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O EDUCADOR NA CONCEPÇÃO DE DURMEVAL TRIGUEIRO MENDES
Dr. Maria Judith Sucupira da Costa Lins – Faculdade de Educação – Universidade Federal
do Rio de Janeiro
I - CATEGORIAS FUNDAMENTAIS DA CONCEPÇÃO DE EDUCADOR
Esta Concepção pode ser entendida a partir de duas categorias fundamentais: 1. Aspectos
Filosóficos da Concepção de Educador e 2. Aspectos Sócio-Políticos da Concepção de Educador.
Para a compreensão da concepção de Educador em Mendes, os aspectos filosóficos são
imprescindíveis pelo embasamento que representam, assim como os aspectos Sócio-Políticos são
lembrados como a categoria referencial que permite o estudo da concepção de Educador coerente
a uma visão da realidade.
1. Aspectos Filosóficos da Concepção de Educador
Toda ação no plano educacional deveria ser fruto de um pensamento filosófico, pois: “O
agir é a primeira disciplina fundamental do ser humano, frutificando na multiplicidade indefinida
do fazer.” (Mendes 1974 b - p.141) Neste sentido surge o papel filosófico por excelência do
Educador. A concepção de Educador prende-se ao conceito de Educação:
A Educação é uma prática interseccionada dialeticamente pela teoria, mediante a aproximação filosófica, científica e artística, na medida dos interesses, das necessidades e das opções da sociedade e do Estado, em que se incluem o indivíduo, os grupos, as instituições e as classes como sujeito social, cultural, político e econômico. Os sujeitos são o educador e o educando, (grifo do Autor) dentro das circunstâncias historicamente estruturadas. ( Mendes, 1988 a - p. 20 ) 1
Já no início do citado artigo, aparece sob qual perspectiva observa o Educador:
O Educador é um ser complexo que assume dimensões diversas, especialmente a de professor. Mas começa que o educador não tem uma tarefa profissional em sentido estrito: suas funções básicas se desenvolvem intrinsecamente entre o agir (grifo do Autor) acionando fins, valores e objetos, e o fazer (grifo do Autor) modificando o homem concreto.”( Mendes, 1988 a -p. 9 )2
Uma delas, “especialmente a do professor,” realiza mais fortemente a junção entre o agir e o
fazer em seu ser. Observe-se: “A grande batalha se concentra sem dúvida, na criação de um
novo professor.” (Mendes,1967 a -p. 77) 3 Voltando-se à definição de Educador, questionemos.
1 MENDES- Subsídios para a concepção do educador, in Trigueiro, D. - Concepção do
Educador e da Universidade - p. 9-20 - Joao Pessoa , UFPb 96 p. 1988 a.
2 idem 3 MENDES, D. Governo da universidade. Revista Brasileira de Estudos Pedagogicos. Rio de
Janeiro, 47(105): 68-90,jan/mar. 1967 a.
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Se não há uma “tarefa profissional em sentido estrito” não há um profissional em sentido
estrito ? Acostumados a esta correlação profissional, surge a necessidade de indagar em busca do
profissional em sentido não estrito. Como encontrá-lo ? O agir é, no pensamento de Mendes, a
própria dinâmica do processo educativo. Antes da discussão entre o agir e o fazer, uma outra
análise se impõe. Qual é a concepção de Educador ? Buscando-se o pensamento de Mendes, em
seus pareceres, conferências, artigos, aulas, discursos, pronunciamentos, vemos que a concepção
de Educador não se encontra limitada a de um profissional reconhecido por formação
determinante e/ou condicionante por legislação específica. Ao contrário, a concepção de
Educador é multiplicada em muitas formas e se concretiza no homem comum em diferentes
feições, sendo também político, filósofo, sociólogo, psicólogo, pedagogo, antropólogo, artista e
outros. A reflexão sobre o agir e o fazer leva à concepção de Educador em outras roupagens, mas
cuidando de um agir e um fazer próprios. A questão da Filosofia é das mais pertinentes em
relação à conceituação do Educador: “O Educador se prende ao vértice da filosofia, ao da ciência
e ao da arte.” ( Mendes, 1988 a -p. 12)4 Mendes busca uma filosofia comprometida com a
realidade. Aprofundando a reflexão sobre a concepção de Educador, é importante analisar quais
as perspectivas para a própria idéia do que seja educar. Mendes alerta para as precárias condições
da Educação que se distanciou da filosofia: “A Educação aparece sem filosofia, sem política, sem
economia, desligada ao mesmo tempo de seus objetivos e valores reais, como de suas condições
históricas e sócio-culturais.” ( Mendes, 1983 - p. 88 )5 O homem se afirma pelo seu agir e este
agir não pode se divorciar do pensar filosófico, tornando-se nesta vinculação um fazer real.
Pensar a Educação é se voltar para a reflexão filosófica profunda que aponta a construção de um
embasamento de valor para o ato educativo. A concepção de Educador deve ser pensada no
sentido político, retomando a dialética do saber/fazer integrada na questão da “polithea”.
4 __________ Subsídios para a concepção do educador, in Trigueiro, D. - Concepção do
Educador e da Universidade - p. 9-20 - Joao Pessoa , UFPb 96 p. 1988 a.
5 __________ Filosofia da Educação Brasileira. Rio de Janeiro. Civilização Brasileira, 239 p.-
1983
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2. Aspectos Sócio-Políticos da concepção de Educador
Não se pode compreender a concepção de Educador exceto a partir dos seus aspectos
sócio-políticos, principalmente no pensamento de Mendes. Todo sujeito em uma sociedade é um
ser político, e por isso usa o termo “político” no sentido da “Paideia” e da “Politheia”, procurando
sempre esclarecer:
O político não é profissional no contexto de minha análise. O agir (grifo do A)(plano ético) e o fazer (grifo do A) (plano normativo do Estado) estão no cidadão e na cidade; o político, então, se incumbe da res publica (grifo do A (...) com visão histórica subsidiada pela “consciência possível”, incompatível com os estilos patrimoniais de agir e de fazer pro domo, (grifo do A ), ou em forma de clã. ( Mendes, 1988 a - p. 14 )6
Procurar as relações entre a concepção de Educador e a concepção de político é buscar
explicações no agir e no fazer do cidadão. O agir é uma instância com origem no plano ético a ser
viabilizado no fazer dentro do plano concreto. O Educador é o político, não o profissional político
simplesmente, mas o político enquanto o sujeito que:
se destina também à abertura exploradora para a mudança social através de, e ainda, rente apenas (grifo do Autor) às circunstâncias no tempo e no espaço destinados à clientela; mas ele se destina também (grifo do Autor) à abertura política e histórica, acionada pelo sujeito social e pela vontade política. (Mendes, 1988 a - p. 14 )7
Esta analogia valoriza o agir político do Educador. Esta é uma reflexão básica para o
educador chamado ao agir numa perspectiva mais ampla. Assim pensa que a Faculdade de
Educação, no que diz respeito à manutenção do espírito crítico essencial à condição do Educador,
deve: “Instaurar nova paideia, dentro de uma polis que ela ajuda a construir, a compreender ou a
transformar.”( Mendes, 1974 b - p. 142 )8. O Educador é aquele que não só observa a vida social
e encontra a sua função restritamente limitada, mas é alguém inserido nesta vida social e em
constante processo de construção desta vida. Trata-se de uma percepção que o Educador
desenvolve para melhor encontrar seu caminho. As exigências de uma sociedade brasileira a
6 __________ Subsídios para a concepção do educador, in Trigueiro, D. - Concepção do
Educador e da Universidade - p. 9-20 - Joao Pessoa , UFPb 96 p. 1988 a.
7 idem 8 __________ Fenomenologia do processo educativo. Revista Brasileira de Estudos
Pedagogicos. Rio de Janeiro, 60 (134): 140-72, abr/jun. 1974 b.
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ser total e radicalmente transformada, conforme enfatiza, criam uma nova concepção de
Educador. A concepção de um novo Educador se impõe como conseqüência da insatisfação com
um tipo de sociedade e a busca por uma nova. Um Educador engajado com o seu agir na
sociedade e ao mesmo tempo seu transformador é o que se aprende na leitura dos seus textos. No
entanto cabe lembrar que para Mendes não pode haver idealismo sem competência, nem a praxis
( este agir transformador) surgirá do nada. Surge uma concepção de Educador como resposta
social, dialeticamente compreendida. Em toda a sua obra se observa a reflexão sobre a vida que
realmente existe e o agir transformador do Educador. As mudanças necessárias são mais
profundas do que apenas uma inovação pedagógica ou metodológica, são transformações radicais
de toda a situação sócio-política que deverão acontecer com uma nova concepção de Educador.
