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rollingstone.com.br | Rolling Stone Brasil | 41 Outubro, 2011 O Maior Problema de Todos A corrupção faz parte da rotina da sociedade brasileira há mais de 500 anos. Será que um dia o país se permitirá extrair esse mal de suas entranhas? H Por Cristiano Bastos H Ilustração Lézio Júnior H S e há reis ladrões, é questão muito arriscada. Certo é que os há e que não furtam ninharias. Quando empolgam, são como as águias reais, que só em coi- sas vivas e grandes fazem presa.” Atribuída ao jesuíta Manuel da Costa (1601-1667), a obra A Arte de Furtar, de 1652, foi oferecida ao rei D. João IV e a D. Teodósio, o príncipe do Brasil. Seus manuscritos, como sugere o título, não ensinam a roubar. Denunciam, todavia, que a malversação de dinheiro público era prática comum no Brasil Colônia – a corrupção veio a bordo das caravelas e ancorou-se na história do país desde o Descobrimento. Em 1516, empossado capitão da Costa Brasileira, o lusitano Pero Capico foi enviado pela coroa portuguesa à novíssima terra com a missão de evitar desvio de direitos reais sobre o comércio de açúcar, pau-brasil e escravos. A passagem é emblemática. Capico desem- barcou pobre no Brasil e, dez anos depois, voltou rico a Portugal. Com muita ironia, o padre Antônio Vieira (1608-1697) também escreveu sobre os governantes coloniais: “Eles [ as autoridades ] chegam pobres nas Índias ricas e voltam ricos das Índias pobres”. Passaram mais de 500 anos de história, mas o quadro ainda é, praticamente, o daqueles tempos. Se não piorado. A despeito da estabilidade econômica e dos inegáveis avanços sociais conquistados pelo Bra- sil, a corrupção continua reinando firme no “país do caixa 2”. Em pouco mais de nove meses de mandato, a presidente Dilma Rousseff teve de nadar contra a corrente de indesejáveis crises políticas, em virtude de sucessivos escândalos motivados por denúncias de corrupção. Nessa gestação inicial, cinco ministros “bailaram”. Último a entrar na dança, Pedro Novais (PMDB-MA), do Turismo, foi derrubado na cha- mada “Operação Voucher” deflagrada pela Polícia Federal (que prendeu mais de 30 pessoas acusadas de desviar R$ 3 milhões, dentre elas o secretário- -executivo do Ministério, Frederico Silva da Costa). Novais sucumbiu após denúncias, entre outras, de que pagava empregados domésticos com dinheiro do Congresso Nacional. Sua bancarrota moral, porém, foram os R$ 2.156 que pediu de reembolso à Câmara dos Deputados para pagar a conta de um motel usu- fruído por ele em São Luís (MA).

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Um histórico da corrupção brasileira

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rollingstone.com.br | Rol l i ng St on e Br a si l | 41O u t u bro, 2011

O Maior Problema de TodosA corrupção faz parte da rotina da sociedade brasileira há mais de 500 anos.

Será que um dia o país se permitirá extrair esse mal de suas entranhas?

H Por Cristiano Bastos H Ilustração Lézio Júnior H

“Se há reis ladrões, é questão muito arriscada. Certo é que os há e que não furtam ninharias. Quando empolgam, são como as águias reais, que só em coi-

sas vivas e grandes fazem presa.”Atribuída ao jesuíta Manuel da Costa (1601-1667),

a obra A Arte de Furtar, de 1652, foi oferecida ao rei D. João IV e a D. Teodósio, o príncipe do Brasil. Seus manuscritos, como sugere o título, não ensinam a roubar. Denunciam, todavia, que a malversação de dinheiro público era prática comum no Brasil Colônia – a corrupção veio a bordo das caravelas e ancorou-se na história do país desde o Descobrimento. Em 1516, empossado capitão da Costa Brasileira, o lusitano Pero Capico foi enviado pela coroa portuguesa à

novíssima terra com a missão de evitar desvio de direitos reais sobre o comércio de açúcar, pau-brasil e escravos. A passagem é emblemática. Capico desem-barcou pobre no Brasil e, dez anos depois, voltou rico a Portugal. Com muita ironia, o padre Antônio Vieira (1608-1697) também escreveu sobre os governantes coloniais: “Eles [as autoridades] chegam pobres nas Índias ricas e voltam ricos das Índias pobres”.

