apaixonada entre elas e o

alimento.

Alimento, corpo e fertilidade, elementos fundantes da feminilidade, são

personagens centrais de uma guerra travada no interior de mentes de mães e

filhas assustadas e perplexas diante do inominável que eclode de emoções

impactantes e antagônicas, que permeiam esses quadros o tempo todo. Mãe e

filha dependentes e paradoxalmente sentindo um horror a esta dependência que

nutre a relação, aprisionadas num corpo-cárcere, ambas buscando eternamente

uma completude para um vazio que sentem nunca ser eficientemente preenchido,

tomadas por uma sensação de constante débito, uma tristeza sem nome, uma

vida que beira a morte.

Patologias dos contrários, dos paradoxos, construções psíquicas fundadas

ao mesmo tempo nos excessos e nas faltas, antagonismos e incoerências que

ocupam o lugar central dessas perturbações. Anorexia e bulimia constituem-se

como o protótipo da configuração ilógica do inconsciente, expressões ilustrativas

da dinâmica profunda da mente perturbada por culpas e penitências.

3

A CLÍNICA É SOBERANA

Uma menina de doze anos, franzina, semi-esquelética, pálida, trêmula, com

ar assustado entra em meu consultório. Chama-se Eliana1. Traz consigo uma

atmosfera grave, pouco colorida, uma avalanche de angústias, difusas e esparsas,

as quais ela pouco consegue definir. Mas sabe que não está bem. Porque sofre e

porque se sente saturada, sem vontade, sem anseios, sem sonhos, sem fome.

Vazia de recursos e de pensamentos, mas cheia de ansiedade, com pouca

disponibilidade para pensar, transbordando dor, comunicando penitência.

Uma boca que pouco come, um psiquismo que pouco elabora.

Esta é Eliana.

Espaços internos ocupados, não há mais lugar, nem no estômago, nem na

mente. (Será que haverá lugar para a análise?) Com um mundo de coisas que

gostaria que eu soubesse, mas sem palavras para transmiti-las a mim ou a

qualquer outro. Percebe-se carente, mas não sabe de quê.

Magra, de carne, de idéias, boca fechada para a comida, mente fechada a

reflexões. Corpo que mostra os ossos, que desnuda a dor, que expõe o que não é

para ser visto: o sinistro.

Assim ela se apresenta a mim. Ela está ali, bem na minha frente. Penetrou

pela minha porta adentro, portanto me refaço otimista, procuro achar desse modo,

notícias de vida, de movimento, de ação. Mas o fundo continua branco e preto,

uma sombra depressiva em suas primeiras falas:

1 Nomes das pacientes e histórias misturados com a ficção, para resguardar o sigilo da sala de análise.

4

“Não posso comer...não consigo comer...se eu não comer, vão me

internar...”

“Sinto-me como um balão estufado, mas vazio, sem nada, que se for solto,

não conseguirá subir.”

Medo, angústia de morte, incerteza, um sombreado negro, uma sensação

frustrada de desencontro, de busca errada, de constantes enganos.

Um mundo sem palavras, sem sustento, sem sentido.

O corpo franzino, o cabelo ralo, a pele seca, a brancura, o roxeado de seus

lábios revelam-me a violência do auto-ataque, o poder destrutivo desta menina

aparentemente tão inofensiva.

“Não me gosto, sou feia, detesto tudo o que faço”.

Sente-se atormentada, assombrada pela gordura, acusada pela magreza,

rodeada de fantasmas que ela não vê, não identifica, similares a inimigos

invisíveis.

“Estou sempre gelada, tenho a impressão de ser como a neve, aliás, eu

adoro o branco...”

Ela “adora” este estado, branco, que tem a ver com o puro, limpo e,

portanto, bom.

Causa-me intenso impacto a força do olhar de Eliana, a sensação de que

estou diante de dualidades de emoções, que me perturbam ao mesmo tempo em

que me fascinam. Um olhar de menina carente, porém transmitindo a presença de

uma mulher que de nada precisa; gestos de pedido de ajuda, implorando

cumplicidade, ao mesmo tempo em que vejo desdém e desprezo em suas falas.

5

Alguém vazio, e ao mesmo tempo alguém tão cheio, atormentado por

fantasmas que a consomem e a conduzem a uma sepultura em vida.

