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O DIREITO PENAL DO INIMIGO: uma breve releitura da teoria de Günther Jakobs RESUMO A Teoria do Direito Penal Inimigo, de Günther Jakobs, acastela um Direito Penal com a incumbência de punir severamente indivíduos às margens da Lei, onde os mesmos são incapazes de oferecer garantias cognitivas para seu retorno ao meio social. O objetivo deste artigo visa analisar tal Teoria a partir da visão de Günther Jakobs, criador desta. Para tanto, utilizou-se a pesquisa bibliográfica por dados pertinentes ao tema. Durante a pesquisa, verificou-se que o Direito Penal do Inimigo visa demolir a pessoalidade do transgressor, além de implantar pena abreviada ante futuras transgressões. Palavras-chave: direito penal do inimigo; sociedade; cidadão ABSTRACT The theory of criminal law, Enemy of Günther Jakobs, acastela a criminal law with the Commission to punish severely individuals at the margins of the law, where they are unable to offer guarantees to return to your cognitive social environment. The purpose of this article aims at analyzing such a theory from the view of Günther Jakobs, creator of this. To this end, we used the bibliographical research for data relevant to the topic. During the research, it was found that the criminal law of the enemy seeks to demolish the personhood of the transgressor, in addition to deploy short penalty against future transgressions. Keywords: criminal law of the enemy; society; citizen 1 INTRODUÇÃO Günther Jakobs, em sua teoria, criara a tese dois sistemas dessemelhantes para dividir o Direito Penal, onde a intenção seria a compreensão de duas castas observadas entre os seres humanos, os quais se distanciam na sua compreensão mútua, que seriam os inimigos e os cidadãos. Porém autores questionam a sua eficácia num Estado Democrático de Direito. O Direito Penal do Inimigo propõe um corretivo severo ao indivíduo fora da ordem jurídica e que sua punição é revelada com base nele próprio, o autor, ao invés do ato realizado pelo mesmo, o que, aos olhos de vários autores, configura-se problema ao ordenamento jurídico de países ditos democráticos como o Brasil. Assim, objetiva-se neste artigo, uma análise teórica sobre as principais correntes que subsidiam a Teoria Penal do Inimigo de Günther Jakobs. Utilizou-se a pesquisa bibliográfica como instrumento de coleta de dados como forma de legitimação do proposto. O presente

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O DIREITO PENAL DO INIMIGO: uma breve releitura da teoria de Günther Jakobs

RESUMO

A Teoria do Direito Penal Inimigo, de Günther Jakobs, acastela um Direito Penal com a

incumbência de punir severamente indivíduos às margens da Lei, onde os mesmos são

incapazes de oferecer garantias cognitivas para seu retorno ao meio social. O objetivo deste

artigo visa analisar tal Teoria a partir da visão de Günther Jakobs, criador desta. Para tanto,

utilizou-se a pesquisa bibliográfica por dados pertinentes ao tema. Durante a pesquisa,

verificou-se que o Direito Penal do Inimigo visa demolir a pessoalidade do transgressor, além

de implantar pena abreviada ante futuras transgressões.

Palavras-chave: direito penal do inimigo; sociedade; cidadão

ABSTRACT

The theory of criminal law, Enemy of Günther Jakobs, acastela a criminal law with the

Commission to punish severely individuals at the margins of the law, where they are unable to

offer guarantees to return to your cognitive social environment. The purpose of this article

aims at analyzing such a theory from the view of Günther Jakobs, creator of this. To this end,

we used the bibliographical research for data relevant to the topic. During the research, it was

found that the criminal law of the enemy seeks to demolish the personhood of the

transgressor, in addition to deploy short penalty against future transgressions.

