o conselho do fundeb no municÍpio de itaboraÍ: controle pÚblico ou legitimaÇÃo do privado na...

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V ENCONTRO BRASILEIRO DE EDUCAÇÃO E MARXISMO MARXISMO, EDUCAÇÃO E EMANCIPAÇÃO HUMANA 11, 12, 13 E 14 de abril de 2011 – UFSC – Florianópolis – SC - Brasil O CONSELHO DO FUNDEB NO MUNICÍPIO DE ITABORAÍ: CONTROLE PÚBLICO OU LEGITIMAÇÃO DO PRIVADO NA EDUCAÇÃO? Marco Vinícius Moreira Lamarão 1 PPGE/UFRJ Resumo: Esta pesquisa tem como objetivo estudar a relação entre o público e o privado na educação brasileira, através da análise do Conselho de acompanhamento do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB). Este trabalho analisou as leis que regulamentam a criação dos conselhos municipais e, através de um estudo de caso, pesquisou as atas das reuniões do conselho do FUNDEB-Itaboraí com o objetivo de identificar a sua composição e a participação dos setores da sociedade civil. Através de entrevista com os conselheiros foi possível apreender as motivações políticas de sua atuação. O conselho municipal é entendido neste trabalho como parte de um processo histórico de formação do espaço público brasileiro e também de disputa entre interesses públicos e privados. Assim, pretende-se responder a seguinte questão: quais são as principais limitações e quais são as principais possibilidades no exercício do controle social e acompanhamento dos gastos públicos pelo conselho do FUNDEB- Itaboraí Ao acúmulo da analise é possível perceber a manifestação de diversas formas de privatização do espaço público, seja esta declarada, seja de forma tácita. Palavras – chave: público e privado; controle social; estado e sociedade civil. 1 Mestrando do Programa de Pósgraduação em Educação da UFRJ (PPGE/ UFRJ), participante do grupo de estudo do LIES sob orientação do professor Roberto Leher, professor da rede particular, pública estadual (RJ), pública municipal (ItaboraíRJ) e diretor do Sindicato estadual dos profissionais da educação – núcleo Itaboraí (SEPEita).

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Pesquisa desenvolvida por Marcos Lamarão sobre a situação do Conselho do FUNDEB em Itaboraí.

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11, 12, 13 E 14 de abril de 2011 – UFSC – Florianópolis – SC - Brasil  

                                                           

O CONSELHO DO FUNDEB NO MUNICÍPIO DE ITABORAÍ: CONTROLE

PÚBLICO OU LEGITIMAÇÃO DO PRIVADO NA EDUCAÇÃO?

Marco Vinícius Moreira Lamarão1

PPGE/UFRJ

Resumo:

Esta pesquisa tem como objetivo estudar a relação entre o público e o privado na

educação brasileira, através da análise do Conselho de acompanhamento do Fundo de

Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais

da Educação (FUNDEB). Este trabalho analisou as leis que regulamentam a criação dos

conselhos municipais e, através de um estudo de caso, pesquisou as atas das reuniões do

conselho do FUNDEB-Itaboraí com o objetivo de identificar a sua composição e a

participação dos setores da sociedade civil. Através de entrevista com os conselheiros

foi possível apreender as motivações políticas de sua atuação. O conselho municipal é

entendido neste trabalho como parte de um processo histórico de formação do espaço

público brasileiro e também de disputa entre interesses públicos e privados. Assim,

pretende-se responder a seguinte questão: quais são as principais limitações e quais são

as principais possibilidades no exercício do controle social e acompanhamento dos

gastos públicos pelo conselho do FUNDEB- Itaboraí Ao acúmulo da analise é possível

perceber a manifestação de diversas formas de privatização do espaço público, seja esta

declarada, seja de forma tácita.

Palavras – chave: público e privado; controle social; estado e sociedade civil.

 

1 Mestrando do Programa de Pós‐graduação em Educação da UFRJ (PPGE/ UFRJ), participante do grupo de  estudo  do  LIES  sob  orientação  do  professor  Roberto  Leher,  professor  da  rede  particular,  pública estadual  (RJ),  pública  municipal  (Itaboraí‐RJ)  e  diretor  do  Sindicato  estadual  dos  profissionais  da educação – núcleo Itaboraí (SEPE‐ ita). 

