o burro juiz macaco coruja - rl.art.br · cantará o hino oficial dos bichos. macaco – por que...
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O Burro Juiz
Coruja (em copa de frondosa árvore a gritar após muito meditar)
– Eureka! Eureka! Realizarei um concurso! Realizarei um concurso!
Eureka! Eureka!...
Macaco (acordando assustado e se dirigindo à coruja)
– Que gritaria é essa?! A senhora me assustou. Eu quase caí do galho
ao lado.
Coruja
– Peço desculpa, foi mal.
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Macaco
– Foi mal mesmo. Eu estava sonhando com o rei da selva.
O leão parecia um gatinho apavorado... Hi hi hi.
Coruja
– Você sempre fazendo gazetas; em sonhar elas também
não lhe escapam.
Macaco
– E que gazetas! E que sonhar! La vida es sueño*. A
senhora precisava ver o barbudo aterrorizado com todas
aquelas bombinhas amarradas na cauda a estourar.
Coruja
– Você não tem vergonha. Você é um caso perdido ou,
talvez, um caso para Freud resolver.
* La vida es sueño – Obra do dramaturgo espanhol Pedro
Calderón de la Barca.
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Macaco
– Quem não tem vergonha é a senhora que atrapalha o melhor de
nossos sonhos. Pior, em linda noite de lua cheia. Vai dormir Velha
Ciência e pare de gritar essas palavras difíceis... Eureka, Freud.
Agora eu sei por que escolheram a senhora para ser o símbolo da
Filosofia. Os filósofos, com suas reflexões, incomodaram e
incomodam muita gente.
Coruja
– É verdade macaco, você diz a pura verdade: os filósofos
incomodaram e incomodam muita gente. Também diz a verdade
sobre a minha velhice, mas quanto ao epíteto Velha Ciência melhor
você outorgar à ave mitológica Fênix; ainda, dormir a esta hora...,
impossível; eu sou animal de hábitos noturnos e, para o seu
conhecimento: Eureka! - exclamação atribuída a Arquimedes,
sinônimo de encontrei; Freud é o pai da psicanálise.
Macaco
– E a senhora deve ser a avó, hi hi hi... Mas, diga-me, o que
encontrastes?
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Coruja
– Encontrei a maneira conveniente para obter, dentre os
animais, o melhor cantor. O vencedor de um concurso
democrático nos representará em mundial de futebol. Ele
cantará o hino oficial dos bichos.
Macaco
– Por que não cantar o hino nacional da Costa do Marfim, local
de nossa estada?
Coruja
– Porque nós não fazemos divisões políticas. Nós não temos
fronteiras. É o verdadeiro viver sem fronteiras; a operadora de
celular que me desculpe.
Macaco
– Concurso democrático? A democracia é o último degrau para
se chegar ao absolutismo. Não; tenho uma ideia melhor.
Coruja (demonstrando curiosidade, pergunta)
– Qual ideia, jovem pensador?
Macaco
– O Burro deve ser o juiz.
Coruja
– Você está louco ou esta intenção é mais uma gazeta?
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Macaco (utilizando-se de persuasão)
– O Burro tem orelhas grandes. Ele, outra verdade seja dita, por
ser orelhudo escuta muito bem. Ele saberá escolher o melhor
cantor. O Burro será um bom juiz. Fique tranquila Dona Coruja.
A África do Sul será o nosso palco em A Revolução dos Bichos*
- parte II.
Coruja
– Não sei não, em você não posso confiar. Eu corro o risco de
virar o burro desta história, entretanto os seus argumentos são
fortes.
Macaco
– A senhora - símbolo da sabedoria - leva muito a sério o viver.
Isto não é bom para uma veterana.
Coruja
– O Macaco tem sempre razão. Eu vou assumir o risco. De
qualquer maneira será divertido.
Macaco
– Ótimo! Amanhã mesmo eu irei falar com o Burro.
Coruja
– Combinado, agora volte para o seu galho e durma. Eu ainda
preciso “corujar” mais um pouco. Hi hi hi...
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*A Revolução dos Bichos - Obra de George Orwell.
Parte satisfeita a Coruja prevendo o final da história.
Coruja (em pleno voo)
– A emenda saiu melhor do que o soneto! Hi hi hi...
No dia seguinte.
Macaco (depois de muito procurar o Burro e definir os
participantes do concurso)
– Burro, que alegria encontrá-lo! Por horas que lhe procuro.
Preciso lhe falar.
Burro
– Agora não. Estou a comer capim. Vá embora, protótipo de
homem enrabado.
Macaco
– É urgente meu amigo.
Burro
– Eu já falei: vai plantar pé e larga de meu batata.
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Macaco
– Não é: vai plantar pé e larga de meu batata. O correto é: vai
plantar batata e larga de meu pé.
Burro
– Foi o que eu disse: vai plantar pé e larga de meu batata.
