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FLÁVIOAUGUSTODEOLIVEIRARIBEIROSANTOS ODIREITODAPERSONALIDADEDOSFILHOSÀGUARDACOMPARTILHADA MARINGÁ– PR 2006 Please purchase PDFcamp Printer on http://www.verypdf.com/ to remove this watermark.

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  • FLVIO AUGUSTO DE OLIVEIRA RIBEIRO SANTOS

    O DIREITO DA PERSONALIDADE DOS FILHOS GUARDA COMPARTILHADA

    MARING PR

    2006

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  • CENTRO UNIVERSITRIO DE MARING

    FLVIO AUGUSTO DE OLIVEIRA RIBEIRO SANTOS

    O DIREITO DA PERSONALIDADE DOS FILHOS GUARDA COMPARTILHADA

    Dissertao apresentada como requisito parcial

    obteno do ttulo de Mestre em Cincias

    Jurdicas pelo Centro Universitrio de Maring.

    Orientadora: Prof Dr Valria Silva Galdino.

    MARING PR

    2006

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  • CENTRO UNIVERSITRIO DE MARING

    MESTRADO EM CINCIAS JURDICAS

    REA DE CONCENTRAO: Direitos da Personalidade

    TTULO: Direito da personalidade dos filhos guarda compartilhada

    AUTOR: Flvio Augusto de Oliveira Ribeiro Santos

    ________________________________________________

    PROF DR VALRIA SILVA GALDINO Presidente

    __________________________________________________

    PROF. DR. JOS SEBASTIO DE OLIVEIRA 1 Membro

    ______________________________________________________

    PROF. DR. SNIA LETCIA DE MELO CARDOSO 2 Membro

    DATA: 27 de dezembro de 2006.

    NOTA / CONCEITO: 8,5 (oito e meio) / Conceito B.

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  • DEDICATRIA

    Dedico este trabalho, em primeiro lugar, a meu pai, Jos dos Santos (in

    memorian), eterno exemplo para todos os aspectos de minha vida pessoal e

    profissional.

    Impe-se, de outro lado, dedic-lo a minha esposa, Graziela Ribeiro Santos,

    cujo amor e companheirismo inspiram, na mesma intensidade, meus passos

    acadmicos e pessoais, e de cuja companhia tantas horas me foram roubadas pela

    realizao deste estudo.

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  • AGRADECIMENTOS

    Agradeo, primeiramente, a Deus, pela inigualvel oportunidade de viver,

    estudar, trabalhar, enfim, de desfrutar de todos os bens que o estar no mundo pode

    nos oferecer.

    Agradeo, tambm, minha me, Terezinha de Oliveira Santos, pelo

    incansvel apoio material e emocional sem o qual me teria sido impossvel concluir

    as linhas que se seguem.

    E, por fim, mas no com menos fervor, agradeo Professora Doutora

    Valria Silva Galdino, pela paciente e preciosa transmisso de conhecimentos e de

    padres de conduta intelectual.

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  • RESUMO

    A presente dissertao se prope a estudar a guarda compartilhada, atravs

    da compreenso de sua posio frente aos institutos jurdicos da guarda em geral,

    do poder parental e do dever do genitor no detentor da guarda de prestar alimentos

    aos filhos menores. Apresentado esse contexto, conceitua-se a guarda

    compartilhada, demarcando sua origem, para, ento, discorrer sobre sua aplicao

    durante os mais de oitenta anos de vigncia do Cdigo Civil brasileiro de 1916.

    Estuda-se, tambm, a aplicabilidade da guarda compartilhada no ordenamento

    jurdico vigente no Brasil, mormente no que tange ao Cdigo Civil institudo pela Lei

    10.406/2002. Disserta-se, ento, sobre os principais caracteres do Projeto de Lei

    nmero 6.350, tambm de 2002, que pretende tornar a guarda compartilhada

    expressa no Direito ptrio, na qualidade de alternativa preferencial em casos de

    separao judicial ou divrcio. Em seguida, expe-se o individualismo, isolamento e

    insensibilidade a que tem sido conduzido o ser humano na sociedade ps-moderna;

    e, em conseqncia, a desagregao familiar caracterstica da atualidade, com seus

    efeitos sociais negativos. Tenta-se, aqui, demonstrar que a guarda compartilhada,

    na medida em que preserva laos familiares, contribui em muito para uma nova

    insero do ser humano em sociedade. A seguir, so abordadas as circunstncias

    psicolgicas envolvidas quando da separao de um casal, principalmente a

    profunda frustrao que se impe aos cnjuges, por verem fracassado um projeto de

    vida em comum, e os danos psquicos causados aos filhos que, diante da separao

    dos pais, se vem obrigados a perder quase que inteiramente a convivncia com um

    dos genitores. Neste ponto, igualmente, indica-se a guarda compartilhada como

    instrumento para se manter a harmonia entre cnjuges separados e a convivncia

    entre pais e filhos, evitando desgaste psicolgico. Por fim, trata-se dos direitos da

    personalidade no Direito ptrio, com nfase na sua proteo tanto em termos de

    preveno quanto de reparao patrimonial. E, encerra-se por caracterizar a guarda

    compartilhada como um instrumento jurdico hbil a promover o pleno exerccio, por

    parte dos filhos menores de casais separados, do direito da personalidade que

    possuem integridade psquica e a uma convivncia familiar equilibrada, dentro do

    princpio da dignidade humana, previsto pela Constituio Federal.

    PALAVRAS-CHAVE: Ps-modernidade; Famlia; Psicologia; Direito; Guarda

    Compartilhada.

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  • ABSTRACT

    The present work is proposed to study the shared guard, through the

    understanding of its position front to the legal institutes of the guard in general, the

    parental power and the duty of the genitor who detains the guard not to give foods to

    the lesser children. Presented this context, it is appraised shared guard, demarcating

    its origin, for, then, discoursing more than on its application during the eighty years of

    validity of the Brazilian Civil Code of 1916. The applicability of the shared guard in

    the effective legal system in Brazil is also studied, mainly in what it refers to the Civil

    Code instituted by the Law 10.406/2002. Then, theres an exposition on the main

    characters of the Project of Law number 6.350, also of 2002, that it intends to

    become the shared guard express in the native Law, in the quality of preferential

    alternative in cases of judicial separation or divorce. After that, one exposes the

    individualism, isolation and insensibility where has been lead the human being in the

    after-modern society; and, in consequence, the characteristic familiar disaggregation

    of the present time, with its negative social effect. It is tried, here, to demonstrate that

    the shared guard, in the measure where it preserves familiar bows, contributes in

    very for a new insertion of the human being in society. To follow, the involved

    psychological circumstances when of the separation of a couple are boarded, mainly

    the deep frustration that if impose to the spouses, for seeing failed a life project in

    common, and the psychic damages caused to the children who, ahead of the

    separation of the parents, almost entirely lose the opportunity to live together with

    one of the genitors. In this point, equally, the shared guard is indicated as an

    instrument to keep the harmony between separate spouses and living together

    between parents and children, preventing psychological consuming. Finally, one is

    about the rights of the personality in the native Law, with emphasis in its protection in

    such a way in terms of prevention as well as patrimonial repairing. And, it is locked in

    for characterizing the shared guard as a skillful legal instrument to promote the full

    exercise, by the lesser children of separate couples, of the right of the personality

    that they possess to the psychic integrity and a balanced familiar living together,

    inside of the beginning of the dignity human being, foreseen for the Federal

    Constitution.

    KEY-WORDS: After-modernity; Family; Psychology; Law; Shared Guard.

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  • Os conflitos em famlia so resolvidos, habitualmente, pela lei do amor.

    Mahatma Gandhi

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  • SUMRIO

    INTRODUO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10

    1. DOS INSTITUTOS JURDICOS BSICOS RELACIONADOS GUARDA

    COMPARTILHADA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14

    1.1 DA GUARDA EM GERAL. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .14

    1.2 DO PODER FAMILIAR. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20

    1.3 DA PENSO ALIMENTCIA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26

    2. DOS FUNDAMENTOS JURDICOS DA GUARDA COMPARTILHADA . . . . . . 30

    2.1 DO CONCEITO E LINHAS GERAIS DA GUARDA COMPARTILHADA. . . . 30

    2.2 DA GUARDA COMPARTILHADA NO DIREITO ANTERIOR AO ATUAL

    CDIGO CIVIL BRASILEIRO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .35

    2.3 DA GUARDA COMPARTILHADA NO CDIGO CIVIL BRASILEIRO. . . . . .41

    2.4 DO PROJETO DE LEI NMERO 6.350, DE 20 DE MARO DE 2002. . . . . .49

    3. DOS FUNDAMENTOS SOCIOLGICOS DA GUARDA COMPARTILHADA. . 52

    3.1 DA PS-MODERNIDADE E INDIVIDUALISMO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .52

    3.2 DA DISSOLUO DAS ENTIDADES FAMILIARES NO ATUAL CONTEXTO

    SOCIAL. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60

    3.3 DA GUARDA COMPARTILHADA COMO TENTATIVA DE SE MANTEREM

    VNCULOS AFETIVOS. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64

    4. DOS FUNDAMENTOS PSICOLGICOS DA GUARDA COMPARTILHADA. . .69

    4.1 DOS EFEITOS PSICOLGICOS, PARA OS CNJUGES, DA SEPARAO

    OU DO DIVRCIO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .69

    4.2 DA DISSOLUO DA FAMLIA E INTEGRIDADE PSICOLGICA DOS

    FILHOS MENORES. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .71

    4.3 DA GUARDA COMPARTILHADA E MANUTENO DA ESTABILIDADE

    EMOCIONAL DOS ENVOLVIDOS. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80

    5. DO DIREITO DA PERSONALIDADE DOS FILHOS GUARDA

    COMPARTILHADA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83

    5.1 DAS NOES GERAIS ACERCA DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE 83

    5.2 DAS LINHAS INTRODUTRIAS PROTEO DOS DIREITOS DA

    PERSONALIDADE NO ATUAL DIREITO CIVIL BRASILEIRO. . . . . . . . . . . . . .86

    5.3 DA GUARDA COMPARTILHADA E A PROTEO AO DIREITO

    INTEGRIDADE PSICOLGICA COMO DIREITO DA PERSONALIDADE. . . . . 88

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  • CONCLUSES. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97

    REFERNCIAS. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106

    ANEXOS. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 124

    ANEXO I PROJETO DE LEI NMERO 6.350, DE 20 DE MARO DE 2002. . . 125

    ANEXO II PARECER DA COMISSO DE CONSTITUIO, JUSTIA E

    CIDADANIA DA CMARA DOS DEPUTADOS, ACERCA DO PROJETO DE LEI

    NMERO 6.350, DE 20 DE MARO DE 2002. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 130

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  • 10

    INTRODUO

    A sociedade atual se caracteriza, entre diversos outros traos, pela

    instabilidade emocional dos indivduos. A chamada ps-modernidade trouxe, em seu

    bojo, uma competitividade nunca antes vivida, em diversos campos da vida humana.

