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12 UM LIVRO REFERENCIAL 18 WOLFGANG WEINGART: DA ESCOLA SUÍÇA À DESCONSTRUÇÃO TIPOGRÁFICA 26 ARTE E ARQUITETURA NOS AZULEJOS DE ATHOS BULCÃO 36 ENTREVISTA COM JORGE SATO 54 DESIGN VS ARTESANATO: IDENTIDADES E CONTRASTES 62 AGENDA

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Segunda Edição. Colaboradores: André Stolarski, Haroldo Eguchi, Ingrid Moura Wanderley, Jorge Sato, Olimpio Pinheiro e Renata Gastal Porto.

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12 UM LIVRO REFERENCIAL 18 WOLFGANG WEINGART: DA ESCOLA SUÍÇA ÀDESCONSTRUÇÃO TIPOGRÁFICA 26 ARTE E ARQUITETURA NOS AZULEJOS DE ATHOS BULCÃO 36 ENTREVISTA COM JORGE SATO54 DESIGN VS ARTESANATO: IDENTIDADES E CONTRASTES

62 AGENDA

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2 PEÇAS DE LEGO DE 8 PINOS PODEM SER COMBINADAS DE 24 MANEIRAS

3 PEÇAS DE LEGO DE 8 PINOS PODEM SER COMBINADAS DE 1.060 MANEIRAS

6 PEÇAS DE LEGO DE 8 PINOS PODEM SER COMBINADAS DE 102.981.500 MANEIRAS

COM 8 PEÇAS AS POSSIBILIDADES SÃO VIRTUALMENTE INFINITAS

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2 PEÇAS DE LEGO DE 8 PINOS PODEM SER COMBINADAS DE 24 MANEIRAS

3 PEÇAS DE LEGO DE 8 PINOS PODEM SER COMBINADAS DE 1.060 MANEIRAS

6 PEÇAS DE LEGO DE 8 PINOS PODEM SER COMBINADAS DE 102.981.500 MANEIRAS

COM 8 PEÇAS AS POSSIBILIDADES SÃO VIRTUALMENTE INFINITAS The Ultimate LEGO book.

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NÚMERO ZERO

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NÚMERO ZERO

OBRIGADOAGRADECEMOS A TODOS OS AUTORES QUE CEDERAM SEUS TEXTOS, TORNANDO POSSÍVEL A REALIZAÇÃO DA NÚMERO ZERO Nº2. AGRADECEMOS TAMBÉM AOS COLABORADORES DA PRIMEIRA EDIÇÃO DESTA FANZINE (AUTORES, ILUSTRADORES, PROFESSORES, COLEGAS E AMIGOS) PELO IMPORTANTÍSSIMO APOIO QUE NOS FOI DADO DESDE A CONCEPÇÃO DO PROJETO ATÉ O FECHAMENTO DO PDF. VALEU.

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OBRIGADOAIMEÊ DA SILVA FERREIRA autora

CELSO LONGO autor

DANIEL TRENCH autor / projeto gráfico

FELIPE VILLA ilustrador / projeto gráfico

GUILHERME ROVAI ilustrador

JOSÉ BÁRTOLO autor

MARCELLO MONTORE autor

SARA GOLDSCHMIT autora

PRIM

EIRA

EDIÇ

ÃO

SEGU

NDA

EDIÇ

ÃO

ANDRÉ STOLARSKI autor

HAROLDO EGUCHI autor

INGRID MOURA WANDERLEY autora

JORGE SATO entrevistado

OLIMPIO PINHEIRO autor

RENATA GASTAL PORTO autora

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NÚMERO ZERO UM LIVRO REFERENCIAL

POR ANDRÉ STOLARSKI Em 1999, Rafael Cardoso publicou uma introdução à história do design, livro que se tornaria uma referência obrigatória no estudo da atividade, agora em sua terceira edição.

Seis anos depois, em 2005, publicou o também referencial o design brasileiro antes do design, responsável por romper definitivamente com as barreiras modernistas para a legitimação de uma investigação histórica rigorosa sobre a profissão antes dos anos 1950.

Se esses dois primeiros títulos tiveram forte impacto sobre a compreensão histórica do design, design para um mundo complexo tem tudo para exercer a mesma influência no campo das ideias e fundamentos capazes de enriquecer seu futuro.

design para um mundo complexo não é, contudo, fruto de pesquisa recente. Suas principais questões vêm sendo elaboradas desde o final da década de 1990, quando o autor publicou o texto “Design, cultura material e o fetichismo dos objetos” (Arcos: Design, cultura material e visualidade, vol. 1, nº único, 1998), reelaborado anos mais tarde e publicado em inglês sob o título Putting the magic back into design: from object fetishism to product semantics and beyond (Art on the line, 2004/1 [2]).

Um aprofundamento ainda maior resultou neste que é o primeiro livro publicado no Brasil a tratar diretamente das questões vinculadas à semântica dos produtos e sua relação com a contemporaneidade.

Nesse sentido, design para um mundo complexo faz excelente companhia a uma bibliografia que inclui autores consagrados como Klaus Krippendorf, Victor Margolin, Richard Buchanan, Henri-Pierre Jeudy, Donald A. Norman, Deyan Sudjic, Adrian Forty e Vilém Flusser – estes dois últimos com títulos publicados pela Cosac Naify (Objetos de desejo e O mundo codificado, respectivamente).

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DO MUNDO REAL AO MUNDO COMPLEXOdesign para um mundo complexo atualiza a discussão proposta pelo quase homônimo design para o mundo real, publicado há exatos quarenta anos, em 1971.

Seu autor, o designer norte-americano Victor Papanek, alertava para uma crescente perda de sentido de um design de matriz modernista crescente e perversamente estetizado em face de um mundo assolado pela miséria, exploração, violência e degradação, e conclamava os designers a saírem de seu universo auto-referente para projetarem soluções para o mundo real.

Constatando que os problemas apontados por Papanek tornaram-se ainda mais profundos, Rafael Cardoso procurou realizar ao mesmo tempo “uma homenagem e uma revisão crítica” à publicação original, aprofundando o ataque à noção modernista de função e atualizando o “mundo real” de então, cuja materialidade passou definitivamente a ser envolvida e permeada por uma camada de informação e imaterialidade.

Segundo o autor, para que o design possa ter qualquer efetividade sobre esta realidade, precisará necessariamente considerar sua complexidade, entendida como “um sistema composto de muitos elementos, camadas e estruturas, cujas inter-relações condicionam e redefinem continuamente o funcionamento do todo”.

Se muitos autores se contentam em exaltar a busca pela simplicidade como forma de ser do design (afinal de contas, “o design nasceu com o firme propósito de por ordem na bagunça do mundo industrial”), são efetivamente poucos os que se dispõem a enfrentar os desconcertantes dilemas colocados pela complexidade das aparências, das formas e dos significados.

design para um mundo complexo é uma poderosa ferramenta teórica para tratar dessas questões, elaborada de maneira clara e acessível tanto ao leigo quanto ao estudioso.

Aliando raciocínio cristalino a insights bem humorados e diversos exemplos concretos, propicia uma leitura agradável, reveladora e profundamente rigorosa.

NÃO EXISTE FUNÇÃO, EXISTEM FUNÇÕESO ponto de partida do livro é a desmontagem da relação unívoca e estável entre forma e função. No primeiro capítulo, intitulado “Compressão e complexidade”, o autor alerta para a confusão perversa entre função e operação, substituindo a primeira pela noção de propósito – ou a adequação de um artefato ao seu uso.

Como essa relação é bem mais aberta que a equação “a forma segue a função”, passa a ser possível demonstrar como diversos conceitos centrais ao design e tradicionalmente engessados pela função, tais como forma, olhar e significado, são de fato muito mais móveis do que se imagina, dependendo essencialmente de noções como contexto, tempo e memória. Nesse

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movimento, a própria noção de função abre-se a uma ambiguidade e uma complexidade inimagináveis para o repertório modernista. O segundo capítulo, intitulado “A vida e a fala das formas: significação como processo dinâmico”, abre com uma afirmação tão evidente quanto renegada: “Não existe função; existem funções”.

E não apenas porque haja diversos usos para os objetos, mas sobretudo porque muitas de suas principais funções, mais que operacionais, são marcadamente semânticas. Noutras palavras, o que define e valoriza a avassaladora maioria dos artefatos com os quais nos relacionamos é aquilo que eles significam, e não seu mero funcionamento ou características de fabricação, produção e distribuição.

Mas quais processos definem esses significados? Qual o papel da aparência? Por que ela nunca é neutra? Qual o papel da memória? Porque ela é vital em nossa relação com o novo? Porque a forma dos objetos, ao invés de tender à homogeneidade? Os objetos podem ser considerados como linguagem?

As respostas a essas questões reforçam a riqueza do universo que se abre à atuação dos designers quando os significados estáveis são substituídos pela noção mais ampla de significação. “Trata-se de uma nova dimensão do pensamento projetivo, maleável, muito mais adequada para o mundo complexo em que vivemos”.

A SOCIEDADE DOS GRÁFICOS ILETRADOSA constatação que se segue, contudo, é inquietante: por mais irrefutável e imperiosa que seja essa complexidade, somos incapazes de reconhecê-la ou de “atribuir densidade poética (…) ao universo material que nos cerca.”