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 1. Introdução:

Este artigo se propõe analisar o Conselho de acompanhamento e controle social

do FUNDEB (CONFUNDEB); em nível Municipal, tendo como estudo de caso

específico o município de Itaboraí- RJ. Busca-se, nestas páginas, aproximar alguns

referenciais metodológicos e conceituais do objeto estudado e analisar a legislação

atinente ao conselho, tanto em nível federal quanto em nível municipal, atentando para

as modificações ocorridas na legislação municipal e, em especial, no que diz respeito à

relação paridade estado/sociedade deste conselho. Além das leis, também foram

analisados materiais de “orientação” e outros documentos oficiais produzidos sobre o

FUNDEB/CONFUNDEB.

A lei no 11.494, de 20 de junho de 2007, que criou o FUNDEB (Fundo de

Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e valorização dos Profissionais da

Educação), e o Decreto no 6253, de 13 de novembro de 2007 que regulamenta a lei

supracitada, dispõem sobre a criação de um Conselho, cujo objetivo seria a fiscalização

e o controle social da distribuição e aplicação das verbas atreladas a este fundo. Em

cada estado ou município, o conselho que fiscaliza a aplicação do fundo público para a

educação possui uma legislação própria. Em Itaboraí, as leis que regulamentam o

CONFUNDEB- ita são as 2005/07, 2034/07 e 2080/08.

Este presente texto, portanto, divide-se em duas partes principais: primeiro,

conforme já dito, pretende aproximar um quadro teórico ao objeto estudado, tratando de

conceitos que nos serão importante na consecução desta investigação. São eles: estado e

sociedade civil, hegemonia, controle social e relação do público e do privado na

educação. Conseguinte, faz-se uma análise de leis relacionadas ao CONFUNDEB, nos

dois níveis que aqui nos interessam - federal e municipal (Itaboraí) - pois estas

legislações determinam juridicamente o espaço estudado, sempre tendo em foco o

conflito entre possibilidades e empecilhos, bem como a inserção deste conselho numa

realidade específica, no nosso caso: Itaboraí- RJ.

Esta pesquisa estabeleceu a seguinte hipótese: os conselhos guardam dentro de si

os conflitos de classe e de interesses da sociedade que os forjam e que os conceberam.

Partindo de concepções distintas de conselhos (os conselhos na tradição operária, na

tradição autoritária e os conselhos na tradição liberal), buscou-se ultrapassar uma visão

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 estritamente negativa do CONFUNDEB, entendendo que o conselho pode auxiliar os

educadores e trabalhadores na construção de uma educação pública, gratuita, de

qualidade e, sobremaneira, emancipadora.

2. Referências teórico-metodológicas: materialismo histórico e dialético,

estado ampliado e hegemonia.

Esta pesquisa, de forma resumida e esquemática, se alinha com a vertente da

pedagogia que busca analisar criticamente o capitalismo que, desde sua origem até os

dias atuais, mantém uma série de características fundamentais: como ser um sistema

contraditório e crítico (pois intermitentemente em crise) graças à sua necessidade

imperiosa do lucro e de, para isto, a burguesia (classe detentora dos meios de produção)

extrair parcela significativa da “mais-valia” (base do lucro) pela exploração do trabalho

de outra classe social (dos expropriados dos meios de produção, os trabalhadores

assalariados). Ademais, a burguesia, buscando potencializar a sua obtenção de lucros,

investe em avanços tecnológicos, aumentando a quantidade de mercadorias produzidas,

diminuindo o tempo de sua produção e dispensando mão- de- obra trabalhadora. Assim,

produz cada vez mais, sem que com isso signifique uma divisão equânime ou pelo

menos justa desta riqueza dentre estas classes sociais. Reivindicando o princípio da

propriedade privada, a classe expropriadora concentra em suas mãos parcelas

significativas do que é produzido, gerando uma concentração de rendas e bens na classe

dominante (MARX; 1966; 2001).

A exploração sobre o trabalho ou a expropriação de parcela da riqueza de uma

classe sobre outra não é uma característica peculiar do capitalismo. Mas o capitalismo

tem uma diferença substancial com relação a outras “formas pré-capitalistas” de

produção. Segundo Wood (2003), no capitalismo há total separação entre os

mecanismos de apropriação do trabalho alheio com as funções “extra econômicas”. Ou

seja, a luta de classes no capitalismo (a exploração classista sobre o trabalho) se

encontra, centralmente, na esfera da produção, pois é lá que se concentram os principais

instrumentos de expropriação. Emerge, neste cenário, a importância do estado, que