    A constante busca pelas conquistas materiais, pela comodidade que os dias

    atuais podem oferecer, tem afastado o ser humano de valores at ento

    considerados importantes, tais como o afeto, a sensibilidade e a convivncia social.

    Inevitavelmente, essa inverso de prioridades atingiu a famlia, que,

    anteriormente, tida como clula geradora das mais essenciais relaes do gnero

    humano, passou a ter como foco questes meramente patrimoniais e reprodutivas.

    Encontra-se, a, uma preocupao, estrada pela qual se pode seguir rumo

    reconstruo da parentalidade como formadora de cidados aptos a fazerem da vida

    um ciclo de perene progresso, individual e coletivo.

    Afetiva, democrtica, indelevelmente destinada preservao e ampliao da

    dignidade humana, em sua integralidade, esta a almejada nova famlia. Cnjuges

    e prole solidificando laos sentimentais e de amizade que jamais deveriam ser

    desfeitos, mesmo em se acatando a separao formal entre aqueles.

    Trata-se de contexto necessrio proteo da prpria dignidade humana,

    envolvendo, em patamar altamente significativo, a defesa legal dos chamados

    direitos da personalidade, quais sejam aqueles inatos pessoa humana.

    A defesa desses direitos ganha relevncia junto doutrina, jurisprudncia e

    aos mais diversos ordenamentos jurdicos contemporneos. Exemplo disso o

    espao dedicado ao tema no novo Cdigo Civil brasileiro, que, na viso de vrios de

    seus comentadores, protege, nessa categoria de direitos, a integridade no s fsica,

    mas tambm psicolgica dos cidados brasileiros.

    Portanto, e tendo em vista que integridade psquica do ser humano , em boa

    parte, gerada e conservada por relaes saudveis e equilibradas entre pais e filhos,

    instrumentos legais destinados a defender essas relaes contribuiro fortemente

    para sustentar aquela integridade.

    Eis a principal razo pela qual se prope este estudo, voltado guarda

    compartilhada, na qualidade de mtodo jurdico para se manterem os laos entre

    pais separados e seus filhos, com vistas defesa dos direito da personalidade que

    estes tm sua integridade psicolgica e desenvolvimento social.

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  • 11

    Isto posto, a demonstrao dos resultados da pesquisa ser efetivada em

    cinco partes distintas. Na primeira, so analisados os trs institutos gerais do Direito

    de Famlia que se relacionam diretamente guarda compartilhada.

    O primeiro o da guarda em geral, cujo estudo tem como foco seu conceito,

    caractersticas fundamentais e espcies, alm do contedo dos principais

    dispositivos do atual Cdigo Civil brasileiro que lhe do tratamento.

    O segundo vem a ser o poder familiar, avaliado atravs de seu conceito, da

    importncia de seu exerccio por ambos os pais, dos direitos que o compem e das

    linhas gerais que lhe so traadas pelo Direito positivo nacional; reconhecendo,

    ainda, na guarda compartilhada uma via de sustentao de seu exerccio

    compartido, em face da separao judicial ou divrcio de seus titulares.

    E, em terceiro lugar, so tecidas algumas consideraes em torno da

    obrigao alimentar no ordenamento civil vigente no pas, bem como sobre o modo

    como se deve posicionar a questo dos alimentos na guarda compartilhada.

    Na segunda parte desta dissertao, trazida a exposio dos fundamentos

    jurdicos da guarda compartilhada no Direito Civil brasileiro, hodiernamente em vigor.

    Comea-se por conceituar tal modalidade de guarda, expondo brevemente

    suas origens e caractersticas bsicas. Prossegue-se, ento, por sua aplicao no

    Brasil na vigncia do Cdigo Civil de 1916. Em seguida, expe-se suas

    possibilidades de implementao sob a gide do vigente Cdigo Civil, passando-se,

    em concluso a esta parte inicial, ao Projeto de Lei nmero 6.350/2002, que tornaria

    a guarda compartilhada expressa no novo Cdigo Civil brasileiro.

    J, na terceira parte, expem-se, de incio, as circunstncias psicolgicas que

    envolvem a separao de um casal, e se tenta demonstrar as conseqncias da

    dissoluo da unidade familiar para pais e filhos, finalizando com posio da guarda

    compartilhada na tentativa de manuteno da unidade afetiva entre os membros da

    famlia dissolvida.

    Segue-se, atravs da quarta parte deste trabalho, traando-se um painel das

    circunstncias sociais da atualidade, buscando evidenciar o modo como a ps-

    modernidade instalou entre ns uma doutrina de tamanho individualismo que levou a

    uma alarmante instabilidade da instituio familiar, e como a guarda compartilhada,

    combatendo essa instabilidade, pode contribuir para uma nova ordem social.

    E, no quinto e ltimo segmento em que se divide este estudo, trata-se dos

    direitos da personalidade, categoria que vem assumindo grande espectro jurdico, e

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  • 12

    que, por envolver a proteo aos aspectos psicolgicos do ser humano, representa o

    quadro em que se pretende inserir o direito dos filhos guarda compartilhada.

    Poder-se-ia dividir esta exposio em um nmero maior de itens e subitens, o

    que, contudo, no se fez especialmente para preservar a simetria na distribuio do

    contedo.

    Em termos de problematizao do tema, pode-se afirmar que a presente

    dissertao se prope a responder a algumas questes principais, sendo a primeira

    a completa caracterizao da guarda compartilhada, suas origens e contornos

    atuais.

    Questiona-se, outrossim, como se deu a aplicao concreta da guarda

    compartilhada na vigncia do Cdigo Civil de 1916, e como pode ocorrer, de acordo

    com a legislao vigente, a implementao prtica da guarda compartilhada,

    englobando, na seqncia, o contedo do Projeto de Lei nmero 6.350/2002, e a

    maneira pela qual sua entrada em vigor pode colaborar com o Direito de Famlia no

    Brasil.

    No setor do texto dedicado aos fundamentos sociolgicos da guarda

    compartilhada, problematiza-se a situao do ser humano, individualmente

    considerado, na sociedade atual, e a influncia das aflies advindas dessa situao

    em seu comportamento familiar.

    Considera-se, ainda, de que maneira a guarda compartilhada pode colaborar

    com a melhora nas condies sociolgicas do indivduo contemporneo, por meio do

    fortalecimento de seus laos sociais baseados na famlia.

    Outro problema proposto o de se definir quais so as circunstncias

    psicolgicas que envolvem a separao de casais, quais so suas conseqncias

    para o casal e seus filhos menores, e como a guarda compartilhada pode amenizar

    tais efeitos.

    E, no que tange aos direitos da personalidade, pode-se estabelecer como

    problemas principais sua delimitao e proteo no atual direito brasileiro,

    atentando-se para a maneira pela qual a guarda compartilhada poderia atender a um

    direito da personalidade dos filhos menores de casais separados; atendendo, ainda,

    ao princpio constitucional da dignidade da pessoa humana.

    Alcanando-se respostas satisfatrias a tais questes, ter-se- abrangido

    tema de relevante importncia na atualidade, uma vez que, diante do crescente

    isolamento emocional e psicolgico a que os indivduos de todas as idades vm

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  • 13

    sendo submetidos na chamada ps-modernidade, a guarda compartilhada pode

    oferecer, nos termos propostos no texto que se segue, uma via de fortalecimento de

    laos familiares slidos, vitais para o desenvolvimento e a felicidade humana.

    Juridicamente, o tema ganha vulto com base na estreita ligao, a qual se

    pretende deixar patente, entre os efeitos da guarda compartilhada sobre a vida dos

    filhos e o direito da personalidade destes integridade psquica, sem perder de vista

    a dignidade dos menores como seres humanos.

    Justificada, portanto, a importncia do tema, saliente-se que o objetivo do

    trabalho ora apresentado no , de modo algum, o de esgotar assunto to vasto

    quanto a guarda compartilhada e as relaes familiares em que se insere, mas, to

    somente, levantar as primeiras linhas de um incentivo a que o tema continue a ser

    estudado, e novas contribuies possam surgir para o aprofundamento desse

    campo do Direito Civil.

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  • 14

    1. DOS INSTITUTOS JURDICOS BSICOS RELACIONADOS GUARDA

    COMPARTILHADA

    1.1 DA GUARDA EM GERAL

    A guarda de filhos, em termos gerais, a primeira figura jurdica a ser

    analisada para que se tenha clara fundamentao acerca da guarda compartilhada,

    objeto do estudo que ora se inicia.

    Usualmente, define-se a guarda como um instituto jurdico pelo qual os pais

    recebem do Estado e da coletividade a misso superior de cuidar dos filhos,

    protegendo-os de riscos de qualquer natureza e estabelecendo limites de atuao.1

    O jurista Flvio Guimares Lauria visualiza na guarda uma gama de direitos e

    deveres de grande abrangncia, externando o entendimento que abaixo se

    transcreve:

    A guarda consiste num complexo de direitos e deveres que uma pessoa ou um casal exerce em relao a uma criana ou adolescente, consistindo na mais ampla assistncia sua formao moral, educao, diverso e cuidados para com a sade. Bem como toda e qualquer diligncia que se apresente necessria ao pleno desenvolvimento de suas potencialidades.2

    O doutrinador Jos Antnio de Paula Santos Neto apresenta, de sua parte,

    conceito assaz interessante, emitido como se segue:

    um complexo de direitos e deveres concernentes ao pai e mo, fundado no Direito Natural, confirmado pelo direito positivo e direcionado ao interesse da famlia e do filho menor no emancipado, que incide sobre a pessoa e o patrimnio deste filho e serve como meio para manter, proteger e educar.3

    No se pode, como adverte Joecy Camargo, confundir guarda com poder

    familiar, ou ptrio poder, figura jurdica a ser tratada mais adiante:

    O instituto da guarda implcito no texto constitucional vem assegurar a toda criana o direito de ter um guardio a proteg-la, prestando-lhe toda assistncia na ausncia dos genitores, porm no se confunde com o ptrio poder. Apesar de ser a essncia deste, nele

    1 MATIELLO, Fabrcio Zamprogna. Cdigo Civil Comentado. So Paulo: LTr, 2003, p. 1064. 2 LAURIA, Flvio Guimares. A regulamentao de visitas e o princpio do melhor interesse da criana. Rio de Janeiro: Lmen Juris, 2002, p. 62. 3 SANTOS NETO, Jos Antnio de Paula. Do Ptrio Poder. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 55.

