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O DIREITO À EDUCAÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO ARGENTINO E BRASILEIRO Nelson Joaquim* SUMÁRIO: 1. Considerações Iniciais. 2. Fontes Internacionais Relacionadas com a Educação. 3. Direito de Ensinar e de Aprender. 4. Responsabilidade dos Estabelecimentos Educacionais. 5. Reforma Universitária – Lei de Educação Superior. 6. Considerações Finais. 7. Referências Bibliográficas. 1. Considerações Iniciais O direito à educação como proteção da vida humana não tem fronteira, pois é anterior a qualquer norma, lei ou instituto positivo, até porque os ordenamentos jurídicos de qualquer sociedade não fazem outra coisa senão reconhecê-lo. Certamente esta foi uma das razões da escolha do tema “O Direito a Educação no Ordenamento Jurídico Argentino e Brasileiro”. Nesse sentido, trata-se de um trabalho acadêmico contextualizado, que não tem a pretensão de aprofundamento nas questões educacionais, mas retratar uma experiência de intercâmbio cultural, bem como identifica as diferenças e semelhanças entre os dois ordenamentos jurídicos em relação ao direito à educação. E aqui, temos dificuldades de comparar, pois nos falta conhecimento mais profundo do sistema jurídico e da cultura Argentina. Apesar do breve contato com a comunidade acadêmica da Faculdade de Direito de Buenos Aires, fomos motivados a escrever sobre

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O DIREITO À EDUCAÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO

ARGENTINO E BRASILEIRO

Nelson Joaquim*

SUMÁRIO: 1. Considerações Iniciais. 2. Fontes Internacionais Relacionadas

com a Educação. 3. Direito de Ensinar e de Aprender. 4. Responsabilidade

dos Estabelecimentos Educacionais. 5. Reforma Universitária – Lei de

Educação Superior. 6. Considerações Finais. 7. Referências Bibliográficas.

1. Considerações Iniciais

O direito à educação como proteção da vida humana não tem fronteira, pois é

anterior a qualquer norma, lei ou instituto positivo, até porque os ordenamentos jurídicos

de qualquer sociedade não fazem outra coisa senão reconhecê-lo. Certamente esta foi

uma das razões da escolha do tema “O Direito a Educação no Ordenamento Jurídico

Argentino e Brasileiro”. Nesse sentido, trata-se de um trabalho acadêmico

contextualizado, que não tem a pretensão de aprofundamento nas questões educacionais,

mas retratar uma experiência de intercâmbio cultural, bem como identifica as diferenças e

semelhanças entre os dois ordenamentos jurídicos em relação ao direito à educação. E

aqui, temos dificuldades de comparar, pois nos falta conhecimento mais profundo do

sistema jurídico e da cultura Argentina. Apesar do breve contato com a comunidade

acadêmica da Faculdade de Direito de Buenos Aires, fomos motivados a escrever sobre

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um tema pouco explorado pela ciência jurídica, mas muito atual e de interesse da

comunidade acadêmica e da sociedade.

No primeiro momento, vamos apresentar breve comentário sobre as fontes

internacionais relacionadas com a educação, destacando a concepção do direito à

educação como um direito humano e a importância dos tratados e convenções

internacionais no contexto da educação; no segundo momento, direito de ensinar e de

aprender, sendo o item mais extenso deste trabalho devido a sua identificação com o

direito à educação, oportunidade para perceber a relação entre o direito e a educação, bem

como de utilizar o direito comparado como instrumento de comparações legislativas; no

terceiro momento, vamos tratar de um tema atual e que tem ocupado destaque no cenário

jurídico, que diz respeito à responsabilidade civil dos estabelecimentos de ensino; e

finalmente vamos apresentar proposta do decano Atílio Aníbal Alterini da Faculdade de

Direito da Universidade de Buenos Aires, para uma nova Lei de Educação Superior e

comentar a recente iniciativa do governo brasileiro, quando apresentou um. anteprojeto de

Reforma. Universitária.

2. Fontes Internacionais Relacionadas com a Educação

O direito à educação no plano internacional tem sido constantemente lembrado nas

declarações, tratados, convenções, cartas de princípios, compromissos, protocolos,

acordos, que buscam a internacionalização do direito à educação. Este tem como

paradigma a Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada em Resolução da III

Sessão Ordinária da Assembléia Geral das Nações Unidas, em 1948. No direito argentino,

como nos esclarece REGINA MUNIZ, os tratados de direitos humanos, que regulam a

educação e que foram constitucionalizados, têm o seu texto extraído da: a) Declaración

Americana de los Derechos y Deberes de Hombre; b) Declaración Universal de Derechos

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Humanos; c) Pacto Internacional de Dedechos Econômicos, Sociales y Culturales, em que

os Estados assumem o compromisso com a educação; d) Pacto Internacional de Derechos

Civiles y Políticos; e) Convención Internacional sobre la Eliminacion de todas lãs Formas

de Discriminación Racial; f) Convención Americana sobre Derechos Humanos (Pacto de

San José de Costa Rica); g) Convención sobre la Eliminación de todas lãs Formas de

Discriminación contra la Mujer; h) Convención contra la Torturo y otros Tratos o Penas

Crueles, Inhumanos o Degradantes; i) Convención sobre los Derechos Del Nino.

