o caos no festival imagem-movimento e o audiovisual de macapá1 · vida de augusto, com a noção...

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1 O Caos no Festival Imagem-Movimento e o Audiovisual de Macapá 1 Marcus André de Souza Cardoso (INCT-InEAC e Unifap) 2 Ianca Moreira do Nascimento (Unifap) 3 Resumo: Neste artigo apresentamos e problematizamos o material etnográfico obtido ao longo de 18 meses junto ao coletivo cultural Espaço Caos Arte e Cultura, que tem sede e atua em Macapá. Focaremos nossa análise nas narrativas e práticas dos nossos interlocutores no que refere-se a organização e realização do Festival Imagem-Movimento FIM. Para tal, lançamos mão de incursões ao campo, que consistiram em visitas regulares três vezes por semana à sede do coletivo e participação ativa, como colaboradores, na organização dos seus eventos. Além do trabalho de observação participante, o material que compõe este artigo também foi obtido através da realização de entrevistas semiestruturadas, captação de imagens e conversas informais. É a partir desse conjunto de procedimentos que interpretamos as falas dos nossos interlocutores no que refere-se aos significados que atribuem a esse empreendimento, como eles experenciam organizar e promover o FIM, como se dá a organização interna do coletivo, quais são as socialidades operantes naquele espaço, assim como o papel do Caos como um agente promotor da democratização do “acesso à cultura” dentro do município. Palavras-chave: Espaço Caos arte e cultura. Festival Imagem-Movimento FIM. Audiovisual. O Espaço Caos é um coletivo cultural que nasceu da junção de diversos grupos artísticos no ano de 2013 e hoje conta com membros envolvidos com pichação, cinema, fotografia, música e design. Sua sede é uma casa de dois andares, com um enorme quintal e com todos os seus quatro cômodos divididos e ocupados por empreendimentos artísticos que ocupam a casa localizada no centro da cidade de Macapá. Atualmente, é um coletivo que fomenta diversas atividades culturais no município, em sua totalidade sem auxílio de verbas públicas. Uma dessas atividades é a realização do Festival Imagem-Movimento - FIM. O FIM ocorre em centros culturais e em espaços públicos do município, e conta com a participação de importantes diretores de cinema do cenário nacional, que descem em solo macapaense para ministrar cursos e apresentar suas obras. Concomitantemente, acontecem oficinas de formação e aperfeiçoamento que acabam por exercer uma 1 Trabalho apresentado no II Encontro de Antropologia Visual da América Amazônica, realizado entre os dias 25 e 27 de outubro de 2016, Belém/PA. 2 Professor na Universidade Federal do Amapá – UNIFAP. 3 Acadêmica do curso de Ciências Sociais da Universidade Federal do Amapá, bolsista no Programa de Educação Tutorial – PET, voluntária no Programa Voluntário de Iniciação Cientifica – PROVIC.

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Page 1: O Caos no Festival Imagem-Movimento e o Audiovisual de Macapá1 · vida de Augusto, com a noção de constituição de identidade trabalhada por Gilberto Velho. Velho traça uma relação

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O Caos no Festival Imagem-Movimento e o Audiovisual de Macapá1

Marcus André de Souza Cardoso (INCT-InEAC e Unifap)2

Ianca Moreira do Nascimento (Unifap)3

Resumo: Neste artigo apresentamos e problematizamos o material etnográfico obtido ao

longo de 18 meses junto ao coletivo cultural Espaço Caos – Arte e Cultura, que tem sede

e atua em Macapá. Focaremos nossa análise nas narrativas e práticas dos nossos

interlocutores no que refere-se a organização e realização do Festival Imagem-Movimento

– FIM. Para tal, lançamos mão de incursões ao campo, que consistiram em visitas

regulares três vezes por semana à sede do coletivo e participação ativa, como

colaboradores, na organização dos seus eventos. Além do trabalho de observação

participante, o material que compõe este artigo também foi obtido através da realização

de entrevistas semiestruturadas, captação de imagens e conversas informais. É a partir

desse conjunto de procedimentos que interpretamos as falas dos nossos interlocutores no

que refere-se aos significados que atribuem a esse empreendimento, como eles

experenciam organizar e promover o FIM, como se dá a organização interna do coletivo,

quais são as socialidades operantes naquele espaço, assim como o papel do Caos como

um agente promotor da democratização do “acesso à cultura” dentro do município.

Palavras-chave: Espaço Caos – arte e cultura. Festival Imagem-Movimento – FIM.

Audiovisual.

