novo curso de direito civil, volume 7 - 4ed · 15/7/2006 · delimitaÇÃo conceitual da cessÃo de...
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ISBN9788547216511
Gagliano,PabloStolzeNovocursodedireitocivil,volume7:direitodassucessões/PabloStolzeGagliano,
RodolfoPamplonaFilho.–4.ed.–SãoPaulo:Saraiva,2017.1.Direitocivil-Brasil2.Direitodassucessões3.Direitodassucessões-BrasilI.
PamplonaFilho,RodolfoII.Título.16-1553CDU347.65(81)
Índicesparacatálogosistemático:
1.Brasil:Direitodassucessões:Direitocivil347.65(81)
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Vice-presidenteClaudioLensing
DiretoraeditorialFláviaAlvesBravin
Conselhoeditorial
PresidenteCarlosRagazzo
GerentedeaquisiçãoRobertaDensa
ConsultoracadêmicoMuriloAngeli
GerentedeconcursosRobertoNavarro
GerenteeditorialThaísdeCamargoRodrigues
EdiçãoDeborahCaetanodeFreitasViadana
ProduçãoeditorialAnaCristinaGarcia(coord.)|LucianaCordeiroShirakawaClarissaBoraschiMaria(coord.)|KelliPriscilaPinto|MaríliaCordeiro|MônicaLandi|
TatianadosSantosRomão|TiagoDelaRosa
Diagramação(LivroFísico)MarkelângeloDesigneProjetos
RevisãoMarkelângeloDesigneProjetos
ComunicaçãoeMKTElaineCristinadaSilva
CapaRoneyCamelo
Livrodigital(E-pub)
Produçãodoe-pubGuilhermeHenriqueMartinsSalvador
ServiçoseditoriaisSuraneVellenich
Datadefechamentodaedição:23-12-2016
Dúvidas?
Acessewww.editorasaraiva.com.br/direito
NenhumapartedestapublicaçãopoderáserreproduzidaporqualquermeioouformasemapréviaautorizaçãodaEditoraSaraiva.
AviolaçãodosdireitosautoraisécrimeestabelecidonaLein.9.610/98epunidopeloartigo184doCódigoPenal.
NovoCursodeDireitoCivil–v.7
PabloStolzeGagliano
RodolfoPamplonaFilho
1ªedição—set.2014
2ªedição—jan.2015
3ªedição—fev.2016
4ªedição—jan.2017
PABLOSTOLZEGAGLIANO
JuizdeDireitonaBahia.ProfessordeDireitoCivildaUFBA–Universidade
FederaldaBahia,daEscoladaMagistraturadoEstadodaBahiaedoCursoLFG.
MestreemDireitoCivilpelaPUCSP–PontifíciaUniversidadeCatólicadeSão
Paulo. Especialista em Direito Civil pela Fundação Faculdade de Direito da
Bahia.MembrodaAcademiaBrasileiradeDireitoCivil–ABDCedaAcademia
deLetrasJurídicasdaBahia.
RODOLFOPAMPLONAFILHO
Juiz Titular da 32ª Vara do Trabalho de Salvador/BA. Professor Titular de
Direito Civil e Direito Processual do Trabalho da UNIFACS – Universidade
Salvador. Coordenador dos Cursos de Especialização em Direito Civil e em
DireitoeProcessodoTrabalhodaFaculdadeBaianadeDireitoedoCursode
Especialização on-line em Direito e Processo do Trabalho da Estácio (em
parceria tecnológica com o CERS Cursos on-line). Professor Associado da
graduação e pós-graduação (Mestrado e Doutorado) em Direito da UFBA –
UniversidadeFederaldaBahia.MestreeDoutoremDireitodasRelaçõesSociais
pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUCSP. Máster em
Estudios en Derechos Sociales para Magistrados de Trabajo de Brasil pela
UCLM –Universidad de Castilla-LaMancha/Espanha. Especialista emDireito
Civil pela Fundação Faculdade de Direito da Bahia. Membro e Presidente
HonoráriodaAcademiaBrasileiradeDireitodoTrabalho.MembrodaAcademia
de Letras Jurídicas da Bahia, Academia Brasileira de Direito Civil – ABDC,
InstitutoBrasileirodeDireitoCivil–IBDCivileInstitutoBrasileirodeDireito
deFamília–IBDFAM.
Dedicamosestaobra
anossoSenhorJesusCristo,pelaherançadeamorepelolegadode
exemploquedeixouparanossasvidas;
aoMahavatarBabaji,poisumaexistênciaapenasseriamuitopouco
paraagradecer;
às pequenas Giovanna (Nanna) e Gabriella (Bibi), flores que
adornamojardimdenossasvidas,concebidas,nascidasecrescendo
juntocomestaobra;
ao amado amigo Hamilton Barros de Vasconcelos (1959-2010),
comsaudades;
eaosformandosdoanode2010.2doCursodeDireitodaUFBA
— Universidade Federal da Bahia (colação de grau na Reitoria),
UNIFACS 2011 (turmamatutina), UNIFACS 2012 (turmamatutina),
UNIFACS2013 (turmamatutina)eMauríciodeNassau2012.2,que
nosconcederamasupremaglóriaacadêmicadaparaninfia.
Sumário
Agradecimentos
MensagemdeAbertura
Prefácio
Apresentação
NotadosAutoresàQuartaEdição
NotadosAutoresàTerceiraEdição
NotadosAutores
CapítuloI-IntroduçãoaoDireitodasSucessões
1.AMORTECOMOUMFATOJURÍDICO
2.COMPREENSÃODODIREITOSUCESSÓRIO:CONCEITOEFUNDAMENTAÇÃOJURÍDICO-IDEOLÓGICA
3.SISTEMASSUCESSÓRIOSEAQUESTÃODALEGÍTIMA
4.BREVEVISÃOHISTÓRICADODIREITODASSUCESSÕES
5.NOÇÕESBASILARESSOBREHERANÇA
5.1.Conceito
5.2.Naturezajurídicadodireitoàherança
6.SUCESSÃOHEREDITÁRIA:CONCEITOEESPÉCIES
6.1.Classificaçãodasucessãohereditáriapelamatriznormativa
6.2.Classificaçãodasucessãohereditáriapeloconjuntodebenstransmitidos
7.ODIREITODASSUCESSÕESNOSCÓDIGOSCIVISBRASILEIROSDE1916E2002
CapítuloII-PrincipiologiadoDireitodasSucessões
1.INTRODUÇÃO
2.ADIFICULDADEDEUMASISTEMATIZAÇÃOPRINCIPIOLÓGICADODIREITODASSUCESSÕES
3.PRINCÍPIOSGERAISRELEVANTESPARAODIREITODASSUCESSÕES
3.1.Dignidadedapessoahumana
3.2.Igualdade
3.3.Funçãosocialdapropriedade
3.4.Boa-fé
3.5.Autonomiadavontade
4.PRINCÍPIOSESPECÍFICOSDODIREITOSUCESSÓRIO
4.1.Princípioda“Saisine”
4.1.1.Consideraçõesetimológicas
4.1.2.Noçõeshistóricas
4.1.3.Conceito
4.2.Princípio(non)ultravireshereditatis
4.3.Princípiodafunçãosocialdaherança
4.4.Princípiodaterritorialidade
4.5.Princípiodatemporariedade
4.6.Princípiodorespeitoàvontademanifestada
CapítuloIII-DisposiçõesGeraissobreaSucessão
1.INTRODUÇÃO
2.ANALISANDOCRITICAMENTEAPOSITIVAÇÃOBRASILEIRADODIREITODASSUCESSÕES
3.NOÇÕESGERAISSOBRESUCESSÕESNOBRASIL
4.ANATUREZADOsinteressesOBJETODASUCESSÃOHEREDITÁRIA
4.1.Dasupostasucessãoeminteressesjurídicosmorais
4.2.Da“sucessão”depessoasjurídicas
5.ACONFUSADISCIPLINAJURÍDICADASUCESSÃOPELO(A)COMPANHEIRO(A)
CapítuloIV-AdministraçãodaHerança
1.NOÇÕESINTRODUTÓRIAS
2.ADMINISTRAÇÃODAHERANÇA
3.RESPONSABILIDADEDOADMINISTRADORDAHERANÇA(EDOINVENTARIANTE)
4.SUCESSÃOEMBENSDEESTRANGEIROS
CapítuloV-AceitaçãoeRenúnciadaHerança
1.INTRODUÇÃO
2.ACEITAÇÃODAHERANÇA
2.1.Distinçãoentreaceitaçãoedelaçãodaherança
2.2.Importânciahistórica
2.3.Classificação
2.3.1.Aceitaçãoexpressa
2.3.2.Aceitaçãotácita
2.3.3.Aceitaçãopresumida
2.4.Efeitos
2.5.Revogaçãodaaceitação
2.6.Transmissibilidadedodireitodeaceitaçãodaherança
3.RENÚNCIADAHERANÇA
CapítuloVI-CessãodeDireitosHereditários
1.INTRODUÇÃO
2.COMPREENDENDOANATUREZADACHAMADA“RENÚNCIATRANSLATIVA”
3.DELIMITAÇÃOCONCEITUALDACESSÃODEDIREITOSHEREDITÁRIOS
4.DISCIPLINAJURÍDICA
5.NECESSIDADEDAAUTORIZAÇÃOCONJUGAL
6.ASPECTOSTRIBUTÁRIOS
CapítuloVII-VocaçãoHereditária
1.INTRODUÇÃO
2.RELEMBRANDOASDIFERENÇASCONCEITUAISDELEGITIMIDADEECAPACIDADE
3.LEGITIMADOSPARAASUCESSÃOHEREDITÁRIAEMGERAL
4.LEGITIMIDADEESPECIALNASUCESSÃOTESTAMENTÁRIA
4.1.Filhosaindanãoconcebidosdepessoaindicadapelotestador(proleeventual)
4.1.1.Discussãosobreoenquadramentodoembriãocomoproleeventual
4.1.2.Discussãosobreapossibilidadedereconhecimentodevocaçãohereditáriaautônomaaoembrião
4.2.Pessoasjurídicas
4.3.Fundações
4.3.1.Relembrandoasetapasparacriaçãodeumafundação
4.3.1.1.Afetaçãodebenslivrespormeiodoatodedotaçãopatrimonial
4.3.1.2.Instituiçãoporescriturapúblicaoutestamento
4.3.1.3.Elaboraçãodosestatutos
4.3.1.4.Aprovaçãodosestatutos
4.3.1.5.RealizaçãodoRegistroCivil
4.3.2.Notasconclusivassobreavocaçãohereditáriadefundações
5.IMPEDIMENTOSLEGAISSUCESSÓRIOS
6.DA“VOCAÇÃOHEREDITÁRIA”DEANIMAISECOISAS
CapítuloVIII-ExcluídosdaSucessão
1.INTRODUÇÃO
2.EXCLUSÃOPORINDIGNIDADE
2.1.Causasdeexclusãoporindignidade
2.1.1.Autoria,coautoriaouparticipaçãoemhomicídiodolosotentadoouconsumado
2.1.2.Delitoscontraahonra
2.1.3.Violênciaoufraude
2.2.Efeitosdaexclusãoporindignidade
3.TEORIADOHERDEIROAPARENTE
4.PERDÃODOINDIGNO
5.DESERDAÇÃO
5.1.Introduçãoebrevehistórico
5.2.Conceito
5.3.Hipóteseslegaisdedeserdação
5.4.Procedimento
5.5.Efeitosdedeserdaçãoedireitoderepresentação
5.6.Consideraçõesfinais
CapítuloIX-HerançaJacente
1.FINALIDADEDOCAPÍTULO
2.CONCEITO
3.NATUREZA
4.ARRECADAÇÃO
5.HERANÇAVACANTE
6.DISCIPLINAPROCESSUAL
CapítuloX-DaPetiçãodeHerança
1.INTRODUÇÃO
2.CONCEITO
3.NATUREZAJURÍDICAEOBJETIVOS
4.PRAZOPARAEXERCÍCIO
5.LEGITIMIDADE
6.APETIÇÃODEHERANÇAEABOA-FÉ
CapítuloXI-SucessãoLegítima
1.INTRODUÇÃO
2.NOÇÕESCONCEITUAISPRÉVIAS
3.PONDERAÇÕESCRÍTICASACERCADOINSTITUTODAHERANÇALEGÍTIMA
3.1.Sobrea(im)possibilidadedegravaçãodebensdalegítima
3.2.Justacausaparagravaçãodebensdalegítima
4.DISCIPLINAJURÍDICAPOSITIVADADASUCESSÃOLEGÍTIMA
4.1.Consideraçõesgeraiseregrasfundamentais
4.2.RelembrandonoçõesbásicasdosregimesdebensnoCódigoCivilbrasileiro
4.2.1.Regimedecomunhãoparcialdebens
4.2.2.Regimedecomunhãouniversaldebens
4.2.3.Regimedeparticipaçãofinalnosaquestos
4.2.4.Regimedaseparaçãoconvencionaldebens
4.2.5.Regimedaseparaçãolegalouobrigatóriadebens
4.3.Sucessãopelodescendente
4.3.1.Correntesexplicativasdaconcorrênciadodescendentecomocônjugesobrevivente,noregimedacomunhãoparcial
4.3.2.Compreensãodaexpressão“bensparticulares”paraefeitodeconcorrênciadocônjugesobreviventecomodescendente
4.3.3.Concorrênciadodescendentecomocônjugesobrevivente,noregimedaseparaçãoconvencionaldebens
4.4.Sucessãopeloascendente
4.5.Sucessãopelocônjuge
4.5.1.Ousufrutovidual
4.5.2.Direitorealdehabitação
4.5.3.Disciplinaefetivadasucessãodocônjuge
4.6.Sucessãopela(o)companheira(o)
4.7.Sucessãopelocolateral
4.8.Sucessãopeloentepúblico
CapítuloXII-DireitodeRepresentação
1.INTRODUÇÃO
2.BREVEHISTÓRICOECONSIDERAÇÕESTERMINOLÓGICAS
3.CONCEITO
4.CARACTERÍSTICAS
5.FUNDAMENTOEFINALIDADE
6.EFEITOS
7.CONSIDERAÇÕESFINAIS
CapítuloXIII-SucessãoTestamentária
1.CONSIDERAÇÕESINICIAIS
2.NOÇÕESGERAISSOBREOTESTAMENTO
2.1.Sobreopoderdetestar
2.2.Conceitoenaturezajurídica
2.3.Característicasessenciais
2.4.Modalidadesclassificatóriasdotestamento
3.ALGUMASPALAVRASSOBREAVISÃOHISTÓRICADOTESTAMENTO
4.ASPECTOSRELEVANTESDOPLANODAVALIDADEAPLICÁVELAOTESTAMENTO
4.1.Manifestaçãodevontadelivreedeboa-fé
4.2.Capacidadedetestar
4.3.Objetodotestamento
4.4.Formaprescritaemlei
4.5.Prazodasaçõesdeinvalidadedetestamento
5.OTESTAMENTEIRO
5.1.Conceitoenaturezajurídica
5.2.Formasdedesignação
5.3.Requisitosparaoexercício
5.4.Atribuições
5.5.Retribuição
5.6.Prazo
5.7.Responsabilidade
5.8.Extinçãoregulardatestamentaria
5.9.Destituiçãoourenúnciadotestamenteiro
6.REGÊNCIATEMPORALDALEIREGULADORADASUCESSÃOTESTAMENTÁRIA
CapítuloXIV-FormasOrdináriasdeTestamento
1.INTRODUÇÃO
2.ALGUMASPALAVRASSOBREFORMASPROIBIDASDETESTAMENTO
3.TESTAMENTOPÚBLICO
3.1.Requisitosdevalidade
3.2.Daspeculiaridadesdotestamentopúblicoporcaracterísticaspessoaisdotestador
3.3.Aspectosprocessuais
3.4.Consideraçõesacercadapublicidadedestaformadetestamento
4.TESTAMENTOCERRADO
4.1.Requisitosdevalidade
4.2.Sobreaconfecçãodotestamentocerrado450
4.3.Daspeculiaridadesdotestamentocerradoporcaracterísticaspessoaisdotestador
4.4.Procedimentoparaaberturadotestamentocerrado
5.TESTAMENTOPARTICULAR
5.1.Noçõesgerais
5.2.Aspectosprocessuais
CapítuloXV-FormasExtraordináriasdeTestamento
1.CONSIDERAÇÕESINICIAIS
2.TESTAMENTOMARÍTIMOEAERONÁUTICO
2.1.Críticaà“criatividade”danovaformacodificada
2.2.Procedimentodeelaboração
2.3.Caducidade
3.TESTAMENTOMILITAR
3.1.Procedimentodeelaboração
3.2.Caducidade
3.3.Observaçõessobreotestamentonuncupativo
4.DISCUSSÃOSOBREAPOSSIBILIDADEJURÍDICADOTESTAMENTOVITALOUBIOLÓGICO
CapítuloXVI-Codicilo
1.ESCLARECIMENTOTOPOLÓGICO
2.CONCEITOEDENOMINAÇÃO
3.FINALIDADEEOBJETODOINSTITUTO
4.FORMA
5.RELAÇÃODOCODICILOCOMOTESTAMENTO
6.REVOGAÇÃO
CapítuloXVII-DisposiçõesTestamentárias
1.FINALIDADEDOCAPÍTULO
2.DELIMITAÇÃOCONCEITUALDEUMADISPOSIÇÃOTESTAMENTÁRIA
3.TIPOLOGIADASDISPOSIÇÕESTESTAMENTÁRIAS
4.SOBREAINTERPRETAÇÃODOTESTAMENTO
5.SOBREANOMEAÇÃODEHERDEIROSEADISTRIBUIÇÃODEQUINHÕESOUBENSINDIVIDUALMENTECONSIDERADOS
6.SOBREAVALIDADEDASCLÁUSULASTESTAMENTÁRIAS
7.PRAZOPARAIMPUGNAÇÃODASDISPOSIÇÕESTESTAMENTÁRIAS
8.DASLIMITAÇÕESDEEFICÁCIA
9.CLÁUSULASDERESTRIÇÃODEPROPRIEDADE
CapítuloXVIII-Legados
1.INTRODUÇÃO
2.NOÇÕESCONCEITUAIS
3.SUJEITOS
4.OBJETO
5.TIPOLOGIA
6.EFEITOS
7.PAGAMENTO
8.CADUCIDADE
CapítuloXIX-DireitodeAcrescereReduçãodasDisposiçõesTestamentárias
1.INTRODUÇÃO
2.DIREITODEACRESCER
3.REDUÇÃODASDISPOSIÇÕESTESTAMENTÁRIAS
CapítuloXX-Substituições
1.INTRODUÇÃO
2.SUBSTITUIÇÃOVULGAROUORDINÁRIA
3.SUBSTITUIÇÃORECÍPROCA
4.SUBSTITUIÇÃOFIDEICOMISSÁRIA(FIDEICOMISSO)
5.SUBSTITUIÇÃOCOMPENDIOSA
CapítuloXXI-ExtinçãodoTestamento(Invalidade,Caducidade,RevogaçãoeRompimento)
1.INTRODUÇÃO
2.CONSIDERAÇÕESCLASSIFICATÓRIAS
3.INVALIDADEDOTESTAMENTO
3.1.Prazodasaçõesdeinvalidadedetestamento
3.2.Conversãodotestamentonuloouanulável
4.INEXECUÇÃODOTESTAMENTO
4.1.Caducidade
4.2.Revogação
4.3.Rompimento
CapítuloXXII-PlanejamentoSucessório
1.INTRODUÇÃO
2.CONCEITO
3.REGIMESDEBENSEPLANEJAMENTOSUCESSÓRIO
3.1.Comunhãoparcialdebens
3.2.Comunhãouniversaldebens
3.3.Participaçãofinalnosaquestos
3.4.Separaçãodebens
3.5.Implicaçõessucessóriasdoregimedebensadotado
4.ODIREITOSOCIETÁRIOEOPLANEJAMENTOSUCESSÓRIO
5.PLANEJAMENTOSUCESSÓRIOEPARTILHAEMVIDA
CapítuloXXIII-Inventário
1.INTRODUÇÃO
2.DELIMITAÇÃOCONCEITUALECLASSIFICAÇÃODOINVENTÁRIO
3.INVENTÁRIOEESPÓLIO
4.ADMINISTRAÇÃOPROVISÓRIADAHERANÇA
5.OINVENTARIANTE
5.1.Legitimidadeparaadesignação
5.2.Atribuições
5.3.Designação
5.4.Remoção
6.INÍCIOEPRAZODOINVENTÁRIO
7.LIQUIDAÇÃODAHERANÇA
7.1.Sonegados
7.2.Colações
7.3.Pagamentodasdívidas
7.4.Avaliaçãoecálculodoimposto
8.INVENTÁRIONEGATIVO
9.INVENTÁRIOADMINISTRATIVO
10.INVENTÁRIOJUDICIAL
10.1.Procedimentojudicialnoinventáriocomum
10.2.Arrolamento
10.3.Alvarájudicial
CapítuloXXIV-Partilha
1.FINALIDADEDOCAPÍTULO
2.NOÇÕESCONCEITUAISFUNDAMENTAIS
3.ESPÉCIESDEPARTILHA
4.LEGITIMIDADEPARAREQUERIMENTODAPARTILHA
5.PARTILHAEMVIDA
6.ISONOMIANAPARTILHA
7.ALIENAÇÃOJUDICIAL
8.HOMOLOGAÇÃODAPARTILHA
9.DAGARANTIADOSQUINHÕESHEREDITÁRIOS
10.DAINVALIDADEDEPARTILHA:AÇÃOANULATÓRIA(ANULAÇÃODAPARTILHA)EAÇÃORESCISÓRIA
11.Sobrepartilha
CapítuloXXV-ResíduosSucessórios
1.FINALIDADEDOCAPÍTULO
2.DELIMITAÇÃOCONCEITUAL
3.TRATAMENTOJURÍDICO
4.RESÍDUOSSUCESSÓRIOSERELAÇÕESTRABALHISTAS
5.ATÍTULODEARREMATE
Referências
Agradecimentos
Umavezescrevemos:
“Reconhecer-segratoéoexercíciodaverdadeirahumildade,queésaberque,sozinho,nãoseconsegue
nada,poisconquistasisoladassãovitóriasdePirro,emqueobteroresultadonãosignificanecessariamente
desfrutá-lo...
(...)
Gratidãoéarespostasinceraqueoafetoexigeporcoerência!
Éamarcaquerenovaaesperança,quenãoéaúltimaquemorre,postoimortal,mas,sim,acertezadeque
aindasepodeterfénahumanidade.”
Porisso,agradecemostodosaquelesqueestiveramaonossoladonaredação
deste livro, especialmentePinho,Virgínia eLourdes (pais), Fred,Camila,Luiz
Augusto e Ricardo (irmãos), Kalline e Emília (esposas), Giovanna (Nanna) e
Gabriella (Bibi) Stolze, Marina e Rodolfinho Pamplona (filhos), Dra. Célia
StolzeSilvany,FernandaBarretto,ThaisRodrigues,SarahRaquelSilvaSantos,
PolianaAlbuquerque(queridasamigasdaEditoraSaraiva),AnaCecíliaRosário
Ribeiro (PI), Marina Ximenes, Lueli Santos, Juliana Corbal, Murilo Sampaio,
MaurícioBranco,Priscylla JustMarizCosta,LuizCarlosVilasBoas,Gabriela
Curi,DaniloGaspar,TalitaMoreiraLima,LeandroFernandez,RenataTavaresde
Alcântara, Júlia Pringsheim Garcia, Alexandre Machado, Salominho Resedá,
RobertoFigueiredo,FredieDidier Jr.,PaulaSarnoBraga,AmandadeAlmeida
Santos, Edilberto Silva Ramos, Nadialice Francischini, Aloisio Cristovam dos
Santos Júnior, Marcos Avallone (MT), Ricardo Aronne (PUCRS), Gonzaga
Adolfo(Gravataí/RS),MarcosCatalan(Unisinos/RS),DanielBoaventura,Lorena
Pimenta,Lucas“Pig”,Thelma,AdrianoeDavi(pelaagradávelvisitaemPraiado
Forte),Greg,Talita,Fábio,Caioetodaaequipedo“PapeandocomPamplona”,
Leiliane Ribeiro Aguiar (“Leila”), Paula Cabral Freitas, Edson Saldanha,
Marianna Chaves, Charles Barbosa, Eliza Cerutti, Monique Teixeira, Luna
Ramacciotti, Flávio Tartuce, Felipe Ventin, Júlia Pringsheim Garcia, Nathalia
Cavalcante,GilbertoFreitas,MarcelaFreitasetantosoutrosamigosdocoração.
RegistramosumagradecimentoespecialatodososformandosemDireitoque
reservaram um espaço em seus corações para a lembrança de nossos nomes,
quandode sua colaçãode grau, notadamente os formandos deDireitoMatutino
Unifacs 2010 (TurmaB) eDireitoUFBA2011.2, que nos elegeram “professor
homenageado”.
MensagemdeAbertura
Doisdelirantes!
Talvez seja esta amaior característicaqueaproximaPabloStolze eRodolfo
Pamplona.
Sim,ambos sãoprofessores,magistrados,doutrinadores, estudiosos,mas têm
comodiferencialacapacidadedeapostaremumajustiçamaisrenteàrealidade
davida.
Esta crença, eles conseguem transmitir com entusiasmo, com paixão, com
convicçãoatodosqueosescutam.
Eacabamcativandoatéquemnãoosquerouvir...
Quemosouvecomdesconfiança...
Eatéoscéticos.
Éoqueosdiferenciadosdemaiseosaproxima.
Daí o qualificativo de delirantes — que, ao contrário do que parece, de
pejorativo,nãotemnada.
Bemaocontrário.
Nãovejomaiorelogioquesepossafazeraalguém.
Aliás, talvez seja esta capacidade de acreditar em sonhos que nos faz tão
próximos.
Esonharjuntoalimentaaconvicçãodequesomoscapazesdemudaromundo.
Pretensioso,não?
Nemtanto!
Bem, agora estes dois juristas se debruçam sobre o ramo de direito que
ninguémgostamuito,querporquelembreamorte,querporque,daformacomoo
temaétratadonaleicivil,émuito,muitoruim.
MudouoCódigoCivileesqueceramdemudarodireitosucessório...
Conclusão: não há, no Direito Civil brasileiro, nada mais hermético, com
termosparaládeininteligíveis.
E não é que Pablo e Pamplona conseguem emprestar suavidade ao texto,
usando uma linguagem acessível e de fácil compreensão, a tornar este insípido
temapalatável?
Bem, deliciem-se todos, pois, com esta leitura e se permitam embarcar no
mundoencantadodavidaalémdodireitoquetratadamorte.
Bomproveito...
MariaBereniceDias
Advogada.Desembargadora(aposentada)doTJRS.
Prefácio
Ofundamentododireitosucessórioestáconstruídoemprincípiosquebuscam
espelharosmaisdiversospontosdevista,osquaisvêmsendorepetidosaolongo
dosséculosepelotranscursodehistóricasgerações.
A morte é o ponto de partida do direito sucessório e, para explicá-lo, os
doutrinadores têm registrado durante eras uma dezena de conhecidas teorias
tentandojustificaratransmissãohereditária.
As grandes transformações operadas na instituição familiar iluminam, na
atualidade,caminhosqueovigentesistemasucessóriodeveriaacolher,diantedas
novasdemandasdasociedadeedosdestinatáriosdoDireitodasSucessões.
Aherançadopresente jánão influi tantocomosucedianopassado,comuma
concentração imobiliária da riqueza das pessoas, enquanto na atualidade as
fortunas encontraram novas frentes e distintos desafios, e costumam, com
frequência, estar empregadas em sociedades empresárias, representadas por
quotaseações.
Curiosaeestranhamente,oCódigoCivilbrasileironãodesenhouestecaminho,
como tampouco tem sido protagonista das novas demandas que reescrevem
sensivelmenteodireitosucessório.
O sistema sucessório brasileiro teve poucas alterações com a assunção do
CódigoCivilemvigordesde2003,sendofatodignoderegistroainquestionável
evidênciadehaverpretendidomelhoraraposiçãodocônjugesobrevivente, até
bemmais do que a posição do convivente viúvo, ao incluí-los comoherdeiros
concorrentes, variando, em princípio, em conformidade com o regime de bens
eleitopeloscônjugesoucompanheiros.
Também não foi muito adiante dos novos instrumentos de concorrência
sucessória,que têmgerado incansáveisembatesdoutrináriose jurisprudenciais,
trabalhandoos tribunaisnopropósitodeconciliaraparticipaçãohereditáriado
parceiro sobrevivente comosprincípios que regemos regimespatrimoniais de
bens.
Diferentedaciênciajurídicaanglo-saxônica,otestamentobrasileiro,seguindo
aculturajurídicacontinental,restringealivredisposiçãodosbensdequemtem
herdeirosconsideradosforçosos.Cédulastestamentáriastambémcontinuamentre
nóscomomanifestaçõesunilateraisdevontade,comrelativoreflexopatrimonial
e com parcial projeção para servir como instrumento para uma planificação
sucessória, de quem, em regra, só tem parcial poder de distribuição da sua
herança.
Odireitosucessóriobrasileiroaindainsisteemdiferenciarmodelosfamiliares,
comoresisteemaceitartestamentosmancomunados,ounegóciosfiduciários,isto
sem falar na expressão rejeição que faz dos pactos sucessórios, que encontram
inexplicável proibição no art. 426 do Código Civil, como se sempre eles
retratassemabjetospactosdecorvina.
Existeoutrodireito sucessório transitandopordetrásdo cenário identificado
pela reproduzida codificação civil, novo direito que não mais repousa
exclusivamente nas antigas instituições. Um bom exemplo dessas novas
inquietações pode ser alçado da crescente preocupação com a transmissão das
empresas familiares e suas configurações societárias, que precisam ser
harmonizadascomas relaçõesafetivas rotaspelamortedocônjugeempresário,
nascendodoseudecessonovastitulaçõeshereditárias,comherdeirosemeeiros
vindicandoparasiasantigasposiçõessocietárias.
O acerto com que os laureados autores Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo
PamplonaFilhoumavezmaisintroduzemnacomunidadejurídicaoutrotrabalho
defôlego,desta feitaconsubstanciadonoVIIvolumedoaplaudidoNovoCurso
de Direito Civil, que trata do Direito das Sucessões, sempre com o selo de
qualidadedaeditoraSaraiva,trazàluzoconhecidorótulodeexcelênciaquetem
diferenciadoosconsagradosescritores.
EmtudoqueproduzemosProfessoresPabloeRodolfovãoadiantedonosso
tempoedoslimitesdoCódigoCivilbrasileiro,eesteéopontoaltoofertadopelo
agraciado e esperado volume, dedicado ao direito sucessório, mas sem as
conhecidas estreitezas de uma doutrina de repetição, mas, bem ao contrário,
desencadeiam os autores capítulos com títulos e temas com inegável visão
contemporâneadoDireitodasSucessões,cujaobraé impulsionadapelosevero
exameeolhardeumclássicodireitosucessório,masemcompletasintoniacomo
novo direito sucessório, como, por exemplo, quando versam acerca dos
princípiosdoDireitodasSucessões,ouquandoabordamasucessãodepessoas
jurídicas, ou tratam do testamento vital, e do planejamento sucessório, também
desenvolvidocomprofundidadeededicadamaestria.
Sou, portanto, sucessiva e eternamente agradecido aos meus diletos amigos
Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, pela ventura que me
proporcionaram em prefaciar um livro escrito por quem todos conhecem e
admiramedirigidoàquelesquehámuitoadmiramotalentodestesdoisartistasda
ciência jurídica, e que, desde o primeiro volume, aguardavam, como eu, que a
esplêndidacoletâneadeDireitoCivilfosseagraciadacomopresentevolumedo
DireitodasSucessões.
RolfMadaleno
AdvogadoespecialistaemDireitodeFamília,
Professoremdiversasuniversidadesdopaís
eautordelivrosdereferêncianacional.
<www.rolfmadaleno.com.br>
Apresentação
PabloStolzeGaglianoeRodolfoPamplonaFilhoformamumaparceriaquedeu
certo.Umcasamentointelectualsemdivórcio.Jáproduzirammuitaseimportantes
obras jurídicas e servem de referência no plano mais alto e nobre da cultura
brasileira. A par de escritores excelentes, são professores renomados,
magistrados exemplares, conferencistas requisitadíssimos, que encantam
auditórios de todos os pontos de nosso país. Já os assisti muitas vezes e vi,
emocionado,plateiasinteirasosaplaudiremdemoradamente.
Em2002,apósumalongatramitação,foiaprovadooCódigoCivilbrasileiro
para substituir o antigo, de 1916. Rodolfo e Pablo tiveram a feliz ideia de
escreverumtrabalhocompletosobreo temae logoescolheramo títulodaobra
projetada:NovoCursodeDireitoCivil.Felizmentepara todosnós,o sonho se
tornourealidade.
A pedido dos autores, de quem sou admirador, faço a apresentação deste
volume, que integra o aludido e vitorioso Curso, e descreve, com carinho e
altíssimacompetência,oDireitodasSucessões.
Com arte e engenho, os dois jovens e vitoriosos mestres construíram um
trabalho emque assuntos de grande complexidade, recheados de controvérsias,
sãoexpostosdidaticamente,comsimplicidade,facilitandooqueàprimeiravista
parece tão difícil.A análise dasmatérias é feita cuidadosamente, commáxima
competência, numa linguagem compreensível, objetiva, que, sem fugir um
milímetro do rigor científico, torna este livro acessível a todos. Como juristas
verdadeiros, o objetivo é dividir democraticamente o saber e abominam a
linguagem empolada, gongórica, afetada. Terãomuito gosto, enorme proveito e
grande prazer na leitura tanto os já conhecedores ou especialistas na matéria
como os estudantes, que, ansiosos e curiosos, dão os primeiros passos nos
caminhosfascinantesdoDireito.
Este trabalho não traz uma repetição de temas, alguns deles, aliás, de
antiguidademultissecular.Aocontrário,éumaobraquetrata—etratabem—,
com uma visão atualizada e prospectiva, dos assuntos que estuda. De forma
singulareinstigante,osautoresanalisamalgunsaspectosdasucessãohereditária,
resultantes da modernidade ou da evolução tecnológica, como a vocação
hereditária autônomado embrião, a questãodo testamentovital oubiológico, a
crítica à “criatividade” da nova forma extraordinária de testamento, resíduos
sucessórioserelaçãotrabalhista,paracitarapenasalguns.Destacoaminuciosae
importanteabordagemdoplanejamentosucessório,assuntodemagnaimportância
eatualidade,aquienomundointeiro.
Pablo e Rodolfo honram a luminosa tradição de juristas baianos, cujos
expoentes,nacivilística,sãoos imortaisAugustoTeixeiradeFreitaseOrlando
Gomes.
Estaproduçãoveioparamarcarechegouparaficar.Nasceuforteeterávida
longuíssima.Nãoésomentemaisumlivronemumlivroamais.Representauma
obravigorosa,bempensadaebemescrita—oqueosleitorespercebemdesdeas
primeiraspáginas—,devalorinestimável,deenormeutilidade,quevemprestar
umrelevanteserviçoeéfundamentalparaoconhecimentoeaboacompreensão
damatéria.Estelivro—nãotenhodúvidasemafirmar—éumtestamento,não
como disposição mortuária, mas no sentido de testemunho, que tem efeito em
vida,comoumdosmaisnotáveisexemplaresdaliteraturajurídicabrasileira.
RodolfoePablo,queridosamigos,comonogloriosoSalmo91,queosanjosos
tomemnassuasmãosparaquenãotropecemseuspésemalgumapedra.
RiodeJaneiro,janeirode2014.
ZenoVeloso
ProfessordeDireitoCiviledeDireitoConstitucionalAplicadona
UniversidadeFederaldoParáenaUniversidadedaAmazônia.Diretordo
IBDFAM.MembrodaAcademiaBrasileiradeLetrasJurídicas.
NotadosAutoresàQuartaEdição
Oanode2017prometeserummarcoemnossasvidas!
Nessadata,completamos15anosdaestreiadovolume1 (“ParteGeral”)do
nossoNovoCursodeDireitoCivil,oprimogênitodeumaprofícuaparceria,que
logofoisucedidoporváriosvolumes,inclusiveestelivro,totalmentefocadoem
umavisãoabrangentedas“Sucessões”.
Comefeito,maisdoquecolegas,tornamo-nosparceiros.
Maisdoqueparceiros,tornamo-nosamigos.
Maisdoqueamigos,tornamo-nosirmãos.
E,nessafraternidade,váriosfrutosforamgerados.
Até o momento, lançamos, juntos, 8 obras em coautoria, a saber, 7
volumes/tomosdonossoNovoCursodeDireitoCivil(ParteGeral,Obrigações,
Responsabilidade Civil, Teoria Geral dos Contratos,Contratos em Espécie,
Direito de Família e Sucessões), e uma obra apartada, O Novo Divórcio,
publicadaquandodapromulgaçãodaEmendaConstitucionaln.66/2010.
Masessafraternidadecontinuaaproduzirnovosresultados!
Justamentenoanoemque“debutamos”,aocompletar3lustrosdepublicações,
você,amigoleitor,équemganharáopresente.
Alémdahabitualededicadarevisãoeatualizaçãodotextodestanovaedição
quechegaàssuasmãos,temosaimensahonradeanunciarque,nesseano,temos
tambémaprevisãodelançardoisnovos“filhos”.
O primeiro é o volume 5 da coleção, inteiramente dedicado ao estudo dos
“DireitosReais”,quejáestásendoultimadonomomentoemqueseredigemestas
linhas.
Osegundoéapéroladanossaprodução:umManualdeDireitoCivil,como
cursocompletodadisciplina,que facilitaráaconsulta rápidadenossosamigos
leitoresemumúnicovolume,abrangendotodososramosdoDireitoCivil,com
precisãotécnica.
Eumfilhonãoconcorrerácomooutro.
OManual terá a característica da consulta rápida, condensada, enquanto os
tomos do Novo Curso de Direito Civil terão cortes epistemológicos bem
direcionadosàsdisciplinasespecíficas, comoaprofundamentodequestõesque
nãosãopossíveisemumaobradaenvergadurado“volumeúnico”.
Um complementando o outro, sem tomar o seu espaço, como devem se
comportarmembrosdeumamesmafamília.
Nestanovafasedenossasvidas,rendemoshomenagensavocê,queridoleitor,
portodooapoioecarinhodemonstrados.
Reiteramos nosso pedido para que nos ajude a cumprir nosso permanente
compromissodehonraramissãodeensinaronovoDireitoCivilbrasileirocom
profundidade,objetividadeeleveza.Porisso,continuamossempreabertosatoda
equalquersugestãodeaperfeiçoamento,quepodenosserenviadapelosnossos
e-mailspessoais,aquidivulgados.
Essasaudávelinteraçãovirtualnostemfeitomuitobem(eaumentado,acada
edição,alistadeagradecimentos...).
Muitoobrigadoportudo!
ComDeus,sempre!
Salvador,novembrode2016.
PabloStolzeGagliano<[email protected]>
RodolfoPamplonaFilho<[email protected]>
Visitenossossites:<www.pablostolze.com.br>e
<www.rodolfopamplonafilho.com.br>
NotadosAutoresàTerceiraEdição
Anualmente, a cada nova edição da obra, temos feito cuidadosa revisão e
atualizaçãodotexto.
Muitas vezes, procedemos também com ampliações, incorporando novas
reflexõesedissecandoinstitutosantesnãoabordados.
Todavia,oquefizemos,destavez,comtodaacoleção,queagoraentregamos
aonossoqueridopúblicoleitor,foimuitomaisdoqueisso.
Defato,oanode2015semostrouprofícuoemmatériadeproduçãolegislativa.
OadventodeumnovoCódigodeProcessoCivil, naperspectivadodiálogo
dasfontes,afetouprofundamenteaspectosdodireitomaterial.
Sem esquecermos a importância e o impacto do Estatuto da Pessoa com
Deficiência.
Destaque-se, ainda, que boa parte da doutrina e jurisprudência aqui trazida,
emboraatualizada,serefere,pormotivosóbvios,àlegislaçãoprocessualcivilde
1973,oquedeixamosclaroaonossoleitor.
Neste novo nascimento, renovamos também o nosso compromisso demanter
esta missão de ensinar o novo Direito Civil brasileiro com profundidade,
objetividade e leveza, sempre abertos a toda e qualquer sugestão de
aperfeiçoamento, pelo que informamos nossos atuais e-mails e sites para a
saudávelinteração,pessoale/ouvirtual.
Muitoobrigadoportodooapoioquevocê,queridoleitor,nosproporciona!
ComDeus,sempre!
Salvador,dezembrode2015.
PabloStolzeGagliano<[email protected]>
RodolfoPamplonaFilho<[email protected]>
Visiteossites:<www.pablostolze.com.br>e
<www.rodolfopamplonafilho.com.br>
NotadosAutores
Estevolume,quehojechegaàsmãosdonossopúblicoleitor,foiumadenossas
obrasquenosdeumaistrabalho.
NãoquenãonosdeliciemosemescreverouministrarliçõessobreDireitodas
Sucessões.
Muitopelocontrário!
Trata-sedeumramodoDireitoCivilfascinante,notadamenteporenvolveras
consequênciasjurídicasdeumacertezainquestionáveldavida,queéacertezada
morte.
Todavia, o grande desafio para a redação deste livro foi o fato de que a
disciplina positivada no vigente Código Civil brasileiro, sobre o Direito das
Sucessões,é,sobumsinceroolharreflexivo,assistematizada.
Temascominequívocaparidadefuncionalsãotratadosemmomentosdistintos
enãoé raroencontrardispositivos legaise institutos jurídicos topologicamente
espalhados e misturados, sem uma indicação razoável acerca da opção do
legislador.
Por isso, em respeito à lógica e à precisão das ideias, a nossa proposta
acadêmica foi “ressignificar” a normatização codificada, tentando lhe dar uma
visão metodologicamente sistemática, o que fez com que “rearrumássemos” o
textolegal,nemsempreseguindoaordemdoCódigo(emboratodososartigosdo
LivrodasSucessõestenhamsidoabordadosnotextoaquiapresentado).
Foiumtrabalhoprofundamenteexaustivo—emborasempreprazeroso—que
demoroucercadetrêsanosparachegaraofinal.
Claroque,nesteperíodo,nãoficamosapenasescrevendoolivro.
Muitovivemosdesdeo lançamentodoúltimo“irmão”destanossaproleque
chegaagoraaovolumedeencerramentodacoleção.
Aprofundamos nossos diálogos inter e transdisciplinares, participamos
ativamentedeconclavesjurídicoseintercâmbiosculturais,tornamo-nosmembros
de prestigiadas associações de debate e reflexão doDireitoCivil,ministramos
cursospeloBrasile,omaisimportantedetudo,mantivemospermanentecontato
comosnossosleitores,conhecendo,aindamais,osseusdesejosenecessidades
profissionaiseacadêmicas.
Porisso,temosaimpressãodequea“demora”paraotérminodestevolumefoi
uma consequência quase natural de um processo de intenso amadurecimento
intelectualeemocional,renovandoonossogostodeviveredeproduziromelhor
resultadopossível.
Eestelivroéofrutodetodonossoesforço.
Esperamos, sinceramente, que você, que lê estas linhas, tenha também a
satisfaçãoquenós—enossosamigos(quefizeramostextosdeapresentação)—
tivemosaoveroresultadofinal.
Para fazer a nossa tradicional nota de abertura, convidamos uma “baiana
honorária”, nossa doce amiga Maria Berenice Dias, nome que dispensa
apresentações pela sua militância na luta por uma sociedade mais digna e
respeitosacomadiversidade.
Para o prefácio, fomos brindados com um lindo texto do amigo Rolf
Madaleno, advogado brilhante e professor respeitadíssimo, uma das maiores
autoridadesbrasileirasnoramodoDireitodasSucessões.
Paraaapresentação,deleitamo-noscomaagradável inteligênciaepoesiado
insuperávelZenoVeloso, uma das figurasmais emblemáticas e conhecidas do
DireitoSucessóriobrasileiro.
Naorelha,contamoscomoencantodajovemProfessoraFernandaBarretto,
ex-aluna e hoje colega, um dos mais brilhantes talentos da nova geração de
civilistasbrasileiros,comdestaquenaáreadeFamíliaeSucessões.
Trata-sedeum time respeitávelquenosacompanhanoapadrinhamentodesta
obra.
Nossodesejoéque,tomandonossospadrinhosemadrinhascomotalismãs,ela
encontre, neste nascimento, sucesso igual ou maior do que seus “irmãos mais
velhos”,orgulhandoatodaa“família”doNovoCursodeDireitoCivil.
Abraçosatodosos“amigosdocoração”!
Salvador,setembrode2010.
PabloStolzeGagliano<[email protected]>
RodolfoPamplonaFilho<[email protected]>
Visiteossites:<www.pablostolze.com.br>e
<www.rodolfopamplonafilho.blogspot.com>
CapítuloI
IntroduçãoaoDireitodasSucessões
Sumário: 1. A morte como um fato jurídico. 2. Compreensão do Direito Sucessório: conceito e
fundamentação jurídico-ideológica. 3. Sistemas sucessórios e a questão da legítima. 4. Breve visão
histórica do Direito das Sucessões. 5. Noções basilares sobre herança. 5.1. Conceito. 5.2. Natureza
jurídicadodireitoàherança.6.Sucessãohereditária:conceitoeespécies.6.1.Classificaçãodasucessão
hereditária pela matriz normativa. 6.2. Classificação da sucessão hereditária pelo conjunto de bens
transmitidos.7.ODireitodasSucessõesnosCódigosCivisbrasileirosde1916e2002.
1.AMORTECOMOUMFATOJURÍDICO
Obrasileiro,emgeral,nãocostumafalardamorte.
Muitos dizemque isso trazmau agourooupode, atémesmo, propiciar a sua
chegadamaisprecoce,oqueninguémquer 1.
Maso fato é que amorte faz parte da vida, sendo a única certeza de toda a
nossatrajetória,independentementedecredooufilosofia.
Encerrandoocicloexistencialdajornadahumana,amortedesafia,háséculos,
acuriosidadedediversospensadores,emváriosramosdoconhecimento,desdea
antiga Alquimia, chegando à moderna Física Quântica, singrando os mares da
BiologiaeatracandonopróprioDireito.
Soboprismaeminentementejurídico,temosqueamorte,emsentidoamplo,é
um fato jurídico, ou seja, um acontecimento apto a gerar efeitos na órbita do
Direito. No entanto, a depender da circunstância, o enquadramento deste fato
poderá, em nível subtipológico, variar: a morte natural de uma pessoa de
avançadaidadeé,nessalinha,um“fatojurídicoemsentidoestrito”;aopassoque
umhomicídiotraduzum“atoilícito” 2.
OutrointeressanteaspectoatinenteàmorteénoPlanodeEficáciadoNegócio
Jurídico,quandoseestudamosseuselementosacidentais,especialmenteotermo
eacondição 3.
Amorte,emprincípio,nãoéconsideradacondição:oindivíduonasceetema
certezadequeumdia irámorrer,mesmoquenão saibaquando (acontecimento
certusaneincertusquando).Trata-sedeumtermocomdataincerta.Imagine-se
ahipótesedeumadoaçãocondicionadaaofalecimentodeumparentemoribundo:
obrigo-meatransferiraterceiroaminhafazenda,quandoomeuidosotio,que
láseencontra,falecer.
Adoutrina, poroutro lado, costuma lembrar a hipótesede amorte vir a ser
considerada condição. Se a doação, figurada linhas acima, for subordinada à
mortedemeutiodentrodeumprazoprefixado(doareiafazenda,seomeutio,
moribundo, falecer até o dia 5), o acontecimento subsume-se direta e
especificamente à categoria de condição, uma vez que, neste caso, haverá
incertezaquantoàprópriaocorrênciadofatodentrodoprazoquesefixou.
Noestudodosdireitosdapersonalidade,otemaadquiremarcantestonalidades
ematizes,relativizandooantigoadágiosegundooqualamortetudoapaga(mors
omnia solvit), uma vez que, mesmo com o perecimento da pessoa física,
importantesaspectosdasuapersonalidadesãopreservados,aexemplodatutela
jurídicadasuamemóriaedoseucorpomorto.
Aliás,atémesmoonatimorto—ouseja,onascidomorto—paraamoderna
doutrina, merece amparo jurídico e proteção, como, aliás, foi registrado no
Enunciadon.1daIJornadadeDireitoCivil:
1—Art. 2.º: a proteção que o Código defere ao nascituro alcança o natimorto no que concerne aos
direitosdapersonalidade,taiscomonome,imagemesepultura.
Damesmaforma,nocampodoBiodireitoedaBioética,diversosestudosvêm
sendodesenvolvidosacercadofenômenodamorte,inclusivenareflexãoquantoà
eventualexistênciadeum“direitodemorrer”,nodebatesobreaeutanásia.