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 concentraria então, diversas funções necessárias para a reprodução e o desenvolvimento

destas relações de produção “econômicas”. Neste sentido, diz a autora:

“Há no capitalismo uma separação completa entre a apropriação privada e os deveres públicos; isso implica o desenvolvimento de uma nova esfera de poder inteiramente dedicada aos fins privados, e não aos sociais. Sob este aspecto, o capitalismo difere das formas pré-capitalistas, nas quais a fusão dos poderes econômico e político significava não apenas que a extração da mais- valia era um transação “extra- econômica” separadas do processo de produção em si, mas também que o poder de apropriação da mais-valia – pertencesse ele ao estado ou a algum senhor privado- implicava o cumprimento de funções militares, jurídicas e administrativas”(Wood, 2003: 36).

Em tempos atrás o poder de apropriação era acompanhado de outros atributos

(jurídicos, militares, religiosos ou mesmo administrativos), isso já não se faz necessário

atualmente, a capacidade de expropriação está inscrita no que entendemos como

relações “econômicas”. Havendo esta separação nítida entre “econômico” e “político”,

coube ao estado, no capitalismo, um papel central e um “caráter público sem

precedentes”. Wood define o estado no capitalismo, em termos bastante amplos, “como

o complexo de instituições por meio das quais o poder da sociedade se organiza numa

base superior à familiar” e uma organização de poder que se compõe de “instrumentos

de coerção formal e especializados”. È também mecanismo de fortalecimento e

reprodução das relações sociais de expropriação servindo, no mais das vezes, para a

reprodução da lógica do capital. (WOOD, 2003: 37-43)

Contudo, continua a autora, a defesa do caráter público do estado, da sua função

social e, principalmente, da democracia são instrumentos importantes contra o

capitalismo. Pois a divisão de poderes entre classe e estado não significou a diminuição

do poder estatal, mas ao contrário, que este “corporificado no monopólio mais

especializado... é, em última análise, o ponto decisivo de concentração de todo o poder

na sociedade”( WOOD; op.cit.:49).

Uma definição mais apurada de estado encontra-se no filósofo italiano Antônio

Gramsci e das formulações advindas, a posteriori, desta matriz. Partindo das

elaborações gramsciana de Estado, Buci-Glucksman (1980) atenta para a ideia de estado

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 ampliado no pensamento do referido filósofo, entendido, assim, como relação dialética

permanente entre a sociedade civil e a sociedade política, onde a sociedade civil é

definida como o espaço de disputa entre agências privadas de hegemonia (esta,

entendida aqui como produção do consenso) e espaço privilegiado da luta de classes. Já

a sociedade política seria o aparato do estado, suas agências, órgãos e instituições.

Também espaço de conflitos - mas principalmente espaço de coerção – influenciando e

influenciado pela sociedade civil. O estado aqui (na concepção ampliada ou integral)

não é entendido como um corpo estranho à sociedade ou dicotomicamente oposto a ela,

mas reflexo das tensões e condensação das relações existentes nela. É, com outras

palavras, todo o aparato de coerção de uma classe sobre a outra, com todas as

instituições criadas para tanto (polícia, exército, burocracia, a justiça, etc.), mas é

também espaço de forjar o consenso através da cultura e da política, que compõem a

hegemonia ou a direção cultural e ideológica de uma classe sobre outra classe ou sobre

frações delas (COUTINHO, 2007; FONTES, 2006; GRAMSCI, 1984; LIGUORI, 2007;

LAMOSA, 2010).

Dentro da perspectiva que assume o artigo, o uso de Gramsci como referencial

teórico no estudo dos conselhos é adequado não só pela contribuição que este faz para a

discussão sobre “estado” e “sociedade”. Neste sentido, afirma Souza Júnior (2006), os

conselhos fazem parte de uma reforma educacional que tem como pressuposto “uma

reestruturação das relações entre estado e sociedade civil, bem como uma reestruturação

entre os diversos componentes do Estado”. Algebaile afirma:

A proposta dos conselhos tem uma matriz gramsciana, a

fim de construir foros nos quais as diferentes perspectivas

presentes nas relações sociais tenham um espaço instituído para

lutar por seus projetos e disputar os sentidos da ação pública.

(ALGEBAILE, 2004: 13)

3. Os conselhos, o controle social e a relação do público e do privado na

educação.

