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165 Educação, Batatais, v. 7, n. 3, p. 165-186, jan./jun. 2017 O educador musical face ao aluno com baixa visão: procedimentos didáticos e uso de recursos tecnológicos Sueli Martins Leal dos SANTOS 1 Glauber SANTIAGO 2 Clarissa BENGTSON 3 Douglas PINO 4 Resumo: Neste artigo, tratamos do ensino de música para pessoas com baixa visão partindo do princípio da inclusão social da pessoa com deficiência. Nosso objetivo foi abordar formas corretas e adaptadas de utilização de recursos tecnológicos possíveis ao ensino de música para pessoas com baixa visão, bem como procedimentos didáticos adequados a serem adotados pelo professor em sala de aula para um melhor aproveitamento do aluno. De início, apresentamos quem é a pessoa com deficiência, dando destaque para a diferenciação entre cegos e pessoas com baixa visão. Na sequência, mostramos sua integração no ambiente de sala de aula e qual deve ser a relação do educador musical com o aluno BV. A partir daí, apresentamos uma série de recursos tecnológicos e procedimentos práticos para o aluno de música com baixa visão. Com a aplicação desse apanhado de recursos e procedimentos, é possível proporcionar a efetiva inclusão social do deficiente visual com baixa visão. Palavras-chave: Educação Musical. Baixa Visão. Visão Subnormal. Recursos Tecnológicos. 1 Sueli Martins Leal dos Santos. Graduanda em Música pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). E-mail: <[email protected]>. 2 Glauber Santiago. Doutor e Mestre em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Graduado em Direito pela Faculdade de Direito de São Carlos. Atualmente é Professor Associado da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). E-mail: <[email protected]>. 3 Clarissa Bengtson. Mestre em Educação pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Atua como Professora no curso de Especialização em Educação e Tecnologias na mesma instituição, onde também exerce a função de Editora de Materiais Acessíveis na SEaD (Secretaria Geral de Educação a Distância). E-mail: <[email protected]>. 4 Douglas Pino. Doutorando em Linguística pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Mestre em Linguística pela mesma instituição. Diretor da Editora Pixel. Editor de livros na SEaD-UFSCar e Professor no curso de Especialização em Educação e Tecnologias na UFSCar. E-mail: <[email protected]>.

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O educador musical face ao aluno com baixa visão: procedimentos didáticos e uso de recursos tecnológicos

Sueli Martins Leal dos SANTOS1

Glauber SANTIAGO2

Clarissa BENGTSON3

Douglas PINO4

Resumo: Neste artigo, tratamos do ensino de música para pessoas com baixa visão partindo do princípio da inclusão social da pessoa com deficiência. Nosso objetivo foi abordar formas corretas e adaptadas de utilização de recursos tecnológicos possíveis ao ensino de música para pessoas com baixa visão, bem como procedimentos didáticos adequados a serem adotados pelo professor em sala de aula para um melhor aproveitamento do aluno. De início, apresentamos quem é a pessoa com deficiência, dando destaque para a diferenciação entre cegos e pessoas com baixa visão. Na sequência, mostramos sua integração no ambiente de sala de aula e qual deve ser a relação do educador musical com o aluno BV. A partir daí, apresentamos uma série de recursos tecnológicos e procedimentos práticos para o aluno de música com baixa visão. Com a aplicação desse apanhado de recursos e procedimentos, é possível proporcionar a efetiva inclusão social do deficiente visual com baixa visão.

Palavras-chave: Educação Musical. Baixa Visão. Visão Subnormal. Recursos Tecnológicos.

1 Sueli Martins Leal dos Santos. Graduanda em Música pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). E-mail: <[email protected]>.2 Glauber Santiago. Doutor e Mestre em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Graduado em Direito pela Faculdade de Direito de São Carlos. Atualmente é Professor Associado da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). E-mail: <[email protected]>.3 Clarissa Bengtson. Mestre em Educação pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Atua como Professora no curso de Especialização em Educação e Tecnologias na mesma instituição, onde também exerce a função de Editora de Materiais Acessíveis na SEaD (Secretaria Geral de Educação a Distância). E-mail: <[email protected]>.4 Douglas Pino. Doutorando em Linguística pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Mestre em Linguística pela mesma instituição. Diretor da Editora Pixel. Editor de livros na SEaD-UFSCar e Professor no curso de Especialização em Educação e Tecnologias na UFSCar. E-mail: <[email protected]>.

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The music educator in the face of students with low sight: didactic procedures and the use of technological resources

Sueli Martins Leal dos SANTOSGlauber SANTIAGOClarissa BENGTSON

Douglas PINO

Abstract: In this article, we deal with the teaching of music for people with low sight based on the principle of social inclusion of the disabled person. Our objective was to address correct and adapted forms of use of technological resources possible to teach music to people with low sight, as well as appropriate didactic procedures to be adopted by the teacher in the classroom for a better use of the student. At the outset, we present who is the disabled person, highlighting the differentiation between the blind and people with low sight. In the sequence, we show its integration in the classroom environment and what should be the relationship of the musical educator with the student low sight. From there, we present a number of technological resources and practical procedures for the student of music with low sight. With the application of these resources and procedures, it is possible to provide the effective social inclusion of the visually impaired with low sight.

Keywords: Musical Education. Low Sight. Subnormal Vision. Technological Resources.

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1. O DEFICIENTE VISUAL PARCIAL OU PESSOA COM BAIXA VISÃO

Por falta de informações, muitas pessoas consideram Defi-ciente Visual (DV) apenas a pessoa com cegueira total e que é, mui-tas vezes, estereotipada como uma pessoa usando óculos escuros, segurando uma bengala branca e sendo guiada por um cão-guia. É importante compreendermos que deficiente visual não é só quem tem cegueira total e que nem todos os deficientes visuais fazem uso de bengala branca e/ou cão-guia. Deficiência visual engloba a cegueira total e a cegueira parcial.

Sassaki (2003) define dois termos corretos a serem usados quando nos referirmos ao Deficiente Visual: cego, que é a pessoa com deficiência visual total, e Pessoa com Baixa Visão (BV) ou Visão Subnormal (VS), aquela com deficiência visual parcial. Para fim de melhor esclarecimento, podemos dizer que a pessoa com baixa visão é aquela que tem “[...] acuidade visual igual ou menor que 20/200 no melhor olho, após a melhor correção, ou campo vi-sual inferior a 20º (tabela de Snellen),5 ou ocorrência simultânea de ambas as situações” (PORTAL DEFICIENTES EM AÇÃO, 2017, [n.p.]). Ou seja, a pessoa com baixa visão não a perde totalmente, mas fica com um resíduo visual específico dependendo da doença que gerou a baixa visão.

2. O ALUNO DV E SUA INTEGRAÇÃO NO AMBIENTE DA SALA DE AULA

Nos tempos atuais, um dos temas muito difundido e discutido é a inclusão social da pessoa com deficiência. Mas, afinal, o que é inclusão social da pessoa com deficiência e quem é ela?

A legislação brasileira define que pessoa com deficiência é aquela que tem comprometimento de ordem física, mental, inte-lectual ou sensorial que a impeçam de participar da sociedade em igualdade de condições. Essa mesma legislação condena qualquer

5 Outras informações acerca da tabela de Snellen podem ser acessadas no seguinte endereço: <http://www.visaolaser.com.br/saude-ocular/teste-de-visao/teste-de-snellen>. Acesso em: 21 mar. 2017.

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tipo de discriminação contra essa pessoa.6 Incluir uma pessoa com deficiência em um meio social é lhe dar aparato para que possa conviver nesse meio em condições de igualdade com as demais do grupo. Lavarda (2008) ressalta em seu trabalho que a inclusão não é um ato isolado, mas sim um conjunto de procedimentos que geram transformações tanto no ambiente físico como na mentalidade das pessoas no que se refere ao convívio com uma pessoa com deficiên-cia. Castro (2010) e Sassaki (2003) acreditam, ainda, que uma ver-dadeira inclusão tem início no uso correto das terminologias, pois:

[...] muitas vezes o preconceito ou as atitudes de exclusão social estão nas entrelinhas dos fatos, nesse caso, a inclu-são precisa estar nas “entreletras” da terminologia utiliza-da (CASTRO, 2010, p. 13, grifo do autor).

No que diz respeito à inclusão social do aluno com defici-ência na escola, sua inclusão ou exclusão dependerá das ações das pessoas que fazem parte desse sistema escolar. Não basta a escola aceitá-lo e introduzi-lo em uma sala de aula, principalmente porque ele não tem de ser aceito, pois como cidadão ele tem direito de frequentar uma escola e desenvolver suas capacidades cognitivas, sociais e intelectuais. Portanto, as ações para a inclusão social desse aluno vão muito além das paredes da sala de aula e envolvem ações dentro e fora do prédio escolar.

Pode-se perceber o descaso com alunos com deficiência quan-do podemos encontrar um prédio escolar cuja arquitetura, muitas vezes, não está adaptada e cujos arredores da escola não possuem rampas, piso tátil, corrimão etc.), além das ações e da forma de agir de vários profissionais ligados direta ou indiretamente à educação. Podemos citar o exemplo do guarda de trânsito em frente à escola, o qual deve ajudar o aluno durante o seu deslocamento ao outro lado da rua. Temos, ainda, as ações do diretor, dos docentes, dos funcionários e demais alunos da escola, que devem garantir apoio e segurança a esse aluno.

Dentro da sala de aula, a responsabilidade em fazer a inclusão acontecer fica totalmente por conta do professor, que deverá criar 6 No Portal da Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência (SNPD) há uma compilação de normas constitucionais, leis, decretos e portarias que amparam a pessoa com deficiência. O endereço está disponível em <http://www.pessoacomdeficiencia.gov.br/app/legislacao>. Acesso em: 21 mar. 2017.