Enfim, sob diversos prismas, a morte repercute na seara jurídica, não se
afigurandopossível,respeitando-seoslimitesdestaobra,esgotarmostodoseles.
Atendo-nos à proposta metodológica deste volume, importa observar que a
mortemarcaofimdapessoafísicaounatural(art.6.ºdoCC/2002).
AmorterealdeveráseratestadaporprofissionaldaMedicina,àvistadocorpo
morto, ressalvada a possibilidade de duas testemunhas o fazerem, se faltar o
especialista,sendoofatolevadoaregistro,nostermosdosarts.77a88daLeide
RegistrosPúblicos(Lein.6.015,de31dedezembrode1973).
Vale anotar que, além da morte real, o Código Civil admite ainda a
denominadamortepresumida,emduassituações:
a) emcasode ausência (segundaparte do art. 6.º e arts. 22 a 39doCódigo
Civil);
b)nassituaçõesprevistasnoart.7.ºdovigenteCódigoCivil(semequivalente
nacodificaçãocivilanterior).
Aausênciatraduzasituaçãoemqueosujeitosimplesmentedesaparecedoseu
domicílio sem deixar notícia, representante ou procurador, caso em que o juiz
nomearácuradorparaadministrar-lheosbens 4.
Asentençadeausênciaéregistradaemlivropróprio,noCartóriodeRegistro
CivildePessoasNaturais,eoseuprocedimentoobservaregrasespeciais—que
não se confundem com as normas de direito hereditário — visando à
transmissibilidadedopatrimôniodeixado,nostermosdosjálembradosarts.22a
39doatualCódigoCivil.
Diferentemente, nas situações de morte presumida do art. 7.º 5, concorrem
fundados indícios damorte real, razão por que, com a declaração judicial do
falecimento, cuja sentença é registrada no próprio Livro de Óbitos, o
procedimento a partir daí a ser observado, em havendo necessidade, será
regulado pelas próprias normas sucessórias atinentes ao inventário ou
arrolamentoepartilha,aseremestudadasoportunamenteaindanestevolume 6.
Emresumo,somentenocasodemortereal(declaradaàvistadocorpomorto)
ounassituaçõesdemortepresumidaconstantesnoart.7.º,asnormassucessórias
devem ser diretamente aplicadas, visto que, na hipótese de ausência, regras
própriasterãoincidência.
Nesse ponto, tecidas essas importantes considerações, voltemos a nossa
atenção para o específico âmbito da nossa obra, para indagarmos: o que se
entende por Direito das Sucessões?Qual o objeto de investigação científica
desteespecialramodoDireitoCivil?
Éoqueveremosemseguida,convidandovocê,amigoleitor,anosacompanhar
nesteinstiganteestudo.
2.COMPREENSÃODODIREITOSUCESSÓRIO:CONCEITOEFUNDAMENTAÇÃOJURÍDICO-IDEOLÓGICA
Compreende-seporDireitodasSucessõesoconjuntodenormasquedisciplina
atransferênciapatrimonialdeumapessoa,emfunçãodesuamorte.
É justamente a modificação da titularidade de bens que é o objeto de
investigaçãodesteespecialramodoDireitoCivil.
SuavinculaçãoaoDireitodePropriedadeéevidente (embora tambémesteja
ligadopotencialmenteaaspectosdeDireitodeFamília),motivopeloqualasua
efetivacompreensãoexigealgumareflexãosobreseusfundamentosideológicos.
NotestemunhoautorizadodeCLÓVISBEVILAQUA:
“Juristasefilósofoshá,paraosquaisodireitohereditárioéumacriaçãoobnóxia 7dalei,quedeve,quanto
antes,sereliminada.MONTESQUIEUachavaque‘aleinaturalordenavaaospaisquealimentassemos
seusfilhos,masnãoosobrigavaafazê-losherdeiros’.AUGUSTOCOMTE, julgando imoralasucessão
legítima, dizia, por seu turno, que, no estado normal da civilização, os filhos, ‘depois de receberem uma
educação completa, não deviam esperar dos pais, qualquer que fosse a sua fortuna, senão o auxílio
indispensávelparaahonrosainauguraçãodacarreiraqueescolhessem’.Aorigemdariqueza,sendosocial,
emproveitodasociedadedeveriaelarevertercomofalecimentodosindivíduos,queadetinham.STUART
MILL, ao passo que justifica a sucessão testamentária e contratual, opõe-se, tenazmente, à sucessão
intestada,principalmentequandoestavaibeneficiarparentescolaterais.Outrosescritorestêminsistidonas
mesmas ideias depreciativas do direito hereditário, preparando assim o terreno para a propaganda dos
socialistasdetodososmatizesque,porseulado,quebramlançaspelaaboliçãodasucessãocausamortis
emproveitodosindivíduos” 8.
Ainda na perspectiva histórica, é possível se afirmar que o pensamento
socialistapartiadeumapremissacontráriaaoDireitoSucessório,nafirmecrença
de que a transmissibilidade da herança iria de encontro aos fundamentos do
Estadoquepretendiamimplementar.
“Elplanacariciadoporalgunossocialistasconsisteenquererintroducirum
nuevorégimensocial,mediantelasupresióndelderechohereditario”,observa
ANTONMENGERnamonumentalobraODireitoCivileosPobres 9.
Todavia, o renomado professor da Universidade de Viena, em outro trecho,
lucidamente,observa:
“quien,noobstante,contempleelrégimenjurídicocomoumconjuntoderelacionespermanentesde
potencialidad, no podrá menos de reconocer, que el derecho hereditario, no es más que una
extensiónde la propiedadprivadamás allá de los límites de la vida humana, y por talmotivo la
suertedeestasdosinstitucionesfundamentalesnopuedesepararse,niserdistinta” 10.
Emoutraspalavras,dopontodevistaideológico,entende-sequeasupressão
doDireitoSucessório implicariaanegaçãodaprópriapropriedadeprivada,na
medida em que se trata de institutos umbilicalmente conectados, senão
simbióticos.
Nesse contexto, o esfacelamento dos ideais comunistas mais radicais,
mormente na segundametadedo séculoXX, culminaria comobanimento desta
ideiasupressivaeaniquiladoradoDireitoHereditárioe,inegavelmente,comuma
aproximaçãoaindamaiordapropriedadeprivada.
Éentãoforçosoconvirqueossistemasjurídicosqueconsagramapropriedade
privadacomoumfundamento,acabam,porviaoblíqua,justificandoaexistência
dodireitohereditário,comoprojeçãopostmortemdopróprio instituto jurídico
tutelado 11.
Não é à toa, aliás, que a nossa Constituição Federal, no mesmo artigo,
disciplina e alberga como direitos fundamentais, a propriedade privada (na
perspectivadasuafunçãosocial),e,poucodepois,odireitoàherança(art.5.º,
XXII,XXIII eXXX 12), o quemostra o respaldo constitucional aoDireito das
Sucessões.
Por isso, entendemos que somente se pode falar em Direito das Sucessões
quando a sociedade admite a propriedade individual, não havendo como se
conceberaherançaemsituaçõesdetitularidadecoletiva.
Nessa mesma linha, no Direito alemão, conforme preleção do Professor
RUDOLFMEYER-PRITZL,apropriedadeprivadaatuacomovetorfuncionaldo
direitohereditário:
“ODireitodasSucessõesvincula-seaumfatosocial,amorte.ObjetodaregulamentaçãodoLivro5do
Código Civil alemão é a transmissão do patrimônio do falecido para os seus herdeiros: ‘o Direito das
Sucessões temafunçãodenãodeixarperecerapropriedadeprivada,deixadapelofalecido,fundamento
donúcleo existencial pelo qual se responsabilizou,mas, sim, assegurar amanutençãodesta propriedade,
conformeasucessãolegal’.Somenteaexistênciadodireitosucessóriojáconsagraaestabilidadeapósa
morte,contribuindoparaoseudesenvolvimentoeplenaeficácia.AConstituiçãogarante,noart.14,par.
1.º, a propriedade privada e o direito sucessório. O Direito das Sucessões fica, com isso, próximo da
constitucional propriedade privada. A partir da estreita união entre a propriedade e o direito sucessório
resultatambémliberdadedotestadorcomoumdosprincípiossucessóriosfundamentais” 13.
Emconclusão, temos que o reconhecimento do direito hereditário encontra a
sua razão existencial na projeção jurídica post mortem do próprio direito de
propriedade privada, constitucionalmente garantido, segundo o princípio da
intervençãomínimadoEstadonasrelaçõesprivadas 14.
Éaprópriamanifestaçãodaautonomiaprivadado indivíduo,direcionadaao
âmbitodasrelaçõesjurídicasconstituídasouderivadasdoseufalecimento.
3.SISTEMASSUCESSÓRIOSEAQUESTÃODALEGÍTIMA
Fundamentalmente, é possível visualizar três modalidades bem claras de
sistemasdesucessão 15:
a) Sistema da Liberdade Testamentária — segundo este modelo, o direito sucessório seria uma
manifestação pura da autonomia privada, em que o autor da herança teria a plena liberdade de dispor,
comoquisesse,doseupatrimônio, independentementedaexistênciadeherdeirospróximos.Seamealhou
osseusbens,duranteavida,teriatodoodireitodefazercomelesoquebementendesse,nãoseadmitindo
ainterferênciadeterceirosoudopróprioEstado.
b)SistemadaConcentraçãoAbsolutaouObrigatória—diametralmenteopostoaoprimeirotipo,este
modelopretendeque todaaherançasejadeferidaaapenasumsucessor.Trata-sedesistemasuperado,
utilizadonopassado,quandohaviaaindao“benefíciodomorgadiooudaprimogenitura”,porforçadoqual
a herança, em sua totalidade ou maior parte, era deferida ao filho mais velho. Na Bíblia, há várias
referências aosdireitosdeprimogenitura, comoduplaherança (Dt21,17), supremacia entreos irmãose
chefiadafamília(Gn27,29.40;49,8),havendovezes,comonocasodeJacóedeJudá(Gn27,30-37;49,4-
8),emqueestedireitonãofoirespeitado 16.
c)SistemadaDivisãoNecessária—deacordocomestemodelo,oautordaherançateriaapenasuma
relativa margem de disponibilidade dos seus bens, caso existissem herdeiros considerados necessários.
Vale dizer, em havendo sucessores desta categoria, parte da herança obrigatoriamente lhes tocaria, não
sendopermitidoaoseutitular,mesmoemvida,dispordaquotareservada.
Nesse contexto, interessa-nos indagar a respeito de qual foi o sistema
sucessórioadotadonoBrasil.
O último sistema exposto é o acolhido pelo Direito brasileiro, conforme
podemosobservardasimplesleituradosarts.1.845e1.846doCódigoCivil:
“Art.1.845.Sãoherdeirosnecessáriososdescendentes,osascendenteseocônjuge.
Art. 1.846. Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança,
constituindoalegítima”.
O que o legislador pretendeu, ao resguardar o direito dessa categoria de
herdeiros, foiprecisamentedar-lhescertoamparopatrimonial, impedindoqueo
autordaherançadispusessetotalmentedoseupatrimônio.
Lembra-nosWASHINGTONDEBARROSMONTEIRO:
“Essalegítima,tãocombatidaporLePlayeseussequazes,porquecontráriaàilimitadaliberdadedetestar,
éfixaemfacedonossodireito,aoinversodoqueocorreemoutraslegislaçõescomoafrancesa,aitaliana
eaportuguesa,emquevariadeacordocomonúmerodaspessoassucessíveis,eésagrada,nessesentido
dequenãopode,sobpretextoalgum,serdesfalcadaoureduzidapelotestador” 17.
Denossaparte, temossincerasdúvidasarespeitodaeficáciasocialejustiça
dessa norma (preservadora da legítima), a qual, na grande maioria das vezes,
acaba por incentivar intermináveis contendas judiciais, quando não a própria
discórdiaentreparentesouatémesmoaindolência 18.
Poderia, talvez, o legislador resguardar a necessidade da preservação da
legítimaapenas enquantoosherdeiros fossemmenores, ou casopadecessemde
algumacausadeincapacidade,situaçõesquejustificariamarestriçãoàfaculdade
dedisposiçãodoautordaherança 19.
Masestenderaproteçãopatrimonialapessoasmaioresecapazesé,nonosso
entendimento,asubversãodorazoável.
Essa restrição aodireitodo testador, comodito, se já encontrou justificativa
emsociedadesantigas,emqueamaiorriquezadeumafamíliaeraafundiária,não
seexplicamaisnosdiasquecorrem.
Pelocontrário.
A preservação da legítima culmina por suscitar, como dito, discórdias e
desavenças familiares, impedindo, ademais, o de cujus de dispor do seu
patrimônioamealhadocomobementendesse.
Ademais,sequisessebeneficiarumdescendenteseuouaesposa,quemaislhe
dedicou afeto, especialmentenosúltimos anosda suavida, poderia fazê-lopor
testamento,semqueisso,emnossosentir,significasseinjustiçaoudesigualdade,
umavezqueodirecionamentodoseupatrimôniodeveterpornorteespecialmente
aafetividade.
Ressalvamosapenasahipótesedeconcorreremàsuaherança filhosmenores
ou inválidos, caso em que se deveria preservar-lhes, por imperativo de
solidariedadefamiliar,necessariamente,partedaherança.
Ademais,essarestriçãoaodireitodotestadorimplicariatambémemafrontaao
direitoconstitucionaldepropriedade,oqual,comosesabe,porserconsiderado
denaturezacomplexa,écompostopelasfaculdadesdeusar,gozar/fruir,dispore
reivindicaracoisa.Ora,tallimitação,semsombradedúvida,entrariaemrotade
colisão com a faculdade real de disposição, afigurando-se completamente
injustificada.
Seoquejustificaobenefíciopatrimonialpostmorteméovínculoafetivoque
une o testador aos seus herdeiros, nada impediria que aquele beneficiasse os
últimosportestamento,deacordocomasualivremanifestaçãodevontade.
Poressas razões,reputamos injustificadaamantençadareservaabsolutae
inflexíveldalegítima,emborasejaaopçãodolegisladorbrasileiro.
4.BREVEVISÃOHISTÓRICADODIREITODASSUCESSÕES
Emborasejaevidenteorespaldoideológicoqueosistemacapitalistaconfere
ao Direito das Sucessões, é preciso ressaltar que a sua disciplina não é um
fenômeno decorrente de uma sistematização ocidental moderna, mas, sim, do
reconhecimento, como visto, da propriedade privada como um direito, o que
antecedeaosurgimentodoprópriocapitalismo.
De fato, trata-se de uma cultura de tempos imemoriais, que apenas foi
modificada(e,semdúvida,profundamenteaperfeiçoada)comodecursodaareia
daampulhetadavida.
Éprecisolembrarqueaideiadesucedersignifica“substituir”,ouseja,“tomar
olugar”.
Esucederpatrimonialmenteéassumirolugarque,outrora,eradaquelequenão
maisconviveentrenós.
Logo,sendoamorteaúnicacertezadavida,todavezquealguém,quepossua
algumbemcomopróprio,vema falecer,háde sedescobrirquemseriaonovo
titulardacoisa.
Eesta“apropriação”poder-se-iadar,nabarbárie,pelaforçadequemmatao
antigo titular ou, na tradição de uma cultura civilizada, em favor de quem
“continuaaobradofalecido”,peloslaçosdefamília(herançalegítima)oupela
própriaindicaçãodequemjásefoi,medianteumtestamento.
Em tempos antigos, marcante característica do Direito Hereditário era no
sentido de que o herdeiro, normalmente o primogênito masculino, substituía o
falecido em todas as suas relações jurídicas, notadamente na continuidade do
cultodoméstico.
NotestemunhoabalizadodeSÍLVIODESALVOVENOSA:
“Assim, a aquisiçãodapropriedade foradoculto era exceção.Por essa razão,o testamento sempre foi
muito importanteemRomaenosdemaispovosantigos,assimcomoo institutodaadoção.Amortesem
sucessortrariaainfelicidadeaosmortoseextinguiriaolar,segundoacreditavam.Cadareligiãofamiliarera
própria e específica de cada família, independia do culto geral da sociedade. Pormeio da adoção e do
testamento, o romano impedia que se extinguisse a religião. Segundo lembra Fustel de Coulanges, a
felicidade durava enquanto durasse a família; com a descendência continuaria o culto. Também, nessa
linhasocial,asucessãosóseoperavanalinhamasculina,porqueafilhanãocontinuariaoculto,jáquecom
seucasamentorenunciariaàreligiãodesuafamíliaparaassumiradomarido.Issoocorrianageneralidade
das civilizações antigas, apresentando resquícios em certas legislações modernas, que dão maiores
vantagensao filhovarão,mantendoa tradiçãoarraigadanoespíritodospovos latinosatuaisdevalorizar
maisonascimentodofilhohomem” 20.
No Direito Romano, a aquisição da herança variava em função do tipo de
herdeiro.
Aquele herdeiro da classe dos necessários, responsável natural pela
continuidade do culto doméstico, adquiria a herança independentemente de ato
seu.Jáosdemaisherdeiros,paraadquiriremaherança,precisavampraticaroato
daadditio.DaíaimportânciadotestamentonoDireitoRomano,nafaltadefilhos
paraaassunçãodasobrigaçõesdacasadofalecido.
Obviamente,taisconsideraçõessereferemaoshomenslivres,aosquaiseram
aplicáveis as regras gerais doDireito, e não aos escravos, tratados comobens
jurídicos.
JánoDireitoMedieval,navigênciadoregimefeudal,ofalecimentodoservo
importavanadevoluçãodesuas terrasaoseusenhor,somenteseadmitindoque
seus descendentes continuassem na posse com o pagamento de um tributo, que
autorizariaaimissão.
Tal estado de coisas começou a se modificar a partir da construção do
princípiodoDroitdeSaisine,queimplicaoreconhecimentodeumatransmissão
imediata dos bens do falecido a seus herdeiros, tema que aprofundaremos em
momentoposterior 21.
Esta característica atravessou a modernidade, permanecendo na
contemporaneidade como um princípio fundamental, com tendência à
generalização.
Feito este relato histórico do Direito das Sucessões, passemos em revista
algumasnoçõesfundamentaisnecessáriasparaasuacompreensão.
5.NOÇÕESBASILARESSOBREHERANÇA
Neste tópico, apresentaremos algumas considerações que nos parecem
essenciais para poder avançar na disciplina jurídica das sucessões no
ordenamentojurídicobrasileiro,quaissejamadelimitaçãoconceitualdeherança
esuanaturezajurídica.
Vamosaelas.
5.1.Conceito
Emconceituaçãosimpleseprecisa,aherançanadamaisédoqueopatrimônio
deixadopelofalecido.
Por isso,parabemcompreendermosoconceitodeherança, faz-senecessário
passarmosemrevistaanoçãodepatrimônio.
Na concepção clássica, o patrimônio é “a representação econômica da
pessoa”,vinculando-oàpersonalidadedoindivíduo,emumaconcepçãoabstrata
que se conserva durante toda a vida da pessoa, independentemente da
substituição,aumentooudecréscimodebens 22.
Modernamente, a coesão patrimonial vem sendo explicada apenas pelo
elementoobjetivodauniversalidadededireitos, comadestinação/afetaçãoque
lhederseutitular.
Valesalientarqueanoçãodepatrimônionãoseconfundecomomeroconjunto
de bens corpóreos,mas sim com toda a gama de relações jurídicas (direitos e
obrigações de crédito e débito) valoráveis economicamente de uma pessoa,
naturaloujurídica.Oconceitoédevitalimportância,porexemplo,paraoDireito
Penal, sendo todooTítulo II (arts.155a183)daParteGeraldoCódigoPenal
brasileirodedicadoaos“crimescontraopatrimônio” 23.
Atítulodeinformaçãoterminológica,saliente-seaindaqueopatrimôniopode
sertantolíquido(conjuntodebensecréditos,deduzidososdébitos)quantobruto
(conjunto de relações jurídicas sem esta dedução)— compreendendo-se neste
últimooativo(conjuntodedireitos)eopassivo(conjuntodeobrigações)—não
sedescaracterizandoanoçãoseosdébitosforemsuperioresaoscréditos,poiso
patrimônioexprimirásempreumvalorpecuniário,sejapositivoounegativo.
Poisbem.
Reafirmando a premissa supra-apresentada, temos que, com a morte do seu
titular, fato este que é denominado, em doutrina, “abertura da sucessão”, o
patrimônio passa a ser designado de herança, submetendo-se às regras
sucessóriasquelhesãopróprias.
Assim,pouco importaseopatrimôniodeixadopelo indivíduo incluíacarros,
mansões,lanchas,investimentosouumaúnicacarroça;seráconsiderado,apósa
suamorte,juntamentecomosdébitosporventuraexistentes,asuaherança.
Nãointegra,todavia,oconceitodeherança,aquiloqueautoresmaismodernos
costumam,comprecisão,denominar “patrimôniomoral”,o conjuntodedireitos
personalíssimosatinentesaoindivíduo(odireitoàvida,àhonra,àprivacidade,à
vidaprivadaetc.) 24,umavezque tais interesses jurídicosnãosão,obviamente,
passíveisdetransmissão.
Outro aspecto deve ainda ser considerado: a natureza jurídica do direito à
herança,que,dadaasuaespecialidade,merecetratamentoemtópicoespecífico.
5.2.Naturezajurídicadodireitoàherança
Aadequadacompreensãodestetópicoexigeumabreveincursãonoâmbitoda
teoriageraldoDireitoCivil.
Dentreascategoriasdebensjurídicos,disciplinadaspeloCódigoCivil,como
sesabe, temos,ao ladodosdenominados“bensmóveis”—passíveisdeserem
deslocadosdeumlugarparaoutrosemfraturaoudano—,os“bensimóveis” 25.
Poisbem.
Dentreessesbensdenaturezaimobiliária,temosumapeculiarespécie,osbens
imóveisporforçadelei.
Nessacategoria,nãoprevaleceoaspectonaturalísticodobem,senãoavontade
dolegislador.
Principalmente por imperativo de segurança jurídica, a lei civil optou por
considerartaisbensdenaturezaimobiliária.
Seguindo a linha normativa do Código Civil de 1916, tais bens seriam: os
direitosreaissobreimóveiseasaçõesqueosasseguram,asapólicesdadívida
públicagravadascomcláusuladeinalienabilidadeeodireitoàsucessãoaberta
(art.44).
O novo Código, corretamente, excluiu desse rol, por seu evidente aspecto
anacrônico,asapólicesdedívidapúblicaclausuladas(art.80,IeII).
Ébomquesedigaaindaque,comoCódigoCivilde2002,talclassificação,
apesar de não haver sido desprezada, ganhou contornos mais simples. A
disciplinaadotadapelolegisladorémenosdigressiva,limitando-seaconsiderar
imóveisapenas“osoloetudoquantoselheincorporarnaturalouartificialmente”
(art. 79). Em sequência, consoante se anotou linhas acima, consideraram-se
imóveis por força de lei “os direitos reais sobre imóveis e as ações que os
asseguram”,bemcomo“odireitoàsucessãoaberta”(art.80,IeII).
Por óbvio, interessa-nos salientar, caro leitor, que o direito à herança (ou
direitoàsucessãoaberta),porexpressadicçãolegal,temnaturezaimobiliária.
Aatribuiçãodestanaturezaaestedireito temoprincipalescopode imprimir
formalismo a sua eventual cessão, pois, como se sabe, a circulação dos bens
imóveisdá-sedeformamuitomaiscriteriosaesolene.
Ora, considerando-se que, durante o curso do inventário ou arrolamento, o
herdeiro poderá ceder a sua quota hereditária (seu direito à herança ou à
sucessãoaberta) a outro sucessor ou a terceiro, deverá observar determinadas
formalidades, a teor do art. 1.793 doCC/2002 (sem equivalente específico no
CC/1916), estudadooportunamente 26, como se estivesse realizando a venda ou
doaçãodeumimóvel.
Issoporqueodireitoàherança temnatureza imobiliária,poucoimportandoa
naturezadobem(oudosbens)deixado(s),semóvelouimóvel.
Comisso,aindaquetodaaherançaconsistaemumúnicoautomóvel,odireito
hereditárioquelhecorrespondeseráimobiliário,porforçadelei.
Em capítulo próprio, quando tratarmos da cessão do direito hereditário 27,
voltaremos ao tema, aprofundando interessantes aspectos, como a polêmica em
torno da exigência da autorização conjugal em caso de transferência de quota
hereditáriaouatémesmoderenúncia.
6.SUCESSÃOHEREDITÁRIA:CONCEITOEESPÉCIES
Primeiramente,faz-senecessáriofixaroexatosentidodapalavra“sucessão”.
Considerando-se que um patrimônio jamais poderá remanescer sem titular,
segundo a própria perspectiva da função social, observamos que os atos de
disposição inter vivos, como uma venda ou uma doação, implicam a
transmissibilidade de determinado bem, operando uma consequente sucessão
(substituiçãodepessoas)emsuatitularidade.
Assim,écorretodizerque,emumaprimeiraacepção,podeasucessãosedar
no âmbito das relações negociais inter vivos, quando determinado bem é
transferidodeumapessoaaoutra,operando-seumasubstituiçãoentreelas 28.
Ocorrequeamortetambémdeterminaessasubstituiçãodepessoas,namedida
emque,comodito,patrimônioalgumpoderápermaneceracéfalo.
Dá-se,pois,asucessãohereditáriaou“mortiscausa”,quando,emvirtudedo
falecimento de alguém (sucedido ou autor da herança 29), o seu patrimônio é
transferido a determinadas pessoas, legitimadas a recebê-lo (sucessores), as
quais,assim,substituem-nonatitularidadedessesbensoudireitos.
Conheçamos, agora, a primeira classificação das espécies de sucessão
hereditária.
6.1.Classificaçãodasucessãohereditáriapelamatriznormativa
A depender da sua matriz normativa, a sucessão hereditária pode assim ser
dividida:
a)SucessãoHereditáriaLegítima(arts.1.829a1.856doCC).
b)SucessãoHereditáriaTestamentária(arts.1.857a1.990doCC).
A sucessão testamentária, devidamente tratada em momento oportuno 30, é
aquelaemqueatransmissibilidadedaherançaédisciplinadaporumatojurídico
negocial,especialesolene,denominadotestamento.
Observa-se, pois, aqui, um espaço de incidência do princípio da autonomia
privada, na medida em que o testador, respeitados determinados parâmetros
normativos de ordem pública, tem a liberdade de escolher, dentre os seus
sucessores, aquele(s) a quem beneficiar e, ainda, de determinar quanto do seu
patrimônioserátransferidoapósasuamorte.
Ocorre que, como anotamos linhas acima, em geral, não é típica da cultura
brasileiraapreocupaçãocomodestinodonossopatrimônioapósamorte,como
sedáempaíseseuropeus.
Soa irônico o fato de a sucessão testamentária ser regulada de forma tão
abrangenteeexaustivanoCódigoCivil,consagrandoinclusiveváriasespéciesde
testamento,adespeitodasuamenoraplicaçãoprática.
Atémesmoporque,emgeral,obrasileironãotemtantopatrimôniocomquese
preocupar...
Quandomorre, em regra, o que deixa não é propriamente uma herança,mas
sim,namelhordashipóteses,umsaldoremanescentedePISouPASEP,deFGTS,
crédito salarial, enfim, meros resíduos sucessórios 31, que desafiam, conforme
veremosainda,umsimplesprocedimentodealvarájudicialparalevantamentode
taisvalores,dispensando-seoinventárioouoarrolamento.
Por tudo isso, desde já afirmamos: a sucessão testamentária, a despeito das
dezenasdeartigosaeladispensadapeloCódigoCivil,nãoteve,nãotemenunca
teráaaceitaçãosocialeosignificadojurídicodasucessãolegítima.
Já por sucessão legal ou legítima entenda-se aquela em que a
transmissibilidade da herança é regrada não pelas normas do testamento, mas,
sim,pelaprópria lei.Valedizer, sãoas regrasdoCódigoCivil quecuidamde
disciplinaraordemdechamamentodos sucessores, tambémdenominadaordem
de“vocaçãolegal”.
Assim,seoautordaherançamorresemfazertestamento(abintestato)—ou
sendo este inválido (nulo ou anulável) — é a própria lei que, atuando
supletivamente,cuidadedisporarespeitodasucessãohereditária.Omesmose
dá,valeobservar,quando,adespeitodeexistirtestamentoválido,estenãocuida
detodososbensdofalecido,demaneiraque,noquetocaàparceladaherança
nãotratada,incidirão,também,asregrasdasucessãolegal 32.
Em conclusão, antecipamos que as duas regras fundamentais atinentes à
sucessãolegaloulegítimaencontram-senosarts.1.790e1.829doCódigoCivil,
queserãocuidadosamenteanalisadasemcapítulopróprio 33.
6.2.Classificaçãodasucessãohereditáriapeloconjuntodebenstransmitidos
Passadas em revista asnoçõesgeraisda sucessão legítimae testamentária, é
importante consignar que a sucessão hereditária ainda comporta uma outra
classificação:
a)SucessãoHereditáriaUniversal(arts.1.829a1.856doCC);
b)SucessãoHereditáriaSingular(arts.1.912a1.940doCC).
Sucedeatítulouniversaloherdeiro,poisaeleédeferidaumafração(quota-
parte)outodaaherança;poroutrolado,sucedeatítulosingularolegatário,pois
aeleédeferidobemoudireitodeterminado.
Emoutraspalavras,temosdoistiposdesucessores:oherdeiro,quesucedeem
caráteruniversal(atotalidadedaherançaouumafraçãodela)eolegatário(que
sucedeembemoudireitoindividualizado).
7.ODIREITODASSUCESSÕESNOSCÓDIGOSCIVISBRASILEIROSDE1916E2002
Apenasparaencerrarestecapítulo introdutório,parece-nos interessante fazer
algumasrápidasconsideraçõessobreasmodificaçõesdoDireitodasSucessões
entreoCódigoCivilbrasileirode1916eoCódigode2002.
Com efeito, embora mantida a base ideológica do Direito das Sucessões,
umbilicalmente ligada à tutela constitucional da propriedade privada, o vigente
texto trouxe significativas mudanças em relação ao ordenamento jurídico
revogado.
De fato, inovando o sistema, trouxe a figura da concorrência do cônjuge
sobreviventecomosherdeiroslegítimos,oqueantesinexistia.
Ainda que de forma tímida, atécnica, e, pela limitação, potencialmente
inconstitucional (comoveremos emvários trechos deste livro), oCódigoCivil
brasileiro vigente reconheceu a possibilidade de participação do(a)
companheiro(a) na sucessão do outro, também em concorrência com outros
parentes.
Trata-sedeumamudançaprofundaemrelaçãoàdisciplinacodificadaanterior,
que simplesmente ignorava tais questões, valendo destacar que tal estado de
coisas já vinha sendo paulatinamente alterado pela nova ordem de valores da
Constituição Federal e por diplomas infraconstitucionais específicos (Leis n.
8.971/94e9.278/96).
Grave omissão legislativa houve, em nosso sentir, na ausência de uma
regulamentação mais detalhada dos chamados “resíduos sucessórios”, aspecto
jurídico presente na vida de milhões de famílias brasileiras, quando um ente
falece sem deixar herança, mas sim, e tão somente, pequenos créditos de PIS,
PASEP,FGTSousalário,casoemquesériasdúvidasaindaexistemnoâmbitoda
legitimaçãoparareceber.
E,emtodoestelivro,abordaremosestasediversasoutrasquestõespolêmicas,
semprenaperspectivasuperiorderespeitoaosprincípiosconstitucionais.
Eparatanto,nãoiremossozinhos.
Estaremosjuntoscomvocê.
CapítuloII
PrincipiologiadoDireitodasSucessões
Sumário:1.Introdução.2.AdificuldadedeumasistematizaçãoprincipiológicadoDireitodasSucessões.
3. Princípios gerais relevantes para o Direito das Sucessões. 3.1. Dignidade da pessoa humana. 3.2.
Igualdade. 3.3. Função social da propriedade. 3.4. Boa-fé. 3.5. Autonomia da vontade. 4. Princípios
específicos do Direito Sucessório. 4.1. Princípio da Saisine. 4.1.1. Considerações etimológicas. 4.1.2.
Noçõeshistóricas.4.1.3.Conceito.4.2.Princípio (non)ultravireshereditatis. 4.3. Princípio da função
social da herança. 4.4. Princípio da territorialidade. 4.5. Princípio da temporariedade. 4.6. Princípio do
respeitoàvontademanifestada.
1.INTRODUÇÃO
Apropostadopresentecapítuloéfazerumasistematizaçãoprincipiológicado
DireitodasSucessões,deformaapossibilitaraopúblicoleitorumavisãogeral
daspremissasdogmáticasquerespaldamasuanormatização.
Terumaconcepçãodesistemasemprefacilitaacompreensãodequalquerramo
doDireito,encarando-ocomoumesforçodo intelectoparadestrinchar todoum
emaranhado de normas,mesmo levando em conta que, por ser uma construção
intelectual (e não necessariamente calcada no direito positivo), a sua
apresentação pode variar de acordo com a visão metodológica de cada
doutrinador.
A tarefa, porém, no caso concreto doDireito das Sucessões não é dasmais
fáceis.
Explicaremosomotivonopróximotópico.
2.ADIFICULDADEDEUMASISTEMATIZAÇÃOPRINCIPIOLÓGICADODIREITODASSUCESSÕES
Um dos aspectos mais intrincados do estudo do Direito das Sucessões é a
compreensãodesuaprincipiologia.
Isso porque não existe uma positivação expressa de princípios fundamentais
(comonoDireitoAdministrativo 34),oquefazcomquehajaverdadeirababelna
compreensãodotema,poucoexploradopeladoutrinaespecializada.
Porisso,permitindo-nosumaousadianaelaboraçãodestaobra,consideramos
relevante apresentar, ainda que emvoo de pardal, alguns dosmais importantes
princípios gerais do Direito Civil (muitos deles já trabalhados por nós em
volumesanterioresdestacoleção),queencontramespecialrelevâncianoDireito
dasSucessões.
Nomesmoritmo,colacionamos,emseguida,aquelesqueconsideramososmais
importantes princípios específicos do Direito Sucessório — tecendo rápidas
consideraçõessobreasprevisõesnormativasqueosrespaldameoseuconteúdo
jurídico — sem perder a consciência de que se trata de uma matéria cujo
aprofundamentovaleria,porsisó,umoutrolivro.
Semmaisdelongas,épossívelapresentar,emumavisãoesquemática,anossa
concepçãosobreotema:
Principiologia
doDireito
dasSucessões
PrincípiosGerais(AplicáveisaoDireitoSucessório)
•DignidadedaPessoaHumana
•Igualdade
•FunçãoSocialdaPropriedade
•Boa-fé
•AutonomiadaVontade
Princípios Especiais (Específicos do DireitoSucessório)
•Saisine
•(Non)UltraViresHereditatis
•FunçãoSocialdaHerança
•Territorialidade
•Intertemporalidade
• Respeito à VontadeManifestada
Enunciados aqueles que consideramos os mais importantes princípios,
iniciemosamissãocomoestudodaprincipiologiageral.
3.PRINCÍPIOSGERAISRELEVANTESPARAODIREITODASSUCESSÕES
Neste tópico, passaremos em revista alguns conceitos fundamentais, cujo
assentamentodogmáticoconsideramosessencialparaacompreensãodoDireito
brasileirodasSucessões.
Iniciemos com aquele que entendemos ser o mais importante princípio
constitucional,asaber,omacroprincípiodaDignidadedaPessoaHumana.
3.1.Dignidadedapessoahumana
Trata-se do mais importante princípio constitucional, que respalda todo o
ordenamentojurídico,comoumvalorquedisciplinatodaasuaaplicação.
Emvolumeanteriordestacoleção 35,revelamosnossavivapreocupaçãoemse
ter um cuidado de ourives no tratamento doprincípio da dignidade da pessoa
humana, que semostra,paranós, inequivocamente, comoamaiorconquistado
Direitobrasileironosúltimosanos.
O receio se explicapelabanalizaçãodo referidoprincípio, como se ele, em
vezdebasede todooordenamento jurídico, fosseumamixórdiade“Panaceia”
com “Caixa de Pandora” da qual se retiraria a solução para todos os males,
mesmoquandonãosesaibadireitooqueeleimplica.
Afinaldecontas,oqueseentendepordignidadedapessoahumana?Qualéa
suadimensão?Comosedáasuaaplicaçãosocial?
Emvãoseráatarefadetentar,onossoleitor,apreenderoseualcancenaobra
dos dicionaristas, que, em geral, dão-lhe conotação restrita e essencialmente
aristocrática:
“Dignidade,s.f.(lat.Dignitatem).Qualidadedequemoudaquiloqueédigno;cargohonorífico;nobreza;
decoro;autoridademoral;respeitabilidade” 36.
Adignidadehumanaémuitomaisdoqueisso.
Princípio solar em nosso ordenamento, a sua definição é missão das mais
árduas,muitoemboraarrisquemo-nosadizerqueanoçãojurídicadedignidade
traduzumvalorfundamentalderespeitoàexistênciahumana,segundoassuas
possibilidades e expectativas, patrimoniais e afetivas, indispensáveis à sua
realizaçãopessoaleàbuscadafelicidade.
Maisdoquegarantirasimplessobrevivência,oprincípioasseguraodireitode
viverplenamente,semquaisquerintervençõesespúrias—estataisouparticulares
—narealizaçãodessafinalidade.
Écorretoafirmar-se,aliás,queoprincípiodadignidadedapessoahumanatem
umadimensãoobjetivaoumetaindividual.
Traduz, pois, uma diretriz de inegável solidarismo social, imprescindível à
implantaçãoefetivadoEstadoDemocráticodeDireito.
Não é por outro motivo, aliás, que a Constituição da República, tratando-o
comovalorfundamental,emseuart.1.°,III,dispõe:
“Art.1.°ARepúblicaFederativadoBrasil,formadapelauniãoindissolúveldosEstadosedosMunicípiose
doDistritoFederal,constitui-seemEstadoDemocráticodeDireitoetemcomofundamentos:
(...)
III—adignidadedapessoahumana”.
Asuamagnitudeconstitucional,portanto,denotaoseuconteúdoessencialmente
político, transcendente, pois, de qualquer tentativa de contenção pelo Direito
PúblicoouPrivado.
NessalinhaderaciocínioéopensamentodeGUSTAVOTEPEDINO:
“Com efeito, a escolha da dignidade da pessoa humana como fundamento da República, associada ao
objetivo fundamental de erradicação da pobreza e da marginalização, e de redução das desigualdades
sociais,juntamentecomaprevisãodo§2.°doart.5.°,nosentidodanãoexclusãodequaisquerdireitose
garantias, mesmo que não expressos, desde que decorrentes dos princípios adotados pelo TextoMaior,
configuram uma verdadeira cláusula geral de tutela e promoção da pessoa humana, tomada como
valormáximopeloordenamento” 37.
E,nocampodasrelaçõesdoDireitodasSucessões,nãopoderiaserdiferente.
ConsiderandoaDignidadedaPessoaHumanacomoumfiltronecessárioparaa
compreensãodetodooordenamentojurídico,todaequalquernorma,inclusiveno
campodoDireitoSucessório,queafrontar esseprincípio superiorpode ter sua
constitucionalidadequestionada.
Assimagindo,amigo leitor,pensamosqueaconcretudedadignidadehumana
serámais efetiva, permitindo, commais segurança, a realização de um Estado
verdadeiramentedemocráticodeDireito.
Enãofaltarãoexemplosnodecorrerdoestudodestaobra.
3.2.Igualdade
Da mesma forma que o princípio da Dignidade da Pessoa Humana, a
consagraçãodoprincípioda igualdade,emnívelconstitucional, representouum
avançoinegáveldoDireitobrasileiro 38.
Poderíamosanalisá-losobdiversosaspectos,diferentesaplicaçõeseâmbitos
de incidência, mas, para não nos afastarmos do nosso objeto de estudo,
cuidaremosdeaprofundarasuaanálisenasrelaçõessucessórias.
A isonomia que se busca constitucionalmente não pode apenas aninhar-se
formalmenteemtextodelei,mas,sim,devefazer-sematerialmentepresentena
sociedadebrasileira,quesepretendeerigircomosolidária,justaedemocrática.
Daí reputarmos evidentemente inconstitucional qualquer determinação legal
quetrate,deformadiscriminatória,aquelesqueseencontramnamesmacategoria
deinteresses.
Assim,reconhecidaapossibilidadedetransmissãopatrimonialcausamortis,
poucoimportaseofilhoéconsanguíneoouadotivo.
De todo o exposto, pode o nosso amigo leitor observar que a aplicação do
princípioda igualdadenos remeteaumacasuística infindável,nãohavendo,de
nossaparte,aintençãodeesgotá-la.
Aliás,qualquertentativanessesentidoseriainfrutífera.
E aí está a beleza do princípio: contendo uma indeterminação conceitual
característica, permitir a sua aplicação em diversos setores da convivência
humana.
3.3.Funçãosocialdapropriedade
Outro importanteprincípio,dematizconstitucional,quedeveseraplicadoao
DireitodasSucessõeséodafunçãosocialdapropriedade.
Como já se afirmou em capítulo anterior 39, o Direito Sucessório está
umbilicalmente ligado ao direito de propriedade e, como este, no vigente
ordenamentoconstitucional,estávinculadoaoexercíciodesuafunçãosocial,as
regrashereditárias,consequentemente,tambémseguemamesmadiretriz.
Trata-se de uma aplicação natural do princípio da sociabilidade, um dos
princípiosgeraisdovigenteCódigoCivilbrasileiro.
Todavia,umaparenteparadoxoaaplicaçãodafunçãosocialnostraz.
Issoporque,porumlado,sobsuaégide,nãoédado,dopontodevistateórico,
queapropriedaderemanesçasemtitular,pelaaplicaçãodoDroitdeSaisine 40,
princípio próprio que ainda será tratado neste capítulo e ao qual remetemos o
leitor 41.
Por outra perspectiva, a ideia de função social da propriedade também
respaldacríticasàconcepçãoideológicadopróprioDireitodasSucessões,uma
vezqueestepermitea titularidadedebenssemquehajaesforçonessesentido,
não“socializando”oprocessodesuaaquisição.
Umverdadeiroconviteàreflexão.
3.4.Boa-fé
Outro princípio fundamental da atual codificação civil, aeticidade, impõe o
reconhecimentodoprincípiodaboa-fénoDireitodasSucessões.
Conformejáexplicitamosemvolumeanteriordestacoleção 42,anoçãodeboa-
fé (bona fides), ao que consta, foi cunhada primeiramente no Direito romano,
emboraaconotaçãoquelhefoidadapelosjuristasalemães,receptoresdacultura
romanista,nãofosseexatamenteamesma 43.
EmRoma,partindo-sedeumaacentuadaamplitudesemântica,pode-seafirmar
que a “fides seria antes um conceito ético do que propriamente uma expressão
jurídica da técnica. Sua ‘juridicização’ só iria ocorrer com o incremento do
comércio e o desenvolvimento do jus gentium, complexo jurídico aplicável a
romanoseaestrangeiros” 44.
JánoDireito alemão, anoçãodeboa-fé traduzia-sena fórmuladoTreu und
Glauben (lealdade e confiança), regra objetiva, que deveria ser observada nas
relaçõesjurídicasemgeral.
Aesserespeito,pontificaJUDITHMARTINS-COSTA:
“A fórmula Treu und Glauben demarca o universo da boa-fé obrigacional proveniente da cultura
germânica, traduzindo conotações totalmente diversas daquelas que a marcaram no direito romano: ao
invésdedenotara ideiadefidelidadeaopactuado,comonumadasacepçõesda fides romana,acultura
germânicainseriu,nafórmula,as ideiasdelealdade(TreuouTreue)ecrença (GlaubenouGlaube), as
quaissereportamaqualidadesouestadoshumanosobjetivados” 45.
TambémoDireitoCanônicoenfrentariaotema,emtermossemelhantesaosdo
Direitoalemão,emboraintroduzisseumpoderosopolodesignificados:aboa-fé
évistacomoausênciadepecado,ouseja,comoestadocontrapostoàmá-fé 46.
Atémesmoporessebreveapanhadohistórico,podemosobservarqueaboa-fé
é,antesdetudo,umadiretrizprincipiológicadefundoéticoeespectroeficacial
jurídico.Valedizer,aboa-fése traduzemumprincípiodesubstratomoral,que
ganhoucontornosematizdenaturezajurídicacogente.
Contextualizando esse importante princípio em nossa ordem constitucional,
PAULOROBERTONALINpondera,cominteligência:
“... tendo o homem como centro necessário das atenções, oportuno de indagar da possibilidade de
localizaçãodaboa-féenquantoprincípiogeraldoDireito,nosistemaconstitucional,assimcomoosdemais
princípios então ditos fundamentais inclusos na Carta, como o da dignidade do ser humano, a vida, a
integridadefísica,a liberdade,apropriedadeprivada,a livremanifestaçãodopensamento,a intimidadee
vidaprivadaetc.” 47.
No campo das sucessões, a boa-fé é fundamental para a interpretação das
disposiçõesdeúltimavontade 48,bemcomoparatemasrelacionadosaosefeitos
sucessóriosdoregimedebensadotado,e,ainda,paraoutrasquestõespeculiares,
a exemplo da indignidade 49, em que a observância das circunstâncias fáticas
levadasajuízodeverálevaremconsideraçãoaéticanasrelaçõesdefamília 50.
3.5.Autonomiadavontade
ComoúltimoprincípiogeralrelevanteparaoDireitodasSucessões,hádese
incluiroprincípiodorespeitoàautonomiadavontade.
Trata-se de umdosmais importantes princípios do tradicionalDireitoCivil,
também respaldado na contemporaneidade, e que fundamenta a celebração de
negóciosjurídicos,valendodestacarqueamanifestaçãodavontadeéjustamente
umdosseuselementosexistenciais 51.
Nocampodassucessões, istose tornaevidentenamodalidade testamentária,
em que se autoriza uma disciplina patrimonial post mortem, em respeito à
autonomiadavontademanifestadapelofalecido.
Vale destacar que o princípio geral do direito se desdobra, no campo das
sucessões, em um princípio próprio, a saber, o de Respeito à Vontade
Manifestada,aoqualremetemosonossoleitor 52.
4.PRINCÍPIOSESPECÍFICOSDODIREITOSUCESSÓRIO
Falaremos, neste tópico, de princípios específicos doDireito Sucessório, ou
seja,diretrizesteóricasprópriasdasuadisciplinajurídica.
Comecemos com aquele que consideramos o mais importante princípio
específicodoDireitodasSucessõesnoordenamentojurídicopátrio:o“Princípio
daSaisine”ou“DroitdeSaisine”.
4.1.Princípioda“Saisine”
ConsisteoDroitdeSaisinenoreconhecimento,aindaqueporficçãojurídica,
da transmissão imediata e automática do domínio e posse da herança aos
herdeiroslegítimosetestamentários,noinstantedaaberturadasucessão.
Mascomosechegouaisso?
Éoqueveremosnospróximossubtópicos.
4.1.1.Consideraçõesetimológicas
Antes de compreendermos historicamente o chamado “Princípio daSaisine”,
parece-nos relevante fazer algumas breves considerações de natureza
etimológica.
Apalavrafrancesa“saisine”éplurissignificativa.
Derivada do verbo “saisir”, também com conteúdo plúrimo (uma vez que
significacolher,apreender,confiscar,agarrar,capturar,apoderar-se,entreoutros
sentidos),“saisine”,juridicamente,podeserutilizadaemvárioscontextos 53.
O que interessa, porém, para o corte epistemológico deste livro, é a sua
utilização no campo do Direito Sucessório, em que é traduzida no sentido de
“posse”,parasignificara“posseimediatadosbensdaquelequefaleceu”.
ComoobservaLUÍSCAMARGOPINTODECARVALHO,emdidáticotexto,
comotrechoaseguirtranscrito(inclusivecomasbem-colocadasreferências):
“Etimologicamente,saisirvemdapalavralatinasacire,contidaemleisbárbaras,queporsuavezresultaria
deduaspalavrasfrancas,*sakjan,comosentidodereivindicar,e*satjan,comosentidodepôr,colocar,
apossar-se,tendosidoempregadapelaprimeiraveznoanode1138 54.
OPetitLarousseatribui-lhesignificadoestritamentejurídico:‘Droitàlaprisedepossessiondebiensd’un
défuntàl’instantmêmedudécèsetsansautorizationpréalabledejustice.(Cedroitestconféréparlaloi
auxhéritiersabintestatouparledéfuntàsonexécuteurtestamentaire)’ 55.
PontesdeMirandaaaportuguesaparaapalavrasaisina(Tratado,v.55,p.16,§5.587),registradaapenas
pelorecém-publicadoDicionárioHouaiss 56,quelheatribuiosentidotécnico-jurídico:‘direitodepossuir
por imperativoda lei,oupossequeodireitodádeformadiversadoatodepossuir[Expressãododireito
feudaldos.XII]’” 57.
