o calvário e a missa - fulton sheen

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O Calvário e a MissaArcebispo Fulton J. Sheen, PH. D., D.D; tradução de Marta de Mesquita da Câmara Livraria Fiqueirinhas, Porto.REFLEXÕES SOBRE O CALVÁRIO E A SANTA MISSA"O monte Calvário é o monte dos amantes." (São Francisco de Sales)ÍNDICE Introdução 1ª Parte: A Confissão 2ª Parte: O Ofertório 3ª Parte: Sanctus 4ª Parte: A Consagração 5ª Parte: A Comunhão 6ª Parte: Ite, Missa est 7ª Parte: O Último EvangelhoPRÓLOGOHá certas coisas na vida que são demasiado belas para serem esqueci

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O Calvrio e a MissaArcebispo Fulton J. Sheen, PH. D., D.D; traduo de Marta de Mesquita da Cmara Livraria Fiqueirinhas, Porto.REFLEXES SOBRE O CALVRIO E A SANTA MISSA

"O monte Calvrio o monte dos amantes." (So Francisco de Sales)

NDICE Introduo 1 Parte: A Confisso 2 Parte: O Ofertrio 3 Parte: Sanctus 4 Parte: A Consagrao 5 Parte: A Comunho 6 Parte: Ite, Missa est 7 Parte: O ltimo Evangelho

PRLOGO

H certas coisas na vida que so demasiado belas para serem esquecidas como, por exemplo, o amor de me. O retrato daquela que nos deu o ser para cada um de ns uma espcie de tesouro. O amor dos soldados que sacrificaram as suas vidas pelo seu pas tambm demasiadamente belo para que o deixemos cair no olvido e, por isso, prestamos homenagem sua memria. A maior bno, porm, de quantos vieram ao mundo, foi, certamente, a visita do Filho de Deus, sob a forma humana. Sua vida, superior a todas as vidas, demasiadamente bela para ser esquecida, e por isso que exaltamos a divindade das Suas palavras na Sagrada Escritura, e a caridade dos Seus feitos nas nossas aes de cada dia. Infelizmente, algumas almas limitam-se apenas a estas lembranas quando, na verdade, por muito importantes que sejam essas palavras e aes, no so a maior caracterstica do Divino Salvador. O ato mais sublime da histria de Cristo foi a Sua Morte. A morte sempre importante porque sela um destino. Qualquer homem moribundo representa um cenculo, e este sempre um lugar sagrado. A literatura do passado deu especial relevo s emoes que rodeiam a morte, e essa a razo pela qual ela nunca passou de moda. De todas as mortes registradas no mundo dos homens, nenhuma, no entanto, foi to importante como a morte de Cristo. Todo aquele que nasceu veio ao mundo para morrer. A morte foi um triste ponto final para a vida de Scrates, mas foi uma coroa para a vida de Cristo. Ele prprio nos disse que veio para dar a Sua vida pela redeno de muitos. Ningum poderia tirar-Lha, mas Ele podia dla voluntariamente. Se, portanto, a morte foi o principal momento para o qual Cristo viveu, ela foi tambm a nica coisa pela qual Ele quis ser lembrado. Jesus no pediu aos homens que registrassem as Suas palavras numa Escritura, nem to pouco que a Sua bondade para com os pobres ficasse gravada na histria; mas pediu que os homens recordassem a Sua morte. Para que essa memria no fosse entregue ao acaso das narrativas humanas, Ele prprio instituiu a maneira como devia ser lembrada. Essa memria foi instituda na noite anterior Sua morte e, desde ento, se chamou A ltima Ceia. Tomando o po nas Suas mos, Jesus disse: este o Meu Corpo que se d por vs; fazei isto em memria de Mim. Tomou tambm depois, da mesma maneira, o clice, dizendo: Este o clice do Novo Testamento em Meu Sangue que ser derramado por vs (S. Lucas, 22,19-20).

E, assim, num smbolo incruento da separao do Sangue e do Corpo, pela consagrao do Po e do Vinho, Cristo oferece-Se vista de Deus e dos homens, e representou a Sua morte que devia ocorrer s trs horas da tarde do dia seguinte. Ele oferecia-Se para ser imolado como vtima, e para que os homens nunca esquecessem que jamais homem algum dera maior prova de amor do que Aquele que renunciava vida, em favor dos Seus amigos, e deu Igreja esta ordem divina: Fazei isto em memria de Mim. No dia seguinte, Jesus realizou em toda a plenitude a cerimnia simblica da vspera, pois foi crucificado entre dois ladres; e o Seu sangue foi derramado pela redeno do mundo. A Igreja que Cristo fundou, no s preservou a palavra que Ele proferiu como ainda o ato que praticou, no qual ns recordamos a Sua morte na Cruz, e que o Sacrifcio da Missa memria da ltima Ceia e prefigurao da Paixo de Jesus. Por esta razo, a Missa , para ns, o ato culminante da amizade crist. O plpito, onde as palavras de Jesus so repetidas, no nos une a Ele; o coro, no qual os suaves sentimentos so cantados, no nos aproxima tanto da Sua Cruz. Um templo sem altar de sacrifcio no existiu entre os prprios povos primitivos, e nada significa entre os cristos. Na Igreja Catlica , pois, o altar, e no o plpito, ou o coro, ou o rgo, que representa o centro de amizade, pois ali que se renova a memria da Paixo. O valor do ato no depende daquele que o celebra, mas sim e apenas do Sumo Sacerdote e Vtima, Nosso Senhor Jesus Cristo. Ali estamos unidos com Ele, a despeito da nossa insignificncia; de certa maneira, perdemos a nossa individualidade, durante aquele espao de tempo; unimos o nosso esprito, a nossa vontade, o nosso corpo, a nossa alma e o nosso corao to intimamente com Jesus que o Pai Celeste no a nossa imperfeio que v, pois contempla-nos atravs de Aquele que o Seu Filho Bem-Amado, no qual Ele ps toda a Sua complacncia. A Missa o maior acontecimento da histria da humanidade: o nico Ato sagrado que afasta a ira de Deus de um mundo pecador, porque eleva a Cruz entre a terra e o Cu, renovando assim aquele decisivo momento em que a nossa triste e trgica humanidade viu desenrolar-se na sua frente o caminho para a plenitude da vida sobrenatural. O que importante acentuar a atitude mental que cada um de ns deve adotar perante a Missa, no encarando o Santo Sacrifcio da Cruz como um acontecimento ocorrido h mil e novecentos anos, mas sim como um fato acontecido em todas e cada uma das ocasies em que a ele assistimos. Esse acontecimento no pertence ao passado, tal como a Declarao do Dia da Independncia, pois um drama permanente, sobre o qual o pano ainda no desceu. No, no pensemos que o fato ocorreu h muito e no nos diz, portanto, mais respeito do que qualquer outro fato ocorrido no passado. O CALVRIO PERTENCE A TODOS OS TEMPOS E A TODOS OS LUGARES E foi por isso que Jesus, quando subiu ao alto do Calvrio, estava praticamente despojado das Suas vestes. Ele poderia ter salvo o mundo sem ter revestido os atavios de um mundo transitrio. A Sua tnica pertencia ao tempo, e localizava, fixava Jesus como um habitante da Galilia. Agora, porm, despojado das Suas vestes e completamente desapossado das coisas terrenas, Ele no pertencia Galilia, nem a qualquer provncia romana, mas sim ao mundo. Jesus transformara-Se no pobre homem universal, que no pertencia a qualquer povo, mas sim a todos os povos. Para exprimir com maior amplitude a universalidade da Redeno, a cruz foi erguida nas encruzilhadas da civilizao, num ponto central, entre trs grandes culturas Jerusalm, Roma e Atenas, em nome das quais Ele fora crucificado. A cruz foi, assim, erguida perante os olhos dos homens para chamar a ateno do negligente, fazer apelo ao desleixado, e despertar as conscincias adormecidas. Foi o nico fato irrefutvel ao quais as culturas e civilizaes do Seu tempo no puderam resistir, e tambm nos nossos tempos o nico fato irrefutvel que no podemos deixar de aceitar. Os personagens que tomaram parte do drama da cruz foram os smbolos de todos aqueles que crucificaram. Ns estivemos l, nas pessoas dos nossos representantes. Os que atualmente fazemos ao Cristo Mstico fizeram-no eles ao Cristo histrico, em nosso nome. Se temos inveja dos bons, fomos representados pelos Escribas e Fariseus. Se hesitamos em abraar a Verdade e o Amor divino, receando perder algumas vantagens temporais, estivemos l, na pessoa de Pilatos. Se a nossa confiana baseada na fora material e procuramos conquistar o mundo por meio dela, em vez de o fazermos atravs da fora espiritual, fomos representados por Herodes. E, assim, a histria continua, e implica em si todos os pecados caractersticos do mundo, pecados que nos cegam para o fato de que Jesus Deus. Havia,

portanto, uma irrefutvel certeza na crucifixo. Os homens que tinham a liberdade para pecar, tambm a tinham para crucificar. Enquanto o pecado existir no mundo, a crucifixo uma realidade. Assim o comentou o poeta: Eu vi passar o Filho de Deus. Coroado de espinhos... E perguntei: Pois no est tudo consumado? Senhor, as amarguras no esto esgotadas? Jesus volveu para mim um olhar terrvel E disse-me: Pois no compreendeste? Toda a minha alma um calvrio, Todo o pecado uma cruz. Ns tivemos l durante a crucifixo. O drama estava j completo, em tudo quanto dizia respeito a Cristo, mas no estava ainda patenteado, em relao a todos os homens, a todos os lugares e a todos os tempos. Se a bobina em volta da qual est enrolado o filme tivesse conscincia prpria, ela conheceria o argumento de um drama, do princpio at ao fim, ao passo que o espetculo no poderia, de fato, conhec-lo, seno depois de o ver completamente reproduzido na tela. Da mesma maneira, Nosso Senhor, pregado na Cruz, viu a Sua eterna vontade, todo o drama da histria, a histria de cada alma e a hora em que cada uma delas reagiria perante a Sua crucifixo; embora, porm, Ele visse tudo, ns no poderamos saber como reagiramos perante a Cruz, antes que as nossas vidas tivessem sido projetadas sobre a tela do tempo. Ns no tnhamos a conscincia de havermos estado presentes no Calvrio, naquele dia, mas Jesus tinha a conscincia da nossa presena. Hoje, todavia, sabemos qual o papel que desempenhamos no cenrio do Calvrio, pela maneira como vivemos e agimos no cenrio do Sculo Vinte. E nisto que reside a atualidade do Calvrio, a razo pela qual a cruz a crise, e o motivo pelo qual, de certa maneira, as chagas ainda esto abertas, a dor divinizada, e as gotas de sangue, maneira de estrelas, caem ainda sobre as nossas almas. No possvel fugirmos cruz, a no ser que faamos o que fizeram os Fariseus ou vendendo Cristo, como o fez Judas, ou crucificando-O, tal como fizeram os seus carrascos. Todos ns vemos a Cruz, quer para abrala, para nos salvarmos, quer fugindo dela, para nos perdermos. Como , porm, que a cruz se torne visvel? Como se perpetuou e renovou o cenrio do Calvrio? No Santo Sacrifcio da Missa, porque, quer no Calvrio, quer durante o Santo Sacrifcio, o Sacerdote e a Vtima so os mesmos. As sete palavras derradeiras so idnticas s sete partes da Missa. Assim como as sete notas musicais comportam uma infinita variedade de harmonias e combinaes, tambm na Cruz h sete notas divinas que o Cristo moribundo fez soar atravs dos sculos e que, no seu conjunto, constituem a sublime melodia da Redeno do mundo. Cada palavra uma parte da Missa. A primeira, "Perdoai-lhes", representa o Confiteor; a segunda, "Hoje estars comigo no paraso", o Ofertrio; a terceira, "Mulher, eis aqui o teu filho", o Sanctus; a quarta, "Por que me abandonaste?", a Consagrao; a quinta. "Tenho Sede", a Santa Comunho; a sexta, "Tudo est consumado", o "Ite missa est"; a stima, "Pai, nas Vossas mos entrego o Meu esprito", o ltimo Evangelho. Representai, pois, na vossa idia, o Sumo Sacerdote, Cristo, saindo da sacristia do Cu para o altar do Calvrio. Ele j se revestiu da nossa natureza humana, colocou no brao o manpulo do nosso sofrimento, a estola do sacerdote, a casula da Cruz. O Calvrio a Sua Catedral; a rocha do Calvrio a pedra do altar; o rubor do sol poente a lmpada do Santurio; Maria e Joo so as imagens vivas dos altares laterais; a Hstia o Corpo de Jesus; o vinho o Seu sangue. Ele est de p, como sacerdote, e prostrado, como vtima. A Sua Missa vai comear.