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estratégias para que o aluno com deficiência não tenha a impressão de que foi imposto ao grupo, e sinta-se realmente parte do grupo, pois é nisso que consiste uma verdadeira inclusão. O professor tem de ter cuidado para não passar a ideia de que aquele aluno, por causa de sua deficiência, é menos capaz que seus colegas, os quais devem aceitá-lo no grupo e devem ajudar o “coitado” (mesmo que o professor não use essas palavras, suas atitudes podem acabar re-fletindo isso).

Segundo Bonilha (2006, p. 8), “[...] incluir não significa ape-nas integrar alunos deficientes a um sistema de ensino pré-estabele-cido, mas significa propor mudanças de conceitos e atitudes diante das diferenças individuais”. Precisamos compreender que todas as pessoas têm dificuldade e facilidade de realizar alguma tarefa; cada pessoa tem uma habilidade específica e uma inabilidade específica também. Isso é o que nos torna diferentes e individuais. Assim é com a pessoa deficiente física, intelectual ou sensorial: ela é dife-rente e especial tanto quanto qualquer outro ser humano e, como tal, tem de ser respeitada. O professor deve atentar para que os alu-nos usem termos corretos, a fim de que o aluno com deficiência não se sinta discriminado e não tenha prejuízo na sua trajetória educa-cional e no seu convívio social, o que poderia gerar a ele problemas emocionais e educacionais irreversíveis.

A Lei nº 9.394/1996, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação (LDB), garante o direito do aluno com necessidades es-peciais à integração social escolar, bem como auxílio pedagógico especializado quando necessário e adaptações pertinentes para que esse aluno possa estudar (BRASIL, 1996). As escolas devem ter profissionais da área da Educação Especial vinculados a ela para dar apoio tanto aos alunos com necessidades especiais quanto aos professores desses alunos. São esses profissionais que determinam procedimentos para que a efetiva inclusão aconteça. Vejamos al-guns deles:

• 1o: Conheça a história do seu alunoAntes de apresentar o aluno ao grupo, converse com ele e

procure conhecê-lo melhor.• 2º: Pergunte sobre a sua deficiência

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Depois de saber um pouco sobre sua história e do que gosta de fazer, pergunte, de forma natural, sobre a sua deficiência e quais são as suas dificuldades em enxergar. Procure perceber na fala do aluno se ele é mais autônomo e autoconfiante ou se é superprote-gido e dependente. Procure inteirar-se sobre a doença que lhe cau-sou a baixa visão para posterior pesquisa e melhor compreensão do seu problema. Procure entender como ele utiliza seu resíduo visual, quais recursos tecnológicos utiliza, o que consegue fazer sozinho e o que precisa de ajuda. Nunca demostre piedade, pois ele precisa apenas de respeito e auxílio.

• 3º: Promova a apresentação do aluno ao grupoNo caso da pessoa com baixa visão, devido aos preconceitos e

dificuldades que enfrenta ao ter de fazer as pessoas acreditarem que ela realmente não enxerga e realmente tem uma deficiência visual, muitas vezes, a pessoa com BV opta por esconder sua deficiência para não passar constrangimentos. O aluno pode não querer revelar aos colegas que tem deficiência visual e, neste caso, a sua vontade deve ser respeitada; mas deve ser orientado de que uma conversa com os colegas dizendo que tem dificuldades visuais e talvez preci-se de ajuda em determinadas situações é a melhor coisa a ser feita, o que o ajudará no seu convívio social e na sua aprendizagem. Diante do consentimento do aluno em conversar com os colegas sobre suas dificuldades, o professor deve proceder da forma mais natural pos-sível, conversando com todos de forma objetiva, apresentando-lhes o novo aluno que fará parte do grupo.

3. O EDUCADOR MUSICAL E O ALUNO COM BAIXA VISÃO

Alguns professores já passaram pela experiência de dar aula de música para pessoas cegas e acreditam, de início, que a didáti-ca e os procedimentos serão os mesmos com a pessoa com baixa visão. Porém, logo percebem que, apesar de o aluno com baixa vi-são ter algum resíduo visual, isso não facilita em quase nada o seu trabalho, pois exige do professor procedimentos especiais para os quais não está preparado. A dificuldade em dar uma aula acessível

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para pessoas com baixa visão é imensa, e o professor imediatamen-te se vê inabilitado e perdido em seus procedimentos.

