o bom senso e a reportagem

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O bom senso e a reportagem da TV*¹ Lívia Inácio*² A imagem não é o mais importante em uma tele reportagem. O texto também não. O que realmente importa na elaboração da notícia da TV é a forma como os dois pontos estão ligados. Dinâmico, vivo e imediato, o conteúdo jornalístico da televisão precisa se adequar, sobretudo, a dois sentidos: ouvidos e olhos. A começar pelo texto, muitos cuidados devem ser tomados em relação ao que será produzido. Para verificar a sonoridade do que se escreve é necessário ler as laudas em voz alta, cortar palavras que rimam, evitar terminações em ‘ão’ e estar atento às repetições consonantais para não dar ao telespectador a impressão de estar ouvindo um poema do Bandeira em vez de uma notícia. Bem como no impresso, a ordem direta da frase deve ser mantida. Sinônimos enriquecem o texto, mas é necessário lançar mão de palavras simples para manter a leveza que o público espera. Tudo deve estar muito claro. Na TV, quem assiste à notícia terá contato com a frase apenas uma vez. “Jornais impressos são escritos para os olhos, o que significa que, se o leitor não entender alguma coisa, pode retornar para o parágrafo ou frase anterior e lê-la novamente” (Ted White, Jornalista norte-americano) Mais do que enxugar palavras e lapidar o texto como se faz a um diamante, é essencial que o jornalista de TV esteja atento ao que vai apresentar aos olhos do telespectador. Para obter essa sintonia, o jornalista tem que trabalhar em conjunto com o cinegrafista. Mas em conjunto mesmo: conferir se o olhar do câmera condiz com o foco da matéria, sugerir filmagens, mostrar o que achou diferente no ambiente da pauta... Acompanhar a edição também ajuda, e muito! Assistir à fita, pelo menos uma vez pode render ideias fantásticas para o off. Em entrevista à Vera Íris Paternostro, o jornalista Jorge Pontual explicou como administra a relação entre o texto e as imagens das quais dispõe. “Primeiro, participando da filmagem, sabendo o que e como o cameraman está filmando. Depois, decupando as fitas e anotando os time codes. Ao escrever, procurando fazer com que o texto se submeta à imagem, sem descrevê-la, mas deixando-a em primeiro plano na atenção do público – ou seja, texto suscinto, frases curtas, de compreensão imediata e que apenas complemente a imagem, não desviem a atenção do que está sendo visto. E, sempre que possível, introduzindo o som ambiente, com pausas no texto.” É comum encontrar reportagens de tevê cujas imagens e textos apresentam total incompatibilidade. Nesses casos, o texto perde sua função e a imagem também.

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Page 1: O bom senso e a reportagem

O bom senso e a reportagem da TV*¹

Lívia Inácio*²

A imagem não é o mais importante em uma tele reportagem. O texto também não. O

que realmente importa na elaboração da notícia da TV é a forma como os dois pontos

estão ligados. Dinâmico, vivo e imediato, o conteúdo jornalístico da televisão precisa

se adequar, sobretudo, a dois sentidos: ouvidos e olhos. A começar pelo texto, muitos

cuidados devem ser tomados em relação ao que será produzido. Para verificar a

sonoridade do que se escreve é necessário ler as laudas em voz alta, cortar palavras

que rimam, evitar terminações em ‘ão’ e estar atento às repetições consonantais para

não dar ao telespectador a impressão de estar ouvindo um poema do Bandeira em vez

de uma notícia.

Bem como no impresso, a ordem direta da frase deve ser mantida. Sinônimos

enriquecem o texto, mas é necessário lançar mão de palavras simples para manter a

leveza que o público espera. Tudo deve estar muito claro. Na TV, quem assiste à

notícia terá contato com a frase apenas uma vez.

“Jornais impressos são escritos para os olhos, o que significa que, se o leitor não entender alguma

coisa, pode retornar para o parágrafo ou frase anterior e lê-la novamente”

(Ted White, Jornalista norte-americano)

Mais do que enxugar palavras e lapidar o texto como se faz a um diamante, é essencial

que o jornalista de TV esteja atento ao que vai apresentar aos olhos do telespectador.

Para obter essa sintonia, o jornalista tem que trabalhar em conjunto com o

cinegrafista. Mas em conjunto mesmo: conferir se o olhar do câmera condiz com o

foco da matéria, sugerir filmagens, mostrar o que achou diferente no ambiente da

pauta... Acompanhar a edição também ajuda, e muito! Assistir à fita, pelo menos uma

vez pode render ideias fantásticas para o off.

Em entrevista à Vera Íris Paternostro, o jornalista Jorge Pontual explicou como

administra a relação entre o texto e as imagens das quais dispõe.

“Primeiro, participando da filmagem, sabendo o que e como o cameraman está filmando. Depois,

decupando as fitas e anotando os time codes. Ao escrever, procurando fazer com que o texto se

submeta à imagem, sem descrevê-la, mas deixando-a em primeiro plano na atenção do público –

ou seja, texto suscinto, frases curtas, de compreensão imediata e que apenas complemente a

imagem, não desviem a atenção do que está sendo visto. E, sempre que possível, introduzindo o

som ambiente, com pausas no texto.”

É comum encontrar reportagens de tevê cujas imagens e textos apresentam total

incompatibilidade. Nesses casos, o texto perde sua função e a imagem também.

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Embora nem todos entendam a importância dessa relação, ela se trata do ponto

chave para a composição de uma boa reportagem.

“A sensibilidade aliada ao bom senso, que todo jornalista deve ter, vai indicar como e quando

esses recursos precisam ser usados.” (p. 89, parágrafo 5)

*¹Baseado em “PATERNOSTRO, Vera Íris; "O texto na TV"; Elsevier, 2006”

*²Discente do 3º ano do curso de Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo