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09 | Dezembro | 2014 - Se Na linha da frente da informação, para que se mantenha sempre informado com rigor e isenção - Nº 5 - Ano 1 | terça-feira 09 de Dezembro de 2014 AS CAIXAS DE SOCORROS pág 03 O ATENTADO de JAMES MASON “Quadrilha de Banditti da Aldeia de Corte do Pinto Lince volta a Mértola Programa de reintrodução do Lince Ibéricoem Portugal en- tra em fase decisiva, com dois animais soltos numa grande área cercada, onde permanecerão durante algumas semanas. pág 8 pág 12/13

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09 | Dezembro | 2014 1

- SeNa linha da frente da informação, para que se mantenha sempre informado com rigor e isenção - Nº 5 - Ano 1 | terça-feira 09 de Dezembro de 2014

AS CAIXAS DE SOCORROS pág 03

O ATENTADO de JAMES MASON“Quadrilha de Banditti da Aldeia de Corte do Pinto

Lince volta a MértolaPrograma de reintrodução do Lince Ibéricoem Portugal en-tra em fase decisiva, com dois animais soltos numa grande área cercada, onde permanecerão durante algumas semanas.

pág 8

pág 12/13

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editorial

Câmara de Mértola é a menos “transparente” do distrito

O cante alentejano, um canto colec-tivo sem recurso a instrumentos e que incorpora música e poesia,

foi classificado como Património Cultural Imaterial da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco).

"Para nós é o expoente máximo do canto alentejano, estamos com uma alegria do ta-manho do mundo", conta Carlos Paraíba, um dos elementos do grupo Coral e Etnográfico da Casa do Povo de Serpa, que viajou de autocarro para Paris para assistir à reunião da Unesco.

Após a inscrição do fado, em 2011, e da dieta mediterrânica, em 2013, na lista repre-sentativa do património cultural imaterial da humanidade, este é o terceiro elemento portu-guês ali inscrito, facto que nos deve encher a todos de orgulho.

O presidente do Turismo do Alentejo destaca o "reconhecimento único" num "dia de fortes emoções, depois de um percurso de quatro anos

que valeu mesmo a pena".

"Portugal e os alentejanos têm de estar muito orgulhosos por esta classificação que terá cer-tamente repercussões ao nível turístico", lembra António Ceia da Silva.

É importante agora separar as águas, a rebo-que desta elevação de certo irão aparecer muitos grupos que de certo vão tentar aproveitar esta árvore das patacas.

Nunca devemos esquecer que o Cante é expon-tâneo nasce do nada, muitas vezes de uma reunião de amigos, ou à volta de um petisco encostados ao balcão de uma qualquer tasca. O Cante não tem casa, o Cante tem muitas casas, sempre se espa-lhou de norte a sul de Portugal através das vozes dos seus intervenientes, nas ruas, em teatros, nas tabernas, em suma onde menos se espera.

Esperemos que a partir de agora o Cante con-tinue vivo como sempre na garganta de todos os que o sentem como seu.

Parabéns a todos os que sentem o Cante na alma.

A Câmara de Beja segundo o Indice de Transparência Municipal (ITM) é a autarquia com melhor classificação.

Apesar de ter piorado o seu desempenho continua a se a que na região apresenta melhor classificação.

A Câmara Municipal de Mértola é considerada segundo este mesmo estudo a menos transparente classificando-se no último lugar o 14º.

Comparativamente com o último ano de 2013, e se considerarmos a classificação dos 308 municípios do país, somente cinco municípios do distrito de Beja asseguram uma evolução positiva, melhorando o

seu lugar nes te rank ing : Almodôvar, Alvito, Serpa, Ferreira do Alentejo e Cuba. Refira-se que o ITM, é liderado pela Câmara de Alfândega da Fé, afere o grau de transparência de cada câmara municipal em função de um trabalho de análise do seu site na Internet. Nessa análise são considerados o volume e a informação prestada aos munícipes sobre a estrutura da autarquia, o seu funcionamento e actos de gestão, entre outros tópicos. Segundo uma fonte da Associação Cívica Transparência e Integridade, “áreas de elevado risco de corrupção, como a contratação pública e o urbanismo, suscitam uma particular atenção dos autores” do índice agora divulgado.

Cante Património Imaterial da Humanidade

Foto: António Peleja

Um mês cheio de emoções fortes, ou talvez não, foram casos e mais casos, a Legionela, o Orçamento de Estado o Sócrates que abafou tudo e todos, só sendo superado pelos tablóides desportivos, o Benfica que já não vai à Champions, o Bruno de Carvalho que anda calado, enfim tanta coisa e tão pouco.

Estudos e mais estudos e todos apontam no mesmo sentido, a CMM pouco tem a perder, pois tudo está já perdido, perdeu o senso comum quando começou a expulsar pessoas da sua página (sua? nossa, pois é de todos os contribuintes), perdeu quando abateu vários eucaliptos na zona de Protecção da Tapada Grande, e perdeu quando é considerada a autarquia menos transparente do distrito de Beja, menos transparente e segundo outro estudo, este da Controlinveste, baseado em dados da Pordata e do INE, com sinal vermelho no que respeita à maioria dos temas abordados, entre eles, (Bancos e Serviços, Cultura e Entretenimento, Lojas e Restaurantes).

Como está noticiado na página 8 deste jornal vão ser libertados Linces em Mértola, esperemos que a autarquia esteja à altura de um projecto desta envergadura, uma autarquia que tem demonstrado sucessivamente falta de objectivos ambientais bem estruturados, senão veja-se o sistemático corte de eucaliptos a seu mando, ou ainda a sistemática falta de cumprimento de leis impostas e publicadas em Diário da República, que visam a defesa do ambiente.

Esperemos pois que estejam à altura de honrar os compromissos que assumem de forma honesta e sem atirar as culpas a terceiros, já vi muitos comentários nas redes sociais que apontam que estas espécies serão abatidas rapidamente, é uma zona de caça “Capital da Caça” da qual a Câmara Municipal tanto se orgulha, esperemos que os caçadores tenham um espiríto aberto e compreendam que os animais têm a sua própria cadeia alimentar e que se ela não for interrompida (geralmente pela mão do homem) as várias espécies podem co-existir, o aparecimento de uma não quer dizer o desaparecimento de uma outra, mas sim o equilíbrio nas espécies um equilíbrio natural.