O Espaço Caos é um coletivo cultural que nasceu da junção de diversos grupos

artísticos no ano de 2013 e hoje conta com membros envolvidos com pichação, cinema,

fotografia, música e design. Sua sede é uma casa de dois andares, com um enorme quintal

e com todos os seus quatro cômodos divididos e ocupados por empreendimentos artísticos

que ocupam a casa localizada no centro da cidade de Macapá. Atualmente, é um coletivo

que fomenta diversas atividades culturais no município, em sua totalidade sem auxílio de

verbas públicas. Uma dessas atividades é a realização do Festival Imagem-Movimento -

FIM. O FIM ocorre em centros culturais e em espaços públicos do município, e conta

com a participação de importantes diretores de cinema do cenário nacional, que descem

em solo macapaense para ministrar cursos e apresentar suas obras. Concomitantemente,

acontecem oficinas de formação e aperfeiçoamento que acabam por exercer uma

1 Trabalho apresentado no II Encontro de Antropologia Visual da América Amazônica,

realizado entre os dias 25 e 27 de outubro de 2016, Belém/PA. 2 Professor na Universidade Federal do Amapá – UNIFAP. 3 Acadêmica do curso de Ciências Sociais da Universidade Federal do Amapá, bolsista no Programa de Educação Tutorial – PET, voluntária no Programa Voluntário de Iniciação Cientifica – PROVIC.

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importante função no universo audiovisual da cidade. Esta importância pode ser estendida

para as outras atividades voltadas para o audiovisual que ocorrem periodicamente durante

todo o ano e que também são de responsabilidade dos realizadores do FIM.

O festival é visto tanto para seus organizadores quanto para seus frequentadores

como importante iniciativa que ajuda na fomentação do audiovisual e seu diálogo com a

cidade. Como podemos observar, há uma massiva fomentação do audiovisual em Macapá

que está concentrada na atuação dos agentes ligados ao Espaço Caos, sendo estes os

mesmos agentes que estão à frente da produção do Festival Imagem-Movimento – FIM.

Exploraremos a atuação destes agentes do audiovisual, as conexões entre Espaço Caos e

FIM, bem como a importância desta fomentação para o município em que atuam,

dialogando com os conceitos de missão, experenciamentos, circuito e cidadania, sempre

a partir da perspectiva de nossos principais interlocutores.

História do Festival Imagem-Movimento – FIM

O FIM se inicia no ano de 2004, como nos relata Augusto4, um de nossos

principais interlocutores e produtores do festival. Nasce como uma iniciativa de alguns

acadêmicos da Universidade Federal do Amapá – UNIFAP – que participavam do

Diretório Central dos Estudantes – DCE – e que visavam movimentar a cena audiovisual,

inicialmente, apenas dentro da universidade. Esse é o ano em que Augusto está voltando

para Macapá, depois de se formar em jornalismo pela Universidade Federal do Pará –

UFPA. Augusto já volta com uma carga de conhecimento sobre audiovisual, dado o seu

envolvimento com alguns movimentos de fomentação do cinema em Belém: lá ele

organizava cineclubes de cinema, que são lugares, geralmente pequenos, que exibem

filmes de graça para as pessoas, visando estimular o contato com o cinema, sempre

discutindo e refletindo sobre o que foi exibido; também ajudava em mostras

cinematográficas, que são eventos maiores, mas que continuam voltados para o cinema.

Como nos relata,

Quando eu voltei, eu lembro que eu fui pra um show do Tribo de

Jah que era no Trem (um bairro da cidade), eu tava meio

deslocado assim, eu falei “porra, nada pra fazer bacana aqui” já

tava nessa liga, né, de movimento cultural independente e tal, cine

clube de cinema e tal, que era o que eu fazia em Belém, aí eu fui

pro show da Tribo de Jah meio só pra ver uma coisa diferente aí

lá eu encontrei essa minha amiga, a Alana, que estudou o ensino

4 Todos os nomes que se seguem são ficcionais, visando manter a integridade de nossos interlocutores.

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médio comigo (...) o pessoal foi chegando pro show, fui

conhecendo, aí eu conheci um menino que era do DCE da

UNIFAP, aí ela apresentou “Olha, esse aqui é o Augusto ele

trabalha com vídeo, foto” aí “Porra, cara a gente tá montando aí

uma atividade cultural, a gente queria colocar alguma coisa de

cinema, mas a gente não saca e tal, precisava de alguém pra cuidar

dessa parte, tu topa? “Topo” (...) eles estavam pensando numa

coisa que eu sabia, tinha contato, aí eu trouxe vários filmes de

fora, ajudei o pessoal a produzir aqui, aí rolou o festival.

Augusto, em entrevista realizada no Espaço Caos. Parênteses

nosso, aspas dele.