Keywords: criminal law of the enemy; society; citizen

1 INTRODUÇÃO

Günther Jakobs, em sua teoria, criara a tese dois sistemas dessemelhantes para dividir o

Direito Penal, onde a intenção seria a compreensão de duas castas observadas entre os seres

humanos, os quais se distanciam na sua compreensão mútua, que seriam os inimigos e os

cidadãos. Porém autores questionam a sua eficácia num Estado Democrático de Direito.

O Direito Penal do Inimigo propõe um corretivo severo ao indivíduo fora da ordem jurídica e

que sua punição é revelada com base nele próprio, o autor, ao invés do ato realizado pelo

mesmo, o que, aos olhos de vários autores, configura-se problema ao ordenamento jurídico de

países ditos democráticos como o Brasil.

Assim, objetiva-se neste artigo, uma análise teórica sobre as principais correntes que

subsidiam a Teoria Penal do Inimigo de Günther Jakobs. Utilizou-se a pesquisa bibliográfica

como instrumento de coleta de dados como forma de legitimação do proposto. O presente

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trabalho se justifica perante a sua análise bibliográfica visando esclarecer os principais pontos

aqui considerados, tais como a dignidade da pessoa humana, a filosofia embasadora da teoria

estudada, além de seus aspectos gerais resumidos.

1.1 Ponderações sobre o Direito Penal do Inimigo de Günther Jakobs

A tese sustentada por Günther Jakobs de que existe uma diferença entre sujeitos não

criminosos e sujeitos criminosos perante a sociedade enquanto Estado Democrático de

Direito, especifica que aqueles, são cidadãos sem crimes, e aceitos pela sociedade enquanto

que o segundo, são sujeitos encarados pela mesma sociedade como inimigos puros do Estado.

Assim, segundo Jakobs, os cidadãos não criminosos são vistos como pessoas socais e

socializadas, do bem, enquanto que os sujeitos ditos inimigos do Estado são entendidos como

pessoas foras da lei e da ordem por conta das suas atitudes e condutas ilegais. Desse modo,

Jakobs considera que tais sujeitos devem ser identificados por suas devidas constituis, além

do seu devido tratamento perante o ordenamento jurídico. O autor também leva ao saber em

seus argumentos os meios pelos quais se legitimam e se justificam o direito penal do inimigo

em que se configura e se mantém a paz social, além de sustentar punições àqueles que

deliquem.

Para tanto, Jakobs argumenta que o conceito de cidadão perante o ordenamento jurídico diz

respeito a todo aquele sujeito que se comporte de acordo com o estabelecido por tal

ordenamento e que, em caso de alguma forma de contrafação (ato ilegal, crime), o mesmo

cidadão deverá ser reconduzido ao meio social, tomadas as devidas precauções.

Ou seja, para o doutrinador alemão, a sociedade somente é suficiente configurada em normas

em face de um determinado entendimento social (segurança cognitiva) por parte dos sujeitos

que a ela se integram, ao mesmo tempo em que tais pessoas devem perceber concretamente o

mesmo comportamento em seus pares sociais e que a lei e a ordem deve ser mantida.

Em contrário,

ela não teria força suficiente para influir eficazmente na sociedade e acabaria se

tornando uma “promessa vazia”. Isso também é válido no que tange à personalidade

do autor de um fato punível, que é tratado como pessoa quando há uma expectativa

de que, apesar do ato cometido, ele se conduzirá de forma geral como cidadão,

mantendo-se fiel ao ordenamento jurídico (JAKOBS 2008, p.p. 33-34).

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O doutrinador alemão propõe em suma, no âmbito de uma sociedade democrática, às pessoas

tidas de alta periculosidade, um direito distinto, posto que à estes sujeitos o direito penal

plicado ao cidadão social, correto, não se aplica de forma eficaz. Desse modo, tem-se que os

inimigos dessa mesma sociedade, portanto, seriam aqueles sujeitos que comentem delitos,

crimes de monta ampla e cruel, diga-se crimes organizados, crimes de sexo, crimes de

terrorismo, crimes econômicos, para citar alguns. Nesse contexto, entende-se que o direito

penal do inimigo figura como ferramenta de combate a distintos grupos onde o crime opera.