Para que estes projectos tenham seguimento é necessário um grande envolvimento de toda a população residente, existe a necessidade da autarquia promover colóquios e sessões de esclarecimento para que todos saibam lidar com o assunto, é preciso sensibilizar, os caçadores, os agricultores a população em geral, espermeos pois o desenvolvimento do projecto, e espero dentro de alguns anos poder ver Linces na Serra de São Domingos. Abraço a todos e até ao próximo “O Gasómetro”.

Novos TEMPOS

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A exploração mineira – industrial de S. Domingos determinou em todo o seu vasto território de influência, formas

muito peculiares relativamente à Questão Social, com particular destaque para as denominadas Caixas de Socorros.

Em primeiro lugar, deve-se ter em conta que apesar de estas estruturas de apoio social terem tido uma maior expressão na localidade de Mina de S. Domingos, o que se compreende pelo facto de ter sido esta a localidade com maior número de habitantes desse mesmo território, e até do Concelho de Mértola, importa referir que foram constituídas Caixas de Socorros em praticamente todos os povoados da margem esquerda, já que quase todos eles foram marcadas por um modo de vida operário e industrial, propício ao surgimento deste tipo de organizações, de molde a fazer frente a alguns dos riscos sociais mais sentidos, nomeadamente os associados à perda do rendimento do trabalho.

No que a este ponto concreto diz respeito, o do território mineiro, pode-se afirmar que a “mina”, enquanto estrutura social muito particular, se fez sentir, e nalguns casos ainda faz, desde Corte Pinto a norte, até Mesquita, a sul. Este último lugar, da Freguesia de Espirito Santo e já na margem direita do Guadiana, estava ligado à mina pelo atividade do porto fluvial do Pomarão.

De todas as localidades, aquelas que de algum modo tinham uma ligação menos intensa com a exploração mineira, foram Corte Sines e Vale do Poço. Isso deve-se em primeiro lugar à distância física das zonas de mineração e transformação, mas também ao facto de só após os anos vinte do século passado, a “Serra de Mértola” ter sido retalhada em glebas e entregues às famílias da margem esquerda do Concelho, e só a partir de então se ter constituído este último aglomerado, em torno da “fábrica” de moagem. Assim, e se numa primeira fase esses camponeses eram oriundos das freguesias de Corte Pinto, Santana de Cambas e Mértola, numa segunda, foi gente proveniente da Serra do Algarve, sobretudo dos Concelhos de Alcoutim e Tavira, e que por vezes, eram em simultâneo mineiros, mas que apesar de tudo, mantiveram formas de vida da cultura mediterrânica, assente nas culturas cerealíferas de sequeiro e na criação de gado.

Assim se justifica, e ao contrário do que sucedeu em toda a margem esquerda, que em Vale do Poço nunca tenha surgido qualquer estrutura de apoio social, e em Corte Sines, isso só tenha acontecido já em pleno Estado Novo (1940), enquanto nas outras localidades, as Caixas de Socorros tenham

Notas para a estudo do território mineiro de S. Domingos

As Caixas de Socorrossido criadas no final do Séc. XIX, e sobretudo durante o primeiro quartel do séc. XX.

As referidas Caixas, eram nem mais nem menos do que estruturas de apoio social, de natureza previdencial e mu tua l , i s t o é , procuravam, de uma forma antecipada, e compartilhada entre os seus associados, gerir mecanismos de apoio à privação material (mas não só), decorrente de riscos como os acidentes de trabalho, a doença ou a invalidez. Numa segunda fase, sobretudo n o p e r í o d o p ó s -primeira República, tiveram um importante papel no domínio do apoio às esposas e filhos dos operários detidos por motivos politico-sindicais, mas também no combate ao analfabetismo, e mais tarde, a partir da década de trinta, no apoio a algumas despesas em torno dos rituais da morte, como o funeral ou o luto, tendo então surgido as Sociedades

eles eram de influência operária. Assim aconteceu em Fernandes, Corvos, Moreanes, Alves, Bens, Pomarão e Mesquita.

A partir dos anos trinta, sobretudo com o desmembramento do sindicato mineiro e da greve de 1932, surgiram os denominados Grupos (também conhecidos por Montepios, Mútuas ou Caixas), organizações informais, que localidade a localidade, agrupavam os mineiros e com as suas Caixas, faziam frente aos impactos de uma pobreza avassaladora. Assim aconteceu em Mina de S. Domingos (onde há registo de dois desses Grupos, um deles que agrupava mineiros residentes na Zona do Bairro Alto e Violeta), Montes Altos, Picoitos, Moreanes e Sapos.

Dentro do associativismo mineiro de natureza social, este é talvez o mais sui-géneris exemplo de organização protetora, e que foram, em particular a partir dos anos trinta, focos de organização sindical e política, embora e neste período, já com alguma influência do Partido Comunista Português.

de Caixões.Sendo organizações de matriz classista, o

seu surgimento esteve ligado aos movimentos operários anarco-sindicalistas do final do séc. XIX até aos anos vinte do século passado, com a constituição de Sociedades Cooperativas em Mina de S. Domingos (1896), Corte do Pinto (1913), e Santana de Cambas (1924), e de Mutualidades em Mina de S. Domingos (1906) e Pomarão (1911). Nos anos trinta foi constituída a União Mutualista de Cambas e a Associação de Socorros Mútuos do Departamento de Engenharia de Mina de S. Domingos, embora estas, já fora do controle do movimento operário.

Uma segunda vaga dessas Caixas de Socorros, surge com a implantação da I República (1910), enquadradas nos centros republicanos, que à exceção do Centro Republicano 5 de Outubro, (Mina de S. Domingos) controlado, numa primeira fase, por uma elite de quadros superiores e médios da mina, embora de inspiração republicana, todos

Livro de "Deve e Haver" do Centro Operário Democrático Moreanense de 1915 - Registo dos Subsídios pagos pela Caixa de Socorros durante o mês de Outubro

Miguel Bento

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Alonso Gomes & CªA Empresa de Navegação por vapor para o Algarve e Guadiana 1870-1905

Alonso Gomes nasceu e viveu em Mértola, destacando-se na atividade mineira. Através desse trabalho,

descobriu e explorou a sua mina de manganésio, na freguesia de Alcaria, situada bem dentro dos limites do Concelho.