Passaram mais de 500 anos de história, mas o quadro ainda é, praticamente, o daqueles tempos. Se não piorado. A despeito da estabilidade econômica e dos inegáveis avanços sociais conquistados pelo Bra-sil, a corrupção continua reinando firme no “país do caixa 2”. Em pouco mais de nove meses de mandato, a presidente Dilma Rousseff teve de nadar contra a

corrente de indesejáveis crises políticas, em virtude de sucessivos escândalos motivados por denúncias de corrupção. Nessa gestação inicial, cinco ministros “bailaram”. Último a entrar na dança, Pedro Novais (PMDB-MA), do Turismo, foi derrubado na cha-mada “Operação Voucher” deflagrada pela Polícia Federal (que prendeu mais de 30 pessoas acusadas de desviar R$ 3 milhões, dentre elas o secretário--executivo do Ministério, Frederico Silva da Costa). Novais sucumbiu após denúncias, entre outras, de que pagava empregados domésticos com dinheiro do Congresso Nacional. Sua bancarrota moral, porém, foram os R$ 2.156 que pediu de reembolso à Câmara dos Deputados para pagar a conta de um motel usu-fruído por ele em São Luís (MA).

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Caíram antes dele os ministros Wagner Rossi (PMDB-SP, da Agricultura), Antonio Palocci (PT-SP, Casa Civil), Alfredo Nascimento (PR-AM, Transpor-tes) e Nelson Jobim (PMDB-RS, Defesa). Importante observar que três deles pertencem ao principal partido da base aliada do governo, o PMDB. O único que não tombou pelos mesmos motivos foi Jobim, o qual, literal-mente, “morreu pela boca” após “declarações polêmicas”. A respeito do vendaval de escândalos que varreu a paz do primeiro ano de seu mandato, Dilma declarou que o real desafio de seu governo consiste em defender os interes-ses brasileiros – muito mais do que “solucionar as crises da Esplanada”. “Meu maior objetivo é desenvolver o país e distribuir renda. O resto eu faço por ‘ossos do ofício’. Prioridade são as condições de vida do povo. Faxina é contra miséria”, declarou a presidente.

Ossos do ofício à parte, o custo médio da corrup-ção no Brasil é altíssimo. Tão elevado que daria para resolver o problema da miséria de uma vez por todas. Segundo estudo realizado em 2010 pela Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), financeiramente, esse “preço” é estimado entre 1,38% e 2,3% do Produto In-terno Bruto (PIB) do país. Ou seja, de R$ 50,8 bilhões a R$ 84,5 bilhões. Com os R$ 50,8 bilhões (estimados em um cenário realista) se poderia, por exemplo, aumentar em 138,1% os quilômetros de rodovias brasileiras – as quais passariam, de acordo com a meta estabelecida no Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), de 45 mil para 107,9 mil quilômetros. O número de aeropor-tos, por sua vez, se elevaria de 20 para 327 unidades. Entretanto, a corrupção não é uma exclusividade brasileira. O Banco Mundial estima que US$ 1 trilhão seja tragado todos os anos pelos corruptos em escala planetária. Correspondente a 1,6% do PIB mundial em 2010 (US$ 63 trilhões), o valor supera em 43% o gasto dos Estados Unidos com armamentos (US$ 698 bilhões). Paradoxalmente à guerra, a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) estima que US$ 30 bilhões por ano são suficientes para acabar com a fome de quase 1 bilhão de pessoas ao redor do globo terrestre. Assim, uma “faxina mundial” em favor da moralidade poderia sumir com a miséria da face da Terra. A berrante diferença entre corrupção no Brasil e nos países mais sérios, contudo, é uma já velha e bastante conhecida: a impunidade.

Os custos da corrupção no brasil são muito maiores do que, meramente, o do dinheiro roubado em si. São perdas humanas, produtivas, sociais. Um im-

portante levantamento feito entre 2002 e 2008 pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) revelou que a cor-rupção subtraiu cerca de R$ 40 bilhões da vida dos brasileiros. Pelas contas, o país perdeu R$ 6 bilhões por ano nesse período. O valor é equivalente ao PIB da Bolívia. Durante seis meses, o economista Marcos Fernandes, que coordena o Centro de Estudos dos Processos de Decisão na FGV, cuja pesquisa é sobre os custos econômicos e políticos da corrupção, reu-niu dados de investigações realizadas pela Controla-doria-Geral da União (CGU), Polícia Federal (PF) e Tribunal de Contas da União (TCU). De acordo com o economista, o valor que se perde por deixar de se investir dinheiro público roubado – em termos de in-vestimentos não realizados em infraestrutura, saúde

pública e desenvolvimento – extrapola a cifra estima-da. Considerando-se, por exemplo, os atuais números do programa Bolsa Família, o uso eficaz de recursos desviados poderia assistir mais 23% de famílias ou aumentar o benefício em pelo menos 13%.

