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Universidade Federal do Rio de Janeiro
O CRUZAMENTO VOCABULAR FORMADO POR ANTROPÔNIMOS: ANÁLISE
MORFOLÓGICA E FONOLÓGICA
Vitória Benfica da Silva
2019
O CRUZAMENTO VOCABULAR FORMADO POR ANTROPÔNIMOS: ANÁLISE
MORFOLÓGICA E FONOLÓGICA
Vitória Benfica da Silva
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa
de Pós-Graduação em Letras Vernáculas, da
Universidade Federal do Rio de Janeiro como
quesito para a obtenção do título de Mestre em
Letras Vernáculas (Língua Portuguesa).
Orientador: Prof. Doutor Carlos Alexandre Victorio
Gonçalves.
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2019
O CRUZAMENTO VOCABULAR FORMADO POR ANTROPÔNIMOS: ANÁLISE
MORFOLÓGICA E FONOLÓGICA
Vitória Benfica da Silva
Orientador: Prof. Doutor Carlos Alexandre Victorio Gonçalves.
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas
da Universidade Federal do Rio de Janeiro como quesito para a obtenção do Título de Mestre
em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa).
EXAMINADA POR:
______________________________________________________________________
Professor Doutor Carlos Alexandre V. Gonçalves – Programa de Letras Vernáculas – UFRJ
Orientador
______________________________________________________________________
Professora Doutora Kátia Emmerick Andrade – UFRRJ/UFRJ
_____________________________________________________________________
Professor Doutor Roberto Botelho Rondinini – UFRRJ/UFRJ
______________________________________________________________________
Professor João Carlos Tavares da Silva – UFRJ/UFRJ
______________________________________________________________________
Professor Vítor de Moura Vivas – IFRJ/UFRJ
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2019
À minha família que tanto amo.
AGRADECIMENTOS
Antes de tudo, agradeço a Deus por ter me guiado até aqui e me sustentado com tanto
amor. Agradeço não só por minhas conquistas, mas também pelo milagre que é a minha vida!
Milagre, inclusive, que foi a motivação do antropônimo dado a mim.
Sou imensamente grata também a minha família, que tem me acompanhado desde o
princípio da jornada acadêmica. Aos meus pais, João Alexandre e Lucireny, agradeço por
todo o apoio e incentivo de sempre; à minha irmã, Sara, por ser um verdadeiro exemplo e por
estar ao meu lado em qualquer situação. Agradeço ao Caio Max, meu namorado, pela ajuda
constante e companhia, que fazem muita diferença nos meus dias; à minha avó, Judith, por
zelar por mim nessa caminhada; e ao meu cunhado, Thiago, sempre solícito no que for
preciso. Vocês são meu suporte!
Meus parentes, mesmo quando de longe, também são muito especiais, sempre se
mostrando satisfeitos com a minha felicidade. E além da minha família biológica, sou grata a
minha família em Cristo, que muito significa para mim.
A todos os meus amigos, que tornam minha vida mais agradável, minha mais sincera
gratidão. Entre esses, destaco Pâmela e Rodrigo, que me acompanharam desde o início do
mestrado, compartilhando as alegrias e aflições do curso.
Em especial, agradeço ao prof. Dr. Carlos Alexandre Gonçalves. Obrigada por me
apresentar de maneira mais tangível o caráter científico dos estudos linguísticos e por me
mostrar a beleza que há nos dados de uma pesquisa. Agradeço também por toda dedicação e
atenção durante esse período! Nunca imaginei ter o privilégio de ser orientada por quem
orientou grandes profissionais que admiro.
Reconheço, inclusive, o valor de todos professores que me ajudaram a construir as
bases para chegar até aqui, como os professores Dr. Roberto Botelho Rondinini e Dra. Kátia
Emmerick Andrade, por quem tenho um grande apreço. Vocês me ajudaram a trilhar esse
caminho!
Por fim, agradeço à CAPES pela bolsa concedida no período do mestrado.
Encerro este momento com o trecho de uma ilustre obra que me deu calmaria nos
momentos de tribulação e me impulsionou a não desistir: "Damos-te graças, ó Deus, damos-te
graças, pois perto está o teu nome; todos falam dos teus feitos maravilhosos." (Salmos 75:1).
Quem reflita um bocado sobre uma palavra há de perceber que mistério poderoso se entocaia
nas sílabas dela. Tive um amigo que às vezes, até na rua, parava, nem podia respirar mais,
imaginando, suponhamos, na palavra "batata". "Ba" que ele, "ta" repetia, "ta" assombrado.
Gostosissimamente assombrado. De fato, a palavra pensada assim não quer dizer nada, não dá
imagem. Mas vive por si, as sílabas são entidades grandiosas, impregnadas do mistério do
mundo. A sensação é formidável.
Mário de Andrade
(Memória e assombração. In:______. Os filhos da Candinha. São Paulo, Martins: 1964,
p.161)
RESUMO
O CRUZAMENTO VOCABULAR FORMADO POR ANTROPÔNIMOS: ANÁLISE
MORFOLÓGICA E FONOLÓGICA
Vitória Benfica da Silva
Orientador: Prof. Doutor Carlos Alexandre Victorio Gonçalves.
Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras
Vernáculas, Faculdades de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos
requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas – Língua
Portuguesa.
O presente trabalho tem como objetivo principal analisar o cruzamento vocabular, processo
de formação de palavras que tem como base outras duas palavras já existentes na língua, a
exemplo de chafé (< chá + café), cujo produto final não só determina um novo significado
como também reproduz os das bases. Focalizamos, no entanto, um corpus diferenciado, não
investigado anteriormente: cruzamento vocabular formado por, pelo menos, uma base
antroponímica. Desse modo, nos baseamos tanto em estudos sobre o cruzamento vocabular –
Gonçalves (2003, 2006, 2016) e Andrade (2008, 2009) – quanto naqueles sobre a
antroponímia – Cassier (1985), Dick (1987) e Soledade (2012). Com esse perfil de corpus,
coletamos dados de quatro categorias distintas: (i) antropônimos acrescidos de qualificador,
como Imbeciro (< imbecil + Ciro); (ii) shippagem, a exemplo de Brumar (< Bruna +
Neymar); (iii) nomes de batismo, como Ivedro (< Ivana + Pedro) e (iv) oniônimos de bases
antroponímicas, como em Veterimário (< veterinário + Mário). Os resultados apontam para
diferentes padrões de formação em cada grupo, além de um forte valor expressivo dos
antropônimos, de modo geral.
Palavras-chave: morfologia; fonologia; cruzamento vocabular; antropônimos.
ABSTRACT
THE LEXICAL BLEND FORMED BY ANTHROPONYMS: A MORPHOLOGICAL AND
PHONOLOGICAL ANALYSIS
Vitória Benfica da Silva
Advisor: Prof. Doutor Carlos Alexandre Victorio Gonçalves.
Abstract da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras
Vernáculas, Faculdades de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos
requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas – Língua
Portuguesa.
The main objective of this work is to analyze lexical blend, a process of word formation based
on two other words already present in the language, such as chafé (< chá “tea” + café
“coffee”), whose final product not only determines a new meaning but also reproduces those
of the bases. We focus, however, on a differentiated corpus, not previously investigated:
lexical blend formed by at least an anthroponymic basis. Thus, we base ourselves on studies
on the lexical blend – Gonçalves (2003, 2006, 2016) and Andrade (2008, 2009) – and on
those on anthroponyms – Cassier (1985), Dick (1987) and Soledade (2012). With this corpus
profile, we collect datas from four distinct categories: (i) anthroponyms plus qualifier, such as
Imbeciro (< imbecile + Ciro); (ii) shipping, like Brumar (< Bruna + Neymar); (iii) baptismal
names, such as Ivedro (< Ivana + Pedro) and (iv) “oniônimos” with anthroponymic bases,
such as Veterimário (< veterinary + Mário). The results point to different training patterns in
each group, as well as a strong expressive value of anthroponyms, in general.
Keywords: morphology; phonology; lexical blend; anthroponyms.
SUMÁRIO
LISTA DE SIGLAS ........................................................................................................................ 11
LISTA DE DIAGRAMAS .............................................................................................................. 12
LISTA DE IMAGENS .................................................................................................................... 13
LISTA DE QUADROS ................................................................................................................... 14
1. INTRODUÇÃO........................................................................................................................... 15
2. ENFOQUES SOBRE O CRUZAMENTO VOCABULAR ........................................................ 18
2.1 DEFINIÇÃO E TIPOLOGIA .................................................................................................. 18
2.1.1 Definição ......................................................................................................................... 18
2.1.2 Tipologia ......................................................................................................................... 20
2.2 VALOR EXPRESSIVO .......................................................................................................... 28
2.3 O CRUZAMENTO VOCABULAR FRENTE A OUTROS PROCESSOS MORFOLÓGICOS 35
2.3.1 Composição ..................................................................................................................... 36
2.3.2 Recomposição ................................................................................................................. 43
2.3.3. Hipocorização ................................................................................................................ 44
2.3.4 Siglagem .......................................................................................................................... 45
3. ABORDAGENS SOBRE A ANTROPONÍMIA ........................................................................ 49
3.1 DEFINIÇÃO E ASPECTOS INTRODUTÓRIOS ................................................................... 49
3.2 PERSPECTIVAS DE ESTUDO .............................................................................................. 53
3.2.1 Motivação ....................................................................................................................... 53
3.2.2 Semântica ........................................................................................................................ 55
3.2.3 Neológica ......................................................................................................................... 58
3.2.4 Morfológica ..................................................................................................................... 59
4. ANÁLISE DE DADOS ............................................................................................................... 62
4.1 ANTROPÔNIMO ACRESCIDO DE QUALIFICADOR ......................................................... 63
4.1.1 Apresentação do corpus .................................................................................................. 63
4.1.2 Análise do grupo antropônimo acrescido de qualificador ............................................... 69
4.2 SHIPPAGEM .......................................................................................................................... 83
4.2.1 O fenômeno ..................................................................................................................... 83
4.2.2 Apresentação do corpus .................................................................................................. 96
4.2.3 Análise do grupo shippagem ......................................................................................... 100
4.2.4 Um paralelo entre o cruzamento vocabular de bases antroponímicas (ships) e a
siglagem ................................................................................................................................. 107
4.3 NOMES DE BATISMO ........................................................................................................ 110
4.3.1 Apresentação do corpus ................................................................................................ 110
4.3.2 Análise do grupo nomes de batismo .............................................................................. 118
4.3.3 Um paralelo entre o cruzamento vocabular de bases antroponímicas (nomes de
batismo) e a hipocorização .................................................................................................... 123
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................... 128
REFERÊNCIAS DAS IMAGENS ................................................................................................ 132
REFERÊNCIAS............................................................................................................................ 134
ANEXOS ....................................................................................................................................... 137
ANEXO I – Antropônimo acrescido de qualificador .................................................................... 137
ANEXO II – Shippagem ............................................................................................................. 148
ANEXO III – Nome de batismo .................................................................................................. 166
ANEXO IV – Oniônimo de bases antroponímicas ....................................................................... 184
11
LISTA DE SIGLAS
CV – Cruzamento vocabular
BL – Blend Lexical (termo em inglês para cruzamento vocabular)
SSL – Substituição Sublexical
PWd – Prosodic Word (termo em inglês para palavra prosódica)
PWd* – Complex Prosodic Word (termo em inglês para palavra prosódica complexa)
MWd – Morfologic Word (termo em inglês para palavra morfológica)
MWd* – Complex Morfologic Word (termo em inglês para palavra morfológica
complexa)
DT-DM – Determinante-Determinado
12
LISTA DE DIAGRAMAS
Diagrama 1: Representação da ambimorfemia........................................................ 21
Diagrama 2: Representação da palavra prosódica (PWd) ...................................... 40
Diagrama 3: Categorização dos antropônimos........................................................ 50
Diagrama 4: Representação da quebra no cruzamento monossilábico................... 71
Diagrama 5: Representação da quebra na combinação truncada............................. 73
Diagrama 6: Representação da quebra na interposição lexical................................ 73
Diagrama 7: Representação de um segmento não aproveitado na interposição
lexical......................................................................................................................... 74
Diagrama 8: Representação da quebra na combinação truncada............................. 75
Diagrama 9: Representação do continuum entre os grupos do corpus.................... 130
13
LISTA DE IMAGENS
Imagem 1: Dilmais (Meme postado no Facebook)................................................... 66
Imagem 2: Dilmais (Postagem no Twitter)............................................................... 66
Imagem 3: Prólogo de uma fanfic do site Spirit Fanfics e Histórias........................ 85
Imagem 4: Brumar (Título de matéria da Ig)............................................................ 86
Imagem 5: Jorena (Postagem no Facebook)............................................................. 86
Imagem 6: Casal da ficção para a vida real (Matéria do Gshow)............................. 87
Imagem 7: Semi – Ship de amizade........................................................................... 89
Imagem 8: Ships de casais improváveis ou impossíveis........................................... 90
Imagem 9: Brincadeira de formar ships.................................................................... 92
Imagem 10: Enquete envolvendo ship....................................................................... 93
Imagem 11: Aplicativo gerador de ships................................................................... 94
Imagem 12: Johnlock – Exemplo de slash ship........................................................ 97
Imagem 13: Clanessa – Exemplo de femslash ship.................................................. 98
Imagem 14: Geronnik – Uso representativo de ‘união de jogo................................. 99
Imagem 15: Teste entre diferentes possibilidades de ordem nas bases dos ships..... 101
Imagem 16: Mart’nália e Analimar (Matéria da revista Quem)............................... 111
Imagem 17: Brincadeira de junção de nomes............................................................ 112
Imagem 18: Derick – Exemplo de nome não considerado neológico....................... 113
Imagem 19: Exemplos de junção de nomes que não correspondem ao cruzamento
vocabular.................................................................................................................... 116
14
LISTA DE QUADROS
Quadro 1: Tipologia do cruzamento vocabular por diferentes autores..................... 28
Quadro 2: Comparação entre a composição e o cruzamentovocabular..................... 43
Quadro 3: Padrões da hipocorização......................................................................... 45
Quadro 4: Processo ocorrido na reanálise................................................................. 80
Quadro 5: Distribuição quantitativa da estrutura dos ships....................................... 106
Quadro 6: Comparação entre a siglagem e o cruzamento vocabular........................ 110
Quadro 7: Distribuição quantitativa da estrutura dos nomes de batismo................. 123
Quadro 8: Comparação entre a hipocorização e o cruzamento vocabular................ 126
15
1. INTRODUÇÃO
Uma das mais instigantes características da língua é a sua dinamicidade, e o
vocabulário do Português Brasileiro é exemplo incontestável disso. Ao passar por
constantes atualizações, palavras são reinventadas a todo momento, além de outras
serem criadas a depender do contexto sócio-comunicativo, o que nos leva a concluir que
o vocabulário de uma língua está longe de se refletir apenas aos dicionários.
A formação de palavras no Português é, em maior escala, pautada em processos
aglutinativos, como afirma Gonçalves (2006), a exemplo da composição (guarda-
chuva) e da afixação (feliz-mente), cujas palavras são caracterizadas pelo encadeamento
estrito de suas partes, ou seja, um morfema começa no exato ponto em que o anterior
acaba.
Há, no entanto, processos chamados não concatenativos, em que essa linearidade
não se verifica. Neles, “a sucessão linear dos elementos morfológicos pode ser rompida
por reduções, fusões, intercalações ou repetições, de modo que uma informação
morfológica não necessariamente se inicia no ponto que outra termina” (GONÇALVES,
2016, p.68). Enquadram-se nesta definição processos como o cruzamento vocabular
(aborrescente), a hipocorização (Cadu) e a siglagem (FUNAI), entre outros.
O objeto de estudo focalizado nesta dissertação é o cruzamento vocabular,
processo criativo que forma palavras por meio de outras já existentes na língua, a
exemplo de chafé (< chá + café), chocotone (< chocolate + panetone) e portunhol (<
português + espanhol). Esse processo vem sendo estudado no português brasileiro por
Gonçalves (2003, 2006, 2016), Andrade (2008, 2009), Almeida (2006), entre não
muitos outros linguistas que se propõem a analisar os cruzamentos por diferentes
perspectivas. Essas pesquisas revelam o quão produtivas têm sido essas formações e o
quão interessante é a sua análise.
Diante de um vasto levantamento de corpora apresentado pelos autores,
encontramos dados ainda não estudados e bastante numerosos: os cruzamentos
formados por antropônimos que, assim sendo, compõem o corpus desta pesquisa. O
presente trabalho busca, então, analisar mesclas em que, pelo menos, uma das bases seja
um antropônimo, como ocorre em Ruimbinho (< ruim + Rubinho), Brumar (< Bruna +
Neymar), Lucireny (< Lucia + Ireny) e veterimário (< veterinário + Mário).
Se o cruzamento vocabular já não recebe muita atenção nos manuais de
morfologia em geral, mais raramente ainda dados como esses são analisados. O fato de
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não haver trabalhos anteriores que tenham traçado a intercessão do cruzamento
vocabular com a antroponímia caracteriza o ineditismo desta pesquisa. Além de dados
ouvidos em situações espontâneas, o corpus desta dissertação tem a internet como fonte
principal, a saber (a) redes sociais, como Facebook, Instagram e Twitter; (b) revistas e
jornais online; (c) blogs sobre diferentes temáticas, como fanfics, séries etc.; e (d) listas
de nomes.
A literatura morfológica de cunho tradicional apresenta o cruzamento vocabular
como um processo marginal de formação de palavras e, geralmente, não se dedica a
descrevê-lo com detalhes. E, diante de uma análise superficial, os cruzamentos são
apresentados como arbitrários (ALVES, 1994). Os estudos de Gonçalves (2003, 2006) e
Andrade (2008, 2009), no entanto, provam que essa descrição não corresponde ao
fenômeno e explicam que são assim descritos por não serem tratados adequadamente
pela morfologia pura, ao passo que o tratamento mais compatível é a interface
morfologia-prosódia.
Entendendo que o cruzamento vocabular não é arbitrário, pretendemos descrever
um corpus totalmente inédito, formado por antropônimos a serviço de, pelo menos,
quatro funções:
(a) expressão de ponto de vista, como em Bolsolixo (< Bolsonaro + lixo);
(b) nomeação expressiva de pares românticos, como em Judrigo (< Juliana + Rodrigo);
(c) formação de outro antropônimo, desta feita complexo, a exemplo de Marelisa (<
Osmar + Elisa);
(d) criação de oniônimos (nomes comerciais), na esteira de Paulufusos (< Paulo +
parafusos).
Objetivamos, então, analisar os quatro grupos do corpus selecionado em prol de
(i) investigar o comportamento morfológico e fonológico dos quatro grupos; (ii)
observar se os padrões estruturais são os mesmos para cada grupo do corpus; (iii)
examinar qual tipo de CV é o mais produtivo entre os dados; e (iv) checar quais
processos morfológicos se assemelham mais ao CV em cada grupo.
Além da análise sobre o cruzamento vocabular, faz-se necessário também o
estudo na área da antroponímia do Português Brasileiro em prol de verificar quais
contribuições esse ramo da Linguística oferece para a análise do fenômeno em questão,
17
visto que a presença de um antropônimo, enfatizamos, é condição necessária para
integrar o corpus deste estudo. Nesse viés, serão extremamente relevantes para o
trabalho discussões sobre a motivação e o significado na escolha de nomes
personativos, além dos aspectos presentes nos antropônimos neológicos, que são vistos
em Dick (1987) e revisados por Obata (1994) e Camara (2008), entre outros.
O presente trabalho é dividido da seguinte maneira: nos capítulos 2 e 3,
apresentamos uma revisão bibliográfica do cruzamento vocabular e da antroponímia,
respectivamente; no capítulo 4, efetuamos a análise dos dados coletados; no quinto
capítulo, expomos as considerações finais a que chegamos; e, por fim, apresentamos as
referências bibliográficas e anexos.
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2. ENFOQUES SOBRE O CRUZAMENTO VOCABULAR
O processo de formação de palavras intitulado cruzamento vocabular não é
descrito na língua de forma homogênea, a começar pelos diferentes nomes referentes a
ele, tal como Contaminação (BASILIO, 2003), Fusão vocabular (BASILIO, 2005),
Combinação (BECHARA, 2009); Palavra cabide (SANDMANN, 1991), Composição
haplológica (SANDMANN, 1991), Amálgama (AZEREDO, 2000), entre outros.
Embora não esteja presente nos livros didáticos de Língua Portuguesa nem
chame a atenção de tantos estudiosos da língua, o cruzamento vocabular vem sendo
descrito por alguns linguistas, como Basilio (2003, 2005), Gonçalves (2003, 2006,
2016) e Andrade (2008, 2009), cujas obras serão aqui revisadas a fim de se elucidar o
processo em foco neste trabalho.
2.1 DEFINIÇÃO E TIPOLOGIA
2.1.1 Definição
O cruzamento vocabular é um processo em que novas palavras são formadas por
meio de outras, como afirma Gonçalves (2006, p.224) ao dizer que “mesclas lexicais
são formas criadas pela junção de duas palavras já existentes na língua”. São exemplos
deste processo palavras como mautorista (< mau + motorista) e chocotone (< chocolate
+ panetone).
Em outras palavras, o cruzamento vocabular é um processo criativo de formação
de palavras que ocorre
quando duas palavras, pertencentes ou não a mesma classe gramatical, se
fundem num todo fonético, com um único acento, à semelhança de um
composto formado por aglutinação, mas sem perder, contudo, os traços semânticos das formas de base que lhes deram origem. (ANDRADE, 2008,
p.17)
Fundir duas palavras significa misturá-las, combiná-las ou agrupá-las. A fusão
de duas bases não só cria formas, mas também significados. Em chafé, por exemplo, a
palavra chá se soma a café, de modo que a adição delas resulta em uma nova palavra,
com uma nova forma e novo significado: ‘café tão fraco que parece chá’.
Ao afirmar que as palavras-matrizes são “pertencentes ou não a mesma classe
gramatical”, Andrade (2008) informa que as bases de um cruzamento vocabular não
19
necessariamente precisam ser da mesma classe gramatical, mas por outro lado, nada
impede que elas assim sejam. Em apertamento (< aperto + apartamento), por exemplo,
ambas as bases são substantivos; já em boadrasta (< boa + madrasta) a primeira base é
um adjetivo e a segunda um substantivo – o que valida o fato de a classe gramatical das
bases não interferir no processo do cruzamento.
Ao descrever a ocorrência de um e somente um todo fonético, é enfatizado o fato
de que o cruzamento vocabular seleciona apenas o acento de uma das bases, afinal,
mesmo que seja originado por meio de duas palavras, o CV constitui apenas uma e,
portanto, porta apenas um acento primário. Na mescla analfaburro (< analfabeto +
burro), o acento da primeira base é suprimido em detrimento ao da segunda base. A
palavra-fonte analfabeto, considerada paroxítona, porta o acento na penúltima sílaba
/’bƐ/, no entanto, o núcleo dela foi ocultada favorecendo assim a permanência do acento
primário em /’bu/, da segunda base, burro.
Ao comparar um CV a um “composto formado por aglutinação”, a autora faz
menção a um processo de formação de palavras semelhante ao cruzamento vocabular: a
composição. Por formar uma palavra também por meio de duas bases, a composição se
assemelha muito ao fenômeno aqui estudado, tanto que alguns autores o consideram
como um subtipo da composição. Há diversos pontos de contato e de divergência entre
os processos, que são enfocados com detalhes mais adiante.
O último trecho da citação, “mas sem perder, contudo, os traços semânticos das
formas de base que lhes deram origem”, relaciona-se com o significado dos
cruzamentos, pois, por mais que uma nova palavra seja formada, o produto cruzado
continua fazendo referência ao significado das bases. Chafé, por exemplo, é um café tão
fraco que parece um chá, ou seja, o CV possui um novo significado, mas ainda assim
faz referência ao significado de suas bases.
Diante deste breve panorama sobre o cruzamento vocabular, é possível definir o
CV como a “fusão de duas palavras, que, ao mesmo tempo, reproduz e cria
significados”, como afirma Andrade (2009, p.193).
Basilio (2005), por sua vez, possui um posicionamento mais distante quando
afirma que o termo cruzamento vocabular não é apropriado para o fenômeno, e que, em
sua concepção, o processo assim denominado deveria ser descrito como dois processos
diferentes, e não um.
20
Basilio (2005) descreve, então, o fenômeno, dando preferência ao termo fusão
vocabular, a fim de apresentar um processo mais abrangente do que o cruzamento
vocabular propriamente dito. Em sua hipótese, “existem dois processos diferenciados. O
primeiro é um processo de incorporação predicativa, (...) o segundo é um processo de
combinação de partes de palavras” (BASILIO, 2005, p.5).
2.1.2 Tipologia
Em relação à tipologia do cruzamento vocabular, há divergências descritivas. A
classificação das mesclas lexicais pode ser fundamentada em fatores morfológicos e
fonológicos, uma vez que os dados são classificados principalmente pela semelhança
fônica ou não entre as bases. Estudos mais pretéritos, com o de Sandmann (1993),
categorizam o fenômeno pelo critério sintático. Há ainda autores, como Bechara (2009),
que investigam o cruzamento vocabular de maneira mais superficial, e não chegam a
classificar o fenômeno em tipos distintos.
A tipologia adotada pelo viés fonológico é a mais precisa para tratar o assunto,
uma vez que cataloga os dados com mais particularidades. Nesta direção, Basilio (2003,
2005) descreve dois tipos associados ao fenômeno, mas identifica apenas um como
legítimo, enquanto Gonçalves (2003, 2006) e Gonçalves, Andrade & Almeida (2010)
defendem uma classificação bipartida e Andrade (2008, 2009) e Gonçalves (2016)
apresentam uma tipologia tripartida.
Diante dessa divergência, adota-se aqui a tipologia tripartida do cruzamento
vocabular. O primeiro tipo, descrito como interposição lexical, entranhamento lexical
ou incorporação predicativa, é aquele em que há semelhança fônica entras palavras-
base. No segundo tipo, combinação truncada ou composição truncada, essa semelhança
não se realiza. Por fim, o terceiro tipo, conhecido como substituição sublexical, é um
padrão em que uma parte do input é promovida à condição de palavra e, em seguida, é
substituída.
O primeiro tipo, de acordo com Gonçalves (2003), é o mais produtivo pelo fato
de que “80% dos cruzamentos vocabulares do português brasileiro são caracterizados
pelo aproveitamento de pelo menos um segmento comum às palavras-matrizes”. Logo,
exemplos como apertamento (< aperto + apartamento) e namorido (< namorado +
21
marido) são representativos desse padrão de formação que mais ocorre entre os
cruzamentos vocabulares.
Andrade (2009, p.194) descreve este primeiro tipo como a
interposição de duas bases que compartilham material fonológico, sejam
sílabas, rimas ou até mesmo porções fônicas sem status próprio, as quais se
fundem de tal modo que estabelecem, no nível da forma cruzada, relações de
correspondência de um-para-muitos entre os constituintes das formas de base
e da forma resultante.
Desse modo, a principal característica do cruzamento formado por meio da
interposição lexical é a relação de semelhança entre as palavras-base, como se vê em
tristemunho (< triste + testemunho) e sofressor (< sofredor + professor)1. Nesses dois
exemplos, é notório que as bases apresentam segmentos em comum; no primeiro caso, o
material fonológico aproveitado é a sílaba /te/, já no segundo caso, as bases
compartilham os segmentos /of,e,or/, material sem status fonológico próprio.
A fusão por meio do compartilhamento fonológico constitui “correspondência de
um-para-muitos” entre as palavras-base e o cruzamento formado, como se pode ver no
diagrama2 a seguir, em que as linhas contínuas representam correspondência entre o CV
e apenas uma das bases, enquanto as linhas pontilhadas indicam associação dupla, por
corresponderem ao CV e às duas bases simultaneamente.
Diagrama 1: Representação da ambimorfemia
Esse exemplo, bem como outros típicos da interposição lexical, aponta para o
conceito da ambimorfemia, que consiste no “compartilhamento de unidade fonológicas
1 Os segmentos em negrito e sublinhados, neste trabalho, são os considerados como pertencentes às duas
formas de base. 2 Representação retirada de Gonçalves (2006, p.234). Nesse exemplo, acrescentamos que, possivelmente,
a sílaba compartilhada em P2, testemunho, é a segunda e não a primeira, principalmente por causa do
maior grau de semelhança dela com a última sílaba de P1, que não é ramificada.
22
(sons, sílabas, sequências) comuns a mais de um morfema em decorrência da
interposição das palavras matrizes” (GONÇALVES, 2005).
Na interposição lexical, a quantidade de material fonológico compartilhado é
diretamente proporcional ao grau de semelhança fônica entre as bases, como afirma
Andrade (2009, p. 194). É por isto que sofressor apresenta um grau maior de
semelhança entre as palavras-fonte do que tristemunho, visto que as bases da primeira
compartilham cinco segmentos, /of,e,or/, e as da segunda, apenas dois, /te/.
Ainda sobre a interação entre as bases, encaixa-se a afirmação de Basilio (2005,
p. 3) de que
mais exatamente, do lado fonológico, temos a superposição de um outro
significante sobre o significante da palavra base hospedeira, mas de tal
maneira que se atinge, na realidade, não apenas uma superposição, mas um
entranhamento ou incorporação. Do lado do significado, temos uma forte
evocação do significado da palavra incorporada, como predicação que passa a
integrar o sentido da palavra base.
Este tipo de CV é o mais focalizado por Basilio (2003, 2005). Sua hipótese é
que o CV é a incorporação de uma palavra na outra, de modo que a “palavra
hospedeira” é a que sofre a predicação, projetada pela “palavra invasora”. O
envolvimento das duas palavras entre si é tanto que a autora tece um questionamento
sobre a definição de que cruzamento vocabular é a soma de parte de palavras.
No entranhamento lexical, a relação entre as bases é tão intrínseca que, de fato,
coloca em xeque a linearidade, tanto que Basilio (2005, p.4), baseada no exemplo de
pilantropia (< pilantra + filantropia), constrói o seguinte questionamento:
Na análise deste caso, já podemos observar que propostas que afirmam que o
cruzamento vocabular se caracteriza por formações com partes de palavras
não é satisfatória. Poderíamos, por acaso, dizer que o p representa o
significado do pilantra? Claro que não. Poderíamos dizer que pil- é uma
parte? Também não, pois só reconhecemos “pilantra” a partir do todo
alterado. Ou seja, o que nos dá a chave para a interpretação é o
reconhecimento da palavra predicativa incorporada. Ou seja, não se trata de formações a partir de parte de palavras, mas de composições integrais em que
uma parte, embora presente, apresenta uma alteração, mínima e fundamental,
em seu significante.
O caso de pilantropia, citado pela autora, de fato não é uma simples adição de
duas partes de palavras, pois não há um encadeamento estrito que ligue partes isoladas
das palavras-fonte. Nesse exemplo, ambas as bases, pilantra e filantropia,
compartilham os segmentos /ilantr/ e são, assim, ligadas por uma interposição em que
os segmentos de P1 se encontram entre os de P2. Nesse sentido, o que permite o
23
reconhecimento de P1 no cruzamento não é apenas p-, mas a modificação na palavra,
como um todo. A esse caso de cruzamento vocabular a autora dá o nome de fuve (fusão
vocabular expressiva). De acordo com Basilio (2010, p. 202), essas formações
originam-se por um fenômeno diferente, tanto que defende a existência de “um tipo
específico de formação, normalmente englobada sob o rótulo de cruzamento vocabular,
a qual denomino ‘fusão vocabular expressiva’ (ou fuve)”.
Cruzamentos formados por meio da combinação truncada, por sua vez, são
descritos como “formações mais isoladas na língua” (ANDRADE, 2009, p. 195) por
corresponderem à minoria dos cruzamentos, se comparadas às formações por
interposição lexical.
Diferente do primeiro tipo, a combinação truncada não necessariamente envolve
compartilhamento de material fonológico entre as bases, como demonstram os
exemplos selemengo (< seleção + Flamengo) e portunhol (< português + espanhol), em
que as bases não possuem material fonológico em comum, não sendo então
ambimorfêmicas como as formações por interposição lexical.
As combinações truncadas podem apresentar bases de tamanho iguais ou
diferentes:
se as formas de base são do mesmo tamanho, ocorre fragmentação em ambas:
chocotone (< chocolate + panetone); caso contrário, a maior sofre
truncamento e a menor, sem perder massa fônica, se concatena inteiramente a
maior: forrogode (< forró + pagode). (ANDRADE, 2008, p.14)
Desse modo, quando as duas bases do CV são de tamanho igual, as duas sofrem
fragmentação, como ocorre em chocotone (< chocolate + panetone) e brasiguaio (<
brasileiro + paraguaio). No primeiro exemplo, retirado do trecho acima, a palavra-base
chocolate perde as sílabas finais, /la.tI/; e na segunda, panetone, são apagadas as sílabas
iniciais /pa.ne/. Já em brasiguaio, as sílabas finais da primeira base, /lej.ɾʊ/, são
omitidas, enquanto as finais de paraguaio são preservadas, sendo suprimidas então as
iniciais da mesma, /pa.ɾa/.
No caso em que as bases são metricamente diferentes, a maior sofre
fragmentação enquanto a menor fica intacta, ou seja, não perde massa fônica, e assim
ambas se conectam. Esse caso pode ser exemplificado por forrogode (< forró + pagode)
e pescotapa (< pescoço + tapa). No primeiro exemplo, também retirado do trecho
acima, a menor base, forró, apresenta duas sílabas, enquanto a segunda possui três,
24
pagode; sendo assim, a primeira base é preservada e a segunda sofre omissão da sílaba
/pa/. Caso semelhante ocorre em pescotapa, em que, por seu tamanho, a base tapa é
conservada e a maior base sofre apagamento da sílaba /sʊ/.
Pode-se concluir assim que o cruzamento vocabular formado por combinação
truncada se “assemelha à composição bem mais que o primeiro” (GONÇALVES, 2016,
p. 77), tanto que Basilio (2005) não descreve esse padrão como um tipo de CV, mas sim
como um subtipo da composição.
O terceiro tipo de cruzamento, por fim, é a substituição sublexical (SSL),
também conhecida como analogia ou reanálise. Nesse padrão, uma sequência de
segmentos de uma determinada palavra é reinterpretada e promovida à condição de
morfema e, logo em seguida, substituída. Sobre esse processo, Gonçalves, Andrade &
Almeida (2010, p.3) exemplificam:
Em ‘macumba’, input de ‘boacumba’, caso claro de SSL, a sequência ‘ma’ –
que não apresenta qualquer status morfológico – é idêntica ao adjetivo ‘má’.
A palavra invasora (‘boa’) é projetada a partir dessa porção não-significativa
em ‘macumba’, levando consigo suas estruturas métrica e silábica. ‘Boa’
promove a sílaba ‘ma’ à condição de palavra, substituindo-a sublexicalmente.
Conforme o funcionamento das SSLs, vale destacar que este é o único tipo que
não se baseia na (des)semelhança fonológica entre as bases; logo, o processo se
distancia bem mais dos outros dois. Além disso, o produto da SSL não se origina da
fusão de duas palavras morfológicas. Por isso mesmo, esse padrão é, então, o que
apresenta mais controvérsias entre os estudiosos.
Por ter um comportamento mais particular, alguns trabalhos o consideram como
um processo à parte – como Gonçalves (2003, 2006) e Gonçalves, Andrade & Almeida
(2010); outros já o abordam como um dos tipos do CV – Andrade (2008 e 2009) e
Gonçalves (2016); e há ainda estudos que nem consideram os dados formados por meio
da substituição sublexical – Basilio (2005). Para melhor compreensão dos diferentes
pontos de vista, serão sucintamente revisadas as perspectivas dos autores que analisam
as SSLs, na ordem em que foram citados. Comecemos com Gonçalves (2003, 2006).
Dadas algumas semelhanças e disparidades entre a substituição sublexical e o
cruzamento vocabular, é possível notar a complexidade de ambos os processos. De
modo geral, a pesquisa de Gonçalves (2003, p.152) aponta para a afirmação de que
“BLs não podem ser analisados como substituições lexicais porque duas palavras
constituem input a formação de uma terceira”.
25
Segundo Gonçalves (2006), a reanálise se distingue do cruzamento vocabular
principalmente pela forma com que as bases interagem. Na interposição lexical e na
combinação truncada, os dados são formados a partir da combinação de duas palavras
em ‘planos alternativos’, como no exemplo chafé, em que as duas bases, chá e café, são
inputs e o cruzamento é o output.
