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A agricultura familiar no Mercosul Sidemar Presotto Nunes Apresentação O objetivo desse trabalho é caracterizar a agricultura familiar no Mercosul. O texto foi desenvolvido considerando três assuntos principais: o primeiro se referindo à agricultura dos países membros e associados do Mercosul; o segundo se referindo à agricultura familiar e a inserção dela nesses países e o terceiro tratando das negociações agrícolas comerciais entre os países do Mercosul. Para isso foi necessário contextualizar o Mercosul e a agricultura desses países para, em seguida, analisar a inserção da agricultura familiar nesse contexto. 1. O Brasil tem a maior população e economia do Mercosul, mas a Argentina tem a maior renda per capita. Os países membros do Mercosul juntos têm uma população de aproximadamente 266 milhões de habitantes e uma economia de U$ 2,23 trilhões. Se aos países membros forem agregados os países associados, que ainda não são membros efetivos, mas que poderão vir a sê-los nos próximos anos, a população chega a 365 milhões e a economia à U$ 2,97 trilhões. Tabela 1 - Valor estimado do PIB dos países membros do Mercosul utilizando o critério de Paridade do Poder de Compra (PPC). País PIB (milhões de US$) PIB per capita População em 2007 IDH Brasil 1.507.106 8.049 190.011.861 0,792 Argentina 510.266 12.468 40.403.943 0,863 Venezuela 157.877 5.571 26.085.281 0,784 Uruguai 32.402 9.107 3.447.920 0,851 Paraguai 28.960 4.553 6.667.884 0,757 Total Mercosul 1 2.236.611 8.389 * 266.616.849 0,809 *

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A agricultura familiar no MercosulSidemar Presotto Nunes

Apresentação

O objetivo desse trabalho é caracterizar a agricultura familiar no Mercosul. O texto foi desenvolvido considerando três assuntos principais: o primeiro se referindo à agricultura dos países membros e associados do Mercosul; o segundo se referindo à agricultura familiar e a inserção dela nesses países e o terceiro tratando das negociações agrícolas comerciais entre os países do Mercosul. Para isso foi necessário contextualizar o Mercosul e a agricultura desses países para, em seguida, analisar a inserção da agricultura familiar nesse contexto.

1. O Brasil tem a maior população e economia do Mercosul, mas a Argentina tem a maior renda per capita.

Os países membros do Mercosul juntos têm uma população de aproximadamente 266 milhões de habitantes e uma economia de U$ 2,23 trilhões. Se aos países membros forem agregados os países associados, que ainda não são membros efetivos, mas que poderão vir a sê-los nos próximos anos, a população chega a 365 milhões e a economia à U$ 2,97 trilhões.

Tabela 1 - Valor estimado do PIB dos países membros do Mercosul utilizando o critério de Paridade do Poder de Compra (PPC).

País PIB (milhões de US$) PIB per capita População em 2007 IDHBrasil 1.507.106 8.049 190.011.861 0,792Argentina 510.266 12.468 40.403.943 0,863Venezuela 157.877 5.571 26.085.281 0,784Uruguai 32.402 9.107 3.447.920 0,851Paraguai 28.960 4.553 6.667.884 0,757Total Mercosul1 2.236.611 8.389* 266.616.849 0,809*

Colômbia 325.915 6.962 44.858.434 0,790Chile 175.324 10.904 16.285.071 0,859Peru 156.511 5.556 28.675.628 0,767Equador 51.681 4.083 13.752.593 0,765Bolívia 24.501 2.710 9.119.372 0,692Total Mercosul2 2.970.543 8.126* 365.555.352 0,792*

1 Somente Estados Membros. 2 Estados Membros e Associados. * Nos cálculos de médias leva-se em conta o número de habitantes de cada país. Fonte: Banco Mundial, apud wikipédia (2007).

Com uma população de 190 milhões de habitantes e um Produto Interno Bruto (PIB) de U$ 1,5 trilhão, considerando a paridade de compra, o Brasil é o principal país do Mercosul em termos de população e de economia. O Brasil tem 71% da população e 67% da economia dos países membros do Mercosul e 52% e 50%, respectivamente, quando aí se incluem os países associados. O Brasil exerce, portanto, uma influência importante sobre os demais países membros. No entanto, a entrada de outros países no Mercosul faz com que se reduza essa importância relativa do País.

Quando nos referimos à indicadores de desenvolvimento humano (IDH), verifica-se que a Argentina e o Uruguai possuem as duas melhores posições. São também os países que possuem os melhores níveis de renda per capita. Uma análise da tabela acima demonstra que há uma relação quase que direta entre IDH e PIB per capita, denotando a importância da atividade econômica a outros indicadores de qualidade de vida (escolaridade e expectativa de vida) utilizados pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), que é quem calcula o IDH.

2. O novo contexto da agricultura mundial

A agricultura mundial pode ser caracterizada por dois momentos históricos principais. O primeiro foi a Revolução Verde, que consistiu na utilização de máquinas e insumos industriais que incrementou a produção e a produtividade. O segundo, mais recente, é a constituição de algumas grandes empresas que controlam o setor. Apresentam-se, a seguir, alguns tópicos que ajudam a entender o desenvolvimento histórico da agricultura, bem como o estágio atual:

Anos 50 em diante: modernização da agricultura mundial (máquinas, insumos, pesquisa, crédito agrícola).

Conseqüências da modernização da agricultura: aumento da produtividade do trabalho e da terra; liberação de mão-de-obra; pequeno aumento da oferta per capita de alimentos; queda relativa da população rural, mas que ainda se mantém alta; barateamento do custo de grande parte dos alimentos; contaminação ambiental e dos alimentos; desequilíbrio ecológico.