CONFISSO (1 PARTE)

Pai, perdoai-lhes, porque eles no sabem o que fazem. (Lc. 23,34) A Missa principia com a confisso. A confisso uma prece na qual confessamos os nossos pecados e pedimos Nossa Me Santssima e aos Santos para que intercedam junto de Deus pelo nosso perdo, pois apenas os limpos de corao podero ver a Deus. Nosso Senhor inicia tambm a Sua Missa com a Confisso, embora ela seja diferente da nossa neste ponto: Ele Deus e, portanto, sem pecado. Qual de vs me argir de pecado? A sua Confisso no pode, portanto, ser uma prece pelo perdo dos Seus pecados, mas sim uma orao pelo perdo dos nossos pecados. Outros teriam gritado, amaldioado, ter-se-iam contorcido, quando os cravos atravessaram os Seus ps e as Suas mos. Nem a revolta nem a vingana encontram, porm, lugar no peito do Salvador; os Seus lbios no proferem uma nica exclamao de represlia contra os Seus algozes, nem sequer murmuram uma prece para obter mais foras que Lhe ajudem a suportar as Suas dores. O Amor Incarnado esquece a angstia e, naquele momento da agonia concentrada, revela algo na altura, da profundidade e inspirao do maravilhoso amor de Deus, quando Jesus pronuncia a sua Confisso: Pai, perdoai-lhes, porque eles no sabem o que fazem. Ele no disse Perdoa-Me, mas sim perdoai-lhes. O momento da morte era, certamente, o mais adequado para provocar a confisso do pecado, porquanto a conscincia, na solenidade das ltimas horas, afirma a sua autoridade. Nem sequer esboo de contrio se escapou dos Seus lbios. Jesus associou-Se aos pecadores, mas nunca Se associou ao pecado. Tanto na morte como na vida, Ele nunca teve a conscincia de ter descurado um nico dever para com Seu Pai Celestial. E por qu? Porque um homem imaculado, absolutamente isento de culpa, algo mais que um homem Deus. E nisso que reside diferena. Ns vamos buscar as nossas oraes s profundidades da nossa conscincia do pecado: a prpria palavra perdoa, prova que Ele o Filho de Deus. Repare-se nos termos em que Jesus pediu a Seu Pai que nos perdoasse - Pai, perdoai-lhes, porque eles no sabem o que fazem. Quando algum nos ofende ou censura sem razo, ns comentamos amargamente a falta de conhecimento de quem assim procede. Quando, porm, ns pecamos contra Deus, Ele encontra uma desculpa para perdoar a nossa ignorncia. No h redeno para os anjos cados. As gotas de sangue que caem da Cruz, na Missa de Sexta-Feira Santa de Cristo, no tombam sobre as suas cabeas. E por qu? Porque eles sabiam o que faziam. Eles previam as conseqncias dos seus atos, to claramente como ns vemos que dois mais dois so quatro, e que uma coisa no pode existir e deixar de existir, ao mesmo tempo. Verdades desta natureza, uma vez compreendidas, no podem ser refutadas, pois so irrevogveis e eternas. Foi essa razo pela qual, quando os anjos decidiram revoltar-se contra o Altssimo, no puderam voltar atrs com a sua deciso. Eles sabiam o que estavam a fazer!

Conosco, no entanto, diferente. Ns no vemos as conseqncias dos nossos atos com a mesma clareza,

porque somos mais ignorantes que os anjos. Se, contudo, soubssemos que cada pecado de orgulho tece uma coroa de espinhos para a fronte de Jesus; se soubssemos que cada transgresso dos Seus Divinos Mandamentos a negao da prpria Cruz; se soubssemos que os atos da avareza e soberba correspondem aos cravos que trespassam as mos e ps de Jesus; se, conhecendo a bondade de Deus, continussemos a pecar, nunca teramos sido salvos. apenas a nossa ignorncia do infinito amor do Sagrado Corao que nos abrange na prece da Sua Confisso, pronunciada do alto da Cruz: Pai, perdoai-lhes porque eles no sabem o que fazem. Estas palavras devem ser gravadas no ntimo das nossas almas, e no constiturem desculpa para a nossa reincidncia no pecado, mas serem, antes, um motivo de contrio e penitncia. O perdo no uma negao do pecado. Nosso Senhor no nega o horrvel fato do pecado, e precisamente neste ponto que o mundo erra, pois considera-o como que um retrocesso ao processo evolucionrio, uma sobrevivncia de influncias do passado e identifica-o com a verbosidade psicolgica. Numa palavra, o mundo moderno nega o pecado. Nosso Senhor lembra-nos que ele a mais terrvel de todas as realidades. Sendo assim, porque, , porm, que Ele deu uma cruz queles que no pecam? Porque que deixou derramar sangue inocente? Porque que esto ligados ao pecado, sentimentos horrveis, como a cegueira moral, a covardia, o dio e a crueldade? Porque que Ele saiu do reino do imaterial, revestiu a forma material, e permitiu que a Inocncia fosse crucificada num madeiro? Jesus, que amou os homens at a ponto de morrer por eles, permitiu que o pecado exercesse a sua vingana sobre Ele, para mostrar todo o horror representado pela crucifixo de Aquele que mais amava. Aqui, no h, portanto, negao do pecado; a despeito de toda a monstruosidade que ele representa, a Vtima perdoa. A morte de Jesus revela a suprema depravao do pecado, mas tem tambm a marca de perdo divino. Sendo assim, no h homem que, olhando para um crucifixo, possa afirmar que o pecado no uma coisa grave, nem tambm possa asseverar que ele no tem perdo.

Pela maneira como sofreu, Jesus revelou a realidade do pecado. Pela maneira como suportou os seus tormentos, Ele revela a Sua compaixo pelo pecador. Ele a Vtima que sofreu e perdoa. Assim na Vtima, to humanamente bela, to divinamente adorvel, qualquer de ns pode recordar um Grande Crime e um Grande Perdo. Sob o escudo, que o sangue de Cristo, podem abrigar-se os maiores pecadores, pois esse sangue tem o poder de sustar as mars da vingana que ameaam submergir o mundo. O mundo pode explicar o pecado sua maneira e desculp-lo; s, no Calvrio, podemos encontrar o perfeito conhecimento da divina contradio do pecado perdoado. A renncia voluntria e o divino amor transformam o pecado na ao mais nobre e na mais suave e piedosa splica que o mundo jamais viu e ouviu a Confisso de Cristo: "Pai, perdoai-lhes, porque eles no sabem o que fazem. Aquela palavra perdoai, que soou do alto da Cruz naquele dia em que o pecado se ergueu a toda a altura e com toda a sua fora, para ser vencido pelo Amor, produziu um eco que ainda no se extinguiu. Pouco antes da Sua Morte, o Divino Salvador institua os meios para prolongar o perdo, atravs do espao e do tempo, at ao fim do mundo. Reunindo Sua volta os membros da Sua Igreja, Ele disse aos Seus Apstolos: Aquele a quem perdoardes os pecados sero perdoados. Em qualquer ponto do mundo dos nossos dias, desde ento, os sucessores dos Apstolos tm o poder de perdoar. No nos cabe perguntar: Mas, como pode um homem absolver os pecados, se, realmente, um homem no tem esse poder? Deus quem perdoa, por intermdio do homem. Pois no foi essa a maneira como Ele perdoou queles que o pregaram na Cruz, visto que estava revestido da natureza humana? No ser, pois, razovel esperar que Ele nos perdoe os pecados por intermdio de outras naturezas humanas, s quais Ele conferiu esse poder? E onde encontraremos essas naturezas humanas? Lembro, a propsito, a histria daquela caixa, cujo contedo fora durante muito tempo ignorado e at ridicularizado pela sua provvel insignificncia, at ao dia em que foi aberta e se descobriu que encerrava o corao de um gigante. Esse caixa existe em todas as igrejas catlicas, e damos-lhe o nome de confessionrio. Alguns ignoram-na, ou escarnecem-na; mas a verdade que nela se

contm o Sagrado Corao de Jesus que perdoa aos pecadores, por meio da mo do sacerdote que se ergue, tal como Ele perdoou, quando as Suas mos se ergueram e foram pregadas nos braos da Cruz. Na realidade, existe apenas o perdo de Deus. A exclamao Perdoai-lhes, foi proferida uma vez num ato divino e eterno, com o qual a humanidade entrou em contacto atravs dos tempos. Assim como no podemos ouvir as melodias e palavras que pairam no ar, a no ser que liguemos os rdio-receptores, tambm as nossas almas s podem sentir a alegria eterna da divina exclamao Perdoai-lhes, acorrendo ao confessionrio, onde nos ser dado ouvir a divina palavra soltada do alto da Cruz. Deus deseja que, em vez de negar a culpa, o esprito dos nossos dias a admita, olhe para a Cruz, em busca do perdo; Deus quer que as conscincias desassossegadas, que no podem encarar a luz e receiam as trevas, procurem alvio, no no domnio da medicina, mas sim na Divina Justia. Aqueles cujos espritos esto imersos nas sombras, devem recorrer confisso, nico meio de expurgar as suas culpas. Em vez de enxugar as suas lgrimas em silncio, os pobres mortais devem procurar a mo que lhes enxugue o pranto e os absolva. A maior tragdia da vida humana no , precisamente, aquilo que s almas acontece, mas sim aquilo que lhes falta. E haver maior tragdia do que a falta de paz, provocada pelo estado de pecado, cuja absolvio se no procura? A confisso, proferida aos ps do altar, uma declarao da nossa ausncia de merecimento: o Confiteor da Cruz a nossa esperana de perdo e absolvio. As feridas do Salvador foram terrveis; a pior de todas, porm, ser aquela que for infligida pelas nossas culpas. O Confiteor pode salvar-nos, pois, quando o pronunciamos, admitimos que carecemos de perdo, e muito mais do que podemos supor. Conta-se que certa religiosa, estando um dia a limpar do p uma pequena imagem do Salvador, a deixou cair. Apanhou-a, intacta, beijou-a e colocou-a no seu lugar, dizendo: Se no tivsseis cado, no tereis recebido este sculo. Penso, a propsito, se Deus Nosso Senhor seria para ns o que , se jamais tivssemos pecado, pois, se assim fosse, no poderamos chamar-Lhe Salvador.