Assim, os tratados de direitos humanos constitucionalizados pelo art. 75, inc. 22

regulam os aspectos relacionados com a instrução e o ensino, como nos ensina o jurista

argentino Nestor Pedro Sagués, na sua obra “Elementos de Derecho Constitucional”

(2003: p. 525). Pode ocorrer, no entanto, contradições entre a Constituição e certos

tratados. Neste caso, para alguns autores argentinos se aplica o Tratado, mas para outros

se aplica a Constituição, considerando que estes tratados são complementares dela, porque

não pode modificar a sua parte dogmática (Constituição Nacional – Comentada: p. 71).

Vale dizer, também, a importância das reformas constitucionais de 1994 neste tema,

embora se mantendo as divergências do ponto de vista teórico. É oportuno mencionar o

seguinte comentário:

“Hace uma distinción: lê da a los Tratados, Convenciones y Concordatos sobre derechos humanos aprobados y ratificados (y a aquellos que se incorporen em el futuro), jerarquía constitucional (art. 75 inc. 22)”.

No caso brasileiro, a Constituição não incorporou textualmente os tratados e

convenções internacionais, como o faz a Constituição Argentina. Todavia, para o jurista

brasileiro Dalmo de Abreu Dallari, a educação é essencial para o desenvolvimento da

pessoa humana e dos povos. O reconhecimento dessa importância fundamental está

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refletido no Pacto dos Direitos Econômicos, Sociais e Cultural, a que o Brasil aderiu,

assumindo compromisso internacional de natureza jurídica. É importante assinalar que

educação, nesse documento, não se limita ao nível básico, mas inclui também o nível

superior, dispondo expressamente o Pacto, no artigo 13: “a educação de nível superior

deverá igualmente tornar-se acessível a todos, com base na capacidade de cada um, por

todos os meios apropriados e, principalmente, pela implementação progressiva do ensino

gratuito”. Infelizmente, segundo o autor, a política educacional adotada nas últimas

décadas caminhou no sentido oposto ao da gratuidade do ensino superior. Contudo, hoje,

defende-se a idéia de que o direito à educação deve ser concebido como um direito

humano. E aqui, a nosso ver, temos duas iniciativas importantes para a educação

brasileira: em primeiro lugar, a reforma do judiciário, através da Emenda Constitucional

nº 45, de 31 de dezembro de 2004, trouxe uma grande contribuição para o direito à

educação no nosso país, quando textualmente reconheceu a importância dos direitos

humanos. Cabe, também, transcrever o § 3º do art. 5º da Constituição Federal:

“Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”.

Em segundo lugar, a Lei nº 11.096, de 13 de janeiro de 2005, que instituiu o Programa

Universidade para todos – PROUNI – que consiste num conjunto de medidas que

associam o setor-público e o privado, concedendo a estes benefícios fiscais, desde que

ofereça uma contrapartida de interesse social, consistente no oferecimento de bolsas de

estudo integrais ou parciais. E aqui, temos a influências dos tratados internacionais de

direitos humanos na legislação brasileira.

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Enfim, em que pese às diferenças nos sistemas jurídicos, objeto das nossas

reflexões, as fontes internacionais ou os tratados de direitos humanos exercem um papel

fundamental para o direito à educação.

3. Direito de Ensinar e de Aprender

Desde logo é importante esclarecer, em primeiro lugar, que os direitos de ensinar e

aprender recebem status Constitucional no direito Argentino, basta examinar os artigos 14

c/c 75, inc. 18 da Constituição Nacional Argentina. Estes artigos são tão importantes para

o direito à educação, como o art. 205 c/c 206 da Constituição Brasileira. Em segundo

lugar, encontramos no ordenamento jurídico Argentino duas Leis Federais como marcos

normativos do direito à educação. A Lei Federal de Educação 24.195, que no nosso

ordenamento jurídico seria a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9.394/96) e a Lei

de Educação Superior 24.521, regulamentada pelo decreto 173/96, mas atualmente objeto

de discussão para estabelecer as bases para uma nova Lei de Educação Superior,

conforme “Boletin Informativo de la Faculdade de Derecho de la Universidad de Buenos

Aires, nº 71 de 14 de julho de 2005”.