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  • 15

    no se esgota, pois a guarda pode ser exercida isoladamente e o ptrio poder pode existir sem a guarda.4

    Para evitar tal confuso, Maria Helena Diniz, de maneira objetiva, associa a

    guarda companhia fsica dos filhos, como corolrio do poder familiar:

    Guarda de filhos. Direito Civil. Direito-dever dos pais de ter seu filho em sua companhia, por serem detentores do ptrio poder.5

    De fato, trata-se de um conjunto de direitos e deveres atribudos aos pais, de

    maneira igualitria, mas sempre com vistas ao interesse de preservao e

    desenvolvimento dos filhos menores, e da prpria unidade familiar.

    A preocupao com o interesse do menor no mbito familiar passou a ter

    destacada relevncia com a Constituio Federal de 1988, conforme Pedro Augusto

    Lemes Carcereri:

    Outrossim, a regulamentao da guarda dos filhos no leva em considerao outros direitos seno aqueles inerentes aos prprios menores, em ateno a teoria da proteo integral da criana e do adolescente, respaldada pela prpria Constituio Federal (art. 227, "caput"). Por conseguinte, eventuais direitos conferidos aos genitores no podem prevalecer em detrimento dos interesses dos menores, inclusive quando da fixao do regime de guarda e do direito de visitas.6

    To focada a guarda no melhor interesse do menor que, segundo

    entendimento dominante no Superior Tribunal de Justia, a mesma pode e deve ser

    alterada a qualquer tempo, buscando-se a integridade dos laos afetivos entre pais e

    filhos.7 4 CAMARGO, Joecy. Guarda e responsabilidade. In WAMBIER, Tereza Arruda Alvim & LEITE, Eduardo de Oliveira (coordenadores). Repertorio de doctrina sobre Directo de Familia: aspectos constitucionais, civis e processuais. Volume 4. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 246. 5 DINIZ, Maria Helena. Dicionrio jurdico. Volume 2. So Paulo: Saraiva, 1998, p. 692. 6 CARCERERI, Pedro Augusto Lemes. Aspectos destacados da guarda de filhos no Brasil. Documento disponvel na internet, atravs do site http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=526, acessado em 21/12/2006, s 03:36 horas. 7 Aos pais, com ampla liberdade de visitao, est dada a oportunidade de promoverem a transferncia da guarda sem maiores transtornos ou prejuzos para o filho, de maneira espontnea, criando laos afetivos, estimulando a convivncia com o irmo natural e mostrando compreenso, tolerncia, conquistando sem ruptura brusca o corao do filho gerado, e, com isso, ampliando os afetos e tornando natural o retorno ao seio da famlia natural (Recurso Especial 2005/0051346-1, da 3 Turma do Superior Tribunal de Justia; Relatora Ministra Carlos Alberto Menezes Direito; julgamento em 15/09/2005. Documento disponvel na internet, por meio do site http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=poder+familiar&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=19, acessado em 06/12/2006, s 13:07 horas).

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  • 16

    Decises nesses moldes vo de encontro ao princpio constitucional do

    melhor interesse do menor, trazido ao ordenamento brasileiro, segundo Suellen da

    Costa Perez, pelo Estatuto da Criana e do Adolescente:

    O Estatuto da Criana e do Adolescente trouxe para o Direito de Famlia uma noo maior a respeito dos direitos dos filhos diante de uma dissoluo da sociedade conjugal. Demonstra, atravs de seus princpios basilares, que, em qualquer situao que diga respeito criana ou ao adolescente, dever ser observado o melhor interesse dos menores, levando-se em considerao a sua peculiar condio de pessoa em desenvolvimento.8

    Esse princpio, abrigado no caput do artigo 227 da Constituio Federal de

    1988, tambm se encontra, segundo Flvio Tartuce, no Cdigo Civil vigente, e em

    documentos internacionais e nas discusses de integrantes do Poder Judicirio:

    Na tica civil, essa proteo integral pode ser percebida pelo princpio do melhor interesse da criana, ou best interest of the child, conforme reconhecido pela Conveno Internacional de Haia, que trata da proteo dos interesses das crianas. O Cdigo Civil de 2002, em dois dispositivos, acaba por reconhecer esse princpio de forma implcita. O primeiro dispositivo o art. 1.583 do Cdigo Civil em vigor, pelo qual, no caso de dissoluo da sociedade ou do vnculo conjugal pela separao judicial por consentimento mtuo ou pelo divrcio direto consensual, ser observado o que os cnjuges acordarem sobrte a guarda dos filhos. Segundo o Enunciado n. 101 do Congresso da Justia Federal, aprovado na I Jornada de Direito Civil, a expresso guarda de filhos constante do dispositivo deve abarcar tanto a guarda unilateral quanto a compartilhada, sempre atendido o melhor interesse da criana.9

    Historicamente, o tratamento guarda de filhos surgiu com o Decreto nmero

    181, de 1890, cujo artigo 90 estabelecia a situao dos filhos quando de eventual

    dissoluo do casamento dos pais, carregando o seguinte contedo:

    Art. 90. A sentena de divrcio mandar entregar os filhos comuns e menores ao cnjuge inocente e fixar a cota com que o culpado dever concorrer para a educao deles, assim como a contribuio do marido para sustentao da mulher, se esta for inocente e pobre.

    8 PEREZ, Suellen da Costa. Guarda compartilhada: sob o enfoque do melhor interesse do menor. Documento disponvel na internet, por meio do site http://www.apase.org.br/81012-soboenfoque.htm, acessado em 29/12/2006, s 23:02 horas. 9 TARTUCE, Flvio. Novos princpios do Direito de Famlia brasileiro. Documento disponvel na internet, por meio do site http://www.flaviotartuce.adv.br/secoes/artigos/Tartuce_princfam.doc, acessado em 29/12/2006, s 19:33 horas.

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  • 17

    Sobrevindo, alguns anos mais tarde, o Cdigo Civil de 1916, tratou-se da

    guarda distintamente nos casos de separao judicial consensual e litigiosa. Sendo

    amigvel a dissoluo da sociedade conjugal, o artigo 325 determinava que os pais

    decidissem a respeito. Em havendo litgio, dever-se-ia observar a existncia de

    culpa de um dos cnjuges na ruptura, bem como a idade e o sexo dos filhos, de

    modo a atender-lhes ao melhor interesse.

    Atualmente, com o advento da Lei nmero 10.406, de 2002, que instituiu o

    Cdigo Civil hoje vigente no pas, deu-se trato questo em captulo especfico, que

    vai do artigo 1.583 ao 1.590.

    No artigo 1.583, dispe-se que, em caso de separao judicial por mtuo

    consentimento ou divrcio direto consensual, ser observado o acordo entre os

    cnjuges quanto guarda dos filhos.

    No dispositivo seguinte, se estabelece que, no havendo acordo quanto

    guarda, esta ser atribuda a quem revelar melhores condies de exerc-la, ainda

    que a pessoa diferente dos pais (pargrafo nico), o que tambm se aplica,

    conforme o artigo 1.585, em sede de medida cautelar de separao de corpos, ou,

    ainda, quando se tratar de invalidade do casamento (artigo 1.587).

    O artigo 1.586 permite ao juiz, havendo motivo grave, estabelecer a guarda

    de modo diverso do anteriormente previsto, enquanto que o artigo 1.588 garante ao

    pai ou me que se casar novamente o direito de manter consigo os filhos.

    E, a seguir, o artigo 1.589 prev o chamado direito de visitas, atravs do qual

    o cnjuge a quem no foi outorgada a guarda dos filhos possa t-los

    temporariamente em sua companhia.

    J, o artigo 1.590 estende as disposies anteriores, a princpio destinadas

    aos filhos menores, aos maiores incapazes, pelo fato de estes ainda manterem certo

    lao de dependncia com os pais.

    Nesse arcabouo jurdico, enxergam-se distintas modalidades de guarda,

    sendo a primeira a guarda comum, tida como aquela verificada na constncia da

    unio entre os pais, convivendo estes com seus filhos diria e diretamente.

    H, tambm, a guarda delegada, em que o Estado, atravs do Juzo da

    Infncia e da Juventude, confere a guarda do menor a outro indivduo que no o pai

    ou a me, para proteger o filho de efeitos negativos advindos de uma convivncia

    direta desequilibrada com os genitores.

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  • 18

    Divide-se, ainda, a guarda em originria, que compete aos pais, e derivada

    (ou desmembrada), quando exercida, por determinao judicial, por terceiro, seja

    pessoa fsica ou organismo vinculado ao aparelho estatal.

    De outro lado, h a guarda provisria, quando se nomeia guardio ao menor

    em situao de separao ou divrcio em curso, ou de impossibilidade temporria

    de exerccio pelos pais; e guarda definitiva, determinada de modo estvel atravs do

    procedimento legal adequado.

    Alguns doutrinadores, como Edgard de Moura Bittencourt, reconhecem como

    modalidade de exerccio da guarda o que denominam guarda de fato:

    aquela que se estabelece por deciso prpria de uma pessoa que toma o menor a seu cargo, sem qualquer atribuio legal (reconhecida aos pais ou tutores) ou judicial, no tendo sobre ele nenhum direito de autoridade, porm todas as obrigaes inerentes guarda desmembrada, como assistncia e educao. Desmembrada, mas no delegada, uma vez que inexiste controle nem avaliao cobre o guardio como sobre o menor. O vnculo jurdico que assim se estabelece, entretanto, s ser desfeito por deciso judicial em benefcio do menor.10

    Entre as espcies de guarda especificamente idealizadas para as situaes

    de pais separados ou divorciados, tem-se como aplicao mais comum a da guarda

    nica, ou exclusiva, em que o pai ou a me, individualmente, mantm o filho menor

    em sua companhia permanente, restando ao outro apenas o direito de visita, a ser

    exercido em dias e horrios determinados.