Lembro-me de antigos rituais religiosos, nos quais evitar a ingestão de

alimentos, como o jejum, carrega em si a conotação de busca de um estado puro

e também de pagamento de uma dívida que sempre está se renovando (anorexias

sagradas, santas)

Um terreno perigoso, onde apenas fragmentos são apresentados, pois o

todo da experiência é por demais violento. Percebo que estou transitando em

áreas de vida e de morte, e que o que pude intuir deste encontro é quase nada

diante do que esta menina está vivendo. Foi apenas um vislumbre da tragédia que

a acometeu.

“Todos dizem para eu comer. Minha mãe diz o dia todo: coma, coma, coma,

ninguém percebe que eu vou entrar em estado de coma!”

Um jogo de palavras que expressa pré – morte...

A mãe de Eliana, rendida à confusão psíquica instaurada e sentida por meio

das angústias da filha, sentiu o medo de perdê-la e percebeu as suas próprias

fragilidades misturadas na relação e aceitou a proposta de iniciar sua própria

análise.

A anorexia e a bulimia têm ocupado um lugar de destaque em nossos dias

devido, principalmente, à alta demanda de meninas púberes e adultos jovens em

nossos consultórios e serviços públicos de saúde mental. Muitas mulheres sofrem

dessas perturbações2 e necessitam ser ajudadas, preferencialmente por um “time”

2 As pesquisas mais recentes apontam para o fato de que 90% das pessoas acometidas pela anorexia são jovens mulheres, o mesmo ocorrendo com a bulimia. Dados extraídos do Current

6

que delas cuide, formado por uma equipe multidisciplinar, pois devido à

complexidade envolvida nesses quadros, um profissional isolado não deveria ter o

patrimônio do atendimento, postura esta que já de antemão irá servir de modelo

contra o pensamento onipotente que permeia o funcionamento mental

anoréxico-bulímico o tempo todo.

Refiro-me à anorexia da paciente bulímica e à bulimia da paciente

anoréxica, desta maneira reproduzindo espontaneamente o cruzamento e o

revezamento das características paradoxais de ambas as perturbações.

Leslie Sohn3, psicanalista inglês de inspiração bion-kleiniana, ensina-nos

que a anoréxica esconde demandas bulímicas na falta de apetite e na falta de

interesse, pois no interior de seus objetos reside uma impossibilidade de

satisfação dos desejos. A mente bulímica, por sua vez, apresenta as mesmas

qualidades da mente anoréxica, uma falta de apetite dirigida às possibilidades e

buscas específicas, não encontrando uma real satisfação em coisa alguma.

Compartilho sobremaneira da compreensão de Sohn4:

“Neste artigo pretendo discutir a anorexia do paciente bulímico e a bulimia

do paciente anoréxico – e sua inter-relação, tal como é manifesta na

transferência.” (tradução livre)

A CONTRIBUIÇÃO DA PSICANÁLISE

Medical Diagnosis & Treatment, ed. Lawrence Thierney, Stephen McPhee, Maxine Papadakis. Stamford: Appleton & Lange, 1999. 3 Sohn, Leslie Anorexic and bulimic states of mind in the psycho-analytic treatment of anorexic/bulimic patients and psychotic patients em Psychoanalytic Psychoterapy, vol. I, 2, pp. 49-56. 4 Idem, ibidem.

7

DEFINIÇÃO DOS TERMOS:

Anorexia: palavra que vem do grego orexis, que significa desejo em geral

e não apenas desejo de comer, precedida do prefixo a de negação, anorexia quer

dizer negação do desejo. Podemos constatar desde aqui que esta perturbação

está originalmente implicada com conflitos na área do desejo e com suas mais

bizarras formas de expressão. Vontade e contra-vontade, os pares de opostos, as

duplas antagonistas ou as idéias antitéticas5 de que nos falava Freud localizam-se

na base destas perturbações.

Bulimia: termo que também deriva do grego, significando fome de boi,

bulimia refere-se a uma vontade incontrolável de comer, de forma

indiscriminada, gulosamente, em pouco espaço de tempo com comprometimento

do senso crítico em relação à quantidade, qualidade ou combinação dos

alimentos. Fome de boi sugere apetite animalesco, que extrapola o humano e

migra para o reino animal, onde sabemos, o pensamento simbólico não tem lugar.

Segue-se a esses episódios, (que geralmente ocorrem às escondidas e com

maneiras pouco elegantes) um intenso sentimento de culpa e medo de engordar,

o que leva à indução de vômitos e/ou uso de laxantes e diuréticos como meios de

evitar o ganho de peso.

