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O conceito de limite sob a perspectiva da transposição didática
Resumo Este artigo é um recorte bibliográfico da pesquisa “Coordenação de Registros de Representação e o Processo de Mediação Docente: conceito de limite em cursos de Engenharia”. Para tanto, apoiamo‐nos na Teoria da Transposição Didática, proposta por Chevallard e, em uma abordagem histórica do conceito de limite, que fundamenta os conceitos do Cálculo. Entende‐se o conceito de limite como um saber científico que é transformado, posteriormente, em um saber a ensinar, produzido na, e a partir da intervenção docente. As abordagens, teórica e histórica possibilitam a análise do conceito de limite em um Livro de Cálculo (ANTON, 2000), parte empírica da pesquisa, buscando identificar como esse saber científico é apresentado na introdução do conceito de limite, levando em conta a necessidade, ou não, deste conceito no ensino de Cálculo para cursos de Engenharia. Concluímos que é necessária esta transformação entre os saberes, científico e a ensinar, para que se produza um saber aprendido com significado. Para tanto é preciso que o docente se aproprie do saber científico e do saber a ensinar estabelecendo significado ao aprendizado. A partir desta perspectiva todo conceito a ensinar terá um significado no processo de ensino. Palavras‐chave: Transposição Didática; Ensino Superior; Engenharia; Educação Matemática; Limite.
Raquel Taís Breunig
Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul [email protected]
Cátia Maria Nehring Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
O conceito de limite sob a perspectiva da transposição didática Raquel Taís Breunig ‐ Cátia Maria Nehring
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Introdução
A problemática da aprendizagem e do ensino de Matemática no Ensino Superior
tem instigado pesquisadores a aprofundar seus estudos nesta área. É considerando,
principalmente, investigações já realizadas, a partir de uma revisão de literatura, que nos
remetem a problematizar e entender as dificuldades de aprendizagem, e o motivo destas,
enfrentadas pelos discentes, bem como, metodologias de ensino, que auxiliem o docente
de Matemática a melhorar sua prática docente no Ensino Superior. Algumas destas
pesquisas têm seu foco centrado na aprendizagem de Matemática nos cursos de
Engenharia, no entanto, poucas estão focadas na prática docente.
Além disso, é instigante questionar de que forma ocorre a transição do saber
científico para o saber a ensinar, no processo de ensino dos conceitos matemáticos. Estas
questões contribuem para o desenvolvimento deste artigo que tem como foco o
processo de transição do saber científico ao saber a ensinar, considerando,
especificamente, o conceito de limite.
O presente artigo se desenvolve levando em conta este conceito, pois está
vinculado ao Projeto de Pesquisa “Coordenação de Registros de Representação e o
Processo de Mediação Docente: conceito de limite em cursos de Engenharia”. O projeto de
pesquisa tem como foco identificar quais os Registros de Representação propostos por
um docente e quais as coordenações e tratamentos articulados pelos discentes de um
curso de Engenharia, seus limites e possibilidades à elaboração conceitual, considerando
o ensino na disciplina de Cálculo I. Para a realização da pesquisa, é necessário
compreendermos o processo de mediação do docente de Matemática nas aulas de
Cálculo I, podendo estar relacionado com o processo de transição do saber científico ao
saber a ensinar. Por este motivo, inicialmente neste trabalho, propomos uma discussão e
compreensão da Teoria de Transposição Didática, que trata exatamente da transição do
saber científico ao saber a ensinar, conceituando cada um destes saberes e a perspectiva
histórica do conceito de limite.
O conceito de limite constitui a base do desenvolvimento do Cálculo,
especificamente, da derivada, portanto, o entendimento do processo histórico é
fundamental para compreendermos o ensino. A partir destes dois entendimentos foi
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realizada a análise de um livro de Cálculo, utilizado como referência de docentes da
disciplina de Cálculo I de uma instituição de ensino superior, visando identificar como o
saber científico é apresentado na introdução de limite. Esta análise tem como objetivo
identificar a necessidade, ou não, do conceito de limite no processo de ensino a discentes
de cursos de Engenharia.
A Teoria da Transposição Didática no Processo de Ensinar
A Teoria da Transposição Didática “[...] possibilita analisar a trajetória que se
cumpre desde a produção do saber científico até o momento em que este se transforma
em objeto de ensino, [...], transformando‐se, por fim, em um saber ensinado (MENEZES,
2006, p. 69).”. É a partir desta definição teórica, que sequencialmente será feito o estudo
da Transposição Didática, a fim de compreender a transformação do saber científico a um
saber a ensinar, foco da pesquisa. Para tanto, é fundamental, compreender o que
constitui cada um dos saberes, e as contribuições que a compreensão da teoria promove
ao processo de ensinar Cálculo.