A estes sujeitos, seriam proporcionadas todas as garantias processuais existentes em

um Estado Democrático de Direito. O autor cita como inimigos aqueles criminosos

econômicos, terroristas, delinqüentes organizados, autores de delitos sexuais e outras

infrações perigosas (JAKOBS1 2009, apud SILVA 2011, p. 11).

Portanto, nessa breve análise aceca da tese de Jakobs sobre o Direito Penal do Inimigo,

entende-se que tal definição objetiva diante das normas legais, que o inimigo aqui

considerado e refletido é aquele á margem desse ordenamento e que com tal atitude, se

desvencilha do meio social e suas práticas delituosas visam a degradação da ordem jurídica.

Jakobs preconiza, nesse entendimento, que o Direito Penal do Inimigo pode ser compreendido

como uma espécie de exceção do direito tradicional, e que essa exceção somente se faz

existente quando do asseguramento das normas. Nesse contexto, podemos dizer que o Direito

Penal do Inimigo busca a supressão dos indivíduos à margem da sociedade os quais não

poderão ser tratados como pessoas sociais.

Em outras palavras, a pessoa fora da ordem social e legal não oferece garantia mínima

cognitiva necessária ao Estado em sua segurança e que tal comportamento definitivamente

será desterrado do meio social perdendo sua condição de cidadão.

Assim:

[...] quem por princípio se conduz de modo desviado, não oferece garantia de um

comportamento pessoal. Por isso, não pode ser tratado como cidadão, mas deve ser

combatido como inimigo. Esta guerra tem lugar com um legítimo direito dos

cidadãos, em seu direito á segurança; mas diferentemente da pena, não é Direito

também a respeito daquele que é apenado; ao contrário, o inimigo é excluído.

(JAKOBS 2008, p. 45.).

1 JAKOBS, Günther. Direito Penal do Inimigo, 4º edição, Tradução André Luís Callegari e Nereu José

Giacomolli, Livraria do Advogado, 2009.

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Talvez um entendimento bastante plausível sobre a teoria do Direito Penal do Inimigo seja a

formulada por Luis Garcia Martín2:

Do ponto de vista geral, é possível dizer que esse Direito Penal do inimigo seria uma

clara manifestação dos traços característicos do chamado Direito Penal moderno,

isto é, da atual tendência expansiva do Direito Penal, que com freqüência origina

formalmente uma ampliação dos âmbitos de intervenção daquele, e, materialmente,

de acordo com a opinião majoritária, um desconhecimento, ou, pelo menos, uma

clara flexibilização ou relaxamento, e, com isso, um menoscabo dos princípios e das

garantias jurídico-penais liberais do Estado de Direito.

Portanto a teoria do Direito Penal do Inimigo, institui que o inimigo do Estado seja aquela

pessoa que possui comportamento altamente lesivo à sociedade, e que tal postura avoca

caráter dessemelhante do indivíduo posto na ordem jurídica.

Por fim deste subtítulo, resta enumerar os pilares que dão sustentação à teoria de Jakobs:

a) antecipação da punição do inimigo; b) desproporcionalidade das penas e

relativização e/ou supressão de certas garantias processuais; c) Criação de leis

severas direcionadas especificamente aos agentes considerados inimigos. (JAKOBS

2009, p,p. 22-23). (adaptado).

Portanto é uma teoria que não coaduna em países democráticos por retirar garantias

fundamentais da pessoa humana, sobretudo no Brasil.

1.2 Alguma filosofia na teoria de Jakobs

Para desenvolver sua teoria, o doutrinador alemão vai buscar em tempos passados, séculos 17

e 18, seus principais argumentos filosóficos para sustentar que o ser humano pode ser

dividido em categorias dissemelhantes entre si, tais como os cidadãos, aqueles que estão

dentro do sistema normal e os inimigos, os fora da lei.