No que diz respeito à Lei Federal de Educação – Lei 24195, que explicitamente

regulamenta o direito constitucional de ensinar e aprender (art. 1º), programa o “sistema

educativo nacional”, em cinco níveis: a) educações iniciais, constituídas pelo jardim de

infância, para crianças de três a cinco anos de idade, sendo obrigatório o último ano; b)

educações gerais básica, obrigatórias, de nove anos de duração a partir dos seis anos de

idade, organizada em ciclos; c) educação média, posterior a básica, e de três anos de

duração; d) educação superior, a caro de instituições universitárias e de grau universitário;

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e) a educação de pós-graduação, encontradas nas universidades e instituições acadêmicas

(art. 10 e seguintes) (Nestor Pedro Sagüés, 2003: pgs). 213 a 218).

Uma abordagem específica e esclarecedora sobre “direito de ensinar e de

aprender” no ordenamento jurídico Argentino, certamente encontramos na obra

“Elementos de Derecho Constitucuional”, no Capítulo XXIX, ( págs. 513 a 534). Aqui,

para o jurista Nestor Pedro Sagüés o art. 14 da Constituição Nacional representa o

paradigma normativo deste tema, quando dispõe:

Derechos civiles.- “Todos los habtantes de la Nación gozan de los siguientes derechos conforme a lãs leyes que reglamenten su ejercicio; a saber; (...) de enseñar y aprender”.

No caso brasileiro, o direito à educação, como um direito subjetivo público, é um

direito social fundamental (art. 6º c/c 205 CF) e de segunda geração, pois a garantia desse

direito começou no âmbito do direito público e na Constituição de 1934. Nesse sentido,

no que diz respeito o direito à educação, o constitucionalista brasileiro José Afonso da

Silva diz o seguinte:

“O art. 205 contém uma declaração fundamental que, combinada com art. 6º, eleva a educação

ao nível dos direitos fundamentais do homem. Aí se afirma que a educação é direito de todos, com

o que esse direito é informado pelo princípio da universidade. Realça-lhe o valor jurídico, por um

lado, a clausula – a educação é dever do Estado e da família -, constante do mesmo artigo, que

completa a situação jurídica subjetiva, ao explicitar o titular do dever, da obrigação, contraposto

àquele direito. Vale dizer: todos têm o direito à educação e o Estado tem o dever de prestá-la,

assim como a família.” (2003: p. 311).

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O direito Argentino, por sua vez, considerar a prestação do serviço educacional

como direito público de ensinar e aprender, (Arts. 5º , 75, inc. 2 –CNA) ), porém inclui o

mesmo direito como “derechos civiles” (art.14 - CNA)

Um segmento da doutrina brasileira, já reconhece o direito à educação com

características dos direitos da personalidade, fazendo parte dos direitos inatos – direito à

vida - dotado de proteção civil, embora não deixando de ser um direito social fundamental

e de interesse público, como sustentam Eduardo Bittar na sua obra Direito e Ensino

Jurídico (2001: p.158) ; Limongi França in RT 567/9; Regina Muniz no excelente

trabalho “ O Direito à Educação”: pp. 136 à 161 e Rosilene Martins no seu livro “Direito

à Educação” : pp. 57 a 94. A propósito, segundo esta autora, “dizer que a educação é um

direito da personalidade significa dizer que o referido direito está intimamente ligado à

personalidade do homem”. (2004: 74). Compactuamos com os referidos autores, até

porque o direito à educação é um direito privado subjetivo absoluto e, ao mesmo tempo,

direito público subjetivo fundamental, como já sustentamos em outros trabalhos.

Nestor Sagüés, jurista argentino, já mencionado, identifica e relaciona os direitos

de ensinar e de aprender na sua obra da seguinte forma: a) Derecho a ensenar: libertad de

enseñanza; derechos de los docentes; libertad de cátedra; estabilidad de los docentes. b)

Derecho de aprender: ingreso; medidas disciplinarias y expulsiones de estudiantes;

derecho al diploma (Elementos de derecho constitucional, 2003: pgs. 514 a 525). Como

se observa, o art. 14 da Constituição Argentina confere “a todos os habitantes da Nação o

gozo do direito de ensinar e aprender”, semelhante ao que encontramos no art. 206, II, da

Constituição Federal Brasileira, quando dispõe: “o ensino será ministrado com base nos

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seguintes princípios: I. II. Liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o

pensamento, a arte e o saber”. Vale dizer, em relação o direito de ensinar na legislação

Argentina, que os estrangeiros possuem o mesmo direitos civis dos cidadãos argentino,

como dispõe os artigos 20 e 25 da Constituição Argentina:

“Extrangeiros. Derechos. Naturalización.- Los extranjeros gozan em el território de la nación de todos los los derechos civiles Del cidadano...”(art.20). “Política inmigratoria..-El gobierno federal fomientará la inmigración eurpea: y no podrá restringir, limitar ni gravar com impuesto alguno la entrada em el território Argentino de los extranjeros que traigan por objeto labrar la tierra, mejorar lãs industrias, e introducir y enseñar lãs ciências y lãs artes”.