O OFERTRIO 2 PARTE

"Em verdade te digo que hoje estars comigo no Paraso". (Lc. 23,43) Chegamos agora ao Ofertrio da Missa, pois Nosso Senhor oferece-Se ao Seu Pai Celestial. Para nos lembrar, porm, que no Se oferece sozinho, mas sim em unio conosco, Ele junta Sua oferta a alma do ladro crucificado Sua direita. Para que a Sua ignomnia fosse mais completa, num golpe de maldade suprema, crucificaram-nO entre dois ladres. Durante a Sua vida, Jesus andara entre os pecadores; foi, pois, entre eles que Lhe ergueram a Sua cruz. O Salvador modificou o quadro, e fez dos dois ladres dois smbolos - a ovelha e o bode - representando assim aqueles que estaro Sua direita e Sua esquerda, quando Ele descer, por entre as nuvens do Cu, com a Sua Cruz triunfante, a julgar os vivos e os mortos. Ambos os ladres, a princpio, revoltaram-se e blasfemaram; mas um deles, aquele a quem a tradio chamou Dimas, voltou a sua cabea para ler na face do Salvador crucificado a resignao e a dignidade. Tal como um pedao de carvo arremessado ao fogo se transforma numa brasa resplandecente, luminosa, tambm a alma escura daquele ladro, arremessada s chamas da crucificao, se abrasou no amor do

Corao Divino. Enquanto o ladro da esquerda dizia: "Se s o Cristo, salva-Te e salva-nos", o ladro arrependido censurava-o; "No temes a Deus, visto que sofreste a mesma condenao. Ns padecemos justamente, ao passo que este homem nenhum mal praticou". Este mesmo ladro proferiu ento uma prece, no para solicitar um lugar nos cus, mas sim e apenas para no ser esquecido. "Lembra-Te de mim, quando estiveres no Teu reino". Tal tristeza e f no podiam ficar sem recompensa. Naquela ocasio, em que o poderio de Roma no conseguiu que Jesus falasse, quando os Seus amigos julgavam que tudo estava perdido, e em que os Seus inimigos se julgavam vencedores, o Salvador quebrou o silncio. Ele, o Crucificado, transformou-Se em Juiz; Ele, o Crucificado, transformou-Se no Divino Protetor de almas: "Eu te digo, hoje estars comigo no Paraso". Por meio dessas palavras, Nosso Senhor, que estava a oferecer-Se a Seu Pai, como grande holocausto, juntava Sua oferta, na patena da Cruz, a primeira hstia humilde, jamais oferecida na Missa - a hstia do ladro arrependido; uma brasa tirada da fogueira; um feixe desprezado, esquecido pelos ceifeiros da terra; o gro modo da crucificao e transformado em po pela Eucaristia. O Salvador no sofre sozinho na Cruz, pois sofre conosco. E foi essa a razo pela qual Ele uniu o sacrifcio do ladro ao Seu prprio sacrifcio. o que significam as palavras de So Paulo quando diz que devemos sofrer aquelas penas que so necessrias aos sofrimentos de Cristo. Isto no significa que Nosso Senhor no sofresse na Cruz tudo quanto pode sofrer, mas sim que o fsico, o Cristo histrico padeceu tanto quanto cabia na Sua natureza humana, nem que o Cristo Mstico, que o Cristo e ns, no tenha sofrido pela nossa plenitude. Nem todos os ladres que existem na histria do mundo reconheceram as suas culpas, nem tampouco pediram para ser lembrados. Nosso Senhor est agora no Cu e j no pode, portanto, sofrer na Sua natureza humana, mas pode padecer ainda mais nas nossas naturezas humanas e pede-nos que, semelhana do bom ladro, nos unamos a Ele na Cruz, para que, participando da Sua Crucificao, possamos participar da Sua Ressurreio e da Sua glria celestial.

Assim como, naquele dia, Deus Nosso Senhor escolheu o ladro para representar a pequena hstia do sacrifcio, escolhe-nos hoje a ns que, assim, representamos outras tantas pequenas hstias, unidas a Ele, na patena do Altar. Recordemos a Missa, tal como era celebrada nos primeiros sculos da Igreja, antes que as civilizaes tivessem modificado o mundo, sob os pontos de vista econmico e financeiro. Nesses tempos remotos cada qual levava para o Santo Sacrifcio, em cada manh, algum po zimo e algum vinho, dos quais o sacerdote tomava uma pequena parte. O restante era posto de lado, abenoado e destrudo aos pobres. Nos nossos tempos no trazemos o po nem vinho, mas trazemos o equivalente, isto , com que os comprar- as moedas coletadas entre os fiis durante o ofertrio. Qual a razo desta oferta? que o po e o vinho so, entre as coisas de natureza, aquelas que melhor simbolizam a substncia da vida. O trigo a prpria medula, a essncia da terra, e o vinho das cepas o seu prprio sangue. Ambos eles sustentam o nosso corpo e o nosso sangue. A oferta destas duas substncias que alimentam a nossa vida, simbolizam a oferta de ns mesmos no Sacrifcio da Missa. A nossa presena est, sob as aparncias de po e de vinho - os smbolos do nosso corpo e do nosso sangue. Ns no somos apenas simples espectadores passivos, assistindo a um espetculo teatral, pois tambm fazemos a nossa oferta, em unio com Cristo. Poder-se-ia representar o nosso papel neste drama, por meio da seguinte imagem: Uma grande cruz, na qual Jesus est pregado e, em torno do Calvrio, uma multido de pequenas cruzes, outras tantas hstias, por meio

das quais nos oferecemos em unio com Ele, numa pura oblao ao Pai Celestial. Naquele momento cumprimos literalmente a ordem do Salvador: "Tomai a tua cruz diariamente e segue-Me". Ao pronunciar estas palavras, Ele no nos pedia algo que Ele prprio j no tivesse feito. No h, portanto, desculpa para dizer-mos: "Eu sou uma hstia, um holocausto pobre, insignificante", pois tambm o ladro o era. Repare-se que houve duas atitudes na alma daquele ladro, e que ambas foram aceitas por Nosso Senhor. A primeira foi o reconhecimento do fato de que ele mereceu o que estava sofrendo, e que Jesus, que no tinha pecados, no merecera a Sua Cruz. A segunda foi a f n'Aquele que os homens rejeitaram e que o ladro reconheceu como sendo o Rei dos reis. Quais as condies que nos transformam em pequeno holocausto no Sacrifcio da Missa? Como pode o nosso sacrifcio unir-se ao de Cristo e ser aceito, como sucedeu com o ladro? Apenas reproduzindo nas nossas almas as duas atitudes que a alma do bom ladro manifestou; penitncia e f. Antes de mais, faamos penitncia, dizendo: "Eu mereo castigo pelos meus pecados. Preciso fazer penitncia". Quantos ignoram at que ponto tem sido cruis e ingratos para com Deus! E, se assim , no deveramos queixar-nos das mgoas e reveses da vida. Nestas circunstncias, as nossas conscincias assemelham-se a quartos escuros, de onde a luz foi h muito tempo expulsa. Se corrermos as cortinas, verificaremos que tudo quanto julgvamos limpo est coberto de p. Algumas conscincias esto de tal maneira integradas no hbito da desculpa, que dizem, orando, como o Fariseu: "Agradeo-Te, Deus, no ser como resto dos homens". Outros, blasfemam contra Deus e contra o Cu, conta dos seus sofrimentos e pecados, mas no se arrependem. A Guerra Mundial, por exemplo, representou uma expiao do mal e serviu para nos ensinar que no podemos viver no afastamento de Deus; mas o mundo no aprendeu a lio. Tal como o ladro da esquerda, recusa-se penitncia, nega-se a ver qualquer relao de justia entre o pecado e o sacrifcio, entre a rebelio e a Cruz.

Quantos mais contritos formos, tanto menos esforos faremos para fugir nossa cruz. Quanto mais reconhecermos o que somos, mais convictos diremos, como o bom ladro: "Eu mereci esta cruz" Ele no pediu para ser desculpado, nem para lhe serem atenuadas as culpas, nem tampouco para ser libertado ou despregado do madeiro de suplcio. Ele pediu apenas para ser perdoado. Ele fez penitncia porque aceitou o seu holocausto, a sua cruz. Ns no temos tambm outra maneira de nos transformarmos em pequenas hstias, seno unindo-nos a Cristo na Santa Missa. Se os nossos coraes no estiverem despedaados pela tristeza, se no reconhecermos que estamos realmente feridos, como poderemos sentir necessidade de ser consolados e curados? Se no tomarmos a nossa parte de dor na Crucificao, como poderemos pedir que os nosso pecados nos sejam perdoados?

A segunda condio que nos permite ser uma hstia no ofertrio da Missa, a f. O ladro, olhando por sobre a cabea de Jesus, leu a palavra rei. Estranho Rei aquele, que estava coroado de espinhos, e cuja prpura real era o prprio sangue, tinha por trono uma cruz, por cortesos os seus carrascos, e fora coroado na crucificao! A despeito de todos aqueles horrores, o ladro viu o "ouro" e ergueu a sua voz, a sua prece, acima de todas as blasfmias. A sua f era to forte que ele aceitava, contente, a sua cruz. O ladro crucificado esquerda pedia para ser despregado; mas no o da direita, porque ele sabia que h males maiores do que a crucificao, e outra vida para alm da cruz. Ele tinha f no Homem da Cruz central, pois sabia que ele poderia, se quisesse, transformar os espinhos em grinaldas e os pregos em flores. Ele acreditava no Reino que fica para alm da Cruz, e sabia que os sofrimentos deste mundo so insignificantes, comparados com as alegrias futuras. Ele disse como o salmista: "Embora eu siga por entre as sombras da morte, no receio o mal, porque o Senhor est comigo". Tal f assemelhava-se dos trs jovens na fornalha ardente, qual o rei Nabucodonosor os condenara, por se terem recusado a adorar a esttua de ouro. A resposta dos mancebos foi esta: "Deves saber, rei, que o Deus a quem adoramos pode tirar-nos da fornalha de fogo ardente e livrar-nos das tuas mos. E, se Ele o no fizer, fica tu sabendo, rei, que ns no honramos os teus deuses, nem adoramos a esttua de ouro que erigiste".

E, depois de dizerem isto, eles entregaram-se nas mos de Deus e confiaram n'Ele como J. Tambm o bom ladro sabia que Nosso Senhor podia libert-lo, mas no Lhe pediu que o retirasse da cruz, pois tambm Jesus no Se retirava a Si prprio, embora os Seus carrascos escarninhos O desafiassem a isso. Isto no queria dizer que o bom ladro no amasse a vida, porque ele amava-a como todos ns a amamos. Ele desejava a vida, mais a vida eterna que, finalmente, obteve. Tambm dado a cada um de ns descobrir essa Vida, mas s entraremos nela por meio da penitncia e da f que nos une Grande Hstia - ao Sacerdote e Vtima que Cristo. Desta maneira nos transformaremos em ladres espirituais, para, mais uma vez, nos apoderarmos do Cu.

SANCTUS- 3 PARTE

Mulher, eis aqui o teu filho... Eis aqui a tua me. (Joo 19,26-27) Cinco dias antes, Jesus fizera a Sua entrada triunfal em Jerusalm. Aos Seus ouvidos soavam gritos de triunfo; o cho que os Seus ps pisaram foi juncado de folhas de palmeira, e nos ares ecoaram aclamaes ao filho de David, e louvores ao Sagrado Filho de Israel. queles que se mantiveram silenciosos durante as demonstraes feitas em Sua honra, Nosso Senhor lembrou que se as suas vozes no se faziam ouvir, as prprias pedras falariam por eles. Esse foi o dia de nascimento das catedrais gticas. Eles no conheciam a verdadeira razo pela qual Lhe chamavam Sagrado, nem tampouco compreendiam o motivo que levava Jesus a aceitar o tributo dos seus louvores. Eles pensavam que aclamavam uma espcie de rei da terra. Jesus aceitou essas demonstraes porque ia ser o Rei de um imprio espiritual. Ele aceitou os seus tributos, as suas aclamaes e exclamaes de louvor porque caminhava, como uma vtima, ao encontro da Sua Cruz. Toda a vtima deve ser sagrada Sanctus, Sanctus, Sanctus. Cinco dias depois, verificou-se o Sanctus da Missa do Calvrio; mas naquele Sanctus da Sua Missa, Jesus dirigiu-Se queles que j eram santos a Sua querida Me e ao Seu bem-amado discpulo Joo. Palavras tocantes foram essas: Mulher eis aqui o teu filho... Eis aqui a tua Me!. Falando agora aqueles que j eram santos, Jesus no carecia da divina intercesso, pois Ele era o Filho de Deus. Ns, todavia, precisamos de santidade, pois cada vtima da Missa deve ser santificada, impoluta. Como podemos, porm, ser os santos participantes do Sacrifcio da Missa? Segundo a prpria resposta de Jesus, consegui-lo-emos colocando-nos sob a proteo da Sua Me Santssima. Ele dirige-Se Igreja e a todos os seus membros, representados na pessoa de Joo, e diz a cada um de ns: Eis a tua me.