Nos dados de substituição sublexical, as bases interagem em ‘planos
competitivos’, como em boacumba, em que a única base no input é macumba, que sofre
uma reinterpretação e resulta na substituição lexical. Esse é um dos motivos pelo qual o
autor declara que
blends não operam como criações analógicas, não podendo ser analisados
como substituições sublexicais. A mesclagem, na verdade, vem a ser o
resultado da fusão de dois vocábulos que atuam em “planos alternativos”, ao
contrário das formações analógicas, cujas bases operam em “planos
competitivos”. (GONÇALVES, 2006, p. 234)
Desse modo, o pesquisador explicita uma tipologia dicotômica para o
cruzamento vocabular, pois, em suas palavras, “há dois padrões para blends no
português do Brasil: (a) um para os casos em que P1 e P2 apresentam algum tipo de
semelhança fônica e (b) outro para aqueles em que P1 e P2 são totalmente
dessemelhantes do ponto-de-vista segmental” (GONÇALVES, 2006, p. 234).
Em pesquisa específica sobre a substituição sublexical (SSL), Gonçalves,
Andrade & Almeida (2010, p. 1) explicam que
por esse processo, reinterpretam-se formas linguísticas, de modo a promover
uma sequência não-morfêmica à condição de base ou afixo, a exemplo do
que ocorre, nesta ordem, com ‘boacumba’ (< ‘boa’ + ‘macumba’ =
“macumba branca”) e ‘tricha’ (< ‘tri’ + ‘bicha’ = “homossexual
exageradamente afetado”). A formação dessas palavras revela criatividade no uso da língua e sua força expressiva resulta (a) da expansão de significados e
(b) do inesperado que se consegue com a combinação.
Sendo assim, a SSL também é descrita pelos autores como um processo
diferente do cruzamento vocabular, não como um tipo de CV. Morfologicamente, esta
distinção é evidenciada pelo fato de formações cruzadas apresentarem dois inputs,
enquanto as substituições lexicais têm apenas um. Exemplos como portunhol,
enxadachim e frátria esclarecem essa diferença, como será explicado a seguir.
No primeiro caso, portunhol (< português + espanhol), claramente duas palavras
são combinadas para se obter o significado ‘espanhol com traços de português’ ou
‘português com traços de espanhol’, havendo, portanto, duas formas de entrada
26
(português e espanhol) que contribuem na mesma medida para a nova formação,
configurando-se, portanto, um cruzamento vocabular de bases dessemelhantes.
Já na análise de enxadachim < espadachim, por sua vez, há controvérsias.
Apresentado primeiramente em Basilio (1997), esse dado demonstra imprecisão quanto
a sua classificação. Afirma-se, em Gonçalves, Andrade & Almeida (2010), que esse
exemplo é uma reanálise, pois, de acordo com os autores, há um único input,
espadachim, classificado como “palavra-alvo”, no qual ocorre a incorporação de
enxada, “palavra invasora”.
Para essa hipótese ser comprovada no exemplo em questão, considera-se que “o
material melódico rastreado (espada) é posteriormente apagado” (op. cit., p. 7).
Entretanto, este apagamento mostra-se improvável, pois se espada foi apagado do
cruzamento, qual seria a origem da sua semelhança com enxada? A única diferença
fonológica entre espadachim e enxadachim, além de /p/ e /ʃ/, é o traço nasal neste
segundo3, visto que até o tamanho e a posição estrutural de ambas as palavras são
semelhantes. Como muitos segmentos de espadachim foram aproveitados em
enxadachim, analisamos esse caso como mais próximo da interposição lexical do que da
substituição sublexical.
O exemplo de frátria < pátria, por sua vez, se mostra mais claramente uma SSL,
pois apresenta um único input. Diferente de portunhol, em que duas bases contribuíram
igualmente para a formação do cruzamento, o caso de frátria apresenta um único input,
pátria, palavra alvo que sofreu a invasão da palavra fraterno. Esta invasão se dá na
medida em que /pat/ de pátria é associado a ‘paterno’ (pai), e, por analogia, é
substituído por /frat/ de ‘fraterno’ (irmão), (op. cit., p. 11).
Com base nesse fato, os autores concluem então que
cruzamentos vocabulares não podem ser analisados como SSLs porque duas
palavras constituem input à formação de uma terceira. (...) Nas SSLs,
portanto, o alvo é apenas uma das palavras e a interseção das bases é
ocasionada pela reanálise intencional da forma de input. (GONÇALVES,
ANDRADE & ALMEIDA, 2010, p.4)
Mesmo com todos os indícios de que a substituição sublexical pode ser um
processo à parte do cruzamento vocabular, ainda assim não podem ser descartadas as
3 Esta afirmação leva em conta o dialeto carioca.
27
semelhanças entre os mesmos. Andrade (2009, p. 195) aponta uma semelhança ao
afirmar que “embora não haja compartilhamento de segmentos nem tão pouco
truncamento, já que envolve uma só palavra-matriz, o produto gerado constitui-se
sempre de duas formas livres na língua”.
O fato de a substituição sublexical ser constituída de duas formas livres na
língua é o bastante para ser traçado um grande paralelo entre ambos os processos, visto
que o fator mais básico de um cruzamento é ser formada por duas palavras existentes na
língua. O trabalho de Gonçalves (2016) concorda com essa visão, ao apresentar três
tipos distintos de CV.
Diante do que foi exposto, é notório que o cruzamento vocabular é um processo
descrito de forma heterogênea. Como foi apresentado, o primeiro tipo, mais recorrente,
é conhecido como interposição lexical por ser basicamente caracterizado pela
semelhança fônica entre as bases e a maneira como elas interagem. Já o segundo,
combinação truncada, é identificado pela dessemelhança entre as bases. E, por fim, a
substituição lexical é o único tipo que não leva em conta a semelhança ou não das bases.
Considerando fenômenos distintos, Basilio (2005, 2010) identifica como fusão
vocabular apenas a incorporação predicativa, aqui denominada interposição lexical. O
segundo tipo, composição truncada (segundo sua nomenclatura), é descrito pela autora
como um subtipo da composição que combina partes de palavras. Segundo ela, esses
dois tipos “constituem processos diferentes, que não deviam ter o mesmo nome e não
deviam ser tratados em conjunto” (BASILIO, 2005, p.5).
Enquanto Basilio (2005) afirma que apenas o primeiro tipo corresponde de fato
ao cruzamento vocabular, Gonçalves (2003, 2006) e Gonçalves, Andrade & Almeida
(2010) defendem que apenas o terceiro tipo não é relativo ao fenômeno. Já Andrade
(2008, 2009) e Gonçalves (2016) englobam três tipos possíveis para o CV.
Considerando todas as análises apresentadas e não desprezando as diferenças expostas,
este trabalho segue os passos destas últimas obras, ao descrever três possíveis tipos para
o cruzamento vocabular.
A seguir, apresentamos um quadro expositivo cujo objetivo nada mais é do que
resumir as diferentes visões apresentadas.
28
Quadro 1: Tipologia do cruzamento vocabular por diferentes autores
TIPOLOGIA DO CRUZAMENTO VOCABULAR
TIPO 1 TIPO 2 TIPO 3
Basilio (2005) X ---- ----
Gonçalves (2003, 2006) e Gonçalves,
Andrade & Almeida (2010) X X ----
Andrade (2008, 2009) e Gonçalves (2016) X X X
2.2 VALOR EXPRESSIVO
Um dos maiores êxitos do cruzamento vocabular é a sua eficiência em expressar
determinado significado de maneira concisa – remetendo o produto final às suas bases,
tanto semanticamente quanto morfológica e fonologicamente, e ainda assim veiculando
uma nova noção. Quando se fala em Rouberto (< roubo + Roberto), por exemplo, é
atrelada a noção de ladrão, por meio da palavra roubo, a uma pessoa chamada Roberto
(nesse caso, o ex-deputado Roberto Jefferson).
Entre as possibilidades Rouberto e Roberto rouba, é evidente que a primeira é
muito mais compacta, mas, apesar disso – e talvez justamente por isso –, transmite um
significado mais expressivo do que a segunda possibilidade. Sendo assim, não são duas
formas de falar exatamente a mesma coisa, pois os significados veiculados causam
efeitos diferentes no interlocutor; são modos distintos de veicular significados
semelhantes.
A pergunta “como e por que o cruzamento vocabular é hábil para transmitir
significados mais expressivos?” é respondida por Basilio (2003) pelo fator
humorfológico próprio dos cruzamentos. A expressividade e o elemento humorístico
dessas formações são pautados na habilidade de quebra de expectativa e de dupla
possibilidade de interpretação. Mas, antes de mais nada, é crucial que se leve em conta a
acumulação semântica que incide sobre o cruzamento vocabular, simultaneamente com
a perda fonológica, como explica Basilio (2005).
29
Basilio (2003, p.1) esclarece o chamado fator humorfológico por meio do
exemplo presidengue (< presidente + dengue), formação criada ao longo de uma
campanha presidencial em 2002 que estabelece uma relação entre um candidato a
presidente da época, José Serra, e a dengue, doença causada pela picada de um
mosquito. Esse cruzamento é, na verdade, uma evidência do escândalo em que o
candidato foi envolvido por estar sendo acusado pela expansão da epidemia de dengue
no Rio de Janeiro, por ter demitido mais de 5 mil agentes sanitários da FUNASA
(Fundação Nacional da Saúde) em 19994.
Durante o ocorrido naquele período eleitoral, foi criada a expressão presidengue,
que ironiza a relação do então candidato a presidente com a dengue. Este cruzamento
cumpre claramente o objetivo de quebrar a expectativa do interlocutor, que esperaria se
deparar com a palavra presidente, mas não é o que ocorre, provocando assim não só
surpresa, mas também humor.
O cenário político é um grande fomentador para construções desse tipo. Bem
como presidengue, há diversas outras formações criadas por meio de escândalos no
governo brasileiro. O trabalho de Assunção (2006) comprova esse fato por meio da
coleta de dezenas de mesclas somente na coluna de Agamenon, uma seção do jornal o
Globo, escrita por Agamenon Mendes Pereira, personagem inventado pelos humoristas
do grupo Casseta e Planeta.
A própria formação Rouberto (< roubo + Roberto), citada anteriormente, é
retirada deste trabalho e também foi criada por uma ocasião política. Inspirado no
deputado Roberto Jefferson, o cruzamento faz menção ao fato de o político ter
denunciado a corrupção no Congresso Nacional mesmo sendo favorecido com o roubo,
durante o primeiro governo do presidente Lula. Agamenon faz menção a esse fato
afirmando ironicamente que “todos esperavam que, no dia do seu discurso final no
Congresso, Rouberto Jefferson fosse devolver a mala com quatro milhões de reais,
conforme havia prometido” (ASSUNÇÃO, 2006, p.17).
Em ambos os casos, presidengue e Rouberto, a recuperação da quebra conceitual
“depende fortemente do conhecimento do mundo para o efeito expressivo na
interpretação. (...) Só a partir deste conhecimento a predicação metonímica surte pleno
4 Notícia completa disponível em: <http://blogs.odiario.com/messiasmendes/2010/04/22/porque-serra-
tem-culpa-no-cartorio-com-relacao-a-epidemia-de-dengue/>. Acesso em: Abr. 2018.
30
efeito”, como afirma Basilio (2003, p.4). Em outras palavras, é necessário conhecimento
de mundo para que o cruzamento vocabular seja plenamente eficiente em seu propósito
expressivo. Por conhecimento de mundo, entende-se aqui um saber extralinguístico,
contextual, como a vivência do falante e sua experiência cotidiana, ou seja, elementos
extratextuais. Além dessa necessidade contextual, faz-se primordial, em alguns
cruzamentos, a presença do cotexto, entendido como a porção de texto, anterior ou
posterior à expressão5.
Por exemplo, é mais difícil que o interlocutor assimile o cruzamento isolado,
Rouberto, do que com o sobrenome Jefferson. Sem ser acompanhada pelo sobrenome, a
formação Rouberto pode ser relativa a qualquer pessoa chamada Roberto, por isso, é
real a necessidade de cotexto. No entanto, se o usuário da língua não conhece o
escândalo que gerou esse cruzamento ou se não conhece o então deputado, ainda que o
sobrenome esteja presente, não consegue captar a real motivação e o efeito expressivo
manifesto no cruzamento (deficiência contextual).
Sobre isto, Assunção (2006, p. 18) explicita o cruzamento Rosquinha Garotinho
(< rosca + Rosinha):
a forma em questão, dada a existência do substantivo graduado em
diminutivo, só é entendida como cruzada em função de um contexto e através da expressão “Rosquinha Garotinho”. Fora de contexto tal forma não seria
interpretada como resultado de um cruzamento.
Como foi dito anteriormente, ainda com a presença dos sobrenomes, é possível
que o interlocutor não compreenda todo o significado expresso se não estiver imerso na
esfera política da época. Caso o interlocutor não domine o contexto político e não se
interesse por esse cenário, ainda é provável que o cruzamento cause algum efeito, mas o
receptor provavelmente não entenderia a real motivação da formação.
É, então, irrefutável o fato de o conhecimento de mundo e eventos do dia a dia
favorecerem a compreensão de formas cruzadas relativas a fatos sociais, em geral.
Sobre isso, Andrade (2009, p. 196) afirma que
os CVs podem ser reconhecidos como criações autorizadas pelas informações
que se tem na memória acerca das entidades envolvidas sendo o
5 Segundo Travaglia (2000, p.85), “o contexto pode ser também linguístico, isto é, uma determinada
sequência ou elemento linguístico vai ter um determinado sentido conforme os elementos linguísticos que
o acompanham (precedem ou seguem) no texto. Esse contexto linguístico, para se diferenciar do contexto
não linguístico, tem sido chamado na Linguística de ‘co-texto’”.
31
conhecimento da situação e dos episódios do cotidiano mais
significativamente mobilizado na criação/interpretação dessas palavras.
Assunção (2006, p.12), baseado em outros teóricos, ainda reitera que “para
compreender esse tipo de construção, é necessário resgatar as pistas estruturais
fornecidas e conectá-las a informações contextuais, culturais e/ou de conhecimento
partilhado”.
Fatos sociais, incluindo não só a política, formam um tema fecundo de
cruzamentos humorísticos. A própria coluna de Agamenon apresenta dados como
Ciscarelli e Caetano Velhoso, referentes a atriz e modelo Daniella Cicarelli e ao músico
e escritor Caetano Veloso.
Destacam-se agora as informações culturais necessárias para captar o significado
de algumas mesclas. Por exemplo, o caso de Ciscarelli, por meio do verbo ciscar, faz
menção metafórica à galinha pelo fato de a atriz Daniella Cicarelli ter se casado
supostamente por interesse com Ronaldinho, jogador de futebol bem sucedido. Na
cultura brasileira, a referência da galinha é atrelada a de uma mulher quando se quer
designar ‘mulher de vida devassa’6 e, neste caso, interesseira; mas provavelmente a
imagem da galinha não seja a mesma em outras culturas; portanto, chamar uma mulher
assim pode não ser considerado um insulto mesmo em comunidades lusofônicas.
Cumprindo o objetivo de sua coluna, Agamenon empenhou-se em conscientizar
a população acerca de informações políticas e sociais por meio de uma linguagem
simples e de modo mais atraente. Seus textos, portanto, reportam importantes
informações de maneira dinâmica, “abordando os fatos de forma constrangedora para os
personagens, mas criando um fato geralmente humorístico para o leitor” (ASSUNÇÃO,
2006, p.11).
Voltando ao primeiro exemplo, Rouberto (< roubo + Roberto), é coerente
afirmar que, ao ouvir essa formação, o interlocutor esperaria processar apenas uma das
bases, não as duas juntas, mas a interferência de /u/ na segunda base o surpreende.
Como afirma Basilio (2003, p. 1), “nos cruzamentos vocabulares bem sucedidos, há
uma quebra de expectativa subitamente frustrada, resultante de uma construção em que
6 Definição informal de “galinha” no Português Brasileiro:
Mulher que se comporta de modo considerado devasso ou imoral. = PIRANHA. Disponível em:
< https://www.priberam.pt/dlpo/galinha>. Acesso em: Mai. 2018.
32
a parte surpresa ao mesmo tempo predica e nomeia a parte base de um modo tanto mais
forte quanto inesperado”, como o que ocorre nesse exemplo, sendo que, em Rouberto, a
base predicadora é a primeira (roubo), e, em presidengue, a segunda base (dengue) é a
que exerce essa função.
É interessante também observar que, no CV bem sucedido, a reestruturação
morfológica impõe reestruturação conceitual, visto que a mescla lexical não se constitui
apenas de uma formação fortuita de segmentos fônicos, mas sim de uma combinação
precisa de duas bases para formar uma nova palavra, levando em consideração aspectos
não só morfológicos e fonológicos, mas também semânticos.
Outro aspecto investigado nesta questão é que o êxito do cruzamento vocabular
é inversamente proporcional à interferência fonológica de uma base na outra, ou seja,
quanto menos uma base interfere fonologicamente na outra, melhor é o resultado do
cruzamento, como afirma Basilio (2003, 2010). Considerando essa premissa,
presidengue (< presidente + dengue) é um exemplo de CV bem sucedido, pois a
segunda base interfere minimamente na primeira, de modo que a única diferença entre
elas, além das sílabas inicias de presidente, é a alteração de /t/ para /g/. Como os dois
segmentos são oclusivos, a semelhança é ainda maior: a diferença fonológica é apenas o
lugar de articulação e a sonoridade de ambos, visto que /t/ é uma alveolar desvozeada e
/g/ uma velar vozeada.
Basilio (2005, p.3) reafirma essa ideia ao dizer que
a incorporação predicativa será tanto mais feliz quanto menor for a
interferência fonológica na palavra básica, a qual deve garantir, no entanto, a
evocação do significado predicativo acoplado ao significado da palavra base.
Outro exemplo oportuno para explicar o êxito de CVs, além de presidengue, é
pilantropia (< pilantra + filantropia), conforme explica Basilio (2005, p.3). Nesse
exemplo, a primeira base é a que projeta uma predicação para a segunda, filantropia. A
única diferença entre a segunda base e o cruzamento é alteração de /f/ para /p/, ou seja,
uma interferência diminuta foi capaz de produzir toda a predicação pretendida – o que
caracteriza esse CV como exitoso, nos termos de Basilio.
Acerca da semelhança entre o cruzamento vocabular e outros processos de
formação de palavras, ele é o único que
33
em termos de reestruturação mórfica e integração conceitual capta os
elementos simultaneamente necessários para efetivação do efeito expressivo,
de caráter retórico ou humorístico, sendo que o padrão de estrutura da
composição exerce uma função importante nestas construções. (BASILIO,
2003, p.1)
Outro fator interessante é que nem todo CV é motivado pelo humor, tanto é que
em lambaeróbica e brasiguaio7 não há traços de comicidade – exemplos como esses são
mais descritivos, cujos objetivos são baseados em expor características dos objetos, não
transparecendo humor nem juízo de valor algum. Sobre isto, Basilio (2003) afirma que
“cruzamentos vocabulares não são sempre humorísticos, mas a principal motivação para
a sua existência é o poder expressivo”.
Gonçalves (2006) também ressalta a expressividade do CV ao afirmar que, na
maioria dos casos, os cruzamentos remetem à opinião do falante, expressando, portanto,
seu ponto de vista. Além disto, concorda com a ideia de Basilio de que “a pejoratividade
é, sem dúvida, o caso por excelência da expressão subjetiva do falante” (BASILIO,
1987).
Sobre a carga semântica dos cruzamentos, Sandmann (1997, p.59) afirma que o
“traço que caracteriza muitos cruzamentos vocabulares é a sua especificidade
semântica, isto é, eles vêm muitas vezes carregados de emocionalidade, sendo que esta é
depreciativa, às mais das vezes, e com pitadas de ironia”. Como vimos nos exemplos
aqui citados, o caráter depreciativo é realmente muito recorrente nos cruzamentos.
Complementando a afirmação do autor, Basilio (2005, p.1) descreve não só os
cruzamentos pejorativos, como lixeratura (< lixo + literatura), mas também aqueles
caracterizados como descritivos, como caipvoka (< caipirinha + vodka). E Andrade
(2008, p. 18), por sua vez, vai além desta dicotomia ao afirmar que
ao lado da grande maioria de mesclas lexicais que expressam atitude
pejorativa do falante frente ao enunciado (p.ex. “mautorista < mau +
motorista”; “crionça < criança + onça”; “batatalhau < batata + bacalhau”),
encontram-se também formações mais isoladas, indicando atitude neutra
(“chocotone < chocolate + panetone”; “toboágua < tobogã + água”;
“frambúrguer < frango + hambúrguer”) ou até mesmo atitude positiva do
falante em relação ao objeto da fala, a exemplo de “chocolícia < chocolate +
delícia”; “deliçoca < delícia + paçoca”. Logo, pode-se afirmar que, em geral, os CVs funcionam como expressões indicativas de intenções, sentimentos e
atitudes do falante em relação ao seu discurso.
7 Exemplos retirados de Basilio (2003, p. 2).
34
Por mais que haja um grande número de mesclas depreciativas, são
consideráveis os casos em que se expressa um posicionamento positivo do falante.
Desse modo, a descrição de Andrade (2008) complementa a de Basilio (2003) ao
afirmar a existência de mesclas nas quais o parecer do falante pode ser positivo,
negativo ou neutro. Mesmo com essa diversidade de possibilidades, os dados apontam
para uma “função predicativa de impacto expressivo”, nas palavras de Basilio (2005, p.
1).
Sendo assim, como foi visto, o fator humorfológico é um notável elemento nos
cruzamentos vocabulares, mas não o essencial, visto que nem todas as mesclas veiculam
comicidade. Por outro lado, nos casos em que esse fator está presente, a palavra-base
surpresa, inesperada, é responsável por uma predicação forte e grotesca. O chamado
fator humorfológico origina-se, então, da quebra conceitual de expectativa e da dupla
possibilidade de interpretação da palavra.
De acordo com Basilio (2005, p.3), “o objetivo do chamado cruzamento
vocabular é uma interferência predicativa incorporada no significado da palavra base,
realizada pela incorporação do significante do vocábulo predicativo ao significante do
vocábulo qualificado”. O valor expressivo do cruzamento vocabular esclarece esse
objetivo por meio não só do fator humorfológico, mas de todos os cruzamentos que
veiculam um sentimento ou uma avaliação por parte do falante.
Sobre o aspecto expressivo dos cruzamentos, Basilio (2010) ainda se dedica a
explicitar a chamada
fusão vocabular expressiva, ou fuve, (que) é uma construção estruturada de
modo a incorporar fonologicamente os dois itens lexicais envolvidos,
representando iconicamente a inclusão da função semântica do qualificador
no significado da palavra base. (BASILIO, 2010, p.202)
Os exemplos de fuve apresentados por ela são lixeratura (de lixo, literatura),
glitterari (de glitter, literari), burrocracia (de burro, burocracia), entre outros. É
perceptível que novamente o tipo enfocado por ela é a interposição lexical, no qual as
palavras-fonte compartilham segmentos, pois é o que mais se relaciona com o conceito
descrito de fuve.
Como o foco deste tópico é demonstrar o valor expressivo inerente aos
cruzamentos, é crucial ainda rever a afirmação de que o cruzamento vocabular não
forma expressões ingênuas, como afirma Basilio (2010, p.204):
As fuves não são formações inocentes, ao contrário, têm a função de nos
levar a considerar novas (ir)realidades, seja pela contradição, seja pela
35
maximização da força simbólica de elementos já existentes. É importante
ressaltar que a transposição do nível de qualificação para o nível de
denotação é fundamental, na medida em que a denotação não se discute; o
impacto expressivo dessas formações também deriva deste fato.
Com a repercussão expressiva que as palavras cruzadas podem ter, é coerente
que estas formações não se encontrem com frequência em situações muito formais da
língua. Pelo contrário, transmitem traço de coloquialidade e são frequentemente
encontradas em textos humorísticos, jornalísticos e literários, entre outros.
Vale ainda destacar a expressividade do cruzamento vocabular de acordo com a
sua classificação, pois os diferentes padrões de CV implicam diferentes papéis
discursivos. De acordo com Gonçalves e Almeida (2007, p. 94), a interposição lexical
evidencia propriedades do determinado e confere características a ele metafórica ou
metonimicamente; já a combinação truncada e a substituição sublexical possuem caráter
mais descritivo do que avaliativo, diferente do primeiro.
O cruzamento vocabular, portanto, indica “intenções, sentimentos e atitudes dos
falantes” (ANDRADE, 2009, p. 196), além de gerar sensação de desvio, causando a
noção de algo inesperado e, não poucas vezes, manifesta humor, deboche, escárnio e
ironia – sendo então, neste caso, eficaz para ridicularizar a imagem de determinadas
pessoas, bem como provocar o riso em outras.
2.3 O CRUZAMENTO VOCABULAR FRENTE A OUTROS PROCESSOS
MORFOLÓGICOS
O cruzamento vocabular apresenta semelhanças com outros processos
morfológicos, tanto aqueles cuja função é lexical quanto aqueles de função expressiva8.
A fim de fundamentar a comparação do CV com outros processos, apresentamos neste
tópico a composição, a recomposição, a hipocorização e a siglagem, de maneira bem
concisa. A seleção destes processos não exclui o paralelo entre o cruzamento vocabular
e outros fenômenos, mas foi assim viabilizada por apresentar maior grau de semelhança
entre os mesmos e pelo fato de nossos dados sinalizarem para essas distinções.
8 De acordo com Gonçalves (2006), os processos cuja função é lexical são considerados processos de
formação de palavras, já os que apresentam função unicamente expressiva, não são assim considerados,
pois o resultado é a mesma palavra modificada em função dos propósitos comunicativos do emissor.
36
Entre os quatro processos aqui analisados, a composição é o que mais se
aproxima do cruzamento vocabular formado por nomes comuns, o que justifica a maior
extensão de revisão bibliográfica, visto que é um paralelo já traçado em estudos
anteriores. A recomposição, por outro lado, é o que menos se assemelha com o
cruzamento vocabular formado por antropônimos, mas foi aqui descrito pela
semelhança com outros dados de CV. O paralelo do CV com a hipocorização e a
siglagem será descrito com mais detalhes no capítulo 4.
2.3.1 Composição
De acordo com Basilio (1987, p.29), a composição “envolve a junção de uma
base a outra base; não há elementos fixos, não há funções predeterminadas no nível dos
elementos”, como ocorre nos exemplos sofá-cama, couve-flor e obra-prima.
A classificação das palavras compostas pode ser analisada de acordo com
diferentes critérios, como o semântico, o fonológico e o sintático. Para Sandmann
(1997), o critério semântico é o mais significativo para a descrição dos compostos. Por
meio desse critério, pelo menos duas divisões são possíveis, uma vez que o significado
dos compostos pode ser metafórico ou metonímico e endocêntrico ou exocêntrico.
Quando há uma transferência de significados baseada na semelhança entre dois
referentes, o composto é metafórico, como em copo-de-leite, ‘nome popular de uma
flor’, e pente-fino, ‘operação de cunho social ou policial’. Quando há uma transferência
alicerçada na contiguidade física, o composto é metonímico, como em beija-flor e dedo-
duro.
Com relação à motivação semântica, o composto pode ser endocêntrico ou
exocêntrico. No primeiro caso, o significado é mais diretamente motivado, como o
exemplo de erva-doce, em que o uso da primeira base foi justificado pelo significado do
produto final, que é um tipo de erva. Já o caso de cabra-cega é exocêntrico, pois o
composto não nomeia um tipo de cabra, mas uma brincadeira infantil; nesse caso, a
motivação é menos direta e, como se pode ver, a contiguidade é a ponte que faz a
associação da expressão com o referente.
Do ponto de vista fonológico, são descritos dois tipos de compostos. De acordo
com Bechara (2009, p.340), as palavras compostas podem ser formadas por
justaposição ou aglutinação. No primeiro tipo, é possível observar a individualidade dos
37
componentes, como nos exemplos guarda-chuva e couve-flor. Os compostos por
aglutinação, por sua vez, são caracterizados pela fusão e maior integração dos radicais,
como em aguardente e bloquiaberto.
O critério sintático divide os compostos em copulativos ou determinativos. Os
copulativos são assim classificados por apresentarem uma relação de coordenação entre
as bases, como em franco-britânico e cantor-compositor9. Os determinativos, por outro
lado, apresentam relação de subordinação entre as bases, como em afro-brasileiro
‘cultura brasileira de influência africana’ e trem-bala ‘tipo de trem’.
O paralelo entre cruzamento vocabular e composição é “uma questão
fundamental para a descrição do fenômeno” (ANDRADE, 2009, p. 197).
Descreveremos a seguir algumas semelhanças e diferenças entre o cruzamento
vocabular e a composição, tendo em vista, principalmente, os critérios semântico e
fonológico.
De modo geral, é possível dizer que a semelhança mais evidente entre os
processos está no fato de tanto compostos quanto cruzamentos serem palavras formadas
por meio de outras duas. Basilio (2003, p. 2) afirma, inclusive, que é possível considerar
o CV como uma espécie de composição, pois “sua formação envolve duas palavras, e o
processo correspondente (CV) envolve o mecanismo de formar uma nova palavra cujo
significado e forma final decorre diretamente da combinação de duas palavras”. Em
outras palavras, o aspecto de maior equivalência entre composição e o cruzamento
vocabular ocorre “na medida em que se forma uma palavra nova a partir de duas
palavras-fonte” (BASILIO, 2010, p. 204). Em ambos os processos, duas palavras já
existentes na língua formam uma terceira.
Por outro lado, Gonçalves (2003, 2006, 2013) e Andrade (2008 e 2009)
defendem que o cruzamento vocabular não é um subtipo da composição. Por mais que
tenham semelhanças, os processos são apresentados por eles como distintos, visto que
as diferenças são mais significativas que as similaridades.
9 Quando copulativos, os compostos podem apresentar mais de duas bases, a exemplo de cantor-
compositor-ator.
38
Quanto à função, o cruzamento vocabular e a composição se aproximam, pois,
ambos são processos que formam palavras e, portanto, possuem função lexical. Basilio
(2005, p. 2) defende a semelhança dos processos ao afirmar que
a fusão vocabular é um tipo de composição que se caracteriza por ter pelo
menos um de seus elementos sem expressão fonológica plena. Ou seja, a
fusão vocabular poderia ser interpretada como uma composição vocabular
em que o lado fonológico de um dos elementos vocabulares atua “nos
bastidores”, ou seja, continua presente embora sem expressão aberta.
De acordo com essa hipótese, o cruzamento vocabular não é um processo
autônomo, mas uma categoria da composição, cujo mecanismo forma palavras novas
por meio de outras já existentes. Diferente da composição, o CV pode não aproveitar a
totalidade fonológica das palavras-fonte.
Para traçar o paralelo pelo critério sintático, recorremos à sintaxe da palavra,
proposta por Sandmann (1993). Os produtos do cruzamento vocabular, bem como os da
composição formada por dois substantivos, podem ser copulativos ou determinativos.
Segundo o autor, “quando temos uma adição de elementos do mesmo nível, uma
coordenação, temos um cruzamento copulativo” (p. 76), como ocorre no ship Arliza (<
Arthur + Eliza).
Quando a adição de elementos é feita em níveis diferentes, o cruzamento é
classificado como determinativo, pois mantém relação de subordinação entre seus
componentes. Essa relação pode ser observada no exemplo Dilmãe (< Dilma + mãe),
em que Dilma é o núcleo determinado por mãe.
Com base no parâmetro semântico, reforçamos as palavras de Andrade (2009, p.
198), em concordância com Gonçalves (2003), ao dizer que “um CV se distingue de um
composto porque, mesmo expressando um novo significado com traços que só nele
estão presentes, sempre deixa transparecer os traços semânticos das palavras que lhes
deram origem”. Dessa forma, o significado gerado nos cruzamentos sempre remete às
suas bases, como pode ser observado no CV de bases comuns – cf. apertamento,
‘apartamento muito apertado’ – e no de base comum acrescido de qualificador – como
Burrichello, ‘Barichello que é burro’. Dito de outra maneira, cruzamentos são sempre
endocêntricos.
Já os compostos não contemplam essa característica na medida em que, mesmo
sendo formados por meio de duas bases, o novo significado não necessariamente
39
corresponde ao significado das bases que o originaram. Por exemplo, o significado
global de peixe-espada claramente remete aos significados das bases, peixe e espada,
pois nomeia um peixe que se parece com uma espada, metaforicamente. Já o caso de pé-
de-moleque é diferente, pois o produto final não corresponde às suas bases, visto tratar-
se de um doce.
Sintetizando o aspecto semântico,
os compostos regulares, por justaposição, diferentemente dos vocábulos
mesclados, podem dissociar-se, total ou parcialmente, dos significados de
seus componentes, como ocorre, respectivamente, em pé-de-moleque
(exocêntrico) e guarda-noturno (endocêntrico). (ANDRADE, 2008, p. 30)
Sob o prisma fonológico, outra diferença entre a composição e o cruzamento
vocabular é pontuada, na medida que
diferentes dos compostos, que tendem a preservar o conteúdo segmental das
bases (‘porta-luvas’ e ‘bóia-fria’), mesclas são caracterizadas pela interseção
de palavras, de modo que é impossível recuperar, através de processos
fonológicos como crase, elisão e haplologia, as sequências perdidas.
(GONÇALVES, 2006, p. 224)
Ao “preservar o conteúdo segmental das bases”, as palavras compostas mantêm,
no produto final, as características fonológicas das bases que lhe deram origem. Por
exemplo, em porta-luvas, todos os segmentos da primeira e da segunda base foram
mantidos. Os cruzamentos, por sua vez, costumam não preservar todos os segmentos
das duas bases. Em alguns dados, a menor base é mantida em sua totalidade, como
Fernandeus (< Fernando + deus); em outros casos, ambas as bases sofrem perda, como
em Debochara (< deboche + Bechara).
No entanto, há compostos caracterizados pela aglutinação, como aguardente (<
água + ardente), que, diferindo de porta-luvas e boia-fria, sofrem uma perda segmental
caracterizada como crase. Embora os cruzamentos se assemelhem mais aos
compostos por aglutinação que aos justapostos, não revelam a existência de segmentos
apagados por meio de processos fonológicos, como acontece na aglutinação. Diferente
do processo de crase, que acontece em aguardente, as sequências perdidas em Luciabo
(< Luciano + diabo), por exemplo, não podem ser resgatadas pela crase nem por
qualquer outro processo fonológico.
Entende-se, então, que o cruzamento vocabular não é fruto de mudanças
fonologicamente motivadas que levam a perdas segmentais, como crase, elisão e
40
haplologia. Nos CVs, a perda de massa fônica de uma ou das duas palavras-base de
modo algum é explicada por fenômenos fonológicos segmentais, o que, nos termos de
Gonçalves (2003), constitui importante diferença entre compostos aglutinativos e
cruzamentos, pois justifica o caráter não concatenativo desses últimos.
Ainda sobre o parâmetro fonológico, Gonçalves (2013, p. 153) apresenta um
critério que diferencia os processos ao afirmar que “há uma diferença crucial entre BL e
composição: nos compostos regulares, cada um dos formativos projeta sua própria
palavra prosódica (PWd), enquanto nos blends os dois formativos levam a uma só
PWd”.
Antes de mais nada, é necessário esclarecer que cada palavra-base, de um
cruzamento ou de um composto, projeta uma palavra morfológica (MWd). A
quantidade de palavras prosódicas, por sua vez, é contada pelo número de acentos que
determinada porção linguística contém. Gonçalves (2013, p. 154) ilustra a estrutura
prosódica de ambos os processos com a imagem a seguir, sendo baba-ovo um exemplo
de composição e selemengo de cruzamento.
Diagrama 2: Representação da palavra prosódica (PWd)
Diferentemente da estrutura morfológica, a estrutura prosódica do cruzamento
vocabular se dá pela soma de duas palavras prosódicas que resulta em apenas uma
palavra prosódica simples, pois o acento primário de uma das bases é omitido em favor
do acento da outra, como é ilustrado em selemengo (< seleção + Flamengo), cruzamento
que preserva o acento da segunda base em detrimento ao da primeira. Desse modo, a
junção de duas bases leva a uma única palavra prosódica, diferente do que ocorre na
composição, que preserva o acento de ambas as bases, gerando uma palavra prosódica
complexa.
41
Em suma, o CV e a composição se aproximam quanto à estrutura morfológica,
pois ambos apresentam a estrutura MWd + MWd = MWd*, e se distanciam quanto à
estrutura prosódica, pois o cruzamento vocabular apresenta um acento enquanto a
composição permite dois acentos; logo, a estrutura do primeiro é representada por PWd
+ PWd = PWd enquanto a da composição é PWd + PWd = PWd*.
Mesmo diante da semelhança estrutural (morfológica) entre os processos, a
distinção entre eles prevalece. Primeiro porque, mesmo na semelhança, os processos
não são idênticos, pois o significado do cruzamento vocabular sempre remete ao de suas
bases, o que nem sempre ocorre na composição. Depois, a diferença é mais explícita na
estrutura prosódica, visto que os compostos portam mais de um acento e os
cruzamentos, não.
