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Departamento de Artes e Design
O DESIGN DA INFORMAÇÃO E O ESPAÇO FÍSICO DA PRÉ-ESCOLA EM
SÃO TOMÉ, ÁFRICA
Aluno: Carolina do Valle
Orientador: Rita Maria de Souza Couto
Coorientador: Eliane Jordy
Introdução
A presente pesquisa, que está sendo desenvolvida sob a orientação da Profa. Rita Couto no
âmbito do LIDE|DAD|PUC-RIO e faz parte do projeto de doutoramento em Design de Eliane
Jordy. Está vinculada ao eixo temático „Design em Situações de Ensino-aprendizagem‟, que é
uma linha de investigação inserida preferencialmente no campo acadêmico e que tem como
princípio básico a reflexão critica sobre objetos, sistemas e linguagens utilizados em ambientes
concretos ou mediados pela tecnologia onde, de alguma forma, se pretenda adquirir
conhecimentos.
O tema do trabalho é a ressignificação de espaços de pré-escolas em São Tomé e Príncipe,
na África. Essa está inserida no projeto de pesquisa “Educação Infantil: uma proposta de ação sob
o olhar do Design” 1, coordenado pela Profa. Dra. Rita Maria de Souza Couto, realizada em
parceria com o DAD/LIDE/PUC-Rio, o Ministério de Educação, Cultura e Ciência e a UNICEF
de São Tomé e Príncipe.
No âmbito da pesquisa foram desenvolvidas peças gráficas tais como infográficos, paletas
de estudo de cor e um mapa de posicionamento, a fim de transmitir com maior clareza as
informações relacionadas ao objetivo central da tese de dotar o espaço da pré-escola de elementos
de coerência com a paisagem circundante, não deixando de lado os aspectos funcionais, técnicos,
ergonômicos, estéticos, econômicos e sociais.
Com o objetivo de dar visibilidade às imagens fotográficas, entrevistas, áudios e textos –
uma mescla de linguagens (textual, imagética, gráfica) produzidas durante o processo de
ressignificação e requalificação dos espaços físicos, foi importante a adoção de alguns conceitos
que auxiliaram na composição para evitar a confusão visual e permitir uma comunicação
eficiente diante do conteúdo proposto.
Justificativa
Na contemporaneidade, a epistemologia do Design caminha em direção a renovação das
questões sociais, interconectando-se com outros campos teóricos e práticos em relações de trocas,
superposições e fusões. O estudo proposto está condizente com essa revisão de paradigma ao
1 O projeto tem por objetivo o desenvolvimento de conteúdos para a Educação pré-escolar de
crianças; o detalhamento de metodologia de ensino adequada a esse segmento; a elaboração de
materiais educativos; o oferecimento de capacitação para educadores e auxiliares e a
ressignificação dos espaços físicos de pré-escolas de São Tomé e Príncipe.
buscar trazer novos ares diante do contexto atual considerando também as dimensões física,
cultural e lúdica do ser humano. Neste cenário são apontadas as confluências entre este campo de
atividade e saber, considerado na sua forma mais ampla. Possibilitando amplitude ao Design
como um campo de conhecimento que vai além dos objetos projetados, para ser compreendido
como uma prática social de maior abrangência.
Em termos históricos, o grande trabalho do design tem sido ajustar conexões entre coisas
que antes eram desconexas. Hoje chamamos isso de projetar interfaces. Trata-se,
contudo, de um processo bem maior e mais abrangente do que imagina o projetista
sentado à sua estação de trabalho. A parte de cada um é entender sua parte no todo.
(CARDOSO, 2012, p.44).
Como colocado pelo autor, a grande área de abrangência do Design permite incluir
profissionais de outras áreas tornando o objeto projetado cada vez mais elaborado, eficaz e direto.
Dado ao fato do Design ser um campo amplo que conjuga conhecimentos e contribuições de
várias áreas do conhecimento, permitindo uma visão abrangente no desenvolvimento de projetos
que atendam às mais variadas necessidades. Como atividade de múltiplas abordagens, ele é um
campo fecundo para maximizar os objetivos de um projeto e atuar em diversas ênfases.
Na busca do aperfeiçoamento dos mecanismos de ensino na educação atual, o emprego do
processo do design tem papel importante quando bem empregado e trabalhado junto à
comunidade e a própria escola. Esse trabalho teria como objetivo incentivar a criatividade,
organização e tornar o momento da aprendizagem mais divertido e compreensível.