Por que foi, porm, que Jesus se dirigiu a Maria, chamando-lhe Mulher, em vez de Me? que ela era agora a Me de todos os cristos, e a Sua misso era universal Me do Corpo Mstico da Igreja, Me de todos ns. H um tremendo mistrio oculto naquela palavra Mulher. Essa foi, realmente, a ltima lio de renncia que Jesus deu a Maria, e a primeira lio de um novo lao. Nosso Senhor alienara gradualmente a Sua afeio por Sua Me, no porque a amasse menos, mas sim e apenas porque ela tinha agora mais a quem amar. Maria desprendia-se da maternidade da carne, para se prender mais grande maternidade do esprito. Da, o emprego da palavra "Mulher". Ela havia de fazer de ns outros tantos Cristos, porque fora ela quem criara o Filho de Deus. S Maria podia transformar-nos em criaturas santificadas, dignas de pronunciar o Sanctus, Sanctus, Sanctus da Missa do Calvrio. A histria de preparao para o papel de Me do Corpo Mstico de Cristo, est representada nas trs cenas da vida do Seu Divino Filho, as trs lies reveladas no drama do Calvrio, principalmente aquela em que Maria foi chamada a ser, no apenas a Me de Deus, mas tambm a me dos homens, no apenas a me daqueles que j eram santos, mas tambm daqueles que pediam para ser santificados. A primeira teve lugar no Templo, onde Maria e Jos encontraram Jesus, depois de O terem procurado durante trs dias. Sua amada Me disse-Lhe que os Seus coraes tinham sofrido deveras durante aquela angustiosa procura, ao que Jesus respondeu: No sabes que devo ocupar-Me das coisas de Meu Pai? Nestas palavras, Jesus queria significar: Tenho outra misso, alm do trabalho da oficina de carpinteiro. Meu Pai mandou-Me a este mundo para a suprema tarefa da Redeno, por meio da qual todos os filhos dos homens sero filhos adotivos do Meu Pai celestial, tornando-se, assim, membros da grande irmandade de Cristo, o Seu Filho. Quem poder dizer quanta luz estas palavras derramaram sobre Maria? Tambm no sabemos se Ela compreendeu ento que a Paternidade de Deus havia de confiar-Lhe o ttulo de me dos homens. Dezoito anos depois, na festa das bodas de Cana, Maria teve, porm, pleno conhecimento de tal misso. Como consolador pensarmos que Jesus, pregando a penitncia, e insistindo para que tomssemos a nossa cruz diariamente e O segussemos, iniciasse a Sua vida pblica, assistindo a uma boda! Que maravilha compreenso dos coraes humanos! Quando, no decorrer do banquete, o vinho se acabou, Maria, sempre solicita para com aquele que A rodeavam, foi a primeira a reparar e a procurar o remdio para aquela falta. Ela limitou a dizer a Nosso Senhor: No tem vinho; e Ele respondeu: Mulher, e o que importa isso, a mim ou a ti? Jesus no A tratou por Me, mas sim por Mulher, o mesmo ttulo que Lhe dera trs anos antes. Jesus queria dizer-Lhe: Queres que faa algo que Me pertence, como Filho de Deus; pedes-Me que faa um milagre que s Deus pode fazer; pede-Me que exera a minha divindade que se relaciona com a espcie humana, principalmente como seu redentor. Quanto a divindade operar pela salvao do mundo, Vs sers no apenas minha me, mas tambm a me da humanidade redimida. A Vossa maternidade fsica exercer-se- no mundo mais vasto da maternidade espiritual, e essa a razo pela qual Vos chamo mulher. Depois, para provar o poder da intercesso de Maria no Seu papel de me universal, Ele ordenou que enchessem as brilhas de gua e operou-se o primeiro milagre: As guas, conscientes, viram o seu Deus e coraram. A terceira cena ocorreu dois anos depois. Um dia, enquanto Jesus pregava, algum O interrompeu, para dizer: Vossa me no cessa de procurar-Vos, ao que Jesus respondeu: Quem minha me? E, estendendo as mos para os Seus discpulos, disse: Contemplai minha me e meus irmos, pois todo aquele que fizer a vontade de Meu Pai que est no cu, esse meu irmo, minha irm e minha me. O significado destas palavras irrefutvel. H uma maternidade espiritual e parentescos que no so carnais, nem laos de sangue, mas sim ligaes do esprito que nos unem ao Reino Supremo, Irmandade de Cristo. Estas trs cenas tiveram o seu clima junto Cruz onde Maria recebeu o ttulo de Mulher. Foi essa a segunda Anunciao. O anjo dissera-Lhe primeiro: Ave Maria.

Seu Filho falou-Lhe em segundo lugar, tratando-A por Mulher, o que no significa que Ela deixava se ser Sua me, porque havia de ser sempre a Me de Deus. A Sua maternidade havia, porm, de expandir-se, espiritualizar-se, tornar-se universal, pois, naquele momento, Maria ficou sendo Nossa Me. Nosso Senhor criou o lao onde, por natureza, ele no existia, e que s Ele podia criar. E como foi que Maria Se tornou Me dos homens? Tornando-se, no somente me, mas tambm esposa de Cristo. Ele era o novo Ado e Ela a nova Eva. E, tal como Ado e Eva, tiveram a sua prognie natural, que somos ns. Tambm Cristo e Sua Me deram origem, na Cruz, Sua descendncia espiritual, que somos ns os filhos de Maria, ou membros do Corpo Mstico de Cristo. Maria teve o Seu primognito em Belm. Note-se que So Lucas chama a Nosso Senhor primognito, no porque Maria tivesse outros filhos, segundo a carne, pois a Sua segunda maternidade seria de carter espiritual. No momento em que Nosso Senhor Lhe disse Mulher, Ela tornou-se, de certa maneira, esposa de Cristo e concebeu em dor o Seu primeiro filho espiritual, cujo nome foi Joo. O Seu segundo filho no sabemos quem foi. possvel que fosse Pedro, ou Andr. De qualquer maneira, todos ns representamos os milionsimos dos milionsimos descendentes daquela Mulher que permaneceu aos ps da Cruz. A troca foi realmente desvantajosa para Aquela que recebeu o filho de Zebedeu, em vez do Filho de Deus. A nossa vantagem foi, porm, maior, pois, ao passo que Maria no adquiria mais do que filhos insubmissos e tantas vezes rebeldes, ns obtnhamos a mais adorvel das mes que existem no mundo - A Me de Jesus. Ns somos filhos de Maria. - literalmente, filhos. Ela nossa me, no por ttulo de fico, nem de cortesia; ela nossa me porque sofreu naquele momento memorvel, e por todos ns, as dores da maternidade. E porque que Deus quis que ela fosse nossa me? Porque Ele sabia que, sem a sua proteo e auxlio, jamais seramos santificados. Jesus veio at ns por intermdio da pureza de Maria, e s atravs da pureza de Maria conseguiremos chegar at junto d'Ele. Cada vtima que sobe ao altar, sob as espcies de po e de vinho, deve ter proferido o Confiteor e transformarse em vtima santificada. Sem Maria, no h, porm, santificao. Note-se que quando tal palavra foi dirigida a Maria, estava prostrada junto Cruz, uma outra mulher. J repararam que, praticamente, todas as imagens tradicionais da Crucifixo representam sempre Madalena ajoelhada aos ps da Cruz? Nunca vimos, no entanto, uma imagem de Maria prostrada. Joo estava presente e refere no seu Evangelho que ela estava de p. E porque? Porque era a posio que lhe competia no papel que ali desempenhava, em relao a ns. Maria, a nossa Me. Se Maria estivesse prostrada por terra, naquela hora, tal como Madalena, se ela tivesse sequer chorado, a sua mgoa teria tido um lenitivo. As dores que no desatam, esmagam o corao. Essa dor foi parte do nosso preo de compra, pago pela nossa co-Redentora, Maria, a Me de Deus! Nosso Senhor deixou-a ficar sobre a terra quando Ele subiu aos cus, para que ela fosse a me da Igreja, a nossa me. A Igreja, infante ainda, carecia do amparo materno, tal como Jesus quando era menino. E foi assim que Maria permaneceu sobre a terra, at que os seus filhos, a sua famlia se criassem e desenvolvessem. E foi essa a razo porque a encontramos orando com os Apstolos, enquanto aguardavam a vinda do Esprito Santo. Mais tarde, foi para o cu, coroada de Rainha dos Anjos e dos Santos, para assistir a outra boda de Can e interceder por ns, junto ao Salvador, pois ns ramos seus filhos, irmos de Cristo, e filhos do Pai Celestial. Virgem Me! Que formosa conjugao de virgindade e maternidade, em que a segunda supre a deficincia da primeira. virgindade falta qualquer coisa, pois h nela algo de incompleto, que necessita de ser preenchido, uma faculdade invulgar. A maternidade, isolada, perde qualquer coisa: ela representa uma rendio, uma florescncia incompleta, uma frutescncia inacabada. Oh! Foi um milagre divino, essa conjuno, na qual virgindade nada faltava e a maternidade nada perdeu!

Encontramos ambas as coisas em Maria Virgindade e Maternidade- a Virgem que recebeu o Esprito Santo, em Belm e no Pentecostes; me, por intermdio dos Seus milhes de descendentes, desde Jesus at ns. A adorao que prestamos a Maria e aquela que prestamos a Nosso Senhor so distintas, pois veneramos nossa me e adoramos o Salvador. A Jesus pedimos aquelas graas que s Deus pode conceder: merc, graa, perdo. A Maria, suplicamos que interceda por ns, junto dEle, especialmente na hora da nossa morte. Sabemos que Nosso Senhor escuta e atende os apelos de Sua Me Santssima. A nenhum outro santo podemos falar como uma criancinha fala a sua me, pois nenhuma outra virgem, ou me, ou mrtir, ou confessor jamais sofreu tanto por ns como ela sofreu. Ningum jamais firmou to solidamente os nossos direitos proteo e ao amor. Maria a medianeira de todas as graas que Jesus pode dispensar-nos, pois foi por intermdio de Maria que Jesus veio at ns. Desejamos ser santificados, mas sabemos que tal s possvel por meio de Maria, pois ela foi a ddiva que Jesus nos ofereceu no Sanctus da Sua Cruz. No h mulher que possa esquecer o filho das suas entranhas. Maria no pode, pois, certamente, esquecernos. precisamente isso que ns sentimos no ntimo dos nossos coraes. Em todas as circunstncias da nossa vida, nossa Me Santssima vela por ns, pois ela v em cada um dos seus filhos a criana inocente da Primeira Comunho, o pecador penitente, encaminhando-se para a Cruz, o corao despedaado, suplicando que a gua da vida dissipada se transforme no vinho do amor de Deus. Em todas essas circunstncias ressoam aos ouvidos de Maria as palavras pronunciadas do alto da Cruz, sobre o Calvrio: "Mulher, eis o Vosso filho!"

A CONSAGRAO 4 PARTE

eu Deus, meu Deus, por que me abandonastes? (So Mateus 27,46) Eis a quarta palavra da Consagrao da Missa do Calvrio. As trs primeiras palavras foram dirigidas aos homens. A quarta, porm, foi dirigida a Deus. Estamos agora na ltima fase do drama da Paixo. Na quarta Palavra, e em todo o Universo, s existem apenas Deus e Jesus. Esta a hora das trevas. Subitamente, o silncio dessa escurido quebrado por um grito to terrvel e to inesquecvel que at aqueles que no compreenderam a lngua em que foi expresso ho de recordar-se sempre do tom estranho em que foi proferido: Eli, Eli, lamma Sabcthany.

Sim, embora alguns no pudessem compreender essas palavras da lngua hebraica, o tom em que foram ditas no mais lhes esqueceu em toda a sua vida. As trevas que cobriam a terra naquele momento representam apenas o smbolo exterior da noite escura da alma. O sol pode esconder a sua face perante o terrvel crime dos deicidas, mas a verdadeira razo da noite que se estendeu sobre a terra foi a sombra da Cruz que se erguia no Calvrio. Toda a criao ficou imersa nas trevas da dor. Qual foi, todavia, a razo do grito que partiu da escurido? Meu Deus, Meu Deus, por que Me abandonastes? Esse foi o grito de espanto para o pecado, em que o homem abandonou Deus, em que a criatura esquece o Criador, em que a flor despreza o sol que lhe deu fora e beleza. O pecado uma separao, um divrcio da unio com Deus, e do qual derivam todos os divrcios. Desde que Jesus veio a terra para remir os homens dos seus pecados, certo que Ele sabia que havia de sentir esse abandono, esse apartamento, esse divrcio. Ele sentiu-o, antes de mais, no ntimo da Sua alma, tal como a base da montanha, se fosse consciente, sentiria o abandono do sol quando uma nuvem descesse sobre ela, embora os seus cumes se conservassem radiosos, banhados de luz. No havia sombra de pecado na alma de Jesus, embora Ele quisesse sentir os efeitos do pecado, e a terrvel sensao de isolamento e solido a solido do afastamento de Deus. Renunciando divina consolao que poderia pertencer-Lhe, Ele quis mergulhar na tremenda solido da alma que se extraviou de Deus pelo pecado, para expiar a solido do ateu que nega a existncia de Deus e deposita a sua f nas coisas terrenas, a dor do corao despedaado de todos os pecadores que sentem a amargura da ausncia do seu Criador. Jesus foi at ao ponto de remir todos aqueles que no crem e que, na tristeza e na misria, exclamam, blasfemando: Por que que a morte levou tal pessoa?, Por que que perdi aos meus bens?; Porque que hei de sofrer. O Por que que Jesus dirigiu a Seu Pai uma expiao que abrange os porqus soltados por aqueles que blasfemam. Para melhor revelar a sensao de tal abandono, Jesus exteriorizou-o. Porque o homem se apartara de Deus, Ele permitiu que o Seu sangue se separasse do Seu Corpo. O pecado entrara no sangue do homem e, como se os pecados do mundo recassem sobre Ele, Jesus deixou derramar o Seu precioso sangue, do clice do Seu Corpo. Quase que podemos ouvi-Lo dizer: Pai, este o Meu Corpo, este o Meu Sangue. Eles esto separados um do outro, tal como a humanidade se separou de Ti. Esta a Consagrao da Minha Cruz. O que aconteceu ento no Calvrio acontece agora na Missa. Com uma diferena: Na Cruz, o Salvador estava s e, na Missa, est conosco. Nosso Senhor, agora, est no cu, mo direita de Seu Pai, intercedendo por ns. J no pode, portanto, sofrer na Sua natureza humana. Como pode, pois, a Missa ser a renovao do drama da Cruz? Como que Cristo pode renovar o drama da Cruz? Ele no pode, realmente, voltar a padecer na Sua natureza, porque est no cu, gozando a divina bemaventurana, mas pode ainda sofrer nas nossas naturezas humanas. Ele no pode, de fato, reviver o Calvrio no Seu Corpo fsico, mas pode renovar os Seus sofrimentos no Seu Corpo Mstico que a Igreja. O sacrifcio da Cruz pode ser renovado, contanto que ns Lhe faamos a oferta do nosso corpo e do nosso sangue, em toda a plenitude. Jesus pode tambm oferecer-Se novamente a Seu Pai Celestial, pela redeno do Seu Corpo Mstico a Igreja. Cristo anda no mundo juntando as almas que desejam ser outras tantos Cristos. Para que nos nossos sacrifcios, as nossas tristezas, os nossos calvrios, as nossas crucificaes, no fiquem isoladas, desunidas, a Igreja rene-os, junta-os, e o agrupamento, a massa de todos esses sacrifcios humanos rene-se ao grande sacrifcio de Cristo na Cruz, durante a Missa. Quando assistimos ao Santo Sacrifcio da Missa, no somos precisamente apenas criaturas terrenas, nem indivduos solitrios, mas sim parcelas vivas de uma grande ordem espiritual, na qual o Infinito penetra e envolve o finito, e o Eterno penetra no ser temporrio e passageiro, e o Espiritual reveste a materialidade.

face de Deus nada existe sobre a terra de mais solene e que mais respeito infunda do que o momento da Consagrao, pois a Missa no uma orao, nem um hino. um Ato Divino com o qual entramos em contato num dado momento do tempo. A rdio pode oferecer-nos uma ilustrao imperfeita, um esboo vago do que acabamos de exprimir. A Missa um Ato nico, divino, singular, com o qual entramos em contato todas as vezes que ela se celebra. Quando a face da medalha ou da moeda so gravadas, ou cunhadas, qualquer desses objetos a representao visvel de uma idia espiritual que existiu no esprito do artista. Do original podem fazer-se reprodues inmeras, desde que em cada pea de metal se grave ou reproduza o original.

Na missa d-se um fato semelhante. O modelo ou padro o Sacrifcio de Cristo no Calvrio, renovado nas almas que entraram em contato com Ele, no momento da Consagrao. A respeito, porm, da multiplicidade da Missa, o Sacrifcio apenas um, e sempre o mesmo. A Missa a comunicao do Sacrifcio do Calvrio, sob as espcies de po e de vinho. Tambm ns estamos no altar sob essas aparncias, pois ambas representam o alimento da vida. Oferecendo, pois, aquilo que nos d vida, oferecemo-nos, simbolicamente a ns prprios. Alm disso, para se transformar em po, o gro tem de ser modo, e as uvas tm de ser esmagadas, para se transformarem em vinho e, assim, representam os Cristos, que so chamados a sofrer com Cristo, para que um dia possam tambm alcanar o Reino dos cus. O momento da consagrao da Missa que nos aproxima de Nosso Senhor equivale s palavras que Jesus pronunciou: Tu Maria, vs, Joo, Pedro e Andr, dai-Me o vosso corpo, dai-Me o vosso sangue, dai-Me todo o vosso ser. Eu no posso sofrer mais. Passei por todos os padecimentos da Cruz, esgotei todos os sofrimentos que o Meu Corpo fsico podia suportar, mas no preenchi a medida dos tormentos necessrios ao Meu Corpo Mstico, do qual vs fazeis parte. A Missa o momento em que cada um de vs pode escutar literalmente a minha exortao: Toma a tua cruz e segue-Me. Do alto da Cruz, Nosso Senhor j olhava para todos aqueles que haviam de vir, para todos ns, esperando que algum dia nos entregssemos a Ele no momento da consagrao. Assistindo Santa Missa, realizamos, portanto, a esperana que antecipadamente Jesus ps em ns. Quando chega o momento da consagrao, em obedincia s palavras de Deus Nosso Senhor, Fazei isto em memria de Mim, o sacerdote toma o po e diz: Este o Meu corpo; depois, sobre o clice que contm o vinho, acrescenta: Este o Meu sangue do novo e eterno Testamento. A consagrao do po e do vinho feita separadamente, como representao da separao do corpo e do sangue; tal como sucedeu na crucificao, o drama do Calvrio repete-se sobre o altar. Cristo no est, porm, sozinho no nosso altar, pois ns estamos com Ele. Da o duplo sentido da palavra da consagrao que, em primeiro lugar, significam: Este o Corpo de Cristo; este o Sangue de Cristo. O segundo significado : Este o meu corpo, este o meu sangue. E esta a finalidade da vida! Reunirmo-nos em unio com Cristo, aplicar os Seus mritos s nossas almas, imitando-O em todas as coisas, e at na Sua prpria morte sobre a Cruz. A consagrao que Jesus fez no Calvrio repetida por cada um de ns quando assistimos Santa Missa. No existe algo de mais trgico no mundo do que a dor sofrida em vo. Quanto sofrimento existe nos hospitais, entre os pobres e os abandonados, e quantos desses sofrimentos so perdidos! E por qu? Porque muitas almas, abandonadas, crucificadas, no dizem, unidas a Nosso Senhor, no momento da consagrao: Este o meu corpo. Tomai-O. Nenhum padecimento seria desperdiado, vo, se todos aqueles que sofrem, dissessem nesses momentos:

Meu Deus, entrego-me nas Vossas mos. Toma o meu corpo, o meu sangue, a minha alma, a minha vontade, a minha energia, a minha fora, os meus bens, a minha sade. Toma tudo o que eu sou e possuo, pois eu me consagro inteiramente a Vs e em unio conVosco, para que o Pai Celestial veja nessa ddiva o Vosso bemamado Filho. quele em quem Ele ps todas as Suas complacncias. Transmuda o pobre po da minha vida na Vossa vida divina; transforma o vinho da minha vida desperdiada no Vosso divino esprito; une o meu corao despedaado ao Vosso corao; transforma a minha cruz num crucifixo.

No deixes que a minha dor e o meu abandono se percam, junta os seus fragmentos e, tal como a gota de gua incorporada no vinho, durante o ofertrio da missa, deixa que a minha vida se incorpore na Vossa.

Deixa que a minha pequena cruz se rena Vossa grande Cruz, para que eu possa obter as alegrias da felicidade eterna, em unio conVosco! Consagra as provaes da minha existncia, pois elas no sero compensadas, seno por meio da minha unio conVosco. Transubstancia-me, tal como o po que agora o Vosso corpo, e o vinho que agora o Vosso sangue, e eu serei inteiramente Vosso. No me importa que as aparncias permaneam, tal como sucede ao po e ao vinho, e que aos olhos da terra eu parea o mesmo que era antes. A minha permanncia no mundo, os meus deveres habituais, o meu trabalho, a minha famlia tudo isso representa as espcies da minha vida que continuam inalteradas. A substncia da minha vida, porm, a sua essncia, - a minha alma, a minha vontade, o meu esprito, o meu corao transubstancia-os, transforma-os inteiramente no Vosso servio, para que todo o meu ser possa saber e sentir toda a doura do amor de Cristo. Amm.

A COMUNHO 5 PARTE

"Tenho Sede". (S. Joo 19, 28) O Nosso bem-amado Salvador, chega comunho da Sua Missa quando, no ntimo do Sagrado Corao, parte este grito: "Tenho sede". No se trata, certamente, de sede de gua, pois a Terra, e tudo quanto ela encerra, Lhe pertenciam, e Ele acalmou as ondas quando as guas enfurecidas pareciam querer ultrapassar os seus limites.

Quando Lhe ofereceram de beber, Ele no aceitou. Era outra, era diferente a sede que atormentava Jesus - era a sede das almas e dos coraes humanos. Esse grito foi uma apelo comunho - o ltimo da longa srie de apelos que o Pastor que Jesus, dirigiu aos homens. O prprio fato de ter sido traduzido pelo mais pungente de todos os sofrimentos humanos, que a sede, d a medida da sua profundidade e da sua fora. A humanidade pode sentir-se faminta de Deus, mas Deus sente-Se sequioso da humanidade. Ele sentiu essa sede na Criao, quando a fez participante da divindade no jardim do paraso, e ainda na Revelao, quando tentou chamar a Si o corao afastado do homem, contando-lhe os segredos do Seu amor. Essa sede renovou-se na Incarnao, quando Jesus Se tornou semelhante quele que amava, revestindo a forma e as aparncias humanas. Na Cruz, o Salvador manifestou a mesma sede na Redeno pelo maior amor que jamais existiu, pois que ofereceu a prpria vida por aqueles a quem amava. Esse foi o apelo final para a comunho, antes de se correr a cortina sobre o Grande Drama da vida de Jesus sobre a terra. Todo o amor dos pais pelos filhos e dos esposo pela esposa, reunidos num amor imenso, representariam apenas uma insignificante parcela, a mais nfima frao do amor de Deus pelo homem, revelado naquele grito de sede. Ele significou, simultaneamente, no apenas a sede que sentiu por todos os humildes, pelos coraes famintos, pelas almas vazias, mas a infinita intensidade do Seu desejo em satisfazer os nossos anseios. A nossa sede de Deus no encerra algo de misterioso, porque a boca sequiosa suspira pela fonte, a planta volta-se para o sol e os rios correm na direo do mar. Dada, porm, a nossa insignificncia e a mesquinhez do nosso amor para com Deus, o amor que Ele nos dedica , realmente, um mistrio. Esse o significado da sede divina pela Comunho conosco. O Salvador j expressara isso mesmo, na parbola da ovelha tresmalhada, ao dizer que O no satisfazia a presena das noventa e nove ovelhas que O seguiam, pois s a recuperao de uma ovelha perdida poderia dar-Lhe alegria completa. Esta verdade foi novamente expressa na Cruz. Nada podia satisfazer devidamente a Sua sede, seno o corao de cada homem, mulher ou criana, que, uma vez nascidos para Ele, s n'Ele poderiam encontrar a paz e a felicidade. Esta prece pela comunho baseia-se no amor, pois este, pela sua prpria natureza, propenso unio. o amor de cada um de ns pelo prximo que se firma a unidade de um estado. do amor do homem e da mulher que resulta a unio de dois seres numa s carne. O amor de Deus pelo homem apela, portanto, para a unidade baseada na Incarnao - unidade de todos os homens no Corpo e no Sangue de Cristo. Foi para selar esse amor por ns que Ele Se deu na Sagrada Comunho, para que, assim como Ele e a Sua natureza humana, nascendo das entranhas da Sua Me Santssima, formaram um s na unidade na Sua Pessoa, tambm Ele e ns, nascidos das entranhas da humanidade, pudssemos ser um s na unidade do Corpo Mstico de Cristo. E por essa razo que empregamos a palavra "receber", quando falamos da Comunho com Nosso Senhor na Eucaristia, pois, literalmente, "recebemos" a Vida Divina, exatamente como a criancinha recebe a vida atravs de sua me. Cada vida sustentada pela comunho com uma Vida mais elevada. Se as plantas falassem, elas diriam ao orvalho e ao sol: "S entrando em comunho comigo, participareis das minhas leis e poderes, e revelareis a vida que em vs existe". Se os animais pudessem falar, eles diriam s plantas: "S participareis da minha vida, entrando em comunho comigo". Todos ns tambm, os seres humanos, dizemos aos seres inferiores da Criao: "A no ser que entreis em comunho comigo, no participareis da minha vida humana". Porque , pois, que Nosso Senhor no havia de dizer-nos tambm: "A no ser que entreis em comunho comigo, a Vida no entrar em Vs". O inferior transformado em superior: as plantas em animais, os animais no homem, e este, por caminho mais elevado, "divinizado", se corresponder quele apelo, isto , por intermdio da Vida de Cristo. A comunho , pois, a primeira maneira de recebermos a Vida Divina, qual no temos mais direito do que a pedra-mrmore tem de vir algum dia a dar flor. apenas uma pura ddiva do Todo-Poderoso que nos amou ao ponto de querer unir-Se a ns, no por meio dos laos da carne, mas sim pelos sagrados laos do Esprito, cujo amor no est sujeito saciedade, pois feito de xtase e alegria. Quo depressa nos teramos esquecido de guardar nas nossas almas as ddivas e a imagem de Jesus de Belm e de Nazar! Deus Nosso Senhor bem sabia que seria assim, mas sabia tambm quanto precisvamos d'Ele e da, a ddiva de Si prprio na comunho, na qual existe um outro aspecto em que raras vezes pensamos.

A comunho implica no somente a recepo da Vida Divina mas tambm a oferta, pois todo o amor recproco. No h amor unilateral, pois, por sua natureza, o amor exige reciprocidade. Deus tem sede de ns, mas isso quer dizer que o homem tambm tem sede de Deus. Quando vamos receber a Sagrada Comunho, no devemos nunca esquecer que no vamos apenas "receber" Deus Nosso Senhor, mas sim retribuir tambm a Sua ddiva, oferecendo-nos a ns prprios na reciprocidade do amor. Existe ainda um outro aspecto da Comunho, alm da recepo da Vida Divina. So Joo refere-se a esse aspecto e So Paulo d-nos essa verdade completamente na sua Epstola aos Corntios. A Comunho no apenas uma incorporao na Vida de Cristo, mas tambm uma incorporao na Sua Morte. "Todas as vezes que comerdes este po e beberdes deste clice comemorais a morte do Senhor, at que Ele venha". A vida natural tem duas faces: a anablica e a catablica. A vida sobrenatural tem tambm duas faces: a reconstruo, segundo o modelo que Cristo, e a destruio do velho Ado. A Comunho implica, portanto, no apenas receber, mas tambm dar. No pode haver ascenso a uma vida superior, se no se extinguir a vida inferior.

O Domingo de Pscoa pressupe uma Sexta-Feira Santa. O amor implica uma ddiva mtua que termina na prpria recuperao. Assim, a Mesa da Eucaristia um lugar de troca, e no um lugar de exclusiva recepo. Acaso poderamos receber toda a Vida de Cristo, sem Lhe darmos nada em troca? Acaso poderamos esgotar o clice, sem contribuir com algo para ench-lo? Devemos receber o po, se oferecer o gro que deve ser modo; receber o vinho, sem dar as uvas que devem ser esmagadas? Se durante a nossa vida fssemos sempre Comunho para receber a Vida Divina, e A levssemos conosco, sem deixar nada em troca, seramos parasitas do Corpo Mstico de Cristo. Devemos, pois, levar conosco, para a Mesa da Eucaristia, o esprito de sacrifcio, a mortificao da inferioridade do nosso ser, as cruzes suportadas com pacincia, a crucificao do nosso egosmo, a morte da nossa concupiscncia, e, inclusivamente, a nossa falta de merecimentos para receber a Comunho. S nestas circunstncias a Comunho ser o que realmente sempre deve ser, isto , uma troca, um comrcio entre Cristo e a alma, na qual Ele d a sua Morte, em troca das nossas vidas, e a Sua Vida pelos Seus filhos adotivos. Ns damos-Lhe o nosso tempo, Ele d-nos a Sua Eternidade; ns damos-Lhe a nossa humanidade; Ele d-nos a Sua Divindade; ns damos-Lhe a nossa insignificncia, Ele d-Nos a Sua plenitude, toda a Sua grandeza. Compreenderemos, realmente, toda a grandeza do amor? No teremos dito j, em momentos de afetuosa expanso por uma criancinha, numa linguagem que pode variar, mas cujo sentido o mesmo: "Amo-a tanto, como se ela fizesse parte do meu ser"? E por qu? Precisamente porque todo o amor anseia pela unidade.

Pela ordem natural, Deus dispensou prazeres unio dos laos da carne, mas esses no podem comparar-se ao prazer da unio espiritual, nos quais a divindade se sobrepe humanidade esta se reveste de aspecto divino, pois toda a nossa aspirao vai para Deus, e Deus vem at ns, e cessamos de ser simples seres humanos para comearmos a ser filhos de Deus. Se alguma vez na nossa vida tivestes um momento em que uma nobre afeio vos elevou... Se alguma vez amastes algum de todo o vosso corao, caso para perguntar o que sentireis unindo-vos completamente ao grande Corao do Amor. Se o corao humano pode dar e sentir to nobres e elevadas alegrias, o que poder dar-nos o grande Corao de Cristo? Oh! Se a simples centelha, j de si, brilhante, como ser a prpria chama! Teremos ns a plena conscincia da ntima ligao que existe entre a Comunho e o Sacrifcio, por parte de Nosso Senhor e por parte das Suas humildes criaturas, que somos ns? A Missa torna-nos inseparveis, pois no h Comunho sem uma Consagrao. No h recepo do po e do vinho que oferecemos, a no ser que tenham sido transubstanciados no Corpo e no Sangue de Cristo. A Comunho a conseqncia do Calvrio. Toda a natureza testemunha esta verdade; a nossa vida, alimenta-se sacrificando os animais dos campos e as plantas da terra. da crucificao que ns recebemos a vida. Matamo-los, no para destruir, mas sim para realizar. E, agora, por um belo paradoxo do Divino Amor, Deus faz da Sua Cruz o meio da nossa salvao. Os homens mataram Jesus, crucificaram-nO na Cruz, mas o Amor do Seu corao eterno no foi extinto nem vencido. Ele quis dar-nos a prpria vida que Lhe tiramos, o prprio alimento que destrumos, alimentar-nos com o po e o vinho que sepultamos. Ele transformou o nosso prprio crime numa culpa abenoada, transformando a Crucificao em Redeno, a Consagrao em Comunho, a morte na vida eterna. O homem , precisamente, o mais misterioso de todos os seres. Compreende-se que o homem seja amado, mas o que no se compreende que no retribua o amor que recebe. Qual a razo que h para se fazer de Deus Nosso Senhor, o Grande Desamado? Que razo existe para no se amar o prprio Amor? Por que Lhe damos fel e vinagre, quando Ele exclama: "Tenho Sede"...?

ITE, MISSA EST- 6 PARTE

Tudo est consumado (So Joo 19,30) Deus Nosso Senhor chega agora ao Ite, missa est da Sua Missa, no momento em que solta o grito de triunfo: Tudo est consumado!.