O estudo também concluiu que os mesmos R$ 40 bilhões ajudariam a diminuir – de 43% para 22% – o percentual de pessoas que ainda não são contempladas com saneamento básico no país. O efeito dessa melhoria seria um significativo impacto sobre a qualidade de vida medida pelo Índice de Expectativa de Vida Sau-dável (Healthy Life Expectancy), indicador criado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A corrupção, explica o economista, atinge, principalmente, políticas públicas cujo objetivo são melhorar a qualidade de vida da sociedade para as futuras gerações. “A corrupção oblitera a possibilidade que milhares de pessoas têm de serem felizes. Quando não se dá educação e saúde adequadas porque há roubo, se está privando o bem--estar de toda a população”, explica. “É um tiro no pé do próprio governo, que dá com uma mão e retira, de forma velada e sub-reptícia, com a outra.”

No jogo sujo da corrupção, economia e eleições ca-minham de mãos dadas, enamoradas. Há evidências práticas de que certas regras eleitorais, no entanto, contribuem para reforçar a fiscalização do comporta-mento político. Ao redor do mundo, pesquisas mostram que a aproximação do eleito em relação ao eleitor tende a minimizar atos corruptos. Isso ocorre, especialmente, no sistema eleitoral baseado no voto distrital puro (em que cada estado é dividido em distritos com número

fixo de eleitores: os partidos apresentam o candidato por distrito e quem receber mais votos fica com a vaga) ou no sistema de voto distrital misto ou proporcional (o qual prevê que metade dos candidatos seja eleita pelo voto majoritário e a outra metade pelo proporcional). A lógica é que, estando mais próximo dos seus eleitos, a tendência é que o eleitor venha, por meio do voto, a punir políticos implicados em escândalos. O voto proporcional, de acordo com o economista Fernandes, serve apenas para sustentar o mercado de “partidos picaretas”. “Criar partido é um grande negócio. É como Igreja, não paga imposto e, mais fácil ainda, nem preci-sa vencer eleição. Para o partidinho de quinta categoria é mais do que negócio, é um modo de vida.”

Com a intenção de apurar os recentes escândalos no governo federal, políticos de oposição estão movi-mentando forças para a instalação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI). Encabeçada por deputados e senadores, o movimento foi iniciado por parlamentares do PSDB, DEM, PSOL e PPS. Cinco deputados do PMDB também assinaram o requerimen-to de abertura da investigação. O deputado Eduardo Cunha (RJ), vice-líder do partido na Câmara, minimi-zou a adesão dos dissidentes: “São apenas cinco”, justifi-cou. Caso aprovada, a comissão se destinará a investigar desvios de recursos públicos, sobretudo nos ministérios dos Transportes, Agricultura e Turismo, envolvidos em denúncias de pagamento de propina e contratos com empresas de fachada. Para ser instalada, a CPI precisa do apoio de 171 deputados e 27 senadores. Caso aprova-da, o grupo, que será constituído por 17 senadores e 17 deputados, terá 180 dias de trabalho, prorrogáveis por mais 90, para o cumprimento do inquérito.

Segundo o senador Álvaro Dias (PSDB), que consi-dera a limpeza promovida pela presidente “puramente seletiva” e a reboque da imprensa, a expectativa é trans-formar a CPI em uma “fotografia do Parlamento”. “Des-taco sempre que, se tivéssemos índices de corrupção semelhantes aos da Dinamarca, nossa renda per capita seria 70% maior. São justificativas inquestionáveis que recomendam como prioridade o combate implacável à corrupção e à impunidade que a alimenta”, ele diz. O citado, como caso de impunidade, a lentidão do caso do mensalão do PT, que já ultrapassa cinco anos sem solução. O Senador afirma que a prática do mensalão, aliás, continua a existir. Exemplo disso seria o escândalo do Ministério dos Transportes, envolvido em superfatu-ramento de obras e pagamento de propina. “Discursos em plenário não bastam, é preciso ação”, exige. Para o deputado Duarte Nogueira, líder do PSDB na Câmara, as denúncias revelaram que há vários focos de corrup-ção no governo. “Estamos no nono mês de mandato, cinco ministros deixaram os cargos, quatro deles por suspeita de irregularidades. Isso é ruim para o país por-que o Executivo está paralisado, usando toda a energia para conter as crises políticas. É preciso estancar a crise e isso se faz investigando de forma profunda.”