Oreconhecimentodetalprincípioéevidentenaconstanteutilizaçãodamáxima
“lemortsaisitlevif”,quepodesertraduzidatambémcomo“omortodáposse
aovivo”.
Compreendidoosentidodaexpressãodesignadora, tenhamos,agora,algumas
noçõeshistóricasparacontextualizara“Saisine”comoumprincípioprópriodo
DireitodasSucessões.
4.1.2.Noçõeshistóricas
ODroitdeSaisinetemsuaorigemnoDireitoMedieval.
Sobreesteperíodohistórico,expõeCAIOMÁRIODASILVAPEREIRA:
“NaIdadeMédia,institui-seapraxedeserdevolvidaapossedosbens,pormortedoservo,aoseusenhor,
que exigia dos herdeiros dele um pagamento para autorizar a sua imissão. No propósito de defendê-lo
dessaimposição,ajurisprudêncianovelhodireitocostumeirofrancês,especialmentenoCostumedeParis,
veioaconsagrara transferência imediatadoshaveresdoservoaosseusherdeiros,assentadaafórmula:
Leserfmortsaisitlevif,sonhoirdeplusproche 58.DaíteradoutrinafixadoporvoltadoséculoXIII,
diversamentedosistemaromano,ochamadodroitdesaisine,que traduzprecisamenteeste imediatismo
da transmissão dos bens, cuja propriedade e posse passam diretamente da pessoa do morto aos seus
herdeiros: le serf mort saisit le vif. Com efeito, no século XIII a saisine era referida num Aviso do
ParlamentdePariscomoinstituiçãovigenteeosétablissementsdeSt.Louislheapontamaorigemnos
CostumesdeOrleans.
Nãofoi,porém,umapeculiaridadedoantigodireito francês.Suaorigemgermânicaéproclamada,ouao
menosadmitida,poisquefórmulaidênticaeraalienunciadacomamesmafinalidade:DerToteerbtden
Lebenden 59e 60.
É importante destacar o reconhecimento do Droit de Saisine como um
princípioquecaracterizaumaresistênciaaeventuaisabusosparaaaquisiçãoda
propriedadeoupossepelaherança.
E o sistema luso-brasileiro, que, originalmente, adotava uma sistemática
romana, com fracionamento de momentos de aquisição da propriedade pelos
herdeirosnãonecessários 61,aprovouexpressamenteoprincípioaindanoséculo
XVIII.
ComoobservaMÁRIOFIGUEIREDOBARBOSA:
“FoiatravésdoAlvaráde9/XI/1754,segundodoAssentode10/2/1786,queodroitdesaisine ingressou
noDireitoluso-brasileiro.Apartirdaí,admitiu-seatransformaçãoautomáticadosdireitosquecompõemo
patrimôniodaherançaaossucessoreslegítimosounão,comtodaapropriedade,aposse,osdireitosreaise
pessoais.Oqueerapropriedadeepossedodecujus passam a ser propriedade e posse do sucessor a
causademorte,oudossucessoreseempartesideais,ouconformeadiscriminaçãotestamentária.Dá-seo
mesmocomoscréditostransferíveiseasdívidas,aspropriedades,asobrigaçõeseasações” 62.
Aberta a sucessão, o Droit de Saisine evita que se possa dar ao acervo
hereditário a natureza de res derelicta (coisa abandonada) ou de res nullius
(coisadeninguém) 63.
Nessalinha,observaROBERTODERUGGIERO:
Aexigênciasentidaporqualquersociedadejuridicamenteorganizadadequecomamortedeumapessoa
as suas relações jurídicas não se extingam, mas que outras pessoas nelas entrem tomando lugar do
defunto, encontra satisfação nomundo da herança. Em qualquer outro campo, por ser verdade omors
omnia solvit, menos no direito, onde exigências não só morais e de espírito, mais sociais, políticas e,
sobretudo, econômicas, impõem que, para segurança do crédito, para conservação e incremento da
riqueza,asrelaçõesdeumapessoacontinuammesmodepoisdesuamorte,quenoseupatrimôniosubstitua
umnovotitular,oqualrepresentacomoqueocontinuadordapersonalidadedodefunto” 64.
Tal substituição sedá, comovisto,de forma imediataedesdeomomentoda
abertura da sucessão, independentemente da prática de qualquer ato ou
manifestaçãodevontadedoherdeiro,quepode,inclusive,desconhecerofato.
4.1.3.Conceito
OPrincípioda“Saisine”,portanto,àluzdetodooexposto,podeserdefinido
como a regra fundamental do Direito Sucessório, pela qual a morte opera a
imediata transferência da herança aos seus sucessores legítimos e
testamentários 65.
Trata-se, em verdade, de uma ficção jurídica, que pretende impedir que o
patrimônio deixado fique sem titular, enquanto se aguarda a transferência
definitivadosbensaossucessoresdofalecido.
Respalda-senodispositivoqueabreoLivrodasSucessõesnovigenteCódigo
Civilbrasileiro,asaber,oart.1.784:
“Art. 1.784. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e
testamentários”.
Por isso, com a abertura da sucessão (morte), os herdeiros já são
imediatamenteconsideradoscondôminosecopossuidoresdosbensdeixados,em
virtudeda incidênciadopresenteprincípio,oquenãosignifica,poróbvio,que
exercemdireitoexclusivosobrebemindividualmenteconsiderado.
A título exemplificativo, se Carmelo morre, deixando três filhos (Arilson,
RivaldaeRaimunda),imediatamenteapósoinstantedoóbito,osseusherdeiros
já são titulares,nãodebemdeterminado,mas sim,cadaum,de1/3daherança
deixada,independentementedaconclusãodoarrolamentooudoinventário.
Todavia,umaafirmaçãojáfeitamereceserrealçada.
O princípio da saisine não dá ao sucessor, herdeiro ou legatário, direito
imediatoabemexclusivodaherança.
Comaaberturadasucessão,osherdeiros,comoditoacima,passarãoaterum
direito meramente abstrato, calculado em fração do patrimônio transferível, e,
mesmo que seja herdeiro único, o exercerá em face da universalidade de bens
deixados,nãosendopermitido,anenhumdossucessores,portanto,semadevida
autorização judicial, enquantonãoconcluídooprocedimentodearrolamentoou
inventário,alienarbemexclusivodaherança.
Quantoaoslegatários,ébomlembrarqueelessomenteterãoapossedosbens
deixados quando assim lhe for concedido pelo herdeiro (art. 1.923, § 1.º, do
CC/2002).
Portudoisso,sentidonenhumhánacondutadedeterminadossucessoresque,
antesmesmodesefindarapartilha,jásesentem“donos”dedeterminadosbens,
integrantesdomontemor(partível),agredindo,emmuitoscasos, iguaisdireitos
dosoutroscoerdeiros.
Ninguém pode se sentir dono de bem exclusivo do inventário ou do
arrolamento antes do seu fim, não apenas pelas razões acima expostas, mas,
inclusive,pelofatodeque,emhavendodívidasdeixadaspelodecujus,poderá
nãosobrarnadamaisparadividir...
Nessediapasão,paraevitaraaplicaçãodeturpada(egananciosa)doprincípio
dasaisine, o Superior Tribunal de Justiça, em admirável acórdão, da lavra da
Min.NANCYANDRIGHI,jáentendeuqueoherdeiroqueexerçaposseexclusiva
debemdaherançaterádepagaraluguelaosdemais:
“Direitocivil.Recursoespecial.Cobrançadealuguel.Herdeiros.
Utilizaçãoexclusivadoimóvel.Oposiçãonecessária.Termoinicial.
—Aquele que ocupa exclusivamente imóvel deixado pelo falecido deverá pagar aos demais herdeiros
valoresatítulodealuguelproporcional,quandodemonstradaoposiçãoàsuaocupaçãoexclusiva.
—Nesta hipótese, o termo inicial para o pagamentodosvalores deve coincidir coma efetivaoposição,
judicialouextrajudicial,dosdemaisherdeiros.
Recurso especial parcialmente conhecido e provido” (REsp 570.723/RJ, Rel.Min. Nancy Andrighi, 3.ª
Turma,j.27-3-2007,DJ,20-8-2007,p.268).
Talarestovaiaoencontrodoquedissemos,namedidaemquereafirmaaideia
básica segundo a qual o princípio ora estudado, a par de transmitir a imediata
posseepropriedadedaherança,ofazcomoumtodo,enquantouniversalidadede
bensedireitos,nãopermitindooexercício imediatodedireitoexclusivo sobre
bemdeterminado.
4.2.Princípio(non)ultravireshereditatis
Aexpressão“ultravireshereditatis”significa“alémdoconteúdodaherança”.
Aideiaqueelarepresentaéapossibilidadedequeoherdeiro,comaaceitação
puraesimplesdaherança,possaserobrigadoapagarsuasdívidaseobrigações,
nãosócomosbensdopatrimôniododecujus,mastambémcomosseuspróprios
bens.
Trata-se de situação que não deve ser ordinariamente aceita, por coroar
injustiça.
Aregrafoipositivada,deformaexpressa,tantonoCódigoCivilbrasileirode
1916,quantonavigentecodificação,asaber:
“Art.1.792.Oherdeironãorespondeporencargossuperioresàsforçasdaherança;incumbe-lhe,porém,a
provadoexcesso,salvosehouverinventárioqueaescuse,demonstrandoovalordosbensherdados”.
Vale destacar que, em anterior legislação brasileira, não havia esta regra
protetiva do herdeiro, de maneira que, se ele não aceitasse a herança “sob
benefíciodeinventário”,osbensdeleficavamsubmetidosàexecuçãodedívidas
dofalecido.
Com efeito, no Direito romano e no Direito brasileiro pré-codificado, o
herdeiro respondia ultra vires hereditatis. Assim, se, por acaso, o passivo
hereditário superasse o ativo, ficava o herdeiro obrigado a pagar, com seus
próprios bens, as dívidas deixadas pelo falecido. Tratava-se da figura da
hereditas damnosa (“herança danosa”, também conhecida como “herança
maldita”),quepoderialevaroherdeiro,eventualmente,àruína.
Como fitodeevitar talconstrangedoraconsequência,oherdeiroaceitava“a
benefíciodeinventário”,oqueacabousetornandoumacláusulausual.Comisso,
ele se resguardava, já que, dessa forma, os encargos da herança seriam pagos
somente pelas próprias forças do acervo hereditário. Remonta tal cláusula,
denominada“beneficiuminventarii”,àAntiguidade.
ComoensinaSÍLVIODESALVOVENOSA:
“NoDireitoRomano, como consequência da aquisição universal da herança, com aceitação, havia uma
confusãoautomáticadepatrimônios.Confundia-seopatrimôniodoherdeirocomopatrimôniodaherança.
Comodecorrência,oherdeirorespondiaultravireshereditas,alémdasforçasdaherança,jáqueassumia
acondiçãodedevedoratítulopróprio(Zannoni,1974:245).Assim,umaherançapoderiatrazerprejuízoao
herdeiro.
A ideia da separação de patrimônios foi a que permitiu ao herdeiro não responder por dívidas que não
fossem suas próprias. Note que, mesmo com a separação de patrimônios, a herança não perde sua
unidade, apenas que omonte deve-se bastar para satisfazer às obrigações do de cujus. Há, inclusive,
obrigaçõesdofalecidoquesãointransmissíveis,queterminamcomamorte.Emrazãodestaproblemática
équeavultavadeimportânciaemRomaodireitodedeliberardoherdeirochamado.
Já na antiguidade, para evitar tais inconveniências, admitiu-se a aceitação da herança sob benefício do
inventário. Itabaiana de Oliveira (1987:58) lembra da primeira aplicação do princípio por Adriano, em
benefíciodeumparticular.Nadefiniçãodoautor,‘benefíciodeinventárioéumprivilégioconcedidopelalei
ao herdeiro e que consiste em admiti-lo à herança do de cujus, sem obrigá-lo aos encargos além das
forçasdamesmaherança’” 66.
Destaque-se que foi o Código Civil de 1916 que alterou o panorama,
consagrandooqueaquichamamosde“Princípio(Non)UltraViresHereditatis”.
Assim,porpreceitolegal,tornou-sedesnecessáriaamanifestaçãoexpressada
aceitação “a benefício de inventário”, diretriz que foi mantida na atual
codificaçãobrasileira 67.
Nacontemporaneidade,portanto,deve-seconsiderar,por forçade lei,queas
dívidas do falecido, de fato, devem ser pagas somente com seu próprio
patrimônio,nãoultrapassandoasforçasdaherança.
Por isso, esse dogma traduz uma regra que proíbe o alcance do patrimônio
pessoaldoherdeiropordívidadofalecido,razãoporquepreferimosdenominá-
loNonUltraViresHereditatis.
Comojávimos,noplanoideal,porforçadoprincípiodasaisine,aherançaé
transmitidaautomáticaeimediatamentecomoadventodamorte.
Mas somente após o inventário ou arrolamento poder-se-á, efetivamente,
apurarse,apósocumprimentodasobrigaçõesdeixadaspelo falecido,aindahá
patrimônioremanescente.
Em síntese: no Direito brasileiro, o herdeiro só responde intra vires
hereditatis(dentrodasforçasdaherança),nãomaisseconfundindoopatrimônio
dofalecidocomopatrimôniodoherdeiro(bonorumseparatio).
Por fim, uma observação relevante sobre a transmissibilidade da obrigação
alimentarmereceanossaatenção.
Dispõeoart.1.700doCódigoCivil:
“Art. 1.700. A obrigação de prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor, na forma do art.
1.694”.
Aregradosistemaanteriorpropugnavapelaabsoluta intransmissibilidadeda
obrigação alimentar aos herdeiros (art. 402 do CC/1916), cedendo espaço à
previsão legal de sua transmissão como encargo da herança (art. 23 da Lei n.
6.515/77), com subsequente redefinição pelo mencionado artigo da vigente
codificação(art.1.700doCC/2002).
Conformeassinalamosanteriormente:
“Registre-sequetaldispositivoconsistiuemumamudançadediretriz teórica,pois,nosistemacodificado
anterior, era vedada expressamente a transmissão da obrigação de prestar alimentos, na forma do
revogadoart.402,CC/1916 68.
Emnossosentir,osentidojurídicodestatransmissibilidadeéoseguinte.
Seo sujeito, já condenadoapagarpensãoalimentícia,deixou saldodevedor emaberto,poderáo credor
(alimentando),semprejuízodeeventualdireitosucessório,desdequenãoocorridaaprescrição,habilitaro
seu crédito no inventário, podendo exigi-lo até as forças da herança. Ou seja, os outros herdeiros
suportarãoestaobrigação,namedidaemqueaherançaque lhes foi transferidaéatingidaparasaldaro
débitoinadimplido.
Mas,senãohouverbenssuficientes,nãopoderáosucessor—ressalvadaahipótesedeumdosherdeiros
também ser legitimado passivo para o pagamento da pensão (irmão do credor, por exemplo), o que
desafiaria ação de alimentos própria— ter o seu patrimônio pessoal atingido pela dívida deixada pelo
falecido” 69.
Reafirmamos tal posicionamento, justamente por considerarmos que a
responsabilidade patrimonial do herdeiro, pelas obrigações do falecido, será
sempre Non Ultra Vires Hereditatis, erigindo tal regra a princípio, para
preservação do patrimônio pessoal do herdeiro, não devendo a herança se
constituiremumaarmadilhaparaaquelequearecebe.
4.3.Princípiodafunçãosocialdaherança
Outro princípio próprio do Direito das Sucessões é o da Função Social da
Herança.
Postoemmenormedidadoquenoexercíciododireitodepropriedade,também
a herança possui uma função social, porquanto permite uma redistribuição da
riquezadodecujus,transmitidaaosseusherdeiros.
Observe-se,ademais,quecertosinstitutos,comoodireitoderepresentação,a
ser estudado posteriormente 70, têm um fundamento moral, respaldado no
princípio da isonomia e da função social, na medida em que visam a dar um
tratamento equânime a herdeiros do autor da herança, poupando-lhes da dupla
tristezadaperdadeseuascendenteimediatamentediretoetambémdebenefícios
potenciais que lhe seriam garantidos, se não tivesse ocorrido o falecimento
daquele.
4.4.Princípiodaterritorialidade
Naformadoart.1.785doCC/2002,a“sucessãoabre-senolugardoúltimo
domicíliodofalecido”.
Trata-sedoPrincípiodaTerritorialidade, regradeDireitoMaterialquegera
evidentes reflexos no campo processual, notadamente para delimitação da
competênciaterritorialreferenteàsquestõessucessórias,matériaconsolidadahá
décadas 71.
Sobreotema,ensinaGISELDAHIRONAKA:
“Entendeu o legislador processual que não bastava indicar o local da abertura do inventário pelo último
domicíliodo falecido,porqueestepoderiaapresentar-sede forma incerta,poderiao falecidonãopossuir
domicílio algum, ou ainda possuirmais de um domicílio. Por essesmotivos, especificou a regra no que
concerneaolocaldaaberturadoinventário,fazendo-oincidirnolocaldasituaçãodosbenssemprequeo
domicílio fosse incerto (art. 96, I, do CPC). Mas outro problema seria criado quando os bens que
compusessem a herança se situassem em locais diversos. Entendendo o legislador não ser possível a
multiplicidade de inventários referentes a umamesma herança, bem imóvel indivisível por determinação
legal,deslocouacompetênciajurisdicionalparaolocaldoóbitododecujus(art.96,II,doCPC).Porfim,
para a hipótese de pluralidade domiciliar, permitiu a abertura do inventário em qualquer foro
correspondenteaumdosdomicíliosdofinado(art.94,§1.º)” 72.
Vale destacar, no particular, que a vigente “Lei de Introdução àsNormas do
Direito Brasileiro” (o novo — e adequado — nome dado à antiga “Lei de
IntroduçãoaoCódigoCivil”)expressamenteestabeleceque:
“Art.10.Asucessãopormorteouporausênciaobedeceàleidopaísemquedomiciliadoodefuntoouo
desaparecido,qualquerquesejaanaturezaeasituaçãodosbens.
§1.ºAsucessãodebensdeestrangeiros,situadosnoPaís,seráreguladapelaleibrasileiraembenefíciodo
cônjugeoudosfilhosbrasileiros,oudequemosrepresente,semprequenãolhessejamaisfavorávelalei
pessoaldodecujus.(RedaçãodadapelaLein.9.047,de18-5-1995.)
§2.ºAleidodomicíliodoherdeirooulegatárioregulaacapacidadeparasuceder”.
Consiste tal preceito em uma regra de Direito Internacional Privado de
invocação obrigatória, que continua em perfeita consonância com o sistema
positivadoderegrascivis 73.
Emboraseextrapolemoslimitesdestaobra,valedestacarquediversaspodem
ser as questões daí suscitadas, especialmente quanto à determinação da lei
materialcabívelquandoestaenvolveralgumelementoestrangeiro(domicíliodo
decujusoudosherdeirosforadopaís,testamentoelaboradoforadoBrasiletc.).
4.5.Princípiodatemporariedade
Outro importante princípio próprio do Direito das Sucessões é o da
“Temporariedade”.
Consisteelenopostulado,insculpidonoart.1.787doCC/2002,dequeregula
“asucessãoea legitimaçãoparasucedera leivigenteao tempodaabertura
daquela”.
Trata-se de regra já consagrada no sistema codificado nacional, com amplo
reconhecimentojurisprudencial 74,tambémpositivadanasistemáticaanterior 75.
O fundamento da regra está calcado na segurança das relações jurídicas
consolidadasnomomentodaaberturadasucessão,atémesmopelojáexplicado
princípiodoDroitdeSaisine 76.Taltemáticaencontrarespaldoconstitucionalna
previsão contida no art. 5.º, XXXVI, da CF, de que “a lei não prejudicará o
direitoadquirido,oatojurídicoperfeitoeacoisajulgada”.
Éprecisoteremmentequea lógicadosistemaédequetodaa transferência
patrimonialsedeuipsofactodamorte,regrabásicadedireitomaterial.
Assim, eventual demora no ajuizamento, com a modificação da disciplina
jurídica a posteriori, não teria o condão de modificar tais situações, com
aplicaçãoretroativa.
Seguindo essa linha de raciocínio, regras hoje criticáveis, mas vigentes ao
tempo da morte, poderiam ser aplicadas, como, por exemplo, o tratamento
diferenciadodefilhos(ilegítimos 77,adotivos45etc.)ouda(o)companheira(o)em
facedocônjuge. 78
Nesse diapasão, o próprio novo Código Civil brasileiro estabeleceu
expressamente tal premissa, na parte referente às suas regras de transição,
conformeseverificadoart.2.041,asaber:
“Art.2.041.AsdisposiçõesdesteCódigo relativasàordemdavocaçãohereditária (arts.1.829a1.844)
não se aplicamà sucessão aberta antes de suavigência, prevalecendoodisposto na lei anterior (Lei n.
3.071,de1.ºdejaneirode1916)”.
Comosevê,odispositivoafirmaperemptoriamenteoprincípioaquidiscutido,
admitindoaultratividade 79dasnormasdoCódigoCivilbrasileirode1916,com
aplicaçãoposterioràsuarevogação,vistoquevinculadasafatosocorridosainda
quandodesuavigência.
4.6.Princípiodorespeitoàvontademanifestada
Por fim, colacionamos, como último elemento da principiologia própria do
DireitodasSucessões,oprincípiodorespeitoàvontademanifestadadofalecido,
conhecidocomo“favortestamenti”.
Trata-sedeumdosmaisimportantesprincípiosnestecampo.
Comefeito,osentidodeadmitiraproduçãodeefeitospostmortememrelação
a determinado patrimônio está justamente no respeito à manifestação da
declaraçãodevontadedoseutitularoriginário.
Percebe-sequeapróprialógicadadisciplinadoDireitoSucessórioé,emsede
detestamento,aregulaçãodeefeitosparaquandootitulardosdireitosnãoestiver
maispresente.
Tal princípio deve prevalecer, inclusive, no caso de simples irregularidades
testamentárias formais 80 ou de modificações supervenientes de situação de
fato 81, se for possível verificar, inequivocamente, qual era a intenção do
testador 82.
CapítuloIII
DisposiçõesGeraissobreaSucessão
Sumário:1. Introdução.2.AnalisandocriticamenteapositivaçãobrasileiradoDireitodasSucessões.3.
NoçõesgeraissobresucessõesnoBrasil.4.Anaturezadosinteressesobjetodasucessãohereditária.4.1.
Dasupostasucessãoeminteressesjurídicosmorais.4.2.Da“sucessão”depessoasjurídicas.5.Aconfusa
disciplinajurídicadasucessãopelo(a)companheiro(a).
1.INTRODUÇÃO
Abrimos o presente capítulo, sob o título de “Disposições Gerais sobre a
Sucessão”,comumaideiafixa.
A sua finalidade é tecer algumas considerações gerais sobre o Direito das
Sucessões que, eventualmente, ainda não tenham sido enfrentadas nos capítulos
anteriores,arrematando,comisso,aparteintrodutória.
Issoporque,conformeverificaremos,adisciplinanormativabrasileirasobrea
matéria não prima por uma boa sistematização, sendo necessário um
conhecimento abrangente da legislação codificada e complementar, para a sua
devidacompreensão.
Porissomesmo,antesdeenfrentarmostodasasintrincadasquestõesteóricase
pragmáticas sobre o tema, parece-nos relevante fazer algumas observações
críticassobreapositivaçãobrasileiradoDireitodasSucessões.
Éoquefaremosnopróximotópico.
2.ANALISANDOCRITICAMENTEAPOSITIVAÇÃOBRASILEIRADODIREITODASSUCESSÕES
Comojáseafirmou,oDireitodasSucessõesestáintimamenteligadoaoestudo
dodireitodepropriedade.
Damesmamaneira,éevidentea suaconexãocomoDireitodasObrigações,
quedisciplinaasrelaçõespatrimoniaisentrecredoresedevedores.
Note-se que tanto os direitos reais quanto os obrigacionais estão firmemente
consolidados há séculos, sendo pouco afetos às injunções ideológicas, frutos
naturaisderamoscommaiorinfluênciadasinovaçõessociais.
Comosepodeobservar,asvinculaçõestaxionômicastenderiamàformaçãode
um ramoespecializadobastante rígido, comuma sistematização estrita e pouco
receptivaamodificações.
Todavia,essaéumaconclusãoequivocada,defato,poisaforteinfluênciadas
relações familiares 83, profundamente suscetíveis a rearranjos e novas
modalidadesdecomposições,fazcomquehaja,ainda,umaevidentedificuldade
nacompreensãodadisciplinadasquestõessucessóriasnacontemporaneidade.
Com efeito, a valorização do afeto como base da composição familiar, com
repercussão jurídica, fezcomque temascomoauniãoestável,oconcubinato,o
poliamorismo, a união homoafetiva e a necessária isonomia entre os filhos
gerasseecontinuegerandonovosprismasparasevisualizarosistemasucessório
brasileiro.
Apardisso,aexistênciadenormascomplementareseparalelas(anterioresou
supervenientes)àcodificaçãocivil(tantoade1916quantoavigentede2002)faz
com que, com frequência, omagistério doDireito das Sucessões não possa se
limitaraoestudoexclusivodadisciplinapositivadanoCódigoCivilbrasileiro,o
qual,muitasvezes,nãosegueumalinhalógica.
Daí, temas como administração da herança, sua aceitação ou renúncia, para
serembemassimilados,exigemumamacrovisãodetodaalegislação.
Da mesma forma, uma análise crítica da legislação positivada impõe
reconhecer que há uma profunda “assistematização” no texto codificado, que
deveriasersinceramenterepensadoereorganizado.
Com efeito, temas como indignidade e deserdação, que sãomodalidades de
exclusão sucessória, são tratados na vigente codificação civil brasileira em
momentosdistintos,quandoummaiorrigortécnicoimporiaasuareunião 84,para
adevidacompreensão.
No mesmo diapasão, questões relacionadas à modificação superveniente do
destinatário da herança ou legado, intimamente ligadas com o Princípio da
Vontade Manifestada, a exemplo do direito de acrescer entre herdeiros e
legatários,bemcomoareduçãodasdisposições testamentárias,são tratadasem
momentosabsolutamentedistintosnoCódigo, topologicamentedistantes,quando
têm,emessência,amesmaratio 85.
Isso sem falar da confusa disciplina legal brasileira sobre capacidade
sucessória,queseráobjetode tópicoespecíficonestecapítulo 86,comofitode
diagnosticartalcomplexasituação,antesdeseenfrentaremasminúciasdostemas
da vocação hereditária e da sucessão legítima, tratados em capítulos
autônomos 87.
Tudoissofoiexpostoparasituaronossoleitoracercadacomplexaimprecisão
legislativa,quefazcomqueumasimplesleiturasequenciadadotextocodificado
nãopermita,depronto,umaadequadacompreensãodamatéria.
3.NOÇÕESGERAISSOBRESUCESSÕESNOBRASIL
O vigente Código Civil abre o seu último Livro da Parte Especial 88,
inteiramente dedicado ao “Direito das Sucessões” (arts. 1.784 a 2.027 do
CC/2002), com o Título I (“Da Sucessão em Geral”), introduzindo-o com o
CapítuloI,que tratade“DisposiçõesGerais”,muitasdelas já trabalhadasneste
livro.
Nestevolume,poróbvio,trataremosdetodasasdisposiçõessobreSucessões.
Todavia,algumasnoçõesfundamentaisdevemserexplicitadas.
Na forma do art. 1.786 do CC/2002, a “sucessão dá-se por lei ou por
disposiçãodeúltimavontade”.
Amudança na ordemdos fundamentos jurídicos da sucessão (na codificação
anterior,falava-se,primeiramente,emdisposiçãodeúltimavontade,paradepois
falardalei),aindaquepossaserconsiderada“cosmética”,revelaaconsciência
dolegisladordeque,defato,noBrasil,aindanãoháumaculturadisseminadada
prática testamentária, estando os efeitos do fato jurídico damorte normalmente
disciplinadospelanormalegal,enãopelaautonomiaprivada.
Porisso,merecedestaquearegradoart.1.788doCC/2002:
“Art. 1.788.Morrendo a pessoa sem testamento, transmite a herança aos herdeiros legítimos; omesmo
ocorreráquantoaosbensquenãoforemcompreendidosnotestamento;esubsisteasucessãolegítimaseo
testamentocaducar,ouforjulgadonulo”.
A concepção do texto legal é no sentido de que a regra é, sem dúvida, a
transmissão ipso facto da herança comamorte do seu autor, aplicando-se o já
conhecidoprincípiodaSaisine 89.
Inexistindo testamentoou,aindaqueexistente,operando-sea impossibilidade
deproduçãodeseusefeitos(sejapelacaducidadeouinvalidade 90),bemcomose
forincompleto(ouseja,quandonãoabrangeratotalidadedoacervododecujus),
prevaleceráaherançalegítima,segundoasregrasdavocaçãohereditária 91.
Valedestacar,porém,queadisposiçãotestamentáriasofrerestriçõesquantoà
suaabrangência.
Defato,naformadoart.1.789doCC/2002,“havendoherdeirosnecessários,
otestadorsópoderádispordametadedaherança”.
Trata-se da reserva da legítima, tema que será aprofundado em capítulo
posterior 92.
Antes, porém, de tratarmos do tema final das disposições gerais sobre
sucessão, a saber, a confusaparticipaçãodo(a) companheiro(a) na sucessãodo
outrosobrevivente,valeapena teceralgumasconsideraçõesacercadanatureza
dosinteressesjurídicosquesãoobjetodesucessãohereditária.
Vamosaeles.
4.ANATUREZADOSINTERESSESOBJETODASUCESSÃO
HEREDITÁRIA
Conformevimosemtópicoanterior 93,oDireitodasSucessõeséoconjuntode
normasquedisciplinaa transferênciapatrimonialdeumapessoa, em funçãode
suamorte.
Anaturezadosinteressesobjetodasucessãohereditáriaé,portanto,decunho
eminentementepatrimonial,atinenteàpessoafísica.
Outroaspectoaseconsiderar,aindanainvestigaçãodessanaturezajurídica,é
osentidodapalavra“sucessão”.
Defato,aetimologiadapalavrasucedervemdolatim“succedere”,virdepois.
Em um sentido jurídico amplo, suceder pode ser compreendido como a
substituição de um sujeito ou objeto da relação jurídica (o vínculo, por óbvio,
nunca admite substituição), matéria que é tratada, normalmente, noDireito das
ObrigaçõesedasCoisas,estudadas,respectivamente,sobonomedesub-rogação
pessoaloudesub-rogaçãoreal 94.
Emumaconcepçãoestrita,porém,queéa trabalhadaneste livro,ovocábulo
significa a sub-rogação pessoal do titular de um patrimônio pelos seus
sucessores,emvirtudedesuamorte.
Mas e o “patrimônio moral”? Não seria ele também objeto do Direito das
Sucessões?
Elucidaremosaquestãonopróximotópico.
4.1.Dasupostasucessãoeminteressesjurídicosmorais
Umaquestãocomumentesuscitadaemsaladeauladizrespeitoàpossibilidade
desucessãoeminteressesjurídicosnãopatrimoniais.
Com efeito, afirmamos peremptoriamente que, na concepção do patrimônio
transmitidomortiscausa,nãoseincluemosdireitosdapersonalidadedomorto.
Todavia, há dispositivo no texto codificado que, potencialmente, enseja
interpretação em sentido contrário do aqui exposto, o que pretendemos
desmistificar.
Trata-se do art. 12 do vigente Código Civil brasileiro, sem equivalente na
codificaçãoanterior,quepreceitua:
“Art.12.Pode-seexigirquecesseaameaça,oualesão,adireitodapersonalidade,ereclamarperdase
danos,semprejuízodeoutrassançõesprevistasemlei.
Parágrafoúnico.Emsetratandodemorto,terálegitimaçãopararequereramedidaprevistanesteartigoo
cônjugesobrevivente,ouqualquerparenteemlinhareta,oucolateralatéoquartograu”.
Damesmaforma,preceitosemelhanteéestabelecidopeloart.20,tambémsem
correspondentenosistemaanterior:
“Art.20.Salvo se autorizadas,ou senecessárias à administraçãoda justiçaouàmanutençãodaordem
pública,adivulgaçãodeescritos,atransmissãodapalavra,ouapublicação,aexposiçãoouautilizaçãoda
imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que
couber,selheatingiremahonra,aboafamaouarespeitabilidade,ousesedestinaremafinscomerciais.
Parágrafoúnico.Emsetratandodemortooudeausente,sãoparteslegítimaspararequereressaproteção
ocônjuge,osascendentesouosdescendentes”.
Comointerpretartalprerrogativalegal,seapersonalidadejurídicadapessoa
humanaextingue-secomoseufalecimento(art.6.ºdoCC/2002)eosdireitosda
personalidadesão intransmissíveis (art.11doCC/2002;semcorrespondentena
legislaçãoanterior)?
Équealeicivil,acertadamente,partedapremissadeque,quandoamemória
domortoéatingida,diretamente,pelapráticadecertosatos,aofensaacabapor
resvalar,indiretamente,naesferaexistencialdosseusprópriosparentes.
E é o direito desses parentes que o mencionado dispositivo legal visa a
resguardar.
Assim,háapenasumaaparentesucessãodedireitosmorais,pois,oqueocorre,
defato,éalesãoaumdireitoreflexo 95dosucessor,subsumívelnacategoriado
danoemricochete 96.
Nessa linha,aordemdesucessão legítima(art.1.829doCC/2002) 97 não se
deveaplicaraocaso,jáquesetratadelegitimidadeparapleitearaproteçãode
direitopróprio.
4.2.Da“sucessão”depessoasjurídicas
OutroquestionamentocomumdizrespeitoàaplicaçãodoDireitoSucessórioàs
pessoasjurídicas.
Quantoàpossibilidadede serdestinatáriadeumamassapatrimonial, nãohá
dúvidasdequetalhipóteseéaceita.
Taltema,aliás,avocaçãohereditáriadaspessoasjurídicas,seráabordadoem
capítulopróprio,aoqualremetemosonossoleitor 98.
Todavia,pergunta-se: as regrashereditáriaspodemser aplicadasnaextinção
dapessoajurídica?
Arespostaé,definitivamente,negativa.
A regrada extinçãodaspessoas jurídicas, como jádissertamosemmomento
anterior 99,temestruturacompatívelcomasuanaturezaabstratapeculiar.
Ofenômenomaisparecidocomasucessãomortiscausadapessoafísica,em
relação à pessoa jurídica, é, sem dúvida, o instituto jurídico da sucessão de
empregadores (sucessão empresarial), prevista nos arts. 10 e 448 da
ConsolidaçãodasLeisdoTrabalho 100,quepodeserdecorrente,porsuavez,de
diversosnegóciosjurídicosinterempresariais,comofusão,cisãoouincorporação
deempresas.
Trata-se,verdadeiramente,deumaoperaçãojurídicadecessãocontratual,por
força de lei, com assunção de obrigações e cessão de ativos 101, estando, sua
semelhança, apenas na expressão consagrada pelo uso (“sucessão”, ainda que
empresarial) e pelo fato de, muitas vezes, haver a extinção da personalidade
jurídicadasucedida,oque,porsuavez,nãoéindispensável.
Paraarrematarestecapítulointrodutório,érecomendávelfazermosreferência
àdisciplinadasucessãodo(a)companheiro(a)navigentecodificaçãobrasileira.
Éotemadoderradeirotópico,aseguir.
5.ACONFUSADISCIPLINAJURÍDICADASUCESSÃOPELO(A)COMPANHEIRO(A)
Parece-nosrelevante,emumcapítuloquetratadas“disposiçõesgeraissobrea
sucessão”,trazeràluzumavisãocríticaacercadaconfusadisciplinacodificada
sobreestetópico.
Eaexpressãoéestamesmo:“confusa”.
Paranãodizerinconstitucional.
Isto se dá pela circunstância de o legislador haver resolvido inserir o
regramento da capacidade sucessória do(a) companheiro(a) — de maneira
formalmenteatécnicaetopologicamenteequivocada—napartedas“Disposições
Gerais”doLivroSucessório.
Note-sequeamatériaétípicadaregulamentaçãodasucessãolegítima,enão
daparteintrodutória,oquetalvezinfiraumpreconceitosub-reptícioemfaceda
uniãoestável.
Assim,nopresenteitem,pretendemosapenasfazeralgumasreflexõesacercada
sucessãodo(a)companheiro(a)navigentecodificaçãobrasileira.
As considerações serão, todavia, apenas introdutórias, pois a matéria será
objeto de minudente apreciação em capítulo próprio 102, no tema que lhe é
efetivamentepertinente.
Adiante-se,porém,queoreconhecimentodapossibilidadedesucessãopelo(a)
companheiro(a)nãoéumainovaçãodoCódigoCivilbrasileirode2002.
Defato,anteriormenteaotextoconstitucionalde1988,quandoainfluênciade
determinada ideologia acabava por restringir uma tutela jurídica positivada de
relações afetivas não matrimonializadas, foi a jurisprudência 103, em atitude
praeterlegem,quegarantiu,paulatinamente,direitosaosconviventes, inclusive,
com base na Lei n. 6.858/80 104, a condição de dependentes, pelo menos para
créditosdenaturezaprevidenciária,bemcomoparavaloresdemenormonta.
Foi a Constituição Federal de 1988, porém, que reconstruiu juridicamente o
sistema,reconhecendoauniãoestávelcomomodalidadefamiliar,oquepassoua
influenciaralegislaçãoinfraconstitucionalposterior.
Nessaesteira,nocamposucessório,apartirdadécadade1990,passouater
o(a)companheiro(a)umaproteçãolegalatéentãoinexistente.
ALein.8.971,de29dedezembrode1994,quantoaoregimedebens,garantiu
aoconviventeameaçãodosbenscomunsparaosquaistenhacontribuídoparaa
aquisição,deformadiretaouindireta,aindaqueemnomeexclusivodofalecido
(art. 3.º), bem como estabeleceu o direito ao usufruto de parte dos bens
transmissíveis,alémdeincluirocompanheirosobreviventenaterceiraordemda
vocaçãohereditária(art.2.º.).
JáaLein.9.278/96,emseuart.7.º,parágrafoúnico,garantiuodireitorealde
habitação ao companheiro sobrevivente, enquanto vivesse ou não constituísse
novauniãooucasamento,emrelaçãoaoimóveldestinadoàresidênciafamiliar.
Assim, o que se esperaria da nova codificação civil era que ela viesse,
finalmente, a igualar o tratamento entre o cônjuge e o companheiro, evitando
qualqueralegaçãodetratamentodiscriminatório.
Ledoengano.
Comefeito,otextooriginaldoprojetodoCódigoCivilbrasileironadaprevia
sobreotema.
Até mesmo pela necessidade de uma suposta adequação ao novo texto
constitucional, foi acrescido ao Capítulo I do Título I do Livro V, quando da
aprovação do projeto pelo Senado Federal, um artigo que não constava do
Projetode1975,porforçadaEmenda358.
O projeto, finalmente aprovado, modificou o texto original, gerando o que
consideramosumadeformidadenosistema,asaber,oart.1.790doCC/2002,que
teveaseguinteredaçãofinal:
“Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens
adquiridosonerosamentenavigênciadauniãoestável,nascondiçõesseguintes:
I—seconcorrercomfilhoscomuns, terádireitoaumaquotaequivalenteàquepor lei foratribuídaao
filho;
II—seconcorrercomdescendentessódoautordaherança,tocar-lhe-áametadedoquecouberacada
umdaqueles;
III—seconcorrercomoutrosparentessucessíveis,terádireitoaumterçodaherança;
IV—nãohavendoparentessucessíveis,terádireitoàtotalidadedaherança” 105.
Sobre o tema, confira-se o testemunho abalizado de GISELDA MARIA
FERNANDESNOVAESHIRONAKA:
“OAnteprojeto deCódigoCivil elaborado em 1972 e o Projeto apresentado para discussão em 1975 e
aprovado naCâmara dosDeputados em1984 não previamqualquer regra relativamente à sucessão de
pessoas ligadasentre siapenaspelos laçosdoafeto.FoioSenadorNélsonCarneiro,emsua incessante
luta pela modernização das relações familiares brasileiras, quem apresentou aquela Emenda 358, antes
referida, no sentido de garantir direitos sucessórios aos conviventes. Como lembra Zeno Veloso 106, a
emenda foi claramente inspirada no Projeto de Código Civil elaborado porOrlandoGomes nos idos da
décadade60doséculoXX,antes,portanto,daigualdadeconstitucionalmentegarantida.Bempor isso,o
artigo em que resultou, este, de número 1.790, é de cariz retrógrado referentemente à legislação
anteriormentesumariada,dadécadade1990doséculoXX” 107.
De fato, cuida-se de tratamento demeritório da união estável em face do
matrimônio, com uma disciplina que a desprestigia como forma de relação
afetiva,oquebeiraainconstitucionalidade.
Ademais,odispositivoémuitomalpensado,umavezquenãoprevêasituação
cada vez mais corriqueira de haver filhos comuns em concorrência com
exclusivos.
E,no finaldascontas, abstraída—aomenosnessemomento—adiscussão
sobreasuaconstitucionalidade,tem-se,defato,umaconfusadisciplinalegal,que
chega ao cúmulo de permitir que um colateral do falecido (um primo, por
exemplo)tenhamaisdireitosdoqueaprópriaviúva.
Isso remonta ao fato, inclusive, de haver sido estabelecido um regramento
materialmentediferenciadoao tratoda legítimaentrecônjugeecompanheiro(a),
conforme se verificará, em momento próprio 108, no estudo confrontado do já
mencionadoart.1.790doCC/2002comosimportantesarts.1.829,1.832e1.837
doCC/2002.
CapítuloIV
AdministraçãodaHerança
Sumário:1.Noçõesintrodutórias.2.Administraçãodaherança.3.Responsabilidadedoadministradorda
herança(edoinventariante).4.Sucessãoembensdeestrangeiros.
1.NOÇÕESINTRODUTÓRIAS
OCapítuloIIdoTítuloI(“DaSucessãoemGeral”)doLivroV,reservadoao
“DireitodasSucessões”,foinomeado,novigenteCódigoCivilbrasileiro,como
“DaHerançaedesuaAdministração”.
Trata-se,senospermitenovamenteumareflexãocrítica,deumapartedanossa
legislaçãoquepoderiatersidomaisbemsistematizada,namedidaemquereúne,
nomesmocapítulo,regrasespecíficasdeadministraçãodaherança(arts.1.791,
1.792e1.797doCC/2002)comadisciplinadasuacessão(arts.1.793a1.795
doCC/2002;semcorrespondêncianacodificaçãoanterior),e,bemassim,regras
procedimentaisprópriasrelacionadasaoinventário(art.1.796doCC/2002).
No esforço de sistematização teórica que aqui propugnamos, cuidaremos, no
presente capítulo, da administração propriamente dita da herança, bem como
teceremos comentários acerca da sucessão embens de estrangeiros localizados
noterritóriopátrio,matériaevidentementerelacionadaaotemaaquiproposto.
Os demais dispositivos domencionado capítulo do Código Civil brasileiro,
porsuavez,serãoapreciadosnomomentoprópriodostemascorrespondentes 109.
2.ADMINISTRAÇÃODAHERANÇA
Falecendoo autor da herança, forma-se, em abstrato, umamassa patrimonial
cuja titularidade,dopontodevista ideal,por forçadoPrincípiodaSaisine 110,
passa aosherdeiros, aindaquenão se conheçaquemeles sejam (enemmesmo
elessaibamquesãoossucessores).
Assim,preceituaoart.1.791doCC/2002:
“Art.1.791.Aherançadefere-secomoumtodounitário,aindaqueváriossejamosherdeiros.
Parágrafoúnico.Atéapartilha,odireitodoscoerdeiros,quantoàpropriedadeepossedaherança, será
indivisível,eregular-se-ápelasnormasrelativasaocondomínio” 111.
Dessaforma,comaaberturadasucessão,tem-seatransferênciaautomáticada
titularidade da massa patrimonial, na expressão codificada, “como um todo
unitário”, independentemente da manifestação de aceitação (ou eventual
renúncia) 112desse(s)novo(s)titular(es).
Masaquemcabeadministraroconjuntodebens?
Seécertoquea titularidadeéde todososherdeiros,que recebemaherança
comoumdireitoindivisível,emregimereguladopelasregrasdocondomínio 113,
também é lógico que, a alguém, deve ser atribuída a responsabilidade pela
direçãodopatrimônio,atéasuafinalindividualizaçãoporcadaherdeiro.
Assim,deveomagistrado,noprocessodeinventário(quedeveserinstaurado
no prazo de trinta dias da abertura da sucessão, na forma do art. 1.796 do
CC/2002 114), designar inventariante para a administração do espólio,
responsávelpelasortedetodaamassapatrimonial,comseuscréditosedébitos,
atésuaentrega,definitiva,paraoherdeirocorrespondente 115.
Tal função é de extrema importância, pois, lamentavelmente, por razões
diversas, não se pode fechar os olhos para a realidade, em que se constatam
processosdeinventárioepartilhaqueduramindefinidamente.
Eéjustamentecomosolhosnarealidadequenãosepodedeixardeenaltecera
previsãodoart.1.797doCC/2002:
“Art.1.797.Atéocompromissodoinventariante,aadministraçãodaherançacaberá,sucessivamente:
I—aocônjugeoucompanheiro,secomooutroconviviaaotempodaaberturadasucessão;
II — ao herdeiro que estiver na posse e administração dos bens, e, se houver mais de um nessas
condições,aomaisvelho;
III—aotestamenteiro;
IV—apessoadeconfiançadojuiz,nafaltaouescusadasindicadasnosincisosantecedentes,ouquando
tiveremdeserafastadaspormotivogravelevadoaoconhecimentodojuiz”.
Osentidododispositivolegaléprestigiaraqueleque,emtese,estará,defato,
na efetiva administração dos bens da herança, no núcleo familiar. Daí a
precedênciado cônjugeou companheiro, sucedidopeloherdeiroque estiverna
posse e administração dos bens, sendo o critério demaior idade, neste último
caso,utilizadoparaaescolhadeumúnicoadministrador,casohajamaisdeum
herdeironessascondições.
Somente na ausência destes é que se pensa em delegar a administração ao
testamenteiroou,na formadaprevisãodo inciso IV,à“pessoadeconfiançado
juiz,nafaltaouescusadasindicadasnosincisosantecedentes,ouquandotiverem
deserafastadaspormotivogravelevadoaoconhecimentodojuiz”.
Claro que a referência do texto legal deveria ser quase acadêmica, pois, se
provocado o Poder Judiciário, a designação mais natural é logo de um
inventariante, e não de um administrador provisório inominado. Entretanto,
dificuldades de ordem prática na investigação de quem será o inventariante
poderiamaconselhartalprovidênciaexcepcional.
Observe-se, nesse contexto, que a previsão legal é específica para a
administraçãoprovisóriadoespólioatéadesignaçãodoinventariante,ateordo
art.617doCódigodeProcessoCivilde2015:
“Art.617.Ojuiznomearáinventariantenaseguinteordem:
I—ocônjugeou companheiro sobrevivente, desdeque estivesse convivendocomooutro ao tempoda
mortedeste;
II — o herdeiro que se achar na posse e na administração do espólio, se não houver cônjuge ou
companheirosobreviventeouseestesnãopuderemsernomeados;
III—qualquerherdeiro,quandonenhumdelesestivernaposseenaadministraçãodoespólio;
IV—oherdeiromenor,porseurepresentantelegal;
V—o testamenteiro, se lhe tiver sidoconfiadaaadministraçãodoespólioouse todaaherançaestiver
distribuídaemlegados;
VI—ocessionáriodoherdeirooudolegatário;
VII—oinventariantejudicial,sehouver;
VIII—pessoaestranhaidônea,quandonãohouverinventariantejudicial.
Parágrafoúnico.Oinventariante,intimadodanomeação,prestará,dentrode5(cinco)dias,ocompromisso
debemefielmentedesempenharafunção.”
E,independentementedasatribuiçõesdoinventariante,previstasnosarts.618
e619doCódigodeProcessoCivil de2015 116, que será objetode análise em
capítulo próprio 117, o fato é que tanto o administrador provisório quanto o
inventariantedevemresponderjuridicamentepeloespólio,bemcomopelaprática
deatosquepossamgerardanosàmassapatrimonial.
Masqualseriaanaturezadetalresponsabilidade?
Éoqueenfrentaremosnopróximotópico.
3.RESPONSABILIDADEDOADMINISTRADORDAHERANÇA(EDOINVENTARIANTE)
Daaberturada sucessão (óbitodo autordaherança) até adefinitivapartilha
dosbens,têmosherdeirosoqueseconvencionouchamarde“direitoàsucessão
aberta”.
Opatrimôniodofalecido,consideradoumamassapatrimonial indivisível,de
titularidade conjunta de todos os herdeiros, passa a ser chamado de espólio,
especialmenteparafinsprocessuais.