Quando Augusto retorna à Macapá, vem não apenas com a intenção de ficar, mas

também de dar prosseguimento a sua relação com o audiovisual que havia se iniciado na

cidade de Belém. Quer dizer, se “iniciado”, haja vista que Augusto é filho de fotógrafo,

irmão de outro fotógrafo e que tinha o sonho de cursar fotografia, mas como não tinha o

curso em Macapá, resolveu cursar Jornalismo, posto que foi o curso que mais viu

similaridades com a fotografia. Desta maneira, ele parece ver no convite que lhe é feito,

a oportunidade para realizar suas aspirações em âmbito local. Notamos isso mais ainda,

quando percebemos que, daí em diante, Augusto só fortifica sua relação com o festival,

um festival que ajudou a construir. Hoje ele é o único integrante do FIM que está desde a

primeira edição do festival, acorrida há treze anos atrás. Augusto é uma pessoa

extremamente comunicativa, não atoa, é ele quem, atualmente, se responsabiliza por

procurar e firmar parcerias com instituições para o festival. É alguém muito conhecido na

cidade, tanto por jovens, por que já deu aulas em faculdades para várias pessoas, como

por pessoas de áreas mais formais, por que já foi servidor público do Estado.

Parece-nos um movimento interessante o de fazer a assimilação da trajetória de

vida de Augusto, com a noção de constituição de identidade trabalhada por Gilberto

Velho. Velho traça uma relação entre memória e projeto e sua importância para a

constituição da identidade (Velho, 2013). Segundo este antropólogo, o florescimento das

diversas ideologias individualistas que passam a fixar o sujeito como valor básico da

cultura no mundo ocidental, faz com que a trajetória de vida do indivíduo, passe a ser o

elemento fundamental, por que constituidor, em sociedades nas quais predominam as

ideologias individualistas. Apesar de Velho chamar a atenção para como, em termos

antropológicos, este processo não é uma regra e nem é natural, dado o fato de que

sociedades e culturas diferentes podem privilegiar outras unidades como fundamentais

que não, necessariamente, o sujeito, notamos como é importante a memória individual de

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Augusto, que organiza sua trajetória de vida, moldando os projetos que ele traça e nos

quais ele se empenha em concretizar, sendo um desses projetos o Festival Imagem-

Movimento, um projeto que, inclusive, molda a sua identidade enquanto ativista do

movimento cultural independente.

A noção de “ativista do movimento cultural independente” surge como uma

maneira analítica de entender os novos movimentos sociais que se pautam num ativismo

cultural oriundo da mesma onde democrática que dá origem aos coletivos culturais nas

grandes metrópoles. São movimentos sociais oriundos de locais invisibilizados

socialmente e, por isso, carentes de muitas políticas públicas e direitos. Nestes

movimentos há uma ênfase na diferença, que faz com que suas bandeiras de luta sejam

por uma igualdade que abarque as diferenças, garantindo a cidadania através de um

ativismo que envolve as singularidades, numa constante negociação em busca de um

denominador comum que coordene as mudanças sociais pelas quais lutam (YÚDICE,

2004, apud in GAMA, 2009). Esta forma de ativismo é vista tanto na pessoa de Augusto,

como na forma como o coletivo cultural Espaço Caos se organiza. Uma forma de ativismo

que está sempre colocando a cultura a serviço do social.

No terceiro ano de atuação, o FIM entra para o Guia Brasileiro de Festival de

Cinema, que consiste num catálogo distribuído em vários lugares no Brasil. Como

consequência disso, vários filmes começam a chegar sem que houvesse muita divulgação

por parte do festival, que ainda se encontrava em seu início. No ano de 2014, um produtor

de cinema do estado do Ceará vem como convidado para o festival e relata como a

produção audiovisual aumenta, quando resolveram premiar os produtores locais.

Instigados com a possibilidade de ver a produção audiovisual crescer, a equipe do Festival

dá vida ao Prêmio Gengibirra de Audiovisual, sendo gengibirra o nome da bebida mais

tradicional de Macapá e que é, principalmente, consumida quando o ciclo do Marabaixo,

a festividade mais tradicional da cidade, se inicia. Este é um prêmio exclusivo para os

produtores amapaenses; eles inscrevem seus filmes que, por sua vez, passam por uma

curadoria formada por alguns integrantes do festival. O filme selecionado leva junto do

prêmio, uma quantia simbólica de mil reais, que segundo os realizadores do Festival, pode

custear uma próxima produção audiovisual. Com o Prêmio Gengibirra, é a primeira vez

na cidade de Macapá que um festival de cinema oriundo daqui, consegue premiar algum

produtor local, posto que antes as premiações já ocorriam, ainda que não todo ano, mas

englobavam toda a produção de qualquer lugar. Esta é uma das maneiras mais diretas

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pelas quais os realizadores do FIM ajudam na fomentação do audiovisual atualmente,

entretanto, há outras formas pelas quais estendem sua fomentação.