Cândido Vacarezza, líder do PT na Câmara, coloca-se radicalmente contra a corrupção, porém, no caso da instalação de uma CPI, diz que antes deve haver “inves-tigação, direito de defesa para os acusados e julgamento e punição para os culpados”. O governo Dilma, segundo ele, não tem dado trégua para nenhuma atividade ilí-cita. “O que veio à tona do nosso governo foi levantado pelo próprio governo. Não foi suscitado por nenhuma

O PREÇO QUE (NÃO) PAGAMOSCom os estimados R$ 50,8 bilhões desperdiçados com a corrupção, o Brasil poderia bancar*:

24,5 milhões

de alunos das séries iniciais do ensino fundamental.

129 mil escolas das séries iniciais do ensino

fundamental, com capacidade para 600 alunos.

57,6 mil escolas para séries iniciais

do ensino fundamental, segundo o modelo CAQi.

160 milhões de cestas básicas.

209,9 milhões

de bolsas família em seu valor máximo (R$ 242).

918 mil casas populares.

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CPI”, diz. Todos os ministros ou funcionários públicos que tiveram acusações, Vacarezza completa, foram levados a depor na Câmara. “Infelizmente, a oposição não tem colaborado. Nenhuma inquirição que fez até agora é consistente. Se o cidadão diz que sabe e não fala, ele é leniente. Mas se fica só criando fato, sem saber, está sendo irresponsável. Para se ter uma CPI é preciso existir um fato determinado e o número de assinaturas suficiente, não é uma discussão genérica.”

Governista, o senador Pedro Simon (PMDB-RS), um dos criadores da Frente Parlamentar contra a Corrupção e pela Governabilidade, defende que é preciso dar um “voto de confiança” à Dilma Rousseff. “Se quiserem fazer CPI, podem fazer. Só penso que nosso trabalho deve ter outro objetivo, considerando que a presidenta está tomando providên-cias, como mostrou ao demitir pes-soas que foram acusadas.” Simon diz que Dilma vem sofrendo pressões em razão das providências por ela ado-tadas no combate à corrupção. Nos bastidores, foi, inclusive, de acordo com Simon, cogitado o afastamento da presidente. “Os próprios partidos do governo, PT e PMDB, a pressio-naram para que não fizesse essa caminhada na direção de ‘moralizar a coisa’. Esse movimento que iniciei com a frente é, justamente, para lhe dar força. Dilma mostrou que teve coragem de por na rua”, elogia. Si-mon, para o qual apoio não significa

anulação de oposição, recusou-se a assinar o reque-rimento da CPI. Ele admite, no entanto, a gravidade da situação: “O Brasil nunca chegou tão baixo. O país vai bem, mas as instituições, eticamente, não vão”. O senador acredita, contudo, que há momento certo para tudo. “Houve para a estabilidade, para o combate à mi-séria e, agora, chegou a vez de acabar com a corrupção.”

Voto secreto, um dia comentou o ex--presidente Tancredo Neves, “dá uma vontade danada de trair”. Com irreto-cável perfeição, a frase ilustra bem o

que foi a absolvição da deputada federal Jaqueline Roriz (PMN-DF), a qual em agosto livrou-se da acu-sação de quebra de decoro parlamentar – ainda que tenha sido flagrada em um vídeo comprometedor, divulgado em março, recebendo dinheiro de Durval Barbosa, delator do chamado “mensalão do DEM” no Distrito Federal. Os deputados que defenderam a cassação alegaram que o voto secreto foi o princi-pal fator que levou a deputada à anistia. Há anos, o

deputado Ivan Valente (PSOL-SP) apresentou um requerimento no qual cobra a inclusão da Propos-ta de Emenda à Constituição (PEC) 349/2001, que institui o voto aberto no Legislativo. A iniciativa já conta com adesão de 191 deputados e foi apelida-da de “Lei Jaqueline”. Votada em primeiro turno na Câmara, em 2006, desde então a PEC enfrenta resistência para ser aprovada em segundo turno. “O voto secreto é uma vergonha neste Parlamento”, brada Valente, que diz que o caso Jaqueline Roriz é um emblemático modelo de impunidade. “Há pro-

vas robustas e muito contundentes e, assim mesmo, ela [Jaqueline] foi absolvida. Em nome da trans-parência e da ética, os deputados têm obrigação de expor seu voto e assumi-lo publicamente, e não se esconderem atrás das cortinas do voto secreto.”