A expressão binge eating é freqüentemente encontrada na literatura sobre o

tema para fazer referência ao rápido e indiscriminado consumo de grande

quantidade de comida num tempo curto, típico dos episódios bulímicos

5 Freud, Sigmund (1892-3) Um caso de cura pelo hipnotismo, ESB, 1ª. Ed., vol. I, p. 171.

8

anteriormente referidos, levando a pessoa a um desconforto físico e psíquico,

sono e vontade de vomitar, gerando, na seqüência, um humor depressivo.

O MAL-ESTAR DA CONTEMPORANEIDADE

Questões de identidade, falhas no processo identificatório, áreas do

desenvolvimento mental que ficaram sem representação e portanto impedidas de

desdobramentos, mentes que burlam a possibilidade de pensar a dor: sinais dos

nossos tempos, eis aqui o “lado mau” da chamada “era contemporânea”, que dá a

luz a aparelhos psíquicos que não conseguem abrigar áreas de representabilidade

do afeto. Daí anorexia e bulimia (assim como a chamada “síndrome do pânico,

alcoolismo, drogadicções) serem consideradas hoje como perturbações

pertinentes à era contemporânea, pela concretude de suas expressões, pelo vazio

de significações, pelos sucessivos actings, pelos constantes splittings e pela

impulsividade das ações violentas em detrimento da ponderação elaborada do

pensamento.

Meninas anoréxicas/bulímicas que se mostram sombrias, pálidas,

assustadas e que relatam uma sensação frustrada de desencontros, de

constantes buscas erradas, de incertezas e indefinições. Sentem-se imersas num

mundo sem palavras, sem sustento e sem sentido.

Deparam-se com a falta, sentem-se devendo. Não sabem o quê, nem a

quem.

Vivemos hoje em contato direto com a violência explícita, gratuita, invasões

de toda ordem que me reportam à violência bulímica e à destrutividade anoréxica,

onde a presença de um objeto intrusivo outorga ao mundo interno dessas meninas

9

uma sensação constante de estarem sendo agredidas e arrombadas. Relatos

constantes de “vazio interior”, sensação de “oco por dentro” ou ainda vivências de

“balão estufado que se for solto se perderá no espaço”6 mostram tentativas de

representações simbólicas que se confundem com a concretude que impera no

modo de funcionar anoréxico e bulímico, possíveis seqüelas das falhas no

processo identificatório, onde self e objeto muitas vezes se fundem sem

alternativas de singularidade.

Vivemos uma época em que o indivíduo expressa muito de sua maneira de

pensar e expõe seu perfil através da forma como lida com seu corpo e com sua

alimentação.

Portanto, reconheço a necessidade de estarmos preparados com nossas

teorias para nos defrontarmos com os fenômenos psíquicos que surgem no

cenário cultural da Pós- Modernidade onde o corpo, a conservação da juventude e

a aparência física dominam o discurso da mulher e do homem, de modo especial

no nosso país. Concordo que o chamado cenário pós-moderno é transformador e

gerador de novos valores éticos e estéticos podendo levar a um impacto sobre a

subjetividade contemporânea, assim como criar novas facetas na cultura pós-

moderna.

Porém, neste artigo, estarei focando minha atenção nas questões

inconscientes, esperando contribuir com uma compreensão do psiquismo na

anorexia e na bulimia, que se movimenta de dentro para fora, afinada com as

vivências da interioridade e na singularidade específica de cada ser humano.

6 Expressões extraídas de relatos de jovens pacientes em análise.

10

Penso que a psicanálise contribui expandindo esta visão ao tomar a

anorexia e a bulimia como sintomas orais que ao mesmo tempo em que

escondem, mostram angústias primitivas ligadas a momentos iniciais do

desenvolvimento da vida psíquica, especialmente no que concerne a rupturas

precoces na relação com a figura materna internalizada.

A anoréxica e a bulímica usam o corpo como tela projetiva ou como um

diário, nele inscrevendo sua história plena de paixões despropositadas; o artista

usa a tela também como forma de registro de afetos impactantes, que tingem o

branco com a história emocional do pintor.

A anoréxica, com seu corpo magro, sem formas, despista a emergência de

fantasias edipianas, desfaz-se da concretização do incesto, do contato com a

realidade psíquica e com as fantasias ligadas à voracidade e inveja.

