o capital posfacio a segunda edição

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Transcrição autorizada MIA > Biblioteca > Marx/Engels > Novidades <<< Índice O Capital Crítica da Economia Política Karl Marx Posfácio à segunda edição Antes do mais, tenho de dar conta aos leitores da primeira edição das alterações feitas na segunda edição. Salta aos olhos a divisão mais clara do livro. As notas adicionais estão por toda a parte assinaladas como notas à segunda edição. No que se refere ao próprio texto o mais importante é: No capítulo I, 1, a dedução do valor através da análise das equações em que todo o valor de troca se expressa está conduzida de um modo cientificamente mais rigoroso, do mesmo modo que a conexão entre a substância de valor e a determinação da magnitude de valor pelo tempo de trabalho socialmente necessário, apenas aludida na primeira edição, está [agora] expressamente acentuada. O capítulo I, 3 (A forma-valor) foi completamente refundido, o que a dupla exposição da primeira edição já impunha. — Observo, de passagem, que aquela dupla exposição foi ocasionada pelo meu amigo Dr. L. Kugelmann, de Hannover. Encontrava-me em casa dele de visita na Primavera de 1867 quando as primeiras provas chegaram de Hamburgo e ele persuadiu-me de que, para a maioria dos leitores, seria necessária uma explicação adicional da forma-valor, mais didáctica. — A última secção do primeiro capítulo, «O carácter de feitiço da mercadoria, etc», foi em grande parte alterada. O capítulo III, 1 (Medida dos valores) foi cuidadosamente revisto porque esta secção, na primeira edição — com a remissão para a explicação já dada em Zur Kritik der Polit. Oek., Berlin, 1859 — havia sido negligentemente tratada. O capítulo VII, particularmente parte 2, foi significativamente refundido. Seria inútil entrar em pormenores sobre as alterações, esparsas, do texto, frequentemente apenas estilísticas. Elas estendem-se por todo o livro. Contudo, verifico agora, com a revisão da tradução francesa a aparecer em Paris, que várias partes do original alemão teriam exigido, aqui uma refundição mais enérgica, ali uma maior correcção estilística ou ainda uma eliminação mais cuidadosa de lapsos ocasionais. Faltou para tanto o tempo, uma vez que só no Outono de 1871, no meio de outros trabalhos urgentes, tive notícia de que o livro estava esgotado e de que a impressão da segunda edição devia começar logo em Janeiro de 1872. A compreensão que Das Kapital rapidamente encontrou em amplos círculos da classe operária alemã é a melhor paga [Lohn] do meu trabalho. Um homem — economicamente, no ponto de vista da burguesia —, o senhor Mayer, um fabricante de Viena, manifestou pertinentemente numa brochura [N7] publicada durante a guerra franco-alemã que o grande sentido teórico, que passava por ser património alemão, tinha sido completamente perdido pelas chamadas classes cultas da Alemanha, revivendo pelo contrário de novo na sua classe operária [N8] . A economia política permaneceu na Alemanha até à hora presente uma ciência estrangeira. Gustav von Gülich, em Geschichtliche Darstellung des Handels, der Gewerbe, etc, nomeadamente nos dois primeiros volumes da sua obra editados em 1830, tinha já em grande parte debatido as circunstâncias históricas que entre nós travavam o desenvolvimento do modo de produção capitalista e, portanto, também a construção da sociedade burguesa moderna. Faltava, pois, o solo vivo da economia política. Ela foi importada como mercadoria acabada de Inglaterra e de França; os seus professores alemães permaneceram alunos. A expressão teórica de uma realidade alheia transformou-se nas suas mãos numa colecção de dogmas, por eles interpretados no sentido do mundo pequeno-burguês que os circundava e, portanto, mal interpretados. Tentou-se dissimular o sentimento, não totalmente reprimível, de impotência científica e a inquietante consciência de se ter de perorar num domínio de facto alheio com o aparato de uma erudição histórico- literária ou com a mistura de um material alheio, tirado das chamadas ciências cameralísticas, uma salada de conhecimentos por cujo purgatório o esperançado (1*) candidato à burocracia alemã tinha de passar. Desde 1848 a produção capitalista desenvolveu-se rapidamente na Alemanha e faz já, hoje em dia, florescer a vigarice. Mas o destino permaneceu igualmente desfavorável para os nossos especialistas. Enquanto se puderam entregar imparcialmente à economia política, faltavam na realidade alemã as condições económicas modernas. Assim que estas condições vieram à existência, aconteceram em circunstâncias que não mais permitiam o seu estudo imparcial dentro do horizonte burguês. Na medida em que é burguesa — i. é, apreende a ordem capitalista não como etapa histórica transitória de desenvolvimento, [mas] inversamente, como figura absoluta e última da produção social —, a economia política só pode permanecer ciência enquanto a luta de classes permanecer latente ou se revelar apenas em fenómenos isolados. Tomemos a Inglaterra. A sua economia política clássica ocorre no período da luta de classes não desenvolvida. O seu último grande representante, Ricardo, torna por fim, conscientemente, a oposição dos interesses de classe, do salário e do lucro, do lucro e da renda fundiária, ponto de arranque das suas investigações, ao apreender esta oposição ingenuamente como lei natural da sociedade. Porém, com isto, a ciência burguesa da economia tinha também alcançado a sua barreira intransponível. Ainda em vida de Ricardo, e em oposição a ele, a crítica fez-lhe face na pessoa de Sismondi (2*) . O período seguinte, de 1820-1830, assinala-se na Inglaterra por uma vitalidade científica no domínio da economia O Capital - Posfácio à segunda edição http://www.marxists.org/portugues/marx/1867/capital/livro1/prefacios/... 1 de 6 23/02/2014 12:35