Observa-se que diante desse pressuposto de Jakobs, a divisão em categorias do ser humano

em cidadão de bem e indivíduos perigosos, nasce da ideia de um plano corretivo do autor com

amparo em sistemas concretos e práticos de imputação diferenciados, angariados pelo direito

penal do cidadão, assim como pelo direito penal do inimigo. Tal concepção é visível e

reconhecida pela adoção de Jakobs das ideias de Hegel, para o qual o crime se configura

2 GRACIA MARTIN, Luis. O horizonte do Finalismo e o Direito Penal do Inimigo. Série Ciência do Direito

Penal Contemporânea. Traduzido por Luiz Regis Prado e Érika Mendes de Carvalho. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2007, p.p. 75/76.

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como negação de validade da norma, e que atualizou-se com vistas a direcionar a punição

jurídica em dois rumos, para o cidadão: a pena criminal iria preservar significação simbólica,

onde ocorreria uma espécie de reafirmação da validade da norma, representando uma sanção a

atos anteriores; enquanto que para o inimigo, a punição significaria o castigo físico, na forma

de custódia de segurança preventiva, ainda que como medida preventiva de fatos

posteriores/futuros.

1.3 Direito Penal do Inimigo e a dignidade da pessoa humana

Um dos fundamentos da teoria de Jakobs diz respeito ao comportamento exercido pelo sujeito

em sociedade, se este for bom é reconhecido como cidadão e o contrário é tido como inimigo

e, portanto, perde o status de pessoa, caindo por terra direitos e garantias fundamentais

assegurados pelo Estado.

Ao analisar tal preposição, verifica-se que o doutrinador alemão nega completamente

qualquer garantia fundamental ao sujeito transgressor e com isso a sua teoria não expressa

nenhum tipo de valor ou garantias fundamentais à pessoa humana. Desse modo, embasando-

se em Fichte (1762-1814), Jakobs insere o pensamento desse autor na sua teoria para

assegurar que o indivíduo que sai do contrato social perde todo seu valor como pessoa.

Assim, Jakobs cita Fichte (1762-1814) o qual afiança que

[…] quem abandona o contrato cidadão em um ponto em que no contrato se contava

com sua prudência, seja de modo voluntário ou por imprevisão, perde todos os seus

direitos como cidadão e como ser humano, e passa a estar em um estado de ausência

completa de direitos.3

Depreende-se assim, que Jakobs, a partir de tais ensinamentos, adota a essência de um direito

voltado para o cidadão de bom comportamento, aquela pessoa não reincidente no mundo do

crime, ao passo em que defende um direito que pune severamente o inimigo do Estado, o qual

é tido como pessoa que não oferece comportamento cognitivo de segurança à sociedade,

inserido naquele contrato social4, momento em que o mesmo perderá todos os seus direitos e

garantias, ausência total de seu status de pessoa.

3JAKOBS, Gunther; MÉLIA, Manuel Cancio. Direito penal do inimigo: noções e críticas, p. 25-26.

4 Jean-Jacques Rousseau (1757, p. 31) estabelece o contrato social como objeto do convívio pacífico entre as

pessoas que tem um objetivo comum, no qual o Estado é a unidade, e seus membros são todos aqueles

alcançados pelas leis promulgadas. As leis surgem para estabelecer os limites que devem ser respeitados pelos

cidadãos que participam do estado, e também como forma de coerção àqueles que as descumprirem.

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Jakobs é ainda mais rigoroso quanto à destituição da condição de pessoa junto ao inimigo,

pois o doutrinador acastela que seja dado um verdadeiro tratamento de guerra a estes sujeitos,

onde no processo judicial que figurassem como réus, não seriam observadas garantias

processuais dadas a cidadãos comuns, pois quando estes não adentram um estado de

cidadania, não podem participar dos benefícios do conceito de pessoa (JAKOBS 2009, p.