Visto sob esta tensão entre sociedade civil e sociedade política, os conselhos

teriam em Gramsci um formulador privilegiado. Tendo em vista a vasta elaboração

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 teórica e prática que o italiano tem acerca do que denomina conselhos de fábrica, cujos

objetivos principais seriam elevar a condição do trabalhador em produtor e também

educar o trabalhador nas funções pertinentes ao estado. Estes conselhos, organizados

através da unidade produtiva, do local de trabalho (no caso histórico, a fábrica) seriam a

célula formadora de um novo estado. Eles seriam o correlato “ocidental” de um espaço

surgido antes do processo revolucionário russo de 1917, mas fundamental para este

acontecimento: os sovietes. Há, portanto, na tradição trabalhadora, formulações que

trazem como positiva a experiência dos conselhos, principalmente por estes buscarem

engendrar a ideia de “autogoverno”. (GRAMSCI:1984, BUCI-GLUKSMANN:1980;

LEHER:2004)

Mas as formulações acerca do conselho não estão reduzidas a esta vertente

política. Segundo Leher (2004), nas tradições autoritárias o conselho recebe importante

atenção. Nas experiências históricas dos governos autoritários europeus (Hitler,

Mussolini, Franco, Salazar) e nos regimes populistas da América Latina (Getúlio

Vargas, por exemplo):

A ideia era de que os conselhos seriam formas de articulação dos trabalhadores, dos empresários e do governo em favor da paz perpétua do capital. Implicava construir formas de entendimento e de negociações corporativas, dentro dos próprios conselhos, de modo a impedir que conflitos embates e lutas sociais se aflorassem. Tratava-se de diminuir a autonomia e, principalmente, a crítica dos movimentos sindicais de esquerda, muito intensa na primeira metade do século XX. Os conselhos sociais surgem como uma forma de cooptação e de consenso social (LEHER, 2004:30)

Não só o ideário autoritário como o liberalismo e neoliberalismo se apropriaram

da idéia de conselhos, dando-lhe sentidos e funções sociais distintas. Combinado a ideia

do estado mínimo, do corte de gastos, do ajuste fiscal, esteve a ideia de transferência de

responsabilidades sociais fundamentais à própria sociedade – todas essas premissas,

componentes do conjunto de ideias denominadas (neo)liberais, bastante influentes no

Brasil na década de 90 (época de criação de grande parte destes conselhos). Sob o

epíteto de “responsabilidade social” o estado transfere à sociedade (ONGs, associação

de moradores, partidos políticos, Igrejas etc., mas, sobretudo, à iniciativa privada)

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 deveres que deveriam por ele ser garantido. (GOUVEA E SOUZA; 2006: 138; SOUZA

JÚNIOR; 2006: 178)

No Brasil, os conselhos de controle social e acompanhamento surgem em

decorrência da garantia constitucional da Constituição Federal de 1988 que prevê a

participação da sociedade em conselhos setoriais como meio de garantir o acesso da

sociedade nas decisões da esfera pública. Os conselhos podem combinar ou reunir três

principais atribuições: a formulação política, a execução e a fiscalização. Há certo

acordo de que esta é uma reivindicação e conquista dos movimentos sociais em um

período caracterizado pelos esforços de descentralização, sucedâneo do período

autoritário civil-militar, de 1964-1985. Contudo, mesmo isso não garante por si só um

funcionamento progressista do conselho. Sobre o conselho do FUNDEF/FUNDEB,

Davies (2001,2004,2007) afirma que não são poucas as estratégias de esvaziamento e

enfraquecimento dos conselhos pelas forças conservadoras. Leher, (2004, 32) afirma

que os conselhos nunca ultrapassaram, no Brasil, os limites estreitos do patrimonialismo

e do conservadorismo. Concordando, em parte, com isso, afirma Algebaile

“No entanto, o processo de institucionalização dos

conselhos vem ocorrendo com matizes da maior diversidade.

Coexistem formas democráticas, amplamente participativas,

com formas que preservam e atualizam a estrutura autoritária

tradicional na política social brasileira” (2004, 13).

Leher (op.cit.: 30-2), analisando historicamente os conselhos na educação

brasileira, afirma que para os liberais e neoliberais “os conselhos são instrumentos para

ampliar a privatização do estado (democracia como poder das classes possuidoras),

conforme a lógica do capital”. Estes conselhos sempre serviram para amortecer os

conflitos sociais e tornar a educação assunto, não de toda sociedade, mas de técnicos

especialistas, afastando trabalhadores, cidadãos e muitos professores leigos destes

espaços que passam a ser ocupados “pelos setores empresariais, dentre os quais se

destacam personalidades ligadas à igreja católica e, minoritariamente, por alguns

tecnocratas da educação que trabalhavam na esfera do estado”.