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Segundo posfácio de O Capital

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  • Transcrioautorizada

    MIA > Biblioteca > Marx/Engels > Novidades

  • poltica. Foi o perodo tanto da vulgarizao e difuso da teoria de Ricardo como da sua luta contra a velha escola.Travaram-se brilhantes torneios. O que ento foi feito pouco conhecido no continente europeu, uma vez que apolmica est em grande parte dispersa por artigos de revista, escritos de ocasio e panfletos. O carcter imparcialdesta polmica apesar da teoria de Ricardo excepcionalmente j servir tambm de arma de ataque contra a economiaburguesa explica-se pelas circunstncias do tempo. Por um lado, a prpria grande indstria estava apenas a sair dasua infncia, como j est demonstrado no facto de s com a crise de 1825 ela inaugurar o ciclo peridico da sua vidamoderna. Por outro lado, a luta de classes entre capital e trabalho permanecia remetida para um plano recuado politicamente, pela discrdia entre os governos e os feudais agrupados em torno da Santa Aliana e a massa do povoconduzida pela burguesia; economicamente, pela querela entre o capital industrial e a propriedade fundiriaaristocrtica, que, em Frana, se escondia por detrs da oposio da propriedade de parcelas e da grande propriedadefundiria e que, na Inglaterra, rebentou abertamente desde as leis dos cereais. A literatura da economia poltica emInglaterra durante este perodo faz lembrar o perodo de tempestade e mpeto [Sturm und Drangperiode] econmico emFrana depois da morte do Dr. Quesnay, mas apenas como um Vero de So Martinho faz lembrar a Primavera. Com oano de 1830 sobreveio a crise de uma vez por todas decisiva.

    A burguesia, em Frana e Inglaterra, tinha conquistado o poder poltico. Da em diante a luta de classes ganhou,praticamente e teoricamente, formas mais e mais declaradas e ameaadoras. Dobrou a finados pela economia burguesacientfica. No mais se tratava agora de se este ou aquele teorema era verdadeiro, mas de se era til ou prejudicial aocapital, cmodo ou incmodo, de se era contrrio aos regulamentos da polcia ou no. Para o lugar da pesquisadesinteressada entrou o esgrimismo pago, para o lugar da investigao cientfica imparcial, a m conscincia e a m

    inteno da apologtica. Entretanto, mesmo os importunos tratadinhos, que a Anti-Corn-Law League[N9], com osfabricantes Cobden e Bright cabea, deitou ao mundo, ofereceram, se no um interesse cientfico, por certo que uminteresse histrico pela sua polmica contra a aristocracia fundiria. A legislao livre-cambista desde Sir Robert Peeltambm arrancou economia vulgar este ltimo aguilho.

