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O Dia em que o Outono ficou Quieto. Casimiro Teixeira 1 O Dia em que o Outono ficou Quieto Casimiro Teixeira 2011

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CasimiroTeixeira1

O Dia em que o Outono ficou Quieto

Cas imiro Te ix e i ra

2011

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Um plano mais além.

Tendo viajado por caminhos desconhecidos,

persisto na procura de um amor que conheço,

são noites a fio de suores quentes,

nos sonhos mais estranhos e delirantes,

onde te encontro, inteira, e bem sei, não te mereço.

Mas, todos os prazeres são assim, mal merecidos.

Como se o simples pronunciar do teu nome,

fosse tortura, dor, ansiada morte,

volto lá, todos os dias, ao lugar da nossa paixão,

sonho-te aí, todas as noites, na forma da minha fome,

na desdita da minha malfada sorte,

no mais infinito plano do que perdi por dizer não!

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Onde estás então, graça louca de tempos idos?

Onde te encontro, além das fábulas de meus devaneios?

Serei eu real, naquele canto, ou é tudo um sonho?

Serão mesmo meus prazeres mal merecidos,

ou és tu, mulher feita da matéria dos meus anseios?

Mulher minha és tu, e eu, onde me ponho?

Eu, eu já nem sei se vivo por viver,

ou se existo para criar imagens de ti.

As noites passam, os sonhos iludem,

eu quero-te tanto, e nem bem sei saber,

se és real, mulher verdadeira que existe aqui,

nesta trama de sonhos que me confundem.

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Amo-te!

Amo-te sem saber como,

nem quando, de onde, porquê,

eu te amei.

Amo-te, porque não és pessoa, és vida.

Sem idade, sorte ou canseira.

Assim te amo, porque não sei,

amar de outra maneira.

Tão profundamente, além da razão,

que a tua mão sobre o meu peito é a minha.

Tão Profundamente, que quando adormeces,

Desfaleço e durmo o sono do perdão.

E ao acordares ainda eu entretinha,

o sonho de que nunca me esqueces.

Amo-te assim, como lobo voraz,

que devora em si mesmo o amor que te tenho.

Tão profundamente, que sem querer,

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no teu sonho fui eu acordar.

Amo-te sim, mas não sei, é ele quem faz,

as ações de loucura que tanto desdenho,

Amo-te enfim, porque sem te ter,

Não entendo o sentido do verbo amar.

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A dureza do fogo

Outrora fomos cinza, enxofre e um breu grosso.

Caminhantes que se atrasam sem se saber já mortos.

Fomos faúlhas de morrão que nunca acende.

Sim, fomos um passo de vento, lento e incessante,

que empurra para longe o que é nosso,

e nos deixa n’alma o fogo dos tormentos.

Fomos o que nos castra, nos tira, nos rouba, nos prende,

nos torna neste ser que não recua nem vai avante.

E eu não quero mais ser pedra a arder nesta fogueira.

Por isso me ergo e lhe quebro a dureza,

com ritos impenetráveis de suaves pilastras,

não mais carentes de serem gume.

Por isso escrevo desta maneira,

Pois é a forma que espanto, é a certeza,

O fio etéreo com que remeto minhas palavras,

Confiante de sair incólume.

Hoje, hoje somos todos pedras irmãs,

roliças, delicadas e cientes desta empatia.

Se, em tempos, (como muitos iguais)

Fomos arestas rudes que cortavam,

as tristes penas de nossas vidas vãs,

agora, não mais deixaremos de sentir que existe poesia,

No falso fundo desses que ademais,

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por pouco, por pouco, quase nos matavam.

O tempo de incertezas deixei-o na distância,

dessas pedras de fogo que mal me adivinham,

e parti de novo, de novo caminhante.

Pequeno seixo redondo de condição dúctil,

como eu, existem alguns, mas de fraca abundância,

juntos nesta demanda todos caminham,

já sem sermos homens, mas poesia ambulante.

E em breve seremos tantos, em breve seremos mil.

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O Caminho certo.

