o casamento de d. manuel ii

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O casamento de D.Manuel II, por Vasco Callixto =A RTIGO PUBLICADO NO JORNAL C ORREIO DA M ANHÃ A 28.3.1995=

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Documento criado a partir de um artigo da autoria de Vasco Callixto, publicado no jornal "Correio da Manhã" a 28 de Março de 1995.

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Page 1: O casamento de D. Manuel II

O casamento de D.Manuel II, por Vasco Callixto

= AR T I G O P U B L I C A D O N O J O R N A L C O R R E I O D A MA N H Ã A 28 .3.1995=

Page 2: O casamento de D. Manuel II

A propósito do próximo casamento de D. Duarte, será oportuno recordar o casamento de D.Manuel II, o último Bragança reinante que, todavia, já casou afastado do trono e longe da Pátria. Mais feliz é, afinal, D.Duarte, pois, embora também tenha o trono à distância, vive no seu Pais e no seu Pais vai casar. Será, porém, o primeiro elemento do ramo miguelista da familia Bragança a contrair matrimónio em Portugal.

Visitei há anos Sigmaringen, na Alemanha, onde em 1913 casou o rei D.Manuel II. Situa-se esta pequena e bonita cidade no sudoeste do país , nas margens do Danúbio e relativamente próximo do lago Constança. Sobre um rochedo, à beira das águas do rio , ergue-se o velho castelo dos Hohenzollern , uma opulenta casa senhorial com o aspecto de fortificação armada. Aí se realizou o acto civil do casamento do ex-rei de Portugal com a princesa da casa imperial da Alemanha , D.Augusta Vitória de Hohenzollern-Sigmaringen.

Presença de Portugal em Sigmaringen

Ao visitar este belo castelo, não encontrei nenhum testemunho da cerimónia ali realizada em 1913. Mas a presença de Portugal é notória nesta residência imperial, uma vez que a Casa de Bragança já anteriormente estava ligada aos senhores de Sigmaringen por estreitos laços familiares. Uma das primeiras salas que se oferece aos visitantes é precisamente a “Sala Portuguesa”, ricamente ornamentada com valiosos tapetes. No “Salão Azul” pude admirar um quadro da rainha D. Estefânia, estando a esposa de D. Pedro V também presente no “Salão Verde”, em magnífico e excelente retrato, ao lado de sua cunhada, a infanta portuguesa D. Antónia Maria, filha de D. Maria II, que em 1861 casou com o príncipe Leopoldo de Hohenzollern. Noiva do último rei de Portugal, era neta da citada infanta D. Antónia Maria, pelo que os conjugues ainda eram parentes.

Durante o curto reinado de D.Manuel II houve, porém, uma outra princesa, inglesa, que a imprensa da época apontou como “Futura Rainha de Portugal”. E, curiosamente, também se chamava Vitória. Era a princesa Vitória Patrícia, sobrinha do rei Jorge V de Inglaterra, filha dos Duques de Connaught. Mais velha três anos que D. Manuel II, esta princesa estivera em Lisboa em 1905, com seus pais e irmã, tendo sido publicadas diversas fotografias da visita dos príncipes ingleses, nomeadamente um numeroso grupo familiar, reunido em Sintra. No entanto, nessa ocasião, após a visita dos Duques de Connaught a Portugal e a Espanha, também foi notícia um próximo casamento da princesa Vitória Patrícia com o rei Afonso XIII de Espanha, enlace igualmente não concretizado.

Page 3: O casamento de D. Manuel II

Casamento celebrado pelo Cardeal Neto

O casamento de D.Manuel II em Sigmaringen, no dia 4 de Setembro de 1913, foi celebrado pelo Cardeal Neto, antigo patriarca de Lisboa, que já baptizara o noivo e seu irmão mais velho, o infeliz príncipe D. Luís Filipe, assassinado no Terreiro do Paço. D.José Neto celebrou o acto revestido de uma casula bordada com as armas dos Hohenzollern e de Portugal.

A noiva, “cuja beleza deslumbrava “, segundo foi referido, apresentou-se com o mesmo véu que sua avó, D. Antónia Maria, utilizara nas suas núpcias. A rainha D. Amélia, mãe do noivo, ia pelo braço do pai da noiva, o príncipe Guilherme de Hohenzollern. Estava também presente o Infante D. Afonso Duque do porto, um príncipe que tão popular fora em Portugal, até ser obrigado a deixar o seu país. E compareceram os mais representativos elementos da aristocracia portuguesa, desde Sabugosa a Tarouca e de Palmela a Lavradio e a Asseca, formando o séquito do jovem rei exilado. No cortejo ocuparam os fidalgos portugueses os seus antigos cargos na Corte. Como damas de honor, figuraram a Duquesa de Palmela, D. Isabel Saldanha da Gama, a Marquesa do Lavradio e a Viscondessa de Asseca.

Presentes em Sigmaringen estiveram também os representantes de quase todas as casas reais da Europa. O então príncipe de Gales, que viria mais tarde a ser o rei Eduardo VIII de Inglaterra e, posteriormente, Duque de Windsor, foi o padrinho da noiva. Na “Sala Portuguesa” do castelo dos Hohenzollern foi servido um almoço a mais de cem convidados e em Sigmaringen foram recebidos cinco mil telegramas de portugueses. Recorde-se que D.Manuel II fora deposto ainda não havia três anos.

Os noivos partiram para Ulm e fixaram residência em Inglaterra, onde o ex-rei de Portugal já vivia, desde que partira para o exilio. E em Inglaterra faleceu D.Manuel II em 1932, com apenas 42 anos de idade, sem descendentes. O seu corpo foi transportado para Lisboa a bordo do cruzador britânico “Concord”, realizando-se o funeral, com todas as honras, para o Panteão de S.Vicente, onde repousam os Braganças. O regime republicano prestava homenagem ao último representante do regime monárquico. Havia poucos meses que Salazar fora chamado a orientar os destinos do País, como Presidente do Conselho de Ministros.

Page 4: O casamento de D. Manuel II

Após o falecimento de D. Manuel II, a sua viúva deixou a Inglaterra e voltou para o castelo dos Hohenzollern, em Sigmaringen. Mas volvidos apenas sete anos, D.Augusta Vitória casou pela segunda vez, em 1939, com o conde sueco Robert Douglas. Não procedeu como sua sogra, a rainha D. Amélia, que sempre se manteve viúva do rei de Portugal, durante mais de quarenta anos. Falecido o conde Robert Douglas em 1955,continuou D. Augusta Vitória a residir no castelo de Langestein, no antigo grão-ducado de Baden, que pertencera ao seu segundo marido. A princesa alemã que fora esposa de um rei de Portugal exilado, faleceu em 1966, com 76 anos de idade. E nunca terá vindo ao nosso país.

F O T O G R A F I A : D. Manuel II e D. Augusta Vitória

(FONTE: CORREIO DA MANHÃ, 28.3.1995)

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