Numa das melhores passagens do livro, Rafael Cardoso afirma: “Nossa sociedade industrial, cuja existência se pauta fundamentalmente em sua capacidade de produzir artefatos, resiste paradoxalmente a se engajar na tarefa de compreender o sentido dos mesmos. Mal comparando, somos parecidos com uma imensa gráfica que imprime livros sem parar, mas onde muito poucos sabem ler e a maioria dos funcionários nega a existência da leitura. O resultado é que estamos em processo de sermos soterrados, literalmente, pelo lixo que produzimos”.

Eis um dos propósitos centrais do livro: oferecer formas de pensar que permitam superar a inexorável transformação dos objetos em dejetos e a “defasagem entre a permanência dos artefatos e à mutabilidade das ideias”.

A esta questão, vital para o debate da sustentabilidade, o autor responde com uma visão renovada do ciclo de vida dos produtos, que enfatiza o pós-uso ou, nas palavras do autor, “o horizonte distante da materialidade que se recusa a morrer”.

REDES DENTRO DE REDES DENTRO DE REDESSe a permanência da materialidade dos objetos se opõe à mutabilidade que caracteriza as ideias, esta oposição torna-se ainda mais abissal se considerarmos o tecido das redes de informação que se urdiu à nossa volta.

No terceiro capítulo do livro, “Caiu na rede é pixel: desafios do admirável mundo virtual”, a contribuição de design para um mundo complexo está em desvelar sua estrutura, não de um ponto de vista tecnológico, mas histórico e visual.

Por outro lado, a internet tornou-se complexa a ponto de não ser mais inteligível. Tornou-se “meio, e não coisa”.Em ambos os casos, seja pela sobreposição e interconexão de redes, seja pela imensidão imaterial de sua estrutura, a conclusão é a mesma: a importância do design como construtor de interfaces nesse meio complexo é imensa, e é preciso superar certa visão da internet que “costuma passar quase que exclusivamente por seu desenvolvimento tecnológico como sistema de informática”. Que ninguém espere, no entanto, um receituário de dispositivos visuais para webdesigners. A ferramenta para enfrentar a questão é, mais uma vez, teórica. Para poder prosseguir, é preciso, antes, entender a “lógica de visualidade errática da rede”.

Aqui, Rafael Cardoso lança mão da “suspensão da descrença”, conceito talhado pelo poeta e filósofo inglês Samuel Taylor Coleridge no início do século XIX: “Nessas linguagens visuais, tudo que se vê, é aceito como premissa. Tudo que é visualizável se torna possível. (…) No admirável mundo virtual, as regras do velho mundo físico não se aplicam da mesma maneira. Apenas, as estruturas visuais se repetem, e é esta repetição que garante o êxito da empreitada. Seduzidos pela memória cada vez mais distante da verossimilhança, permitimo-nos nos entregar com maior abandono à suspensão da descrença, na esperança ilusória de que venha a ser permanente”.

ABAIXO O ENSINO! VIVA O APRENDIZADO!Para enfrentar esses desafios, o livro propõe novos valores para o design e seu aprendizado, começando com dois tópicos complementares: “Abaixo o ensino!” e “Viva o aprendizado!”. No primeiro, um ataque à compreensão da história do design como história de suas escolas, algumas questões sobre a regulamentação da profissão e uma visão positiva do aumento do número de escolas de design no país. No segundo, uma defesa da complementação do ensino com uma prática essencialmente ampliadora de fronteiras para a profissão, que não pode ser vista “como um corpo de doutrinas fixo e imutável, mas como campo em plena evolução”.

E se o design “tende ao infinito – ou seja, a dialogar em algum nível com quase todos os outros campos de conhecimento”, ele pode ser tudo menos cosmético: “A formação de um designer pensante – legado [da Escola] de Ulm – ainda é uma meta a ser perseguida com seriedade por todos que se interessam pelo ensino do design.”

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UM COMENTÁRIO SOBRE O PROJETO GRÁFICOAssim como ocorre com diversos outro títulos da editora, o projeto gráfico de design para um mundo complexo merece um comentário à parte, a começar pelo papel no qual é integralmente impresso, conhecido como Kraft Ouro.

A substituição dos papeis comumente utilizados nos miolos de livros por essa variedade empregada na indústria de envelopes é, a seu modo, um comentário sobre nosso costume de destinar certos materiais a certos usos pelo engessamento de suas funções.

Não se trata, contudo, de simplesmente utilizar um papel “estranho”. Se os envelopes contêm mensagens, e se alguns papéis são mais utilizados para a fabricação de envelopes, eles passam também a significar “embalagem”, independentemente de sua configuração como envelope.

Assim, além de reforçar o caráter de mensagem que permeia todo o livro, o projeto induz a outra experiência fundamental: a leitura se produz numa embalagem (a teoria), que se relaciona de forma sempre incerta e incompleta com seu conteúdo (a realidade).

Dois dispositivos visuais aprofundam e reafirmam esse comportamento: por um lado, todas as imagens – mesmo as fotografias e logotipos – foram transformadas em ilustrações em preto-e-branco desenhadas à mão, próximas de esboços; por outro, a capa e as demais seções do livro são identificadas e permeadas por uma padronagem hexagonal que, multiplicada, produz uma imagem semelhante às “redes dentro de redes dentro de redes”.

Mensagem, embalagem, esboço e rede, o projeto gráfico de design para um mundo complexo pode ser finalmente entendido como uma metáfora material que transforma em experiência de leitura a afirmação de Aldous Huxley escolhida como epígrafe para o livro: “Nossas teorias mais refinadas, nossas descrições mais elaboradas são apenas simplificações cruas e bárbaras de uma realidade que é, em suas amostras cada vez menores, infinitamente complexa”.

andré stolarski é designer formado em arquitetura pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (fau/usp). Dirigiu o departamento de design e museografia do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, de 1998 a 2000. É sócio-diretor da produtora Tecnopop, onde desenvolve projetos nas áreas editorial, expositiva e de identidade visual.

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DA ESCOLA SUÍÇA À DESCONSTRUÇÃO TIPOGRÁFICA

INTRODUÇÃOO tipógrafo suíço Wolfgang Weingart, a partir da década de 70 ganha importância na história do design gráfico, sendo influente até hoje. Nesse período novas tecnologias eram introduzidas nos meios de produção artística. Na Escola Suíça tradicional, Weingart teve sua formação profissional, sendo também inspirado nas inovações construtivistas, no movimento De Stijl, na Bauhaus, e nos princípios da nova tipografia dos anos 30, que a partir dos anos 50 passou a ser conhecida como Estilo Internacional.¹

Tanto os profissionais integrantes do que se convencionou chamar Escola Suíça, quanto aqueles inseridos dentro do contexto do Estilo Internacional aplicavam a grid², proporções matemáticas, divisão geométrica do espaço, fotografias objetivas, as famílias tipográficas Akzidenz Grotesk, Futura e Helvética, textos alinhados à esquerda e destaque de parágrafos através de linhas em branco, priorizando a hierarquia de informações. A Escola Suíça, por si era de dogma conservador e de limitações restritas em termos de projeto gráfico.

Wolfgang Weingart foi o responsável por uma das grandes mudanças no Design Gráfico do século XX, aplicando inovações em meados da década de 70 e influenciando diretamente a produção das décadas posteriores. Será o trabalho desenvolvido por Weingart o único responsável por esta profusão de imagens ou serão os atuais designers que levaram ao extremo a proposta desconstrutivista de Wolfgang Weingart?

1. O movimento Estilo Internacional teve

como princípio a idéia de que o uso de formas,

tipografias e cores universais promoveria uma

sociedade mais justa. Entre as décadas de 60-70

passou a ser adotado pelas multinacionais como

um design perfeitamente apropriado

para o mundo capitalista.

2. A construção da grid é baseada

na unidade básica de medida tipográfica. O uso

consiste na disposição de textos e ilustrações

concebidas segundo princípios rigorosos,

exercendo um princípio de controle sobre o

trabalho, ordem e economia de material.

POR RENATA GASTAL PORTO

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DA ESCOLA SUÍÇA ÀDESCONSTRUÇÃO TIPOGRÁFICAWolfgang Weingart destacou-se entre os designers suíços no exterior. Seus trabalhos influentes na época são apenas o princípio das mudanças que provocou no Design. Quando convidado para lecionar na Basle Allgemeine Gewerbeschule³ desenvolveu seus pensamentos revolucionários, onde recebeu estímulo de seus alunos.

O surgimento das novas tecnologias instigou o designer suíço a realizar experimentações com tipos, fotocomposição (sobreposição de imagens por filme fotográfico), uso de assimetria em composições, e um nível de experimentalismo que não era comum ao Design Gráfico modernista. Resultou no surgimento de uma nova linguagem gráfica, com a perda da hierarquia de informações, a formação de uma visualidade conturbada, e o emprego de inúmeras tipografias em um mesmo projeto.

3. Basle Allgemeine Gewerbeschule é a Escola

de Design suíça onde Weingart ainda leciona.

Processo Tipográfico, Nº4 e Nº5

Sinais Tipográficos , 1971-1972.

Página do livro

Wolfgang Weingart: My Way to Typography

Lars Müller Publishers , 2000.

Se perdeu o interesse na escrita tradicional horizontal esquerda/direita e passou a posicionar seus textos em sentidos não convencionais. Esteve presente o uso de colagens de alfabetos e imagens com o filme fotográfico.