35)5.

Diante do exposto, implica dizer que junto a procedimentos aparentes aos utilizados no front

de batalha (de guerra) em face do indivíduo considerado como inimigo do Estado, o

doutrinador alemão Jakobs explica que devem ser cultivadas ainda alcances de segurança na

busca por serem separados tais indivíduos do meio social.

Portanto, e ao cabo, verifica-se que a teoria do Direito Penal do Inimigo não é bem vinda num

Estado Democrático de Direito, posto que quando cerceia direitos e garantias fundamentais do

indivíduo e contrapõe todo um arsenal constitucional contido em países democráticos, a

exemplo do Brasil.

1.4 Breve apontamento histórico do Direito Penal do Inimigo

Em 1985 Günther Jakobs cunhara pela primeira vez a expressão Direito Penal do Inimigo

quando da publicação do seu artigo que versava acerca da criminalização prévia de condutas

extremamente lesivas ao Estado.

Seus pelares de sustentação são basicamente três segundo o jurista alemão: a prioridade da

punibilidade, a cautela de penas desproporcionais e altas, além do cerceamento de garantias

do indivíduo os quais seriam terroristas, líderes de facções criminosas, homens-bomba,

estupradores etc. Assim, segundo um ordenamento jurídico eficaz, poderia se fazer a distinção

entre cidadãos ordeiros e aqueles considerados inimigos do Estado.

Já em finais da década de 1990, o próprio Jakobs defende certa flexibilização sobre sua tese

quando passa a defende-la de forma parcial, numa tentativa de legitimar a aplicação do

Direito Penal do Inimigo. A alegação foi de que o Direito Penal do Inimigo não seria

ilegítimo, posto que a diferença entre Direito Penal do Inimigo e o Direito Penal do Cidadão

5 Cf. em: SILVA, Willians Schiestl da. A INFLUÊNCIA DO DIREITO PENAL DO INIMIGO NO

ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de

Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a

obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Murilo Henrique Pereira Jorge. p. 12.

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tornara-se necessária para a segurança e a proteção do Estado Democrático de Direito, assim

como do próprio ordenamento jurídico em si. Assim,

O Direito penal do cidadão e o Direito de todos, o Direito penal do inimigo e

daqueles que o constituem contra o inimigo: frente ao inimigo, e só coação física,

ate chegar a guerra (...) [Assim] O Direito penal do cidadão mantem a vigência da

norma, o Direito penal do inimigo (...) combate perigos (...).

Depreende-se desse contexto, que no entendimento de Jakbs o Direito Penal do Cidadão

encerra suas práticas aos cidadãos sem nenhuma exercício delinquente e que demonstra

comportamento fiel às normas legais, ao passo em que o Direito Penal do Inimigo seria

aplicado em contrário ao primeiro.

Um fato que marcou e ampliou a discussão sobre o direito penal do inimigo foi o atentado

terrorista de 11 setembro de 2001 nos Estado Unidos da América. Tal monta causara grande

comoção mundial e local e exacerbara os ânimos patrióticos dos americanos frente o combate

àqueles que se posicionam contra o Estado, ditos inimigos do Estado. Seria agora combater

tais inimigos de forma severa e rápida, sobretudo terroristas.

Diante desse contexto de atentado terrorista, ocorre um direcionamento penal mais severo

como forma de punir aqueles que s projetam contra o Estado e suas leis, eis que surge o

Direito Peal do Inimigo. Desse modo, é pertinente explicar, nesse sentido, que qualquer

indivíduo que portador de comportamento infrator às normas estatais, ou mesmo que viesse

colocar em temeridade/risco a lei e ordem, a ele seria cominada sanções penais, subtraindo-

lhe seus direitos básicos. Restando-lhe também uma condenação sumária e breve, sem

nenhum preposto legal ou ampla defesa.