Os produtores do FIM passam a ser, com o tempo, os responsáveis por várias

outras atividades voltadas para a fomentação do audiovisual no município, que vão muito

além do festival em si e do tempo em que ele ocorre, o tempo de uma semana. Os

realizadores do FIM passam também a serem os responsáveis pela a realização do Dia

Nacional da Animação – DIA –; do Clube de Cinema, que é o cine clube do FIM, uma

forma pela qual o FIM arranjou de continuar a exibir filmes durante o ano inteiro; há

também a comemoração do aniversário do Clube de cinema, posto que na sua

programação sempre se inclui o momento do audiovisual; os realizadores do FIM também

foram os responsáveis, em 2012, pela realização do Cinema Pela Verdade, um circuito de

cinema idealizado pelo Instituto Cultura em Movimento – ICEM – o qual visava exibir

cinco documentários voltados para o período da ditadura civil militar no Brasil; esses

documentários foram exibidos em várias universidades do país, de modo quem em

Macapá, a mostra ocorreu na UNIFAP.

Atualmente, o FIM conta com uma equipe de quatorze pessoas, sendo estes

números frutos de uma conta baseada naqueles que percebemos ajudando na produção do

último Festival, que ocorreu em dezembro de 2015. Num grupo do facebook – ferramenta

pela qual organizam seus encontros e postam todas as questões relacionadas ao festival –

há mais pessoas constando como integrantes da equipe. Desta maneira, percebemos que

os realizadores do FIM, que também são os realizadores do coletivo cultural Espaço Caos,

são os responsáveis por uma boa parte da fomentação da cena cultural da cidade, não

apenas no que concerne ao espaço que fornecem para a arte, a música, a fotografia e o

design, mas também para o cinema e a fomentação do audiovisual, sendo este último,

fomentado de uma forma muito mais singular e autônoma.

Há esta forma mais singular e autônoma que identificamos na fomentação do

audiovisual no município, atribuímos o fato de que a história do FIM se caracteriza por

sua longa trajetória a qual inclui a passagem de vários agentes audiovisuais, e de um

caminho de construções de agentes bastante especializados e capacitados no que fazem.

Os vários agentes que passaram pelo festival, são aqueles que entram como voluntários

e, por isso, acabam entendendo o festival como algo passageiro; os que produzem o

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festival e que estão neste trabalho há anos, são os seus representantes legítimos5 por que

se entregam a causa e são reconhecidos como figuras de liderança. As figuras de liderança

encontram-se naqueles membros mais antigos, como Claudia e José Augusto, ela desde

2012 ajudando na produção do festival, e ele desde o primeiro FIM. Atualmente, o festival

conta com uma equipe grande que se divide em equipes de curadoria; gerenciamento de

páginas; eletricidade do festival; editores; os que se ocupam dos vídeos promocionais do

Festival e que produzem imagens de divulgação. Alguns desses trabalhos são realizados

por voluntarismo, outros pela equipe que faz parte do festival, que, ao fim e ao cabo,

acabam contribuindo nos trabalhos braçais que envolvem a realização do festival.

Relação FIM e Espaço Caos

O FIM já existia e atuava em Macapá muitos anos antes da existência do Espaço

Caos. A relação que existe entre Espaço Caos e FIM se dá por que o FIM estava entre os

cinco coletivos que há três anos atrás se uniram para procurar uma casa a qual lhes serviria

como a sede das atividades culturais que aqueles grupos gostariam de começar a fomentar

na cidade; portanto, o FIM era um dos grupos que fizeram parte do processo fundador do

Espaço Caos, um dos principais coletivos culturais atuantes na cidade de Macapá.

Como dizem seus realizadores “o FIM não termina quando acaba”, afirmam isso

por que o processo de produção do festival (re)começa pouco tempo depois que ele

termina. Desde 2013 os realizadores do festival possuem uma sede para as suas reuniões

de planejamento, um local no qual realizam as exibições mensais do Cine clube – o clube

de cinema do FIM –, e também onde realizam a comemoração anual do aniversário do

Clube, que em 2015 completou cinco anos de existência. Esta sede de suas atividades é o

Espaço Caos – Arte e Cultura que, como já mencionado, é um importante coletivo cultural

da cidade por que fomenta a cena cultural independente de uma forma muito atuante.

O FIM fez parte do processo de construção do Espaço Caos, assim como outros

diversos grupos também fizeram, todavia, desde que ingressamos ao campo, notamos

como os integrantes do FIM são também os integrantes mais importantes do Espaço Caos.