O espólio não possui personalidade jurídica, mas tem reconhecida a sua
capacidadepostulatória,naformaconsagradapeloart.75doCódigodeProcesso
Civil de 2015 118. Assim, poderá o espólio, através de seu representante
(provisório, na forma do mencionado art. 1.797, ou definitivo, no caso do
inventariantenomeado judicialmente),proporaçãoemjuízo,bemcomotambém
serréu.
Assim,porexemplo,seumimóvel,queeradetitularidadedofalecido, tenha
sido invadido, cabe ao espólio, por seu administrador provisório ou
inventariante,ajuizaraaçãopossessóriacorrespondente.
Anomeaçãodoinventariantesomentesedáapósaaberturadoinventário,com
a verificação, pelo magistrado, da legitimidade da pessoa que se propôs a
assumiroônus,múnuspúblicoquedeveserexercidocomdenodo,nãopodendo
serimotivadamenterenunciado 119.
Comovimos,antesdanomeaçãoformaldoinventariante,aadministraçãodos
bens do espólio cabe aos sujeitos indicados no já transcrito art. 1.797 do
CC/2002.
Nãohavendo inventário, o referido administradorprovisório teráodeverde
administração dos bens do espólio e, consequentemente, de prestar contas aos
interessados.
Mas, após a sua assunção, o inventariante assumirá todos os deveres
correspondentes 120.
Ambos têm,portanto,aobrigaçãodeadministraropatrimôniodo falecidoe,
ainda,odeverdepromovertodoequalqueratonadefesadoespólio,sobpenade
ser responsabilizado civilmente. Qualquer dos herdeiros pode exigir que lhe
sejamprestadascontasdaadministraçãoque fazdoespóliooquepoderágerar
contraoinventarianteeventualresponsabilidadecivil.
Equalseriaanaturezadessaresponsabilidade?
Entendemosqueahipóteseéderesponsabilidadecivilsubjetiva,devendoser
demonstradaaculpadoadministradorprovisóriooudoinventariantepelosdanos
causadosaoespólio.
Isso porque a responsabilidade patrimonial pessoal deve ser interpretada de
acordocomaculpadoagente,ateordoart.186doCódigoCivilquedefineoato
ilícito.
Assim,noscasosemqueoadministradorouoinventariantenãoadministrede
forma satisfatória os bens oudireitos deixados pelo falecido, estará sujeito, na
medidaemqueviolardeveresjurídicospreexistentes,adurassançõesnoâmbito
civil,desdearemoçãodafunçãoatéopagamentodeindenização 121.
Da mesma forma, dependendo da situação fática, poderá ainda responder
penalmenteporseusatos,valendodestacar,atítuloilustrativo,que,notipopenal
de apropriação indébita, a condição de inventariante é hipótese de aumento de
pena,ateordoart.168,§1.º,II,dovigenteCódigoPenalbrasileiro 122.
4.SUCESSÃOEMBENSDEESTRANGEIROS
A título de arremate, parece-nos fundamental tecer algumas considerações
acercadadisciplinajurídicadasucessãodebenspertencentesaestrangeiros,que
estejamlocalizadosemterritórionacional.
O tema é tratado na vigente “Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro”, novo nome da antiga “Lei de Introdução ao Código Civil
Brasileiro”,asaber,oDecreto-Lein.4.657,de4desetembrode1942 123.
Estabeleceoseuart.10,notadamenteseu§1.º,comaredaçãodadapelaLein.
9.047,de1995:
“Art.10.Asucessãopormorteouporausênciaobedeceàleidopaísemquedomiciliadoodefuntoouo
desaparecido,qualquerquesejaanaturezaeasituaçãodosbens.
§1.ºAsucessãodebensdeestrangeiros,situadosnoPaís,seráreguladapelaleibrasileiraembenefíciodo
cônjugeoudosfilhosbrasileiros,oudequemosrepresente,semprequenãolhessejamaisfavorávelalei
pessoaldodecujus.
§2.ºAleidodomicíliodoherdeirooulegatárioregulaacapacidadeparasuceder”.
OdispositivolegalreproduzaprevisãoconstitucionalcontidanoincisoXXXI
doart.5.ºdaConstituiçãoFederalde1988(“asucessãodebensdeestrangeiros
situadosnoPaísseráreguladapelaleibrasileiraembenefíciodocônjugeoudos
filhosbrasileiros, semprequenão lhes sejamais favorável a leipessoaldode
cujus”).
Trata-se de uma regra protetiva dos interesses dos cidadãos brasileiros,
determinando-seaaplicaçãodanormamaisbenéficaaosnacionais.
Verifique-seque,apriori, tem-seaquiumaexceçãoà regrageraldocritério
determinantedoregimepatrimonialdosbens,queéaaplicaçãoestritadaleido
domicíliodosujeito(art.7.ºdaLINDB).
Somenteomagistradodolocaldasituaçãodosbensimóveispoderáprocessar
apartilha.
Todavia,odireitomaterialaplicávelnãoserá,comovisto,necessariamenteo
dalocalizaçãodosbens,mas,sim,aquelequeformaisfavorávelaosinteresses
docônjugeoufilhosbrasileiros.
Assim, admitir-se-á,por exceção, a aplicaçãodedireitomaterial estrangeiro
no Brasil, na hipótese de melhor conformação dos interesses do cônjuge
sobrevivente — leia-se também do convivente supérstite — e dos filhos
brasileiros.Claroque,porse tratardenormaestrangeira,poderáexigirdilação
probatóriaemjuízo,nostermosdoart.376doCPC/2015 124,comaapresentação
detraduçãojuramentada.
No próximo capítulo, trataremos, finalmente, da aceitação e renúncia da
herança, tema em que a administração da massa patrimonial, aqui tratada,
configura-secomopremissa.
Somente depois de compreendida a administração da herança, bem como a
possibilidadedesuaaceitação,équeseabordaráapossibilidadedesuacessão,
matériaquereservamosparaocapítulosubsequente.
Tudoissoparafacilitaramelhorcompreensãodamatéria.
CapítuloV
AceitaçãoeRenúnciadaHerança
Sumário: 1. Introdução.2.Aceitaçãodaherança. 2.1.Distinção entre aceitação edelaçãodaherança.
2.2. Importância histórica. 2.3. Classificação. 2.3.1. Aceitação expressa. 2.3.2. Aceitação tácita. 2.3.3.
Aceitação presumida. 2.4. Efeitos. 2.5. Revogação da aceitação. 2.6. Transmissibilidade do direito de
aceitaçãodaherança.3.Renúnciadaherança.
1.INTRODUÇÃO
Vimos, em capítulo anterior 125, que, à luz do Princípio da Saisine, com a
abertura da sucessão, decorrente da morte, a herança é transmitida,
imediatamente,paraosherdeiroslegítimosetestamentários 126.
Comisso,valesalientar,nãosedigaqueoherdeirojápossapretenderdispor
debemdeterminadodaherança,porquantoatransmissibilidade,calcadaemuma
ficção jurídica, opera uma transferência meramente ideal, para evitar que o
patrimôniodeixadoremanesçasemtitular.
Aliás, não é outra a razão por que, antes de ultimado o arrolamento ou o
inventário, não pode o sucessor, salvo mediante autorização judicial
fundamentada, pretender dispor de bem determinado componente do acervo
hereditário.
Somentecomaefetivapartilha (emhavendomaisdeumsucessor)oucoma
adjudicação(emhavendosucessorúnico),observadasasnormaslegais,poderáo
herdeiro efetivamente considerar-se dono do bem que lhe fora deixado,
exercitandotodasasprerrogativasinerentesaodireitodepropriedade.
Sucede que, a par de a transmissibilidade patrimonial operar-se
automaticamente por aplicação da Saisine, como já vimos, o Direito das
Sucessões cuida ainda de regular as formas pelas quais o herdeiro confirma o
recebimento,pormeiodoconhecidoinstitutodaaceitaçãodaherança.
É bemverdade que, no atual estágio do nossoDireito, esta figura carece da
importânciadeoutrora,especialmenteseconsiderarmosqueatransmissibilidade
é imediata e, ainda, pela circunstância de os herdeiros não responderem por
dívidasalémdasforçasdaherança,comovimosanteriormente 127.
Poroutrolado,avultaaimportânciadeoutroinstituto:arenúnciadaherança.
Isso porque, por se tratar de um ato abdicativo de direito, a lei o cerca de
formalidades que devem necessariamente ser conhecidas pelo profissional do
direito,sobpenadenãoseatingiremosefeitosjurídicospretendidos.
Aprofundemos,então,ostemas:aceitaçãoerenúnciadaherança.
2.ACEITAÇÃODAHERANÇA
Aaceitaçãoouadiçãodaherança(aditio)éoatojurídicopeloqualoherdeiro
manifesta, de forma expressa, tácita ou presumida, a sua intenção de receber a
herançaquelheétransmitida.
Manifesta-se aqui o princípio da autonomia privada, também trabalhado
anteriormente em nossa sistematização principiológica 128, namedida em que a
ninguémpodeserimpostaaobrigaçãodereceberumaherança.
Nesse sentido,explicitaoart.1.804doCC/2002 (semcorrespondentedireto
nacodificaçãoanterior):
“Art. 1.804. Aceita a herança, torna-se definitiva a sua transmissão ao herdeiro, desde a abertura da
sucessão.
Parágrafoúnico.Atransmissãotem-sepornãoverificadaquandooherdeirorenunciaàherança”.
É importante fixarmos esse aspecto, na medida em que o senso comum nos
remeteàfalsaimpressãodequeesseprincípioapenastemaplicaçãonasrelações
contratuais.
Emoutrasesferasdasrelaçõesparticulares,aautonomiaprivadasemanifesta,
comonadecisãodeconvolarnúpciasouquando,nocasooraestudado,oherdeiro
atuanosentidodeaceitaraherançaquelheforadeixada.
Até mesmo em microssistemas jurídicos em que o dirigismo estatal é
acentuado, como nas relações trabalhistas e consumeristas, sempre há espaço
parasediscutiraaplicaçãodasregrasdaautonomiadavontade,cujorespeitoé
umprincípiogeraldodireito,calcadonaliberdadehumanadebuscar,livremente,
arealizaçãodassuaspretensõesdevida.
2.1.Distinçãoentreaceitaçãoedelaçãodaherança
Parece-nos relevante distinguir a aceitação da herança da figura conhecida
comodelaçãodaherança.
Comefeito,nãosedevemconfundirosinstitutos.
De fato, a denominada delação da herança é expressão que caracteriza a
situaçãoemque,apósamorte,aherançaécolocadaàdisposiçãodosherdeiros,
que,assim,poderãoaceitá-laounão 129.
Comefeito,aconfusãoéinjustificável.
Umasituaçãotraduzaoportunidadeparaamanifestaçãodevontade—delação
da herança — outra é a própria manifestação — aceitação ou, em sentido
contrário,comoseverámaisàfrente,renúnciadaherança 130.
2.2.Importânciahistórica
Parece-nos interessante tecer algumas considerações sobre a importância
históricadafiguradaaceitaçãodaherança.
É bem verdade que, no passado, o instituto da aceitação da herança já se
revestiudemaiorimportância,namedidaemque,antesdoCódigoCivilde1916,
se o herdeironãodeclarasse aceitar “sobbenefíciode inventário” (beneficium
inventarii),poderiaadquirirapenasopassivodeixadopelomorto(asdívidas),
pois,nosistemadaépoca,nãovigoravaaregraqueproibiaoherdeirodereceber
além das forças da herança (ultra vires hereditatis), conforme já se inferiu de
tópicoanterior 131.
Sobreotema,lembraMARIAHELENADINIZ:
“Deveras,nodireito romanoenodireitobrasileiro, antesdoCódigoCivilde1916,a responsabilidadedo
herdeiroeraultravireshereditatis (alémdasforçasdaherança), logo,deviaelepagar,comseupróprio
patrimônio,osdébitosdodecujus.Com isso, corria o risco de sofrer grande prejuízo econômico. Para
escapar desse encargo, o herdeiro aceitava a herança a benefício de inventário, resguardando-se, pois,
com isso, asdívidasdoespólio seriampagaspelas forçasdoacervohereditário.ComoCódigoCivil de
1916,confirmadopelonovoCódigo,operou-seabonorumseparatio,ouseja,opatrimôniodoherdeironão
se confunde com o do de cujus. A herança responde pelos débitos do espólio e o herdeiro tem
responsabilidadeintravireshereditatis (dentrodasforçasdeherança).Seopassivoformaiordoqueo
ativoeseoherdeirotivesseodeverdepagá-lo,ter-se-iaherançadanosa,quepoderialevá-loàruína” 132.
Após a entrada em vigor do Código de 1916 (art. 1.587), como é cediço,
firmou-searegrasegundoaqualoherdeironãopoderiareceberapenasdívidas
do falecido—ouseja,dequenão responderiaalémdas forçasdaherança—,
diretriz esta mantida no Código de 2002 (art. 1.792), o que, por conseguinte,
resultou, não propriamente no reconhecimento da “desnecessidade” do ato de
aceitação,mas,sim,emmenorpreocupaçãosocialemfacedele,umavezqueo
herdeirosomentepoderiaserbeneficiadocomaherança,nuncaprejudicado.
2.3.Classificação
Aaceitaçãodaherançacomportaumaclassificaçãoamplamentedifundida.
Podeserelaexpressa,tácitaoupresumida.
Compreendamoscadaumadelas.
2.3.1.Aceitaçãoexpressa
A aceitação expressa é aquela que se opera por meio de uma explícita
declaraçãodosucessor,reduzidaaescrito(públicoouparticular)ouatermonos
autos.
Valesalientar,nesseponto,que,a teordoart.1.805(1.ªparte),adeclaração
meramenteverbalnãoteráeficáciajurídica.
Trata-se de uma restrição calcada na segurança jurídica e que poderia ser
objetodereflexão,namedidaemque,conformeveremosemseguida,admite-sea
modalidade“tácita”deaceitação.
2.3.2.Aceitaçãotácita
Aaceitação tácitaéaquelaquedecorredaatitudedopróprioherdeiro,que,
emboranãohajadeclaradoexpressamenteaceitar,comporta-senessesentido(art.
1.805,2.ªparte),habilitando-se,porexemplo,noprocedimentodeinventárioou
dearrolamento.
Éaformamaiscomumdeaceitação,poisépoucousualoherdeirodar-seao
trabalho de “expressamente declarar” que aceitou a herança, porquanto os atos
porelerealizadosjátraduzemaceitação.
Frise-se, finalmente,nos termosdos§§1.º e2.ºdo referidoartigo,que“não
exprimemaceitaçãodeherançaos atosoficiosos, comoo funeraldo finado,os
meramente conservatórios, ou os de administração e guarda provisória”, bem
como “não importa igualmente aceitação a cessão gratuita, pura e simples, da
herança,aosdemaiscoerdeiros”.
Noprimeirocaso,apráticadosatosalidescritospodemcaracterizarapreço
ourespeitopelamemóriadofalecido,nãosignificando,porsisós,anecessária
aceitaçãodaherança.
Já no segundo caso, temos, tecnicamente, a prática de um ato abdicativo da
herança, a ser estudado em seguida, quando voltarmos a nossa atenção para a
interessantefigurajurídicadarenúncia.
2.3.3.Aceitaçãopresumida
Porfim,aaceitaçãopresumidaéaquelaqueresultadeumasituaçãofáticade
omissão.
Comefeito, estaúltimacategoriaderivado reconhecimento legalda eficácia
jurídicadosilêncio.
Já tivemos oportunidade de anotar, em nosso volume I, Parte Geral, que o
silêncio,emgeral,nadatraduz.
Éumaabstençãojuridicamenteirrelevante.
Todavia, situações há em que a lei atribui valor legal ao silêncio, conforme
podemosnotardaleituradoart.111donossoCódigoCivil(semequivalenteno
CC/1916): “o silêncio importaanuência,quandoascircunstânciasouosusoso
autorizarem,enãofornecessáriaadeclaraçãodevontadeexpressa”.
Mantendocoerênciacomestedispositivo,oart.1.807doCC/2002dispõeque
“o interessado emqueo herdeiro declare se aceita, ounão, a herança, poderá,
vintediasapósabertaasucessão,requereraojuizprazorazoável,nãomaiorde
trintadias,para,nele,sepronunciaroherdeiro,sobpenadesehaveraherança
poraceita”.
Note-seque,nocaso,seoherdeiro,instadoasemanifestar,quedar-sesilente
aofimdoprazo,significaráqueaceitou.
Observe-se que, a rigor, não se trata de uma aceitação derivada de atos
próprios do herdeiro, indicativos de aquiescência, como se dá na aceitação
tácita,mas, sim,decorrentedeumapostura inerte,decompletaabstenção, caso
emqueapróprialeifirmapresunçãodequeaceitou.
Essas são as razões pelas quais, tecnicamente, em nosso sentir, não se deve
confundiraaceitaçãotácitacomaaceitaçãopresumida.
2.4.Efeitos
Nestetópico,cabe-nosdissertaracercadosefeitosdaaceitação.
Defato,aaceitação,emqualquerdassuasmodalidades,quandomanifestada,
retroage à data da abertura da sucessão, uma vez que confirma a
transmissibilidadeabstrataoperadaporforçadoPrincípiodaSaisine.
Registre-se, ainda, que se trata de um ato puro, não admitindo condição ou
termo, nem eficácia parcial, na forma do caput do art. 1.808 da vigente
codificação civil, que estabelece expressamente que “não se pode aceitar ou
renunciaraherançaemparte,sobcondiçãoouatermo”.
Não posso, por exemplo, aceitar uma herança sob a condição de, “após a
apuração das dívidas, verificar-se que o saldo líquido é superior a 100.000
reais”,assimcomonãopossosubordinaraminhaaceitaçãoaumadata(termo),
nem,muitomenos,aceitarpartedaherançaerecusarorestanteque tambémme
tocariapelomesmotítulo.
Algumaspeculiaridades,entretanto,derivamdapróprialei.
Nadaimpede,nessa linha,queoherdeiro,aquemse testaremlegados,possa
aceitá-los,renunciandoàherança;ou,aceitando-a,repudiá-los(art.1.808,§1.º,
doCC/2002),pois,emtaiscasos,repudiandoaquotaouobem,aceitaráooutro
porinteiro.
Da mesma forma, o herdeiro, chamado, na mesma sucessão, a mais de um
quinhãohereditário, sob títulos sucessóriosdiversos,pode livrementedeliberar
quantoaosquinhõesqueaceitaeaosquerenuncia(art.1.808,§2.º,doCC/2002).
Trata-sederegraque,aparentemente,conflitacomaideiadequeumaherança
nãopossaseraceitaemparte,tornando-se,todavia,maiscompreensível,quando
invocamosoexemplodadopeladoutrina:
“Nadaobsta,havendoduplasucessão,alegítimaeatestamentária,queoherdeirorenuncieinteiramentea
sucessão legítima, conservando a outra ao aceitar a herança advinda de testamento; só se lhe proíbe a
aceitaçãoparcialdaherança” 133.
Ou seja, permitindo-nos um jogo de palavras, a regra legal deve ser
interpretadacomadevidacompreensãodequenãosetratadeaceitaçãoparcial
daherança,mas,sim,deaceitaçãototaldeapenasumaoualgumasdaspartesque
lhecabe.
2.5.Revogaçãodaaceitação
Outro importante aspecto a ser consideradoéno sentidodenão se admitir a
revogaçãodoatodeaceitar.
Algumas considerações, nesse ponto, devem ser tecidas, em atenção à boa
técnica.
Arevogaçãotraduzoexercíciodeumdireitopotestativopeloqualoseutitular
manifesta vontade contrária à que fora externada antes, negando-lhe os seus
efeitosjurídicos.
Éoqueacontece,porexemplo,quandoomandanterevogaoatoqueconferiu
poderesaoseumandatário(procurador).
Nãoseconfundecomainvalidaçãodoatojurídico,umavezque,nestecaso,
ataca-seavontademanifestadanoplanodavalidade,medianteoreconhecimento
danulidadeabsolutaourelativadecorrentedovícioqueoinquina.
Poisbem.
Nahipótesesobanálise,àluzdoart.1.812doCódigoCivil,aaceitaçãoválida
nãopoderáserrevogada,oquelogicamentenãoimpedeoherdeiroderenunciarà
quota hereditária que aceitou, desde que não haja prejuízo aos seus credores,
conformeveremosemmomentooportuno 134.
2.6.Transmissibilidadedodireitodeaceitaçãodaherança
Finalmente, é bom lembrar que, falecendo o herdeiro antes de declarar se
aceitaaherança,opoderdeaceitarpassa-lheaosseussucessores,amenosque
se tratedevocaçãoadstritaaumacondiçãosuspensiva,aindanãoverificada,a
teordoart.1.809doCódigoCivilde2002 135.
Assim,atítulodeexemplo,sePedromorre,deixandoosfilhosChico(quepor
sua vez é pai deCarla) e Leo, e o herdeiroChico, ao saber damorte do pai,
tambémfaleçaenfartado,semquehouvessetidotempodeaceitaraherançadele,
odireitodeaceitarquelhetocariaserátransmitidoasuafilhaCarla.Esta,então,
teráodireitodeaceitaraherançadoseupaietambémodeaceitaraherançado
seuavô(emvirtudedeodireitodeaceitaçãodoseupaiter-lhesidotransmitido).
Emcasos como este, é de boa cautela, vale frisar, que os inventários tramitem
conjuntamente,emautosapensados.
Masumdetalhedeveserressaltado.
Carlasomentepoderá,logicamente,aceitar(ounão)aherançadoavô,Pedro,
sehouveraquiescidoemreceberadopai,pois,sóassim,odireitodeaceitarnão
exercidoporChicolheserátransmitido.
Notequea transmissibilidadedodireitodeaceitar—quesedáquandoum
herdeiro,vivoaotempodamortedoautordaherança,falecelogoapós,semque
tivessetidotempodeaceitar—nãoseconfundecomodireitoderepresentação
—que, como será visto posteriormente 136, pressupõe que o herdeiro seja pré-
morto em relação ao autor da herança, caso em que os seus sucessores o
representarão como se vivo estivesse, para evitar injustiças na divisão
patrimonial.
Passemos, agora, a estudar o outro lado da moeda, a saber, a renúncia da
herança.
3.RENÚNCIADAHERANÇA
Tecnicamente, a renúncia da herança consiste na prática de um ato jurídico
abdicativododireitohereditárioconferido,comefeitosretroativos,queexcluem
osujeitodacadeiasucessóriacomoseherdeironuncahouvessesido.
Em outras palavras, ao renunciar a uma herança, o sucessor é banido do
panoramasucessório,pormanifestaçãodasuaprópriavontade—razãoporque
tambémaquié sentidooprincípiodaautonomiaprivada—fazendocomqueo
bemasitransferidoretorneaomonte-mor(partilhável) 137.
Emnossosentir,nãosetratademeroatojurídicoemsentidoestrito,aqueleque
traduz um simples comportamento humano, com efeitos jurídicos impostos ou
determinadospelopróprioordenamentojurídico. 138
Diferentementedasimplesaceitaçãodaherança,vistanotópicoanterior,que,
ao ser emitida, apenas confirma o efeito jurídico da transmissibilidade já
conferido por força do Princípio da “Saisine” — o que facilitaria o seu
enquadramento na categoria que se quer afastar —, a renúncia da herança é
impregnada de autonomia privada, namedida em que, por ser fruto da livre
manifestaçãodevontade,afastadoseutitularumdireitopatrimonialquetem,
comojávimos,índoleconstitucional 139.
Por isso, preferimos reconhecer, no ato de renúncia, natureza negocial, na
medidaemque,comosabemos,osatosportadoresdetaiscaracterísticastêmpor
principalmarcaaliberdadedeescolhadosefeitosproduzidos.
E,noatoderenúncia,existe,indiscutivelmente,essetraço,exatamentepornão
poder ser imposta ao titular do direito que, como vimos, tem magnitude
constitucional.
Conformejáditoemoutraoportunidade,arenúncia“secaracterizaporserum
negócio jurídicounilateral, que somente terá eficácia, em se tratando de bens
imóveis,seobservadaaformaouasolenidadeestabelecidaporlei” 140.
Nestesentido,aeruditaliçãodeORLANDOGOMES:
“Renúnciaéonegóciojurídicounilateralpeloqualoherdeirodeclaranãoaceitaraherança.
Arenúncianãodependedoassentimentodequemquerqueseja.
Não se presume. Há de resultar de expressa declaração. Tal como a aceitação, é negócio puro, não
prevalecendosefeitasobcondiçãoouatermo.Inadmissível,também,arenúnciaparcial.
A renúncia é negócio formal. Deve constar, necessariamente, de escritura pública ou termo judicial. A
forma, sendo da substância do ato, sua inobservância importa nulidade. O termo lavra-se nos próprios
autosdoinventário.
Nãopodeserfeitaantesdaaberturadasucessão,poisimplicariapactosucessório,legalmenteproibido.
Devemanifestar-seantesdaaceitação,istoé,dapráticadequalqueratoqueainduza” 141.
Superado tal aspecto, é importante pontuarmos ainda que a renúncia é ato
solene,umavezque,ateordoart.1.806doCódigoCivilde2002 142,deveráser
sempre expressa, lavrada em instrumentopúblico (noTabelionatodeNotas)ou
portermonosprópriosautosdoprocesso,nãotendo,portanto,validadejurídicaa
renúnciafeitaemmeroinstrumentoparticular 143.
Claro que tal providência é salutar, decorrendo do próprio princípio da
segurança jurídica, porquanto, como dito, ao renunciar à herança, o sujeito é
tratadocomoseherdeironuncahouvessesido 144.
Aliás, reafirmandoa seriedadedoato,vale lembrarque, à luzdoart.1.811,
CC/2002, “ninguém poderá suceder, representando herdeiro renunciante. Se,
porém, ele for oúnico legítimoda sua classe, ou se todososoutrosdamesma
classe renunciarem à herança, poderão os filhos vir à sucessão, por direito
próprio,eporcabeça”.
Valedizer,se,porexemplo,eurenuncioàherançadomeupai,osmeusfilhos
não poderão pretender habilitar-se no inventário do avô por direito de
representação.
Todavia, se todososherdeirosdaminhaclasse renunciarem, logicamente,os
netospoderãoherdarpordireitopróprioeporcabeça(emigualdadededireitos),
comoinclusivejádecidiuoSTJ:
“RENÚNCIAÀHERANÇA—INEXISTÊNCIADEDOAÇÃOOUALIENAÇÃO—ITBI—FATO
GERADOR—AUSÊNCIADEIMPLEMENTO.
A renúncia de todos os herdeiros da mesma classe, em favor do monte, não impede seus filhos de
sucederempordireitopróprioouporcabeça.Homologadaarenúncia,aherançanãopassaàviúva,esim
aos herdeiros remanescentes. Esta renúncia não configura doação ou alienação à viúva, não
caracterizando o fato gerador do ITBI, que é a transmissão da propriedade ou do domínio útil de bens
imóveis.
Recursoprovido”(STJ,REsp36.076/MG,Rel.Min.GarciaVieira,1.ªTurma,j.3-12-1998,DJ,29-3-1999,
p.76).
Sobreotema,interessanteobservaçãoéfeitaporVANESSASCURO:
“Nesseparticular,cabedestacarumequívocoquemuitasvezesseverificaemcasosondeocorrerenúncia
àherança.Nãoéraroque,comofalecimentodopai,osfilhosresolvamrenunciaremfavordamãe,que
eracasadacomofalecidopeloregimedacomunhãouniversaldebens.Assim,osfilhosrenunciam,purae
simplesmente,ouseja,emfavordomonte-mor,pensandobeneficiaramãe.Porém,como,nestecaso,ela
nãoéherdeira(somentemeeiradosbensdofalecido,emvirtudedoregimedebens)oato,emverdade,
beneficiaosfilhosdosrenunciantes,netosdofalecidoeseusdescendentesemsegundograu,e,sónafalta
deles,acônjugesobrevivente,emconcorrênciacomosascendentes,seexistirem” 145.
Pode-seafigurar injustaesta regraque impedeaos sucessoresdo renunciante
exercer o direito de representação, mas, se analisada detidamente, ela guarda
coerênciacomaeficáciaretroativadarenúncia,aqual,comodissemos,excluio
renunciantedacadeiasucessóriaabinitio.
É bom lembrarmos ainda que a renúncia não admite condição, termo, nem
eficáciaparcial,e,bemassim,éirrevogável,nostermosdosarts.1.808e1.812
doCódigo,jácomentadoslinhasacima.
Emconclusão,importanteaspectoaserenfrentadodizrespeitoàpossibilidade
jurídicadeoscredoresdorenunciantepleitearemasuspensãojudicialdosefeitos
darenúncia,afimdequesepaguem,noslimitesdosseusrespectivoscréditos:
“Art. 1.813.Quando o herdeiro prejudicar os seus credores, renunciando à herança, poderão eles, com
autorizaçãodojuiz,aceitá-laemnomedorenunciante.
§1.ºAhabilitaçãodoscredoressefaránoprazodetrintadiasseguintesaoconhecimentodofato.
§2.ºPagasasdívidasdorenunciante,prevalecearenúnciaquantoaoremanescente,queserádevolvido
aosdemaisherdeiros”.
Arigor,emnossosentir,nãoéadequado,adespeitodadicçãonormativa,eda
aceitação jurisprudencial, falar-se em “aceitação” da herança pelos eventuais
credoresdorenunciante,umavezqueelesnãosãoherdeiros.
Não se pode conferir legitimidade sucessória para quem efetivamente não a
tem.
O que sucede, no caso, é a suspensão dos efeitos da renúncia, para evitar
prejuízoacréditolegitimamenteconstituído 146,emfrancodesrespeitoàprópria
lealdade negocial: Cassio deve 10.000 a Pedro, e, sem dinheiro para pagar,
resolve, por birra ou qualquer outra razão, renunciar a uma herança de 20.000
havida do seu tio Francisco. Em tal caso, o credor (Pedro) intentará medida
judicial para obter a suspensão dos efeitos da renúncia, no limite do crédito
constituído, para se pagar, prevalecendo o ato de renúncia quanto ao
remanescente.
Feitas tais considerações, colacionamos interessante julgado do Superior
Tribunal de Justiça, quanto ao momento de exercício do direito por parte dos
credores:
“CIVILEPROCESSUALCIVIL.RENÚNCIADEHERANÇA.HOMOLOGAÇÃODAPARTILHA.
TRÂNSITOEMJULGADO.REQUERIMENTODEACEITAÇÃODAHERANÇAPORCREDOR
PREJUDICADO E PEDIDO DE PENHORA NO ROSTO DOS AUTOS DO ARROLAMENTO.
IMPOSSIBILIDADE.
1. A falta de prequestionamento em relação a diversos dispositivos impede o conhecimento do recurso
especial.Incidênciadasúmula211/STJ.
2.Orecorrentenãoindicadequeformaosarts.655,X,e659doCPCforammalferidos,motivopeloqual
deficienteafundamentação.
Incidênciadasúmula284/STF.
3.Opedidodeaceitaçãodaherançarealizadopelocredordoexecutado/renunciante,nosautosdo
arrolamento de bens do falecido pai deste, somente pode ser formulado até o momento
imediatamenteanterioraodasentençadehomologaçãodapartilha.Apósadivisãodopatrimônio
do ‘de cujus’, acolhida a renúncia por parte do executado, os bens passaram a integrar o
patrimôniodosdemaisherdeiros.
4.Inexistindorecursodeterceiroprejudicadoetransitadaemjulgadoasentençaquehomologouapartilha,
resta ao credor, se for o caso e se preenchidos os demais requisitos legais, arguir, em ação própria, a
anulaçãodapartilhahomologada.
5. Para a configuração do dissídio jurisprudencial, faz-se necessária a indicação das circunstâncias que
identifiquemassemelhançasentreoarestorecorridoeoparadigma,nostermosdoparágrafoúnico,doart.
541,doCódigodeProcessoCiviledosparágrafosdoart.255doRegimentoInternodoSTJ.
6.Recursoespecialnãoconhecido”(REsp754.468/PR,Rel.Min.LuisFelipeSalomão,4.ªTurma, j.27-
10-2009,DJe,16-11-2009)(grifamos).
Finalmente,umaadvertênciasalutardeveserfeita.
Não é incomum encontrarmos, na prática judiciária, a inusitada figura da
“renúncia translativa”,casoemqueo renunciantedirecionaaquota renunciada,
nãoparaomonte,mas,sim,paradeterminadoherdeiro.
Umexemplotornaráclaraaideia.
JoãomorreedeixaaviúvaLeilaetrêsfilhos:Huguinho,PedrinhoeLuisinho.
OherdeiroLuisinho,então,resolve“renunciar”àsuaquotahereditáriaemfavor
desuamãeLeila.Ora,nocaso,tecnicamente,renúncianãohouve,namedidaem
queeledirecionouobenefício,ouseja,eleaceitouodireitoeocedeuparaa
suamãe.
Renúncia, de fato, não ocorreu, namedida em que, se tivesse havido, a sua
quotabeneficiariaatodososoutrosherdeiros,enãoaumemespecial,pois,ao
abdicar do seu direito, como vimos, a exclusão é total e retroativa, como se
sucessornuncahouvessesido.
Aoaceitaredirecionarasuaquota,oquehouve,emverdade,foiumacessão
dedireitoshereditários,temaque,pelasuaimportânciaeprofundidade,mereceu
tratamentonopróximocapítulo.
CapítuloVI
CessãodeDireitosHereditários
Sumário:1.Introdução.2.Compreendendoanaturezadachamada“renúnciatranslativa”.3.Delimitação
conceitualdacessãodedireitoshereditários.4.Disciplinajurídica.5.Necessidadedaautorizaçãoconjugal.
6.Aspectostributários.
1.INTRODUÇÃO
Conforme vimos no capítulo anterior, a renúncia da herança, tecnicamente,
opera a abdicação plena do direito hereditário, excluindo o sujeito da relação
sucessória,comoseherdeironuncahouvessesido.
Por isso, também ressaltamos que o exercício desse direito tem eficácia
retroativa.
Sucede que, por vezes, a prática forense nos indica existir ainda figura
aparentementeanáloga,costumeiramentedenominada“renúnciatranslativa”.
Umexemplocertamentetornaráclaraahipótese.
ImaginequetratamosdoinventáriodeJosé.
José, o autor da herança, deixou, além da esposa Joana (viúva), três filhos,
Jorge, Jonatas e Jomilio. Se, por ventura, este último exercer o seu direito de
renúncia, a quota hereditária a que faria jus retornará ao monte partível,
beneficiandoatodososdemaisherdeiros,naformadoart.1.810doCC/2002.A
rigor,então,teríamos,aqui,a“renúnciadaherança”tratadanocapítuloanterior.
Poroutrolado,suponhaqueJomilio,nocursodoinventáriooudoarrolamento,
resolvarenunciaràsuaquotahereditária“emfavordasuamãeJoana”.Teríamos,
aqui,então,umdirecionamentodaquotaabdicada,que,nocaso,favoreceria,não
todos,masapenasumdosherdeiros.
Muitobem.
No segundo caso, surgiria, então, a figura da “renúncia translativa” ou “in
favorem”, frequente na prática forense, e costumeiramente enfrentada pelos
Tribunais,conformesepodeverificardosseguintesacórdãos:
“DIREITOS CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ARROLAMENTO. COMPOSIÇÃO DA VIÚVA-
MEEIRA E DOS HERDEIROS. RENÚNCIA ‘TRANSLATIVA’. INSTITUIÇÃO DE USUFRUTO.
POSSIBILIDADE. TERMO NOS AUTOS. CC, ART. 1.581. PARTILHA HOMOLOGADA.
PRECEDENTES.DOUTRINA.RECURSOPROVIDO.
—Nãohávedação jurídicaemseefetivar renúncia ‘in favorem’eemse instituirusufrutonosautosde
arrolamento, o que se justifica até mesmo para evitar as quase infindáveis discussões que surgem na
partilhadebens”(STJ,REsp88.681/SP,Rel.Min.SálviodeFigueiredoTeixeira,4.ªTurma,j.30-4-1998,
DJ,22-6-1998,p.81).
“AGRAVODE INSTRUMENTO. INVENTÁRIO.CESSÃODEDIREITOSHEREDITÁRIOSNOS
AUTOS.POSSIBILIDADE.Écabível, segundodoutrinae jurisprudênciamoderna,acessãodedireitos
hereditários ou a renúncia translativa por termo nos autos. Precedentes doutrinário e jurisprudencial.
Agravo de Instrumento provido” (TJRS,AI 70014017958, 8.ªCâmaraCível,Rel. JoséAtaídes Siqueira
Trindade,j.9-3-2006).
Nãonosagrada,todavia,adenominação“renúnciatranslativa”.
Éoqueveremosemseguida.
2.COMPREENDENDOANATUREZADACHAMADA“RENÚNCIATRANSLATIVA”
Comodissemosnotópicoanterior,nãonospareceidealaexpressão“renúncia
translativa”.
Comisso,nãoestamosadizerseafigurarerrooseuuso,namedidaemquea
própria jurisprudênciadosTribunaisEstaduais, edopróprioSTJ, acolheo seu
emprego.
Pensamos, por outro lado, sermais seguro e preciso utilizar-se a expressão
“cessão de direito(s) hereditário(s)”, quando exista o direcionamento da quota
abdicada,namedidaemque,comisso,nãoseafrontaaideiafundamentaldoato
derenúnciaque,comovimos,fazretornarodireitoatodoomontepartível,enão
aumherdeiroemespecial.
Assim, se um dos herdeiros pretende abdicar do direito hereditário a si
conferido em favor de determinada(s) pessoa(s), e não de todos os demais
herdeiros,estará,emverdade,operandoumacessãodedireitohereditário.
Evite-se,também,afirmarquesetratadeuma“doação”.
A doação tem, por objeto, coisas, ou seja, bens materializados, corpóreos,
passíveisdealienação,aopassoqueacessãoversasobredireitos 147.
Nãosedeve,pois,utilizaroverboalienarparacaracterizaracessãogratuita
ou onerosa de direitos, uma vez que, para a boa técnica, direitos não são
vendidos nem doados,mas sim cedidos. Em outras palavras, “reputamosmais
apropriadaautilizaçãodapalavraalienaçãoparacaracterizaratransferênciade
coisasdeum titularparaoutro, reservandoaexpressãocessãoparaosdireitos
emgeral” 148.
Feitas tais considerações, que revelam a verdadeira natureza do instituto,
passemosacompreenderasuadelimitaçãoconceitual.
3.DELIMITAÇÃOCONCEITUALDACESSÃODEDIREITOSHEREDITÁRIOS
Explicitadaanaturezadoinstitutoaquitrabalhado,definidacomoa“cessãode
direitoshereditários”,épossívelenfrentaroseuconceito.
A cessão de direitos hereditários consiste emum ato jurídico negocial, pelo
qual o herdeiro (cedente), por escritura pública ou termo nos autos, transfere,
gratuitaouonerosamente,asuaquotahereditáriaaumterceiro(cessionário).
Trata-se,inequivocamente,deumatonegocialdenaturezaaleatória,namedida
em que o cessionário assume o risco de nada vir a receber, caso se apure a
existênciadedívidasdeixadaspelofalecido,quepossamviraesgotarasforças
daherança.
Por isso, em geral, quando onerosa a cessão, o preço recebido pela quota
transferida costuma ser mais baixo, exatamente para cobrir o risco de o
cessionárionãoreceber,aocabodoinventáriooudoarrolamento,ojustovalor
pelaquotaporquepagou.
O tema tem sido objeto de reflexão da doutrina e jurisprudência há bastante
tempo, embora, no texto positivado, a suamenção, sem explicitar a expressão
aquiutilizada,sejafeitanocapítuloreferenteàadministraçãodaherança.
Conheçamos,portanto,asuadisciplinajurídicacodificada.
4.DISCIPLINAJURÍDICA
Nãohaviaprevisãoespecíficadotemanacodificaçãocivilde1916.
Já no Código Civil de 2002, amatéria é tratada a partir do art. 1.793, que
preceitua,emseucaput,queo“direitoàsucessãoaberta,bemcomooquinhãode
quedisponhaocoerdeiro,podeserobjetodecessãoporescriturapública”.
A primeira parte da norma deixa claro que tanto poderá ser cedida toda a
herança (representada aqui pela expressão “odireito à sucessão aberta”) como
tambémoquinhãodequedisponhaoherdeiro(ouseja,aquotaquelhecaibapor
contadamortedosucedido).
Note-se, igualmente, que o ato de cessão é formal: deverá ser lavrado por
escritura pública, não se admitindo seja documentado em mero instrumento
particular.
Por outro lado, a despeito da literalidade do dispositivo comentado, a
jurisprudênciatemadmitidoquesepossacederodireitohereditáriotambémpor
termonosautos:
“AGRAVODE INSTRUMENTO. INVENTÁRIO.CESSÃODEDIREITOSHEREDITÁRIOSNOS
AUTOS.POSSIBILIDADE.Écabível, segundodoutrinae jurisprudênciamoderna,acessãodedireitos
hereditários ou a renúncia translativa por termo nos autos. Precedentes doutrinário e jurisprudencial.
Agravo de Instrumento provido” (TJRS,AI 70014017958, 8.ªCâmaraCível,Rel. JoséAtaídes Siqueira
Trindade,j.9-3-2006).
“INVENTÁRIO. RENÚNCIA TRANSLATIVA E ABDICATIVA. CESSÃO DE DIREITOS
HEREDITÁRIOS. TERMO NOS AUTOS. VIÚVA QUE CEDE DIREITO DE MEAÇÃO.
IMPRESCINDIBILIDADEDEESCRITURAPÚBLICA.1.Oart.1.806doCódigoCivil,aexemplodo
art.1.581doCódigoCivilde1916,contemplaapossibilidadedarenúnciadaherançaserfeitatantoatravés
de termo nos autos como pela via do instrumento público. 2. Essa disposição legal contempla tanto a
renúnciaabdicativaquantoarenúnciatranslativa,denominaçãodoutrináriaestaqueserefere,emverdade,
àcessãodedireitoshereditários.3.Seaviúvapretendedoarasuameação,éimprescindívelqueofaça
atravésdeescriturapública.Recursodesprovido”(TJRS,AI70012673190,7.ªCâmaraCível,Rel.Sérgio
FernandodeVasconcellosChaves,j.19-10-2005).
Vale dizer, a cessão de direitos hereditários, para ter validade e eficácia
jurídicas,exigeserlavradaporescriturapública—noTabelionatodeNotas—
ouportermonosprópriosautosdoinventárioouarrolamento.
Claroestá,todavia,que,seoinventário(ouarrolamento)foradministrativo 149,
a cessão poderá ser lavrada na mesma oportunidade em que se formaliza a
própria escritura pública de partilha (ou de adjudicação), não havendo que se
falarem“termonosautos”,porquanto,nessecaso,processojudicialnãoexiste.
Nessesentido,inclusive,valetranscreveroart.16daResoluçãon.35,de24
deabrilde2007,doConselhoNacionaldeJustiça:
“Art.16.Épossívelapromoçãodeinventárioextrajudicialporcessionáriodedireitoshereditários,mesmo
nahipótesedecessãodepartedoacervo,desdequetodososherdeirosestejampresenteseconcordes”.
Aspectoimportanteaserrealçadoéoconstanteno§1.ºdoreferidoart.1.793:
“§ 1.º Os direitos, conferidos ao herdeiro em consequência de substituição ou de direito de acrescer,
presumem-senãoabrangidospelacessãofeitaanteriormente”.
Oportunamente, enfrentaremos a temática referente à “substituição
testamentária” 150eao“direitodeacrescer” 151,mas,delogo,anunciamosaideia
constante neste dispositivo: caso um herdeiro haja cedido a terceiro direito
hereditário que a si competia, em tendo sido posteriormente beneficiado em
virtudedesubstituição(chamadoasubstituiroutrosucessor)ouemdecorrência
de acréscimo de quinhão, este novo direito ou valor agregado não estará
compreendidonacessãoanterior.
Em outras palavras, a cessão de direito hereditário não abrange direito
posteriormenteincorporado,atítulodiverso(substituiçãotestamentáriaoudireito
deacrescer).
Em nosso sentir, trata-se de regra de intelecção clara, na medida em que a
cessãodeumdireitonãodevecomportarinterpretaçãoextensiva,sobpenadese
cunharumbenefícionãoprevistopelocedente.
Outropontodeveaindaserconsiderado.
Mormente nos inventários e arrolamentos judiciais, os quais, por diversas
razões—especialmenteaausênciadodevidoregistroimobiliáriodecertosbens
componentesdoacervo—, frequentemente tramitampor longo tempo,écomum
determinado herdeiro pretender ceder — em geral onerosamente — bem
individualizadointegrantedaherançaaindanãopartilhada.
Éocasodoherdeiroquepretendeceder,mediante recebimentodepreço,“o
direitosobreocarro”ou“acasa”integrantedomontepartível,porentenderque
farájusaoreferidobem,aocabodoprocedimento.
Ora,aindaqueestebemtoqueaestesucessor,o§2.ºdomesmodispositivoé
claroaodispor:
“§ 2.º É ineficaz a cessão, pelo coerdeiro, de seu direito hereditário sobre qualquer bem da herança
consideradosingularmente”.
Earazãoémuitosimples.
Atéqueseultimeoprocedimentodeinventárioouarrolamento—omesmose
diga para o ato lavrado administrativamente — não poderá, nenhum dos
herdeiros, considerar-se “dono” de bemdeterminado do acervo, namedida em
que,somenteapósseremapuradasesaldadasasrespectivasdívidasdofalecido,
poder-se-á, efetiva e legitimamente, conferir a cada um o que por direito lhe
pertença.
Claro está, todavia, que, se houver a justa necessidade da cessão de certo
direito ou da alienação de bem determinado, em benefício de todo o espólio,
comonahipótesedeseterdepagarumtributoouparaevitaradeterioraçãodo
própriobem(casoemqueovalorcorrespondentedeverápermanecerdepositado
em conta judicial), poderá o juiz, incidentalmente, autorizar o ato, em caráter
excepcional.
Estaúltimaideia, inclusive,defluidaleituradoparágrafoseguintedomesmo
dispositivo:
“§3.ºIneficazéadisposição,sempréviaautorizaçãodojuizdasucessão,porqualquerherdeiro,debem
componentedoacervohereditário,pendenteaindivisibilidade”.
Opedidopoderáserfeitonosprópriosautosdoinventárioouarrolamentoe,
caso o ato esteja sendo lavrado administrativamente 152 — hipótese em que
processo judicial não há—, deverá ser formulado perante o Juízo competente,
instaurando-se, com isso, um procedimento de jurisdição voluntária para a
obtençãodonecessárioalvarájudicial.
Umaoutraprevisãolegalemespecialtambémnãopodeseresquecida.
O art. 1.794 do Código Civil de 2002 (sem qualquer correspondente na
codificaçãoanterior)consagraaocoerdeirodireitodepreferênciasobreaquota
hereditária.
Vale dizer, antes de oferecê-la a terceiro, o outro herdeiro tem o direito de
adquiri-la,se,logicamente,atenderaostermosdapropostadocedente.
Isso porque, conforme já vimos, enquanto não ultimada a partilha, os
coerdeiros atuam como se titulares fossem de frações ideais da herança, em
situaçãoanálogaaodocondomíniodecoisaindivisível.
Se,porexemplo,Joãopretendercederasuaquotanaherançadoseupaiaum
terceiro,mediante o recebimento da quantia deR$ 10.000,00, precisará, antes,
comunicaraosseusdoisoutrosirmãos(coerdeiros),paraqueeles,noprazoque
lhesforassinado,manifesteminteresseemadquiri-la,nasmesmascondições.
O ato de comunicaçãopoderá, emnosso sentir, consistir emumanotificação
judicial ou extrajudicial, sem prejuízo de, estando já em curso o procedimento
judicial de inventário ou arrolamento, o cedente solicitar que o próprio juiz
intimeosdemaisherdeirospara,querendo,semanifestaremnoprazoassinado.
Em tal caso, deixando transcorrer o prazo in albis, o silêncio deve ser
entendidocomoatodeaquiescênciaàcessãofeitaaoterceiro.
Mas,seocoerdeiroforalijadodoseudireitodepreferência,pornãolheter
sidodadoconhecimentodacessão,poderá,ateordoart.1.795doCódigoCivil,
apósdepositaropreço,haverparasiaquotacedidaaestranho,seorequereraté
centoeoitentadiasapósatransmissão.
Éinteressanteressaltarque,mesmonacodificaçãoanterior,emquenãohavia
previsão legal específica do direito de preferência do coerdeiro na cessão de
créditos hereditários, a jurisprudência já admitia o exercício de um direito de
preferência,justamentepelaaplicaçãoanalógicadasregrasdocondomínio 153,ao
qualseequiparavaaherança(espólio).