Te n d o A l o n s o G o m e s r e q u e r i d o Diploma do descobrimento legal da mina de manganés io da Cruz do Peso , na Freguesia de Alcaria, Concelho de Mértola;

Alonso Gomes deveria ter imaginado anos antes, que tendo a mina a trabalhar, o difícil não seria tirar o minério da terra, mas sim retirá-lo de Mértola, abrindo perspectivas de mercado, no país e no estrangeiro. Daí que optou por antecipar a fundação de uma Companhia de Navegação, que lhe facilitasse o transporte do minério. Por esse motivo deu os primeiros passos, com a aquisição do primeiro navio, o “Gomes”, em 1870, para estabelecer uma carreira regular no rio Guadiana, entre Mértola e Vila Real de Santo António. Como este tráfego de mercadoria e passageiros foi bem sucedido, o Governo achou que havia condições para aumentar e melhorar essa ligação, confirmado pelo acordo entre ambas as partes, em 6 de Outubro de 1874. Esse acordo previa o estabelecimento de um serviço de navegação regular, entre Lisboa e portos no Algarve, com escala em Sines, além do serviço fluvial já iniciado. Ficava assim Alonso Gomes obrigado perante o Reino, de dois serviços dentro das seguintes condições:

1º- Carreira de Lisboa para o Algarve

Com vapores de pelo menos 200 toneladas e um mínimo de 40 passageiros, em 1ª e 2ª classes e 60 em 3ª, com saídas regulares de Lisboa todos os dias 1 e 16 de cada mês. Para a efetivação deste serviço, teria a comparticipação do Estado através de um subsídio anual de 10 contos de reis.

2º- Carreira de Mértola para Vila Real de Santo António

Vapor com dimensões que permitisse a navegação no rio Guadiana, com lotação para 100 passageiros a distribuir por 3 classes. Viagens

redondas diárias entre Mértola e Vila Real de Santo António, exceptuando os Domingos. No entanto essa exceção perdia a regra, sempre que a mala do correio entre Lisboa e o Algarve seguisse pelo Guadiana. Pelo trabalho assegurado nesta carreira, teria igualmente um subsídio anual do Estado, no valor de 4.000,000 reis. Fica desde então estabelecido, que os subsídios vigoram durante o período de validade do contrato, conforme publicado no Diário do Governo, Nº 241, de 26 de Outubro de 1874. Para fazer face ao acordo com o Estado, ainda nesse mesmo ano de 1874, foi comprada uma segunda unidade de maior porte, destinada à ligação entre os portos da costa Algarvia, sendo batizado “Gomes 2º”.

D o i s a n o s m a i s t a r d e a f r o t a é a u m e n t a d a c o m m a i s u m n a v i o , o “Gomes 3º”, seguindo-se a alteração do nome do primeiro vapor para “Gomes 1º”. Com a entrada ao serviço do “Gomes IV”, fica com carácter definitivo a representação em Lisboa a cargo do Despachante Oficial Alberto B. Centeno & Cª, que passa a integrar a sociedade, participando na compra dos navios seguintes. Enquanto isso é decidido que no Porto, a representação será da responsabilidade da firma José de Sousa Faria, com sede no Nº 85 do Muro dos Bacalhoeiros, actuando na qualidade de agentes. Com o alargamento natural da actividade, a Companhia leva os navios a escalar outros portos nacionais, incluindo uma linha regular para o rio Douro. Esse maior fluxo de escalas nos vários portos, serve para dar resposta aos acordos entretanto firmados com a Empreza Nacional de Navegação, que recebia os passageiros e as mercadorias de cabotagem em transito para as Colónias em África, mantendo contrato similar com a Companhia Francesa Charguers Reúnis, relativamente a portos com destino no Brasil e em Moçambique. Depois da compra do “Gomes 5º”, do “Gomes VI”, do “Gomes 7º” e do “Gomes VIII” e também muito por causa dos naufrágios de que foram vitimas, a Companhia começa a entrar em declínio, situação agravada pela deterioração do estado de saúde de Alonso Gomes, que viria a falecer em 1904. No decorrer de 1904 e durante o ano de 1905, por via das dissidências dos sócios da Companhia e por indiscriminada ausência de entendimento, o seu legal representante Alberto B. Centeno decidiu-se pela venda dos navios ainda a operar, até à final e completa dissolução da empresa.

Os navios “ Gomes “ e - ou “ Gomes 1º” Porto de registo: Lisboa, 26.11.1876

Construtor: Hugh Parry & Genros, Ginjal, 1867 ex “Pr incípe D. Car los” - 1867-1876 Armava em escuna, casco de ferro, movido por rodas. Tonelagens: Tab 78,- to > Tal 45,- to Comprimentos: Ff 33 mt > Pp 21 mt > Bc 3,7 mt > Ptl 2,- mt Ignora-se qual o destino.

Postal de Mértola com o “Gomes 1º” fundeado no Guadiana

Detalhe do postal anterior

“ Gomes 2º ”Porto de registo: Lisboa, 10.02.1875

Construtor: Roberts & Cº., Seacombe, Inglaterra, ?? ex “Ballina” - Irish Sea Passenger Steamers, ??-1875 Armava em iate, casco de ferro, proa direita e popa redonda.

Tonelagens: Tab 78,- to > Tal 166,- to

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Comprimentos: Pp 41,50 mt > Boca 5,80 mt > Pontal 3,00 mt Adquirido por Alberto B. Centeno, nome “Algarve”, 1885-1886 Ve n d i d o à A r m a d a - A l f â n d e g a L i s b o a , n o m e “ A ç o r ” , 1 8 8 6 - 1 9 3 4 Vendido para demolição em 1934

“ Gomes 3º ”Porto de registo: Lisboa, 21.10.1876

Construtor: Winsford, Colchester, Inglaterra, 1875 Aquisição directa ao estaleiro pelo preço d e 2 . 4 0 0 l i b r a . C o n v é s c o m s a l t o , casco de madeira , movido por rodas . Tonelagens: Tab 56,- to Comprimentos: Ff 25,0 mt > Boca 3,60 mt > Pontal 1,60 mt

Em Julho de 1910, o casco do navio encontrava-se encalhado na praia de Vila Real de Santo António, à venda para demolição.

