o ensino sobre o batismo

40
O ENSINO SOBRE O BATISMO. POR KARL BARTH TRAD DANIEL SOTELO

Upload: dmsot3045

Post on 11-Dec-2015

221 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: o Ensino Sobre o Batismo

O ENSINO SOBRE O BATISMO.

POR KARL BARTH

TRAD DANIEL SOTELO

Page 2: o Ensino Sobre o Batismo

I

O batismo cristão é, na sua essência, a imagem da renovação do homem devida à sua participação, pelo poder do Espírito Santo, na morte e ressurreição de Jesus Cristo; e é portanto, também a imagem daquilo que em si é executado pelo Testamento da Graça, e pela Comunhão da sua Igreja que nele são cumpridos e realizados.

A palavra grega bapizein e o termo alemão “taufen” de “Tiefe”, originalmente, e com propriedade, descrevem o processo pelo qual um homem ou um objeto é completamento imerso em água e novamente retirado. Desta maneira, o significado primitivo da palavra, quando o batismo era realizado tinha, precisamente como na circuncisão do Velho Testamento, o caráter de um perigo eminente de vida que é seguido pela prometida reabilitação e preservação que se dá logo a seguir, na “emersão do batismo”. Seria difícil negar que o batismo por imersão, realizado mesmo no ocidente, até tarde na Idade Média, como símbolo, era muito mais significativo na sua representação do que quando passou a ser uma infusão, especialmente depois desta ter passado a uma simples aspersão e finalmente, na prática, a um simples humedecer com o mínimo possível de água, tornando-se absolutamente inócuo. Quem pensaria que Paulo, em I Coríntios 10: 1 ss, viu a prefiguração de tal batismo, em tão crítico evento como foi a passagem dos israelitas pelo Mar Vermelho? Podemos realmente concordar com Lutero em que seria interessante dar a um tal acontecimento, tão completo e rico de significado, um símbolo também completo e expressivo: sicut et institutum sine dubio a Cristo.

Permanecerá como último argumento, que “facilidade de administração”, saúde e conveniência seriam razões suficientes para proceder de outra maneira, ou voltaremos a um cristianismo cuja vigorosa imaginação já não se deixará satisfazer pela inofensiva forma atual de batismo nem tão pouco por outras fraquezas do cristianismo moderno? No entanto o batismo não seria uma necessidade para salvação de qualquer maneira, mesmo em Lutero. Assim, até mesmo Lutero, não considerou que a forma original do batismo fosse uma necessidade para a salvação. Foi, por essa razão, contra todos aqueles que desejavam fazer deste assunto uma simples questão de fé porque, historicamente, enquanto que bapizein também significa em realidade, aspergere afusão, aspersão - embora uma forte aspergere! - Embora se possa, pelo menos, levantar a pergunta em algumas passagens do Novo Testamento (por exemplo, no caso do batismo dos três mil no dia de Pentecostes) que forma exterior de batismo é ali considerada. Por certo, logo depois do período apostólico, pelo menos no caso do batismo de doentes (o chamado batismo clinicorum), a forma original foi, por vezes modificada, nas tais mudanças não alteram o fato de que é impossível compreender o significado do batismo se não estiver claro que o batismo representa um perigo de morte e preservação de vida; e, portanto, nada na prática do batismo é de se considerar certo ou errado, pois ele é a representação dum tal processo sem depender do grau de exatidão com que o faz.

Então, aquilo que o batismo, de acordo com o texto básico do Novo Testamento em Romanos 6: 3 ss reproduz, é a realidade cuja sombra e luz recai sobre o homem no acontecimento do batismo. Trata-se de um evento profundamente dramático: Sua participação na morte e ressurreição de Jesus Cristo. Ali e então, no ano 30, fora dos portões de Jerusalém, na cruz do Gólgota, não somente Jesus Cristo mas, com Ele, também aquele homem, morre eternamente e, no jardim de José de Arimatéia, não somente Jesus Cristo mas, com Ele, também aquele homem ressurge da morte para a eternidade, e isto não só relativamente aos seus pecados nem à sua situação de pecador mas, na realidade, a ele mesmo como sujeito que encontrou, então e ali, a sua morte e foi então e ali enterrado. Desta maneira, embora e enquanto ainda esteja vivo, na realidade já não está. E não somente a graça de Deus para com ele, mas, sua verdadeira vida no Reino Eterno de Deus e, portanto, na Glória, ali e então, começou para ele, de maneira que

2

Page 3: o Ensino Sobre o Batismo

agora, já não mais morre mas, embora venha a morrer um dia, na realidade somente pode viver. Portanto, em conseqüência disto, ele, de acordo com Romanos 6, morreu para os pecados e foi salvo para Deus, passado para a Vida, começando assim uma existência para o serviço do Senhor. Isto foi o que aconteceu também para e com ele na ressurreição de Jesus Cristo, no poder do Espírito Santo derramado sobre Ele, de fato também para ele e com ele. Assim é que, o Espírito Santo proveniente de Jesus Cristo e n’Ele em ação, une este homem com o Salvador, como sendo a cabeça ligada a um corpo, fazendo-o propriedade de Jesus Cristo, e relacionado a tudo quanto Jesus Cristo é e faz: isto quer dizer que ele nunca mais pode existir sem Jesus Cristo porque Jesus Cristo nunca mais pode existir sem ele; isto é, que ele já não está fora, mas em Jesus Cristo, e com Ele permanece no fim de todas as coisas, e com Ele permanece no início de um novo céu e de uma nova terra. “Qualquer que está em Cristo é uma nova criatura, as coisas velhas já passaram, eis que tudo se fez novo” 2 Coríntios 5: 17.

Sendo o Espírito Santo, e assim é descrito por todos os quatro Evangelhos e pelo livro dos Atos dos Apóstolos, para o distinguir do simples batismo com água. Assim, o batismo com água e o muothriou anagenhsewd o Sacramentum regenerationis. O que acontece a um homem em sua participação na morte e ressurreição de Jesus Cristo, devido ao trabalho do Espírito Santo que é realizado no batismo, é na realidade o seu renascimento para uma nova vida na Era Vindoura, realizado pela sua completa justificação perante Deus, pelo completo perdão de seus pecados, pela sua completa consagração ao serviço do Senhor.

A teologia reformada do século XVII ensinava e dizia exatamente isto quando, de acordo com o seu principal ponto de vista, descrevia esta realidade com a aceitação de um homem na foedus gratiae Dei, que foi estabelecida pelo decreto eterno da eleição de Deus em Jesus Cristo e que se realizou no seu próprio tempo na morte e ressurreição desse mesmo Jesus Cristo. Participante neste concerto, e portanto um irmão de Jesus Cristo, o homem é nascido de novo como um filho de Deus e cidadão da Nova Era. Ainda mais, ele é justificado perante Deus, pois foi declarado livre dos seus pecados e, portanto, consagrado ao Senhor. Isto acontece a um homem devido à sua fé em Jesus Cristo e à crença na sua própria renovação como filho de Deus por intermédio Dele, e porque confessa a sua fé, torna-se devido à sua confissão, um membro consciente da graça divina, um membro vivo da Igreja de Jesus Cristo. Tudo isto - ou seja, tudo quanto foi realizado na morte e ressurreição de Jesus Cristo, até mesmo a última dessas coisas, a saber, o louvor a Deus que brota dos lábios do pecador perdoado e que é aceite pela graça - é a realidade representada no batismo pela água.

De acordo com João I, o batismo com água de João dá testemunho do batismo do Espírito que seria levado a efeito pelo próprio Jesus Cristo.

De acordo com a passagem básica em Romanos 6: 5, é a omoiwma (semelhança) da sua morte. Portanto, e segundo esta noção, dizemos que o batismo é um símbolo (Abbild). Podemos no entanto chamá-lo um selo (sfragij), seguindo um uso bastante comum no segundo século, ou um sinal (signum), de acordo com a terminologia de Agostinho, a qual prevaleceu posteriormente. Tanto quanto eu saiba, não há nenhum ensino Cristão acerca do batismo que conteste diretamente a idéia de que o batismo por água seja também em si próprio, e principalmente, compreendido como um símbolo, isto é, como uma figura (Entsprechung) e uma representação (Darstellung) ou, de acordo com Gregório de Nissa, uma cópia mimhsij - daquela outra realidade divino-humana de que dá testemunho. Alguém pode esconder este fato com expressões que pareçam mais fortes ou mais concretas, mas ninguém o pode negar.

O batismo é santo e santificador, embora ainda tenha-mos de ver porque e em que medida. Mas ele não é Deus, nem Jesus Cristo, nem o Testamento, nem a Graça, nem a fé, nem a Igreja. Dá testemunho de tudo isto, como também do acontecimento no qual Deus, em Jesus Cristo, faz com que um homem seja Seu filho e participe do seu Testamento, despertando fé pela Sua graça e chamando um homem para a vida na Igreja. O batismo testifica a um homem

3

Page 4: o Ensino Sobre o Batismo

que este acontecimento não é um produto da sua imaginação, mas que é uma realidade objetiva, a qual nenhum poder terreno pode alterar, pois Deus mesmo promete mantê-lo em todas as circunstâncias. Dá-lhe também testemunho de que Deus dirigiu todas as Suas palavras e obras em sua direção e nunca para de assim fazer. Dá-lhe testemunho daquilo que já tinha sido declarado no signum audibile na palavra do ensino e instrução Cristã, e na verdade já aconteceu de acordo com o último, pois acontece também no seu batismo e acontecerá novamente depois do seu batismo. Dá-lhe testemunho disto, no entanto, como signum visibile: como a semelhança oral daquele perigo de morte e salvação para a vida no meio do qual, ele não toma em consideração a nenhum outro, mas a si próprio, como um que está em perigo e é salvo; e nisto não somente é sujeito passivo pelo ato de se apegar a este perigo e salvação, mas encontra-se a si mesmo tomando uma parte ativa. Desta maneira, o batismo é uma figura na qual o homem, em verdade, não é o personagem principal, mas é, por certo, o segundo em grau de importância.

Esta é a essência do batismo: ser esta figura, este testemunho e este sinal. É evidente que é somente uma figura, independentemente de qualquer outra coisa, devido à insuficiência com que este perigo e salvação - (não oferecendo perigo algum, mesmo na sua forma mais direta) - corresponde à real morte e real vida do homem, com os quais se ocupa objetivamente.

Aquilo que em João 1: 8 lê de João Batista: “Ele não era a luz, mas veio para dar testemunho da luz”; aquilo que o Batista confessa de si mesmo em João 1: 20; 3: 28: “Eu não sou o Cristo”, e o que por sua vez Jesus disse de si mesmo: “O testemunho que eu dou é maior que aquele de João”. )João 5: 36); pode ser aplicado ao batismo, e aponta um princípio limitador que, numa doutrina sadia acerca do batismo, não deve ser nem posto de parte nem tornado ineficaz.

Não glorificamos o batismo por interpretá-lo como se, na sua essência, fosse mais do que arepresentação da história sagrada (Heilsgeschichte) que se realiza entre Deus e os homens em Jesus Cristo.

Tem a sua máxima glória, precisamente quando é considerado como a mais viva e expressiva representação dessa história: o sinal visível da invisível nativitas spiritualis no pórtico de entrada da Igreja e no princípio de cada vida Cristã.