Áreas concretas, de corpo, de carne, de tecidos, de vômitos ou de

gorduras, repetindo e copiando si mesmo, sem alternativas de criatividade ou

fertilizações.

Corpos anoréxicos e bulímicos que exibem as marcas da passagem da

angústia, corpos sacralizados e notados, que atraem e repelem, reproduzindo e

estampando o sofrimento e a dor daquelas mulheres que não conseguiram manter

no reino do simbólico os seus desencontros.

A TEORIA ALICERÇANDO A CLÍNICA DOS DISTÚRBIOS DA ALIMENTAÇÃO

Freud já falava...

A investigação de Freud, no início da construção da teoria psicanalítica, é

preciosa para este estudo, não só à guisa de fundamentação teórica, mas para

11

destacar que as questões psicopatológicas envolvidas na anorexia e na bulimia já

aconteciam e por ele eram percebidas e pesquisadas em 1893.

Freud descreve os “casos clínicos,”7 nos quais a anorexia figura e é referida

como um sintoma de quadros clínicos denominados por ele como “histerias”,

“neurose infantil” ou ainda, usando a expressão de Charcot “histerique

d´occasion”.8 Em 1895, Freud já usava o termo atual quando se reportava à

“anorexia nervosa em moças jovens” 9 e ao descrever os sintomas anoréxicos

observados em suas primeiras pacientes, mulheres, diagnosticadas por ele e por

Breuer como histéricas. Seus achados clínicos levantam questões sobre a

sexualidade e feminilidade equivalentes às encontradas na dinâmica psíquica das

jovens anoréxicas e bulímicas por mim atendidas.

DA NEUROSE NUTRICIONAL À ANOREXIA NERVOSA

Existe uma carta a Fliess, que, segundo os editores da Standard Edition,

não tinha data; guiados pelo carimbo do correio no envelope que julgam pertencer

a ela, os primeiros editores situaram-na como sendo de 7 de janeiro de 1895, o

que corresponde e faz sentido com as idéias que Freud vinha desenvolvendo

sobre histeria e melancolia: é o Rascunho G, documento precioso no qual ele diz

ter observado anorexia nervosa em moças jovens, estabelecendo uma intensa

ligação com conteúdos melancólicos.

7 Freud, Sigmund (1893-1895) Estudos sobre a Histeria – II Casos Clínicos: (1) Fraülen Anna O., (2) Frau Emmy Von N., e (3) Fraülen Elizabeth Von R., ESB, 1ª. ed., vol. II, p. 63. 8 Freud, Sigmund (1892-3) Um caso de cura pelo hipnotismo, Op. cit., p. 171. 9 Freud, Sigmund (1895) Rascunho G, Op. cit., pp. 275-6.

12

Vejamos:

“(a) O afeto correspondente à melancolia é o do luto – ou seja, o desejo de

recuperar algo que foi perdido. Assim, na melancolia, deve tratar-se de uma perda

– uma perda na área da vida instintual.

(b) A neurose nutricional paralela à melancolia é a anorexia. A famosa

anorexia nervosa de moças jovens, segundo me parece (depois de cuidadosa

observação) é uma melancolia em que a sexualidade não se desenvolveu. A

paciente afirmava que não tinha se alimentado simplesmente porque não tinha

nenhum apetite, não havia qualquer outro motivo. Perda do apetite – em termos

sexuais, perda da libido.

Portanto, não seria muito errado partir da idéia de que a melancolia consiste

em luto por perda da libido.

Restaria saber se essa fórmula explica a ocorrência e as características dos

pacientes melancólicos”.

Em outro momento (1924)10, Freud reflete que foi a partir dos estudos com

as jovens histéricas, nas quais um desejo sexual reprimido transformou-se num

sintoma penoso, que a psicanálise começou a mostrar que ela era capaz de lançar

luz sobre outras atividades que não a atividade mental patológica, a saber, sobre

qualquer questão investigativa do mundo interno.

Assinalo esta reflexão de Freud porque ela conduz, a meu ver, a um ponto

de intersecção fundamental nessas três patologias: as meninas anoréxicas, as

histéricas e as melancólicas, a quem Freud se refere, apresentam um imenso

componente de culpa e destrituvidade e tiveram sua investigação viabilizada por 10 Freud, Sigmund (1924 [1923]) Uma breve descrição da psicanálise, Op. cit., p. 247.