Outra distinção entre o cruzamento vocabular e a composição, também apontada
por Gonçalves (2003), é que a quebra das bases no CV nem sempre aproveita um
constituinte morfológico. Em outras palavras, “o que segue ou o que precede o ponto de
quebra nem sempre é um constituinte morfológico, fazendo com que o blend seja visto
como fenômeno distinto da composição, cujo encadeamento preserva a integridade das
bases”, como afirma Gonçalves (2006, p.236).
Essa característica não se repete na composição, pois este é um processo
concatenativo que prima por conservar a integridade lexical das palavras-fonte.
Exemplos como amor-perfeito e aguardente são indícios do encadeamento preservado
na composição, visto que a segunda base só começa no ponto em que a primeira acaba.
Retomando as palavras de Gonçalves (2003, p. 154), o CV é entendido como “uma
fusão que leva a mistura não-linear de bases, o que faz com que blends se diferenciem
de compostos, cuja ligação sempre se dá por encadeamento, seja ele por justaposição ou
por aglutinação”. Essa característica é resultado da natureza dos processos, pois,
enquanto a composição é um processo substancialmente aglutinativo, o cruzamento
vocabular não o é. É justamente por este fator que estudiosos mais tradicionais
consideram a composição um processo regular de formação de palavras, enquanto
descrevem o CV como irregular ou marginal tanto que na visão de Sandmann (1997, p.
58), o
“cruzamento vocabular” é, no fundo, um tipo de composição, diferenciando-
se desta, porque no cruzamento vocabular as bases que entram na formação
42
de nova unidade lexical, ou ao menos uma, sofrem diminuição, não
sistemática ou regular, de seu corpo fônico.
Caracterizando o CV como um tipo de composição, o autor os descreve quase
como um processo único, mas ressalta a diferença entre eles, uma vez que o corte das
bases, no cruzamento vocabular, “não é sistemático”. Embora preserve a estrutura
silábica da língua, “o corte é naturalmente opção de quem cria a palavra”, segundo
Sandmann (1997, p. 58).
Entende-se aqui que a “irregularidade” descrita no corte é fruto da não
concatenatividade do CV, uma vez que diferente das palavras compostas, formadas por
encadeamento, no cruzamento vocabular, “a nova palavra é formada não por
concatenação ou sequência linear, mas por fusão quase total”, como pontua Basilio
(2010, p. 204). Acerca disso, Gonçalves (2006, p. 225) explica que “a sistematicidade
dessa operação só pode ser observada na interação morfologia-prosódia, o que difere
mesclagem de composição, fazendo do primeiro uma operação circunscritiva e do
segundo um processo aglutinativo”.
Diante dos pontos aqui apresentados, Basilio (2003) esclarece seu
posicionamento de que a relação entre CV e composto depende do objeto de descrição
que está em análise. Por exemplo, tomando como pressuposto o enfoque fonológico, é
possível dizer que os processos são, de fato, distintos; no plano morfológico, porém, é
correto afirmar que o cruzamento vocabular está mais próximo da composição do que
da derivação.
Já Gonçalves (2003, 2006, 2013) e Andrade (2008) possuem uma posição mais
categórica ao afirmarem que a composição e o cruzamento vocabular são processos
distintos. Mediante os argumentos defendidos pelos autores, somados com outros
apresentados aqui, concordamos que o cruzamento vocabular seja um processo distinto
da composição e elencamos, no quadro a seguir, algumas das principais diferenças entre
esses dois mecanismos, além das semelhanças descritas.
43
Quadro 2: Comparação entre a composição e o cruzamento vocabular
COMPOSIÇÃO VS. CRUZAMENTO VOCABULAR
CRITÉRIO COMPOSIÇÃO CV
1 Qtde de bases Forma palavras por meio de
duas bases
Forma palavras por meio de
duas bases
2 Função Função lexical Função lexical
3 Sintático Pode ser copulativo ou
determinativo
Pode ser copulativo ou
determinativo
4 Semântico Pode ser endocêntrico ou
exocêntrico É endocêntrico
5 Fonológico Recupera perdas fônicas por
processos fonológicos
Não recupera perdas fônicas por
processos fonológicos
6 Estrutura
morfológica 1MWd + 1 MWd = 1 MWd* 1MWd + 1 MWd = 1 MWd*
7 Estrutura
prosódica 1PWd + 1 PWd = 1 PWd* 1PWd + 1 PWd = 1 PWd
8 Formação Processo aglutinativo Processo não-concatenativo
2.3.2 Recomposição
Segundo Monteiro (1987, p. 170), a recomposição é um processo que “ocorre
quando apenas uma parte do composto passa a valer pelo todo e depois se liga a outra
base, produzindo uma nova composição”. O fenômeno pode ser ilustrado com o
formativo auto-, que etimologicamente possui o significado de ‘de/por si próprio’, como
expressa a palavra autoavaliação ‘avaliação sobre si mesmo’. Com o tempo, o
formativo passou a veicular também a ideia ‘automóvel’, tanto que autopeça,
autoestrada e autoscola10 se referem, todos, à noção de ‘carro’. Desse modo, surgem
formas recompostas, pois auto- deixa de veicular o significado etimológico e,
nos termos de Belchor (2011, p. 161), é empregado em referência a alguma
10Autopeça é a “peça destinada a autoveículo, fabricada na rede industrial desse ramo”. Enquanto
autoestrada é a “rodovia ou estrada destinada ao trânsito de automotores ou automóveis em velocidades
mais altas, que percorrem distâncias maiores e às vezes chegam a ter três vias de acesso em ambos
sentidos”. E autoescola, por sua vez, é o “local, que funciona como uma escola, onde são ensinadas lições
àqueles que desejam aprender a dirigir”. Disponível em: <https://www.dicio.com.br>. Acesso em: Set.
2018.
44
característica relevada no domínio “carro”. Desse modo, ‘autoesporte’ é o
nome de um “programa de televisão dedicado a esportes automotivos” e
‘autosseguro’, um “seguro para veículos”. (GONÇALVES & OLIVEIRA,
2013, p. 3)
Ao lado de exemplos com auto- estão outras palavras recompostas, formadas por
foto- (fotografia, fotonovela) e tele- (televisão, telefone), entre outros formativos
ressemantizados. Esses exemplos apontam para uma “forma reduzida (que) tornou-se
independente e passou a ser empregada com o valor semântico de todo o composto”
(ANDRADE, 2009, p. 200), uma vez que foto-, por exemplo, é usado como sinônimo
de fotografia, podendo criar uma série de novas palavras compostas. Entende-se, então,
que este componente da palavra que se apropriou do significado total da palavra é
denominado pseudoprefixo ou prefixóide11.
A relação entre recomposição e cruzamento vocabular é de grande diferença, na
medida que só na recomposição ocorre um pseudoafixo, já que CVs envolvem partes de
palavras não necessariamente morfêmicas. Diante disto, Andrade (2009, p.200) afirma
que “o que define se uma nova palavra se constrói por recomposição ou por cruzamento
vocabular é a preservação ou não da estrutura morfológica das bases-fonte”.
2.3.3. Hipocorização
Nas palavras de Gonçalves (2001, p. 1), “a hipocorização é o processo pelo qual
nomes próprios são abreviados afetivamente, resultando numa forma diminuta que
mantém identidade com o prenome ou com o sobrenome original”, como ocorre em
Chico e Mabel cujas bases são, respectivamente Francisco e Maria Isabel. Sendo assim,
esse processo nada mais é do que o encurtamento afetivo de antropônimos.
A partir desta definição, é notável a relação do hipocorístico com apelido. De
fato, todo hipocorístico é um apelido, mas nem todo apelido é um hipocorístico. Os
exemplos apresentados, Chico e Mabel, são hipocorísticos e, por conseguinte, são
apelidos; já exemplos como Gigante e Palito são apelidos, mas não hipocorísticos.
Esses apelidos são claramente originados das características de uma pessoa alta e de
uma pessoa magra, ou seja, guardam relação com características físicas de alguém e,
portanto, são considerados apelidos; mas não podem ser considerados hipocorísticos por
não guardarem uma relação de correspondência com um prenome, como explica
11 Termos utilizados em Cunha e Cintra (1985, p. 111).
45
Gonçalves (2006, p. 223). Deste modo, Gigante pode ser o apelido de alguém chamado
André, mas não pode ser o hipocorístico; já Dedé é tanto apelido quanto hipocorístico
desse prenome, uma vez que corresponde a ele.
Existem cinco padrões possíveis de hipocorização, como é demonstrado na
imagem a seguir, que apresenta a categorização proposta por Lima (2008, p.19).
Quadro 3: Padrões da hipocorização
O primeiro padrão é o chamado default, que mapeia apenas a borda direita dos
nomes – é considerado o mais produtivo dos cinco. O sistema dois, por sua vez, é
aquele que mapeia apenas a margem esquerda da palavra. Os padrões três e quatro
envolvem o processo de reduplicação, sendo que, no terceiro sistema, ocorre a
reduplicação da borda direita dos nomes, enquanto no padrão quatro a margem esquerda
é reduplicada. O quinto padrão, por seu turno, apresenta nomes compostos como base.
Provavelmente por não haver pesquisas anteriores que focalizem o cruzamento
vocabular formado por antropônimos, não foram encontrados trabalhos que comparem o
CV ao hipocorístico. Logo, traçamos, no capítulo 4 desta dissertação, o paralelo entre os
processos levando em consideração os conhecimentos sobre cruzamento vocabular já
apresentados e as características do hipocorístico, principalmente apresentadas por Lima
(2008).
2.3.4 Siglagem
Conceito anterior à siglagem é o da acrossemia, proposto por Monteiro (1987).
Para ele, a acrossemia é uma das possibilidades de formação dos antropônimos,
hipocorísticos e oniônimos, em que ocorre uma redução, que “se dá em cada elemento
de um composto ou de uma expressão para em seguida formar o vocábulo” (p.199).
46
Sobre o primeiro caso, formação de antropônimos, “há uma preferência pela
formação de prenomes mediante a combinação de sílabas, quase sempre extraídas dos
nomes dos pais”, segundo Monteiro (1987, p.185). Alguns exemplos de acrossemia
neste grupo são Erlice (< Ernesto + Alice), Claudionor (< Cláudio + Leonor), Jomar (<
José + Maria) e Edigênio (< Edite + Eugênio).
Já com relação aos hipocorísticos, Monteiro apresenta quatro meios de
formação: a braquissemia12, a acrossemia, a duplicação e a sufixação. Entre eles, a
acrossemia é o processo que menos ocorre pelo fato de existirem poucos prenomes
compostos em comparação aos nomes simples. Alguns dos exemplos apresentados são
Cadu (< Carlos Eduardo), Mabel (< Maria Isabel) e Franzé (< Francisco José). Em
exemplos como esses, que são “prenomes compostos não unidos graficamente, o normal
e esperável é a ocorrência da acrossemia, responsável por formações bastante
expressivas”. (MONTEIRO, 1987, p.193).
Já no caso dos oniônimos13, a frequência se inverte, pois, segundo o autor, a
acrossemia é bem mais produtiva do que a braquissemia. Nesse grupo, a acrossemia é
novamente responsável por uma redução em cada palavra-base – de um composto ou de
uma expressão – para a formação de uma nova palavra. Alguns casos desse grupo são
Nescau (< Nestlê + cacau), Brastemp (< Brasil + Temperatura), Fiat (< Fabbrica
Italiana diAutomobili Torino) e Cimo (< Companhia Industrial de Móveis).
A proposta de Monteiro (1987) vai em sentido oposto à de autores como
Gonçalves (2016) e Lima (2008 e 2014). Para eles, a acrossemia não é um processo de
formação de palavras propriamente dito, mas pode ser entendido melhor como um
mecanismo que atua em determinados processos morfológicos.
Analisando os dados da formação de antropônimos apresentados anteriormente,
na perspectiva de Gonçalves (2016), seria possível dizer que a acrossemia é um
dispositivo atuante no processo cruzamento vocabular, tanto que, em Claudionor (<
Cláudio + Leonor) e Jomar (< José + Maria), o que ocorre nada mais é do que uma
“mistura de fragmentos de palavras existentes. Nesse sentido, as formas resultantes
refletem iconicamente suas palavras-matrizes” (GONÇALVES: 2016, p. 74).
12A braquissemia é entendida pelo autor como um processo de formação de palavras à parte, no qual
novas palavras são formadas pelo encurtamento de outras já existentes na língua – este encurtamento
pode ser dado de diversas maneiras, como explica Monteiro (1987, p.191). 13 Monteiro (1987, p.197) define os oniônimos como o objeto do estudo de nomes próprios referentes a
marca industriais ou artigos comerciais.
47
Sobre a formação de hipocorísticos, Lima (2008) trata dos mesmos exemplos –
Cadu (< Carlos Eduardo) e Mabel (< Maria Isabel) – sem recorrer ao termo acrossemia,
visto que, segundo sua análise, formações como essas são produzidas por se
submeterem a uma série de filtros e terem tratamento mais adequado com base na noção
de Circunscrição Prosódica14.
Focalizando agora os oniônimos apresentados por Monteiro (1987), é possível
perceber que o autor agrega no “rótulo” acrossemia tanto os exemplos que Lima (2014)
descreve como sigla quanto casos referidos por Andrade (2016) como cruzamento
vocabular.
A ocorrência de Fiat (< Fabbrica Italiana Automobili Torino), por exemplo, é
designado como uma sigla em Lima (2014, p.6) por consistir na “combinação das
iniciais de um nome composto ou de uma expressão”. Esse caso, na análise do mesmo
autor, é classificado ainda como um acrônimo, por ser uma sigla “cuja sequência de
letras permite a pronúncia de uma palavra normal” (LIMA, 2014, p.6), como também
ocorre em ENEM (< Exame Nacional do Ensino Médio).
Retomando agora o caso de Nescau (< Nestlê + cacau), que Monteiro (1987)
analisa no mesmo grupo de Fiat, é possível notar que ambos podem até ser semelhantes
por se tratarem de novas palavras originadas de palavras-base já existentes na língua,
mas são formadas por meio de processos diferentes.
O exemplo de Nescau (< Nestlê + cacau) se aproxima da definição de siglagem,
apresentada por Lima (2014), na medida em que é uma combinação de letras originadas
de duas palavras-base, mas não constitui uma sigla, uma vez que um dos requisitos da
siglagem é que seus produtos sejam formados apenas por meio das iniciais de cada base,
e em nescau isso não ocorre, tanto que /cau/ é a sílaba final da segunda palavra-base,
cacau.
Caso semelhante é Nescafé (< Nestlé + café), analisado em Andrade (2008)
como um cruzamento vocabular, visto que ocorre uma mescla lexical de duas palavras
sob um único acento e com um único significado. Sendo assim, Nescau (< Nestlê +
cacau) também seria um dado de CV.
14A Circunscrição Prosódica é um dos princípios da Teoria da Morfologia Prosódica, desenvolvida por
McCarthy& Prince (1990).
48
Pode-se concluir, então, que a análise de Monteiro (1987) é significativa
principalmente por investigar processos morfológicos geralmente colocados à margem
dos estudos linguísticos, tanto que em diversas obras nem se fala de processos
morfológicos não concatenativos.
No entanto, a pesquisa de Monteiro (1987) é imprecisa em alguns aspectos.
Primeiramente, é contestável o fato de a acrossemia ser um processo de formação de
palavras. Levando em conta os dados apresentados, é coerente afirmar que a acrossemia
se assemelha a um mecanismo que leva à combinação de determinadas partes de
palavras e pode ser entendida como um dispositivo que atua tanto na hipocorização
como em outros processos morfológicos.
Outro aspecto contestável é o tratamento impreciso que o autor atribui a grupos
morfológicos distintos, desconsiderando suas diferenças. Em outras palavras, Monteiro
(1987) trata três processos morfológicos – cruzamento vocabular, hipocorização e
siglagem – sem esclarecer as diferenças entre eles, o que acaba desprezando as
particularidades de cada um. Por outro lado, seus exemplos revelam que as fronteiras
entre os processos não concatenativos podem ser flexíveis, havendo casos que parecem
atuar no limiar entre siglagem, hipocorização e cruzamento.
Diante de todos os enfoques sobre o cruzamento vocabular vistos até aqui,
apresentamos não só sua definição e tipologia, mas também seu valor expressivo e o
paralelo entre ele e outros processos morfológicos; essas noções são essenciais para a
descrição do corpus desta pesquisa – cruzamentos formados por, pelo menos, um
antropônimo. Continuando a seguir, com a revisão bibliográfica, o próximo capítulo
apresenta algumas noções sobre a antroponímia, concepção também significativa para a
análise do corpus aqui adotado.
49
3. ABORDAGENS SOBRE A ANTROPONÍMIA
O presente capítulo é dedicado a uma breve revisão bibliográfica sobre o objeto
de estudo da antroponímia, área de conhecimento raramente explorada em materiais
morfológicos da Língua Portuguesa. Como os antropônimos formam uma parte
integrante do corpus desta pesquisa, é fundamental que sejam revistas algumas
abordagens sobre a antroponímia no Português Brasileiro. Sendo assim, será
estabelecida, a seguir, uma revisão bibliográfica desse tema.
3.1 DEFINIÇÃO E ASPECTOS INTRODUTÓRIOS
O ramo da Linguística que se dedica ao estudo dos nomes próprios é chamado
de Onomástica. Em linhas gerais, essa área se divide em duas especialidades: a
antroponímia e a toponímia. A primeira, cerne de estudos do capítulo, focaliza os
antropônimos15, ou seja, nomes personativos, que designam pessoas; a segunda
especialidade, toponímia16, é referente a nomes de lugares.
Embora essa seja a linha adotada, há controvérsias sobre quais classes fazem
parte dos nomes próprios, como descreve Amaral (2011). Segundo alguns autores, a
antroponímia e a toponímia não são as únicas classes de nomes próprios, mas diante de
um levantamento feito pelo autor, essas duas especialidades foram encontradas na
classificação de todos estudiosos consultados em diferentes línguas, como o inglês,
holandês, francês e espanhol17. Sendo assim, a antroponímia e a toponímia são classes
certamente incluídas nos nomes próprios e são as que mais recebem atenção dos
estudiosos.
A antroponímia também é uma área heterogênea quanto suas subclasses – tanto
que chega a ser considerada “a categoria mais diversificada de nomes próprios”
(AMARAL, 2011, p. 64). Estudiosos empenharam-se em traçar uma tipologia para os
antropônimos na perspectiva linguística, mas ainda “faltam trabalhos que busquem
definir e classificar tais itens, levando-se em conta, especialmente, dados do português
brasileiro” (p. 64).
15Do grego anthropos ‘homem’ + ónoma ‘nome’ (Cunha: 2010). 16Do grego tópos ‘lugar’ + ónoma ‘nome’ (Cunha: 2010). 17Allerton (1987) no inglês, Van Langendonck (2007) no inglês e horlandês, Wilmet (1995) e Jonasson
(1994) no francês e López García (2000) e Bajo Pérez (2002) no espanhol – cf. Amaral (2011, p. 65).
50
Mediante essa carência e debruçado na revisão bibliográfica de estudos
anteriores, Amaral (2011) apresenta uma proposta de classificação dos antropônimos,
considerando o uso social dos nomes no Brasil, levando em conta fatores semânticos e
pragmáticos. Sendo assim, seus estudos foram adotados neste trabalho.
Antes de expor sua proposta de categorização, o autor esclarece que entende
como antropônimos apenas os nomes desprovidos de significado lexical, diferente dos
nomes de parentesco (mamãe, papai, madrinha, etc.) e de elementos como fulano,
beltrano e sicrano, que possuem significado lexical e, inclusive, têm entrada em
dicionários.
A categorização de Amaral (2011) é baseada em dados retirados de textos da
Folha de São Paulo durante o ano de 2009 e divide os antropônimos em dois grandes
grupos: ortônimos e alônimos. O ortônimo18 equivale ao nome civil completo, como
aparece no registro civil e se subdivide em prenomes e sobrenomes. Já o alônimo19, ao
contrário do primeiro, é o nome não oficial, ou seja, não registrado civilmente;
subdivide-se em hipocorístico, apelido, pseudônimo/codinome, heterônimo, nome
artístico/de palco e nome de guerra. Essa divisão é representada no diagrama20 a seguir
e será descrita adiante.
Diagrama 3: Categorização dos antropônimos
18Do grego orthós ‘reto, direito’+ ónoma ‘nome’ (Cunha: 2010). 19Do grego allo- de allós ‘outro, diverso’+ ónoma ‘nome’ (Cunha: 2010). 20 Diagrama da tipologia de antropônimos proposta por Amaral (2011, p.76).
51
A começar pelo grupo dos ortônimos, o prenome é o antropônimo que precede o
sobrenome e normalmente diferencia um indivíduo de outros em seus grupos sociais.
Também conhecido como nome de batismo ou antenome, o prenome pode ser simples
ou composto. Quando simples, tem apenas um item lexical, como Tiago e Lorena;
quando composto, tem mais de um, a exemplo de Luís Felipe e Maria Clara.
O sobrenome, por sua vez, é o antropônimo que sucede o prenome; Silva,
Oliveira e Souza são exemplos comuns no Brasil. Também designado como nome de
família, o sobrenome normalmente é passado de pais para filhos, tanto que podem ser
patronímicos, “antropônimos que têm origem no nome do pai ou de um ascendente
masculino”, ou matronímicos, “originários do nome da mãe” (AMARAL, 2011, p.71).
Essa relação é tão precisa que há sobrenomes como Júnior, Filho, Sobrinho e Neto que
indicam diretamente o parentesco entre o portador do nome e seu familiar.
O grupo dos ortônimos tem importância efetiva nos antropônimos e,
de acordo com a legislação brasileira, o prenome, junto com o sobrenome,
constitui o nome pessoal garantido por lei: “Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome” (BRASIL, 2002). O
prenome é utilizado oficialmente pelo portador durante toda a sua vida, mas o
art. 1º da Lei Nº 9708, de 18 de novembro de 2008, possibilita sua
substituição: “O prenome será definitivo, admitindo-se, todavia, a sua
substituição por apelidos públicos notórios”. (AMARAL, 2011, p.70)
Sobre esse fato, Ullmann (1987) também faz questão de evidenciar que “a posse
de um nome é, e tem sido desde tempos imemoriais, privilégios de todo ser humano”
(p.148), ou seja, todos têm direito a um nome independentemente de condições sociais,
econômicas ou de qualquer outro fator, o que gera grande heterogeneidade de dados.
Passando agora para o grupo dos alônimos, serão brevemente descritas as seis
subclasses. O hipocorístico, já analisado no capítulo 2, é descrito por Amaral (2011)
como o produto de uma alteração morfológica de um antropônimo, como abreviação,
diminutivo e aumentativo. Como discutido no capítulo anterior, essa definição se opõe
ao conceito adotado aqui, de Gonçalves (2001), que considera como hipocorístico
apenas as formas encurtadas dos nomes. Como esse não é foco agora, basta esclarecer
que hipocorístico é diferente do apelido, por guardar identidade com o antropônimo, e
geralmente é usado de forma afetiva, a exemplo de Dudu, originado de Eduardo, e Rafa,
de Rafael.
52
A segunda subclasse é o apelido (ou alcunha) definido como “antropônimo
atribuído a um indivíduo geralmente por outra pessoa. Muitas vezes alude a uma
característica física ou intelectual e pode ou não ser depreciativo”, conforme Amaral
(2011, p.72). Presuntinho, por exemplo, é o apelido dado a um menino cujas
características físicas, de peso e cor da pele, se assemelham a de um porco.
O pseudônimo, por sua vez, é um antropônimo usado no lugar do nome civil de
uma pessoa, como por exemplo Stanislaw Ponte Preta, pseudônimo do escritor,
radialista e compositor Sérgio Marcus Rangel Porto. Diferente do apelido, o
pseudônimo é escolhido pelo próprio portador e outra característica dessa subclasse é
que o pseudônimo pode ou não ser encoberto. Já o codinome é “utilizado para ocultar
ou nomear um plano de ação ou uma organização” (AMARAL, 2011, p.73). Pode
esconder a identidade de alguém, e, assim, sua concepção é considerada próxima à do
pseudônimo.
O heterônimo é um antropônimo correspondente a um indivíduo fictício, o que o
distingue do pseudônimo embora sejam parecidos. O referente fictício é criado pelo
portador de outro antropônimo. Caeiro, por exemplo, é um dos heterônimos do poeta
português Fernando António Nogueira Pessoa.
A quinta subclasse, nome artístico, é um antropônimo usado no lugar do nome
civil pelo qual uma pessoa se identifica profissionalmente. Um exemplo é Dolores
Duran, nome artístico de Adiléia da Silva Rocha. Semelhante a esse uso, o nome de
palco tem acepção semelhante.
O nome de guerra, por último, se assemelha ao nome artístico, mas, por não se
aplicar apenas na esfera artística, se distingue desse, tanto que parece ser comum na
esfera militar, por exemplo, e pode ser usado em qualquer área de atividade. O nome de
guerra também se aproxima do pseudônimo, mas não carrega o sentido pejorativo que
aquele possui. Sendo assim, o nome de guerra constitui uma subclasse à parte, que pode
ser exemplificada por Deadmau5, nome de guerra do DJ/produtor Joel Zimmerman, e
Adriana, nome de guerra de uma garota de programa21.
Diante dessa categorização, proposta por Amaral (2011), é necessário destacar
que
21 Exemplos retirados de Amaral (2011), bem como a maioria dos outros nesse tópico.
53
esses conjuntos não possuem delimitação rígida e pode haver transição de um
a outro. Um indivíduo pode, por exemplo, usar seu hipocorístico ou apelido
como nome artístico. Esse fato pode ser exemplificado com (8), em que a
atriz Daniela Maria Giustti Barra explica que adotou o apelido Calabresa
como nome artístico. (pág. 77)
A divisão e subdivisão das classes antroponímicas no Português Brasileiro é,
provavelmente, resultado de relações sociais complexas formadas por diferentes
motivações, cujo uso se enquadra em diferentes esferas sociais. Admitindo-se que
existem outras propostas de classificação, adotamos a de Amaral (2011) por ser
aparentemente completa e baseada no uso social dos nomes no Brasil, sem menosprezar
fatores semânticos e pragmáticos.
Além da classificação apresentada, os estudos da antroponímia também podem
ser realizados por outras perspectivas, a saber: motivação, significado, neologismos,
processos de formação, etimologia, frequência, estrangeirismos, influências culturais,
entre outras, todas voltadas aos antropônimos. Mantendo o foco desta pesquisa, serão
revisadas referências que focalizam as quatro primeiras perspectivas citadas.
Antes de apresentar as perspectivas, é importante esclarecer que, como corpus,
os estudiosos da antroponímia geralmente recorrem a catálogos como lista telefônica
(CASTRO, 2004), registro de paróquias (MEXIAS-SIMON, 2004), lista escolar de
estudantes (MEXIAS-SIMON, 2004), documento de aprovados em universidade
(POSSIDÔNIO, 2009), variados sites brasileiros (SIMÕES-NETO E RODRIGUES,
2017), entre outros.
3.2 PERSPECTIVAS DE ESTUDO
3.2.1 Motivação
A relação do nome com as coisas não é um foco de estudo recente, uma vez que
já no século XI a.C. esse debate vinha sendo traçado pelos filósofos que estudavam a
língua, como afirma Dick (1987, p.190). Esse questionamento tomou maiores
proporções e chegou também à antroponímia, na medida em que há uma discussão que
gira em torno da arbitrariedade ou não dos prenomes, como será visto adiante.
Há povos que acreditam convictamente na motivação sobrenatural dos nomes. A
chamada “verdadeira teoria do nome”, apresentada por Dick (1987, p.190), afirma que
54
“bons nomes” conquistam benefícios originados de um mundo superior enquanto os
“maus nomes” atraem influências negativas não só a seu referente, mas também ao
grupo em que ele está inserido.
Algumas tribos indígenas, por exemplo, atribuem valores místicos e mágicos aos
nomes. A importância dos nomes para eles é tamanha que os Bororo, tribo do Centro
Oeste brasileiro, conferem aos seus habitantes cinco nomes com finalidades distintas
durante a vida. Alguns povos africanos também defendem a significação dos
antropônimos e são motivados a uma boa escolha de nome para afastar espíritos
malignos, como também explica Dick (1987).
Embora essa percepção mágica não tenha desaparecido totalmente, a motivação
para escolha de nomes não é mais essa, na maioria das sociedades. Muitos nomes são
escolhidos por modismo, como, por exemplo, a partir de personagens de novela e de
filmes. Além desse fator, há também muitas escolhas de nomes bíblicos e por tradições
familiares. De qualquer forma, a questão da moda se mostra realmente forte – tanto que
em alguns contextos são preferidos os nomes simples e curtos enquanto, em outros, a
tendência predominante são os nomes complexos, a depender de variáveis como tempo,
espaço, classe social, etnia etc.
As motivações da escolha de prenomes apresentadas por Obata (1994)
convergem com essas expostas por Dick (1987), mas vão além ao apontar outras.
Segundo a autora, um nome também pode ser escolhido por motivos políticos ou
históricos quando os pais empregam nomes de personalidades ou até de fatos pelos
quais são simpatizantes, como, por exemplo, a ocorrência de muitos adultos chamados
Adolf Hitler na década de 80. Nomes também podem ser escolhidos simplesmente por
gosto dos pais, fantasia ou até por arbitrariedade, como defende a autora.
Sobre os critérios para a escolha de um prenome, Obata (1994, p.6) relaciona
seis e explica que
escolher o nome para um filho pode ser uma tarefa apaixonante e ao mesmo
tempo fatigante. A preocupação começa muito antes do nascimento da
criança. Em primeiro lugar, exige-se que o nome tenha um som agradável, depois, que tenha qualidades estéticas, ambientais, de significado, e até que
expresse as tendências sociais ou políticas dos pais.
Como se vê, a motivação de um nome integra muitos fatores de diferentes
ordens, como aspectos culturais, históricos, fonológicos, estilísticos e, sobretudo, os
55
semânticos. O grande debate em torno da motivação antroponímica é a questão do
significado, como será abordado a seguir.
3.2.2 Semântica
O prenome, de acordo com alguns estudiosos, não passa de um “rótulo de
identificação social” que distingue um referente do outro. Essa corrente afirma que o
antropônimo constitui um mero símbolo desprovido de qualquer significado e é
escolhido para seu portador de maneira totalmente arbitrária, sendo apenas uma “marca
de individualidade”, como descreve Obata (1994, p. 5).
Essa linha de pensamento não é recente. Já no século XIX, o filósofo John Stuart
Mill afirmava que
um nome próprio não é mais que uma marca sem significado que
relacionamos na nossa mente com a ideia do objeto, na intenção de que
sempre que a marca se encontre com os nossos olhos, ou ocorra à nossa
memória, possamos pensar naquele objeto individual. (MILL, 1879, p. 36)
A característica de identificação é o critério mais importante que diferencia o
nome comum do nome próprio, na medida em que o segundo tem o papel de
singularizar um indivíduo, mas não porta valor semântico. No exercício de distinguir os
nomes comuns dos próprios, Mill (1879) lista outros critérios que convergem para a
mesma conclusão.
No parâmetro designação contra conotação, ratificado em Ullmann (1964),
prevalece a ideia de que os antropônimos “não são conotativos: designam os indivíduos
que por eles são chamados; mas não indicam nem implicam nenhum atributo como
pertencentes a estes indivíduos” (MILL, 1879, p. 33). Desse modo, os nomes próprios,
diferente dos comuns, são apenas denotativos, não conotativos.
Com relação ao som distintivo, explica-se que a identificação característica dos
nomes próprios é adquirida, também, por meios fonológicos ao singularizar nomes por
sons contrastivos, mas, ainda assim, desconsiderando qualquer significado relacionado
ao som.
Em oposição a essa corrente, Dick (1987) reitera a afirmação de Cassier de que
“o nome não é nunca um mero símbolo, sendo parte da personalidade de seu portador: é
uma propriedade que deve ser resguardada com o maior cuidado e cujo uso exclusivo
deve ser ciosamente reservado” (CASSIER, 1985, p. 60).
56
Em conformidade com essa corrente proposta por Cassier (1985), e em oposição
à declaração de Mill (1879), a pesquisa de Camara (2008) defende que é impossível
compreender os nomes próprios simplesmente como denotativos. Nesse viés, a autora
elenca dez argumentos que justificam essa afirmação (CAMARA, 2008, pp. 27-39),
como será brevemente resumido a seguir.
Primeiramente, é pontuada a ocorrência de nomes próprios se tornarem nomes
comuns. Exemplos como chauvinismo, originado do nome Nicolas Chauvin de
Rochefort, apontam para uma conotação proveniente dos nomes próprios, que motivou
tal criação. Em outras palavras, a denotação, por si só, não daria conta de explicar essa
mudança.
Além de nomes comuns, antropônimos também podem tornar-se verbos, a
exemplo de malufar, expressando uma reação negativa ao político Paulo Maluf. Além
da conotação negativa, também são possíveis casos dessa natureza que expressem cunho
apreciativo. De qualquer modo, não há justificativa plausível para desconsiderar a
conotação que os nomes próprios possuem.
O terceiro argumento focaliza exemplos originados na Grécia, fonte da cultura
ocidental e de onde surgiram nomes como Édipo, herói da tragédia grega cujos pés
foram amarrados ao nascer, razão pela qual recebeu esse nome que significa ‘pés
inchados’. Exemplos como esse sinalizam, mais uma vez, o traço semântico presente
nos antropônimos.
A Bíblia também fornece indícios que apontam para a conotação dos nomes.
Nas situações bíblicas em que uma pessoa muda de nome, a troca não é arbitrária; pelo
contrário, é sempre motivada. O exemplo de Abrão evidencia esse aspecto porque, ao
receber de Deus o nome Abrãao, um novo batismo é anunciado.
Como quinto argumento, a autora desencadeia um fato histórico em que novos
cristãos nomeavam a si mesmos com nomes de animais e de árvores frutíferas para se
livrarem da perseguição aos judeus; desse modo, assumiam nomes como Leão, Lobo,
Pereira, Laranjeira. Se os antropônimos não possuíssem significados, em vão seria
essa estratégia.
A questão do tabu linguístico também muito contribui para este debate. Há
nomes com elevado nível de honra que são evitados de serem proferidos, como o nome
57
de Deus, por exemplo, que é omitido em certos contextos como a oração do celebrante
da igreja católica ao dizer “Bendito seja o seu santo Nome!”. Além desse caso, também
é evitada a pronúncia de nomes de espíritos malignos, como diabo e demônio, sendo
substituídos por demo, o cujo, entre outros, a depender da situação comunicativa.
Além dos seis argumentos expostos até então, os nomes próprios ainda
demonstram indícios de que podem classificar certas situações. Por exemplo, a
tendência de alguns prenomes estrangeiros, como Washington e Jennifer, é revelar
ascensão social, portanto são nomes mais usuais nas classes menos favorecidas. Por
outro lado, as famílias com maior poder econômico dão preferência a nomes mais
simples, como Antônia e João, gerando uma quebra de expectativa e uma sofisticação
pelo alto nível socioeconômico.
O próximo argumento, já citado na seção anterior, focaliza a escolha de
prenomes baseada em famosos, por suas atitudes ou por suas qualidades como pessoa;
são exemplos desse cenário nomes como Getúlio, renomado político, e Roberto Carlos,
notável cantor e compositor brasileiro. “Nesses casos, o antropônimo não é uma simples
identificação; é o próprio ser” (CAMARA, 2008, p. 32).
A conotação do nome próprio é tão forte que é capaz até de perpetuar o nome de
alguém, mesmo após a sua morte. Esse, inclusive, é um dos possíveis motivos de
escolha de um nome para uma criança. Na cultura brasileira, é comum que a criança
receba nomes para homenagear alguém da família e, assim, faça perdurar o nome da
pessoa condecorada.
Por fim, o último argumento citado pela autora enfatiza o campo da literatura. A
escolha dos nomes dos personagens é sempre feita com uma intenção, como o nome
Diadorim de Grande Sertão: Veredas, por exemplo, que conota o ser e o não-ser em
que Deus e o demo se distanciam. Há muitos outros exemplos nesse sentido, mas o que
importa agora esclarecer é que “o nome próprio dos personagens é o primeiro estágio de
individualização, uma forma de fazer adquirir vida própria, de destacar-se e de
diferenciar-se dos demais” (CAMARA, 2008, p. 33).
Diante dos argumentos apresentados, só há uma conclusão plausível: o nome
“classifica, individualiza e significa; é apropriado” (CAMARA, 2008, p. 34).
58
3.2.3 Neológica
A antroponímia no Português Brasileiro possui uma característica muito
singular: a criatividade linguística – não vista em outras línguas (pelo menos não na
mesma proporção). Em Portugal, por exemplo, existem normas que controlam a
escolhas de nomes, de modo que os portugueses só podem escolher nomes que sejam
autorizados por uma lista22, ao passo que não podem nomear seus filhos com nomes que
constem na lista de nomes proibidos. Essas listas foram elaboradas por uma série de
preocupações, como a conservação da Língua Portuguesa no território (impedindo
estrangeirismos) e a preservação dos indivíduos à exposição de nomes constrangedores,
entre outros motivos.