    A revoluo continental de 1848 repercutiu-se tambm em Inglaterra. Homens que ainda reivindicavam umsignificado cientfico e que queriam ser mais do que meros sofistas e sicofantas das classes dominantes procuraram prem harmonia a economia poltica do capital com as reivindicaes do proletariado, que agora j no era possvel ignorar.Da um sincretismo sem esprito, que John Stuart Mill melhor representa. uma declarao de bancarrota da economiaburguesa que o grande sbio e crtico russo N. Tchernichvski, na sua obra Esboo da Economia Poltica Segundo Mill,j magistralmente esclareceu.

    Na Alemanha, o modo de produo capitalista alcanava, portanto, a maturidade depois do seu carcter antagnicose ter revelado j ruidosamente em Frana e Inglaterra atravs de lutas histricas, quando o proletariado alemo j

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  • possua uma conscincia terica de classe muito mais decidida do que a burguesia alem. Mal uma cincia burguesa daeconomia poltica parecia, pois, aqui tornar-se possvel, tinha-se de novo tornado impossvel.

    Nestas circunstncias, os seus porta-vozes dividiram-se em duas fileiras. Uns gente esperta, vida de ganho,prtica agruparam-se em torno da bandeira de Bastiat, do representante mais cho e, portanto, mais famoso daapologtica econmica vulgar; os outros, orgulhosos da dignidade professoral da sua cincia, seguiram J. St. Mill natentativa de conciliar o inconcilivel. Tal como no tempo clssico da economia burguesa, os alemes tambm no tempodo seu declnio permaneceram meros alunos, repetidores e seguidores, pequenos vendedores ambulantes do grandenegcio estrangeiro.

    O desenvolvimento histrico peculiar da sociedade alem fecha, portanto, a porta aqui a todo o aperfeioamentooriginal da economia burguesa, mas no sua crtica. Na medida em que tal crtica representa, em geral, uma classe,s pode representar a classe cuja vocao histrica o revolucionamento do modo de produo capitalista e a finalabolio das classes o proletariado.

    Os porta-vozes instrudos e no instrudos da burguesia alem tentaram, antes do mais, passar em silncio DasKapital, tal como tinham conseguido com os meus escritos anteriores. Logo que esta tctica deixou de corresponder scondies do tempo, escreveram, sob o pretexto de criticarem o meu livro, instrues para tranquilizao daconscincia burguesa, mas encontraram na imprensa operria vejam-se, p. ex., os artigos de Joseph Dietzgen no

    Volksstaat[N10] combatentes de primeira linha de maior peso a quem ainda hoje devem uma resposta.(3*)

    Na Primavera de 1872, apareceu em Petersburgo uma excelente traduo russa do Kapital. A edio, de 3000exemplares, est agora j quase esgotada. J em 1871 o senhor N. Sieber (e), professor de economia poltica naUniversidade de Kev, no seu escrito: "Teopi c aIIaa . Pao" (Teoria do Valor e do Capital de D.Ricardo, etc), tinha demonstrado que a minha teoria do valor, do dinheiro e do capital, nos seus traos fundamentais,era um aperfeioamento necessrio da doutrina de SmithRicardo. O que surpreende o europeu ocidental na leitura doseu slido livro a manuteno consequente do ponto de vista puramente terico.

    O mtodo empregue no Kapital foi pouco entendido, como j o demonstram as interpretaes dele entre sicontraditrias.

    Assim, a Revue Positiviste[N11] de Paris censura-me, por um lado, porque trato a economia metafisicamente e, poroutro lado imagine-se! , porque me limito a uma dissecao meramente crtica do dado, em vez de prescreverreceitas (comtianas?) para as casas de pasto do futuro. Contra a censura de metafsica, observa o Prof. Sieber:

    Na medida em que se trata propriamente da teoria, o mtodo de Marx o mtodo dedutivo de toda aescola inglesa, os seus defeitos tal como as qualidades so partilhadas pelos melhores economistas

    tericos.[N12]

    O senhor M. Block Les thoriciens du socialisme en Allemagne. Extrait du Journal des Economistes, juillet et aot1872 descobre que o meu mtodo analtico e diz, entre outras coisas:

    Par cet ouvrage, M. Marx se classe parmi les esprits analytiques les plus minents.(4*)

    Os autores de recenses alemes, naturalmente, gritam que sofstica de Hegel. O (Mensageiro da Europa) de

    Petersburgo, num artigo que trata exclusivamente do mtodo do Kapital (nmero de Maio de 1872, pp. 427-436)[N13],acha o meu mtodo de pesquisa rigorosamente realista, mas o meu mtodo de exposio infelizmente germano-dialctico. Diz ele:

    primeira vista, a julgar pela forma exterior da exposio, Marx um grande filsofo idealista e,precisamente, no sentido "alemo", isto , mau desta palavra. De facto, porm, ele infinitamente maisrealista do que todos os seus antecessores em matria de crtica econmica... De maneira nenhuma sepode j consider-lo um idealista.