    O direito de visitas assegurado pelo j mencionado artigo 1.549 do Cdigo

    Civil vigente, nos seguintes termos:

    Art. 1.589. O pai ou a me, em cuja guarda no estejam os filhos, poder visit-los e t-los em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cnjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manuteno e educao.

    Houve, tambm, tentativa, nascida no Direito anglo-saxo, de fazer com que

    a presena de ambos os genitores fosse mais freqente na vida do filho. Denomina-

    se guarda alternada, pela qual o menor residiria ora com o pai, ora com a me, por

    perodos previamente estabelecidos. Daniela Tapajs Gomes conceitua:

    10 BITTENCOURT, Edgard de Moura. Guarda de filhos. 2 edio So Paulo: Livraria Editora Universitria de Direito, 1981, p. 20.

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  • 19

    Na guarda alternada os filhos vivem ora com um genitor e ora com outro, o que no deixa de ser um modelo de guarda nica. Cada um dos genitores exerce o direito de guarda por um determinado perodo de tempo enquanto o outro fica com o direito de visita. Decorrido o lapso temporal, a situao se inverte.11

    Porm, tal modalidade no logrou aplicao significativa no Brasil, por se

    considerar a mudana constante de domiclio prejudicial formao do menor.

    Outras desvantagens dessa guarda so apontadas por Claudete Canezin:

    Nesse modelo, no se exige sequer que o guardio consulte o outro (pai ou me) no-guardio sobre as decises importantes a tomar relativamente ao menor. O no-guardio no pode, nem direta e nem indiretamente, participar da educao dos filhos, nem goza de um direito a ser ouvido pelo seu ex-cnjuge em relao s questes importantes da educao do menor. No h contato contnuo com o no-guardio, o que, conseqentemente, afasta o filho do pai no-guardio.12

    Construiu-se, ento, a idia do aninhamento, ou nidio, em que seriam os

    pais que alterariam periodicamente seu domiclio para o local onde estivesse o

    menor, o que tambm no chegaria a atender as necessidades de desenvolvimento

    dos filhos, por representar instabilidade em sua rotina e em seu ambiente de vida.

    E, foi justamente com base nessa preocupao que se formulou a guarda

    compartilhada, cujo contedo ser explicitado em captulo prprio deste estudo, na

    qual os filhos permanecem em domiclio fixo, contando, porm, com a participao

    de ambos os pais na soluo de todas as questes referentes sua formao

    integral.

    claro que, como em todos os outros modos de guarda, necessrio atentar

    para a idade e sexo dos menores, sua opinio, a existncia de irmos que no se

    deva separar, e o comportamento recproco e social dos pais.

    Contudo, a guarda compartilhada pode ser vantajosa em inmeros casos,

    tendo em vista a permanncia da convivncia familiar e do exerccio completo e

    constante, tanto pelo pai quanto pela me, do poder familiar, a ser tratado no item a

    seguir. 11 GOMES, Daniela de Mendona Tapajs. Guarda compartilhada. Documento disponvel na internet, por meio do site http://www.emerj.rj.gov.br/biblioteca/resenhas/2000/danielam.htm, acessado em 01/01/2007, s 21:38 horas.

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  • 20

    1.2 DO PODER FAMILIAR

    Pode-se afirmar que o poder familiar, tambm denominado ptrio poder, vem

    a ser um conjunto de atribuies conferidas aos pais, com o fim de velar pelo pleno

    desenvolvimento e formao integral dos filhos menores. Rmulo Coelho conceitua:

    O ptrio poder o conjunto de direitos e obrigaes conferidos

    aos pais, no tocante pessoa e bens dos filhos menores. Seu exerccio policiado pelo Estado, que pode intervir em

    favor do menor. Suas disposies so de ordem pblica, de execuo obrigatria. O titular da relao est sujeito s sanes pelo seu no exerccio, que irrenuncivel, uma vez que considerado um mnus pblico.13

    As atribuies do titular do poder familiar, portanto, envolvem tanto a pessoa

    do filho quanto seus bens. A face patrimonial vista com amplitude pelo Superior

    Tribunal de Justia, que defere, inclusive, o acesso da me a valores de

    indenizaes depositados em favor do menor.14

    De fato, a preocupao quanto titularidade e exerccio do poder familiar

    voltada exclusivamente ao interesse dos filhos, como salienta Fabola Albuquerque:

    O poder familiar compete aos pais conjuntamente na constncia do casamento ou da unio estvel, diz respeito a um poder-dever, a um mnus pblico incumbido aos pais, porm seu exerccio no interesse dos filhos. Esta correlao entre poder familiar e realizao do interesse do filho materializa a reciprocidade de interesses inerentes a uma relao entre pais e filhos.15

    Em se considerando as origens do Direito brasileiro, calcadas em Roma, v-

    se que nem sempre foi assim, pois, quele tempo, o poder parental dirigia-se

    exclusivamente ao exerccio da autoridade, mesmo que arbitrria, da figura paterna: 12 CANEZIN, Claudete Carvalho. Da guarda compartilhada em oposio guarda unilateral. In Revista Brasileira de Direito de Famlia, v. 6, n. 28, fevereiro a maro de 2005. Porto Alegre: Sntese/IBDFAM, 2005, p. 15. 13 COELHO, Rmulo. Direito de Famlia. 2 edio So Paulo: Livraria Editora Universitria de Direito, 1992, p. 208. 14 Os valores destinados aos irmos menores da vtima de acidente fatal, depositados em cadernetas de poupana, podem ser livremente movimentados pela me, porque no exerccio do poder familiar e da administrao dos bens dos filhos. Precedentes. Recurso especial conhecido e provido (Recurso Especial 2005/0029198-0, da 3 Turma do Superior Tribunal de Justia; Relatora Ministra Nancy Andrighi; julgamento em 17/08/2006. Documento disponvel na internet, por meio do site http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=poder+familiar&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=8, acessado em 06/01/2007, s 13:01 horas).

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  • 21

    Nesses primrdios, o pai no era apenas o homem forte que protegia os seus e que tinha tambm a autoridade de fazer-se obedecer: o pai era, alm disso, o sacerdote, o herdeiro do lar, o continuador dos ancestrais, o tronco dos descendentes, o depositrio dos ritos misteriosos do culto e das frmulas secretas da orao. Toda religio residia no Pai.16

    Todos os membros da famlia deviam to-somente submisso ao pai,

    conforme nos ensina Maria Cristina Cereser Pezzella:

    O vnculo de parentesco que unia a famlia romana era baseado na submisso de todos os membros de cada famlia autoridade do pater familias. Este vnculo transmitia-se apenas pelo parentesco havido pela linha masculina, excluda a linha feminina.17

    No Direito Civil ptrio, tinha-se, inicialmente, tendncia manuteno desse

    status absoluto do pai de famlia. Observa-se, no artigo 233 do Cdigo Civil de 1916,

    a disposio de que o marido o chefe da sociedade conjugal, funo que exerce

    com a colaborao da mulher, no interesse comum do casal e dos filhos.

    Apesar da mentalidade jurdica centralizada no espectro paterno, tem-se

    entendido que, mesmo sob a vigncia daquele diploma legal, no se poderia falar

    em alterao do poder familiar em relao a um dos pais, pelo simples fato de

    haver-se separado o casal. Essa interpretao esposada por Cludio de Cicco:

    Tambm poderia o casamento ser dissolvido pelo desquite. Nem assim se extinguiria o ptrio poder, que continuaria com os pais, em conjunto, independente de quem fique com a guarda dos filhos, tendo o outro cnjuge os seus direitos sempre garantidos, tal como nas situaes de desquite ou separao de corpos.18

    Em alguns pases, ainda recentemente to presente o carter individual do

    poder familiar, atribudo a apenas um dos genitores, que se poderia renunciar a tal

    poder. Leciona Alicia Prez Duarte19:

    15 ALBUQUERQUE. Fabola Santos. As perspectivas e o exerccio da guarda compartilhada consensual e litigiosa. In Revista Brasileira de Direito de Famlia, v. 7, n. 31, agosto / setembro de 2005. Porto Alegre: Sntese / IBDFAM, 2005, p. 19. 16 COULANGES, Fustel de. A cidade antiga. Traduo de Jonas Camargo Leite e eduardo Fonseca. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004, pp. 92-93. 17 PEZZELLA, Maria Cristina Cereser. Propriedade privada no Direito Romano. Porto Alegre: Srgio Antnio Fabris Editor, 1998. 18 CICCO, Cludio de. Direito: tradio e modernidade. 2 edio So Paulo: cone, 2005, p. 155. 19 DUARTE, Alicia Prez. Derecho de Familia. Mxico: Fondo de Cultura Econmica, 1994, pp. 237-238.

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  • 22

    Tambin encontramos que en algunas entidades la madre si puede renunciar al ejerccio de la patria potestad cuando contrae segundas nupcias. En estas ocasiones se seala que quien renuncie a su ejerccio no lo recobrar, salvo la madre, que podr hacerlo si se disuelve el matrimonio que provoco su accin.20

    Todavia, promulgada a Constituio da Repblica Federativa do Brasil, em

    cinco de outubro de 1988, mudou-se radicalmente esse paradigma, ao se

    determinar, atravs dos artigos 5, inciso I, e 226, 5, a plena e irrestrita igualdade

    de homem e mulher em seus direitos e obrigaes, inclusive familiares.

    Segundo o artigo 229 da mesma Constituio, os pais tm o dever de

    assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores tm o dever de ajudar a

    amparar os pais na velhice, carncia ou enfermidade. Ou seja, ambos tm profunda

    responsabilidade no que tange ao exerccio de sua condio diante dos filhos.

    J, pelo artigo 55 do E. C. A., os pais ou responsvel tm a obrigao de

    matricular seus filhos ou pupilos da rede regular de ensino.