E se eu palmilhasse sem receio,

um caminho que nem me apeteça,

no final de um dia que custou a vir,

mas lento, e num céu de chumbo, ele veio.

E se por lá ficasse, sem que mereça,

a vasta liberdade que me fez sentir?

E se misturasse ao som mudo dos meus pés,

a pausa etérea da areia revolvida?

O ruído feroz daquela trovoada,

O restolho do mar lambendo-me de viés?

E se fosse isto a minha vida?

E não mais sempre alma magoada.

E se pelas pupilas gastas pelo sal,

a imagem do mundo se entreabrisse?

Majestosa se mostrava, e mesmo sem ser minha,

pareceu-me não ter nunca tido outra igual.

Como se o próprio Sol ao morrer olhasse, e visse,

que a tristeza d’outrora já definha.

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Foi-se, sem emitir um som que fosse impuro.

Nem tampouco um só lamento de saudade.

E se por fim entrassem em alinho,

Os quantos sentidos e emoções deste coração duro,

neste momento singular de inerte vontade,

Que vim a descobrir neste caminho?

Vontade! A mesma que sabia já ter perdido.

E se atestasse que aquela luz afinal,

Fosse mostra de uma esperança que nunca quis?

E o receio de viver fosse por fim vencido,

em luta valente do bem contra o mal.

E este sopro de mar me tornasse mais feliz?

Seria como um império sem nexo que se avizinha,

suave e sorrateiro como esta luz que se evade.

Mas, e se a soberba no meu peito,

Afinal não fosse vaidade minha?

E este caminho ignoto, fosse alegria que me agrade?

E que se fez minha afinal, porque se fez do meu jeito.

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Cego.

Quando te vi,

não te vi.

Olhei, e nem estavas lá.

Mas depois repeti com vontade,

de ver,

a tua imagem, que sem a esquecer,

vejo-a agora, e pareço,

guarda-la,

na ânsia de tanto te olhar.

No cofre de meus olhos d'então,

via-te sim, mas agora, quando te vejo,

é meu beijo,

que te endereço.

Amor, bem sei, eu não me esqueço,

de ver-te com o coração.

Pois é verdade, eu guardo,

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e tudo de teu eu guardei (guardámos)

e dentro de mim,

ainda vive,

tudo o que já passei (passámos)

e que tenho,

porque te tive.

Pois por ti e em ti,

um tudo ou nada, ledo ensejo,

aqui te tenho, resguardada,

é o futuro, é o futuro,

é o tudo nada que aguarda,

a cegueira de quando te vejo.

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Porque partiste?

Onde estás tu hoje meu amor,

onde te poderei encontrar, para te dizer o que aqui me traz?

Vejo-te tão perto e porém...tão longe, tão distante...

Onde te poderei abraçar e esquecer a dor?

O peso maldito desta vida macerante,

Cuja paz, apenas tu, és quem traz.

Quero-te mais, muito mais do que a vida eterna,

Trago-te para sempre guardada na memória e na alma,

Alma essa transtornada por um sem fim de fantasias.

Onde estás tu criatura divina e terna,

Fonte de paz, mansidão e calma,

Amor de uma vida imensa e de todos os dias.

Nada temas deste escravo da tua paixão,

Caminho para sempre na esteira do teu olhar,

Procuro-te ansioso nos meus sonhos transtornados,

E lá te encontro, radiosa, bela, fonte de inspiração.

Onde estás tu agora, meu chão, meu céu, meu mar,

Meu sorriso, meu tremor, meu desejo, meus olhos de lágrimas lavados.

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Ondes está tu, onde te encontras, porque me escapas?

Onde me ocultas a paixão latente que tudo em ti reveste?

Terei pecado tanto por te desejar, que te perdi por fim?

Não sei de mais nada, perdi o rumo, a bússola, os mapas,

Perdi o Norte o Sul o Este e o Oeste,

Sei apenas que sou pra ti e tu pra mim.

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Menos que isto é nada.

Tu és tudo,

que destino outro, terei eu,

senão tu?