Macaco (irritadiço)
– Este Burro é uma boa besta.
Burro (contrariado e sem se virar; pronto para dar um coice)
– O que é que você falou?
Macaco (olhando para o traseiro do Burro)
– Eu falei que você tem; melhor dizendo, eu falei que você é uma
boa testa. É uma metáfora - figura de linguagem – significando um
bom pensante.
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Burro (satisfeito)
– O que é que você quer falar de tão urgente?
Macaco
– O nobre colega foi escolhido para ser o juiz do concurso
musical que se realizará em breve; assim, o douto Burro
determinará o melhor cantor que nos representará em Copa de
2010.
Burro
– Quem são os concorrentes inscritos no concurso?
Macaco
– Somente a Dona Gralha e o Mestre/Majestade Sabiá. O sábio
jurisconsulto aceita a investidura?
Burro
– Aceito. Quando e onde será o evento?
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Macaco
– No próximo sábado às 21h 30min. Todos os animais estarão aqui
no prado para apreciar e ratificar o seu bem julgar.
Burro (manifestando preocupação em razão do pouco tempo
para os preparativos, bem como, para a convocação de todos os
bichos)
– No próximo sábado às 21h 30min? Tudo bem, hoje sexta-feira
12h 30min. Tempo há, espero! Conquanto este problema não seja
meu... Agora, quedo sozinho. Vá embora seu criadouro de
pendenga e piolho.
Macaco
– Vossa Excelência fala bonito. Não vá empacar; quero dizer,
atrasar. Quanto ao resto, não se preocupe, eu resolvo.
O Macaco deixa o Burro em sua faina de mastigação e parte
fazendo macaquice.
Dia seguinte (sábado) – em derradeiro momento: os animais estão
reunidos em alvoroçados debates; o Burro, devidamente vestido
(toga) e confortavelmente sentado em uma poltrona, tem ao seu lado
esquerdo o Porco Promotor como auxiliar – sobre a mesa defronte
um martelo e alguns papéis; a certa distância o Macaco e a Coruja a
cochichar.
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Burro (batendo o martelo na mesa e recolhendo os papéis)
– Silêncio no tribunal. Vamos dar início aos trabalhos. Primeiro
ouviremos o Sábia.
Porco (a corrigir o Burro)
– Não é Sábia; é Sabiá.
Burro
– Certo! Ouviremos primeiro o Sabia.
Porco (a corrigir o Burro novamente)
– Não é Sabia; é Sabiá.
Burro (aborrecido com os papéis nas mãos)
– É o que estou lendo nestes papéis, idiota! Mais, focinho de
tomada 220.
Porco (retribuindo a ofensa)
– Está lendo errado. Você tem que respeitar a pronúncia
determinada pelo acento que marca a sílaba tônica, seu burro.
Você já esqueceu as aulas do professor de Língua Portuguesa?
Burro
– Qual professor?
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Porco (reforçando a ofensa)
– Professor Marsupial, seu peludo mal cheiroso.
Burro (dando risada e demonstrando algum conhecimento)
– Aquele mula - animal híbrido, razão de cruzamento entre
diferentes espécies - não soube se definir: cavalo ou jumento?
Eis a questão. De qualquer forma, a mula é um animal que já
nasce extinto, hi hi hi... Jamais será papai o professor de pizza
portuguesa.
Porco (enfatizando a matéria e o termo mulo)
– LÍNGUA PORTUGUESA, LÍNGUA PORTUGUESA. Ainda,
não é mula; é MULO, é MULO o termo exato para o gênero
masculino. Utiliza-se o vocábulo mula para designar o gênero
feminino.
Burro (atrapalhando-se com a observação)
– Mas, a professora, que também é esposa do professor
Marsupial, não é mula; ela é um espécime de panda.
Porco
– Sim, correto. São os enigmas da natureza. Contudo, o professor
Marsupial é um distinto educador e, assim sendo, merece,
inclusive, o respeito de um ex-aluno burro que não quis e não
soube aproveitar os bons ensinamentos. Ele não é mulo e sim um
marsupial coala; por isso, neste caso específico, o hibridismo
retido.
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Burro (a ordenar)
– Deixemos de conversa. Você, suíno, leva tudo ao pé de porco;
quero dizer, leva tudo ao pé da letra... Que cante o Sabiá.
O afinado Sabiá começa a cantar. Quase todos os presentes,
entusiasmados, aplaudem.
Burro (batendo o martelo com mais força na mesa)
– Silêncio no tribunal. Agora ouviremos a Gralha.
A Gralha não canta; ela grita. Um grupo de bichos começa a
vaiar e a fazer alguns comentários:
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Lobo
– Esta Gralha grita mais que a Virde*.
Lebre
– Quem é a Virde?
Lobo
– É a rainha primata de espécime mico-leão-dourado e
coordenadora pedagógica de nossa escola.