No Brasil, por outro lado, como esse conservadorismo não atua, o que se pode
notar é uma “espantosa liberdade que ocorre na antroponímia brasileira, em que a
imaginação criativa corre à solta na escolha dos nomes de batismo” (CASTRO, 2004).
E não é preciso muito aprofundamento para se chegar a essa conclusão, uma vez que
muitos brasileiros têm conhecimento de pelo menos uma pessoa que possua um nome
inovador e, muitas vezes, excêntrico.
Obata (1994, p.7) explica que esses nomes incomuns recorrentes no Brasil
podem ser justificados pela extravagância ou até por ignorância dos pais. Dentre muitos
casos, a autora lista uma série de exemplos que serão aqui também mencionados:
Abecê Nogueira, Antônio Morrendo das Dores, Bemvindo o Dia do Meu Nascimento
Cardoso, Cafiaspirina Cruz, Céu Azul do Sol Poente, Dezecênio Feverêncio Delegas,
Francisoréia Dorotéia Dorida, Jacinto Dores Peta, João da Mesma Data, Luciferino
Barrabás, Oceânico Atlântico Linhares, Prodamor Conjugal de Marichá e Marimel,
Rolando de Alto a Baixo da Estrada, Serpentina Rodo Metálico, Um Dois Três de
Oliveira Quatro, Zero Fonseca etc.
Embora haja uma lei23 de 1973 que tente evitar a ocorrência de prenomes que
causem constrangimento a seus referentes, ainda há inúmeros casos como esses, tanto
22Disponível em: <http://rederecord.r7.com/video/lista-com-cinco-mil-nomes-proibidos-vira-lei-em-
portugal-4d59337a9dfc1bf61d9a1f4b/>. Acesso em: Out. 2018. 23“A lei nº 6015 de 1973, no seu artigo 55, prevê que ‘os oficiais do registro civil não registrarão
pronomes suscetíveis de expor ao ridículo seus portadores. Quando os pais não se conformarem com a
recusa dos oficiais, este submeterá por escrito o caso, independentemente da cobrança de quaisquer
emolumentos, à decisão do juiz competente’” (OBATA, 1994, p. 8).
59
que se a escolha de nomes excêntricos não fosse tão recorrente na antroponímia
brasileira, provavelmente não teria necessidade de haver uma lei nesse sentido, já que
não há preocupação social com o conservadorismo, como ocorre em Portugal. E,
independentemente da lei, os pais deveriam refletir acerca dos problemas que os nomes
escolhidos podem acarretar em seus filhos.
Como foi visto, há casos de nomes excêntricos em que são quase
incompreensíveis as razões de escolha dos pais, mas, por outro lado, há situações cujos
motivos são mais transparentes. Nesse contexto, encaixam-se os casos de união de
nomes na medida que
grande parte dos nomes excêntricos são provenientes de combinação de dois
nomes, principalmente do pai e da mãe. São exemplos Claudionor (Cláudio e
Leonor), Jomar (José e Maria), Erlice (Ernesto e Alice), Aguimar (Aguinaldo
e Maria), Edigênio (Edite e Eugênio), Mariel (Maria e Ariel), Marielza
(Maria e Elza), Gusmira (Gustavo e Almira), Vanderci (Vanderlei e Cilene).
O conhecido escritor e cartunista Ziraldo Alves Pinto costuma dizer que já
nasceu com pseudônimo, graças à criatividade do seu pai, que combinou o
nome da esposa e o seu próprio para formar o nome do filho (Zizinha e
Geraldo). (OBATA, 1994, pp. 8-9)24
Como se pode notar, são consideráveis os casos em que prenomes funcionam
como uma forma de homenagear duas pessoas de uma só vez, principalmente os pais.
Nesse uso, merece destaque ainda o fato de a combinação usar como bases dois nomes
de gêneros diferentes para criar um nome que se refira a um só gênero, o que pode gerar
ambiguidade.
3.2.4 Morfológica
Diante de uma breve compilação de estudos antroponímicos brasileiros, pode-se
afirmar que são raros os que descrevem processos morfológicos de formação dos
nomes. Algumas das pesquisas que voltam à atenção para essa perspectiva são Monteiro
(1987), Soledade (2012) e Simões Neto e Rodrigues (2017) – esta última obra faz um
mapeamento mais geral baseando-se nas outras duas anteriores. Os processos de
formação de antropônimos serão revisados adiante.
Antes de mais nada é fundamental esclarecer que
24 Alguns exemplos presentes nessa citação são também encontrados em Monteiro (1987, p.185), como
foi apresentado no capítulo anterior.
60
quando se trata da análise dos processos de formação dos nomes próprios e
dos operadores que atuam nesse processo, as bases linguísticas se apóiam e,
em geral, se encerram em parâmetros aplicáveis a nomes comuns, não tendo
sido ainda identificados estudos que apontem para uma definição das peculiaridades dos processos morfolexicais de formação do léxico
antroponímico. (SOLEDADE, 2012, p. 328)
Por essa deficiência de materiais voltados à formação de antropônimos, Simões
Neto e Rodrigues (2017, p. 118) reafirmam a necessidade de “levar em conta as
peculiaridades que a morfologia dos nomes próprios tem”, e descrevem assim os
denominados processos genolexicais na formação de nomes de pessoas do Brasil.
Diante disso, os autores traçam um panorama desses processos tendo como base a
Morfologia portuguesa, de Monteiro (1987).
Apoiando-se em processos de formação de nomes comuns, mas contemplando
especificidades dos antropônimos, os autores listam sete processos: derivação
imprópria, sufixação, composição, braquissemia, acrossemia, anagrama, e empréstimos
– cada um será brevemente apresentado a seguir.
No seu sentido básico, a derivação imprópria é caracterizada pela mudança de
classe das palavras. Ao se tratar de antropônimos, o fenômeno “ocorre quando
vocábulos, originalmente tratados como pertencentes ao léxico dos nomes comuns,
passam a ser utilizados no léxico dos nomes próprios, a exemplos dos prenomes
Morena, Sol, Rosa, Branca, etc.”, como afirmam Simões-Neto e Rodrigues (2017).
A sufixação, por sua vez, remete ao acréscimo de partículas a nomes
designativos, como faz o diminutivo em Tereza, por exemplo, gerando Terezinha. O
trabalho de Soledade (2012) é voltado somente para a sufixação em nomes personativos
no português arcaico e apresenta exemplos de sufixo como -nte (Vicente, Clemente) e -
el (Miguel, Isabel).
A composição dos antropônimos, como nos nomes comuns, também apresenta
dois tipos, de acordo com a perspectiva fonológica, a justaposição e a aglutinação. Esses
dois tipos, no entanto, geram três grupos: nomes separados (p.ex. José André), nomes
justapostos (p.ex. Analucia) e aglutinados (p.ex. Rosalva).
O quarto “processo” é a braquissemia, baseada nos termos de Monteiro (1987),
para designar parte de palavra usada no lugar da palavra inteira. Esse fenômeno abrange
o truncamento e o hipocorístico. Sobre o truncamento, Simões-Neto e Rodrigues (2017)
não apresentam exemplos de antropônimos – os exemplos expostos são de palavras
61
comuns como refri (refrigerante) e madruga (madrugada). Já o hipocorístico sempre
possui antropônimos como base e, mesmo sendo uma forma afetiva de prenomes,
podem acabar sendo usados como nomes de batismo, como ocorreu com Zeca.
A acrossemia é caracterizada pela mescla de sílabas ou fonemas. Já explicado no
capítulo anterior, esse “fenômeno” mistura dois nomes para formar um terceiro, como
ocorre na combinação de nomes de pais, já citada no tópico da perspectiva neológica.
Sobre esse fato, inclusive, Simões-Neto e Rodrigues (2017, p. 125) contribuem com
dois dados formados pelas mesmas bases em ordens diferentes: Mart’nália (< Martinho
+ Anália) e Analimar (< Anália + Martinho), caso de duas irmãs que receberam tanto o
nome da mãe quanto o do pai.
O processo de anagrama ocorre quando há “inversão total ou troca de sílabas dos
nomes e, ao que parece, não se mostra como um recurso na formação de nomes
comuns” (SIMÕES-NETO E RODRIGUES, 2017, p.125). Exemplo conhecido de
anagrama é o caso de Iracema, formado por América; além deste, os autores
acrescentam Alobened e Airam, anagramas de Denébola e Maria, respectivamente.
O último processo é o de empréstimos, causado pela ocorrência de nomes
importados de outra língua, a exemplo de Charles e Elvis. Nesse grupo, é comum a
ocorrência de uma espécie de manutenção fonológica e/ou ortográfica da língua que
recebe os nomes, como o nome do músico britânico John Lennon, que passou a nomear
brasileiros como João Lennon.
Diante do breve panorama morfológico apresentado aqui, não se pode perder de
vista que
o estudo da morfologia dos nomes próprios é ainda incipiente, revelando-se,
portanto, um desafio a partir do que se conhece da morfologia dos nomes
comuns para se tentar estabelecer as bases linguísticas que entram nos
processos morfolexicais de formação de antropônimos. (SOLEDADE, 2012,
p.328)
Dos sete processos de formação de antropônimos, a acrossemia é o mais
significativo para o presente trabalho. Além disso, o aspecto morfológico e a motivação
dos antropônimos, em suas perspectivas semântica e neológica, contribuem para as
abordagens sobre a antroponímia traçadas neste trabalho. O somatório dessas
abordagens com os enfoques sobre o cruzamento vocabular, vistos no capítulo 2, dão
suporte para a análise de dados do corpus desta pesquisa, realizada no próximo capítulo.
62
4. ANÁLISE DE DADOS
Neste capítulo, apresentamos uma proposta de análise dos dados de cruzamento
vocabular formados por, pelo menos, uma base antroponímica. Ao todo, coletamos 637
dados que categorizamos em quatro grupos distintos. O primeiro, antropônimos
acrescidos de qualificador, apresenta dados em que uma base é antroponímica e a outra,
não; a principal função de seus dados é a atitudinal, uma vez que revelam atitudes
subjetivas dos falantes em relação à personalidade avaliada, a exemplo de Jeguerino (<
jegue + Severino). O segundo grupo é denominado como shippagem, por englobar
dados oriundos desse fenômeno, apresenta antropônimos em ambas as bases e tem
como objetivo nomear casais, como em Shirlipe (< Shirlei + Felipe). O terceiro grupo,
por sua vez, é constituído de nomes de batismo e também apresenta duas bases
antroponímicas, mas não para nomear casais e sim um único indivíduo, a exemplo de
Marcotônio (< Marco + Antônio). Por fim, o quarto grupo forma oniônimos, em que
uma base é formada por nome comum e outra por antropônimo, como Veterimário (<
veterinário + Mário).
O presente trabalho é de caráter descritivo, uma vez que objetiva pormenorizar
de que maneira os dados são formados e como é seu uso no contexto social em que
estão inseridos. Adotamos uma metodologia qualitativa, a fim tecer uma análise de
como os dados se comportam. A coleta de dados foi feita, principalmente, da internet,
mas de modos diferentes nos quatro grupos, devido às especificidades de cada um.
Os dados do grupo dos antropônimos acrescidos de qualificador foram retirados
principalmente das seguintes fontes: (a) redes sociais, como Twitter, Facebook e
Instagram; (b) sites humorísticos, como a Desciclopédia25; (c) jornais online,
especialmente nas matérias esportistas, como o Globo Esporte do jornal G1; (d) revistas
online, em especial de temáticas políticas, como a Isto é; (e) sites diversos, como
Imprensa viva; além de (f) trabalhos anteriores e (g) conversas informais.
O grupo da shippagem, por sua vez, teve seus dados retirados sobretudo de (a)
redes sociais, como Twitter, Facebook e Instagram; (b) sites de fanfics, como
Spiritfanfiction; (c) jornais online, especialmente na categoria entretenimento, como o
25“Desciclopédia é uma (des)enciclopédia escrita com a colaboração de seus leitores, (...) é um site de
humor debochado e seu conteúdo não deve ser levado a sério. Todas as nossas regras e políticas
convergem para um só princípio: ser engraçado e não apenas idiota”. Disponível em:
<https://desciclopedia.org/wiki/P%C3%A1gina_principal>. Acesso em: Jan. 2019.
63
Gshow do jornal G1; (d) revistas online, sobretudo de temáticas de adolescentes do sexo
feminino, como Capricho e Toda teen; (e) sites diversos, principalmente sobre fofoca
de famosos, como O fuxico, além de (f) conversas informais.
As fontes do terceiro grupo, nomes de batismo, são basicamente as seguintes: (a)
a rede social Facebook; (b) sites diversos de interação dos usuários, como o Yahoo
Respostas; (c) o site sobre gestação Baby Center, na categoria sobre nomes de bebês;
além de (d) trabalhos anteriores e (e) conversas informais.
O quarto grupo, que apresenta oniônimos formados por antropônimos e nomes
comuns, é de maior complexidade na tarefa de rastrear dados. Foram coletados apenas
dois dados deste grupo no site Gazeta do povo, cujo título da matéria é “Não tem como
negar que esses 14 trocadilhos são obras de brasileiros”, e apresenta a criatividade
linguística dos brasileiros para nomear estabelecimentos comerciais. Entre os quatorze
nomes, dois são formados pelo cruzamento vocabular envolvendo bases
antroponímicas: Veterimário (< veterinário + Mário) e Paulufusos (< Paulo +
parafusos). Pelo número restrito de dados, é o único grupo que não está descrito em um
tópico específico.
A seguir, os três primeiros grupos serão investigados separadamente. Em cada
seção, há pelo menos duas subdivisões: primeiro é apresentado o corpus de maneira
detalhada; logo depois, segue a análise dos dados. Além disso, é traçado, nas seções 4.2
e 4.3, um comparativo entre os dados do grupo com um dos processos morfológicos
apresentados no capítulo 226. O grupo da shippagem é o único que possui um subtópico
a mais, para a descrição do fenômeno.
4.1 ANTROPÔNIMO ACRESCIDO DE QUALIFICADOR
4.1.1 Apresentação do corpus
O corpus da categoria Antropônimo + qualificador é constituído por 160 dados
coletados em diversos meios de comunicação, principalmente online, como jornais,
revistas, blogs e redes sociais, além de conversas espontâneas. Os dados coletados são
26 Esse paralelo não é apresentado no grupo 1 porque já há uma descrição detalhada, no tópico 2.3.1, do
CV com a composição, mecanismo de maior semelhança com os dados.
64
de diferentes esferas sociais, sendo 2 do campo científico (especificamente da área de
Letras), 2 de personalidades musicais, 5 de anônimos (originados de conversas
espontâneas), 7 de figuras religiosas, 11 de celebridades que atuam na televisão
(apresentador de programa, atores, etc.), 26 da área esportista (principalmente, futebol)
e 107 dados provenientes da política.
As condições necessárias para uma palavra ser integrada ao corpus foram as
seguintes: (a) ser formada pelo cruzamento de duas bases; (b) uma das bases ser
antroponímica; e (c) uma das bases ser, necessariamente, um qualificador, podendo,
nesse caso, também ser um antropônimo que funcione como modificador de outro
prenome. Cada uma será esclarecida a seguir.
Para atestar a formação por meio do cruzamento vocabular, foram levados em
consideração os aspectos descritos no capítulo 2, tanto morfológicos e fonológicos
quanto semânticos. Desse modo, formações como Jeguerino (< jegue + Severino) e
Malafalha (< Malafaia + falha) são interpretadas como produtos do cruzamento
vocabular por mesclarem duas palavras já existentes na língua, de modo que o produto
final ainda mantém relação semântica com as suas bases.
Formações que parecem mais com outros processos de formação de palavras não
foram contabilizadas no presente corpus, a exemplo de Lulice (< Lula + burrice), em
que a parte copiada da segunda base foi apenas o sufixo -ice, o que parece indicar o
mecanismo da sufixação. Outros casos excluídos do corpus foram Mentiradilma (<
mentira + Dilma), que é formado por composição, e Lucifer (< Lula + Ciro + Fernando
(Haddad)), que parece produto da siglagem.
A condição em (b), de que uma das bases deve ser antroponímica, é o que atribui
singularidade a este trabalho. Pesquisas anteriores já analisaram CVs com essa
característica, mas não como foco central. Andrade (2008), por exemplo, inventariou,
no total de 218 dados, apenas 8 com esse caráter, tais como Ladruf (< ladrão + Maluf) e
Malufioso (< Maluf + mafioso). Assunção (2006), por sua vez, analisou 21 dados com
essa característica, como Rouberto (< roubo + Rouberto) e Velhoso (< velho +
(Caetano) Veloso), mas, ainda assim, a base antroponímica não foi uma condição
necessária para a constituição de seu corpus, visto que, ao lado dessas formações,
também foram analisadas formações com nomes comuns.
65
É necessário, neste ponto, retomar o capítulo 3, que esclarece que antropônimos
englobam (i) prenomes, como em Rouberto (< roubo + Roberto); (ii) sobrenomes,
Galinisteu (< Galisteu + galinha); (iii) hipocorísticos, a exemplo de Eduerrado (< Edu +
errado), (iv) apelidos/alcunhas, como em Rateen (< Ratinho + teen); (v)
pseudônimos/codinomes; (vi) heterônimos; (vii) nomes artísticos e (viii) nomes de
guerra, sendo que não houve ocorrências desses quatro últimos grupos.
O requisito (c), que prevê uma base qualificadora, aciona palavras de diferentes
classes gramaticais. O corpus revela que o qualificador pode ser (i) substantivo comum
– Martaxa (< Marta + taxa) – ou próprio – Ballothalles (< Balotelli + Thalles); (ii)
verbo – Ciscarelli (< ciscar + Cicarelli); (iii) adjetivo – Imbeciro (< imbecil + Ciro) ou
(iv) advérbio – Dilmais (< Dilma + mais).
A relação do qualificador com o referente pode ocorrer de maneira mais direta
ou mais indireta. Em Gornaldo (< gordo + Ronaldo), por exemplo, o qualificador gordo
caracteriza diretamente o referente Ronaldo, ex-futebolista da seleção brasileira, de
maneira clara e objetiva. Já em Lazanhário (< lasanha + Nazário), o mesmo sentido é
expresso para o mesmo referente, mas de maneira mais indireta porque o significado de
gordo é expresso em lasanha por metonímia; além disso, esse exemplo se mostra mais
opaco pela escolha do sobrenome do jogador, menos popular que seu prenome. Outros
exemplos ilustram bem essa questão, como a diferença entre galinha e ciscar em
Galinisteu (< galinha + Galisteu) e Ciscarelli (< ciscar + Cicarelli), respectivamente.
A base qualificadora caracteriza o referente do antropônimo, positiva ou
negativamente, a depender do contexto sócio-comunicativo. Quando eminentemente
positiva, a qualificação é exemplificada por dados como Daciolindo (< Daciolo + lindo)
e Fabishow (< Fabi + show), que conferem atributos valorativos aos referentes. Já os
qualificadores com proeminência negativa podem ser exemplificados por Bolsotário (<
Bolsonaro + otário) e Jararaqueline (< jararaca + Jaqueline). Há dados, no entanto, cujo
valor só pode ser depreendido de acordo com o contexto empregado, como ocorre com
Dilmais (< Dilma + mais), que aparece nos seguintes contextos:
(I) Errar 1 vez é lulice!
Errar 2 vezes é dilmais!
Errar 3 vezes é malddad
66
Imagem 1: Dilmais (Meme postado no Facebook)
(II) Legítima presidenta. #dilmais #ondapelademocracia #lula2018
Imagem 2: Dilmais (Postagem no Twitter)
Como se vê, a mesma formação é empregada com características opostas. Na
primeira, o valor da formação destacada é negativo, uma vez que se associa a eleição da
Dilma Rousseff, ex-presidente do Brasil, a um erro repetido e excessivo. Já no segundo
67
contexto, o cruzamento atribui caráter positivo à eleição da Dilma, afirmando que a
mesma é legítima e valida a democracia.
Alguns dados, por outro lado, apresentam características aparentemente neutras,
como Barbosafro (< Barbosa + afro), em que o CV salienta a característica
afrodescendente do referente Joaquim Barbosa, ex-ministro do STF, o que não
necessariamente atribui valor positivo ou negativo ao mesmo.
Pelo fato de o valor discursivo dos cruzamentos depender do contexto, em
alguns casos, é difícil contabilizar os dados que atribuem características positivas ou
negativas, mas, de modo geral, a quantidade de formações com proeminência negativa é
certamente superior. Dos 160 dados coletados, estima-se que 124 atribuem
características negativas aos referentes, independentemente do contexto. Dentre eles,
estão formações como Ruimbinho (< ruim + Rubinho) e Wyllixo (< Wyllys + lixo), que
não variam quanto ao valor negativo atribuído ao esportista Rubens Barrichello e ao
político Jean Willys, respectivamente.
Nos dados desse grupo, antropônimo acrescido de qualificador, geralmente o
determinado é o próprio antropônimo, como em Fernandeus (< Fernando + deus), em
que o jogador do Flamengo é comparado a um deus por ser extremamente competente;
mas isso nem sempre acontece.
O caso de Gordiola (< gordo + Guardiola), por exemplo, une o sobrenome de
um treinador de futebol espanhol, Josep Guardiola, ao adjetivo gordo, mas a intenção
não é caracterizar o treinador como gordo, mas sim qualificar Guto Ferreira, um
treinador de futebol brasileiro. Com dois atributos simultaneamente, Guto é comparado
com o treinador espanhol, por seu bom desempenho profissional, e é caracterizado por
seu peso acima do esperado. Esse uso é raro nos dados encontrados, mas, como houve
essa ocorrência, foi analisada e merece destaque.
Entre os dados coletados, há um número expressivo de formações em que um
antropônimo funciona como qualificador de outro antropônimo, a exemplo de
Bolsohitler (< Bolsonaro + Hitler) e Luanel (< Luan + Lionel). O primeiro atribui a
Bolsonaro, presidenciável das eleições 2018, o caráter de nazista por meio do
sobrenome de Adolf Hitler, líder do Partido Nazista. No segundo caso, Luanel, o
prenome de Messi, considerado um dos melhores jogadores do mundo, qualifica Luan,
jogador do Grêmio que ocupa a mesma posição de Messi no campo, por ter mostrado
68
bom desempenho no último campeonato brasileiro. Observa-se que as bases das
mesclas estão no mesmo domínio conceptual, tanto é que Bolsonaro e Hitler são
políticos e Messi e Luan, jogadores de futebol.
Houve um caso cujo comportamento foi diferenciado: Cirocracia (< Ciro +
democracia), em que o próprio antropônimo exerce a função de qualificador da outra
base, que é um nome comum. Essa formação revela uma democracia baseada nos
princípios de Ciro, candidato a presidente em 2018. Pelo fato de a segunda base não ser
um antropônimo nem um qualificador, esse dado não foi contabilizado: confunde-se
com a formação de uma palavra complexa com o formativo neoclássico -cracia.
Além das três condições necessárias para o grupo dos antropônimos acrescidos
de qualificador, há ainda outros apontamentos a serem levados em conta, como a
questão de formar palavra diferente. O produto do cruzamento vocabular nem sempre é
uma unidade distinta na língua, o que significa dizer que, embora haja dados que
apresentam novidade tanto no aspecto fônico quanto no gráfico, há também aqueles em
que apenas a grafia é diferente, e outros que não alteram nada além do significado.
O primeiro caso, formações cujos produtos finais têm nova pronúncia e grafia, é
exemplificado pela maioria dos dados já expostos, como Malafalha (< Malafaia + falha)
e Velheira (< velha + Vieira). A grafia de ambos é nova (diferente das bases), bem
como a pronúncia e o significado.
Além desse caso, há também dados em que apenas a grafia do produto final é
diferente de uma das bases. É o que ocorre com Analfabetto (< analfabeto + Betto), em
que a pronúncia do produto final é idêntica à da primeira base, tornando possível
esclarecer o referente apenas pela grafia, com o [t] dobrado no produto final. Embora
figure apenas uma pequena parcela, são formações interessantes27.
Há, ainda, formações que adquirem um novo significado, mas não sofrem
alteração fônica nem gráfica, a exemplo de Frouxo (< Freixo + frouxo) e Roskoff (<
Rousseff + roskoff). Nesses casos, há uma grande semelhança fônica entre as bases, o
que deixa o produto final idêntico ao qualificador, ficando opaco o referente ao qual se
está qualificando. A dúvida quanto ao referente pode ser resolvida pelo cotexto – como
27 Esse caso também é visto nos cruzamentos de nomes comuns, como o exemplo de cegurança (< cego +
segurança) usado para designar um segurança que era cego.
69
foi explicado no tópico 2.2 – como, por exemplo, ao esclarecer o prenome de Marcelo
Freixo, político filiado ao Partido Socialismo e Liberdade, e o de Dilma Rousseff, ex-
presidente do Brasil.
As três condições necessárias para a integração de um dado no corpus delimitam
um perfil mais particular dos dados, que sempre apontam uma pessoa qualificada, pelo
fato de seu antropônimo ter sido associado a uma palavra que o caracteriza positiva ou
negativamente. A seguir, o grupo Antropônimo acrescido de qualificador será
analisado, principalmente, por meio de aspectos fonológicos e morfológicos.
4.1.2 Análise do grupo antropônimo acrescido de qualificador
Esta seção faz uma análise estrutural da formação de CVs oriundos de
antropônimo acrescido de qualificador, a fim de se investigar os padrões pelos quais são
formados. Pretende-se, então, responder a perguntas como as seguintes: (a) de que
maneira é feita a escolha da ordem das palavras-base? (b) Como as bases se combinam?
(c) Como é feito o ponto de quebra das bases no CV? (d) Que fator, de ordem
fonológica, motiva a junção das bases?
Acerca da ordem interna nos cruzamentos, Gonçalves (2006) pontua o exemplo
de sa.co.lé (< sa.co + pi.co.lé), em que as bases apresentam uma sílaba em comum, co.
A partir dessa sílaba, é estabelecida, além da junção das bases, a posição no produto
final. Nesse exemplo, a sílaba em questão é átona final em P1, saco, e pretônica em P2,
picolé; logo, o cruzamento conserva o acento de P2. Se a ordem das bases fosse inversa,
não haveria como aproveitar a ambimorfemia dessa sílaba e seria produzido algo como
*picosaco ou talvez *picosa, tornando o cruzamento extremamente opaco. Desse modo,
o acento primário do cruzamento preserva o da P2, picolé.
Sobre a ordem das bases no cruzamento vocabular, Basilio (2003, p.3) afirma
que, na maioria dos dados, o componente predicador, aquele que atribui determinada
característica ao outro, antecede o elemento qualificado. Alguns exemplos que
correspondem a sua hipótese são boilarina (< boi + bailarina), chafé (< chá + café) e
apertamento (< aperto + apartamento), diferente de presidengue (< presidente +
dengue), que é uma exceção para sua proposta. Essa hipótese demanda maior análise,
principalmente quando se refere ao corpus envolvendo antropônimos, que ainda não foi
estudado como foco central de análise.
70
Nos dados coletados, foram encontradas as duas possibilidades de ordem das
bases, podendo o qualificador preceder o referente – cf. Chattoso (< chato + Mattoso),
Falsiddad (< falso + Haddad), Gornaldo (< gordo + Ronaldo) e Ruimbinho (< ruim +
Rubinho) – ou o suceder – cf. Bolsoasno (< Bolsonaro + asno), Collorrupto (< Collor +
corrupto), Luladrão (< Lula + ladrão) e Sandiabo (< Santiago + diabo).
Há ainda casos mais complexos que não se encaixam necessariamente em uma
das duas possibilidades. No caso de Gordiola (< gordo + Guardiola), como já citado,
ambas as bases funcionam como qualificadoras, dado que o produto final do CV se
refere a um outro referente. A intenção, nesse exemplo, é atribuir a Guto Ferreira,
treinador de futebol brasileiro, o status de bom profissional, ao compará-lo com
Guardiola, treinador espanhol reconhecido. Além disso, há outra motivação: destacar
uma característica física do treinador. Como as duas bases qualificam, não há como
definir a antecedência/sucessão.
Também como exceção à dupla possibilidade de ordem das palavras-fonte,
encaixam-se os exemplos em que o produto final é idêntico a uma das bases, sendo elas
metricamente semelhantes, como ocorre em Frouxo (< Freixo + frouxo), Roskoff (<
Rousseff + roskoff), Rosquinha (< Rosinha + rosquinha). Nesses exemplos, não há
como afirmar com certeza qual é a primeira base e qual é a segunda.
Eliminando esses casos que apresentam dúvida quanto à ordem do elemento
qualificador (7), 60% dos dados apresentam o qualificador na segunda base contra 40%
na primeira base, sendo uma diferença não muito díspar, mas que coloca em xeque a
hipótese levantada por Basilio (2003). Essa porcentagem aponta para a posição regular
do adjetivo em Português, que, geralmente, sucede o substantivo, como afirma Câmara
(2000, p.87) ao dizer que “a posição regular do adjetivo determinante, em português, é
depois do substantivo determinado”. Os sintagmas menina linda, garoto alto e cabelo
curto exemplificam essa questão. Se pronunciados ao contrário, o primeiro sintagma até
seria de possível realização, mas não veicularia exatamente o mesmo significado, como
em Sua filha é uma linda menina!. Os outros dois sequer seriam aceitáveis, como *Seu
filho é um alto garoto e *Que curto cabelo esse seu. Nesse aspecto, o português difere
do inglês, por exemplo, cujo padrão é inverso, com a sequência Adj-S: beautiful girl,
tall boy e short hair.
71
Sendo assim, os exemplos do corpus que apresentam o qualificador na segunda
base refletem o padrão geral do português. O dado Dilmãe (< Dilma + mãe), por
exemplo, apresenta o núcleo e o modificador, respetivamente, bem como garoto alto. O
mesmo padrão se repete em Fabishow (< Fabi + show), Sashanás (< Sasha + satanás),
Naymaravilha (< Neymar + maravilha), entre outros.
Sobre a maneira como é feito o ponto de quebra das bases no CV, consideramos
os três tipos de cruzamento vocabular existentes na Língua Portuguesa, descritos no
capítulo 2, e as possibilidades métricas de cada tipo, formam-se quatro diferentes
grupos em virtude de suas palavras-fonte: CV formado por bases monossilábicas, bases
polissilábicas semelhantes (tipo 1), bases polissilábicas dessemelhantes (tipo 2) e bases
da substituição lexical (tipo 3).
Sobre o primeiro grupo, Gonçalves (2006, p. 234) afirma que “quando as duas
palavras envolvidas são monossilábicas, a unidade após a quebra pode ser identificada
como rima”. Neste caso, aproveita-se o ataque da primeira base e a rima da segunda,
como é exemplificado na representação28 a seguir.
Diagrama 4: Representação da quebra no cruzamento monossilábico
No caso de pãe (< pai + mãe), a mescla isolou o onset da primeira base, /p/, da
rima /aɪ/, bem como houve um corte interno na segunda base, em que o onset, /m/, foi
separado da rima /ãɪ/. Levando em conta que a rima é considerada a “unidade de
produção nos blends” (op. cit.), fundiram-se o onset da primeira palavra e a rima da
segunda, formando-se pãe, ‘pai e mãe ao mesmo tempo’.
Esse tipo de formação não é muito numeroso nos dados de cruzamento
vocabular com nomes comuns, e, nos dados formados por antropônimos, ainda não foi
registrado caso algum, em nenhum dos grupos do corpus.
28 Representação retirada de Gonçalves (2006, p. 235), em que O corresponde ao ataque silábico (onset,
do inglês) e R é referente a rima silábica.
72
A respeito das bases polissilábicas semelhantes, Assunção (2006, p.20) defende
que “faz-se necessária uma sílaba em comum entre as duas palavras envolvidas na
construção, determinando a interseção e a posição das bases no interior do CV”. Casos
como Martaxa ['max.ta + 'ta.ʃa] e Bolsonada [bow.so. 'na.ɾʊ + na.da]29 comprovam
essa assertiva, uma vez que ambos compartilham exatamente uma sílaba . No entanto,
exemplos como Rhodolfrank, Gordiola e Retarddad colocam em xeque essa hipótese.
Em Rhodolfrank [xo.'dow.fʊ + 'fɾã.kɪ], as bases não apresentam sequer uma
sílaba compartilhada. O que faz desse exemplo um caso de interposição lexical é apenas
um segmento que ambas têm em comum: /f/, onset da sílaba /fʊ/ em P1 e de /fɾã/ em P2.
Sendo assim, é possível que a interposição seja originada de uma unidade prosódica
menor que a sílaba, visto que, nesse caso, houve apenas um segmento compartilhado.
Gordiola ['goɣ.dʊ + guaɣ.di.'ɔ.la], por sua vez, é um caso cuja interposição
aproveita os segmentos /g/, /ɣ/ e /d/ das duas bases, cuja relação com uma sílaba é ainda
mais remota. Nesse caso, então, não é uma única sílaba que determina a interseção e a
posição das bases, até porque nem todas as intercessões preservaram a sílaba na íntegra.
Os segmentos /g/ e /ɣ/ fazem parte da mesma sílaba, o primeiro ocupando a posição de
onset e o segundo, de coda; a oclusiva /d/, por sua vez, é o onset da segunda sílaba, em
ambas as bases.
Bem como o anterior, a interposição lexical em Retarddad [xe.taɣ.'da.dʊ +
a.'da.dʒi] também não é pautada apenas em uma sílaba, pois, além da sílaba /da/, há
outros dois segmentos ambimorfêmicos: /a/, que é núcleo da segunda sílaba da primeira
base e da primeira sílaba na segunda base, e /d/, que é onset tanto na quarta sílaba de P1
quanto na terceira sílaba de P2.
Esses três exemplos comprovam que é insuficiente dizer que é necessário existir
“uma sílaba em comum entre as duas palavras envolvidas na construção, determinando
a interseção e a posição das bases no interior do CV” (ASSUNÇÃO, 2006, p.20). Logo,
conclui-se que a categoria em jogo na quebra das palavras mescladas não é a sílaba, mas
os segmentos, que devem ser analisados um a um.
Antes de passar para o próximo grupo, merece destaque a nota de rodapé em
Gonçalves (2006, p.236) que esclarece que
29 Neste tópico, as bases estão transcritas fonologicamente para facilitar a análise fonológica, que é o foco
da seção.
73
a semelhança fônica deve ser interpretada não como a mera presença de um
segmento comum, mas como uma semelhança em termos de posição na
estrutura da sílaba. Assim, embora ‘show’ e ‘comício’ apresentem uma vogal
média posterior em comum (/o/), essa identidade não é estrutural, uma vez que as rimas são diferentes: na primeira palavra, a rima é ramificada (/ow/),
enquanto na segunda a rima é constituída unicamente da vogal média (/o/).
Dessa forma, ‘show’ e ‘comício’ são interpretadas como dessemelhantes,
sendo o blend formado a partir do padrão 2 (‘showmício’).
Desse modo, quando se fala em bases (des)semelhantes no cruzamento
vocabular, não se deve atentar apenas para os segmentos em comum entre as bases, mas
também para a posição estrutural que esses segmentos ocupam em cada uma. Por
exemplo, no CV Bolsoasno [bow.so.'na.ɾʊ + 'aʃ.nʊ], as bases possuem a vogal /a/ em
comum, que é núcleo da terceira sílaba em P1 e da primeira em P2. No entanto, em P1,
a posição de coda é vazia, e P2, ao contrário, tem a coda preenchida; desse modo a
vogal /a/ não é considerada ambimorfêmica em Bolsoasno, uma vez que as rimas não
têm correspondência. A representação30 a seguir ilustra o não aproveitamento do
segmento /a/ em comum, o que configura a formação por combinação truncada.
Diagrama 5: Representação da quebra na combinação truncada
Além disso, se a vogal /a/ em comum fosse aproveitada, ambas as sílabas que a
compartilham se fundiram numa só, aproveitando ao máximo seus segmentos,
formando um dado como *Bolnonasno, como está reproduzido a seguir, mas que não se
realiza, razão de estar marcada com o (*).
Diagrama 6: Representação da quebra na interposição lexical
30 Nessa proposta de representação, a linha contínua preta sublinha todos os segmentos das bases que
foram aproveitados no produto final do CV. O retângulo vermelho abrange os segmentos
ambimorfêmicos. E, por último, a linha contínua vermelha risca os segmentos descartados no produto
final.
74
Outro exemplo interessante para observar essa questão é Neymaravilha
[neɪ.'max + ma.ɾa.'vi.ʎa]. Os róticos na segunda sílaba de P1 e de P2 poderiam ser
considerados em comum entre as bases, mas em P1 ele preenche a função de coda na
sílaba /max/, e, em P2, de onset em /ɾa/, descaracterizando, assim, a possível
ambimorfemia do segmento. Desse modo, apenas /ma/ configura a interposição lexical
com a qual esse exemplo é formado, como está ilustrado a seguir.