    Dessa forma, o ideal jurdico trazido pela Carta Magna representou real

    evoluo no ordenamento jurdico nacional, no que tange ao poder familiar,

    considerado instrumento para que os filhos possam alcanar sua felicidade e

    realizao pessoal. Ressalta Patrcia Pimentel de Oliveira Ramos:

    A evoluo do direito de famlia, com a consagrao dos princpios previstos na Constituio Federal, transformou o casamento, e a famlia em geral, no mbito legislativo, em instrumento de felicidade e promoo da dignidade de cada um de seus membros, fulcrada no respeito e na realizao pessoal destes, o que se denomina eudemonismo. Assim, o reconhecimento deste direito felicidade individual, o princpio da dignidade humana, e a afirmao dos direitos fundamentais do infante, desguam no princpio da afetividade, que vem orientando a interpretao dos mltiplos aspectos da regulamentao jurdica da vida familiar.21

    Tanto que, nos termos da parte inicial do artigo 1.631 do Cdigo civil vigente,

    afirma-se que durante o casamento e a unio estvel, compete o poder familiar aos

    pais, sem se fazer qualquer distino entre ambos.

    20 Tambm encontramos que em algumas entidades a me pode renunciar ao exerccio do ptrio poder quando contrai segundas npcias. Nessas ocasies, se assinala que quem renunciar ao seu exerccio no o recobrar, salvo a me, que poder faz-lo se dissolver-se o matrimnio que provocou sua ao. 21 RAMOS, Patrcia Pimentel de Oliveira Chambers. O poder familiar e a guarda compartilhada sob o enfoque dos novos paradigmas do Direito de Famlia. Rio de Janeiro: Lmen Juris, 2005, p. 16.

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  • 23

    Tal a preocupao com o cumprimento dos deveres que os pais tm para

    com os filhos, que nem mesmo o divrcio ou a nova unio de qualquer um daqueles

    pode afetar esses deveres. Estabelece o artigo 1.579:

    Art. 1.579. O divrcio no modificar os direitos e deveres dos pais em relao aos filhos. Pargrafo nico. Novo casamento de qualquer dos pais, ou de ambos, no poder importar restries aos direitos e deveres previstos neste artigo.

    O artigo 1.632, por sua vez, traz determinao semelhante, excepcionando

    apenas a possibilidade de, atravs da j citada guarda exclusiva, um dos pais ter o

    filho em sua companhia:

    Art. 1.632. A separao judicial, o divrcio e a dissoluo da unio estvel no alteram as relaes entre pais e filhos seno quanto ao direito, que aos primeiros cabe, de terem em sua companhia os segundos.

    Em torno do texto legal apresentado, Jeanete Scorsim traz interpretao clara

    e concisa, de grande utilidade sua inteira compreenso:

    O exerccio do poder familiar no se altera com a separao ou divrcio, ambos os genitores enfeixam toda a gama de direitos e deveres referentes educao dos filhos menores. Todavia, uma das dificuldades ps-ruptura a atuao, em sincronia, dos pais em relao s responsabilidades jurdicas inerentes a esse encargo.22

    Ana Paula Corra Patio associa o exerccio comum do poder familiar, aps a

    separao, prpria igualdade de condies dos cnjuges em relao aos filhos:

    Compete aos pais, em igualdade de condies, o exerccio do poder familiar (CC, art. 1.634, e ECA, art. 21), irrelevante sejam eles casados, separados, divorciados, solteiros ou companheiros.23

    Eis uma razo inicial para que se busque, entre pais separados, um modo de

    harmonizar as relaes atinentes ao exerccio do poder parental.

    22 SCORSIM, Jeanete. Guarda compartilhada: um efetivo exerccio da autoridade parental. Documento disponvel na internet, atravs do site http://www.apase.org.br/81014-umefetivo.htm, acessado em 30/12/2006, s 20:22 horas. 23 PATIO, Ana Paula Corra. Direito Civil: direitos de famlia. So Paulo: Atlas, 2006, p. 125.

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  • 24

    No Direito argentino, Mauricio Lus Mizrahi24 ressalta entendimento doutrinrio

    dominante no sentido de que podem os pais convencionar o exerccio conjunto do

    poder familiar aps a separao ou divrcio:

    De todas formas corresponde destacar nuevos avances sobre la materia; por ejemplo, el predomnio de la doctrina que afirma que el princpio general de nuestra ley es el ejerccio compartido de la ptria potestad, de tal modo que puede ser convenido por los padres em situaciones de divorcio o separacin.25

    A preocupao com a proteo ao correto exerccio do poder familiar

    corrente em diversos pases, onde pode ser encontrado sob a denominao de

    ptrio poder. Na Repblica Argentina, observa Jlio Lpez del Carril26:

    El Estado no hace ms que dar juridicidad a lo que existe biolgica, psquica, moral y socialmente, dictando reglas que conducen al logro de los fines del instituto, que consisten fundamentalmente na la proteccin de los hijos y em el mantenimiento de la jerarqua paterna.27

    Importa, ento, destacar quais so os deveres fundamentais que compem o

    poder familiar, o que se faz expondo o contedo integral do artigo 1.634 do Cdigo

    Civil, que trata diretamente do tema:

    Art. 1.634. Compete aos pais, quanto pessoa dos filhos menores: I Dirigir-lhes a criao e educao; II T-los em sua companhia e guarda; III Conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem; IV Nomear-lhes tutor por testamento ou documento autntico, se o outro dos pais no lhe sobreviver, ou o sobrevivo no puder exercer o poder familiar; V Represent-los, at aos dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, aps essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; VI Reclam-los de quem ilegalmente os detenha;

    24 MIZRAHI, Mauricio Lus. Familia, matrimonio y divorcio. 1 reimpresin Buenos Aires: Astrea, 2001, p. 426. 25 De toda forma, cumpre destacar novos avanos sobre a matria; por exemplo, o predomnio da doutrina que afirma que o princpio geral de nossa lei o exerccio compartilhado do ptrio poder, de tal modo que pode ser convencionado pelos pais em situaes de divrcio ou separao (traduo do autor). 26 CARRIL, Jlio J. Lpez del. Derecho de Familia. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2002, p. 332. 27 O Estado no faz mais que dar juridicidade ao que existe biolgica, psquica, moral e socialmente, ditando regras que conduzem realizao dos fins do instituto, que consistem fundamentalmente na proteo dos filhos e na manuteno da hierarquia paterna (traduo do autor).

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  • 25

    VII Exigir que lhes prestem obedincia, respeito e os servios prprios de sua idade e condio.

    Compreende-se, assim, a amplitude do poder familiar, no sentido de fornecer

    no s todas as condies materiais indispensveis ao desenvolvimento fsico do

    menor, mas, igualmente, a ateno a suas necessidades psicolgicas, sociais,

    emocionais, afetivas e ticas. Acerca dessa amplitude de contedo, discorre, com

    propriedade, Maria Alice Zaratin Lolufo:

    Criar um filho muito mais que t-lo em sua companhia. Significa no lhe dar somente o sustento, como tambm assistncia mdica, escolaridade, carinho e proteo. E, ainda, ensinar-lhe os valores essenciais da existncia, preparando-o para ser cidado, uma pessoa participante da comunidade onde vive, solidria para com o prximo, ciente de como deve exercer seus direitos e cumprir as suas obrigaes, capaz de, no futuro, prover o prprio sustento. Logicamente que isso deve se dar em conformidade com os padres scio-econmicos e, tambm, culturais de cada famlia.28

    Logo, procura-se, com o exerccio equilibrado do poder familiar, promover os

    filhos como seres humanos integrais, respeitando-se, em primeiro lugar, sua

    dignidade. De acordo com Silvana Maria Carbonera:

    O mais significativo efeito da metamorfose jurdica no que tange famlia foi sentido com prioritria tutela da proteo dignidade da pessoa, base comum de onde derivam todos os demais princpios que informam um ou outro ponto do Direito de Famlia.29

    Nesse sentido, a guarda compartilhada se apresenta como via sustentvel a

    atender tal objetivo, pois conserva o exerccio do poder familiar com ambos os

    genitores. o que defende Sylvia Mendona do Amaral:

    Com o objetivo de um desenvolvimento mais saudvel dos filhos surgiu a guarda compartilhada onde os pais obrigam-se a exercer o poder familiar sobre a criana, dividindo da maneira mais igualitria possvel os direitos e deveres para com as crianas.30

    28 LOLUFO, Maria Alice Zaratin. Curso avanado de Direito Civil. Volume 5: Direito de Famlia. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 256. 29 CARBONERA, Silvana Maria. Guarda de filhos na famlia constitucionalizada. Porto Alegre: Srgio Antnio Fabris Editor, 2000, p. 38.

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  • 26

    De fato, mesmo em outras naes se tem compreendido a guarda

    compartilhada como meio de se manter intacto o exerccio do poder familiar, como

    um dos direitos relacionados ao melhor interesse dos filhos menores. Na Espanha,

    conclui Joseph Goldstein31:

    La ley supone, y debe suponer, que los nios son titulares del derecho a ser cuidados conjuntamente por sus padres. Com efecto, es generalmente em el interes superior del nino que sus padres tienen la custodia conjunta no importa que ellos hayan o no estado casados alguna vez.32

    Relacionada a guarda compartilhada ao poder familiar, pretende-se, agora,

    tecer algumas breves consideraes sobre os alimentos nesse tipo de guarda.

    1.3 DA PENSO ALIMENTCIA

    Outra figura jurdica de compreenso vital para o tratamento da guarda

    compartilhada a da penso alimentcia, ou simplesmente do que seja o dever que

    o pai ou a me que no detenha a guarda do filho menor tem de prestar-lhe

    alimentos. Marino Elgio Gonalves apresenta conceito satisfatrio:

    Assim, por alimentos deve ser entendido tudo aquilo que capaz de propiciar ao sujeito as condies necessrias sua sobrevivncia, respeitados os seus padres sociais.33

    Quanto sua natureza jurdica, pode-se dizer que o direito aos alimentos de

    natureza patrimonial, j que sua realizao se d em termos pecunirios, mas que

    se trata de direito personalssimo, uma vez que protegido por normas

    consideradas de ordem pblica, e se destina intransmissivelmente ao titular.

    30 AMARAL, Sylvia Mendona do. Guarda compartilhada: casal deve assumir compromisso no processo judicial. Documento disponvel na internet, atravs do site http://conjur.estadao.com.br/static/text/35415,1, acessado em 30/12/2006, s 22:34 horas. 31 GOLDSTEIN, Joseph I. En el interes superior de quin? In BELOFF, Mary (compiladora). Derecho, infancia y familia. Barcelona: Gedisa, 2000, p. 115. 32 A lei supe, e deve supor, que os filhos so titulares do direito a serem cuidados conjuntamente por seus pais. Com efeito, geralmente no interesse superior dos filhos que seus pais tm a guarda conjunta no importa que eles tenham ou no estado casados alguma vez (traduo do autor). 33 GONALVES, Marino Elgio. Alimentos entre parentes: uma reflexo aos arts. 396, 397 e 398 do Cdigo Civil brasileiro. Documento disponvel na internet, atravs do site http://www.advogado.adv.br/artigos/2000/art15.htm, acessado em 31/12/2006, s 02:46 horas.