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 Alocados nos principais postos de formulação dos conselhos de educação, estes

representantes de setores sociais interessados na educação detêm não tão somente suas

agências privadas de hegemonia, a fim de defender seus interesses específicos, mas

também, acesso direto a estrutura política e, assim, possibilidade de formular ou mesmo

destinar recursos na execução dos interesses do seu grupo social.

Desta maneira, é necessário analisar a ocupação dos postos de gerenciamento e

fiscalização das políticas públicas pelos diversos setores que o compõem. Cunha

(2009), demonstra de que maneira os variados grupos que atuam na educação se

organizam para ocupar os cargos gestores das políticas públicas e como os setores

ligados a Igreja Católica e ao empresariado da educação constroem sua hegemonia neste

campo. Estes se esforçam para, ora avançar o espaço público na educação (mesmo que

com o fim de criar uma reserva de mercado), ora avançar o espaço privado, ou mesmo o

debate sobre o ensino laico ou religioso, tendo como norte a “sustentação dos lucros” e

a “compensação das perdas” do capital (CUNHA, 2009:323-77). Identificando os

agentes políticos, os grupos as quais estão atrelados, bem como seus interesses, é

possível levantar dados relevantes sobre a tensão entre os interesses públicos e os

interesses privados na educação, em âmbito municipal.

4. Município de Itaboraí e o Conselho do FUNDEB.

O município de Itaboraí é situado na área metropolitana do Rio de Janeiro tendo

uma extensão territorial de 429.3 Km² e uma população estimada de 211.000 habitantes.

Suas principais atividades econômicas são serviços e comércio, transporte, construção

civil, pecuária, apicultura, etc. Panorama econômico este que deve se modificar

radicalmente em breve, tendo em vista que Itaboraí será sede da mais importante obra

da indústria petroquímica no Brasil: o COMPERJ (Complexo Petroquímico do Rio de

Janeiro). Nas eleições municipais de 2008, teve como prefeito eleito o Sr. Sérgio Soares

e como vice o Sr. Rafael Vitorino, dono de uma rede de escolas particulares no

município. Estes substituíram o Sr. Cosme Salles. Por conta da sua mediana população,

sua câmara municipal conta com 13 representantes cuja maioria ampla compõe a base

governista.

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 As marcas principais da política local em Itaboraí são o clientelismo e o

patrimonialismo. Na educação, isso não é diferente. A ausência de concursos públicos

para o provimento dos quadros técnicos administrativos no município gera uma

vacância desses quadros nos colégios, sendo estas vagas muitas vezes utilizadas como

“cabide de emprego” dos vereadores para seus “cabos eleitorais”. Através de uma

OSCIP (Organização da sociedade civil de interesse público) nominada “Instituto

Sorrindo para a Vida” há a ocupação destes cargos, sem deixar de haver inúmeras

denúncias acerca desta relação (uma delas seria a assinatura de contracheque em valor

superior ao realmente creditado ao trabalhador). O uso do espaço público de forma

privada em Itaboraí é uma prática bastante corriqueira, chegando a casos de claro

nepotismo, como o caso da esposa do Sr. Rafael Vitorino (vice - prefeito) que, mesmo

sem concurso público, é diretora de uma das maiores escolas da rede municipal (Escola

Municipal Auto Rodrigues). Não é incomum no município o relato da compra de votos

e, muitas das vezes, as obras públicas são entendidas como favores do vereador ou

representante do poder público local. Essas características da política local far-se-ão

presentes também no referido conselho estudado.

O Conselho do FUNDEB no município foi criado pela lei 2005/07 e,

posteriormente, modificada pelas leis 2034/07 e 2080/08. Seguem todas elas os

princípios da lei federal 11494/07 e do decreto lei 6253/07. Segundo estes documentos

oficiais (um manual de orientação do Fundo, para além das leis supracitadas) (BRASIL;