Tu és o meu silêncio mudo,

de mim, o mais profundo meu,

menos que isso e sou ponto nu!

Tu és quem traz,

a esperança que persiste,

a paz que me sacia.

O pedaço em falta, que me perfaz,

o coração que não desiste,

em voltar a ser teu, um dia.

Que vida esta, que destino,

sonhar com um amor que já foi meu.

Que tristeza tão grande é, não o ter.

Tu és minha, eu desatino,

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eu enlouqueço neste céu,

neste paraíso a esvanecer.

Volta, volta, ama-me novamente.

Tu és tu, e meu Deus,

não há outro amor assim.

Lavas-me a alma e tão intensamente,

que julgo já, serem teus,

os suspiros de amor que aspiro assim!

Tu, criaste em mim vontade,

deixaste-me, e fui pluma que voou.

Longe da certeza de ter sido certo,

fui voando errante, sem destino meu.

Tu, deixaste em mim a dor da saudade.

Fizeste-me ser volátil, o que hoje sou,

ar passageiro que vagueia pelo céu aberto,

esporo de uma vida que não cresceu.

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A Mulher.

Esta é a forma feminina,

um nimbo divino que exala da cabeça aos pés,

e atrai com uma feroz e inegável atração.

Sou sugado pelo seu suspiro de menina,

como se não fosse mais que um vapor indefeso, (que nem vês)

e tudo desaparece. Fico eu e ela nessa visão.

Livros. Arte. Religião. Tempo.

O visível e indivisível, e até mesmo o sólido mundo,

E o que se espera do paraíso e do medo do inferno,

todos consumidos, sem receio de contratempo.

Cabelo, busto, ancas, e aconchego de pernas fecundo,

negligentemente caindo em mãos sem governo.

(as minhas por demasia.)

Inchaço de amor de carne e dor deliciosa,

Ondulando na noite rendida.

Este é o núcleo – Após a criança nascer da mulher,

O homem nasce na fome viciosa.

É este o resumo de uma condição vencida,

A mescla do que é dado e do que se quer.

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Tomado assim (vivo) novamente,

vejo minha alma reflectida na natureza,

mais longe através de uma névoa de ser,

que de tanto exalar perfeição ao descrente,

só pode ser uma de inexprimível beleza,

não sei mais que seja, senão tu, mulher.

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O dia em que o Outono ficou quieto.

Perdi-te lá ao longe no revolteio das folhas,

ali sentada no banco de jardim,

inquieta pelo chicote do vento,

parecias mais fúria que mulher.

Procurei-te mais tarde,

na certeza de ter perdido uma parte de mim,

quando de novo o manto castanho te cobriu,

e o vento te levou da minúcia do meu ver.

Louco, louco..

avancei temeroso,

na esperança que o Outono ficasse quieto,

e me mostrasse o sorriso que quis ter.

Louco, louco..

senti a raiva do vento nervoso,

e um fio solto do teu cabelo senti,

enredando-me na saudade que vivi.

Louco, louco..

Como se fosse eu este vento,

levantado de um chão que ruiu,

e te enterrou num manto espesso de nervuras,

louco, como se um gesto sem intento,

fosse mais que uma vida inteira.

Quem dera esquecer eu estas agruras,

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e cair quieto como no dia em que te vi.

Quem dera não mais ser louco desta maneira,

E me esquecer para sempre que te esqueci.

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Um Poema sem demora.

Pouco a pouco enxerto linhas neste esteio,

Incerto da solitude que me comanda a mão,

avanço num vagar pausado que não refreio,

e deixo de entender o sentido da razão.

Lentamente junto as rimas deste mote.

Ansiosas, vazam largo um encher d’alma,

sem contar que o tempo me derrote,

ou que o espaço curto perca a calma.

Devagar, a vida vai nascendo em verso,

um a um, alinhados no prumo de um rima,

faço birra, desespero, mas não disperso,

o sentir que coloco aqui por cima.

Sem pressa vou desfiando este dizer,

que dizem poucos ser o que chamam poesia.