Diagrama 7: Representação de um segmento não aproveitado na interposição lexical
Com relação ao padrão estrutural, os dados do corpus investigado se aproximam
muito daqueles formados por nomes comuns, até porque esse grupo não deixa de ser
formado por nomes comuns, além das bases antroponímicas. Comparando, então, os
dados formados exclusivamente por nomes comuns, estudados em análises anteriores, e
os dados de antropônimos acrescidos de qualificador, a interposição lexical predomina
em ambos os casos.
Gonçalves (2003) afirma que 80% dos cruzamentos são formados pelo
aproveitamento de segmentos ambimorfêmicos, e, confirmando essa indicação, Andrade
(2008) apresenta uma porcentagem de exatamente 80% dos seus 218 dados (173)
formados por meio da interposição lexical.
No presente corpus, de antropônimo acrescido de qualificador, 71% dos dados
(114) correspondem a essa formação, do total de 160 formações analisadas. Sendo
assim, nossos dados reafirmam e reforçam a indicação de Gonçalves (2003) de que a
interposição lexical é o padrão responsável pela formação da maioria dos cruzamentos.
Esse fato, de a interposição lexical ser predominante nos dados, também reforça
a informação sobre o papel discursivo do CV: cruzamentos expressivos são, em sua
maioria, formados pela semelhança fônica entre as bases, como defendem Gonçalves e
Almeida (2007, p. 94) ao afirmarem que
os entranhamentos lexicais são predicativos. Neles, a predicação atua de duas
maneiras: (a) acentua propriedades inerentes ou possíveis do determinado ou,
em vez disso, (b) atribui propriedades implausíveis a ele, através de
extensões metafóricas ou metonímicas. Ao contrário do entranhamento, as
75
combinações truncadas e as reanálises têm em comum, em relação ao
referente que designam, um caráter mais descritivo e menos avaliativo.
A veracidade dessa afirmação é inegável nos dados analisados até então. Como
as formações deste corpus sempre qualificam alguém, os estudos desses autores já
previam que o padrão mais recorrente seria a interposição/entranhamento lexical, (a)
acentuando propriedades do determinado, como em Velheira (< velha + Vieira),
referente à atriz Suzana Vieira, ou (b) atribuindo características implausíveis a ele,
como em Sandiabo (< Santiago + diabo), sobre o religioso Valdomiro Santiago.
Sobre CVs com bases polissilábicas dessemelhantes, Gonçalves (2004) afirma
que a quebra é realizada nas sílabas tônicas das palavras-base, como é exemplificado em
Ladrão [la.'dɾãʊ + ma.'lu.fɪ]31. A quebra, nesse caso, é feita nas sílabas tônicas de
ambas as bases; na primeira, ladrão, o corte é feito no interior da sílaba /dɾãʊ/, sendo
descartados os dois últimos segmentos, /ãʊ/; na segunda base, Maluf, a quebra também
é realizada no interior da sílaba, sendo excluído o onset /l/ e aproveitado o núcleo /u/.
Diagrama 8: Representação da quebra na combinação truncada
Segundo Gonçalves (2006, p.235), “nos casos em que as bases são totalmente
dessemelhantes, não haverá descontinuidade morfológica. A quebra será feita com base
no melhor rastreamento das bases (maior grau de identidade)”. Um exemplo dessa
realização nos nomes comuns é portunhol (< português + espanhol). Nesse caso, P2
teve seu acento preservado pelo maior grau de identidade das bases. Caso contrário, se o
resultado fosse *espaguês, o cruzamento seria mais opaco, tornando muito mais difícil a
associação do CV com as bases. A partir da seleção da sílaba tônica, aproveita-se o
início de uma base e o final da outra. Como foram aproveitadas as sílabas iniciais de
português, em espanhol são as sílabas finais que se aproveitam.
No caso com antropônimos, também entende-se que a quebra é motivada pelo
melhor rastreamento das bases, tanto é que se fossem aproveitadas outras sequências de
31 Nesse caso, os segmentos em negrito representam as sílabas tônicas de cada palavra.
76
[la.dɾãʊ] e [ma.lu.fɪ], no exemplo de Ladruf, a formação *[ma.lɾãʊ] seria extremamente
opaca, além de impronunciável.
No corpus analisado, não foram encontrados dados de combinação truncada em
que “a maior (base) sofre truncamento e a menor, sem perder massa fônica, se
concatena inteiramente a maior”(ANDRADE, 2008, p.14), como ocorre nos dados de
nomes comuns, a exemplo de forrogode (< forró + pagode). Alguns casos com
antropônimos acrescidos de qualificador que têm essa configuração são, na verdade,
formados por interposição lexical, como Jeguerino (< jegue + Severino), Dilmãe (<
Dilma + mãe) e Ruimbinho (< ruim + Rubinho), em que as menores bases não perderam
massa fônica.
Contra os 71% dos dados formados pelo entranhamento lexical, os outros 29%
(46 dados) possuem bases dessemelhantes. Além de Ladruf, são exemplos desse padrão
de formação dados como Bourelles (< Boulos + Meirelles), Bolsodeus (< Bolsonaro +
deus), Empregácio (< emprego + Inácio), Lulaminion (< Lula + minion), entre outros.
Mas, mesmo não apresentando segmentos ambimorfêmicos, esses dados continuam
sendo avaliativos (e não descritivos).
A análise estrutural dos dados de substituição lexical, por sua vez, não pode se
basear nos mesmos parâmetros dos demais grupos, afinal suas bases não são
combinadas por meio de sua (des)semelhança fônica. Sendo assim, a análise desse
grupo será baseada na noção de construção gramatical, desenvolvida por Gonçalves,
Andrade e Almeida (2010) para a descrição da reanálise.
Com base na abordagem construcional, os autores apresentam a SSL na ótica de
uma construção gramatical, visto que suas formações são unidades básicas da língua,
nas quais forma e significado não se dissociam. Uma palavra formada por meio de uma
SSL é, então, uma construção que deriva de outra construção básica, cujo modelo é de
derivação afixal.
Focalizando a derivação, os autores explicam que a prefixação e a sufixação se
constituem por meio do modelo em que há dois elementos: um determinante (DT)
seguido de um determinado (DM), nesta ordem, como em antipatia, palavra derivada
em que a base erudita -patia é determinada pelo prefixo de negação anti-. A sufixação
também segue o modelo DT-DM. No entanto a base é determinada pelo sufixo, não o
contrário, visto que em marinheiro, por exemplo, é o afixo –eiro que determina a
característica de ocupação, ofício, profissão em relação à base mar-.
77
Conforme os dados de SSLs coletados no trabalho de Gonçalves, Andrade &
Almeida (2010) – boacumba, cracolândia, frambúguer, mãedrasta, entre outros –, é
possível, de fato, afirmar que as substituições lexicais apresentam comportamento
semelhante ao de palavras derivadas. O padrão estrutural que se repetiu foi o elemento
determinante à esquerda, como consta nos exemplos apresentados. Na maioria dos
casos, é na margem esquerda que ocorre a substituição pela ‘palavra invasora’,
seguindo, em geral, o modelo DT-DM.
Outra característica significativa que as substituições sublexicais possuem é a
aptidão em formar séries de palavras, promovendo itens à categoria de afixo, como
também pontuam Gonçalves, Andrade & Almeida (2010, p.8). A série de palavras
formada por meio da sequência -trocínio é uma evidência dessa capacidade. Presume-se
que a primeira criação a partir de patrocínio foi paitrocínio, um cruzamento vocabular
que, por analogia, deu origem a autotricínio, tiotrocínio, mãetrocínio etc.
Não há ocorrências de dados de CV com antropônimos que sejam formados por
reanálise. Há, no entanto, casos que apresentam aptidão em formar séries de palavras,
bem como as SSLs. Partículas com bolso-, mala-, -naro e -ácio ilustram bem essa
habilidade.
Com 35 dados no corpus, o formativo bolso- é o que produz a maior série de
palavras, correspondendo à forma Bolsonaro, sobrenome do candidato eleito a
presidência do Brasil em 2018; os dados podem ser representados por
i. ‘Bolsonaro que é X’ – Bolsofalso, Bolsomito
ii. ‘X que é típico(a) Y do Bolsonaro’ – Bolsogata32, Bolsoviolência33
iii. ‘X do Bolsonaro’ – Bolsofilho
iv. ‘Princípios políticos do Bolsonaro com características de X’ – Bolsolula,
Bolsohitler
A segunda maior série é formada por -ácio, com 12 dados, relativos ao segundo
nome do ex-presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e podem ser generalizados
por34
32 Bolsogata ‘mulher que é típica eleitora do Bolsonaro’. 33 Esse caso realiza-se com Y preenchido com Ø: Bolsoviolência ‘violência típica Ø do Bolsonaro’. 34 Não foi encontrada a generalização para duas formações: Bombácio e Empregácio.
78
i. ‘Inácio que é X’ – Galinácio, Viajandácio, Populácio
ii. ‘X do Inácio’ – Filhácio
iii. ‘Inácio envolvido com X’ – Mensalácio, Caipirinácio
iv. ‘Princípios políticos do Inácio com características de X’ – Stalinácio
O formativo -naro responde por 5 dados, e, como bolso-, também corresponde a
Bolsonaro. Esses cinco dados podem ser representados genericamente por
i. ‘Bolsonaro que é X’ – Lixonaro, Boçalnaro, Bozonaro
ii. ‘X com característica do Bolsonaro’ – Lulanaro e Marinaro
Por último, mala- forma 4 dados referentes ao sobrenome do pastor Silas
Malafaia, que podem ser generalizados por
i. ‘Malafaia que só X’– Malafala, Mafalha
ii.‘Malafaia que se assemelha a uma mala X’ – Malacheia e Malafeia
É significativo observar que um único nome, Bolsonaro, resultou em dois
formativos: bolso- e -naro. Provavelmente pela grande polêmica no processo eleitoral
de 2018, o nome do candidato à presidência foi o mais popular entre os demais. O
formativo bolso- teve significativa produtividade em comparação aos demais, sendo
responsável por 61% das formações a seguir. As formações com os quatro fragmentos
são listadas a seguir.
(1)
Bolsoafetivo
Bolsoanta
Bolsoasno
Bolsobosta
Bolsocaixa (2)
Bolsodeus
Bolsoditador
Bolsoestucpro
Bolsofake
Bolsofalso
Bolsofascista
Bolsofilho
Bolsogatas
Bolsohitler
Bolsokid
Bolsolixo
Bolsolula
Bolsolunático
Bolsomerda
Bolsominion
Bolsomito
Bolsonabo
Bolsonada
Bolsonagem
Bolsoneca
Bolsonegan
Bolsoniver
Bolsonojo
Bolsoquadrilha
Bolsoréu
Bolsotário
Bolsotonto
Bolsotroglodita
79
Bolsotrump Bolsoviolência
(2)
Bombácio
Caipirinácio
Emgambelácio
Empregácio
Falácio
Filhácio
Galinácio
Manguácio
Mensalácio
Populácio
Stalinácio
Viajandácio
(3)
Boçalnaro
Bozonaro
Lixonaro
Lulanaro
Marinaro
(4)
Malacheia
Malafala
Malafalha
Malafeia
Por mais que essas formações apresentem uma característica própria das SSLs,
formar série de palavras, não necessariamente são caracterizadas como tais. Com relação a
posição das bases, vimos que, nas reanálises, o determinante (DT) geralmente ocupa a
posição esquerda. Em Galinhácio e Lixonaro, por exemplo, a posição do determinante
também é à esquerda (como em boacumba), já em Bolsofalso e Malafalha o determinante
está à direita. Com isso, notamos uma diferença entre as formações com antropônimos em
séries e as SSLs.
Outra divergência entre as duas instâncias é que, no produto da substituição
sublexical, como em boadrasta, a sequência reinterpretada é a que sofre a substituição,
nesse caso a sílaba ma-. Já no dado com antropônimo formado em série, como em
Bolsonojo/Bolsomito/etc, um formativo é reinterpretado e o outro é que sofre substituição;
nesse caso, o formativo bolso- é reinterpretado, adquirindo valor do todo (Bolsonaro), e -
naro é substituído, como representa o quadro a seguir.
80
Quadro 4: Processo ocorrido na reanálise
Como se vê, em ambos os casos, boadrasta e Bolsonojo/Bolsomito/etc, há duas
etapas atuantes: a (I) reinterpretação e a (II) substituição. No primeiro caso, no entanto,
somente ma- sofre alterações, enquanto o formativo -drasta permanece intacto até o fim,
ao passo que, no segundo caso, (I) atua em bolso- e (II) em -naro. Dessa forma, pela
definição apresentada no capítulo 2, boadrasta se configura uma reanálise enquanto
Bolsonojo/Bolsomito/etc, não.
É necessário, então, aprofundar a análise sobre bolso-, mala-, -naro e -ácio, uma
vez que apresentam comportamento diferenciado dos demais dados do corpus. Do ponto
de vista fonológico, como descrito, essas formações foram classificadas pela semelhança
ou não entre as bases, mas demandam uma descrição morfológica mais precisa.
Pelo comportamento, de modo geral, esses formativos parecem se aproximar da
noção de splinters, também denominados como fragmentos vocabulares. Baseando-se em
estudos anteriores35, Andrade (2013, p.127) define fragmentos vocabulares como “partes
não-morfêmicas resultantes de processos não-concatenativos de formação de palavras,
como o truncamento e o CV, utilizados com alguma recorrência na criação de formas
linguísticas”.
35 Como o de Bauer (2005) – cf. Andrade (2013).
81
Considerando como parte resultante do cruzamento vocabular, Gonçalves, Carvalho
e Andrade (2016) adotam o conceito de Bauer (2004) de que
splinter é uma parte de uma palavra que, devido a algumas reanálises da
estrutura da palavra original, é interpretada como significativa e posteriormente
utilizada na criação de novas palavras. Como exemplo familiar, considere a
palavra ‘alcoholic’. Em termos morfológicos, esse vocábulo é dividido em ‘alcohol’ e -ic. Mas essa palavra foi reanalisada como alc-oholic, e o novo
splinter -oholic (variavelmente soletrado), em seguida, reocorre em palavras
como chocoholic, spendaholic e shopoholic. (p.77)
Assim como -nese em maionese, -naro não carrega informação morfológica alguma
em Bolsonaro. O mesmo pode ser dito em relação a mala-, em Malafaia. Os três
formativos resultam do processo de cruzamento vocabular, como em
macarronese/ovonese/bacalhonese, Boçalnaro/Lixonaro/Lulanaro e
Malafalha/Malafeia/Malacheia, respectivamente.
Além de formarem palavras em série por meio de um fragmento não morfêmico da
palavra-base, os três formativos, bem como bolso- e -ácio, “precisam combinar-se com um
outro elemento a fim de formar uma palavra”, característica dos splinters descrita por
Andrade (2013, p. 130). Essa característica os identifica como bases presas, uma vez que
só são usados quando ligados a outro elemento.
Outra propriedade do fragmento vocabular é a regularidade em seu recorte, pois se
identifica “com a estrutura silábica e com os segmentos constituintes do pé métrico (o
nuclear, mais raramente, o secundário) da base-alvo” (ANDRADE, 2013, p.131). Os
estudos da autora apontam para fragmentos vocabulares com pés troqueus silábicos, ou
seja, pés binários com cabeça à esquerda, representados por (X .), como -nese, -burguer,
choco-, entre outros. Os quatro formativos oriundos de antropônimos também
correspondem a essa característica, visto que apresentam cabeça à esquerda: bolso-, mala-,
-naro e -ácio.
Em análise sobre os splinters, Gonçalves, Carvalho e Andrade (2016) testam dados
com piri- e -guete (oriundos de periguete) à luz da Teoria da Otimalidade e chegam à
conclusão de que “em todos esses casos, ocorre violação à restrição mais importante da
hierarquia: NOPWd* (não recursividade no nó palavra prosódica, PWd, ou seja, realização
sob um único acento), o que inviabiliza tratar essas construções como cruzamentos de
cruzamentos, já que não se comportam como cruzamentos prototípicos” (p. 150).
82
NOPWD*, retirada da citação anterior, é uma restrição que desfavorece
recursividade no domínio da palavra prosódica (PWD). O fato de os dados analisados pelos
autores violarem essa restrição implica dizer que eles apresentam palavra prosódica
complexa, ou seja, mais de um acento lexical, fato também observado em algumas das
formações focalizadas nesta pesquisa – cf. Bol.so.vi.o.lên.cia, Bol.so.mi.to, entre outros. É
relevante notar que alguns dados, como Bolsoviolência, são grandes e, sem o recurso da
ambimorfemia, não têm como possuir um único acento.
De qualquer forma, não é insignificante esse fato, visto que, na análise otimalista
dos cruzamentos vocabulares, a restrição NOPWD* é a mais bem cotada, ou seja, a mais
importante para a formação de outputs. Isso caracteriza essas formações como cruzamentos
não prototípicos e talvez seja justificado pelo fato de os splinters se adjungirem a palavras
inteiras.
A exceção de Bolsonagem, todos os outros dados com bolso- apresentam como
segunda base uma palavra inteira (cf. Bolsoditador, Bolsolunático, Bolsoquadrilha).
Consequentemente, essas formações portam mais de um acento.
Com mala-, todos os quatro dados, formados com aproveitamento da semelhança
fônica entre as bases, se adjungiram a palavras inteiras. Esse é o grupo cujos dados mais se
parecem com a base alvo, Malafaia. Em Malacheia, a diferença fônica é apenas a sílaba
/fa/; em Malafala e Malafalha, a diferença para a base alvo é o ditongo que foi desfeito; e,
em Malafeia, a alternância de /a/ para /e/. Mesmo assim, esses dados apontam para
palavras prosódicas complexas, muito em função de processarem uma espécie de
decomposição lexical, nos termos de Gonçalves (2016), aproximando-se de
reinterpretações como ‘deter gente’ e ‘omo sexual’ para, respectivamente, ‘detergente’ e
‘homossexual’.
Os dados com -naro também se uniram a palavras inteiras, cf. Boçalnaro,
Bozonaro, Lixonaro, Lulanaro e Marinaro. Apenas o último faz o aproveitamento
ambimorfêmico: Marinaro, sendo, portanto, um caso de interposição lexical pelo fato de
as bases compartilharem uma sílaba entre elas. Esses dados, como os splinters analisados
por Gonçalves, Carvalho e Andrade (2016), também indicariam violação ao restritor
NOPWD*.
Com os dados X-ácio, por sua vez, a análise foi diferente, pois apenas três
apresentaram como primeira base uma palavra inteira, contra nove bases “incompletas”,
83
como Empregácio, cuja primeira base surge como empreg-, não emprego, provavelmente
pelo fato de -ácio ser o mais parecido com afixo, o que leva suas formações a portarem um
único acento.
Voltando ao trabalho de Andrade (2013, p.133), baseado em estudos anteriores, a
tendência dos splinters é tornarem-se afixos36 “pelo fato de não terem autonomia
discursiva, realizarem palavras morfológicas complexas sob um único acento e fixarem-se
na borda direita da palavra formada”, o que implica dizer que são mais recorrentes
splinters em posição de final de palavra, como -drasta, -trocínio, entre outros. É difícil
comprovar essa afirmação com os dados de antropônimos visto que, dos quatro dados
encontrados, dois são de posição inicial (bolso- e mala-) e dois de posição final (-naro e -
ácio).
Diante dessa breve análise, é possível descrever bolso-, mala-, -naro e -ácio como
“porções não-significativas reinterpretadas como formativos em função da recorrência”
(ANDRADE, op.cit, p.134); logo parece coerente descrever esses elementos como
splinters.
É interessante observar esse status em fragmentos de antropônimos, classe de
palavras considerada sem significado por alguns autores (MILL, 1879) e desprovida de
significado lexical na visão de outros (AMARAL, 2011). Os cruzamentos que unem
antropônimos e qualificadores comprovam que esse tipo de substantivo tem adquirido
valor morfológico (não idêntico aos nomes comuns), tanto que alguns formativos
antroponímicos apresentam comportamento de splinters. Ainda que não seja a maioria,
36% dos dados (57) foram formados por fragmentos vocabulares de antropônimos, uma
parcela consideravelmente expressiva.
4.2 SHIPPAGEM
4.2.1 O fenômeno
A shippagem é um fenômeno que tem se popularizado em grande escala,
principalmente, entre adolescentes. A expressão shippagem parece ser uma tradução por
36 Além da possibilidade de se tornarem elementos derivados, Bauer (2005) descreve a possibilidade de os
splinters se transformarem em bases da composição. Como essa discussão não é o foco da presente análise,
não foi detalhada com mais rigor – cf. Andrade (2013, p. 135).
84
empréstimo do inglês shipping. Segundo o site Holofotes37, o fenômeno se tornou
tendência primeiro na mídia americana, o que justifica o termo no inglês. A expressão,
portanto, não é encontrada em dicionários oficiais da Língua Portuguesa. Dessa forma, os
aspectos apresentados a seguir foram obtidos em dicionários informais do Português.
De acordo com essas fontes, shippar é uma expressão criada por meio da palavra
relationship, do inglês “relacionamento”. Uma vez assumida essa noção, o fenômeno se
refere à relação interpessoal, unindo, geralmente por meio de um neologismo, os referentes
de um possível relacionamento amoroso. Sendo assim, shippar é definido como o “ato de
torcer pelo relacionamento amoroso de alguém, normalmente personagens de filmes,
seriados, desenhos animados, histórias em quadrinhos, mangás e etc”38, ou seja, ao praticar
o ato de shippar, o falante expressa seu desejo de que duas pessoas se envolvam em um
relacionamento, como por exemplo, a torcida para que Afonso e Amália ficassem juntos,
personagens da novela Deus salve o Rei (Rede Globo), resultando no neologismo
Afonsalia.
O fenômeno foi originado por expectadores e leitores de narrativas da ficção que
admiravam determinados personagens desejando uni-los para que formassem um casal em
uma história paralela, já que na versão original o casal não era real. Essas histórias
alternativas, criadas por fãs, são nomeadas como fanfics, encurtamento de fanfiction, em
português ‘ficção criada por fãs’.
Além de serem criadas pelos fãs, as fanfics também são divulgadas por eles,
geralmente em sites específicos para esse fim. O site chamado Fanfics Brasil39, por
exemplo, é um local virtual exclusivo para a publicação dessas histórias e organiza as mais
de 15 mil fanfics em 24 categorias distintas, como aventura/ação, comédia, drama, guerra,
LGBT, romance, suspense, terror, entre outros. O site Spirit Fanfics e Histórias40 também
é uma plataforma popular para autopublicação de histórias em que muitas fanfics são
encontradas, e foi inclusive uma fonte para muitos dados de shippagem deste trabalho.
37 Disponível em:
<http://www.clicrbs.com.br/blog/jsp/default.jsp?source=DYNAMIC,blog.BlogDataServer,getBlog&uf=1&lo
cal=1&template=3948.dwt§ion=Blogs&post=268333&blog=53&coldir=1&topo=3994.dwt>. Acesso
em: Jan. 2019. 38 Disponível em: <https://www.significados.com.br/shippar/>. Acesso em: Out. 2018. 39 Disponível em: <https://fanfics.com.br/>. Acesso em: Out. 2018. 40 Disponível em: <https://www.spiritfanfiction.com/?locale=pt>. Acesso em: Out. 2018.
85
A imagem a seguir apresenta o prólogo de uma fanfic do site Spirit Fanfics e
Histórias. Nele, a autora faz um convite para leitores consumirem a sua história alternativa
da série literária Os heróis do Olimpo. A autora, identificada como LoveJason, deixa claro
que torce para que os personagens Jason e Piper formem um casal, mas, já que não formam
na história original, ela mesma cria uma história para que seu desejo se torne realidade, e
declara: “ja estou cansada de não ter o que quero como leitora, então faça vc mesmo,
certo?”.
Imagem 3: Prólogo de uma fanfic do site Spirit Fanfics e Histórias
O fenômeno da shippagem foi se popularizando e, assim, se expandindo. Os ships
não mais se referem somente a casais irreais nas histórias, mas também àqueles que são
casais verídicos nas narrativas. Além disso, passaram a se reportar também a casais da vida
real, e não somente da ficção.
Muitos dados são provenientes de casais famosos, como Brumar, junção dos nomes
de Bruna Marquezine, atriz da Globo, e de Neymar, jogador de futebol da seleção
brasileira. Ao que tudo indica, esse ship foi criado depois que o casal já tinha começado o
86
relacionamento amoroso, o que comprova que o fenômeno passou a se aplicar a casais já
formados. Na imagem a seguir, o neologismo Brumar aparece no título de uma matéria do
site da Ig, em um período que o casal tinha se separado.
Imagem 4: Brumar (Título de matéria da Ig)
A shippagem também se expandiu para casais “anônimos”, ou seja, todo casal que
não é famoso, nem na vida real nem em narrativas ficcionais. A imagem a seguir
exemplifica esse uso, e é uma publicação encontrada no Facebook, em que uma usuária da
internet tirou uma foto de duas pessoas, João e Lorena, sentadas lado a lado,
aparentemente sem elas verem. Depois, expressou publicamente seu desejo de que
formassem um casal.
Imagem 5: Jorena (Postagem no Facebook)
87
Há ainda casos em que o ship se origina nos personagens de uma ficção e acaba
projetando outro ship, que envolve um casal da vida real, como ocorreu com os
personagens Samuel e Marocas, par romântico na novela O tempo não para (Rede Globo).
Durante as gravações da novela, os atores Juliana Paiva e Nicolas Prattes, que encenavam
os respectivos personagens, começaram um relacionamento, o que gerou o ship Junick.
Esse processo também aconteceu com os atores que interpretaram os personagens Mônica
e Chandler da série Friends, entre outros. A imagem a seguir retrata o caso mencionado de
Juliana Paiva e Nicolas Prattes.
Imagem 6: Casal da ficção para a vida real (Matéria do Gshow)
A shippagem, entendida como o fenômeno de maneira geral, envolve diversos
termos referentes a ela: shippar, ship, shipper e shippado. Shippar é “o ato de unir os
nomes dos personagens com a intenção de criar um novo, que caracterize toda a torcida
88
existente pelo casal”41, sendo assim a prática da mescla de nomes. O ship, por sua vez, é o
neologismo formado por meio da união dos nomes de base, como, por exemplo, Brumar.
Já o shipper é quem pratica o ato de shippar, ou seja, quem torce pelo casal. Por fim, os
shippados são as pessoas envolvidas no ship, ou seja, o casal envolvido, como Bruna e
Neymar, no caso de Brumar.
Os ships referentes a casais da ficção podem ser de dois tipos quanto a
previsibilidade da narrativa. O termo canonship ou conventional couple é usado para casos
em que o relacionamento pelo qual se torce é óbvio na história, de maneira que o autor não
deixa dúvidas de que determinados personagens formarão um casal. Já cult ship ou
unconventional couple é o oposto, pois se realiza quando um casal nunca é revelado pelo
autor ao longo da narrativa.
Quanto à sexualidade do casal, os ships também recebem diferentes classificações.
O termo slashship é usado para casais formados por personagens homossexuais
masculinos, enquanto femslashship é a expressão usada para se referir a casais formados
por personagens homossexuais femininos, o que leva a conclusão de que, quando não
especificado, o ship é referente a casais heterossexuais.
Além dessas classificações, o site Amino também descreve o ship de amizade que,
em vez de representar uma torcida para que os shippados se tornem um casal, expõe apoio
pela amizade entre duas pessoas ou expõe a torcida para que duas pessoas se tornem
amigas, como é o caso da torcida por Semi, mescla de Selena Gomes e Demi Lovato, como
mostra a imagem a seguir.
41Disponível em: <https://www.significados.com.br/shippar/>. Acesso em: Out. 2018.
89
Imagem 7: Semi – Ship de amizade
90
Segundo um site geek42, há ainda outros três critérios que tornam os ships passíveis
de classificação, como serão descritos a seguir. OTP é a sigla de One True Paring, do
inglês Único Casal Verdadeiro, termo atribuído ao ship do casal favorito. Ghost ship, por
sua vez, é o referente ao ship de casais cujos personagens morreram ao longo da narrativa.
E crack ship são aqueles que misturam personagens de histórias diferentes, o que os torna
improváveis.
O fato de um casal ser improvável – ou até impossível – não inibe a torcida. A
revista Capricho, voltada especificamente para adolescentes do sexo feminino, divulgou
uma matéria sobre o assunto listando doze casais improváveis, mas que ainda assim são
shippados. A revista deixa claro que não há regras quanto a isso e afirma: “Não adianta:
nem todos os casais que shippamos vão acontecer. Ou porque eles nunca tiveram nada
além de amizade ou porque já não tem mais nada a ver juntos. Mas no maravilhoso mundo
dos shippers tudo é possível!”, como mostra a imagem a seguir.
Imagem 8: Ships de casais improváveis ou impossíveis
42 Disponível em: <http://www.garotasgeeks.com/guia-do-ship-voce-sabe-o-que-e-shippar/>. Acesso em:
Nov. 2018.
91
Em redes sociais, como Instagram, Twitter e Facebook, os ships são
frequentemente acompanhados de uma hashtag (#), ferramenta que facilita a busca de
outras postagens sobre o mesmo assunto. Esse fato comprova a afirmativa do site
Significados Br43 de que o ship “auxilia os fãs a encontrarem outras pessoas que torcem
pelo mesmo casal”. Dessa forma, tanto a ferramenta hashtag quanto o ship podem facilitar
o encontro de pessoas que tenham o mesmo interesse e, no caso do ship, interesse
específico pelo mesmo casal.
Não é imprevisível o fato de pessoas que compartilham o mesmo interesse se
juntarem para formar torcidas organizadas, visto que a existência de fãs clubes parece ser
bem anterior ao fenômeno da shippagem. Existem sites, inclusive, cuja função principal é
conectar pessoas que compartilham do mesmo gosto, como o Amino, por exemplo, que
também foi uma importante fonte de dados para o presente trabalho.
A popularização da shippagem gerou diversas brincadeiras, a exemplo do desafio
lançado pela Buscapé no Facebook no dia dos namorados, 12 de junho de 2018. Nesse
desafio, as pessoas eram estimuladas a criar ships de seu próprio casal, ou seja, unir seu
nome com o do cônjuge ou namorado(a). As perguntas feitas na página foram “Qual é o
seu nome de casal?” e “Como ficaria se você juntasse seu nome com o do mozão?”.
43Disponível em: <https://www.significadosbr.com.br/shippar>. Acesso em: Nov. 2018.
92
Imagem 9: Brincadeira de formar ships
93
Nos exemplos formados, fica claro o alto grau de monitoramento com que os ships
são formados. Diferente de outros fenômenos linguísticos, os ships são produzidos
controladamente pelo falante, que procura avaliar a forma criada pela soma das bases. No
caso de uma avaliação negativa, o falante busca outra alternativa de cruzamento possível,
geralmente trocando a ordem das bases, como ocorre em Gustanca ou Biantavo para
Gustavo mais Bianca; Marisco ou Franciane para Mariane mais Francisco; e Izaquias ou
Ezebel para Izabel mais Ezequias. E houve ainda um caso em que o falante julgou
negativamente todas as alternativas pensadas para Gilvanice mais Gabriel, preferindo
assim não registrar nenhuma.
Além do exercício de produzir ships, também são encontradas na internet enquetes
envolvendo ships, como a votação no Blog do Mauricio Stycer sobre quem deveria ficar
com a personagem Eliza, da novela Totalmente Demais. As opções da votação foram
fechadas: Artur ou Jonatas, que originaram os ships Arliza (< Artur + Eliza) e Joliza (<
Jonatas + Eliza).
94
Imagem 10: Enquete envolvendo ship
A crescente popularidade da shippagem resultou até na criação de algoritmos
produtores de ships. Existem aplicativos disponíveis no Google Play e sites que geram
ships, enquanto o papel do usuário é apenas escrever o nome dos dois integrantes do
(possível) casal. A imagem abaixo apresenta o aplicativo denominado Fandom Ship Names
Generator.
95
Imagem 11: Aplicativo gerador de ships
O aplicativo é gratuito e gera uma grande lista de possibilidades de ships, com base
nos nomes dados e, dentro das opções, o usuário seleciona seu preferido. As alternativas
oferecidas são diversas, mas muitas, ou até a maioria delas, não são passíveis de
reconhecimento das bases ou são até agramaticais na língua. Para a entrada Bianca e
Gustavo, por exemplo, são disponíveis opções como Ag, Agustav, Ancag, Bgustav,
Biancgu, Caustavo, Gustavb, Iancatavo, Ncagu, entre outros.
Aparentemente, o padrão usado pelo aplicativo é uma análise combinatória que
estabelece uma primeira letra (de P1) e vai acrescentado letras de P2 a ela. Depois de todas
as tentativas com aquela primeira letra, o gerador muda de primeira letra, até que todas
ocupem essa posição. No caso exemplificado, há 26 alternativas que começam com a, letra
final de Bianca, e a ela vão se adicionando as letras da segunda base, Gustavo. As opções
oferecidas são muito numerosas porque não há filtros que as controlem, fazendo com que
muitas sejam agramaticais. Além da ausência de filtros, um grande problema do aplicativo
é considerar as letras apenas como caracteres, ignorando os fonemas dos nomes.
Tendo sido apresentado o fenômeno da shippagem, será apresentado a seguir o
corpus coletado neste grupo. Mas, antes, vale salientar que julgamos necessária uma
96
descrição mais exaustiva do fenômeno neste caso pelo fato de não haver trabalhos
anteriores que o façam.
4.2.2 Apresentação do corpus
O corpus relativo à shippagem possui 212 dados. Com exceção de 10 dados
coletados de fala espontânea (oralidade), todos foram retirados da internet. A maioria do
corpus foi originado na televisão ou em plataformas online de filmes, séries e novelas
(como a Netflix), mas os outros 202 dados foram coletados de sites que falam sobre os
personagens e atores dessas narrativas, como revistas, jornais, sites de fanfics, blogs
diversos, entre outros, além das redes sociais Twitter, Facebook e Instagram.
A quantidade de 120 ships, que representa 56% dos dados, são referentes a casais
na vida real. Esse número comprova a ampliação do uso da shippagem, que originalmente
se referia somente a personagens ficcionais e passou a representar casais da vida real. Entre
esses ships de pares românticos da realidade, enquadram-se:
(i) 33 dados de anônimos, retirados principalmente das redes sociais – como
Brelherme, união de Brenda e Guilherme;
(ii) 29 dados de participantes do Big Brother Brasil e A Fazenda (reality shows
brasileiros) – como Brenara, junção de Breno e Ana Clara;
(iii) 24 dados de atores e atrizes – a exemplo de Judrigo, mescla de Juliana Paiva e
Rodrigo Simas;
(iv) 12 dados de artistas do campo musical (cantores, instrumentistas etc) – como
Luade, ship de Luan Santana e Jade Magalhães;
(v) 2 dados do domínio jornalístico (dois ships com as mesmas bases) –
Sandrevaristo e Evarisandra, união de Sandra e Evaristo;
(vi) 1 dado de youtubers – como Viihlu, mescla de Viih e Luiz;
(vii) 1 dado da esfera política – como Marchele, ship de Marcela Temer e Michele
Bolsonaro;
(viii) 18 dados de casais em que os shippados não possuem a mesma função – a
exemplo de Felena, ship de Fausto Silva, apresentador de televisão, e Selena
Gomes, atriz.
Os outros 92 dados, que correspondem a casais da ficção, são distribuídos em:
97
(i) 42 dados de novelas brasileiras – a exemplo de Shirlipe, junção de Shirlei e
Felipe, da novela Haja coração (Rede Globo);
(ii) 36 dados de séries – como Stelena, união de Stefan e Elena, da série The
vampire diaries;
(iii) 8 dados de personagens de filmes – como Dramione, cruzamento de Draco com
Hermione, do filme do Harry Potter.
(iv) 4 dados de personagens de mangá – a exemplo de Nalu, ship de Natsu e Lucy,
do mangá Shonen;
(v) 2 dados de personagens de livro – Jasiper, mescla de Jason e Piper, do livro
Percy Jackson e os Olimpianos.
Quanto à relação interpessoal expressa nos ships, 205 dados manifestam torcida ou
apoio por um casal contra apenas 7 ships de amizade, o que confirma que, embora a
shippagem possa expressar outra relação interpessoal, é a relação romântica o principal
domínio dos ships.
Entre os 205 ships de casais, 89% (183 dados) são de casais héteros, enquanto 7%
(13 dados) são classificados como slash ship, ou seja, casais homossexuais masculinos e
4% (9 dados) são femslash ship, casais homossexuais femininos. As imagens a seguir
apresentam um exemplo de slash ship e um de femslash ship, respectivamente. A primeira
imagem foi retirada de um blog sobre Sherlock Holmes, um clássico personagem da
literatura britânica que, segundo o blog, mantém um suposto romance com seu assistente
Jonh Watson, o que gerou o ship Jonhlock. A segunda imagem, retirada do site Bol,
apresenta o ship Clanessa, mescla de Clara e Vanessa, participantes da 14ª edição do Big
Brother Brasil.