A Transposição Didática surge a partir da interação entre Pedagogia e Didática, as
quais se diferenciam pelo fato da primeira ter como foco as relações em sala de aula
docente/discente, e a segunda ter como foco o objeto de ensino, o saber, ou seja, a
relação saber/discente. Portanto, a Transposição Didática considera a relação constante
entre saber/docente, saber/discente e discente/docente. Estas articulações remetem ao
triângulo didático‐pedagógico, enfatizado por Gauthier e Martineau (2001). Esta relação
se torna necessária, pois o trabalho do docente não se limita apenas a uma ação, mas
diversas ações, pois a prática docente é caracterizada por um “agir tradicional, o agir
afetivo, o agir instrumental, o agir estratégico, o agir normativo, o agir dramático, o agir
expressivo e o agir comunicacional” (TARDIF, 1993 apud GAUTHIER E MARTINEAU, 2001,
p. 64).
Para que o docente ensine os discentes, ele precisa considerar as situações
didáticas e pedagógicas que ocorrem em sala de aula, ou seja, “[...] a cognição e a
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aprendizagem são fenômenos que não pertencem apenas aos atores, mas se remetem
também a diversos contextos particulares. Por isso mesmo, compreender o ensino é,
portanto, compreender também o contexto de ensino” (GAUTHIER e MARTINEAU, 2001,
p.66). O docente precisa considerar, ao pensar sua prática docente, o grupo de discentes,
mas também, levar em conta, cada discente individualmente. O discente também não
pode ser considerado individualmente, pois “[...] o conhecimento não se constrói
somente na cabeça do aluno” (GAUTHIER e MARTINEAU, 2011, p.65). O discente
necessita da mediação do docente, que auxilia na relação saber/discente. São estas
considerações, que permitem entender que o saber também não pode ser considerado
individualmente, pois sem a relação docente e discente, o saber se torna algo
descontextualizado, despersonalizado, e sócio‐culturalmente instituído.
Para de fato entender o processo de produção do saber a ensinar é necessário
entender mais profundamente o conceito de Transposição Didática, que inicialmente
pode ser definida como a transformação de um saber a ensinar em um saber ensinado,
conforme Chevallard (1991 apud LEITE, 2007). Este conceito surgiu a partir da necessidade
de adaptar o conhecimento para posteriormente ensiná‐lo. A teoria da Transposição
Didática vem corrigir um equívoco da reflexão pedagógica em relação aos saberes,
propondo uma nova maneira de pensar a transformação dos saberes.
Na Transposição Didática “[...] o professor tem o papel de garantir a continuidade
do processo, apresentando novos textos do saber e assegurando algum nível de
familiaridade nesses conteúdos” (LEITE, 2007, p.54), ou seja, ele precisa utilizar o saber
científico como base para o saber a ensinar, sem perder o sentido dos conceitos
ensinados, tornando‐o mais acessível ao discente, possibilitando a compreensão destes.
O docente precisa entender esta teoria não somente como um processo de preparar uma
atividade, ou seja, trabalhar na, e dentro da Transposição Didática, mas, que ele também
faz parte deste processo, no momento em que ele realiza a transformação dos saberes a
serem ensinados na escola. Mas o que são esses saberes sob a perspectiva da
Transposição Didática?
Conne (1996) afirma que o saber é algo descontextualizado, despersonalizado e
coletivo, mas que transforma as situações didáticas de ensino. O conhecimento é
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individual, sendo difícil considerá‐lo individualmente, pois este será transformado em um
saber coletivo. A partir disso pode‐se entender que os saberes são estruturados pelo
conhecimento individual de cada sujeito que compõe o coletivo. Neste momento se
destaca o papel do docente, que precisa fazer com que esses conhecimentos se
desenvolvam e assumam a forma dos saberes constituídos.
“O saber é um conhecimento que controla uma situação e as suas transformações,
elas próprias indutoras de conhecimentos. [...], saber é saber colocar‐se em situação de
mobilizar os próprios conhecimentos para agir (CONNE, 1996, p.238).”. Por este motivo o
ensino é uma utilização do saber, pois o processo de ensino parte dos saberes científicos
para o saber a ensinar, e posteriormente, o saber aprendido, no qual se transforma em
um conhecimento individual. Neste processo de transformação/transposição o saber é
modificado, mas ele continua sendo caracterizado como saber, ou seja, um saber
transposto continua sendo um saber.
Nesse processo o docente precisa se sentir parte dele, mas para isso, é necessário
entender o que é a Transposição Didática, ou seja, que no processo de ensino, não se
pode considerar como ator principal o discente, o docente ou o saber e, além disso,
entender o docente como o gestor do currículo. Todos devem ser considerados como
parte do processo de ensino, numa constante interação entre eles. Entender que o saber
científico não pode ser modificado, mas transformado em outro saber (a ensinar,
ensinado e aprendido), sem perder o caráter de saber, ou seja, um conceito pode ser
modificado, (re)contextualizado, mas não pode perder suas características. Para isso é
necessário a mediação do docente e a recontextualização.