Chamar-lhe-ei tão somente o meu viver,

Pois é isto somente o que me ocupa o dia.

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Vagaroso, defino assim este pequeno adágio,

pois é forçoso que o expulse de mim,

mais que isso, sinto apenas o presságio,

que explana o sentido do seu fim.

Espaçado entre linhas que conserto,

Pela pausa demorada do pensamento,

lá termino de encher o espaço aberto,

com o que vida me ensinou nesse momento.

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esta Terra, este Mar.

Ensinaste-me a viver,

Nesse teu modo de ser,

e tantas vezes me perdi,

em tuas ruas de solidão,

tantas, tantas que nem ouvi,

o bater do coração.

Sou filho nato desta beleza,

de vento, canção e mar,

onde esvoaça a gaivota,

e grassa o viço do pinheiral.

Onde também, e com certeza,

castiga o vento a levantar,

no som certo da mesma nota,

que nunca nos deixa sem igual.

E de longe desenha o rio,

seu caminho até ao sal.

Da ladeira do Mosteiro,

desce a saudade com brio,

Remetida ao laranjal,

que enamora o seu esteiro.

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Desta gente enviada,

Às sete partidas do mundo.

faz a sorte lembrar,

terra calma e incontida.

Onde nasceram poetas,

boas naves de madeira,

e uma alma amargurada.

Ponto de azul tão fecundo,

és toda Mãe a amar,

lembras sempre na partida,

nunca esqueces na chegada,

és memória por inteira.

Quem dera a mim trazer-te ao peito,

num relicário de espuma,

guardar-te minha para sempre,

E nunca, nunca te partilhar.

Nunca sejas de outro jeito,

que terra assim há só uma,

Terra bendita que esconde,

Segredos por revelar,

vives em nós como uma alma,

Querida Vila do Conde.

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CasimiroTeixeira24

Gratidão.

Algaravia de saudade que já passou,

tive medo, pois sou feito de cristal,

e temi essa onda bruta de desilusão.

Devaneio curto, quase nem medrou,

foi uma nuvem, uma aurora boreal,

um sonho estranho, sonhado, ou não?

De tanto sentir-te perto até acreditei,

que era meu este pecado que nem vivi,

e senti-o profundo, quase uma paixão,

um pedaço de carne que toquei, ou não toquei?

Ou terei mesmo sonhado que de facto estava ali,

Tão perto, tão perto que lhe chegava com a mão.

Basta a noite cair e sinto esses tremores,

Menos toque quiçá do que um ardor de frémito,

Mas doendo sempre a dor de ser pancada.

Com o tempo expulsei esses horrores,

transformei-os num vapor de ar atónito,

onde antes havia o rosto de uma amada.

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CasimiroTeixeira25

Obrigado, te agradeço, eu te agradeço.

Por livrares a alma deste penado,

tua imagem, um fogacho que irradia,

o castigo que sentir eu nem mereço.

Mas está longe, é um momento do passado,

morre a noite, e surge de novo o dia.

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As mãos

As mãos exprimem,

as nossas intenções.

Acariciam, confortam, castigam, trabalham.

A boa mão,

que faz o gesto sedutor de lasciva paz,

é a mesma, que no auge das suas ações,

oferece também o aceno, acalma e apraz.

E vai mais longe, afagando-nos as dores que apertam no

coração.

Atributo valioso e escasso,

A mão de puro toque com sabor a mal,

aquele que o amante desvenda,

no segredo obscuro de um olhar baço,

que mesmo parecendo-lhe igual por igual,

é gesto contínuo que sempre encomenda.

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CasimiroTeixeira27

As mãos são ninhos de aconchego,

devaneio de linhas tortas que deixo correr,

são ruas perigosas em cujas rugas me perco,

portos de abrigo onde por vezes chego,

e de ânimo excitado as ponho a escrever,

descobrindo-as sonolentas, estando eu desperto.

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CasimiroTeixeira28

Revolta cá dentro!