Lebre
– Esse espécime não está em extinção?
Lobo
– Infelizmente está. A fauna e a educação sucumbem!
*Virde – Professora-coordenadora da Escola Estadual Homero Rubens
de Sá (ano 2010).
Para ser apresentado em outro contexto, segue nova redação:
Lobo
– Esta Gralha grita mais que o Atarzando.
Lebre
– Quem é Atarzando?
Lobo
– É o macaco/homem; filho do relacionamento inusitado entre o Tarzan e
a Chita.
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Outros comentários (aleatórios):
Sapo
– Você viu o Ganso?
Zebra
– Ele ficou em Santos - Brasil.
Sapo
– Você viu o Pato?
Zebra
– Ele ficou em Milão - Itália.
Cobra
– O que faz o Urso Polar na África?
Girafa
– Ele é, também, personagem nesta fábula adaptada.
Cobra
– Você não acha que o Autor exagerou? Quantos despautérios!
Girafa
– Que linguinha venenosa...
O Burro, depois de muito refletir (refletir como só refletem os
burros), prepara-se para anunciar o veredicto.
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Burro
– Atenção, atenção. Darei o veredicto.
A apreensão toma conta de todos e o silêncio se faz presente.
Burro (rompendo o silêncio e fazendo suspense)
– O mais agradável canto, dentre os bichos, pertence...,
pertence..., pertence..., pertence à Gralha.
O silêncio não reina mais. A gritaria se faz atual. A Gralha berra
comemorando o resultado junto à Águia marcial; vários
animais protestam com estrondosas vaias e com arremessos de
objetos – acertam a cabeça de outros bichos que se sentem
ofendidos e, assim, dão início a uma briga generalizada.
O Macaco e a Coruja observam a confusão em segurança – por
manterem certo afastamento. Ambos, acometidos por fortes
convulsões de risos passam a chorar. A ave, restabelecida de
seus excessos, finaliza:
Coruja
– Quem burro nasce; togado ou não, burro morre.
Coruja e Macaco partem animados...
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Agradecimentos
Agradeço a Deus por viabilizar a imortalidade que provém do próprio Ser em nós e
por possibilitar a imortalidade que provém do pensamento ora articulado em escrita. Agora,
as primeiras pessoas a quem quero agradecer são os meus pais, pois o livro da vida que li
e leio em seus olhos; que li e leio em suas palavras; que li e leio em suas condutas; que li e
leio (para todo o sempre) em suas almas; torna-me coautor desta trajetória de plural viver.
Sendo assim, obrigado Marco, Marcelo, Márcio (irmãos queridos) e Márcia (irmã querida);
obrigado Larissa, Victor, Matheus, Bruno, Vinícius, Thaya (sobrinhos e sobrinhas não
menos queridos).
Obrigado avós, em especial: obrigado avó Benedicta (avó Mara – apelido) por torcer
sempre a favor de um bom resultado.
Obrigado Sílvia (esposa de cândido amor e professora de Língua Portuguesa/Língua
Inglesa da Escola Estadual Homero Rubens de Sá) por compartilhar o percurso, incluindo o
literário – fazendo observações ímpares em totalidade de obra.
Obrigado Vanesca (cunhada) por ler o texto (dando risadas contagiantes) e por
opinar de forma satisfatória sobre as figuras.
Obrigado professora Ana (diretora da Escola Estadual Conselheiro Crispiniano) por
favorecer o projeto e por renovar o ânimo através de boas palavras.
Obrigado professora Janaína (professora de Artes da Escola Estadual Homero
Rubens de Sá) por acreditar em nosso projeto artístico (interdisciplinar) e por confeccionar
magníficos desenhos.
Obrigado professora Juliana Araújo (professora de Língua Portuguesa/Língua
Inglesa da Escola Estadual Homero Rubens de Sá) por incentivar o trabalho e por projetar
de maneira auspiciosa o resultado deste livro.
Obrigado professora Virde (vice-diretora da Escola Estadual Homero Rubens de Sá)
por permitir o uso de nome e de desenho em publicação e por auxiliar o projeto em
nascedouro.
Obrigado professora Vânia (professora de Artes da Escola Estadual Conselheiro
Crispiniano) por aceitar o propósito interdisciplinar trabalhando de forma exemplar em
representação teatral.
Obrigado alunos (séries: 5ª A, 5ª B, 5ª C, 5ª D – ano 2010) da Escola Estadual
Homero Rubens de Sá por partilharem o ensino/aprendizagem em texto escrito.
Obrigado alunos (séries: 7ª A, 7ª B, 7ª C, 7ª D – ano 2012) da Escola Estadual
Conselheiro Crispiniano por partilharem, também, o ensino/aprendizagem em novo
contexto – representação teatral.
Por fim, obrigado Mamp Júnior (cão da raça labrador) por companheirismo e por
incondicional amor (é bom trabalhar com você por perto).
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