Nãosededuza,outrossim,comisso,queodireitodepreferênciatenhanatureza
real.
Trata-se,emverdade,deumdireitopotestativo 154comprazodecadencialde
centoeoitentadiasparaserexercido,sobpenadedecadência.
E se houver mais de um sucessor interessado em exercer o direito de
preferência?
Nesse caso, atendidos os termos da proposta de cessão, entre eles será
distribuído o quinhão, na proporção das suas respectivas quotas hereditárias,
conforme estabelecido no parágrafo único do art. 1.795 do CC/2002 (“Sendo
váriososcoerdeirosaexercerapreferência,entreelessedistribuiráoquinhão
cedido,naproporçãodasrespectivasquotashereditárias”).
Trata-se de uma regra bastante razoável, que prestigia indistintamente os
herdeiros,evitando-sediscussõessobrequemexerceuprimeiramenteodireitode
preferência.
5.NECESSIDADEDAAUTORIZAÇÃOCONJUGAL
A autorização conjugal pode ser conceituada como a manifestação de
consentimentodeumdoscônjugesaooutro,paraapráticadedeterminadosatos,
sobpenadeinvalidade 155.
A matéria está atualmente disciplinada nos arts. 1.647 a 1.650 do vigente
CódigoCivilbrasileiro.
Dispõeomencionadoart.1.647doCC/2002:
“Art. 1.647.Ressalvadoo disposto no art. 1.648, nenhumdos cônjuges pode, semautorizaçãodooutro,
excetonoregimedaseparaçãoabsoluta:
I—alienarougravardeônusrealosbensimóveis;
II—pleitear,comoautorouréu,acercadessesbensoudireitos;
III—prestarfiançaouaval;
IV — fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura
meação.
Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem
economiaseparada”.
Todasashipóteseslegaissereferemasituaçõesemqueopatrimôniodocasal
épotencialmenteafetado,motivopeloqualseexigeaautorização.
Daleituradocaputdodispositivo,observamos,delogo,queanecessidadeda
autorizaçãoconjugalédispensávelparaaquelescasados“noregimedeseparação
absoluta”,que,emnossosentir,equivaleadizer“separaçãoconvencional” 156.
Ora,o inciso Idispõequeaalienaçãodebens imóveis exige, como regra, a
autorização conjugal (a outorga uxória ou a autorizaçãomarital), pelo que uma
perguntase impõe:considerando-sequeodireitoà sucessãoaberta (direitoà
herança)tem,porforçadelei(art.80,II,doCC) 157,naturezarealimobiliária,
a cessão do referido direito também exigiria, se casado fosse o cedente, a
autorizaçãodoseucônjuge?
Nocasodarenúnciapropriamentedita,abdicativa,entendemosserdispensável
talexigência,porquanto,dadooseuefeitoretroativo,orenuncianteéconsiderado
comoseherdeironuncahouvessesido.
Mas, no caso da cessão de direito — ou “renúncia translativa” como se
costuma dizer —, a questão se reveste de maior complexidade, pois, como
anotamos,ocedenteaceitaasuaquota,e,emseguida,transmite-aaterceiro.
Respeitável corrente de pensamento argumenta que, além da capacidade
jurídica,exige-se,paraavalidadedoato,aautorizaçãodocônjugedocedente,
soboargumentodequesetratadesituaçãosemelhanteàdaalienaçãodedireito
imobiliário,paraaqualaleiexigeoutorgauxóriaouautorizaçãomarital.
Nessesentido,FRANCISCOCAHALIeGISELDAHIRONAKAprelecionam
que:
“Tratando a sucessão aberta como imóvel (CC/1916, art. 44, III 158) a renúncia à herança depende do
consentimentodocônjuge,independentementedoregimedebensadotado(CC/1916,arts.235,242,IeII).
Considera-sequeaausênciadoconsentimento tornaoatoanulável,umavezpassívelderatificação(RT
675/102)” 159.
Ressaltamos que, em nosso pensar, tal formalidade só é necessária em se
tratando da chamada “renúncia translativa”, hipótese em que o herdeiro
“renuncia em favor de determinada pessoa”, praticando, com o seu
comportamento,verdadeiroatodecessãodedireitos.
Cumpre,porfim,registrarqueamatérianãoépacífica,namedidaemquehá
também entendimento no sentido de não ser exigível a referida autorização do
outrocônjugeparaarenúnciadedireitoshereditários.
Apessoacasada,entendemos,podeaceitarou renunciaràherançaou legado
independentemente de prévio consentimento do cônjuge, apesar de o direito à
sucessãoabertaserconsideradoimóvelparaefeitoslegaisporserelaaherdeira
dodecujus 160.
Não é, todavia, o nosso pensamento, que encontra guarida na jurisprudência
desdeacodificaçãoanterior 161.
Obviamente,acrescente-se,seanegativaàautorizaçãoéinjusta,poderáojuiz
supri-la, por haver lesão de direito do renunciante, à luz do princípio da
inafastabilidadedajurisdição.
6.ASPECTOSTRIBUTÁRIOS
SegundoavigenteConstituiçãoFederal,emseuart.155,competeaosEstados
eaoDistritoFederalinstituirimpostossobre:
“I—transmissãocausamortisedoação,dequaisquerbensoudireitos”(RedaçãodadapelaEmenda
Constitucionaln.3,de1993).
Assim, temos que, no âmbito doDireito Sucessório, sem prejuízo de outros
recolhimentostributáriosdevidos,avultaaimportânciadoimpostocausamortis,
decompetênciadosEstadosedoDistritoFederal.
Algumasponderações,nessaseara,merecemserfeitas.
Ora, seoherdeiro simplesmenteabdicadasuaquotahereditária,operandoa
renúncia propriamente dita, estudada no capítulo anterior, será, como vimos,
excluídodarelaçãosucessória,nãohavendoespaçoparasefalaremincidência
deimpostodetransmissãomortiscausa 162.
Éoquesedáquando“renunciaemfavordetodooespólio”,“detodoomonte”
ouemfavor“detodososoutrosherdeiros”.
Nãohá,nocaso,incidênciadomencionadoimpostoestadual.
Osdemaisherdeiros,porseuturno,queaceitaremasrespectivasquotas—o
mesmosedigaparaoherdeiroúnicoqueaceitetodaaherança—deverão,por
óbvio,fazerorecolhimentodevido.
Na hipótese da cessão de direito hereditário — denominada por alguns de
“renúnciatranslativa”—asituaçãoédiversa.
Isso porque, na hipótese, o herdeiro, ainda que diga estar “renunciando em
favordeterceiro”,emverdade,aceitaasuaquotae,emseguida,transmite-aa
outra pessoa, caso em que deverá haver uma dupla incidência tributária: pela
ocorrência do fato gerador do tributo causa mortis (pois aceita o direito
transmitido pelamorte do de cujus) e, ainda, pela ocorrência do fato gerador
consistente na transmissibilidade realizada inter vivos (pois cede o direito
adquiridoaumaoutrapessoa).
Nesteúltimocaso, tratando-sede transmissãoonerosa(ocedente recebeuum
preço pela cessão), a competência tributária é municipal (art. 156, II, CF 163),
mas, se a transmissão for gratuita, também será da alçada estadual, à luz do
referidoart.155,I,daConstituiçãobrasileira.
CapítuloVII
VocaçãoHereditária
Sumário: 1. Introdução. 2. Relembrando as diferenças conceituais de legitimidade e capacidade. 3.
Legitimadosparaasucessãohereditáriaemgeral.4.Legitimidadeespecialnasucessãotestamentária.4.1.
Filhos aindanão concebidos depessoa indicadapelo testador (prole eventual). 4.1.1.Discussão sobre o
enquadramentodoembriãocomoproleeventual.4.1.2.Discussãosobreapossibilidadedereconhecimento
devocaçãohereditáriaautônomaaoembrião.4.2.Pessoasjurídicas.4.3.Fundações.4.3.1.Relembrando
as etapas para criação de uma fundação. 4.3.1.1.Afetação de bens livres pormeio do ato de dotação
patrimonial. 4.3.1.2. Instituição por escritura pública ou testamento. 4.3.1.3. Elaboração dos estatutos.
4.3.1.4.Aprovaçãodosestatutos ..4.3.1.5.RealizaçãodoRegistroCivil.4.3.2.Notasconclusivassobrea
vocação hereditária de fundações. 5. Impedimentos legais sucessórios. 6. Da “vocação hereditária” de
animaisecoisas.
1.INTRODUÇÃO
Nopresentecapítulo,abordaremosavocaçãohereditária, tratadanoCapítulo
III do Título I (“Da Sucessão em Geral”) do Livro V (“Do Direito das
Sucessões”)doCódigoCivil.
Seécertoquetrataremosdetodososdispositivoslegaisdoreferidocapítulo
codificado, o fato é que não nos limitaremos a eles, permitindo-nos tecer
considerações sobre o tema em geral, de forma a possibilitar ao nosso amigo
leitoramaisamplaeabrangentevisãosobreamatéria.
2.RELEMBRANDOASDIFERENÇASCONCEITUAISDELEGITIMIDADEECAPACIDADE
O conceito de “legitimidade”, no Direito Civil, sempre causou certa
perplexidade.
Isso porque se costuma erroneamente confundir esse conceito com o de
capacidade 164.
Como se sabe, adquirida a personalidade jurídica, toda pessoa passa a ser
capazdedireitoseobrigações.
Possui,portanto,capacidadededireitooudegozo.
Todo ser humano tem, assim, capacidade de direito, pelo fato de que a
personalidadejurídicaéumatributoinerenteàsuacondição.
MARCOSBERNARDESDEMELLOprefereutilizaraexpressãocapacidade
jurídica para caracterizar a “aptidão que o ordenamento jurídico atribui às
pessoas,emgeral,eacertosentes,emparticular,estesformadosporgruposde
pessoas ou universalidades patrimoniais, para serem titulares de uma situação
jurídica” 165.
Nem toda pessoa, porém, possui aptidão para exercer pessoalmente os seus
direitos, praticando atos jurídicos, em razão de limitações orgânicas ou
psicológicas.
Sepuderematuarpessoalmente,possuem, também,capacidadede fatooude
exercício.
Reunidososdoisatributos,fala-seemcapacidadecivilplena.
Nessesentido,cumpreinvocaroprecisopensamentodeORLANDOGOMES:
“Acapacidadededireitoconfunde-se,hoje,comapersonalidade,porquetodapessoaécapazdedireitos.
Ninguémpodesertotalmenteprivadodessaespéciedecapacidade”.
Emaisadiante:
“A capacidade de fato condiciona-se à capacidade de direito.Não se pode exercer um direito sem ser
capazdeadquiri-lo.Umanãoseconcebe,portanto,semaoutra.Masarecíprocanãoéverdadeira.Pode-
se ter capacidadede direito, semcapacidadede fato; adquirir o direito e nãopoder exercê-lo por si.A
impossibilidadedoexercícioé,tecnicamente,incapacidade” 166.
Nãoháqueseconfundir,poroutrolado,conformejáditoacima,capacidadee
legitimidade.
Nem toda pessoa capaz pode estar legitimada para a prática de um
determinadoatojurídico.
Alegitimaçãotraduzumacapacidadeespecífica.
Em virtude de um interesse que se quer preservar, ou em consideração à
especial situação de determinada pessoa que se quer proteger, criaram-se
impedimentos circunstanciais, que não se confundem com as hipóteses legais
genéricasdeincapacidade.
Otutor,porexemplo,emboramaiorecapaz,nãopoderáadquirirbensmóveis
ouimóveisdotutelado(art.1.749,I,doCC/2002).Doisirmãos,damesmaforma,
maioresecapazes,nãopoderãosecasarentresi(art.1.521,IV,doCC/2002).Em
taishipóteses,otutoreosirmãosencontram-seimpedidosdepraticaroatopor
faltadelegitimidadeoudecapacidadeespecíficaparaoato.
Sobre o assunto, manifesta-se, com propriedade, SÍLVIO VENOSA, nos
seguintestermos:
“Nãoseconfundeoconceitodecapacidadecomodelegitimação.Alegitimaçãoconsisteemseaveriguar
se uma pessoa, perante determinada situação jurídica, tem ou não capacidade para estabelecê-la. A
legitimação é uma forma específica de capacidade para determinados atos da vida civil. O conceito é
emprestadodaciênciaprocessual.Está legitimadoparaagiremdeterminadasituação jurídicaquema lei
determinar.Porexemplo, todapessoa temcapacidadeparacomprarouvender.Contudo,oart.1.132do
Código Civil estatui: ‘os ascendentes não podem vender aos descendentes, sem que os outros
descendentesexpressamenteconsintam’.Dessemodo,opai,quetemacapacidadegenéricaparapraticar,
em geral, todos os atos da vida civil, se pretender vender um bem a um filho, tendo outros filhos, não
poderá fazê-lo se não conseguir a anuência dos demais filhos. Não estará ele, sem tal anuência,
‘legitimado’ para tal alienação. Num conceito bem aproximado da ciência do processo, legitimação é a
pertinênciasubjetivadeumtitulardeumdireitocomrelaçãoadeterminadarelaçãojurídica.Alegitimação
éumplusqueseagregaàcapacidadeemdeterminadassituações” 167.
Poisbem.
AplicandoessalinhaderaciocínioparaocampodoDireitoSucessório,temos
que, para se inserir na relação jurídica hereditária, o sujeito deve ter uma
pertinência subjetiva juridicamente autorizada, ou, em outras palavras,
legitimidadesucessóriapassivaparareceberaherança.
Nãoétodapessoa,pois,quepodeserchamadaasuceder.
Deveráhaverlegitimidadeparareceberaherança,oqueseestudanoâmbito
da“vocaçãohereditária”,temadesenvolvidonopresentecapítulo.
Surgem, aqui, as noções de testamenti factio passiva (legitimidade ou
capacidade específica para ser herdeiro), estudada no presente capítulo, a teor
dosarts.1.798a1.803doCódigoCivil,e,bemassim,comooutrafacedamoeda,
detestamentifactioativa(legitimidadeoucapacidadeespecíficaparaelaboraro
testamento), esta última tratada no capítulo dedicado ao estudo da Sucessão
Testamentária 168.
3.LEGITIMADOSPARAASUCESSÃOHEREDITÁRIAEMGERAL
O art. 1.798 do Código Civil brasileiro de 2002 consagra a regra geral
sucessória,aplicáveltantoàSucessãoLegítimacomoàTestamentária,segundoa
qual têm legitimidade para suceder “as pessoas nascidas ou já concebidas no
momentodaaberturadasucessão”.
Assim,seosucessor,beneficiáriodaherança,jáéfalecidoaotempodamorte
do autor da herança, por óbvio, nada herdará, bem como, nesta mesma linha,
pessoasaindanãoconcebidas,emregra,tambémnãoherdarão.
Esta norma, em verdade, tem um sentido histórico, encontrando assento em
outrossistemasnomundo.
LembramRIPERTeBOULANGER:
“Unaantigua regla,quese remontaalderecho romano,exigeque las sucesionesseabransolamenteen
favordelaspersonasqueyatienenexistencia,porlomenosenestadodehijosconcebidosenelmomento
delfallecimientodel‘decujus’.Estareglanoesmasquelaexpresióndeunhechohistórico:losbienesde
unmuertosonrecogidosporaquellosquevivenenelmomentodesufallecimiento” 169.
E,poróbvio,temaplicaçãotantonaSucessãoLegítimacomonaTestamentária.
Perceba-sequeessaéumalegitimidadeassentadanodireitomaterialparaque
osucessorpossareceberaherança.
Não se confunde, pois, com a legitimidade processual, de que é titular o
espólio, para atuar na persecução ou na defesa dos interesses atinentes ao
patrimôniodeixadopelofalecido,comosevênashipótesesabaixoreferidas:
“CIVIL.INDENIZAÇÃO.PLANODESAÚDE.CIRURGIA.AUTORIZAÇÃO.AUSÊNCIA.
LEGITIMIDADE.ESPÓLIO.DANOSMORAIS.CONFIGURAÇÃO.QUANTUM.
DISSÍDIO.AUSÊNCIADEDEMONSTRAÇÃOECOMPROVAÇÃO.
1. ‘Oespóliodetémlegitimidadeparasucederoautoremaçãode indenizaçãopordanosmorais’ (REsp
648.191/RS,Rel.Min.JorgeScartezzini,DJ06.12.2004).
2. É possível a reparação moral quando, como no caso presente, os danos não decorrem de simples
inadimplementocontratual,masdaprópriasituaçãodeabalopsicológicoemqueseencontraodoenteao
ternegadainjustamenteacoberturadoplanodesaúdequecontratou.
3.Aanálisedosmotivosensejadoresdaaplicaçãodamultaporlitigânciademá-fépassa,necessariamente,
nocasodosautos,pelainterpretaçãodecláusulascontratuaiserevolvimentodefatoseprovasconstantes
dosautos,incidindo,pois,osvetosconstantesdassúmulas05e07destaCorte.Precedentes.
4. Malgrado a tese de dissídio jurisprudencial, há necessidade, diante das normas legais regentes da
matéria (art.541,parágrafoúnico,doCódigodeProcessoCivil c/coart.255,doRISTJ),deconfronto,
quenãosesatisfazcomasimplestranscriçãodeementas,entreexcertosdoacórdãorecorridoetrechos
das decisões apontadas como dissidentes, mencionando-se as circunstâncias que identifiquem ou
assemelhemoscasosconfrontados.Ausenteademonstraçãoanalíticadodissenso,háflagrantedeficiência
nasrazõesrecursais,comincidênciadoverbetesumularn.284/STF.
5.Agravoregimentaldesprovido”(STJ,AgRgnoAg797.325/SC,Rel.MinistroFernandoGonçalves,4.ª
Turma,j.4-9-2008,DJe,15-9-2008).
“PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MORAIS.
LEGITIMIDADE ATIVA DO ESPÓLIO. REVISÃO PROBATÓRIA. INADMISSIBILIDADE.
SÚMULA7/STJ.
Na linhada jurisprudênciadesteTribunal, o espóliodetém legitimidadepara sucedero autorna açãode
indenização por danos morais. No entanto, levando em consideração as singularidades dos fatos e as
partes envolvidas, nãohá como anular o acórdão semo reexamedoquadro fático noqual se baseouo
Tribunallocal(Súmula7/STJ).
Recursoespecialnãoconhecido”(REsp602.016/SP,Rel.Min.CastroFilho,3.ªTurma, j.29-6-2004,DJ,
30-8-2004,p.284).
Em síntese, o art. 1.798 do Código Civil contém uma regramaterial para a
sucessãohereditáriaemgeral,quelegitimaaspessoasnascidasouosnascituros
(aqueles seres humanos já concebidos, embora não nascidos) 170, ao tempo da
mortedoautordaherança,parareceberparteoutodoopatrimôniodeixadopelo
falecido.
Todavia,situaçõespeculiarestambémforamprevistas.
NoâmbitodaSucessãoTestamentária,podemaindaserchamadosasuceder,a
teordoart.1.799:
a)osfilhos,aindanãoconcebidos,depessoasindicadaspelotestador,desdequevivasestasaoabrir-sea
sucessão;
b)aspessoasjurídicas;
c)aspessoasjurídicas,cujaorganizaçãofordeterminadapelotestadorsobaformadefundação.
Cadaumadessashipótesesmerecerádetidaconsideração, conformeveremos
abaixo.
4.LEGITIMIDADEESPECIALNASUCESSÃOTESTAMENTÁRIA
No presente tópico, analisaremos cada uma das hipóteses de legitimidade
especial previstas no mencionado art. 1.799 do Código Civil, aplicáveis à
SucessãoTestamentária.
4.1.Filhosaindanãoconcebidosdepessoaindicadapelotestador(proleeventual)
OCódigoCivilautoriza,emseuart.1.799,I,queoautordaherança,mediante
testamento,beneficiefilhoaindanãoconcebidodepessoaindicadapelotestador.
A conhecida categoria da “prole eventual” caracteriza tais filhos ainda não
concebidos,valendofrisarque,poróbvio,o(a)genitor(a)indicado(a)deveráser
pessoa existente ao tempo da abertura da sucessão, quando se verificarão as
circunstânciasdadeclaraçãodevontade 171.
Vale dizer, Joaquim poderá indicar, em seu testamento, como beneficiário, o
filhoqueasuasobrinhaLéliaaindanãoconcebeu(ofuturofilhodela),mas,ao
tempodasuamorte,Léliadeveráestarviva,sobpenadeacláusulatestamentária
caducar.
Noteadiferençamanifesta,caroleitor,entre“nascituro”e“proleeventual”.
O nascituro, que, como visto, também pode ser beneficiário da herança (art.
1.798), consiste naquele ente já concebido, posto não nascido, e com vida
intrauterina; diferentemente, a prole eventual caracteriza aqueles que nem
concebidosaindaforam.
Neste último caso, como dito acima, poderão ter especial legitimidade
sucessória, se, por meio de testamento, o autor da herança indicá-los como
beneficiáriosedesdequeoseugenitorestejavivoaotempodamorte(doautor
daherança).
Osbensdaherança,emtalhipótese,nostermosdoart.1.800,serãoconfiados,
apósa liquidaçãooupartilha,aumcuradornomeadopelo juiz,queserá, salvo
disposiçãotestamentáriaemcontrário,naformado§1.ºdoreferidodispositivo,
a própria pessoa cujo filho o testador esperava ter por herdeiro, e,
sucessivamente,aspessoasindicadasnoart.1.775doCódigoCivil 172.
Os poderes, deveres e responsabilidades do curador reger-se-ão, no que
couber,pelasdisposiçõesconcernentesàcuratelados incapazes,na formado§
2.ºdoreferidoart.1.800doCódigoCivil 173.
Finalmente, nascendo com vida o herdeiro esperado, ser-lhe-á deferida a
herança, com os frutos e rendimentos relativos à deixa, a partir da morte do
testador 174.
Emoutraspalavras,comoseunascimento,odireitosucessórioseconsolida,
cabendo,logicamente,apartirdaí,aoseurepresentantelegal,oencargodegerir
o interessedoincapazatéqueatinjaacapacidadecivilplena,momentoemque
poderápessoalmenteassumiraadministraçãodoseuprópriopatrimônio.
Note-se, portanto, que a sucessão da prole eventual é, como a própria
expressãoinfere,“condicionada”àsuaconcepção.
Ecomoficaaquestãodasegurançajurídica,diantedessapossibilidadesema
certezadaconcreção?
Emoutraspalavras,umaperguntaseimpõe:eseaproleeventual(beneficiária
dotestamento)nãoforconcebida?
Nesseaspecto,oprópriotextolegalestabeleceuumtermofinalparaoperíodo
deincertezadodestinatáriodosbensdaherança.
Trata-sedo§4.ºdoreferidoart.1.800,quepreceitua,inverbis:
“§4.ºSe, decorridosdois anos após a aberturada sucessão, não for concebidooherdeiro esperado, os
bensreservados,salvodisposiçãoemcontráriodotestador,caberãoaosherdeiroslegítimos”.
Trata-se de um prazo, à primeira vista, bastante razoável, considerando o
período de umagestação, para a consolidação de umpatrimônio cuja sucessão
ficoupendentedecondição(aconcepçãoeoposteriornascimentocomvidado
beneficiário).
Todavia,ampliandooshorizontes,talveztalprazonãosejatãoelásticoassim,
uma vez que não contemplaria, por exemplo, situações de destinação
testamentária de bens para filhos de pessoas ainda longe da idade de ter
condiçõesparaprocriar.
Também refletindo sobre o prazo, observa o amigo CARLOS ROBERTO
GONÇALVES:
“A estipulação do chamado ‘prazo de espera’ supre omissão do Código de 1916, que possibilitava a
perpetuaçãodasituaçãodeesperadoherdeiroaguardado.Operíodofixadolimita,porém,ainstituição,que
jamaisseráfeitaemfavordaproleeventualdepessoaquenãopossagerarouconcebernoprazodedois
anos, contados da data da morte do testador, sendo este pessoa idosa e aquela de tenra idade, por
exemplo” 175.
Em nosso entender, porém, tal prazo não comporta flexibilização pela
autonomiadavontade,porimperativodesegurançajurídica.
A menção, no texto legal supratranscrito, à ressalva “salvo disposição em
contráriodotestador”serefereaodestinatáriodosbenscomponentesdoacervo,
enãoàpossibilidadedealteraçãodoprazoperemptórioprevistoemlei.
O termo inicial do prazo é, como visto, a data da abertura da sucessão (da
morte do autor da herança), e, frise-se, por se tratar de um prazo decadencial
(paraoexercíciodeumdireitopotestativo),nãoseaplicam,emregra,asnormas
que impedem, suspendem ou interrompem o lapso temporal (como ocorre na
prescrição),conformepreceituaoart.207doCC/2002 176.
Umaoutraobservaçãoquesefazimportante,equenormalmenteéolvidada,diz
respeitoàliteralidadedaexpressãoutilizadanopreceitolegalaquiinterpretado:
“nãoforconcebidooherdeiroesperado”.
Concepçãoédiferentedenascimento.
Logo,oherdeiroesperadonãoprecisaternascidonoprazodedoisanosfixado
nalei,mas,sim,apenas,tersidoconcebido.
Apósoseunascimentocomvida,consolidaráoseudireito,herdandoosbens
reservados,conformejáanalisado.
Não vindo a nascer vivo (natimorto), a hipótese é de entrega dos bens
reservadosaomontepartilhável 177.
ÉcomolecionaGISELDAMARIAFERNANDESNOVAESHIRONAKA:
“Podeser,entretanto,queorebentoimaginadopelotestadortenhaefetivamentesidoconcebido,masnão
tenhavindoaomundocomvida.Dessaderradeirahipótesenãotratouexpressamenteolegislador,massua
soluçãoéfacilmenteencontradanosistema.
Seconcebido,adquireofetoapropriedadeeaposseindiretadosbenscomosedenasciturosetratasse,
operandoaleiaficçãodequetalaquisiçãosedeunoexatomomentodofalecimentodotestador,esealei
põe a salvo os direitos do nascituro, condicionando o efetivo exercício desses direitos à aquisição da
personalidade, o que ocorre com o nascimento com vida, e se, enfim, o nascituro sucumbe antes de
respirarautonomamente,entendealeiqueosdireitosqueelaprópriavinharesguardandoemseubenefício
resolvem-seextunc,ouseja,desdeomomentoemquelhesemprestouresguardo” 178.
É,noatualestágiodonossodireito,asoluçãoqueseimpõe 179.
Por fim, aspecto interessante e que merece referência, por imprimir uma
interpretaçãomaisamplaejustaànormacodificada,énosentidodequeaprole
eventual poderá derivar não apenas do vínculo biológico, mas também civil
(socioafetivo),comosedánaadoção.
Nessesentido,empesquisasobreotema,anotamRUSSIeFONTANELLA:
“Oinstitutodaproleeventualcaracteriza-sepelapossibilidadedetercapacidadetestamentáriapassivaos
filhos ainda não concebidos de pessoas indicadas pelo testador, desde que vivas estas no momento da
mortedomesmo.
A princípio esta possibilidade seria permitida apenas aos filhos designados naturais, frutos do vínculo
biológicocomoterceirocitadoemtestamento;porém,apartirdaCRFB/88,queconsagrouoprincípioda
igualdadeentretodososfilhosindependentedesuaorigem,inicia-seadiscussãoarespeitodapossibilidade
daampliaçãodotermo‘concebidos’paragarantirqueafiliaçãoadotivafossecontempladapeloinstituto.
Para tanto, a concepção citada no artigo 1.799, I, do CC, seria o momento em que a parentalidade é
estabelecidacomoterceirodesignado,jáque,comrelaçãoàfiliação,existetotalisonomia.
A alteração do modelo de Estado liberal para Estado social, a partir da CRFB/88, trouxe mudanças
significativascomrelaçãoàvisãodos institutosdoDireito, fatordeterminanteparaoestabelecimentode
novoscritériosrelacionadoscomaincidênciadosdireitosfundamentaisnasrelaçõesprivadas.
Aconcepçãodeconstituiçãocomoordemdevaloresqueirradiaefeitosatodasasesferasdavidasocial
passouainfluenciar,alémdodireitopúblico,odireitoprivado.
Várias teorias foram formuladas a respeitode como sedaria a incidênciadosdireitos fundamentaisnas
relaçõesprivadas,sendoadotadapelamaioriadosdoutrinadoresadaeficáciadireta/imediatadosmesmos
nasrelaçõesprivadas.
Apesar dos particulares estarem vinculados aos direitos fundamentais, não podendo desrespeitá-los, a
formadevinculaçãodestesdireitosentreestesnãoéamesmaqueafetaaospoderesestatais.
Osparticularestambémsãotitularesdedireitosfundamentais,possuindoumaesferadeautonomiaprivada
que é constitucionalmente protegida. Desta forma, ao colidirem dois direitos fundamentais, faz-se
necessária a ponderação de interesses baseada em parâmetros prefixados, para que, no caso concreto,
possaseavaliarqualobemjurídicodevesertutelado.
Asdivergênciasdoutrináriasarespeitodotemapropostofundamentam-senaincidênciadiretaouindireta
dosdireitosfundamentaisnasrelaçõesentreprivados,ondeprevaleceoprincípiodaautonomiaprivada.
Por ser o testamento a manifestação da liberdade individual do testador tanto no seu aspecto negocial
quantoexistencial,opresenteartigosecoadunacomaposiçãodefendidaporSílviodeSalvoVenosa,que
garante a incidência do direito fundamental à igualdade na relação privada, porém, preserva o direito à
autonomiaprivadadotestador.
Sendoassim,seotestador,aofazeraliberalidade,deixandoherançaoulegadoàproleeventualdeterceira
pessoa, especificamente vedar a possibilidade da adoção, sua vontade deve ser respeitada (garantindo
assimsuaautonomiaexistencial,sualiberdadedeescolha);porém,nocasodeomissão,nadadeclarandoo
testadorarespeito,oprincípioconstitucionaldaigualdadeentreosfilhosindependentedesuaorigemincide
diretamentenanormaestabelecida,permitindoaadoção” 180.
Namesmalinhadeentendimento,SÍLVIOVENOSA,comhabitualprecisão:
“O testador não fazendo referência (e sua vontade deve ser respeitada), não se faz distinção quanto à
filiação:recebemosfilhoslegítimosouilegítimos,istoé,nanovasistemática,filhosprovenientesounãode
união com casamento. Afirmava-se que os adotivos não se incluíam nessa possibilidade, a menos que
houvesse referência expressa do testador (Wald, ob. cit.: 94). Contudo, entendemos que a evolução da
situação sucessória do adotivo não permitemais essa afirmação peremptória. Lembre-se de que houve
sucessivas alterações de direito sucessório em favor do filho adotivo.A intenção do legislador foi, sem
dúvida,possibilitaracontemplaçãodosfilhosdesangue.Apessoaindicadapoderiaadotarexclusivamente
para conseguir o benefício testamentário. Contudo, já a legitimação adotiva e a adoção plena das leis
revogadasnãomaispermitiamdiferençaentreafiliaçãonaturaleafiliaçãocivil.
Cremos que na atual legislação incumbe ao testador excluir expressamente os filhos adotivos se não
desejar incluí-los, por força do art. 41 da Lei n. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente): ‘a
adoção atribui a condição de filho ao adotado, com osmesmos direitos e deveres, inclusive acessórios,
desligando-odequalquervínculocompaiseparentes,salvoosimpedimentosmatrimoniais’.
Com a mesma conotação apresenta-se a adoção no atual Código Civil. Desse modo, o filho adotivo,
conformenossoordenamento,seinserenoconceitodeprole,aliásatendendoaoqueaatualConstituição
pretendia” 181.
Defato,emnossosentir,nadaimpedequeàcategoriadaproleeventual tanto
possamsesubsumirosfilhosbiológicosdapessoaindicadapelotestadorcomo
também os havidos por adoção, ou, atémesmo, em virtude de reconhecimento
diretodefiliaçãosocioafetiva 182.
Eoquedizerdalegitimidadesucessóriado“embrião”?
Seriapossível?
Éoqueenfrentaremosemseguida.
4.1.1.Discussãosobreoenquadramentodoembriãocomoproleeventual
Questão extremamente polêmica, porém, diz respeito à possibilidade de
reconhecimentodecapacidadesucessóriaaoembrião.
Sim,aoembriãopropriamentedito,aindanãoimplantadonoúteroquandoda
aberturadasucessão,nãosendo,portanto,tecnicamente,um“nascituro”.
IssoporqueoDireitonãopodefecharosolhosparaosavançosdaciência.
SeécertoqueovigenteCódigoCivilbrasileironãotratoudetalhadamenteda
matéria,éumainjustiçadizerqueadesconheceuporcompleto.
Comefeito,importantesdiretrizeshánostrêsúltimosincisosdoart.1.597do
nossoCódigo:
“Art.1.597.Presumem-seconcebidosnaconstânciadocasamentoosfilhos:
I—nascidoscentoeoitentadias,pelomenos,depoisdeestabelecidaaconvivênciaconjugal;
II—nascidosnos trezentosdiassubsequentesàdissoluçãodasociedadeconjugal,pormorte,separação
judicial,nulidadeeanulaçãodocasamento;
III—havidosporfecundaçãoartificialhomóloga,mesmoquefalecidoomarido;
IV—havidos,aqualquertempo,quandosetratardeembriõesexcedentários,decorrentesdeconcepção
artificialhomóloga;
V—havidosporinseminaçãoartificialheteróloga,desdequetenhapréviaautorizaçãodomarido”.
Ora, o que fazer diante das situações decorrentes de inseminação artificial
homóloga (com material fecundante do próprio casal) ou heteróloga (com
material fecundante de terceiro), realizadas depois do falecimento do autor da
herança?
Poderia, por exemplo, a deixa testamentária beneficiar os futuros filhos de
alguém (prole eventual), e, no prazo de dois anos, ocorrer uma concepção
mediante uma técnica científica de reprodução assistida e consequente
implantaçãonoúteromaterno?
Não temosdúvidadeque,nestecaso,oembriãoconcebidoem laboratórioe
posteriormenteimplantadonoúteromaterno(comonascituro),adquiriráodireito
sucessóriocorrespondente.
Claro que há um inconveniente manifesto decorrente da exigência legal do
referidoprazodedoisanos.
Seaconcepçãoeaimplantaçãosederemdentrodoprazodedoisanos,oente
assimformadoseráconsideradofilhoeherdeirodoautordaherança.
Por outro lado, se a concepção ocorrer após o prazo de dois anos,
indiscutivelmente a criança será considerada “filha do falecido” (que autorizou
previamente a fecundação),mas não poderá ser considerada “herdeira”, pois a
concepçãosedeuforadobiênio.
Eumaperguntaaindamaiscomplexaseimporia:adeixatestamentáriapoderia
beneficiaroembriãoaindanãoimplantadonoúteromaterno?
Seriapossívelreconheceraoembriãoumavocaçãohereditáriaautônoma?
Éoqueenfrentaremosnopróximosubtópico.
4.1.2.Discussãosobreapossibilidadedereconhecimentodevocaçãohereditáriaautônomaaoembrião
Trata-se, a questão ora em debate, sem dúvida, de uma situação de alta
complexidade.
Oembrião,preservadoemlaboratório,concebidoantesdamortedo testador
ouduranteoprazodedoisanosacontardaaberturadasucessão(umavezqueo
falecido poderia autorizar a utilização de material fecundante seu), não
implantadonoúteromaterno,poderiaserbeneficiadopeladeixatestamentária?
Note o problema: ele fora concebido, mas não fora implantado no útero
materno.
Aquestãoreveste-sedealtacomplexidade.
MÔNICAAGUIAR,porexemplo,argumentanosentidodainconveniênciado
projetoparentalpostmortem:
“Aoexaminaraquestão,ressaltaJOÃOÁLVARODIASosprejuízos—deordeminclusivepsicológica
—paraacriança,deserconcebidaquandojáéórfãdeumdospais,situaçãoquenãopodeserjustificada
comasmesmasrazõeslançadasparaashipótesesemque,porvicissitudesimpossíveisdeseremafastadas
pelavontade,acriançanascesemumdosgenitores 183.
Aprocriação resultante de umdesejo unilateral foge à bilateralidade que caracteriza o autêntico projeto
parental e, pois, não pode provocar efeitos em relação a quem não se manifestou, ao tempo da
inseminaçãoartificial,pelaassunçãodessedesiderato.
Àrealizaçãodainseminaçãoprecedearegularemissãodevontadedeambososcônjugesecompanheiros.
Formam eles, entretanto, uma única parte, em relação à qual cada uma das declarações singulares de
vontade não tem autonomia para gerar a filiação relativamente ao outro e, somente assume relevância
jurídica,quandounidasasduasemumamanifestaçãoúnica.
Pelateoriadavontadeprocriacional,háqueseconcluirserpossívelreconhecerapenasafiliaçãoamatre,
afastada,deplano,apresunçãoprevistanoincisoreferido,porsetratardenormainconstitucional,umavez
que violadora do comando expresso no art. 5.º, I, da Constituição Federal, embora seja de lamentar a
opçãoporumaorfandadearbitrariamenteprovocada 184” 185.
Nessamesmalinha,jáprelecionavaJOSÉROBERTOMOREIRAFILHO:
“Quanto à inseminaçãopostmortem, ou seja, a que se faz quando o sêmen ou o óvulo dode cujus é
fertilizadoapósasuamorte,odireitosucessórioficavedadoaofuturonascituro,portersidoaconcepção
efetivadaapósamortedodecujus, não havendo, portanto, que se falar emdireitos sucessórios ao ser
nascido, tendoemvistaquepelaatual legislaçãosomentesãolegitimadosasucederaspessoasnascidas
oujáconcebidasnomomentodaaberturadasucessão” 186.
Esta primeira corrente de pensamento, pois, nos levaria a concluir pela
inadmissibilidadedoreconhecimentodelegitimidadesucessóriaaoembrião,por
razão,sobretudo,desegurançajurídica.
Outrosautores,todavia,seguiramoutratendência.
Há quem defenda a impossibilidade jurídica de reconhecimento da
legitimidade sucessória do embrião apenas para participação na Sucessão
Legítima,admitindo-se,porém,ocabimentonaSucessãoTestamentária.
Emnossosentir,estaseriaalinhadereflexãodaqueridaProfessoraMARIA
HELENADINIZ:
“Filho póstumo não possui legitimação para suceder, visto que foi concebido após o óbito de seu pai
genético, e por isso é afastado da sucessão legítima ou ab intestato. Poderia ser herdeiro por via
testamentária, se inequívoca a vontade do doador do sêmen de transmitir herança ao filho ainda não
concebido, manifestada em testamento. Abrir-se-ia a sucessão à prole eventual do próprio testador,
advindadeinseminaçãoartificialhomólogapostmortem(LICC,arts.4.ºe5.º)” 187.
Perceba-se que não se reconheceria, de fato, uma legitimidade sucessória
autônoma,mas,sim,umaaplicaçãoanalógicadasregrasdaproleeventual,aqui
játrabalhadas.
Trata-sedeuma linhadepensamentoconvincente,muitoemboranãoafasteo
inconvenientedeoenteconcebidopoderpermanecercongelado,emlaboratório,
porlongosanos.
Afinal,o§4.ºdoart.1.800parte,semdúvida,dapremissadequehaveriaa
implantação no úteromaterno no prazo legal, com a perspectiva de nascimento
paraospróximosnovemeses.
Ora, e se a concepção já sedeu, pormeio artificial,mantendo-seo embrião
congelado em laboratório, a deixa testamentária aguardaria a implantação no
úteromaternoindefinidamente?
Eoinventário,emtalcaso,permaneceriaparalisado?
Em nosso sentir, ao menos enquanto não houver uma regulamentação legal
específica, que leve em conta os avanços da tecnologia, a segurança jurídica
recomenda que, nos limites da Sucessão Testamentária, o embrião somente
poderá figurar como beneficiário se a implantação no útero materno ocorrer
dentrodoprazodedoisanos,nalinhado§4.ºdoart.1.800doCódigoCivil.
Após esse prazo, não deixará de ser considerado filho do falecido,mas não
terádireitosucessório.
Sem dúvida, não se afigura como a melhor solução, mas, em nosso atual
sistema,éamaisadequada,mormenteemseconsiderandoquea indefiniçãode
um prazo para a implantação geraria o grave inconveniente de prejudicar por
meses ou anos o desfecho do procedimento de inventário ou arrolamento, em
detrimentododireitodosdemaisherdeiroslegítimosoutestamentários.
4.2.Pessoasjurídicas
Também têm legitimidade para figurar como beneficiárias de testamento as
pessoasjurídicasemgeral 188.
Nadaimpede,pois,queotestadordeixepartedasuaherança(outodaela,caso
não tenha herdeiros necessários) para uma associação de apoio a crianças
carentesouparaumaigreja.
É muito comum, por exemplo, que professores deixem suas bibliotecas
particularesparainstituiçõesdeensinoaquesededicaram.
Registre-se, porém, que, em nosso pensar, sociedades irregulares ou de fato
(despersonificadas)carecemdoatributonecessárioparafigurarcomosucessoras
testamentárias 189,dadoovíciodasuaconstituição,assimcomonãopoderãoser
beneficiáriososentesque,postodotadosdecapacidadeprocessual,carecemde
personalidadejurídica,comoocondomínio,aherançajacenteouamassafalida.
4.3.Fundações
Para compreendermos a peculiar legitimidade sucessória das fundações,
parece-nosrecomendávelpassarmosantesemrevistaalgumasnoçõesgerais 190.
Primeiramente, lembramos que a “fundação” aqui tratada é a de direito
privado,pois,nostermosdoart.1.799,III,somenteestaspodemserorganizadas
segundoavontadedotestador,enão,poróbvio,asfundaçõespúblicas,quesão
criadasporlei.
Diferentementedasassociaçõesedassociedades,as fundaçõesresultam,não
da união de indivíduos, mas da afetação de um patrimônio, por testamento ou
escritura pública, que faz o seu instituidor, especificando o fim para o qual se
destina 191.
Segundo CAIO MÁRIO, “o que se encontra, aqui, é a atribuição de
personalidade jurídica a um patrimônio, que a vontade humana destina a uma
finalidadesocial” 192.
Oart.62dovigenteCódigoCivildispõeque:
“Art. 62. Para criar uma fundação, o seu instituidor fará, por escritura pública ou testamento, dotação
especialdebens livres,especificandoofimparaoqualsedestina,edeclarando,sequiser,amaneirade
administrá-la”.
Cumpre-nos observar que o legislador cuidou de inserir parágrafo único ao
referidoart.62dovigenteCódigoCivil, consagrandooelemento finalísticoda
fundação, que somente poderá constituir-se “para fins religiosos, morais,
culturais ou de assistência”. Escapa, pois, do permissivo legal, a entidade
supostamente fundacional que empreenda atividade econômica com escopo
lucrativo.
Não se admite,poroutro lado, sobretudopor suaprecípua finalidade social,
queadiretoriaouoconselhodeliberativodafundação,desvirtuandoinclusivea
vontadedoinstituidor,alieneinjustificadamentebenscomponentesdeseuacervo
patrimonial.
Nessesentido,observaLINCOLNANTÔNIODECASTRO:
“DependemdepréviaautorizaçãodoMinistérioPúblico,entreoutrosatosque,envolvendoopatrimônioe
osrecursosfinanceiros,exorbitemdaadministraçãoordinária,aalienaçãodebensdoativopermanente,a
constituiçãodeônusreais,aprestaçãodegarantiaaobrigaçõesdeterceiros,aaceitaçãodedoaçõescom
encargos, a celebração de operações financeiras.Omesmo tratamento aplica-se aos negócios jurídicos
celebrados com os participantes ou administradores da fundação, ou com empresas ou entidades em
relação às quais os mesmos detêm interesses, direta ou indiretamente, como sócios, acionistas ou
administradores” 193.
Paraacriaçãodeumafundação,háumasérieordenadadeetapasquedevem
serobservadas,asaber:
4.3.1.Relembrandoasetapasparacriaçãodeumafundação
Nossubtópicosaseguir,relembraremoscadaumadasetapasparaacriaçãode
umafundaçãonosistemacodificadobrasileiro.
Vamosaelas.
4.3.1.1.Afetaçãodebenslivrespormeiodoatodedotaçãopatrimonial
A fundação, como dito, é uma massa patrimonial a que se outorga
personalidadejurídica.
Assim, o primeiro passo para sua criação é justamente a iniciativa de um
instituidor,nosentidodedestacarbenslivresedesembaraçadosdopatrimôniode
queétitularparacriarafundação.
4.3.1.2.Instituiçãoporescriturapúblicaoutestamento
Escolhidos os bens para a formação da fundação, já pode ela ser instituída
formalmente,porescriturapúblicaoutestamento.
Note-se, pois, de logo, atendo-se ao objetivo desta obra, que o instituidor
poderá,medianteaelaboraçãode testamento,criaruma fundação,dotando-a
dosbensnecessáriosparaasuaconstituiçãoefuncionamento.
Acrescente-sequeporqualquerdasformastestamentáriaspoderásercriadaa
fundação,enãoapenaspelaformapública,pois,seestafosseaopçãolegislativa,
teriahavidomençãoexpressanalei.
4.3.1.3.Elaboraçãodosestatutos
Emlinhasgerais,háduasformasdeinstituiçãodafundação:adireta,quandoo
próprio instituidor o faz, pessoalmente, inclusive cuidando da elaboração dos
estatutos;ouafiduciária,quandoconfiaaterceiroaorganizaçãodaentidade.
Nesteúltimocaso,dispõeoart.65doCódigoCivil:
“Art.65.Aquelesaquemo instituidorcometeraaplicaçãodopatrimônio,em tendociênciadoencargo,
formularãologo,deacordocomassuasbases(art.62),oestatutodafundaçãoprojetada,submetendo-o,
emseguida,àaprovaçãodaautoridadecompetente,comrecursoaojuiz.
Parágrafoúnico.Seoestatutonãoforelaboradonoprazoassinadopeloinstituidor,ou,nãohavendoprazo,
emcentoeoitentadias,aincumbênciacaberáaoMinistérioPúblico”.
Note-sequeanovaLeicodificadafoimaisprecisadoqueoCódigode1916,
umavezquecuidoudeestabeleceroprazomáximode180diasparaaelaboração
dosestatutos,sobpenadeaincumbênciasertransferidaaoParquet.Emgeral,o
Ministério Público tem uma ou mais Promotorias de Justiça com atribuição
específicadefiscalizaracriaçãoefuncionamentodasfundações.
Aindasobreaelaboraçãodosestatutos,observe-sequeaLein.13.151,de28
de julhode2015,admitiuexpressamenteapossibilidadedeestabelecimentode
remuneraçãoaosdirigentesdefundações 194.
4.3.1.4.Aprovaçãodosestatutos
Como consectário de sua atribuição legal para fiscalizar as fundações, é o
órgãodoMinistérioPúblico quedeverá aprovar os estatutos da fundação, com
recursoaojuizcompetente,emcasodedivergência.
O interessado submeterá o estatuto aoMinistério Público, que verificará se
foramobservadasasbasesdafundaçãoeseosbensdotadossãosuficientesao
fimaqueelasedestina.Nãohavendoóbice,oParquetaprovaráoestatuto 195.
4.3.1.5.RealizaçãodoRegistroCivil
Comotodapessoajurídicadedireitoprivado,ocicloconstitutivodafundação
só se aperfeiçoa com a inscrição de seus atos constitutivos no Cartório de
RegistroCivildasPessoasJurídicas.
Nessesentido,rezaoart.114daLein.6.015de31dedezembrode1973(Lei
deRegistrosPúblicos):
“Art.114.NoRegistroCivildePessoasJurídicasserãoinscritos:I—oscontratos,osatosconstitutivos,o
estatutooucompromissosdassociedadescivis,religiosas,pias,morais,científicasouliterárias,bemcomoo
dasfundaçõesedasassociaçõesdeutilidadepública”(grifonosso).
Trata-sedeumaformalidadeindispensáveldenaturezaconstitutiva,semaqual
nãoháquesefalaremcriaçãodapessoajurídica.
4.3.2.Notasconclusivassobreavocaçãohereditáriadefundações
De todooexposto,édignodenotaquea fundaçãonãoapenasébeneficiada
peladotaçãopatrimonialprevistano testamento,mas, também,pode sercriada
ouconstituídapelomesmoatodedisposiçãodeúltimavontade.
Com isso, concluímos que a legitimidade da fundação para figurar como
beneficiária de testamento comportaria uma análise jurídica em dupla
perspectiva:
a)afundação,jáexistente,ébeneficiadaportestamento(casoemque,jásendo“pessoajurídica”,asua
legitimidadeestáprevistanoincisoanteriormenteanalisado—art.1.799,II,doCódigoCivil);
b)afundaçãoécriadapelopróprio testamentoqueafetabensparaa suaconstituiçãoe funcionamento
(casoemquetemosaespecialsituaçãooraanalisada—art.1.799,III,doCódigoCivil).
Emambososcasos,temosmanifestadaavocaçãohereditáriadasfundações.
5.IMPEDIMENTOSLEGAISSUCESSÓRIOS
Algumaspessoasestãoimpedidasdesernomeadasherdeirasoulegatárias,nos
expressostermosdoart.1.801doCódigoCivil.
Ashipótesessão,portanto,deausênciadelegitimidadesucessóriapassiva.
Estão,pois,proibidasdeserbeneficiadasportestamento:
1)a pessoa que, a rogo, escreveu o testamento, nem o seu cônjuge ou companheiro, ou os seus
ascendenteseirmãos—paraevitar indevida interferêncianamanifestaçãodevontadedo testador,ou,
até mesmo, a captação dolosa da sua vontade, não poderão ser beneficiados: a pessoa que escreveu,
digitououdatilografouo testamentoapedidodo testadornemoseucônjuge,companheiro,ascendentee
irmão.Oautordaherança,porexemplo,nãopoderádeixarpartedasuaherançaparaaenfermeiraque
escreveu, a seu rogo, o testamento, nem ao filho oumarido dela. Tudo isso, como dito, para preservar
incólumearealintençãodotestador,quandodamanifestaçãodasuaúltimavontade;
2)astestemunhasdotestamento—pelamesmarazãoacimaexposta,nãopoderãoaspessoaschamadas
atestemunharaelaboraçãodotestamentoserbeneficiadasnessemesmoato,emrespeitoàpreservação
daautonomiadavontadedotestador;
3)o(a)concubino(a)do(a)testador(a)casado(a),salvoseeste,semculpasua,estiverseparadode
fato do cônjuge há mais de cinco anos — primeiramente, recordemo-nos de que a palavra
“concubino(a)”, em nosso direito positivo, significa “amante”, ou seja, a pessoa que é partícipe de uma
relação paralela afetiva espúria com alguém impedido 196. Pois bem. O que o dispositivo pretende é
impedirqueotestador—outestadora,claro(poisosdireitossãoiguais)—casadobeneficie,pormeiodo
seu testamento, a(o) sua(seu) amante. Note-se, nesse ponto, que óbice algum há no que toca à deixa
testamentária que beneficie a(o) companheira(a), integrante de uma união estável com o testador, pois,
comosabemos,nestecaso,estamosdiantedeumaentidadefamiliar,constitucionalmenteprotegida.Afinal,
“concubina(o)” e “companheira(o)” são figurasquenão se confundem.Aproibição,portanto, atingeum
homem,porexemplo,que,sendocasado(equemantémaindaasociedadeconjugal),pretendadeixarparte
da sua herança para a mulher com quem mantém um relacionamento clandestino há alguns anos. A
vedação é expressa. Todavia, o dispositivo, na parte final, ressalva que a disposição testamentária será
possívelseotestadorestiverseparadodefatodoseucônjugehámaisdecincoanos.Nãoandoubemo
legisladornoestabelecimentodesseprazo.Ora,seotestadorjáestiverseparadodefatodoseumarido
ou da sua esposa, poderá testar, em nosso sentir, respeitada a legítima dos herdeiros necessários, para
quem quiser, pois não há que se falarmais em traição, infidelidade, ou seja, em relação clandestina ou
concubinato.Até porque,mesmo antes de completar o referido prazo quinquenal, já pode estar vivendo
umahistóriadeamorcomoutrapessoa,emuniãoestável,alémdofatodeque,tendoemvistaaEmenda
Constitucional n. 66/2010, o divórcio se tornou um direito potestativo sem exigibilidade de prazomínimo
parasuamanifestação,judicialouadministrativa 197;
4)otabelião,civiloumilitar,ouocomandanteouescrivão,perantequemsefizer,assimcomooque
fizerouaprovaro testamento—pelomesmoprincípiode isenção,ooficialqueelaborarouaprovaro
testamentonãopoderá,aomesmotempo,ser,pormeiodele,beneficiado.
E, como o sistema normativo atua para evitar manobras fraudulentas, o art.
1.802,acertadamente,prescreveanulidadeabsolutadadisposiçãotestamentária
quebeneficie,indiretamente,qualquerdessaspessoasacimareferidas:
“Art.1.802.Sãonulasasdisposiçõestestamentáriasemfavordepessoasnãolegitimadasasuceder,ainda
quandosimuladassobaformadecontratooneroso,oufeitasmedianteinterpostapessoa.
Parágrafo único. Presumem-se pessoas interpostas os ascendentes, os descendentes, os irmãos e o
cônjugeoucompanheirodonãolegitimadoasuceder”.
Alógicadoparágrafoúnicoéevidente.
SeJoão(testadorcasado)nãopodetestaremfavordeGeralda,suaconcubina,
tambémnão poderá fazê-lo por via oblíqua, em inequívoca simulação relativa,
beneficiandoindiretamenteoirmãodela.
Damesmaforma,nãopoderásimularumacompraevenda(atooneroso)com
elaparamascararadoação.
Todavia,poróbvio,tomandoaindaomesmoexemplocomoreferência,seJoão
teveumfilhocomGeralda,poderábeneficiá-lo—respeitada,claro,a legítima
doseventuaisherdeirosnecessários—vistoqueavedaçãonãopoderiaagredir
direitodefilhoalgum,sobpenadeinconstitucionalidade.
Éoquedispõeoart.1.803doCódigoCivil:
“Art.1.803.Élícitaadeixaaofilhodoconcubino,quandotambémofordotestador”.
Taldispositivo,semequivalentenacodificaçãoanterior, incorporaaodireito
positivobrasileirooanteriorentendimentodaSúmula447doSupremoTribunal
Federal 198.
6.DA“VOCAÇÃOHEREDITÁRIA”DEANIMAISECOISAS
Apenasatítulodearrematedestecapítulo,quepretendeudarumavisãogeral
davocaçãohereditária,sejalegítima,sejatestamentária,parece-nosinteressante
tecerbrevesconsideraçõesacercada“vocaçãohereditária”deanimaisecoisas.
Taisobservaçõessefazemnecessáriaspeladúvidacomumentevistaemsalade
aula, principalmente influenciada por uma visão simplista de legislações
estrangeiras,ventiladaemfilmesouseriados.
É aquela velha história “do milionário que deixou sua fortuna para seu
cachorrinho Bilu” ou “a da falecida que deixou toda sua herança para a sua
biblioteca”.
Arigor,nadadissoépermitidonoBrasil.
Semoventesecoisassão,nosistemabrasileiro,bens,nãotendopersonalidade
jurídicae,muitomenos,vocaçãohereditária.
Oqueépossíveléoestabelecimentodeônusparadeterminadosherdeiros,em
disposiçõestestamentárias,paraquerealizemoencargo,porexemplo,decuidar
dedeterminadoanimal,enquantoeleviver.
Da mesma forma, é possível, como visto, destinar parte ou totalidade da
herançaparaumafundação,porexemplo,comafinalidadeculturaldepromovera
educação,medianteacriaçãodeumaáreadeestudosparagraduandos.
Taiscondutas,evidentementepossíveiselícitas,jamaisdevemserconfundidas
com uma suposta “vocação hereditária” de animais e coisas, que ainda não é
permitidanoatualpanoramadoDireitoBrasileiro 199.
CapítuloVIII
ExcluídosdaSucessão
Sumário: 1. Introdução. 2. Exclusão por indignidade. 2.1. Causas de exclusão por indignidade. 2.1.1.
Autoria, coautoria ou participação em homicídio doloso tentado ou consumado. 2.1.2. Delitos contra a
honra.2.1.3.Violênciaoufraude.2.2.Efeitosdaexclusãoporindignidade.3.Teoriadoherdeiroaparente.
4.Perdãodoindigno.5.Deserdação.5.1.Introduçãoebrevehistórico.5.2.Conceito.5.3.Hipóteseslegais
de deserdação. 5.4. Procedimento. 5.5. Efeitos de deserdação e direito de representação. 5.6.
Consideraçõesfinais.
1.INTRODUÇÃO
Nossograndeesforço,ao longode todaaobra,éconjugaroaprofundamento
científicoaoapurosistemático,emproldamelhorcompreensãodadisciplina.
Em nosso sentir, o Direito das Sucessões, tal como atualmente regulado,
apresenta,sobcertosaspectos,umindesejávelpanoramaassistemático.
Valedizer,dentreos ramosdoDireitoCivil,éoqueexige,do jurista,maior
cuidadoorganizacionalnaexposiçãodassuasnoçõesfundamentais,porquantoa
normatizaçãoexistente,eemvigor,emdiversospontos,afigura-seconfusa.
Tome-se como exemplo a já criticada localização do art. 1.790 do Código
Civilbrasileirode2002que, topograficamente situadonocapítulodedicadoàs
“disposições gerais” da “Sucessão em Geral” (Título I do Livro V), cuida
especificamentedo“direitosucessóriodo(a)companheiro(a)viúvo(a)”.
Outrosexemplos,extraídosdalegislaçãocodificada,poderiamserapontados,
e que serviriam de reforço à ideia acima esposada, segundo a qual a
regulamentação legal doDireitoHereditário brasileiro apresenta-se, emmuitos
pontos,desordenada.
Muitobem.
Traçamos essas breves linhas para que o nosso leitor possa compreender a
perspectivacríticaqueiniciaaabordagemdestecapítulo.
OCapítuloVdoTítuloI(“DaSucessãoemGeral”)doLivroV(“Direitodas
Sucessões”)donossoCódigoCivilégenericamenteintitulado“DosExcluídosda
Sucessão”,e,ao longodoseucorpodenormas,cuidadedisciplinaro instituto
jurídicodaexclusãoporindignidade.
Sucedeque,noâmbitodaSucessãoTestamentária(CapítuloXdoTítuloIIIdo
LivroV)—,poróbvio,tambémintegraanoçãomaiorde“SucessãoemGeral”
—, outro importante instituto é disciplinado, o qual também objetiva o
afastamentocompulsóriodeumsucessor:adeserdação.
Ou seja, o legislador, posto pretenda, na parte geral do Direito Sucessório,
tratardossucessoresexcluídos, inadvertidamentedeixade inserir (ouaomenos
referir)institutocorrelatoedotadodeumainequívocaparidadefuncional.
Porisso,emrespeitoàlógicaeàprecisãodasideias,cuidaremosdeanalisar,
nestemesmocapítulo,tantoaexclusãoporindignidadecomoadeserdação,não
obstantesejamtratadosemdistintaspartesdamesmacodificação.
Tambéméassimemoutrossistemaspositivados:
“Con acierto se ha observado que en forma compatible y sin excluírse, desheredación e indignidad han
convivido durante siglos en los ordenamientos jurídicos. Sin adelantarnos a lo que ha de verse más
adelante,convieneadvertirquedesarrolladaenelderechoromano,aunquetardíamente,mostróluegodela
épocajustinianeanotascaracterísticas,quemarcabansudiferenciaconlaindignidad.Ladesheredaciónde
losascendientesydescendientesdebíarealizarseenuntestamentoquecontuvierainstitucióndeherederos
yenvirtuddealgunadelascausasprevistasporJustiniano,loqueoriginabaunaexclusióndeterminantede
quelosbienespasarandirectamentealosqueveníanasucederensulugar.Porlaindignidad,encambio,
noseoriginabaunaverdaderaexclusióninicial,ylasituaciónhaquedadoacuñadaenlafrasequehemos
recordado: indignus potest capere sed non potest retinere. Los bienes de que era privado el indigno
pasabanalfiscoporelprocedimientodelaextraordinariacognitio(bonaereptoria).
También el derecho consuetudinario francés admitió la indignidad y la desheredación como institutos
diferentes. Sin embargo, apartándose del precedente romano, se unificaron las causales que para uno y
otro resultaron idénticas, variando las formas operativas. La desheredación dependía de la voluntad del
causante expresada en el testamento, apareciendo la indignidad como una forma tácita de aquélla,
pronunciada por la justicia después de la muerte del causante, cuando las circunstancias no le habían
permitido desheredar al heredero culpable. Ambas producían análogos efectos, ya que a diferencia del
sistemaromano,losbienesdeloscualeseraexcluídoelindignopasabanalosotrossucesoressinquese
produjeralaconfiscaciónporelEstado.Ladualidaddeinstitutossubsistióduranteelperiodorevolucionario,
desapareciendoaldictarseelCódigoCivilfrancés,queabolióladesheredación.
El Código argentino se mantuvo fiel a las inspiraciones justinianeas y legisló separadamente ambos
institutos.Nohanfaltadocríticascontraestasolución,postulándose lasupresiónde ladesheredaciónpor
considerarla odiosa e inútil.Así,Bibiloni, al borrar el título respectivo, adujo que tratada en elCódigo la
exclusióndelherederoolegatarioporindignidad,demaneracomprensivaatodaclasedesucesión,carecía
deobjetodecircuándoelherederoforzosodebíaserseparadodelasucesiónpordeclaracióndeltestador.
ElmismotemperamentofueadoptadoporelProyectode1936,aunqueMartínezPazcuidódepuntualizar
quesibienlaComisiónhabíaseguidoelconsejodelAnteproyecto,lasrazonesconqueBibiloniapoyabasu
supresiónnoaparecíancomodeltodoconvincentes” 200.
De logo, anotamos, porém, que tais institutos, por objetivaremo afastamento
punitivo de um dos sucessores, em nada se confundem com as hipóteses de
“impedimentolegalparaasucessão”,previstasnoart.1.801ejátratadaspornós
no capítulo imediatamente anterior 201, pois, neste último caso, o que há, como
vimos,éasimplesausênciadelegitimidadetestamentáriapassiva.
2.EXCLUSÃOPORINDIGNIDADE
Primeiramente, trataremos da “exclusão por indignidade”, cujas causas estão
taxativamente enumeradas no art. 1.814 do Código Civil de 2002, e que tanto
podeseaplicaràSucessãoLegítimacomoàTestamentária.
Trata-se,pois,deuminstitutodeamploalcance,cujanaturezaéessencialmente
punitiva,namedidaemquevisaaafastardarelaçãosucessóriaaquelequehaja
cometidoatograve,socialmentereprovável,emdetrimentodaintegridadefísica,
psicológicaoumoral,ou,atémesmo,contraaprópriavidadoautordaherança.
Emoutraspalavras,invocandoRIPERTeBOULANGER,“laindignidadesla
exclusión de la sucesión, pronunciada a título de pena contra quien ha sido
culpable de faltas graves contra el difunto y su memoria. Se funda pues en
motivospersonalesdelindigno” 202.
Afinal, não é justo, nem digno, que, em tais circunstâncias, o sucessor
experimente um benefício econômico decorrente do patrimônio deixado pela
pessoaqueagrediu.
Oalgoznãodeveherdardavítima.
Nodireitoalemão,otratamentodispensadoaoindignonãoémenosrigoroso,
comoobservamosProfessoresRAINERHAUSMANNeGERARDHOHLOCH,
quesalientamocarátercriminaldacondutadosucessorindigno:
“Die abschliessend imGesetz aufgezähltenErbunwürdigkeitsgründe haben alle gemeinsam, dass es sich
umstrafrechtlichrelevanteTatenhandelnmuss,diederErbegegenüberdemErblasservorgenommenhat.
Eine strafrechtlicheVerurteilung ist nichtnotwendig, vielmehrgenügtdie tatbestandlicheBegehungeiner
strafrechtlichrelevantenTat” 203.
Nessecontexto,éforçosoconvirque,porsetratardemedidasancionatória,as
causas da exclusão sucessória não comportariam interpretação extensiva ou
analógica,razãopelaqualdevemsercuidadosamenteinterpretadas.
Trata-se,pois,deuminstitutopenal—poiscominaumasançãooupena—de
carátercivil,equetraduzumaconsequêncialógico-normativapelapráticadeum
“atoilícito”, institutoprevistonoart.186doCódigoCivilde2002,dadooseu
caráterantijurídicoedesvalioso.
Sucede que, diferentemente dos ilícitos civis em geral — que, quando
perpetrados, implicam a obrigação de indenizar —, os atos de indignidade
cometidoscontrao falecido resultamemumasançãoespecífica:a exclusãodo
indignodacadeiasucessória,subtraindo-lheodireitodehaverqualquerbem
daherança,comoseherdeironuncahouvessesido.
Previsãodesançãosemelhantehánoâmbitodocontratodedoação,conforme
observouPABLOSTOLZEGAGLIANO,aoestudararevogaçãodaliberalidade
poratodeingratidão:
“Semsombradedúvida,umadaspioresqualidadesqueumhomempodecultivaréaingratidão.
SegundooclássicodicionaristaCALDASAULETE,oingratoéaquele‘quenãomostrareconhecimento’
ou,simplesmente,‘queseesqueceudosbenefíciosquerecebeu’ 204.
Nocasode talcomportamentoprovirdodonatário,asituaçãoreveste-sedemaiorgravidade,namedida
emque, beneficiadopor umato de liberalidadeou atémesmoaltruísmo, volta-se traiçoeiramente contra
aquelequeoagraciou.
Podemos,até,afirmarqueocometimentodequalquerdosatosdeingratidãocapituladosnaleicivil(orolé
exaustivo) traduz quebra de boa-fé objetiva pós-contratual, ou seja, implica o cometimento de ato
atentatórioaodeverderespeitoelealdade,observávelentreasprópriaspartes,mesmoapósaconclusão
docontrato.
(...)
O descaso, a frieza e a indiferença, por mais desalentadores que sejam, são sentimentos que não se
confundem com a ingratidão, não permitindo ao doador o desfazimento da doação nem mesmo por
invalidade,comojádecidiuoSuperiorTribunaldeJustiça:
‘AconclusãoédaTerceiraTurmadoSuperiorTribunaldeJustiça (STJ),ao julgarprocessodecasalde
São Paulo que pretendia anular a doação de vários imóveis à filha, alegando que ela ‘nuncamais teve
notícias de seus pais, não lhes dirigindo a palavra, oumesmo telefonandopara saber se estão passando
bem,tendo,inclusive,apóssériadoençaqueacometeuoseupai(...),deixadodecompareceraohospital
paravisitá-lo(atémesmodepoisdestaoperação),emtotalignorânciaaosseusgenitores’.
Os pais queixaram-se de ofensa ao artigo 1.183 do Código antigo, afirmando que os frutos e os
rendimentos dos imóveis em questão cessaram, sendo-lhes negadas indiretamente fontes de alimento.
Além de demonstração de abandono material e moral, devido à falta de visitação, carinho, respeito e
atenção, ferindo, com isso, seus ‘mais frágeis sentimentos de filiação’. Pleiteavam a revogação das
doaçõesfeitas,restabelecendoosimóveisnapropriedadedosdoadores.
Como seguimentonegadonaorigem,o casal entrounoSTJ.O relatordoprocesso,ministroHumberto
GomesdeBarros,esclareceuqueadoação,conformedispõeoartigo1.181doCódigoCivilde1916,pode
ser revogada por três modos: pelos casos comuns a todos os contratos (vícios do negócio jurídico,
incapacidadeabsoluta,ilicitudeouimpossibilidadedoobjeto),poringratidãododonatárioeporinexecução
doencargo,nocasodedoaçãoonerosa.
Deacordocomorelator,apesardesetratardeumnegóciojurídicoprovenientedaliberalidadedodoador,
a lei, principalmente em respeito à segurança jurídica, limita o arbítrio do doador em desfazer tal
liberalidade.Assim,oministroreconheceuataxatividadedashipótesesprevistasnoartigo1.183doCódigo
Civil de 1916 (Código Beviláqua), segundo o qual só se podem revogar por ingratidão nas seguintes
situações:seodonatárioatentoucontraavidadodoador,secometeucontraeleofensafísica,seoinjuriou
gravemente, ou o caluniou, ou se, podendo ministrá-los, recusou ao doador os alimentos de que este
necessitava. ‘Não é, portanto, qualquer ingratidão suficiente para autorizar a revogação da doação.No
casodosautos,aindaqueseconsideredesrespeitosoouinjustoodesapegoafetivodaorarecorrida,nãohá
comoenquadrarsuacondutanasestreitashipótesesprevistaspeloCódigoBeviláqua’,observouoministro
GomesdeBarros,aonegarconhecimentoaorecurso 205.
Seguindoessalinha,concluímosque,casoodonatáriorealizequalquerdosatosdeingratidãoalinhadosno
art.557doCódigoCivil,estaráatuandoemdetrimentoàregraética(edeexigibilidadejurídica)daboa-fé
objetivapós-contratual.
‘Art.557.Podemserrevogadasporingratidãoasdoações:
I—seodonatárioatentoucontraavidadodoadoroucometeucrimedehomicídiodolosocontraele;
II—secometeucontraeleofensafísica;
III—seoinjuriougravementeouocaluniou;
IV—se,podendoministrá-los,recusouaodoadorosalimentosdequeestenecessitava’” 206.
Claroestá,noentanto,que,emboraexistacertasemelhançacomarevogação
da doação por ingratidão, a exclusão por indignidade, instituto tipicamente
sucessório, tem os seus próprios fundamentos e regramento peculiar, conforme
veremosabaixo.
2.1.Causasdeexclusãoporindignidade
Inicialmente, observamos que as hipóteses autorizadoras da exclusão estão
taxativamente previstas em lei, não admitindo, como já afirmado, interpretação
extensivaouanalógica,dadooseucaráterpunitivo 207.
Por tradição, também, é firmeo entendimentono sentidodequeodireitode
demandaraexclusão,porenvolverinteressepatrimonial,caberiaaoutroherdeiro
oulegatário 208,oquecomporta,claro,reflexão.
Essedireito,acrescente-seainda,deveráserexercidonoprazodecadencialde
quatro anos, a contar da data da abertura da sucessão (da morte do autor da
herança) 209.
Equaisseriamosfundamentosdaexclusãosucessória?
Nos termos do art. 1.814 do Código Civil, são excluídos da sucessão os
herdeirosoulegatários:
a) que houverem sido autores, coautores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a
pessoadecujasucessãosetratar,seucônjuge,companheiro,ascendenteoudescendente;
b)quehouveremacusadocaluniosamenteemjuízooautordaherançaou incorrerememcrimecontraa
suahonra,oudeseucônjugeoucompanheiro;
c)que,porviolênciaoumeiosfraudulentos,inibiremouobstaremoautordaherançadedisporlivremente
deseusbensporatodeúltimavontade.
Note-se que tantopoderão incorrer nas situações acimaoherdeiro (sucessor
universalquerecebetodaaherançaouumafraçãodela)ouolegatário(sucessor
singularquerecebebemoudireitodeterminado,componentedaherança) 210.
Analisemos, pois, cada uma dessas hipóteses, separadamente, para melhor
compreensãodamatéria.
2.1.1.Autoria,coautoriaouparticipaçãoemhomicídiodolosotentadoouconsumado
Afigura-seinconcebível,atentatóriomesmocontraamoral,apossibilidadede
oautor,coautoroupartícipedecrimedehomicídio,tentadoouconsumado,contra
oautordaherança,haverparasibensoudireitosdeixadospelofalecido.
A agressão ao bem jurídicomais caro e valioso, a vida, não poderia render
ensejoaumlocupletamentoque,alémdeilícito,repugnariaosmaiscomezinhos
princípioséticosdeconvivênciasocial.
Note-sequeanorma sucessórianão se refere ànecessidadede “condenação
criminal”, de maneira que, tal como redigida, a mera comprovação, no juízo
cível, da cooperação ou autoria delitivas poderia ensejar a aplicação da pena
sucessória.
Sucedequeoraciocínio,postoacademicamentedefensável,nãoseafiguratão
simplesassim.
Como sabemos, existe uma relativa independência entre os juízos cível e
criminal,demaneiraque,casoomagistrado,encarregadodeexaminaraexclusão
sucessória, tenha fundada dúvida acerca da autoria (e participação) ou da
materialidade do fato, deverá, em nosso sentir, reconhecer a prejudicialidade,
paraaguardarodesfechodalidenaesferapenal 211.
Mas, não havendo robusta dúvida sobre esse aspecto, ou não tendo sido
tempestivamente proposta a ação penal correspondente, poderá e deverá o juiz
apreciarimediatamenteopedidoformuladonojuízocível.
Se,todavia,posteriormente,asentençapenalabsolutória—quehajanegadoa
autoria ou amaterialidade do fato— passar em julgado, o sucessor excluído,
infelizmente, não terá em seu favor um amparo legal específico entre os
fundamentos contidos no dispositivo que regula a ação rescisória (art. 966 do
CPC/2015 212),oque,poróbvio,acarretaindesejávelinsegurançajurídica.
Trata-se de uma decorrência da postura que propugna pela mais ampla
segurançajurídicanapreservaçãodacoisajulgada,protegidaconstitucionalmente
(art. 5.º, XXXVI, CF/88 213), o que, porém, gera um sentimento de injustiça e
insatisfação, na evidente contradição entre as mencionadas manifestações —
autônomaseindependentes—dosjuízoscívelecriminal.
A matéria é evidentemente de reserva legal, quiçá constitucional, para se
admitirumarelativizaçãodacoisajulgada.
Todavia, sem querer “distorcer a dogmática” por conta de um sentimento
pessoal de injustiça, talvez seja possível defender uma solução intermediária
(pelo menos no prazo da ação rescisória), com uma releitura do art. 966 do
CódigodeProcessoCivilde2015(queelencaashipótesesdeaçãorescisória),
tese, porém, que, embora acolhida eventualmente pela jurisprudência
(notadamenteemquestõesrelacionadasaosexamesdeDNA 214),encontra,ainda,
resistência,prevalecendo,quasecomoumdogma,atesedeque,paravalercomo
causahábilparadesconstituiracoisajulgada,umdocumentonovoemrescisória
deveserpreexistente.
Discute-se, ainda, nesse contexto, que, posto a ação de exclusão por
indignidade verse sobre direito patrimonial disponível (direito à herança), em
virtudedagravidadedo seu fundamento,não seria razoável,naperspectivado
princípiodafunçãosocial,queaproposituradademandaestivesseobstada,caso
nãoconcorresseoutrosucessorinteressado.
Emoutraspalavras,nãopoderiaoMinistérioPúblico,naatuaçãodefensivada
própria sociedade, dada a impactante e profunda repercussão de um fato de
tamanhagravidade,ingressarcomamedidacabível?
DependeriaoórgãoMinisterialdeumaeventualmanifestaçãodeinteresseda
Fazenda Pública, como sucessor anômalo 215, para ingressar com o pedido de
exclusão?
Hoje, sob o prisma do nosso direito positivo, o ajuizamento da ação de
exclusãodeherdeirooulegatárioporindignidadepressupõeainiciativadeoutro
sucessor,hajavistaenvolverinteressepatrimonial.
Todavia,comovisto,talveznãosejaestaamelhorsolução 216.
Para pôr fim a esta celeuma, o Projeto de Lei do Senado n. 118/2010 217
pretende, expressamente, reconhecer ao Ministério Público legitimidade para
pedir a exclusão por indignidade, contornando, assim, omissão do direito bra-
sileiroaindavigente,conformeaagênciaestatalacimamencionada:
“AComissão deConstituição, Justiça eCidadania (CCJ) aprovou emdecisão terminativa, nesta quarta-
feira(16),mudançasnosdispositivosdoCódigoCivil(Lei10.406/02)quetratamdaexclusãodeherdeiros
considerados indignos e dos declarados deserdados. O projeto permite que tanto o Ministério Público
quanto pessoas que tiverem legítimo interesse moral na causa entrem com ações para declarar um
herdeirocomosendoindigno—e,assim,excluí-lodaherança.Aindasegundooprojeto,essedireitoacaba
emdoisanos,contadosdoiníciodasucessãooudaaberturajudicialdotestamento.Hoje,somenteaqueles
quetêminteresseeconômiconasucessãopodemproporaação”.
Emais:
“Apropostaampliaoalcancedoinstitutodaindignidadesucessória,explicouorelator,paraprivardodireito
àherançanãoapenasherdeirosoulegatáriosindignos—assimconsideradosporterematentado,praticado
ouestaremenvolvidosematocontraavida,ahonra,adignidadesexual,aintegridadefísica,aliberdadeou
opatrimôniododonodaherança.Deacordocomaproposta, tambémpassamaserdeclaradas indignas
pessoas que desfrutariam indiretamente dessa herança e são acusadas de cometer algum dos crimes
descritoscontraopossuidordopatrimônio.
Outra inovação importante da proposta impede a sucessão direta ou indireta por indignidade a quem
abandonar ou desamparar economicamente o detentor da herança, sem justa causa. Por acréscimo do
relator,esseimpedimentoéestendidoaocasodeausênciadereconhecimentovoluntáriodepaternidadeou
maternidadedofilhoduranteamenoridadecivil.
Seriam tomados ainda como causa de indignidade sucessória os atos de furtar, roubar, destruir, ocultar,
falsificaroualterarotestamentododonodaherança,incorrendonamesmapenaaqueleque,mesmonão
tendosidooautordiretoouindiretodequalquerdessesatos,fizerusoconscientededocumentoirregular.
Após ajuste da relatoria, o projetopassou a estabelecer que essa restrição seja determinadanão sópor
sentençadadanoprocessodeinventário,mastambémpordecisãojudicialanterior,vinculadaaaçãocível
oucriminalemqueacondutaindignatenhasidoexpressamentereconhecida” 218.
Somos favoráveis a esta mudança de perspectiva no trato da matéria,
reconhecendo-seaoMinistérioPúblicolegitimidadeparaaproposituradopedido
de exclusão, por considerarmos que o interesse patrimonial privado envolvido
não sobrepujariao sensoético socialmente exigido, especialmentenas relações
defamília.
Opanoramarevigorantetraduz,pois,maisumademonstraçãodamudançapor
quevempassandooDireitoCivil,noBrasil,especialmenteapósaConstituição
Federal de1988, no sentidoda sua reconstrução axiológica, na perspectiva da
dignidade e da promoção da pessoa humana, aspecto este que ressaltávamos
desdeaprimeiraediçãodenossovolumeI,dedicadoaoestudodaParteGeraldo
CódigoCivil:
“Se, por um lado, omovimento codificador do séc.XIXdistanciava-se doDireitoConstitucional—por
imaginar, dentro de sua perspectiva exclusivista, que todo oDireitoPrivado estaria concretizado emum
corpo monolítico, vocacionado à perenidade, e com traços de autossuficiência —, o processo
descentralizador do Direito Civil, nascido em um período de maior consciência democrática, tem, na
Constituição,oseusistemaprincipiológicosuperior,estruturadordaharmoniadoconjunto.
Nãosepode,pois,entenderoDireitoCivil—emsuasvigasfundamentais—ocontrato,apropriedade
eafamília—,semonecessáriosuportelógicodoDireitoConstitucional.
Umprende-seaooutrocomocorpoealma.
QueatentadoàformaçãodoalunocometeoProfessordeDireitoCivilqueoshabituaeescravizaalivros
antigosapenas,semdescortinarparaelesonovohorizonteabertopelaConstituiçãoFederalparaoDireito
Civil!
O CC/1916, sem diminuir a sua magnitude técnica, na sua crueza, é egoísta, patriarcal e autoritário,
refletindo,naturalmente,asociedadedoséculoXIX.
Preocupa-secomo‘ter’,enãocomo‘ser’.
Ignoraadignidadedapessoahumana,nãosecompadececomossofrimentosdodevedor,esmagaofilho
bastardo,faz-sededesentendidonoquetangeaosdireitoselitígiospelapossecoletivadeterras,e,oqueé
pior,imaginaqueaspartesdeumcontratosãosempreiguais.
Por tudo isso, a Constituição Federal, consagrando valores como a dignidade da pessoa humana, a
valorização social do trabalho, a igualdade e proteção dos filhos, o exercício não abusivo da
atividadeeconômica,deixadeserumsimplesdocumentodeboas intenções,epassaaserconsiderada
um corpo normativo superior que deve ser diretamente aplicado às relações jurídicas em geral,
subordinandotodaalegislaçãoordinária” 219.
EsteéoDireitoCivilquequeremosparaestenovoséculo.
2.1.2.Delitoscontraahonra
Não apenas a vida,mas também a imagem e a honra integram o patrimônio
moraldecadaindivíduo,merecedordamaisjustatutelaconstitucional.
Trata-se, pois, de valores atinentes ao âmbito de proteção e amparo dos
direitosdapersonalidade,nasuperiorperspectivadoprincípiodadignidadeda
pessoahumana.
Sobreodireitoàhonra,escrevemosemnossovolumededicadoaoestudoda
ParteGeral 220:
“Umbilicalmente associada à natureza humana, a honra é um dos mais significativos direitos da
personalidade,acompanhandooindivíduodesdeseunascimento,atédepoisdesuamorte.
Poderámanifestar-sesobduasformas:
a)Objetiva: correspondente à reputação da pessoa, compreendendo o seu bom nome a fama de que
desfrutanoseiodasociedade;
b)Subjetiva:correspondenteaosentimentopessoaldeestimaouaconsciênciadaprópriadignidade.
Trata-se, também, de umdireito da personalidade alçado à condição de liberdade pública, comprevisão
expressanoincisoXdoart.5.ºdaCF/88,inverbis:
‘X—sãoinvioláveisaintimidade,avidaprivada,ahonraeaimagemdaspessoas,asseguradoodireitoa
indenizaçãopelodanomaterialoumoraldecorrentedesuaviolação’”.
Noquetocaaodireitoàimagem,porseuturno,anotamos:
“Segundo a metodologia de classificação que reputamos mais adequada, o direito à imagem deve ser
elencadoentreosdireitosdecunhomoral,enãoaoladodosdireitosfísicos.Issoporque,apardetraduzir
aforma plástica da pessoa natural, os seus reflexos, principalmente em caso de violação, sãomuito
maissentidosnoâmbitomoral,doquepropriamentenofísico.
A garantia de proteção à imagem, como se verifica do último dispositivo constitucional transcrito, é
considerada,também,umdireitofundamental.
Mascomoseconceituaaimagem?
A imagem, emdefinição simples, constitui aexpressão exterior sensível da individualidade humana,
dignadeproteçãojurídica.
Paraefeitosdidáticos,doistiposdeimagempodemserconcebidos:
a)imagem-retrato—queéliteralmenteoaspectofísicodapessoa;
b)imagem-atributo—quecorrespondeàexteriorizaçãodapersonalidadedoindivíduo,ouseja,aforma
comoeleévistosocialmente”.
Nessa linha de intelecção, o art. 1.814, II, do Código Civil de 2002, sob
comento, tambémprescreve como ato de indignidade o cometimento dedelitos
contra a honra (calúnia, injúria ou difamação) 221 — e que, por extensão,
tambémvulneramaimagemdoofendido—,equepoderáresultarnaimposição
depenadeexclusãosucessória.
Em nosso sentir, a expressão “acusação caluniosa” também contempla a
denunciação prevista no art. 339 do Código Penal, delito de gravidade mais
acentuada,pois,alémdevulneraropatrimôniomoraldoofendido,tambématenta
contraaprópriaAdministraçãoPública,namedidaemqueoofensordá“causaà
instauração de investigação policial, de processo judicial, instauração de
investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade
administrativa” contra o autor da herança, “imputando-lhe crime de que o sabe
inocente”.
Note-se que, neste caso,mais doqueuma imputação falsa de fato criminoso
(calúnia),oofensormovimentaindevidamenteoaparatoestatal,nabuscadeuma
persecuçãocriminalquesesabeinfundada.
Eofatodetambémcontemplar-seodelitoemtela(denunciaçãocaluniosa)não
significa estar-se utilizandoométodode interpretação extensiva— inaplicável
por tratar-se de norma sancionatória —, mas sim, tão somente, que se busca
alcançar o âmbito de previsão normativa, nos limites da sua própria dicção, e
segundoumaperspectivalógicaedebomsenso.
2.1.3.Violênciaoufraude
Finalmente, encerra o rol de causas de exclusão a prática de violência ou
fraudecontraoautordaherança,aptaainibirouobstaralivremanifestaçãode
vontadedofalecido.
Defato,considerando-sequeaautonomiaprivada tambémsefazpresenteno
âmbitodoDireitoSucessório,mormentenapreservaçãodalivremanifestaçãode
vontade do autor da herança, o que pode ser considerado da essência da
principiologia doDireito das Sucessões 222, quaisquer atos que impeçam o seu
exercíciodeverãoser,poróbvio,firmementerechaçados.
Assim,casoumdossucessoreshajacometidoatosdeviolênciafísicaoumoral
para se beneficiar ou impedir a plena exteriorização do ato de última vontade,
deverá,pormedidadejustiça,serexcluídodarelaçãosucessória.
Os atos violentos podem se subsumir ao conceito de “coação”, estudado na
TeoriaGeraldoDireitoCivil 223.
Noâmbitodosdefeitosdadeclaraçãonegocial,entende-secomocoaçãocapaz
deviciaroconsentimentotodaviolênciapsicológicaaptaainfluenciaravítima
arealizarnegóciojurídicoqueasuavontadeinternanãodesejaefetuar.
Arespeitodotema,manifesta-seFRANCISCOAMARAL:
“acoaçãoéaameaçacomqueseconstrangealguémàpráticadeumatojurídico.Ésinônimodeviolência,
tantoqueoCódigoCivilusaindistintamenteosdoistermos(CC,arts.147,II,1.590,1.595,III).Acoação
nãoé,emsi,umvíciodavontade,massimotemorqueelainspira,tornandodefeituosaamanifestaçãode
querer do agente. Configurando-se todos os seus requisitos legais, é causa de anulabilidade do negócio
jurídico(CC,art.147,II)” 224.
Conformemencionadoacima,sãodoisostiposdecoação:
a)física(“visabsoluta”);
b)moral(“viscompulsiva”).
Acoaçãofísica(“visabsoluta”)éaquelaqueagediretamentesobreocorpo
davítima.Adoutrinaentendequeestetipodecoaçãoneutralizacompletamentea
manifestaçãodevontade,tornandoadeclaraçãodevontadeinexistente.
TambémnoDireitoPenal,seocoatorempregarenergiacorporalparaforçaro
indivíduoacometerumfatodelituosocontraterceiro,acondutadocoagidoserá
considerada atípica, respondendo criminalmente apenas aquele que exerceu a
coação física. Note-se que esta espécie de violência não permite ao coagido
liberdadedeescolha,poispassaasermeroinstrumentonasmãosdocoator.
A coação moral (“vis compulsiva”), por sua vez, é aquela que incute na
vítimaumtemorconstanteecapazdeperturbarseuespírito,fazendocomque
elamanifesteseuconsentimentodemaneiraviciada.
Nesta hipótese, a vontade do coagido não está completamente neutralizada,
mas, sim, embaraçada, turbada, viciada, pela ameaça que lhe é dirigida pelo
coator 225.
Emqualquerdashipóteses,quertenhahavidocoaçãofísicaoumoralcontrao
autordaherança,valedizer,“apráticadeatosdeviolência”,capazdeinibirou
obstar a sua livre manifestação de vontade, impõe-se a aplicação, a título
punitivo,damedidadeexclusãodaherançaporindignidade.
Tambéma“fraude”poderáresultarnaimposiçãodemesmamedida.
Emnosso sentir,quandoo inciso IIIdoart.1.814utilizaaexpressão“meios
fraudulentos”,ofaznosentidodeabarcartodasituaçãoemqueoautordaherança
haja sido dolosamente enganado ou ludibriado, pelo ofensor, com o escopo de
impedirasuamanifestaçãolivredevontade.
Vale dizer, o conceito de fraude aí empregado encontra-se umbilicalmente
conectadoànoçãodedolo,poisoqueolegislador,emverdade,pretendeu,fora
coibirodesideratoespúriodaqueleque,envenenadopelamá-fé,induziuotitular
daherançaapraticaratoemfalsocontextofático,captando,assim,dolosamente,
asuavontade.
Éocasodaenfermeiraque,aolongodosúltimosmesesdevidadotestador,o
induzacrerqueoseufilhohouvessemorrido,paraqueelamesmafigurassecomo
beneficiáriadaherança.
Outrahipóteseéaquelaemqueumdosherdeirossubtraiedestróiotestamento,
ou,ainda,alteraoufalsificaodocumento,paraque,assim,recebaparcelamaior
daherança.
Emalgunscasos,porém,nãosepoderádaraexclusãodoherdeiro,quando,por
exemplo,destróitestamentonulo 226.
Trata-sedeumaposiçãodoutrináriacompreensível.
Nãosoboprismapsicológico,damá-fédoagente,mas,sim,sobaperspectiva
eficacial do próprio ato jurídico, namedida em que a conduta reprovável não
geraria repercussão jurídicaalguma, talcomosedá,emtermossemelhantes,no
DireitoPenal,nodenominado“crimeimpossível” 227.
2.2.Efeitosdaexclusãoporindignidade
Por se tratar de uma sanção, são pessoais os efeitos da exclusão por
indignidade, de maneira que os descendentes do herdeiro excluído sucedem,
comoseelemortofosseantesdaaberturadasucessão(art.1.816doCC).
Umexemploiráaclararahipótese.
Imagine-sequeAfonso,irmãodePedroeDolores,houvessesidoexcluídoda
sucessãodoseupai,Mário,porhavercometidocrimecontraasuahonra.Uma
vezoperadaaexclusão,aquota-partedoofensor(1/3)acresceráoquinhãodos
coerdeiros (Pedro e Dolores), ressalvada a hipótese de Afonso haver deixado
filhos, caso em que estes herdarão a cota do excluído, por direito de
representação.
Earazãoésimples.
Como dito acima, a exclusão por indignidade é uma pena, ainda que de
naturezacivil.Ecomotalnãopodepassardapessoadoofensor.
Assim,osfilhosdeAfonsofarãojusàcotadoexcluído(1/3),concorrendo,por
estirpe,emfacedosdemaisherdeiros,seustios,PedroeDolores.
Umdetalhe,noentanto,mereceserressaltado.
Olegisladorfoiatento,poisoexcluídodasucessãonãoterádireitoaousu-
frutoouàadministraçãodosbensqueaseussucessorescouberemnaherança,
nem à sucessão eventual desses bens (parágrafo único do art. 1.816 do
CC/2002).
Ouseja,osbensqueforamnegadosaoexcluídonãopoderãofavorecê-lo(nem
nacondiçãoderepresentantelegaldosbeneficiários),nemaeleretornarem(por
nova relação sucessória), por expressa disposição de lei: no exemplo dado,
Afonsonãopoderáusufruirouadministrarosbens transferidos aos seus filhos,
enquanto menores ou incapazes, e, bem assim, em caso de morte deles, não
poderáherdá-los.
Trata-sedenormaquemantémalógicadoinstitutopunitivooraestudado.
3.TEORIADOHERDEIROAPARENTE
Antesdeiniciarmosaabordagemdotemaemnívelteórico,valeapena,atítulo
derevisão,estabelecermosaconexãoentreoinstitutodoherdeiroaparenteeo
princípiodaboa-fé.
Issoporqueéadimensãoéticadocomportamentosocialdoherdeiroque,em
nível principiológico, justifica, veremos logo mais, a proteção que se confere
àquele(s)queatuou(aram)comcorreçãoehonestidade.
Trata-sedaaplicaçãodeumprincípiogeraldoDireito,queconsideramosde
vitalimportânciaparaoestudodaprincipiologiadoDireitodasSucessões 228.
Nessecontexto,analisandoesseprincípioemsuainterfacecomoinstitutodo
herdeiroaparente,faz-senecessárioqueestabeleçamosumadiagnosediferencial
entreaboa-féobjetivaeaboa-fésubjetiva.
Esta última, de todos conhecida por estar visivelmente presente no Código
Civil de 1916 um estado de ânimo ou de espírito do agente que realiza
determinado ato ou vivencia dada situação, sem ter ciência do vício que a
inquina.
Em geral, esse estado subjetivo deriva do reconhecimento da ignorância do
agente a respeito de determinada circunstância, como ocorre na hipótese do
possuidordeboa-féquedesconheceovícioquemaculaasuaposse.Nessecaso,
oprópriolegislador,emváriosdispositivos,cuidadeampará-lo,nãofazendoo
mesmo, outrossim, quanto ao possuidor de má-fé (arts. 1.214, 1.216, 1.217,
1.218,1.219,1.220,1.242doCC).
Distingue-se,portanto,daboa-féobjetiva,aqual, tendonaturezadeprincípio
jurídico—delineadoemumconceitojurídicoindeterminado—,consisteemuma
verdadeiraregradecomportamento,defundoético,eexigibilidadejurídica.
No caso do herdeiro aparente, avulta, sem sombra de dúvidas, o aspecto
subjetivodaboa-fé.
Nesse sentido, confira-se o art. 1.817, caput e parágrafo único, do vigente
CódigoCivilbrasileiro:
“Art.1.817.Sãoválidasas alienaçõesonerosasdebenshereditáriosa terceirosdeboa-fé, eosatosde
administração legalmente praticados pelo herdeiro, antes da sentença de exclusão; mas aos herdeiros
subsiste,quandoprejudicados,odireitodedemandar-lheperdasedanos.
Parágrafoúnico.Oexcluídoda sucessãoéobrigadoa restituiros frutose rendimentosquedosbensda
herançahouverpercebido,mastemdireitoaserindenizadodasdespesascomaconservaçãodeles”.
O terceiro inocente que, por exemplo, celebra com o herdeiro (indigno)
contratodeprestaçãodeserviçosparaaconservaçãodebensdaherança,fazjus
àremuneraçãocontratada.
Da mesma forma, se, mediante autorização judicial, determinado bem,
componente do acervo hereditário, é vendido pelo herdeiro e inventariante
(indigno)aumterceirodeboa-fé,aalienaçãoéválida.
Emoutraspalavras,naperspectivadoprincípiodaboa-féedaprópriateoria
daaparência, nãopodemserprejudicados aquelesque, amparadosna legítima
expectativa da qualidade de herdeiro, firmam com este uma relação negocial
juridicamentepossível.
Por fim, note-se que, uma vez excluído da relação sucessória, o herdeiro
indigno é obrigado a restituir os frutos e rendimentos dos bens da herança que
houver percebido, embora tenha o direito de ser indenizado pelas despesas de
conservação,naperspectivadaregraquevedaoenriquecimentosemcausa.
4.PERDÃODOINDIGNO
A teor do art. 1.818 do Código Civil, “aquele que incorreu em atos que
determinemaexclusãodaherançaseráadmitidoasuceder,seoofendidootiver
expressamentereabilitadoemtestamento,ouemoutroatoautêntico”.
Admite-se, com isso, o perdão do herdeiro indigno, desde que o autor da
herançaofaçaexpressamente,mediantedeclaraçãonotestamento,oupormeiode
qualqueroutroinstrumento,públicoouparticular.
Poderá,assim,perdoaro filhoqueocaluniou,pormeioda lavraturadeuma
escriturapública,oumedianteaconfecçãodeumsimplesdocumento(como,por
exemplo,umacartaouume-mail,oumesmoumagravaçãodigitaldeáudioou
vídeo),desdequenãohajadúvidafundadaquantoasuaautenticidade.
Por isso, as declarações feitas pela via eletrônica — posto sejam uma
realidadeinafastáveldanossa“pós-modernidade”—exigemredobradacautela,
dadaavulnerabilidadenotóriaafraudesdevariadaordem.
Caso não tenha havido reabilitação expressa, o indigno poderá, em nosso
sentir, sucederno limitedadisposição testamentária, seo testador, ao testar, já
conheciaacausadaindignidade:trata-sedochamadoperdãotácito.
Poróbvio,operdãodoofendido,quersejaexpressooutácito,deveráserlivre,
isentodevícios,comoacoaçãoeodolo,sobpenadeserinvalidado,segundoas
regrasgeraisdeinvalidadedoatojurídico.
5.DESERDAÇÃO
Noesforçodesistematizaçãoteórica,parece-nosevidente,comojádito,que,
em um capítulo que trata da exclusão da sucessão, sejam abordados
conjuntamenteostemasdaindignidadeedadeserdação,mesmosendoestaúltima
situaçãoaplicávelestritamenteàSucessãoTestamentária.
Trata-se de matéria disciplinada pelos arts. 1.961 a 1.964 da vigente codi-
ficação,que,aqui,seráanalisada.
Vamosaela!
5.1.Introduçãoebrevehistórico
Adeserdaçãotambémtemporfinalidadeaexclusãodarelaçãosucessória.
ODireitoRomano já a conhecia, conforme anotaMAXKASER, em erudita
obra:
“Segundoo juscivile, o testador temde instituiroudeserdaros seussuiheredes; não pode preteri-los
(praeterire).
1. Os filhos que estão sob o seu poder ao tempo da feitura do testamento têm de ser individual e
nominalmentedeserdados,nominatimexheredare,p.ex.:‘Titius filiusmeusexheresesto’: Se um filho
forpreterido,todootestamentoénulo(...)” 229.
Sobreasorigenshistóricasdadeserdação,ensinaSÍLVIOVENOSA:
“Indica-se aexheredidatio comoo primeiro ato solene de despojamento da herança do filho, comoum
castigo imposto pelo pai e como forma necessária de preparação para o pater adotar um estranho.