Design é uma metodologia poderosa de pensamento e resolução de problemas. Muitas
vezes percebido como o resultado „cosmético‟, na verdade é processo exploratório que
está por trás. Neste sentido, o resultado visual é a manifestação da nossa capacidade de
sintetizar nossas pesquisas e achados e criar soluções realmente bonitas, relevantes,
eficientes e que, de alguma forma, refletem a comunidade para a qual o problema está
sendo resolvido.2 (informação verbal).
Vindo ao encontro das ideias acima esboçadas, o projeto gráfico sobre a Ressignificação de
espaços de pré-escolas, objeto de estudo da presente pesquisa, foi conceituado como um material
que reunirá e disponibilizará para o campo acadêmico, e para a sociedade em geral, reflexões
sobre as relações entre a ressignificação do espaço, projetos e objetivos educacionais que, na
maior parte dos casos, ainda são pouco estudadas.
O estudo visa levantar discussões relacionadas ao Design e a Educação, e aborda espaço
físico interno e externo de pré-escolas como um espaço vivo, promotor de convivência e
experiências. Para tanto, fizemos breves considerações sobre a relevância do espaço da pré-
escola, ao oferecer as condições necessárias ao desenvolvimento das crianças, possibilitando que
as mesmas tenham um bom aproveitamento ao desenvolver atividades individuais e de grupo.
Neste sentido, educar está associado ao espaço vivido na infância – não sendo apenas onde se
aprende a ler e a escrever –, mas abrigo para a criação e inúmeras descobertas ao proporcionar às
crianças vivenciarem experiências significativas. Segundo Jordy (2014), o aprendizado da criança
2 Frase de Viktor Venson, criador do projeto No right brain left behind.
desenvolve-se ligado á observação e investigação do mundo. Por isso, quanto mais a criança
explora as coisas do mundo, mais ela é capaz de relacionar fatos e ideias, escolher seus
intercessores, falar, ver, pensar, trocar, compreender e compartilhar.
Um espaço feito para as crianças desenvolverem suas potencialidades não precisa ser um
prédio sofisticado, nem apenas uma edificação ordenada e limpa, mas é recomendável que esteja
dotado de condições físicas e instalações adequadas, e que fatores como ventilação, iluminação,
organização espacial, materiais educativos e mobiliário estejam de acordo com as condições de
acomodação do corpo da criança.
Horn (2004) enfatiza essa ideia ao dizer que ao dizer que é “no espaço da escola que a
criança consegue estabelecer relações entre o mundo e as pessoas, Devendo o espaço ser visto
como algo conjugado ao ambiente e vice versa” (HORN, 2004, p. 28). Todavia, segundo o autor,
essa relação não se constitui de forma linear. Assim sendo, em um mesmo espaço podemos ter
ambientes diferentes, pois a semelhança entre eles não significa que sejam iguais. Eles se
definem com a relação que as pessoas constroem entre elas e o espaço organizado.” (HORN,
2004, p. 28).
Todos os espaços da escola têm sua relevância individual para o aprendizado, no entanto ao
seccioná-los, assim como com as disciplinas em áreas do conhecimento, distanciamos o desenho
curricular proposto da ideia de integralidade tão necessária à Educação. O gráfico 1, propõe que o
espaço físico da edificação escolar se posicione no centro se ramifique em direção ao currículo,
aos projetos pedagógicos, materiais didáticos e educativos, metodologia e a filosofia da escola-
como conexões e campos de atuação. Cunha (2001, p.20) alerta que “é da adequada interação dos
recursos humanos e materiais com as práticas pedagógicas, que a escola ganha a sua maior
eficácia na ação educativa”. Afinal, se vivemos em espaços múltiplos e sendo seres complexos,
como e por que dividir para ensinar? Esse é um modelo que gera padronização e dispõe de pouca
disponibilidade para a interação no acontecimento pedagógico.
Devido ao contexto insular de São Tomé e Príncipe, não se trata apenas de garantir
oportunidades educacionais, mas segundo Moraes (2002, p.13), “promover o alcance de padrões
mínimos de funcionamento” dos espaços de pré-escola com o objetivo de assegurar
oportunidades de aprendizagem das crianças.
Neste cenário, o Design se insere buscando adaptar interface às necessidades desses
usuários. Essas necessidades nada mais são do que “a situação de dependência de um individuo
em relação a sociedade, ao meio ambiente e aos objetos e instrumentos necessários à vida”.