    No posso responder melhor ao senhor autor do que atravs de alguns extractos da sua prpria crtica, que, almdisso, podero interessar a muitos dos meus leitores para quem o original russo inacessvel.

    Depois de uma citao do meu prefcio a Kritik der Pol. Oek.(5*) , Berlin, 1859, pp. IV-VII[N14], onde debati a basematerialista do meu mtodo, o autor prossegue:

    Para Marx s uma coisa importante: encontrar a lei dos fenmenos, de cuja investigao ele se ocupa.E, para ele, importante no uma lei que os rege enquanto eles tm uma certa forma e enquanto seencontram na conexo que observada num dado perodo de tempo. Para ele, ainda acima de tudoimportante a lei da sua mutabilidade, do seu desenvolvimento, isto , da passagem de uma forma outra,de uma ordem de conexes outra. Uma vez que descobriu esta lei, encara mais em pormenor asconsequncias nas quais a lei se manifesta na vida social... De acordo com isto, Marx preocupa-se comuma s coisa: demonstrar, atravs de uma investigao cientfica precisa, a necessidade de determinadasordens das relaes sociais e por constatar, to irrepreensivelmente quanto possvel, os factos que lheservem de pontos de partida e de apoio. Para isso perfeitamente suficiente que ele, tendo demonstradoa necessidade da ordem actual, demonstre tambm a necessidade de uma outra ordem, para a qual teminevitavelmente de ser feita uma passagem a partir da primeira, sendo totalmente indiferente que seacredite ou no nisso, se esteja consciente ou no disso. Marx encara o movimento social como um

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  • processo histrico-natural, dirigido por leis que no s no se encontram dependentes da vontade, daconscincia e da inteno do homem, como determinam elas prprias a sua vontade, conscincia eintenes... Se o elemento consciente na histria da cultura desempenha um papel to subordinado, compreensvel ento que a crtica, cujo objecto a prpria cultura, tanto menos possa ter por fundamentoqualquer forma ou qualquer resultado da conscincia. Isto , no a ideia mas apenas o fenmenoexterior que lhe pode servir de ponto de partida. A crtica limitar-se- comparao e confronto de umfacto, no com a ideia mas com outro facto. Para ela apenas importante que ambos os factos sejamestudados o mais precisamente possvel e realmente constituam diferentes graus de desenvolvimento;mas acima de tudo importante que no menos precisamente seja estudada a ordem, a sequncia eligao em que se manifestam estes graus de desenvolvimento [...] A outro leitor pode aqui ocorrer aseguinte questo [...] as leis gerais da vida econmica no so as mesmas, sendo indiferente que seapliquem vida presente ou passada? Mas precisamente isto Marx no o admite. Para ele tais leis geraisno existem... Em sua opinio, pelo contrrio, cada grande perodo histrico possui as suas prpriasleis... Mas assim que a vida ultrapassou um dado perodo de desenvolvimento, saiu de um dado estdio eentrou noutro, comea tambm a ser guiada por outras leis. Numa palavra, a vida econmica oferece-nosneste caso um fenmeno perfeitamente anlogo quilo que observamos noutras classes dos fenmenosbiolgicos... Os velhos economistas no compreendiam a natureza das leis econmicas, ao consider-lasdo mesmo tipo das leis da fsica e qumica... Uma anlise mais profunda dos fenmenos mostrou que osorganismos sociais diferem uns dos outros no menos profundamente do que os organismos botnicos ezoolgicos... Um mesmo fenmeno, em consequncia da diferena de estrutura destes organismos, dadiversiddade dos seus rgos, das diferenas de condies em que os rgos tm de funcionar, etc, estsubordinado a leis perfeitamente diferentes. Marx nega-se, por exemplo a admitir que a lei do aumento dapopulao seja a mesma sempre e em toda a parte, para todos os tempos e para todos os lugares.Afirma, pelo contrrio, que cada grau de desenvolvimento tem a sua prpria lei da reproduo...Dependendo das diferenas do nvel de desenvolvimento das foras produtivas, alteram-se as relaes eas leis que as regulam. Ao colocar-se, assim, a si prprio o objectivo de investigar e explicar a ordemcapitalista da economia, Marx apenas formulou de um modo rigorosamente cientfico o objectivo que todaa investigao precisa da vida econmica tem de ter... O seu valor cientfico reside no esclarecimento dasleis particulares a que esto submetidos o surgimento, existncia, desenvolvimento e morte de um dadoorganismo social e a sua substituio por um outro, superior. E o livro de Marx tem de facto este valor.