Quando uso o adjetivo “importante”, quero dizer que são aqueles integrantes que, dentro

do Caos, possuem uma figura de liderança, um papel importante na integração do coletivo

Espaço Caos, bem como na sua manutenção organizacional e financeira.

5 “Representantes legítimos” é um termo retirado do artigo de Antônia Gama (2009, p. 103), um termo que ela identifica em seu campo de pesquisa e que aqui utilizamos para representar aqueles que fazem parte da equipe do festival há anos e que, por isso, são vistos como figuras de liderança.

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As reuniões do FIM sempre ocorrem dentro do auditório da casa do Espaço Caos.

O auditório é a forma como os agentes do Espaço Caos chamam a sala que fica na parte

posterior da casa, ocupando uma parte da faixada do Espaço. Auditório é, pois, uma

categoria nativa, posto que para qualquer pessoa de fora do Espaço Caos que eu

perguntasse “onde fica o auditório do Caos? ”, me responderiam assustados: há um

auditório no Caos? Eu nunca o vi! É no auditório que ocorre, além das reuniões de

organização do Festival, as exibições do Clube de Cinema; é, ainda, a mesma sala que se

transforma no QG da produção do Festival, enquanto esse está acontecendo.

Gostaríamos de chamar a atenção para o fato de que o FIM ocupa um lugar de

suma importância dentro do Espaço Caos. Primeiramente por que seus realizadores

possuem um papel de suma importância para o Espaço Caos em si e, posteriormente, por

conta do fato de que este papel se estende para o lugar que o audiovisual ocupa dentro do

Espaço Caos. Vejamos: a atividade mais frequente do Espaço Caos é a exibição de filmes

pelo Clube de Cinema, uma atividade que acontecia quinzenalmente e que, esse ano,

passou a ocorrer mensalmente, mas que ainda sim, continua sendo bastante constante.

Além disso, tem-se a comemoração do aniversário do Cine Clube, que já se tornou uma

comemoração importante para seus realizadores, pois, é o momento de ressaltarem que o

clube de cinema do FIM é um dos mais antigos da cidade, como ressalta Augusto com

muito orgulho, quando perguntado sobre o surgimento do Cine Clube, um clube de

cinema completamente ligado a história do Festival.

O que se nota é que o FIM possui, claramente, um lugar físico para si dentro do

Espaço Caos, o qual seus realizadores ocupam de várias formas, mas sempre são

ocupações voltadas para as suas conexões com o audiovisual. No Espaço Caos também

ocorrem eventos voltados para o audiovisual com uma certa frequência. Para além disso,

ainda, ressalta-se o rompimento no tempo de atuação do Espaço Caos quando o FIM se

inicia.

O único momento do ano em que o Espaço Caos tem suas atividades

interrompidas durante uma semana inteira, é quando o FIM começa. Atividades são

suspendidas, nenhum outro evento ocorre e não se vê muita circulação de outros agentes

pelo quintal do Espaço Caos. Isso se dá por que a equipe que se empenha o ano inteiro

no Espaço Caos, passa a está empenhada na realização do FIM. As atividades são

suspensas para que os focos estejam no Festival. A pouco circulação pelo quintal da casa,

que sempre é movimentado, ocorre por que a maioria das pessoas se encontra dentro do

QG do Festival. O que notamos é a total ressignificação do auditório, que agora já não é

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mais denominado de auditório, mas sim de QG do FIM. Acompanhamos a mudança deste

espaço. Esta ressignificação de ambiental começa alguns dias antes do início do Festival.

Limpa-se toda a sala, retirado dela qualquer coisa que podia está ocupando o espaço da

sala; divide-se a sala bem ao meio com cortinas, de modo que a parte pela qual as pessoas

entram e deparam-se com o espaço, era a parte mais pública do QG, era onde fazíamos

trabalhos como dobrar os folders com a programação que seriam distribuídos no decorrer

do festival e nas panfletagens; no outro lado da sala, ficava a área mais particular, onde

se colocaram travesseiros, esteiras de palha, uma pequena mesa de ferro onde se fazia o

café, e uma estante onde se colocava diversos materiais do Festival, como as caixas com

folders, luminárias e vários outros equipamentos.

O QG é o espaço, portanto, onde todas as pessoas que fazem parte do FIM juntam-

se para trabalhar para o Festival, pessoas essas que durante todos os meses que antecedem

dezembro, reuniam-se conjuntamente no quintal do Espaço Caos, mas que agora estão

empenhadas, particularmente, em produzir um Festival de Cinema independente.

Reuniões acontecem lá, refeições acontecem lá, o gerenciamento das páginas na internet

do Festival, acontecem de lá. O QG é também o point de encontro, pois, todos encontram-

se de lá, para seguir para o lugar da cidade onde o Festival está ocorrendo naquele dia.