“ Gomes IV ”Porto de registo: Lisboa, Maio de 1884

Construtor: Dobson & Charle, Grangemouth, Inglaterra, 1882 ex “Strathcarron” - 1882-1884 Tonelagens: Tab 420,- to > Tal 292,- to Comprimentos: Pp 47,40 mt > Boca 4,90 mt > Pontal 3,20 mt

Vendido a José de Sousa Maciel (Empreza de Navegação do Rio de Janeiro), em 1901. Mudou o nome para “Murupy”, tendo ainda navegado por mais de 20 anos.“ Gomes 5º ”Porto de registo: Lisboa, 04.01.1887

Construtor: Burrel & So, Dumbarton, Escócia, 1883ex “Toreador” - Baird & Brown (W. Cunlife - W. Yeoman), 1883-86 Tonelagens: Tab 435,- to > Tal 310,- to Comprimentos: Ff 55,90 mt > Boca 9,00 mt > Pontal 4,00 mt

Naufragou após encalhe nas pedras Sorlingas, devido a denso nevoeiro em 09.07.1888. Os 18 tripulantes salvaram-se.

“ Gomes VI ”Porto de registo: Lisboa, 26.04.1889

Construtor: John Elder & o., Glasgow, Escócia, 1875 ex “Barnsley” - Manchester, Sheffield & Lincolnshire, 1875-1889 Tonelagens: Tab 575,- to > Tal 327,- to Comprimentos: Pp 56,40 mt > Boca 8,20 mt > Pontal 4,60 mt

Vendido a J. Soares Franco, 16.02.1905-06.03.1905 Ve n d i d o a J o ã o F o n s e c a e S á , 0 6 . 0 3 . 1 9 0 5 - D e z e m b r o d e 1 9 0 5 Vendido à Emp. Nac. de Navegação, nome “Lobito”, 1906-1909

Naufragou após encalhe no Sul da Ilha do Maio, em Cabo Verde, em 04.02.1909. Não há registo de vitimas.

O “ L o b i t o ” e x “ G o m e s V I ” n o s e r v i ç o d e c a b o t a g e m e m A n g o l a imagem editada por Eduardo Osório , Luanda

O “Açor” ex “Gomes 2º” na Horta - postal da Armada

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“ Gomes 7º ”Porto de registo: Lisboa, 1891

Construtor: Hall Russel & Co., Aberdeen, Escócia, ?? ex “Banchory” - Grampian Steamship Co., Ltd., ??-1891 Tonelagens: Tab 576,- to > Tal 372 to Comprimentos: Ff 53,20 mt > Boca 7,90 mt > Pontal 4,40 mt. Naufragou após encalhe na barra do rio Douro, em 01.03.1893, salvando-se a tripulação.

“ Gomes VIII ” Porto de registo: Lisboa, 01.05.1893

Construtor: Edwards Shipbuilding Co. Ltd., Newcastle, Ing., 1891 ex “Montague” - Merchant Banking Corp., 1891-1893 Tonelagens: Tab 645,- to > Tal 485,- to Comprimentos: Ff 53,90 mt > Boca 8,50 mt > Pontal 4,30 mt

Naufragou após encalhe no baixo Chaldrão, meia milha a Norte das Berlengas devido a nevoeiro cerrado, em viagem do Porto para Lisboa, sob o comando do Capitão Manuel da Costa. O navio transportava 32 passageiros que se salvaram, havendo contudo a lamentar a morte de 1 tripulante.

O “Gomes VIII” a entrar na doca do primitivo porto comercial de Viana do Castelo

Documentos

O título de transporte, vulgarizado como conhecimento de embarque

A publicidade através dos vespertinos, publicitando a chegada dos navios, quantas vezes enchendo por completo as páginas dos principais jornais.

O bilhete postal com o aviso da chegada do navio, avisando ter espaço disponível para meter mercadoria, sistema adaptado por muitas companhias e que foi prática comum durante muitos anos.

EDIÇÃO: ANTÓNIO PACHECOFONTE: NAVIOS E NAVEGADORES

PUBLICAÇÃO DE “REIMAR”ETIQUETAS:COMPANHIAS PORTUGUESAS

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Última grande greve dos mineiros Mina de São DomingosValentim Adolfo João (30 de Março de 1902-29 de Janeiro de 1970) foi um destacado diri-gente do Sindicato dos Mineiros (primeiro da Mina de São Domingos, depois de Aljustrel).

Anarcosindicalista, participou em 1932 na última grande greve dos mineiros da Mina de São Domingos, tendo

sido o último destes a ser libertado das prisões políticas da ditadura, nos anos 60, neste caso, do forte de Peniche. Preso em 1924 por lançamento de bomba. Delegado ao Congresso Operário de 1925. Membro do Grupo de Propaganda e Estudos Sociais da Mina de S. Domingos (1923/33). Participa na Conferência Anarquista do Sul de 1925 – UAP

Relativamente a Valentim Adolfo João há uma referência em José Correia Pires, no livro ““Memórias de um prisioneiro do Tarrafal” (1975), em que este anarquista conta a sua fuga do Algarve, nas vésperas do 18 de Janeiro de 1934, a caminho de Espanha. De Beja passa à Mina de São Domingos e à fronteira. “Na fronteira descalcei-me, arregacei as calças e com a companhia de um camarada de nome António Patrício, irmão do velho militante anarquista Valentino Adolfo João, excelente camarada e envolvido mais tarde no atentado a Salazar, esteve preso mais de uma dezena de anos e faleceu há cerca de três. Valentim Adolfo João estava fixado a umas dezenas de quilómetros da fronteira e fui dirigido a ele. Ali o encontrei feito agricultor, vivia com a mulher e filhos numa barraca de vime. Já nos conhecíamos por correspondência, mas quando o vi, cabeleira ao alto e desenvolta, lembrei-me da «Cabana do Pai Tomás», e Valentim dava na verdade uma excelente figura de romance. Fazia a sua sementeira e era um autêntico camponês. Fiquei ali um dia e uma noite e recordo-me que ele gozava ali de bom ambiente, nessa noite fomos visitados por uma patrulha da guarda fiscal ou os chamados «carabineiros», que decerto modo me vieram a ser úteis para a minha introdução em Espanha!…”

Também o escritor Modesto Navarro que encontrou o irmão, Patrício, em Aljustrel, já na década de 70, escreve sobre Valentim Adolfo João no seu livro “Poetas Populares Alentejanos”. Apesar de várias inexactidões (o atentado a Salazar foi em 1937 e não em 1933 como refere Modesto Navarro. Valentim Adolfo João morreu em Janeiro de 1970 e não em 1971), eis o texto de Modesto Navarro com umas “quadras” atribuidas a Valentim Adolfo João.