Weingart, apesar das novas experiências gráficas, estava consciente do risco que o emprego das novas tecnologias apresentava às tradições de ofício de compositor. Contudo, o ponto interessante de sua produção é que ele levou o Design para o campo da expressão pessoal, caracterizando o expressionismo tipográfico. Tal fato se verifica que até

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então o designer criava a partir de padrões estabelecidos pela Academia, o que restringia a produção, pois a inovação não era aceita na Escola. A saturação das imagens repetidas orientou o mote na tentativa de oferecer uma nova disposição dos elementos e uma linha gráfica direcionada a cada proposta, transmitindo assim aspectos simbólicos.

O seu trabalho é marcado pelo espaçamento diferenciado entre tipos. A tipografia era baseada nos estudos de semântica, sintaxe e pragmática das funções da tipografia. Enquanto a tipografia suíça se focava na função sintática, Weingart estava interessado em como fazer as qualidades gráficas da tipografia serem utilizadas e retidas no seu significado. Acreditava que alterações nos tipos poderiam intensificar o significado4. Weingart foi responsável pelo surgimento do movimento Punk5 e New Wave6. O último surgiu nos Estados Unidos no fim da década de 70, e a tecnologia eletrônica era utilizada para a geração e manipulação de imagens. Simultaneamente o microcomputador tornou-se ferramenta de trabalho do Design. Nesta período, April Greiman destacou-se pela estética desenvolvida nos projetos, sendo claramente percebida a influência de Weingart devido à ilegibilidade criada pela baixa resolução dos tipos e imagens. O tipógrafo suíço influenciou nomes como Dan Friedman, Willi Kunz e Kenneth Hiebert.

Na década de 90 a diversidade de tipografias difundiu-se no meio profissional, que por fim, baseava-se no estilo gráfico de desafio ao estilo suíço. Conforme Heller, citado por farias (2001, pág 31), contrastava o que chamou de “design feio” com as qualidades clássicas de equilíbrio e harmonia, acusando as escolas de Design de difundir suas idéias experimentais pelo mundo, onde elas teriam sido reduzidas a um estilo sem substância, resultando em uma avalanche de mensagens confusas e ambíguas. Ainda, a polêmica em torno das novas tipografias passou então a girar em torno das questões da legibilidade e do respeito ao leitor. Tais tipografias foram acusadas de estarem criando um corpo de trabalhos anti-estéticos, dificultando a leitura em prol de um “culto ao designer como artista”.

Tais mudanças de paradigmas provocadas por Weingart e reforçadas por seus alunos, deram início ao que é produzido atualmente. As propostas causaram impacto diretamente ao Design posterior, possibilitando a produção livre de antigos conceitos impostos pela Escola Suíça e/ou Estilo Internacional. A descontrução tipográfica frequentemente utilizada, consiste na manipulação dos caracteres, tanto das formas originais como do espaçamento entre caracteres e imposição de ruídos e demais elementos, alterando a legibilidade e muitas vezes perdendo-a totalmente, fazendo com que o caractere tenha função ornamental e não mais a função original, enquanto informação. Cabe questionar se estão sendo preservados tais conceitos e quais os limites da manipulação projetual

4. Segundo Weingart, “What’s the use of being

legible, when nothing inspires you to take notice

of it?”. A partir deste princípio ele consegue

romper o conceito de que “menos é mais”.

5. O movimento Punk era um estilo das ruas

de Londres, tendo ramificações inclusive

no Design Gráfico. Surgido como resposta

ao estilo internacional, ocorreu principalmente

na Grã-Bretanha e tinha por característica

usar letras recortadas de jornais, textos escritos

à mão e/ou à máquina de escrever, imagens

prontas e colagens para reprodução

em litografia ou fotocópia.

6. O New Wave foi um movimento nascido

da oposição ao modernismo, característica

na Holanda e EUA, usava tecnologia

fotográfica e eletrônica para ignorar

os formatos originais, dando-lhes aspecto

de terem sido executados improvisadamente.

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Capa da revista WET

April Greiman , 1979.

Boletim da PCA

Kenneth Hiebert , 1971.

Folheto da Columbia University

Willi Kunz , 1992.

Capa de disco para Elvis Costello

Dan Friedman , 1985.

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renata gastal porto possui MBA em Design (Inovação em Produtos Industriais) pela UniRitter (2009). É graduada em Artes Visuais com Habilitação em Design Gráfico pela Universidade Federal de Pelotas (2007) e Técnica em Programação Visual pelo Centro Federal de Educação Tecnológica de Pelotas/RS.

e casual dos elementos tipográficos e visuais, visto o fácil acesso a programas destinados à manipulação digital.

A desconstrução proposta por Weingart preconizou o que hoje vemos presente nos trabalhos contemporâneos. O que antes era utilizado como nível de experimentação, ainda respeitando as normas da escola suíça, onde eram estudadas novas formas da proposição gráfica, foi se perdendo pelo próprio surgimento das novas tecnologias, clamando por novas tentativas, na busca de um resultado gráfico impactante. Os programas de editoração de tipos, vetoriais e edição de imagem permitem novas linguagens gráficas, mas tornam sistemático os métodos de trabalho difundidos e limitam a resultados repetitivos. O acaso passa a ser metodologia de trabalho onde o processo projetual perde cada vez mais importância

. CONSIDERAÇÕES FINAIS É cabível dizer que a criatividade só se desenvolverá a partir do estudo, da análise e da verificação atenta do mundo. A mudança de comportamento projetual do profissional não é totalmente responsabilidade do estímulo provocado por Weingart. Esta mudança de paradigma deu liberdade ao designer de experimentar, no entanto foram esquecidas as premissas do designer conectado aos ideais de composição.

Podemos caracterizar o Design contemporâneo como eclético, caótico, cheio de ruídos, onde a presença da atitude pessoal é mais característica do que a própria informação a ser comunicada. A iniciativa de Weingart, ao levar o design para a expressão pessoal, hoje é muito percebida e estimulada pelo mercado. São as experiências pessoais que vão configurar os trabalhos gráficos. O próprio estilo de vida, o urbanismo, o apelo ao consumismo e as constantes inovações/transformações tecnológicas determinam a desordem na construção gráfica.

A contribuição de Weingart se fez necessária para modificar os padrões de seu contexto histórico. A produção de hoje executa o desconstruir em demasia, onde fica difícil perceber as diretrizes do projeto. A repetição visual parece começar a não oferecer mais novidades, quem sabe já esteja por surgir algum novo movimento.

BIBLIOGRAFIA FARIAS, Priscila. Tipografia digital. Rio de Janeiro. Ed. 2AB. 2001. ¶BROCKMANN, Josef Muller. Sistema de retículas. Um manual para diseñadores gráficos. Barcelona. Gustavo Gili. 1992.¶DENIS, Rafael Cardoso. Uma introdução à história do design. São Paulo. Ed. Edgard Blucher Ltda. 2000. ¶GRUSZYNSKI, Ana Cláudia. Do tangível ao ilegível. Rio de Janeiro. Ed. 2AB. 2000. ¶HOLLIS, Richard. Design Gráfico, Uma história concisa. São Paulo. Ed. Martins Fontes. 2001 ¶KEITH, Tam. Wolfgang Weingart’s Typographic Landscape. http://keithtam.net/ writings/ww/ww.html.Acessado em: 17/07/2006 ¶KOPP, Rudinei. Design gráfico cambiante.¶EDUNISC. Santa Cruz do Sul. 2004. ¶WEINGART, Weingart. My Typography Instruction at the Basle School of Design/Switzerland 1968 to 1985. http://www.complink.net/greg/designsite/weingart.htm. Acessado em: 17/07/2006

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ARTE E ARQUITETURA NOS AZULEJOS DE ATHOS BULCÃO

POR INGRID MOURA WANDERLEY

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DENTRO DA PRODUÇÃO MODERNA E CONTEMPORÂNEA DAS ARTES PLÁSTICAS E ARQUITETURA BRASILEIRA, ATHOS BULCÃO SE DESTACA COM UMA OBRA QUE RECLAMA JUSTIFICADOS ESTUDOS E QUESTIONAMENTOS. CONSIDERADO UM ARTISTA MÚLTIPLO, PELA SUA FACILIDADE EM PENETRAR E TRABALHAR EM DIVERSAS ÁREAS DAS ARTES PLÁSTICAS E TAMBÉM POR POSSUIR DOMÍNIO DE TÉCNICAS DIFERENTES. AO LONGO DE SUA CARREIRA, ALÉM DO EXERCÍCIO CONTÍNUO DO DESENHO E PINTURA, ELABORA FIGURINOS PARA PEÇAS DE TEATRO, DESENHA CAPAS DE LIVROS E REVISTAS, TRABALHA COM FOTOMONTAGENS E CRIA SÉRIES “MÁSCARAS” E “BICHOS”. É, NO ENTANTO, ATRAVÉS DA SUA INTERVENÇÃO ARTÍSTICA PELO USO DE PAINÉIS DE AZULEJOS QUE ELE ALCANÇA MAIS AMPLO RECONHECIMENTO. COMPREENDENDO SUA OBRA NO CONTEXTO DAS ARTES E DA ARQUITETURA BRASILEIRA NO SÉCULO XX, A ANÁLISE DOS SEUS PAINÉIS DE AZULEJOS REVELA O INTENTO DE OPERAR NO SENTIDO DE UMA INTEGRAÇÃO COM O ESPAÇO ARQUITETÔNICO, DOTANDO-O DE UM FORTE TEOR DE UMA ARTE PÚBLICA.

