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O ESTUDO DO GÊNERO ARTIGO DE OPINIÃO NO ENSINO MÉDIO: argumentar,

uma ação inevitável nos dias de hoje

Autor: Gislene Aparecida Ruiz Marques1

Orientador: Evandro de Melo Catelão2

Resumo

Estudar a linguagem atualmente significa ir além do quadro das estruturas linguísticas para analisar o sentido de um discurso como processo dinâmico de interação entre sujeitos sociohistoricamente situados. De acordo com os PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais) ensinar línguas hoje é ensinar diferentes gêneros textuais, os quais são fenômenos históricos vinculados à vida cultural e social. Portanto, este artigo tem por objetivo relatar uma intervenção pedagógica que teve como proposta o estudo em sala de aula, de um dos muitos gêneros textuais que socialmente circulam no nosso meio: o artigo de opinião, que é veiculado em jornais e revistas, considerados excelentes materiais didáticos para o ensino de leitura e produção de texto e que serão usados como base para a execução do presente projeto. A implementação desta proposta foi direcionada para os alunos do 2º Ano do Ensino médio do Colégio Estadual Itacelina Bittencourt, Ensino Fundamental e Médio, no município de Cianorte – PR, pois é nessa etapa de aprendizagem que se precisa despertar o senso crítico nos alunos, a prática da argumentação e identificar questões polêmicas. O desenvolvimento dessa unidade teve como encaminhamento metodológico a organização de uma sequência didática, apresentando um conjunto de atividades organizadas voltadas para o desenvolvimento da competência comunicativa, envolvendo leitura e análise de textos já publicados, linguagem oral, conceitos gramaticais, pesquisas, produção de texto dos alunos. Vale ressaltar aqui, que vários foram os momentos de leitura e discussão de temas polêmicos utilizando para isso, além do material produzido, jornais locais e regionais, revistas, sites da internet, até chegar à etapa final que foi a produção dos textos. Desta maneira, a implementação deste projeto atendeu aos objetivos propostos, pois aprender a ler e a escrever esse gênero na escola favoreceu o desenvolvimento da prática de argumentar, ajudou na formação de opiniões sobre questões relevantes e a pensar em como resolvê-las, o que é um importante instrumento para a formação do cidadão.

1 Professora especialista em Língua Inglesa e Metodologia de Ensino, Escola Estadual Itacelina

Bittencourt Ensino Fundamental e Médio. 2 Doutorando em Letras UFPR, Orientador PDE Universidade Estadual de Maringá.

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PALAVRAS-CHAVE: Artigo de opinião; Argumentação; Ensino médio.

Interacionismo Sociodiscursivo. Ensino de Língua Portuguesa.

1 Introdução

Ler e escrever são duas aprendizagens essenciais a todo o ser humano. Um

cidadão que não tenha essas duas habilidades está condenado ao fracasso escolar

e à exclusão social; vai sempre depender dos outros e terá muitas limitações em sua

vida profissional. Por isso, o desenvolvimento da leitura e da escrita é a maior

preocupação de todos os educadores. Compreender e produzir textos são atividades

humanas que implicam dimensões sociais, culturais e psicológicas e mobilizam

todos os tipos de capacidade de linguagem.

Por muito tempo, a prática de produção textual em sala de aula resumia-se a

redações, cujo objetivo era que o professor avaliasse a norma padrão, ou seja,

corrigia-se a gramática utilizada pelo aluno, com o intento de avaliar se ele teria

aprendido os conceitos gramaticais estudados. O conteúdo, as ideias dos alunos de

quase nada serviam, elas não estavam ali para ser entendidas. Não havia um

produtor atrás daquele texto. A situação precisa ser, porém, revertida e o professor

de língua assumir seu verdadeiro papel, "o de contribuir significativamente para que

os alunos ampliem sua competência no uso oral e escrito da língua portuguesa"

(ANTUNES, 2003, p.14).

Possivelmente, uma das principais causas que levam ao desanimador quadro

no qual se encontra o ensino da língua é a forma como estão planejadas as aulas de

português. Evindencia-se um ensino que enfatiza a gramática descontextualizada

dos usos reais da língua, fragmentada em frases soltas tornando-se dificultada a

formação de um texto, com questões sem importância para a unidade textual

apoiando-se em regras, voltada para as nomenclaturas e classificações. Uma

gramática inflexível que geralmente desconsidera o uso corriqueiro da língua,

preocupada apenas com o "certo e o errado", como se falar e escrever bem fossem

apenas frutos de escrever corretamente, de acordo com a norma culta. Para Irandé

Antunes (2003, p.19);

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Um exame mais cuidadoso de como o estudo da língua portuguesa acontece, desde o Ensino Fundamental, revela a persistência de uma prática pedagógica que, em muitos aspectos, ainda mantém a perspectiva reducionista do estudo da palavra e da frase descontextualizadas. Nesses limites, ficam reduzidos, naturalmente, os objetivos que uma compreensão mais relevante da linguagem poderia suscitar – linguagem que só funciona para que as pessoas possam interagir socialmente.

Surge a proposta de utilizar o texto como centro de todo o trabalho das aulas

de português e a necessidade de rever a metodologia de desenvolvimento das

atividades com a leitura, a escrita e a análise da língua. Para tanto, é imprescindível

adotar um trabalho que contemple a perspectiva sociointeracionista da língua,

pautado nas concepções de Bakhtin (2003) e nas Diretrizes Curriculares de Língua

Portuguesa que norteiam o Ensino Público no Estado do Paraná. Dessa forma, a

leitura e a produção de texto passam a ser um dos eixos estruturantes do ensino de

português, o que é sugerido também por linguistas como Schnewvly e Dolz (2004) e

Marcuschi (2003), que adotam a perspectiva dos gêneros e das sequências

didáticas como forma de solucionar o problema da produção textual dos alunos.

Sobre isso Marcuschi (2003, p. 22) esclarece:

Partimos do pressuposto básico de que é impossível se comunicar verbalmente a não ser por algum gênero, assim como é impossível se comunicar verbalmente a não ser por algum texto. Em outros termos, partimos da ideia de que a comunicação verbal só é possível por algum gênero textual. [...] Essa visão segue uma noção de língua como atividade social, histórica e cognitiva. Privilegia a natureza funcional e interativa e não o aspecto formal e estrutural da língua.

Surge, assim, a necessidade de desenvolver no aluno sua competência

discursivo-argumentativa com atividades de linguagem apoiadas na prática da

interação social e que fujam da prática descontextualizada de escrita escolar. Neste

sentido, propôs-se o trabalho com os gêneros textuais como forma de redirecionar o

ensino de língua portuguesa, pois os mesmos se constituem como "ações sócio-

discursivas para agir sobre o mundo e dizer o mundo, constituindo-se de algum

modo" (MARCUSCHI, 2003, p.22).

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Busca-se, com isso, desenvolver no aluno competências para a prática social

do discurso por meio do trabalho com sequências didáticas do gênero

argumentativo, em especial o trabalho com Artigo de opinião, visto aqui não apenas

como uma ferramenta de ensino, mas como objeto de aprendizagem e como meio

de inserção em seu grupo social.

Assim, mediante essas concepções, o objetivo desse trabalho foi repensar o

ensino de Língua Portuguesa nas escolas públicas da rede estadual, que vem

acontecendo de forma não muito eficaz, apesar do empenho dos professores de

língua e das ações institucionais terem buscado metodologias, visando resultados

positivos neste sentido. Pois, do ponto de vista social, incentivar a leitura e a escrita

dos vários tipos de textos que estão circulando na nossa sociedade é permitir ao

aluno o acesso às formas de socialização mais complexas da vida cidadã.

Com essa preocupação, propõe-se desenvolver pelo PDE um projeto de

intervenção pedagógica que contemplasse o gênero textual artigo de opinião,

importante instrumento para a formação do cidadão. Para a pesquisa em sala de

aula, contou-se com 20 alunos do ensino médio da Escola Estadual Itacelina

Bittencourt de Cianorte, Paraná, com os quais se motivou por meio do trabalho com

este gênero textual o (re)conhecimento de questões polêmicas como pedágio,

homossexualismo entre outros temas que atravessam nosso cotidiano.