Redução da importância da agricultura na composição do PIB dos países, principalmente dos mais desenvolvidos. Apesar disso não abrem mão dos subsídios e da manutenção da política agrícola (PAC na Europa, Farm Bill nos EUA), devido a pressão do setor, por questões de segurança alimentar e pela dinamização promovida pela atividade agrícola em outros setores da economia.

O milho, o trigo e o arroz continuam sendo os principais produtos agrícolas mundiais, com produções acima de 600 milhões de toneladas cada um. Em virtude do crescimento do consumo de carne produzida em sistema de confinamento, a soja foi o cultivo agrícola que mais cresceu, quase 700% entre 1961 e 2005.

O processo de modernização da agricultura foi estimulado pelo Estado brasileiro a partir dos anos 60, época em que o crescimento econômico e industrial mantinha-se alto. Os problemas sociais resultantes do “desemprego tecnológico” da agricultura se intensificaram com a redução do crescimento e com a queda do nível de emprego urbano.

A produção agrícola brasileira dobrou a partir dos anos 90 puxada pelas exportações ante a produção ao mercado interno.

Concentração do poder de controle do setor em mãos de um pequeno número de grandes indústrias nacionais e transnacionais. Inseridas no mercado mundial e dotadas de grandes logísticas, essas empresas realocam suas unidades produtivas com vistas a obter os menores custos de produção possíveis. Visando atingir suas metas, estabelecem contratos de produção com agricultores familiares, o que tem contribuído para garantir uma maior competitividade das mesmas no mercado mundial.

Ao lado da concentração do controle por parte das grandes agroindústrias, as grandes redes varejistas vêm ampliando o poder de controle da distribuição. Essas grandes redes vêm ampliando a fatia do mercado que controlam. No Brasil respondem atualmente por aproximadamente 50%.

As políticas públicas desenvolvidas pelo Estado (agrária, agrícolas e sociais), a integração/ terceirização agroindustrial e a redução do nível de crescimento industrial e do emprego urbano têm garantido a competitividade da agricultura familiar, especialmente nas atividades em que a produtividade do trabalho é baixa, como na fumicultura.

A produção de biocombustíveis colocará uma nova dinâmica à agricultura, “renovando o discurso do agronegócio”. Pouco tem se levado em conta os problemas sociais e ambientais que daí poderão decorrer.

3. O setor primário sempre foi importante na pauta de exportações dos países latino-americanos

O setor primário (agropecuário e extrativista) sempre foi importante aos países latino-americanos, gerando os conhecidos ciclos econômicos que pautaram as exportações desses países. Devido ao fato da economia desses países ser subordinada à economia dos países do capitalismo central, atualmente o setor primário continua sendo importante à economia, apesar de um certo aumento da produção e da exportação de bens industrializados.

No Brasil, por exemplo, o estabelecimento da agricultura como âncora do processo de estabilização dos preços e como fonte para obtenção de divisas (via exportações) causou uma série de problemas para o setor, especialmente para a agricultura familiar. Entre os principais problemas, pode-se citar: a elevação forçada das escalas de produção, a elevação dos custos acima das receitas, a redução dos preços recebidos, a

compressão da renda agrícola, a concentração dos agentes compradores da produção agropecuária e a queda da renda da população consumidora.

O aumento da produção agrícola brasileira, superior a 100% entre 1990 e 2005, período em que se intensificou a abertura comercial, foi estimulado principalmente pelas exportações em detrimento da produção ao mercado interno. Entretanto, o crescimento da produção não significou o aumento da população ocupada na agricultura, já que a introdução de novas máquinas, equipamentos e também de insumos agrícolas contribuiu para continuar a ampliação da produtividade do trabalho e da terra na maioria dos cultivos agrícolas. A produção agrícola da Argentina e do Paraguai cresceu ao mesmo nível da produção brasileira, também puxada pelo aumento das exportações.

4. Produção agrícola e mercado interno na Argentina e no Brasil

O Brasil e a Argentina, os dois principais países do Mercosul, têm como característica em comum a grande participação da agricultura na economia nacional e na dinamização de outros setores da economia. Entretanto, em virtude de um menor desenvolvimento industrial e de um mercado interno menor (a Argentina possui cerca de 40 milhões de habitantes, enquanto o Brasil possui 190 milhões), os produtos agrícolas destinados à exportação adquirem importância ainda maior na Argentina. Por isso, em virtude do tamanho do mercado interno, as agroindústrias tendem a se interessar mais pelo mercado interno no Brasil do que na Argentina.

Em virtude da importância da agricultura nesses dois países, os reflexos do desenvolvimento agrícola em um país (devido à políticas públicas, negociações comerciais, o desempenho da economia, etc) são facilmente sentidos no outro, implicando diretamente nos volumes de importação e exportação entre os dois países. No entanto, a produção agrícola no Paraguai também vem aumentando, ampliando a importância do País no que se refere a esse assunto.

5. A produção agrícola e a agricultura nos países do Mercosul

Um pequeno número de produtos agrícolas responde pela maior parte da produção agrícola dos países que compõem o Mercosul. Com 513 milhões de toneladas, a cana-de-açúcar é o produto agrícola com o maior volume de produção, embora em termos de área ocupada, aproximadamente 8 milhões de hectares, e de valor bruto da produção tem um nível de importância menor do que a soja, o trigo e o milho. Em termos de grãos, a soja, o milho, o arroz e o trigo são os produtos agrícolas mais importantes. Verifica-se, através da tabela a seguir, que a produção de alguns produtos (como a cana-de-açúcar, por exemplo) é bastante concentrada em alguns países.

Tabela 2 – Principais produtos do Mercosul em 2005 segundo o volume de produção (mil toneladas).Produto Argenti

na Brasil Paraguai

Uruguai

Venezuela Total 1* Total 2**

Cana-de-açúcar 19.300,0

422.926,4 3.820,0 177,3 9.654,4

455.878,1

513.977,7

Soja 38.300,0 51.182,1 3.988,0 478,0 4,0 93.952,1 95.765,6Milho 20.482,6 35.134,3 830,0 251,0 2.193,5 58.891,4 65.145,7Leite 8.100,0 23.455,0 372,4 1.770,0 1.347,7 35.045,0 48.361,2Mandioca 170,0 25.725,2 4.785,0   531,3 31.211,5 34.736,8Arroz 1.027,0 13.191,9 102,0 1.214,5 1.004,5 16.539,9 23.544,2Trigo 12.579,2 4.658,8 630,0 387,5 0,2 18.255,6 20.469,6Laranja 770,0 17.864,1 188,3 176,5 374,4 19.373,4 20.112,7Banana 180,0 6.803,0 48,4   529,7 7.561,1 15.625,0Carne bovina 2.980,5 7.796,4 215,0 520,3 424,7 11.936,8 13.505,7Batata 2.021,0 3.128,5 1,1 157,6 443,1 5.751,3 13.012,0Carne frango 785,0 8.692,1 37,0 45,0 739,4 10.298,5 12.596,6Pescados 35,6 135,1   2,0 292,3 465,0 9.777,9Fonte: FAO (Março de 2007). *Países membros. ** Inclui países associados (Chile, Peru, Bolívia, Equador, Colômbia). A classificação do nível de importância dos produtos agrícolas levou em consideração o Total 2. Elaboração: DESER.

No que se refere à produção de proteína animal, as carnes de bovinos e de frangos são as mais importantes, com 13,5 milhões e 12,6 milhões de toneladas, respectivamente. A produção de pescados, que chegou à 9,77 milhões de toneladas em 2005, é muito mais expressiva nos países associados do que nos países membros, o que revela a importância da pesca para esses países.

No Brasil, atualmente, a agricultura responde por aproximadamente 9% do PIB, emprega aproximadamente 14% da população economicamente ativa e o meio rural possui em torno de 21% da população total. Verifica-se, através desses dados, que no meio rural brasileiro os rendimentos são menores do que em relação ao meio urbano, já que a proporção do PIB é inferior à população ocupada e bem inferior que a população total. Se, de um lado, a economia no meio rural é menos mercantilizada e o custo de vida é inferior ao meio urbano, de outro lado, ganham importância as rendas não-agrícolas, sejam elas derivadas da venda de trabalho, seja através de transferências sociais e da previdência social rural.

O Brasil ainda possui fronteiras agrícolas em que o preço da terra é baixo, sendo comercializada a menos de R$ 100,00/ha, enquanto que em alguns lugares da região Sul esse valor pode chegar a mais de R$ 20.000,00/ha. Isso possibilita que empresas ou até mesmo agricultores

médios do Sul adquiram grandes extensões de área, que se valorizam a partir do momento em que passam a ser dotada de infra-estrutura pública e comercial. Na região de Santarém, no estado do Pará, por exemplo, a terra que era comercializada por R$ 200,00/hectare no ano de 2000, atualmente possui valor de mercado que pode chegar a R$ 5.000,00 (25 vezes maior). Esse mesmo processo de valorização do preço da terra aconteceu no estado do Mato Grosso, a partir do início dos anos 80. Com a diversificação das fontes energéticas alternativas ao petróleo e a ampliação da produção de biocombustíveis, a tendência é de que a propriedade fundiária passe por um novo ciclo de valorização, já que a demanda por ela se ampliará. A pressão pelo uso dos recursos naturais e pela propriedade fundiária também deverá provocar uma nova onda de conflitos sociais no campo, principalmente nas regiões consideradas ainda como fronteiras agrícolas.

Na Argentina, a produção de cereais concentra-se na região da Pampa Úmida, localizada ao Norte de Buenos Aires e no entorno de Rosário. É uma região que apresenta solos férteis, clima temperado e chuvoso e, como conseqüência, alta produtividade na produção de grãos e cereais (soja, trigo). Em Rosário está o principal porto, localizado no Rio do Prata, por onde mais de 70% da produção agrícola é escoada e exportada. O País possui regiões muito frias, a exemplo da Patagônia, pouco adequadas à produção de cereais, predominando a produção de frutas (maçã, pêra). Há também regiões desérticas e semi-desérticas. Em Mendoza, que se situa na divisa com o Chile, por exemplo, a precipitação média é de 200 mm anuais, abaixo dos 400 ou 600 mm anuais do sertão nordestino brasileiro. A produção agrícola da província se concentra na produção de frutas e hortaliças, irrigada através do degelo da neve da Cordilheira dos Andes.

Toda a produção de soja argentina é transgênica, obtidas através da multiplicação de sementes da tecnologia desenvolvida pela Monsanto e sem o controle desta sobre a produção. A legislação nacional não permite a cobrança de royalties sobre a patente de sementes. Isso tem feito com que a Monsanto busque outras formas de cobrar royalties dos produtos e a estratégia está sendo cobrar na entrada da soja no comércio europeu. Essa questão tem promovido amplos embates entre o governo argentino, que é contrário à cobrança, e a empresa.

Em algumas regiões há grande concentração fundiária, principalmente na região produtora de grãos (Pampa Úmida), nas regiões produtoras de bovinos para corte (ao Sul da província de Buenos Aires) e em algumas regiões em que a agricultura é menos importante e onde os interesses se voltam ou ao turismo ou à própria especulação imobiliária. Atualmente, cerca de 3 mil proprietários possuem o domínio de 15 milhões de hectares. Outro processo em curso é a compra de terras por estrangeiros que atualmente controlam 14 milhões de hectares, como artistas, grandes empresas e bancos estrangeiros.