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ARTE, ARQUITETURA E ARTE PÚBLICAUma forte característica da obra de Athos Bulcão é a opção por múltiplos materiais e suportes: papel, lápis, tela, tinta, cerâmica, concreto, mármore, gesso, massa de modelar, madeira. Porem, existe um alto grau de concentração para que essa multiplicidade alcance a uniformidade de sua obra. Trabalha com rigor e não se permite dispersar.

O primeiro contato com azulejo é quando começa a trabalhar com Oscar Niemeyer, aprende experimentando, errando, aprimorando o olho. Um dos primeiros trabalhos com azulejos é o painel para o Hospital Sulamérica (Hospital da Lagoa) em 1955, projeto de Niemeyer e Hélio Uchôa, no Rio de Janeiro, onde usa negativo e positivo de um desenho em azul e branco. O azulejo tem um desenho geométrico simples e já começa a ser encarado como módulo único e mutiplicável.

Em Brasília seus primeiros painéis de azulejo foram o da Igrejinha Nossa Senhora de Fátima e o do Brasília Palace Hotel, ambos projetos de Niemeyer. O primeiro e único trabalho com simbologia figurativa é o azulejo da Igrejinha Nossa Senhora de Fátima, 1957, onde cria dois módulos sobre fundo azul de tonalidades diferentes e contornados por um friso branco, reforçando a idéia do azulejo como módulo, uma estrela de Belém na cor preta e uma pomba branca, posicionada para baixo. A pomba além de significar o Espírito Santo, faz alusão ao plano piloto de Brasília.

No painel do Brasília Palace Hotel, 1958 parte de conceitos abstratos com deslocamentos das formas, elementos rígidos com objetivo de não destruir a

Igreja Nossa

Senhora de Fátima

© Daniel Souza Lima

Representação dos

Azulejos encontrados

na Igreja Nossa

Senhora de Fátima

simplicidade do ambiente arquitetônico. São azulejos que carregam o mesmo princípio dos azulejos do Hospital Sulamérica, negativo e positivo em azul e branco, de um mesmo módulo.

Athos admite que começou a aprender e entender melhor a arquitetura com Oscar Niemeyer. Sempre trabalhando a convite dos arquitetos e amigos, dentre os quais se destacam Oscar Niemeyer e João Filgueiras Lima, o Lelé; também trabalha em parceria com Sérgio Parada, Haroldo Pinheiro, Cláudio Queiroz, Persina, Glauco Campelo, Hélio Uchôa, entre outros.O Teatro Nacional de Brasília é uma das obras mais citadas e famosas, que exemplifica bem o entrosamento do seu trabalho com a arquitetura, em cujas fachadas laterais desenvolve um painel com blocos de concreto, um jogo de luz e sombras. Neste relevo em concreto adota a idéia de cubos quadrados e retangulares monocromáticos em branco, utiliza o mesmo processo dos azulejos, ou seja, o ponto de partida é uma

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estrutura modular, neste caso um todo com partes medidas e coerentes, organizadas segundo relações numéricas, posicionadas proporcionalmente para serialização. Sob a incidência do sol do planalto de Brasília se estabelece um jogo de luzes e sombras, que transforma o painel a todo o momento, modificando suas formas de acordo com a luz, salientando os volumes e planos, multiplicando a linguagem da geometria (FREITAS, 1997). Segundo Telles (1997), o relevo das fachadas do Teatro Nacional é considerado um momento de destaque na obra de Athos.

afabilidade e cordialidade. Seus painéis de azulejos cumprem função especial em Brasília - cidade, às vezes, inóspita: aproximam, dialogam, oferecem sombra, proporcionam bem estar; não são colocados para preencher algum espaço não resolvido, são pensados desde o início do projeto do edifício (morais, 1998).

Fachada do

Teatro Nacional

de Brasilia

© Blog da Arquiteta

Módulos na

fachada do Teatro

Nacional de Brasilia

© Blog da Arquiteta

Não só pela sua grandeza física, como também pela presença imponente do painel em relação ao edifício e também em relação à própria cidade. O painel define esteticamente o edifício, com sua forte presença ressalta a confiança que existe entre o arquiteto e o artista, onde é difícil saber o que pertence a um e o que pertence a outro, mas fica bem claro a perfeita comunhão de intenções.

Brasília, sem duvida, concentra maior parte de sua obra de integração com a arquitetura. Sua opção de se transferir para lá, escolhendo-a como sua cidade, em detrimento do Rio de Janeiro com todo seu fervor e agitação artística e cultural, demonstra a personalidade tímida e silenciosa do artista, cuja obra é reconhecida e elogiada pela maioria dos críticos de arte. É um artista que, no silêncio e exílio voluntário em Brasília, vem dedicando sua obra ao bem-estar do povo.Transfere para sua criação as qualidades de seu caráter:

Na maioria das vezes participa no projeto desde o início, o que, sem dúvida, ajuda na integração do trabalho. Muitas vezes, pela sua experiência, faz sugestões de cores e materiais que os arquitetos acabam aceitando plenamente e que realmente interferem no ambiente, sempre complementando para uma melhor solução arquitetônica.

É um artista com sensibilidade para trabalhos em espaços públicos, produzindo obras que se incorporaram à paisagem e se encontram acessíveis aos cidadãos, (francisco, 2001). É a favor da democracia, da arte social feita para o povo, talvez integrado também

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NÚMERO ZERO

ao contexto político vivido por ele. Seu interesse e respeito focam-se no público que entra em contato com sua obra por acidente, no transeunte, a caminho de casa ou do trabalho, naquele que não tem conhecimento de artes plásticas.

A arte pública geralmente aparece para resolver uma carência ou um problema da arquitetura e do urbanismo, usa a pintura e a escultura sem perder sua autonomia, para adicionar beleza sem se confundir com a arquitetura e com o espaço público. As obras de Athos, por sua vez, vão ao encontro dessa situação comum. Seus painéis, relevos, divisórias, portas, paredes, não se afastam da arquitetura que os recebe, que os compreende. Seus painéis, pelo contrário potencializam a arquitetura, opta pelas formas

AUTONOMIA E ANONIMATO: PROCESSO DE TRABALHOCertamente deve ser conhecido pelos habitantes de Brasília, por ser o criador dos relevos do Teatro Nacional, e talvez eles não associem a seu nome outras obras que se espalham pela cidade, tão próxima das pessoas, tão familiar pelo contato cotidiano, que já nem percebem que se trata de obra de arte. A esse artista não interessa sua mitificação, há certa negação da autoria em sua obra, no momento que

A ARTE PÚBLICA GERALMENTE APARECE PARA RESOLVER UMA CARÊNCIA DO URBANISMO, USA A PINTURA E A ESCULTURA SEM PERDER SUA AUTONOMIA, PARA ADICIONAR BELEZA SEM SE CONFUNDIR COM O ESPAÇO PÚBLICO

abstratas em seus trabalhos de intervenção arquitetônica. Sua preocupação está em usar poucos elementos e uma escala perfeita e equilibrada. Segue a experiência de Fernand Léger, que prefere usar uma composição abstrata em grandes quadros e a figura humana em pequenos espaços (farias, 2001).

Para Costa (1987) as obras de Athos “estão estética e filosoficamente, comprometidas com a proposta do projeto arquitetônico”, reafirmando seu valor e sua verdade. Não encara o espaço onde seu trabalho é inserido como suporte passivo ou como uma “oportunidade para investir no gigantismo” destacando individualmente seu produto. Ao contrário, a partir da arquitetura trabalha em função desse espaço, cria jogos de ver e pensar que aumentam sua riqueza e seu valor. Athos Bulcão atinge os preceitos necessários que são o de deixar o arquiteto e o edifício como autores e o artista, o colaborador, mas sabe tornar esta colaboração essencial (telles, 1997). Para Costa (1987), a integração das artes e da arquitetura ocorre quando o artista convidado a resolver certos espaços propostos pelo arquiteto, o faz de maneira harmônica, além de compor, a obrase confunde com o espaço criado pela arquitetura.

não assina seus painéis, na medida em que prefere o anonimato, deixando que sua obra seja consumida do jeito que planejou, ou não planejou, quando os operários interferem e contribuem na composição do painel. Nesse momento o artista se preserva, numa postura não vaidosa.

Na sua integração com a arquitetura firma sua marca própria, que se mantém inconfundível, ao mesmo tempo em que se desinteressa pela assinatura. Pode-se reconhecer seu trabalho independente da assinatura, ou seja, a sua assinatura está na combinação das cores, nos motivos geométricos, nos jogos e combinações da composição, na intenção da sua proposta de se misturar ao ambiente, de se integrar ao espaço.

O que marca grande parte de sua produção de painéis de azulejos,

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é a criação em série, com a utilização de elementos repetidos. É através do artesanal que nascem seus trabalhos, obedecendo a um método racional, partindo na busca de clareza e objetividade.

Nos painéis de azulejos, o módulo, a unidade mínima e indivisível se mantém, pois o desenho está sempre dentro dos limites da peça de azulejo, geralmente quadrada, 15x15 cm ou 20x20 cm. Porém, ao unir uma peça as outras quatro, e assim sucessivamente, o desenho se expande para ultrapassar os limites iniciais, ganhando escala imprevista, multiplicando-se virtualmente ao infinito e resultando na expansão do desenho para a escala urbana, sem perda de peso ou complexidade. Ao olhar, de imediato se vê o todo,

em seguida se vê a parte, depois com um olhar mais atento se notam as relações estabelecidas entre eles, de uma análise combinatória que guia a composição. Em alguns painéis, a colocação resulta de um padrão estabelecido: 3 x 1, quando a cada quatro peças, apenas uma pode ter variações (nobre, 1999).