Educação é um projeto simultaneamente político e filosófico, cuja compreensão não cabe exclusivamente no âmbito da racionalidade científica.Por ex: não há um currículo para a educação fundamental que possa ser estabelecido apenas por critérios científicos, como se tratasse apenas de um objeto suscetível de ser exaustivamente compreendido pelo saber objetivado.(Mendes,1983-p.60) 9
II - DIFERENTES POSSIBILIDADES DE EDUCADOR
Para Mendes a dinâmica do Educador está no ser do Professor, Artista e Agente Social
1. O Educador - Professor
Por mais ampla que seja a concepção de Educador, é quando este assume a função de
Professor que mais sistematicamente poderá realizar seu trabalho. Mendes relaciona a atividade
profissional do Professor com o próprio agir do Educador e mostra que o Professor deve se tornar
necessariamente um Educador. É a sua função primeira. É pelo seu agir, na relação dialética
estabelecida com o aluno-educando que o Professor se afirma como Educador.
O encontro deles (alunos) com os professores e mestres é o encontro de duas correntes, de águas diferentes, que vão formar o mesmo rio, cada um com um conteúdo próprio, nuns se exprimindo sobretudo como uma potencialidade antecipadora ( grifo do Autor) e noutros como uma potencialidade formadora (grifo do Autor). ( Mendes, 1967 a - p. 77 )10
9 __________ Filosofia da Educação Brasileira. Rio de Janeiro. Civilização Brasileira, 239 p.-
1983
10 _________ Governo da universidade. Revista Brasileira de Estudos Pedagogicos. Rio de
Janeiro, 47(105): 68-90,jan/mar. 1967 a.
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O Professor se torna Educador não ao lidar com os conteúdos programáticos, necessários,
mas na medida em que possibilita o fazer e o ser do aluno. É visando possibilitar este
acontecimento único “a intencionalidade do ser do educando” que o Educador aparece revestido
da função de Professor. Não é só pelo que ensina, embora isto deva acontecer, e bem feito, mas
pelo que ele oferece ao Educando enquanto oportunidade de vir a ser. A comunicação Professor/
Aluno é a raiz da atividade que deve se espalhar pela “polis”, completada no sentido da
“polithea”, presa à realidade a ser transformada. Infere-se que o Educador não se impõe
autoritariamente, mas com a autoridade de quem não pretende seu próprio bem, mas sim o do
Educando. Está numa posição dialética, vivencial, não só metodológica, mas integrada em seu
agir. O Pedagogo não é apenas alguém com um diploma na mão, mas alguém com um olhar
especial. Quanto ao olhar especial, a idéia está presente quando diz: “Temos de reconhecer que a
pedagogia é antes de tudo liberdade de olhar.” ( Mendes, 1973 - p. 230 )11. É o contemplar
acrescido do agir. “Liberdade de olhar” é não só contemplar, mas a partir da contemplação
necessária, agir. O Pedagogo desenvolveria este olhar especial, livre e criador, não se deixando
aprisionar por sistemas e organizações que lhe impedem a ação de Educador. O papel da
Faculdade de Educação no contexto brasileiro, Mendes vê: “Um sistema gerador de idéias e de
técnicas responsáveis pelo projeto educacional.”(Mendes, 974 b - p. 141)12 Neste sentido a
identificação Pedagogo/Professor com o seu papel necessário de Educador se faz urgente. Exige-
se uma responsabilidades maior quando este Pedagogo/Professor toma consciência do agir
transformador. Assim: “A nossa pedagogia deve ter a coragem de ser a arte do re-começo.
Pedagogia da dúvida em relação ao constituído, da esperança em relação ao que se está
constituindo.”(Mendes, 1973 - p. 233 )13 A escola que surge do processo dialético na e com a
11 __________ Realidade, experiência e criação. Revista Brasileira de Estudos Pedagogicos,
Rio de Janeiro, 59(130):227-40,abr/jun. 1973.