A meta agora é pressionar o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), para incluir a PEC na ordem do dia. Cândido Vacarezza é explicitamente contra o voto aberto, o qual ele compara a “práticas totalitaristas”. “O voto aberto existia na ditadura no Brasil, no regime de Hitler, na Rússia de Stalin. Nos Estados Unidos, que é a mais antiga democracia, existe até sessão secreta”, compara o líder do PT. Para Vacarezza, o voto aberto “desbalança o voto de consciência”. “Como se vota, por exemplo, o veto de um presidente aber-tamente? A experiência do voto aberto, que parece ter um ‘jeito democrático’, é experiência própria das ditaduras e do ‘poder do rei’. O voto secreto, sim, é o voto da democracia, que a pessoa usa conforme sua consciência e não por pressão dos mais poderosos. Se a pressão fosse igual na sociedade, se todos tivessem o

mesmo peso, o certo seria o voto aberto.” Já o senador Paulo Paim (PT-RS) roga, pelo contrário, que o Legis-lativo acabe com o voto secreto. Segundo ele, a luta contra a corrupção começa mostrando à população como se posicionam os deputados e senadores em suas votações. “Se não temos o que temer, não há motivo para não expressar no painel, de forma transparente, nossas posições”, diz.

Para o cientista político Ricardo Caldas, que dirige na Universidade de Brasília o Núcleo de Estudos da Corrupção, muitos candidatos a cargos políticos es-

tão completamente comprometidos antes mesmo das eleições. Tudo já começa com o oneroso financiamen-to de campanha, quando “começam os esquemas”, diz. “Ele [o político] vai cumprir seu mandato não muito preocupado com realizações, mas em como viabilizará sua reeleição.” Quanto à limpeza bancada por Dil-ma no alto escalão do governo, Cal-das pondera que, caso aprofunde tal postura – por mais positiva que seja –, a presidente corre riscos de perder importante parte da base de sustentação de seu governo no Con-gresso Nacional. A razão seriam os partidos da própria base aliada, os quais estão escancaradamente liga-dos aos últimos escândalos. “Se ela travar um combate muito rigoroso contra essas forças, estará comba-tendo seus próprios aliados, o que, em linguagem militar, é o chamado

‘fogo amigo’. E quem vai para a fogueira, na verdade, é sua sustentação política no Congresso”, diz Caldas. A absolvição de Jaqueline Roriz, ele interpreta, foi um recado claro de que Dilma pode estar mandando no Executivo, mas de que no Legislativo ela não apita. “Os políticos são inimigos em vários assuntos, mas se unem na hora de serem cassados. Existe entre eles o consenso de que, ao menos no Congresso, a corrupção não deve ser combatida.”

Embora o Brasil seja o país que, ao lado dos Estados Unidos, preside a parceria internacional Governo Aberto – lançada em setembro, comprometida com a “transparência total das contas públicas” –, a batalha contra a corrupção no Brasil atualmente se encontra em plano secundário. A crítica é feita pela Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF). De acordo com a entidade, entre os 11 macrodesafios traçados no Plano Plurianual (2012-2015), o comba-te ao desvio de recursos públicos não passa de um vago apêndice, sendo citado de passagem em três referências relacionadas à “Segurança Pública com

O problema da corrupção não é uma exclusividade brasileira. O Banco Mundial estima que US$ 1 trilhão seja tragado todos os anos pelos corruptos em escala planetária. A berrante diferença entre a corrupção no Brasil e nos países mais

sérios, contudo, é uma já velha e bastante conhecida: a impunidadeH

A DANÇA DOS MINISTROS 1. Wagner Rossi, da Agricultura; 2. Alfredo Nascimento; Transportes. 3. Pedro Novais, Turismo; 4. Antonio Palocci, Casa Civil

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Pero Borges (1549)

Nomeado primeiro “ministro da Justiça” do Brasil, o português Pero Borges desembarcou na Bahia em 1549, na comitiva do primeiro governador-geral da colônia, Tomé de Sousa. Antes de vir para o novo país, Borges estava envolvido em denúncias de superfaturamento relativos a uma obra em Portugal. A investigação apurou o desvio de 114.064 réis. No governo seguinte, de Duarte da Costa, Borges ainda acumulou o cargo de provedor-mor da Fazenda, equivalente, hoje, ao de ministro da Economia.

Projeto Jari (1967)

Combater a corrupção e derrotar o comunismo: eram essas as bandeiras do regime militar que se instalou em março de 1964. Não houve, porém, repressão que imtimidasse a corrupção. O caso mais famoso foi o Projeto Jari, administrado pelo norte-americano Daniel Ludwig, que incluía o reflorestamento, a produção de celulose e papel e a exploração mineral. Quase isento de impostos, o Jari acumulou enorme dívida externa – de US$ 526 milhões – com o aval do próprio governo brasileiro.

