o caminho da experiÊncia comunitÁria, segundo jesus

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    O CAMINHO DA EXPERINCIA COMUNITRIA, SEGUNDO JESUS

    O termo Ekklesia sintetiza de forma impressionante o ser Igreja de Jesus: So os chamados para fora.

    No entanto, na histria crist preponderou o caminho inverso que torna os discpulos em gente'chamada para dentro', chamada para deixar o mundo, para s considerarem 'irmos' os membros do'clube santo' e a no buscarem relacionamentos fora de tal ambiente.

    Mas, lendo o Evangelho, difcil conceber que Jesus sonhasse com aquilo que depois ns chamamosde "igreja".

    Quem pode ouvir o ensino de Jesus, com toda sua desinstalao, com toda a sua mobilidade, com todanfase na igualdade de todos, com toda denncia aos poderes religiosos, e com toda a pertinncia vidafosse para curar a mente, o corpo ou o esprito; fosse para anunciar a destruio do Templo comolugar de Deus; fosse para "beatificar" samaritanos e "demonizar" religiosos sem corao ; e, ainda

    assim, imaginar que Jesus tenha qualquer coisa a ver com o que ns chamamos de "igreja", seja aquelaque se abriga em Roma ou sejam aquelas que tm tantas sedes quantos pastores, bispos e apstolosmegalomanacos existirem?

    No se v Jesus tentando criar uma comunidade fixa e fechada, como tambm no percebo, em Seuesprito, qualquer interesse nesse tipo de recluso comunitria.

    Por isso, o termo igreja perdeu seu significado original, e, pelo uso milenarmente pervertido, aexpresso j no til para designar a jornada individual e comunitria dos discpulos de Jesus. De fato,a idia de igreja ficou to possessa de outros significados que usar o termo fala da anttese do que sedesejaria expressar, conforme o Evangelho.

    Jesus no plantou igreja em nenhum cho que no fosse o do corao das pessoas!

    Igreja, de acordo com Jesus, comunho de dois ou trs em Seu Nome e em qualquer lugar. Igreja, deacordo com Jesus, algo que acontece como encontro com Deus, com o prximo e com a vida, nocaminho do Caminho.

    Para Jesus, o lugar onde melhor e mais propriamente se deve buscar o discpulo nas portas doinferno, no meio do mundo!

    Nesse Caminho, as maiores demonstraes de f vm de fora da religio. Vm de publicanos como

    Zaqueu e meretrizes como a pecadora que ungiu Seus ps. Vem da mulher samaritana, do centurioromano, da mulher srio-fencia e do ladro da Cruz. Percebe-se que tanto "malandros arrependidos"quanto "rus confessos" podem encontrar seu repouso.

    Portanto, Seus discpulos so treinados a espalhar sementes, a salgar, a levar amor, a caminhar embondade, e a sobreviver com dignidade no caminho, com todos os seus perigos e possibilidades emaberto (Lucas 10). Com demnios, tempestades, competies entre si, certezas satnicas, exagerosdesnecessrios, medo de trair, frgeis certezas de jamais trair, traio explcita, negao e morte!

    E, alm disso, tudo, v-se que no Caminho com Ele, os ventos cessam, as ondas se abrandam, as Leisdo Universo so relativizadas, os demnios sabem quem Ele e quem ns somos Nele!

    Jesus o Caminho em movimento nos caminhos da existncia. E Seus discpulos so acompanhantes

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    sem hierarquia entre eles. No mais, existem as multides, as quais Jesus organiza apenas uma vez, e istoa fim de multiplicar pes. De resto... Elas vm e vo... Ficam ou no... Voltam ou nunca maisaparecem... Gostam ou se escandalizam... Maravilham-se ou acham duro o discurso... Mas Jesus nadafaz para mudar isso. Ele apenas segue e ensina a Palavra, enquanto cura os que encontra.

    No! Jesus no pretendia que Seus discpulos fossem mais irmos uns dos outros do que de todos os

    homens.

    No! Jesus no esperava que o sal da terra se confinasse a quatro dignas paredes de um SaleiroComunitrio.