98
Imagem 12: Johnlock – Exemplo de slash ship
Imagem 13: Clanessa – Exemplo de femslash ship
Os requisitos adotados para que um dado fizesse parte desse grupo do corpus foram
basicamente três, a saber: (a) ser formado pelo cruzamento de duas bases; (b) pelo menos
uma base ser antroponímica; e (c) o produto final ser um ship de uma única palavra. Esses
critérios serão pormenorizados a seguir.
Para que se cumprisse o requisito (a), excluímos dados cujo o número de bases é
superior a dois, como os que constam a seguir.
(i) Geronnik (< Geralda + Ronan + Ana + Munik)
Gleigneriana (< Gleici + Wagner + Ana Clara)
Kaynopau (< Kaysar + Breno + Paula)
Mallymar (< Marcos + Emilly + Ilmar)
Roannik (< Ronan + Ana + Munik)
As bases dos cinco casos apresentados são antropônimos relativos a ex-
participantes do Big Brother Brasil (Rede Globo). Esses dados, que unem três ou mais
nomes, representam, nesse contexto, união de jogo. Diferente dos ships apresentados até
então, esse uso apresenta a união de participantes da competição que formaram uma
espécie de equipe e, portanto, apoiavam-se mutuamente. Quando um telespectador torce
pela equipe, significa que apoia todos os integrantes dela, sem distinção. É comum que os
integrantes desse reality show se unam como uma estratégia de jogo. A imagem a seguir
99
apresenta o uso da hashtag #Geronnik, encontrada em uma postagem do Twitter por um
torcedor da equipe.
Imagem 14: Geronnik – Uso representativo de ‘união de jogo’
O requisito (b), por sua vez, pressupõe que, no mínimo, uma base seja
antroponímica, característica básica dos ships, que na grande maioria dos casos apresenta
antropônimos em ambas as bases. Um dos poucos casos em que apenas uma base é um
antropônimo é o ship Dolly, cruzamento entre Doutor Marcos e Emilly. Esse critério
restringe nomes comuns, mas abre um leque de opções visto que o antropônimo pode ser
prenome, sobrenome, hipocorístico, alcunha ou nome artístico, entre outros apresentados
no capítulo 3.
Na maioria dos casos, os ships unem prenomes, como Thiara (< Thiago + Sara).
Em casos de prenomes compostos, o falante tende a selecionar o primeiro ou segundo
nome para produzir a mescla. Como exemplo, podemos citar os ships que envolvem a Ana
Clara, ex participante do Big Brother Brasil. No caso do cruzamento com o antropônimo
Breno, o ship resultante é Breana, optando-se pelo primeiro nome, Ana; já no caso da
mescla com o prenome Caruso, o produto é Claruso, sendo selecionado o segundo nome,
Clara.
Em alguns poucos casos, os ships usam os sobrenomes. No caso de Tralliane (<
Tralli + Ticiane), o cruzamento envolve o sobrenome do jornalista Cesar Tralli com o
prenome da apresentadora Ticiane Pinheiro. Em Stylinson, foram mesclados dois
sobrenomes, os dos músicos Harry Styles e Louis Tomlinson, da banda One Direction. São
mais raros os casos do uso de sobrenomes.
Além de prenomes e sobrenomes, há também ships cujas bases são hipocorísticas,
como Cabibi, de Caio e Bibi, personagens da novela A força do querer (Rede Globo). Os
100
outros tipos de antropônimos não se mostraram relevantes para o fenômeno da shippagem,
sendo o prenome, de fato, o mais recorrente.
O critério (c), que requer que o produto final seja um ship de uma única palavra,
exclui exemplos como Captain Swan, mescla entre Captain Hook e Emma Swan, da série
Once upon a time. Esse, diferente dos demais, une as bases Captain e o sobrenome da
personagem Emma, não formando uma só palavra, mas duas.
Apresentados os três requisitos adotados, vale reafirmar o que foi dito na descrição
do grupo 1: nem sempre o CV é uma unidade distinta na língua. No grupo anterior,
apresentamos palavras como Analfabetto (< analfabeto + Betto), que tem homófonos
correspondentes na língua. Observamos que esse fato também acontece nos ships.
Os dados Amando (< Amanda + Fernando), Frango (< Franciele + Diego), Frito (<
Franciele + Vitor), entre outros, possuem homônimos perfeitos na língua, com mesma
grafia e mesma pronúncia, tendo alteração apenas na parte semântica. Já no caso de Thiara
(< Thiago + Sara), a pronúncia é a mesma de tiara ‘adereço usado no cabelo’, mas a grafia
das palavras se distingue pelo /h/ presente no ship. O caso de LuAr (< Lua + Arthur)
também apresenta uma distinção gráfica do seu correspondente luar, uma vez que possui
uma letra maiúscula no meio da palavra, ressaltando os limites entre as bases.
Os três requisitos adotados para a entrada de um dado no corpus delimitam o perfil
dos ships, que sempre apontam para a união entre dois referentes por uma relação
interpessoal, seja de amor ou amizade. Tendo justificados os dados coletados, analisamos,
adiante, o grupo da shippagem, principalmente, por meio de aspectos fonológicos e
morfológicos.
4.2.3 Análise do grupo shippagem
Nesse tópico, nós nos deteremos a analisar os dados coletados no grupo Shippagem,
afim de (a) investigar como é feita a escolha da ordem das bases; (b) observar se há um
padrão na estrutura dos dados; (c) descrever como é feito o ponto de quebra nas bases dos
ships e (d) contabilizar qual tipo de CV é mais recorrente nos dados.
Nesse grupo, diferente do primeiro, os dados não apresentam bases predicadoras,
mas antropônimos interligados. A grosso modo, observamos no grupo Antropônimo
acrescido de qualificador uma relação de subordinação entre as bases, e, no grupo
101
Shippagem, uma relação de coordenação. De acordo com a noção da sintaxe da palavra,
proposta por Sandmann (1993), os dados do primeiro grupo são determinativos, enquanto
os do segundo são copulativos, como está representado nos exemplos a seguir.
(i) Antropônimo acrescido de qualificador
Gornaldo – ‘Ronaldo que é gordo’
Luladrão – ‘Lula que é ladrão’
Ruimbinho – ‘Rubinho que é ruim no que faz’
(ii) Shippagem
Bentriz – ‘Bento e Beatriz’
Jorena – ‘João e Lorena’
Peloísa – ‘Pedro e Heloísa’
Nos exemplos do primeiro grupo, observamos uma constante presença de que,
enquanto na segunda de e, que denota adição. Mesmo sabendo que esses seis exemplos são
uma amostra pouco expressiva do corpus, a diferença entre os dados de (i) e (ii) é
significativa. Sendo assim, ao que tudo indica, a ordem das bases é escolhida
diferentemente nos grupos 1 e 2.
Os manuais consultados sobre shippagem não estabelecem restrições quanto à
ordem que as bases devem seguir. Por exemplo, não há ressalvas se é o nome da mulher ou
do homem que tem que vir primeiro no ship. A coleta de dados aponta para uma escolha da
ordem baseada na sonoridade mais agradável do produto final, tanto que, na etapa de
produção do ship, muitos falantes testam as duas ordens, A + B ou B + A, e escolhem a
que “combina mais”, ou a que “fica mais bonita”, de acordo com as palavras dos falantes
ao justificarem sua escolha. As imagens a seguir demonstram a dupla tentativa de
ordenação das bases.
102
Imagem 15: Teste entre diferentes possibilidades de ordem nas bases dos ships
Um questionamento muito instigante que se tenta responder no estudo do
cruzamento vocabular é “como definir, entre as duas bases, qual é a primeira e qual é a
segunda?”. No caso dos ships, podemos aplicar essa pergunta do seguinte modo: por que o
ship de Afonso e Amália é Afonsália e não Amálionso? E por que o de Rodolfo e Brice é
Bridolfo não Rodolce? Como já citamos aqui, nossa hipótese para essa pergunta, no caso
dos ships, é a melhor sonoridade. Essa hipótese, por sua vez, gera outro questionamento:
por que Afonsália e Bridolfo têm melhor sonoridade que Amálionso e Rodolce?
Ao selecionar uma e não outra forma, o indivíduo aparentemente usa sua intuição
de falante, que requer estudos mais extensos para descrever. Mas, por hora, nossa hipótese
é baseada na de Basilio (2005), apresentada no capítulo 2. Para ela, a chave da
interpretação do CV é reconhecê-lo como uma palavra alterada, como um todo, e não
como partes de palavras. Nesse sentido, concluímos ser mais fácil reconhecer a base
Afonso no ship Afonsália do que em Amálionso, do mesmo modo que é mais fácil
identificar Brice em Bridolfo do que em Rodolce.
Quanto à estrutura dos ships, identificamos ao todo cinco possibilidades de
formação entre os dados, sendo apenas dois consideradas padrões, pois as outras três
apresentam número insignificante de ocorrências.
O padrão dominante de formação dos ships é o que mescla os segmentos iniciais da
primeira base com os finais da segunda base, a exemplo de Joliza (< Jonatas + Eliza), em
que houve aproveitamento da primeira sílaba de P1 e das duas últimas de P2. A grande
maioria de 85% dos dados (180) foi formada por esse padrão ‘início + fim’. Seguem mais
alguns exemplos.
103
(i) Belidolfo (< Beliza + Rodolfo)
Brelherme (< Brenda + Guilherme)
Felena (< Fausto + Selena)
Paugner (< Paula + Wagner)
Shirlipe (< Shirlei + Felipe)
Thiara (< Thiago + Sara)
O segundo padrão identificado é o que mescla os inícios de ambas as bases, a
exemplo de DiRo (< Diego + Roberta). Apenas 13% dos dados (28) são formados por esse
padrão, que parece não se repetir no cruzamento vocabular formado por nomes comuns,
que geralmente seguem a estrutura ‘início + fim’, como portunhol (< português +
espanhol) e chocotone (< chocolate + panetone). A seguir são listados mais alguns ships
formados por ‘início + início’
(ii) BelGra (< Belo + Gracyanne)
Jelu (< Jéssica + Lucas)
Jolari (< João + Larissa)
MaVi (< Manoel + Vivian)
Peromar (< Pérola + Márcio)
ToCar (< Tomás + Carla)
A terceira possibilidade estrutural une o início de P1 com o meio de P2, e forma
apenas 2 dados do corpus, perfazendo o total de 1% dos ships. Essas ocorrências, listadas a
seguir, são diminutas com relação a maioria, e parecem ser intencionalmente motivadas já
que as duas palavras finais possuem homônimos disponíveis na língua: frito ‘que se frigiu
ou estar em situação embaraçosa, sem desculpas para uma falta, sem dinheiro, sem
escapatória’ e viada (≈ veada) ‘pej. vulgar. Designação pejorativa, preconceituosa e
depreciativa para se referir a homossexuais’.
(iii) Frito (< Franciele + Vitor)
Viviada (< Vivi + Radamés)
A quarta possibilidade de formação só ocorreu em 1 caso (0,5% dos dados), que
mescla o fim da primeira base com o ínicio da segunda. Assim como os anteriores, esse
caso isolado também parece ter sido formado com a intenção de fazer analogia com outra
palavra de uso comum na língua: pau ‘vara, ripa, viga; [chulismo] pênis’.
104
(iv) Nopau (< Breno + Paula)
A quinta e última possibilidade estrutural também ocorreu em 1 só caso, que uniu
P1, integralmente, com as duas extremidades de P2. Entendemos que a excentricidade
desse caso raro pode ser justificado pelo fato de as bases serem antropônimos mais comuns
na língua inglesa, visto que ambos os nomes são referentes a personagens da série
Supergirl.
(v) Karamel (< Kara + Mon-el)
Apresentadas as cinco possibilidade estruturais, dicorreremos a seguir sobre as
duas mais recorrentes, que consideramos aqui os efetivos padrões estrututurais.
A princípio, começando pelo padrão ‘início + início’, ressaltamos que nenhum dos
dados compartilham material fonológico entre as bases. Identificamos alguns dados cujas
bases até têm semelhanças, mas essas não foram aproveitadas para a produção do
cruzamento, desconsiderando assim a interposição lexical já que não há compartilhamento
das mesmas. Por exemplo, o ship LuAr (< Lua+ Arthur), mesmo tendo /a/ em comum, não
apresenta semelhança fônica.
Outro caso interessante nesse sentido é o de TayTay (< Taylor + Taylor), ship do
ator Taylor Lautner e da cantora Taylor Swift. Os prenomes são idênticos, portanto, todos
os segmentos podem ser considerados semelhantes entre as bases, mas, ao selecionar a
primeira sílaba de cada base, o ship não aproveita nem uma dessas semelhanças no produto
final, o que descaracteriza a interposição lexical.
Desse modo, todos os 28 dados do padrão ‘início + início’ são classificados como
combinação truncada. Entre eles, uma particularidade que vale ser ressaltada é a mudança
da estrutura silábica em relação as bases. Em Somic (< Sophia + Micael), por exemplo, o
ship aproveita, além da primeira sílaba de P1, a primeira sílaba da segunda base (/mi/) e o
onset da segunda sílaba (/k/); esse onset, no produto final acaba se tornando uma coda,
graficamente. Outro exemplo semelhante é MerDer (< Meredith + Derek)44, em que o /ɾ/,
onset da segunda sílaba de ambas as bases, passa a /r/ tornando-se em coda – mudança
estrutural essa que não costuma ocorrer em outros dados de CV. Além desses dois casos
44 A diferença de antropônimos no português e no inglês foi levada em consideração uma vez que
procuramos coletar apenas dados formados por falantes brasileiros, mesmo sendo nomes mais comuns em
outra língua.
105
descritos, mudança estrutural semelhante é observada em Belgra (< Belo + Gracyanne),
Catpe (< Catarina + Pedro) e Wellmiche (< Wellington + Michele).
Os ships formados pelo padrão ‘início + fim’, por sua vez, são os que perfazem a
maioria dos dados e, entre eles, a combinação truncada também prevalece sobre
interposição lexical, sendo 36% dos dados formados por este tipo contra 64% por aquele –
levando em conta o total de 180 ships característicos do padrão ‘início + fim’.
Com relação ao ponto de quebra, observamos que, em alguns dados desse grupo, o
corte nas bases é feito no nível inter-silábico. Como exemplo, citamos os casos de Ludrigo
(< Luciana + Rodrigo), Pelice (< Pedro + Alice) e Maunam (< Maura + Ionam), cujo
material aproveitado no produto final é a primeira sílaba de P1 e a(s) última(s) de P2. O
ponto que merece destaque é que, nos três casos, o material aproveitado são sílabas na
íntegra.
Há, no entanto, outros dados formados pelo mesmo padrão ‘início + fim’ e pelo
mesmo tipo ‘combinação truncada’ cujo corte é feito no nível intra-silábico, uma vez que o
material aproveitado são porções menores do que a sílaba – é o caso de Mafeu (< Mafalda
+ Romeu), Spoby (< Spencer + Toby) e Tatelson (< Tatiana + Kelson). No primeiro
exemplo, o corte é feito no interior da segunda sílaba de P1, aproveitando apenas seu onset
(/f/), que é ligado ao núcleo da segunda sílaba de P2 (/e/). De igual modo, em Spoby, o
corte de P1 conecta o onset da segunda sílaba (/p/) com o núcleo da primeira sílaba de P2
(/ɔ/). Em Tatelson, novamente o onset da segunda sílaba de P1 (/t/) é ligado ao núcleo da
primeira sílaba de P2 (/ɛ/). Nos três casos, a quebra foi feita no interior da sílaba, diferente
dos outros apresentados.
Observamos assim que os dados formados pelo padrão ‘início + fim’ são
heterogêneos quanto ao ponto de quebra, uma vez que, em alguns dados, o corte mantém
as sílabas completas e, em outros, o corte é interno às mesmas – o que denominamos de
nível inter-silábico e nível intra-silábico, respectivamente.
Nossa hipótese para explicar a motivação de um ou outro é a questão da melhor
sonoridade somada à questão do reconhecimento do ‘todo alterado’, proposta por Basilio
(2005). No exemplo de Pelice (< Pedro + Alice), se a quebra fosse feita no nível intra-
silábico, o produto final (Pedrice), até poderia ser considerado sonoramente agradável, mas
seria de mais difícil reconhecimento da base Alice. Do mesmo modo, se o corte do ship
106
Mafeu (< Mafalda + Romeu) fosse inter-silábico, o resultado (Mameu ou Mafalmeu), além
de ter sonoridade incomum, seria opaco quanto a identificação da base Romeu.
Concluindo, não identificamos nenhum ship monossilábico e nem formado pela
substituição sublexical. Observamos a combinação truncada como o tipo de cruzamento
vocabular mais recorrente nos ships, correspondendo a praticamente 70% dos 212 dados.
Segue uma tabela expositiva que distribui os dados entre as possibilidades estruturais de
ships e os tipos de cruzamento vocabular identificados.
Quadro 5: Distribuição quantitativa da estrutura dos ships
Nesse grupo, diferente do primeiro e diferentes dos cruzamentos de nomes comuns,
a interposição lexical não prevalece e pode ser justificado pela hipótese de Gonçalves e
Almeida (2007, p. 94) de que os cruzamentos formados por entranhamento lexical são
predicativos, enquanto os dados da combinação truncada e da reanálise possuem “um
caráter mais descritivo e menos avaliativo”.
Mesmo que menos avaliativo, o significado veiculado pelos ships são motivados
por uma intenção específica do falante e aponta para um forte valor discursivo dos
antropônimos quando cruzados. Ao apoiar um ship publicamente, muitas evidências são
reveladas sobre o falante. Por exemplo, pelo simples fato de postar a hashtag #Paugner em
uma rede social, os leitores saberão que o autor da postagem é expectador do realit show
Big Brother Brasil, e claramente torce pelo romance entre Paula e Wagner, logo não deve
Análise estrutural dos ships INTERPOSIÇÃO
LEXICAL
COMBINAÇÃO
TRUNCADA
UNID % UNID % UNID %
Início + fim 180 85 65 31 115 54
Início + início 28 13 0 0 28 13
Início + meio 2 1 0 0 2 1
Fim + início 1 0,5 0 0 1 0,5
Início + extrem. 1 0,5 0 0 1 0,5
TOTAL 212 100 65 31 147 69
107
apoiar o romance da participante com nenhum outro jogador, e provavelmente torce para
os dois terem um bom desempenho no programa, caso contrário não daria ibope para os
mesmos. Sendo assim, mais uma vez o antropônimo se apresenta como muito mais do que
uma “marca sem significado” ou um “mero rótulo”, mas revela um forte valor discursivo
socialmente demarcado.
4.2.4 Um paralelo entre o cruzamento vocabular de bases antroponímicas (ships) e a
siglagem
Já examinados a estrutura dos dados e seus principais padrões de formação,
investigaremos agora qual outro processo morfológico é próximo deste grupo da
shippagem. Entre os processos apresentados no capítulo 2, observamos que os dados em
questão, sobretudo os formados pelo padrão ‘início + início’, são parecidos com algumas
siglas. Embora essa estrutura não seja a mais recorrente nos ships, ainda assim é a segunda
mais frequente e, por sua característica principal, apresenta dados semelhantes às siglas
que também são palavras formadas pelas iniciais de suas bases. Desse modo, traçamos um
breve comparativo entre a siglagem e o cruzamento vocabular, tendo em vista os ships,
principalmemte os formados pelas inciais de ambas as bases, mas também os de outras
estruturas.
O paralelo entre a siglagem e o cruzamento vocabular não é inédito, pois foi
apresentado no trabalho de Gonçalves (2006), ao juntar ambos os processos no mesmo
grupo, o de processos criados pela fusão. Nesse sentido, analisaremos mais a fundo o que
é a siglagem e, depois, verificaremos algumas divergências e convergências entre os
processos a fim de investigar se os ships podem ser considerados siglas.
Segundo Gonçalves (2006), uma sigla nada mais é do que uma “combinação das
iniciais de um nome composto ou de uma expressão” (p. 225). Uma sigla pode ser de dois
tipos: (i) alfabetismo, em que são pronunciadas letra por letra, como em uma soletração, a
exemplo de UFMG ou (ii) acrônimo, que são “siglas cuja combinação de letras possibilita
pronunciar a nova forma como palavra comum na língua” (GONÇALVES, 2016, p.73),
como em UERJ. Pela pronúncia dos dois tipos, selecionamos os acrônimos para serem
comparados com os ships do padrão ‘início + início’.
O primeiro ponto em comum que assinalamos é não concatenatividade
característica de ambos os processos pois, assim como os cruzamentos, as siglas também
108
não são formadas por meio do encadeamento estrito de seus componentes. E, além disso, a
siglagem e o CV são formados por meio de fusão, como afirma Gonçalves (2006).
A fusão, inclusive, parece ser o fator que mais une os processos. Em siglas como
Petrobras (< Petróleo Brasileiro), é nítida a fusão pela qual são processadas, o que também
deixam claro que os acrônimos são mais parecidos com o CV do que os alfabetismos, uma
vez que não usam apenas a primeira letra de cada base da expressão, mas aproveitam mais
segmentos.
Em Petrobras, são empregadas as duas primeiras sílabas da primeira palavra,
/petro/, que se unem à primeira sílaba da segunda palavra, /bra/, mais o onset da sílaba
seguinte, /s/, o que torna a pronúncia do produto como a de outra palavra usual na língua.
Esse caso se assemelha com o ship MaJo (< Manuela + Joaquim), por exemplo, que
aproveita a primeira sílaba de cada base, formando uma palavra de pronúncia usual.
Outra semelhança entre os processos é que ambos possuem função lexical. Assim
como o CV, a siglagem também forma novas palavras por meio de bases já existentes na
língua. E, além disso, alguns ships formados pelas iniciais das bases são grafados com
letras maiúsculas no interior da palavra, delimitando quando começa a segunda base, bem
como ocorre em algumas siglas. São exemplos neste ponto BelGra (< Belo + Gracyanne) e
MinC (< Ministério da Cultura) – ship e sigla, respectivamente.
A quantidade de bases, por sua vez, é um critério que aproxima os processos, mas
também os distancia. A aproximação é justificada porque os produtos de ambos são
formados por mais de uma base, já o afastamento ocorre porque, enquanto os dados de CV
possuem invariavelmente duas bases, as siglas apresentam no mínimo duas bases.
A relação do produto final com as bases é uma convergência entre os processos. O
falante pode considerar um acrônimo como palavra primitiva, ou seja, as siglas formadas
por acronímia apresentam a possibilidade de criar derivados – cf. petista (< PT) e aidético
(< AIDS). E, mesmo que não muito recorrente, verificamos um uso parecido com um ship
do padrão ‘início + fim’ – cf. shirlipeiro45, oriundo do ship Shirlipe (< Shirlei + Felipe).
45 Dado disponível em:http://gshow.globo.com/tv/rapidinhas/noticia/2016/11/shirlipe-teste-seus-
conhecimentos-sobre-o-casal-de-haja-coracao.html.Acesso em Out. 2016.
109
Comparando agora pelo critério semântico, constatamos uma divergência. No
cruzamento vocabular, o significado total é a soma dos significados de cada base,
isoladamente, de modo que o falante imerso na esfera social em que circulam os ships,
capta as bases de modo quase automático. Por exemplo, o ship ToCar pode ser opaco pra
muitos falantes, mas para os telespectadores da novela Rebelde (SBT), é de fácil acesso.
Já nas siglas, por sua vez, embora o significado total também seja a combinação dos
significados de cada base, é possível afirmar que o significado parcial das bases é mais
distante do significado da nova palavra, o que se dá pela possibilidade de o falante não
conseguir identificar as bases de determinadas siglas, como ocorre em CEP (< Código de
Endereçamento Postal) e BRT (< Bus Rapid Transit, em português ‘Transporte Rápido por
Ônibus’). Por exemplo, o fato de o falante conhecer o BRT não é garantia de que ele
reconheça as bases da sigla. Inclusive, no caso do BRT, é muito difícil que os próprios
usuários do transporte consigam recuperar as bases.
Sobre isso, Gonçalves (2006, p.226) afirma que
o distanciamento das formas de base advém da pequena relação de identidade
entre a sigla e a expressão, uma vez que apenas a sequência inicial é copiada. Em
decorrência, é grande a probabilidade de o acrônimo suplantar de vez o
sintagma-base, a exemplo do que vem ocorrendo com CPF (abreviação de
‘cadastro de pessoas físicas’), que já não mantém qualquer relação de
correspondência com a expressão que lhe deu origem.
Como já apresentado, há ships que aproveitam apenas as iniciais das bases, como
em JeLu (< Jéssica + Lucas); mas também há dados que aproveitam o início de uma base e
o fim de outra, como Artulia (< Artur + Julia), além de outras possibilidades menos
significativas. Já as siglas, independentemente de serem alfabetismos ou acrônimos,
necessariamente aproveitam os segmentos iniciais das bases, como em Detran (<
Departamento de Trânsito) e Petrobras (< Petróleo Brasileiro). Fica claro, então, que a
maior diferença entre os processos é o fato de a siglagem formar palavras,
necessariamente, por meio das iniciais de suas bases, tanto que, no inglês, o termo usado
para siglagem é initialism ‘inicialismo’ 46.
Levando em conta os critérios apresentados – como resume o quadro a seguir –
concluímos que os ships, principalmente os formados por ‘início + início’, têm
características tanto de cruzamento vocabular como de siglas. Em um continuum entre os
46O termo initialism, como tradução para siglagem, é encontrado no dicionário online de inglês Oxford.
Disponível em: <https://en.oxforddictionaries.com/spelling/initialisms>. Acesso em: Set. 2018.
110
processos, os ships provavelmente ficariam entre o cruzamento vocabular e a siglagem.
Mas, sobretudo pelo último critério de diferenciação, descrevemos os ships como frutos do
cruzamento vocabular, uma vez que apresentou cinco padrões estruturais, enquanto as
siglas só permitem um: ‘início + início’.
Quadro 6: Comparação entre a siglagem e o cruzamento vocabular
SIGLAGEM VS. CRUZAMENTO VOCABULAR
CRITÉRIO SIGLAGEM CV (SHIP)
1 Formação
Processo não-
concatenativo/fusão
Processo não-
concatenativo/fusão
2 Função Função lexical Função lexical
3
Qtde mínima de
bases Duas bases Duas bases
4
Qtde máxima de
bases Permite mais de duas bases Duas bases
5
Autonomia das
bases
Produto final poder ser
derivado
Produto final poder ser
derivado
6 Semântico
Significado das bases distante
do significado da nova palavra
Significado das bases próximo
do significado da nova palavra
7 Padrão estrutural
Permite apenas um padrão:
‘início + início’
Permite, pelo menos, dois
padrões
4.3 NOMES DE BATISMO
4.3.1 Apresentação do corpus
O corpus referente a nomes de batismo é constituído de 263 dados: 30 coletados da
língua oral espontânea, frutos de nomes de que tomamos conhecimento ao longo dos anos
de pesquisa, por intermédio de pessoas de nosso ciclo social; 14 dados extraídos de
trabalhos anteriores, retirados das obras de Obata (1994), Sandmann (1993) e Simões Neto
e Rodrigues (2017), cujas obras citam alguns exemplos de antropônimos oriundos do
111
cruzamento vocabular; e 219 retirados da internet, em sites diversos, como o Yahoo
respostas, a rede social Facebook e, principalmente, o site Baby Center.
Poucos são os trabalhos anteriores que citam exemplos de antropônimos oriundos
do cruzamento vocabular, e, mesmo quando citam, o fazem como parte de um subtópico de
suas pesquisas, não como objeto central de estudo, o que justifica a pequena quantidade de
dados oriundos desse tipo de fonte. A seguir, apresentamos dois dados encontrados no
trabalho de Simões Neto e Rodrigues (2017), que foram originalmente retirados de uma
entrevista da Revista Quem com a cantora/atriz Mart’nália Ferreira, uma das filhas de
Martinho da Vila.
Imagem 16: Mart’nália e Analimar (Matéria da revista Quem)
A coleta de dados na internet foi mais difícil neste grupo pelo fato de os dados não
fazerem parte de um fenômeno próprio, como a shippagem. Alguns nomes foram
encontrados em sites muito específicos, como o Yahoo Respostas, em que as pessoas
perguntam opinião de outros usuários da internet sobre a escolha de nome de bebês
originados pela junção do nome do pai com o da mãe, por exemplo. No entanto, o local de
onde a maioria de 207 dados foi coletado foi o site Baby Center, uma ferramenta digital
exclusiva sobre gravidez e bebês, em que uma usuária lançou a seguinte brincadeira:
112
Imagem 17: Brincadeira de junção de nomes
Muitos casos deste grupo foram originados da combinação dos nomes dos pais do
referente, como já citado também no subtópico sobre antropônimos neológicos, no capítulo
3. No entanto, nem todos os dados mesclam o nome dos pais. O caso de Eulana (<
Eulália + Ana), por exemplo, surgiu como forma de homenagem a familiares, mas
favorecendo duas avós desta vez – como o caso da personagem Renesmee, do filme
Amanhecer. Em outros casos, ainda, a mescla é motivada pelo gosto de dois nomes
distintos, que são unidos para formar um só, como o exemplo de Lucireny (< Lucia +
Irene(y)). As motivações podem ser as mais variadas, mas o foco principal de análise é a
estrutura morfológica e fonológica desses dados.
Para uma análise mais uniforme, estabelecemos três critérios para os dados
constarem do corpus: (a) serem formados pelo cruzamento vocabular de duas bases; (b) as
duas bases serem antroponímicas; e (c) o produto final ser um prenome simples. Além
disso, demos preferência aos antropônimos neológicos, ou seja, não consagrados; o
exemplo a seguir representa um dado que foi excluído por esse motivo.
113
Imagem 18: Derick – Exemplo de nome não considerado neológico
De acordo com a autora da postagem, o nome de seu filho Derick representa a
junção de Deo e Ericka. No entanto esse nome não pode ser classificado como neológico
de fato, visto que é encontrado no Dicionário de Nomes Próprios47. Desse modo, não
estamos excluindo a possibilidade de Derick ser um cruzamento vocabular, mas estamos
evitando prenomes como esses, já que não temos como afirmar suas bases formadoras.
O primeiro critério, (a), demanda muita cautela na análise, visto que é mais difícil
identificar o processo morfológico formador de um antropônimo do que de um nome
comum. Em primeiro lugar, justificamos essa dificuldade porque o conceito de morfema
não pode ser empregado literalmente aos antropônimos, por causa do esvaziamento
semântico que sofrem, como afirma Soledade (2012, 325)48. E, em segundo lugar, porque
existe um número bem menor de material sobre os processos de formação dos
antropônimos, como apontamos no capítulo 3, e essa carência de manuais linguísticos gera
maior complexidade para tal tarefa.
O fato de um dado (a) ser formado pelo cruzamento entre duas bases, exclui a
formação do antropônimo por outros processos morfológicos, senão o cruzamento
vocabular. Como apresentado no capítulo 3, os antropônimos podem ser formados por
sufixação, composição, derivação imprópria, entre outros dispositivos, cujas formações
47 Disponível em: <https://www.dicionariodenomesproprios.com.br/derick/ >. Acesso em:Jan. 2019. 48 O “esvaziamento semântico” ao qual a autora se refere leva em conta a perda do significado etimológico
do Português arcaico, foco de sua pesquisa, até o Português contemporâneo.
114
foram eliminadas do corpus, em prol de prevalecerem apenas os antropônimos formados
por meio do cruzamento vocabular.
Para identificar os antropônimos formados por sufixação, consultamos alguns
trabalhos, como o de Soledade (2012), que lista e analisa uma série de sufixos de nomes
personativos do Português arcaico que se refletem no Português do Brasil, tais como:
(i) -a, -o
-am
-eiro, -eira
-el
-es
-ia
-ino, ina, inho, inha
-nte
-ada
-asco
-dor
-estre
-inco
-nça
-ndo
-triz
É certo que não é nosso objetivo acolher os prenomes formados por sufixação no
corpus, visto que nosso objetivo é analisar somente as formações oriundas do cruzamento
vocabular, mas não é por isso que excluiremos todo e qualquer prenome que tenha uma das
terminações acima. Se assim o fosse, muitos cruzamentos de nomes comuns não seriam
assim considerados por terminarem com sufixos recorrentes do português, tais como
flumineiro (< fluminense + mineiro), globeleza (< Globo + beleza), horrorível (< horroroso
+ terrível), miserite (< miséria + holerite) e nepetismo (< nepotismo + PT)49, cujas
terminações equivalem aos sufixos -eiro, -eza, -vel, -ite e -ismo.
49 Exemplos retirados de Andrade (2008).
115
A presença desses sufixos não impossibilita a produção do cruzamento vocabular,
pois é natural que esse mecanismo crie palavras por meio de outras duas já existentes,
sejam elas primitivas ou derivadas. Por exemplo, na formação de flumineiro (< fluminense
+ mineiro), entendemos que não há sufixação de -eiro, mas mesclagem da base fluminense
com mineiro – novamente considerando a base como um todo alterado, não como parte de
uma palavra. O mesmo ocorre com globeleza, horrorível, miserite e nepetismo, que não
priorizam o sufixo no produto final, mas a base como um todo, que pode ou não apresentar
sufixo.
Para identificar as formas compostas, por sua vez, levamos em consideração o
mesmo trabalho de Soledade (2012), que descreve os elementos da composição como
formas livres na língua, podendo assim ocorrer isoladamente, como Inês, Nalva, e Valdo,
formativos da composição que geralmente aparecem na posição final do prenome. Além
disso, esses elementos típicos de posição final podem ocorrer também em posição inicial –
cf. Inesalva, Valdomiro e Nalvalice (SOLEDADE, 2012, 327).
Para essa distinção, é importante ainda relembrar que
diferentes dos compostos, que tendem a preservar o conteúdo segmental das
bases (‘porta-luvas’ e ‘bóia-fria’), mesclas são caracterizadas pela interseção de palavras, de modo que é impossível recuperar, através de processos fonológicos
como crase, elisão e haplologia, as sequências perdidas. (GONÇALVES, 2006,
p. 224)
Assim sendo, exemplos como Maristela foram excluídos do corpus. De acordo com
o Dicionário de Nomes Próprios, esse prenome é formado pela composição de maris e
stella, com o significado de ‘estrela do mar’. A maneira como as bases foram aglutinadas
caracteriza o processo de crase, visto que a primeira termina com /is/ tanto quanto o ínicio
da segunda assim se pronuncia.
Como saber, então, se um determinado prenome é formado por sufixação,
composição, cruzamento vocabular ou outro mecanismo de expansão lexical? A resposta
para essa pergunta é um tanto quanto complicada, visto que nem sempre há fronteiras bem
delimitadas entre os processos; admitimos, então, continuum entre eles.
Quanto ao critério (b), as duas bases serem antroponímicas, estabelecemos uma
diferença com o grupo 1, antropônimos acrescidos de qualificador, e uma aproximação
com o grupo 2, shippagem, cujos dados também possuem dois antropônimos como bases.
Por esse critério, aceitamos incluir quaisquer tipos antropônimos listados no capítulo 3,
116
mas, pelo contexto em que os dados foram coletados, a grande maioria das bases
corresponde a prenomes.
O critério (c), produto final equivalente a prenome simples, por sua vez, foi
estabelecido pelo fato de todo cruzamento vocabular constituir uma única palavra. Por esse
requisito, excluímos dados como Maria Paula, “junção” de Maria, nome da mãe do
referente, e Paulo, nome do pai50.
Descartamos, ainda, dados cuja motivação foi de unir os nomes dos pais no
prenome do(a) filho(a), mas morfologicamente não correspondem ao processo do
cruzamento vocabular. A imagem a seguir apresenta alguns desses nomes em uma matéria
do G1.
50 Dado disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/309231/nome-do-pai--nome-da-
m%C3%A3e?startIndex=10>. Acesso em: Jan. 2019.
117
Imagem 19: Exemplos de junção de nomes que não correspondem ao cruzamento
vocabular
(i) “Junção de nomes de pais resulta em nomes de filhos inusitados”
Davi, José, Maria e Ana. Os nomes bíblicos já são consagrados e nunca faltam em listas
telefônicas, chamadas escolares e, naturalmente, nos livros dos cartórios de registro civil.
Mas que tal fugir do convencional e ousar um pouco mais no nome do seu filho ou filha? A
atriz e cantora norte-americana Gwyneth Paltrow, por exemplo, registrou a filha com o
nome de Apple (maçã, em português). Mas há outras formas de conferir originalidade à
sua árvore genealógica. A junção de nomes dos pais é uma das opções.