A transformação dos saberes aqui proposta, saber científico → saber a ensinar,
constitui a etapa inicial de transformação dos saberes. Conforme Menezes (2006), esta
transformação é realizada com a interferência da Noosfera, constituída pela comunidade
que estabelece o que deve ser ensinado na instituição educativa. Comunidade esta,
constituída por didatas, docentes, pedagogos, entidades sindicais, autores de livros
didáticos, “Enfim, pessoas [...] que vão elaborar programas, diretrizes curriculares, livros
didáticos, etc (MENEZES, 2006, p.75‐76).”. Estes instrumentos – programas, diretrizes,
livros didáticos, vão normatizar o que será ensinado, ou seja, o saber a ensinar. É por este
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motivo que se propõe a compreensão do saber científico, para que, posteriormente, seja
possível, analisar a transformação do saber científico para o saber a ensinar proposto no
livro de Cálculo.
Conceito de Limite sob a Perspectiva Histórica
A partir da análise da ementa da disciplina de cálculo, de monitorias orientadas e
acompanhamento de aulas de cálculo I, podemos afirmar que o conceito de limite
introduz o estudo da derivada no processo de ensino do cálculo I. Este processo ocorre
não pelo acaso, mas sim, porque é a partir do limite que se organiza a definição da
derivada.
O processo de constituição do conceito de limite surge historicamente a partir de
problemas geométricos, considerando a área de regiões planas e a retas tangentes à
curva. Estes problemas dão sentido à Matemática, possibilitando uma evolução das
teorias. Conforme Dieudonné (1990) esta evolução ocorre, não no sentido de substituir
teorias ou de formular novas teorias, mas de reformulá‐las, ou seja, é uma reorganização
dos teoremas/teorias mais antigos. De forma igualitária, o conceito de limite também
passou por diversas reformulações.
Arquimedes (287‐212 a.C.), em suas pesquisas já se deparou com a necessidade de
um novo conceito, que veio a se tornar mais tarde, o conceito de limite, ou seja, as
tangentes de uma curva. Este desafio não foi enfrentado apenas por Arquimedes, mas
também por Fermat, em meados do século XVI. No entanto, o conceito de limite
apareceu com clareza em meados do século XVII, e impôs‐se apenas oitenta anos depois
(DIEUDONNÉ, 1990). Conforme Caraça (1998), nesta mesma época, Kepler também
enfrentou dificuldades, e a necessidade de um novo conceito, pois ao estudar as órbitas
planetárias se deparou com a condição de que os planetas não se moviam naturalmente,
tendo como preocupação/problema, o movimento. Surge então a necessidade de
encontrar leis que permitam prever resultados de experiências, de observações. A busca
por uma explicação matemática que permita e “[...] dê conta da infinidade de estados
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possíveis entre dois estados quaisquer; de natureza a permitir‐nos trabalhar, não só com
estados determinados, mas com a infinidade das possibilidades entre dois estados
(CARAÇA, 1998, p. 206).” Neste momento não havia a necessidade de uma representação
numérica, mas sim de uma representação algébrica que possibilitava a representação de
qualquer número de um conjunto numérico, ou seja, uma variável.
A partir deste entendimento é possível iniciarmos o entendimento do conceito de
limite, relacionado estreitamente a ideia de variável. O importante ao se considerar a
variável é o fato de um conjunto possuir finito ou infinito de valores. Se a variável for
considerada um conjunto de apenas um elemento, ela passa a ser uma constante, e isso
não satisfaz as necessidades do problema (COSTA, 1981). Além disso, a variável precisa
representar, especificamente, uma infinidade de valores muito pequenos, e que
pertençam à vizinhança de um ponto específico. Percebe‐se que neste momento a
variável está extremamente ligada à noção de infinito, e é a partir deste entendimento,
que surge o conceito de infinitésimo, nome atribuído
[...] a toda variável representativa de um conjunto de pontos pertencentes à vizinhança da origem quando nessa variável considerarmos sucessivamente valores , , … , , …tais que | | para todos os valores de e todo o 0 (CARAÇA, 1998, p. 207).
Esta definição permitiu a determinação de várias outras definições de infinitésimo.
Estas diversas definições sofreram modificações para então, chegar a definição formal de
limite, que é baseada diretamente no conceito de infinitésimo. Conforme Caraça a
definição inicial de limite ficou assim estabelecida: “dizemos que tem por limite L se
é vizinho de L quando n é vizinho de infinito.” (1998, p. 217), ou seja, L é o resultado da
interdependência dos termos da sucessão . Esta é a primeira definição de limite, a qual
deu origem a outras definições que contribuíram para a evolução do conceito,
considerando as diferentes concepções do limite, mantendo sempre sua característica
inicial, ou seja, o infinito como um elemento ativo de construção.