2 Pressupostos para a abordagem didática 2.1 Os gêneros e o interacionismo sociodiscursivo

O ensino da Língua Portuguesa até pouco tempo, centrava no ensino

gramatical, um trabalho embasado na concepção estruturalista de linguagem. No

decorrer das décadas, o estudo com enfoque na língua foi se ampliando e já a partir

da década de 1960 com as ideias do Círculo de Bakhtin e as de Bronckart, a

linguística do discurso passou a ter como unidade de ensino o texto, visto pelo viés

do discurso, buscando verificar não só a estrutura, mas principalmente o seu

funcionamento, impulsionando as discussões teóricas e os desenvolvimentos

pedagógicos na área de língua. Para Bakhtin (1988, p. 95), “um método eficaz e

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correto de ensino prático exige que a forma seja assimilada não no sistema abstrato

de língua, mas na estrutura concreta da enunciação, como um signo flexível e

variável”.

Dentro dessa corrente encontra-se Vygotsky, precursor da perspectiva

interacionista sociodiscursiva (ISD). Segundo Machado (2006), a tese do ISD seria

de que as propriedades específicas das condutas humanas (físico e psíquico) são

resultados de um processo histórico de socialização, que só foi possível pela

emergência e pelo desenvolvimento da linguagem. A abordagem social, conforme

Vygotsky (1984, p.21) tem como objetivo “caracterizar os aspectos tipicamente

humanos do comportamento das pessoas e elaborar hipóteses de como essas

características se formaram ao longo da história humana e, de como se desenvolve

durante a vida de um indivíduo”.

Nesse sentido, Machado (2006) considera que os estudos desenvolvidos pelo

ISD são imprescindíveis para garantir mudanças no ensino de línguas, pois nessa

perspectiva de linguagem como interação, a língua deixa de ser considerada

estática, pronta e acabada e passa a ser dinâmica, plástica, sujeita à mudanças.

De acordo com a teoria sociointeracionista vygotskiana de aprendizagem, a

concepção de aprendizagem como resultado da interação dialética de um indivíduo

com outros num determinado grupo social (VYGOTSKY, 1984) reflete a importância

da dimensão social no processo de desenvolvimento do ser humano. Ou seja, “o

homem transforma e é transformado nas relações produzidas em uma determinada

cultura” (MARCUSCHI, 2005).

A Língua Portuguesa precisa ser percebida como um conjunto aberto e

múltiplo de práticas sociointeracionais orais ou escritas, desenvolvidas por sujeitos

historicamente situados, ou seja, perceber a linguagem no contexto das relações

sociais, onde ela se constitui continuamente.

Sendo assim, os falantes tomam forma como sujeitos que interagem

socialmente, pois, vivendo em conjunto com outras pessoas, estarão sempre

envolvidos em situações discursivas, sejam elas formais ou informais.

Na realidade, toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que procede de alguém como pelo fato de que se dirige para alguém. (...) A palavra é uma espécie de ponte lançada entre mim e os outros. Se ela se apoia

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sobre mim numa extremidade, na outra se apoia sobre o meu interlocutor. A palavra é o território comum do locutor e do interlocutor (BAKHTIN, 2003, p.113).

“O desenvolvimento do pensamento é determinado pela linguagem, ou seja,

pelos instrumentos linguísticos do pensamento e pela experiência sociocultural da

pessoa” (VYGOTSKY, 2002, p.39). Quando uma criança ingressa na escola, já tem

uma vivência familiar, social e cultural que é levada para esta escola, sendo assim,

se em casa, com os pais e a família, a criança não foi estimulada, provavelmente

terá uma capacidade de aprendizagem reduzida. Essa afirmação é baseada também

na teoria sociointeracionista que comprova a ligação entre desenvolvimento e

linguagem:

A formação dos conceitos é resultado de uma complexa atividade em que todas as funções intelectuais fundamentais participam. No entanto, este processo não pode ser reduzido à associação, à tendência, à magética, à inferência ou às tendências determinantes. Todas essas funções são indispensáveis, mas não são suficientes se não se empregar o signo ou a palavra, como meios pelos quais dirigimos as nossas operações mentais, controlamos o seu curso e o

canalizamos para a solução do problema com que nos confrontamos (VYGOTSKY, 2002, p.43).

Nesse aspecto, cabe a escola desenvolver ao máximo os alunos deficitários,

mostrando a correlação racional entre signos e funções comunicativas, entre formas

e usos, entre organização textual e discursiva. Estimular o intelecto, criar situações

desafiantes que possam produzir o amadurecimento intelectual. Assim, a escola,

além de trabalhar conteúdos, promove o desenvolvimento psicológico, que por sua

vez, leva o ser humano a uma transformação de si mesmo e do mundo no qual está

inserido (SILVEIRA, 2007, p.05).

Sabemos que é por meio da linguagem que nos comunicamos com o mundo

e com os outros e que essa comunicação acontece principalmente por meio da

linguagem verbal, ou seja, nosso principal instrumento é a palavra. Sendo ela a base

de nossa comunicação, há uma combinação para que as palavras formem uma

unidade significativa, então, nossa comunicação acontece fundamentalmente por

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meio de textos. E essa unidade de linguagem em uso acontece em todos os

momentos de nosso dia.

Vygotsky (2002) acredita que o homem é dotado de capacidades particulares

que permitem a criação de instrumentos mediadores na interação social. Esses

instrumentos são (re)apropriados pelos organismos humanos. Seguindo essa ideia,

Bronckart (2009), o maior defensor do ISD, coloca essa teoria como o melhor

caminho para o trabalho com a linguagem e ainda menciona que a atividade de

linguagem consiste em uma leitura do agir, que implica as dimensões motivacionais

e intencionais mobilizadas por um coletivo organizado, a ação de linguagem como

um conjunto de aplicações de linguagem que constituem uma unidade cujo resultado

final é o texto, que permite a esse coletivo organizado construir mundos de

conhecimentos que podem se tornar autônomos em relação às circunstâncias

individuais da vida e que podem se acumular no curso da história dos grupos. Ainda

de acordo com Bronckart as atividades de linguagem são diversificadas, porque

suas propriedades dependem também de opções assumidas pelas formações

sociais como também e, sobretudo, porque elas dependem do tipo de atividade geral

com o qual se articulam.

2.2. Perspectivas atuais para o ensino de Língua Portuguesa

Com a entrada em cena dos referenciais nacionais do ensino de linguagem,

os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), essa tendência teórico-metodológica

assumiu grande parte das discussões sobre o ensino de línguas. Apesar de conter

algumas incoerências em sua estrutura, os Parâmetros Curriculares Nacionais –

PCN’s – já propunham, na década de 80, que o ensino da Língua Portuguesa

estivesse pautado na noção de gêneros textuais. Com isso, buscava-se uma

mudança de paradigma do ensino da Língua Portuguesa, que antes se

fundamentava na gramática normativa. Esse documento apresenta como ponto de

partida que “ensinar língua significa ensinar diferentes gêneros textuais”. Diversos

autores e linguistas como Dolz e Schneuwly (2004), Marcuschi (2003), entre outros,

ressaltam a importância e pertinência dos gêneros textuais para o aprendizado da

língua materna. Por meio dessa abordagem, as palavras são ferramentas que

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cumprem várias funções: relatar; ensinar alguém, seja a usar um aparelho, tomar um

remédio, fazer um bolo; jogar; inventar e narrar histórias; convencer alguém de algo

em que se acredita.

Algumas situações de comunicação estão presentes em nossa vida desde

que nascemos e, por estarmos habituados a elas, não precisam ser ensinadas na

escola; outras, entretanto, por serem mais específicas, mais técnicas, profissionais,

científicas, necessitam de uma aprendizagem escolar. E é o que se ensina com os

gêneros textuais. Conforme afirma MARCUSCHI (2003), “Os gêneros discursivos

contribuem na ordenação e estabilização das atividades de comunicação do

cotidiano, sendo fenômenos históricos e entidades sócio-discursivas que se

caracterizam como eventos textuais maleáveis e dinâmicos.” Certamente a adoção

da abordagem de Bakhtin nos PCN’s e a indicação de alguns gêneros para a prática

de leitura e produção de textos orais e escritos abriram perspectivas para o

tratamento da linguagem como ação social, na medida em que evidenciavam a

necessidade de se desenvolverem com os alunos práticas sociointeracionais

mediadas pela linguagem (seja oral, seja escrita), que iriam instrumentalizá-los para

os usos efetivos de linguagem no seu meio social.