12 __________ Fenomenologia do processo educativo. Revista Brasileira de Estudos
Pedagogicos. Rio de Janeiro, 60 (134): 140-72, abr/jun. 1974 b.
13 __________ Realidade, experiência e criação. Revista Brasileira de Estudos Pedagogicos,
Rio de Janeiro, 59(130):227-40,abr/jun. 1973.
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sociedade, é um dos pontos centrais da questão do Educador/Professor. O Professor não mais
estaria preso ao modelo escolar , mas envolvido num projeto mais amplo da sociedade.
2. O Educador - Artista
Para a criação de uma nova sociedade, Mendes vê no Educador o Artista, o que cria, o
Educador/Artista, que pela criatividade gera uma forma original principalmente em seu ser.
Por ele - o fazer - é que as coisas vêm a nós, devidamente apropriadas pela nossa praxis, e são depois devolvidas ao mundo externo com o selo de nossa criatividade. Nós só sabemos o que fazemos, e não fazemos senão o que sabemos (...) o fazer é a experiência que retorna da percepção e se materializa na criação. ( Mendes, 1973- p. 229 )14
Não se trata do Educador/Artista que usa a Arte como intermediário entre seu agir e o
Educando. Educador/Artista é o que vive o sentido mais profundo da Arte, a Poiesis, processando
os elementos da sua realidade de modo a vivenciar algo especial. Sobre isto, afirma: “A educação
é, filosófica e sociologicamente, criatividade .”(grifo do A) (Mendes, 1973 - p. 231 )15. Partindo
da relação Educação/Criatividade, busca-se o sentido do Educador/Artista, na reflexão sobre o
significado da Arte. “A arte é a busca do absoluto no particular, e mais: ela é a busca do absoluto
no indivíduo e não na esfera do universal em que ele se perde.” (Mendes, 1973 - p. 228 ) 16
O Educador, como alguém sempre a refazer, aproxima-se do Artista, no sentido daquele
que faz a Arte. Discutindo a questão da Arte, e interligada a esta, a concepção de
Educador/Artista, é preciso refletir sobre o que é uma obra de Arte. Se a Educação é um processo
no qual a Arte acontece, o que seria então a obra de Arte ? Como seria possível ao Educador
contribuir para a elaboração da realidade? Esta “elaboração da realidade” é um dos pontos básicos
do agir do educador. O Educador pode mais facilmente ser aproximado com o Artista, alguém
que vive a Arte, e que pretende a “elaboração da realidade” pelo compromisso com a realidade do
absoluto que é cada indivíduo. O Educador se interessa, num sentido profundamente individual e
artesanal, pelo Educando ou não será um Educador. Embora se conheçam os problemas
existentes, o Educador não pode renunciar à relação artesanal do agir do Artista. Insiste no valor
da arte em relação ao indivíduo, lembrando: “A grande significação da arte na educação consiste,
14 idem 15 idem 16 idem
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a meu ver, em fixar, de modo concreto, o valor do indivíduo como fonte primária de
criatividade.” (Mendes, 1973 - p. 234 )17
A cultura de um povo é o elemento substancial do processo educativo. Assim comenta a
fenomenologia do processo educativo: “Há uma espécie de dialética pela qual um fazer inicial
instaura o ser, e depois o ser instaurado realiza os múltiplos fazeres através dos quais ele se
enriquece e consolida.” ( Mendes, 1974 b - p.144)18. Seria esta a própria praxis do Educador-
Artista ? O ser instaurado se desenvolve e se multiplica num processo que se torna mais
importante do que o produto final. Esta é a idéia da relação criadora Educador/ Educando,
buscando-se nesta relação destacar as possibilidades criativas da Educação. A preocupação com
as possibilidades criativas da Educação é uma das bases de seu pensamento, principalmente ao se
observar na prática educativa a ausência de uma política educacional. Insiste ainda:
A ação do educador e do educando recai sobretudo no agir, que é radicalmente criatividade; e o agir, convertido em instrumento é um jorro incessante de diferentes fazeres. A educação consiste, basicamente em acionar o agir (...) em ligar o homem-criador ao homem-artífice. (Mendes. 1974b - p. 146)19 O homem-criador ligado ao “homem-artífice” é uma idéia que faz refletir sobre o
Educador-Artista. Procurando-se as razões de um agir educativo, coerente com a realidade do
educando, chega-se ao que busca o Artista. O Educador e o Artista são insatisfeitos com a
realidade, não se acomodam a uma situação imposta, independente da tomada de consciência.