1.5 Breve consideração sobre crime

É imperativo nesse momento destacar, mesmo que de forma abreviada, algumas

considerações sobre o conceito de crime. Dizer que nesse contexto, tudo aquilo que se faz

referência a um episódio que se opõe ao ordenamento jurídico (à lei vigente), será entendido

como delito, crime ou mesmo contravenção. Apesar de sua aplicação semântica distinta,

ambas palavras são entendidas na prática da legislação nacional brasileira de forma também

diferenciada.

O Decreto-Lei 3.914/41, em seu art. 1º explica o crime como infração penal cominada pela

pena de reclusão, ensejando tal diferenciação entre crime, delito ou contravenção. Tem-se que

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cada Estado toma sua doutrina jurídica em face daquilo que se diz fato desfavorável ao

ordenamento jurídico (à lei) e assim persevera a análise do ato ilegal (ilícito) gerando assim a

sua própria e pura pena. Deve-se dizer ainda que alguns países adotam o sistema tripartido de

disposição dos atos que afrontam a lei. Tal sistema é dividido em algumas nações como

crimes, contravenções e delitos.

O direito penal no Brasil adota, segundo Prado (2005), o modelo bipartido, onde, para o autor,

a distinção ente crime ou delito e contravenção depende da sua gravidade.

O Direito Penal Brasileiro, bem como também o Alemão, o Italiano (art. 39) e o

Português, entre outros, agasalha a divisão geral bipartida das infrações penais em

crime ou delito e contravenção. A diferença entre eles é meramente quantitativa

(gravidade da conduta/pena). Os crimes ou delitos são punidos com penas privativas

de liberdade, restritivas de direitos e de multa (art. 32, CP), e a contravenção é

sancionada com prisão simples e multa (art. 5º, Decreto-lei 3.688/1941 – Lei das

Contravenções Penais). (PRADO, 2005, p. 256).

Ou seja, o núcleo da discussão mora na gravidade do fato. Na legislação brasileira agrupam-se

na ceara das contravenções os delitos leves, brandos, enquanto que os delitos de maior monta

estabelecem-se no campo dos crimes ou delitos.

Se analisarmos o nosso primeiro Código Criminal do Império de 1830, assim como o

primeiro Código Penal Republicano de 1890 percebe-se que ambos se esforçam para

conceituar o crime. Assim, o § 1º do art.2º do Código Criminal do Império diz: Art. 2º julgar-

se á crime como: § 1º ação ou omissão voluntária contrária às leis penais. (redação original).

O primeiro Código Penal Republicano de 1890 expressa: Art. 2º A violação da lei penal

consiste em ação ou omissão, constitui crime ou contravenção. (redação original).

Segundo concepção de Berenini (apud FERRI, 2003, p. 341) crime “são ações puníveis

(crimes) as determinadas por móbeis individuais (egoístas) e anti-sociais, que perturbam as

condições de vida e vão de encontro à moralidade média de um dado povo em um dado

momento”.

Franz Von Liszt (1899, p. 183) observa que crime “Crime é o injusto contra o qual o Estado

comina pena e o injusto, quer se trata de delicto do direito civil, quer se trate do injusto

criminal, isto é, do crime, é a ação culposa e contraria ao direito”. (sic).

Greco (2015 p. 194) explica que o conceito atribuído ao crime é meramente doutrinário. Para

este autor, “não existe um conceito de crime fornecido pelo legislador, restando-nos, contudo,

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seu conceito doutrinário”. E apresenta três conceitos considerados por ele os mais difundidos

a saber: formal, material e analítico. Do ponto de vista formal, Greco (2015) considera que

crime seria toda conduta que atentasse, que colidisse frontalmente contra lei penal

editada pelo Estado. Considerando-se o seu aspecto material, conceituamos o crime

como aquela conduta que viola os bens jurídicos importantes. (GRECO 2015, p.p.