    No! Jesus no deseja tirar ningum do mundo, da vida, da sociedade, da terra... Mas apenas deseja quesejamos livres do mal.

    No! Jesus no disse "Eu sou o Clube, a Doutrina e a Igreja; e ningum vem ao Pai seno por mim".

    Assim, na assemblia dos chamados para fora, todos se encontram com o irmo de f e tambm com o

    prximo que no tem f, mas so tratados com amor e simplicidade.

    Em Jesus, o discpulo apenas um homem que ganhou o entendimento do Reino e vive como seucidado, no numa 'comunidade paralela', mas no mundo real.

    A COMUNIDADE DOS "DO CAMINHO"

    No livro de Atos dos Apstolos, um dos modos de designar a Igreja como comunidade dos discpulosera cham-la de "o Caminho", e os discpulos, de "os do Caminho". Portanto, tal designao anteriorao tempo em que os cristos vieram a ser "oficialmente" nomeados "cristos".

    Paulo o apstolo em razo de quem essa designao de "o Caminho" mais aparece em Atos. Noincio, ele perseguia "os do Caminho"; ou, como ele tambm diz, "... para levar presos os que eram doCaminho", ou ainda "... este Caminho, ao qual chamais de seita...".

    Ora, a designao "o Caminho" , no meu modo de ver, aquela que melhor expressa o esprito doEvangelho como movimento humano no mundo. E por qu?

    Primeiro, porque Jesus o Caminho.

    Segundo, porque o chamado da f "hebreu", e ser hebreu ser algum do caminho, da viagem, da

    peregrinao, como foi Abrao, o hebreu

    o Pai da F. "Hebreu" vem da raiz da palavra que expressao ato de cruzar, de atravessar, de seguir em frente.

    E terceiro, porque, historicamente, um dos maiores problemas da Igreja foi o fato de que ela deixou omundo e, assim, deixou de ser Caminho no cho da Terra.

    Por conta disso, logo a palavra "igreja" passou a designar algo geogrfico, fixo, esttico e imutvel, eperdeu assim sua vocao caminhante e, por essa via, tornou-se cada vez mais uma estrutura que vivede sua prpria institucionalizao.

    No entanto, a designao "o Caminho" prope que a Igreja seja a comunidade dos que se renem para

    adorar, discernir a Palavra e ajudar-se mutuamente, mas que no se fecham num ambiente e nemchamam o ambiente fsico de "Igreja", posto que Igreja, de fato, um movimento de discpulos que

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    andam no Caminho enquanto trilham a F no cho desse mundo, como gente boa de Deus na Terra!

    Portanto, a referncia paulina aos "do Caminho" , provavelmente, a melhor designao para traduzir oesprito livre, desinstalado, peregrino, ajustvel aos tempos e aos desafios da jornada que o Evangelhoprope aos discpulos de Jesus.

    O Caminho em Cristo, conforme as narrativas dos evangelhos, mais que um lugar ou um "clube deiluminados". Trata-se de um movimento de subverso existencial do Reino de Deus na Terra.

    Por esta razo, o Caminho da Graa feito de gente desafiada a assumir seu papel de sal que se dissolvee some para poder salgar; de fermento que se imiscui na massa e desaparece a fim de subverter com a

    vida do reino; de pequena semente que se torna grande e generosa rvore que a todos acolhe; de Casado Pai para os Filhos Prdigos e tambm para os Irmos Mais Velhos para que se alegrem com a Graado Perdo; e um ambiente espiritual no qual at o "administrador infiel" possa se "consertar", e, assim,tentar fazer o melhor do que restou.

    No Caminho, todos so irmos e ningum juiz do outro. Assim, ajudam-se, mas no se esmagam uns

    aos outros, posto que no Caminho todos caem e se levantam; todos se enfraquecem, mas nodesanimam; todos so humanos, e, com humanidade so tratados, conforme o Dogma do Amor.

    E o mesmo Dogma no permite abusos de uns para com os outros, posto que o Caminho de Graa ePerdo; e no a espinhenta vereda da disputa, da supremacia e do abuso; pois a Graa jamais ser aGraxa dos descomprometidos!