Caso Lutfalla (1974)

Aconteceu em 1974, durante o governo Ernesto Geisel, quando o Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDE, hoje BNDES) concedeu milhões a uma empresa têxtil de propriedade da família da esposa do então governador de São Paulo, Paulo Maluf, que acabou denunciado por irregularidades na concessão de empréstimos por parte do Estado para a empresa, que estava em falência. O caso ficou conhecido como “Lutfalla”, nome da empresa beneficiada e sobrenome da família que a regia.

Collor /PC Farias (1992)

A revelação do Esquema PC Farias foi a principal causa que gerou o impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Melo, em 1992. A falcatrua política, denunciada por Pedro, irmão caçula de Collor, desviou dinheiro público e envolveu várias formas de corrupção. O esquema foi montado pelo empresário Paulo César Farias, ex-tesoureiro da campanha de Collor à Presidência, para desviar verbas e arrecadar propinas. Collor saiu absolvido da acusação de corrupção passiva por falta de provas no STF.

Anões do Orçamento (1993)

No início dos anos 90, os congressistas brasileiros chamados “Anões do Orçamento” envolveram-se em fraudes com recursos do Orçamento da União até serem descobertos e investigados por uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) de grande repercussão. A denominação de “anões” era uma alusão à coincidência de serem os principais envolvidos homens de baixa estatura física. Apesar do tamanho, os baixinhos surrupiaram mais de R$ 100 milhões em recursos públicos.

EScâNdAlOS NA cORtE

Cidadania” e “Democracia e Aperfeiçoamento da Gestão Pública”. Nas palavras de Bolivar Steinmetz, presidente em exercício da ADPF, a atuação da Polícia Federal não é percebida com a devida importância no enfrentamento à corrupção. O Plano Plurianual destaca as ações da PF apenas no âmbito da Política Nacional de Defesa e, quase exclusivamente, no com-bate ao tráfico de drogas, armas e pessoas, sobretudo, nas fronteiras. “Para a Polícia Federal, a guerra aos traficantes é imprescindível. Mas, também mere-cedoras de atenção, são as ações contra corruptos e corruptores. Nossas operações têm revelado que a concentração das fraudes e dos desvios de recursos públicos está nas áreas de saúde, educação e infraes-trutura”, expõe Bolivar.

No entendimento do frade dominicano e escritor Frei Betto, um dos fundadores do PT e da Central Única dos Trabalhadores (CUT), a corrupção é um pecado religioso e um crime do ponto de vista legal. “É roubar, na verdade, o dinheiro que pertence ao povo”, ele afirma, valorizando o trabalho que Dilma Rousseff vem desempenhando – “Nota dez”, diz. Betto reforça que é preciso aprofundar a faxina ins-titucionalmente, uma vez que não se pode esperar, de qualquer pessoa, um comportamento ético exemplar. São as instituições que precisariam se tornar capazes de coibir a tentação de corromper ou ser corrompido. “Eu não acredito em ética na política. Acredito é na ética ‘da política’. Temos de criar uma institucionali-dade na qual o indivíduo tentado a corromper ou ser corrompido iniba-se devido às sanções que ocorrerão, caso transgrida. Definitivamente, não é o que aconte-ce no Brasil”, completa. Um dos efeitos da indignação

popular, demonstrada em mobilizações contra a corrupção ocorridas em várias cidades brasileiras, no dia 7 de setembro, pode ser a renovação do debate a respeito de uma série de propostas que permanecem adormecidas no Congresso – dentre as quais, além do voto aberto e do financiamento público de campanha, a tão esperada reforma política.

Apesar de pessimista em relação ao atual Congres-so, onde “raros deputados inspiram confiança”, Frei Betto olha a reforma política como uma poderosa arma para se lutar contra a impunidade. “A maioria dos congressistas negocia sua estabilidade no poder em troca de maracutaias. Seria necessário, portanto, convocar um congresso específico para realizar a re-forma política”, ele afirma. No entanto, Betto deposita esperanças nas mobilizações populares não partidá-rias que despontaram após os recentes escândalos. “Creio ser [a mobilização] um caminho para que a sociedade venha a pressionar o governo a criar meca-nismos institucionais de inibição e punição.” Embora concorridas, as marchas anticorrupção estão longe de serem fenômenos de engajamento, vide as marchas gays ou “da família”, que levaram de 3 a 4 milhões de pessoas às ruas. Em Brasília, no Dia da Independên-cia, o principal protesto tirou 40 mil pessoas de casa. Ainda temos muito a marchar.