4

Page 5: o Ensino Sobre o Batismo

II

O poder ou potência (Kraft) do batismo consiste no seguinte - que, sendo um elemento na mensagem da Igreja, é uma palavra e ato livre do próprio Jesus Cristo. O batismo não é uma representação morta ou muda, mas viva e bem expressiva. Sua potência consiste no fato de incluir o inteiro movimento da história sagrada (Heilsgeschichte) e que portanto é potentíssima et efficacissima. Tudo quanto pretende, e em realidade executa, é o resultado desta potência. Põe o seu poder em ação quando mostra a um homem aquela realidade objetiva, à qual ele próprio pertence ( e da qual é um sinal), de tal maneira que somente per nefas pode esquecer ou desprezar. Assim, em qualquer circunstância, pelas características do batismo, ele próprio se torna um homem marcado. Pela sua representação, a própria pessoa também se identifica. A seguir, naturalmente, perguntamos: quando surge essa potência?

Principiamos pelo fato de que o batismo é, em qualquer circunstância, uma parte da proclamação da Igreja e que é claramente um ato humano. Assim como a Ceia do Senhor, pregação, oração, total adoração da Igreja, trabalho pastoral, obras de caridade, disciplina da Igreja, trabalho pastoral, obras de caridade, disciplina da Igreja e Educação Cristã, é também uma parte da proclamação da Igreja. Estamos acostumados a distingui-lo das outras atividades da Igreja, como a Ceia do Senhor, como um “sacramento”. Mas, embora claro acerca do batismo e da Ceia do Senhor, é ainda mais importante reconhecer que todas as atividades da Igreja são, à sua maneira, um sacramento. Isto quer dizer, que são atividades que envolvem sinais e símbolos; mais do que isso, para ser efetivo, depende de certos sinais e símbolos fixos. O batismo (como já dissemos), de qualquer maneira, como todos os outros atos da Igreja é claramente um ato humano. Se na realidade tem a força de uma representação viva e expressiva, capaz de representar e denotar o homem, então isto é devido ao fato de ser, juntamente com todos os outros elementos da proclamação da Igreja, em si mesmo e na sua completa humanidade, de uma maneira indireta e mediadora, uma palavra e ato livre do próprio Jesus Cristo. É isto que dá vida a todos os elementos da proclamação da Igreja, tanto ao batismo como a todos os outros. A Igreja permanece debaixo do governo do Seu Senhor, é um instrumento ao Seu dispor. Quando ela se expressa em palavras e atos humanos, fá-lo baseada na promessa de que se alguém a ouvir, ouve o Senhor. A Igreja não se fundou nem se consagrou a si mesma. Foi fundada e consagrada por Seu Senhor e nessa base ela continua a existir. Semelhantemente, não foi a Igreja que inventou por si os diferentes elementos da proclamação; nem tão pouco inventou o batismo. Ela o administra por ter sido instituído por Seu Senhor. Ela obedece ao Seu mandamento. Por palavras e por atos ela serve aqueles que são Seus, na esperança e expectativa que através do poder das palavras e atos da Igreja, encontrem expressões as palavras e atos de Cristo.

O batismo de João pela água dá testemunho do batismo com o Espírito e com fogo do próprio Jesus Cristo. Por essa mesma razão, o grande dispensador do batismo pela água não é João, nem a Igreja - mas o próprio Senhor Jesus Cristo, - embora mediadora e indiretamente seja através do serviço de João e do serviço da Igreja.

Quem poderia, senão o próprio Jesus Cristo, testemunhar com eficácia acerca de Jesus Cristo? Lutero, correta e repetidamente, afirmou em seus sermões, baseado em Mateus 3: 13 s. (concordando com Crisostomos, Ambrósio, Tomás Aquino e Bonaventura) assim como também Calvino creu, é o Senhor quem faz o batismo, pela água, poderoso para arrependimento e perdão de pecados. Ele, que não precisava destas coisas, submeteu-se a elas, anunciando assim aquilo que havia de acontecer no Gólgota e na manhã de Páscoa, declarando desta maneira a sua solidariedade com os pecadores. Por esta razão, o batismo foi tornando uma representação viva e expressiva da morte e ressurreição de Cristo como sumo sacerdote. Todo aquele que agora for batizado pode confiar como Ele, em ver os céus abertos, ouvir a voz do Pai e ter comunhão com

5

Page 6: o Ensino Sobre o Batismo

o Espírito Santo. Portanto denomina-se e realmente é, batismo no nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.

O testamento da graça foi estabelecido pela morte de Cristo e revelado na Sua ressurreição. Assim, colocando-se Ele próprio já na representação que prefigura estas coisas (e depois na sua reflexão), Jesus Cristo instituiu (eingesetzt) o batismo.

Todas as outras passagens concordam neste ponto - por exemplo, Mateus 28: 19, deve ser compreendido como a ratificação e reforçamento desta “instituição” do batismo. Por este testemunho do serviço a prestar - testemunhando de si mesmo como sendo o Servo Sofredor de Isaias 53, e o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo (João 1: 29 s.; cf. Marcos 10: 38; Lucas 12: 50) - Cristo fez-se o Senhor do batismo. Ele que, em cada batismo que é administrado com propriedade nos serviços da Igreja, é a Principal Figura, o original e verdadeiro batizador, transformando assim o batismo numa coisa poderosa, viva e expressiva. O batismo é a parábola ilustrada da sua morte, na qual (segundo Romanos 6: 5) o homem é “plantado” pelo seu próprio batismo. É uma repetição do batismo de Cristo no qual, o homem, como batizando, é agora a figura que ocupa o segundo lugar em importância. Citando Lutero mais uma vez: o batismo é “A palavra de Deus na água” (Catecismo Maior), isto quer dizer que o próprio Jesus Cristo é o primeiro envolvido neste ato, tomando nele uma parte ativa. Pela Sua participação nele, deu uma ordenança e comissão. Esta é a origem do poder do batismo.

Embora seja o fato de ter sido instituído por Cristo, de ser sua ação e palavra, que dá poder ao batismo, deve no entanto enfatizar-se que esta palavra e ação são livres. Aquele que, quando consentiu em ser batizado por João no rio Jordão, prefigurou-se e representou-se a Si próprio como servo de todos aqueles que batizam e são batizados no Seu nome, e no nome do Pai e do Espírito; mostrou também desta maneira que é o Senhor soberano e o único e poderoso cabeça da Igreja. O poder do Batismo depende de Cristo que, nele, é o principal agente. Não tem poder em si mesmo. Assim como nenhum outro elemento da proclamação da Igreja o tem. Embora a Igreja proclame a palavra no batismo e execute o ato, aquilo que deve ser sempre querido, amado, esperado e desejado em oração é o poder da sua livre Pessoa, enviado especialmente com este propósito. Não pode ser manipulado pelos homens. É sempre poder que o próprio Cristo, pessoal e livremente oferece. É uma promessa que só ele pode cumprir.

A esta altura, tornam-se necessárias algumas qualificações. Tem razão aqueles que chamam a atenção para o fato de que há um genuíno poder simbólico na água, afirmando que o seu uso é necessário no batismo.

Tertuliano e Ambrósio lembram o movimento do Espírito de Deus sobre as águas no tempo da criação. É, por certo permissível, atribuirmos um certo significado salvador ao nosso duche de água fresca na manhã de cada novo dia. Mas não devemos levar este simbolismo demasiadamente longe. O simbolismo natural da água e o seu uso comum, podem apontar em qualquer outra direção, assim como para a morte e ressurreição de Jesus Cristo - fatos dos quais depende a regeneração do homem. Tal simbolismo geral pode falhar totalmente. Para que qualquer coisa seja um testemunho ou um sinal, o poder necessário tem que estar presente. A água e o seu uso tem necessidade de receber o seu significado especial. Não o recebem devido a alguma coisa que lhes seja dada ou atribuída de qualquer maneira pela igreja. Recebem-no porque Jesus Cristo é o Senhor da natureza e porque Ele, de sua própria e livre vontade, lhes permitiu servir a Sua palavra e obra. Como Lutero diz no Catecismo Menor: “Verdadeiramente a água o não pode fazer, mas a Palavra de Deus que está com e na água, e a fé que crê nesta Palavra de Deus na água. Porque, sem a Palavra de Deus, a água é simplesmente água, e não batismo mas, com a Palavra de Deus, então é batismo”.

6

Page 7: o Ensino Sobre o Batismo

Zwinglio estaria correto se tivesse contentado em dizer que o batismo é um símbolo da fé da Igreja e da fé dos seus membros em particular, e que a sua execução é um ato que recorda, e portanto um ato de confissão, e consequentemente, algo que confirma essa fé. Como demonstraria Jesus Cristo o poder do batismo, senão na e pela fé tanto na Igreja como da pessoa que é batizada? Infelizmente, Zwinglio quis dizer algo mais; a saber, que a potência do batismo é limitada agora pelo poder de uma fé que limita e que se fortifica a si mesma pelo uso do símbolo. Contra isto tem que ser dito que o poder da fé não é qualquer coisa que depende de si mesma - um poder que se possa fortificar a si mesmo em cerimônias piedosas - mas é o poder de alguém que a exerce, e nada mais na realidade; e até mesmo isto, por si mesmo, e também o poder de Jesus Cristo, são realmente o mesmo poder do batismo, mas este, na realidade, está exatamente nisto - em mostrar, como um límpido espelho, que a Igreja e aqueles que são batizados no seu seio, não são deixados sozinhos com a sua fé, não dependem de si mesmo, mas que a fé tem a sua base e razão de ser na realidade objetiva do testamento divino da graça.

A tradição da Igreja de Roma, por sua vez, estaria certa se afirmasse que o poder do batismo é o poder do opus operatum de Jesus Cristo, o poder da sua obra reconciliadora executada de uma só vez para sempre, e cada vez, e sempre, tornada efetiva através do livre poder do Espírito Santo. Infelizmente, esta não é a afirmação feita. Ao invés, fala-se de um opus operatum da forma correta pela qual o batismo é executado, que se torna poderoso e efetivo pelo seu próprio poder, assim como acontece com a fé no caso de Zwinglio. Contra isto, é preciso dizer que o poder do Batismo não pode ser um poder dependente em si mesmo, ou que produza os seus efeitos por si próprio. Em Atos 8: 14 s. lemos acerca dos samaritanos, que aqueles que (ao contrário dos discípulos de João em Atos 19: 1 s.) ouviram a poderosa pregação de Filipe, foram batizados especialmente no nome do Senhor Jesus e que, no entanto, não tinham recebido ainda o Espírito Santo. Não é esta passagem, (juntamente com Atos 19) um aviso explícito contra qualquer idéia que queira dar às águas batismais, aos ritos eclesiásticos, ou a qualquer outra parte da proclamação da Igreja, seu próprio, ainda que relativamente independente, poder de ação, ao invés da livre ação de Deus? I Coríntios 6: 11 não afirma que somos lavados, santificados e justificados no batismo, mas “no nome do Senhor Jesus Cristo e no Espírito do nosso Deus”.

Se o batismo é um verdadeiro testemunho, isto significa que tem vida e expressão, não no seu próprio poder, mas no poder Daquele de quem dá testemunho e por cuja ordenança é realizado.