Estou cansado de esquecer,

quero seguir em frente, mostrar peito,

gritar alto, divagar por aí, escrever um segredo,

rir, correr, amar, ser vento que assobia pelo ar,

ser parte do grande plano infinito de viver,

de estar cá, de existir, de mostrar o meu jeito,

pois estou pronto, já não tenho medo,

já não quero ficar, morrer, definhar.

Três décadas de carne aqui caminham,

roliças da parte de uma vida modorrenta,

endurecidas por feridas que não saram.

Cansada das crostas negras do esquecimento.

Não! Não serei mais daqueles que alinham,

dos pobres espíritos moldados em água barrenta,

dos que estão, que ficam, que morrem, que param.

Vou ser agora e sempre, o fôlego do momento.

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O cristalizar de todos os meus anseios,

vou ser todos os momentos que ficaram encobertos.

Vou ser Homem, homem, homem... vou ser criança.

Vou esbanjar alegria pelos meus olhos abertos,

vou consegui-lo, eu sei. Por todos os fins, todos os meios,

Todos os infinitos que preenchem esta alma mansa.

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Pelos caminhos da verdade.

Não duvido de mais nada,

de nada, de nada que sinta.

Confiar?

Só confio no que escrevo,

pois escrevendo eu minto,

e pois que minta,

já que fazer mais não me atrevo.

É confuso o trilho da caneta,

torneante nas voltas,

de querer parecer uma recta,

em chorrilhos de palavras,

que despejam a rima falsa,

que tanto me apraz como me afecta.

De nada mais eu duvido,

aqui jaz,

no branco fundo desta pasta,

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CasimiroTeixeira31

a incerteza, o desassossego,

que desgasta,

e negando-o agora, eu não nego,

que a verdade, essa,

sempre e sempre me tira a Paz.

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Farto.

Já não me fazes falta,

E os versos que faço, já nem por ti os rimo,

Nem sequer almejo ter-te por perto.

Perdi o teu rosto na poeira do deserto,

fechei a tua memória lá no cimo,

De uma imensa montanha alta.

Quis-te ter tanto e sempre junto a mim,

Mas cortaste-me o nome e jogaste-o fora,

Num só golpe de ódio mesquinho,

Desejo-te que fiques para sempre nesse escaninho,

Onde te escondeste no dia em que te foste embora,

Pondo em descanso um amor que não tinha fim.

Já não te tenho em conta de seres gente,

Somei todos os dias e ficou um só grão,

És partícula diminuta num espaço infinito,

És menos que o pó que se agita com um grito,

Já nem sequer te reconheço em meio à solidão,

Pois essa ao menos, é coisa que se sente.

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CasimiroTeixeira33

Meus gestos.

Meus gestos, não sou eu,

são toque inusitado,

a carícia de ser teu,

este teu ente amado.

E bem tento, eu tento,

conter o amor, mas não conter,

os sufocos, os abraços de prazer,

mais fortes que o mais forte tormento.

Mas não consigo, não posso,

amo-te mais do que o próprio amor,

exalto, sinto demais, e de mim troço,

pois já nem sequer sinto que é dor.

Ai, mas não é mau, não faz mal,

outra coisa, eu não desejo,

Senão isto, tudo o resto já nem vale,

E o melhor de nós eu já prevejo.

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ODiaemqueoOutonoficouQuieto.

CasimiroTeixeira34

P’ra quê conter então? P’ra quê perder?

estou pronto, feliz, quero sorrir.

Não quero lembrar, nem esquecer,

Nem pensar em me destruir.

Eu não sou eu, não me conheço,

isso é certo, não relego, não passo,

á frente da memória de ti, não esqueço,

o doce calor do teu regaço.

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O que está por vir?

Nós dois somos o mundo,

que fizemos no mundo que existe,

n'agrura e no agrado profundo,

de uma paixão que não desiste.

Nós os dois sem nos fazermos,

crescemos do fundo marcado,

por tudo o que nos inibe.

Eu creio que já nem somos,

pertença do mundo de alguém,

somos argila de barro,

moldados no que ninguém tem.