Na família da educadora física Juldrene Prates Ferreira, 34 anos, de Montes Claros
(MG), muita gente recebeu nomes inusitados. A mãe dela se chama Julmar e o pai Pedro.
Segundo ela, seu nome é resultado da união do “Jul” da mãe e o “edr” do pai. Já o "ene”
no final "foi só para feminizar”, como ela conta. Hoje, Juldrene diz gostar do nome, por
ser original, mas quando era criança a situação era difícil. “Na chamada no colégio
sempre falavam meu nome errado”, comenta.
118
Entre muitas risadas e até ga rgalhadas, ela fala sobre a criação do nome dos dois irmãos.
A técnica utilizada foi a mesma: intercalar as letras dos nomes dos pais. O resultado:
Jurrewerson e Juldroelson. Do nome do pai foram utilizadas algumas letras,
embaralhadas. E para manter a tradição, as iniciais são da mãe. “No primeiro, o ‘w’ é o
‘m’ de Julmar de cabeça para baixo; no segundo, o 'son' e o ‘elson’ são só para
masculinizar”, conta, se divertindo em relembrar as brincadeiras que já fez com os nomes.
Como explicado na matéria, os nomes Juldrene, Jurrewerson e Juldroelson foram
formados a partir dos nomes dos pais, mas não necessariamente por meio do cruzamento
vocabular, visto que foram envolvidos sufixos de gênero, além de outros mecanismos
como “virar uma letra de cabeça para baixo”. Sendo assim, embora sejam formações
interessantes, foram eliminadas do corpus pelo requisito (a).
Uma vez apresentados os critérios adotados para a formação do corpus dos nomes
de batismo oriundos do cruzamento vocabular, descreveremos a seguir a contraparte
morfológica e fonológica do processo.
4.3.2 Análise do grupo nomes de batismo
Como na análise dos demais grupos, objetivamos investigar, nesta seção, a ordem
das bases nos dados coletados, as possibilidades estruturais e o “corte” das bases. Além
disso, pretendemos observar qual tipo de CV é o mais recorrente nesse grupo.
De modo geral, os nomes de batismo se assemelham aos ships. Em nenhum dos
dois casos, há uma ordem pré-estabelecida que as bases devam seguir. E, assim como nos
ships, há uma grande ocorrência de dupla tentativa da produção do CV para testar qual a
melhor forma de saída do nome, o que explica a grande quantidade de antropônimos
diferentes com as mesmas bases, como Leonnifer (< Leonardo + Jhennifer) e Jhennardo (<
Jhennifer + Leonardo).
Observamos que a ordem das bases no interior do CV pode estar ligada ao ponto de
quebra que elas sofrem. No caso de Cadré (< Carolina + André) ou Andrelina (< André
+ Carolina), por exemplo, a quantidade de material aproveitado em uma alternativa e em
outra é bem diferente. Enquanto Cadré apresenta apenas duas sílabas, Andrelina possui
quatro. Nesse caso, então, a ordem das bases parece exercer influência na quantidade de
material aproveitado e, consequentemente, no ponto de quebra das bases.
119
Nossa hipótese, enfatizamos, é a de que a ordem das bases no interior do
cruzamento seja escolhida pela melhor sonoridade e pelo maior reconhecimento possível
das bases no produto final, pois é característica do CV mesclar nomes, “mas sem perder,
contudo, os traços semânticos das formas de base que lhes deram origem” (ANDRADE,
2008, p.17).
Os traços semânticos dos nomes comuns não são como os dos antropônimos, pois,
como já citado com base em Soledade (2012), os antropônimos têm classificação à parte.
De todo modo, é esperado que as bases de nossos dados sejam passíveis de recuperação no
produto final do CV, visto que o objetivo básico da junção de nomes é expor dois
antropônimos em um, de modo que as bases sejam o mais transparente possível no produto
final.
Quando o falante opta, intuitivamente, por uma possibilidade de ordenação das
bases, provavelmente analisa qual é a forma cuja identificação das bases se dá de maneira
mais clara, além de testar a sonoridade das alternativas. De todo modo, a investigação
acerca do motivo pelo qual as bases são mais facilmente identificadas em uma forma e não
em outra merece mais destaque, que pretendemos dar em trabalhos futuros.
Com relação à estrutura dos nomes de batismo formados por cruzamento vocabular,
verificamos a ocorrência de quatro possibilidades de formação, sendo, novamente, apenas
duas consideradas como padrão por serem a estrutura de uma porcentagem significativa de
dados. Apenas uma dessas possibilidades não foi identificada nos ships.
O padrão mais frequente é o que mescla o início de P1 com o fim de P2, como foi
atestado nos ships. Um total de 74,5% dos dados (197) foi formado por esse padrão, como
os seguintes exemplos:
(i) Bremila (< Breno + Samila)
Claudionor (< Cláudio + Leonor)
Francinanda (< Francisco + Fernanda)
Juliarcio (< Juliana + Márcio)
Paucela (< Paulo + Marcela)
Ziraldo (< Zizinha + Geraldo)
120
O segundo padrão mais recorrente é aquele que une os segmentos iniciais de ambas
as bases. Um total de 22% dos dados (57) é formado por esse padrão, como os que estão
listados a seguir.
(ii) Arcângela (< Arcanjo + Ângela)
Dailu (< Daianne + Lucas)
Isape (< Isabela + Pedro)
Jomar (< João + Maria)
Letial (< Leticia + Allan)
Marcélia (< Mário + Célia)
Cumpre esclarecer que consideramos formados por ‘início’ todos os cruzamentos
que aproveitam os segmentos iniciais de uma base, mesmo que todos os segmentos dela
sejam aproveitados na íntegra. Por exemplo, em Marcélia (< Mário + Célia), a segunda
base foi totalmente empregada no produto final, mas a consideramos formada por ‘início’
por sua primeira sílaba estar contida no CV. Caso contrário, se o nome formado fosse
Marlia, não consideraríamos assim. Englobamos no mesmo grupo tanto os casos que só
aproveitam o início das bases, como Jomar, quanto os que aproveitam a palavra inteira,
como Marcélia, a fim de simplificar as possibilidades. Se tratássemos desses casos em
grupos distintos, teríamos nove alternativas estruturais em vez de cinco.
A terceira possibilidade mescla o fim da primeira base como o início da segunda,
característica de 2% dos dados (5), elencados a seguir.
(iii) Marelisa (< Osmar + Elisa)
TonSol (< Milton + Solange)
Thamar (< Samantha + Marcos)
Geljo (< Angel + João)
Nicevo (< Genice + Ivo)
A quarta possibilidade, por fim, é mais inusitada por unir os segmentos finais de
ambas as bases. Essa estrutura foi a única não vista nos ships, e é responsável pela
formação de apenas 1,5% dos dados (4), expostos adiante.
(iv) Cilael (< Priscila + Rafael)
Faela (< Rafael + Priscila)
Milael (< Camila + Michel)
121
Celyne (< Marcelo + Alyne)
É interessante destacar, que embora tenham sido identificadas essas quatro
possibilidades estruturais, um falante tende a recorrer a uma única, ou, no máximo, duas.
Foi possível chegar a essa conclusão pelos comentários da postagem do site Baby Center,
nos quais os usuários discorrem geralmente sobre duas ou mais tentativas de mesclagem.
Essa é uma tendência que observamos, mas não uma regra, visto que nem todos os falantes
fazem uso do mesmo padrão. Os pares de nomes abaixo exemplificam essa tendência por
meio das formações dos falantes A, B e C.
A. Laulo (< Laura + Paulo) – ‘Início + fim’
Paura (< Paulo + Laura) – ‘Início + fim’
B. Natlu (< Nathan + Ludmila) – ‘Início + início’
Lunat (< Ludmila + Nathan) – ‘Início + início’
C. Prisra (< Priscila + Rafael) – ‘Início + início’
Rapris (< Rafael + Priscila) – ‘Início + início’
Cilael (< Priscila + Rafael) – ‘Fim + fim’
Faela (< Rafael + Priscila) – ‘Fim + fim’
Como nas seções anteriores, daremos ênfase à análise dos dados formados pela
estrutura ‘início + fim’ e ‘início + início’, já que perfazem mais de 95% total dos dados do
grupo nomes de batismo formados por cruzamento vocabular.
A começar pelo padrão ‘início + início’, verificamos 17 dados formados pela
interposição lexical contra 40 formados pela combinação truncada, diferente dos ships, em
que nenhum dos dados do modelo ‘início + início’ apresenta semelhança fônica entre as
bases.
A semelhança detectada em alguns dados da interposição lexical apresenta mais ou
menos material em comum, que pode ser “sílabas, rimas ou até mesmo porções fônicas
sem status próprio” (ANDRADE, 2009, p.194). Assim sendo, dados como Arcângela (<
Arcanjo + Ângela) apresentam mais material ambimorfêmico – um núcleo silábico e um
onset, da sílaba seguinte – do que outros como Francisquelly (< Francisco + Quelly), cujo
o único segmento compartilhado é o onset /k/.
Os dados do modelo ‘início + início’ formados pela combinação truncada, como os
ships, apresentam, algumas vezes, mudança na estrutura silábica em relação às bases. O
122
exemplo de Letial (< Leticia + Allan) ilustra essa mudança, visto que o corte na segunda
base ocorre no nível intra-silábico, pois aproveita, no produto final, o núcleo da primeira
sílaba e o onset da segunda, que, ao ocupar nova posição na estrutura silábica, sofre
mudança de /l/ para [w], típica do consonantismo do português. Essa e outras ocorrências
indicam que, algumas vezes, no exercício de cruzar nomes, o falante controla letras, mas
segue o padrão fonotático da língua.
Os casos formados pelo padrão ‘início + fim’, por sua vez, totalizam a maioria dos
dados de nomes de batismo e também apresentam mais recorrentemente a combinação
truncada (164) que interposição lexical (33).
Nesse grupo, também identificamos quebras tanto no nível inter-silábico quanto no
intra-silábico. O prenome Cachel (< Camila + Michel) exemplifica o primeiro caso, já que
o corte é feito entre as sílabas, aproveitando a primeira sílaba da primeira base e a última
da segunda base, diferente do caso de Maruardo (< Mariana + Eduardo), cujo corte é
interno às sílabas, empregando-se, no produto final, a primeira sílaba inteira mais o onset
da segunda, de P1, e o núcleo da segunda sílaba mais os segmentos seguintes, de P2.
Pelo que se expõe, a combinação truncada é o tipo de CV mais produtivo entre os
cruzamentos de bases antroponímicas, uma vez que praticamente 80% dos nomes de
batismo são formados por esse mecanismo. É interessante observar que essa porcentagem
equivale a que Gonçalves (2003) descreve para a interposição lexical nos cruzamentos com
nomes comuns: “80% dos cruzamentos vocabulares do português brasileiro são
caracterizados pelo aproveitamento de pelo menos um segmento comum às palavras-
matrizes”. Como não é função desse grupo atribuir qualidades aos referentes, recorremos
novamente a Gonçalves e Almeida (2007, p. 94) para explicar essa diferença radical. Os
autores afirmam que os cruzamentos formados por combinação truncada são mais
descritivos e menos avaliativos que os formados pela interposição lexical.
Apresentamos a seguir um quadro que resume os quantitativos dos tipos de CV –
interposição lexical e combinação truncada – e das estruturas de formação verificadas ao
longo da análise. Esse grupo, como os demais, também não apresentou casos de dados
monossilábicos nem dados de reanálise.
123
Quadro 7: Distribuição quantitativa da estrutura dos nomes de batismo
4.3.3 Um paralelo entre o cruzamento vocabular de bases antroponímicas (nomes de
batismo) e a hipocorização
Uma vez verificadas as questões estruturais dos nomes de batismo, traçamos, agora,
um paralelo entre o cruzamento vocabular de bases antroponímicas e outro processo
morfológico de natureza não concatenativa. Identificamos a hipocorização como um dos
processos mais semelhantes à criação de nomes de batismo, o que nos levou a traçar um
paralelo entre os dois mecanismos.
No capítulo 2, destacamos que o padrão de hipocorização que mais se assemelha ao
cruzamento vocabular é o de nomes como Mabel (< Maria Isabel) e Joca (< João Carlos),
pois ambos os processos envolvem duas bases. Nas palavras de Lima (2008, p. 19), a
hipocorização de nomes compostos equivale à “junção de duas bases que se combinam e se
encurtam”, como em Luís Carlos > Luca. O ato de “juntar” e “combinar” bases comprova
a maior identidade do CV com esse padrão, visto que os cruzamentos também são
formados por duas palavras-fonte, de modo a juntá-las e combiná-las.
Ao comparar exemplos como Jomar (< João + Maria) e Cadu (< Carlos Eduardo), é
nítida a semelhança entre os processos, podendo até causar dúvida se há fronteiras bem
demarcadas entre eles. Como o objeto de investigação deste trabalho é o cruzamento de
antropônimos, convém tentar diferenciar os dois casos.
Análise estrutural dos nomes de
batismo
INTERPOSIÇÃO
LEXICAL
COMBINAÇÃO
TRUNCADA
UNID % UNID % UNID %
Início + fim 197 74,5 33 12,5 164 62
Início + início 57 22 17 7 40 15
Fim + início 5 2 0 0 5 2
Fim + fim 4 1,5 2 0,75 2 0,75
TOTAL 263 100 52 20,25 211 79,75
124
O aspecto semântico-pragmático se mostra um grande divisor de águas nesse
sentido, podendo esclarecer casos aparentemente opacos. Jomar é um antropônimo, pois
nomeia uma pessoa, e usa como base outros dois antropônimos, João e Maria. Já Cadu,
pelo menos inicialmente, comporta-se como um apelido, um modo carinhoso de se referir a
uma pessoa chamada Carlos Eduardo. Em outras palavras, Jomar cruza dois nomes para
formar um terceiro, sendo que tanto as bases quanto o cruzamento possuem a mesma
função: nomear alguém; Cadu, a princípio, não tem como função atribuir nome de batismo
a uma pessoa.
Somada ao aspecto semântico, está a diferença nas funções de ambos os processos:
“hipocorísticos e antropônimos diferem unicamente quanto ao valor estilístico/contextual,
funcionando, na verdade, como sinônimos” (GONÇALVES, 2006, p. 222). Essa assertiva
evidencia o fato de o significado veiculado por André e Dedé, por exemplo, ser o mesmo,
pois ambos apontam para o mesmo referente, sendo considerados sinônimos. A diferença
entre as formas é dada, portanto, em termos de função expressiva, uma vez que elas
apresentam diferentes papéis, sendo a segunda mais afetiva que a primeira. Desse modo,
conclui-se que o hipocorístico não forma novas palavras; modifica expressivamente a
mesma unidade lexical.
O cruzamento vocabular, por sua vez, apresenta comportamento diferente, uma vez
que, além da função expressiva, apresenta também função lexical, ou seja, além de
veicularem, em sua maioria, a expressividade do falante, os cruzamentos formam novas
palavras, tanto que Marcotônio (< Marco + Antônio) não possui o mesmo referente que
Marco, isoladamente, nem Antônio; refere-se a uma outra pessoa, cujo nome remete a dois
outros.
O fato de, no cruzamento vocabular formado por antropônimos, as bases poderem
ter gêneros distintos (uma no feminino e outra no masculino ou vice-versa) reitera essa
diferença. Inclusive, esse uso é recorrente na nomeação de filhos para homenagear, ao
mesmo tempo, o pai e a mãe. Fato esse que já não é visto nos hipocorísticos de nomes
compostos, visto que se referem sempre a uma única pessoa, sendo, portanto, idêntico o
gênero das bases encurtadas.
Um aspecto que aproxima o cruzamento vocabular da hipocorização é a não
concatenatividade. Ambos os processos morfológicos são considerados não concatenativos
125
porque não operam com mera adição de unidades morfológicas, promovendo, antes, algum
tipo de encurtamento prosodicamente motivado.
Com relação à estrutura métrica e ao tamanho dos hipocorísticos, mais uma
diferença entre os processos é revelada, pois o “hipocorístico deve constituir palavra
mínima na língua” (LIMA, 2008, p. 69)51. Sendo um processo de encurtamento, a
hipocorização impede formações que tenham mais de duas sílabas. Já o cruzamento
vocabular não impõe essa limitação de tamanho, visto que são numerosas as formações que
tenham três sílabas ou mais – como em Aguimar, Edilange e Eduarlene. Em outras
palavras, a hipocorização é um processo de encurtamento e o cruzamento vocabular, não.
Embora os processos se distanciem com relação ao tamanho máximo de suas formações,
aproximam-se ao delimitar um tamanho mínimo, pois não são possíveis nem hipocorísticos
nem cruzamentos com menos de um pé métrico.
Pelo viés prosódico, algumas diferenças também são pontuadas. Focalizando
apenas o padrão de nomes compostos dos hipocorísticos e cruzamentos vocabulares
formados por antropônimos, são claras algumas distinções fonológicas. Nos hipocorísticos
desse tipo, são vedados52: (a) a posição de onset vazia, (b) onsets complexos, (c) codas que
não sejam os glides /j/ e /w/, (d) pés trocaicos53, (e) alinhamento de sílabas que não sejam a
primeira com onset preenchido de ambas as bases, e (f) acentuação da vogal -a quando em
posição final de palavra prosódica.
O cruzamento vocabular formado por antropônimos, no entanto, não apresenta
essas imposições em suas formações, visto que Arcângela (< Arcanjo + Ângela), por
exemplo, infringe (a), (c) e (e) ao mesmo tempo. O item (a) é descumprido, pois o
cruzamento apresenta a posição de onset desocupada logo na primeira sílaba /ar/; já a
condição (c) é infringida pelo fato de o nome Arcângela apresentar uma coda preenchida
por consoante, como é visto na sílaba /ar/, em que há uma fricativa ocupando essa posição;
o item (e), por seu turno, não é satisfeito porque o cruzamento não alinha as primeiras
sílabas com onset de cada base, pois, da primeira, são aproveitadas as duas sílabas iniciais,
51 Nas palavras de Gonçalves (2004), “ocorre palavra mínima todas as vezes em que a palavra fonológica (ω)
dominar um e somente um pé (∑)”. 52 A análise prosódica dos hipocorísticos de nomes compostos é descrita a rigor por Lima (2008). 53 O pé métrico troqueu é aquele que considera o peso da sílaba, contando suas moras (µ). A cada duas
moras, calcula-se um pé; assim sílabas pesadas formam, sozinhas, um pé. Além disto, outra característica do
pé troqueu é que este possui cabeça à esquerda, apresentando o seguinte padrão silábico: (x.), como afirma
Lima (2008, p. 20).
126
sendo que a primeira não apresenta onset e a segunda base é alinhada em sua totalidade,
não havendo perda segmental.
Além de Arcângela, outros exemplos comprovam que, embora os processos sejam
parecidos, o padrão prosódico de formação seguido nos hipocorísticos é distinto do padrão
empregado nos cruzamentos vocabulares formados por antropônimos. Formas como
Claudionor (< Cládio + Leonor) e Isalberto (< Isabela + Roberto) evidenciam o que
estamos afirmando.
De modo geral, a comparação entre a hipocorização e o cruzamento vocabular
(nomes de batismo) reuniu aqui dois critérios de semelhança contra cinco de diferença
entre os processos, como mostra o quadro a seguir.
Quadro 8: Comparação entre a hipocorização e o cruzamento vocabular
HIPOCORIZAÇÃO VS. CRUZAMENTO VOCABULAR
CRITÉRIO HIPOCORIZAÇÃO CV (NOMES DE BATISMO)
1 Semântico-
pragmático Não designa nome a alguém
Designa nome um nome de
batismo
2 Função Função expressiva Função expressiva e lexical
3 Gênero das bases As bases possuem o mesmo
gênero
As bases podem ou não possuir o
mesmo gênero
4 Formação Processo não-concatenativo Processo não-concatenativo
5 Estrutura métrica Tamanho mínimo de um pé
métrico
Tamanho mínimo de um pé
métrico
6 Estrutura métrica É um processo de encurtamento Não é um processo de
encurtamento
7 Prosódico Possui uma série X de restrições Possui uma série Y de restrições
Diante disso, concluímos que o cruzamento vocabular de bases antroponímicas
(nomes de batismo e ships) e o hipocorístico de nomes compostos são processos muito
semelhantes. Em uma proposta de continuum, esses processos devem estar bem próximos,
tanto é que, em processo de lexicalização, é possível que um hipocorístico de nomes
127
compostos admita a mesma função de um nome de batismo formado por cruzamento
vocabular.
De acordo com o Dicionário de Nomes Próprios, o caso de Malu provavelmente é
um exemplo um hipocorístico, de Maria Luiza ou Lúcia, que, ao que tudo indica, foi
lexicalizado e atualmente é usado como nome de batismo, como consta no registro civil54.
Esse processo de lexicalização também parece ter ocorrido com Alex, hipocorístico de
Alexandre, entre outros casos. Desse modo, embora os processos tenham diferenças
significativas, os limites entre eles podem ser instáveis.
Sendo assim, apresentamos a hipocorização de nomes compostos como um
processo bem próximo do cruzamento vocabular de bases antroponímicas. Descrevemos o
grupo de nomes de batismo como majoritariamente formado pelo padrão ‘início + fim’ por
meio da combinação truncada, uma vez que a maioria dos dados têm bases que não
compartilham segmentos.
Com a descrição dos grupos Antropônimos acrescidos de qualificador, Shippagem
e Nomes de batismo, concluímos a análise de dados. No próximo capítulo, seguem as
considerações finais, em que será apresentada uma visão panorâmica dos três grupos e as
conclusões a que chegamos.
54 O antropônimo Malu é encontrado como um prenome no Dicionário de Nomes Próprios. Disponível em:
<https://www.dicionariodenomesproprios.com.br/malu/>. Acesso em: Jan. 2019.
128
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
No decorrer desta dissertação, foi apresentado o cruzamento vocabular como um
processo produtivo de formação de palavra. Diferentemente de estudos anteriores, o
presente trabalho teve um direcionamento inédito por focalizar somente as mesclas que
possuem, no mínimo, uma base antroponímica. Para isso, foram revisadas também
algumas abordagens sobre a antroponímia do Português Brasileiro.
Foram coletados 637 dados, que categorizamos em quatro grupos distintos:
antropônimos acrescidos de qualificador, ships, nomes de batismo e oniônimos de bases
antroponímicas. Retomamos, aqui, algumas questões importantes, obtidas com os
resultados da análise, a fim de resumir o comportamento das mesclas com bases
antroponímicas.
No primeiro grupo, foi refutada a hipótese de Basilio (2003) de que o elemento
predicador dos cruzamentos geralmente ocupa a posição da primeira base. Dados como
Dilmãe (< Dilma + mãe), Fabishow (< Fabi + show), Sashanás (< Sasha + satanás) e
Naymaravilha (< Neymar + maravilha) reforçam a posição regular do adjetivo em
Português, que, geralmente, sucede o substantivo, e contestam a alegação de Basilio
(2003). Os dados desse grupo comprovam a expectativa de Gonçalves (2003) de que a
interposição lexical é responsável pela formação da maioria dos cruzamentos.
Consequentemente, os antropônimos acrescidos de qualificador também ratificam a
assertiva de Gonçalves e Almeida (2007) de que a interposição lexical caracteriza
formações predicativas, realçando características dos referentes ou conferindo a eles
propriedades impossíveis, por meio da metáfora ou metonímia.
Embora não tenham sidos atestados casos de substituição sublexical nesse grupo, as
formações iniciadas com bolso- e mala- e as que terminam com -naro e -ácio mostraram
aptidão em formar séries de palavras. Mediante o comportamento desses casos, tais
partículas foram classificadas como splinters, o que aponta para um forte valor linguístico
dos antropônimos, contestando a noção, proposta por Mill (1879), de que eles são meros
rótulos sem significado algum.
O processo morfológico que se mostra mais semelhante a esses dados é a
composição, que também forma novas palavras por meio de duas bases. Alguns autores
consideram, inclusive, o cruzamento vocabular como um subtipo da composição, mas,
pelos argumentos reunidos, defendemos o CV como um processo autônomo.
129
O segundo grupo, dados oriundos do fenômeno da shippagem, possuem
características bem diferentes do primeiro por apresentarem antropônimos em ambas as
bases, cuja escolha da ordem, ao que tudo indica, é justificada pela melhor sonoridade.
Quanto à estrutura desses dados, foram identificadas cinco possibilidades que, ao
todo, distribuíram-se em 31% de formações por interposição lexical contra 69% por
combinação truncada. O padrão mais recorrente entre os ships é o que mescla o início da
primeira base com o fim da segunda, que, formado por meio da combinação truncada,
perfaz o total de 54% do corpus. A inversão da ocorrência entre a interposição lexical, no
primeiro grupo, e combinação truncada, neste, pode ser justificada pela natureza menos
avaliativa e mais descritiva dos dados, corroborando com a hipótese de Gonçalves e
Almeida (2007).
Entre os demais processos apresentados no capítulo 2, a siglagem foi o processo
selecionado para ser comparado aos ships, principalmente pela semelhança entre os dados
do padrão ‘início + início’ e as siglas, que são sempre formadas pelas iniciais de suas
bases. Mediante aos argumentos apresentados, concluímos que os ships são fruto do
cruzamento vocabular, mesmo tendo semelhanças com as siglas.
No terceiro grupo, nomes de batismo, os dados também são formados por duas
bases antroponímicas. Como nos ships, a escolha da ordem também parece ser justificada
pela melhor sonoridade do produto final, além da forma cuja identificação das bases se dá
de maneira mais clara.
Identificamos quatro possibilidades estruturais entre os nomes de batismo e
novamente a porcentagem da combinação truncada (80%) foi superior à da interposição
lexical (20%). O padrão mais produtivo entre esses dados foi, novamente, ‘início + fim’
não caracterizado pela semelhanca entre as bases, que atinge 62% do total.
O processo morfológico que mais se aproxima dos dados desse grupo é, sem
dúvida, a hipocorização, principalmente a de nomes compostos. A grande semelhança,
contudo, não é maior que as diferenças, visto que foram apresentados mais argumentos de
diferenciação do que de aproximação entre os processos.
O quarto grupo, por sua vez, não foi analisado separadamente pelo baixo número de
dados coletados até então. Oniônimos formados por bases antroponímicas constituem um
grupo muito específico e, portanto, de difícil coleta de dados. De todo modo, os dois dados
coletados são formados pela interposição lexical e apontam para uma semelhanca
130
substancial com o primeiro grupo, tanto com relação à estrutura quanto ao valor
expressivo.
De modo geral, apresentamos os antropônimos acrescidos de qualificador mais
próximos aos oniônimos de bases antroponímicas, ao passo que os nomes de batismo se
assemelham mais aos ships. A relação entre os quatro grupos é representada na proposta de
continuum que se segue.
Diagrama 9: Representação do continuum entre os grupos do corpus
Na extrema esquerda do continuum, localizam-se os cruzamentos designativos
enquanto, na extrema direita, posicionam-se os cruzamentos avaliativos, e, no decorrer do
continuum, encontram-se os grupos que têm características tanto designativas quanto
avaliativas, mas com inclinação para um deles.
Os nomes de batismo são totalmente designativos por denominarem referentes, não
os avaliando quanto à suas características. Ao seu lado, encontram-se os ships, conhecidos
como “nomes/apelido do casal”, mas possuem diferente valor expressivo dos primeiros,
pois são menos designativos que eles.
Na ponta direita, encontram-se os antropônimos acrescidos de qualificador, que,
mesmo portando antropônimo em uma das bases, não são usados para nomear, mas para
avaliar o referente do respectivo nome. Os oniônimos de bases antroponímicas, por sua
vez, são mais designativos que aqueles por serem usados para nomear estabelecimentos
comerciais, mas, ao mesmo tempo, os avaliando, o que justifica sua localização no
continuum.
Concluímos assim que os pares de grupos mais parecidos são os que possuem bases
da mesma natureza. Os nomes de batismo e os ships são formados por duas bases
+ designativo + avaliativo
NOMES DE
BATISMO
SHIPS ANTROPÔNIMOS ACRESCIDOS DE
QUALIFICADOR
ONIÔNIMOS DE
BASE
ANTROPONÍMICA
BASES: ANTROPÔNIMOS
BASES: NOME COMUM E
ANTROPÔNIMO
131
antroponímicas, logo são mais designativos, enquanto os antropônimos acrescidos de
qualificador e os oniônimos de bases antroponímicas possuem uma base antroponímica e
uma de nome comum, sendo, portanto, mais avaliativos e menos designativos.
De modo geral, apresentamos os antropônimos como uma classe de palavras em
potencial. Mesmo que não sejam como os nomes comuns, os antropônimos, principalmente
os neológicos, como enfatizamos aqui, demonstram alta carga semântica e excessiva
motivação para sua criação. O cruzamento vocabular, por sua vez, mostrou-se um processo
morfológico produtivo capaz de refletir tendências sociais de modo criativo, econômico e,
portanto, eficiente.
Consideramos, então, positiva a mescla entre a antroponímia e o cruzamento
vocabular, visto que fomenta importantes questões da morfologia do Português Brasileiro,
além de contribuir para a descrição das duas áreas.
132
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137
ANEXOS
ANEXO I – Antropônimo acrescido de qualificador
Legendas utilizadas para a categorização dos cruzamentos (T. = TIPO):
IL → Interposição Lexical
CT → Combinação Truncada
Legendas utilizadas para a categorização qualificador (QUAL. = QUALIFICADOR):
PB → Primeira Base
SB → Segunda Base
PF → Produto final = base
DB → Duas bases
NOME BASES T. QUAL.
1 Alckimedo Alckmin + Amoedo IL DB
2 Alckmia Alckmin + alquimia IL SB
3 Analfabetto (Frei) Analfabeto + Betto IL PB
4 Ballothalles Balotelli + Thalles IL PB
5 Barbiepta Barbieri + Heptacampeão IL SB
6 Barbiola Barbieri + Guardiola IL SB
7 Barbosafro (Joaquim) Barbosa + afro IL SB
8 Blackenbauer Black + Beckenbauer IL PB
9 Boçalnaro Boçal + Bolsonaro IL PB
10 Bolsoafetivo Bolsonaro + afetivo CT SB
11 Bolsoanta Bolsonaro + anta CT SB
12 Bolsoasno Bolsonaro + asno CT SB
13 Bolsobosta Bolsonaro + bosta CT SB
14 Bolsocaixa (2) Bolsonaro + caixa 2 CT SB
15 Bolsodeus Bolsonaro + deus CT SB
16 Bolsoditador Bolsonaro + ditador CT SB
17 Bolsoestucpro Bolsonaro + estucpro CT SB
18 Bolsofake Bolsonaro + fake CT SB
19 Bolsofalso Bolsonaro + falso CT SB
20 Bolsofascista Bolsonaro + fascista CT SB
21 Bolsofilho Bolsonaro + filho CT SB
22 Bolsogatas Bolsonaro + gatas CT SB
23 Bolsohitler Bolsonaro + Hitler CT SB
24 Bolsokid Bolsonaro + kid CT SB
25 Bolsolixo Bolsonaro + lixo CT SB
26 Bolsolula Bolsonaro + Lula CT SB
27 Bolsolunático Bolsonaro + lunático CT SB
28 Bolsomerda Bolsonaro + merda CT SB
29 Bolsominion Bolsonaro + minion CT SB
30 Bolsomito Bolsonaro + mito CT SB
31 Bolsonabo Bolsonaro + nabo IL SB
32 Bolsonada Bolsonaro + nada IL SB
33 Bolsonagem Bolsonaro + bobagem CT SB
34 Bolsoneca Bolsonaro + soneca IL SB
138
35 Bolsonegan Bolsonaro + Negan (Walking Dead) CT SB
36 Bolsoniver Bolsonaro + niver CT SB
37 Bolsonojo Bolsonaro + nojo CT SB
38 Bolsoquadrilha Bolsonaro + quadrilha CT SB
39 Bolsoréu Bolsonaro + réu CT SB
40 Bolsotário Bolsonaro + otário IL SB
41 Bolsotonto Bolsonaro + tonto CT SB
42 Bolsotroglodita Bolsonaro + troglodita CT SB
43 Bolsotrump Bolsonaro + Trump CT SB
44 Bolsoviolência Bolsonaro + violência CT SB
45 Bombácio bomba + Inácio IL PB
46 Bourelles (Guilherme) Boulos + (Henrique) Meirelles CT PB
47 Bozonaro Bozo + Bolsonaro IL PB
48 Bozonazi Bozo (Bolsonaro) + nazista CT SB
49 Buraque (Chico) Bu.ra.co + Bu.ar.que IL PB
50 Burrichello Burro + Barichello IL PB
51 Caipirinácio Caipirinha + Inácio IL PB
52 Cangaciro cangaceiro + Ciro IL PB
53 Carpezidane (Paulo) Carpegiane + Zidane IL SB
54 Chattoso Chato + Mattoso IL PB
55 Cihaddad Ciro + Haddad CT SB
56 Ciririca Ciro + Tiririca IL SB
57 Ciroará Ciro + Ceará IL PB
58 Cirula Ciro + Lula IL SB
59 Ciscarelli Ciscar + Cicarelli IL PB
60 Collorupto Collor + corrupto IL SB
61 Daciolindo Daciolo + lindo IL SB
62 Debochara Deboche + Bechara IL PB
63 Delábio Delúbio (Soares) + lábia IL SB
64 Desmorolizado Desmoralizado + Moro IL PB
65 Dilmãe Dilma + mãe IL SB
66 Dilmais Dilma + mais IL SB
67 Dilmônia Dilma + demônia IL SB
68 Eduerrado (Paes) Eduardo + errado IL SB
69 Emgambelácio Emgambelador + Inácio IL PB
70 Empregácio Emprego + Inácio CT PB
71 Fabishow Fabi (Fabrício) + show CT SB
72 Falácio Falácia + Inácio IL PB
73 Falsiddad falsidade + Haddad IL PB
74 Feliciddad felicidade + Haddad IL PB
75 Fernandeus Fernando + deus IL SB
76 Filhácio filho + Inácio CT PB
77 Frouxo (Marcelo) Freixo + frouxo IL PF
78 Fudel (Castro) Fudeu + Fidel IL PB
79 Fuscamar fusca + Itamar (Franco) IL PB
80 Galinácio galinha + Inácio IL PB
81 Galinhasso galinha + (Bruno) Galiasso IL PB
82 Galinisteu galinha + Galisteu IL PB
83 Gerohummels Geromel + Hummels IL SB
84 Gordiola (Guto Ferreira) Gordo + Guardiola IL DB
85 Gornaldo gordo + Ronaldo IL PB
86 Gracirambo Gracy(anne Barbosa) + Rambo IL SB
139
87 Groheuer (Marcelo) Grohe + Neuer IL SB
88 Haddadmaleão Haddad + camaleão CT SB
89 Imbeciro (Gomes) Imbecil + Ciro IL PB
90 Janecrete Jane (Corso) + chacrete IL SB
91 Jararaqueline Jararaca + Jaqueline IL PB
92 Jeânus Jean (Wyllys) + ânus IL SB
93 Jeguerino jegue + Severino (Cavalcanti) IL PB
94 Jessiquenga Jéssica + quenga IL SB
95 Jordayrton (Senna) Jordan + Ayrton IL SB
96 Ladruf ladrão + Maluf CT PB
97 Lazanhário lasanha + (Ronaldo) Nazário IL PB
98 Linconel (Messi) Lincon + Lionel (Messi) IL SB
99 Lixonaro lixo + Bolsonaro CT PB
100 Luanel Luan + Lionel (Messi) IL SB
101 Luciabo Luciano (Hulk) + diabo IL SB
102 Luísque Luís (Inácio da Silva) + uísque IL SB
103 Luladrão Lula + ladrão IL SB
104 Lulaminion Lula + minion CT SB
105 Lulamsés Lula + Ramsés CT SB
106 Lulanaro Lula + Bolsonaro CT PB
107 Lularápio Lula + larápio IL SB
108 Lulassonaro Lula + Bolsonaro CT DB
109 Maconhela maconha + Manoela IL PB
110 Magrina magrinha + Marina IL PB
111 Malacheia Malafaia + cheia CT SB
112 Malafala Malafaia + fala IL SB
113 Malafalha Malafaia + falha IL SB
114 Malafeia Malafaia + feia IL SB
115 Malddad maldade + Haddad IL PB
116 Malufioso Maluf + mafioso IL SB
117 Malular malufar + Lula IL DB
118 Manguácio Manguaça + Inácio IL PB
119 Marinaro Marina + Bolsonaro IL SB
120 Marinelles Marina + (Henrique) Meirelles IL PB
121 Martaxa (Marta Suplicy) Marta + taxa IL SB
122 Mastro (Fidel) mastro + Castro IL PB
123 Maxichello Max[ɪ] + Barichello IL SB
124 MenegHell Meneghel + hell IL SB
125 Mensalácio mensalão + Inácio IL PB
126 Mentirez mentira + Martinez IL PB
127 Merdonça merda + mendonça IL PB
128 Mial miau + (Pedro) Bial IL PB
129 Neymaravilha Neymar + maravilha IL SB
130 Neymorzão Neymar + amorzão IL SB
131 Oligarcia oligarquia + Garcia (Neto) IL PB
132 Paquetotti (Lucas) Paquetá + Totti IL SB
133 Parálítico Pará + paralítico IL SB
134 Pedófyllys pedófilo + Wyllys IL PB
135 Pijânio pijama + Jânio IL PB
136 Pinotche (Guevara) Pinotche + Che IL SB
137 Pinton pinto + (Bill) Clinton IL PB
138 Pogbalace Pogba + Walace IL PB
140
139 Populácio popular + Inácio IL PB
140 Rateen Ratinho + teen IL SB
141 Renêymar Renê + Neymar IL SB
142 Retarddad retardado + Haddad IL PB
143 Rhodolfrank Rhodolfo + Frank(stein) IL SB
144 Rodibrei Rodinei + "dibrei" (drible) IL SB
145 Ronalducho Ronaldo + Gorducho IL SB
146 Roskoff Rousseff + Roskoff IL PF
147 Rosquinha Rosinha + rosquinha IL PF
148 Roubasself rouba + Rousseff IL PB
149 Rouberto roubo + Roberto IL PB
150 Ruimbinho ruim + Rubinho (Barrichello) IL PB
151 Sandiabo (Valdemiro) Santiago + diabo IL SB
152 Sarnento Sarney + sarnento IL SB
153 Sashanás Sasha + satanás IL SB
154 Stalinácio [i]Stalin + Inácio IL PB
155 Valdelícia Valdelice + delícia IL SB
156 Vandeuslei Vanderlei + deus IL SB
157 Velheira (Susana) velha + Vieira IL PB
158 Velhoso velho + Veloso IL PB
159 Viajandácio viajandão + Inácio IL PB
160 Wyllixo Wyllys + lixo IL SB
141
FONTE
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62 Facebook - Linha do tempo
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69 Assunção (2006)
70 Assunção (2006)
71 Conversa informal
144
72 Assunção (2006)
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80 Assunção e Gonçalves (2009)
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95 Conversa informal
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146 Assunção (2006)
147 Assunção (2006)
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154 Assunção (2006)
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159 Assunção (2006)