Os gêneros textuais já estão circulando na sociedade antes que o homem

faça uso desse instrumento. Os gêneros são construções sociais históricas; são

maleáveis, dinâmicos, transformam-se e se adaptam às necessidades e atividades

sociais e culturais. Cada gênero tem seu campo predominante de existência, onde é

insubstituível, não suprimindo aqueles já existentes. Cada novo gênero aumenta e

influencia os gêneros de determinada esfera e o seu desaparecimento se dá pela

ausência das condições sociocomunicativas que o engendraram (RODRIGUES,

2005).

Os gêneros textuais são entidades sociodiscursivas e formas de ação social

incontornáveis em qualquer situação comunicativa. Surgem emparelhados a

necessidades e atividades socioculturais, bem como na relação com inovações

tecnológicas, o que é facilmente perceptível ao se considerar a quantidade de

gêneros textuais hoje existentes em relação às sociedades anteriores.

O trabalho com os gêneros textuais, defendido inicialmente por Bakhtin e

mais recentemente por Dolz, Sheneuwly, Marcuschi abrem perspectivas mais

eficazes para o trabalho com a linguagem, pois tem como objeto de ensino as ações

de linguagem e as especificidades que envolvem cada uma e o domínio de como a

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linguagem funciona em diferentes situações de comunicação. Com isso se faz

necessário uma nova prática teórico-metodológica na formação e na ação de

professor. Pois até então, o ensino de Língua Portuguesa continuava fragmentado,

desvinculado da prática social, apresentando resultados pouco animadores, apesar

dos esforços dos professores, os quais eram, quase sempre, desconsiderados

quando se tratava de reestruturar os currículos e diretrizes norteadoras de seu

trabalho em sala de aula. Praticamente não havia espaço ou orientações para

estudos de embasamento teórico capazes de dar suporte às práticas pedagógicas

dos professores e reverter essa situação, que não se restringia apenas ao estado do

Paraná, pois estudiosos, como Antunes (2003), já afirmavam:

A reorientação do quadro até aqui apresentado requer, antes de tudo, determinação, vontade, empenho de querer mudar. Isso supõe uma ação ampla, fundamentada, planejada, sistemática e participada (das políticas públicas – federais, estaduais e municipais – dos professores como classe e de cada professor em particular), para que se possa chegar a uma escola que cumpra, de fato, seu papel social de capacitação das pessoas para o exercício cada vez mais pleno e consciente de sua cidadania (ANTUNES, 2003, p.34).

Então, a partir de 2003, estabeleceu-se, pela Secretaria de Estado de

Educação do Paraná – SEED - uma retomada da discussão coletiva do currículo. A

concepção adotada era de que a reformulação do currículo deveria ser uma

produção social coletiva, construída por pessoas inseridas em determinados

contextos educacionais e sociais, ou seja, uma intervenção a partir de experiências

concretas, vividas, pensadas e realizadas nas escolas da rede estadual de ensino.

Como estratégias para a reformulação do currículo nas escolas públicas do Paraná,

a SEED adotou Seminários de Diretrizes Curriculares, eventos para a elaboração

coletiva das Diretrizes Curriculares Estaduais, a produção dos cadernos das

Diretrizes Curriculares, a reorganização das matrizes curriculares, a organização de

espaços colegiados, a capacitação e atualização dos profissionais da educação, a

elaboração coletiva do Projeto Político Pedagógico e do Plano Estadual de

Educação.

As Diretrizes Curriculares Estaduais de Língua Portuguesa, DCEs, assumem

a concepção de língua como discurso que se efetiva nas diferentes práticas sociais,

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garantindo aos alunos o domínio das práticas socioverbais indispensáveis à vida

cidadã (SILVA, 2007, p.09).

O ensino de Língua Portuguesa focaliza a necessidade de dar ao aluno condições de ampliar o domínio da língua e da linguagem, aprendizagem fundamental para o exercício da cidadania, visto que as práticas de linguagem são uma totalidade e que o sujeito expande sua capacidade de uso da linguagem e de reflexão sobre ela em situações significativas de interlocução (KOCH, 1991, citado em DCEs).

Para Bakhtin (2003), "A riqueza e a variedade dos gêneros de discurso são

infinitas, pois a variedade virtual da atividade humana é inesgotável, e cada esfera

dessa atividade elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, sendo que

a isso denominamos gêneros do discurso”.

Sendo assim, em consonância com essa teoria, a escola deve conduzir os

alunos ao aprendizado de práticas sociais de leitura e de escrita comuns no seu dia-

a-dia, ou seja, de diversos gêneros textuais existentes na sociedade, não somente

ao aprendizado, mas também ao prazer de ler e escrever e, de forma reflexiva e

participativa, ao exercício pleno de sua cidadania. "É através dos gêneros que as

práticas de linguagem materializam-se nas atividades dos aprendizes."

(SCHNEWVLY & DOLZ, 2004).

É preciso que a escola seja um espaço que promova, por meio de uma gama

de textos com diferentes funções sociais, o letramento do aluno e que as práticas

discursivas promovidas nesse espaço abranjam, além dos textos escritos e falados,

a integração de linguagem verbal com outras linguagens. Mas, para que essa prática

seja realizada com propriedade, é necessário ampliar o conceito de texto, o qual

envolve não apenas a formalização do discurso verbal ou não-verbal, mas o evento

que abrange o “antes” e o “depois”. De acordo com Bakhtin (1999), o texto ocorre

em interação, e por isso mesmo, não é compreendido apenas em seus limites

formais. Para Adam (1992), o texto é apontado como um objeto circundado e

determinado pelo discurso e que os componentes textuais existem em

função/decorrência das práticas sociais de linguagem, ou seja, a materialização de

uma ação.

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Desta forma, temos que um texto não é um objeto fixo num dado momento no

tempo, ele lança seus sentidos no diálogo intertextual, é sempre uma atitude

responsiva a outros textos, estabelecendo relações dialógicas. Na visão de Bakhtin

(1992), “mesmo enunciados separados um do outro no tempo e no espaço e que

nada sabem um do outro, se confrontados no plano de sentido, revelarão relações

dialógicas”.

De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs 2009), “no

processo de ensino-aprendizagem, é importante ter claro que quanto maior o

contato com a linguagem, nas diferentes esferas sociais, mais possibilidades se tem

de entender o texto, seus sentidos, suas intenções e visões de mundo”.

Portanto, no âmbito escolar, deve-se ter em mente que compreender e

produzir textos são atividades humanas que implicam dimensões sociais, culturais e

psicológicas e mobilizam todos os tipos de capacidades de linguagens. É real que

ler e escrever são atividades básicas e importantes para todo cidadão. A primeira,

segundo Solé (1998), significa compreender e interpretar textos escritos de diversos

tipos com diferentes intenções e objetivos, contribuindo de forma decisiva para a

autonomia das pessoas. E ainda, de acordo com os PCNs, tal atividade é um ato

dialógico, interlocutivo que envolve demandas sociais, históricas, políticas,

econômicas e ideológicas. Pois, ao ler, o indivíduo envolve as suas experiências, os

seus conhecimentos prévios, a sua formação familiar, religiosa, cultural, enfim, as

várias vozes que o constituem. Solé (1998) afirma que “sendo a leitura um processo

de interação entre o leitor e o texto, é necessário que neste processo existam

objetivos que guiem tal leitura, pois é o leque de objetivos e finalidades que faz com

que o leitor se situe perante o texto”.