A combinação dos módulos na maioria dos painéis parece aleatória, mas surpreende à medida que mantêm certa uniformidade, tanto nas cores, como nas formas, resultados de trabalhos estudados para gerar composições desejadas. Em certos painéis, o desenho geométrico do módulo lembra um logotipo, em outros, os módulos encaixam-se formando uma seqüência geométrica. As linhas e curvas dos módulos, às vezes, dão continuidade, às vezes, rompem-se, os círculos nunca se fecham.

As fachadas da Igreja de Nossa Senhora de Fátima, projeto de Niemeyer, também chamada a igrejinha de Dona Sarah, desencadearia o processo de abstração na sua obra de integração à arquitetura, abandonando o figurativo e sua subordinação ao tema e concentrando-se na operação de

funcionamento do plano arquitetônico, fixando-se na geometria. Não chega a aderir às manifestações mais radicais do abstracionismo, instalado a partir dos anos 50, no eixo Rio – São Paulo. “A seu modo, e naturalmente informado pelos movimentos de renovação artística no Brasil, Athos Bulcão constrói uma obra muito pessoal, única, que ganha intensidade justamente em torno dos problemas inerentes à produção arquitetônica moderna em Brasília” (nobre,

1999). Suas intervenções abstrato-geométricas o colocam entre os maiores artistas da linha construtiva – concretos e neoconcretos.1

Seus painéis e intervenções são jogos visuais que perturbam o olhar, são jogos lúdicos, onde a genialidade é a simplicidade. Com padrões simples, consegue um resultado surpreendente. Os painéis geométricos geralmente são constituídos por módulos de formas fechadas, lineares ou circulares, polígonos complexos e coloridos. Curvas e retas, círculos e quadrados que se encaixam e desencaixam num ritmo alucinante e cortado, numa harmonia que seduz o olhar, pois numa desordem e combinação aleatória consegue manter uniformidade e equilíbrio.O artista faz o desenho, olha, pinta na

1. Para entender

melhor o conceito

de arte neoconcreta,

a qual perpassa o

trabalho do Athos

Bulcão, ver Amaral

Aracy (coord.) Projeto

construtivo na arte:

1950-1962. Rio de

Janeiro: Museu de

Arte Moderna; São

Paulo: Pinacoteca do

Estado, 1977.

Salão no Palácio

do Planalto

© Roberto Stuckert

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cartolina com guache e corta os quadrados (módulos) e começa a brincadeira, a arrumá-los em diversas posições, sempre no esquema de 4 x 4 (jogo de quadro), freqüentemente em combinações do verde-azul e amarelo-laranja (cabral, 2005).

Geralmente, faz composições de módulos que apresentem várias possibilidades. Nos painéis, usa de um a quatro módulos diferentes e um número pequeno de cores (no máximo cinco), sendo muito comum a presença de somente duas, dentre elas o fundo branco do azulejo (base esmaltada). Criou o “principio de composição” onde os operários é que fazem a criação da composição do painel de azulejos e usa em muitos dos seus trabalhos esse método.

Athos Bulcão é um profissional que sabe pensar a arte e a arquitetura, valorizando os espaços, criando uma identidade própria, usando a arte em função do espaço e dos usuários. Atento às influências do contexto artístico no Brasil, o artista opta por soluções geométricas como temas de seus painéis de azulejos comprometidos com a proposta arquitetônica do edifício; ele trabalha em função da arquitetura, destacando-a e valorizando-a.

Por opção, não assina seus painéis de azulejo, pois quer que sua obra se confunda com a paisagem da cidade, ou que se integre totalmente ao edifício onde esta inserida. Com apurado senso estético, educa a população que não tem contato com arte.

Em contrapartida a essa postura retraída e anônima, surge um grupo de pesquisadoras de Brasília com apoio da Fundação Athos Bulcão, inventariando as obras do artista: elaboraram o projeto Brasiliathos e um projeto de educação patrimonial, Circuito Educativo Brasiliathos, com objetivo mais amplo de sensibilizar a população para a valorização dos nossos bens patrimoniais, os riscos de depredação do patrimônio e importância da qualidade de vida gerada do aspecto artístico-cultural da cidade pela integração arte-arquitetura das obras do artista Athos Bulcão. É interessante lembrar que as ações em favor de disseminação da cultura e incentivos a pesquisas e estudos artísticos e culturais ainda são poucos e pontuais no nosso país.

BIBLIOGRAFIA ¶CABRAL, Valéria. Valéria Cabral: entrevista [abr. 2005]. Entrevistadora: Ingrid Moura Wanderley.

Brasília.¶COSTA, Marcus de Lontra. Athos Bulcão sinfonias da modernidade. Módulo, Rio de Janeiro, n.95,

p.32-37, 1987.¶FARIAS, Agnaldo. Construtor de espaços. In: ATHOS Bulcão. São Paulo: Fundação Athos Bulcão,

2001. p.34-53.¶FRANCISCO, Severino. Habitante do silêncio. In: ATHOS Bulcão. São Paulo: Fundação

Athos Bulcão, 2001. p.322-335.¶FREITAS, Grace. Módulos em expansão. Correio Braziliense, Brasília, 1997. In:

Textos críticos selecionados, Brasília, Fundação Athos Bulcão.¶MORAIS, Frederico. Humanizador dos espaços

de Brasília. Jornal de Brasília, 2 jul. 1998. Edição extra: Athos Bulcão 80 anos. ¶NOBRE, Ana Luiza. Athos Bulcão -

Destino: Brasília. Arquitetura e Urbanismo, São Paulo, v.15, n.85, p.37-44, ago./set. 1999.¶TELLES, Claudio. Sintonia

de arte e arquitetura. Jornal de Brasília, 1997. In: Textos críticos selecionados, Brasília, Fundação Athos Bulcão.

ingrid moura wanderley é professora no curso de Design da Facamp, autora da dissertação de mestrado Azulejo na arquitetura brasileira: os painéis de Athos Bulcão, defendida na Escola de Engenharia de São Carlos, USP

Painel no

Instituto de Artes

em Brasília

© Ricardo Gaioso

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JORGESATO

FORMADO PELA ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING, JORGE SATO COMEÇOU SUA CARREIRA TRABALHANDO EM AGÊNCIAS DE CRIAÇÃO NA CIDADE DE SÃO PAULO. DURANTE ESSE PERÍODO CONHECEU CLAUDIO EDINGER, PREMIADO FOTOGRAFO CARIOCA QUE JÁ TEVE SEU TRABALHO PUBLICADO EM REVISTAS COMO NEW YORK TIMES, NEWSWEEK, VANITY FAIR E EL PAÍS, COM QUEM TRABALHOU POR TRÊS ANOS. SATO ENTÃO DECIDIU MANTER-SE FOCADO EM PROJETOS PESSOAIS DE FOTOGRAFIA, BUSCANDO CRIAR UMA LINGUAGEM PRÓPRIA PARA SE EXPRESSAR DE MANEIRA ÚNICA.O TRABALHO DE JORGE SATO CARACTERIZA-SE PELA COMBINAÇÃO DE IMAGENS CAPTADAS EM MOMENTOS DISTINTOS QUE ACABAM CRIANDO COMPOSIÇÕES SURPREENDENTES. SUAS FOTOS VEM GANHANDO CADA VEZ MAIS RECONHECIMENTO, TANTO POR PARTE DE FOTÓGRAFOS PROFISSIONAIS QUANTO DE APRECIADORES DA LOMOGRAFIA. NESTA ENTREVISTA CONCEDIDA À NÚMERO ZERO, JORGE SATO FALA SOBRE A LOMOGRAFIA, E COMO OS PROCESSOS ANALÓGICOS DE FOTOGRAFIA CONTRIBUÍRAM PARA QUE ELE ENCONTRASSE SEU ESTILO.

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NÚMERO ZERO ENTREVISTA . JORGE SATO

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O QUE É LOMOGRAFIA? QUAL A ORIGEM DESSE TERMO?

COMO SE DIFERE DA FOTOGRAFIA?

Hoje em dia Lomografia é mais que uma marca: é um estilo de fotografia. Sua origem remete à extinta câmera russa Lomo de 1984. No começo dos anos 90, dois jovens de Viena descobriram essa câmera em Praga e começaram a produzir fotos únicas que muitos começaram a se interessar. Surge então a Lomography.

Muitos detalhes que são considerados erros na fotografia clássica, na lomografia é estilo: entrada de luz, vinheta, foco instável e cores explosivas com mudança de tons e contraste devido a métodos diferentes de revelação do filme.

“DIRECIONO A IDEIA ATÉ CERTO PONTO NA COMPOSIÇÃO E DEIXO O ALEATÓRIO FAZER SUA MÁGICA”

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“AS PESSOAS ESTÃO SE INTERESSANDO CADA VEZ MAIS PELO UNIVERSO ANALÓGICO PORQUE ELAS ESTÃO CANSANDO DO IMEDIATISMO QUE O DIGITAL PROPORCIONA. ELAS QUEREM ALGO ÚNICO”

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COMO É O SEU MÉTODO DE TRABALHO? TÉCNICAS, EQUIPAMENTO, LUGARES, ENQUADRAMENTOS, O QUE VOCÊ PROCURA QUANDO FAZ UMA FOTO?