Todo este processo não ocorreu de forma simples, ou seja, para se determinar a
definição de limite, existiu um longo período de dúvidas, reorganizações, convergências,
retomadas, tais como, as indeterminações, expressões que não têm sentido, como, por
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exemplo, . “Mas o acostumar progressivo a este gênero de raciocínios e a sua
fecundidade incontestável levam, por volta do fim do século, a codificá‐los introduzindo
notações gerais e algoritmos que permitem manejá‐los (limites) comodamente
(DIEUDONNÉ, 1990, p. 76).”. Tem‐se então a atual definição geral de limite,
Seja I um intervalo aberto ao qual pertence o número real a. Seja f uma função definida para ∈ . Dizemos que o limite de f(x), quando x tende a a, é L e escrevemos lim
→, se para todo 0, existir
0 tal que se 0 | | então | | (IEZZI, 2005, p. 23).
O limite permite resolver problemas antigos, apresentado em pesquisas de
grandes matemáticos, podendo‐se destacar Newton e Leibniz, no século XVII, que
utilizaram a definição de limite para determinar a velocidade e aceleração de móvel, ou
seja, a taxa de variação, e ainda, as tangentes às curvas. Vale destacar que a taxa de
variação é a derivada.
Conforme Dieudonné (1990) o limite da expressão define
uma nova função , ou (definido por Leibniz), mais tarde escrito como ′ o
limite de , que determina a derivada num ponto x da função
. Temos então a seguinte definição: “Seja f uma função definida em um intervalo
aberto I e um elemento de I. Chama‐se derivada de f no ponto o limite lim→
(IEZZI, 2005, p. 127).”. Ao calcularmos a derivada de uma função no ponto ,
determinamos o coeficiente angular da reta tangente à curva no ponto. Problema inicial,
para o qual foi elaborado o conceito de limite. É a partir da definição de derivada de uma
função, num ponto genérico ∈ , que foram calculadas as derivadas das funções
elementares, ou seja, a partir deste processo é que foram definidos os teoremas/regras
de derivação, que facilitam o desenvolvimento da derivada de uma função, ou seja, não
sendo necessário recorrer à definição. Leibniz foi responsável e rigoroso com a
simbologia das diferenciais e estabeleceu regras de derivação. Para Leibniz, diferencial
“[...] era uma diferença entre dois valores infinitamente próximos de uma variável (IEZZI,
2005, p. 143).” Ainda no século XIX, os matemáticos Cauchy e Weierstrass foram
responsáveis pela estruturação lógica do cálculo.
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A partir deste histórico do conceito de Limite, pode‐se perceber que este é
resultado de uma longa evolução teórica de conceitos matemáticos. Essa
evolução/desenvolvimento da Matemática ocorre graças aos problemas colocados aos
matemáticos, ou seja, “[...], esta fonte indispensável nunca se esgotou desde que a teoria
existe, quer se trate de problemas colocados pelas aplicações das matemáticas ou de
uma evolução <<interna>> [...] (DIEUDONNÉ, 1990, p.176)”.
Transformação do Saber Científico para Saber a Ensinar – análise de um livro de Cálculo
Conforme Leite (2007), na Transposição Didática, o docente precisa garantir a
continuidade do processo de transformação dos saberes, principalmente no que tange ao
movimento do saber científico ao saber a ensinar, pois é a partir deste processo que se
constituem os saberes ensinados e aprendidos. Portanto, é importante haver uma
coerência, uma familiaridade entre o conceito apresentado cientificamente e
didaticamente. Diante disso, propõe‐se a partir de agora, uma relação entre a discussão
histórica do conceito de limite (saber científico) e uma proposta deste conceito em um
Livro Didático (saber a ensinar), considerando o estudo e o entendimento da
Transposição Didática. Busca‐se identificar de que forma ocorre a transformação do saber
científico, que é a referência para este processo, para o saber a ensinar, estando estes
interligados, qual é a aproximação existente entre a história e o ensino. Ou seja, partir
desta discussão, tem‐se o intuito de identificar/perceber quais as contribuições da
Transposição Didática para o ensino de limite em uma disciplina de Cálculo I, a partir da
análise do livro de Cálculo (ANTON, 2000), utilizado como referência básica por docentes
de Cálculo I de uma instituição de ensino superior. A análise teve como foco a
identificação da forma que o saber a ensinar é apresentado nos conteúdos relacionados
ao conceito de limite no livro, ou seja, qual é a relação ou distanciamento com o saber
científico.