Mas se ainda, porém,

dúvidas vierem a surgir,

não desesperemos ninguém,

ainda está muito por vir.

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Ponho-te um fim.

Não seremos mais amantes,

Que esta união de suor,

Este toque de carne fervente,

Não é mais que um lume,

Um morrão aceso e vicioso...

Que me queima eternamente.

Não seremos mais amantes,

Que não mais suporto não ser amor,

Aquilo que o teu corpo sente,

E a paixão, uma emoção que se esfume,

Nas curvas de um corpo amoroso,

Que nunca será meu completamente!

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Vejo-te depois.

Não tenho outra alegria em mim,

ou por mim que seja,

que careça da necessidade de te sentir assim.

Não tenho outro alguém, que me dê calor, que me sorria,

que me cante ao ouvido, me dê vontade ou alegria.

Não há mais ninguém que faça sentido.

Que me traga, que me leve, que me pinte que me escreve,

que me doa e morra, no meu morrer de cada dia.

Não existe mais ninguém que assim se perderia.

Perdi, em tempos a vontade do meu viver,

vagueei por um negro e fundo horizonte,

e ninguém mais, (senão tu), me lançou uma escada,

uma estrada, um caminho, uma ponte.

E assim fechei-me, fechei-me…

fiquei mudo e surdo e inerte e deixei de ver,

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e nessa tristeza velada, levei os meus dias,

nessa cruzada me ía afogando no poço da demência,

onde rostos amargos e vozes de desespero,

habitavam e me assombravam sem clemência.

Mas por isto tudo, nada digas, não digas nada,

quando fores velha comida pela vida,

irás tomar este poema nas tuas mãos,

e sonharás, com o teu doce olhar,

nesse silêncio, de mim te irás lembrar,

e de todo o passado que viveste até aqui chegar.

Pois um homem apenas, amou a tua alma peregrina,

e lambeu o sal do teu rosto sulcado de lágrimas,

Mas não, não digas nada, não digas,

deixa estar.

Não percas palavras pela vontade de as dizer,

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vontade delicada, trémula, quase vã,

Não digas.

Não digas,

Que eu meu amor, que eu,

nunca te digo adeus, apenas até amanhã!

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Mais Almas que Uma.

Quando te vi nessa noite, eras só pele e calor,

quis sentir-te mais de perto, mas queimavas,

a vontade de te tocar,

com o mesmo fogo que te guardava.

Estendias-te ao alto, indolente, num esboço de pintor,

e nem eras carne, incendiavas apenas, tu queimavas,

teu reflexo, meu espírito, o próprio ar,

que respirava.

Que suplício de fogueira é este que me queima desta maneira,

me prende à cama na visão tua que se esfuma?

Os meus olhos enganam-me, e não te vejo,

e perdi a função viva de te sentir,

sei-te aí, nua em frente à lareira,

mas sei também que tenho mais almas que uma,

e perdi-te a figura, no calor do desejo,

adormeci pensando no que está por vir.

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Onde a ferida alastra.

Olhei hoje, por baixo da camisa,

e aí vi, uma ferida na carne.

Larga, vasta e profunda.

Nesse sítio, uma linda flor crescia.

Hoje, e agora, e durante todo o dia.

Virei-me a mostrar a ferida ao espelho,

e já não era eu, mas sim um velho.

e a ferida só por si,

dar-me-ia toda a força de que precisava,

Hoje, e agora e durante todo o tempo,

em que nem a vi.

Estou certo da sua coragem e dor,

enquanto crescia e fosse crescendo,

e de novo da ferida, uma flor nascia,

de algures, além do profundo devir.

Agora e já, e durante todo o dia.

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Flores belas que crescem com calma,

em canteiros de feridas que levamos para sempre,

e que agora, já e para sempre,

serão aquilo que chamamos de alma.

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É uma dor que nasce do amor.

Quero fazer-me crer,

num sonho que não sei sonhar,

uma batalha que me cansa,

só de existir.