Esta fotografia pessoal de Valentim Adolfo João foi conservada por Emídio Santana, que a entregou ao Arquivo Histórico-Social

“Quando do atentado contra Salazar, em 1933, Valentim Adolfo João, na altura presidente do Sindicato dos Mineiros de Aljustrel, foi acusado pela PVDE (aquela que viria a ser a PIDE) de ter fornecido o dinamite. Sabe-se hoje que os fascistas aproveitaram esse acontecimento para perseguirem e prenderem muitos democratas. A partir daí, Valentim Adolfo João andou com um nome suposto (José Dias) até 1946, data em que foi reconhecido em Setúbal. Condenado a 28 anos de prisão, foi libertado quase no fim da década de 1960/1970, já completamente destruído. Veio a morrer por volta de 1971. É seu irmão, o sr. Patrício, que nos diz estas décimas em Aljustrel, explicando que, na altura em que Valentim Adolfo João as fez, organizava o sindicato com outros mineiros.

Namorava uma moça com a sua idade, dezanove anos, e um dia ela queixou-se da pouca atenção que lhe dedicava: – «Passa-se uma noite, passa-se outra, e tu sem apareceres…» Ao que Valentim Adolfo João respondeu:

Não tenho vagar amor para te dar atenção tenho muito que fazer na minha Associação

É meu desejo transformar esta pobre sociedade que semeia a iniquidade para nos escravizar temos muito que lutar com força audácia e valor para extinguirmos a dor a miséria e o sofrimento e por isso neste momento não tenho vagar amor

Se a vida fosse a sorrir se de encantos fosse o viver e se num breve alvorecer a luta nos redimir então poder-te-ei garantir imorredoira afeição mas enquanto a escravidão produzir mal e desgosto não posso fugir do posto para te dar atenção

Olha para todo o mundo verás tanta dor tanta desgraça eu amo a beleza, amo a graça amo o bem-estar profundo o capital iracundo procura nos perverter mas nós havemos de vencer apeando os comodistas e amando os idealistas tenho muito que fazer

Sociedade corrompida teus erros são vis e sicários aleivosos, argentários que nos negam o direito à vida e eis porque minha querida distraio a atenção e para acabar a escravidão eu prego por toda a parte construindo um baluarte a minha associação”

(Texto retirado da obra “Fado Operário no Alentejo, séculos XIX – XX” de Paulo Lima, 2004, ed. Tradisom, Vila Verde, pp. 90 e 91. 2)

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Depois de anos de esforços e de avanços e recuos, os primeiros linces ibéricos criados em cativeiro a serem rein-

troduzidos em Portugal deverão ser libertados dentro de uma semana, no concelho de Mértola. É o primeiro passo de um plano para soltar oito animais em território nacional, de onde o lince tinha praticamente desaparecido ao longo do século XX.

A espécie Lynx pardinus é endémica da Pe-nínsula Ibérica – ou seja, só existe em Portugal e Espanha e em mais lugar nenhum do mundo. Mas a sua população foi minguando até restarem pouco mais de uma centena em Espanha e quase nenhum em Portugal no princípio década passada. É um animal considerado em “perigo crítico” de extinção, segundo a União Internacional para Conservação da Natureza.

Nos últimos anos, vários linces criados em cativeiro em Espanha e Portugal foram libertados em território espanhol. Agora é a vez de Portugal, que pela primeira vez o fará em solo nacional. Se tudo correr como o previsto, no próximo dia 16 de Dezembro, terça-feira, dois linces serão alvo de uma “soltura branda”, ou seja, serão libertados numa zona cercada, com cerca de dois hectares.

Aí permanecerão durante algumas semanas, para se adaptarem à vida selvagem. Quando os técnicos que os irão monitorizar estiverem seguros de que os animais estão prontos para uma vida completamente independente, então serão por fim soltos na natureza.

O principal elemento necessário para o suces-so da reintrodução do lince é o coelho bravo, o seu principal alimento. Uma variante da doença

Primeiros Linces vão ser libertadosem Mértola na próxima semanaPrograma de reintrodução do Lince Ibéricoem Portugal entra em fase decisiva, com dois animais soltos numa grande área cercada, onde permanecerão durante algumas semanas.

hemorrágica viral, que afecta ciclicamente os coe-lhos, provocou drástica redução da sua população nos últimos anos. Sem coelhos, não há hipótese de os linces se fixarem em território nacional.

O Ministério do Ambiente sempre garantiu que os linces só seriam libertados quando a situação dos coelhos fosse comprovadamente favorável. O PÚBLICO solicitou mais detalhes, mas o mi-nistério remeteu quaisquer esclarecimentos para um momento mais próximo do dia da libertação, argumentando que a data poderia ser alterada.

Em Mértola, porém, há sinais de que a situação melhorou. “A percepção que temos é a de que houve uma ligeira recuperação em relação ao ano passado”, afirma António Paula Soares, pre-sidente da Associação Nacional de Proprietários Rurais, Gestão Cinegética e Biodiversidade, que representa os donos de zonas de caça.

Quercus pede "justificação técnica"Em 2013, praticamente não houve caça ao

coelho na região. A doença hemorrágica viral dizimou os animais. Mas este ano tem havido uma maior actividade cinegética, embora a população de coelho bravo esteja ainda longe dos números de há dois anos. António Soares acredita que “as coisas estão bem encaminhadas”.

A associação ambientalista Quercus estranha que a libertação ocorra agora. “Gostaríamos de conhecer a justificação técnica”, afirma Paulo Lucas, dirigente da Quercus. “Estava prevista para Janeiro ou Fevereiro, estranhamos a pressa”, completa.

O que mais preocupa a Quercus é haver poucos incentivos para que os proprietários melhorarem o habitat do lince. Os prémios anuais de 10 a

100 euros por hectare, conforme o tamanho da propriedade, não são atractivos, segundo a asso-ciação. “A libertação em si do lince é um fogacho. A reintrodução de uma espécie é uma corrida de longo prazo”, diz Paulo Lucas.