O direito de ensinar envolve em primeiro lugar de criar ou fundar instituto de

estudo de qualquer nível. Esta é uma liberdade de ensinar, que implica na possibilidade de

funcionamento das escolas privadas, paralelamente ao Estado, que está obrigado a

garantir a todos o acesso ao ensino, através de escolas públicas. Para Nestor Sagués, “não

seria constitucional o monopólio estatal em algum setor da educação Argentina, sem

prejuízo do direito de o Estado controlar o ensino privado, tanto em seu conteúdo como

em seu desenvolvimento e qualidade, em função do seu poder de regulamentação do art.

14 e dos planos de estudos que deve disciplinar, segundo o art. 75, inciso 19”.

. A liberdade do ensino, também, está presente no ordenamento jurídico brasileiro,

art. 209 c/c 206, III da Constituição Federal. A propósito, a coexistência de instituições

públicas e privadas de ensino é garantida pela nossa Constituição Federal: “o ensino é

livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições: I – cumprimento das normas

gerais da educação nacional; II – autorização e avaliação de qualidade pelo Poder

Público (art. 209 da CF); “o ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

(...) III – pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições

públicas e privadas de ensino” (art. 206 da CF).

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No regime constitucional argentino, o Estado tem a obrigação constitucional de

subsidiar as escolas privadas autorizadas (...) Neste caso, com subsídios no pagamento

dos salários dos docentes dos estabelecimentos educativos privados, autorizados por

aquele”, segundo Miguel Angel (Tratado de derecho constitucional: p. 677).

Para REGINA MUNIZ, entre nós, embora não haja previsão legal para o subsídio

do setor educacional privado, excetuado o disciplinado no art. 213 da Constituição

Federal, que abre as portas do apoio financeiro público às entidades comunitárias,

confessionais e filantrópicas, bem como às atividades universitárias de pesquisa extensão,

não incluídas, obviamente, as atividades normais por ela (universidades particulares)

desenvolvidas, não se pode, certamente, afirmar que o ensino privado não seja subsidiado,

dado que o art. 150, VI, alínea c, da Constituição Federal disciplina que, ”sem prejuízo de

outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito

Federal e aos Municípios instituir impostos sobre o patrimônio, renda e serviços das

instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os

requisitos da lei”. Tal mandamento constitucional, segundo a autora, deve ser combinado

com o art. 14 do Código Tributário Nacional.

Devido o aumento da demanda educacional nos estabelecimentos de ensino, bem

como do princípio constitucional de igualdade de condições para o acesso e permanência

na escola (art. 206, I CF), não podemos deixar de destacar, além da Constituição, a

importância da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, Estatuto da Criança e do

Adolescente, Código de Defesa do Consumidor e a Lei das Anuidades Escolares (Lei

9.870/99). Além disso, a sociedade brasileira demorou a perceber que o princípio da

igualdade de todos perante a lei não é suficiente para que o direito à educação seja um

direito de todos, pois não eliminava as desigualdades que foram acumuladas

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principalmente em relação aos afrodescendentes. Hoje as chamadas ações afirmativas na

educação são o centro das discussões nos âmbitos legislativos, acadêmicos e na

comunidade em geral Para Joaquim Barbosa, o Ministro do Supremo Tribunal Federal,

“ações afirmativas podem ser definidas como um conjunto de políticas públicas e

privadas de caráter compulsório, facultativo ou voluntário, concebidas com vistas ao

combate à discriminação racial de gênero e de origem nacional, bem como para corrigir

os efeitos presentes da discriminação praticada no passado, tendo por objetivo a

concretização do ideal de efetividade de acesso a bens fundamentais como a educação e

o emprego”. (2001: p.40). Como ações afirmativas na educação brasileira temos as

experiências da Universidade Nacional de Brasília, Universidade Nacional do Estado da

Bahia, Universidade Estadual do Rio de Janeiro e Universidade do Estado do Norte

Fluminense Darcy Vargas. A lei nº 4. 151/2003, que iniciou uma segunda etapa das ações

afirmativas, reserva em cada curso de graduação: 20% das vagas para estudantes oriundos

da rede pública de ensino; 20% para negros; e 5% para pessoas com deficiência física,

juntamente com integrantes de minorias raciais (www.politicasdacor.net – www.ipp-

uerj.net).

Contudo, é oportuno lembrar, que se podem implementar ações afirmativas sem

utilização de cotas, pois esta é apenas uma modalidade ou forma de ação afirmativa. A

propósito, a ação afirmativa pode ser pública e privada. E aqui, as Instituições de Ensino

Superior da rede privada, também, estão implementando ações afirmativas, como

programas de inclusão social no ensino. Elas oferecem bolsas de estudos parciais para

alunos carentes de recursos e outras iniciativas previstas no Projeto Pedagógico, bem

como nos programas de governo como, por exemplo, o Programa Universidade Para

Todos – PROUNI.