COMO VOCÊ INCORPORA ERROS PARA QUE SE TORNEM PARTE DA ESTÉTICA?

Meu trabalho é baseado entre o conflito de controle da composição usando equipamentos com limitação técnica e de certa forma instáveis, e de deixar um espaço ao acaso para alcançar resultados únicos. Deixo uma fresta ao acaso e não um oceano. Direciono a ideia até certo ponto na composição e deixo o aleatório fazer sua mágica. É claro que muitas vezes o resultado fica abaixo de sua expectativa, mas quando dá certo, tornam-se especiais, além de minha imaginação.

Como costumo deixar uma parte da composição final ao aleatório, acabo não encarando as fusões e múltiplas exposições como erro ou acerto, assim é uma forma de acalmar meu espírito e minha mente. Interpreto como além ou aquém de minha expectativa.

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“O QUE MAIS ADMIRO NA FOTOGRAFIA ANALÓGICA É O SEU PROCESSO LENTO QUE PERMITE O FOTÓGRAFO RACIOCINAR E IMAGINAR A FOTOGRAFIA CLICADA. ESSE EXERCÍCIO É FUNDAMENTAL PARA EVOLUIR O OLHAR”

ENTREVISTA . JORGE SATO

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VOCÊ PROCURA EQUILIBRAR O NIVEL DE EXPERIMENTALISMO COM QUALIDADE ESTÉTICA?

Gosto bastante de experimentações e sempre que possível tento algo novo. Para melhorar a probabilidade do resultado ser além de minhas expectativas, uso sempre mais de uma câmera ao mesmo tempo, às vezes até 5. A mente fica a mil quando você está clicando com tanto equipamento assim, as ideias surgem sem você pensar muito.

SOBRE O CRESCIMENTO DE ADEPTOS À LOMOGRAFIA E O INSTAGRAM COMO ALTERNATIVA DIGITAL, QUAIS AS DIFERENÇAS E SIMILARIDADES ENTRE ELES?Acredito que as pessoas estão se interessando cada vez mais pelo universo analógico porque elas estão cansando do imediatismo e das mesmas fotos que o digital proporciona. Elas querem algo diferente e único.

É aí que a lomografia se encaixa como uma luva. Toda essa experimentação, o processo de lidar com filmes/ revelação se tornam de certa forma uma aventura. É sair da rotina e produzir algo criativo e com estilo. Sobre o Instagram, uso e gosto bastante. Nessa vida precisamos de equilíbrio e esse app é perfeito para isso: enquanto o analógico leva tempo, tem todo um processo para percorrer até você ver o resultado, no Instagram vejo na hora e já compartilho no mesmo segundo algo que não teria tanta graça esperar dias para ser postado. Gosto de pensar que um completa o outro.

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“PARA QUEM QUER SE TORNAR UM FOTÓGRAFO AUTORAL, TER SUA LINGUAGEM, É FUNDAMENTAL. PARA ENCONTRÁ-LA COSTUMA LEVAR CERTO TEMPO, POR ISSO É IMPORTANTE PRODUZIR BASTANTE O TEMPO TODO.”

ENTREVISTA . JORGE SATO

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QUAIS AS VANTAGENS DO PROCESSO ANALÓGICO EM RELAÇÃO À FOTOGRAFIA DIGITAL?

As pessoas costumam me perguntar o que é melhor: digital ou analógico? Costumo responder que ambos são ótimos. Uso digital para algo mais tradicional e comercial e o analógico para uma temática mais autoral e/ou experimental.

O que mais admiro na fotografia analógica é o seu processo lento, o que permite o fotógrafo raciocinar, refletir, imaginar a fotografia clicada. Esse exercício é fundamental para aprender e evoluir o olhar. O lcd é excelente, prático e rápido, mas deixa a pessoa uma pouco preguiçosa, já que você está vendo e não imaginando.

É claro que essa ideia de imaginar depende do contexto e da finalidade da sua fotografia. Para autoral funciona bem, mas caso você esteja fazendo fotos still, você não vai querer imaginar muito. Nessas horas é preciso ser mais pragmático

PRA VOCÊ, QUAL A CONTRIBUIÇÃO DA LOMOGRAFIA COMO FORMA DE LINGUAGEM?Aí depende de cada um. No meu caso a contribuição foi extrema: consegui achar uma voz através da lomografia. Para quem quer se tornar um fotógrafo autoral, ter sua linguagem, sua voz, é fundamental. Para encontrá-la costuma levar certo tempo, por isso é importante pesquisar muitas referências e produzir bastante material o tempo todo.

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ONDE SÃO EXPOSTOS TRABALHOS DE LOMOGRAFOS?

Exposição com lomografia é algo muito novo ainda, não só no Brasil, mas no mundo. Os locais são temporários. Não conheço nenhum lugar, seja loja ou galeria, que tenham fotografias lomo sendo expostas a todo momento. Mas quem sabe no futuro...Enquanto isso, é possível criar uma conta na www.lomography.com.brpara ver trabalhos de lomografia.

ENTREVISTA . JORGE SATO

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DESIGN VS ARTESANATO: IDENTIDADES E CONTRASTESPOR HAROLDO C. EGUCHI e OLIMPIO PINHEIRO

Existem inúmeras controvérsias sobre a origem histórica do design. Alguns autores consideram que o design é herdeiro de toda uma tradição que data à Pré-história, desde que o homem inventou as primeiras próteses que o auxiliaram em seu contato com o mundo externo (bürdek, 2006). Esta visão faz sentido se, a par da origem histórica, analisarmos o termo design do ponto de vista etimológico. Design é uma palavra de origem latina (designáre) que significa marcar, indicar, ou, simplesmente, designar1. Com este conceito – designar, vinculado ao termo design – podemos esboçar o conceito modernista de projeto. Deste modo se poderia dizer que um artesão “designa” uma forma que considera ideal para seu produto, da mesma forma que um designer o faz em seu projeto.

Uma curiosa relação é o fato da palavra latina signáre, ter se transformado, na língua portuguesa, em “ensinar”, cujo significado original incluía: colocar dentro, gravar no espírito. Há evidente contraste com educação (educare), cujo sentido original é retirar para fora, criar, nutrir, conduzir, levar (oliveira, 2008). Não obstante, poderíamos também observar uma identidade entre colocar dentro ou gravar no espírito e conduzir ou levar.

Pensando em termos etimológicos, o designer seria, em síntese, aquele que acrescenta. Mas acrescentaria o que? Tal qual o artista, o designer seria aquele que acrescenta

1. Flusser reconhece em design o sign, derivado

do radical latino signum, que se tornou,

em alemão, Zeichen (signo, desenho).

Seu significado teria estreitas relações com

“esquema maligno, fraude, plano, conspiração”,

uma vez que o objetivo de todo design é

acrescentar valores ao material, valores estes

próprios da cultura, em oposição à natureza.

(flusser, 2002; 2007)

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a forma, ou informa, a matéria amorfa, matéria que para o artesão grego era a madeira2. A discussão platônica sobre a verdade no trabalho do artesão e do artista reside no fato de que a matéria desfiguraria a idéia, o que transformaria artistas e artesãos em charlatães. Deste ponto de vista, enganam as pessoas ao deformarem a idéia ou verdade sob a forma de uma representação falsa3. (lacoste, 1986; flusser, 2002; 2007).

Outra visão é a de que o design deriva de certo tipo de artesanato feito às vésperas da Revolução Industrial. Apóia-se esta tese no fato de existir um projeto a priori e divisão do trabalho incipientes, ou seja, apenas o modo de produção diferenciaria este tipo de produto artesanal do industrial, que veio logo em seguida. (denis, 2000; de fusco, 2005).

Segundo esta linha de pensamento, a base do design estaria na metodologia projetual e criativa, enquanto que do ponto de vista anterior, estaria em um procedimento de bricolagem4, escolher fazer assim a partir de uma tradição e do que está à mão. É importante lembrar que a palavra projeto carrega um significado estritamente moderno. Projeto vem do latim projectus, que significa “ação de lançar à frente” e, portanto, pressupõe que o que se projeta deva ser inovador e vanguardista.5

A terceira, e mais aceita visão, percebe o design como um produto tipicamente industrial e, portanto, não pode existir antes da Revolução Industrial6, datada aproximadamente entre os anos 1760-18307. A partir deste ponto de vista faria muito sentido o nome que o curso possui em algumas universidades, “Desenho Industrial”, já que se ensina um desenho direcionado para a produção industrial em maior ou menor escala. Entretanto, cada vez mais cursos vêm abandonando este confuso e ultrapassado nome, passando a adotar simplesmente o nome de “Design”, como ocorreu com a UNESP/Bauru que alterou o nome do curso em 2007.

Neste contexto, caberia agora nos questionarmos: será que os conhecimentos e aptidões que um designer possui são realmente tão diferentes a ponto de se justificar uma oposição operativa entre design e artesanato? Para respondermos a esta pergunta teremos que tentar questionar mais adequadamente o domínio da atividade do profissional “designer”.