Da mesma maneira, Lutero e os luteranos antigos, estariam corretos se tivessem ficado satisfeitos, em oposição a todos os espiritualistas fora da Igreja, em chamar a atenção para a disciplina inter-relação do sinal e da substância da representação, e da realidade representada e, portanto, do batismo e do Espírito, da água e da Palavra de Deus. Lutero falou corretamente acerca do batismo enquanto se limitou a afirmar a idéia de que é a Palavra ou ordenança de Deus, que é o “Kern im Wasser”. Mas, com característico exagero, nesse mesmo Catecismo Maior, vai mais além neste assunto, assim como no seu ensino acerca da Ceia do Senhor. Ele diz da água batismal que “é incluída na palavra e ordenança de Deus, e portanto é santificada”, Ele denomina-a “água de Deus”, uma “água abençoada, santa, celestial e divina” e afirma que a fé “agarra-se” a esta água. Mais tarde ele é capaz de dizer que é “tal água que elimina o pecado, a morte e toda a miséria, e nos ajuda a atingir o céu e a vida eterna. Através de tal preciosa e exaltada água, aromaticum e cura é realizada porque o próprio Deus se encontra nela. Desde que Ele agora está nesta água, essa deve ser a verdadeira aqua vitae, que afasta a morte e o inferno e dá imortalidade”. E os antigos luteranos não deixaram de sistematizar este exagero, ensinando que a eficácia do batismo é coniunctim àquela do Espírito Santo e à da água consagrada pela repetição das palavras da instituição. Para nós, é tão difícil seguir este ensino, como seguir os de Zwinglio e os de Roma. Poder divino - humano e algum outro, tal como o da água batismal, não podem ser separados como dois fatores efetivos trabalhando no mesmo plano,

7

Page 8: o Ensino Sobre o Batismo

nem como tal devem ser unidos, pois traria incerteza em quem ou em que deveríamos crer nessa mistura. Crer em Jesus Cristo e em água consagrada pela sua presença é uma coisa perigosa e não recebe confirmação por nenhuma necessária relação entre os dois.

Aqui estão algumas das qualificações que devem estar presentes na mente. A promessa do poder do batismo é aceite com confiança e certeza, precisamente na medida em que o seu cumprimento é somente esperado através da livre ação de Jesus Cristo.

Algo tem que ser dito de uma importante conseqüência que se segue a isto. O poder de Jesus Cristo, que é o único poder no batismo, não depende da realização do batismo. Este tem a necessidade de um comando que não pode deixar de ser ouvido necessitas praecepti. Não há nele a necessidade de um instrumento indispensável necessitas medii. A livre palavra e trabalho de Cristo pode fazer uso de outros meios. O fato de a Igreja receber ordenança para usar estes meios não pode significar que Jesus Cristo fica limitado por eles. O campo do testamento divino da graça é maior que o campo da Igreja. O regnum de Cristo é maior do que a sua eclésia. A regra para nós é que fora da Igreja não há salvação, mas o Senhor da Igreja não é limitado por essa regra. A afirmação acerca da água e do Espírito em João 3: 5 não se refere a isto. Marcos 16: 16 certamente dia “Aquele que crer e for batizado será salvo, mas, então, simplesmente: Aquele que não crer será condenado”. Os defensores da idéia de que o batismo é uma absoluta necessidade para a salvação, portanto, nos seus trabalhos dogmáticos, sempre ensinaram com uma certa excitação, que esta afirmação deve incluir a ausência do batismo. Pelo menos para os filhos não batizados de cristãos, quase toda a Igreja tem mantido em todos os tempos a perspectiva de uma excepção amiga, ou pelo menos de uma perdição de certa maneira modificada (a que chamam limbus infantium).

Ainda mais, a dogmática romana fala do batismo de sangue dos mártires baptismus sanguinis como sendo suficiente para substituir o batismo pela água; desde o famoso sermão de Ambrósio no funeral do Imperador Valenciano II, que morreu como catecumeno, tem falado também de um batismo desejado no caso de perfeito amor e arrependimento bapt. flaminis. Na Idade Média, debaixo de certas condições, até mesmo a entrada numa ordem monástica servia como substituição para o batismo. Mas, casuística desde tipo - que é ao mesmo tempo paupérrimo e ambíguo - é, por certo, completamente supérflua para a solução do problema que temos diante de nós. Foi muito acertadamente que Lutero, nos seus primeiros anos, pregando com propriedade e entusiasmo, declarou: “Um homem pode ter fé mesmo que não esteja batizado; pois o batismo não é mais do que um sinal externo de que a promessa divina deve corrigir-nos. Se um homem pode tê-lo, é bom, deixai-o tomá-lo, pois ninguém o deve desprezar. Mas se um homem não o pode ter, ou se lhe é negado, ele não é condenado, desde que creia no Evangelho. Pois onde o Evangelho se encontra, aí há batismo e tudo o mais que o homem cristão necessita. Calvino também declarou explicitamente que um homem não pode perder a graça renovadora se morrer antes do batismo; portanto, certamente, não devemos pensar nas operações do testamento da graça como sendo de alguma maneira depende do sinal que o sela. A dogmática clássica protestante de ambas as confissões - embora tenha abandonado o ensino acerca de um ou outro aspecto do batismo - estava corretamente unida na idéia de que a Igreja e o cristianismo deve firmar-se no mandamento do Senhor e firmar-se na sua promessa embora, (como Agostinho já tinha expressado), ser privado do batismo por si só, não pode condenar um homem ou fechá-lo fora do Reino dos Céus. Isto sucederá apenas pelo menosprezo e negação do batismo. Plenamente, o poder do batismo não é limitado ao batismo pela água. Não há nada que torne o batismo necessário no momento da morte (o chamado Nottaufen). Não seria verdade - afirmar o contrário.

8

Page 9: o Ensino Sobre o Batismo

III

O significado e intenção (Sinn) do batismo é a glorificação de Deus no desenvolvimento da Igreja de Jesus Cristo, através da promessa dada a um homem, com a divina certeza, da graça que lhe é dirigida, e através da promessa de obediência pronunciada sobre um homem, com autoridade divina, em referência ao grato serviço que lhe é requerido.

Agora, voltamo-nos para a pergunta: Que se passa no batismo para corresponder à sua natureza e potência? Que pode e deve ser efetuado em e através deste ritual, distinguindo-o de qualquer ação casual, arbitrária e sem significado? Qual é o seu trabalho especial, distinguindo-o de certos outros aspectos que também tem o seu próprio significado? Que se quer dizer quando em Tito 3: 5, se descreve o batismo como “a purificação da regeneração e da renovação do Espírito Santo”, ou então quando o Nic. Const. Refere-se ao “batismo para perdão de pecados”? Aqui devemos ser pouco confundir aquilo que não o é.

Em vista dos pontos estabelecidos em relação à natureza e potência do batismo, é manifestamente impróprio manter os ensinos estabelecidos pelos Romanos, Luteranos e Anglicanos acerca do batismo; isto é, que o batismo pela água, concedido pela Igreja, é em si mesmo um meio pelo qual o perdão de pecados, o Espírito Santo e até mesmo a fé, são dadas ao homem - um meio pelo qual a graça é derramada sobre ele, de tal maneira que é salvo e abençoada - um meio pelo qual o seu renascimento é realizado, sendo assim integrado no testamento da graça de Deus e incorporado na Igreja. Os modernos luteranos tem descrito o batismo como a introdução “de uma centelha viva e divina cristã”, na consciência e vontade da pessoa batizada, como “a introdução no velho de um novo homem, germen espiritual da plenitude redentora de Cristo”. Aqui dá-se uma confusão de sujeitos, isto é, dum lado Jesus Cristo e do outro aquele que em seu nome leva a efeito o batismo da Igreja - uma conclusão arriscada para não dizer mais. Aqui, de qualquer maneira, a característica especial da experiência do batismo e sua peculiaridade em relação àquilo que representa, é obliterado de tal maneira que, por certo, não se dá no caso das passagens do Novo Testamento que são citadas para apoiar tal ponto de vista (por exemplo Gálatas 3: 27; Romanos 6: 4; I Pedro 3: 21; Efésios 5: 26; Tito 3: 5 s.; Atos 2: 38). Recordemos que o batismo é a representação, o selo, o sinal, a cópia, o símbolo da nossa redenção. E recordemos também que o poder do batismo reside na livre palavra e ação de Jesus Cristo. O batismo não é a causa da nossa redenção mais do que o é a nossa fé. “Será então a lavagem exterior a purificação de pecados? Não. Somente o sangue de Jesus Cristo e o Espírito Santo nos purifica de todo o pecado”. No batismo não temos a causa mas o cognitio salutis. Se alguém confundir causa e cognitio, imediata e inevitável ignora e confunde a peculiaridade do propósito do batismo ( e também o da fé!).

Devemos, no entanto, com justiça, reconhecer o realismo do ensino romano, luterano e anglicano acerca do batismo, o qual é um aviso que está em linha com as passagens citadas do Novo Testamento, para não se menosprezar o trabalho especial do batismo, e de o não negar com o receio do perigo de mágica. É um trabalho que, no seu caráter especial, é auxiliar, mas esta é precisamente a sua função especial. O Catecismo de Heidelberg também está correto quando declara que o Espírito Santo chama o batismo a lavagem da regeneração e da purificação de pecados “não sem boas razões”. O sacramento não redime - pois que, debaixo da redenção, é compreendida a experiência da reconciliação renascimento e salvação para a fé, mas a palavra e trabalho de Jesus Cristo que, neste sentido, são as únicas redentoras, e a fé Nele, tem também uma forma e dimensão sacramental (Gestalt). O fato de isto se encontrar ausente em Zwingli, é a razão pela qual o seu ensino acerca do batismo - assim como o que se refere à Ceia do Senhor - é tão estranhamente fraco e frio e tão insatisfatório em relação às referências do Novo Testamento. A palavra e trabalho de Cristo, únicos meios de redenção, estendem-se não somente à fé, mas

9

Page 10: o Ensino Sobre o Batismo

também ad fideinostrae sensum; pois a própria fé implica decisão e experiência. No batismo, assim como na Ceia do Senhor, na pregação ou em qualquer outra parte da proclamação da Igreja, a palavra e trabalho de Jesus Cristo são uma oferta de salvação que é reconhecida - uma revelação do testamento da graça, do renascimento, do perdão de pecados, que satisfaz uma confissão ao homem crente, da realidade divino-humana que o cerca e suporta - um convite para o homem crente, chamando-o a responder a esta realidade no seu próprio ser e a se tornar obediente ao Espírito Santo, de acordo com o Dom que é seu.

A palavra e trabalho de Jesus Cristo são poderosos não somente em si mesmos; é aquilo que atrai a nossa percepção pela sua representação de si própria, enquanto que, somente ela é a causa da nossa salvação, deseja ser vista, ouvida, sentida, saboreada, compreendida, tomada em consideração e obedecida pelo homem que é salvo e crê na sua salvação. Deseja ser reconhecida e experimentada da maneira mais completa. Não é absolutamente certo que isto aconteça. Na realidade se torna verdade para nós. É preciso que o próprio Senhor Jesus Cristo nos dê essa realidade. Por essa razão, Calvino e outros professores da primitiva igreja reformada falaram com propriedade e ênfase, não somente de um significare, declarare, repraesentare, offerre, mas também de um exhibire e conferre que tem lugar no batismo, e do lado do homem um accipere, obtinere, impetrare. O acontecimento sacramental através do qual vem ao homem um verdadeiro Dom de Jesus Cristo não é de maneira nenhuma um acontecimento menos genuíno porque, nesta ocasião, a palavra e trabalho de Jesus Cristo, dimensão e forma, e o seu poder não tem um fim causativo ou gerativo, mas sim cognitivo.

De acordo com I Pedro 3: 21, o batismo não é “o eliminar o mau cheiro da carne” mas sim o apelo de uma boa consciência a Deus, pela ressurreição de Jesus Cristo”. Na representação simbólica do batismo, Jesus Cristo fala de si próprio e de Sua ação em favor do candidato, no batismo, Ele diz ao candidato que também por ele e com ele morreu e ressuscitou, e é um companheiro no Testamento. No batismo, Ele convida e recruta o homem para ser Nele aquilo que Ele é. No batismo, Jesus Cristo sela a carta que escreveu na Sua pessoa com o Seu trabalho e que nós, pela nossa fé Nele, já recebemos. Selar - obsignare - é o trabalho especial do homem.