Estão procurando modificar a realidade, na ânsia de construção e de perfeição. Neste sentido, o
Educador é Artista, e o Artista exerce a função social de Educador. O Educador é um artista
especial. A obra de arte não é sua. Ele interage com o Educando, agente ativo do próprio agir.
A existência concreta do homem é permeada e fertilizada pelo eterno, não para concretizá-lo cumulativamente, mas para exercer incessantemente a aventura de sua interrogação; para viver a experiência de ser, (...) Não é só a aventura de interrogar, mas também a de responder por uma múltipla, diversificada e constantemente renovada resposta. (Mendes, 1973 - p. 236 ) 20
17 idem 18 __________ Fenomenologia do processo educativo. Revista Brasileira de Estudos
Pedagogicos. Rio de Janeiro, 60 (134): 140-72, abr/jun. 1974 b.
19 idem 20 __________ Realidade, experiência e criação. Revista Brasileira de Estudos Pedagogicos,
Rio de Janeiro, 59(130):227-40,abr/jun. 1973.
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Não há um produto a ser alcançado, e nisso o autor se distancia das práticas educacionais
vigentes, acenando com nova perspectiva. A Educação acontecerá pela Pedagogia da dúvida. O
Educador-Artista jamais encontra a terminalidade em seu agir, o qual é voltado para o devenir,
sempre situado no plano inesgotável da possibilidade e guiado pela perfectibilidade do Educando.
E neste paradoxo do eterno/urgente se instaura o agir do Educador-Artista. Renovação que é cada
encontro Educador/Educando, ambos vivenciam uma interação rica e profunda, geradora de um
agir social pleno que resultará no que a Educação pode ser entendida de mais essencial. Esta é
uma problematização, que nos leva a questionamentos importantes e busca de respostas, dentro
do quadro das suas idéias sobre a concepção e o agir do Educador, de tal ordem que este seria um
Educador-Artista. É o criador cujo agir é um in fieri exatamente porque sua obra está ela também
in fieri. Sua arte transcende todas as demais.
3. Educador - Agente Social
Na sua filosofia, a questão social da Educação é certamente das mais importantes, por isso
o estudo do Educador enquanto Agente Social se impõe. Educar é provocar em alguém a
transformação e autonomia, é tornar mais consciente de si mesmo e da realidade. Desde o
primeiro momento surge a dúvida sobre se todo agente social é um Educador. Ampliando o
raciocínio podemos perguntar também se todo cidadão, elemento participante da sociedade e
construtor do que se conhece como o elemento social, não seria ele também necessariamente um
Educador. Estas são as questões fundamentais que surgem a partir da leitura da obra de Mendes.
Observemos a questão da influência. Muito além de qualquer conceito moderno de Educação está
a inevitável ação influenciadora, seja consciente ou não. O processo de aculturação por exemplo,
um tipo de experiência pela qual a criança terá que passar para vir a ser um cidadão é fortemente
baseado na capacidade que esta já traz de imitar e de ser influenciada. A influência acontece a
partir desta propriedade intrínseca ao ser humano, e também a outros animais, de imitar. A
criança está constantemente imitando, o que significa também dizer que está recebendo
influências. Quem exerce influências ? Quem exerce influência é um Educador ? Sabe-se que o
Educador tem que estar consciente deste seu poder para que se organize adequadamente, desde
que a força de sua pessoa como um todo é muito grande e ele é na realidade um modelo para os
seus educandos, queira ou não, saiba ou não disto. A questão da influência é das mais discutidas
diante de uma postura honesta da parte do Educador que venha a caracterizá-lo realmente como
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Educador. Não adianta fugir da capacidade de influenciar, ignorá-la ou lutar contra ela. De
maneira coerente com a filosofia de Educação que norteia a sua prática, o Educador deverá
conhecer benefícios e perigos da influência que necessariamente exerce. O processo de Educação
é também um processo no qual acontecem influências, algumas intencionais, outras fora da
percepção, e também fora do controle, e neste o Educador é um agente de influência. Mas, todo
agente de influência é um Educador ?