A obra de salvao est concluda; mas quando ela foi iniciada? Essa obra comeou, de fato, no tempo infinito da eternidade, quando Deus quis fazer-Se homem. Antes do princpio do prprio mundo, j a Divina Impacincia existia, para restituir o homem aos braos de Deus. O Verbo existia no cu, impaciente por ser o Cordeiro sacrificado, desde o princpio do mundo. Ele manifestou a Sua impacincia sob a aparncia de smbolos e imagens profticas, como se a Sua face moribunda se refletisse em milhares de espelhos, ao longo de toda a histria do Velho Testamento. Ele estava impaciente por ser o verdadeiro Isaac, que transportava por suas prprias mos a lenha para o sacrifcio, em obedincia s ordens de Seu Pai celestial Abrao. Ele estava impaciente por realizar o mstico smbolo do Cordeiro da Pscoa Judaica, que foi imolado, sem que um nico osso do Seu Corpo fosse quebrado. Ele estava impaciente por ser o novo Abel, morto pelos seus invejosos irmos da raa de Caim, para que o Seu sangue pudesse erguer aos cus o grito do perdo. Ele estava impaciente no seio de Sua Me, quando saudou Joo, o Seu precursor. Ele estava impaciente na Circunciso, quando antecipou o derramamento do Seu Sangue e recebeu o nome de Salvador. Ele estava impaciente, quando, na idade de doze anos, recordou a Sua Me que devia ocupar-se das coisas de Seu Pai. Ele estava impaciente na Sua vida pblica, quando dizia que tinha ainda um batismo a receber, e estava ansioso por que ele se cumprisse. Ele estava impaciente no Jardim das Oliveiras, voltando s costas s doze legies de anjos consoladores. Ele estava impaciente na ltima Ceia, quando antecipou a separao do Seu Corpo e do Seu Sangue, sob as aparncias de po e de vinho. Finalmente, a impacincia atingiu o seu termo, quando a hora da escurido se aproximou, no final da ltima Ceia. Ele, ento, cantou, pela primeira e nica vez, precisamente no momento em que caminhava para a morte. No teria importncia para o mundo o fato de que as estrelas brilhassem com mais intensidade, ou que as montanhas se erguessem, como smbolos de perplexidade, ou que as colinas prestassem o seu tributo aos vales que lhes deram o ser. O que importava apenas era que cada uma das simples palavras que Ele dissera se cumprira exatamente. O cu e a terra no passariam antes que as Suas palavras fossem cumpridas. Restava apenas o cumprimento de uma palavra de David sobre a realizao de cada profecia. Agora, porm, que tudo o mais se cumprira. Ele, o verdadeiro David, pronunciava, por ltimo, as palavras do profeta: Tudo est consumado. O que que estava consumado? Era a redeno do homem, porque o Amor completara a sua misso, o Amor fizera tudo o que pudera. H duas coisas que o amor pode fazer. Por sua prpria natureza, o Amor pende para a Encarnao, e toda Encarnao pende para a Crucifixo. Pois no verdade que, na ordem do amor humano, do afeto do marido pela esposa, e da encarnao, da confluncia do amor mtuo, nascem novos seres, que so os filhos? E quem poder jamais esquecer os filhos das suas entranhas, cujo amor vai at ao ponto de fazer por eles os maiores sacrifcios, inclusivamente o da prpria vida? E assim, porque todo o amor, quando verdadeiro, pende para a crucificao. Isto , porm, uma plida comparao com a ordem divina, segundo a qual o amor de Deus pela Sua criatura to profundo e intenso que terminou numa Encarnao. O Amor divino, todavia, no se limitou a revestir a forma humana, pois Nosso Senhor veio ao mundo para remilo. A morte era, pois, o alvo supremo, que Ele procurava. A morte, que interrompe e corta as carreiras dos grandes homens, no interrompe, porm, a Sua, pois Ele foi coroado de glria, e este era o nico objetivo que Ele procurava. Assim, a Sua Encarnao pendia para a Crucificao, para o maior amor que jamais algum sentiu, e que sacrificou a prpria vida por aqueles a quem amava. Consumada a obra da Redeno, o Divino Amor podia dizer: Dei tudo quanto podia dar, em benefcio da minha vinha. O amor no pode, realmente, dar mais do que a vida por aqueles a quem ama: Ite, Missa est. Ide, a missa est dita. A Sua obra estava, pois, consumada. E a nossa? Quando o Salvador disse Tudo est consumado, Ele no quis dizer que as oportunidades da sua Vida se tinham esgotado, mas sim que a Sua obra estava to perfeitamente terminada que nada havia a acrescentarlhe, por muito perfeito que fosse.

Quanto a ns, no entanto, quo longe isto est da verdade! Quantos de ns acabam as suas vidas, sem as terem realmente cumprido! Uma vida de pecado pode chegar ao seu fim, mas nunca poder dizer-se que foi uma existncia concluda, perfeita. Se a nossa vida se limitou a acabar, os nossos amigos perguntaro: quanto tempo viveu? Se, porm, a nossa vida foi uma existncia que atingiu a sua finalidade, que cumpriu, enfim, a pergunta ser esta: quantos merecimentos de boas obras leva ele consigo? Uma vida realmente preenchida no se conta pelo nmero de anos, mas sim pelas suas obras. No conta o tempo que se gastou na vinha, mas sim o trabalho que ali ficou feito. Num curto espao de tempo pode realizar-se tarefa equivalente a muitos anos, pois os prprios que chegam dcima primeira hora podem viver uma vida completa. Os outros, e at aqueles que vieram at Deus, como o bom ladro, apenas na hora do seu ltimo suspiro, podem acabar a sua existncia no Reinado de Deus. A nenhum deles se aplica a triste exclamao de pesar: Demasiado tarde Te amei, Beleza Eterna! Nosso Senhor consumou a Sua obra, mas ns no consumamos a nossa. Ele aponta-nos o caminho que devemos seguir. No final, Ele deps a Sua Cruz, e ns devemos tom-la sobre os nossos ombros. Ele consumou a Redeno no Seu Corpo fsico, mas cabe-nos a ns consum-la no Seu Corpo Mstico. Ele consumou a Salvao, mas ns ainda a no aplicamos s nossas amas. Ele terminou a construo do Templo, mas ns devemos habit-lo. Ele realizou o modelo ao qual devemos adaptar as nossas cruzes. Ele lanou a semente, mas cabe-nos a ns ceifar a seara. Ele encheu o clice, mas ns ainda no esgotamos o seu contedo que refrigera. Ele semeou o campo de trigo, mas ns devemos recolher o gro no nosso celeiro. Ele consumou o Sacrifcio do Calvrio; cabe-nos, porm, consum-lo tambm, na Santa Missa. A crucificao, no representa um drama inspirador, mas sim um ato, um modelo ao qual devemos adaptar as nossas vidas. No devemos limitar-nos a permanecer na contemplao da cruz, considerando-a como uma obra consumada e terminada, como a vida de Scrates. No! O que se passou no Calvrio aproveita-nos apenas na medida em que o repetirmos nas nossas prprias vidas. A Missa permite essa relao, pois, por intermdio da renovao do Calvrio nos nossos altares, no seremos apenas espectadores, mas sim participantes da Redeno, e a que reside a consumao, o cumprimento da nossa tarefa. Jesus disse-nos: E se Eu me elevar acima da terra, arrastarei comigo todas as coisas. Jesus consumou a Sua obra quando foi erguido sobre uma cruz; ns consumaremos a nossa quando Lhe permitirmos que nos atraia, nos arrebate para Si, no Sacrifcio da Missa. A Missa o ato que torna a Cruz visvel aos nossos olhos; ela que se patenteia, que se ergue em todas as encruzilhadas da civilizao, e nos aproxima tanto do Calvrio que at os ps fatigados podem fazer a jornada que conduz ao seu doce abrao. Todas as mos podem, assim, tocar o Sagrado Fardo, e todos os ouvidos podem ouvir o suave apelo, pois a Missa e a Cruz so uma e a mesma coisa. Em ambos existe a renncia perfeita da vontade ao Filho bemamado, o mesmo corpo dilacerado, o mesmo derramamento do precioso sangue, o mesmo perdo divino. Tudo quanto foi dito e feito durante a Santa Missa, deve acompanhar-nos, para vivermos o sagrado ato, para a praticarmos e o aplicarmos em todas as circunstncias da nossa vida diria. O Sacrifcio de Jesus transforma-se no nosso prprio sacrifcio, por meio da oblao de ns prprios, em unio com Ele; a Sua vida, oferecida por ns, transforma-se na prpria vida que Lhe oferecemos. Que, ao voltar da Santa Missa, tenhamos feito a nossa escolha, voltando costas ao mundo, para fazermos parte da gerao daqueles que vivem semelhana de Cristo, e so assim testemunhas vivas do Amor dAquele que morreu por ns, para que pudssemos viver com amor. O mundo dos nossos dias est repleto de catedrais incompletas, de vidas incompletas, de almas meio crucificadas. Algumas levam a cruz at ao Calvrio e, depois, abandonam-na; outros, deixaram-se pregar, mas despregaram-se, antes que a sua cruz, fosse erguida ao alto; outros esto crucificados: mas, se o mundo os desafia, dizendo Desce da cruz, eles descem, decorrida uma hora... Duas horas... Ou duas horas e cinqenta e cinco minutos... Verdadeiros cristos so aqueles que perseveram at ao fim. Nosso Senhor tambm ficou, at que a Sua obra estivesse consumada.

Da mesma maneira, o sacerdote no abandona o altar, sem que a Missa esteja terminada. Tambm ns devemos permanecer na cruz, at que as nossas vidas se tenham cumprido. Cristo crucificado o perdo, o modelo de uma vida preenchida. A nossa natureza humana o material bruto, a nossa vontade o cinzel; a graa de Deus a energia e a inspirao. Sob a ao do cinzel, desbastam-se os blocos grosseiros da nossa natureza imperfeita. Os primeiros pedaos que caem representam o nosso egosmo. Depois, por meio de uma cinzelagem mais delicada, mais leve, desbastamos excrescncias que representam o orgulhoso exagero da personalidade, o egocentrismo. Finalmente, com uma escovadela da prpria mo, faremos surgir luz do dia a obra-prima completa o ser perfeito, imagem e semelhana do modelo patenteado na Cruz. Ns estamos no altar sob as aparncias de po e de vinho; ns oferecemo-nos a Nosso Senhor, e Ele consagrou-nos. No devemos, portanto, bater em retirada, mas sim permanecer at o final, orando sem cessar, para que um dia, ao olharmos para o passado, possamos dizer que vivemos na intimidade d'Aquele que morreu por ns, na Cruz, e tal como Ele, possamos pronunciar a Sexta Palavra: Tudo est consumado. Assim, as suaves palavras do Ite, Missa est ressoaro ao longo dos corredores do Tempo, transpondo os umbrais da Eternidade. E os coros dos anjos e o exrcito branco da Igreja Triunfante respondero: Deo Gratias

O LTIMO EVANGELHO - FINAL

Pai, nas vossas mos entrego o meu esprito. (So Lucas 23,16) O ltimo Evangelho da Missa um formoso paradoxo que nos faz regressar ao princpio, pois abre com as palavras no princpio... Tambm na vida humana o fim o princpio de outra vida. A ltima palavra de Nosso Senhor foi realmente, o Seu ltimo evangelho: Pai nas vossas mos entrego o meu esprito. Tal como no evangelho da Missa, tambm Ele regressa ao Pai de onde veio. Jesus completara a Sua obra. A Sua missa comeara com a palavra Pai, e foi com essa mesma palavra que Ele terminou. Todas as coisas perfeitas, diziam os Gregos, movem-se em sentido circular. Tal como os grandes planetas, que s aps um longo espao de tempo completam as suas rbitas e regressam novamente ao seu ponto de partida, como que para saudarem Aquele que os colocou no seu caminho, tambm o Verbo Incarnado, que veio ao mundo para dizer a Sua Missa, ao completar a Sua Missa na Terra regressou para junto de Seu Pai Celestial que O enviara para a jornada da Redeno do mundo.