Na sequência, a segunda atividade de acordo com os PCNs (2009), leva em

conta a relação entre o uso e o aprendizado da língua, sob a premissa de que o

texto é um elo de interação social, sendo uma forma de atuar, de agir no mundo,

permitindo o acesso às formas de socialização mais complexas da vida cidadã. A

escrita é uma ferramenta de comunicação e de guia para os alunos compreenderem

melhor o funcionamento da língua. Ela mobiliza o pensamento e a memória, um

auxílio para a reflexão, uma forma de regular comportamentos humanos. Sem

conteúdos nem ideias, o texto será vazio e sem consistência.

Ainda segundo as DCEs (2008, p. 31), é papel da escola formar alunos

leitores e produtores de textos, construindo assim cidadãos críticos, uma vez que

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“ler é familiarizar-se com diferentes textos produzidos em diferentes práticas sociais

– notícias, crônicas, piadas, poemas, artigos científicos, ensaios, reportagens,

propagandas, informações, charges, romances, contos, etc”.

Portanto, o que se propôs aqui é que o aluno compreendesse o mecanismo

da leitura e que fosse capaz de usá-lo como instrumento auxiliar no seu crescimento

pessoal e utilizasse esse conhecimento como elemento de participação social,

compreendendo a leitura como uma possibilidade de serem estabelecidas relações

entre a sala de aula e a sociedade.

Por isso, com base em todas essas definições, propus trabalhar o gênero

“artigo de opinião”, por ser uma materialidade textual repleta de vozes sociais e que

abordam temáticas polêmicas, possibilitando aos alunos afirmar-se, posicionar-se e

defender seu ponto de vista por meio de argumentos consistentes e convincentes,

desenvolvendo-lhe o senso crítico e o poder da argumentação.

Nesse gênero o autor tem a intenção de convencer outras pessoas sobre uma

determinada questão polêmica, sobre a qual ele tem uma opinião. E que, além de

promover o desenvolvimento da competência linguística e discursiva dos alunos, o

gênero Artigo de opinião, aponta-lhes formas de participação social, as quais

poderão contribuir para a formação de um cidadão leitor e usuário consciente da

língua. Desta forma, o aluno apropria-se do conhecimento a partir de uma visão

crítica da realidade e, de posse desse conhecimento possa atuar em diferentes

situações de interlocução.

Para isso, as ações deste projeto se pautaram em um conjunto de atividades

planejadas de maneira sistemática em torno do referido gênero textual, a sequência

didática, com intuito de possibilitar ao educando leituras críticas e produções orais e

escritas, bem como a reflexão e o uso da linguagem em diferentes situações,

priorizando as práticas sociais. Tiveram como base de estudo a argumentação, o

convencimento, a defesa de opiniões e uma extraordinária oportunidade de se lidar

com a língua oral e escrita em seus mais diversos usos autênticos do dia-a-dia.

3 Implementação da proposta de intervenção na escola

3.1 Métodos, resultados e discussões dos resultados

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As Diretrizes Curriculares Estaduais de Língua Portuguesa, DCEs, assumem

concepção de língua como discurso que se efetiva nas diferentes práticas sociais,

garantindo aos alunos o domínio das práticas socioverbais indispensáveis à vida

cidadã. Sendo assim, a escola deve conduzir os alunos ao aprendizado de

práticas sociais de leitura e de escrita comuns no seu dia-a-dia, ou seja, de diversos

gêneros textuais existentes na sociedade, não somente ao aprendizado, mas

também ao prazer de ler e escrever e, de forma reflexiva e participativa, ao exercício

pleno de sua cidadania. "É através dos gêneros que as práticas de linguagem

materializam-se nas atividades dos aprendizes." (SCHNEWVLY e DOLZ, 2004).

Como toda produção de um texto e sua leitura acontece em condições

determinadas por diversos fatores histórico e sociais, ganha sentido afirmar que os

gêneros textuais são constituídos socialmente. Em outras palavras, as atividades

discursivas estão sempre em relação aos contextos em que ocorrem. Apesar disso,

a noção textual usualmente presente nas escolas empobrece o trabalho com a

leitura/escrita pelo fato de tratar de maneira idêntica qualquer texto,

desconsiderando suas especificidades e intenções.

Na escola, o texto é apresentado como um produto, ignorando-se, assim, a

dinâmica de seu processo de significação, que inclui a consideração de estruturas,

de conhecimentos prévios partilhados, de múltiplos recursos semióticos, como a

imagem e, ainda, as condições de produção: o contexto, os sujeitos envolvidos

nessa ação de linguagem, as intenções comunicativas, o meio de circulação do

texto.

Para a produção escrita de qualquer texto com circulação social, o aluno

precisa ter a consciência das condições em que o texto é produzido e como circula

na sociedade. É preciso saber reconhecer o gênero a ser utilizado, planejar o que

vai redigir ou falar conforme seus interlocutores e ser capaz de concretizar suas

ideias por meio da escrita (SILVA, 2007, p.10).

Como lembra Antunes (2003), “não existe escrita “para nada,” “para não

dizer", "para não ser ato de linguagem". A escrita varia na sua forma, em

decorrência das diferenças de função que se propõe a cumprir e,

consequentemente, em decorrência dos diferentes gêneros em que se realiza”.

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Desta forma, faz-se necessário que as práticas pedagógicas tenham o texto como

objeto de ensino e como instrumento de interlocução, pois:

Conceber o texto como unidade de ensino-aprendizagem é entendê-lo como lugar de entrada para este diálogo com outros textos, que remetem a textos passados e que farão surgir textos futuros. Conceber o aluno como produtor de texto é concebê-lo como participante ativo desse diálogo contínuo: com texto e com leitores (GERALDI, 2004, p.22).

Diante das noções expostas acima, o trabalho foi desenvolvido no formato

Sequência Didática que, para Schnewly & Dolz, (2004, p.97) “são atividades

planejadas para serem desenvolvidas de maneira sequenciadas, com a finalidade de

tematizar aspectos em torno de um determinado gênero”, que no caso foi o Gênero

Argumentativo Artigo de opinião. Essa forma de encaminhamento objetiva a auxiliar

o aluno a dominar melhor o gênero em estudo.

Para tanto, foi imprescindível o embasamento teórico sobre a concepção

interacionista da linguagem, defendida por Bakhtin (2003) e adotada pelas DCEs e

estudos sobre os gêneros textuais (SCHNEWVLY & DOLZ, 2004; MARCUSCHI,

2003).

Após os estudos realizados e com o referido projeto montado, foi apresentado

durante a Semana Pedagógica de 2011 aos professores da escola como seria

realizada a implementação do projeto, para que os mesmos avaliassem sua

pertinência para as mudanças no ensino de Língua Portuguesa. As atividades

elaboradas na sequência didática foram colocadas em prática durante o segundo

semestre do ano de 2011, aplicadas com 20 alunos da 2ª série do Ensino médio do

Colégio Estadual Itacelina Bittencourt em Cianorte – PR. Os alunos foram orientados

de como aconteceria o desenvolvimento das atividades, como também foi enviado

aos pais um comunicado de autorização da participação de seus filhos, já que a

implementação da proposta pedagógica aconteceria em turno contrário.

3.1.1 Primeiro passo: sondagem inicial dos alunos

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Para iniciarmos o projeto propriamente dito com os maiores interessados, os

alunos, o primeiro passo foi a apresentação de um dos meios em que o gênero

textual aqui em estudo, artigo de opinião, é mais encontrado: o jornal. Os alunos

manusearam os jornais que circulam na sociedade, levados pela professora e

oferecidos pela escola, para se familiarizarem com os mesmos, identificando as

seções presentes.

Após essa primeira atividade e esse primeiro contato com o projeto foram

levantados alguns questionamentos orais, destacando o poder da argumentação.

Algumas das questões levantadas foram: a) Seus pais têm o direito de corrigi-los na

frente de outros? b) Em sua casa suas opiniões são aceitas? c) E com os amigos, a

sua opinião é respeitada? d) A sociedade em si respeita as opiniões dos jovens? e)

O que é necessário para que sua opinião seja respeitada?

Depois de debatermos muito sobre as questões acima levantadas, os alunos

perceberam que nossas opiniões são dadas a todo o momento do dia, desde um

assunto corriqueiro ou até mesmo sobre polêmicas da atualidade e sempre

defendendo nosso ponto de vista sobre o assunto tratado com bases sólidas.