O Livro Didático de Anton (2000) possui um capítulo exclusivo ao estudo do
conceito de limite, intitulado “Limites e Continuidade”, no qual, de início enfatiza que
“[...] o conceito de limite é o alicerce sobre o qual todos os outros conceitos do cálculo estão
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baseados (ANTON, 2000, p. 112)”. A partir desta posição, situa que o cálculo está baseado
nas ideias da reta tangente, área e velocidade instantânea, indicando intuitivamente a
necessidade de limite para resolver os problemas relacionados a estas ideias. O autor faz
relação à construção histórica do limite, considerando sua constituição a partir de
situações problemas, levando em conta o cálculo de áreas planas e retas tangentes à
curva.
Considerando o estudo da reta tangente, ou secante a uma curva em um
determinado ponto, movendo‐a para que exista um único ponto comum entre a reta e a
curva, a reta acaba por se localizar em uma posição limite, desencadeando o conceito de
limite. O estudo da área de diferentes curvas sugere o termo aproximação, para tanto,
pode‐se considerar a construção de vários retângulos sobre a curva, e somar a área
destes, definindo, portanto, a área da curva. Repetindo o processo de aproximação com
maior quantidade de retângulos, infinitamente menores, preenchendo todos os espaços
vazios na curva, a aproximação ficará mais próxima do valor exato da área da curva,
portanto, “Isto sugere que podemos definir a área sob a curva como sendo o valor limite
destas aproximações.” (ANTON, 2000, p. 113). Relacionando as velocidades instantâneas
ao conceito de limite, o autor destaca a fórmula que possibilita determinar a velocidade
média de uma partícula. No entanto o que interessa nesta situação é a velocidade em um
tempo específico. Para tanto, sugere que, em um curto período de tempo, existe uma
velocidade sem muita variação, portanto, quanto mais próximo estiver o tempo final do
inicial, melhor será a aproximação. A partir disto, define‐se uma reta tangente que irá
tender à uma inclinação da reta tangente à curva, em um ponto no qual o tempo final e
inicial são muito próximos, definindo a velocidade instantânea de uma partícula em um
tempo determinado. Podemos verificar nestas situações a relação do autor com o
contexto histórico de limite, considerando os termos aproximação e infinitésimo, termos
que caracterizam a definição formal do limite. Estes termos matemáticos são evidentes,
por exemplo, quando o autor realiza a seguinte discussão acerca da velocidade
instantânea, considerando que
[...] quanto mais perto fica t1 de t0, melhor será a aproximação. Entretanto, à medida que t1 fica cada vez mais próximo de t0, a inclinação da reta secante [...] irá tender à inclinação da reta tangente à curva no
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instante t = t0; isto sugere que podemos definir a velocidade instantânea da partícula no instante t = t0 como sendo a inclinação da reta tangente à curva, posição versus tempo, naquele ponto. Deste modo, assim que soubermos como calcular as inclinações das retas tangentes, teremos um método para calcular as velocidades instantâneas (ANTON, 2000, p. 114).
A partir destas situações e discussões, considerando a explicitação de situações
problemas, o autor se concentra apenas no estudo do conceito de limite e situa que “O
uso básico do limite é descrever como uma função se comporta quando a variável
independente tende a um dado valor.” (ANTON, 2000, p. 114). A partir disto, propõe o
estudo de uma função do segundo grau a partir da análise do registro gráfico,
considerando valores próximos de um determinado x. Neste enfatiza várias vezes a
palavra proximidade, para então, definir que o “‘limite de ² 1 é 3 quando x tende a
2 por qualquer um dos lados’, e escrevemos lim→
1 3” (Idem, ibidem). Esta
discussão possibilita uma ideia informal de limite, considerando valores muito próximos a
constante a, mas não iguais a ela, definindo então o registro algébrico (lim→
) e da
língua materna (o limite de f(x) quando x tende a a é L).
São propostos então, vários exemplos, considerando esta mesma sequência, no
entanto, substituindo a análise gráfica da função, por uma análise numérica,
considerando a construção de uma tabela, na qual são definidos valores diferenciados
para x, mas muito próximos de a. Para facilitar a análise do Limite, o autor propõe o
tratamento algébrico da função, e a seguir, a análise gráfica para verificar se o limite está
correto, justificando que, a partir do tratamento algébrico, mas principalmente o
numérico, pode conduzir a conclusões incorretas, devido a erros de arredondamento.
Essas discussões remetem à análise do limite de uma função, considerando os
limites laterais. Inicialmente o autor formaliza o que são os limites laterais e sua relação
com os limites bilaterais. Chamamos a atenção, de que o autor, até o momento não
formalizou o conceito, enfatizando sempre uma ideia geral de um ponto de vista informal
e considerando alguma situação. A partir dos limites laterais, ocorre o primeiro contato
com a continuidade de uma função, no qual o autor destaca as condições de
continuidade. Após esta breve ênfase, é feito o estudo de limites infinitos e sua relação
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com as assíntotas verticais e horizontais das funções, bem como a existência ou não do
limite infinito. Neste momento são propostas duas definições relacionadas às assíntotas.