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  • 27

    Quanto sua abrangncia, os alimentos no se restringem s necessidades

    fsicas dos filhos com alimentao, higiene e vestimenta. Slvio Rodrigues manifesta-

    se sobre essa abrangncia no ordenamento civil brasileiro vigente na atualidade:

    J o legislador de 2002 expresso quanto abrangncia da prestao, indicando incluir as necessidades com educao, alm daquelas destinadas a preservar a subsistncia de modo compatvel com a condio social do alimentado.34

    O tema tratado, legalmente, pelos artigos 1.694 a 1.710 do Cdigo Civil

    brasileiro, institudo pela Lei nmero 10.406/2002.

    O artigo 1.694 estabelece o direito a alimentos entre parentes, cnjuges ou

    companheiros, ditando, como critrios para a fixao de seu valor, as necessidades

    de quem os ir receber e as possibilidades financeiras de quem seja obrigado a

    prest-los.

    Pelo apresentado, de fcil entendimento que os alimentos, segundo os

    parmetros do artigo 1.694, sejam devidos aos filhos, em caso de separao judicial

    ou divrcio, por aquele genitor que no os tenha em sua companhia constante, pois,

    se os tivesse, efetuaria diretamente os gastos referentes sua manuteno.

    Vale lembrar que, conforme posicionamento recente do Superior Tribunal de

    Justia, nem mesmo a maioridade do filho extingue automaticamente o dever dos

    pais aos alimentos, sendo necessrio que se demonstre, alm de ter atingido a

    idade legalmente determinada, o alimentado tenha deixado efetivamente de

    necessitar da colaborao do genitor.35

    Contudo, abrange-se a exclusivamente a hiptese do que se conceituou

    anteriormente como guarda unilateral, restando questionar se, na guarda

    compartilhada, em que as despesas do menor so, a princpio, divididas por ambos

    os pais na medida em que vo sendo feitas.

    34 RODRIGUES, Slvio. Direito Civil. Volume 6: Direito de Famlia. 28 edio So Paulo: Saraiva, 2004, p. 375. 35 HABEAS CORPUS. PRISO CIVIL. ALIMENTOS. A jurisprudncia do Superior Tribunal de Justia consolidou-se no sentido de que a maioridade dos filhos no acarreta a exonerao automtica da obrigao de prestar alimentos. Ordem denegada (HABEAS CORPUS 2006/0037123-0, da 3 Turma do Superior Tribunal de Justia; Relator Ministro Ari Pargendler; julgamento em 10/10/2006. Documento disponvel na internet, atravs do site http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=alimentos&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=7, acessado em 06/01/2007, s 13:14 horas).

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  • 28

    Para se responder a esta questo, deve-se considerar, primariamente, o

    contedo do artigo 1.701 da Lei nmero 10.406/2002, redigido nos termos que se

    seguem:

    Art. 1.701. A pessoa obrigada a suprir alimentos poder pensionar o alimentando, ou dar-lhe hospedagem e sustento, sem prejuzo do dever de prestar o necessrio sua educao, quando menor. Pargrafo nico. Compete ao juiz, se as circunstncias o exigirem, fixar a forma do cumprimento da prestao.

    A doutrina ressalta, por outro lado, a mais absoluta igualdade entre os pais no

    momento de determinar os parmetros da prestao alimentar aos filhos, devendo-

    se obedincia exclusivamente aos critrios da possibilidade de quem oferece a

    penso e a necessidade de quem a recebe.

    Luiz Felipe Brasil Santos, relacionando a igualdade de condies dos pais

    nos alimentos quela mencionada anteriormente, referente ao exerccio do poder

    familiar, explica:

    a consagrao do princpio da igualdade entre os cnjuges, que impe iguais deveres em relao prole. Sinale-se que a obrigao dos genitores embora de igual intensidade sempre proporcional aos ganhos de cada um. E nem poderia ser diferente, uma vez que os alimentos, em qualquer hiptese, devem obedecer, em sua quantificao, ao binmio possibilidade-necessidade, cujo equilbrio se busca pelo princpio da proporcionalidade.36

    Tendo-se em considerao, alm da mencionada igualdade dos cnjuges,

    bem como a liberdade de ambos, na separao, de decidir acerca do destino da

    prole, entende-se que, na guarda compartilhada, a opo pela fixao de penso

    alimentcia ou pelo simples rateio de custos, tanto quanto o valor de eventual

    penso, deve ser decidida por acordo entre os pais.

    A possibilidade de acordo entre os cnjuges, quando da separao judicial ou

    divrcio, em torno dos recursos materiais necessrios manuteno dos filhos

    menores tem sido reconhecida pela jurisprudncia do Superior Tribunal de Justia,

    36 SANTOS, Luiz Felipe Brasil. Novos aspectos da obrigao alimentar. In DELGADO, Mrio Luiz & ALVES, Jones Figueiredo. Questes controvertidas no novo Cdigo Civil. So Paulo: Mtodo, 2006, p. 226.

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  • 29

    que impe como condio apenas que a respectiva manifestao de vontade de

    ambos seja real e livre de vcios.37

    Com efeito, o pai, na medida em que tem assumido, no mundo atual, uma

    postura mais ativa em relao vida do filho como um todo, e no s sua

    mantena financeira, deve enfrentar os termos desse acordo como um reflexo desse

    seu novo papel familiar, ao contrrio de apenas aguardar da legislao uma

    definio a respeito. Assinala Cristina de Oliveira Zamberlan:

    O pai sempre necessitou de uma definio legal, aps a separao conjugal, sobre penso alimentcia, visitas. Agora ele vai busc-la, no porque lhe imposto, mas porque ele est em transformao e nessa transformao h que ser legitimada uma nova paternidade, uma nova condio ser pai.38

    Apenas quando, adotada a guarda compartilhada, permanecer a dvida no

    que tange aos alimentos, deve haver interveno do magistrado, fixando o padro

    que melhor atenda s necessidades do menor e s obrigaes e possibilidades de

    cada genitor.

    37 PROCESSO CIVIL. AO DE ALIMENTOS. HOMOLOGAO DE ACORDO. Proferindo sentena, o juiz esgota seu ofcio, no podendo reconsider-la ou desentranh-la dos autos, ainda que advertido de que uma das partes j havia falecido na data do julgado; peculiaridades do caso que, todavia, recomendavam o reconhecimento da ineficcia da sentena de homologao. Recurso especial no conhecido (Recurso Especial 2005/0085274-8, da 3 Turma do Superior Tribunal de Justia; Relator Ministro Ari Pargendler; julgamento em 28/06/2006. Documento disponvel na internet, atravs do site http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=alimentos+acordo&data=%40DTDE+%3E%3D+20060101+e+%40DTDE+%3C%3D+20061231&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1, acessado em 06/01/2007, s 13:19 horas). 38 ZAMBERLAN, Cristina de Oliveira. Os novos paradigmas da famlia contempornea: uma perspectiva interdisciplinar.So Paulo: Renovar, 2001, p. 139.

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  • 30

    2. FUNDAMENTOS JURDICOS DA GUARDA COMPARTILHADA

    2.1 CONCEITO E LINHAS GERAIS DA GUARDA COMPARTILHADA

    Antes de tudo, para se tratar da viabilidade jurdica da guarda compartilhada,

    deve-se conceitu-la em termos jurdicos, o que se faz considerando a exposio de

    Luiz Felipe Lyrio Peres:

    Portanto, podemos chegar a concluso que o melhor conceito para a guarda compartilhada o de uma situao jurdica onde ambos os pais, aps uma separao judicial, um divrcio ou uma dissoluo de unio estvel, conservam mutuamente sobre seus filhos o direito da guarda jurdica e da guarda fsica, tendo como obrigao domiciliarem prximos, possurem mesmos valores e determinarem que o arranjo de alternncia de lares no seja longo, para no quebrarem a continuidade das relaes paternais.39

    Conceito to claro e consistente quanto o apresentado acima o que

    trazem tona Edivane Paixo e Fernanda Oltramari:

    Guarda compartilhada a modalidade de guarda onde os filhos de pais separados permanecem sob responsabilidade de ambos os genitores, que tm a possibilidade de, em conjunto, tomar decises importantes quanto ao seu bem-estar, educao e criao. a forma de exerccio que busca se assemelhar relao existente entre pais e filhos antes da dissoluo do vnculo conjugal, pois privilegia a continuidade do exerccio comum da autoridade parental.40

    Diante dessa noo, atente-se ao fato de que a guarda visualizada sob tais

    condies justifica-se, primeiramente, pelo simples fato de que a separao judicial

    ou divrcio dos pais no exonera qualquer deles das obrigaes que tm para com

    os filhos. Diz o clebre jurisconsulto lusitano Antunes Varela:

    O divrcio no pe termo ao direito-dever dos pais relativamente criao e educao de cada um dos filhos menores, mas obriga a regular esse direito em novos moldes, visto desaparecer o centro (domiclio conjugal) onde os cnjuges, como progenitores, exerciam simultaneamente e harmoniosamente o poder parental.41

    39 PERES, Luiz Felipe Lyrio. Guarda Compartilhada. Documento disponvel na internet, por meio do site http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3533, acessado em 01/07/2005, s 19:43 horas. 40 PAIXO, Edivane & OLTRAMARI, Fernanda. Guarda Compartilhada de filhos. In Revista Brasileira de Direito de Famlia, ano VII, n. 32, outubro a novembro de 2005. Porto Alegre: Sntese / IBDFAM, 2005, pp. 53. 41 VARELA, Antunes. Direito da Famlia. 1 volume. 5 edio Lisboa: Livraria Petrony, 1999, p. 525.