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Cabe outra indagação: O Estado é obrigado a criar e manter estabelecimentos

educativos? Sobre o tema, a Constituição Argentina (art.5º) obriga as províncias a

assegurar a educação primária, bem como análoga obrigação tem o governo federal nas

áreas territoriais que lhe compete (2003: p. 514). Em caso de conflito entre os planos

educativos das províncias e dos nacionais, haverá de prevalecer a primazia deste último,

sempre que existir um razoável interesse federal no caso, como diz o jurista Nestor Pedro

Sagüés.

No Brasil, com o advento da Constituição de 1988 (art. 208) e da Lei de Diretrizes

e Bases da Educação (art. 5º), o acesso ao ensino fundamental obrigatório e gratuito é um

direito público subjetivo. E o não oferecimento ou sua oferta irregular importa

responsabilidade da autoridade competente (art. 208,I § 2º da CF; Art. 54 § 1º e 2º do

ECA). Enquanto em outros níveis, quer seja no direito brasileiro, quer seja no direito

argentino, não há exigência constitucional de ensino obrigatório e gratuito, embora o

Estado programe educação secundária (ensino médio) e universitária (terceiro grau) para

quem não pode pagar os gastos.

Em outras palavras, o princípio da gratuidade do ensino determina que o Estado

nacional, as províncias e a atual Cidade de Buenos Aires obriga-se a garantir a gratuidade

nos serviços educacionais estatais, em todos os níveis e regimes. Da mesma forma, no

caso brasileiro, a constituição estabelece a gratuidade do ensino público federal, estadual e

municipal, também, em todos os níveis, inclusive universitário, conforme dispõe o art.

206, IV da Constituição Federal:

“O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios (...) gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais”.

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Do direito de ensinar, se deduz o direito constitucional de liberdade de cátedra, como se deduz, também, da parte final do art. 14 da Constituição Argentina. Trata-se de um direito em favor dos docentes, mas como qualquer direito cabem limitações razoáveis contidas na lei e na doutrina. Por exemplo, não é absurdo proibir a difusão de ideologia totalitária, tampouco o desrespeito a moral pública (art. 19, CNA), em especial os direitos personalíssimos. Entre nós, a liberdade de ensinar, aprender, pesquisar e divulgar o pensamento, arte e o saber está prevista na Constituição Federal (inc. II do art. 206). E a liberdade de cátedra é entendida como um direito do professor, que poderá livremente exteriorizar seus ensinamentos aos alunos, sem qualquer ingerência administrativa, ressalvada, porém, a possibilidade da fixação do currículo escolar pelo órgão competente (Alexandre de Moraes, 2002: p. 1951).

Agora, cabe investigar: o quê é os direitos de aprender? Estes direitos significam

os direitos à educação? Quais são os direitos de aprender? Como se manifesta e se aplica

o direito constitucional de Aprender? Para Nestor Sagüés, os direitos de aprender são os

direitos de ingresso ou acesso à educação; de continuar estudando e de diploma.

Entendemos que, estes, são direitos semelhantes ao direito à educação. Segundo ele, em

princípio, o direito de aprender significa liberdade de escolher onde se educar. Em

segundo, cabe uma indagação: Existe um direito constitucional à educação gratuita?

Aplica-se o direito de ingresso, se o interessado carece de recursos suficientes para

educação primária, cuja prestação deve ser assegurada pelo Estado (art. 5º da

Constituição Nacional). Enquanto em outros níveis, como já cometamos, não há exigência

Constitucional, embora valioso que o Estado programe a educação em todos os níveis

para quem não pode pagar os gastos com a educação.

Com a reforma constitucional de 1994 o art. 75, inciso 19, introduziu algumas

idéias novas em matéria educacional, dentro das competências do Congresso que explicita

as normas e princípios que regem a educação, a saber: a) consolidação da unidade

nacional com o respeito das particularidades provinciais e locais; b) responsabilidade

indelegável do Estado com a educação; c) participação da família e da sociedade; d)

promoção dos valores democráticos; e) igualdade de oportunidades e possibilidades sem

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discriminação alguma; f) gratuidade e eqüidade na educação pública estatal. E aqui,

segundo Regina Muniz, sobre estes princípios houve um debate prolongado em torno da

compatibilidade dos conceitos de “gratuidade” e “equidade”, idéias que devem se somar,

posto que não são contraditórias: a eqüidade significa que “se impõe ao Estado o dever de

prover os habitantes dos meios suficientes para terem acesso à educação gratuita, com o

fim de alcançar, assim, uma efetiva igualdade de oportunidade, se a gratuidade não é

suficiente para isso. g) Promoção da investigação e desenvolvimento científico e

tecnológico; h) proteção à identidade e pluralidade cultural; i) livre criação e circulação

das obras do autor; j) proteção do patrimônio artístico; k) proteção dos espaços culturais e

audiovisuais; l) competências das províncias”.