Segundo Bonilha (2006), muitas vezes, a falta de recursos, a ausência de preparo dos professores e a baixa quantidade de mate-rial na área de ensino de música para pessoas com deficiência vi-sual levam professores e alunos a uma busca intensa e solitária por soluções e recursos adequados para esse fim. Algumas vezes, essa busca traz ótimos resultados, e, outras vezes, gera frustração. Mas o problema é que, como essas experiências realizadas pelos pro-fessores em sala de aula não são sistematizadas e nem registradas, não é possível que outros professores possam aplicá-las. Segundo a autora:

Por um lado, a criação desses métodos (que se dá em geral de forma empírica) pode, por vezes, dar origem a experiências bem-sucedidas, permeadas de soluções criativas e eficazes. Por outro lado, esse empirismo faz com que professores e alunos se deparem com dificuldades, que, por sua vez, seriam supridas, caso houvesse a existência de uma sistematização dos trabalhos realizados nessa área. Isto faz com que eles saiam em busca de meios que sirvam como fontes de referência aos seus trabalhos. Entretanto, eles rapidamente notam a carência desses recursos, o que os forçam a criar e desenvolver suas próprias estratégias de atuação junto aos alunos que tenham deficiência (BONILHA, 2006, p. 19).

Isso tudo toma uma proporção muito maior quando tratamos da pessoa com baixa visão. A maioria dos trabalhos encontrados é direcionada ao ensino de música para cegos com uso de Musico-grafia Braille. Mas, do vidente ao cego, tem a pessoa com baixa visão, e da leitura convencional de partituras à Musicografia Brail-le, tem um longo caminho a ser percorrido. Geralmente, as pessoas com baixa visão não usam (ou usam com pouquíssima frequência) a técnica de leitura e escrita em Braille. Além disso, o aluno com resíduo de visão deve ser estimulado a usá-lo para que não venha a desaprender a enxergar.

A falta de conhecimento sobre o que é a baixa visão pode prejudicar o processo pedagógico; portanto, o professor não pode ter medo de perguntar ao seu aluno: Qual é a sua dificuldade para

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acompanhar as aulas? O que posso fazer para te ajudar? Quais re-cursos tecnológicos você utiliza e/ou tem acesso?

Neste trabalho, procuramos sistematizar alguns recursos prá-ticos e acessíveis a todos, para que sirvam ao deficiente visual com baixa visão em sua trajetória de estudo musical e ajudem o pro-fessor a dar início à sua busca por recursos metodológicos para o trabalho com alunos com BV. Infelizmente, não existe uma fórmula mágica ou um método definitivo para ser usado com pessoas com baixa visão, pois cada uma tem um resíduo visual específico e, por-tanto, uma necessidade especial e única. O importante é o professor aceitar o desafio e buscar recursos para auxiliá-lo nesse processo, tendo consciência de que as pessoas com deficiência não querem favores, querem apenas condições adequadas para apender e se de-senvolver.

4. RECURSOS TECNOLÓGICOS E PROCEDIMENTOS PRÁTICOS PARA O ALUNO DE MÚSICA COM BV

Atualmente, os programas e sistemas usados nos computado-res oferecem diversos recursos para que pessoas com DV possam ter acesso a todos os conteúdos oferecidos pelos sistemas compu-tacionais. O professor deve aproveitar todas as ferramentas possí-veis, pois o aluno DV poderá usar os recursos de acessibilidade do seu computador para estudar e se desenvolver no seu aprendizado musical.

Na sequência deste trabalho, descreveremos algumas situa-ções que acontecem em sala de aula e alguns procedimentos que podem ajudar no relacionamento e na melhoria das condições do trabalho pedagógico com alunos de música com BV.

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Aula expositiva e auxílio ao aluno

Durante as exposições de conteúdo, procure ficar atento ao aluno com BV. Deixe-o à vontade quanto ao lugar de sentar, pois nem sempre sentar na primeira carteira no meio da sala é a melhor opção para ele. Dependendo do seu resíduo visual, sentar no canto da sala facilita sua visualização. Portanto, vá até perto do aluno durante a explicação, pois, quando falamos, fazemos movimentos corporais e faciais que facilitam a comunicação. Se você estiver perto, o aluno com baixa visão vai tentar enxergar essa linguagem corporal e isso o ajudará a compreender melhor o conteúdo.

O professor precisa ter cuidado nas suas ações, pois, por não saber como agir, ele pode optar por excluir o aluno BV de certas atividades, causando-lhe constrangimento e prejuízo da sua apren-dizagem.

Sendo assim, o professor pode pensar uma forma de atingir o mesmo objetivo mudando a atividade, para que o aluno BV possa participar dela com os demais. Este tem de participar da aula, pois, se não é para ser assim, então qual é o propósito da inclusão? Tiran-do o aluno da atividade, o professor está fazendo inclusão? Mude a atividade, seja criativo; esse é o papel de um bom educador musi-cal: usar a criatividade, criar e adaptar atividades, jogos e procedi-mentos para incluir todos os alunos nas atividades em sala de aula.

A lousa

A frase “O colega do lado te ajuda” deve ser substituída pelo ato do professor falar enquanto escreve. Dessa forma, o aluno BV tem a possibilidade de copiar o conteúdo no caderno, notebook ou tablet, além da possibilidade de poder gravar a fala do professor sem incomodar ninguém.