    O senhor autor, ao descrever to acertadamente aquilo a que chama o meu mtodo real e to benevolentemente oque minha aplicao pessoal dele concerne, que outra coisa descreveu ele seno o mtodo dialctico?

    Certamente que o modo de exposio se tem de distinguir formalmente do modo de investigao. A investigaotem de se apropriar do material em pormenor, de analisar as suas diversas formas de desenvolvimento e de seguir apista do seu vnculo interno. Somente depois de completado este trabalho pode o movimento real ser exposto emconformidade. Se se consegue isto e se a vida do material se reflecte; ento, idealmente [ideell], poder parecer que seest perante uma construo a priori.

    O meu mtodo dialctico , pela base, no apenas diverso do de Hegel, mas o seu directo oposto. Para Hegel, oprocesso do pensamento que ele transforma mesmo num sujeito autnomo sob o nome de Ideia o demiurgo doreal, que forma apenas o seu fenmeno exterior. Para mim, inversamente, o ideal [das Ideelle] no seno o materialtransposto e traduzido na cabea do homem.

    Critiquei o lado mistificador da dialctica de Hegel h j quase 30 anos, numa altura em que ela ainda estava em

    moda. Mas, precisamente, quando elaborava o primeiro volume do Kapital, a epigonagem[N15] rabujenta, arrogante emedocre, cuja palavra pesa hoje na Alemanha culta, comprazia-se a tratar Hegel como o bom do Moses Mendelssohn,no tempo de Lessing, tinha tratado Spinoza, a saber: como co morto. Confessei-me, portanto, abertamente discpulodaquele grande pensador e coqueteei mesmo aqui e ali no captulo sobre a teoria do valor com o modo de expressoque lhe peculiar. A mistificao que a dialctica sofre s mos de Hegel de modo nenhum impede que tenha sido ele aexpor, pela primeira vez, de um modo abrangente e consciente as suas formas de movimento universais. Nele, ela estde cabea para baixo. H que vir-la para descobrir o ncleo racional no invlucro mstico.

    Na sua forma mistificada, a dialctica tornou-se moda alem, porque ela parecia glorificar o existente. Na sua figuraracional, ela um escndalo e uma abominao para a burguesia e para os seus porta-vozes doutrinrios, porque, nacompreenso positiva do existente, ela encerra tambm ao mesmo tempo a compreenso da sua negao, da suadecadncia necessria; porque ela apreende cada forma devinda no fluir do movimento, portanto, tambm pelo seu ladotransitrio; porque no deixa que nada se lhe imponha; porque, pela sua essncia, crtica e revolucionria.

    O movimento pleno de contradies da sociedade capitalista faz-se sentir do modo mais flagrante para o burgusprtico nas vicissitudes do ciclo peridico que a indstria moderna atravessa e no seu ponto culminante a criseuniversal. Ela vem de novo a caminho, embora ainda nos estdios preliminares e, pela omnilateralidade do seu palco deaco, bem como pela intensidade do seu efeito, enfiar a dialctica na cabea mesmo dos novos-ricos do novo sacroimprio prusso-germnico.