O clima quente e seco de Mendoza é adequado à produção de uva para vinho. Na província se produz os melhores vinhos da Argentina, que são exportados para diversas partes do mundo. Além do vinho, o Brasil importa hortaliças e frutas dessa região, principalmente os que são menos perecíveis ao transporte (pêssego, maçã, pêra, etc). Em Mendoza, a

gestão do uso da água é algo muito importante, já que é dela que se garante a vida (consumo humano e animal, produção agrícola, irrigação de árvores urbanas e parques). Ao contrário da região de Rosário e Buenos Aires, onde os estabelecimentos agrícolas são maiores e onde há cultivos extensivos, na região de Mendoza a grande maioria dos estabelecimentos produtores de frutas e hortaliças é pequeno e possui menos de 5 hectares.

Na Venezuela,El gobierno venezolano aprobó una Ley de Reforma Agraria en 1960, encaminada a expandir y diversificar la producción agrícola, que además se estimuló con el aumento de la superficie regable. En 2003 las actividades agropecuarias ocupaban al 11% de la población activa del país y contribuyeron con el 5% del PIB anual. La superficie cultivada ascendió en 2003 a 3.400.000 hectáreas. Los variados recursos agrarios venezolanos se expresan en diversos sistemas productivos que cubren desde la agricultura de subsistencia y semicomercial, desarrollada en tradicionales conucos (huertas) y en pequeñas fincas donde se cultivan productos para el consumo doméstico (caraotas, frijoles, yuca y raíces tropicales), hasta plantaciones de diversos tipos, como las antiguas (hoy modernizadas en su mayor parte) dedicadas al cultivo de café, cacao, caña de azúcar y otros productos comerciales. En estas últimas décadas se han multiplicado los sistemas de cultivos anuales mecanizados y modernos, como los especializados en maíz, arroz, sorgo, ajonjolí, maní (cacahuete), girasol y algodón, gracias a la irrigación, la fertilización y el control de plagas, que han transformado los paisajes geográficos agrarios de la mesa de Guanipa (estado de Anzoátegui) e importantes extensiones de Los Llanos centrales y occidentales. Destaca la introducción reciente de los sistemas innovadores de fruticultura, viticultura, horticultura y floricultura comercial en los estados andinos y de Zulia, Falcón, Lara, Guárico y Aragua, entre otros (Wikipédia, 2007).

No Uruguai,A economía de Uruguay está basada en la producción ganadera. Los ganados ovino y bovino son los más importantes; carne, lana, cuero y otros subproductos constituyen las principales exportaciones. De menor relevancia para la economía son los cultivos agrícolas, entre ellos, el trigo, el arroz y la soja. Los recursos minerales son escasos, pero la industria ha crecido gracias a las importaciones de combustibles y materias primas. La principal industria es la alimenticia, seguida por la textil y la química. Una industria que ha crecido a finales del siglo XX y principios del XXI es la del software, la que está efectuando exitosas exportaciones no tradicionales. La red caminera es buena y el turismo crece rápidamente. El turismo y los servicios financieros constituyen importantes recursos económicos. Al igual que en otros países de la región, en los '90 se hicieron políticas de apertura económica (Mercosur) y

reforma del Estado, aunque no se han realizado tantos cambios como en los países vecinos (Wikipédia, 2007).

6. As exportações como estímulo ao aumento da produção agrícola

Verificou-se, nesses últimos anos, uma tendência de ampliação da área produtiva dos produtos destinados à exportação, em especial da soja, e uma redução da área destinada aos produtos de mercado interno. Em parte, a queda na área de cultivo dos produtos de mercado interno foi compensada em parte pelo aumento da produtividade. No Brasil, por exemplo, houve uma queda de 16,5% na área cultivada com feijão, mas um aumento de 34% na produção total.

Atualmente, a soja é o produto agrícola que mais ocupa área no Brasil, na Argentina e no Paraguai e o que exerce maior pressão sobre os recursos naturais através do desmatamento, da drenagem de áreas alagadas, da redução da biodiversidade e das diversas formas de contaminação ambiental e da saúde, devido à utilização de insumos agrícolas. Entretanto, não se trata de uma particularidade da soja, nem é a soja a grande vilã. Deve-se às próprias mudanças nas relações de produção em nível mundial, em decorrência do mercado (oferta, demanda, preços) e da ação do Estado (políticas públicas, subsídios), que alteram as formas de produzir e as relações sociais no campo. Ou seja, a soja atualmente ocupa um lugar de destacada importância na pauta de exportações, mas, no médio prazo, poderá ser um outro produto agrícola qualquer que ocupe espaço na mesma lógica da acumulação. Em virtude do estímulo à produção de agrocombustíveis, a cana-de-açúcar ampliará bastante a área de cultivo nos próximos anos.

Na agricultura, as máquinas, os insumos e as novas técnicas de produção elevam a produtividade do trabalho, permitindo que um número cada vez menor de pessoas produzam a mesma (ou maior) quantidade de mercadorias, como acontece no caso da suinocultura. Nos últimos anos, embora a produção tenha se elevado, houve redução no número de produtores de suínos no Brasil. Isso não significa que em outros setores do “agronegócio da suinocultura” o número de empregos não tenha se mantido (ou aumentado), mas na agricultura diminuiu, mesmo em um sistema em que predomina a produção familiar.

Tabela 3 – Valor Bruto da Produção de 20 produtos agrícolas vegetais produzidos no Brasil entre 1989 e 2005 (R$ milhões)

Ano Valor Bruto da Produção (VBP)1989 89.9211994 90.5131996 75.8841998 87.2321999 86.7692002 87.2512003 114.8542004 109.878

2005 96.256Fonte: Mello, 2006.

A tabela demonstra que, apesar do expressivo aumento da produção agrícola dos produtos exportáveis, o valor bruto da produção de 20 produtos agrícolas se manteve quase estável entre 1989 e 2005, embora tivesse oscilado um pouco entre os anos analisados. Isso reflete a tendência de queda de preço das commodities agrícolas.