Outra situação frequente é que alguns professores se esque-cem de que tem aluno com DV na sala e escrevem na lousa, expli-cando o conteúdo e apontando para a lousa usando termos como “isto”, “aquilo”, “aqui”, “esse”; deixando o aluno com DV total-mente alheio ao que está acontecendo. Para evitar essa situação, o

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professor deve sempre ajudar o aluno a copiar o conteúdo da lousa e, em seguida, explicar falando o que está apontando: “No terceiro pentagrama, temos uma nota fá, que...”. Ao invés de acompanhar na lousa, o aluno acompanha na sua anotação.

Quando for necessário fazer um desenho ou tabela, por exem-plo, o professor deve chegar perto do aluno, explicar-lhe o que deve fazer na sua folha e depois voltar para a lousa e iniciar a explicação. O professor pode também optar por trazer o desenho ou esquema já copiado e entregar para o aluno.

Notebook, tablet e afins

Como já foi mencionado, os recursos tecnológicos e compu-tacionais têm sistemas de acessibilidade que ajudam muito o aluno DV. Sempre que possível, permita que o aluno use seu notebook, tablet ou outro recurso afim durante as aulas. Os recursos de aces-sibilidade ajudarão na leitura e realização de tarefas. O uso do no-tebook na sala de aula ajudou-me muito durante meus estudos, pois podia usar os recursos de acessibilidade disponíveis e acompanhar as aulas mais ativamente.

Máquinas fotográficas, gravadores e outros recursos afins

Uma forma prática de copiar as lições da lousa pode ser tirar fotos da lousa ou do caderno de um amigo ou do livro do professor. Posteriormente, o aluno transfere a foto para o computador e usa seus recursos para ampliar a imagem e estudar. Isso ajuda muito quando é necessário, por exemplo, copiar um desenho, uma tabela, esquemas ou partituras.

Gravar o áudio também é uma boa alternativa quando o pro-fessor fala o que está escrevendo, pois o aluno tem a opção de gra-var a aula e posteriormente copiar o conteúdo ou ouvir a explicação quantas vezes forem necessárias. Da mesma forma, filmar a aula também é um ótimo recurso, pois o aluno terá condições de ver no computador o que não conseguiu ver na aula e compreender os conceitos com mais exatidão.

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Material escrito/visual em formato digital

Bonotto (2017) esclarece que a baixa visão permite que a pessoa tenha uma visão útil, que lhe possibilita, por exemplo, ler materiais impressos, desde que sejam ampliados de acordo com sua necessidade. Além disso, o deficiente visual com baixa visão pode contar hoje com diversos recursos ópticos, como óculos especiais, lentes para ampliação, equipamentos eletrônicos e outros, que po-dem ajudá-lo a potencializar a sua visão útil, além de instituições de auxílio e leis que o ajudam a amenizar seus problemas causados pela baixa visão. Portanto, sempre que possível, o professor deve disponibilizar ao aluno todo o material escrito que for usado na aula, com antecedência, em arquivo digital; os computadores têm recursos de leituras de textos e ampliação de tela que ajudam o aluno na leitura.

Nesse caso, os materiais podem ter layout fixo (como nos arquivos em PDF) ou formato de texto fluido (como no caso dos arquivos em formato e-Pub). Para a leitura de textos, o formato fluido é mais interessante, pois permite o redimensionamento da fonte e a reformatação automática do texto; já para material com imagens ou muitas tabelas um formato de layout fixo pode ser mais interessante.

Disponibilize o material já digitalizado, pois assim estará aju-dando o aluno, que, ao invés de passar horas digitalizando o ma-terial de cada professor, poderá usar o tempo para estudar e fazer seus trabalhos. Tenha cuidado com a resolução da digitalização, pois como o aluno tem de ampliar muito o arquivo, muitas vezes, a baixa resolução não permite que ele consiga ler. Lembre-se, tam-bém, de que, mesmo entregando o material já digitalizado e o aluno usando os recursos de ampliação, a luz da tela e a dificuldade de enxergar cansam muito rápido sua visão e, às vezes, até prejudicam mais seu problema visual; portanto, dê-lhe um tempo a mais para a realização da tarefa. Não diga: “Se você não ler, não tem impor-tância”. Para ele, pode ter toda importância; ele quer ler e aprender como todos os outros; basta dar-lhe o texto digitalizado com mais antecedência.

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Vídeos e apresentação de slides

Conseguir assistir a um vídeo ou a uma apresentação de sli-des na sala de aula é um martírio para o aluno com BV. As imagens não ficam nítidas e o aluno não consegue ver o todo da cena em tempo hábil, pois precisa deslocar o olhar em vários pontos para poder montar a cena. Quando o vídeo é legendado, fica pior ainda, pois, normalmente, o tamanho da legenda não é suficiente e, quan-do o aluno consegue ler a legenda, não consegue ver a cena. Para essa situação, podemos fazer uso de dois procedimentos:

• 1o procedimento: disponibilizar o vídeo com antecedência para o aluno poder usar os recursos de acessibilidade que tem em casa (monitor maior, por exemplo) para assisti--lo como quiser (pausando para ler as legendas, pausando quadro a quadro para entender a cena etc.). Quando o ví-deo for apresentado na aula, o aluno já tem toda a imagem mental das cenas e conseguirá acompanhar a dinâmica da aula.