Em tramitação no senado federal e na Câmara dos Deputados, algumas pro-postas defendem o caráter punitivo que deve ser aplicado aos corruptos. Uma delas

é o Projeto de Lei do Senado (PLS 204/11), de autoria do senador Pedro Taques (PDT-MT), que inclui a cor-

rupção na Lei de Crimes Hediondos (atualmente, en-tende-se por hediondo crimes como sequestro, latro-cínio, estupro e genocídio). O PL propõe que, no caso de crime de corrupção, a pena mínima passe de dois para quatro anos. A aceitação pública, por sinal, foi ótima. Em enquete promovida pela Agência Senado e pelo Data Senado, em agosto, 99,4% dos votos, num universo de 426.618, foram favoráveis à proposta do pedetista. “A sociedade brasileira chegou ao limite de sua paciência. A corrupção no Brasil mata, literal-mente, não metaforicamente. Ela mata nas estradas que temos hoje, de péssima qualidade, e nas portas dos hospitais. A corrupção rouba o futuro das crian-ças por causa da péssima qualidade da educação”, diz Taques. Outro ponto que precisaria ser repensado é o benefício da imunidade parlamentar. “A impunida-de que se permite por causa da imunidade faz com que tenhamos uma grande sensação de insegurança. Precisamos de mudanças urgentes no código penal.”

Na concepção de Cláudio Weber Abramo, diretor--executivo da ONG Transparência Brasil, um dos mo-tes cruciais para o combate à corrupção seria a drástica diminuição dos cargos de confiança no poder público. “Só o presidente da República pode nomear 20 mil cargos, diferentemente dos Estados Unidos, que tem 100 milhões de habitantes a mais e o presidente só pode dispor de 5 mil cargos de confiança. Na França, são apenas 400 cargos”, compara Abramo. Explicitamen-te, a Constituição brasileira permite que indivíduos situados altamente na hierarquia dos três poderes (em particular no Executivo, que tem mais dinheiro) nomeiem pessoas para ocupar tais postos. É, na rea-lidade, um grande jogo de interesses e “loteamentos”.

Relembre os casos de corrupção mais notórios, absurdos e desavergonhados da história do Brasil

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Precatórios (1997)

Prefeito de São Paulo entre 1997 e 2000, após ter ocupado o cargo de secretário de Finanças na gestão de Paulo Maluf, Celso Pitta assumiu o cargo sob suspeitas de desvio de recursos públicos. Sua situação piorou quando sua ex-mulher, Nicéia, o acusou de corrupção na administração e compra de vereadores. Na ocasião, Pitta foi apontado como integrante do “escândalo dos precatórios”. Segundo denúncias, o valor dos desvios alcançou R$ 3,8 bilhões, o equivalente a quase metade do orçamento da cidade.

Mensalão (2005)

Também conhecido como “esquema de compra de votos de parlamentares”, foi a crise de maior repercussão do primeiro mandato do governo Luiz Inácio Lula da Silva e do PT. A palavra “mensalão” foi cunhada pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ), que revelou o funcionamento do esquema. Ele afirmou que o tesoureiro do PT, Delúbio Soares, pagava uma mensalidade de R$ 30 mil a alguns deputados do Congresso para que votassem seguindo orientações do bloco governista.

Sanguessugas (2006)

O escândalo dos “Sanguessugas”, também conhecido como “máfia das ambulâncias”, estourou em 2006 após desmascaramento de uma quadrilha que agia desviando dinheiro para a compra de ambulâncias. O caso daria origem, no mesmo ano, ao “Escândalo do Dossiê”, no qual integrantes do PT foram presos em flagrante pela Polícia Federal comprando, com R$ 2 milhões em dinheiro vivo, um dossiê que revelaria a suposta participação de políticos do PSDB no esquema – entre eles, José Serra e Geraldo Alckmin.

Operação Anaconda (2003)

A operação intitulada “Anaconda” (referência ao outro nome pelo qual é conhecida a cobra sucuri) resultou de uma investigação da Polícia Federal que durou mais de um ano. A investigação descobriu, por meio de escutas telefônicas, indícios de extorsão e venda de sentenças judiciais envolvendo juízes e policiais federais. João Carlos da Rocha Mattos, ex-juiz federal acusado de ser o mentor do esquema, perdeu cargo, bens e foi condenado (atualmente cumpre prisão domiciliar).

Mensalão do DEM (2010)

“Escândalo do Mensalão dos Democratas de Brasília” é o nome do esquema revelado, em novembro de 2009, pela Polícia Federal por meio da Operação Caixa de Pandora, baseada em depoimentos e comprometedores vídeos gravados por Durval Barbosa, delator do esquema. Em fevereiro de 2010, José Roberto Arruda, o ex-governador do DF, foi preso preventivamente pelo temor de que pudesse obstruir as investigações. O pedido foi feito após a tentativa de suborno do jornalista Edson Sombra.