7. A concentração do controle do setor pelas agroindústrias multinacionais e pelas grandes redes varejistas

Ocorreu, no Brasil, a partir dos anos 90, um processo de concentração do setor exportador nas mãos de um pequeno número de grandes agroindústrias inseridas no mercado mundial. Essas empresas passaram a interferir fortemente nas estratégias de desenvolvimento da agricultura brasileira, já que possuem capacidade de investimento e podem definir os preços dos produtos agrícolas (em virtude da redução dos estoques públicos e do aumento dos estoques privados e também em função de sua importância no controle do mercado interno e externo).

Essas empresas possuem unidades ou subsidiárias em diversos países, permitindo-lhes facilidades para a inserção de seus produtos no mercado mundial, bem como para a redefinição dos locais de produção economicamente mais vantajosos. Em virtude do poder econômico que possuem, conseguem influenciar a política agrícola de muitos países, como o que vem acontecendo em relação à soja transgênica, em que a Monsanto jogou muitos esforços para garantir a liberação do uso da tecnologia por ela produzida.

No Brasil, a partir dos anos 90, ocorreu uma série de fusões e aquisições entre as empresas do setor agropecuário. Atualmente, as norte-americanas Cargill e Bunge são as principais empresas do setor. Além de serem as maiores exportadoras de produtos agrícolas, essas empresas possuem investimentos diversificados, atuando na produção de fertilizantes, alimentação animal, industrialização de produtos alimentícios e no setor financeiro.

O controle do setor nem sempre se dá mediante o controle de todas as fases da produção, já que algumas fases podem ser economicamente mais interessantes. Assim, algumas grandes empresas formam parcerias com outras, no sentido de garantir o controle do setor. Esse é o caso dos citros no Brasil, setor que sempre foi controlado por três ou quatro empresas, em que a Cargill abriu mão de controlar a produção para controlar o consumo, atuando como uma espécie de agenciadora do suco de laranja na Europa e na produção de outros alimentos derivados do suco de laranja. A inserção mundial tem permitido também que essas empresas driblem o fisco, exportando para unidades próprias ou de subsidiárias, a um preço baixo. No caso do fumo, a maior exportação é de fumo em folha em relação à de cigarros, já que a tributação sobre o primeiro é bem inferior do que sobre o segundo, sendo o produto transformado nos países em que o cigarro é consumido.

Se de um lado tem aumentado a concentração e o controle do setor por um pequeno número de grandes agroindústrias, de outro lado, tem

aumentado a concentração do setor varejista através de grandes redes mundiais de supermercados (Wal-Mart, Carrefour, etc). Essa concentração do setor varejista acontece também em outros setores, não somente nos alimentos. Atualmente, no Brasil, aproximadamente 50% dos alimentos consumidos no país são comercializados através dessas grandes redes de supermercados, cuja participação vem crescendo ano a ano. Em diversos países esse percentual é ainda maior e nos Estados Unidos chega à 90%.

Devido à importância econômica dessas grandes redes varejistas em termos de participação no volume global de alimentos comercializados diretamente aos consumidores, elas tem ampliado seus lucros em relação aos lucros totais da cadeia (agricultores, indústria) e obrigam os setores à jusante se ajustarem às suas demandas, tanto no que se refere à escala quanto ao tipo e aos processos utilizados na produção e na industrialização. Está clara a capacidade de controle por parte das grandes agroindústrias e, cada vez mais, por parte das grandes redes varejistas. No entanto, mesmo considerando o discurso atual de que tudo teria que se ajustar às necessidades e os desejos dos consumidores, o que isso pode significar para modificar o padrão de consumo é uma questão complexa.

A tendência é que a indústria e as grandes redes varejistas segmentem os consumidores de acordo com o nível de renda que possuem. Alguns, particularmente aqueles que possuem níveis de renda altos, poderiam pagar um preço mais elevado pelos alimentos em virtude de incorporar alguns atributos relacionados ao tipo de produção (origem, cuidado com o meio ambiente). Para outros, no entanto, aqueles que possuem níveis de renda baixos, o padrão de consumo seria definido pelo próprio varejo e pelas grandes agroindústrias, pois o atributo que possui maior peso é o preço baixo em detrimento de outros, em virtude da alta participação dos alimentos na composição dos custos de manutenção familiar. A questão de fundo que aqui se coloca é da capacidade das campanhas que fazem apelo à consciência ambiental e social em modificar o próprio consumo.

8. A agricultura familiar nos países do Mercosul

A agricultura familiar brasileira, de acordo com o convênio FAO/INCRA (2000), com base nos dados do Censo Agropecuário 1995/96 do IBGE, representa 85% dos 4,6 milhões estabelecimentos agropecuários, ocupa 79% da mão-de-obra, responde por 38% do valor bruto da produção e possui maior capacidade de gerar renda por unidade de área, em relação à agricultura empresarial. O estudo identificou também que a agricultura familiar no Brasil respondia por grande parte da produção de alguns produtos agrícolas, principalmente aqueles destinados ao mercado interno.

Sendo assim, um grupo de autores, políticos e sindicalistas passaram a defender a agricultura familiar como alternativa às questões sociais do campo e brasileiras, tendo em vista sua capacidade em promover um novo modelo de desenvolvimento. Isso seria possível em virtude de uma maior capacidade de geração de trabalho e renda em relação à agricultura de tipo patronal; não existir a categoria lucro (ou

mais-valia), uma vez que o trabalho é predominantemente desenvolvido pelos membros da família; produzir alimentos predominantemente para o consumo interno; dinamização da economia dos pequenos municípios, favorecendo o “desenvolvimento local e territorial”; um maior cuidado com a preservação do meio ambiente, em virtude da maior diversificação das atividades econômicas e maior preocupação com a reprodução dos meios de vida ante o lucro; maior possibilidade de se desenvolver a agroecologia enquanto alternativa aos problemas sociais (trabalho, renda, saúde) e ecológicos.