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  • 31

    Tambm o doutrinador argentino Augusto Csar Belluscio42 expressa posio

    semelhante, ao se manifestar nos termos abaixo:

    Em todos los casos, la atribuicin de la tenencia o guarda lleva aparejado el ejercicio de la ptria potestad por aquel de los progenitores a quien le es conferida (art. 264, prr. segundo, incs. 2 y 5, Cd. Civil), sin que ello excluya la obligacin del otro de educar al hijo (art. 271, Cd. Civil).43

    Prosseguindo, percebe-se que a modalidade de guarda em questo surgiu e

    ganhou relevncia nos E. U. A., como decorrncia da prtica intensiva da mediao

    na seara familiar, por meio da qual um terceiro imparcial auxilia os cnjuges a definir

    todos os termos da separao em comum acordo. Nesse sistema, um dos aspectos

    mais importantes a serem determinados , obviamente, a guarda dos filhos,

    atendendo, do melhor modo possvel, aos interesses destes.

    Sobre a viabilidade da escolha da guarda compartilhada no curso de

    procedimento de separao ou divrcio em que se utilize a mediao familiar,

    dissertam John M. Haynes e Marilene Marodin:

    A guarda conjunta no est prevista em nossa legislao, mas tambm no h vedao. Logo, existindo consenso entre os pais e sendo favorvel aos interesses do menor, poder ser ajustada a guarda compartilhada. Embora ela seja uma modalidade pouco utilizada nos acordos judiciais de separao ou divrcio feitos no Brasil, a verdade que sua aplicao prtica est cada vez mais difundida. Nada impede que os pais, alm da custdia conjunta, tambm convencionem onde ser a residncia primria dos filhos, independentemente de compartilharem o cuidado do menor e as decises sobre sua educao. O mediador poder discutir com os pais a possibilidade de adotarem esta filosofia em relao parentalidade.44

    E, Srgio Eduardo Nick, ao estudar a primazia dos Estados Unidos da

    Amrica na prtica efetiva da guarda compartilhada, afirma que a maior parte dos

    Estados conta com legislao especfica, em alguns casos estabelecendo-a como

    alternativa preferencial. 42 BELLUSCIO, Augusto Csar. Manual de Derecho de Famlia. Tomo 2. 7 edicin Buenos Aires: Editorial Astrea, 2002, p. 367. 43 Em todos os casos, a atribuio da tutela ou guarda implica no exerccio do ptrio poder por aquele dos genitores a quem conferida (art. 264, pargrafo segundo, incs. 2 e 5, Cd. Civil), sem que isto exclua a obrigao do outro de educar o filho (art. 271, Cd. Civil). Traduo do autor.

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  • 32

    Naquele pas, ainda segundo Nick, os pais em vias de separao recebem

    amplas informaes acerca da opo pela guarda compartilhada. Essas informaes

    vo desde a escolha do advogado at o que a legislao de cada Estado prev

    sobre o assunto, passando pela formao de grupos de auto-ajuda, para

    esclarecimento e auxlio quanto ao funcionamento prtico dessa espcie de guarda.

    Enfim, na exposio do autor mencionado, atribui-se o crescimento das

    concesses de guarda compartilhada nos Estados Unidos da Amrica, entre outros

    traos, nova posio de homens e mulheres frente s funes familiares,

    caracterstica marcante na atual formatao da sociedade daquele pas:

    Outro fator a contribuir para esta escolha foram as mudanas no papel de gnero para os homens e mulheres, onde o intercmbio de atitudes masculinas e femininas entre os dois sexos propiciou a que ambos - homem e mulher - assumissem tarefas que outrora sequer imaginavam.45

    Maria Antonieta Pisano Motta, por sua vez, compara as realidades brasileira e

    estadunidense para analisar a viabilidade da guarda compartilhada no Brasil.

    Conclui que, no Brasil, as vantagens seriam menores, pois, ao contrrio da

    realidade aliengena, em nosso pas dificilmente os pais separados passam a viver

    em cidades ou Estados distintos, e seria apenas no caso de grandes distncias

    geogrficas entre os genitores que a guarda compartilhada seria necessria

    manuteno dos vnculos afetivos entre pais e filhos. Mas, a jurista faz sua ressalva:

    Evidentemente, todos os fatores intervenientes devem ser considerados para que o interesse da criana continue sendo a meta a ser alcanada, sopesando-se em quais circunstncias especficas aquela criana ser mais bem atendida em suas demandas fsicas e emocionais.46

    De igual interesse o tratamento dado guarda, em geral, pelo Direito

    muulmano. Embora o pai tenha o dever de sustento material e educacional dos

    filhos, a me quem resguarda o direito e a responsabilidade afetiva sobre os 44 HAYNES, John M. & MARODIN, Marilene. Fundamentos da mediao familiar. Traduo de Eni Assumpo e Fabrizio Almeida Marodin. Porto Alegre: Artes Mdicas, 1996, p. 105. 45 NICK, Srgio Eduardo. Guarda compartilhada: um novo enfoque no cuidado aos filhos de pais separados ou divorciados. Documento disponvel na internet, por meio do site http://www.apase.org.br/81001-umnovoenfoque.htm, acessado em 10/07/2005, s 11:33 horas.

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  • 33

    menores, detendo com exclusividade o direito de mant-los em sua companhia,

    mesmo aps eventual separao.

    Teresa Estevez Brasa47, jurista argentina que estudou o Direito islmico,

    identificou um direito exclusivo da me, correspondente tambm a uma obrigao, e

    que exposto pela autora da seguinte forma:

    La voz hizanah significa custodia, uma custodia amplia que comprende los actos de proteger al nino, de acunarlo, de tenerlo em brazos, incluso de alimentarlo; si bien la lactancia compone para la madre otra obligacin especial que a la vez es un derecho, ya que la madre puede reclamar en forma exclusiva el privilegio de alimentar a su hijo, aun cuando el padre hubiera contratado uma nodriza a tales efectos.48

    J, Karen Ribeiro Pacheco Nioac de Salles indica que o primeiro

    ordenamento de filiao romano-germnica a positivar, ainda que um pouco

    timidamente, a guarda compartilhada foi o de Portugal. Vejam-se suas

    consideraes sobre a regulao do tema naquele pas:

    No sistema portugus, apenas existia a codificao do regime da guarda nica. Com o advento da Lei n 84, de 31 de agosto de 1995, foi alterada parte do artigo 1906 do Cdigo Civil Portugus, cujo n 2 estabelece que os pais podem acordar sobre o exerccio em comum do poder parental, decidindo as questes relativas prole em condies idnticas s que vigoravam na constncia do matrimnio. Assim, Portugal introduziu em sua legislao um breve conceito de guarda compartilhada, que possibilita a informao da existncia de tal instituto por todos.49

    No Brasil, Dbora Brando expe algumas vantagens da opo por esse

    regime, entre as quais a no confrontao do menor com a necessidade de escolher

    um dos pais (o que geraria desgaste); igualdade de participao dos genitores na

    guarda, sustento e educao da prole; menos sentimentos negativos do pai pela

    46 MOTTA, Maria Antonieta Pisano. Guarda compartilhada: novas solues para novos tempos. In CATTANI, Aloysio Rafael et alli. Direito de Famlia e Cincias Humanas Caderno de Estudos n 3. So Paulo: Jurdica Brasileira, 2000, p. 85. 47 BRASA, Teresa M. Estevez. Derecho Civil Musulmn. Buenos Aires: Depalma, 1981, p. 482. 48 A expresso hizanah significa custdia, uma custdia ampla que compreende os atos de proteger o filho, de abrig-lo, de t-lo nos braos, inclusive de aliment-lo; alis a amamentao compe para a me outra obrigao especial que tambm um direito, j que a me pode reclamar de modo exclusivo o privilgio de alimentar seu filho, ainda quando o pai tenha contratado uma criada para tais efeitos (traduo do autor). 49 SALLES, Karen Ribeiro Pacheco Nioac de. Guarda Compartilhada. 2 edio Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 95.

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  • 34

    distncia fsica do filho; menor sobrecarga da me na responsabilidade pela guarda

    dois filhos. Alm disso, a guarda conjunta teria o seguinte mrito:

    Aumenta o respeito mtuo entre os genitores, apesar da separao ou divrcio, porque tero de conviver harmonicamente para tomar as decises acerca da vida dos filhos; desta maneira a criana ou adolescente deixa de ser a tradicional moeda usada nos joguetes apelativos que circundam as decises sobre o valor da penso alimentcia e outras questes patrimoniais.50

    Waldyr Grisard Filho51 se posiciona de modo bastante semelhante, mediante

    sntese que pode ser representada graficamente da seguinte maneira:

    Guarda Compartilhada

    VANTAGENS DESVANTAGENS

    PARA OS PAIS

    Ambos se mantm na guarda; Qualificao nas aptides; Equiparao dos pais quanto ao tempo livre para organizar suas vidas; Compartilhamento dos gastos com a manuteno dos filhos; Maior cooperao.

    Maiores custos (moradias apropriadas); Obrigatoriedade de permanncia na mesma cidade); Constante adaptao; Necessidade de um emprego flexvel.

    PARA OS FILHOS

    Convivncia igualitria; Incluso no novo grupo familiar de cada um dos pais; Maior comunicao; Menos problemas de lealdade; Modelo de relao parental.

    Adaptao a duas moradias; Problemas prticos ou logsticos.

    Apesar das manifestas vantagens desse regime de guarda, indicadas acima,

    o ordenamento jurdico, desde que se positivou o Direito de Famlia no pas, jamais

    possuiu previso expressa da guarda compartilhada.

    Entretanto, sua aplicabilidade no mbito do ordenamento jurdico brasileiro j

    vem sendo estudada h dcadas, antes mesmo de se cogitar do advento do Cdigo

    Civil hoje vigente no pas. o que se passa a demonstrar, a partir do item a seguir.

    50 BRANDO, Dbora. Guarda compartilhada: s depende de ns. Documento disponvel na internet, por meio do site http://www.mundojuridico.adv.br/html/artigos/documentos/texto436.htm, acessado em 02/12/2004, s 19:30 horas. 51 Cf. GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, pp. 172 e 177.

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  • 35

    2.2 GUARDA COMPARTILHADA NO DIREITO ANTERIOR AO ATUAL CDIGO

    CIVIL BRASILEIRO

    Durante mais de oito dcadas, teve vigncia, em nosso pas, o Cdigo Civil

    de 1916, elaborado pelo eminente jurista Clvis Bevilacqua. Apesar de se tratar de

    um diploma legal frente da mentalidade do perodo em que surgiu, no foi capaz

    de prever uma srie de institutos que, atualmente, so considerados importantes

    para o Direito nacional.