Primeira questão: poderemos considerar que o designer é o profissional responsável por realizar um projeto pensado e esclarecido, tanto do ponto de vista da inovação, criatividade e da percepção e exploração dos materiais, quanto do domínio do modo de produção industrial, levando ao protótipo bem sucedido destinado à seriação? Se a afirmação for verdadeira, então haveria uma diferença enorme entre o designer e o artesão, baseada no conceito de inovação e criatividade aplicada, na consciência dos materiais, no binômio entre a ergonomia e a estética e

2. Em Filosofia a matéria amorfa é conhecida

como hilético ou hylé, que, em grego, significa,

originalmente, madeira. (lacoste, 1986; lalande,

1999). Sua semelhança com a palavra madeira

pode ser notada, mais recentemente, na

denominação “hiléia” atribuída pelos naturalistas

Alexander Von Humbolt (1769-1859) e Aimé

Bonpland (1773-1858) à Floresta Amazônica.

houaiss, Antônio. Dicionário Eletrônico da

Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Editora

Objetiva, 2001. 1 CD-ROM.

3. Esta visão de descrédito nas artes teve uma

guinada no século passado. Heidegger considera

a obra de arte como a única reveladora da

verdade. (lacoste, 1986). Ela não imita a realidade,

mas faz surgir outra realidade implícita. Já para

Merleau-Ponty, o artista é aquele que torna visível

o invisível. (merleau-ponty, 1980; lacoste, 1986).

Na questão da relação entre a realidade e

a representação, quer na linguagem pictórica,

quer na linguagem literária, não se trata apenas

de uma questão de mimesis:

4. Por “bricolagem” aqui se entende o “trabalho

ou conjunto de trabalhos manuais feitos em casa,

na escola etc., como distração ou por economia”

– houaiss (2001). Bricolagem tem origem no

termo francês bricolage (trabalho intermitente)

que deriva de bricoler (movimento de ir e vir).

O termo é aqui aplicado para designar o trabalho

de pequenas oficinas, hoje em dia mais por

passatempo que por obrigação, onde “se fundem

os diversos elementos ao alcance da mão para

criar um novo produto”. (Cf. levi-strauss, 2007;

pinheiro, 1991, p. 271).

“A pintura não é uma linguagem ‘visual’ que designaria diretamente

as coisas que as palavras denominariam. Muito pelo contrário, a pintura

é uma linguagem porque logra indiretamente, ‘tacitamente’ uma

significação. Assim como uma pintura não reproduz o real, sem deixar de

querer exprimir o mundo, um romance não é um relato, a descrição de uma

realidade social existente. Tal como o quadro, o romance é a operação de

um estilo que só indiretamente, obliquamente, chega a uma significação.

Isso explica porque Marx, por exemplo, pôde adotar Balzac. Este faz ver o

mundo do dinheiro, e essa expressão importa muito mais do que todas as

teses legitimistas.” (lacoste, 1986, p. 106).

5. Vide nota 11 sobre styling, adiante

DESIGN VS ARTESANATO

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6. Para percebermos a popularidade deste

ponto de vista, basta consultar algumas obras

referenciais sobre design e observar que os

autores iniciam freqüentemente seus textos

com uma explicação do que foi a Revolução

Industrial. Para citar alguns exemplos, entre

outros: guidot (2005), que, apesar de se focar

no design contemporâneo apresenta uma breve

retrospectiva iniciada em 1772; denis (2000),

que faz uma discussão sobre o termo design

para depois iniciar sua história em 1750. Ou

ainda byars (2007), que nas 832 páginas de sua

enciclopédia não cita nada anterior ao século

XVIII. Por outro lado, pevsner (2002), reconhecia,

nos meados do século XX, este “Desenho

Industrial” como sendo o “Desenho Moderno”.

Restringe assim o seu grau de atuação, e deixa

deste modo implícita a possibilidade de existir

um desenho pré e proto-moderno.

7. No entanto a datação não é consensual,

há até quem observe as raízes da Revolução

Industrial em 1452. Renato de Fusco defende

que houve uma revolução anterior à de 1730,

que seria a revolução da imprensa de tipos

móveis, contendo já todas as características

de uma produção em série a partir de um

modelo pré-determinado e, portanto,

industrial. (de fusco, 2005).

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NÚMERO ZERO

“Em sua evolução nos dois últimos séculos, a técnica é condicionada

pelo acelerado desenvolvimento da ciência e passa a resolver seus

problemas pelo método científico. É o salto evolutivo da técnica,

que passa a caracterizar a tecnologia. Assim, pode definir-se a tecnologia

(...) como um corpo de conhecimentos empregados para controlar,

transformar ou criar coisas ou processos naturais ou sociais, compatíveis

com a ciência contemporânea e controláveis pelo método científico.”

(pinheiro, 1993, p. 46)

8. Sobre técnica e tecnologia:

9. Não pretendemos fazer um contraste,

muito menos uma identidade, entre

artista e artesão, não caberia neste

estudo. O termo “artista”, usado por nós,

distingue-se do artífice medieval

(artes mecânicas), mas também não se

identifica com o artista moderno, posterior

ao século XVIII, cuja obra assenta sobre

uma verdade imaginativa. Pensaríamos numa

outra concepção de artista identificado com

as artes aplicadas posteriores ao Renascimento,

como foram os artistas e artesãos contratados

pelo ceramista inglês Wedgwood, liderados

por John Flaxman, ou o pintor Peter Behrens,

em sua participação na AEG, como designer

de produto. (denis, 2000; de fusco, 2005).

Para situarmos a questão na época

contemporânea, poderíamos pensar

na leva atual de designers pósmodernos

que se preocupam mais com os valores

culturais do que com os valores funcionais

e ergonômicos de sua produção.

(branzi, 1988; guidot, 2004; bosoni, 2006).

numa reflexão sobre os conhecimentos técnicos relativos à produção em série e ao funcionamento do maquinário industrial. Se assim for, o designer contraposto ao artesão seria um profissional ímpar, multi e interdisciplinar, muitas vezes obrigado a atuar em grupo, nas interfaces entre arte, ciência, técnica e tecnologia.8

Por outro lado, poderia caber a pergunta: será que o designer é o “artista” da indústria 9, responsável por incrustar valores nos objetos, sobretudo valores estéticos e culturais, que representem o espírito de sua época ou qualquer outro tipo de aspiração de seu tempo, de modo que caiba à indústria dispor de outros profissionais destinados a cuidar da parte técnica produtiva? Se esta resposta for afirmativa, então a diferença entre o designer e o artesão parece desvanecer-se, ou pelo menos se reduzir drasticamente. A diferença importante entre eles seria a de repertório, não muito maior que a diferença de repertório entre um artesão do nordeste brasileiro de um artesão do norte da Rússia. Neste caso, poderíamos perguntar: não estaria o artesão mais apto a realizar uma produção local do que o designer educado para uma cultura global e globalizante?

Estas questões poderiam desdobrar-se em uma terceira: entre a primeira e a segunda pergunta não poderíamos entrever um caminho do meio? Não seria a pedagogia do design, desenvolvida nas universidades, a responsável por esse perfil de designer globalizado e de costas para a cultura local? Talvez a resposta assente na formação do designer: ora calcada numa visão universal de cultura globalizada, ora apoiada nos valores universais impregnando os regionais, em uma palavra, o universo todo está na minha aldeia.

Paralelamente ao domínio de atividades do designer, parece relevante estabelecer os limites temporais da sua atividade: em que período histórico poderíamos situar a origem do design? A primeira versão citada no início do texto, sobre a origem do design remeter à pré-história (como deixa a entender o famoso corte do filme 2001: uma Odisséia no Espaço), parece-nos fazer sentido. Mas por que esta versão é tão pouco difundida? Não seria o artesanato também um projeto, vinculado às necessidades históricas do seu tempo? Não teria o conceito de projeto também uma história? Não haveria, pelo menos, um conceito de projeto vinculado à técnica ancestral e outro à tecnologia contemporânea? É sabido que no início da industrialização eram artesãos e artistas que realizavam os “desenhos industriais”, herdeiros do secular “desenho ornamental”.

DESIGN VS ARTESANATO

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(...) ARQUITETOS, ESCULTORES, PINTORES, TODOS DEVEMOS

RETORNAR AO ARTESANATO, POIS NÃO EXISTE “ARTE POR

PROFISSÃO”. NÃO HÁ NENHUMA DIFERENÇA ESSENCIAL ENTRE

ARTISTA E ARTESÃO, O ARTISTA É UMA ELEVAÇÃO DO ARTESÃO, A

GRAÇA DIVINA, EM RAROS MOMENTOS DE LUZ QUE ESTÃO ALÉM DE

SUA VONTADE, FAZ FLORESCER INCONSCIENTEMENTE OBRAS DE

ARTE, ENTRETANTO, A BASE DO “SABER FAZER” É INDISPENSÁVEL

PARA TODO ARTISTA. AÍ SE ENCONTRA A FONTE DE CRIAÇÃO

ARTÍSTICA.10 (GROPIUS, 2008).

10. Manifesto da Bauhaus de Walter Gropius

(Weimar, abril de 1919).

11. Ainda não há muito tempo, Gui Bonsiepe,

professor egresso de Ulm, com grande circulação

no Chile de Allende, na Argentina, no México

e no Brasil, opunha design – indicando com isto

o design funcional – a styling, a forma americana

de projetar. Se não vejamos:

“Esta versión del diseño industrial es designada con el nombre de styling.

El styling, como técnica proyectual, al igual que como concesión proyectual,

se agota – con el gesto servil de sumisión a los intereses del valor de cambio

– llevando a cabo modificaciones epidérmicas del producto, con lo cual

se proporciona la ilusión de un producto nuevo y mejorado, en tanto

que su estructura, portadora del valor de uso, queda inalterable. Styling

significa por tanto la continuación de lo idéntico bajo ropajes diversos.