Se for compreendido assim, podemos e devemos dizer a seu respeito, nas palavras da Escritura: salva, santifica, purifica, intercede e dá o perdão de pecados e a graça do Espírito Santo, efetua o novo nascimento, é a admissão do homem no Testamento da Graça e na Igreja. Isto é tudo verdade, no sentido em que, no batismo, uma palavra autêntica nos é proferida de maneira decisiva acerca de tudo isto.

São claramente duas coisas distintas, a adaptação dum estrangeiro à vida e costumes suíços e o ato legal de naturalização pelo qual isto é publicamente reconhecido. Sem dúvida, uma pessoa que não é “naturalizada” no último sentido, pode no entanto ser já desde há muito “ein güter Schweizer”. Também, sem dúvida, aquele que é “naturalizado” não se torna suíço devido ao seu certificado de cidadania, mas em conseqüência do mesmo, e é possível que, apesar deste, continue a ser um fraco exemplar. Mas, quererá isto dizer que para o estrangeiro, e para o suíço, o que aconteceu na naturalização é uma cerimônia sem efeito algum e completamente supérflua? Não depende dela a prova e promoção da “qualidade suíça” do estrangeiro, e daí não advém também para o país a possibilidade prática de o reclamar como cidadão? Da mesma maneira o batismo “deve ser considerado firme e constantemente como um certo sinal e testemunha ao lado da palavra, pelo qual esta é garantida e no qual Deus assegura que a sua promessa da Graça purificará e limpará nossos pecados”. Podemos amavelmente perguntar aos romanos, luteranos e anglicanos se, e em que aspecto, foi dito demasiadamente pouco aqui acerca do significado do batismo. Mas, termos também que lhes perguntar se há alguma outra maneira pela qual desejem venerar as características especiais daquilo que acontece no sacramento do batismo.

10

Page 11: o Ensino Sobre o Batismo

E agora, quanto ao significado e ação do batismo, temos que dizer de maneira positiva, e em particular, o seguinte:

Há um estranho vazio no ensinamento acerca do batismo em todas as confissões - incluindo a Reformada - em que o significado e ação do batismo nunca foi em princípio compreendido como uma glorificação de Deus, isto é, como sendo um momento na Sua Revelação de Si mesmo. Talvez se tenha chegado próximo desta idéia quando, com Justino, o batismo foi descrito como “iluminação” (fwtismoj). Justino, na realidade, certamente concebeu isto objetivamente; quem quer que entre nas águas batismais é iluminado. Mas, precisamente porque isto é verdade, devia ser lembrado que, de acordo com Mateus 5: 15 e com o resto do Novo Testamento; uma lâmpada acesa por Deus não é iluminada para si mesma, mas para todos os que estão na casa. O batismo, então, deve a sua “radiância” à Kabod Jahve, à (doxa ton tesn), e devia portanto servi-la. Enquanto o batismo executa o seu trabalho cognitivo, enquanto a realidade divino-humana ilumina um homem, fazendo com que ele seja um iluminado, realiza-se a primária e mais importante coisa: Enquanto o homem o reconhece em verdade, Deus recebe glória em que Ele próprio, uma vez mais assegura o Seu justo direito na terra.

Deus, no entanto, faz isto dentro do campo de ação da igreja de Jesus Cristo, quando o candidato, como um membro vivo da Igreja - uma lâmpada iluminada na escuridão - é visível para si próprio e para os outros. Com excepção de Calvino, os homens tem-se concentrado demasiadamente no significado do batismo para o indivíduo. Tem dado pouca proeminência a este outro lado da questão, que o batismo, como sacramento da regeneratio natural.

A Igreja de Jesus Cristo, - na terra, dá origem, cresce e persiste através do divino: “E todos os dias acrescentava o Senhor” (Atos 2: 47) aqueles que através do seu batismo, como crentes, proclamaram-se publicamente salvos e foram publicamente reconhecidos como tal. Há, por certo, membros secretos da Igreja de Jesus Cristo, que não são reconhecidos como tais por si próprios, não fazendo profissão e portanto não sendo reconhecidos como tais pelos outros. Mas a Igreja não é formada por esses, nem interior nem exteriormente. Ela não brilha em tais pessoa, nem tão pouco pode realizar nelas o propósito de sua existência - a glorificação de Deus. Por outro lado, cada batismo não é simplesmente uma garantia de vida, mas também uma prova de vida, e a execução das funções da eclesia perpétuo mansurá, um reforçamento do seu credo, uma adição pública ao louvor de Deus pela qual, de geração em geração, até à vinda do Senhor, a Igreja é chamada e congregada. As conseqüências práticas litúrgicas são evidentes: em princípio o batismo não pode ser celebrado como um ato privado ou uma festa familiar. Em princípio só pode ser celebrado no serviço público de adoração a Deus.

O significado central do batismo em relação ao candidato está agora, finalmente, claro. É lhe dado com certeza divina, para a glória de Deus e edificação da Igreja de Jesus Cristo, a promessa de que na morte e ressurreição de Jesus Cristo, a graça de Deus é-lhe dirigida e oferecida; que nesse acontecimento ele é renascido; que, com base nesse acontecimento, até mesmo ele pode ter a certeza da presença e ação do Espírito Santo; que seus pecados são perdoados; que também ele é um filho de Deus; que a esperança de vida eterna também é sua. Esta é a primeira coisa que, não a Igreja nem nenhum ser humano, mas o divino-humano batizador tem a dizer e realmente diz ao candidato se possa agarrar a isto em toda e qualquer circunstância? A Segunda coisa é esta: tem sido muitas vezes impropriamente relegado para um segundo plano, mas o significado do batismo seria imperfeitamente descrito se isto não fosse especificamente mencionado. Com autoridade divina é pronunciado sobre o candidato, para a glória de Deus na edificação da Igreja de Jesus Cristo, seu voto de fidelidade de grato serviço que lhe é exigido. É-lhe dito que em virtude da morte e ressurreição de Jesus Cristo, que se deu em seu favor, ele já não pertence a si mesmo, está em dívida para com o seu Salvador; que, como alguém que foi sem dúvida e completamente preso; que foi colocado num caminho do qual, desde agora, já não se pode desviar, fraco, errando, louco, até mesmo perverso, ele ainda é e

11

Page 12: o Ensino Sobre o Batismo

continua a ser. Ele recebeu um Senhor. Esta é a Segunda coisa que é dita a um candidato a batismo - uma vez mais pelo batizador, o próprio Jesus Cristo - e dito de tal maneira que nenhum outro o pode fazer, mas somente Ele, com autoridade divina, de maneira que ele já não terá base ou pretexto para desobediência.

É perfeitamente compreensível que estas duas coisas sejam ditas à mesma pessoa. É do próprio Jesus Cristo que estamos a falar. Assim como, ao homem a quem estas coisas são ditas, é aquele a quem Cristo veio como luz, ele está destinado a servir a divina doxa, ao invés de sua própria, e eleito membro vivo da Igreja de Jesus Cristo. A experiência à qual um homem é sujeito no batismo consiste em ser assegurado com certeza divina a ser colocado debaixo de obrigação pela Graça divina.

12

Page 13: o Ensino Sobre o Batismo

IVOs princípios que suportam a ordem do batismo são, por um lado a missão aceite com

senso de responsabilidade pela Igreja e, por outro, o sério preparo e desejo do batizando de receber este convite e consentir em dar o seu voto de lealdade. O batismo é parte da proclamação da Igreja. Mas, manifesta e inevitavelmente, também interessa à pessoa batizada. Antes de falarmos, como o faremos no último capítulo, acerca do efeito e resultado do batismo, devemos obviamente dirigir especial atenção a este aspecto do problema - à Igreja que batiza e à pessoa que é batizada.

Temos que tratar aqui da questão da ordem e prática do batismo: com batismo, até aqui distinguido da sua natureza, potência e significado, para que seja visto como um assunto de determinação e formação humana, por vezes determinado e dependente pela ordem de julgamento e decisão eclesiástica. Segue-se, da natureza da Igreja, como uma manifestação do concreto da graça no tempo entre a Ressurreição e a Parousia de Jesus Cristo, como na realidade se conclui da natureza de todas as partes em separado da proclamação da Igreja - entre elas o batismo - em que a sua ordem e prática, sendo humanamente arranjadas, deve ser mantida em mente como parte do problema total. Quando o Reino de Deus vem, esta distinção não terá mais significado. Ainda mais, é verdade que o batismo é colocado nas mãos dos homens e que as condições de sua administração e recepção são assuntos de julgamento e decisão humanas.

Ao mesmo tempo, isto por certo tem que ser dito: O que deste ponto de vista deve ser, ou pode ser, é ou não é, não pode alterar de maneira nenhuma, melhorar ou piorar o que o batismo é do ponto de vista de sua instituição divina, sua origem divino-humana, isto é, sua natureza objetiva, poder e significado. Estabeleçamos de início todas as coisas que devem ser firmemente mantidas: a natureza, poder e significado do batismo são fundamentalmente independentes da ordem e prática que estão mutuamente condicionadas pela Igreja e pela pessoa que é batizada. Estabeleçamos de início tudo que tem de ser dito, defendido e exigido, como algo semelhante a uma precaução: dos primeiros princípios, é certo que nenhuma rejeição da ordem e prática do batismo devido a falta da Igreja, ou devido a falta ou imperfeição do candidato, pode fazer o batismo de uma pessoa, uma vez realizado, enefetivo e portanto inválido, ou pode levar ou justificar a realização de um segundo batismo de acordo com uma melhor ordem e prática.

Uma ordem e prática inadequada do batismo pode obscurecer a sua natureza, ordem, poder e significado, pode prejudicar e tornar difícil a sua compreensão. Não há dúvida que isto tem acontecido e continua a acontecer. O efeito do batismo pode, devido a isto, ser subjetivamente discutido. Acerca disto teremos algo definido a dizer mais adiante. Pode dar-se a paradoxal situação em que a própria Igreja não reconhece o que está a fazer no batismo ou o que ela possui naqueles que são batizados. Por seu lado, as pessoas batizadas, podem não saber que estão a ser batizadas, podem não saber que estão a ser batizadas, ou o que vem a elas no batismo realizado nelas pela Igreja. Mas, não pode haver lugar para nenhuma destruição objetiva da natureza do batismo, nenhum anulamento objetivo do seu poder, nenhum objetivo impedimento do seu trabalho e portanto nenhuma objetiva ineficácia do batismo pode resultar devido à administração e recepção inadequadas do sacramento.

“O ouro não se transforma em palha se um ladrão o roubar e usar indevidamente. A prata não passa a ser papel se um usurpador a adquirir por meios ilícitos”. Não há nenhuma espécie de inconvenientes na ordem e prática do batismo que não possam ser removidas ou corrigidas por outros meios que não sejam o rebatismo. Isto pode ser escrito em adiantado no livro de memória de Anabatistas de qualquer tipo - tanto Romanos como aqueles considerados evangélicos. Nada será dito aqui em seu favos.

Mas isto também não quer dizer que não deve haver séria consideração teológica acerca da ordem e prática do batismo. Neste assunto também há princípios que não podem ser

13

Page 14: o Ensino Sobre o Batismo

suprimidos ou negligenciados sem castigo. Sua adulteração torna possível e real o obscurecimento do conteúdo do batismo - embora este seja invariável em si mesmo - o que resulta na situação paradoxal de uma dupla incerteza acerca do seu efeito. A Igreja, em todos os seus ramos, sofre severamente devido ao fato de que, embora ela realmente tenha batismo, tem-no como um resultado da irregularidade da sua ordem - somente na maneira em que o tem. Portanto levanta-se a questão, se a Igreja poderia ter o batismo numa maneira completamente diferente por virtude de uma melhor ordem e prática. A atual tragédia da Igreja - muitas vezes lamentada - pode muito bem estar ligada ao fato de que até agora ela tem dedicado a esta questão de ordem, muito pouca atenção e disposição em tomar decisões. Cada tentativa para retificar esta tragédia está condenada ao fracasso se não houver disposição, para procurar, e então, aceitar um remédio completamente novo.