    Jesus nunca quis fundar uma religio. Essa foi a razo pela qual nada foi mais danoso para a genuna fdo que terem-na feito tornar-se uma religio entre as demais.

    Seguir Jesus aceitar o seu modo de ser, assumir como vida as Suas palavras e dar testemunho do

    Evangelho no como uma "estratgia de evangelizao" (proselitismo e marketing), mas como a naturalvocao da Vida em Cristo.

    O MODELO DO CAMINHO

    O que ser, ento, que o Senhor tinha em mente quando disse aos seus discpulos que permanecessemem Jerusalm at que do Alto fossem revestidos de poder (Atos 1.4)?

    Jesus determinara que o poder do Esprito os fizesse sair em desassombro pelo mundo, pregando aPalavra da Boa Nova, ensinando singelamente os discpulos a serem de Jesus em suas prprias casas e

    culturas.

    Desse modo, se teria sempre um movimento hebreu, crescente, progressivo, livre, guiado pelo Esprito,e completamente semelhante ao que eles haviam vivido com Jesus durante o Caminho, naqueles trsanos de estrada que construram o Evangelho ao ar livre, nas praias da Galilia, nos desertos da Judia,nas passagens por Samaria, nas terras de Decpolis, e nos confins da Terra.

    Tudo o que Jesus queria era que os discpulos continuassem discpulos, e que os apstolos fossem osservos de todos; sem haver nem algum maior, e muito menos, um lugar mais santo ou um centro depoder.

    O que sei que Jesus esperava que tudo quanto Ele havia dito antes acerca de como se deveriaproceder, de cidade em cidade, fosse agora vivido como uma ao contnua, num fluxo ininterrupto,

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    num vai e vem constante, e como um poder que nunca tivesse um trono, nem uma cidade santa, nemum vaticano.

    Algum, com razo, diria que tal projeto no seria possvel, visto que ningum consegue viver sem umcentro de poder. Entretanto, parece que ainda no se discerniu que o convite de Jesus contrrio atoda lgica de poder, e no prope nada que no seja Hoje, e que no obriga ningum a pavimentar o

    futuro de Deus na Terra mediante a construo de alguma coisa duradoura.

    O que os cristos precisam saber que Jesus no era cristo, e que nem tampouco quis Ele fundar oCristianismo, nem mesmo teve interesse em algo que se assemelhasse "civilizao crist", conformens a conhecemos de 332 de nossa era at hoje.

    Na realidade, quem entendeu o Evangelho e seu significado sabe que o "cristianismo" se tornou umaperverso da proposta de Cristo, transformando o Evangelho puro e simples numa religio, comdogmas, doutrinas, usos, costumes, tradies imutveis e muita barganha com os homens, em franca epag manipulao do nome de Deus. Um ateu famoso no est errado ao afirmar o bvio: "A religioagrava e exacerba os conflitos humanos, muito mais do que o tribalismo, o racismo ou a poltica." (Sam HarrisCarta

    a uma Nao Crist).

    O poder dos discpulos, paradoxalmente, est em no ter poder. E o convite, para que se morra a fimque se tenha vida, tambm para a igreja, que ansiosa para mandar na vida e controlar o mundo.

    Assim, pretendendo "salvar" a sua vida neste mundo, a igreja no s perde a sua prpria vida, mas deixade ganhar o mundo.

    Para Jesus, o duradouro era justamente aquilo que no se poderia pegar, nem fixar, nem pontuar, nemser objeto de visitas tursticas, dada a permanncia sucessiva do arbtrio caracterizado pelo cheiro daurinas dos mandes.

    O que Jesus queria era uma multido de seres-sal-e-luz se espalhando pela terra, e, se diluindo emsabores e luzes que s seriam sentidas, mas jamais se tornando em Salinas ou em Usinas de luz crist, aserem visitadas pelos curiosos.

    Ele esperava que os discpulos fossem como o Mestre, e que aqueles anos de Caminho no ficassemcristalizados nas pginas dos registros dos evangelhos, mas que se tornassem um modo de ser daquelesque O seguem.