Que fazer?

Que fazer?

Gritar, como os loucos da noite?

Sem ter ninguém por perto,

para estar, ou ouvir?

Deus, afundo-me na morte mansa,

sou desespero, martírio, loucura,

a espuma bafienta,

que escorre lenta, que não descansa.

Sou o esboço de um sorriso,

que de mim próprio se ri.

Sou covarde, egoísta, injusto,

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homem, poeta e louco,

e não vejo, não vejo,

que tantos, tantos outros,

estão aqui, onde nem os senti.

Mas por pouco, Meu Deus,

por pouco,

Fui vencedor por inteiro,

desta batalha eterna que sou eu.

Campo de sangue, onde exaustas,

se desfilam todas as lutas, que tenho p’ra desfilar,

qual bandeira, estandarte, qual estátua,

qual estátua, qual quê?

Qual desejo, ou amor,

ou amor, Meu Deus, que seja,

encosta um homem ao fio da navalha do seu fim?

Chega de noites assim,

onde a verdade da noite,

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não traz certezas para mim.

Onde a dor que é minha,

não chega a ser minha dor.

E para quê, Meu Deus, para quê?

Se tudo se foi, e nada se vê.

Se pago por tudo, por nada, por mim,

Ah sim!

E por tudo o que é mal ou bem,

e pela entrega que termina, ou não,

mas assim..

Assim, Meu Deus, só assim,

eu compreendo..

Que quero ser eu,

com todos ou só,

mas que ninguém me diga:

Meus Deus, que metes dó!

Ninguém me chame sem me chamar.

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Que eu, Meu Deus, que eu,

não chamo ninguém,

se não o amar.

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São estas as palavras.

Tenho-te para sempre, e se mais não posso,

não me importo, nem antes nem depois.

És minha, e a eternidade me sustenta.

As recordações também são vida,

e só por isso, por isso apenas e só.

Vivo os tristes dias que destroço,

em pedaços lânguidos de vida a dois.

Tua imagem é a maior força que me levanta,

e depois num choro mudo me reduz a pó.

Volta, eu imploro do fundo da minha tristeza merecida.

Sê minha de novo, como antes fomos.

Lê este poema, e relembra todos os momentos.

Não sou eu que te escrevo, é o meu amor,

é a poesia em mim que te devota perdão.

Eu acredito que como em tempos já foi, agora somos,

o culminar dos nossos mais puros sentimentos,

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parte de um sonho, uma vida, ou seja lá o que for,

sobretudo será, o fruto da nossa desmedida paixão.

Não envies estas palavras para o nada,

nelas destilo todo o meu ser.

Não troces delas, não as remetas ao fim.

Por elas, por tudo, por ti, pelo nosso amor,

tenho vivido os dias ocos da minha vida marcada,

pela imagem do teu olhar, do teu amor, do teu viver.

Sem ele sou mesmo nada, nada existe em mim,

excepto a perdição de viver sempre nesta imensa dor.

Eu vivo,

Eu acredito,

Eu sou,

Eu amo-te!

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Qualquer espécie de erotismo!

Tu és quem me diz tudo,

e por tudo o que me dizes, adoro-te,

o tudo que em ti se pode adorar.

Adoro-te no sol da manhã,

no doce toque do teu despertar.

Adoro-te nos meus sonhos,

quando me deito de noite,

e me ponho a sonhar.

Adoro o som do nosso amor,

o sentir quente da tua pele,

o encostar, o tocar, o roçar, o mexer,

as tremuras que sinto quando me tocas,

nele...

Adoro ferrar-te na boca,

quando te fazes sentir desejada,

adoro quando te fazes de saudosa,

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de triste, de furiosa, de mulher, de mulher..

Adoro quando te fazes de louca.

Adorava um dia violar-te morena do meu coração,

pegar em ti rasgar-te a roupa,

deitar-te no chão...

Adoro cada gesto, cada ondulação do teu cabelo,

quando és mulher, mulher, ai, mulher desejada.