No Brasil a Constituição de 1988 contemplou dez artigos (205 a 214), que

abordam de forma ampla os assuntos educacionais. Destacam-se, no entanto, os princípios

inovadores em matéria educacional (V. artigos 206 a 208, incisos e parágrafos). Aliás, o

direito à matricula representa o primeiro dos princípios do artigo 206, inciso I da

Constituição brasileira: “igualdade de condições para o acesso e permanência na

escola”.

Em relação à inscrição ou matrícula nos estabelecimentos educacionais argentino

podem ocorrer impedimentos? Em princípio os impedimentos são inconstitucionais, até

porque o direito à educação significa, também, direito à matrícula como direito

constitucional fundamental do interessado. A Corte Suprema de Justicia de la Nación,

cujo presidente atual é o doutor Eugênio Zaffaroni, Juiz da Corte - na oportunidade

chegamos a entrevistá-lo – “tem dito que certos impedimentos são inconstitucionais

como, por exemplo, a decisão da Universidade de Buenos Aires que proibiu a matrícula

de alunos pelo fato de ter sido expulso de outras universidades. Aqui, segundo a Corte

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Suprema, não podia aplicar o impedimento de maneira automática, sem considerar as

causas que motivaram tal expulsão, porque isto importaria uma inabilidade perpétua, ou

seja, permanente para receber instrução de um órgão oficial, o que seria violação do

direito constitucional de aprender”.

Contudo, uma situação especial ocorre quanto ao acesso a institutos privados.

Certas correntes sustentam que o direito de ensinar, não cria a relação de obrigação para

atender o direito de aprender, que é absoluto em relação às escolas públicas. Porém, a

postura mais moderada argumenta que a liberdade de aprender deve ser assegurada em

condições razoáveis de ingresso e negando o acesso apenas para aqueles que não reunirem

as condições previstas na lei. Vale dizer, segundo esse entendimento, que o direito de

admissão e o direito de permanência não podem ser negados arbitrariamente. A propósito,

no caso brasileiro, o legislador estabeleceu o princípio da igualdade para o acesso e, ao

mesmo tempo, para permanência na escola (art.206, I).

A Lei 24.195 – Lei Federal da Educação, no caso Argentino, estabelece direitos e

deveres tanto para os educandos, como para os pais. Por um lado, os alunos devem ser

respeitados em sua liberdade de consciência, convicções religiosas, morais e políticas; a

prova de avaliação tem que responder a critérios científicos e fundamentos; e por própria

determinação os alunos podem fundar associações, centros ou clubes, para funcionar nas

unidades educativas. Igualmente tem o direito a receber educação em quantidade e

qualidade suficiente e, orientações vocacional, acadêmica e profissional-ocupacional

(art.43) Por outro lado, os pais contam com o direito de escolher para seus filhos a

instrução educacional cujo ideal corresponda as suas convicções éticas, filosóficas e

religiosas. Além disso, ele deve ser informado sobre a evolução dos estudos de seus filhos

(art.44). No caso, brasileiro, “os pais ou responsáveis têm a obrigação de matricular seus

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filhos ou pupilos na rede regular de ensino” (art. 55 do ECA – Lei 8.069/90), e o art. 6º da

LDB (Lei 9.394/96) confere aos pais ou ao responsável o dever da matrícula das crianças,

adolescentes e jovens, até 18 anos, a partir dos 6 anos de idade, no ensino fundamental.

No que diz respeito ao direito a diploma, significa dizer que é uma conseqüência

do direito constitucional de matricula e de aprender. É reconhecido o direito de obter o

diploma, desde que o interessado satisfaça, também, as exigências acadêmicas e

administrativas correspondentes. O estrangeiro, por sua vez, gozam na Argentina desses

mesmos direitos, ou seja, de receber um título universitário, em igualdade de condições

com os argentinos (art.20 CNA).

4. Responsabilidade dos Estabelecimentos Educacionais

A responsabilidade civil tem ocupado destaque no cenário jurídico brasileiro,

devido às profundas modificações de concepção de dano moral e material.. Da mesma

forma, a responsabilidade dos estabelecimentos educacionais. Estes celebram contratos

de prestação serviço educacional, mas devido ao aumento da demanda educacional no

contexto das instituições de ensino particular, aumentaram as demandas judiciais.