Posteriormente, essa forma de deserdação converteu-se em uma simples declaração testamentária que
serviaparaexcluircertosherdeirosdasucessão(Arangio-Ruiz,1973:615).
Asformaseconsequênciasdadeserdaçãoeramdiversassedirigidasaumfilho,ouumafilha,ouaoutros
herdeiros. Pelas fontes parece que podemos concluir que as deserdações abusivas eram raras e, nesse
caso,cabiaaopretordeixarintactaaordemlegítimadaherança.Haviagrandemargemdedecisãoparao
pretordecidirnocasoconcreto.Somentenaépocaimperialéqueseconcedeaçãocontraadeserdação
injusta(querelainofficiositestamenti),numaépocaemqueRomajávivianacorrupçãoedissoluçãode
costumes. Não se consegue fixar corretamente a origem dessa ação, parecendo ter sido trazida dos
costumesgregos.Jáporessa‘querela’nãosecolocavaoherdeirocomobeneficiáriodotestamento,mas
anulava-setodootestamento.
Nodireitojustinianeu,naNovela115,jáestácriadaumaherançalegítima.Qualquerdeserdaçãodeviaser
feita nominalmente, baseada em casos descritos na lei, inspirados sobretudo na ideia de ingratidão. O
exercício da querela ficava restrito aos descendentes e ascendentes, aos irmãos e irmãs, quando eram
excluídosembenefíciodepessoa torpe (Arangio-Ruiz,1973:619).Nessaépoca,então,adeserdaçãosó
erapossívelquandocolocadanotestamentoejustificadapormotivosexpressoseplausíveis,cujadiscussão
ficava sempre aberta aoherdeiro legítimo.A expressãomodernada indignidade e deserdação já estava
desdeessaépocadesenhada” 230.
Tambémodireitopositivobrasileirocuidadedisciplinarotema,adaptando-o
aosnossosdias.
Trata-sedeinstitutoinseridonoCapítuloXdo“TítuloIII”,dedicadoaoestudo
da Sucessão Testamentária, visto que, para se operar, exige que o autor da
herança,portestamento,hajaaplicadoapenadeexclusãoaosucessorquecontra
si cometera atos graves, descritos nos arts. 1.962 e 1.963 do CódigoCivil de
2002.
Note-se, pois, que somente haverá interesse em deserdar os herdeiros
necessários, uma vez que todas as demais pessoas (herdeiros eventuais ou
facultativos)poderão,simplesmente,nãoserbeneficiadosportestamento.
Comisso, temosque,emboraanaturezaosaproxime,o institutodaexclusão
por indignidade, estudado linhas acima, tem alcance mais amplo, porquanto
independe de testamento, podendo se aplicar em face de qualquer sucessor,
legítimooutestamentário 231.
Delimitemos,pois,conceitualmenteoinstituto.
5.2.Conceito
Detudoqueexpusemosatéaqui,podemosconceituaradeserdaçãocomouma
medida sancionatória e excludenteda relação sucessória, impostapelo testador
ao herdeiro necessário que haja cometido qualquer dos atos de indignidade
capituladonosarts.1.962(queremeteaoart.1.814)e1.963doCódigoCivil.
NoensinamentodeORLANDOGOMES:
“Deserdaçãoéaprivação,pordisposiçãotestamentária,dalegítimadoherdeironecessário.
SuaexclusãoporessemodoéautorizadaemnossoDireito,masoutraslegislações,emmaioria,aboliram-
naoinstituto,nãoapenasporodiosa,mas,também,porinútil,emfacedasregrasrelativasàindignidade.
Entretanto, não se confundem. A deserdação regula-se na sucessão testamentária, por isso que só em
testamento pode ser ordenada.A indignidade é o instituto da sucessão legítima.A indignidade pode ser
motivada em fatos posteriores à morte do autor da herança, ao passo que a deserdação só em fato
ocorrido durante a vida do testador. Mais extenso é o campo da aplicação daquele, pois podem ser
declarados indignososherdeiros legítimos semexceção, istoé,osdescendentes, ascendentes, cônjugee
parentescolaterais,enquantoadeserdaçãoserestringeaosherdeiroslegitimários,istoé,aosdescendentes,
ascendenteseaocônjuge.Contemplam-se,ademais,casosdedeserdaçãoquenãoseincluementreosde
indignidade. Por tais motivos, julgam alguns ser conveniente tratar separadamente as duas espécies.
Outros,porém,consideramdesnecessáriaaduplicidade,nãosomenteporqueadeserdaçãopertence,em
essência, à sucessão legítima, mas, sobretudo, porque, conforme procedente observação de Clóvis
Beviláqua, os efeitos legais da indignidade bastam para excluir da herança os que realmente não a
merecem.Certoéqueoinstitutodadeserdaçãonãoteveaplicaçãoprática,justificando-sesuaablaçãodo
Código” 232.
Entendemos, pois, nesse contexto, que, em sentido lato, também as hipóteses
previstas nos arts. 1.962 e 1.963 podem ser qualificadas como “atos de
indignidade”.
Conheçamos,portanto,ashipóteseslegaisjustificadorasdadeserdação.
5.3.Hipóteseslegaisdedeserdação
Por se tratar de situações referidas em um testamento, parece-nos óbvio
salientar, de início, que somente se pode falar de deserdação referente a fatos
ocorridosanteriormenteàsuacelebração 233.
Sobreashipóteseslegaisdedeserdação,dispõeonossoCódigo:
“Art. 1.961.Os herdeiros necessários podem ser privados de sua legítima, ou deserdados, em todos os
casosemquepodemserexcluídosdasucessão.
Art. 1.962.Alémdas causasmencionadas no art. 1.814, autorizam a deserdação dos descendentes por
seusascendentes:
I—ofensafísica;
II—injúriagrave;
III—relaçõesilícitascomamadrastaoucomopadrasto;
IV—desamparodoascendenteemalienaçãomentalougraveenfermidade.
Art. 1.963.Além das causas enumeradas no art. 1.814, autorizam a deserdação dos ascendentes pelos
descendentes:
I—ofensafísica;
II—injúriagrave;
III — relações ilícitas com a mulher ou companheira do filho ou a do neto, ou com o marido ou
companheirodafilhaouodaneta;
IV—desamparodofilhoounetocomdeficiênciamentalougraveenfermidade”.
Ashipótesesaídescritas,emgeral,dispensariamexplicaçãomaisdetida,dada
asuafácilintelecção.
Valeregistrar,porém,queovigenteCódigoCivilbrasileiroexcluiudoroldas
causas de deserdação dos descendentes a “desonestidade da filha que vive na
casapaterna”,previstanoart.1.744, III,doCC/1916,dispositivo incompatível
com a igualdade entre os sexos e de tratamento entre filhos, propugnada pela
ConstituiçãoFederalde1988.
É de observar, todavia, que o art. 1.962 cuidou dos atos perpetrados pelos
descendentescontraosascendentes,aopassoqueoartigoseguinte,porsuavez,
analisouasituaçãoinversa.
Poderia, talvez, o legislador, haver ordenado todas essas situações em um
dispositivo único, esclarecendo, em parágrafo(s), que os atos atentatórios
admitiriam reciprocidade, ou mesmo referindo, no próprio caput, que as
hipóteses aplicar-se-iam à deserdação tanto de ascendentes como de
descendentes,oquenãoseriadedifícilcompreensão.
Masassimnãoofez,optandoporumanormatizaçãomaisextensa.
Nessecontexto,temosqueasofensasfísicas,as injúriasgraves,asrelações
amorosasousexuaisespúriaseodesamparodapessoadoentepodemjustificar
aaplicaçãodapenadedeserdação.
Atenção especial merece a hipótese do desamparo, que poderá ser “do
ascendente em alienaçãomental ou grave enfermidade” (art. 1.962, IV), ou do
“filhoounetocomdeficiênciamentalougraveenfermidade”(art.1.963,IV).
Chamaanossaatençãoofatode,nosegundocaso,haverolegisladorperdidoa
oportunidade de utilizar a expressão “descendente”, preferindo se limitar à
categoria dos filhos e à dos netos, talvez pela constatação fática da pouca
ocorrênciadeconvivênciaentrebisavósebisnetos,oquemereceserrepensado
diantedoavançodamedicinaedoaumentodaexpectativamédiadevida.
Outroaspectode relevoéamençãoàexpressão“deficiênciamental”noart.
1.963, IV, emdescompasso como dispositivo anterior, que preferiu “alienação
mental”.Seadistinçãofoiintencional,pensamosque,emvezdesalutar,primou
por incrementar o lamentável risco da insegurança jurídica, pela injustificada
ausênciadeuniformidadenotratamentodesituaçõesequiparadas.
Analisando o dispositivo por outra ótica, observa CARLOS ROBERTO
GONÇALVES,emsuabelaobra:
“E o inciso IV ganhou redação aperfeiçoada, mais condizente com a moderna psiquiatria, usando a
expressão ‘deficiência mental’ no lugar de ‘alienação mental’. Sem dúvida, o desamparo diante da
deficiência mental ou grave enfermidade de um descendente, cometida pelo ascendente, em geral
possuidor de maiores recursos financeiros, revela-se mais grave e repulsivo do que a idêntica conduta
omissivadodescendente” 234.
Poderia, talvez, o legislador, optando por uma expressão aperfeiçoada,
uniformizaradicçãolegal.
Por fim, temos que a noção de desamparo— tanto do ascendente como do
descendenteenfermo—tambémpodesesubsumirnanoçãomaiorde“abandono
afetivo”.
Este tema, aliás, tem despertado, nos últimos anos, a atenção dos civilistas,
comojátivemosaoportunidadedeescrever:
“Umdos primeiros juristas a tratar do assunto foi o talentosoRODRIGODACUNHAPEREIRAque,
analisando o primeiro caso a chegar em umaCorte Superior brasileira, asseverou: Será que há alguma
razão/justificativa para um pai deixar de dar assistência moral e afetiva a um filho? A ausência de
prestação de uma assistência material seria até compreensível, se se tratasse de um pai totalmente
desprovido de recursos.Mas deixar de dar amor e afeto a um filho... não há razão nenhuma capaz de
explicartalfalta.
Oreferidolitígiocuidou,fundamentalmente,daseguintediscussão:seoafetoseconstituiriaemumdever
jurídico,deformaqueanegativainjustificadaedesarrazoadacaracterizariaumatoilícito.
Ospartidáriosdatesedefendemaideiadeumapaternidade/maternidaderesponsável,emqueanegativa
deafeto,gerandodiversassequelaspsicológicas,caracterizariaumatocontrárioaoordenamentojurídicoe,
porisso,sancionávelnocampodaresponsabilidadecivil.
Jáaquelesquesecontrapõemàtesesustentam,emsíntese,queasuaadoçãoimportariaemumaindevida
‘monetarizaçãodoafeto’,comodesvirtuamentodasuaessência,bemcomoaimpossibilidadedeseaferir
quantidade e qualidade do amor dedicado por alguém a outrem, que deve ser sempre algo natural e
espontâneo,enãoumaobrigaçãojurídica,sobcontroleestatal” 235.
Ora, se, no campoda responsabilidade civil, amatéria aindadesperta acesa
polêmica,pensamosque,aquinasearasucessória,nãohádúvidanosentidodese
poderconsideraroabandonoafetivodoascendenteoudescendentedoente,causa
dedeserdação,umavezqueasituaçãofáticadescritaenquadra-seperfeitamente
noconceitoabertocodificado.
5.4.Procedimento
Porsetratardeumasançãocivil,adeserdaçãonãoadmitedicçãogenéricaou
expressãoabstrata.
Issoporque,somentecomexpressadeclaraçãodecausa,podeadeserdaçãoser
ordenadaemtestamento(art.1.964doCC).
Claroquenãoseexigedotestadorconhecimentotécnicoespecializadoquelhe
permitaapontarosartigosdoCódigoCivilqueamparamasuadeclaração.Masé
indispensávelque,dainterpretaçãodotestamento,resteclaraelivrededúvidasa
situação que justificou a exclusão sucessória, subsumível em um dos
retromencionadosdispositivosdoCódigoCivil.
Assim,nãohácomosefalaremdeserdaçãoimplícita.
Abertaarelaçãosucessória,comamortedo testador,seránecessário,ainda,
queoherdeiro instituídooubeneficiário,mediante açãoprópria—quedeverá
tramitarnoprópriojuízodoinventárioouarrolamento—,proveaveracidadeda
causaalegadapelotestador(art.1.965doCC).
Oprazoparaoexercíciododireitopotestativoédecadencialdequatroanos,a
contardaaberturadotestamento,coincidindocomomesmoprazoparaaaçãode
exclusãodeherdeirooulegatárioporindignidade(parágrafoúnicodoart.1.815
doCC/2002),oqueressaltaaproximidadedosinstitutos.
Findo o prazo ou julgado improcedente o pedido, restará sem efeito a
deserdaçãoimpostanotestamento.
5.5.Efeitosdedeserdaçãoedireitoderepresentação
Conforme jámencionamos anteriormente, os efeitos da exclusão do herdeiro
porindignidadesãopessoais,naformadoart.1.816doCC 236.
Eoquedizerdadeserdação?
Hádivergêncianadoutrina.
Com efeito, o texto codificado nada menciona acerca dos efeitos da
deserdação.
Seriatalomissãoproposital?
A resposta é fundamental para abordar o importante tema dos efeitos da
deserdaçãoparaoexercíciodeeventualdireitoderepresentação 237.
E,defato,adoutrinadivergeseéounãopossívelaosucessordodeserdado
herdarpordireitoderepresentação.
Optando por uma visão restritiva, tem-se o posicionamento do grande
WASHINGTONDEBARROSMONTEIRO:
“Notocanteaodeserdado,porém,diversificaasituação.Nãosóéeleexcluído,comotambémosãoseus
descendentes.Odireitopré-codificadorealmenteexcluíadasucessãoosherdeirosdodeserdadoeassim
tambémoCódigoCivilde1916.
A essa conclusão se chegava ante a consideração de que oCódigoCivil de 1916 não fazia referência,
quanto àdeserdação, a efeitoprevistoda indignidade, que excluía daherançaos sucessoresdo indigno.
Ademais, a lei revogada, ao excluir o usufruto, bem como da administração dos pais, certos bens
pertencentes aos filhosmenores, só se reportava à indignidade, sem qualquer referência à deserdação.
Ora,crucialnãoseriaqueodeserdadopudesseexerceraquelesatributosdopátriopodercomrelaçãoaos
bens da herança de que havia sido excluído. A falta de referência à deserdação, ao contrário do que
sucediacomaindignidade,indicavapositivamenteque,naquelecaso,nãorecolhiamaherançaosherdeiros
dodeserdado.Reconheça-se,todavia,queaopiniãoprevalecenteeraemsentidocontrário” 238.
EmsentidodiametralmenteopostoéoensinamentodeORLANDOGOMES:
“Entendem-se pessoais os efeitos da deserdação. Consideram-na pena, inferindo deste caráter que não
pode alcançarosdescendentesdoherdeiro culpado:nullum patris delictum innocenti filio poena est.
Realmente,nãodevemosfilhosserpunidospelaculpadospais.
Contudo,nãoépacífico,entrenós,esseentendimento.Argumenta-seque,nãocontendoaleinocapítulo
dadeserdaçãodisposiçãoqueatribuaaosdescendentesdoherdeiroexcluídoodireitodesucessãocomose
elemortofosse,nãopodemrecolheraherançadodeserdado.Passariaaosdemaisherdeirosdotestador.
Predomina,noentanto,aopiniãodiversa.Aplica-se,poranalogia,aregrainstituídaparaocasodeexclusão
porindignidade.Teminteirocabimentotalrecursodeinterpretação,porqueosdoistítulosseassemelhame
colimam o mesmo fim, conquanto diversos os processos de exclusão do herdeiro. Atenta, ademais, à
circunstância de que se tem a deserdação como uma pena civil, justifica-se, por um princípio geral de
direito, limitarseusefeitosàpessoadodeserdado.(RA)Perdeuolegisladoraoportunidadedepôrfimà
polêmica existente, causada por uma omissão no texto revogado fartamente criticada pela doutrina e
jurisprudênciae,que,certamente,poderiatersidoreparadanonovotexto(RA)” 239.
Diantedadivergênciadoutrinária,cabe-nosexpornossoposicionamento.
Eele,semdúvida,énosentidodelimitarosefeitosdadeserdaçãoàpessoado
deserdado,reconhecendo-se,aosseussucessores,odireitoderepresentação,tal
comosedánaexclusãoporindignidade(art.1.816).
Comefeito,parece-nosexageradoampliarosefeitosdadeserdaçãoaos seus
herdeiros,pois,se,porumlado,reconhecemosagravidadedacondutadele,por
outro,nãoconsideramospossívelseestenderosefeitosdaresponsabilidadeaele
imputada.
Observe-se que, se, em vez de deserdado, tivesse elemorrido, poderiam os
seus herdeiros habilitar-se normalmente, no exercício do direito de
representação,que,comovisto,seráestudadomaisadiante.
Ora,nãoé razoável imaginarque,paraalguém, fossemelhorqueumparente
seutivessemorridodoquepermanecessevivo...
A limitação dos efeitos, além de se mostrar mais justa e adequada ao
posicionamento majoritário da doutrina 240, demonstra a proximidade — aqui
diversasvezesjásalientada—entreosinstitutosdaexclusãoporindignidadee
dadeserdação.
5.6.Consideraçõesfinais
Por tudo que vimos, podemos concluir que a deserdação é matéria que
mereceriaumaperfeiçoamentolegislativo.
A par da sua disciplina ser feita em artigos pouco uniformes, como vimos
acima,oqueresultaemprejuízodaprópriasegurançajurídica,aindarestouem
aberto o delicado problema atinente ao exercício do direito de representação
pelos sucessores do deserdado, possibilidade que consideramos perfeitamente
viável,conformeditonosubtópicoanterior.
Ademais,outragraveomissãohá.
Nãocuidou,ocodificador,de tambémincluirocônjugeno roldosherdeiros
passíveisdedeserdação.
Basta uma simples leitura dos arts. 1.961 a 1.963 para se constatar que
deserdaçãodocônjugenãoforaregulada,mesmosendoeleherdeironecessário!
E, como se trata, a deserdação, de medida punitiva, excludente da relação
sucessória, os mais comezinhos princípios de hermenêutica não autorizariam a
aplicaçãodeumcritériodeinterpretaçãoextensivaouanalógica.
Ouseja,enquantonãocontornadaaomissãolegislativa,poder-se-ia,emtese,
defender que o cônjuge pode ser “excluído por indignidade” (arts. 1.814 e s.),
mas não “deserdado” (arts. 1.961 e s.), já que não teria havido uma descrição
minuciosade causas como feitopara ascendentes edescendentes,na formados
arts.1.962e1.963doCC.
Eissoseriaumcontrassenso.
Obviamente,nãointerpretamososistemajurídicoassim.
Naprevisãodoart.1.961doCódigoCivil,háamençãodequeosherdeiros
necessários podem ser privados de sua legítima, ou deserdados, em todos os
casosemquepodemserexcluídosdasucessão.
Ora, ainda que se admita, ad argumentandum, uma autonomia entre os
institutos da indignidade e da deserdação, há de se convir que a remissão
codificadaautorizaria,inabstrato,aaplicaçãodaregradoart.1.814doCCao
cônjuge—quetambéméherdeironecessário—medianteadeserdação.
Parece-nosamelhorinterpretação.
Nessecontexto,porém,atítulodecomplementaçãodepesquisa,colacionamos
trechodocitadoProjetodeLeidoSenadon.118de2010 241, que, ao tratarda
privação da legítima, pretende contornar essa atecnia, ao tratar dos herdeiros
necessáriosemgeral,e,inclusive,consagrar,noBrasil,apossibilidadejurídica
dadeserdaçãoparcial:
“CAPÍTULOX
DAPRIVAÇÃODALEGÍTIMA
Art.1.961.Osherdeirosnecessáriospodemserprivadosdesualegítima,parcialoutotalmente,emtodos
oscasosemquepodemserimpedidosdesucederporindignidade.(NR)
Art.1.962.Oautordaherançatambémpode,emtestamento,comexpressadeclaraçãodecausa,privaro
herdeironecessáriodasuaquotalegitimária,quandoeste:
I— culposamente, em relação ao próprio testador ou à pessoa com este intimamente ligada, tenha se
omitidonocumprimentodasobrigaçõesdodireitodefamíliaquelheincumbiamlegalmente;
II—tenhasidodestituídodopoderfamiliar;
III — não tenha reconhecido voluntariamente a paternidade ou maternidade do filho durante a sua
menoridadecivil.(NR).
Art. 1.963. A privação da legítima, em qualquer dos casos, deverá ser declarada por sentença, salvo
quandohouveranteriorpronunciamentojudicial,civiloucriminal,quejátenhaexpressamentereconhecido
apráticadaconduta,bastando,nestescasos,asuajuntadaaosautosdoinventário.
§1.ºPoderádemandarjudicialmenteaprivaçãodalegítimatodoaquelequeefetivamentepossuirlegítimo
interesseeconômicooumoral,alémdoMinistérioPúblico.
§2.ºOdireitodedemandaraprivaçãodalegítimaextingue-seem2(dois)anos,contadosdaaberturada
sucessãooudotestamentocerrado.(NR)
Art.1.964.Aquelequeforprivadodalegítimaéequiparadoaoindignoparatodososefeitoslegais.(NR)
Art. 1.965. O direito de privação da legítima se extingue com o perdão, tornando ineficaz qualquer
disposição testamentárianesse sentido, seja atravésdeexpressadeclaraçãoem testamentoposterior,ou
tacitamente,quandooautordaherançaocontemplar”.(NR)
Aguardemos,portanto,aevoluçãolegislativa.
CapítuloIX
HerançaJacente
Sumário: 1. Finalidade do capítulo. 2. Conceito. 3. Natureza. 4. Arrecadação. 5. Herança vacante. 6.
Disciplinaprocessual.
1.FINALIDADEDOCAPÍTULO
Comaaberturadasucessão,opera-se,dopontodevistaideal,atransferência
doacervopatrimonial,porforçadojácitadoPrincípiodaSaisine 242.
Todavia,nemsempreexistem,defato,herdeirosdofalecido.
Damesma forma,nemsempreosherdeiros têmconhecimentodo falecimento
doautordaherança,pornãoteremmaiscontatocomele,pelarupturadoslaços
deconvivência.
Há, portanto, um patrimônio cujo novo titular, por força da sucessão, é
desconhecido.
Eoquefazer?
É o que abordaremos neste capítulo, ao tratarmos da herança jacente e da
herançavacante.
A matéria, para ser efetivamente compreendida, exige conhecimento
interdisciplinar, uma vez que não se limita à previsão de disciplina em direito
material(arts.1.819a1.823doCC),mastambémémencionadadiversasvezes
na legislação processual vigente, bem como é objeto de um procedimento
especial específico, regulado nos arts. 738 a 743do atualCódigodeProcesso
Civilbrasileiro.
Afinalidadedopresentecapítuloserá,portanto,compreenderosinstitutosda
herança jacente e da herança vacante, trazendo, para conhecimento do nosso
leitor,aspectosprocessuaisrelevantessobreotema.
Iniciemos,portanto,comadelimitaçãoconceitualdeherançajacente.
2.CONCEITO
Segundo o dicionarista AURÉLIO BUARQUE DE HOLANDA FERREIRA,
tem-seoseguinteconceitodotermo“jacente”:
“Jacente [Dolat.jacente.]Adj.2g.1.Quejaz;queestásituado.2.Imóvel,estacionário.[F.paral.,us.
nessasacepç.:jazente.]~V.estátua—eherança—. •S.m.3.Viga longitudinaldaspontes, sobrea
qualsefixamastravessasdotabuleiro.~V.jacentes” 243.
Acompreensãodoreferidoadjetivo,quandosejuntaaosubstantivo“herança”,
tempor finalidade abranger a situaçãodeumaherança estabelecida,mas ainda
semumdestinatárioconhecido.
Sobretalsituação,nomeadajustamentede“herançajacente”,estabeleceoart.
1.819doCC:
“Art.1.819.Falecendoalguémsemdeixar testamentonemherdeiro legítimonotoriamenteconhecido,os
bensdaherança,depoisdearrecadados, ficarãosobaguardaeadministraçãodeumcurador,atéasua
entregaaosucessordevidamentehabilitadoouàdeclaraçãodesuavacância”.
Assim, pode-se conceituarherança jacente como aquela em que o falecido
nãodeixoutestamentoouherdeirosnotoriamenteconhecidos.
A herança literalmente “jaz” enquanto não se apresentam herdeiros para
reclamá-la, ignorando-se quem seja, do ponto de vista ideal, o novo titular do
patrimôniodeixado.
Equaléanaturezajurídicadesseinstituto?
Éoqueveremosnopróximotópico.
3.NATUREZA
Aherançajacenteé,defato,umamassapatrimonial.
Não tem ela personalidade jurídica, sendo resultado de uma arrecadação de
bens,paraseevitarquefiquesemtitularindefinidamente.
Trata-se, em outras palavras, de um ente despersonalizado 244, ao qual,
juntamente com a herança vacante, a legislação processual civil brasileira
reconhecelegitimaçãoativaepassivaparademandarjudicialmente,naformado
art.75,VI,doCódigodeProcessoCivilde2015 245.
Sobre a natureza da herança jacente, observa CARLOS ROBERTO
GONÇALVES:
“Relevasalientarqueaherançajacentedistingue-sedoespólio,malgradotenhamemcomumaausência
de personalidade. No espólio, os herdeiros legítimos ou testamentários são conhecidos. Compreende os
bens deixados pelo falecido, desde a abertura da sucessão até a partilha. Pode aumentar com os
rendimentos que produza, ou diminuir em razão de ônus ou deteriorações.A noção de herança jacente,
todavia,éadeumasucessãosemdonoatual.Éoestadodaherançaquenãosesabeseseráadidaou
repudiada” 246.
Realmente, a distinção é importante, uma vez que o espólio abrange toda a
massapatrimonialdeixada,partindo-sedopressupostodeconhecimento—ainda
quenãoindividualizado—deseuspotenciaistitulares.
4.ARRECADAÇÃO
Ocorrendoasituaçãodofalecimentodealguémsemaexistênciadetestamento
ouherdeiros,tem-seasituaçãofáticaautorizadoradoreconhecimentodaherança
jacente.
O Estado, com a finalidade de evitar o perecimento do valor representado
pelos bens cujo titular se ignora, determina a sua arrecadação, com o fito de
entregar a referida massa patrimonial aos herdeiros que eventualmente
demonstremtalcondição.
E, enquanto não surgem herdeiros, o curador dado à herança jacente deve
providenciararegularizaçãodeativosepassivosdamassapatrimonial.
Nessesentido,confira-seoart.1.821doCC(semequivalentenacodificação
anterior):
“Art. 1.821. É assegurado aos credores o direito de pedir o pagamento das dívidas reconhecidas, nos
limitesdasforçasdaherança”.
Esenãoapareceremquaisquerherdeiros?
Éomomentodaconversãodaherançajacenteemvacante,conformepreceitua
oart.1.820doCC/2002:
“Art.1.820.Praticadasasdiligênciasdearrecadaçãoeultimadoo inventário, serãoexpedidoseditaisna
formadaleiprocessual,e,decorridoumanodesuaprimeirapublicação,semquehajaherdeirohabilitado,
oupendahabilitação,seráaherançadeclaradavacante”.
Equaissãoasconsequênciasdetalconversão?Emqueconsisteefetivamentea
herançavacante?
Éoqueveremosemseguida.
5.HERANÇAVACANTE
Oconceitodeherançavacante, tradicionalmente,évistocomoumsucedâneo
danoçãodeherançajacente.
Defato,considera-sevacanteaherançaquenão tevequalquerhabilitação
de herdeiro, seja por ser desconhecido, seja porque aqueles de que se têm
notíciasrenunciaram-na.
Assim, a lógica era somente considerar vacante a herança após o
reconhecimentodasuajacência.
Todavia,ovigenteCódigoCivilbrasileiro,porsuavez,inovouamatéria,ao
estabelecer,emseuart.1.823(semequivalentenacodificaçãoanterior):
“Art.1.823.Quandotodososchamadosasucederrenunciaremàherança,seráestadesdelogodeclarada
vacante”.
Ainovaçãoébem-vinda.
Aideiaé,literalmente,economizartempo.
Todavia, a questão pode se tornar um poucomais complexa, caso venham a
surgir outros herdeiros posteriormente à renúncia de todos aqueles conhecidos
originalmente.
Éporissoqueosconceitosdeherançajacenteedeherançavacante,nosistema
brasileiro, sempre foram normalmente encarados como fases de uma sequência
temporal.
Vale dizer, a vacância somente é reconhecida quando não houve qualquer
habilitaçãodeherdeirosparaaherança, sendoa jacênciaumestadomeramente
provisório.
Decorrido o mencionado interstício (um ano, na forma do já transcrito art.
1.820 do CC) para o reconhecimento da vacância da herança, ou ocorrendo a
mencionadasituaçãodereconhecimentoimediatodaherançavacante(art.1.821
doCC/2002), quais são as consequências para amassa patrimonial sem titular
conhecido?
Amatériaestádisciplinadapeloart.1.822doCC:
“Art. 1.822. A declaração de vacância da herança não prejudicará os herdeiros que legalmente se
habilitarem;mas,decorridoscincoanosdaaberturadasucessão,osbensarrecadadospassarãoaodomínio
do Município ou do Distrito Federal, se localizados nas respectivas circunscrições, incorporando-se ao
domíniodaUniãoquandosituadosemterritóriofederal.
Parágrafo único. Não se habilitando até a declaração de vacância, os colaterais ficarão excluídos da
sucessão”.
Observe-sequenãoháumaincorporaçãoimediatadosbenspeloEstado,após
adeclaraçãodevacância,dadaaprevisãodeumlapsotemporaldecincoanos,a
partir da abertura da sucessão, para que o domínio público, efetivamente, se
consolide,emvirtudedaausênciadeherdeirosconhecidosehabilitados:
“RECURSOESPECIAL.AÇÃOPOPULAR.ANULAÇÃODETESTAMENTO. INADEQUAÇÃO
DAVIAELEITA.AFASTAMENTODAMULTAIMPOSTA.SÚMULAN.98.
1.Oart.9.ºdoRegimento InternodoSTJdispõequeacompetênciadasSeçõeseTurmasé fixadaem
funçãodanaturezada relação litigiosa.Nocaso,nãoobstante tratar-sedeaçãopopular,o fato équea
relação em litígio é eminentemente de ordem privada, pois litiga-se a nulidade de um testamento. O
interessedaAdministraçãoPúblicaéreflexo,emrazãodapossívelconversãodaherançaemvacante.
2.Paraqueoatosejasindicávelmedianteaçãopopular,deveeleser,aumsótempo,nuloouanulávele
lesivoaopatrimôniopúblico,noqualseincluem‘osbensedireitosdevaloreconômico,artístico,estético,
históricoouturístico”.Comefeito,mostra-seinviáveldeduziremaçãopopularpretensãocomfinalidadede
mera desconstituição de ato por nulidade ou anulabilidade, sendo indispensável a asserção de lesão ou
ameaçadelesãoaopatrimôniopúblico.
3.Nocaso,pretende-seaanulaçãodetestamentoporsupostafraude,sendoque,alegadamente,aherança
tornar-se-ia jacente.Daínãodecorre, todavia,nemmesmoem tese,uma lesãoaos interessesdiretosda
Administração. Issoporque, aindaque seprosperasse a alegaçãode fraudena lavraturado testamento,
nãoseteria,porsisó,umalesãoaopatrimôniopúblico,porquantotalprovimentoapenasteriaocondãode
propiciaraarrecadaçãodosbensdofalecido,comsubsequenteprocedimentodepublicaçõesdeeditais.
4. A jacência, ao reverso do que pretende demonstrar o recorrente, pressupõe a incerteza de
herdeiros,nãopercorrendo,necessariamente,ocaminhorumoàvacância,tendoemvistaque,após
publicadososeditaisdeconvocação,podemeventuaisherdeirosseapresentarem,dando-se início
aoinventário,nostermosdosarts.1.819a1.823doCódigoCivil.
5. ‘Embargos de declaraçãomanifestados comnotório propósito de prequestionamento não têm caráter
protelatório’(Súmulan.98).
6. Recurso especial parcialmente conhecido e, na extensão, provido” (STJ, REsp 445653/RS, Recurso
Especial 2002/0070597-6, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4.ª Turma, j. 15-10-2009, DJe, 26-10-2009)
(grifamos).
Nãohá,note-se,prejuízonecessárioaosherdeiros—enquantonão sedá tal
incorporação—umavezqueaindapodemsehabilitarpara receber aherança,
salvooscolaterais(quenãosãoherdeirosnecessários 247),queficam,naforma
domencionadoparágrafoúnicodoart.1.822,excluídosdasucessão.
6.DISCIPLINAPROCESSUAL
Conformeditonotópicodeaberturadestecapítulo,otemadaherançajacenteé
objeto de um procedimento especial próprio, disciplinado no Livro IV (“Dos
Procedimentos Especiais”) do Código de Processo Civil de 1973, mais
precisamente do seu Título II (“Dos Procedimentos Especiais de Jurisdição
Voluntária”),CapítuloV(“DaHerançaJacente”).
Trata-sedosarts.738a743doCódigodeProcessoCivilde2015:
“Art.738.Noscasosemquea leiconsidere jacenteaherança,o juizemcujacomarca tiverdomicílioo
falecidoprocederáimediatamenteàarrecadaçãodosrespectivosbens.
Art.739.Aherança jacente ficará sobaguarda,aconservaçãoeaadministraçãodeumcuradoratéa
respectivaentregaaosucessorlegalmentehabilitadoouatéadeclaraçãodevacância.
§1.ºIncumbeaocurador:
I—representaraherançaemjuízoouforadele,comintervençãodoMinistérioPúblico;
II — ter em boa guarda e conservação os bens arrecadados e promover a arrecadação de outros
porventuraexistentes;
III—executarasmedidasconservatóriasdosdireitosdaherança;
IV—apresentarmensalmenteaojuizbalancetedareceitaedadespesa;
V—prestarcontasaofinaldesuagestão.
§2.ºAplica-seaocuradorodispostonosarts.159a161.
Art.740.Ojuizordenaráqueooficialdejustiça,acompanhadodoescrivãooudochefedesecretariaedo
curador,arroleosbensedescreva-osemautocircunstanciado.
§1.ºNãopodendocompareceraolocal,ojuizrequisitaráàautoridadepolicialqueprocedaàarrecadação
eaoarrolamentodosbens,com2(duas)testemunhas,queassistirãoàsdiligências.
§2.ºNãoestandoaindanomeadoocurador,ojuizdesignarádepositárioelheentregaráosbens,mediante
simplestermonosautos,depoisdecompromissado.
§3.ºDuranteaarrecadação,ojuizouaautoridadepolicialinquiriráosmoradoresdacasaedavizinhança
sobreaqualificaçãodofalecido,oparadeirodeseussucessoreseaexistênciadeoutrosbens,lavrando-se
detudoautodeinquiriçãoeinformação.
§4.ºOjuizexaminaráreservadamenteospapéis,ascartasmissivaseoslivrosdomésticose,verificando
que não apresentam interesse, mandará empacotá-los e lacrá-los para serem assim entregues aos
sucessoresdofalecidoouqueimadosquandoosbensforemdeclaradosvacantes.
§5.ºSeconstaraojuizaexistênciadebensemoutracomarca,mandaráexpedircartaprecatóriaafimde
seremarrecadados.
§6.ºNãosefaráaarrecadação,ouessaserásuspensa,quando,iniciada,apresentarem-separareclamar
osbensocônjugeoucompanheiro,oherdeiroouotestamenteironotoriamentereconhecidoenãohouver
oposição motivada do curador, de qualquer interessado, do Ministério Público ou do representante da
FazendaPública.
Art. 741.Ultimadaa arrecadação,o juizmandaráexpedir edital, que serápublicadona redemundialde
computadores,nosítiodo tribunalaqueestivervinculadoo juízoenaplataformadeeditaisdoConselho
Nacional de Justiça, onde permanecerá por 3 (três)meses, ou, não havendo sítio, no órgão oficial e na
imprensadacomarca,por3(três)vezescomintervalosde1(um)mês,paraqueossucessoresdofalecido
venhamahabilitar-senoprazode6(seis)mesescontadodaprimeirapublicação.
§1.ºVerificadaaexistênciadesucessoroudetestamenteiroemlugarcerto,far-se-áasuacitação,sem
prejuízodoedital.
§2.ºQuandoofalecidoforestrangeiro,serátambémcomunicadoofatoàautoridadeconsular.
§3.ºJulgadaahabilitaçãodoherdeiro,reconhecidaaqualidadedotestamenteiroouprovadaaidentidade
docônjugeoucompanheiro,aarrecadaçãoconverter-se-áeminventário.
§4.ºOscredoresdaherançapoderãohabilitar-secomonosinventáriosouproporaaçãodecobrança.
Art.742.Ojuizpoderáautorizaraalienação:
I—debensmóveis,seforemdeconservaçãodifíciloudispendiosa;
II—desemoventes,quandonãoempregadosnaexploraçãodealgumaindústria;
III—detítulosepapéisdecrédito,havendofundadoreceiodedepreciação;
IV—deaçõesdesociedadequando,reclamadaaintegralização,nãodispuseraherançadedinheiropara
opagamento;
V—debensimóveis:
a)seameaçaremruína,nãoconvindoareparação;
b)seestiveremhipotecadosevencer-seadívida,nãohavendodinheiroparaopagamento.
§1.ºNãoseprocederá,entretanto,àvendaseaFazendaPúblicaouohabilitandoadiantaraimportância
paraasdespesas.
§2.ºOsbenscomvalordeafeição,comoretratos,objetosdeusopessoal,livroseobrasdearte,sóserão
alienadosdepoisdedeclaradaavacânciadaherança.
Art. 743. Passado 1 (um) ano da primeira publicação do edital e não havendo herdeiro habilitado nem
habilitaçãopendente,seráaherançadeclaradavacante.
§ 1.º Pendendo habilitação, a vacância será declarada pelamesma sentença que a julgar improcedente,
aguardando-se,nocasodeseremdiversasashabilitações,ojulgamentodaúltima.
§2.ºTransitadaemjulgadoasentençaquedeclarouavacância,ocônjuge,ocompanheiro,osherdeirose
oscredoressópoderãoreclamaroseudireitoporaçãodireta”.
Dadoocorteepistemológicodestaobra,nãoteceremosmaioresconsiderações
sobre os aspectos procedimentais de reconhecimento da herança jacente e da
herançavacante.
Todavia,adiretrizquedevesertomadanasuacompreensãoéadequenãohá
um interesse jurídico primário doEstado em incorporar tal patrimônio,motivo
peloqual todas as cautelasque se fizeremnecessárias são fundamentaispara a
preservaçãodosinteressesdosherdeiros,aindaquedesconhecidos.
É por isso que, até a efetiva incorporação do patrimônio ao ente estatal
correspondente,sempresepoderádesfazerasituação,paraoutorgaraherançaa
quemdedireito,naobservaçãodoPrincípiodaSaisine,ressalvadaasituaçãodo
colateral, que, como já dito, fica excluído da sucessão após a declaração de
vacância.
Por fim, um peculiar aspecto que merece ser ressaltado diz respeito à
possibilidade de se reconhecer a usucapião dos bens componentes do acervo
hereditário, até a declaração de vacância, conforme já entendeu, inclusive, o
SuperiorTribunaldeJustiça:
“AGRAVOREGIMENTAL.AGRAVODEINSTRUMENTO.HERANÇAJACENTE.
USUCAPIÃO.FALTADEARGUMENTOSNOVOS,MANTIDAADECISÃOANTERIOR.
MATÉRIAJÁPACIFICADANESTACORTE.INCIDÊNCIADASÚMULA83.
I—Nãotendoaparteapresentadoargumentosnovoscapazesdealteraro julgamentoanterior,deve-se
manteradecisãorecorrida.
II—Obem integrantedeherança jacente só édevolvido aoEstadocoma sentençadedeclaraçãoda
vacância,podendo,atéali,serpossuídoadusucapionem.IncidênciadaSúmula83/STJ.
Agravoimprovido”(AgRgnoAg1212745/RJ,Rel.Min.SidneiBeneti,3.ªTurma,j.19-10-2010,DJe, 3-
11-2010).
Na linhadesse julgado,emboraaefetiva incorporaçãodosbensdeixadosao
domínio público somente ocorra após cinco anos contados da abertura da
sucessão, a aquisição da propriedade por usucapião somente é possível até a
declaraçãodevacância.
Issoporqueasentençadevacânciajátraduziriaoprópriomarcodetransição
entreosdomíniosprivadoepúblico,aindaqueaconsolidaçãododireitosomente
sedêapósoquinquídiolegal.
Trata-se, sem dúvida, de um critério de segurança jurídica, que atende aos
especiaisprincípiosdopróprioDireitoAdministrativo.
CapítuloX
DaPetiçãodeHerança
Sumário: 1. Introdução. 2. Conceito. 3. Natureza jurídica e objetivos. 4. Prazo para exercício. 5.
Legitimidade.6.Apetiçãodeherançaeaboa-fé.
1.INTRODUÇÃO
OvigenteCódigoCivilbrasileirotratoudaaçãodepetiçãodeherançaemseus
arts.1.824a1.828.
Cuida-sedeuma inovação,poisamatérianãoeraespecificamente tratadana
leianterior.
Compreendamos,pois,oinstituto.
2.CONCEITO
Por meio da ação de petição de herança, o herdeiro pode demandar o
reconhecimentodoseustatussucessório,visandoaobterarestituiçãodetodaa
herança,oudepartedela,contraquemindevidamenteapossua:
“Art.1.824.Oherdeiropode,emaçãodepetiçãodeherança,demandaroreconhecimentodeseudireito
sucessório,paraobterarestituiçãodaherança,oudepartedela,contraquem,naqualidadedeherdeiro,ou
mesmosemtítulo,apossua”.
Exemplificando.
Joaquimfalece,deixando,apriori,comoherdeiros,seusfilhosJoaquimJr.e
Jucineia. Após a abertura da herança, surge Carmelo, que se diz fruto de uma
relaçãoextraconjugaldofalecido,pleiteandooseureconhecimentocomofilhoe
herdeiro.
Acrescente-se,ainda,ateordoart.1.825doCC 248,queaaçãodepetiçãode
herança(petitiohereditatis),aindaqueexercidaporumsódosherdeiros,poderá
compreendertodososbenshereditários.
A petição de herança é, portanto, conceitualmente, omeio pelo qual alguém
demanda o reconhecimento da sua qualidade de herdeiro, bem como pleiteia a
restituiçãodaherança,totalouparcialmente,emfacedequemapossua.
A expressão “qualidade de herdeiro”, utilizada pelo texto legal, deve ser
compreendidacomotodoaqueleaquemcouber,defato,aherança,sejaherdeiro
legítimo,testamentáriooumesmooEstado,comosucessoranômalo 249.
Equaléanaturezadesteinstituto?
Éoqueveremosnopróximotópico.
3.NATUREZAJURÍDICAEOBJETIVOS
Éprecisocompreenderbemanaturezajurídicada“petiçãodeherança”.
Primeiramente, faz-se necessário esclarecer que ela não se confunde com a
açãodereivindicação.
Nessesentido,observaORLANDOGOMES:
“Diferenciam-sesegundoA.Cicu,porque:a)areivindicatóriatemporobjetooreconhecimentododireito
depropriedadesobredeterminadacoisa,enquantoaaçãodepetiçãodeherançavisaaoreconhecimento
daqualidadedeherdeiro,daqualpodederivaro reconhecimentodeumdireitodepropriedade,deoutro
direitoreal,deumdireitodecréditooudeoutrodireitopessoal;b)enquantonareivindicatiodeveoautor
provar, não somente, que adquiriu a propriedade,mas que a houve de quem era proprietário, napetitio
hereditatisdeveoherdeiroprovarunicamenteseutítulodeaquisição” 250.
Nãoésimples,portanto,fixarasuanaturezajurídica.
Issoporque,detudoquejáfoidito,restaclaro,emnossosentir,queapetição
deherançatemduasfinalidadesprecípuas:
a)oreconhecimentodaqualidadedoherdeirodemandante;
b)opedidoderestituiçãodaherança.
Ora,se,emfacedoprimeiroaspecto,éfácilconcluir tratar-sedeumpedido
declaratório,manejadomedianteoexercíciodeumsimples“direitopotestativo”,
por outro lado, a restituição dos bens pressupõe a formulação de uma
“pretensão”,medianteaapresentaçãodeumpedidocondenatório 251.
Ouseja,há,napetiçãodeherança,duaspostulaçõesdenaturezasdistintas,que
não se confundem, embora intimamente ligadas: uma de natureza declaratória e
outradenaturezacondenatória.
Enquantoaquestãonãoédefinitivamentesolucionada,épossívelopedidode
reservadebensnoinventárioouarrolamento,paraseasseguraroresultadoútil
dademanda,desdequeospressupostosdatutelaestejamconfigurados:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE CUMULADA COM
PETIÇÃODEHERANÇA.PEDIDODERESERVADEBENS. 1.Embora seja possível o pedidode
reserva de bens de caráter cautelar, ou em sede de antecipação de tutela nos autos de ação de
investigação de paternidade cumulada com petição de herança, não há elementos que indiquem a
verossimilhançadasalegaçõesapontodeautorizarodeferimentoda liminarantesmesmodacitaçãoda
sucessão.2.Nadaimpede,contudo,queaagravantenoticieoajuizamentodainvestigatórianosautosdo
inventário,postulandooqueentenderpertinente.NEGARAMPROVIMENTO.UNÂNIME”(TJRS,AI
70047241260,8.ªCâmaraCível,Rel.LuizFelipeBrasilSantos,j.19-4-2012).
4.PRAZOPARAEXERCÍCIO
Qualéoprazoparaoexercíciododireitoàpetiçãodeherança?
Estaéumaperguntaextremamentedelicada.
Com efeito, a resposta vai depender de qual das finalidades da petição de
herançaseestáfalando.
Defato,quandosedizqueapetiçãodeherançatemprazoprescricionalparao
seu exercício, está-se referindo, em verdade, ao seu mais relevante aspecto,
condenatório, de “restituição de bens”, namedida em que, por óbvio, omero
reconhecimento do status de herdeiro, pode ocorrer a qualquer tempo,
independentementedeprazo.
Aliás, vale a pena relembrar ao nosso amigo leitor que somente as
“pretensões”,própriasdepostulaçõesdenaturezacondenatória,prescrevem.
Conforme já explicitamos em outra oportunidade, com inspiração no culto
AGNELOAMORIMFILHO:
“Realmente,jáantecipamosqueháperfeitacorrespondênciaentreosinstitutosdaprescriçãoedecadência
eaclassificaçãodasações,deacordocomatutelajurisdicionalpretendida.
Eistosedá,emverdade,porqueseaprescriçãoéaextinçãodapretensãoàprestaçãodevida—direito
este que continua existindona relação jurídica de direitomaterial—em funçãode umdescumprimento
(quegerouaação),estasomentepodeseraplicadaàsaçõescondenatórias.Afinal,somenteestetipode
açãoexigeocumprimentocoercitivodeumaprestação.
Jáadecadência,comoserefereàperdaefetivadeumdireito,peloseunãoexercícionoprazoestipulado,
somente pode ser relacionada aos direitos potestativos, que exijam uma manifestação judicial. Tal
manifestação,porserelementodeformaçãodopróprioexercíciododireito,somentepodesedar,portanto,
poraçõesconstitutivas.
Porfim,asaçõesdeclaratórias,quevisamsomenteaomeroreconhecimentodecertezajurídica(eisto
independe de qualquer prazo) somente podem ser imprescritíveis, uma vez que não são direcionadas a
modificarqualquerestadodecoisas.
Por exceção,nos casosdedireitospotestativos exercitáveismediante simplesdeclaraçãodevontadedo
titular, sem prazo especial de exercício previsto em lei, a eventual ação judicial ajuizada (ações
constitutivas semprazoespecialdeexercícioprevisto em lei) também será imprescritível, como é o
casodaaçãodedivórcio,quedesconstituiovínculomatrimonial” 252.
E,nessecontexto,concluímosque,ateordoquedispõeoart.205doCódigo
Civil, é de dez anos o prazo prescricional para se formular a pretensão de
restituiçãodebensdaherança,acontardaaberturadasucessão 253.
Eondeestáprevistoesteprazo?
De fato, é possível, em tese, sustentar a imprescritibilidade, ante a falta de
previsão legal específica, dada a peculiaridade de objetivo da petição de
herança 254.
Todavia,comovisto,tendoemvistaapostulaçãodenaturezacondenatória,
precípua finalidade da demanda, a prescritibilidade é a regra (e a
imprescritibilidade somente seria admissível se houvesse previsão legal
específicanessesentido).