En suma: conservadurismo dinámico.” (bonsiepe, 1978, p. 33-4).

O próprio manifesto da Bauhaus é muito próximo de um discurso de uma guilda de artesãos:

A Bauhaus pretendia revolucionar a arte ao formar artistas-artesãos, num primeiro momento, sob a influência preponderante de Itten e Gropius (fase de sua fundação em Weimar). Após receber críticas abertas de Theo van Doesburg no famoso periódico dos neoplasticistas holandeses De Stijl e, paralelamente, sob a influência do construtivismo russo através das palestras de El Lissitski, houve uma mudança no currículo visando a formação de engenheiros-técnicos construtivistas (segunda fase em Dessau). Com preocupações socialistas sob a direção de Hannes Meyer, este construtivismo funcionalista exacerba-se sob a direção de Mies van der Rohe nos últimos anos da Bauhaus de Dessau e na Bauhaus decadente em Berlim, privilegiando assim a reprodutibilidade técnica e o barateamento dos custos de produção. (de fusco, 2005; droste, 2006).

Este objeto do design bauhausiano, cuja justificativa cultural se apoiava em princípios funcionalistas e nos movimentos de vanguarda construtiva, eram, por sua vez, um feedback de apoio a estes mesmos movimentos, os quais pretendiam uma nova estética de visão de mundo em maior sintonia com a cultura industrial do que com a anterior cultura agrícola milenar. No entanto, se representavam muito bem o espírito da época, seus objetos eram mais lineares e frios, como diríamos hoje sob uma ótica pós-moderna.

Posteriormente, na Escola de Ulm, foi rejeitada a influência formal construtivista. Salvo o design gráfico, que se apoiará na arte concreta, o design de produto negará, em princípio, qualquer forma que não seja exclusivamente de cunho funcional. Fato é que em algum momento entre a Bauhaus e a Escola de Ulm, o termo design sofreu uma deturpação de sentido, passando a ser correntemente sinônimo do design moderno.11 (de fusco, 2005; guidot, 2004).

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NÚMERO ZERO

Estudo de máquina voadora.

Leonadro DaVinci.

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12. Sem excluirmos o racionalismo

que acabou atingindo as camadas populares

a partir da Revolução Francesa.

13. Veja-se, a propósito, o ataque vigoroso

a ideologia funcionalista por Tom Wolfe

em From Bauhaus to our house (1981).

BIBLIOGRAFIA BONSIEPE, Gui. Teoría y práctica del diseño industrial. Barcelona: Gustavo Gili,

1978.¶BOSONI, Giampiero. il Modo Italiano; Italian Design and Avant-garde in the 20th Century.

Torino: Skira Editore S.p.A., 2006. ¶BRANZI, Andréa. Learning from Milan; Design an the Second

Modernity. Cambridge: MIT Press Edition, 1988.¶BÜRDEK, Bernhard E. História, teoria e prática

do design de produtos. São Paulo: Edgard Blücher, 2006.¶DE FUSCO, Renato. Historia del diseño.

Barcelona: Santa & Cole, 2005.¶DENIS, Rafael Cardoso. Uma introdução à história do design. São

Paulo: Edgard Blücher, 2000.¶DROSTE, Magdalena. Bauhaus Archiv. Köln: Taschen, 2006. ¶FLUSSER,

Vilém. Filosofia del diseño. Madrid: Editorial Síntesis, 2002. ¶FLUSSER, Vilém. O mundo codificado:

por uma filosofia do design e da comunicação. São Paulo: Cosac Naify, 2007. ¶GROPIUS, Walter.

Manifesto Bauhaus. In: ArketektUrbo, 2008 (http://www.arkitekturbo.arq.br/bauhaus_manifesto_por.

html).¶GUIDOT, Raymond. Histoire du design de 1940 à nos jours. Paris: Éditions Hazan, 2004.

¶LACOSTE, Jean. A Filosofia da Arte. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1986.

haroldo coltri eguchi é curioso em diversos assuntos, foca sua atenção para a História e a Teoria do Design e possui mestrado em Design pela UNESP/Bauru. olimpio josé pinheiro é professor efetivo da Universidade Estadual Paulista - Júlio de Mesquita Filho (UNESP) e na Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação (FAAC) e possui Pós-Doutoramento em História e Teoria da Arte pela École des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS), no Centre de Histoire et Theorie de l’Art (CEHTA).

Ora, o principal motivo da arte construtivista representar a sua época é porque a Indústria impunha a mesma ordem racionalista e idealista a toda sociedade. Hoje, com a descoberta de novos materiais e meios de produção, não há mais a necessidade de um racionalismo exacerbado ao se projetar a forma do produto. O próprio pensamento racionalista, fruto do Iluminismo, que foi levado à sociedade, impregnando a mente, pelo menos, das pessoas mais esclarecidas12 durante dois séculos parece estar perdendo sua força. As pessoas, no contexto cultural pós-moderno, buscam refúgio na espiritualidade, na identidade e na diferenciação, enquanto que poucos anos atrás buscavam apoio na ciência, na igualdade e no nivelamento. (pinheiro, 2007).

Se os meios de produção permitem produzir praticamente qualquer forma imaginável, e se as correntes construtivistas já não representam mais nossa época, porque o designer – oposto ao artesão – é o profissional certo para a produção industrial? Aliás, caberia questionar – em uma proposta herética: Não seria o designer uma espécie de artesão acadêmico? O termo acadêmico referia-se, desde o romantismo até a Segunda Guerra Mundial, ao artista conservador arraigado na tradição que se desenvolve desde a Renascença, constituindo o reverso da moeda que tinha na outra face as vanguardas do modernismo.

Por analogia, não seria hoje acadêmico o designer preso aos princípios modernistas, em parte originados anteriormente, mas re-elaborados e sublimados pela Bauhaus e pela Escola de Ulm, como um modelo pedagógico difundido para o mundo inteiro?13 Não seria a hora de reconhecermos que a historiografia do design modernista é, em suma, uma história que veio a se sedimentar no preconceito?

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WILLYS DE CASTRO

DE 21.JUL A 14.OUT 2012PINACOTECA DO ESTADO DE SÃO PAULO Praça da Luz, 02 . Luz . Tel.: 11 3324.1000

Terça à Domingo das 10h às 17h30 (com permanência até as 18h e às quintas até as 22h )

Entrada franca das 18h às 22hIngresso: R$ 6,00 e R$ 3,00 (Grátis aos sábados)

AGENDA

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A Pinacoteca do Estado de São Paulo, instituição da Secretaria de Estado da Cultura, apresenta a exposição Willys de Castro, um dos mais importantes artistas brasileiros e representante do movimento Concreto e Neoconcreto, nas décadas de 1950 e 1960. Com cerca de 130 trabalhos, entre pinturas, desenhos, objetos, design gráfico, estudos e projetos, todos realizados entre 1952 e 1988, a mostra tem como ponto de partida as 50 obras que pertencem ao acervo da Pinacoteca do Estado e que estão centradas na produção plástica e gráfica de Willys de Castro (1926, Uberlândia, MG – 1988, São Paulo, SP).

Organizada em ordem cronológica, a exposição é apresentada em três espaços. A primeira tem como ponto de partida a pintura Anjos, de 1952. O estudo dessa pintura, bem como outras pinturas sobre papel desse mesmo período, contextualiza o início do trabalho plástico de Willys com figuras geometrizadas que, em seguida, se desmancham em composições abstratas, regidas por planos de cor. Também são apresentados trabalhos realizados entre 1956 e 1957, período em que Willys se aproxima com mais convicção do credo do Grupo Ruptura e desenvolve uma série de pinturas baseadas em rigorosos princípios matemáticos. Destaque para Pintura 162, Pintura 167, Pintura 172, Pintura M-111 e Pintura 194, sendo as duas últimas pertencentes ao acervo do museu. Nelas, a repetição de estruturas compostas por uma determinada combinatória de formas geométricas resulta ora em progressões crescentes que engendram intensos movimentos centrífugos, ora em ritmos brandos que remetem à cadência musical. Nessas obras, o artista trabalha com elementos e questões comuns ao movimento concreto: cores puras, formas geométricas, efeitos óticos e cinéticos e proximidade com o design gráfico.

Na segunda sala é apresentada a série Soma entre planos e diversos Objetos ativos (1959 – 1962). A série Soma entre planos antecede os famosos Objetos ativos, constituídos por sarrafos de madeira recobertos por telas pintadas com formas geométricas. Essas obras romperam a superfície bidimensional da tela como suporte para a pintura e representaram um dos momentos mais radicais na história da arte no Brasil.

E por último poderão ser vistos os Pluriobjetos, 1988, esculturas de metal ou madeira que resultam de operações semelhantes às dos Objetos ativos. Na série Pluriobjeto A6 (1988), por exemplo, o artista trabalha com estruturas de madeira vertical, na qual explora, através de deslocamentos, diferentes possibilidades combinatórias e sua relação com o espaço. Assim como nos Objetos ativos, em Pluriobjetos, a obra nunca se completa, porque não existe ponto ideal de observação e o visitante deve observá-la de diversos ângulos. Além deles também serão exibidas diversas peças que Willys de Castro desenvolveu como projetista gráfico, marcas institucionais, impressos, rótulos de embalagens, convites, capas de livros e propaganda, em que a programação visual deveria não só ser atender as necessidades funcionais e simbólicas, mas também a questões estéticas. Fonte: Pinacoteca do Estado de São Paulo

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