Em seguida foi direcionada aos alunos a seguinte pergunta para uma breve

reflexão: “Hoje, o que é para você um Artigo de opinião?” Muitos demoraram em

responder por que nunca tinham ouvido tal expressão; outros responderam de forma

bem simplista, de forma bem natural como pode ser visualizado na tabela 1 abaixo:

Tabela 1

Nº de alunos Respostas

02 É o que pensa sobre algo.

04 Um espaço onde você coloca sua ideia.

05 Opinião pessoal.

01 E o modo de escolher um assunto e discutir sobre o mesmo.

03 É um espaço em um jornal ou revista onde você pode expressar sua opinião.

02 É um gênero textual.

02 É um artigo que usa temas polêmicos.

01 É a produção de um texto em que o autor expressa sua opinião sobre determinado assunto.

Total 20 alunos

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De posse dessas respostas, pode-se avaliar o quanto os alunos sabiam ou

não sobre o assunto e de que forma poderia se colocar em prática todas as

atividades elaboradas, já que estas foram preparadas com especial atenção para

que despertassem o interesse dos alunos e que também não descuidassem de

questões relevantes da Língua Portuguesa.

3.1.2 Segundo passo: leitura de textos

Após essa preparação, passou-se para a leitura de um texto escolhido pela

professora, que propositalmente foi um artigo de opinião que falava sobre o tema

“trabalho infantil: criança sofre”3. Na sequência foi aplicada uma avaliação

diagnóstica composta de algumas questões referentes ao texto e ao gênero textual

em discussão (ver anexo 1).

Após a leitura feita e discutida, as questões propostas foram feitas de forma

coletiva, com a participação de todos os alunos da turma com o monitoramento da

professora. Algumas perguntas não apresentaram dificuldades para serem

respondidas, outras, geraram opiniões contrárias, o que já era esperado.

O próximo passo foi ampliar o repertório do gênero estudado e

aproximar os alunos desse gênero por meio de uma gama de textos de opinião

oriundos de jornais e de revistas com o objetivo de reconhecimento das principais

características do gênero. Propôs-se leituras, discussões com a função de

proporcionar descoberta de informações sobre os assuntos e o próprio ponto de

vista de cada um dos sujeitos. E depois de feito as leituras e discussões,

selecionamos um dos artigos lidos para responderem oralmente a algumas

perguntas referentes ao gênero (anexo 2).

Percebeu-se que a análise feita em textos de opinião, na escola, é muito

importante para que os alunos possam se familiarizar com seu objetivo comunicativo

e com sua estrutura. O professor exerceu papel fundamental nessa atividade,

guiando a leitura do aluno na análise do conteúdo e das estratégias de estruturação

3 Texto incluso no material da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro. Programa de

parceria entre o Ministério da Educação (MEC), a Fundação Itaú Social e o Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec). Livro Na Ponta do Lápis – ano V – número 11 – agosto de 2009, p.16.

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desse gênero. Coube ao professor aqui, orientar seus alunos com relação aos

aspectos específicos do gênero argumentativo, fazendo com que argumentassem,

opinassem e apontassem soluções de modo a convencer o leitor de seu ponto

de vista. Foi um trabalho que exigiu muito esforço, mas que começava a “dar frutos”.

3.1.3 Terceiro passo: estudo das características

O próximo passo foi apresentar atividades de oralidade, leitura, escrita, por

meio da leitura de textos de opinião para a identificação das características

peculiares desse gênero textual: assunto do artigo, relevância desse assunto, autor,

modo de apresentação do assunto, veículo de publicação do artigo, etc. Depois de

identificadas tais características nos artigos em questão, mostrou-se a eles em forma

de cartaz, algumas características principais de um artigo de opinião (anexo 3).

O processo de leitura e análise descritos acima possibilitou aos alunos o

reconhecimento das principais características do gênero como um texto escrito que

costuma circular em veículos jornalísticos: jornais impressos, revistas, sites de

notícias e traz reflexões a respeito de um tema atual. Essa etapa não foi tão difícil de

ser trabalhada.

3.1.4 Quarto passo: o discurso argumentativo

Uma vez identificadas as principais características dos artigos de opinião, foi

explicado aos alunos a expressão “discurso argumentativo”, qual o valor que a

argumentação podia ter na condução da vida pública de uma comunidade, de uma

cidade, de um Estado ou de um país, bem como no cotidiano das pessoas,

especialmente em situações que “pareciam difíceis”. Aproveitei e lancei a seguinte

pergunta para uma breve reflexão: “O que é uma situação difícil?” Pedi a eles que

anotassem as conclusões a que chegassem e foi feita após um tempo uma

apresentação oral das respostas seguida de discussão coletiva dos resultados.

Nesse momento alguns alunos entraram em contradição, pois o que era uma

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situação difícil para um, não era para o outro. Às vezes até se exaltavam, querendo

que sua opinião prevalecesse.

3.1.5 Quinto passo: levantamento de questões polêmicas

Sentiu-se, então, que era chegado um momento primordial da proposta que

era fazer um levantamento de questões polêmicas que estariam circulando na

sociedade na época. Para tanto, provocou-se um debate oral com os alunos sobre o

que seria uma “questão polêmica” e incitou-se a responder algumas questões

polêmicas pra melhor compreensão do assunto, como: a) A pena de morte ajuda a

diminuir a criminalidade? b) A sociedade tem o direito de tirar a vida de um

criminoso? c) Você concorda com o uso de câmeras nas escolas? d) Quem

consome drogas também deve ser responsabilizado pela violência do narcotráfico?

e) As vantagens que a internet proporciona compensam os problemas que ela pode

provocar? Essas e outras questões polêmicas foram importantes de serem

discutidas para que os alunos percebessem que, uma questão polêmica capaz de

motivar a escrita de um artigo de opinião, envolve, necessariamente, um assunto de

interesse público.

3.1.6 Sexto passo: tipos de argumentos

Considerando que o gênero textual artigo de opinião trata de temas

polêmicos, dando enfoque a problemas sociais, foi levado ao conhecimento dos

alunos, por meio de explicação e exemplificação, os argumentos de autoridade, de

exemplificação, de provas, de princípio ou crença pessoal, de causa e

consequência. Fez-se uma leitura comentada desses argumentos e a importância

de reconhecimento de cada um e em seguida organizou-se a classe em duplas para

a leitura de um texto retirado do material de uma coletânea artigos de opinião da

Olimpíada de Língua Portuguesa que tratava do tema da violência escolar “Menino

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de 9 anos é internado após agressão em escola”4. As coletâneas foram

distribuídas para as duplas e solicitou-se aos alunos que identificassem o argumento

central do texto e, com base nos tipos de argumentos citados acima classificá-los.

Os alunos foram auxiliados pelo professor por meio de perguntas como: a) A que

área (educação, política, ciência, economia etc.) o artigo e seus argumentos estão

associados? b) Qual o tipo de argumento que foi utilizado neste texto? c) Há alguma

indicação no texto para essa resposta?

Para reforçar essa questão do uso dos argumentos, foi proposta aos alunos

uma atividade com o intuito de ser instigante. Foi escrito em tiras de papel algumas

situações e as respectivas polêmicas levantadas, as quais foram distribuídas entre

os alunos para que desenvolvesse o olhar crítico e a capacidade argumentativa dos

mesmos (anexo 4).

Logo após uma breve discussão sobre as situações citadas, dividiu-se a sala

em dois grupos: de um lado, os alunos que deveriam tomar posição favorável; do

outro, aqueles que assumiriam posição contrária. Ao final, representantes de ambos

os lados leram a posição assumida diante da questão polêmica e os argumentos

elaborados para defender a posição e refutar a contrária. Foi uma atividade que

trouxe grande polêmica em sala, pois ainda não tinham aprendido a aceitar as

diferentes opiniões sobre um mesmo assunto, mesmo que contrárias à sua.