A noção de agricultura familiar, embora não seja precisa e unânime, e de temas em prol do desenvolvimento rural com base nesta forma social de produção agrícola, têm sido amplamente adotados, a partir de meados dos anos 90, nos discursos e nos projetos de organizações sociais do campo, organizações multilaterais e por praticamente todos os níveis dos governos brasileiros em suas políticas. A utilização da noção de agricultura familiar provocou uma substituição, mesmo que parcial, das definições de trabalhador rural, pequeno agricultor, camponês e outras adotadas até então. Atualmente, o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) é a principal política pública específica destinada à categoria, tendo sido criado pelo governo federal em 1995.

No se puede ignorar el efecto que tuvieron sobre el campesinado políticas como la desregulación, la privatización y la apertura económica implementadas desde los ochenta. El nuevo énfasis de la economía de mercado está limitando las condiciones de sobrevivencia de los pequeños productores. Junto con el aumento de los índices de pobreza en el campo, se incrementaron las estrategias hacia el pluriempleo o la multiactividad, a la vez que muchos productores se vieron obligados a abandonar sus actividades productivas en búsqueda de un trabajo temporario. Sólo algunos pequeños productores más capitalizados han podido enfrentar las exigencias del nuevo régimen agroalimentario, accediendo a tecnologías e insumos que les permitió mantener sus niveles de ingreso (Tapella, 2003, pg. 689).

As organizações argentinas, “inspiradas” no Brasil, estão passando a adotar a idéia de Agricultura Familiar para reunir diversas categorias ligadas ao meio rural e marginalizadas pelas políticas públicas, como os pequenos produtores e indígenas. Em maio de 2006 foi criado o Fórum Nacional da Agricultura Familiar, um espaço de articulação para a construção de políticas agrícolas e reforma agrária. A própria Secretaria Nacional de Agricultura está criando um espaço institucional para tratar desse tema. Outro espaço institucional do Mercosul para tratar desse tema é a Reunião Especializada em Agricultura Familiar (REAF), que reúne organizações sociais e governos dos cinco países (Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e Venezuela).

9. A agricultura familiar brasileira e a competitividade das grandes agroindústrias

A agricultura familiar brasileira tem garantido uma maior competitividade nas exportações brasileiras de fumo, aves, suínos e outros produtos. No entanto, isso tem contribuído para gerar uma maior competitividade às grandes indústrias desses setores, que tem aumentado a produção no país com vistas a atender, em grande parte, as exportações. O Brasil ampliou bastante a produção e a exportação dos três produtos acima citados a partir do início dos anos 90. No entanto, em virtude de diferentes evoluções da produtividade do trabalho, o número de produtores de fumo praticamente dobrou e de suinocultores e de avicultores caiu praticamente à metade.

Onde o Estado de Direito garante a propriedade privada da terra, ou seja, onde as terras estão regularizadas e possuem um valor de mercado mais elevado, o capital industrial procura redesenhar sua ação mediante a integração com os agricultores. Outro fator é o custo dos encargos sociais do trabalho, já que o trabalho escravo passa ser denunciado pela sociedade, além de monitorado e punido pelo Estado. Isso se verifica de forma explícita, por exemplo, na entrevista de um empresário paraense quando questionado sobre a parceria de sua empresa com agricultores familiares da região na produção de dendê. O entrevistado disse que a empresa não faz benemerência social, pois esse é papel do Estado. Só o fazem porque é interessante para a empresa e para os agricultores. Afirmou também que, assim, a empresa não precisa imobilizar capital com a aquisição de terras e não necessita contratar funcionários, uma vez que, além dos salários, os encargos sociais implicariam num aumento de até 102% na folha de pagamento dos funcionários1.

No Brasil, as políticas públicas (agrárias, agrícolas e sociais) desenvolvidas pelo Estado, a integração/ terceirização agroindustrial e a redução do nível de crescimento industrial e do emprego urbano têm garantido a competitividade da agricultura familiar, especialmente nas atividades em que a produtividade do trabalho é baixa, como na fumicultura. A propriedade da terra é outro fator que contribui com a permanência e a reprodução da agricultura familiar, principalmente aonde ela tem um valor de mercado mais elevado, por dois motivos: ela pode ser transmitida por herança a membros de uma mesma família e ao fato de que a aquisição de terras por grandes agricultores ou empresas significa uma alta imobilização de capital, que não poderá ser reavido em um curto prazo, salvo quando se presta apenas à especulação imobiliária.

10. A importância da política agrícola no desenvolvimento do setorOs instrumentos de política econômica que influenciam a agropecuária são diversos2: Política fiscal: tributação, gastos do governo, mecanismos de isenção

fiscal e de incentivos fiscais.

1 PLANETA ORGÂNICO. Diretor da Agropalma fala sobre Biodiesel ao Planeta Orgânico. Disponível em http://www.planetaorganico.com.br/entrev-marcellobrito05.htm. Acesso em 10 de novembro de 2006.2 BACHA, Carlos José Caetano. Economia e política agrícola no Brasil. Editora Atlas, São Paulo, 2004.

Política monetária: taxa de juros de captação versus taxa de juros de empréstimos, taxas de juros nominal versus taxas de juros real.

Política cambial: câmbio valorizado versus câmbio desvalorizado. Política de rendas: legislação trabalhista e política de zoneamento do

uso da terra. Política comercial: acordos comerciais entre países. Política agrícola: crédito rural, política de garantia de preços mínimos,

seguro rural, pesquisa, extensão rural, sanidade vegetal e animal, políticas específicas para certos produtos e insumos, política de uso florestal e de incentivo ao reflorestamento. Além desses instrumentos de política agrícola mais gerais, outros podem ser desenvolvidos visando atender um público específico, como os de apoio à agricultura familiar.