(COELHO, 2008, p.77).
Método
A metodologia adotada para o projeto - que busca a aproximação e o diálogo entre o Design
e a Educação - foi a pesquisa exploratória. A pesquisa reúne uma equipe composta por designers,
educadores, arte/educadora, psicopedagoga para acompanhamento do processo e revisão dos
materiais desenvolvidos. O processo metodológico aplicado consistiu na técnica de coleta de
dados por meio de viagens realizadas pelos pesquisadores/integrantes do LIDE. Essa técnica foi
considerada por possibilitar o conhecimento do ambiente de São Tomé e Príncipe, na África,
como fonte direta de informações. Tais viagens serviram para, entre outras coisas, manter
“contato direto com a situação estudada, procurando compreender os fenômenos segundo a
perspectiva dos pesquisadores, sujeitos/participantes” (GIL, 1991, p.46).
Foi realizado também coleta de dados com levantamento bibliográfico e análise documental
concernente a fundamentação e às práticas. Na segunda fase foram realizadas análise e
interpretação dos dados coletados apontando os itens a serem projetados e os materiais adequados
ao projeto.
Após os primeiros passos da pesquisa bibliográfica para aprofundamento do problema de
projeto, a fundamentação contou com uma análise de similares para possibilitar uma maior
aproximação do objeto de pesquisa desenvolvido e do público alvo, crianças de 4 a 5 anos de
idade. O estudo de similares se constituiu como uma etapa importante para conhecimento de
outros objetos que pudessem contribuir com a pesquisa.
Semanalmente é realizada uma reunião de planejamento, organização, análise e definição
de tarefas para a realização do projeto.
Objetivo
Em meio a tantas informações e material fotográfico, a necessidade de uma interface
gráfica para organizar e compilar se fez necessária para que todos esses dados fossem facilmente
entendidos por pessoas que não estão envolvidas no projeto ou para a apresentação desses para os
parceiros.
Partindo dessa ideia, o projeto visa organizar e estudar informações, utilizando as
ferramentas da multidisciplinaridade do Design, como fator integrador e potencializador, que nos
permite atuar em todos os campos envolvidos. Tudo isso, com o objetivo de organizar as
informações de pesquisa e de processo para que se tornem claras, estéticas, precisas e visuais,
dando visibilidade apenas às informações relevantes.
Material Gráfico
A partir dos registros fotográficos desenvolvemos um infográfico com o passo a passo da
ressignificação do espaço de leitura e gráficos; além disso, foram feitos estudos que nos permitiu
compreender alguns fenômenos de uso de cores nas escolas; marcações das modificações sofridas
no espaço diante da requalificação que possibilitaram - mais que planejamento e organização – a
ressignificação dos espaços tornando-os propícios ao convívio. Todo o estudo teve a intenção de
tornar o processo mais visual e inteligível.
Infográfico
Durante a requalificação do espaço do Jardim de Infância Primeiro de Maio, em São Tomé,
surgiu a necessidade de reconstrução do telhado. O novo telhado deu nova forma a um corredor
de passagem entre os pátios e as casas de banho3. Como a escola não contava com nenhum lugar
próprio para as crianças manusearem livros de uma forma lúdica, ali nasceu o espaço de leitura.
3 Nome dado aos banheiros de São Tomé e Príncipe.
O Espaço de leitura surge com a intenção de oportunizar às crianças uma convivência e
contato com livros em seu cotidiano escolar, para que, desse convívio elas possam partilhar
práticas de leitura. A escola é feita de tempos e espaços e, muitas vezes, no processo de se
constituir leitor, mesmo crianças pequenas precisam ousar o contato com variados tipos de livros
e imagens.
A escolha do infográfico se deu por conta da necessidade do projeto em registrar uma
quantidade de informação e imagem. O infográfico que permite a síntese dessa ressignificação se
deu pela possibilidade da mistura de texto e fotos, mostrando apenas os dados mais relevantes e
da transmissão visual da informação, o que facilita o entendimento do conteúdo. O Infográfico
produzido contempla o passo-a-passo da construção do espaço de leitura como foi descrito acima.