Desta maneira, o lugar do audiovisual na cidade de Macapá, encontra-se

extremamente relacionado e representado pelos agentes do coletivo cultural Espaço Caos,

o lugar que sedia eventos e exibições voltadas para o audiovisual durante o decorrer do

ano, e o local no qual os produtores do FIM planejam-se e dão vida ao festival. O que

decorre disto é uma associação direta da imagem do Espaço Caos ao FIM, ou vise e versa,

como se fossem coisas indissociáveis, todavia, esta é uma associação renegada pelos

produtores mais ligados ao festival, como se percebe na fala de Claudia

O FIM já tem uma história de vida muito anterior ao Caos, e se o

Caos acabar o FIM vai continuar existindo. São partes totalmente

dissociáveis, né (...) O caos é a união de várias coisas, mas os

grupos que já integraram a casa, ou ainda integram a casa, eles

são independentes nas suas vontades e nas suas demandas, né, na

sua criação, eles são independentes do Caos.

Claudia, em entrevista realizada no Espaço Caos.

O grupo que já pertencia ao FIM e que ajuda no processo de surgimento do Espaço

Caos, enxerga o espaço que conquistaram dentro do coletivo como uma conquista deles

próprios no que concerne a independência e liberdade para realizar atividades culturais

alternativas, dentre essas atividades, a fomentação do audiovisual. Afirmar que Espaço

Caos e FIM são as mesmas coisas é simplificar demais todas as relações que envolvem

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ambos, e, numa perspectiva dos realizadores, simplificar a longa história que o FIM

possui. Daí, é muito mais provável que seus realizadores ainda vejam o Espaço Caos

como um laboratório para suas ações, do que como um corpo cultural autônomo, que é o

que ele vem se transformando. A prova disso, é que algumas pessoas que entraram

fazendo parte do FIM, hoje estão mais distantes do festival, por que envolvidas com

empreendimentos artísticos que surgiram no Espaço Caos.

Para finalizar, é importante entender que a interelação entre Espaço Caos e FIM,

faz com que o lugar do audiovisual cresça na cidade em paralelo a visibilidade que o

Espaço Caos conquista enquanto coletivo, proporcionando inúmeras atividades artísticas

no município que incluem o audiovisual e que são produto do trabalho cultural feito pelos

mesmos realizadores do FIM. Estes são fatores que fazem com que a visibilidade do

audiovisual cresça junto com o coletivo Espaço Caos, mas, ainda sim, sendo fruto de

movimentos diferentes. Desta maneira, é tão importante tudo o que os agentes culturais

do FIM, fazem no Espaço Caos, quanto tudo o que o Espaço Caos passa a representar

para o audiovisual. Resta-nos, ainda, falar sobre o audiovisual no Festival Imagem-

Movimento e sua relação com o município.

Festival Imagem-Movimento e o audiovisual em Macapá

A linha do tempo segundo a qual começamos a manter contato com o Festival

Imagem-Movimento, não é seguida numa ordem cronológica. Primeiro conhecemos os

agentes culturais que constroem o Espaço Caos – Arte e Cultura, e soubemos do contato

de alguns com o audiovisual. Num momento posterior, tivemos a oportunidade de

acompanhar a realização do Festival Imagem-Movimento do ano de 2015, por que

ingressamos ao campo no meio do ano, pulando, por isso, todo o processo de reunião que

começa muito tempo antes, no início do ano. Todavia, todo esse processo de produção,

que se caracteriza pelas várias reuniões, nos foi possível acompanhar este ano, para o FIM

que ocorrerá em dezembro de 2016 e que já começou a ser planejado. O que se segue,

portanto, são relatos e analises pautados, por um lado, nas experiências em campo junto

com a produção no último FIM e, por outro lado, nas reuniões de planejamento para o

FIM 2016.

Geralmente é Claudia quem, em meados do mês de março, começa a convocar as

pessoas que fazem parte do grupo do facebook, para, em reunião no auditório do Espaço

Caos, começarem a planejar o FIM que está por vir. Este período de dois meses, após o

término do último festival, é o período que eles denominam de férias e do qual não abrem

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mão. Como vários integrantes do FIM são também integrantes do Espaço Caos, já deve-

se imaginar que nesse período de “férias”, do mês de dezembro até março, o Espaço Caos

também aproveite para dar uma amenizada nas atividades culturais.

Na primeira reunião fazem um balanço avaliativo do último FIM. Este é o

momento no qual todas e todos avaliam suas participações e o desempenho do Festival.