    London, 24 de Janeiro de 1873Karl Marx

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    Notas de rodap:

    (1*) Hoffnungsvolle. Nas 3. e 4. edies: hoffnunglose, sem esperana (Nota da edio alem.) (retornar ao texto)

    (2*) Veja-se o meu escrito Zur Kritik, etc., p. 39. (retornar ao texto)

    (3*) Os arengadores pastosos da economia vulgar alem reprovam o estilo e a exposio do meu escrito. Ningum pode ajuizar maisrigorosamente dos defeitos literrios do Kapital do que eu prprio. Todavia, para proveito e alegria destes senhores e do seu pblico, querocitar aqui um juzo ingls e um juzo russo. A Saturday Review, inteiramente hostil s minhas perspectivas, no seu anncio da primeira edioalem, disse: a exposio confere tambm s questes econmicas mais ridas um encanto (charm) prprio. O C.-IIBOMOCT (Notciasde Sampetersburgo), no seu nmero de 20 de Abril de 1872, observa, entre outras coisas: A exposio do seu trabalho ( excepo dealguns pormenores demasiado especializados) distingue-se pela acessibilidade geral, clareza e, apesar da altura cientfica do objecto, por umavivacidade inabitual. Neste aspecto, o autor... nem de longe se assemelha maioria dos sbios alemes, que... escrevem as suas obras numalinguagem to obscura e seca que estoira com a cabea do comum dos mortais. Aos leitores da literatura professoral alem nacional-liberalcorrente, estoira, contudo, algo de totalmente diferente da cabea. (retornar ao texto)

    (4*) Em francs no texto: Com esta obra, o Sr. Marx situa-se entre os espritos analticos mais eminentes. (Nota da edio portuguesa.)(retornar ao texto)

    (5*) Ver K. Marx, F. Engels, Obras Escolhidas em trs tomos, Edies Avante!-Edies Progresso, Lisboa-Moscovo, 1982, t. I, pp. 529-533.(Nota da edio portuguesa.) (retornar ao texto)

    Notas de fim de tomo:

    [N7] Sigmund Mayer, Die sociale Frage in Wien. Studie eines Arbeitgebers. Wien, 1871. (retornar ao texto)

    [N8] Na 4. edio alem do primeiro livro de O Capital (1890) os primeiros quatro pargrafos do presente posfcio foram omitidos. Napresente edio o posfcio publica-se na ntegra. (retornar ao texto)

    [N9] A Anti-Corn-Law League (Liga contra as Leis dos Cereais) foi fundada em 1838 pelos industriais Cobden e Bright. Defendendo osinteresses da burguesia industrial, a Liga procurava a revogao das chamadas leis dos cereais, que previam, em benefcio da aristocraciafundiria, a limitao e a proibio da importao de cereais do estrangeiro. A lei dos cereais, aprovada em 1815, proibia a importao de trigoenquanto o preo do trigo na prpria Inglaterra se mantivesse abaixo dos 80 xelins o quarter. Em 1822 essa lei foi ligeiramente alterada e em1828 foi introduzida uma escala mvel segundo a qual as taxas de importao sobre os cereais aumentavam com a reduo do preo nomercado interno e, inversamente, se reduziam com o aumento desse preo. Ao procurar a revogao das leis dos cereais e a instaurao docomrcio livre dos cereais, a Liga tinha por objectivo a reduo dos preos internos dos cereais e desse modo tambm a reduo do salrio dosoperrios assalariados. A palavra de ordem de liberdade de comrcio era amplamente utilizada pela Liga na sua pregao demaggica da

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    unidade de interesses dos operrios e dos industriais. As leis dos cereais foram revogadas em 1846. (retornar ao texto)

    [N10] Trata-se do artigo de Joseph Dietzgen: Das Kapital. Kritik der politischen Oekonomie von Karl Marx. Hamburg, 1867, publicado nojornal Demokratisches Wochenblatt, n.os 31, 34, 35 e 36 de 1868. De 1869 a 1876 este jornal publicou-se com um novo nome DerVolkstaat. (retornar ao texto)

    [N11] Trata-se aqui da revista La philosophie positive. Revue, publicada em Paris entre 1867 e 1883. No seu n. 3, de Novembro-Dezembro de1868, foi publicada uma breve recenso do primeiro livro de O Capital, escrita por Ievgeni Valentinovitch De Roberty, seguidor da filosofiapositivista de A. Comte. (retornar ao texto)

    [N12](retornarao texto)

    [N13](retornarao texto)

    [N14] Ver Karl Marx, Zur Kritik der Politischen Oekonomie, 1. Heft. Berlin, 1859. (Ver MEW, Bd. 13, S. 8-10.) (retornar ao texto)

    [N15] Tem-se em vista os filsofos burgueses alemes Buchner, Lange, Dhring, Fechner e outros. (retornar ao texto)

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