13

conta do estudo de Emmy, Anna Ó e Elizabeth Von R., a quem devemos a

compreensão atual do uso do corpo como fetiche (na anorexia e na bulimia),

encobrindo e renegando qualquer falta e, historicamente, serviram de ponto de

partida para as posteriores descobertas em psicanálise.

Penso que as meninas anoréxicas e bulímicas de hoje expressam sintomas

organizados em antigas patologias, ou seja, seus corpos revelam, de modo

original, singular e contemporâneo, enredos históricos de vidas comprometidas

com vínculos de intensa paixão, transmitidos transgeracionalmente.

Por que transgeracionalmente?

Porque nesses conflitos de mulheres, a relação fusional mãe-filha e suas

ascendências e heranças afetivas serão evocadas o tempo todo, constituindo-se,

a meu ver, no núcleo principal dos distúrbios alimentares.

Nesse sentido, o crescente interesse contemporâneo acerca dos

transtornos alimentares adquire utilidade de pesquisa, por provocar a abertura de

caminhos para novas descobertas sobre épocas arcaicas do psiquismo e, por

conseqüência, expandindo a compreensão das histórias mais primitivas de

relações de objeto.

O ASPECTO NUCLEAR DA ANOREXIA E DA BULIMIA: A

COMPLEXIDADE DA RELAÇÃO MÃE-FILHA

14

“Minha mãe não me larga, me chama o tempo todo...estou enjoada dela. Não

quero ser como ela. Ela pensa que é eu; eu já falei a ela: Mãe, seja você

mesma, você não é eu, eu não sou você!”11

“Escuto o dia todo: coma!coma!coma! parece que minha mãe quer

que eu entre em estado de coma!”12

Deparo-me com o clima de ameaça à vida, pois recebo a comunicação de

que trabalharemos em clima de U.T.I.13

A contradição entre o comer e o não-comer revela-se nos distúrbios de

metabolização do alimento: a hostilidade e o oposicionismo se denunciam na

recusa em ser alimentada e nos vômitos do veneno que alucina conter em si, o

deteriorado da experiência inominável, aquilo que ela, paciente, não pôde

metabolizar ou nomear.

Emagrece, “tentando fazer a mãe sumir de dentro dela.”

A figura da mãe parece ser a personagem central de suas vidas, de seus

sonhos, de suas histórias, e, finalmente, de suas paixões.

O relacionamento das filhas anoréxicas com suas mães, ambas sofridas e

assustadas, precisa de cuidados e de toda a nossa atenção e interesse, pois se

mostra revelador dos caminhos que conduzirão à compreensão da trama

instaurada entre elas.

Nesse momento, recorro a Melanie Klein que destaca a interação entre o

alimento e a mãe, o alimento e o bebê, enfim a interdependência poderosa desta

11 Fala explosiva de uma jovem bulímica de 14 anos, em análise. 12 Fala de Eliana, menina anoréxica de 12 anos, referida na Introdução. 13 Unidade de Terapia Intensiva de um hospital, para onde são encaminhados pacientes graves.

15

tríade que irá constituir o cenário tranqüilo ou turbulento da constituição do

psiquismo.

Diz ela:

“As relações do bebê com seu primeiro objeto, a mãe, e com o alimento

estão inseparavelmente ligadas desde o início(...)

A atitude inicial em relação ao alimento vai desde uma aparente ausência

de voracidade até uma grande avidez(...) a voracidade surge quando, na interação

entre impulsos libidinais e agressivos, esses últimos são reforçados. A voracidade

pode ser desde o início incrementada pela ansiedade persecutória. Por outro lado,

como assinalei, as primeiras inibições alimentares do bebê também podem ser

atribuídas à ansiedade persecutória. Isso significa que a ansiedade persecutória

em alguns casos aumenta a voracidade e em outros a inibe. Como a voracidade é

inerente aos primeiros desejos dirigidos ao seio, ela influencia vitalmente a relação

com a mãe e as relações de objeto em geral,”14

A análise visaria a restituição da capacidade do ego para a incorporação do

objeto bom (na anorexia, redundaria na volta da alimentação). O ego, movido

pelos sentimentos amorosos que mitigariam o ódio, ganharia força e coesão. A

clivagem entre os objetos idealizados e persecutórios diminui. A fantasia de que o

objeto amoroso pode ser preservado com segurança dentro do corpo aumenta as

possibilidades dos mecanismos de introjeção, pois o interior do psiquismo fica

mais aliviado da fantasia de ser percebido como um lugar perigoso e venenoso; o

ego se fortalece no momento em que é capaz de proteger e preservar os bons

14 Klein, Melanie (1952) Sobre a observação do comportamento dos bebês in Inveja e Gratidão e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1985, p.121.