• 2o procedimento: o professor pode fazer a audiodescrição do vídeo em tempo real.

O professor deve dar preferência para a primeira opção, pois o aluno com BV tem um resíduo visual e, sempre que possível, esse resíduo deve ser estimulado a ser usado. No primeiro procedimen-to, o aluno realmente estará assistindo ao vídeo, enquanto que, no segundo, ele teria de imaginar as cenas, o que nem sempre lhe dará a interpretação correta.

No caso de apresentação de slides, o professor pode pedir que o aluno leve um pen drive, copie os slides para seu notebook e use seus recursos para acompanhar a apresentação. Temos de entender que, mesmo o slide sendo apresentado em um telão, a qualidade da imagem, muitas vezes, não ajuda o aluno BV a ler o seu conteúdo. Talvez o uso de contraste nos slides e a sala totalmente escura aju-de-o a enxergar o slide no telão. Converse com o aluno e pergunte qual é a melhor opção para ele.

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Trabalhos escritos

Para esta atividade, há duas soluções, sendo a segunda mais recomendável:

• 1a solução: permita que o aluno use folhas de sulfite para escrever o trabalho sem se preocupar com as linhas e es-crevendo com um tamanho de letra que ele consiga ler posteriormente. Esta, porém, não é a opção mais confor-tável.

• 2ª solução: permita que o aluno digite seus trabalhos e en-vie por e-mail ou faça a impressão. Ele poderá reler o tra-balho e corrigir de forma mais limpa e adequada.

Provas

No caso de uma prova, o professor pode também usar dois procedimentos:

• 1o procedimento: preparar a prova ampliada de acordo com a necessidade do aluno e permitir que ele escreva as respostas em folha sulfite usando letras garrafais. Uma prova que utilizaria uma folha ficará com inúmeras folhas, neste caso.

• 2o procedimento: levar um pen drive com as questões da prova, copie no notebook do aluno e permita que ele res-ponda às questões no próprio notebook e salve no pen dri-ve.

A segunda opção é a melhor, pois, no caso de o aluno precisar escrever à mão, ele teria de escrever em letras garrafais para poder reler e corrigir; como acontece com os trabalhos, a aparência da prova ficaria, muitas vezes, grotesca e a tarefa seria exaustiva e frustrante para o aluno, que gostaria de apresentar um trabalho bo-nito e limpo ao professor. O professor não pode esquecer que não é porque o aluno tem uma deficiência que “qualquer coisa está bom”. Dê-lhe as condições adequadas e ficará surpreso com a qualidade dos seus trabalhos.

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Nesses casos, utilize um quadro com fontes em diversos ta-manhos e pergunte ao aluno com BV qual é a mais adequada para ele. A Figura 1 ilustra essa possibilidade com a fonte “Arial”.

Figura 1. Quadro com diversas amostras de tamanhos para a fonte “Arial”.

Fonte: Elaborado pelos autores.

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Partituras

Em relação às partituras, mostraremos de que forma o profes-sor pode proceder para preparar as partituras adequadamente para o aluno BV, bem como outras maneiras de ajudar o aluno a memo-rizar a música, pois a partitura nada mais é do que uma extensão da memória; portanto, podemos usar outros recursos que o auxiliem nesse processo. Dependendo do grau de deficiência do aluno BV e como ele enxerga, a ampliação das partituras se dará de forma dife-rente, por isso, daremos algumas possibilidades de editar e ampliar as partituras adequadamente.

É preciso esclarecer, ainda, que o tamanho excessivo da par-titura acaba prejudicando ao invés de ajudar. Por essa razão, as su-gestões aqui colocadas têm de ser adequadas e adaptadas a cada si-tuação e a cada aluno específico. Em alguns momentos, o aluno usa um tamanho de partitura para partituras rítmicas e outro tamanho para partituras melódicas ou ainda pode utilizar tamanho diferen-te dependendo da complexidade da música. Óculos especiais para leitura, estantes adaptadas e impressão em folha amarela também o ajudam na leitura. Para facilitar esse trabalho e auxiliar na análise de qual tamanho de partitura é melhor para o aluno, sugerimos o uso de uma tabela (Figura 2) na qual ele poderá identificar qual o tamanho de ampliação mais adequada.

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Figura 2. Tabela para aferição de tamanho de partitura.

Fonte: Elaborado pelos autores.