3.1.7 Sétimo passo: elementos articuladores

Nessa etapa fez-se necessário trabalhar alguns dos aspectos linguísticos

desse gênero textual. Essa atividade teve como objetivo orientar os alunos a

conhecer os elementos articuladores e a usá-los apropriadamente. Foi fornecida a

eles uma relação5 desses elementos articuladores com suas respectivas expressões

para o conhecimento dos mesmos e logo após uma tabela de atividades6, tabela

4 Texto retirado do material da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro – Coletânea

Artigos de Opinião, p.11. 5 Relação retirada do material da Olimpíada de Língua Portuguesa – Pontos de Vista- 2ª edição,

2009, p.42. 6 Tabela retirada do material da Olimpíada de Língua Portuguesa – Pontos de Vista- 2ª edição, 2009,

p.41.

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esta que foi recortada conforme as instruções e montado em conjunto completo em

envelopes.

A sala foi dividida em grupo de três alunos e foi proposto um jogo mediante os

conjuntos em envelopes formados. Foi entregue para os alunos os envelopes para

que montassem as frases contidas no envelope, ressaltando a função dos

elementos articuladores, conforme tabela discutida. Alguns alunos tiveram

dificuldades, sendo necessário a intervenção do professor para um melhor

entendimento da tarefa. Quando todos terminaram, foi pedido que lessem em voz

alta as frases montadas. Em resultado, percebeu-se que o conteúdo não havia sido

assimilado muito bem e foram elaboradas mais atividades referentes ao assunto nas

quais se procurou deixar clara a importância dos elementos articuladores nos textos

de opinião. Em nenhum momento foi priorizado o conhecimento gramatical puro,

mas sim, sua real função nesse gênero textual, mostrando-lhes que o conteúdo e a

forma são interdependentes.

3.1.8 Oitavo passo: vozes no artigo de opinião

A proposta a seguir, foi mais uma leitura de um texto para que os alunos

percebessem que um artigo de opinião costuma trazer diversas “vozes”. Essa

atividade iniciou-se perguntando aos alunos o que significava para eles a expressão

“vozes em um artigo de opinião”. Houve um momento para reflexão sobre a

questão em si e para um entendimento plausível do referido conteúdo foi

apresentado um texto retirado do material da Olimpíada de Língua Portuguesa

(Escrevendo o Futuro-Coletânea Artigos de Opinião, p.8) que discute o poder da

notícia. “Só há notícia se for muito ruim” de Carlos Brickmann7.

Antes de iniciar a leitura, o professor preparou os alunos oferecendo algumas

pistas sobre o texto que leriam, de modo que pudessem fazer inferências. Quanto

mais um leitor conhece o assunto que vai ler, melhor condição terá para construir os

7 Carlos Brickmann é jornalista e diretor do escritório Brickmann & Associados Comunicação,

especializado em gerenciamento de crises. Tem reportagens assinadas nas edições especiais de primeira página da Folha de S. Paulo e do Jornal da Tarde.

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sentidos do texto, ou seja, sua finalidade do texto, as diferentes vozes presentes, a

função do título, o suporte do artigo, o autor.

A leitura foi feita em grupos para que, juntos, pudessem perceber no texto as

diferentes vozes. Uma dica foi grifar os trechos que continham os elementos que

ajudassem a responder às perguntas abaixo. Foi uma boa estratégia de

aprendizagem (anexo 5). Para finalizar essa atividade, um representante de cada

grupo leu para a classe as conclusões elaboradas, cabendo ao professor promover

uma discussão coletiva a esse respeito.

3.1.9 Nono passo: o jogo da argumentação

Após todo esse caminho percorrido em busca da compreensão da

organização textual do gênero artigo de opinião, neste momento fez-se necessário

uma verificação do que se aprendeu até então. Para isso foi proposto um jogo,

retirado do material da Olimpíada de Língua Portuguesa chamado “Q.P. Brasil -

Questões Polêmicas do Brasil – o jogo da argumentação.8 O jogo traz temas atuais,

veiculados pela mídia e que podem gerar polêmicas. O material deste jogo procura

auxiliar na reflexão e na construção de argumentos. É certo de que a utilização de

jogos educativos no ambiente escolar traz muitas vantagens para o processo de

ensino e aprendizagem.

O jogo proposto aqui se destinou a alunos do Ensino médio e trouxe questões

da atualidade. O objetivo do jogo era o de apresentar argumentos, contrários ou

favoráveis, em relação às questões polêmicas. Uma boa utilização de argumentos

garantiria maior número de pontos. Venceria o jogo quem fizesse mais pontos.

A sala deveria ter sido dividida em três grupos de 4 a 7 participantes, mas

como a adesão a este dia foi um número limitado de alunos, se tornou quase

impossível a realização do jogo em seu forma real. O que pode ser feito foi conhecer

as etapas do jogo e responder questões polêmicas do próprio jogo, aproveitando os

8 Q.P. Brasil – Questões Polêmicas do Brasil – é um dos materiais da Olimpíada de Língua

Portuguesa – Escrevendo o Futuro, cujo objetivo é desenvolver a capacidade de argumentação nos estudantes do Ensino médio. Disponível em < www.escrevendoo futuro. org.br> ou <www.cenpec.org. br>.

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poucos alunos presentes. Sabendo-se da importância do jogo para a qualidade da

implementação, retomou-se o jogo num outro momento com a sala, mas após o

término da implementação pedagógica e o resultado não pode ser apresentado no

presente artigo.

3.1.10 Décimo passo: jornal mural

Após as várias abordagens do assunto em sala de aula, percebeu-se que os

alunos já eram capazes de executar atividades individualmente. Portanto, foi

proposto nessa etapa que se fizessem pesquisas sobre temas atuais que gerassem

polêmicas. Essas pesquisas foram feitas em jornais, revistas, internet e foram

trazidas para a sala de aula para a produção de um jornal mural, que foi afixado na

entrada da escola, funcionando assim, como um porta voz eficiente das múltiplas

opiniões que se confrontam dentro da escola. A dificuldade nessa atividade foi

colher essas notícias polêmicas, pois eles sempre esqueciam de trazer. Precisou-se

de um dia de período normal das aulas de Português para que fossem até a Sala de

Informática para fazerem a pesquisa pedida. Desta maneira, obteve-se o resultado e

foi possível montar o Jornal Mural, o qual chamou muito a atenção de todos da

escola.

3.1.11 Décimo primeiro passo: produção e reestruturação textual

De posse de todo esse conhecimento do gênero artigo de opinião, passou-se

para a produção textual. Coletivamente fez-se a escolha de um assunto atual

resultado de entrevistas feitas com personalidades da cidade de Cianorte: Pedágio-

PR 323, assunto que estava no auge na época. A partir daí, foi levado para a sala de

aula, jornais, revistas, artigos tirados da internet, a fim de buscar mais informações

sobre o assunto. Os alunos entrevistaram os pais, vizinhos, vereadores,

comerciantes, para colher suas opiniões com o intuito de enriquecer as próprias

opiniões. Dos vinte alunos que participaram da proposta pedagógica, 15 alunos

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iniciaram a produção textual em casa e a trouxeram na outra aula para uma possível

correção. A correção foi feita coletivamente por meio de uma tabela com algumas

questões (anexo 6).

A partir deste trabalho, os alunos começaram com a reestruturação do texto.

Alguns tiveram que refazer o texto todo, outros apenas alguns itens. O professor

ficou à disposição em todo o momento para ajudá-los no que fosse preciso. Houve

certa dificuldade sobre como poderiam interferir no texto, fazendo as mudanças

necessárias, pois os alunos apresentaram oralmente dificuldade na produção e

muitas dúvidas na reescritura do texto. Essa questão é importante, pois mostra o

momento em que os alunos tomam consciência de suas dificuldades e buscam

corrigi-las e aperfeiçoam em consequência sua escrita. Para alguns alunos foi

necessário apontar o que deveria ser mudado. Mas, em nenhuma intervenção foi

feita mudança por iniciativa do professor. Este trabalho durou quatro aulas, o que fez

com que dos 15 alunos que iniciaram a produção textual, apenas 10 persistiram até

a produção final. Mas mesmo assim, a proposta pedagógica atingiu seus objetivos

básicos previstos e que foi possível observar o quanto a intervenção do professor

nessa etapa final da produção é importante e necessária, seja orientando,

explicando ou mesmo aguardando, estrategicamente, que o aluno reconheça a

importância de sua atuação na produção e revisão textual, pois:

O ideal é que se crie, com os alunos, a prática do planejamento, a prática do rascunho, a prática das revisões, à maneira que a primeira versão dos seus textos tenha sempre um caráter de produção provisória, e os alunos possam viver, uma coisa natural. A experiência de fazer e refazer seus textos, tantas vezes forem necessárias, assim como fazem aqueles que se preocupam com a qualidade do que escrevem (ANTUNES, 2003, p.65).