Não é qualquer tipo de atitude do Agente Social que pode ser classificada de Educação.
Critérios indicarão quando o Agente Social é também um Educador, quando existe o processo de
Educação na ação influenciadora de diferentes membros da sociedade. Mendes lembra, que entre
outros importantes atributos, um deve estar presente nestes profissionais exercendo o papel de
Educador-Agente Social: a Criatividade. Sobre a criatividade nos artistas, diz: “Pode ser
simpático a muita gente, inclusive artistas, que se atribua a estes o privilégio da criatividade. Mas
a verdade é que a criatividade não é especialização, mas a condição do homem.” (Mendes, 1973
- p. 232 )21. Analisando-se estas possibilidades diversas de Agentes Sociais entende-se a
ampliação do conceito de Educador, calcando sua definição em características fundamentais que
deveriam estar presentes de modo especial também nestes outros Agentes Sociais. Ainda sobre
este aspecto, afirma que: “Em última análise a sociedade ajuda cada um a ajudá-la.” ( Mendes,
1969 - p.9)22. O que se entende é que Agentes Sociais devem participar da Educação com um
agir próprio de reconhecida importância. A sociedade influencia, no entanto, será que sempre a
sociedade educa ? Quando a sociedade não educa e apenas influencia ? A sociedade age num
sentido educacional em suas circunstâncias particulares e específicas. A idéia de Agente Social
tem fundamento no princípio de que a Educação está submersa em objetivos sociais. O Educador
se distancia dos outros Agentes pois trabalha “quase artesanal no logos (grifo do A.) e na praxis
21 __________ Realidade, experiência e criação. Revista Brasileira de Estudos Pedagogicos,
Rio de Janeiro, 59(130):227-40,abr/jun. 1973.
22 _________ Um novo mundo, uma nova educação. Revista Brasileira de Estudos
Pedagogicos, Rio de Janeiro,51 (113):9-18, jan/mar. 1969.
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(grifo do A .) da aula”, (Mendes, 1988 a - p. 14)23. Entende-se o Agente Social como o cidadão
ativo, consciente do seu papel na sociedade e integrado num agir que o aproxima do Educador.
Ele terá um agir na Educação, como os outros sujeitos da sociedade, mas na realidade com uma
limitação específica, como lembra o autor: O Educador-Agente Social representa em síntese o
agir do Educador participando ativamente da sociedade, num contexto a ser transformado.
III - REFLEXÕES FINAIS
Pode-se encontrar um perfil do Educador em alguns autores, mas não na obra de Mendes.
O Educador não é superior e perfeito, pois este ser não existe, mas aquele que se põe
constantemente em movimento, modificando-se pois se vendo inferior e imperfeito.
Por isso não apresentamos respostas definitivas. Pode-se concluir que o Educador é o
sujeito responsável pela construção da “transparência da praxis social” ? No olhar para o alto,
buscando sempre o melhor, está a característica fundamental do Educador, que seria um idealista,
mas seu compromisso, com a realidade presente e com toda a sociedade, o prende a uma
concretude necessária.
E então procurar descobrir o que vai determinar a função deste membro da sociedade. Não
existe um Educador descrito no papel, na lei ou elaborado na fantasia das pessoas que seja
suficiente. Se falávamos em um Educador, é num sentido de perspectiva de renovação, a qual está
vinculada a uma proposta muito mais ampla, a proposta política de Mendes, demonstrando
enorme fé na humanidade, sem deixar de observar as situações adversas da existência e não só
acreditando no melhor, mas trabalhando para que o melhor fosse alcançado. Pode-se estabelecer
a relação Educador/Cidadão. O Cidadão como alguém consciente de seu papel na sociedade, de
seus deveres e direitos, agindo na construção contínua da sociedade.
O Educador vivendo uma atitude de respeito, promoverá mudanças, principalmente no
que se refere a um questionar e a um novo agir. Na concepção de Mendes o Educador se constrói
a si mesmo e por isso não se pode apresentar previamente um modelo de como este deverá ser.
23 __________ Subsídios para a concepção do educador, in Trigueiro, D. - Concepção do
Educador e da Universidade - p. 9-20 - Joao Pessoa , UFPb 96 p. 1988 a.