Outras associações têm manifestado preocupa-ções quanto à libertação dos linces. Em Julho, a Federação Portuguesa de Caça e a Confederação Nacional de Caçadores Portugueses criticaram vários aspectos do processo, manifestando o temor de que haja uma espécie de competição com o lince pelo coelho bravo e maior ingerência do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) em matérias de gestão que estão hoje na esfera dos gestores cinegéticos.

O período de caça ao coelho termina no final do ano. O Ministério do Ambiente, segundo An-tónio Soares, comprometeu-se a avançar com a libertação dos linces apenas após o fim do período das montarias, que se estende até Fevereiro. Isto significa que os primeiros linces deverão perma-necer dois meses na área cercada, que fica numa zona de caça turística de Mértola.

A Secretaria de Estado do Ordenamento do Território e da Conservação da Natureza garantiu dois mil hectares de terrenos favoráveis para os linces, através de contratos com proprietários da região. Foi também lançado um “pacto” para a preservação da espécie, envolvendo gestores de caça, investigadores, organizações não-governa-mentais, representantes da agricultura e institui-ções oficiais, no qual diz-se que “a presença do lince ibérico não implicará a criação de limitações ou proibições” nos sectores cinegético, agrícola e florestal.

in “Público” 09-12-2014

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estórias com história

JoséAntónio Estevão

Sem Mina e Sem Natal

— ... Anda comigo ...

Diz-me o Tói da Gregória ...

— Vamos ali para os lados do telheiro á pro-cura de barro ...

— Barro? ... mas barro para quê?

— O Natal está a chegar e tenho de fazer o presépio lá em casa, ... e as figuras faço-as mol-dadas em barro.

— Deixa-te disso, ... faz antes uma árvore de natal, ...

Embora eu não soubesse bem o que era uma árvore de Natal, mas tinha ouvido uma prima do Toninho Américo que morava em Beja, falar com entusiasmo da sua linda árvore de Natal colori-damente decorada e iluminada ...

... Mas o Tói já tinha visto uma arvore de Natal em Mértola quando foi levar a metade da vacina do tétano ...

— ... Não pode ser, ! ...

... a arvore de Natal é feita com ramo de pi-nheiro, ... e aqui na aldeia só temos carrasqueiros, estevas e chaparros ...

... E lá fomos e recolhemos o barro vermelho que foi dividido pelos dois...

— Tu fazes os animais, ... eu as pessoas ..

... e comecei cheio de entusiasmo a fazer o

burro ...... Um rolo de barro mais ou menos cilíndrico

amassado com as mãos e estava feito o corpo do bicho, ...

... mais um rolinho fininho para o rabo, ... mas o raio do rabo não queria agarrar ao corpo e teimava em cair, ... mas lá consegui, ... ... ficou um pouco arrebitado e quase na vertical, ... mas ...

Agora era a cabeça, .. mais um naco de barro quase esférico arredondado nas palmas da mão, ... e fazer mais as orelhas na lateral, ... que também não seguravam ... mas lá insisti e prendeu uma, ... embora quase no alto da cabeça .

... Vinda da rua chegava a minha mãe de enfusa ao quadril com água do poço ...

... — ... Olha lá, ... bonita, ... bonita sim senhor, … a galinhita tá a tomar jeito, ... com mais um retoque na crista, e mais as patinhas ... e mais a ...

Com este elogio da minha mãe, ... rapidamente compreendi que a continuar ... o meu burro de barro chegaria ao fim a cacarejar ...

... e ainda faltava a ovelha e mais a vaca e mais a ...

... Se fosse tempo delas, .. fazia a vaca com uma fava e uns pauzinhos de fósforo, ... era muito mais

fácil, ... mas também não tinha jeito ... e desisti...

Numa corrida fui ao largo do poço a casa do Tói, confessar-lhe a minha incapacidade de não conseguir moldar um burro com o barro ...

... e lá estava o Tói todo besuntado e peganhoso até ás pestanas do encarnado do barro, ...

.... e disfarçadamente satisfeito reparei que os bonecos do Tói não estavam melhores que o meu burrinho "engalinhado", ...

Aquele São José estava pior e mais mal enca-rado que o Carrusca bêbado, .. ainda por cima marreco, ... aleijado, com um ombro descaído, ... uma perna mais curta e mais grossa que a outra, ... nariz desproporcionado, parecendo picado por um enxame de vespas, ... barriga maior que a do Caxitra ou do Risota ...

...um dó d ‘alma ...!

.... E que dizer da Nossa Senhora, ...

..coitada ...! ...

... mas coitada, mesmo! ...

... oh valha-me Deus, ...

... parecia a "Mela", ... muito mal amanhada, sem cabelo, parecendo zarolha, pescoço comprido

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e grosseirão, mamas desalinhada e descaídas até á zona do umbigo, ... mãos que pareciam duas talochas, ... bochechas de politico agnóstico ... … uma desgraça …!Uma verdadeira desgraça!

... a pobre coitada estava ainda mais feia que aquelas noites de Inverno com as trovoadas que vêm do lado de Espanha e que a minha mãe "acode" aflita pela Santa Bárbara ...

Sem querer cometer pecado, ... imaginei o menino Jesus ao ver aqueles pais desgraçados que lhe calharam em sorte, fugir assustado mesmo sem cueiros do conforto da sua cama de palhinhas na manjedoura improvisada do presépio. . .

... Não podendo evitar, soltei grande gargalha-da, ... e claro o Tói não gostou!

Mas a tia Catrina a mãe do Tói, mulher perspi-caz e desenrascada, vendo que a coisa não tomava jeito, teve uma ideia ...

— .... Olhem, ... não se ralem, ... estão ali ainda os bonecos de massa de jornal com que vocês fizeram o teatro de marionetas na escola, ... eu vou costurar e vesti- los e vão ver que até vão parecer Santos do Céu ...

... quanto ao burro, ... vou pedir á Luísa Colaço aquele de loiça que ela tem em cima da cómoda lá em casa, ... e a vaca logo se vê ...

— ... Pede o bezerro á tua irmã, aquele que a vaca pariu ontem á noite ...

...olha, .. e trás também a vaca, ... sempre temos leite fresco .... pelo menos até aos Reis ....

Diz o tio Zé Maurício, gozando com a situação, enquanto batia na sola duma bota sentado á mesa da sua oficina de sapateiro ...

— ... Não façam caso...! ... diz a tia Catrina resmordendo com a graçola desbocada e parva do marido ...