Ao término deste trabalho, as produções deveriam ser publicadas no jornal

local, mas as atividades da proposta de intervenção tiveram que ser aceleradas no

final, devido aos prazos exigidos para a entrega de notas, conselhos de classe e

fechamento do bimestre. Apesar de estas serem atividades rotineiras de toda

escola, acabaram por interferir, indiretamente, no processo metodológico do projeto.

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No entanto, as produções finais foram lidas para a sala toda e recolhidas para um

aproveitamento posterior.

4 Conclusão

Algumas questões, frutos da experiência em sala de aula, depois de anos de

docência, foram o mote para o desenvolvimento desse trabalho. Ao chegar ao

Ensino médio, o professor espera que o aluno já tenha certo domínio de leitura e de

escrita de textos, pois ele teve (ou pelo menos deveria ter tido) todo conhecimento

básico nas séries do Ensino Fundamental. Porém, o professor se depara com um

grave problema: este aluno não atende a essas expectativas de aprendizagem.

Deve-se ter a consciência de que algo tem que ser feito daí para frente,

procurar soluções para que essas dificuldades sejam amenizadas. Sendo assim,

cabe à escola, especialmente a disciplina de Língua Portuguesa, habilitar os

educandos a compreender não só o universo alfabético do texto escrito, mas

também a singularidade de cada repertório comunicacional. Faz-se necessário

prepará-los para expressar-se com coesão e coerência nas diversas situações de

interlocução. “E acreditando que, mesmo no Ensino médio, ainda é possível

estimular o pensamento conceitual do aluno, aprimorar sua escrita, criar novos

caminhos que amenizem as falhas da escrita e não tê-lo como um “produto pronto e

acabado” que não precise mais de estímulos” (SILVEIRA, 2007, p.26), desenvolveu-

se esse trabalho cujo principal objetivo foi o de repensar a metodologia de ensino da

Língua Portuguesa utilizando as teorias e estudos realizados acerca dos Gêneros

Textuais, em especial o Gênero Argumentativo Artigo de opinião, por meio de

uma perspectiva sociointeracionista da linguagem. Com essa nova metodologia,

esperava-se que o aluno conseguisse perceber-se como sujeito de seu próprio

discurso, ou seja, que fosse capaz de ampliar sua interação com o outro por meio de

atividades que reproduzissem na escola contextos sociais nos quais a linguagem

fosse um fator determinante.

Diante do que se vem estudando para o ensino da língua, relativamente à

oralidade, à leitura e à escrita, pode-se dizer que, para o estudo de gêneros

discursivos conforme estabelecido pelas Diretrizes Curriculares da Educação Básica

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(2008), os textos de esfera jornalística constituem-se como formas eficientes de

conduzir o aluno à compreensão das características peculiares de cada texto.

Textos de opinião, conforme proposto, permitem que os alunos interajam entre si,

discutam ideias, refutem opiniões, estabelecendo assim a relação entre as

atividades de sala de aula e as práticas sociais da linguagem. O trabalho realizado

com esse Gênero Argumentativo conseguiu atingir, de forma bastante satisfatória,

os objetivos propostos. A metodologia utilizada, que foi a sequência didática,

despertou o interesse dos alunos durante todo o transcorrer das atividades; a

aproximação com textos com os quais eles têm contato socialmente facilitou o

processo ensino-aprendizagem, uma vez que houve uma nova visão sobre o que é

produzir textos. Foi possível perceber também com esse trabalho, que o aluno ao

saber para que e para quem escreve, cria-se um nível de consciência discursiva

maior que refletirá em sua produção.

A revisão e a reestruturação de texto foi um procedimento que os

surpreendeu muito, já que estavam acostumados a escreverem somente para o

professor corrigir. Cabe salientar aqui que, em momento algum, percebeu-se que

todos os alunos que participaram do projeto atingiram o nível desejado pelas

atividades propostas, mas que, mesmo com muitas dificuldades de aprendizagem,

houve um aprimoramento intelectual e a formação de um sujeito capaz de modificar

a sua história.

Sem sombra de dúvidas, alguns fatores dificultaram um pouco o andamento

do trabalho: o fato de exigir-se do professor um exaustivo rol de tarefas intercaladas

para cumprir as duas atividades: as atividades relacionadas à Proposta de

Intervenção do PDE e as atividades normais da escola (inclusive na turma escolhida

para a intervenção) e o fator tempo, que fez com que as últimas atividades da

proposta de intervenção precisassem ser aceleradas, devido aos prazos exigidos.

Contudo, apesar das dificuldades encontradas, os resultados obtidos com o

trabalho foram bastante motivadores. Na turma onde a proposta foi implementada

percebeu-se uma mudança de postura dos alunos diante da leitura, do interesse

pela busca de informações mais precisas sobre os temas abordados e da

consciência da necessidade de conhecer bem o assunto para poder formar sua

própria opinião sobre o mesmo e aceitar a opinião do outro.

Diante disso, é possível acreditar que ensinar línguas pode se tornar mais

significativo mediante o trabalho com os gêneros textuais, pois transforma o aluno

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num usuário consciente e eficaz da língua materna. A sistematização desse trabalho

também levou o aluno a compreender como que linguagens e ideologias se

articulam, e como as próprias ideias precisam ser organizadas na constituição de um

texto.

Portanto, com o resultado obtido por meio dessa proposta, deve-se acreditar

que ensinar Língua Portuguesa por meio do trabalho com Gêneros Textuais, em

especial o Gênero Argumentativo Artigo de opinião, aplicando a metodologia

sociointeracionista da linguagem, permitiu ao aluno perceber que é fundamental

dominar a língua materna para fazer dela um dos mais relevantes instrumentos de

inserção social.

Pode-se então, mediante a conclusão positiva deste trabalho, concluir que há

um trabalho a ser realizado pelo professor de Português no sentido de planejar suas

aulas de forma a tornar claras para os alunos as especificidades dos processos de

produção dos diversos gêneros textuais escritos e orais, além de criar oportunidades

nas quais os alunos possam exercitar sua sensibilidade linguística e sua capacidade

de reflexão sobre a língua.

O trabalho deu-se de forma a orientar todas as ações para um ponto comum

e relevante: conseguir ampliar as competências discursivo-interacionais dos alunos,

ou seja, capacitá-los para o exercício fluente, adequado e relevante da linguagem

verbal, oral e escrita. Como bem observa Antunes (2003, p. 37):

Sentimos na pele que não dá mais para tolerar uma escola que, por vezes, nem sequer alfabetiza (principalmente os mais pobres) ou que, alfabetizando não forma leitores nem pessoas capazes de expressar-se por escrito, coerente e relevantemente, para, assumindo a palavra, serem autores de uma nova ordem das coisas. É, pois, um ato de cidadania, de civilidade, da maior pertinência, que aceitemos, ativamente e com determinação, o desafio de rever e de reorientar a nossa prática de ensino da língua.

Um último aspecto a ser descrito foi a importância como ferramenta pedagógica que

o projeto proporcionou ao professor proponente com a utilização do material da

Olimpíada de Língua Portuguesa. Recebeu-se convites para o seminário “Escrita

sob foco: reflexão em várias vozes “, que aconteceu em Brasília, no mesmo ano,

para professores de Língua Portuguesa do país, onde foi feita uma breve

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demonstração do referido projeto. Seminário que foi de grande valia para o

professor, pois contribuiu para a ampliação do conhecimento e aprimoramento do

ensino da leitura e da escrita. E, uma outra oportunidade de participar de um

encontro de formação em Curitiba, também da Olimpíada de Língua Portuguesa,

que mais uma vez trouxe enriquecimento para a prática pedagógica.