“O que fazem o presidente, o governador, os pre-feitos? Eles chamam certa quantidade de partidos e dizem: ‘Me apoiem, não me fiscalizem, aprovem o que eu quiser e, em troca, fiquem com esses lotes da admi-nistração. Não são cargos para satisfazer as necessida-des da comunidade, mas para satisfazer as necessidades dos partidos e dos políticos. É uma usina de corrupção”, prossegue Abramo, que afirma que a transação de car-gos de confiança destrói a eficiência da máquina públi-ca. No quesito “precaução”, outro fator a se considerar seria a extinção das chamadas “emendas parlamentares individuais”, tidas como favorecedoras fontes de ladroagem. Segundo o senador Taques, após a promulgação da Consti-tuição de 1988, todos os grandes escândalos estão relacionados a emendas parlamentares indivi-duais, dentre os quais, “anões do orçamento, sanguessugas, mensaleiros e as grandes operações da PF”, enumera.

Nascida da mais legítima iniciativa popular, a Lei da Ficha Limpa, que juntou mais de 1,6 milhão de assina-turas em favor da moralização dos costumes políticos no Brasil, enfrenta sério risco de não mais valer nas eleições municipais de 2012, tampouco nas posteriores. Criada com a finalidade de impedir que candidatos condenados pela Justiça concorram à eleições públicas e transformada na Lei Complementar nº 135, a medida foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2010. Reconhecida internacionalmente, foi

escolhida pela ONU como “a mais importante iniciati-va de combate à corrupção”. Em sua última passagem pelo Brasil, Bono, vocalista do U2 e presidente da One Foundation, afirmou que a Ficha Limpa é “um processo que inspira até ele próprio”. Contudo, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) não estão tão “inspira-dos” quanto à permanência da norma – invalidada pelo próprio Supremo nas eleições de 2010 –, cuja constitu-cionalidade será decidida neste mês de outubro.

Com a aposentadoria da ministra Ellen Gracie, que é pessoalmente favorável à lei, a Ficha Limpa poderá

vir a perder um precioso voto. O juiz de direito Marlón Reis, do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), lembra que a Ficha Limpa é uma conquista democrática que, para ser aprovada, seguiu os cami-nhos previstos na Constituição – a qual, ele sublinha, dá poder ao povo para apresentar projetos de lei de iniciativa popular. O atual esforço do movimento é para reunir assinaturas em um documento que será entregue à presidência, exigindo que a Lei da Ficha Limpa seja levada em consideração em todas as decisões governa-mentais – inclusive na escolha do próximo ministro do Supremo. “Tem uma vaga em aberto no STF e a pessoa

que será nomeada terá, muito provavelmente, voto deci-sivo para a consagração da Ficha Limpa. É essencial que Dilma escolha alguém que tenha foco compromissado no combate à corrupção”, diz Reis. “Há grande número de políticos condenados criminalmente, poderosos e influentes, de olho nas eleições municipais de 2012. A manutenção da Ficha Limpa, que tem poder para detê--los, é um desafio à sociedade brasileira.”

Renato Janine Ribeiro, professor de Ética e Filoso-fia Política da Universidade de São Paulo (USP), define a corrupção como “o verdadeiro inimigo republicano”.

Na Roma antiga, ele ob-serva, foi ela que matou a República – o “gover-no para o bem comum” –, que, no Brasil, vigora desde 15 de novembro de 1889. Ribeiro classifica a corrupção atual de “pós--moderna”, aquela ocor-rida na troca de favores,

de cargos, favorecimentos e negociações internas: “É a noção de que ‘um favor paga outro’”, explica. Quando se opta pelo regime republicano, sublinha o filósofo, existe a fundamental obrigação da honestidade – não só dos políticos, mas de toda a sociedade. Pensar o mau político como corrupto e, portanto, como ladrão, simplifica demais as coisas. É sinal de que não se en-tende o que é a vida em sociedade. Ao desviar dinheiro público, o corrupto não apenas furta: ele elimina a confiança de um no outro, que talvez seja o maior dos bens públicos. “A confiança é um elo social”, ele diz, “e sem elo social não há vida republicana”.

Para especialistas, certas medidas ajudariam a reduzir sensivelmente a corrupção: transformá-la em crime hediondo; eliminar a imunidade parlamentar;

e diminuir cargos de confiança no poder públicoH

Relembre os casos de corrupção mais notórios, absurdos e desavergonhados da história do Brasil