No caso do direito argentino, embora com predominância do ensino público, a

responsabilidade dos estabelecimentos educacionais privados e, ao mesmo tempo, estatais

está prevista textualmente no Código Civil de La República Argentina, com nova redação

que lhe deu a Lei Federal de Educação 24.830, que é o marco normativo da educação no

ordenamento jurídico argentino. Nesse sentido, estabelece o art. 1117 da legislação civil

que:

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“Os proprietários de estabelecimentos educacionais privados e estatais serão responsáveis pelos danos causados ou sofridos por seus alunos menores quando se acharem sob o controle da autoridade educativa, salvo se provarem o caso fortuito. Os estabelecimentos educativos deverão contratar um seguro de responsabilidade civil. A tais efeitos, as autoridades jurisdicionais devem tomar as medidas para o cumprimento da obrigação precedente. A presente norma não se aplicará aos estabelecimentos de nível terciário ou universitário”.

Além disso, a responsabilidade dos estabelecimentos de ensino tem por fundamento o dever de vigilância, que foi transferido pelos pais ou pelos responsáveis dos menores aos estabelecimentos de ensino, privado ou público, que só podem elidi-la provando caso fortuito, o que configura, assim, segundo o que dispõe o art. 1117 do Código Civil Argentino, embora nenhuma referência faz à culpa.

Entre nós, a responsabilidade dos estabelecimentos de ensino esta prevista no artigo 932,

IV, e 933 do Código Civil, e pode ser dividida em: a) responsabilidade do estabelecimento de

ensino em relação à terceiro por atos de seus educandos; b) e responsabilidade do educandário em

relação aos seus alunos. E aqui, a responsabilidade que tem por fundamento o dever de vigilância

transferido pelos pais ou responsáveis dos menores ao estabelecimento de ensino, incide tanto

para os danos causados pelos alunos a outros alunos ou a terceiros, como pelos próprios

funcionários ou professores da instituição de ensino. Da mesma forma, o art. 14 do Código de

Defesa do Consumidor estabeleceu a responsabilidade objetiva direta para todos os fornecedores

de serviços em relação aos danos causados aos seus hospedes, educandos etc. Se não bastasse,

esclarece Sergio Cavalieri Filho, “o parágrafo único do art. 927 do Código Civil também

estabeleceu responsabilidade objetiva direta para todos os que desenvolvem atividades de risco,

isto é prestam serviços”. (2005: p. 217). Vale lembrar, também, que a presunção de

responsabilidade fundada na culpa “in vigilando” não alcança o professor universitário, porque

ele não tem o dever de vigilância sobre os estudantes, até porque por serem maiores

Para Carlos Roberto Gonçalves, em síntese, esclarece que, no caso dos educadores, não

há incompatibilidade entre o que dispõe o Código de Defesa do Consumidor a respeito dos

prestadores de serviço em geral e o novo Código Civil, pois ambos acolheram as

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responsabilidades objetivas, independentes de culpa. No Programa de Responsabilidade Civil,

obra consagrada pela comunidade jurídica, Sergio Cavalieri Filho ressalta que a jurisprudência do

Superior Tribunal de Justiça também se vem firmando no sentido de enquadrar no Código do

Consumidor a responsabilidade dos hotéis, educandários e outros estabelecimentos fornecedores

de serviços pelos danos causados aos seus hóspedes ou educandos. (2005: p. 218/219) Serve de

exemplo, prossegue o autor, um caso concreto:

“Alunos de um colégio que danificaram o elevador do edifício onde funcionava o estabelecimento de ensino. Na ação de indenização movida pelo condomínio contra o colégio, o Supremo Tribunal Federal entendeu que o réu faltou com a necessária vigilância, indiferente à indisciplina dos alunos no interior do edifício, pelo quê o condenou a reparar os danos, assegurando-lhe, todavia, o direito de ação regressiva contra os responsáveis pelos menores e contra os alunos maiores que participaram dos fatos determinantes dos danos (RJTJSP 25/611)”.

Por fim, quer seja no direito argentino ou no direito brasileiro, a responsabilidade civil

dos estabelecimentos de ensino ocupa um lugar de destaque na legislação, doutrina e

jurisprudência, contribuindo, assim, para o direito à educação e a sistematização do Direito

Educacional, como novo ramo da ciência jurídica.

4. Reforma Universitária – Lei de Educação Superior

O direito à educação superior é o tema do momento para a comunidade acadêmica da

Faculdade de Direito da Universidade de Buenos Aires, até porque a comunidade não está

satisfeita com a atual Lei da Educação Superior 24.521, como tivemos oportunidade de constatar

no Curso de Investigação Jurídica que participamos na Argentina. Da mesma forma, Além do

PROUNI que é de conhecimento de todos, chegando ao Brasil tomamos conhecimento que a

versão definitiva do anteprojeto de Reforma Universitária foi entregue pelo ministro da Educação

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ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Aqui no Brasil, salvo o Decreto 3.274, de 9 de julho de

2001 (Dispõe sobre a organização do ensino superior e avaliação de cursos e instituições), a

rigor, não existe uma Lei de Educação Superior propriamente dita, que represente as aspirações

da comunidade educacional e da sociedade. E sim, decretos, diferentes legislações esparsas que

regulam a educação superior, com aquiescência do poder legislativo, mas submetidas a muitas

críticas, pela ausência de debates e discussões na sociedade.