Adoro cada palavra que digas,

mesmo quando te calas e não dizes nada.

Adoro cada ruga da tua pele,

cada eriçar do teu mais pequeno pêlo.

Adoro o bocejar, o gritar, o chorar, o sorrir,

o enrugar da testa quando pensas,

o prazer da tua boca, quando te estás a vir.

Adoro esses cantinhos malandros dos teus olhos,

a pele macia do teu rabo,

o desatino do teu olhar, quando começo,

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e não acabo.

Não quero outro passado que não este,

não quero, que não me diz nada,

teu canto lavou as minhas mágoas,

o teu sorriso limpou o meu caminho,

as tuas lágrimas enxugaram as minhas,

os teus braços nunca me deixaram sozinho,

e cada alegria que perdia eras tu quem as tinhas.

O teu corpo criou o meu desejo,

os teus cabelos aqueceram o meu coração,

os teus lábios abrigaram o meu beijo,

e nas tuas mãos acolheram-se as minhas.

Não quero outro futuro que nada me diga,

não quero outra vida de esperança,

outra vida sozinho, outra vida comigo,

que cansa, que cansa..

Quero-te a ti, diz-me tu, que és tu,

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em cada movimento, em cada toque,

em cada beijo, em cada sorriso,

em cada palavra, andar, desejo,

tristeza, fúria, desespero, morte.

Em cada Amor.

Diz-me tu, quando és mulher de corpo ardente,

quando és menina tímida, corada de decoro,

diz-me tu do meu presente,

que já nem é meu, é teu.

Do teu falar, do teu mexer, do teu rir,

do teu enervar, suar, do teu respirar,

do teu querer que seja assim, o que está por vir.

Diz-me tu do nosso ardor,

pois, que eu, por mim, perdi-me no teu calor,

e que mais posso dizer sobre o meu adorar,

pois se tudo teu, amor, mesmo tudo,

eu adoro, neste meu jeito de te amar

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O meu País.

Tentei ver luz no meu país perdido,

de rosto baixo, desolado, inerme,

pudesse eu deslizar para fora sem ruído,

deste chão sumir-me como faz um verme.

Quisera eu não ter cuidados,

e contentar-me em ser patriota no país que é meu,

não ter olhos ou ouvidos p'ra ver os pecados,

ou sentir bem fundo que o país morreu.

Não vale a pena fazer um gesto,

que nada consegue contra esta dor atroz.

Fazer por fazer não adianta, eu não presto,

e a sua morte lentamente me amordaça a voz.

Este medo de fazer há-de matar-me,

São anos inteiros de febre na cabeça,

e quanto mais o veja caindo a toda a pressa,

não encontro forma de adaptar-me.

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Adeus país, na ausência meses são anos.

Vou agora, mas volto com brevidade,

Não mais suporto ver-te comido em danos,

por aqueles que foram e nem deixam saudade.

Sou culpado, bem sei, tão grande culpado!

Fui eu quem assim te deixou,

sucumbir moribundo às mãos do potentado,

que de tudo fez, mas que nunca te amou.

Parto sim, mas levo a esperança,

de te encontrar de novo erguido e forte,

não te esqueci cá dentro, no coração de criança,

não deixarei nunca de lembrar da tua morte.

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Foi quando te vi.

É assim que a alma é.

Um lume egoísta que arde sem razão,

Na altura exata deste trapézio solto,

que balança apenas ao sabor de uma fé,

incendiada no momento daquela união,

de uma mente perdida e um coração revolto.

É assim que nasce o que é poesia.

Um dizer sem sentido, e de muito querer,

somado em tudo que nunca esqueci,

e aberto à luz ardente de um dia,

que fiz ser real pela vontade de o viver,

Aquele mesmo em que por acaso te vi.

É assim que a abraço, e assim deve ser.

Cada linha é um sopro, um desabafo, um suspiro,

uma palavra colocada no lugar de uma emoção.

É assim desta forma que te quero descrever,

Como uma ave assustada fechada num retiro,

No côncavo cerrado do meu coração.

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