— ... Vão, ... vão buscar o musgo ali na bar-reira ao pé da nossa cerca junto do barranco, ... há lá muito e bonito ...

... E lá fomos, colhemos e trouxemos as "man-tas" de musgo viçoso numa alcofa e começámos a construir o nosso presépio, ... onde nem faltavam os pequenos lagos com latas de conserva cheias de água disfarçada pelo musgo ...

Enquanto a tia Catrina continuava a fazer os mantos e as túnicas para vestir os bonecos, ...

Mas, ... reparámos que faltava a estrela, ... e um presépio sem estrela, desorientaria os Reis Magos ... e teria de ser uma estrela brilhante ...

... mas, ... as lojas dos Senos da aldeia só tinham papel de embrulho e papel pardo .

... Na Mina havia uma espécie de papelaria, e poderia ser que lá houvesse papel brilhante...

— Então vão á Mina, ... diz a mãe do Tói ...

mas vão com cuidado, ...

... e pediu os 5 escudos que o mestre sapatei-ro acabara de receber de um freguês, por umas "tombas" cosidas numas botas, ...

Chegados á papelaria da Mina, ...

— ... Queremos uma folha de papel lustrado, .... amarelo .

— ... Papel lustrado, ... só tenho branco, preto e vermelho ...

— ... Leva o vermelho, ... disse eu ao Tói ...também é bonito e normalmente irrita muita gente. ... ...

— ... A folha custa um cruzado, ...

— ... Olha, só 4 tostões, diz o Toi admirado — ... Então dê-me mais 4 pastilhas elásticas "gorila" ...

O Tói de cada vez que vinha á Mina ia carre-gado com pastilhas elásticas, ... porque na Corte do Pinto não havia.

Eu não gostava muito de mastigar aquela coisa que parecia borracha, ... gostava mais dos caramelos "vaquinha", daqueles que se agarravam aos dentes e obrigava a língua dentro da boca a andar aos pinotes ...

Quando chegámos á aldeia para fazer a estrela "brilhante", já a Nossa Senhora estava condigna-mente vestida, ... com um lindo manto azul escuro de veludo ... e agora sim, ... aquela Nossa Senhora parecia uma verdadeira Santa do céu ...

... A túnica do São José é que o Tói torceu o nariz, ... e a tia Catrina notou ...

— ...A túnica do S. José não te agrada? ...

.... pois, ...era o que havia, ... tirei de umas ceroulas velhas de flanela do teu pai ...

... E não tardou, ... o presépio estava pronto e por acaso bem bonito ...

.... Até a tia Catrina parecia orgulhosa, con-vidando quem passava para espreitar aquela representação do nascimento do Menino, ... e não se cansava de dizer: ... foram os moços pequenos sozinhos que o fizeram, ... o meu Tói e aqui o Zezinho...

Na casa do Toi já ficou montado o belo presépio, símbolo desta época Natalícia ...

Mas, ...

Este ano na minha casa, o Natal era diferente e mais triste ...

A Mina estava a acabar, ... os mineiros foram obrigados a abandonar a aldeia, ..as famílias e os amigos ... e procurar vida longe...

... tão longe que a saudade já doía antes te terem abalado ...

A aldeia ficou sem homens ...!

Dos mineiros apenas ficaram os velhos, so-frendo no corpo o tufo engolido de uma vida nas catacumbas da mina, ...

... e os mineiros mortos, enterrados na terra de talisca das sepulturas do cemitério da aldeia ...

... aqueles que um dia entraram na escuridão do inferno para arrancar as pedras negras, ... e nunca mais viram a luz do dia ...

Nas tabernas vazias já não se ouvia cantar ...

... e o meu pai foi mais um dos mineiros que também foi embora, ... para longe , ... ... para uma França que ficava para além do fim do mundo ...

— ... E teve sorte, .... dizia um caixeiro viajante, ... — se tivesse que ir a "salto" era bem pior! ...

A aldeia não parecia a mesma, ...

As mulheres, de semblante inconformado, pareciam viúvas tristes ...

...Ir ao "pago" á Mina deixou de ter graça, ...a cooperativa fechou, ... as coletividades antes cheias de vida e diversão pareciam locais de velório, ..

Até a rotina de amassar e cozer o panito no forno acabou, ... faltava o meu pai para trazer a lenha do campo ...

... Olhando para o cepo de Natal a arder na minha ladeira, ... o calor não era o mesmo, ... com o meu pai a contar-me um conto, ...tínha-mos de chegar as cadeiras para trás para não nos queimar-mos ....

…E a minha mãe avisou- me: ...

... podes por na mesma o sapatinho na chaminé, ... mas de manhã só vais encontrar as meias de linha que a avó acabou de fazer com as 4 agulhas, ...

...e olhando uma fotografia que o meu pai man-dou junto a uma torre enorme de "pernas abertas", ... mostrando o sobretudo novo que comprou para substituir a velha samarra que levara e que já não tapava o frio, ... vendo um chão de um branco estranho, ... lamentava aflita o sacrifício daquele frio que o pobre pai devia estar a passar ...

.... e a tua prenda de Natal só vai chegar com o teu pai em Agosto do ano que vem...

... e se Deus quiser ... !

Pensei, : ...ainda com as ideias demasiado confusas e sem perceber muito bem o que estava a acontecer á aldeia e ás famílias da minha aldeia...

...mas que malvado Natal este ...!!!

... mas porque teria de ter sido tudo assim? ... ???

... Malvado Natal ... este ...!

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AntóniaFernandes

Correia

momentos d e p o e s i a

bom garfoPÉZINHOS deCOENTRADA

vivemos de histórias e mitos ,pensando que não é real ,mas sem ficar aflitos , afirmo que é verdade crucial,nas profundezas da terra , para garantir o sustento, mineiros de S. DOMINGOS,Lutavam como na guerra, de pique como instrumento ...

Na luta, desenfreada, não lembravam quanto ao perigo,nem mesmo pensando em mais nada,que traziam a morte, consigo,e tantas vezes ela vencia, nessa luta derradeira, sua vida pertencia, ao fundo dessa barreira, barreiras desse minério negro como a própria morte, e findavam no cemitério, sempre que lhes faltava a sorte,

que desgosto , que agonia,sofriam os que cá ficavam,nada mais na vida havia,todas as esperanças findavam,Haviam aqueles que ficavam,para a sua inteira vida, e de muletas finda-vam , numa tristeza esquecida,muita pena todos tinham, sem nada puder fazer , mas as penas se avizinham , e ficam até morrer ........