160 Disponível em: <http://desciclopedia.org/wiki/Jean_Wyllys>. Acesso em: Out. 2018.
148
ANEXO II – Shippagem
Legendas utilizadas para a categorização dos cruzamentos (TIPO):
IL → Interposição Lexical
CT → Combinação Truncada
NOME BASES TIPO ESTRUTURA
1 Abelena Abel + Selena (Gomes) CT Início + fim
2 Afonsalia Afonso + Amália CT Início + fim
3 Alfredisis (José) Alfredo + Isis CT Início + fim
4 Amando Amanda + Fernando IL Início + fim
5 Amason Amanda + Robson CT Início + fim
6 Andretino André + Tolentino CT Início + fim
7 Annik Ana (Paula) + Munik IL Início + fim
8 Arliza Arthur + Eliza CT Início + fim
9 Artulia Artur + Julia IL Início + fim
10 Barchie Betty + Archie IL Início + fim
11 Barken Barbie + Ken (apelidos) CT Início + fim
12 Becstin Becky + Austin CT Início + fim
13 Bejei (Isa)Bella + Jeison CT Início + início
14 Belgra Belo + Gracyanne CT Início + início
15 Belidolfo Beliza + Rodolfo CT Início + fim
16 Belívia Beto + Lívia CT Início + fim
17 Bellarke Bellamy + Clarke IL Início + fim
18 Bennifer Ben + Jennifer CT Início + fim
19 Bentriz Bento + Beatriz IL Início + fim
20 Beremy Bonnie + Jeremy CT Início + fim
21 Beward Bella + Edward CT Início + fim
22 Beyon-Z Beyoncé + Jay-Z CT Início + fim
23 Biantavo Bianca + Gustavo CT Início + fim
24 Brangelina Brad + Angelina CT Início + fim
25 Breana Breno + Ana (Clara) CT Início + início
26 Brelherme Brenda + Guilherme CT Início + fim
27 Brenara Breno + (Ana) Clara CT Início + fim
28 Bridolfo Brice + Rodolfo CT Início + fim
29 Brittana Brittany + Santana IL Início + fim
30 Bruane Bruno + Leidiane CT Início + fim
31 Brucas Brooke + Lucas IL Início + fim
32 Brugio Bruno + Giovanna CT Início + início
33 Brullian Brooke + Julian IL Início + fim
34 Brumar Bruna + Neymar IL Início + fim
149
35 Bughead Betty + Jughead CT Início + fim
36 Cabibi Caio + Bibi CT Início + fim
37 Cadolfo Catarina + Rodolfo CT Início + fim
38 Camren Camila + Lauren CT Início + fim
39 Caskett (Ricahrd) Castle + (Kate) Beckett CT Início + fim
40 Catheus Cacau (Maria Claudia) + Matheus IL Início + fim
41 Catpe Catarina + Pedro CT Início + início
42 Chamel Chay (Suede) + Melanie (Fronckowiak) CT Início + início
43 Chaverroni Chavez + (Mai) Perroni IL Início + fim
44 Ciribela Cirilo + Isabela CT Início + fim
45 Clana Clark + Lana IL Início + fim
46 Clanessa Clara + Vanessa IL Início + fim
47 Clanitta (Ana) Clara + Anitta CT Início + fim
48 Clarick Clara + Patrick IL Início + fim
49 Claruso Clara + Caruso IL Início + fim
50 Claysar Clara + Kaysar IL Início + fim
51 Clexa Clarke + Lexa CT Início + fim
52 Clois Clark + Lois CT Início + fim
53 Debóger Déborah + Roger CT Início + fim
54 Delena Demi (Lovato) + Selena (Gomez) CT Início + fim
55 Delena Damon + Elena IL Início + fim
56 Destiel Dean + Castiel CT Início + fim
57 Dezalel Deborah + Bezalel CT Início + fim
58 DiRo Diego + Roberta CT Início + início
59 Dolly Doutor (Marcos) + Emilly CT Início + fim
60 Dramione Draco + Hermione CT Início + fim
61 Drarry Draco + Harry CT Início + fim
62 Duanca Duda + Bianca CT Início + fim
63 Elisabel Elisa + Isabel IL Início + fim
64 Evarisandra Evaristo + Sandra CT Início + fim
65 Ezebel Ezequias + Izabel IL Início + fim
66 Ezria Ezra + Aria IL Início + fim
67 Falice FP + Alice CT Início + fim
68 Felena Fausto Silva + Selena Gomez CT Início + fim
69 Ferline Fernando + Aline CT Início + fim
70 Fermanda Fernando + Amanda IL Início + fim
71 Finchel Finn + Rachel CT Início + fim
72 Flacelo Flávia + Marcelo CT Início + fim
73 Frango Franciele + Diego CT Início + fim
74 Frito Franciele + Vitor CT Início + meio
75 Gamila Gabriel + Camila IL Início + fim
76 Gamo Gabriel + Moisés CT Início + início
150
77 Gesório Gerusa + Osório CT Início + fim
78 Gimila Giovanni + Camila CT Início + fim
79 Gleigner Gleici + Wagner CT Início + fim
80 Glernanda Gláucio + Fernanda CT Início + fim
81 Grauã Grazi + Cauã IL Início + fim
82 Gustanca Gustavo + Bianca CT Início + fim
83 Haleb Hanna + Caleb CT Início + fim
84 Harmione Harry Potter + Hermione Granger IL Início + fim
85 Haylor Harry Styles + Taylor Swift CT Início + fim
86 Heloel Heloísa + Daniel CT Início + fim
87 Isales Isabela + Thales IL Início + fim
88 Isarilo Isabela + Cirilo CT Início + fim
89 Izaquias Izabel + Ezequias IL Início + fim
90 Jailey Justin (Bieber) + Hailey (Baldwin) CT Início + fim
91 Jasiper Jason + Piper CT Início + fim
92 Jaurello Jauregui + Cabello (sobrenomes) IL Início + fim
93 Jayoncé Jay + Beyoncé IL Início + fim
94 Jelena Justin (Bieber) + Selena (Gomez) CT Início + fim
95 JeLu Jéssica + Lucas CT Início + início
96 Jemerson Jéssica + Emerson IL Início + fim
97 Jeyzeca Jeiza + Zeca IL Início + fim
98 Johnlock John (Watson) + Sherlock CT Início + fim
99 Jolari João + Larissa CT Início + início
100 Joliza Jonatas + Eliza CT Início + fim
101 Jorena João + Lorena IL Início + fim
102 Joshelle Josh + Michele IL Início + fim
103 JuCa Juju + Zeca CT Início + fim
104 Judrigo Juliana + Rodrigo CT Início + fim
105 Jullipe Juliana + Fellipe IL Início + fim
106 Junick Juliana + Nick (Nicolas) CT Início + fim
107 Junik Juliano (Laham) + Munik IL Início + fim
108 Justney Justin (Timberlake) + Britney (Spears) IL Início + fim
109 Kamieser Kamilla + Elieser IL Início + fim
110 Karamel Kara + Mon-el CT Início+extremidades
111 Kayssica Kayser + Jéssica CT Início + fim
112 Kelana Kelson + Tatiana CT Início + fim
113 Kimie Kim (Kardashian) + Kanye (West) CT Início + fim
114 Klaine Kurt + Blaine CT Início + fim
115 Klamille Klaus + Camille IL Início + fim
116 Klaroline Klaus + Caroline CT Início + fim
117 Klaysar (Ana) Clara + Kaysar IL Início + fim
118 Klemila Klebber (Toledo) + Camila (Queiroz) CT Início + fim
151
119 Lanzotto Lanza + Salotto (sobrenomes) CT Início + fim
120 Larry Louis + Harry CT Início + fim
121 Lauríque Laura + Caíque CT Início + fim
122 Laylor Laura + Taylor CT Início + fim
123 Lexana Lex + Lana CT Início + fim
124 Leyton Lucas + Peyton CT Início + fim
125 Livipe Lívia + Felipe IL Início + fim
126 Lovi Lorrana + Vinícius CT Início + início
127 Luade Luan Santana + Jade Magalhães CT Início + fim
128 LuAr Lua + Arthur CT Início + início
129 Ludrigo Luciana + Rodrigo CT Início + fim
130 Mafeu Mafalda + Romeu CT Início + fim
131 MaJo Manuela + Joaquim CT Início + início
132 Mally Marcos + Emilly CT Início + fim
133 Marchelle Marcela + Michelle IL Início + fim
134 Mariben Marizete + Benjamin CT Início + início
135 Marilex Maria + Alex CT Início + fim
136 Marisco Mariane + Francisco IL Início + fim
137 MauNam Maura + Ionam CT Início + fim
138 MaVi Manoel + Vivian CT Início + início
139 Mayhashi Mayara + (Felipe) Hashimoto CT Início + início
140 MaZé Mafalda + Zé CT Início + fim
141 Meliz Mel + Liz CT Início + fim
142 MerDer Meredith + Derek CT Início + início
143 Miam Miley (Cyrus) + Liam (Hemsworth) IL Início + fim
144 Michewell Michele + Wellington CT Início + início
145 Mondler Monica + Chandler CT Início + fim
146 Mosh Michele + Josh IL Início + fim
147 Naley Nathan + Haley IL Início + fim
148 Nalu Natsu + Lucy CT Início + início
149 Nanlipe Nanda + Filipe CT Início + fim
150 Narry Niall + Harry CT Início + fim
151 NaruHina Naruto + Hinata CT Início + início
152 Narusuke Naruto + Sasuke CT Início + fim
153 Neymarquezine Neymar + Marquezine IL Início + fim
154 Neymessi Neymar + Messi IL Início + fim
155 Nikon Nicole + Akon IL Início + fim
156 Niley Nick (Jonas) + Miley (Cyrus) CT Início + fim
157 Nopau Breno + Paula CT Fim + início
158 Olicity Oliver + Felicity IL Início + fim
159 Oliguel Olívia + Miguel IL Início + fim
160 Paugner Paula + Wagner CT Início + fim
152
161 Pauniel (Ana) Paula + Daniel CT Início + fim
162 Pauruso Paula + Caruso CT Início + fim
163 Paussica Paula + Jessica CT Início + fim
164 Pelice Pedro + Alice CT Início + fim
165 Peloísa Pedro + Heloísa IL Início + fim
166 Percabeth Percy Jackson + Annabeth Chase CT Início + fim
167 Perina Pedro + Karina IL Início + fim
168 Peromar Pérola + Márcio CT Início + início
169 Petniss Peeta (Mellark) + Katniss (Everdeen) CT Início + fim
170 Petrolfo Petrônio + Rodolfo IL Início + fim
171 Ponny Poncho Herrera + Anny (Anahi) CT Início + fim
172 Renik Renan + Munik IL Início + fim
173 Rizzles Rizzoli + Isles CT Início + fim
174 Robsten Robert (Pattinson) + Kristen (Stewart) CT Início + fim
175 Romena Romero + Atena IL Início + fim
176 Samurocas Samuel + Marocas CT Início + fim
177 Samygor Sâms + Ygor IL Início + fim
178 Sandrevaristo Sandra + Evaristo CT Início + fim
179 Sasusaku Sasuke + Sakura CT Início + início
180 Scallison Scott + Allison CT Início + fim
181 Semi Selena (Gomes) + Demi (Lovato) CT Início + fim
182 Shailey Shawn + Hailey CT Início + fim
183 Shamy Sheldon + Amy CT Início + fim
184 Shirlipe Shirlei + Felipe IL Início + fim
185 Somic Sophia (Abrahão) + Micael (Borges) CT Início + início
186 Spoby Spencer + Toby CT Início + fim
187 Steferine Stefan + Katherine IL Início + fim
188 Stelena Stefan + Elena CT Início + fim
189 Sterek Stiles + Derek CT Início + fim
190 Stucky Steve + Bucky CT Início + fim
191 Stydia Styles + Lydia CT Início + fim
192 Stylinson Styles + Tomlinson (sobrenomes) IL Início + fim
193 Susan Susana + Sandro CT Início + início
194 Suzércio Suzi + Tércio CT Início + fim
195 Tadrilles Tamires + Adrilles IL Início + fim
196 Talicks Talita + (Rafael) Licks IL Início + fim
197 Tatelson Tatiana + Kelson CT Início + fim
198 TayTay Taylor + Taylor CT Início + início
199 Thiara Thiago + Sara IL Início + fim
200 Tocar Tomás + Carla CT Início + início
201 Tralliane (Cesar) Tralli + Ticiane (Pinheiro) IL Início + fim
202 Troyella Troy + Gabriella CT Início + fim
153
203 Valdemario Valdineia + Romário CT Início + fim
204 Vashley Vanessa (Hudgens) + Ashley (Tisdale) CT Início + fim
205 Vaustin Vanessa (Hudgens) + Austin (Buttler) IL Início + fim
206 Viihlu Viih + Luis CT Início + início
207 Viviada Vivi + Radamés CT Início + meio
208 Vondy Von + Candy (Dulce Maria e Christopher) CT Início + fim
209 Wellmiche Wellington + Michele CT Início + início
210 Zanessa Zac (Efron) + Vanessa (Hudgens) CT Início + fim
211 Ziam Zayn + Liam IL Início + fim
212 Zigi Zayn + Gigi Hadid CT Início + fim
154
FONTE
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183 Disponível em: </http://www.minhaserie.com.br/novidades/4287-the-big-bang-theory-novidades-sobre-shamy/>. Acesso em: Dez.
2017.
184 Disponível em:http://gshow.globo.com/tv/rapidinhas/noticia/2016/11/shirlipe-teste-seus-conhecimentos-sobre-o-casal-de-haja-
coracao.html.Acesso em Out. 2016.
185 Disponível em: <https://capricho.abril.com.br/famosos/apos-noticia-de-separacao-sophia-abrahao-e-micael-borges-desembarcam-
juntos-no-rio/>. Acesso em: Dez. 2018.
186 Disponível em: <https://www.terra.com.br/diversao/purebreak/criadora-de-pretty-little-liars-revela-onde-spencer-e-toby-estao-agora-
spoby,00afaa35d83d885d93aff6f09ecc2239xes8e3ih.html>. Acesso em: Dez. 2018.
187 Disponível em: <https://www.spiritfanfiction.com/historia/a-filha-de-steferine-14021095>. Acesso em: Jan. 2019.
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190 Disponível em: <https://todateen.com.br/tumblr-divulga-lista-ships-mais-populares-2015/>. Acesso em: Jan. 2019.
191 Disponível em: <https://antesdameianoite.com/2015/11/19/casais-que-eu-shippo/>. Acesso em: Mai. 2018.
192 Disponível em: <http://www.mtv.com.br/noticias/zkbgda/louis-tomlinson-afirma-que-o-ship-larry-stylinson-afetou-sua-amizade-com-
harry-styles>. Acesso em: Dez. 2018.
193
Disponível em:
<http://www.clicrbs.com.br/blog/jsp/default.jsp?source=DYNAMIC,blog.BlogDataServer,getBlog&uf=1&local=1&template=3948.dwt§ion=Blogs&post=268333&blog=53&coldir=1&topo=3994.dwt>. Acesso em: Jan. 2019.
194 Fala espontânea
195 Disponível em: <https://capricho.abril.com.br/famosos/descubra-o-que-rolou-na-festa-surpresa/>. Acesso em: Dez. 2017.
165
196 Disponível em: <http://gshow.globo.com/realities/bbb/BBB17/noticia/2017/04/ronan-e-talita-araujo-apostam-em-saida-de-marcos-em-
paredao-contra-vivian.html>. Acesso em: Dez. 2018.
197
Disponível em:
https://www.facebook.com/buscape/videos/10155986654657182/?comment_id=10155988429632182¬if_id=1528817271193995&n
otif_t=comment_mention&ref=notif. Acesso em: Jun. 2018.
198 Disponível em: <https://capricho.abril.com.br/diversao/os-5-casais-que-queriamos-muito-ver-juntos/>. Acesso em: Nov. 2017.
199 Fala espontânea
200 Disponível em: <https://br.answers.yahoo.com/question/index?qid=20120608054955AAd2QU5&guccounter=1>. Acesso em: Dez.
2018.
201 Disponível em: <https://noticias.bol.uol.com.br/bol-listas/eu-shippo-veja-11-nomes-de-casais-famosos-que-viraram-hashtag.htm>.
Acesso em: Mai. 2018.
202 Disponível em: <https://www.spiritfanfiction.com/historia/high-school-musical-4--troyella-4900132>. Acesso em: Dez. 2018.
203 Disponível em: <https://www.facebook.com/buscape/videos/10155986654657182/?comment_id=10155988429632182¬if_id=1528817271193995&
notif_t=comment_mention&ref=notif>. Acesso em: Jun. 2018.
204 Disponível em: <http://vanessahudgens.com.br/vanessa-hudgens-e-ashley-tisdale-podem-vir-ao-brasil-para-evento/>. Acesso em: Dez.
2018.
205 Disponível em: <https://twitter.com/babyddjonas/status/351162363048763392>. Acesso em: Dez. 2018.
206 Disponível em: <https://twitter.com/melissacandiido/status/816403238136193024> Acesso em: Out. 2018.
207 Disponível em: <http://www.clicrbs.com.br/blog/jsp/default.jsp?source=DYNAMIC,blog.BlogDataServer,getBlog&uf=1&local=1&template=3948.dwt
§ion=Blogs&post=268333&blog=53&coldir=1&topo=3994.dwt>. Acesso em: Jan. 2019.
208 Disponível em: <https://rbdunion.blogspot.com/2016/02/rbd-traumas.html>. Acesso em: Dez. 2018.
209 Disponível em: <https://www.facebook.com/buscape/videos/10155986654657182/?comment_id=10155988429632182¬if_id=1528817271193995&
notif_t=comment_mention&ref=notif>. Acesso em: Jun. 2018.,,<
210 Disponível em: <http://www.ofuxico.com.br/noticias-sobre-famosos/zac-efron-e-vanessa-hudgens-podem-estar-se-
reaproximando/2016/05/12-265485.html>. Acesso em: Dez. 2018.
211 Disponível em: <https://todateen.com.br/tumblr-divulga-lista-ships-mais-populares-2015/>. Acesso em: Jan. 2019.
212 Disponível em: <https://capricho.abril.com.br/moda/shippamos-os-casais-mais-estilosos-do-momento//>. Acesso em: Nov. 2017.
166
ANEXO III – Nome de batismo
Legendas utilizadas para a categorização dos cruzamentos (TIPO):
IL → Interposição Lexical
CT → Combinação Truncada
NOME BASES TIPO ESTRUTURA
1 Adeli Adélcio + Sueli CT Início + fim
2 Adriara Adriano + Clara CT Início + fim
3 Adrilo Adriana + Paulo CT Início + fim
4 Aguimar Aguinaldo + Maria CT Início + início
5 Alair Alaíde + Jair IL Início + fim
6 Alcelo Alyne + Marcelo CT Início + fim
7 Aldelite Aldemar + Elite IL Início + fim
8 Aleago Alessandra + Tiago CT Início + fim
9 Alexana Alexandra + Daiana IL Início + fim
10 Aliandro Aline + Leandro CT Início + fim
11 Alidre Aline + André CT Início + fim
12 Alidre Aline + Alexandre CT Início + fim
13 Alinardo Aline + Leonardo IL Início + fim
14 Alixan Aline + Alexandre IL Início + início
15 Alubora Aluízio + Débora CT Início + fim
16 Amagina Amadeu + Regina CT Início + fim
17 Amailson Amanda + Vailson CT Início + fim
18 Analimar Anália + Martinho CT Início + início
19 Anamei Ana + Sitmei CT Início + fim
20 Anão Angel + João CT Início + fim
21 Andaldo Andreia + Ronaldo CT Início + fim
22 Andesley Anderson + Nasley CT Início + fim
23 Andiana Anderson + Juliana CT Início + fim
24 Andrean Andréa + Juan CT Início + fim
25 Andrelina André + Carolina CT Início + fim
26 Andrila André + Sheila CT Início + fim
27 Antoly Antônio + Rosely CT Início + fim
28 Antoniela Antônio + Manuela CT Início + fim
29 Arcângela Arcanjo + Ângela IL Início + início
30 Arilo Aline + Murilo CT Início + fim
31 Augusthia Augusto + Cynthia IL Início + fim
32 Aurimundo Aurineide + Raimundo CT Início + fim
33 Basmila Bastian + Camila CT Início + fim
34 Bastila Bastian + Camila IL Início + fim
167
35 Bervan Berton + Vania CT Início + início
36 Bremila Breno + Samila CT Início + fim
37 Bruane Bruno + Cristiane CT Início + fim
38 Bruriana Bruno + Mariana CT Início + fim
39 Cachel Camila + Michel CT Início + fim
40 Cadré Carolina + André CT Início + fim
41 Carmaria Carmem + Maria IL Início + início
42 Carolardo Caroline + Leonardo CT Início + fim
43 Carolicio Carolina + Fabrício IL Início + fim
44 Castian Camila + Bastian IL Início + fim
45 Celsiane Celso + Tathiane CT Início + fim
46 Celyne Marcelo + Alyne IL Fim + fim
47 Cesela César + Pâmela CT Início + fim
48 Cilael Priscila + Rafael IL Fim + fim
49 Cirson Cinara + Jefferson CT Início + fim
50 Clariano Clara + Adriano CT Início + fim
51 Clariedro Clarissa + Pedro CT Início + fim
52 Claudelina Claudemir + Carolina CT Início + fim
53 Claudevane Claudemar + Vanessa CT Início + início
54 Claudionor Cláudio + Leonor IL Início + fim
55 Cleosvaldo Cleonice + Osvaldo IL Início + início
56 Crislene Cristiano + Marlene CT Início + fim
57 Daguisué Daguialine + Josué CT Início + fim
58 Dailu Daianne + Lucas CT Início + início
59 Damielena Damião + Helena CT Início + fim
60 Déluízio Débora + Aluízio CT Início + fim
61 Derran Débora + Lorran CT Início + fim
62 Dibiano Diones + Fabiana CT Início + fim
63 Dolorene Dolores + Marlene CT Início + fim
64 Douna Douglas + Janaína CT Início + fim
65 Dudardo Duda + Leonardo IL Início + fim
66 Edigênio Edite + Eugênio CT Início + fim
67 Edilange Edison + Solange CT Início + fim
68 Eduana Eduardo + Mariana CT Início + fim
69 Eduarlene Eduardo + Darlene IL Início + fim
70 Edunardo Eduarda + Leonardo IL Início + fim
71 Eliando Elisa + Fernando CT Início + fim
72 Eliedson Eliane + Edson CT Início + início
73 Elismar Elis + Márcio CT Início + início
74 Elizandra Elizeu + Sandra CT Início + fim
75 Elizelma Elias + Zelma CT Início + início
76 Eminuel Emília + Emanuel IL Início + fim
168
77 Emmamin Emmanuel + Yasmin CT Início + fim
78 Endriele Henrique + Adriele CT Início + fim
79 Erlice Ernesto + Alice CT Início + fim
80 Eulana Eulália + Ana (avós) CT Início + início
81 Euriso Eurides + Solange CT Início + início
82 Evandrila Evandro + Priscila CT Início + fim
83 Fabines Fabiana + Diones CT Início + fim
84 Fabrilina Fabrício + Carolina CT Início + fim
85 Faela Rafael + Priscila CT Fim + fim
86 Farla Fábio + Karla IL Início + fim
87 Fedrigo Fernanda + Rodrigo CT Início + fim
88 Felisa Fernando + Elisa IL Início + início
89 Fercisca Fernanda + Francisco CT Início + fim
90 Ferdinei Fernanda + Rudinei CT Início + fim
91 Fernanline Fernando + Aline CT Início + fim
92 Fernaula Fernando + Paula CT Início + fim
93 Flaberto Flávia + Gilberto CT Início + fim
94 Florduardo Flor + Eduardo CT Início + fim
95 Franando Francisco + Fernanda CT Início + fim
96 Franciberto Francine + Gilberto CT Início + fim
97 Francinanda Francisco + Fernanda CT Início + fim
98 Francisquelly Francisco + Quelly IL Início + início
99 Gabricelo Gabriela + Marcelo CT Início + fim
100 Geljo Angel + João CT Fim + início
101 Gilbercine Gilberto + Francine CT Início + fim
102 Gilnete Gilberto + Marienete CT Início + fim
103 Gilvia Gilberto + Flávia CT Início + fim
104 Guiliana Guilherme + Juliana CT Início + fim
105 Guslya Gustavo + Jullya CT Início + fim
106 Gusmira Gustavo + Almira CT Início + fim
107 Henribrina Henrique + Sabrina CT Início + fim
108 Hitarol Hitalo + Carol IL Início + fim
109 Hugline Hugo + Jaqueline CT Início + fim
110 Isadro Isabela + Pedro CT Início + fim
111 Isalberto Isabel + Alberto IL Início + início
112 Isape Isabela + Pedro CT Início + início
113 Isaria Isaque + Vitória CT Início + fim
114 Ivedro Ivana + Pedro CT Início + fim
115 Ivoneide Ivone + Neide IL Início + início
116 Ivonice Ivo + Genice CT Início + fim
117 Izaley Izaias + Shirlei CT Início + fim
118 Jael Jéssica + Rafael CT Início + fim
169
119 Jaiane Jairo + Cassiane CT Início + fim
120 Jaíde Jair + Alaíde IL Início + fim
121 Janeão Jane + João CT Início + fim
122 Janiel Jaqueline + Daniel CT Início + fim
123 Jaqgo Jaqueline + Hugo CT Início + fim
124 Jaquinato Jaquiele + Renato CT Início + fim
125 Jecina Jefferson + Cinara CT Início + início
126 Jefferlita Jefferson + Thalita CT Início + fim
127 Jessiel Jéssica + Rafael CT Início + fim
128 Jhennardo Jhennifer + Leonardo IL Início + fim
129 Joci Jorge + Luci CT Início + fim
130 Joleny João + Marlene CT Início + fim
131 Jomar João + Maria CT Início + início
132 Josenara José + Dinara CT Início + fim
133 Josuline Josué + Daguialine CT Início + fim
134 Joticia João + Letícia CT Início + fim
135 Jucélia Júlia + Célia CT Início + início
136 Juis Júnior + Thais CT Início + fim
137 Julerson Juliana + Anderson CT Início + fim
138 Juliarcio Juliana + Márcio CT Início + fim
139 Julierme Juliana + Guilherme CT Início + fim
140 Juliquel Juliano + Raquel CT Início + fim
141 Junirla Júnior + Marla CT Início + fim
142 Kárbio Karla + Fábio IL Início + fim
143 Karinaldo Karine + Ronaldo IL Início + fim
144 Karlene Carlos + Marilene IL Início + fim
145 Keltisa Kelton + Marisa CT Início + fim
146 Laerpa Laerte + Filipa CT Início + fim
147 Lalipa Laerte + Filipa CT Início + fim
148 Laulo Laura + Paulo IL Início + fim
149 Leandrine Leandro + Aline CT Início + fim
150 Leidiane Leomar + Lidiane CT Início + fim
151 Leoduarda Leonardo + Eduarda IL Início + fim
152 Leoline Leonardo + Caroline CT Início + fim
153 Leonnifer Leonardo + Jhennifer IL Início + fim
154 Letial Leticia + Allan CT Início + início
155 Liander Lidia + Anderson CT Início + início
156 Lobora Lorran + Débora CT Início + fim
157 Lucireny Lucia + Irene(y) IL Início + início
158 Lucitelma Lucia + Telma CT Início + início
159 Ludai Lucas + Daianne CT Início + início
160 Luéria Luís + Valéria CT Início + fim
170
161 Luge Luci + Jorge CT Início + fim
162 Luizna Luiza + Natan CT Início + início
163 Lunat Ludmila + Nathan CT Início + início
164 Maberta Marcelo + Roberta CT Início + fim
165 Maíres Mar + (arco) íris CT Início + início
166 Malena Maria (Rita) + Elena CT Início + fim
167 Marceleuza Marcela + Neuza CT Início + fim
168 Marcélia Mário + Célia CT Início + início
169 Marcila Marcelo + Priscila CT Início + fim
170 Marciliana Márcio + Juliana CT Início + fim
171 Marcir Marla + Moacir CT Início + fim
172 Marcivânia Marcia + Vânia CT Início + início
173 Marcotônio Marco + Antônio CT Início + fim
174 Mareldon Marina + Ueldom CT Início + fim
175 Marelis Márcio + Elis CT Início + início
176 Marelisa Osmar + Elisa CT Fim + início
177 Mariel Maria + Ariel IL Início + início
178 Marielza Mariel + Elza IL Início + início
179 Marilton Marisa + Kelton CT Início + fim
180 Marinardo Mariana + Eduardo CT Início + fim
181 Marinice Mário +Eunice CT Início + fim
182 Marion Mariana + Helton CT Início + fim
183 Mariuno Mariana + Bruno CT Início + fim
184 Marlenores Marlene + Dolores CT Início + fim
185 Marlior Marla + Júnior CT Início + fim
186 Marlo Marcela + Paulo CT Início + fim
187 Marmundo Marlene + Raimundo CT Início + fim
188 Marsa Marcos + Samantha CT Início + início
189 Mart’nália Martinho + Anália CT Início + fim
190 Maruardo Mariana + Eduardo CT Início + fim
191 Mathisa Matheus + Thaísa CT Início + fim
192 Maulo Maria + Paulo IL Início + fim
193 Milael Camila + Michel CT Fim + fim
194 Milange Milton + Solange CT Início + fim
195 Misol Milton + Solange CT Início + início
196 Muline Murilo + Aline CT Início + fim
197 Nafael Nathália + Rafael IL Início + fim
198 Naslerson Nasley + Anderson IL Início + fim
199 Nathalissa Nathalia + Lissa IL Início + início
200 Natlu Nathan + Ludmila CT Início + início
201 Nelvanda Nelson + Vanda CT Início + início
202 Neuci Neuza + Euci IL Início + início
171
203 Nicevo Genice + Ivo CT Fim + início
204 Oscelo Osvaldina + Marcelo IL Início + fim
205 Ozilaine Ozias + Elaine CT Início + fim
206 Pâmesar Pâmela + César CT Início + fim
207 Paucela Paulo + Marcela CT Início + fim
208 Paulando Paula + Fernando CT Início + fim
209 Pauliana Paulo + Adriana CT Início + fim
210 Paulicia Paulo + Letícia CT Início + fim
211 Paura Paulo + Laura IL Início + fim
212 Pedrana Pedro + Ivana CT Início + fim
213 Pedrissa Pedro + Clarissa CT Início + fim
214 Peisa Pedro + Isabela CT Início + início
215 Penia Pedro + Tânia CT Início + fim
216 Peta Pedro + Tânia CT Início + início
217 Priscelo Priscila + Marcelo CT Início + fim
218 Priscilandro Priscila + Evandro CT Início + fim
219 Prisra Priscila + Rafael CT Início + início
220 Rafica Rafael + Jéssica CT Início + fim
221 Railene Raimundo + Marlene CT Início + fim
222 Raineide Raimundo + Aurineide CT Início + fim
223 Ramanda Ramon + Amanda IL Início + início
224 Rapris Rafael + Priscila CT Início + início
225 Raquiano Raquel + Juliano CT Início + fim
226 Rathalia Rafael + Nathália IL Início + fim
227 Regineu Regina + Amadeu CT Início + fim
228 Relena (Maria) Rita + Elena CT Início + início
229 Reniele Renato + Jaquiele CT Início + fim
230 Ricamarta Ricardo + Marta CT Início + início
231 Roberlo Roberta + Marcelo IL Início + fim
232 Rodrinanda Rodrigo + Fernanda CT Início + fim
233 Roneia Ronaldo + Andreia CT Início + fim
234 Rorine Ronaldo + Karine CT Início + fim
235 Rosean Rosely + Antônio CT Início + início
236 Rosênio Rosely + Antônio CT Início + fim
237 Sabririque Sabrina + Henrique CT Início + fim
238 Samino Samila + Breno CT Início + fim
239 Sheidré Sheila + André CT Início + fim
240 Shirlias Shirlei + Izaias CT Início + fim
241 Silton Solange + Milton CT Início + fim
242 Sitmana Sitmei + Ana CT Início + início
243 Solandes Solange + Eurides CT Início + fim
244 Suélcio Sueli + Adélcio CT Início + fim
172
245 Suzângela Suzana(e) + Ângela IL Início + início
246 Tadro Tânia + Pedro CT Início + fim
247 Tape Tânia + Pedro CT Início + início
248 Thaju Thais + Júnior CT Início + início
249 Thalerson Thalita + Jefferson CT Início + fim
250 Thamar Samantha + Marcos CT Fim + início
251 Thatheus Thaísa + Matheus IL Início + fim
252 Thiara Thiago + Clara IL Início + fim
253 Tissandra Tiago + Alessandra CT Início + fim
254 TonSol Milton + Solange CT Fim + início
255 Ueldrina Ueldom + Marina CT Início + fim
256 Valine Vagner + Aline IL Início + início
257 Valu Valéria + Luís CT Início + início
258 Vamanda Vailson + Amanda IL Início + início
259 Vanderci Vanderlei + Cilene CT Início + início
260 Vanilde Valter + Leonilde CT Início + fim
261 Vitóque Vitória + Isaque CT Início + fim
262 Zatan Luiza + Natan IL Início + fim
263 Ziraldo Zizinha + Geraldo CT Início + fim
173
FONTE
1 Obata (1986)
2 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
3 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
4 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
5 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
6 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
7 Disponível em: <https://www.uai.com.br/app/noticia/saude/2015/11/29/noticias-saude,186665/por-modismo-ou-homenagem-pais-registram-filhos-com-
nomes-pra-la-de-in.shtml>. Acesso em Jan. 2019.
8 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
9 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
10 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
11 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
12 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
13 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
14 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
15 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
16 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
17 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
18 Simões Neto e Rodrigues (2017)
19 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
20 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
21 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
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259 Obata (1986)
183
260 Oralidade
261 Disponível em: <https://brasil.babycenter.com/thread/680463/brincadeira-de-jun%C3%A7%C3%A3o-de-nomes?startIndex=40>. Acesso em Jan. 2019.
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263 Obata (1986)
184
ANEXO IV – Oniônimos de bases antroponímicas
Legendas utilizadas para a categorização dos cruzamentos (TIPO):
IL → Interposição Lexical
NOME BASE TIPO
1 Paulufusos Paulo + parafusos IL
2 Veterimário veterinário + Mário IL
FONTE
1
Disponível em: <https://www.gazetadomundo.com/nao-tem-como-negar-que-esses-14-
trocadilhos-sao-obras-de-
brasileiros/?utm_source=fb_publisher&utm_medium=cpm&utm_campaign=e3cbd&slot=9b
9ed>. Acesso em: Set. 2018.
2
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