    E, uma das lacunas apontadas pela doutrina, sob a gide do Cdigo

    revogado, era, justamente, a ausncia de previso expressa acerca da guarda

    compartilhada:

    No Brasil no existe previso legal, ou seja, o Cdigo Civil no descreve o conceito, no entanto, no probe a prtica que pode ser acordada pelo casal ou por uma deciso judicial.52

    O que no impedia, de modo algum, que se cogitasse de sua aplicao.

    Tanto que se encontra na doutrina jurdica nacional, sob a vigncia daquele diploma

    legal, o reconhecimento da necessidade de se manter, mesmo diante de separao

    litigiosa do casal, a convivncia tanto do marido quanto da esposa com a prole.

    Pondera Joo Andrades Carvalho:

    No na relao linear de um progenitor com o outro que repousa a questo da guarda ou, mais explicitamente, o direito guarda. Esse direito nasce com a criana, pessoal, sua fora reside na necessidade inadivel de proteo, e exercitvel contra ambos os pais.53

    No se tratava, j desde ento, apenas de um direito dos filhos, mas tambm

    de um dever dos pais, que, segundo j se mencionou, so responsveis, em sua

    prpria condio, pela vida e pelo desenvolvimento dos filhos menores. O clebre

    civilista Orlando Gomes discorre:

    52 SANTOS, Magda Raquel Guimares Ferreira dos & ADUA, Maria de Betnia Lacerda Ferreira. Guarda compartilhada: o compartilhamento da presena dos filhos por pais separados. Documento disponvel na internet, por meio do site http://www.clubedobebe.com.br/Palavra%20dos%20Especialistas/df-12-03.htm, acessado em 30/11/2004, s 10:11 horas. 53 CARVALHO, Joo Andrades. Tutela, curatela, guarda, visita e ptrio poder. Rio de Janeiro: AIDE, 1995, p. 155.

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  • 36

    Quanto criao dos filhos, o desquite no exonera qualquer dos genitores desse indeclinvel dever. Desfeito, porm, o lar, a obrigao de criar a prole se modifica na forma do seu cumprimento.54

    De outro lado, a viabilidade do suprimento da ausncia de previso legal

    especfica, ainda sob a gide do Cdigo de Clvis Bevilacqua, foi acatada pela

    jurisprudncia, como no caso do Tribunal de Justia do Estado de Mato Grosso.55

    J, no Tribunal de Justia de Santa Catarina, a guarda compartilhada chegou

    a ser rejeitada, tambm na vigncia do Cdigo Civil de 1916, no porque lhe fosse

    contrria, e nem mesmo por ausncia de previso legal, mas to somente por

    crerem os julgadores que a medida no seria benfica criana.56

    Os Tribunais brasileiros j vinham, portanto, discutindo os possveis

    benefcios ou malefcios da guarda compartilhada, mesmo margem de previso

    legal especfica ou de uma reforma mais profunda na codificao civil. Tomavam em

    conta as circunstncias familiares de cada caso.

    54 GOMES, Orlando. Direito de Famlia. Rio de Janeiro: Forense, 1968, p. 202. 55 Ementa: AO DE REVISO DE ALIMENTOS OBSERVNCIA DO BINMIO NECESSIDADE E POSSIBILIDADE INTELIGNCIA DO ARTIGO 400 DO CDIGO CIVIL FIXAO EM PATAMAR ELEVADO IMPOSSIBILIDADE GUARDA COMPARTILHADA INVIABILIDADE PROCEDNCIA PARCIAL RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE PENSO MINORADA DECISO UNNIME. Os alimentos devem ser fixados em estrita observncia ao binmio necessidade do alimentando e capacidade do alimentante, de modo a garantir a mantena dos filhos, todavia, sem onerar demasiadamente somente um dos genitores, quando os dois auferem renda. A fixao da guarda na forma compartilhada, de modo a conviverem os filhos um ano com cada genitor, no a forma mais indicada, pois certamente causaria instabilidade psicolgica aos menores, que despenderiam grande esforo emocional para se readaptarem todos os anos em um novo lar (Apelao Cvel nmero 27.421, da 3 Cmara Cvel do Tribunal de Justia do Estado de Mato Grosso; Relator Desembargador Jos Jurandir de Lima; julgamento em 28/08/2002. Documento disponvel na internet, por meio do site http://www.tj.mt.gov.br/Jurisprudencia2/Resultado.aspx, acessado em 03/04/2006, s 20:22 horas). 56 AGRAVO DE INSTRUMENTO AO DE ALTERAO DE GUARDA C/C PEDIDO DE BUSCA E APREENSO FILHA MENOR (2 ANOS DE IDADE) CONCESSO PARCIAL DA LIMINAR PARA DETERMINAR A GUARDA ALTERNADA IMPOSSIBILIDADE DE DEFERIMENTO ACUSAES FEITAS ME INFUNDADAS E CARENTES DE TODO E QUALQUER SUBSTRATO PROBATRIO INTERESSE DA CRIANA DEVE SOBREPOR-SE A QUALQUER OUTRO RECURSO PROVIDO. A guarda de filha menor com apenas dois anos de idade deve ser concedida preferencialmente me, a quem a natureza melhor dotou de condies para os cuidados de que necessita a prole, se nada emerge dos autos em desabono sua conduta. Destaque-se que a guarda compartilhada no aconselhvel na hiptese, haja vista que esta constante alternncia de ambiente familiar gerar para criana certa instabilidade emocional e psquica, prejudicando seu normal desenvolvimento (Agravo de Instrumento nmero 2002.013071-6, da 2 Cmara Cvel do Tribunal de Justia de Santa Catarina; Relator: Desembargador Mazoni Ferreira; julgamento em 28/11/2002. Documento disponvel na internet, por meio do site http://tjsc6.tj.sc.gov.br/jurisprudencia/VerIntegra.do?p_id=AAAG5%2FAATAAAADVAAF&p_query=guarda+compartilhada&corH=FF0000, acessado em 02/05/2006, s 21:12 horas).

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    http://www.verypdf.com/http://www.tj.mt.gov.br/Jurisprudencia2/Resultado.aspxhttp://tjsc6.tj.sc.gov.br/jurisprudencia/VerIntegra.do?p_id=AAAG5%2FAATAAAADVAAF&p_query=gu

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    Desse modo, considerando, no caso concreto de uma separao judicial,

    divrcio ou dissoluo de unio estvel, perfeitamente possvel ao juzo deferir a

    guarda compartilhada.

    Mesmo porque, o prprio autor do Cdigo Civil previa, em obra de doutrina,

    que se deveria respeitar, quanto guarda dos filhos, o que acordassem os cnjuges

    em processo de separao judicial consensual:

    Quanto aos filhos, se o desquite for amigvel, concordaro os cnjuges sobre a sua criao e educao, acordo que, uma vez homologado pelo juiz, tem fora de lei.57

    Contudo, Guilherme Strenger assevera que necessrio que o magistrado

    tome em considerao o paralelismo das vocaes parentais envolvidas,

    determinando um dos pais para ter o filho em sua companhia e residncia habitual,

    estabelecendo, assim, o domiclio principal do menor. E, justifica sua ponderao:

    A estabilidade que o direito deseja para o filho no exclui que sua vida cotidiana seja vinculada a um ponto fixo, mas todas as frmulas de guarda alternada ficam dissipadas, e mesmo assim no se pode descartar o problema da reserva de visita e fiscalizao. evidente, porm, que o direito de visita contm o direito de moradia, as modalidades de exerccio desses direitos e mais amplamente a participao ao exerccio da guarda, deixando-se para a concertao dos pais a soluo em nome do postulado, de um mnimo de harmonia que se credita a essa modalidade.58

    No aparente vazio legislativo, a fundamentao que se poderia encontrar a

    respeito a que indica a guarida do instituto na Constituio Federal de 1988, como

    o faz Maurcio Lougon:

    Podemos tomar como ponto de partida o fato de que a Constituio Brasileira de 1988 garanta o direito de convivncia familiar e comunitria, como transparece especificamente no artigo 92 do Estatuto da Criana e do Adolescente, que enfatiza a necessidade de preservao dos vnculos familiares, assim como evitar sempre que possvel a transferncia para outras entidades de crianas e adolescentes abrigados. Ainda o artigo 93 preceitua que o abrigo de crianas e adolescentes em estabelecimentos pblicos ou privados apenas dever ocorrer em carter excepcional e de urgncia,

    57 BEVILACQUA, Clvis. Direito de Famlia. Rio de Janeiro: Editora Rio, 1976, p. 294. 58 STRENGER, Guilherme Gonalves. Guarda de filhos. So Paulo: LTr, 1998, p. 71.

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    caracterizando assim que tais situaes devem ter carter transitrio e nunca permanente.59

    Em sede do texto constitucional, tem-se, em primeiro lugar, a absoluta

    igualdade entre homens e mulheres, inclusive no que tange a suas obrigaes entre

    si e quanto aos filhos. Belmiro Pedro Welter destaca essa caracterstica da

    Constituio vigente:

    Com o advento da Carta Magna, no existe mais um critrio de preferncia entre o homem e a mulher, acerca da guarda dos filhos, pois cada um deles ostenta o mesmo direito, em vista da canonizao da igualdade e do princpio da prevalncia dos interesses da prole.60

    Na doutrina estrangeira, mormente latino-americana, essa igualdade vista

    como de grande importncia, e tida como um fato inquestionvel no Direito atual.

    Observa o argentino Marcos Crdoba61:

    Ya no hay uma supremaca del marido en la legislacin; la mujer comparte derechos y oblicaciones por igual con el esposo. La autoridad de los padres cumple las funciones de proteccin y formacin integral de los hijos menores de edad. La potestad de los padres se concibe em funcin Del beneficio de los hijos. Se atiende fundamentalmente al respeto y dignidad de la mujer y los hijos.62

    A guarda compartilhada encontra, ainda, respaldo jurdico no artigo 226 da

    Carta Magna, que ostenta o seguinte texto:

    Art. 226. A famlia, base da sociedade, tem especial proteo do Estado. (...) 5 Os direitos e deveres referentes sociedade conjugal so exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. (...)

    59 LOUGON, Maurcio. A sade mental e o direito convivncia familiar em face do melhor interesse. In PEREIRA, Tnia da Silva (coordenao). O melhor interesse da criana: um debate interdisciplinar. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, pp. 433. 60 WELTER, Belmiro P