16

objetos internalizados, das pulsões do id e dos objetos perseguidores maus. Os

aspectos fantasiosos dos objetos tomam o seu devido lugar.

Klein enfatiza a fundamental importância da capacidade de integração, para

que a saúde mental – termo usado por ela - se instale.15

Essa necessidade de integração se origina do sentimento de que partes do

self são desconhecidas e, portanto, há uma sensação de empobrecimento ou de

vazio.

Como o ódio necessita ser mitigado pelo amor, esta mitigação não poderá

se dar se estiverem separados ou em total oposição, como acontece nos

distúrbios alimentares, onde as relações de objeto estão em permanente regime

de objeto parcial. Além disso, como a integração implica em dor, há, novamente,

uma tendência à expulsão dessas partes ameaçadoras e perturbadoras dos

impulsos.

Em relação à violência bulímica, Melanie Klein contribui indiretamente para

esse tema, quando em sua obra faz alusão ao ataque derivado dos impulsos anais

e uretrais que implica em expelir substâncias perigosas (excrementos) para fora

do self e para dentro da mãe.

Segundo ela:

“Juntamente com esses excrementos danosos, expelidos com ódio, as

partes excindidas do ego são também, projetadas para dentro da mãe. Esses

excrementos e partes más do self destinam-se não só a ferir, mas também a

controlar e tomar posse do objeto.”16

15 Klein, Melanie (1960) Sobre a saúde mental, op. cit., p. 312. 16 Klein, Melanie (1946) Notas sobre alguns mecanismos esquizóides, op. cit., p. 27.

17

A mãe, assim identificada com as partes más do self já não é mais ela

mesma, e sim o self mau.

Aqui encontro respaldo para o entendimento que fiz a respeito das

vivências de fusão e de confusão de identidades da menina anoréxica e/ou

bulímica e suas mães e o conseqüente sentimento de rejeição da filha pela mãe,

que é vista como má, sádica, que a obriga a fazer o que menos quer e o que mais

teme: comer.

Um grande ódio é direcionado para a mãe que leva, segundo Klein, no

mesmo artigo, a uma forma peculiar de identificação, que estabelece o modelo de

uma relação de objeto agressiva. Este é mais um aspecto do mecanismo que

Klein chamou de identificação projetiva.

Marilyn Lawrence, psicanalista do grupo britânico, afinada com a leitura

kleiniana dos distúrbios alimentares, diz em recente artigo:

“Algumas pacientes anoréxicas, mais do que outras, estão preparadas para

passar fome a ponto de morrer. Penso que o grau de homicidade em direção ao

self e ao corpo reflete a extensão do propósito assassino com relação aos pais

internos e suas relações.”17

A partir da constatação de que há 10 mulheres anoréxicas para 1 homem,

Marilyn Lawrence continua em artigo posterior18 a apresentar suas considerações

sobre a feminilidade e a relaciona à hipótese de que as mulheres que

17 Lawrence. Marilyn (2001) Morrer de amor : a anoréxica e seus objetos in International Journal of Psychoanalysis, 32,London: Hogarth Press, 2001, p.11. 18 Lawrence, Marilyn (2001) Body, Mother, Mind – Anorexia, femininity and the intrusive object. International Journal of Psychoanalysis ,83, 2002, pp. 837-850.

18

desenvolveram anorexia foram, quando crianças, receptáculos de invasões ou

vítimas de violências físicas ou psíquicas.

A dinâmica do mundo interno que é observada denuncia a presença de um

objeto intrusivo instalado na mente dessas mulheres, que não tiveram,

necessariamente, antecedentes de experiências externas de intrusão.

A intensidade das fantasias de que algo perigoso e ameaçador se instalou

dentro de seu próprio corpo é diretamente proporcional às fantasias de ataque ao

corpo da mãe e quanto mais a menina nega a relação entre os pais, maior será a

intrusividade do objeto.

A menina usa a mãe como escudo protetor dessas fantasias, ao invés de

senti-la como continente e capaz de metabolizar seus medos e fantasias

agressivas.