2008), este conselho teria como características: uma representação social variada e sua

atuação seria de forma autônoma, não subordinada ou com qualquer vínculo à

administração pública estadual ou municipal. Seriam atribuições deste Conselho: a

análise dos demonstrativos e relatórios relacionados ao uso dos recursos do FUNDEB; a

realização de visitas para verificar o andamento das obras e serviços realizados com

recurso do fundo; a regularidade e adequação do transporte escolar e a utilização de

bens adquiridos com recursos do fundo; bem como a aplicação de verbas do PNATE

(Programa Nacional de Transporte Escolar); do Programa de Apoio aos Sistemas de

Ensino para Atendimento da Educação de Jovens e Adultos; do Programa de

Complementação ao Atendimento Educacional Especializado às Pessoas Portadoras de

Deficiência (PAED); é sua atribuição a instrução de pareceres para os Tribunais de

Conta e, cabe-lhe também, a supervisão do censo escolar e da proposta orçamentária

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 anual do respectivo estado ou município, entre outros. Nestes documentos deixa - se

claro as limitações acerca das funções deste conselho, que deveria tão somente fiscalizar

e acompanhar o uso dos recursos, respeitando as atribuições que lhes são imputadas,

bem como as atribuições de outros órgãos de fiscalização e controle públicos, como os

Tribunais de Conta e o Ministério Público. Embora traga no seu nome a expressão

“Controle social”, não é da competência deste conselho a gestão ou o planejamento

destes recursos.

O CONFUDEB- ita, de acordo com a lei municipal 2005/07, seria composto por:

um representante da secretaria municipal de educação e cultura; um representante dos

professores da educação básica pública; um representante dos diretores da educação

básica pública; um representante dos servidores técnicos administrativos da educação

básica pública; dois representantes dos estudantes da educação básica pública; dois

representantes dos pais de alunos da educação básica pública; um representante do

conselho municipal de educação; um representante do conselho tutelar; e dois

representantes do poder legislativo local. Perfaz-se assim um total de 12 conselheiros

onde, formalmente, apenas três teriam relação direta com o poder público local e o

restante seriam representantes de variados setores da sociedade civil. Contudo, este

aspecto é apenas formal. Identificando a ingerência que tem o poder público na escolha

dos diretores e dos funcionários técnicos administrativos (estes que, embora o sindicato

local seja dos trabalhadores da educação, não são por ele indicados) podemos dizer que

estes representantes dificilmente votarão em desacordo com a orientação do poder

público. Ademais, a ausência de entidades representativas de setores tais como os pais

de alunos ou o não reconhecimento do poder público a entidades - como no caso

estudantil (CEAI- Comunidade de Estudantes e Amigos de Itaboraí) - tornam obscuras a

eleição desses representantes e, consequentemente, as suas representatividades.

Esta já problemática relação foi agravada pela lei 2034/07 que aumenta a

participação do poder estatal em mais um representante do executivo. Totalizando 13

membros e aumentando para 4 o número de conselheiros diretamente ligados a

administração pública local. Nicholas Davies (2001;2004;2007) atenta para o caráter

mais estatal do que social do CONFUNDEB e embora, no caso municipal, houvesse

maior chance de haver o dito controle social, nada garante isso na prática.

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 É só no âmbito municipal que podemos dizer que os

conselhos, pelo menos formalmente, poderiam ter caráter mais

social (ou melhor dizendo, não estatal) do que estatal, uma vez

que contariam com no mínimo 9 membros, sendo dois do

executivo municipal ... Teríamos assim, no âmbito municipal

um conselho aparentemente mais de caráter social do que

estatal.

Entretanto, tendo em vista a predominância do

clientelismo e do fisiologismo nas relações entre governantes e

entidades supostamente representativas da sociedade, nada

garante que os representantes de tais entidades não sejam

também escolhidos ou fortemente influenciados pelo prefeito ou

pelo secretário municipal de educação, dando apenas uma

fachada social para um conselho que tenderia a refletir os

interesses dos governantes. (Davies, 2007;48)

Fatores a mais auxiliam para a falta de representatividade social ou o

questionamento de eficácia do CONFUNDEB-ita. Em explícita oposição ao §6 do

art.24 da lei 11.494/07- onde se impede que a presidência do conselho seja ocupada

pelos representantes do poder público - preside as reuniões do CONFUNDEB-ita, um

representante do poder executivo.

As inconstâncias das reuniões também é outro impeditivo para a realização das

tarefas do conselho. Embora o art.8 da lei municipal 2005/07 estabeleça que a

periodicidade das reuniões ordinárias seja mensal (afora as extraordinárias, que podem

ser convocadas a qualquer momento, através de notificação escrita pelo prefeito,

secretário municipal ou presidente do conselho), em Itaboraí, o ano de 2010, contou

apenas com a realização de 9 reuniões do CONFUNDEB ( ITABORAÌ; 2010). Assoma-

se a isto a inexistência de um Regimento Interno a fim de organizar e disciplinar o

trabalho do conselho.