Partituras ampliadas por fotocópiasPara alguns casos, a fotocópia ampliada de uma partitura em

folha A3 já resolve o problema. Neste caso, o cuidado deve ser com a qualidade da partitura original e qualidade da cópia. Uma amplia-ção em folhas de tamanho maior que A3 não são viáveis, pois além de ficar mais difícil manusear a folha ainda acontece de alguns pen-tagramas ficarem muito acima ou muito abaixo dos olhos do aluno.

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Partituras editadas e ampliadasNem sempre ampliar a dimensão da partitura por meio de

fotocópias ampliadas será suficiente para resolver o problema do aluno. Neste caso, o professor deve ter domínio em edição de par-titura e digitalizar as músicas ou exercícios que serão utilizados em aula, “limpar a partitura”, ampliá-la e imprimir para o aluno. A escola tem a obrigação de custear essas impressões, pois assim determina a Lei.7

Todo excesso de informações atrapalha o aluno com BV; por isso, o professor deve limpar a partitura o máximo possível. Apa-gue ligaduras de fraseado, sinais de dinâmica, claves, armadura de clave no final de pentagramas, diminua o recuo da armadura de clave e da fórmula de compasso para aproveitar mais o espaço etc. Todas essas informações o aluno pode memorizar durante os en-saios e a execução da música.

As folhas em tamanho Ofício são uma boa opção, pois são maiores que a A4 e podem ficar na direção do rosto do aluno sem que ele precise fazer “ginásticas” para enxergar os pentagramas mais acima ou mais abaixo. Use toda margem possível e deixe os pentagramas a uma distância um do outro que aproveite o espa-ço da folha, mas não deixe as notas muito grudadas. A quantida-de de compassos por pentagrama também de que ser analisada de acordo com a complexidade, quantidade de notas e tipos de figu-ras musicais existentes no compasso. Muitas vezes, colocar um ou dois compassos por pentagrama acaba atrapalhando ao invés de ajudar, pois tira a ideia do desenho melódico. Em alguns casos, é aconselhável omitir barras de compasso, pois confundem com as hastes das figuras. Deixe apenas as ligaduras de valor, pois ao ver uma ligadura, o aluno terá a certeza de que a nota se mantém a mesma e não precisa se preocupar em tentar enxergar se a ligadura é de valor ou não, nem se preocupa em tentar enxergar qual é a próxima nota.

Feita a limpeza, amplie a partitura na porcentagem que o aluno escolheu. Em algumas situações, a ampliação terá de ser de 7 A Portaria no 3.284, de 7 de novembro de 2003, dispõe sobre requisitos de acessibilidade de pessoas com deficiência e pode ser consultada no seguinte endereço: <http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/port3284.pdf>. Acesso em: 21 mar. 2017.

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tamanho diferente em cada pentagrama. Pense no desenho meló-dico, nas frases musicais, e não na leitura nota por nota. Após a ampliação, verifique se as viradas de página ficaram adequadas, se estão em notas longas ou em pausas para o aluno virar a página. Se não estiver, quando possível, rearranje a partitura e coloque pausas estratégicas para viradas de página.

Aumente o tamanho da fonte do número dos compassos (po-de-se também usar alto relevo para essa indicação). Evite o uso de ritornellos, em que o aluno terá de voltar folhas e ficar procurando o retorno; faça a transcrição do trecho na sequência da música, de modo que ele apenas siga virando as páginas sem precisar procurar retornos. Uma página de uma partitura pode se transformar em 15, 20 páginas ou mais, dependendo da complexidade da música, por isso, sugerimos que as músicas sejam impressas frente e verso e encadernadas em ordem alfabética. Fica mais fácil para manusear, não corre o risco de misturar as folhas e a aparência fica muito melhor.

Analisando a partituraUma boa análise da partitura juntamente com o aluno facilita

a sua memorização. Ajude-o a fazer anotações com canetas hidro-gráficas coloridas. Padronize as cores de acordo com as situações. Sente com o aluno e ajude-o a identificar trechos que se repetem ou que só mudam de tonalidade, conservando o mesmo fraseado, escalas, harpejos, padrões e exceções. Peça-o para colorir os tre-chos que achar necessário, pois o professor, muito solidário, pode acabar fazendo tantas anotações coloridas na partitura que o aluno não conseguirá destacar o que realmente precisa. Quando o pro-fessor não tem contato rápido com o aluno para fazer essas anota-ções e análise, pode enviar a partitura por meio eletrônico para que este imprima e faça um vídeo com uma pré-análise da música para orientar o aluno. Mesmo pelo vídeo, seja mais pessoal com ele.

Outros recursos que ajudam na memorização da música é gravar vídeos tocando a música no instrumento específico do alu-no, mostrando detalhes da mão e dos dedos dedilhando o instru-mento em determinado trecho; gravações de áudios com a música solfejada, cantada, tocada com o som do instrumento do aluno etc.

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Enfim, use a criatividade e todos os recursos que puder, pois quanto mais opções o aluno tiver para ajudar a memorizar a música, me-lhor será o seu desenvolvimento musical.