Como toda política pública, as políticas agrícolas podem induzir mudanças desejadas pelos governos no setor, através do arranjo de instrumentos que estimulem a produção (preços, crédito, juros, seguro, formação de estoques, exportações, compras internas) e promovam a distribuição social da riqueza da agricultura3. Sendo assim, a orientação dessas políticas é dada pelo papel que se espera que a agricultura cumpra em um dado momento histórico (liberar mão-de-obra, baratear o custo da cesta básica, promover as exportações de determinados produtos, garantir a segurança alimentar, fortalecer a agricultura familiar ou patronal, etc).

11. Política agrícola para a agricultura familiar

O Brasil é o país que melhor desenvolveu um conjunto de políticas agrícolas específicas para a agricultura familiar. Em termos de política agrícola para esse setor, alguns avanços foram conquistados a partir da criação do Pronaf: a) o aumento do volume de recursos repassados aos agricultores familiares, que passou de R$ 89 milhões4 em 1995 para R$ 7,5 bilhões em 2005/06; b) o número de contratos que no mesmo período passou de 33.227 para mais de 1,9 milhão, c) a diminuição progressiva dos encargos e elevação dos níveis de subsídios, inclusive sobre o capital (os juros passaram de 16% ao ano para 4%, rebate nos grupos de baixa renda – A, B e C); d) a criação do grupo B, que visa financiar o investimento a agricultores de baixa renda e a criação de mecanismos para efetivamente atendê-los; e) a nacionalização do Pronaf, ampliando a atuação ao Nordeste e Norte; f) a criação do seguro agrícola (Garantia-Safra e Proagro Mais); g) a criação do seguro de preços da agricultura familiar. Outros importantes avanços do programa podem ser considerados: a articulação do crédito a outras políticas (garantias de compra, aquisição da agricultura familiar, Programa Fome Zero, etc.); a estruturação de uma política de assistência técnica e extensão rural; a criação de linhas específicas de financiamento (jovens, mulheres,

3 Como exemplo, entre meados da década de 60 e meados da década de 80, o governo federal planejou as políticas agrícolas nas áreas de pesquisa, de assistência técnica e de crédito, principalmente, visando liberar mão-de-obra da agricultura para a indústria.

4 Referente ao ano fiscal.

agroecologia, etc.), apesar das dificuldades de operacionalização; a identificação da estrutura das cadeias produtivas da agricultura familiar em nível nacional, no sentido de desenvolver ações específicas para apoiá-las na inserção no mercado.

As políticas públicas e agrícolas brasileiras servem de referência às organizações argentinas que trabalham com a agricultura familiar, bem como do Uruguai e do Paraguai. Embora ambos os países tenham passado por um processo de intensificação da abertura comercial a partir do início dos anos 90, na Argentina a “Era Menen” e a crise econômica deflagrada em 2002 promoveram um aumento da pobreza, que chegou à 50% da população e a perda de direitos sociais dos trabalhadores. Houve também nesse período a privatização e desnacionalização de alguns setores da economia, considerados estratégicos ao desenvolvimento da economia nacional, como a energia elétrica e os combustíveis.

Em termos de organização institucional, apesar da grande importância econômica da agricultura, há apenas uma Secretaria dentro do Ministério da Economia. De acordo com a FAA, os agricultores familiares não possuem nenhum amparo do Estado em termos de política agrícola, apenas os grandes agricultores têm acesso ao crédito bancário. O governo criou também no início desse ano uma Secretaria de Terras, ligada ao Ministério do Planejamento, que trata da questão fundiária urbana e rural. O Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) também está buscando estruturar algumas políticas. A principais políticas são as transferências sociais como o Bolsa Família no Brasil e a política de micro-crédito à organizações sociais do meio rural e urbano.

A Federação Agrária Argentina (FAA) é a principal entidade de representação dos pequenos agricultores. Foi criada há mais de 90 anos enquanto entidade de representação dos pequenos e médios agricultores do país. No ano 2000 fez a opção pelos pequenos agricultores argentinos. Participam da FAA agricultores, diretórios de juventude, organização das mulheres e organizações sociais, mas apenas as duas primeiras possuem direito à participar da direção. Há também no país três organizações que representam os grandes produtores: a Sociedade Rural Argentina, a Federação das Cooperativas Agrícolas e Confederação Rural Argentina (que representa os bovinocultores).

12. A Reforma Agrária: pouco investimento

Nos anos 60, quando a reforma agrária era colocada como necessidade ao desenvolvimento nacional, via criação de um mercado interno de massas, colocou-se a Revolução Verde como a grande promessa à resolução dos problemas sociais do campo. O Estado estimulou, através de políticas de crédito, assistência técnica e pesquisa, a utilização de máquinas, insumos e técnicas produtivas que permitiram aumentar a produtividade do capital, do trabalho e da terra. Pela ausência de uma reforma agrária concreta e pela redução do crescimento econômico e do nível de emprego, isso resultou em grandes problemas sociais, empurrando milhões de pessoas para as grandes cidades, com grande parte se concentrando nas favelas. A esse processo costuma-se chamar de modernização conservadora, pois não provocou grandes alterações nas estruturas sociais do campo.

O Brasil é o país que mais investiu na reforma agrária nos últimos anos. Apesar de se ter ampliado o número de famílias assentadas nos anos 90 em diante em relação ao período anterior, a reforma agrária é um tema que passou a dividir opiniões no que se refere a sua importância ao mercado interno. Apesar da pressão dos movimentos de luta pela reforma agrária, particularmente o MST, a maior parte das famílias foram assentadas em terras públicas ou de regularização (quilombolas, indígenas) e uma menor parte mediante desapropriação. Apesar de se utilizar a idéia de reforma agrária, o que predomina hoje são os assentamentos rurais. Outra política adotada no Brasil no que se refere às questões agrárias é o financiamento público para aquisições de terras por agricultores que possuem pouca ou não possuem terras.