A análise das planilhas de gastos faz surgir outra dimensão de impeditivos para

o exercício do acompanhamento e controle social. Analisando conselhos do FUNDEF

no Paraná, Gouveia e Souza afirmam que “uma dificuldade iminente era de os

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 municípios fornecerem os dados contábeis ao Conselho e da dificuldade dos

conselheiros compreenderem tais dados devido à linguagem técnica da contabilidade

pública” (2006; pág.150). Concordando com isso, Davies (2007) alerta que a falta de

capacitação técnica dos conselheiros - tanto no CONFUNDEF quanto no

CONFUNDEB - é uma marca registrada destes conselhos, inviabilizando a real análise

contábil relativa à aplicação dos fundos. Desta forma, fica fácil fazer prevalecer a visão

dos técnicos dos conselhos (representantes do pode executivo) cuja formação em

contabilidade é melhor e, assim, é possível, como chamou a atenção Gouveia e Souza

(2006), os conselhos passam a ser espaços onde, de praxe, se acobertam desvios ou a

má aplicação destes recursos. A presença de rubricas e siglas desconhecidas do leigo em

contabilidade e a não formação destes conselheiros com fim de bem exercerem suas

funções são também observadas no CONFUNDEB- ita.

Outro problema é a dificuldade de se conseguir determinadas informações

contábeis. No mês de novembro de 2010 foram requeridas, pelo conselheiro

representante dos professores através de ofício protocolado, as planilhas de gastos do

ano corrente, bem como as diversas atas do conselho desde sua instauração. Até o

presente momento (fevereiro de 2011) não houve retorno do poder público, embora a lei

11494/07 afirme ser dever do poder executivo a disponibilização permanente dos dados

relativos ao FUNDEB para os conselheiros.

A ineficácia das reuniões do CONFUNDEB-ita fica patente também por outras

razões. A própria existência de um instituto que terceiriza grande parte da mão de obra

da escola, inclusive parte do magistério e dos diretores de escola, retendo, legal ou

ilegalmente, parcelas das verbas para a educação, num flagrante claro de privatização do

espaço público, é uma clara demonstração de que o conselho não vem cumprindo com

as suas atribuições. Este mesmo provimento de mão de obra terceirizada para as escolas

é utilizado pelos vereadores locais, como já descrito anteriormente, como objeto de

troca de favores, loteando o espaço público em troca de apoio político.

Outro ponto crítico dessa transferência de verbas do âmbito público para o

privado é o curso de formação “continuada” organizado pela SEMEC (Secretaria

Municipal de Educação e Cultura). Embora se utilizando da infraestrutura pública (uma

escola municipal) e tendo como “duração” somente dois dias, a SEMEC alegou ter

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 gasto, em algumas dezenas de palestras em 2009, algo em torno de R$ 400.000

conforme lançamento efetuado em planilha de gastos do FUNDEB (ITABORAÌ; 2009).

Contudo, retomando a hipótese levantada na introdução, que percebe o caráter

contraditório do conselho, cabe analisar não só as limitações, mas também as

potencialidades destes. Mesmo havendo concordância que elas estejam muito aquém

das expectativas do ideário da tradição operária ou mesmo dos ideais republicanos e ou

democráticos. As análises críticas ao CONFUNDEB trazem uma visam estritamente

negativa deste conselho. Parece que, ao olhar destas perspectivas, o CONFUNDEB não

teria outra utilidade senão legitimar o discurso estatal ou mesmo garantir os interesses

privatistas que disputam a educação. Aqui, assume-se sim a perspectiva que, nesta

tensão, as forças conservadoras e arcaizantes têm no conselho mais um espaço de

referendo de suas demandas, mas também se percebe que há certas vitórias e conquistas

dos trabalhadores dados a partir da ocupação concreta destes espaços.

Como é o caso do PCCS (plano de cargos, carreiras e salários) que só foi

elaborado muito em conta da observação dos conselheiros desta obrigação do poder

executivo, conforme dispositivo presente na Emenda Constitucional 53 (BRASIL;

2006; Art.206, inciso V e VIII- parágrafo único).