O primeiro princípio fundamental na questão da ordem do batismo está no fato de que este se dá como parte da mensagem da igreja, aceite e realizada como responsabilidade. O batismo, administrado pela igreja em obediência ao mandamento do seu Senhor, com cuidadosa e verdadeira compreensão da sua vontade, e sendo o rito acompanhado pela fiel pregação da Sua palavra, é batismo verdadeiro do ponto de vista da ordem. Uma pessoa conforta-se e consola-se com um miserável pedaço de legalismo se deixa a validade do batismo esgotar-se a si mesma na intenção do batismo, neste pronunciamento da formula de administração que inclui os três nomes sagrados, ou na molha, pelo menos da cabeça do batizando, com água; ou, quando se designa o sacerdote ou pastor ordenado como a pessoa normal para batizar; ou quando, Romanos e Luteranos querem em casos de emergência faze-lo válido por outras pessoas - até mesmo uma dona de casa por exemplo - enquanto que, pelo contrário, os primitivos reformados (segundo o exemplo de Tertuliano) zangavam-se caso algumas “mulheres velhas” tomassem parte no ato; ou quando, seguindo a controvérsia sobre os heréticos no quarto século, reconhecia-se o batismo herético se corretamente administrado, e ao mesmo tempo desejavam fazer algumas exceções entre eles; ou, ainda, quando para casos duvidosos se inventou a instituição do batismo “condicional”; já para não falar nas posteriores divisões dos Romanos e infelizmente também da antiga dagmática protestante!

Compreendemos bem isto. O dolorosos não é que se queira por tais considerações e declarações ser exato acerca do batismo em todas as circunstâncias. Essa é realmente a coisa digna de elogios em tal legalismo. O doloroso é que daí, à maneira dos escribas e fariseus (Mateus 23: 23) a hortelã, o entro e o cominho, eram dizimados, enquanto, que os assuntos mais importantes da lei - justiça, misericórdia e fé - não são realizados. “Isso devias ter feito sem deixar as outras por fazer”.

Verdadeiramente, a questão do batismo, em toda a sua altura e profundidade, é responsabilidade da Igreja. Se tais casos e condições devessem ser mantidos, porque não tem de ser, por exemplo, a confissão de fé do batizando, a oração do batizador, o caráter público do batismo, sua relação à adoração da consagração, também considerados entre os requisitos necessários para a sua execução correta? Porque fixaram os homens, evidentemente, um mínimo ao invés de um máximo? Porque procuramos, obviamente, fazer a estrada e porta tão largas quanto possível, quando neste assunto deviam plenamente ser pequenas e estreitas? Não merecem certas questões básicas de Tertuliano, e ainda mais de Cipriano - mesmo que acertadamente não queiramos aceitar as suas conseqüências práticas - mais fundamental consideração do que lhe tem sido dedicada desde a vitória da solução agostiniana na controvérsia acerca dos heréticos? Estas são algumas dessas questões: Com que direito há batismo onde um homem não está dentro da Igreja, ou onde a existência de Deus (segundo os seus três santos Nomes), é pelo menos posto em dúvida? Com que direito, é ministrado o batismo a um homem que não está convicto do seu significado? Com que direito, quando um homem - aberta ou secretamente, intencional ou realmente - tem e professa uma fé completamente diferente daquela do Novo Testamento? Como podem cristãos verdadeiros surgir do seio de uma Igreja falsa?

14

Page 15: o Ensino Sobre o Batismo

Como pode haver luz na sua casa se ela própria está em escuridão? Não seria melhor, ao invés de rejeitar a doutrina de Ambrósio Non sanat baptismus perfidorum, non mundat sed polluit como temos feito ultimamente, escutá-la com tremor e terror como uma chamada à unidade uma chamada para voltarmos à pureza da única fé, uma maior constância em todos os lados e lugares, um mais válido apelo para renovação da Igreja? Pode a Igreja admirar-se ou ficar ofendida com aqueles que foram batizados, onde ela própria, quando batiza, torna por certo duvidoso se ela é a Igreja e de que maneira ela pode e deve tornar-se completamente nova? Pode o batismo está em ordem onde está ausente a preparação que, antes de mais nada, a própria Igreja tem de se por em ordem, e deve procurar dia e noite pela oração e serviço os caminhos e meios necessários? Desde que ela elimina está preocupação, que outra coisa poderá acontecer se não que ela por vezes leva o povo a ser tentado a duvidar se o batismo é realmente o verdadeiro e efetivo batismo de Jesus Cristo, ou se não deve ser restaurado ou substituído por algum deplorável rebatismo sectário? Pela clara liberdade com que se tem, desde Agostinho, resolvido a controvérsia acerca dos heréticos, e para preparação e realização de uma pura ordem exterior de procedimento no batismo, a Igreja tem o direito inerente e a autoridade espiritual na medida em que ela tem os seus assuntos em ordem; mas isto quer dizer na medida em que, consciente da sua responsabilidade, em toda a linha, não somente é a Igreja, mas está em processo de vir a ser a Igreja. Batismo na Igreja que se está a reformar, é batismo genuíno.

O segundo princípio fundamental na questão da ordem do batismo refere-se à pessoa que é batizada. Pois ela é, sem duvida alguma a Segunda em ordem de importância no ato que se realiza, pelo que temos que perguntar também muito seriamente a seu respeito. E não será nem de mais nem de menos atribuir à irresistível graça do batismo à qual na realidade pertence o seguinte, (não à natureza, poder, significado ou efeito do batismo, mas certamente a sua ordem): o desejo responsável e preparado, da pessoa a batizar, para receber a promessa da graça que lhe é dirigida, e para tomar parte na promessa de fidelidade com respeito ao grato serviço que lhe é exigido.

Somente com uma compreensão causativa ou geradora do batismo pode ser estudado este Segunda assunto acerca da ordem e, tomando literalmente, somente então, se uma pessoa decide em favor da dogmática romana que atribui ao rito do batismo ou seu próprio efeito ex opere operato. Mas deve ser mostrado que ninguém teve a coragem de escapar este particular assunto neste campo. E em nenhuma circunstância pode estar Segunda questão de ordem se negligenciada do ponto de vista reformado com a sua compreensão cognitiva da graça do batismo. Batismo sem a vontade e preparo da pessoa batizada é verdadeiro, eficaz e efetivo, mas não é correto; não é feito em obediência, não é administrado segundo a ordem própria, e portanto é um batismo nublado. Não deve nem pode ser repetido. É, no entanto, uma ferida no corpo da Igreja e uma fraqueza para o batizado que pode, por certo, ser curada, mas que é tão perigosa que outra pergunta tem de ser feita à Igreja: até quando deseja ser culpada da provocação desta ferida e enfraquecimento através de uma prática de batismo que é, deste ponto de vista, arbitrária e despótica?

Temos aqui em mente o costume de batizar crianças ou, mais exatamente, o baptismus infantium já reconhecido no 2º século conforme o testemunho de Origenes e Cipriano, tornou-se geral em toda a parte no 4º século e foi defendido com grande energia por todos os reformadores. De acordo com o significado das palavras, isto significa o batismo daqueles que antes e no decorrer daquilo que se passa, não tem nada a dizer; e não tem nada a dizer porque ainda não tem possibilidade de falar, e por isso mesmo, nem são capazes de perguntar aquilo que deveriam dizer, no entanto a estes se está no costume de batizar sem perguntar acerca do seu desejo e preparação, sem os tornar responsáveis, numa pura passividade, baseados no fato de que são filhos de pais cristãos. O ensino hoje prevalecente do batismo em todas as grandes confissões cristãs - na Igreja reformada também - tem neste ponto não uma simples brecha mas um abismo. A prática em uso do batismo com base no ensino prevalecente é arbitrária e despótica. Nem por

15

Page 16: o Ensino Sobre o Batismo

exegese e pela natureza do caso que nesta ação, o batizando é uma parte ativa e não importa em que período da vida, por certo nenhum infans pode ser tal pessoa. Não podemos evitar de a questão crucial se aqui apresentada à Igreja. Podemos, como é compreensível, desenvolve-la apenas em esboço:

Quando à exegese batismo no Novo Testamento é, em todos os casos, uma resposta indispensável a uma pergunta inevitável por um homem que veio para fé. Responde à pergunta acerca da certeza divina e da autoridade divina da palavra que ele já ouviu, à qual já se agarrou pela fé e à qual deu uma resposta afirmativa. Responde ao seu desejo de selar a sua fé e ao reconhecimento daquilo que ele já percebeu como sendo o objeto da fé. Responde ao seu desejo de não ser somente convencido eternamente da comunhão de Jesus Cristo com ele, mas de uma vez para sempre Ter uma visão dela. Responde-lhe representando-lhe a figura da morte e ressurreição de Jesus Cristo, na qual ele próprio se encontra, não como principal autor, mas, por certo, como o segundo, enquanto apresenta Jesus Cristo perante os seus olhos como aquele crucificado por si (Gálatas 3: 1). Pode ser errado o desejo por tal acontecimento? Pode este acontecimento em si mesmo ter qualquer outro caráter do que o de uma resposta à pessoa batizada?

Na esfera do Novo Testamento uma pessoa não é trazida para o batismo; vem para o batismo.

Para os infantes, isto é, para aqueles que não podem ainda perguntar ou responder - ou, para falar de outra maneira, para uma palavra de Deus que, do contrário de Isaías 55: 10 s., sendo um precursor, volta vazia, correndo sem realizar aquilo que decretou - não vemos em nenhum lugar na ordem ali seguida; como se pode ver claramente em Atos 3: 28 s.; 10: 44 s.; 16: 13 s. 32 s.; 18: 8 s. O fato de que Jesus, de acordo com Mateus 19: 13 s. deixa que as criancinhas sejam trazidas a ele, orou por elas, e colocou suas mãos sobre elas, e de acordo com Mateus 21: 15 s., Ele encontra louvor na boca dos infantis e dos que amamentam, é uma prova de que o seu reino é realmente maior do que a sua Igreja, mas de maneira nenhuma constituiu prova de que tais crianças devem ser batizadas.

Ainda mais, que os filhos dos cristãos são (de acordo com I Coríntios 7: 14) santos, mostra outra vez esse mais extenso reino de Cristo, mas não significa que essas crianças devem ser batizadas, assim como o mesmo se deve do marido santificado pela mulher crente, ou da mulher santificada pelo seu marido crente. Que a promessa, de acordo com Atos 2: 39, é correta para “vós e vossos filhos” dá testemunho da sua universalidade no espaço; mas não que nenhuma dessas crianças devessem ser mergulhadas na especial, sacramental graça do batismo - automaticamente e sem ter reconhecido o seu lugar nele. (maqhtenein) por certo não é ação que possa ser completa sem a decisão responsável do interessado. É verdade que em Colossensses 2: 11 s. o batismo é chamado a ressurreição de Cristo, na qual podemos entrar em substituição à circuncisão israelita, mas daqui nunca se segue que batismo, como na circuncisão, deve ser praticado nos infantis. Circuncisão refere-se ao nascimento natural; é o sinal da eleição da santa linhagem de Israel a qual, com o nascimento do Messias, atingiu seu alvo, de maneira que, desde então, este sinal perdeu o seu significado. A sucessão daqueles que confiavam nesta promessa e nesta fé, eram verdadeiros filhos de Abraão, observamos no entanto, já no Israel pré-messiânico (de acordo com Romanos 4), que este de maneira nenhuma se identificava com a sucessão da raça e circuncisão dos seus membros (de sexo masculino). E assim, propriamente, a sucessão daqueles chamados para a Igreja do novo concerto (de acordo com João 1: 12 s.) claramente não depende de uma sucessão racial, nem de uma família ou nação, mas vem na vida do indivíduo, ora desta maneira, ora de outra, surge uma aceitação (lambanein) de Jesus, uma fé no seu nome. É isto que lhe dá o poder para se tornar um filho de Deus. Do ponto de vista do Novo Testamento é impossível dizer que “todo aquele que é nascido de pais cristãos, é nascido dentro da Igreja”.