As conseqüências psíquicas da falha da menina em internalizar o casal

parental conduzem a uma fusão da menina com a mãe. Identificada com as partes

faltantes da mãe fragilizada, a menina desenvolverá um vazio que tentará a todo

custo preencher em busca da completude ou de um engajamento e carecerá de

um desenvolvimento simbólico adequado.

Em Farrell19 (1995) e Linda Miller (1997)20, também psicanalistas do grupo

britânico, dão especial atenção à complexidade da relação mãe-filha na anorexia e

19 Farrell, Em (1995) Lost for words – The Psychoanalysis of anorexia and bulimia. London: Other Press, 1995. 20 Miller, Linda (1997) Mother – daughter and absent father: Oedipal issues in the therapy of an 11-year-old girl with an eating disorder, Journal of Child Psychotherapy, vol. 23, 1. London, 1997, pp. 81-102.

19

na bulimia reforçando a idéia de que a falha na internalização do triângulo edípico

resulta na falha em integrar a observação à experiência, o que dificulta a

separação da identidade da menina e da mãe.

Miller vê também as perturbações alimentares como defesas contra essa

fusão e uma tentativa de alcance da individuação, uma vez que outras defesas

fracassaram e manifesta a importância da inclusão da mãe num trabalho analítico.

FANTASMAS SEM LUGAR

Estamos num cenário penitencial, pleno de sentimentos de culpa e frente a

perturbações que se caracterizam pelo trânsito em áreas de fronteiras, como se o

fio de ligação entre o mundo neurótico e o psicótico ameaçasse constantemente

se romper.

Os investimentos narcísicos da mãe e da filha impedem a troca afetiva e

bloqueiam o reconhecimento do outro. Há no funcionamento anoréxico- bulímico

uma perversão do querer, um horror ao reconhecer a dependência do objeto e,

simultaneamente, um descaso a ele, ou, mais do que isto, um verdadeiro triunfo

sobre a comida, que beira a imortalidade.

Uma aura de morte é expressa nesses sintomas orais, que parecem

almejar um renascimento como fantasia. Mas não é o sofrimento ou o desprazer

20

que é almejado e sim não ser mais nada, atingir a pureza própria das

santas21, pois o corpo que não tem mais órgãos ou o eu que não tem mais corpo

torna-se imortal.

Sidonie, a paciente anoréxica de 17 anos, atendida por Maud Mannoni22,

apresenta grave risco de vida pelos danos físicos que o emagrecimento lhe

causou, chegando a ter os rins em colapso pela ingestão exagerada de vinagre,

limão e aspirinas, além do abuso de soníferos. É várias vezes internada, oscilando

entre o hospital geral e o hospital psiquiátrico. Diagnosticada como histérica e

também como psicótica, nem os médicos, nem seus pais acreditam em sua

recuperação. É vista como uma pessoa delirante e sem esperanças de “cura”.

Diz Sidonie a Mannoni em sessão de análise:

- Os alimentos...não é preciso que eu saiba como são, acarreta-me

remorso. Uma força me diz: “Tu não deves comer, uma desgraça te acontecerá.”

A obesidade é um crime que considero mortal. Minha mãe dizia: “Tu não deves

comer, se tu tocas em alguma coisa, será infeliz por toda a vida. Tu serás

mostrada nos parques de diversões. Tenho vozes que me habitam, desejo provar

ao mundo que posso agüentar até o extremo limite do início da morte. É preciso

que me deixem chegar até lá, fazer o que me der na telha. Nunca me deixaram

fazer esta experiência e tudo deve recomeçar em cada vez. Tenho de me livrar

das minhas vozes. É a primeira vez que falo a alguém do meu segredo.”

21 Pesquisando a vida das santas da Igreja Católica, encontrei sinais bastante indicativos de anorexias e bulimias, como em Santa Maria Egipcíaca, Santa Tereza D´Avila, Santa Catarina de Sienna, entre outras. 22 Mannoni, Maud Instituição Psiquiátrica e Psicanálise – II - Um caso de anorexia mental. In O psiquiatra, seu louco e a psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1971, p. 147.