No entanto, apesar de o público alvo desta proposta ter sido o aluno,

percebeu-se, com todos esses acontecimentos, que a implementação da mesma

contribuiu para o aprimoramento intelectual e o crescimento pessoal de todos os

envolvidos, tanto aluno quanto professor.

REFERÊNCIAS

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GERALDI, João W. O texto na sala de aula. São Paulo: Ática, 2004.

MACHADO, Daniela Zimmermann. Estudo do Gênero na Perspectiva do

Interacionismo Sócio discursivo. 2006. Tese (Mestrado em Linguística)

Universidade Federal de Santa Maria, RS.

MARCUSCHI, L.A. Gêneros textuais & Ensino. In DIONISIO, Ângela Paiva;

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MEURER, J.L.; BONINI, Adair; ROTH, Desirée Motta. Gêneros: teorias, métodos,

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PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes Curriculares da

Educação, 2009.

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SOLÉ, Isabel. Estratégias de leitura. 6ª Ed. Porto Alegre: ArtMed, 1998.

VYGOTSKY, Liev. Et. al . A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes,

1984.

Anexos:

Anexo 1

Tal avaliação consistiu em algumas perguntas:

1. Num artigo de opinião, o autor...

a. Toma posição sobre uma questão polêmica.

b.Enumera problemas da comunidade

c. Relata experiências do dia a dia.

d. Divulga um fato.

2. Para convencer o leitor de seu ponto de vista, o autor deve trazer

para o texto a opinião dos adversários. Em “Criança sofre” há discussão entre

opiniões contrárias?

a. Sim, aparece quando o autor denuncia um sério problema e reforça essa

posição com bons argumentos.Sim, no trecho “Criança tem que brincar, estudar e

esperar chegar à fase adulta para trabalhar.”

b. Há, mas deve ser ampliada por meio de pesquisas, entrevistas, porque no

texto foram apenas citadas”Hoje existe o Programa Bolsa Escola, Peti e outros, que

dão oportunidades de estudar sem trabalhar”, sem trazer as opiniões dos que são a

favor dos programas sociais do governo.

c. Há o testemunho, autoridade construída pela experiência vivida.

d. Sim, no trecho “Criança tem que brincar, estudar e esperar chegar à fase

adulta para trabalhar.”

3. Como o trecho abaixo poderia ser aprimorado?

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“[...] pois o cansaço maltrata a mente e não conseguimos aprender com

facilidade, bloqueando assim muitas coisas que poderiam fluir diante das

consequências que aparecem”.

a. Use expressões diferentes para introduzir a conclusão como: “então”,

“assim”, “portanto”.

b. Explique melhor para o leitor o que quis dizer no trecho sublinhado.

c. Reforce a posição do autor com argumentos mais consistentes.

d. Verifique se a pontuação está correta.

4. Ao escrever um artigo de opinião, o autor emite seu ponto de vista e...

a. Publica-o em jornais e revistas mantendo neutralidade.

b. Desenvolve a capacidade de narrar os fatos.

c. Procura não influenciar o leitor com suas opiniões.

d. Incorpora a seu discurso a fala de outras pessoas que já se pronunciaram

a respeito do tema, valorizando-a ou desqualificando-a.

5. No texto “Criança sofre”, o objeto de crítica do autor é:

a. A dificuldade de aprender.

b. O clima da região que é árido.

c. A crise cultural.

d. O trabalho infantil e os projetos sociais do governo.

6. Identifique o trecho do texto “Criança sofre” que revela a questão

polêmica, a denúncia do problema, o ponto de vista do autor.

a. “O mundo não é tão competente como deveria ser, pois desde pequeno eu

e alguns colegas meus dávamos um duro danado nas cerâmicas da minha cidade.”

b. “[...]vontade de estudar de verdade, de saber resolver todos os problemas

que aparecessem, até mesmo os de matemática.”

c. “O barro molhado exposto ao sol quente da região causava um grande mal-

estar.”

d. “Só que as famílias continuam vivendo miseravelmente e precisando da

ajuda dos filhos para sobreviverem, pois mais importante do que esses programas

do governo seria um emprego digno com salário justo para os pais dessas crianças,

inclusive o meu.”

7. Onde esse tipo de texto pode ser reconhecido?

a. Em revistas.

b. Em jornais.

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c. Na televisão.

d. Em livros.

8. Em nossa sociedade, quem pode escrever esse gênero textual? (não o

nome da pessoa/autor, mas sua função social)

9. Qual a real função desse gênero textual?

10. Você já leu ou lê esse gênero? Relate em que situação ou situações.

11.Retire do texto frases ou expressões que servem para:

a. indicar opinião

b. apresentar argumentos

c. apresentar contra argumentos ou a ideia da qual o autor não concorda.

Anexos 2

1. Em que veículo o texto foi publicado?

2. É bastante conhecido do público?

3. Que tipo de autor o escreveu?/ Além do nome, há mais informações sobre

ele?

4. Qual é o assunto principal abordado no texto?

5. É atual ou ultrapassado em relação à data da publicação?

6. Parece relacionado a alguma notícia do mesmo período?

7. Para que tipo de leitor o artigo se dirige?

8. Com qual objetivo esse assunto é abordado?

9. Que ideia o autor parece defender?

10. Quais são os argumentos utilizados pelo autor?

Anexo 3

1) costumam circular em veículos tipicamente jornalísticos e de grande

penetração popular: jornais impressos, revistas, sites de notícias etc.;

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2) geralmente são escritos por especialistas num determinado assunto,

pessoas publicamente reconhecidas por suas posições, autoridades etc.;

3) abordam assuntos e/ou acontecimentos polêmicos atuais, recentemente

noticiados e de interesse público;

4) dirigem-se a um leitor que o jornal considera potencialmente envolvido no

debate, na qualidade de cidadão;

5) têm como finalidade defender uma opinião ou tese, a qual é apresentada

com base em argumentos coerentes.

Anexo 4

SITUAÇÃO 1 –

Uma adolescente, para resolver os problemas econômicos da família dela,

resolveu se prostituir, fazendo programas à noite. Ela consegue clientes todas as

noites e ajuda a família a pagar algumas contas.

QUESTÃO POLÊMICA: “A jovem tem ou não o direito de se prostituir para

ajudar a família, desconsiderando a ética moral?”.

SITUAÇÃO 2 –

Novas pesquisas indicam que os adolescentes começam a beber cada vez

mais cedo e de forma abusiva. Preocupado com esse consumo de álcool, o prefeito

de uma cidade proibiu a venda de bebidas alcoólicas em bares próximos às escolas.

QUESTÃO POLÊMICA: “Essa medida pode diminuir o consumo de bebidas

alcoólicas pelos adolescentes?”.

SITUAÇÃO 3 –

Uma diretora de escola proibiu a entrada de alunos com bonés em sala de

aula.

QUESTÃO POLÊMICA: “É legítimo impedir o acesso à escola por essa

razão?

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Anexo 5

a. Qual é a posição do articulista sobre a questão?

b. Toda a argumentação é construída com informações cujas fontes ou são

mencionadas ou estão subentendidas. Em todos esses casos há muitas vozes

aliadas ao articulista. Pedir aos alunos que identifiquem algumas delas.

c. Ao longo do artigo, o articulista se refere ora à imprensa de circulação

restrita, ora à grande imprensa. Em que trechos do texto cada uma delas aparece?

d. Nos dois últimos parágrafos o autor do artigo se dirige ao leitor por meio de

perguntas e de propostas de ação concreta. Pedir aos alunos que identifiquem as

expressões que se referem ao leitor e a proposta que o articulista faz a ele.

Anexo 6

1 O título é sugestivo?

2 O artigo traz uma questão polêmica?

3 O autor anuncia sua posição?

4 Os argumentos usados são consistentes?

5 O texto está bem estruturado?

6 Usa outras vozes sociais?

7 Usou os elementos articuladores para introduzir argumentos?

8 Apresenta erros de ortografia, concordância e pontuação?

9 O parágrafo final encerra o tema de maneira conclusiva?

10 O autor convence o leitor do seu ponto de vista?