16

Page 17: o Ensino Sobre o Batismo

Se alguém finalmente considerar a analogia de batismo vicário em I Coríntios 15: 29, o que tem a ser dito é o seguinte, não importa qual seja o seu significado, a referencia por certo não é a dum batismo de pessoas mortas que podem dificilmente transferir o seu batismo para os infantis, mas somente a um batismo por certas pessoas mortas. Conheço apenas uma tênue linha a que se possam, talvez, firmar (mas muito dificilmente!) para provarem o batismo de infantis no Novo Testamento; o fato de que em Atos 16: 15; 18: 8; e I Coríntios 1: 16 fala-se do batismo de “famílias” e Atos 16: 23 do batismo do carcereiro de Filipos, e que estas passagens não proíbem explicitamente a suposição de que infantis possam ter sidos incluídos. Pensamos, no entanto, da seqüência que é invariavelmente mantida mesmo nessas narrativas - a pregação da palavra, fé, batismo - e pensamos se realmente desejamos manter essa linha!

Não é portanto um pouco arbitrário, e um sinal de embaraço quando, à face destas circunstâncias, mais de um dos modernos defensores do batismo infantil afirma que não devemos compreender o Novo Testamento “legalisticamente”? Isto por certo não desejamos nós fazer. Mas, não mostram os defensores do batismo infantil, com a sua busca de argumentos no Novo Testamento; que não é sem sentido o dar-se o primeiro lugar à exegese? Se assim o fazemos no entanto, dificilmente poderemos chegar a uma outra conclusão, mas à de que o caso de uma prova de batismo infantil no Novo Testamento é mais do que fraca.

A Igreja que defende o batismo infantil, é particularmente a Igreja da reforma, está por certo altamente cônscia do decisivo problema exegético; e tem, portanto, várias vezes tentando dar, acima de tudo segundo o ponto de vista da sua prática, uma resposta à questão da relação, em termos de ordem, entre o batismo e a fé declarada em responsabilidade própria pela pessoa batizada. Aqui está o problema essencial e decisivo para a doutrina: podemos ficar ou não satisfeitos com os diferentes argumentos tendenciosos a que se tem apelado neste assunto?

Tem sido afirmado que as crianças são batizadas com base na profissão de fé da Igreja ou dos seus pais ou padrinhos. Mas haverá alguma substituição possível nesta questão de fé, a não se aquele da fé que Jesus por certo nos garante e pela qual ele nos pertence - mas, pela qual, no entanto, estabeleceu, a partir daí, a nossa própria fé? Lutero uma vez pensou na possibilidade e tal fides aliena, apenas para a rejeitar mais tarde com igual veemência. Em seu lugar colocou a idéia de uma fé primitiva, mas ao mesmo tempo verdadeira e real, que era pressuposta na própria criança a batizar. É curioso que o próprio Calvino sabe falar de tal semente de uma futura fé e arrependimento que se encontra na criança e é ativada pelo Espírito Santo. E J. Wolleb julgava conhecer infantes fidem non secus ac rationen habent; etsi non in fructu, tamem in semina et radice etsi non in actu secundo, tamem actu primo; etsi non operis externa demonstratione, tamem Spiritus sancti interna virude. Por outro lado, os modernos luteranos ensinaram que a fé da criança, juntamente com a sua regeneração, é dada pela primeira vez através do batismo. Desde que, ao mesmo tempo, eles se mantém firmes na opinião de que fé e confissão de fé anterior ao batismo deve ser requerida dos adultos (talvez judeus convertidos), colocaram-se na estranha posição de que o batismo realiza alguma completamente diferente nas crianças do que nos adultos. Nas crianças opera regeneração e fé, e portanto uma ratificação da sua justificação, ante Deus, que dará o real fruto nos anos de amadurecimento; mas nos adultos, depois de já terem recebido o novo nascimento e fé através da palavra de Deus anteriormente ao batismo, simplesmente (num momento, de acordo com o ensino reformado!) um obsignatio et testificatio de gratia Dei e daí um crescimento da sua renovação e do Dom do Espírito Santo. Mas ninguém é capaz de especificar como se conceber com precisão esta fides infantilis que é pressuposta e que se torna objetiva através do batismo. E por certo podemos afirmar corretamente que é pedir demais quando se refere a tal inverosímil possibilidade - ou melhor, uma invenção com tão evidente embaraço - ao invés de defender com a devida reverência da fé perante os mistérios de Deus. Segundo esta hipótese, a pessoa é arrastada de um para outro

17

Page 18: o Ensino Sobre o Batismo

labirinto. Mas uma defesa satisfatória do batismo infantil não pode ser fornecida com o auxílio desta hipótese, mesmo que ela própria pudesse ser levada avante.

Porque o que estaria a faltar em tal fé infantil, se tivéssemos que a tomar em consideração, seria a possibilidade de sua confissão e do pedido para o batismo; e, plenamente, não se deve omitir este requisito, se vamos evitar que o batismo seja um ato de violência. O judicioso Calvino, por esta razão, fez o mínimo uso possível desta hipótese e ao invés, compreendeu que a fé decisiva da criança batizada era aquela que tinha de ser autenticada e confessada mais tarde na vida.

Esta é a interpretação de batismo infantil que podemos descrever como a mais aceite atualmente, mas mesmo a esta foi-lhe adicionada a necessidade da chamada confirmação - “a ratificação do concerto do batismo”. Ninguém pode negar que o batismo infantil pede clamorosamente um tal aperfeiçoamento e suplemento. Schleiermacher diz em simples verdade: “Batismo infantil só é batismo verdadeiro quando a profissão de fé que vem depois de subsequente instrução é considerada como sendo o ato que o consuma”. Mas que é o batismo em si mesmo e como tal, se não possui uma referência ao consciente reconhecimento de regeneração e fé, que torna completa a realidade divino-humana que nele é representada, se não pode ser num sentido real e inteligível a confirmação e ligação na obediência do segundo personagem em ordem de importância - a pessoa batizada - se não pode ser uma questão de decisão e confissão? Será neste caso um batismo completo? Não será, ao invés, e notoriamente um meio batismo? E, por outro lado, que direito temos nós de atribuir à confirmação o significado de um meio sacramento? Poderá ser mais do que admissão na Ceia do Senhor o clímax da instrução dada pela Igreja?

Calvino corretamente chamou o termo confirmatio uma iniuria baptismi, mas na suposição do batismo infantil, não devemos falar tão abertamente da abolição ou desvalorização da confirmação. Porque, onde estará então aquela outra metade que falta ao batismo infantil? Não haverá, no entanto, talvez, uma iniuria que lhe é feita aqui? De acordo com o próprio, e em si mesmo excelente, ensino batismal de Calvino, o batismo não consiste somente em nós recebermos o símbolo da graça, mas é ao mesmo tempo, no nosso consentire cum omnibus christianis, na nossa pública affirmare de fé, na nossa iurare no nome de Deus, também a expressão de uma velle humana. Isto tem que ser, sem dúvida, em virtude do caráter cognitivo do poder sacramental. Então, neste caso, o batismo não pode ser batismo infantil. É estranho que Calvino parece ter esquecido isto no seu segundo capítulo, onde estabeleceu a sua defesa do batismo infantil, recomendando ali um batismo sem decisão e sem confissão! Deve este consentire, affirmare, uurare ser completado nalguma ocasião para tornar o batismo completo? Pode-se concluir a afirmação de que a confusão com a qual Lutero e Calvino, e os seus seguidores de ambos os lados se colocaram, neste assunto, é sem esperanças. Temos de admitir que - ao contrário dos modernos - eles se entregaram desesperadamente à solução deste importante ponto de doutrina. Mas, ainda tem que ser dito que a atual informação que recebemos deles no ponto decisivo é, na realidade, tão inacreditável como são insatisfatórios os fundamentos exegéticos. Podemos ler os capítulos 15 e 16 no IV Livro do Institutio, um em seguida ao outro, e convencermo-nos se o grande Calvino estava certo neste assunto ou se obviamente não estava, mas visivelmente nervoso, numa desesperada confusão de pensamento, abusando onde devia informar e, quando deseja convencer, procurando um caminho no nevoeiro que o não pode conduzir a nenhum alvo pela simples razão de que ele não tem nenhum.

Do ponto de vista de uma doutrina do batismo, o batismo infantil dificilmente poderá ser mantido sem artifícios e sofismas exegéticos e de ordem prática - a prova do contrário está ainda para ser fornecida! Se alguém o deseja manter, fá-lo com bases que estão fora das passagens bíblicas e fora do assunto, acerca do batismo.

18

Page 19: o Ensino Sobre o Batismo

A determinação de o defender em tão difícil campo tem por certo encontrado expressão século após século.

Vejamos rapidamente as difíceis razões que são consideradas importantes:

Calvino, realmente de uma maneira afetada, refere-se à necessidade que os pais piedosos tem de conforto, fazendo assim o batismo infantil desejável, e o mesmo argumento é apresentado hoje nos campos missionários. É um ponto de vista humanamente compreensível e respeitável. Mas, com que justiça pode o batismo ser praticado para satisfação desta necessidade - e um batismo com a sua verdadeira ordem distorcida? - Durante o período entre a Ressurreição e a Vinda de Jesus, a relação entre pais e filhos já não pode ter o significado decisivo que tinha para o Israel pré-messiânico. Por certo não tem o direito de fazer aberta desordem da ordem eclesiástica. Não devem os pais ser informados sem esta desordem? Não se lhes pode dizer que não têm necessidade de se lamentar porque os seus filhos infantis estão no Reino de Cristo?

Calvino, outra vez, compreendeu o batismo infantil como instituto para o bem e vantagem da criança, obrigando os pais, os padrinhos e toda a comunidade a dar-lhe uma educação cristã. Deve fazer-se menção desta solicitude justificável nas nossas liturgias batismais, que são governadas por consideração de ordem prática, e por certo há muito vinho novo para se colocar nos odres velhos afim de inculcar tal seriedade. Mas, aqui também temos que perguntar se o batismo deve ser usado para a proclamação desta séria solicitude - e num batismo com a sua verdadeira ordem distorcida? - O batismo cristão, na medida em que significa obrigação - mas haverá tal necessidade? - podia ser feito numa simples apresentação e benção pública do recém nascido.