Para Augusto, por exemplo, o FIM do ano de 2015 foi um dos melhores da história do

Festival, segundo ele, todos os dias o público não decepcionou; a parceria que

conseguiram firmar com o dono de uma importante franquia de cinema local, fez com

que eles lançassem o longa-metragem do diretor pernambucano Camilo Cavalcanti, numa

enorme sala de cinema que abriga inúmeras pessoas. Augusto vê isso como um passo

enorme para o Festival, e aconselha que, para 2016, procurem novamente esta parceria.

Seu argumento é o de que isso faz com que o público espere sempre mais do festival e,

consequentemente, que o festival tenha mais responsabilidade em não decepcionar.

Também começam a pensar num mote para o festival. Mote é o tema central que

vem a nortear todo o festival; portanto, ao redor do mote gira toda a propaganda que dá

uma face ao festival que virá. As pessoas na reunião começam a pensar os fatos que estão

ocorrendo na atualidade e que julgam importantes, por exemplo, nesta primeira reunião

falou-se muito dos desastres naturais que vem acontecendo, como o caso da cheia de

Mariana (MG), e pensou-se em abordar a relação humanos x natureza. Posteriormente,

também pensam nas parcerias que irão buscar para ajudarem a construir o Festival, tanto

sediando espaços, disponibilizando materiais que o festival não possui, quanto para ajudar

na parte cultural e promocional do festival. Definem prazos para que as respostas de todas

as deliberações comecem a chegar. Depois da primeira reunião, os encontros posteriores

passam a acontecer quinzenalmente. Sempre no auditório do Espaço Caos. Desta

maneira, o andamento do festival é feito em conjunto.

O festival começa a ganhar vida quando a produção começa a buscar: buscar

parcerias, grupos e pessoas; e quando começam a chamar: chamar diretores ou diretoras

que foram pensados em reunião para fazerem a proposta de convida-los para participar

do Festival. Estes são dois passos fundamentais. Há instituições que ajudam o festival

desde as primeiras edições, o SESC é o maior exemplo. Eles sediam as cadeiras que a

produção utiliza para as exibições em espaços públicos, e também sediam o Bob, uma

tela de exibição que, com a entrada de ar, infla-se o suficiente para ganhar metros de

altura e espessura. Quando é necessário, faz-se documentos de solicitação e os entregam

em espaços culturais, pedindo alguns dias de utilização do espaço. O FIM possui uma

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parceria com alguns grupos locais que os ajudam em slogans, cobertura do evento e

ajudantes para o festival. Estes são os colaboradores voluntários, e formam uma boa parte

da equipe que trabalha no festival.

O FIM sempre foi visto por seus representantes legítimos como um festival de

caráter voluntário. Por isso mesmo, são incontáveis os números de pessoas que já

ajudaram o festival em algum momento nestes treze anos. Segundo Claudia “essa

rotatividade, ela sempre esteve presente, né, pelo ou menos desde que eu conheço a

história do FIM, os membros entram e saem a hora que a disponibilidade da pessoa

mandar”. Quanto a este aspecto, eles identificam pontos positivos e negativos. Um ponto

positivo é que eles sentem-se, de fato, como os responsáveis pelo festival, sentem que a

sua missão é fazer este festival acontecer todos os anos e esforçam-se para isso, portanto,

sentem-se parte do festival; um ponto negativo, é que o núcleo de representantes legítimos

do festival acaba sendo pequeno, e diminuiu mais com o afastamento de algumas pessoas

que também eram importantes; daí eles procurarem tanta ajuda para que o festival possa

acontecer.

Ser visto por seus realizadores como um festival de caráter voluntário, faz com

que seus representantes legítimos, entre outras coisas, se enxerguem como aqueles que

promovem a profissionalização do audiovisual no município; nesta perspectiva, segundo

Augusto em reunião com acadêmicos da UNIFAP no QG, uma das intenções do festival

é “aproximar gerações”, gerações essas que podem proporcionar uma troca de

experiências. Fazer parte do festival como voluntário, para aqueles que se propõem, faz

com que eles se aproximem de um universo que os interessa. Um universo que se torna

mais acessível quando o festival se inicia.

O processo de busca de diretores convidados não se dá de uma forma tão diferente.