    J o Reino de Deus como o fermento escondido... At que invade e permeia toda a massa dahumanidade... Sem ningum saber como! E sem que ningum possa dar glria a mais ningum, senoao Pai que est nos cus.

    Alis, a proposta de Jesus to extraordinria que a vontade de aparecer no pode resisti-la. O sal, porexemplo, foi usado por Jesus como ilustrao desse 'desaparecimento' da Igreja na terra. Ele associa osal ao sabor, e nada mais. O sal tem que ter sabor, seno j no presta para nada! E para que o sal salguee d sabor, de fato, ele tem que se dissolver nos elementos que recebem o seu benefcio. O sal s salgaquando morre como sal visvel e se torna apenas gosto, presena, tempero, realidade e bem, emboraningum possa dizer onde ele est, podendo apenas dizer: Ele est na panela. Mas onde?

    J a Luz do mundo"vs sois!"deveria ser a ao contnua da bondade e da misericrdia; de talmodo que os "de fora", ao receberem os benefcios da luz, pudessem discerni-la como boas obras, eassim, eles mesmos, agradecessem a Deus pelos filhos da misericrdia que Ele espalhou pela terra.

    Entretanto, o que Jesus prope, como simplicidade total, logo deu lugar s complexidades regimentais e

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    aos centros de poder. Mesmo dizendo "tal no entre vs"referindo-se ao poder de governar dosreis e autoridades, o que se criou desde bem logo foi aquilo que era comum, no o que eracompletamente incomum.

    No cristianismo, Deus tem Seus representantes fixos e certos na terrao clero, seja ele catlico ouprotestante, tem suas doutrinas e dogmas escritos por conclios de homens patrocinados por reis e

    tem na sabedoria deste mundo seu instrumento de elaborao lgica de Deus: a teologia.

    Desse modo, no cristianismo, "Deus" no passa de uma 'potestade religiosa' e de um poder mantidopelos homens, posto que se acredita que sem o cristianismo, Deus est perdido no mundo.

    O mundo conheceu o Cristianismo, mas no teve muita chance de conhecer o Evangelho conformeJesus e segundo as dinmicas livres e libertadoras do Caminho, narradas nos evangelhos, nas quais onico convite que existe para "seguir" Jesus.

    O Brasil, por exemplo, est cheio de Cristianismo, e, paradoxalmente, quase morto do Evangelho.

    O CAMINHO NO UMA REFORMA!

    Mas e a Reforma? Para que serviu, ento? Qual o fruto dela hoje? Diante do exposto, talvez no seja ahora de propor uma Nova Reforma, tal quais alguns tm idealizado?

    No! Reformar a religio ainda "remendo de pano novo em veste velha"! Buscar reformar ocristianismo nada muda, visto que apenas se adia o comprometimento radical que o Evangelho requer!

    O Evangelho no prope uma religio, mas um Caminho Existencial!

    A Reforma Protestante elegeu 95 teses; arrancou os dolos do lugar do culto, e os retirou da devoodos fiis; aboliu o papado, acabou com boa parte do clero conforme a formatao catlica, e afirmouque a Graa, Cristo, a Escritura e a F eram os 'pilares' sobre os quais a igreja deveria ter seusfundamentos. No entanto, a Reforma seguiu se utilizando dos mesmos mtodos de estudo einterpretao bblica, criando seus prprios credos, dogmas, doutrinas e leis morais. A Reforma tornou-se num Catolicismo que fez Dieta.

    De fato, a coragem que se demanda desta gerao bem maior do que aquela que levou camponesesoprimidos pelo papado de Roma Reforma Protestante. Digo isto porque, naquele caso, a mudanano era radical. O Evangelho permaneceu 'aprisionado' Religio; e a coragem revolucionria para se

    viver o processo contnuo de converso e de no-conformao com este mundo aquela que se deixa

    levar pelo vento do Esprito e caminha pela F em contnuo processo de transformao

    Caminho da Graa

    Estaes do Caminho: Texto de orientao