Hoje em dia são muitos os defensores do batismo infantil, porque estão receosos de toda a sorte de “perigos” de umas das formas de batismo que pressupõe uma livre decisão e confissão pelo batizando, e que assim toma o lugar da atual confirmação - perigos tais como uma doentia pressão para conversões, escrúpulos, falsas ilusões de santidade, o levantamento de “igreja da elite”, farisaicas, etc. A isto temos que responder - aqui e em toda a parte - “perigos” não são razão contra o reconhecer e fazer o que é justo. Uma boa instrução batismal, na verdade, não seria necessariamente provada incompetente em face de tais “perigos”. A verdadeira questão no batismo assinalado por desejo e preparação, não é a separação antes do tempo determinado das ovelhas dos bodes, crentes dos incrédulos, justos dos injustos, o verdadeiro Corpo de Cristo dos cristãos nominais, que só o são de boca. É algo muito diferente, e é isto: dar oportunidade uma vez mais para a livre ação e controle do Espírito Santo na chamada e reunião da Igreja à qual, a atual prática de batismo procura fazer séria violência. Sem nenhum legalismo, seria fácil formar assim a prática de batismo para que a Igreja ao batizar se assegure - não em relação a fé, regeneração, conversão, revestimento do Espírito Santo, daqueles que ela batiza, - mas da sua livre decisão e confissão; de maneira que as pessoas batizadas possam sempre lembrar-se do seu batismo como uma experiência na qual participaram pessoalmente, pelas conseqüências do que eles são obrigados e devem ser influenciados, pelo que são separados da Igreja e de todos mais, perante todo o mundo.

Não é o verdadeiro “perigo”, a existência de uma cristandade, que mesmo em matérias que afetam o próprio cristianismo, pode com uma certa justiça formal negar responsabilidade? - Embora isto seja ainda tão escondido de nós que podemos perguntar acerca destes outros perigos? É realmente a “perfeição” a nossa maior preocupação?

Muitos bons teólogos hoje em dia abandonariam relutantemente o batismo infantil porque, sem dúvida, oferece uma ilustração drástica do ensino da Reforma da antecipada livre graça de Deus. Isto por certo é verdade. É realmente notável que os próprios reformadores, tanto quanto estou apto a ver, fizeram muito pouco uso deste argumento. Devemos tratar o assunto com uma certa precaução. Com a explicação sumária de que a verdade de Deus não deve ser feita dependente da nossa fé, devemos justificar uma prática como aquela que Carlos Magno

19

Page 20: o Ensino Sobre o Batismo

empregou com os saxônicos, ou aquela usada em certa altura pelos missionários da Igreja Católica Romana na América do Sul quando batizaram vilas inteiras de índios com uma espécie de mangueira de bombeiros? Também não deve ser menosprezado que deste argumento se pode pretender a admissão dos infantes à Ceia do Senhor. Por certo, desde que por razão do seu batismo eles são membros da Igreja, propriamente falando, isto deve de ser pretendido. Seriamente, este argumento de graça antecipada só tem peso se a correção do batismo infantil pudesse ser provada por outros meios. O ensino acerca da graça livre pode ser ilustrado, se não tão drasticamente, pelo menos mais completa e exatamente, num batismo livre e responsável.

Estarei errado em pensar que o verdadeiro poder extraterreno para o batismo infantil, mesmo no caso dos Reformadores, e claramente sempre desde então, tem sido este: não queriam então em nenhum caso e por nenhum preço negar a existência da Igreja Evangélica no corpus christanum de Constantino - e hoje não querem renunciar à presente forma da Igreja nacional? Se abandonasse o batismo infantil, a igreja não continuaria facilmente a ser a Igreja do povo no sentido de uma igreja do estado ou uma Igreja das multidões. Hinc, hinc illae lacrymae! Não tem a ansiedade, que se mostra aqui, muitas vezes inconscientemente, a primitiva forma que Lutero certa vez confessou: não haveria muito povo batizado se, ao invés de serem levados ao batismo, tivessem que vir pela sua própria vontade? Não nos enganamos acerca da dificuldade da decisão pessoal - histórica, prática e atual - que é óbvia aqui. Mas, apesar disto, podemos perguntar: São legítimas estas ansiedades? Não viria a ser, mesmo neste assunto, que para ter sucesso naquilo que pretendemos, de qualquer maneira e a todo o custo, devemos examiná-lo de perto? Estamos nós tão certos da palavra interna do sistema de Constantino e da forma atual da Igreja Nacional - está a nossa consciência tão esclarecida nestes assuntos - que nós precisamos e devemos decidir mantê-las firmemente a todo o custo - mesmo ao custo de infligir feridas e fraqueza na Igreja devido a um batismo desordenado? Ou, pelo contrário, não mostra isto imediatamente a evidente desordem da nossa prática de batismo: que há uma desordem na estrutura sociológica da nossa Igreja, a qual terá talvez ainda de ser suportada por um longo tempo, mas que não poderá ser apresentada como um sério argumento contra um melhor arranjo da nossa prática de batismo? Onde é que encontramos escrito que os cristãos não podem estar em minoria, talvez numa muito pequena minoria? Não serão eles de maior utilidade para o seu meio ambiente se lhes fosse permitido ser uma Igreja saudável? O que é realmente desejável para a Igreja a fim de permanecer uma Igreja nacional no atual significado do termo: uma Igreja do povo, ao invés de uma Igreja para o povo?

A teologia tem de declarar que o assunto de importância do melhor arranjo da nossa prática do batismo é importante para a questão de como isso se dará.

Isto é, então, o que tem de ser dito acerca da ordem do batismo do ponto de vista do candidato: há um convite para um restabelecimento, o que é desejável e muito simples: ao invés do atual batismo infantil, um batismo que seja um ato responsável da parte do candidato. Se é para ser natural, o candidato, ao invés de ser um objeto passivo no batismo, tem que se tornar uma vez mais o livre companheiro de Jesus Cristo, isto é, decidindo livremente, confessando livremente, declarando da sua parte o seu desejo e preparação.

(A questão de como este restabelecimento será estabelecido na prática não pertence à esfera desta apresentação doutrinal. Eu tenho as minhas próprias opiniões sobre o assunto e desejava expressá-las na minha palestra em Gwatt com o propósito de completar o assunto. Essa importante passagem é aqui suprimida porque desejo que os leitores ponham sua atenção principal e exclusivamente na questão teológica - sem ser perturbado por considerações de política eclesiástica - e para manter a minha declaração num nível teológico. Tudo quanto tiver que acontecer tem que começar, de qualquer maneira, com uma nova consideração teológica deste ponto especial de doutrina do batismo, e isto infelizmente não tem sido feito desde o século 16. Mas aqueles que estão intimamente preocupados com interessados em, e indicados para a

20

Page 21: o Ensino Sobre o Batismo

política eclesiástica não podem escapar à responsabilidade por supô-la colocada sobre outros, ou por evitar considerações sobre o assunto do seu ponto de vista).

21

Page 22: o Ensino Sobre o Batismo

V

A eficácia do batismo consiste nisto, que a pessoa batizada é colocada uma vez e para sempre debaixo do sinal da esperança, em conseqüência da qual ele já tem a morte para trás de si e somente vida à sua frente, e em conseqüência do qual a sua luz brilhará para a glória de Deus entre os povos, porque os seus pecados estão perdoados.

Voltemos ao nosso ponto de partida na Tese I. O que acontece a um homem no batismo é que ele é colocado e coloca-se a si mesmo na sombra e luz deste fato: que na morte e ressurreição de Jesus Cristo, ele também morre e ressurge novamente. No batismo ele é convencido disto com certeza divina e pode assegurar-se a si mesmo disto; ele é portanto preso com autoridade divina e a partir daí se entrega a si mesmo. “Pois vós sois todos filhos de Deus, pela fé em Cristo Jesus. Pois todos vós que vos batizastes em Cristo, estais em Cristo”. (Gálatas 3: 26-27). Na promessa que nos é feita por Deus no batismo, aquilo que é prometido está abundantemente presente, como Gregório de Nissa claramente o expressou. O vosso batismo é a vossa tota innocentia, tota pietas, tota gratia, tota sanctificatio; assim Ambrósio impunha aos candidatos. “O batismo torna um homem de uma vez para sempre e completamente puro e santo, de maneira que não falta nada para o título da herança de benção além da fé na misericórdia de tal Deus””.

“Pelo batismo, uma vez o tenhamos recebido, participamos e somos colocados no número daqueles que estão para ser abençoados, e Deus faz conosco um eterno concerto de graça”. Pelo batismo, Cristo fez-nos participantes da sua morte... e aqueles que recebem o batismo com fé verdadeira, realmente sentem (vere sentiunt) a eficácia da morte de Cristo na mortificação da sua carne e a eficácia da sua ressurreição na Vida do Espírito”. Se lermos estas e outras similarmente fortes e triunfantes palavras do Novo Testamento, da Igreja primitiva e dos Reformadores acerca do efeito do batismo no batizado, e nos inclinarmos a perguntar se não dizem demais, se idéias “mágicas” - das quais tão louvavelmente nos libertarmos - não terão nelas um lugar ilegal? Então isto tem que ser recordado: estas e outras tais palavras dizem demasiadamente pouco ao invés de excessivamente. Nenhum cristão é tão bom cristão que a sua compreensão e experiência da plenitude da Graça que é sua no batismo poderia corresponder, a não ser de muito longe, à realidade. Ainda mais, quão grandemente está o batismo obscurecido em toda a parte, para vós, pelos vários desfiguramentos e perversões nesta observância! Quão longe está removido de nós, em prática, o poder para se conseguir formar um julgamento claro neste assunto! Vejamos, mesmo por um momento, através de toda a confusão pela qual somos pessoalmente responsáveis, e através de toda a ordem e desordem prática em relação ao batismo, a sua verdadeira natureza, poder e significado, então teremos de admitir que acerca do seu efeito - acerca daquilo que realmente executa - não podemos pensar suficientemente alto, ou falar suficientemente forte. Esclarecemos uma vez mais que nenhum abuso do batismo pode prejudicar de qualquer maneira a sua atual eficácia. Esta é independente da pureza ou impureza, do valor ou indignidade, da Igreja que o administra, ou dos seus representantes.

Non recte datur, tamen datur, escreveu Agostinho, acerca do batismo herético. Corrigo in te, quod tuum est, agnosco quod Christi est. “Se eu esperasse até estar certo de que o que batiza é santo, então, nem eu nem ninguém seria jamais batizado, e eu teria que eliminar da Oração do Senhor, que todos devemos dizer: Perdoa-nos as nossas culpas!” “Mesmo que aqueles que nos batizam fossem completamente ignorantes de Deus e sem piedade, ou fossem desprezadores, mesmo assim eles não nos batizaram com a sua ignorância ou sacrilégio dentro de uma comunhão, mas na fé de Jesus Cristo... O nosso batismo foi de Deus e incluiu nele a promessa de perdão de pecados”. Convicção assim foram o resultado do conflito com os hereges do IV século, para trás dos quais não temos necessidade de recuar. É possível que haja

22

Page 23: o Ensino Sobre o Batismo

casos duvidosos nos quais é impossível reconhecer, na prática, o que é chamado como tal o ato do batismo. Mas é bom neste assunto permitir, à pobre Igreja que batiza em todas as suas formas, de as exercer ao invés de a constranger.

O que o batismo realiza pode manifestamente, segundo a natureza do caso, não ser dependente - tanto quanto toma e considera o candidato - tanto na quantidade de piedade ou impiedade com que ele recebe o sacramento ou na perfeição ou imperfeição cristã com a qual ele depois, como receptáculo do sacramento, se põe ao trabalho e se prova a si mesmo. Aqui também entra em questão um imenso mar de abusos do batismo, um tremendo abismo de negação e engano. A eficácia do batismo pode obviamente ser obscurecida por tal abuso pessoal da parte do candidato, de maneira que torna-se para ele uma coisa quase, ou mesmo completamente, desconhecida. Devemos, no entanto, dizer em acordo com o ensino batismal dos Reformadores, que o batismo nunca mais pode ser anulado por isso como também o não pode ser por abuso eclesiástico. Opera irresistivelmente: ad dandam gratiam non modo non ponentibus, set etiam obstinatissime ponentibus obicem.