Definição de assíntota vertical
Fonte: ANTON, 2000, p. 122.
Definição de assíntota horizontal
Fonte: ANTON, 2000, p. 123.
A partir das ideias iniciais desenvolvidas até o momento, o autor propõe técnicas
para calcular o limite de uma função, utilizando o tratamento algébrico para encontrar
limites. É proposto um “bloco de construção”, no qual, a partir de teoremas, são
estabelecidos os limites de funções básicas, tais como, funções definidas por uma
constante ( ), função linear ( ) e racional ( 1⁄ ). Este
procedimento possibilita o entendimento e determinação de limites de funções mais
complicadas, as quais são exemplificadas e solucionadas em seguida, considerando o
limite de funções polinomiais, exponenciais, racionais e envolvendo radicais, com a
variável independente tendendo a uma constante a ou a ∞ ou ∞.
Sabe‐se que até o momento houve, em grande parte, o estudo do saber a ensinar,
no qual o autor desencadeia situações para, em um novo item, então propor uma
discussão mais específica de limites, discutindo, portanto, a definição de limite e a
importância de compreender o seu conceito, ou seja, relaciona‐se o saber a ensinar ao
saber científico. O autor destaca que
Até aqui, a nossa discussão de limites tem sido baseada na nossa intuição do significado dos valores de uma função ficarem cada vez mais próximos do valor limitante. Entretanto, este nível de informalidade não
2.1.5 DEFINIÇÃO. Uma reta é chamada de assíntota vertical do gráfico de uma função f se f(x) tem a ∞ ou ∞, quando x tende a a pela esquerda ou direita.
2.1.7 DEFINIÇÃO. Uma reta é chamada de assíntota horizontal do gráfico de uma função f se → , quando → ∞ ou → ∞.
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nos leva adiante. Assim, nossa meta nesta seção é definir limites precisamente. Do ponto de vista puramente matemático, estas definições são necessárias para estabelecer limites com toda certeza e provar teoremas sobre eles. Contudo, elas também nos fornecem um aprofundamento no entendimento do conceito de limite, tornando possível visualizar algumas das mais sutis propriedades das funções (ANTON, 2000, p. 138).
É a partir desta discussão que Anton (2000) busca sistematizar o conceito de
limite, para tanto, relaciona as linguagens e definições informais a uma linguagem
matemática, ou seja, busca atribuir significado matemático mais preciso às pré‐definições
estabelecidas anteriormente. Para formalizar o conceito, é feito um diálogo,
considerando a análise gráfica e algébrica, de uma função f qualquer, em um ponto no
qual → . Retoma‐se a necessidade de utilizar aproximações para x cada vez mais
próximas de a, este processo possibilita que f(x) aproxime‐se cada vez mais do limite. A
partir disso é proposta uma primeira definição considerando o limite bilateral.
Primeira definição de Limite (Bilateral)
Fonte: ANTON, 2000, p. 139.
No entanto, esta definição não é conveniente, ao se considerar os valores
aproximados definidos à direita e à esquerda de a, levando em conta a possibilidade de
que os valores podem estar distantes de a com intervalos diferentes. Para que este
intervalo seja equivalente em ambos os lados de a, é considerado um número positivo
2.3.1 LIMITE (PRIMEIRA DEFINIÇÃO PRELIMINAR). Seja f(x) uma função definida em todo x de algum intervalo aberto que contenha o número a, com a possível exceção de que f(x) não precisa estar definida em a. Escreveremos
lim→
se dado qualquer número 0, pudermos encontrar um intervalo aberto 0, 1 que contenha o ponto a de modo que f(x) satisfaz
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qualquer , o qual possibilita considerar o intervalo , , sugerindo a
reformulação da primeira definição para uma segunda.
Primeira definição de Limite (Bilateral)
Fonte: ANTON, 2000, p. 140.
Alterando as condições da definição anterior, para
| | e, que x está situado no intervalo , , mas , para 0
| | , tem‐se a versão final da definição de limite.
Primeira definição de Limite (Bilateral)
Fonte: ANTON, 2000, p. 140.
De acordo com o autor, esta definição possibilita desencadear as demais
definições complementares de limite, considerando os limites laterais, valores diferentes
2.3.3 DEFINIÇÃO DE LIMITE (VERSÃO FINAL). Seja f(x) definida em todo x que está em algum intervalo aberto que contenha o número a, com a possível exceção que f(x) não precisa estar definida em . Escreveremos
lim→
2.3.2 LIMITE (SEGUNDA DEFINIÇÃO PRELIMINAR). Seja f(x) definida em todo x em algum intervalo aberto contendo o número a, com a possível exceção de que f(x) não precisa estar definida em . Escreveremos
lim→
se dado qualquer número 0, pudermos achar um número 0, tal que f(x) satisfaz
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para , se → ∞ ou → ∞ e, para limites infinitos. Este estudo proposto por Anton
(2000) possui em sua sequência a proposta de provar as definições de forma numérica e
gráfica. A partir deste processo, nas demais seções, é discutida a aplicação de limites,
considerando o estudo de continuidade de uma função, bem como, o uso de ambos na
resolução de situações problemas, enfatizando a contextualização do conceito.