13. Os problemas sociais e ambientais e a idéia de Desenvolvimento Rural

O processo de modernização da agricultura foi estimulado pelo Estado brasileiro a partir dos anos 60, época em que o crescimento econômico e industrial mantinha-se alto. Os problemas sociais resultantes do “desemprego tecnológico” da agricultura se intensificaram com a redução do crescimento econômico e com a queda do nível de emprego urbano.

Os problemas decorrentes do aumento da produtividade do trabalho e do êxodo rural tendem a não ser tão nefastos quando o ritmo de desenvolvimento industrial e a evolução do emprego urbano são elevados, mas problemáticos quando são baixos. Nos anos 70, no Brasil, quando houve a intensificação da revolução verde e o aumento da produtividade do trabalho e da terra, ocorreu, ao mesmo tempo, a redução do crescimento industrial devido ao tipo de política interna, à crise do petróleo e à redução do nível de crescimento da economia mundial. Nesse momento, os problemas sociais se agravaram e os movimentos sociais (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, sindicalismo rural, movimento de mulheres agricultoras etc.) e as ONGs surgiram com força renovada em questionamento ao “modelo de desenvolvimento”.

Uma série de mudanças na interpretação sobre o meio rural ocorreu no período em que a noção de agricultura familiar passou a ser adotada, particularmente a partir de meados dos anos 90. A mais importante delas é que, para um grande número de estudiosos e políticos (governantes, sindicalistas), o meio rural passou a ser considerado como espaço estratégico ao desenvolvimento, em oposição ao que predominantemente se considerava ser um espaço em vias de decomposição, que perdia cada vez mais em importância social e econômica. Pode-se considerar que isso ocorreu devido a alguns motivos: a difusão da “positividade da noção de agricultura familiar5”; a emergência das questões ambientais; os problemas sociais decorrentes do desemprego e das dificuldades econômicas do Estado em desenvolver políticas de grande impacto social e econômico (reforma agrária, política industrial, etc.).

5 Quem defende essa idéia tende a afirmar que a agricultura familiar seria dotada de características sociais e econômicas que, impulsionada politicamente, poderia apontar para um desenvolvimento diferente daquele que se colocava até o momento e que gerava crises econômicas, sociais e ambientais.

Em que pese o fato de que a idéia de desenvolvimento rural carregue um componente de busca, do meio político e dos pesquisadores, em defender seus próprios objetos (de luta política e de pesquisa, respectivamente), cabe considerar que se trata de uma mudança profunda, entretanto, fundada em matrizes teóricas distintas. De um lado, trata-se de considerar a busca de novos projetos de desenvolvimento com a pretensão de “gerar justiça social” e, de outro lado, trata-se de considerar o meio rural e a agricultura familiar pelo seu caráter funcional, como colchão ou menisco dos problemas sociais decorrentes da redução do crescimento industrial, do desemprego e da crise ambiental. São perspectivas que por ora se colocam lado a lado, sob um nível maior ou menor de conflito, mas sob um discurso aparentemente consensual.

14. Agrocombustíveis: uma nova Revolução Verde?

Atualmente, é surpreendente a velocidade de implantação de novos projetos para a produção de biocombustíveis no Brasil. Vários investimentos nacionais e estrangeiros já foram anunciados e outros já estão em fase de implantação. Diante da possibilidade de esgotamento do petróleo enquanto matriz energética, a produção de biocombustíveis tem sido colocada como alternativa ao Brasil, mobilizando muito rapidamente os interesses econômicos de grandes empresas.

No que se refere à cana-de-açúcar, a previsão de que a área de cultivo passasse de 5 milhões para 10 milhões de hectares em 10 anos já foi reduzida para 5 anos. George Soros, um dos maiores investidores mundiais, anunciou recentemente que investirá 900 milhões de dólares em usinas de álcool no Brasil. Bill Gates investirá 250 milhões de dólares e os criadores do Google, uma das maiores empresas da Internet, também manifestaram interesses em investir na produção de álcool no Brasil.

Além da possível ampliação da importância do álcool como combustível, uma energia limpa de acordo com o Protocolo de Kioto, a divulgação de que a cana-de-açúcar consegue reter altos níveis de gás carbônico da atmosfera tende a estimular os investimentos no cultivo. Aí se verifica um grande contra-senso, que parece não ter muita importância nos acordos mundiais, já que a remuneração poderá ser garantida mesmo que a paisagem seja coberta por grandes monocultivos com reduzida biodiversidade, uma vez que se pressupõe que bastaria produzir “energias limpas”.

Sem levar em consideração os impactos sociais e ambientais que poderão decorrer com o desenvolvimento da produção de biocombustíveis, fala-se, normalmente, que o Brasil está diante de uma grande oportunidade de desenvolvimento econômico. No âmbito internacional, está se criando condições que facilitem os investimentos na produção de biocombustíveis, pois se daria em “benefício de toda humanidade”. Em nome da produção de energias limpas e sem considerar o aumento da pressão sobre os recursos naturais, o discurso do grande agronegócio está se renovando. Assim, os problemas fundiários e sociais do campo tendem a ficar ofuscados. Com o apoio internacional e concessões do Estado brasileiro, veremos, nos próximos anos, uma reedição da Revolução Verde e da modernização conservadora, semelhante àquela dos anos 60 e 70.

Embora ainda não tenha sido desenvolvido uma política de estímulo específica, como a brasileira, a tendência é de que a diversificação da matriz energética através da produção de biocombustíveis promova novas alterações na importância da agricultura à economia dos diversos países do Mercosul. Atualmente, o principal produto agrícola para a produção de agrocombustíveis é a cana-de-açúcar, mas o que é importante é considerar o efeito que o aumento do cultivo provoca ao meio ambiente, à disputa entre os produtos por área agrícola e aos preços finais dos alimentos aos consumidores.

Bibliografia

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