No caso da Argentina, as razões são outras, ou seja, de ordem constitucional e do Pacto de

Direitos Econômicos Sociais e Culturais da ONU ( Nova York,1966), que tem hierarquia

constitucional segundo o art. 75 ,inciso 22º, da Constituição Nacional Argentina, atribuindo a

todo habitante o direito de aceder, “sobre a base da capacidade”, a uma educação superior

progressivamente “gratuita” ( art.13,inc. 2-c). A propósito, os argentinos aderiram na prática o

compromisso internacional assumido no Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais

e Culturais, quando implementam progressivamente a gratuidade no ensino superior. Para tanto,

o documento del decano de la Facultad de Derecho de la Universid de Buenos Aires apresenta as

bases para uma nova Lei de Educação Superior, para melhorar as condições de funcionamento

das instituições educativas do nível superior e garantir a igualdade de oportunidades e igualdade

de possibilidades para todos os setores da população. Eles sustentam, em suma, que a legislação

da Educação Superior seja adequada às pautas do Projeto de Nação desenhado pela Constituição

Nacional com esses critérios, como um dos perfis do Contrato Social que no vincula aos

argentinos, como afirma o decano Atílio Aníbal Alterini e o Secretario Acadêmico Gonzalo

Alvarez, em Buenos Aires, em junho de 2005.

O governo brasileiro, pela primeira vez na história da educação deste país, apresentou

uma versão do Anteprojeto da Lei de Educação Superior para discussões, debates e sugestões da

comunidade acadêmica e da sociedade, envolvendo os professores, estudantes, técnico-

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administrativo, pesquisadores e representantes de entidades acadêmicas, da comunidade

científica, do movimento social e do setor produtivo. Estabeleceu que a instituição interessada em

apresentar novas sugestões de mudanças deveria encaminhar suas propostas até o dia 30 de junho

de 2005. Em seguida, 29 de julho de 2005, o Ministro da Educação apresentou a versão final da

reforma universitária ao Presidente da República para encaminhar a câmara Federal.

Com o advento da Lei da Educação Superior as redes públicas e particulares de ensino

superior vão sofrer muitas mudanças, que certamente deverão adaptar seus estatutos e regimentos

no prazo previsto na lei. Mudanças também vão ocorrer no Plano Nacional de Educação, Lei de

Diretrizes e Bases da Educação, bem como em diversas normas que complementam o cenário do

Direito Educacional e dos diferentes aspectos da educação superior. E aqui, o Estado, a sociedade

e a comunidade acadêmica têm uma grande responsabilidade social com o direito à educação, até

porque o Brasil tem sérios problemas em matéria educacional.

Para João Roberto Moreira Alves, Presidente do IPAE, o anteprojeto de Lei da Educação

Superior apresenta avanços e retrocessos. Do ponto de vista político, ele dividi a responsabilidade

social com a educação, através dos debates, discussões e opiniões, como contribuições para o

avanço na educação. Contudo, algumas propostas do governo não estão agradando a comunidade

acadêmica e a sociedade.

Esperamos que, com as sugestões apresentadas pela sociedade, o Congresso Nacional

melhore o Projeto de Reforma Universitária.

5. Considerações Finais

Devido à abrangência do tema, procuramos destacar alguns aspectos do direito à educação

no ordenamento jurídico argentino e brasileiro. O direito à educação é uma convocação para

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participação de todos, em especial todas as nações têm uma responsabilidade social com a

educação do povo, pois se trata de um direito natural e personalíssimo. Por isso, todos devem

contribuir, para a igualdade de oportunidade e acesso à educação, mas, sobretudo para uma

igualdade real de condições e permanência na escola, que inclui o direito de aprender e de um

ensino de qualidade.

Enfim, o tema é um terreno fértil para os estudantes, pesquisadores, educadores, juristas,

profissionais do direito, gestores educacionais e todos aqueles comprometidos com a educação. E

aqui, encontramos no Direito Educacional, ** como novo ramo do saber jurídico, um

instrumento de proteção e garantias à educação.

6. Referência Bibliográficas

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Jornal do Brasil. Rio de Janeiro. Ano 115 nº 159. 24 de setembro de 2005. A11. “Educação superior sem privilégios”.

**www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=6794

* Advogado (UFRJ), Mestre em Direito (UGF), Especialista em Direito Civil, Romano e Comparado (UFRJ), Curso de Perfeccionamiento sobre Actualidades y Perspectivas Del Drecho Argentino (UBA), Professor de Teoria Geral do Direito Civil da UNIVERCIDADE, Professor de Direito e Legislação Educacional (UNISUAM), Membro do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) e Coordenador de Supervisão dos Estagiários da Comissão OAB/RJ Vai à Escola.

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