A partir do desencadear dessa discussão, considerando a análise do livro de
cálculo, especificamente a formalização e definição do conceito de limite e a constituição
do saber científico, fica perceptível a preocupação do autor em manter fidelidade ao
saber científico. Este procedimento vai possibilitando a construção do conceito a partir
de investigações sem perder a essência/foco do conceito. Além disso, o autor busca
trabalhar com ideias intuitivas, relacionando ao contexto histórico do conceito, porém
somente na introdução ao estudo de limite. Da mesma forma que a organização do saber
científico, a importância da variável, considerando um conjunto finito ou infinito de
números, é enfatizada na proposta do saber a ensinar. As discussões do autor,
considerando os termos aproximação e tendência a valores infinitos, bem como os
limites laterais, levando em conta a definição das assíntotas horizontal e vertical,
explicitadas anteriormente, possibilitam a relação com o saber científico, no qual a
variável precisa representar, especificamente, uma infinidade de valores muito pequenos,
pertencentes ou muito próximos de um ponto específico. Porém neste momento
percebe‐se um distanciamento entre o saber a ensinar e o saber científico, pois diferente
do contexto histórico, e constituição do conceito pelos matemáticos, o autor não se
remete ao estudo dos infinitésimos, que, conforme Caraça (1998) está intimamente
ligado à noção de infinito e fundamenta o estudo e constituição do conceito de limite.
As definições de limite apresentadas por Anton (2000) demonstram que a
constituição do conceito, perpassou uma reestruturação e organização do pensamento
matemático, até estabelecer a definição atual do conceito. Comparando a definição atual
do conceito, proposta pelo autor do Livro de Cálculo e a definição do saber científico,
Seja I um intervalo aberto ao qual pertence o número real a. Seja f uma função definida para ∈ . Dizemos que o limite de f(x), quando x tende a a, é L e escrevemos lim
→, se para todo 0, existir
0 tal que se 0 | | então | | (IEZZI, 2005, p. 23).
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Fica evidente que a definição de limite no saber a ensinar foi (re)construída em
uma linguagem distante do saber científico, mas não desconsiderou as principais
características do conceito. Aqui fica claro o que é a Transposição Didática, e como ocorre
o processo de saber científico → saber a ensinar. Este processo se caracteriza pela
transformação e organização de novos textos que contextualizam a compreensão por
parte do discente para a constituição do saber aprendido, no entanto, é de extrema
importância, que nesse processo de transformação dos saberes, os conceitos não percam
o sentido, pois desta forma o conceito pode perder seu significado no processo de
aprendizagem. Aqui, fica evidente a importância da vigilância epistemológica, do autor do
livro didático/docente, tenha de fato, o conhecimento científico, para então mediar o
saber científico a saber ensinado e aprendido. Conforme Conne (1996), o docente, antes
de ensinar um conceito, precisa realizar a transposição do saber científico ao saber a
ensinar e refletir sobre o saber que o discente vai aprender.
Considerações Parciais
Esta produção teve por objetivo, discutir acerca da transformação do saber
científico ao saber a ensinar, a partir da análise de um livro de Cálculo, considerando o
desenvolvimento conceitual de limite. Para esta análise inicialmente foi feito o estudo da
Teoria da Transposição Didática, que define o percurso do saber até se tornar saber
aprendido, partindo do saber científico ao saber aprendido. Para tanto, foi proposto o
estudo histórico do conceito de limite, considerando sua constituição como saber
científico, para então, analisar o livro didático de Anton (2000), constituído pelo saber a
ensinar, que parte de uma nova escrita do saber científico, para então, se transformar no
saber ensinado e aprendido. Conforme Conne (1996, p.265) “[...] a transposição didática é
o processo que faz com que os objectos do saber matemático erudito se transformem
em saberes a ensinar, inscritos no projecto de ensino, e depois em saberes de ensino.”
A Transposição Didática mostra‐se coerente a esta análise e discussão, pois é
importante no processo de ensino, que o docente se aproprie do conhecimento
científico, suas particularidades e características, para que o ensino e aprendizagem dos
conceitos matemáticos sejam significativos. Conforme Chevallard (LEITE, 2007), é
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necessário estabelecer relações entre os diferentes saberes para que o discente aprenda
e dê significado ao conceito matemático. Portanto, o docente é parte deste processo,
pois é ele que, produz o saber a ensinar, uma nova escrita, a partir do saber científico,
possibilitando a compreensão por quem ainda não sabe. Ou seja, o docente é o mediador
entre o saber científico e o discente. Sabendo da importância do saber científico na
constituição do saber aprendido, e que suas características precisam permanecer apesar
das transformações que sofre ao longo do processo de Transposição Didática, foi feita a
análise do Livro Didático de Cálculo, buscando identificar se as características do saber
científico estão presentes no saber a ensinar, considerando o conceito de limite.