Figura 1: Infográfico
Fotos com marcações
Para a melhor visualização das mudanças ocorridas durante a ressifignicação dos espaços,
organizamos as fotos das escolas em antes e depois. Após isso, marcamos nas fotos classificadas
como “antes” todas as mudanças, definidas em conjunto com o parceiro, que ocorreriam naquele
local. Nessa categoria optamos por um layer que se assemelha a um papel manteiga, sobre o qual
foram feitas marcações com desenhos e registros das considerações sobre a requalificação do
espaço com tipografia manual. Acreditamos que assim, o leitor entenderia essa etapa como um
processo em andamento. Nas fotos classificadas como “depois” usamos elementos de cor que
ressaltam as mudanças feitas, direcionando o olhar do observador para os pontos da foto que
foram ressignificados.
Figura 2 e 3: Fotos da escola Primeiro de Maio classificadas como “antes”: Requalificação
das sanitas, dos brinquedos e construção do telhado
Figura 5 e 6: Fotos da escola Primeiro de Maio classificadas como “depois” - Sanitas e
brinquedos requalificadas, e telhado construído.
Gráfico
A partir do que foi observado durante as visitas se fez necessário mapear a relação entre os
agentes presentes na vida das crianças que estudam nas escolas que atuam sobre o espaço físico
em que essas crianças aprendem. Pensando nisso, desenvolvemos um mapa de posicionamento
dos agentes atuantes no espaço da escola. Inicialmente, o representamos utilizando cores e
tamanhos de circulo diferentes dependendo de sua força de atuação e proximidade do centro do
estudo, o espaço físico. Com o tempo, notamos que essa representação gerava uma estratificação
entre os agentes atuantes que não nos era favorável para o estudo, e por isso, geramos um
segundo mapa apenas com palavras, em que o objeto central do estudo se encontra em bold,
enquanto todos os outros termos se encontram equiparados, com a mesma cor e peso, e que
acreditamos ilustrar melhor o esquema de influência.
Gráfico 1: Posicionamento de elementos
Gráfico 2: Revisão do posicionamento de elementos
Paletas de cor
Com o intuito de entender a aplicação das cores no ambiente escolar e reforçar a influência
do ambiente exterior nas salas de aula, desenvolvemos um estudo de cores a partir de fotos
tiradas durante a viagem empreendida para São Tomé e Príncipe e as comparamos com as cores
usadas nas escolas. Notamos que há uma presença muito forte de cores como os azuis, verdes,
amarelos e rosas com seus matizes e nuances, no ambiente escolar e que essas são frequentes
também na paisagem circundante do espaço insular.
Figura 7: Paletas paisagem a beira mar e criança sãotomense
Figura 8: Corredor da escola Monte Café
Conclusão
O design gráfico no contexto do projeto serviu como ferramenta para a compilação e
organização de ideias, dando destaque ao conteúdo e a sua apresentação. Dessa forma, a
preocupação foi não só para o que se diz, mas também para como se está sendo dito, no intuito de
potencializar e otimizar a captação da mensagem, sem que o público tenha que buscar outras
fontes para entendê-la. Além da organização e facilitação de entendimento, tornou possível a
aplicação desse conteúdo em ambientes digitais e analógicos.
O trabalho acima descrito tem por diretriz o entendimento de que o espaço físico da escola
não é só um pano de fundo para as aprendizagens, mas deve ser visto como um elemento que
interfere diretamente nas aquisições das crianças, sendo, inclusive, palco de experiências
educacionais, como interlocutor, como educador.
Referências
GIL, A.C. 1991. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Atlas.
CUNHA, José Ronaldo Alves da; Esteves, Ricardo Grisólia. 2001. Manual prático do mobiliário
escolar. São Paulo: Associação Brasileira das Indústrias de Móveis Escolares.
HORN, Maria da Graça de Souza. 2004. Sabores, cores, sons, aromas. A organização dos
espaços na educação infantil. Porto Alegre: Artmed.
MORAES, Karla Motta Kiffer. 2006. Padrões mínimos de funcionamento da escola do ensino
fundamental: ambiente físico escolar: guia de consulta. Brasília.
COELHO, Luiz Antônio L. 2008. Conceitos-chave em Design. São Paulo: Novas Ideias.
CARDOSO, Rafael. 2012. Design para um mundo complexo. São Paulo: Cosac Naify
JORDY, Eliane. 2014. Ponto de partida para um diálogo entre o design e a educação – o design
em parceria em ação. In: COUTO, Rita Maria de Souza (Org.). Design em Situações de Ensino-
Aprendizagem: 20 anos de pesquisa no Laboratório Interdisciplinar de Design/Educação. Rio de
Janeiro: Rio books.
No Right Brain Left Behind. Disponível em <http://nrblb.org/>. Acessado em: 17/06/2015