A Igreja Romana tornou o batismo praticamente sem significado por tomar em consideração um obex (obstáculo), que pode ser oposto à graça batismal, pela pessoa batizada; descrevendo esta graça como uma coisa que pode fácil e rapidamente ser perdida de maneira irreparável devido a novos pecados que começam depois do batismo; e por colocar por detrás do batismo o, muito mais fácil de manejar, sacramento da penitência, para recompensar tal perda. E é realmente notável que um cristão romano, embora seja ensinado que o batismo era absolutamente necessário para ele, e que através do seu ex opere operato veio a ele o perdão de pecados e a regeneração, até no dia presente tem do seu batismo (inalienável e não necessitando de aperfeiçoamento) não mais do que a transmissão de um “caráter” cristão, indestrutível, mas inteiramente vazio de significado, o pré-requisito para a recepção dos seis restantes sacramentos. Devido à pocessão desta “disposição” ele pode tanto crer como não crer, tanto ser salvo como perdido. A montanha deu à luz um rato. Felizmente, no entanto, isto é como se apresenta para o cristão romano, somente de acordo com o texto da sua dogmática. “Porque o que Deus cria e realiza são obras inabaláveis, por certo imutáveis e eternas, assim como Ele é imutável e eterno. Portanto resistem e permanecem firmes e inabaláveis, e não são alteradas mesmo que as abusemos todos juntos. Mas, o que fazemos é instável e incerto, assim como nós mesmos somos, de maneira que não podemos descansar nem construir sobre isso... Que eu tenha sido batizado, não é meu trabalho, nem tão pouco aquilo que me concedeu.

Porque não é chamado o meu batismo, nem tão pouco do sacerdote ou de qualquer outra pessoa, mas o batismo de Cristo meu Senhor, e não necessita absolutamente nada da minha ou da tua pureza. Porque nem eu nem ninguém podemos santificar o batismo e torná-lo puro, mas todos nós devemos ser santificados e purificados pelo batismo”. O argumento total de Paulo em Romanos 6; Gálatas 3; Colossenses 2 seria retórica sofisticada se ele não tivesse tomado em consideração que, em todas as circunstâncias, o batismo tem um real significado para a pessoa batizada, uma absoluta eficácia - isto é, uma eficácia que não consiste simplesmente num apagado “caráter”, mas uma eficácia que devido à sua natureza, poder e significado, se ri de qualquer obex. Pelos céus, quem tem coragem de se exaltar contra a Graça que lhe pertence no batismo, de qualquer outra coisa senão de ser ele o único e realmente formidável obex?

Em todas as circunstâncias, o homem batizado difere do não batizado, como um que foi colocado debaixo do sinal da morte e ressurreição de Jesus Cristo, sob o sinal da Sua esperança. Seu destino, Sua vinda, devido ao decreto divino aceite e declarado sobre ele. Difere do não batizado em todas as circunstâncias; quer pense sobre isto ou não, quer lhe dê honra ou não, ele é, por aquele sinal, um homem assinalado, um homem que, por aquela representação, foi assim condicionado. Isto não é da sua própria autoria; nem tão pouco pode ele pela sua própria vontade deixar de o ser: Pode pôr um fim à vida que Deus lhe deu. Não pode, no entanto, despojar-se do seu batismo, assim como ninguém o pode tirar dele. Pode tornar-se um Maometano, asteta ou

23

Page 24: o Ensino Sobre o Batismo

ateísta, um nacional socialista ou um bolchevista, ou - pior de tudo - um herético, ou um mau cristão ou um meramente nominal. Pode tornar-se um Católico. Ele não deixa, no entanto, de estar debaixo do sinal.

A total, superpopulosa humanidade perversa das terras do ocidente está debaixo do sinal. Pode - na paciência e ira de Deus - tornar-se per nefas afastada nesse assunto, e há a possibilidade - isto também na Paciência e ira de Deus - de poder fazer dele um uso correspondente fatal. Mas que a humanidade permanece debaixo do sinal não é menos verdade, e talvez - não, certamente - isto seja o melhor que se pode dizer sobre o assunto. Tanto Hitler e Mussolini como o Papa estão debaixo do sinal. Para melhor compreensão do assunto pelos mais devotos cristãos, assim como daquele de mais madura percepção e decisão, tudo pode depender no fato de que ele próprio - realmente sua própria perversidade - não se envergonha de permanecer debaixo do sinal, juntamente com toda a sorte de perversões e as mais estranhas pessoas. Há no reconhecimento deste sinal, na sua observância, no seu uso, na atitude humana a seu respeito, e ligado a partir daí, na forma de fé e vida que resulta, grandes, terrivelmente grandes, diferenças. Uma pessoa fará melhor em aclarar a circunferência da sua própria fé e vida e não a de outros. O próprio sinal, no entanto, como tal, está e permanece e tem o seu significado para todos estes homens; deixemos que cada um pense primeiramente e sobre tudo o que faria a este sinal - a despeito de todas as possibilidades e hesitações - não tivesse sido criado para ele. Então por certo não negaria que o mesmo é válido para outros, e para os mais desesperados casos entre estes, e isto é para vantagem deles assim como o é para si próprio.

Ninguém deveria desprezar este sinal porque ele é em si mesmo tão significativo, embora a sua marca - ao contrário da circuncisão dos Israelitas - não deixe sinais visíveis porque os poucos pingos de água, com os quais fomos uma vez aspergidos com a invocação da Trindade, secaram já há muito tempo; porque consiste agora apenas no fato de que este rito foi executado uma vez em nossas vidas, donde - de acordo com a atual prática de batismo - nós não possuímos nenhuma memória, mas simplesmente um certificado. Foi, no entanto, uma ocorrência real; foi, no entanto, esta representação que teve lugar e nós mesmos estávamos no centro dela. E esta representação no centro dela. E esta representação no centro da qual estávamos, foi a representação da quinta-feira santa e o dia de Páscoa como a tarde e manhã do grande dia das nossas vidas, aparentemente insignificante, mas não para ser rejeitado e não há nada para ser mudado quanto ao seu significado. Da mesma maneira, podíamos e devíamos pensar do batismo de cada outra pessoa. De que outra maneira pode um homem pensar corretamente acerca do seu próprio batismo?

Nem tão pouco devíamos desprezar este sinal pelo fato de, talvez, se tenha dado entre o dia do nosso batismo e o tempo presente, muitos acontecimentos, encontros e experiências, iluminações espirituais e crescimento moral que nos podem parecer sinais muito mais importantes e impressivos da nossa comunhão com Deus. Notemos qual o sinal que nos leva vitoriosos através de todas as coisas, através de todas as experiências menos edificantes das nossas vidas, assim como aquelas outras que causam mais profunda impressão. Diz-se de Lutero que teve horas nas quais estava confundido acerca de tudo - acerca da reforma, acerca da sua fé, até mesmo acerca do trabalho do próprio Jesus Cristo, horas em que ele não conhecia nada mais para o ajudar (e realmente o ajudou) exceto o escrever com giz na sua mesa as duas palavras: Baptizatus sum! Um conceito mágico? De qualquer maneira, uma mágica estranha e sóbria, que sabe utilizar uma tão simples lembrança, e trabalhar tão eficazmente! Mas aquele que sabe confortar-se a si próprio desta maneira, não disputará que este mesmo conforto está realmente ao alcance de outros que presentemente parecem ignorá-lo, que talvez nunca venham ao seu conhecimento.

Tentemos agora descrever, no mínimo de palavras possível, a essência deste sinal, válido e eficiente no seu completo significado para cada pessoa batizada. É o sinal da esperança oferecido pela Igreja como parte do seu serviço à pessoa batizada, tão certo como é o sinal de

24

Page 25: o Ensino Sobre o Batismo

Jesus Cristo (da morte que Ele uma vez experimentou e da ressurreição do seu corpo completo que Ele também uma vez experimentou) e também o sinal do indivíduo em questão. E portanto um sinal escatológico. Isto quer dizer: a aparência da realidade que ele denota ocorrera no e com o aparecimento de Jesus Cristo como alvo e fim do período começado com a sua ressurreição. Designa o batizado como um que, embora ainda vivo, tem a sua morte já para trás de si por causa da morte de Jesus Cristo em seu favor; como um que, por causa da ressurreição de Jesus Cristo em seu favor, embora tenha de morrer, tem à sua frente a sua verdadeira luz, vida eterna na nova Era do Reino que está para vir - e somente a sua vida. Precisamente como um sinal escatológico, aponta também para o coração da vida que o batizando está a viver aqui e agora; para o seu passado; e para o seu futuro no tempo daquele (Aeon), que está presente conosco e apressando-se em direção ao seu alvo e fim. Aponta para o seu passado aqui e agora; isto é, no entanto, para a sua intenção de brilhar para a glória de Deus, como um que foi perdoado por livre compaixão.

Não há nenhum outro passado nem nenhum outro futuro por detrás deste sinal para o tempo e eternidade de e para a pessoa batizada. Aquele que recebeu este sinal é apontado e preparado para a glorificação de Deus no crescimento da Igreja de Jesus Cristo, para testemunhar do vindouro Reino de Deus. Não há nada a objetar se uma pessoa deseja considerá-lo como, em realidade, o suportador de um character indelebilis. Tal caráter tem então de ser compreendido, no entanto, não como um molde vazio, mas como a intenção e preparo transmitido ao batizando em todo o seu rico conteúdo. E realmente algo indestrutível, a que pode apelar em todas as circunstâncias e para o qual, em todas as circunstâncias ele se pode firmar.

Por certo este sinal deve ser compreendido e tomado pela fé em todos os momentos. Por certo - o grande aviso de I Coríntios 10: 1- 13 nunca deve ser esquecido! - não aproveita ao homem, se isto realmente acontece, a cada pessoa batizada não pode ser dito demasiadamente forte que o sinal foi-lhe dado, não lhe pode ser tirado outra vez e ele somente pode rejeitar a fé por insensível contradição deste sinal. Por certo, deve haver vida que corresponde a este sinal. Mas esta não é a coisa mais importante na qual insistir. Ao invés, deve-se insistir nisto: que a pessoa tomada neste símbolo é recrutada para uma vida de responsabilidade. Por certo, mesmo debaixo deste sinal, uma pessoa pode falhar, cair e naufragar. Mas esta não é a coisa mais importante que todos deveriam ouvir. Ao invés, isto deveria ser dito: que o sinal nunca deixa de ser um apelo dirigido a todos aqueles que estão fracassando, caindo e naufragando - e qual de nós não está? Por certo, debaixo deste sinal continua a haver dificuldades, vergonha, julgamento e o terrível castigo de Deus. Mas esta não é a coisa essencial que tem de ser dita a este respeito. Ao invés, que, quer reconhecido ou não, é inalteravelmente o sinal de conforto e aviso, o sinal da promessa. Podemos dirigir-nos a uma pessoa de diferentes maneiras; mas se nos dirigimos a ela acerca da eterna eleição de Deus e acerca da conseqüência, que Jesus Cristo morreu e ressuscitou outra vez para ela, e a respeito da sua cidadania que recebeu no seu batismo, então pressupomos que a promessa é válida para ela e continua certa.

Precisamente por causa disto a sua eficácia é finalmente válida, o batismo não necessita de repetição nem tão pouco excesso de ênfase. Precisamente por causa disto, qualquer rebatismo arbitrário envolve uma difamação do batismo e é, como Vilmar corretamente disse, blasfêmia contra Deus. A Ceia do Senhor, a pregação, e a oração podem e devem ser repetidas. A glória de Deus é o tema de cada novo dia, de cada nova hora. A glória do batismo, entre todas as partes da proclamação da Igreja está na sua “uma vez para sempre”. Pois Jesus Cristo morreu uma vez pelos nossos pecados e ressuscitou uma vez dos mortos para a nossa justificação: efapax, uma vez para sempre.

25