A partir da análise do Livro Didático de Anton (2000), são perceptíveis as
características científicas considerando uma linguagem mais simples e de fácil
compreensão. Além disto, Anton (2000) enfatiza a importância do estudo de limite,
contextualizando o conceito a partir de situações iniciais que evidenciaram a necessidade
de um novo conceito, que são o estudo da reta tangente, a área de uma curva e a
velocidade instantânea. Esta percepção nos remete à Conne (1996, p.231), o qual afirma
que “Por um lado, a situação é indutora de conhecimento; por outro lado, o
conhecimento permite agir sobre a situação.”
No entanto, apesar de haver grande concordância entre o saber a ensinar e o
saber científico, aqui discutidos, é necessário concordar com Cabral e Baldino (2006), ao
afirmarem que na matemática, voltada a um modelo expositivo, perdeu‐se a legitimidade
dos infinitésimos no ensino de matemática, principalmente, em cursos de Engenharia. De
fato, Anton (2000), também não significa o conceito de limite a partir dos infinitésimos,
que foram os norteadores para a constituição do saber científico. Além disto, conforme
Cabral e Baldino (2006, p. 8) “[...] as concepções espontâneas dos alunos, [...] já são
naturalmente infinitesimais [...].”, o que garantiria uma aprendizagem mais significativa
do conceito de limite.
Outro aspecto significativo de Anton (2000) em sua obra é a proposta de situações
e problematizações possibilitando a “utilização” do conceito de limite. A partir destas
situações é possível identificar se de fato o processo de Transposição Didática teve
continuidade, considerando o saber ensinado e aprendido.
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Quando o sujeito reconhece o papel activo de um conhecimento sobre a situação, para ele, o laço indutor da situação sobre esse conhecimento torna‐se invertível, ele sabe. Um conhecimento assim identificado é um saber, é um conhecimento útil, utilizável, porque permite ao sujeito agir sobre a representação (CONNE, 1996, p. 231).
Portanto, a análise do Livro Didático de Cálculo (Anton, 2000), possibilitou
perceber a importância do conhecimento científico por parte do docente. São as
características do saber científico nos demais saberes, que dão sentindo e significado à
aprendizagem conceitual do discente, não somente do conceito de limite, mas dos
demais conceitos matemáticos. Entende‐se a importância de refletir acerca dos
diferentes saberes produzidos, das suas transformações, e principalmente, como ocorre
a transposição do saber científico até o saber aprendido pelo discente. Cada um dos
saberes é importante no processo de ensino e aprendizagem dos conceitos de Cálculo,
por este fato, é interessante que o docente seja parte do processo de Transposição
Didática. Além disto, é necessário pensar práticas de ensino coerentes com o saber
científico, e que possibilitem a significação e o saber do conceito de limite, pois é
perceptível a dificuldade por parte dos discentes em compreender este conceito. Diante
disto, é possível questionar, como de fato, ocorre a prática do docente diante destas
situações, e quais suas intervenções para que ocorra a significação conceitual.
Referências
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ANTON, Howard. Cálculo: um novo horizonte. Tradução: Cyro de Carvalho Patarra; Márcia Tamanaha. 6 edição. Porto Alegre: Bookman, 2000.
CABRAL, T. C. B.; BALDINO, R. R. Cálculo Infinitesimal para um Curso de Engenharia. Revista de Ensino de Engenharia, Passo Fundo, v. 25, n. 1, jan./jun. 2006. Disponível em: < http://www.upf.br/seer/index.php/ree/article/view/216>. Acesso em: 12 ago.2012.
CARAÇA, Bento de Jesus. Conceitos Fundamentais da Matemática. Lisboa: Gradiva, 1998.
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DIEUDONNÉ, Jean. A Formação da Matemática Contemporânea. Tradução: J.H. von Hafe Perez. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1990.
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GAUTHIER, Clermont; MARTINEAU, Stéphane. Triângulo Didático‐Pedagógico: o triângulo que pode ser visto como um quadrado. Educação nas Ciências, Ijuí: UNIJUÍ, 2001, v. 1, n.1, p. 45‐77, jan/jun. 2001.
IEZZI, Gelson et al. Fundamentos de Matemática Elementar: limites, derivadas, noções de integral, 6 edição. São Paulo: Atual, 2005, volume 8.
LEITE, Miriam Soares. Recontextualização e Transposição Didática: introdução à leitura de Brasil Bernstein e Yves Chevallard. Araraquara, SP: Junqueira & Marin, p. 43‐67, 2007.