Depois de escolherem quem será o convidado, manda-se, através do email do FIM, um

convite para a (o) diretora (o). No email vão todas as explicações possíveis e plausíveis

sobre o festival e sobre como a produção custeia as passagens, estadia e alimentação. Esta

busca por parcerias é uma das principais caraterísticas de um festival feito de forma

independente, todo o dinheiro voltado para as pessoas convidadas pelo festival, é

fornecido pelos seus próprios produtores. Diante disso, chamamos a atenção para a

importância que as relações assumem no festival. Augusto, como já dito, é alguém muito

comunicativo e sempre que pode, utiliza-se disso para conseguir mais coisas para o

festival. Camilo Cavalcante, o diretor convidado do FIM 2015, me relatou em uma de

nossas conversas, como conheceu Augusto: foi em São Paulo, num evento de cinema do

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qual ele participava como convidado. Me contou que Augusto foi até ele ao termino do

evento, explicando que era um dos produtores de um festival independente e que gostaria

do contato de Camilo, para que conversassem mais. Esta foi a ponte para que o diretor

viesse exibir seu longa-metragem pelo FIM. Saiu daqui completamente satisfeito, pois,

relatou que está havia sido a segunda vez que seu longa tinha lotado uma sala, a outra

tinha sido em Recife.

Chegado o mês de dezembro, após todas as reuniões serem feitas, todas as

parcerias terem confirmado, toda a propaganda ter sido feita, todos os produtores

nacionais terem chegado e após o QG ter sido montado, se inicia o Festival. Um festival

que promove exibições em locais fechados, em salas de exibições de cinemas locais, em

espaços públicos da cidade, em bairros centrais, em bairros periféricos e, no seu último

dia, num coletivo cultural. Tudo, absolutamente, de graça e acessível a todos que queiram

assistir às exibições.

Quando o FIM se inicia, a movimentação da cidade se altera, por que os espaços

públicos são ocupados e movimentados. A mostra de abertura é sempre realizada numa

praça pública da cidade, no último ano, foi realizada na Praça da Bandeira, com a

participação de uma companhia de circo, com a cobertura colaborativa de um grupo de

produtores locais e com a participação de mais de cem pessoas. O mesmo movimento

acontece na “Mostra Muralha”, ocorrida no entorno do monumento Fortaleza de São.

A ocupação dos espaços urbanos é quesito fundamental para se traçar uma relação

com a cidade. Uma relação que muitas vezes é precária, principalmente, quando se trata

de uma cidade que está com praças sendo “revitalizadas” há anos e, por isso, rodeadas

por muros. O FIM é o promotor desta ocupação e deste movimento de levar o audiovisual

há cidade e sua população. Muito costumeiramente, vê-se pessoas que estavam apenas

passando, pararem para assistir à exibição. O fato de mais de cem pessoas comparecerem

à praça no primeiro dia de festival, demonstra como a ocupação dos espaços públicos é

bem-vinda quando estimulada, assim como o fato de eles exercerem o movimento de ir

até a população, os caracteriza como os responsáveis pela democratização do acesso à

cultura dentro do município. Isto pode ser mais comprovado quando percebemos os

bairros periféricos que o festival ocupa. Fomos para o bairro do Copala realizar exibições

cinematográficas no segundo dia de FIM. Este é um bairro completamente estigmatizado

no município e é também o bairro de um novo membro da equipe da equipe de produção

do Festival.

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Da mesma forma, percebemos como o festival mobiliza um circuito de produtores

audiovisuais e artistas locais. Esta mobilização se dá pelo fato de que o festival, quando

busca parcerias, também busca aqueles que queiram colaborar de alguma forma, de modo

que muitos têm a oportunidade de se apresentarem para um enorme número de pessoas,

ou de trabalharem na equipe de um festival, através da participação no FIM. Portanto, o

Festival traz consigo uma gama de oportunidades não só para os produtores audiovisuais

locais, como para uma boa parcela de artistas locais, movimento, assim, a cena cultural

do município.

Macapá é um município ausente em políticas públicas voltadas para a área

cultural. Todavia, é importante ressaltar que esta ausência de políticas públicas nuca foi

um motivo para que o grupo FIM e o coletivo cultural que fazem parte, o Espaço Caos,

parassem suas atividades culturais; ao contrário, sempre foi um importante fator para que

continuassem a fomentar a cena cultural independente do município. Quando

movimentos culturais surgem na cidade, eles preenchem uma lacuna deixada por

instituições públicas não apenas por que promovem o acesso à cultura, como por que

criam espaços para que artistas locais se tornem visíveis, sendo essa visibilidade existente

apenas com o trabalho de ativistas culturais. É necessário lembrar que o ativismo cultural

enxerga na cultura a peça central da mudança social que desejam promover, e que veem

nas diferenças a chave para se chegar numa concepção de igualdade que abarque as

diferenças. É este ponto de vista que faz com que os agentes do FIM proporcionem, para

artistas das mais variadas áreas, a oportunidade de fazerem parte do festival e, com isso,

serem os agentes que promovem muito mais que um festival de cinema: eles promovem

a democratização do acesso à cultura, bem como, demonstram, na prática, como a cultura

– aqui, mais especificamente o audiovisual – pode se tornar a peça central de intervenções

sociais.

Bibliografia

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