21

Sidonie assim como tantas meninas anoréxicas e bulímicas que entram em

risco de vida, tem o desejo de morrer no seu corpo, a fim de que o seu ser

escape à morte. É exatamente desta compreensão que participo, quando

evidencio o fato de que o psiquismo destas meninas experimentou um grande

engano ao escolher um caminho de morte, para cumprir um objetivo que não é de

morte, mas de vida, de busca de vida, de renascimento de um ser que

genuinamente seja seu, nem que seja na fantasia ou na imortalidade

delirante; daí ter destacado, no início deste artigo, o tema da identidade, de

busca do eu, feminino e integrado, diferenciado das figuras parentais.

Se essas idéias estiverem presentes na mente do futuro analista, com

certeza as pacientes perceberão que ele não participa do conluio tácito de

condenação e desânimo que muitas vezes reina no clima familiar.

Concordo com Mannoni, quando ela assim interpreta os sintomas

anoréxicos:

“A anorexia, nesse contexto, não é uma doença, mas a única maneira de o

sujeito chegar a nascer como um sujeito desejoso, fora do desejo da mãe.”23

É como se a paciente se perguntasse: Para que viver, se viver representa

condenar seus desejos à morte?

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O corpo, o alimento, o aparelho ou somente o tubo digestivo passam a ser

a mente, que ocupa o lugar do corpo. 23 Mannoni, Maud Op. cit., p. 163.

22

A anorexia e a bulimia são formas de defesa que viram do avesso o ser que

as habita e são potentes e eficazes como mecanismos de subversão da ordem

natural de muitos órgãos do corpo, tanto dos sentidos como funcionais: a boca

que não mais come, os olhos que passam a comer, o corpo que não mais

consome os alimentos, mas que é consumido por ele próprio; a vagina que não

mais pode expelir o sangue menstrual, as fezes retidas e as fantasias de

engravidar pela boca, onde alimento e sêmen são misturados e confundidos na

fantasia.

A menina, afastada de sua própria subjetividade, delira e alucina inventando

padrões surreais de vida que mais parecem de morte. Repete os padrões por ela

criados e fica copiando a si mesma, numa roda viva sem perspectivas de saída,

como uma adicta, drogada de si, pois o fechamento à penetração do outro impede

a evolução e garante a eterna repetição compulsiva de auto-cópia daquilo que já

existe nela.

Perpetua-se no vácuo, sua mente trabalha no vazio, no nada, no etéreo da

sua fantasiosa experiência.

Talvez o encontro com uma mente - continente capaz de abrigar suas

contradições e duplicidades, suportando a presença da morte em vida... ao invés

de frustradas tentativas narcísicas de “cura” consiga buscá-la em suas fendas

glaciais, assim que ela for avistada emergindo de seu mundo subterrâneo.

Acompanhá-la no fio que a separa do abismo psicótico, trazendo-a de volta para a

luz do dia, do conhecimento de si, aquecida pelo calor de um acolhimento

pensante, sintonizado com suas necessidades afetivas, poderá restituir-lhe os

sentidos e os significados perdidos.

23

No reencontro do casal parental haverá o encontro de si mesma; quem

sabe achará as palavras...e as comidas.

Que os seus monstros e fantasmas transformem-se em personagens-

curadores internos, a partir de uma compreensão amorosa da vitalidade escondida

atrás de suas sombras...

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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24

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RESUMO

Neste artigo pretendi apresentar algumas reflexões nascidas de encontros

analíticos com meninas adolescentes anoréxicas e bulímicas, dirigindo-me à

compreensão psicanalítica do mundo objetal na anorexia e na bulimia, afinada

com o modo de pensar bion-kleiniano, que toma estas perturbações da

alimentação como sintomas orais, que contêm em si angústias ligadas a

momentos primitivos da constituição da psique, especialmente no que concerne a

rupturas precoces na relação com a figura materna internalizada.

Palavras-chave: anorexia, bulimia, alimentação, relação mãe-filha .

25

ABSTRACT

In this paper I intend to show some thoughts about psychoanalysis of

anorexic and bulimic teenager girls and their objectal world, fined with the bion-

kleinian point of view, which intents to understand these nourishment disturbs as

manifestations having origin in psychological suffering, oral symptoms of anxiety

bound to primitive stages of the mind development, specially as early ruptures with

an internalized maternal image.

Key-words: anorexia, bulimia, nourishment, mother-daughter relationship.

Marina Ramalho Miranda é Mestre e Doutora em Psicologia

Clínica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Psicanalista do

Instituto de Psicanálise da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo e

membro do Comitê de Adolescência da Associação Paulista de Medicina de São

Paulo (APM).