Ingredientes: 12 pezinhos de porco pequenos 2 cebolas 5 cravinhos Sal q.b. 5 dentes de alho 6 colheres (sopa) de azeite Coentros q.b. 1 colher (sopa) bem cheia de farinha maisena 3 colheres (sopa) de vinagre

Preparação:

Arranje, chamusque e lave bem os pe-zinhos de porco. Descasque as cebolas e espete-lhes os cravinhos.

Numa panela, junte os pezinhos, as cebo-las e água até cobrir bem, tempere com um pouco de sal, leve ao lume e deixe cozer até que os pezinhos fiquem macios. Vá retirando a espuma que se vai formando.

Escorra os pezinhos (reserve o caldo da cozedura), deixe-os arrefecer e retire-lhes os ossos mais salientes.

Descasque os dentes de alho, deite-os para um almofariz, junte um pouco de sal grosso e esmague bem até obter uma pasta.

Aqueça o azeite num tacho, adicione a pasta de alho, deixe alourar, junte bastantes coentros picados grosseiramente, mexa e retire do lume.

Adicione depois a farinha previamente dis-solvida no vinagre e 2,5 dl do caldo de cozer os pezinhos, mexa, adicione os pezinhos, leve novamente ao lume, deixe apurar o molho até ficar espesso, retire do lume e sirva.

A Lenha O Combustível na casa dos Mineiros

Vou escrever o que alguns sabem E que a mim me marcou A lenha um bem essencial, escasso, E pelo mesmo se lutou

Também era das Mulheres Essa tarefa tão árdua Ir a Espanha procurar O que neste lado rareava

Partiam em grupos a fio Enfrentando o seu penar Para a Espanha chegar O Chança tinham que passar

Enregeladas lá iam Afim da sua missão A lenha iam buscar Para também cozer o pão

Regressavam cansadas Com a lenha bem presa O feixe seguro nas suas cabeças

Quando à fronteira chegavam E pelos Carabineiros encontradas A lenha levavam para as Cazilhas escoltadas

A Portugal regressavam Seus lamentos a falar O Chança passavam de Mãos a abanar

Vida dura a dos Mineiros E da Esposa também Cuidar do lar e dos filhos E do Marido também

Tempos idos de sofrimento Que jamais se irão esquecer Também Elas nossas Mães Foram vítimas do poder

Homenagem às nossas Mães Também Elas sofreram na Imparável exploração da mina.

Domingos Teixeira Bairro-Alto

Mina de s. Domingos Domingo 12 de Outubro 2014

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Na encosta a sul do Eremitério de São Domingos, encontrava-se o único campo cultivado de todo o território

mineiro, talvez explorado pelo Eremitão sob a proteção da "Santa Madre Igreja". No mesmo

O ATENTADO de JAMES MASON“ Quadrilha de Banditti da Aldeia de Corte do Pinto”

espaço apenas existia umas ruinas de casa rural, sinais evidentes de um perfeito deserto.

O jazigo tinha pro-prietários e proprie-dades confinantes. Os proprietários foram vendendo as suas ter-ras na área pretendida, originando um grande senhor terrenamente, os Mason & Barry. Os vizinhos eram gente humilde dos Montes Altos e de Corte do Pin-to: Manuel Lourenço, Manuel Francisco Var-gas, Manuel Francisco Magro e os herdeiros de João Félix.

James Mason encon-trava-se em Portugal desde os meados de 1858, colocando-se ao serviço da industria mineira, impulsionan-do o sector das pirites neste País e preparando a exploração da Serra

James Mason

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de São Domingos, de acordo com as conceções mineiras. A partir de Janeiro de 1859, estabelece o arrendamento definitivo da concessão, impul-sionando doravante a exploração do minério a partir do primeiro ano de lavra.

Estimulou o crescimento de uma primeira povoação mineira com todos os requisitos neces-sários para não só ali habitarem os mineiros, como também toda a logística humana especializada, oriunda da Inglaterra, os engenheiros e diversos funcionários.

Em julho de 1860 foi vitima de um atentado, não consumado, perpetrado por uma Quadrilha de Banditti da Aldeia de Corte do Pinto.

O atentado foi preparado por José Félix e José Félix Mourinho, o "Chato", ambos envolvidos no movimento da Patuleia(movimentos de revoltas populares como o liderado pela jovem Maria da Fonte) e fugitivos do Limoeiro e do Forte do Bugio. Os dois tornaram-se célebres pelos atos criminosos, apoiados pelas populações autócto-nes e por amigos em várias povoações das duas margens do Guadiana, personificando um tipo de banditismo descrito por, (E. J. Hobsbawn e Gorge Rudé, Revolucion Industrial y Revuelta Agraria. El Capitán Swing. Madrid, 1978. Também descrito pelo primeiro autor em, "Rebeldes Primitivos", estudo sobre as formas arcaicas dos movimentos socias nos séculos XIX e XX)

João Félix era pedreiro e fabricante de tijolos em Corte Do Pinto, onde tentou fazer passar a James Mason, tijolos de fraca qualidade. As suas relações com a Mina encontravam-se também relacionadas com divergências nos limites das

propriedades na zona da concessão, na qualidade de herdeiros de João Félix.

Os problemas sociais não treinaram aqui, pois a gestão do pessoal era um grande problema nos meados do século XIX. Em conjunto com os mineiros portugueses, ( Alentejanos e Algarvios), trabalhavam piemonteses, andaluzes, castelhanos e asturianos, os últimos oriundo das explorações mineiras espanholas. De notar que as suas pro-veniências foram influenciadas pelas empresas de Huelva e pelas sociedades onde já trabalhara James Mason.

Fontes:( Imagens de autoria desconhecida: Centro de Estudos da Mina de São Domingos e Google )http://cemsd.minadesdomingos.com/http://aespeciaria.blogspot.pt/2012/01/sublevacao-popular-da-maria-da-fonte.htmlhttp://ct1end.netpower.pt/cs4b_bugio/histo-rial_bugio.htmExtratos de texto: Mineração do Baixo Alentejo da Autiria do Pro. Jorge Custódio.( Arranjo e edição de António Pacheco)

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CARTOON

CANTE (2014) - Ilustração: Helder Peleja