Estantes de partitura articuladasAs estantes podem ser presas ao próprio instrumento, na pa-

rede, em tripés etc. O importante é que elas sejam fortes para su-portar a quantidade de folhas e de tamanho adequado para uso de folhas maiores que A4.

As estantes podem ter borboletas em lugares específicos para que possam ser movimentadas horizontalmente, verticalmente e se-rem inclinadas de acordo com a necessidade do aluno. O importan-te é que permitam que a partitura fique bem próxima aos olhos do aluno para ajudar na sua leitura. São muitas as possibilidades, basta usar a imaginação e a criatividade.Figura 3. Exemplo de estante de partitura articulada.

Fonte: Acervo dos Autores.

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Regência musicalAo reger uma música, sempre que possível, o professor deve

fazer movimentos um pouco mais largos para que o aluno com BV possa conseguir perceber o movimento e acompanhar a regência. Evite usar movimentos apenas de mãos e dedos, a não ser que seja inevitável. Dê as entradas com bastante clareza. Se for necessário dar um sinal específico para o aluno e ele não conseguir ver o mo-vimento, combine com um músico que estiver do seu lado para lhe dar um sinal ou avisá-lo da proximidade de um trecho específico que depende do sinal do regente, por exemplo. O importante é que o aluno consiga tocar junto com o grupo sem se expor a situações constrangedoras, entrando em momentos errados na música por não ver a regência.

O contraste entre a cor do fundo da sala e a roupa do regente também ajuda nessa visualização. O regente pode ajudar usando roupas que contrastem com a cor da parede da sala ou usar roupas que não contrastem com a sala e usar uma luva com cor contras-tante.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O aluno que tem qualquer deficiência visual deve buscar au-xílio e todos os recursos disponíveis no mercado. Existem inúme-ros recursos tecnológicos ópticos, como óculos especiais para leitu-ra com prismas; óculos com lentes duplas com ajuste de foco; lupas eletrônicas de diversos tamanhos, ampliações, modelos e preços; estantes articuladas para leitura e inúmeros outros recursos tecno-lógicos à venda em lojas especializadas. Além disso, em relação a recursos metodológicos de ensino de música para DV, temos, ainda, a Musicografia Braille e a Escrita Musical Lissoni8.

Hoje, podemos contar com várias entidades, fundações e gru-pos que auxiliam o deficiente visual em todas as suas dúvidas e di-ficuldades, orientando-o no que for necessário para que tenha uma vida mais independente. 8 Outras informações sobre a Escrita Musical Lissoni estão disponíveis em: <http://sidneylissoni.blogspot.com.br/>. Acesso em: 21 mar. 2017.

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A pessoa com baixa visão tem necessidades específicas e precisa ser considerada pela sociedade como tendo necessidades especiais específicas; não adianta fazer um estudo e buscar recursos tecnológicos e didáticos para pessoas cegas e acreditar que esses recursos atendem à pessoa com baixa visão porque isso não aconte-ce. A baixa visão é uma deficiência que precisa ser mais estudada e levada em consideração na hora do planejamento de uma aula para que a inclusão social realmente ocorra e não fique apenas no papel e na teoria.

REFERÊNCIAS

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BONOTTO, L. B. Visão subnormal: o que é visão subnormal e quais podem ser as causas. Portal Oftalmopediatria. Disponível em: <http://www.oftalmopediatria.com.br/texto.php?cs=10>. Acesso em: 21 mar. 2017.

BRASIL. Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial, Brasília, 23 dez. 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm>. Acesso em: 21 mar. 2017.

CASTRO, S. A. A inclusão dos deficientes: tudo começa nas “entreletras” da terminologia. In: COLÓQUIO NACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO/2010 – PUC MINAS, 7. Belo Horizonte. 2010.

LAVARDA, S. T. F. O problema dos dêiticos na interação didático-pedagógica e passagem de conteúdos: a linguagem do professor em sala de aula face aos alunos com deficiência visual. 2008. 133f. Dissertação (Mestrado em Letras) – Centro de Educação, Comunicação e Artes, Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE). Cascavel, 2008. Disponível em: <http://tede.unioeste.br/tede/tde_arquivos/4/TDE-2009-06-15T145511Z-293/Publico/Santa_Terezinha.pdf>. Acesso em: 21 mar. 2017.

PORTAL DEFICIENTES EM AÇÃO. Definições: deficiência visual. Disponível em: <http://www.deficientesemacao.com.br/deficiencia-visual>. Acesso em: 21 mar. 2017.

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SASSAKI, R. K. Terminologia sobre deficiência na era da inclusão. In: VIVARTA, V. (Coord.). Mídia e deficiência. Brasília: Andi/Fundação Banco do Brasil, 2003. p. 160-165.

VISÃO LASER. Saúde ocular – testes de visão: teste de Snellen. Disponível em: <http://www.visaolaser.com.br/saude-ocular/teste-de-visao/teste-de-snellen>. Acesso em: 21 mar. 2017.