194-195).

Entretanto, Greco (2015) é enfático em afirmar que os conceitos formal e material não são

suficientes para traduzir o crime em face da ausência de uma definição concreta. “Surge,

assim, outro conceito, chamado analítico, porque realmente analisa as características ou

elementos que compõem a infração penal”, (GFRECO 2015, p.).

Portanto temos que todos os subsídios e conjeturas implicam estudos que se inserem no

núcleo da teoria do crime ou delito. Dessa forma, entende-se que por meio desses subsídios,

tem-se bases teóricas que possam ensejar o reconhecimento do fato delituoso/crime.

2 CONCLUSÕES

Por meio de breve releitura da teoria de Günther Jakobs realizada neste trabalho, conclui-se

que o Direito Penal do Inimigo, além de um rigoroso sistema penal de ampla punição ao

inimigo do Estado, visa ainda, sobretudo, destituir a pessoalidade do agente transgressor,

propondo em suma a sua prevenção antecipada diante de futuras transgressões, numa tentativa

e resguardar a segurança do Estado. Verifica-se ainda que o Direito Penal do Inimigo corre

contra os preceitos e garantias fundamentais do homem, além de se opor às bases

institucionais do nosso país.

Em seu discurso perante o Contrato Social de Jean-Jacques Rousseau, pode-se observar que o

Direito Penal do Inimigo traduz a intenção filosófica de Jakobs em separar os seres humanos

em categorias distintas, o cidadão (do bem) e o inimigo (perigoso). O primeiro, o cidadão

ordeiro, que obedece fielmente o contexto jurídico estatal, e o segundo, o oposto, considerado

indivíduo perigoso, às margens de qualquer ornamento jurídico estabelecido num Estado

Democrático de Direito.

Tal pretexto de resguardo à segurança do Estado proposto por Jakobs, leva ao segundo plano,

valores humanos, imprimidos por toda a sua história, já que os valores de uma sociedade

civilizada, surgindo agora como novos valores a serem protegidos, erguem-se ao patamar de

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prioridade, onde importa em grau máximo a sua segurança. Assim, o princípio de segurança

da sociedade surge da normalidade que esta experimenta.

Nesse contexto, seria nesse rio que o Direito Penal do Inimigo iria beber água para a sua

aplicabilidade e manutenção em face do crime que mina o Estado, e que o próprio Estado não

possui nenhum tipo obrigatório pela manutenção e respeito às garantias constitucionais

oriundas do contrato social em sua amplitude.

Portanto, nasce assim o cerceamento às garantias constitucionais e jurídicas como um todo,

onde a desproporcionalidade das penas seriam atendidas e aplicadas ao inimigo.

3 REFERÊNCIAS

BRASIL, Constituição da República Federativa do. Edição administrativa atualizada em

junho de 2013. (Contém as Emendas Constitucionais n° 1 a 73). Senado Federal.

FERRI, Enrico. Princípios do direito criminal: o crime e o criminoso. Campinas: Russell,

2003.

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 17. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2015.

JAKOBS, Gunther. Direito penal do cidadão e direito penal do inimigo. In: ______;

MELIÁ, Manuel Cancio. Direito penal do inimigo: noções e críticas. 3 ed. Porto Alegre:

Livraria do Advogado, 2008.

LISZT, Franz Von. Tratado de Direito Penal Alemão. Traduzido por: José Hygino Duarte

Pereira. Rio de Janeiro: Editora F. Briguret & C. 1899.

PRADO, Luiz Régis. Curso direito penal brasileiro. 2. Ed. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2002.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do Contrato Social. 3º edição, Tradução Pietro Nassetti,

Martin Claret, 2009.

SILVA, Willians Schiestl da. A Influência do Direito Penal do Inimigo no Ordenamento

Jurídico Brasileiro. Universidade Tuiuti do Paraná. Curitiba, 2011.