O Filho Prdigo est prestes a regressar casa de Seu Pai, pois Jesus tambm o Filho Prdigo que durante tinta e trs anos deixou a casa de Seu Pai e a bem-aventurana do Cu e veio ao pas estrangeiro que a Terra- pois estrangeiro todo o pas distante da casa paterna. Ele despendeu a substncia da Sua Verdade na infabilidade da Sua Igreja, e a substncia do Seu Poder na autoridade que deu aos Seus Apstolos e aos Seus sucessores. Ele despendeu a substncia da Sua Vida na Redeno e no Sacramento. Quando esgotou tudo at a ltima gota, Ele volveu o olhar para a casa de Seu Pai e, num grito ressonante, lanou o Seu Esprito para os braos de Seu Pai, no como algum que mergulha na escurido, mas sim como quem sabe que caminha para onde ser bem-vindo. Naquela ltima palavra e naquele ltimo evangelho que O fez regressar ao Princpio de todos os princpios, e principalmente a Seu Pai, revelam-se a histria e o ritmo da vida. O fim de todas as coisas regressa, de qualquer maneira, ao seu princpio. Tal como a Filho regressa casa de Seu Pai, e como o corpo regressa ao p de onde nasceu, tambm a alma do homem, que veio de Deus, deve algum dia voltar para junto de Deus. A morte no o fim de todas as coisas. A lousa fria que cai sobre a sepultura no marca o fim da histria de um homem. A maneira como ele viveu a sua vida determina as condies da sua vida futura. Se ele procura Deus durante a existncia, a morte ser como que a abertura de uma gaiola. Ele poder ento, servindo-se das suas asas, voar para os braos do Bem-Amado. Se ele, durante a vida, se afastou de Deus, a morte ser-lhe- como que o incio de um eterno afastamento da verdadeira Vida, da Verdade e do Amor ser o inferno. Junto ao trono de Deus, de onde viemos para o nosso noviciado da Terra. Deveremos regressar algum dia para prestar contas do uso que fizemos da nossa existncia. No haver um nico ser humano que, ao chegar ltima folha do livro da sua existncia, no encontre ali traado o seu destino, segundo aceitou ou rejeitou a divina ddiva da Redeno. Aceitando-a, ou rejeitando-a, o homem ter assinado, por sua prpria mo, a sentena do seu eterno destino. Tal como na caixa registradora ficam apontadas as importncias para serem conferidas no final do nosso dia de negcio, tambm os nossos pensamentos e obras so registrados para o Julgamento Final. Se, porm, vivemos sempre sombra da Cruz, a morte no ser o fim, mas sim o princpio da vida eterna. Em vez de uma separao, aguardar-nos- uma reunio; em vez de uma partida, ser uma chegada; em vez de encontrarmos um fim, esperar-nos- um ltimo evangelho um regresso ao princpio. Tal como a voz do destino murmura, Deves abandonar a Terra, a voz do Pai diz: Meu Filho, vem para Mim! Fomos enviados a este mundo como filhos de Deus, para assistirmos ao Santo Sacrifcio da Missa. Competenos permanecer aos ps da Cruz e, como queles que ali permaneceram desde o primeiro dia, ser-nos- pedida a declarao da nossa lealdade. Deus deu-nos o gro e a cepa da vida e, semelhana do homem que, segundo o Evangelho, recebeu talentos, tambm ns devemos apresentar a retribuio das graas divinas que tivermos recebido. A vida que Deus nos concedeu representa o gro e as cepas, e nosso dever consagr-los, restitu-los a Deus, sob as formas de po e de vinho, transubstanciados. As nossas mos devem apresentar o fruto das colheitas, quando chegar o fim da nossa peregrinao na terra. essa a razo pela qual o Calvrio se ergue no meio de todos ns, e nos encontramos sobre a sua montanha sagrada. No nascemos para ser simples espectadores, ou para lanarmos os dados, como fizeram os algozes de outrora, mas sim para sermos participantes do mistrio da Cruz. A maneira de reproduzir o quadro do ltimo Julgamento, durante a Santa Missa, ser a evocao da forma como o Pai recebeu e saudou o Seu Filho, olhando para as Suas mos. Nelas se evidenciavam os vestgios do trabalho, as calosidades da Redeno e as cicatrizes da Salvao. Tambm ns, terminada a nossa peregrinao na Terra e no regresso ao princpio, veremos que Deus olha as nossas mos. Se durante a nossa vida tivermos tocado as mos do Seu Divino Filho, as nossas mos apresentaro as marcas dos pregos; se tivermos percorrido a senda que conduz eterna glria, atravs das veredas tortuosas e difceis do Calvrio, tambm os nossos ps apresentaro os mesmos ferimentos; se os nossos coraes bateram em unssono com o de Jesus, tambm eles ostentaro a chaga do lado, aberta pela lana que trespassou o Corao do Salvador. Abenoados so, pois todos aqueles que levam nas suas mos, marcadas pelos cravos da Cruz, o po e o vinho das suas vidas consagradas, marcadas pelo signo e pelo selo do Amor redentor.

Mal, porm, daqueles que se afastaram do Calvrio e que apresentaro as mos brancas e sem cicatrizes! Quando a vida se acaba, e a Terra se desvanece como um sonho, quando a luz da eternidade entra a jorros nas almas, com todo o seu esplendor, os justos podem com uma f humilde, mas triunfante, repetir, como num eco, a ltima palavra de Cristo: Pai, nas Vossas mos entrego o meu esprito! E, assim, termina a Missa de Cristo. O Confiteor foi a Sua orao ao Pai, para que nos perdoasse aos nossos pecados; o Ofertrio foi a apresentao das pequenas hstias, sobre a patena da Cruz; o Sanctus foi a encomendao das nossas almas a Maria, a Rainha de todos os Santos; a Consagrao representou a separao do corpo do Salvador e a aparente separao de divindade e humanidade; a Comunho foi a Sua sede pelas nossas almas; o Ite Missa est foi o remate da obra da salvao; o ltimo evangelho foi o regresso de Jesus a Seu Pai. E, agora que a Missa est dita, que Jesus encomendou o Seu esprito ao Pai Celestial, Ele prepara-Se para restituir o Seu corpo a Sua Me Santssima, aos ps da Cruz. Tambm esta ltima fase ser um regresso ao princpio da Sua vida terrestre a Belm, ao tempo em que Se aconchegava no regao de Sua Me, retomando novamente o Seu lugar. A Terra tinha sido cruel para Ele; os Seus ps vaguearam pelos caminhos da ovelha tresmalhada, e ns trespassamo-los com os cravos de ferro; as Suas mos ofereceram-nos o po da Vida Eterna, e ns pregamolas nos braos da Cruz; os Seus lbios ensinaram-nos a Verdade, e ns oferecemos Sua sede o fel e o vinagre. Ele veio para nos dar a Vida, e ns demo-Lhes a morte; mas esse foi o nosso erro fatal, pois no Lhe roubamos realmente a vida, e apenas tentamos faz-lo. Ele deixou-Se vencer por Sua prpria vontade. Nenhum dos Evangelhos diz, de fato, que, Ele morreu, mas sim, Ele rendeu o esprito. Foi, pois, um ato voluntrio, uma renncia espontnea da prpria vida. No foi a morte que se aproximou dEle. Foi Ele quem Se aproximou da morte. E foi por essa razo que o Salvador, aproximao do fim, ordenou que os portais da morte se Lhe abrissem, na presena de Seu Pai. O clice vai-se gradualmente enchendo com o vinho rubro e precioso da salvao. As rochas da terra abrem as suas bocas sequiosas, para beb-lo, como se ela prpria estivesse mais necessitada da torrente da salvao do que os ressequidos coraes dos homens. A Terra estremeceu de horror porque os homens tinham erigido sobre seu seio a Cruz de Deus. Madalena, arrependida, l estava, abraada aos ps da Cruz; Joo, o sacerdote, cujo rosto a imagem fiel do prprio amor, escuta as pulsaes do corao, cujos segredos aprendera a amar. Maria, absorta, pensa quanto o Calvrio diferente de Belm. Trinta e trs anos antes, Maria baixava o seu doce olhar para a sagrada face de Jesus Menino. Em Belm o Cu contemplava a face da Terra; agora, os papis invertiam-se. a Terra que ergue os olhos para a face do Cu um Cu marcado pelas cicatrizes da Terra. Ele amava Maria, acima de todas as criaturas da Terra, porque Ela era a Sua Me e a Me de todos ns. Ele viu-A, logo que chegou a Terra, e viu-A ainda no momento derradeiro, antes de A deixar. Os Seus olhos encontraram-se, resplandecentes de vida, trocando, entre si, uma linguagem que s Eles entendiam. No meio de um rapto de amor, uma cabea inclinou-se, um corao parou, outro corao despedaou-se. Jesus entrega o Seu esprito puro, sem mcula, nas mos de Deus, por entre o ressoar das trombetas da vitria eterna. E Maria, a Me que acaba de perder o Seu Filho, permanece aos ps da Cruz. Jesus est morto. Maria ergue o Seu olhar para os olhos de Jesus, vivos e claros ainda no Seu rosto imobilizado pela morte. Sumo Sacerdote do Cu e da Terra, a Vossa Missa est terminada! Deixa o altar da Cruz e encaminha-Vos para a Vossa sacristia. Como Sumo Sacerdote, Vs vieste da sacristia do Cu, paramentado com as vestes da humanidade, e o Vosso corpo e o Vosso sangue eram o po e o vinho. Agora, o Sacrifcio est consumado. Fez-se ouvir o toque da campainha da Consagrao, e resta apenas o clice esgotado e enxuto. Entra na Vossa sacristia, despe as vestes da mortalidade, e enverga a tnica branca da imortalidade. Mostra as Vossas mos, os Vossos ps e o Vosso lado a Vosso Pai Celestial e diz: "Assim fui ferido na casa daqueles que Me amaram". Entra, Sumo Sacerdote, na Vossa sacristia celestial e, quando os Vossos representantes na Terra erguerem a hstia e o clice, mostrai-Vos ainda a Vosso Divino Pai, e intercede amorosamente por ns, at a consumao dos sculos. A Terra foi cruel para conVosco, mas Vs sers extremamente misericordioso para com ela. A Terra ErgueuVos na Cruz, mas agora Vs elevars a terra por meio por meio da Cruz. Abre as portas da celestial sacristia, Sumo Sacerdote! V que estamos agora Vossa porta e no cessamos de bater!

E o que Vos diremos ns a Vs, Maria? A Vos que s a sacristia do Sumo Sacerdote, como j o foste em Belm, quando Ele veio at junto de Vs, para trazer ao mundo o gro e a cepa? E foste-o tambm na Cruz, onde Jesus Se transformou no Po da Vida e no Vinho, por meio da Crucificao. Vs s tambm o Seu sacristo, agora que Ele vem do altar da Cruz, trazendo apenas o Clice enxuto do Seu sagrado corpo. Quando esse clice repousa no Vosso regao como se voltasses aos tempos de Belm, porque Ele Vosso, mais uma vez, O clice s , porm, o mesmo, na aparncia, pois o de Belm sofrera apenas a prova do fogo que o moldara, ao passo que o da Paixo passara pelo duplo fogo do Glgota e do Calvrio. Em Belm, Ele era branco, tal como viera das mos de Deus, Seu Pai: agora da cor de sangue, tal como vem at ns. Vs sois, porm, ainda a Me Imaculada daqueles que ajoelham junto ao altar; fazei com que nos apresentemos ali na maior pureza e assim nos conservemos, at ao dia em que entremos na Sacristia Celestial do Reino dos Cus, onde Vs sereis a nossa eterna sacristia e Jesus o nosso eterno Sacerdote. E vs, amigos do Crucificado, o vosso Sumo Sacerdote abandonou a Cruz, mas deixou-nos o altar. Na Cruz, Ele estava s, mas na Missa est conosco. Na Cruz, Ele sofreu no Seu corpo fsico. No altar, Ele sofre no Seu Corpo Mstico, que somos ns. Na Cruz, Ele era a nica Hstia; na Missa, ns representamos pequenas hstias, e Ele a Hstia imensa, recebendo o Seu Calvrio por nosso intermdio. Na Cruz, Ele era o Vinho; na Missa ns somos a gota de gua, unida com o vinho e consagrada com Ele. Sob esse aspecto, Ele est ainda na Cruz, rezando a Confisso conosco, perdoando-nos ainda, encomendando-nos ainda a Maria, sequioso ainda por ns, encaminhando-nos ainda para junto de Seu Pai, pois, enquanto o pecado existir na terra, a Cruz permanecer!

"De dia ou de noite, Onde quer que o silncio me rodeie, Sou surpreendido por um grito Que vem do alto da Cruz. A vez primeira que o ouvi, Parti procura... E encontrei um homem nas agonias da crucificao. E disse-Lhe: "Vou despregar-Vos da Cruz!" E tentei arrancar os cravos dos Seus ps, Mas Ele disse: "Deixa-os estar, porque eu no posso ser retirado, Enquanto cada homem, cada mulher e cada criana No vierem, juntos, retirar-me daqui".

E eu volvi: "mas eu no posso ouvir Vosso grito. O que devo fazer?" E Ele replicou: "Vai, mundo fora, e diz, a todo aquele que encontrares Que est um Homem pregado na Cruz!"