Concordando com Gouveia e Souza entende-se que o conselho do FUNDEB

representa, destarte, uma possibilidade interessante, qual seja: “estes espaços podem

cumprir um papel de publicização das temáticas e dos conflitos, que é uma importante

dimensão da democracia” (2006; 146). A atuação dos conselheiros pode ser uma fonte

profícua de dados a fim de se potencializar as denúncias de privatização da educação e

de desvios de verbas do FUNDEB para fins outros que não a manutenção e

desenvolvimento do ensino (MDE).

A articulação de setores combativos da sociedade civil também pode se dar em

torno do FUNDEB e de outras temáticas da educação. Como foi o caso descrito por

Gouveia e Souza (2006), no estado do Paraná, com a criação do Fórum Permanente de

Controle e Fiscalização do FUNDEF, como tem sido a aproximação do sindicato dos

profissionais da educação (SEPE-ita) com a entidade estudantil de Itaboraí (CEAI) ou

mesmo como tem sido efetuado no Rio de Janeiro por setores das Universidades,

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 movimentos sociais e organizações dos trabalhadores da educação com o Fórum

Estadual em Defesa da Educação Pública.

Neste aspecto, achamos errôneo atribuir ao estado a responsabilidade de

organizar estes espaços realmente democráticos e plurais de articulação e participação,

como defende Jacobi (2000). Ou mesmo, como afirma Barbosa (2006), que a

participação social nos Conselhos de acompanhamento e controle, ademais as

dificuldades, são, per si, um exercício e um aprendizado de participação social.

Percebendo a relação dialética entre sociedade política e sociedade civil, entende-se que

seja tarefa dos setores interessados da sociedade civil (e não da sociedade política),

através de suas agências e organizações, construir e ampliar o “espírito democrático”, a

participação popular efetiva, ou a radicalização desta democracia. Falando sobre a

importância e limite acompanhamento e controle social dos conselhos, Davies afirma,

É maior quando se considera que os órgãos responsáveis

pela fiscalização (basicamente os Tribunais de Contas) não são

plenamente confiáveis para essa tarefa, o que impõe o desafio do

controle social sobre o uso de verbas das verbas da educação,

algo que os Conselhos do FUNDEF não resolveram, sendo

muito pouco provável que os do FUNDEB sejam bem

sucedidos, a não ser que a sociedade e, em especial, os

profissionais da educação básica se organizem, mobilizem e

adquiram uma formação adequada para este controle social.

(grifo meu). (DAVIES; 2007: 56)

Aproximando-se desta perspectiva, Gouveia e Souza (2006) afirmam que se os

conselhos não cumpriram o seu papel técnico, ao menos serviram para centenas de

pessoas discutirem os seus limites, publicizarem estas denúncias e manterem vivo na

agenda política o debate sobre financiamento da educação.

Por fim, cabe ressaltar um ultimo aspecto positivo percebido na atuação dos

conselheiros no CONFUNDEB, mediante essa articulação entre representantes e

sociedade civil. A possibilidade de se sistematizar estas críticas e limitações e, assim,

propor-se alterações nas leis que instituem os conselhos. Isto já aconteceu na transição

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 entre o FUNDEF e o FUNDEB, onde diversas críticas ao CONFUNDEF foram levadas

em conta quando na elaboração das leis do CONFUNDEB.

5. À guisa de conclusão

Buscando entender os aspectos contraditórios que forjam o CONFUNDEB bem

como aproximando um quadro teórico que permitisse relacioná-lo na relação entre

sociedade política e sociedade civil e, por fim, trazendo esta análise para a realidade

específica de Itaboraí, foi possível perceber claramente os limites que cerceiam a efetiva

atuação e acompanhamento dos recursos do FUNDEB. A forte presença estatal, o

clientelismo, a não representatividade de alguns conselheiros, as contrariedades à lei, a

incapacidade técnica dos conselheiros e as visíveis privatizações de determinados

espaços públicos dentre muitos outros indícios, são claras demonstrações das limitações

deste conselho.

Contudo, diante da experiência local, ainda incipiente, mas em contraste com

outras experiências mais consolidadas, é possível absorver aspectos do conselho na luta

pela valorização do profissional do magistério ou pelo cumprimento do mínimo

vinculado à educação das diversas esferas administrativas. Fornecendo elementos para a

denúncia, potencializando a organização das entidades combativas da sociedade civil,

articulando os setores interessados na formulação e proposição de novos espaços e leis,

e, assim, modificando a “sociedade política”, não é irreal dizer que o CONFUNDEB

pode sim representar uma ferramenta importante na luta por uma educação pública e de

qualidade.

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