Assim sendo, a hipótese é de aplicação da previsão geral do art. 205 do
Código Civil (equivalente, na codificação anterior, ao art. 177 255), que
estabelecequea“prescriçãoocorreemdezanos,quandoaleinãolhehajafixado
prazomenor”.
Todavia,háaindaumapeculiaridadeaserdestacada.
Defato,muitasvezes,quandodaaberturadaherança—leia-se,dofalecimento
do seu autor — os pretensos herdeiros podem ainda ser nascituros
(exemplificando, o indivíduo morre, tendo deixado uma mulher grávida) ou
menoresdeidade.
E, como se sabe, por força do art. 198, I, do CC, contra os absolutamente
incapazesnãocorreprescrição.
Assim,mesmoreconhecendoaexistênciadeumprazolegalparaadeduçãoem
juízodapretensãodepetiçãodeherança,éprecisoteremmentequeodiesaquo
poderáserprotraídoemfacedasituaçãopessoaldopretensoherdeiro.
Pensamos, pois, que esteprazo começaria a correr quandooherdeiromenor
chegasseaos16anoscompletos,namedidaemquedeixariadeser,tecnicamente,
absolutamenteincapaz.
Nessesentido,comenta,compropriedade,ADRIANOGODINHO:
“Jáquantoaoprazodeprescrição,duassãoasdiscussõeslevadasaosautos:a)qualoprazodeprescrição
aplicável,seodoCódigode1916ouododiplomaatual;b)adatadoiníciodacontagemdoprazo.
(...)
b)paraidentificarotermoinicialdoprazoprescricional,deve-severificar,emprimeirolugar,queoart.198,
I do Código Civil de 2002 estabelece que não corre a prescrição contra os absolutamente incapazes.
Assim, enquanto o menor não completa 16 anos de idade, tornando-se relativamente incapaz, não tem
início o decurso do prazo. No caso dos autos, a herdeira excluída ilegitimamente da herança tornou-se
relativamenteincapazsomenteem2003,sendoestaadatainauguraldacontagemdoprazodeprescrição.
Por isso, tendo sido a ação de petição de herança manejada em 2008, não se pode mesmo falar em
prescrição,cabendoàherdeirareivindicarosbensquelhetocamcontraosterceirosqueindevidamenteos
possuem,conformepreveemosarts.1.824a1.828doCódigoCivil” 256. .
5.LEGITIMIDADE
Quempodeajuizarapetiçãodeherança?
A resposta, em nosso sentir, é simples: todo potencial herdeiro que se
considerarexcluídodoseudireitosucessório.
Assim, incluem-se, por exemplo, filhos não reconhecidos, herdeiros
testamentários excluídos da sucessão ou parentes do de cujus excluídos por
outrostitulares.
Nessecontexto,àluzdoprincípiodaboa-féobjetiva,consideramosumdever
do inventariante informar ao juízo acerca da possível existência de outros
herdeiroshabilitáveis.
6.APETIÇÃODEHERANÇAEABOA-FÉ
O tema ora estudado está intimamente relacionado com a questão da boa-fé,
que, como vimos, traduz um fundamental princípio jurídico, com especial
aplicaçãonocampodasSucessões 257.
Defato,estabeleceoart.1.826doCC:
“Art. 1.826. O possuidor da herança está obrigado à restituição dos bens do acervo, fixando-se-lhe a
responsabilidadesegundoasuaposse,observadoodispostonosarts.1.214a1.222.
Parágrafo único. A partir da citação, a responsabilidade do possuidor se há de aferir pelas regras
concernentesàpossedemá-féeàmora”.
Antes da propositura de uma ação de petição de herança, a presunção juris
tantumédequeopossuidordosbensdaherançaestejadeboa-fé.
Apresunção, como dito, é relativa, uma vez que, por exemplo, poderia este
possuidorsaberdaexistênciadeherdeironãoabrangidopelaherançaenadater
informadoaojuízodoinventário.
Porisso,aplicar-se-ãoaeleasregrasdaresponsabilidadepelapossedeboa
oudemá-fé,previstasnosarts.1.214a1.222doCC.
Apartir da citação,porém, tal presunçãocai por terra, devendoopossuidor
responderdeacordocomasregrasreferentesàpossedemá-féeàmora.
Nademonstraçãoda importânciadaboa-fénessa situação,avultaa figurado
herdeiroaparente.
Trata-sedeaplicaçãodateoriadaaparêncianoDireitoSucessório,conforme
estudamosnoitemIIIdonossoCapítuloVIII.
Como vimos, o herdeiro aparente é aquele que, por ser detentor de bens
hereditários, faz supor a terceiros que seja o seu legítimo titular, quando, na
verdade,nãooé.
Emoutraspalavras,naperspectivadoprincípiodaboa-féedaprópriateoria
daaparência, nãopodemserprejudicados aquelesque, amparadosna legítima
expectativa da qualidade de herdeiro, firmam com este uma relação negocial
juridicamentepossível.
Protege-se,pois,oterceirodeboa-fé.
Nessesentido,osarts.1.827e1.828doCódigoCivil:
“Art.1.827.Oherdeiropodedemandarosbensdaherança,mesmoempoderdeterceiros,semprejuízoda
responsabilidadedopossuidororigináriopelovalordosbensalienados.
Parágrafoúnico.Sãoeficazesasalienaçõesfeitas,atítulooneroso,peloherdeiroaparenteaterceiro
deboa-fé.
Art.1.828.Oherdeiroaparente,quedeboa-féhouverpagoumlegado,nãoestáobrigadoaprestaro
equivalenteaoverdadeirosucessor,ressalvadoaesteodireitodeprocedercontraquemorecebeu”(grifos
nossos).
Note-se,pois,queoterceiroquecomopossuidordosbenshereditárioshouver
travadoumarelaçãojurídica,deboa-fé,nãopoderáserprejudicado,cabendo,ao
realherdeiro,prejudicado,exigirdo sucessoraparenteaeventualcompensação
devida.
CapítuloXI
SucessãoLegítima
Sumário: 1. Introdução. 2. Noções conceituais prévias. 3. Ponderações críticas acerca do instituto da
herança legítima. 3.1. Sobre a (im)possibilidade de gravação de bens da legítima. 3.2. Justa causa para
gravação de bens da legítima. 4.Disciplina jurídica positivada da sucessão legítima. 4.1. Considerações
gerais e regras fundamentais. 4.2. Relembrando noções básicas dos regimes de bens no Código Civil
brasileiro. 4.2.1. Regime de comunhão parcial de bens. 4.2.2. Regime de comunhão universal de bens.
4.2.3.Regimedeparticipaçãofinalnosaquestos.4.2.4.Regimedaseparaçãoconvencionaldebens.4.2.5.
Regime da separação legal ou obrigatória de bens. 4.3. Sucessão pelo descendente. 4.3.1. Correntes
explicativasdaconcorrênciadodescendentecomocônjugesobrevivente,noregimedacomunhãoparcial.
4.3.2.Compreensãodaexpressão“bensparticulares”paraefeitodeconcorrênciadocônjugesobrevivente
com o descendente. 4.3.3. Concorrência do descendente com o cônjuge sobrevivente, no regime da
separação convencional de bens. 4.4. Sucessão pelo ascendente. 4.5. Sucessão pelo cônjuge. 4.5.1. O
usufruto vidual. 4.5.2. Direito real de habitação. 4.5.3. Disciplina efetiva da sucessão do cônjuge. 4.6.
Sucessãopela(o)companheira(o).4.7.Sucessãopelocolateral.4.8.Sucessãopeloentepúblico.
1.INTRODUÇÃO
ContornamosoCabodaBoaEsperança 258.
Estecapítulorepresentaocoraçãodanossaobra.
Issoporque,conformejámencionado,asociedadebrasileiranãotemohábito
da feitura de testamento, o que invariavelmente conduz ao sistema consagrado
peloprópriolegisladorparaatransmissibilidadesucessória.
Comefeito,adenominada“SucessãoLegítima”traduzoconjuntoderegrasque
disciplina a transferência patrimonial post mortem, sem a incidência de um
testamentoválido.
NostermosdoCódigoCivil,“morrendoapessoasemtestamento,transmitea
herança aos herdeiros legítimos; o mesmo ocorrerá quanto aos bens que não
forem compreendidos no testamento; e subsiste a sucessão legítima se o
testamentocaducar,ouforjulgadonulo”(art.1.788doCC).
Eéjustamenteessetipodesucessãooobjetodestecapítulo.
Para bem compreendê-lo, porém, é necessário tecer algumas considerações
conceituaisprévias.
Vamosaelas.
2.NOÇÕESCONCEITUAISPRÉVIAS
Emlinhasgerais,oestudodasregrasdaSucessãoLegítimaobedeceàseguinte
metodologia:
a)sucessãopelosdescendentes;
b)sucessãopelosascendentes;
c)sucessãopelocônjugeoucompanheirosobrevivente;
d)sucessãopeloscolaterais;
e)sucessãopeloEntePúblico.
Reafirmamos a nossa indignação pelo fato de o codificador haver,
injustificadamente, inserido o dispositivo regulador da sucessão da(o)
companheira(o)nasDisposiçõesGerais,CapítuloI,doTítuloI(asaber,noart.
1.790),quando,emverdade,deveriatê-loalocadonocapítulopróprio,doTítulo
II,dedicadoàSucessãoLegítima(maisprecisamentenoart.1.829).
Masnãocometeremosomesmoerro.
Trataremosdasucessãodointegrantedauniãoestável,aqui,juntamentecoma
sucessão do cônjuge, não apenas por um rigor técnico topográfico, mas,
sobretudo, pela dignidade constitucional familiar conferida à relação de
companheirismo.
Poisbem.
Inicialmente,vale lembrarqueoherdeiro legítimo é aqueledesignadona lei
para receber a herança; ao passo que o herdeiro testamentário é aquele
declinadonotestamento.
Quantoaosprimeiros,lembraORLANDOGOMES:
“Naclassificaçãodosherdeiroslegítimos,distinguem-seosnecessários,tambémdesignadoslegitimáriosou
reservatários,dosfacultativos” 259.
Os herdeiros necessários (legitimários ou reservatários), como se sabe, são
aquelesquetêmdireitoàlegítima,eosfacultativos,todososdemais.
Emnossoatualsistema,pela literalidadedoteordoart.1.845,sãoherdeiros
legítimos necessários: o descendente, o ascendente e o cônjuge (sendo que,
quanto a este último, o reconhecimento codificado da condição de herdeiro
necessáriosedeucomoatualsistema 260).
Feitas essas considerações iniciais, e antes de passarmos à análise das
categoriasouordensdeherdeiroslegítimos,cuidemosdeaprofundaranoçãoda
“legítima” e dos “herdeiros necessários”, providência necessária para a boa
compreensãodetodoocapítulo.
3.PONDERAÇÕESCRÍTICASACERCADOINSTITUTODAHERANÇALEGÍTIMA
Comojásepercebeu,distinguem-seosherdeirosnecessários(legitimáriosou
reservatários) dos chamados herdeiros facultativos, justamente em função de
haver(ounão)direitoàchamadaherançalegítima.
Emmaisdeumaoportunidade,jáexpusemosanossaopiniãosobreaproteção
dalegítimanoDireitobrasileiro 261.
E,atítuloderevisão,valeapenarepassarmosalgumasideias.
Por“herdeironecessário”entenda-seaquelaclassedesucessoresquetêm,por
forçadelei,direitoàpartelegítimadaherança(50%).
Porexemplo,seJoãomorreedeixatrêsfilhos:Pedrinho,MarquinhoseGabi,
metadedasuaherança(partelegítima)tocaránecessariamenteaessesherdeiros,
podendo,emvida,otestador,seassimoquiser,fazeroquebementendercoma
suapartedisponível(aoutrametadedeherança) 262.
Oquenãopodehaveréviolaçãoaodireitodosherdeirosnecessários.
E, na regra positivada do Código Civil, são herdeiros necessários os
descendentes, os ascendentes eo cônjuge (art. 1.845), aosquais, comodito, se
reconhecedireitoàmetadedosbensdaherança,adenominadapartelegítima(art.
1.846).
Lembrando a doutrina sempre atual de FRANCISCO JOSÉ CAHALI, vale
recordar:
“Por sua vez, a sucessão, no direito brasileiro, obedece ao sistema da divisão necessária, pelo qual a
vontadedoautordaherançanãopodeafastarcertosherdeiros—herdeirosnecessários—,entreosquais
deve ser partilhada, nomínimo,metade da herança, em quotas ideais (CC, arts. 1.789, 1.845 e 1.846).
Herdeironecessário,assim,éoparentecomdireitoaumaparcelamínimade50%doacervo,daqualnão
pode ser privado por disposição de última vontade, representando a sua existência uma limitação à
liberdadede testar.Estaclasseécompostapelocônjuge,descendenteseascendentesdodecujus (CC,
1.845), sem limitação de graus quanto aos dois últimos (filhos, netos, bisnetos etc., e pais, avós, bisavós
etc.).Sãoossucessoresquenãopodemserexcluídosdaherançaporvontadedotestador,salvoemcasos
específicosdedeserdação,previstosemlei.Senãoforesteocaso,oherdeironecessárioteráresguardada
suaparcela,casooautordaherançadecidafazertestamento,restringindo-se,destaforma,aextensãoda
partedisponívelparatransmissãodeapenasmetadedopatrimôniododecujus” 263.
O que o legislador pretendeu, ao resguardar o direito dessa categoria de
herdeiros,foiprecisamentedar-lhescertoconfortopatrimonial,impedindoqueo
autordaherançadisponhatotalmentedoseupatrimônio.
Lembra-nosWASHINGTONDEBARROSMONTEIRO:
“Essalegítima,tãocombatidaporLePlayeseussequazes,porquecontráriaàilimitadaliberdadedetestar,
éfixaemfacedonossodireito,aoinversodoqueocorreemoutraslegislaçõescomoafrancesa,aitaliana
eaportuguesa,emquevariadeacordocomonúmerodaspessoassucessíveis,eésagrada,nessesentido
dequenãopode,sobpretextoalgum,serdesfalcadaoureduzidapelotestador” 264.
Denossaparte,jáanotamosquetemossincerasdúvidasarespeitodaeficácia
social e justiçadessanorma (preservadorada legítima), aqual,namaioriadas
vezes, acaba por incentivar intermináveis contendas judiciais, quando não a
própriadiscórdiaentreparentesouatémesmoaindolência.
Poderia, talvez, o legislador resguardar a necessidade da preservação da
legítimaapenas enquantoosherdeiros fossemmenores, ou casopadecessemde
algumacausadeincapacidade,situaçõesquejustificariamarestriçãoàfaculdade
dedisposiçãodoautordaherança 265.
Masestenderaproteçãopatrimonialapessoasmaioresecapazesé,nonosso
entendimento,asubversãodorazoável.
Essa restrição aodireitodo testador, comodito, se já encontrou justificativa
emsociedadesantigas,emqueamaiorriquezadeumafamíliaeraafundiária,não
seexplicamaisnosdiasquecorrem.
Pelocontrário.
A preservação da legítima culmina por suscitar, como dito, discórdias e
desavenças familiares, impedindo, ademais, o de cujus de dispor do seu
patrimônioamealhadocomobementendesse.
Ademais, sequisessebeneficiarumdescendente seuouaesposa,quemmais
lhe dedicou afeto, especialmente nos últimos anos da sua vida, poderia fazê-lo
por testamento, sem que isso, em nosso sentir, significasse injustiça ou
desigualdade,umavezqueodirecionamentodoseupatrimôniodeveterpornorte
especialmente a afetividade.Ressalvamos,mais uma vez, apenas a hipótese de
concorreremàsuaherançafilhosmenoresouinválidos,casoemquesedeveria
preservar-lhes,por imperativodesolidariedadefamiliar,necessariamente,parte
daherança.
Ademais,essarestriçãoaodireitodotestadorimplicariatambémumaafronta
ao direito constitucional de propriedade, o qual, como se sabe, por ser
considerado de natureza complexa, é composto pelas faculdades de usar,
gozar/fruir, dispor, e reivindicar a coisa. Ora, tal limitação, sem sombra de
dúvida, entraria em rota de colisão com a faculdade real de disposição,
afigurando-secompletamenteinjustificada.
Seoquejustificaobenefíciopatrimonialpostmorteméovínculoafetivoque
une o testador aos seus herdeiros, nada impediria que aquele beneficiasse os
últimosportestamento,deacordocomasualivremanifestaçãodevontade.
Esenãodispusesseabsolutamentenadasobreodestinodeseupatrimônio?
Nemaísejustificariaalegítima,poisoqueocorreriaseriaapenasasucessão
patrimonial na ordem estabelecida legalmente, de acordo com as regras de
vocação hereditária, o que não se confunde com o instituto aqui criticado, que
intentasepararumapartedopatrimôniodaincidênciadaautonomiadavontade.
Dequalquermaneira, a par da nossa respeitosa visão crítica, o fato é que a
legítimaexisteepreservaametadedopatrimôniodotitulardaherançaparaoseu
descendente, ascendente e cônjuge, a teor dos citados arts. 1.845 e 1.846 do
CódigoCivilde2002.
Se, em vida, o autor da futura herança dispuser de mais da metade do seu
patrimônio— ultrapassando a “parte disponível”, e invadindo a “legítima”—
estarárealizandoumadoaçãoinoficiosa,passíveldeinvalidação 266.
Sobre o tema, em ampla pesquisa realizada, discorreu um dos autores desta
obra 267:
“OnossoDireitoPositivomanteve apreservaçãoda legítima, circunstânciaque se reflete no âmbitodo
DireitoContratual,especialmentenadoação,consoantepodemosobservardaanálisedosarts.544e549
doCódigoCivil: ‘Art. 544. A doação de ascendentes a descendentes, ou de um cônjuge a outro,
importaadiantamentodoquelhescabeporherança’.‘Art.549.Nulaétambémadoaçãoquantoà
partequeexcederàdequeodoador,nomomentodaliberalidade,poderiadisporemtestamento’.
Oqueolegisladorquerimpediréqueodoadordisponhagratuitamentedemaisdametadedasuaherança,
comviolaçãodalegítimadosherdeirosnecessários.Contrariosensu,seoatodeliberalidadenãoatingiro
direitodessacategoriadeherdeiros, será reputadoválido.Vale lembrarqueparaefeitodessecálculo se
deverá considerar o valor do patrimônio do disponente, quando da alienação (ressuscitou-se, assim, a
dicçãodoart.1.796doCódigoCivilanterior,revogandooart.1.014doCódigodeProcessoCivil).
(...)
NoDireitoPositivobrasileiro, apósaentradaemvigordoCódigonovo,optou-seporparâmetrodiverso,
considerando-seovalordobemdoado,aotempodaliberalidade(art.2.004doCC,analisadoabaixo).Esta
é a precisa preleção de PAULOLUIZNETTOLÔBO:Omomento de cada doação para se aferir o
limite,somando-seasanteriores,éfundamental.Odireitobrasileironãooptoupelomomentodaabertura
dasucessãoparaseverificaroexcessodapartedisponíveloudalegítimadosherdeirosnecessários,maso
daliberalidade.Opatrimôniosofreflutuaçõesdevalor,aolongodotempo,mercêdasvicissitudesporque
passa.Sea reduçãosederposteriormenteàdatadadoação,comprometendoa legítima,anulidadenão
seráretroativa.Sehouveaumentodopatrimônio,posteriormenteaomomentodadoaçãoemexcesso,não
altera este fato; a nulidade é cabível. Se de nada poderia dispor, no momento da doação, toda ela é
nula 268.Aquestão,todavia,nãoépacífica,havendoentendimentonosentidodequeovalorconsiderado
aotempodadoaçãosomenteésustentávelseobemnãomaisintegravaopatrimôniododonatário,quando
da colação. Nesse sentido, um dos ‘Enunciados das Jornadas de Direito Civil’ (n. 119): Para evitar o
enriquecimentosemcausa,acolaçãoseráefetuadacombasenovalordaépocadadoação,nostermosdo
caputdoart.2.004,exclusivamentenahipóteseemqueobemdoadonãomaispertençaaopatrimôniodo
donatário.Se,aocontrário,obemaindaintegrarseupatrimônio,acolaçãosefarácombasenovalordo
bemnaépocadaaberturada sucessão,nos termosdoartigo1.014,demodoapreservar aquantiaque
efetivamente integrará a legítima quando esta se constitui, ou seja, na data do óbito (Resultado da
interpretação sistemática do CC 2003 e §§, juntamente com o CC 1.832 e 844). Data venia, não
concordamos com esse entendimento. Tal diversidade de tratamento, em nosso pensar, é insegura,
consagrando ‘dois pesos e duasmedidas’ para uma situação explicitamente enfrentada e regulada pelo
legislador:oart.2.004,normaespecífica,éclaroaodisporqueovalordecolaçãodosbensdoadosserá
aquele,certoouestimativo,quelhesatribuiroatodeliberalidade.Paratornarclaraamatéria,umexemplo
iráilustrarahipótese:imaginemosqueCaiosejatitulardeumpatrimônioavaliadoem100.000reais.Viúvo,
tem três filhos: Mévio, Xisto e Xerxes. Todos, como sabemos, herdeiros necessários. Pois bem.
Imaginemos que Caio resolva doar 50% do seu patrimônio (50.000) para um terceiro. Não haveria
problema,poisessaquotasairiadasuapartedisponível.Namesmalinha,poderiatambémdoaressevalor
paraumdosherdeirosnecessários(50%),oqual,inclusive,poderiajáreceber,atítulodeadiantamento,a
suapartenalegítima(16,66%).Oqueotestadornãopoderiaseriadoarapartedisponível(50%)+uma
quota que ultrapassasse os 16,66% correspondente à legítima dos outros herdeiros necessários. Tais
valores serão considerados quando da liberalidade, e não nomomento damorte do doador 269. E vale
aindalembrar,comLUIZEDSONFACHINeCARLOSEDUARDOPIANOVSKI,que:Onascimento
demaisumfilhododecujusapósadoaçãoconsumadanãoalteraria,pois,osefeitosjurídicosdadoação,
umavezque,remarque-se,oexcessoéapuradoapenasnoinstanteemquealiberalidadeérealizada 270.
Nesse diapasão, em havendo violação da legítima, a doação, no que concerne a esse excesso, será
consideradanula,ateordoart.549doCódigoCivil” 271.
Valeacrescentaraindaqueaproteçãodalegítimaopera-seporumaduplavia:
mediante o tratamento jurídico da doação inoficiosa, reputada inválida, e,
mesmoapósamortedoautordaherança,pormeiodanecessidadedeseefetuara
colação dos bens doados (ato jurídico pelo qual o herdeiro/donatário leva ao
inventário,emconferência,ovalordobemdoado,a fimdepreservarodireito
dosdemaisherdeirosnecessários) 272.
Porisso,aliás,parasechegaraovalorda“legítima”,deve-selevaremcontao
valordosbensdoadosemvidaaoherdeironecessárioesujeitosà“colação”:
“Art.1.847.Calcula-sealegítimasobreovalordosbensexistentesnaaberturadasucessão,abatidasas
dívidaseasdespesasdofuneral,adicionando-se,emseguida,ovalordosbenssujeitosacolação”.
Tudoissoparaseapurar,efetivamente,sehouveounãoviolaçãoaodireitodos
demaisherdeirosreservatários.
3.1.Sobrea(im)possibilidadedegravaçãodebensdalegítima
Finalmente, aspectopeculiar a considerar, e causadordemuitasdúvidas, é a
questãodapossibilidadede“gravar”bensdalegítima.
Nosistemacodificadoanterior,previaoart.1.723:
“Art.1.723. Não obstante o direito reconhecido aos descendentes e ascendentes no art. 1.721, pode o
testador determinar a conversão dos bens da legítima em outras espécies, prescrever-lhes a
incomunicabilidade, confiá-los à livre administração damulher herdeira, e estabelecer-lhes condições de
inalienabilidade temporária ou vitalícia. A cláusula de inalienabilidade, entretanto, não obstará a livre
disposição dos bens por testamento e, em falta deste, à sua transmissão, desembaraçados de qualquer
ônus,aosherdeiroslegítimos”.
A regra sobre o tema foi diametralmente modificada com o Código Civil
brasileirode2002,quepassouadisciplinarotemaemseuart.1.848noseguinte
sentido:
“Art. 1.848. Salvo se houver justa causa, declarada no testamento, não pode o testador estabelecer
cláusuladeinalienabilidade,impenhorabilidade,edeincomunicabilidade,sobreosbensdalegítima”.
Esse dispositivo encontra-se em “diálogo normativo” com a regra de direito
intertemporalcontidanoart.2.042doCódigoCivil:
“Art.2.042.Aplica-seodispostonocaputdoart.1.848,quandoabertaasucessãonoprazodeumano
apósaentradaemvigordesteCódigo,aindaqueotestamentotenhasidofeitonavigênciadoanterior,Lei
n.3.071,de1.ºdejaneirode1916;se,noprazo,otestadornãoaditarotestamentoparadeclararajusta
causadecláusulaapostaàlegítima,nãosubsistiráarestrição”.
Sobreodispositivo,jádiscorreuPABLOSTOLZEGAGLIANO:
“Paraentendermoscorretamenteoart.2.042,sobanálise,éprecisoquefaçamosasseguintesdistinções:
a)otestamentoforaelaboradoapósaentradaemvigordoCódigode2002;
b)otestamentoforaelaboradoantesdaentradaemvigordoCódigode2002.
No primeiro caso, a restrição imposta pelo testador (cláusula de inalienabilidade, impenhorabilidade ou
incomunicabilidade) à legítima, por óbvio, somente subsistirá se houver sido declarada, no testamento, a
justacausa(conceitovago)exigidapeloart.1.848doCódigo.
Entretanto,nasegundahipótese,aindaqueotestamentotenhasidoelaboradoantesdavigênciadoCódigo
de2002,desdequeaaberturadasucessãotenhasedadodentrodoprazodeumanoapósaentradaem
vigor do Código, aplicar-se-á o caput do art. 1.848, que exige a justa causa declarada para efeito de
subsistir a restrição da legítima. Neste caso, o testador terá de aditar o testamento, mencionando e
justificandoogravameimpostoàlegítima,sobpenadearestriçãonãovaler.
Semdúvida,estedispositivocausarácontrovérsia.
Afinal,comoexplicarqueosujeito,nostermosdalegislaçãovigenteàépocadaelaboraçãodotestamento
(CC/1916),redigiu, livremente,oseuatodeúltimavontade,gravandoalegítima(direitoreconhecidopelo
art.1.723,CC/1916),e,apósavigênciadeumanovalei,viu-seobrigadoaaditá-lo?
Argumentar-se-ia,pois,queotestador,elaborandootestamentoantesdoCódigode2002,obedeceuàlei
vigenteàépoca.
Entretanto, neste ponto, considerando inclusive o aspecto egoístico do Direito anterior que conferia
arbitráriopoderaotestador,concordamoscomoProfessorZenoVeloso,nosentidodeque‘aexigênciade
ser mencionada a justa causa da cláusula restritiva (CC, art. 1.848) não é uma questão de forma (o
extrínsecodotestamento),masdefundo,deconteúdojurídicodadisposiçãotestamentária(ointrínsecodo
testamento),regendo-se,assim,pelaLeivigenteaotempodaaberturadasucessão’ 273.
Porisso,entendemosrazoávelaincidênciadaregra,nostermosemqueforaredigida” 274.
Emverdade,parabemcompreendermosoinstituto,énecessárioinvestigarmos
aexpressão“justacausa”.
Éoobjetivodopróximosubtópico.
3.2.Justacausaparagravaçãodebensdalegítima
O que se pode entender como “justa causa” para a gravação de bens da
legítima?
Trata-sedeumconceitoabertoouindeterminado.
UmdosváriosquecompõemocorpodenormasdoCódigoCivilde2002,à
luz do princípio da operabilidade, conforme preleciona MIGUEL REALE,
porquanto:
“Somenteassimse realizaodireito emsuaconcretude, sendooportuno lembrarquea teoriadoDireito
concreto, enãopuramenteabstrato, encontra apoiode jurisconsultosdoportedeEngisch,Betti,Larenz,
Esseremuitosoutros,implicandomaiorparticipaçãodecisóriaconferidaaosmagistrados” 275.
Nãoédemaisdizer,pois,queonossoCódigoCivilpautou-seporumadiretriz
caracterizada pela adoção, ao longo do seu texto, de verdadeiros poros
axiológicos,consagradosemtaisconceitosabertosenasdenominadascláusulas
gerais, para permitir que o magistrado pudesse imprimir maior concreção ao
comandonormativo,segundoaspeculiaridadesdocasoconcreto.
Portalrazão,comodito,tambémencontramos,aolongodetodaacodificação,
cláusulas gerais, as quais, para além de compreenderem um conceito aberto,
possuemumacargadepoderoucomandonormativomuitomaior,vinculativoda
própriaatividadedojuiz,aexemploda“boa-féobjetiva”ouda“funçãosocial”.
Temos, portanto, que, ao permitir ao testador gravar com cláusula de
inalienabilidade,incomunicabilidadeouimpenhorabilidadedosbensdalegítima,
emhavendo“justacausa”,olegisladorconcedeuumaáleadediscricionariedade
possível,dentrodovalordojustoelegítimo,paraasalvaguardadedeterminados
interesses 276.
É o caso, por exemplo, de se gravar com cláusula de inalienabilidade e
impenhorabilidade uma casa, integrante da legítima, que tocará a um herdeiro
afeito a gastos, como fimde impedi-lodedilapidar o seuprópriopatrimônio.
Ou,namesmalinha,gravá-locomcláusulade incomunicabilidadepara impedir
queobemsejatransmitidoaoseucônjuge.
Nessescasos,emhavendoulteriorcontrolejudicial,nãopoderáomagistrado,
umavezconvencidodalegitimidadedamedida,torná-laineficaz,fazendoobem
retornaraomonte-mor 277.
Vale destacar que a referência à “justa causa” permite eventual discussão
judicialulterior,emhavendorazãojurídicaparatanto.
Nesta linha, vale lembrar que o Código Civil de 2002, ao contrário do seu
antecessorde1916,experimentacertainfluência“causalista” 278,oquereforçaria
apossibilidadedecontrolejudicialdalegalidadedacláusularestritiva.
Sobreosdiversosaspectosematizesdacláusuladeinalienabilidade,SÍLVIO
VENOSAensina:
“Dopontodevista da legítima, exclusivamente, a inalienabilidadepode ser total ouparcial, conforme se
estendaounãoatodososbensquecomporãoalegítima.Quantoàcláusula,genericamentefalando,pode
ela ser absoluta, quando o testador impõe a impossibilidade de alienação a quem quer que seja. Esse
absolutismoda cláusula pode referir-se a um, algumou todos os bens clausulados. Se o disponente não
distingue, entendemos a restrição como absoluta. É relativa a imposição quando o testador proíbe a
alienaçãosobdeterminadasformas,ouadeterminadaspessoas.Podeotestador,porexemplo,sópermitir
aalienaçãoatítulogratuito,ouadeterminadaspessoas(...)Ainalienabilidadeévitalíciaquandonãoaposto
um termo, terminando com amorte do titular (...) Pode a cláusula ser temporária quando o disponente
insereumtermo” 279.
Outropontodignodenotaéquenãoserádadoaotestadorestabelecerqueos
indicadosbensdalegítimasejamconvertidosemoutrosdeespéciediversa,ateor
doquedispõeo§1.ºdomesmoartigo.
Vale dizer, com base no exemplo acimamencionado, o testador não poderá
determinaravendadacasaparaaposterioraquisiçãodedoisveículosaserem
clausulados.
A lei expressamente veda que o testador estabeleça a conversão embens de
natureza diversa, mas nada diz quanto à possibilidade de serem da mesma
natureza.
Emnossosentir,nãohaveriamuitautilidadepráticanaexpressaproibiçãode
se estabelecer a conversão em bens congêneres (inclusive quanto à expressão
econômica),poisaconjunturafática,emtalcaso,nãoexperimentariamudança.
Ressalve-se,finalmente,conformedispõeo§2.ºdoart.1.848,apossibilidade
deseobterumaautorizaçãojudicial—se,paratanto,houverfundamento—com
o propósito de alienar os bens gravados, convertendo-se o produto obtido em
outros bens, de natureza diversa ou não, que ficarão sub-rogados nos ônus dos
primeiros.
É o caso de o herdeiro, a quem tocou a casa— gravada com cláusula de
inalienabilidade—,precisarvendê-laparacustearumacirurgia.
Poderá, pois, ingressar com pedido de alvará judicial, que deflagrará um
procedimentodejurisdiçãovoluntária,noqualdeveránecessariamenteinterviro
órgãodoMinistérioPúblico.
Obtidaanecessáriaautorização,poderáserefetuadaavendae,abatidoovalor
da justificada despesa, conforme exemplo dado, o interessado deverá, com o
remanescente(sehouver,claro),obteroutrobemcongênere,quesesubstituiráno
ônusdoprimeiro.
Aliás, a excepcional possibilidadede alienaçãodobemgravado—quenão
pode ser afastada pela vontade das partes — vai ao encontro do próprio
princípio da função social, como já decidiu o STJ, em acórdão da inspirada
MinistraNANCYANDRIGHI:
“DIREITO DAS SUCESSÕES. REVOGAÇÃO DE CLÁUSULAS DE INALIENABILIDADE,
INCOMUNICABILIDADEEIMPENHORABILIDADEIMPOSTASPORTESTAMENTO.
FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. SITUAÇÃO
EXCEPCIONAL DE NECESSIDADE FINANCEIRA. FLEXIBILIZAÇÃO DA VEDAÇÃO
CONTIDANOART.1.676DOCC/16.POSSIBILIDADE.
1.Seaalienaçãodoimóvelgravadopermiteumamelhoradequaçãodopatrimônioàsuafunçãosociale
possibilita ao herdeiro sua sobrevivência e bem-estar, a comercialização do bem vai ao encontro do
propósitodotestador,queera,emprincípio,odeampararadequadamenteobeneficiáriodascláusulasde
inalienabilidade,impenhorabilidadeeincomunicabilidade.
2.Avedaçãocontidanoart.1.676doCC/16poderáseramenizadasemprequeforverificadaapresença
desituaçãoexcepcionaldenecessidadefinanceira,aptaarecomendaraliberaçãodasrestriçõesinstituídas
pelotestador.
3.Recursoespecialaquesenegaprovimento”(REsp1158679/MG,Rel.Min.NancyAndrighi,3.ªTurma,
j.7-4-2011,DJe,15-4-2011).
Trata-se,pois,deumjulgadoqueprivilegiaainterpretaçãoconstitucionaldas
normaslegaisdonossoDireitoSucessório.
4.DISCIPLINAJURÍDICAPOSITIVADADASUCESSÃOLEGÍTIMA
Pretende o relevante tópico enfrentar, efetivamente, a disciplina jurídica
positivadaacercadaSucessãoLegítima.
Antes de adentrarmos no núcleo desta apaixonante temática, algumas outras
considerações, porém, devem ser feitas, para a sua completa e abrangente
compreensão.
Vamosaelas.
4.1.Consideraçõesgeraiseregrasfundamentais
Se as regras da Sucessão Legítima existem para a preservação da parte
indisponíveldaherança—prestigiando-sealgunsdosherdeiros—,nãosepode
negar que o estabelecimento de uma ordem de vocação hereditária tem por
finalidade, também, permitir a transmissibilidade do patrimônio do falecido,
especialmenteparaoscasosemqueelenãomanifestou,de formaprévia,asua
vontadesobreosentidododirecionamentodaquelesbens.
Por isso, a própria lei cuida de imprimir destinação ao patrimônio, segundo
umasupostavontadepresumíveldoautordaherança.
Nesse contexto, é muito importante frisarmos que é característica básica do
sistemaaregrasegundoaqualosucessormaispróximoexcluiomaisremoto.
Assim, se Carmelo morre deixando um filho, Fabio, e um irmão, Roger, a
herançatocaráaoprimeiro,segundoaregraacimaexposta.
O parente mais próximo, pois, no caso, afastou o mais distante na linha
sucessória.
Ainda a título introdutório, é importante frisar a mudança por que passou o
sistema,quandodarevogaçãodoCódigode1916econsequenteentradaemvigor
daLeide2002.
Até então, o sistema de Sucessão Legítima, a par de bastante simplificado,
conferiaumatutelatênueaocônjugesobrevivente.
Valedizer,comamortedoautordaherança,atransmissibilidadedosbensera
linear,semaexistênciadeeventualdireitoconcorrencial,naseguinteordem:
a)descendente;
b)ascendente;
c)cônjuge;
d)colateral.
Destaque-se que a(o) companheira(o) sobrevivente, por sua vez, também foi
contemplada(o) na terceira classe de sucessores, a partir da vigência daLei n.
8.971,de1994.
Emsuma,aordemdetransmissibilidadepatrimonialeradesimplesintelecção,
comprioridadedodescendente.
Aocônjugeeàcompanheira(oucompanheiro),reservara-sea terceiraclasse
sucessória, a par de lhe haverem sido conferidos certos direitos sucessórios
indiretos ou paralelos, a exemplo do “usufruto vidual” e do “direito real de
habitação”,queserãoanalisadosemsubtópicosposteriores.
Críticas eram feitas a esse sistema, desde a primeira codificação brasileira,
sob o argumento de que o direito do cônjuge não estaria suficientemente
preservado, impondo-seumareformaquemelhorcontemplasseasuasituaçãoe
aperfeiçoasseasuatutela.
Nessesentido,veja-seotestemunhohistóricodeCLÓVISBEVILÁQUA:
“Entremaridoemulhernãoexisteparentesco,quesirvadebaseaumdireitohereditáriorecíproco.Umelo
maisforte,porém,osuneemsociedadetãoíntima,pelacomunhãodeafetos,deinteresses,deesforços,de
preocupações,emvistadaproleengendradaporambos,quesenãopode recusaranecessidadede lhes
ser garantido um direito sucessório, somente equiparável ao dos filhos e ao dos pais. Ou se tenha em
atenção, para determinar o direito hereditário ab intestato, o amor presumido do de cujus ou a
solidariedadedafamília,asituaçãodocônjugesupérstiteapresenta-sesobaspectosdosmaisvantajosos.
E,relembrandoqueafortunadomaridoencontranasábiaeconomiadamulherumpoderosoelementode
conservação e desenvolvimento; que é,muitas vezes, para cercar uma esposa amada, de conforto e de
gozos,queohomemlutaevencenoconflitovital;eaindaqueaequidadeseriagravementegolpeadaem
muitas circunstâncias, se o cônjuge fosse preferido por um parente longínquo; os legisladoresmodernos
têm procurado reagir contra o sistema ilógico e injusto da exclusão total ou quase total do cônjuge
sobrevivoemfacedaherançadocônjugepré-morto” 280.
Ecoubeaocodificadorde2002atenderaessesreclamos.
Isso porque o tratamento jurídico sucessório do cônjuge supérstite fora
vigorosamenteampliado,reconhecendo-se,notextocodificado,asuacondiçãode
herdeironecessárioeconcorrentecomosdescendenteseascendentes.
Omesmoelogioànovelcodificação,todavia,nãopodeserditoemrelaçãoao
tratamentosucessórioda(o)companheira(o),que,conformeveremosemmomento
oportuno,sofreuuminegávelmaltratolegislativo.
Com efeito, o casamento passou a conferir um status sucessório até então
inexistente.
À(ao) viúva(o), outrora casada(o), não apenas se manteve um importante
direitosucessórioparalelo(direitorealdehabitação),comotambém,apardeser
erigida(o) à categoria de herdeiro necessário, passou a concorrer com os
sucessores das classes anteriores (ascendentes e descendentes), em uma clara
mitigação da tradicional regra, acimamencionada, segundo a qual o “herdeiro
maispróximoexcluiriaomaisremoto”.
Umaverdadeirarevoluçãoemnossosistema!
Por outro lado, conforme ainda veremos, o direito conferido ao cônjuge de
concorrer comosdescendentesdependerádaprévia análisedo regimedebens
queforaadotado.
Ou seja, ao analisarmos o inventário ou o arrolamento em que haja cônjuge
sobrevivente (viúva ou viúvo) a concorrer com descendentes comuns ou
exclusivos do de cujus, afigura-se indispensável a análise do regime de bens
adotado.
Por isso, em respeito ao nosso estimado leitor, antes de deitarmos olhos no
específico estudo da sucessão do descendente, passaremos em breve revista
noções básicas acerca dos regimes de bens consagrados pelo Direito
brasileiro 281.
4.2.RelembrandonoçõesbásicasdosregimesdebensnoCódigoCivilbrasileiro
Em uma análise sistemática, é possível identificar cinco regimes básicos de
bensnovigentesistemabrasileiro.
São eles, a saber, a comunhão parcial de bens; a comunhão universal; a
participaçãofinalnosaquestos;aseparaçãoconvencionaldebens;e,porfim,o
regimedaseparaçãolegalouobrigatóriadebens.
Relembremossuasregrasfundamentais.
4.2.1.Regimedecomunhãoparcialdebens
Aesmagadoramaioriados casais, quandoda celebraçãodomatrimônio, não
cuidadeestabelecer,pormeiodepacto,regimedebensespecial.
Isso talvezporcontada(quasesempre)constrangedorasituaçãode,emmeio
ao doce encantamento do noivado, teremde entabular conversa desagradável a
respeitodedivisãopatrimonial.
Tal diálogo culmina por afigurar-se acentuadamente desagradável, quase
anacrônico,diantedaexpectativadeeternidadequesempreacompanhaoprojeto
devidadosnoivos.
Ou,quemsabe,talveznãocuidemdeestabeleceroreferidopactoantenupcial,
simplesmente,pornãoteremaindapatrimôniocomoquesepreocupar...
Enfim!
O fato é que, emgeral, noBrasil, as pessoas não cuidamde fazer opção de
regime, mediante contrato antenupcial, de maneira que incidirá o regime legal
supletivo,previstoemlei.
AtéaentradaemvigordaconhecidaLeidoDivórcio(Lein.6.515),em1977,
oregimesupletivoeraodecomunhãouniversaldebens.
Apartirdessediploma,onossoDireitoconsagrariacomoregimesubsidiárioo
dacomunhãoparcialdebens,oquepassouaconstarnocaput do art. 258do
Código Civil brasileiro de 1916 282, opção legislativa esta ainda presente no
Códigode2002:
“Art. 1.640.Nãohavendo convenção, ou sendo ela nula ou ineficaz, vigorará, quanto aosbens entre os
cônjuges,oregimedacomunhãoparcial”.
Eoparágrafoúnicodestaca:
“Poderãoosnubentes,noprocessodehabilitação,optarporqualquerdosregimesqueestecódigoregula.
Quantoàforma,reduzir-se-áatermoaopçãopelacomunhãoparcial,fazendo-seopactoantenupcialpor
escriturapública,nasdemaisescolhas”.
Assim, temos que a comunhão parcial, seja pela vontade expressa dos
cônjuges, seja pela supletividade prevista em lei, acaba por se tornar o mais
abrangenteedisseminadoregimedebens.
Nãoéestranho,porisso,quetambémparaauniãoestáveltalregimesejaeleito
comoosupletivo 283.
Podemosdefiniro regimedecomunhãoparcialdebenscomoaqueleemque
há, em regra, a comunicabilidade dos bens adquiridos a título oneroso na
constânciadomatrimônio,porumouambososcônjuges,preservando-se,assim,
comopatrimôniopessoaleexclusivodecadaum,osbensadquiridosporcausa
anteriorourecebidosatítulogratuitoaqualquertempo.
Genericamente, é como se houvesse uma “separação do passado” e uma
“comunhão do futuro” em face daquilo que o casal, por seu esforço conjunto,
ajudouaamealhar.
Trata-se,pois,emnossosentir,deumregimeconveniente,justoeequilibrado.
Anossadefiniçãopropostatemraiznoart.1.658doCódigoCivilde2002:
“Art. 1.658. No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na
constânciadocasamento,comasexceçõesdosartigosseguintes”.
Note-se que a comunicabilidade característica desse regime (a
comunicabilidade dos bens aquestos) não é absoluta, sofrendo o temperamento
dosarts.1.659a1.662doCódigoCivil.
4.2.2.Regimedecomunhãouniversaldebens
Oregimedecomunhãouniversaldebenstendeàunicidadepatrimonial.
Vale dizer, o seu princípio básico determina, salvo as exceções legais (art.
1.668 284), uma fusão do patrimônio anterior dos cônjuges, e, bem assim, a
comunicabilidade dos bens havidos a título gratuito ou oneroso, no curso do
casamento,incluindo-seasobrigaçõesassumidas:
“Art.1.667.Oregimedecomunhãouniversalimportaacomunicaçãodetodososbenspresentesefuturos
doscônjugesesuasdívidaspassivas,comasexceçõesdoartigoseguinte”.
Em situações especiais, porém, é possível ainda se constatar a formação de
jurisprudência ampliativa das hipóteses de incomunicabilidade, mesmo no
regimedecomunhãouniversaldebens.
Lembremo-nos de que, a teor do art. 1.669, a incomunicabilidade dos bens
enumeradosnoartigoantecedentenãoseestendeaosfrutos,quandosepercebam
ou vençam durante o casamento, a exemplo dos aluguéis gerados por um bem
exclusivodeumdoscônjuges.
4.2.3.Regimedeparticipaçãofinalnosaquestos
Uma leitura equivocada das previsões legais do regime poderia conduzir o
intérpreteaconfundi-lo,inicialmente,comacomunhãoparcialdebens.
Masesseerronãodevesercometido.
Nacomunhãoparcial,comunicam-se,emregrageral,osbensquesobrevierem
aocasamento,adquiridoporumouambososcônjuges,atítulooneroso.
Já na participação final, a comunicabilidade refere-se apenas ao patrimônio
adquiridoonerosamentepeloprópriocasal (ex.:acasadepraiaadquiridapelo
esforçoeconômicoconjuntodomaridoedaesposa).
Nãoéporoutra razão,aliás,queoart.1.673 285dispõeque,naparticipação
final,integramopatrimôniopróprioosbensquecadacônjugepossuíaaocasare
osporeleadquiridos,aqualquertítulo,naconstânciadocasamento.
Ficaclaro,pois,queacomunicabilidadenoregimeoraestudadotocaapenas
aopatrimônioadquiridoemconjunto 286,pelosprópriosconsortes.
Outradiferençaconsistenaincidênciaderegrasprópriasparacadaregime,a
saber: comunhão parcial está disciplinada nos arts. 1.658 a 1.666, enquanto a
participação final nos aquestos é regida pelos arts. 1.672 a 1.686 do mesmo
Código.
Porcontadisso,nãosepodefazerincidirregradeumregimeemoutroouvice-
versa.
Atítulodeexemplo,entramnacomunhãoparcialosbensadquiridosporfato
eventual,comousemoconcursodetrabalhooudespesaanteriordocônjuge(art.
1.660,II),aexemplodeumprêmiodeloteria,nãosepodendoaplicartalnormaà
participaçãofinal.
4.2.4.Regimedaseparaçãoconvencionaldebens
O regime de separação convencional de bens é de simples compreensão e
guardaíntimaconexãocomoprincípiodaautonomiaprivada.
Emcampodiametralmenteopostoaodacomunhãouniversaldebens,comtal
regime, os cônjuges pretendem, por meio da vontade manifestada no pacto
antenupcial, resguardar a exclusividade e a administração do seu patrimônio
pessoal,anteriorouposterioraomatrimônio.
Opensamentosegundooqual“amornãoseconfundecompatrimônio”encontra
aquioseuamparojurídico.
É o exercício da autonomia da vontade que permite, no caso, haver total
divisãodosbensdecadacônjuge,semprejuízodoreconhecimentodaformação
deumafamília.
Esseregimetemcomopremissaaincomunicabilidadedosbensdoscônjuges,
anterioreseposterioresaocasamento.
Éaprevisãodoart.1.687doCódigoCivil:
“Art.1.687.Estipuladaaseparaçãodebens,estespermanecerãosobaadministraçãoexclusivadecada
umdoscônjuges,queospoderálivrementealienarougravardeônusreal”.
Trata-se de regime que exige expressa manifestação das partes, não se
confundindocomodaseparaçãolegalouobrigatória.
Estipulado o regime de separação de bens, cada cônjuge mantém o seu
patrimônio próprio, compreensivo dos bens anteriores e posteriores ao
casamento, podendo livremente aliená-los, administrá-los ou gravá-los de ônus
real.
Note-se, pois, que, nesse regime, existirá uma inequívoca independência
patrimonial,nãohavendoespaçoparafuturameação.
4.2.5.Regimedaseparaçãolegalouobrigatóriadebens
Hásituaçõesemquealeiimpõeoregimedeseparaçãodebens.
Trata-sedodenominadoregimedeseparaçãolegalouseparaçãoobrigatória
de bens, instituído nos termos do art. 1.641 que, por traduzir restrição à
autonomia privada, não comporta interpretação extensiva, ampliativa ou
analógica.
Vejamos,pois,quaissãoassuashipótesesdeaplicação,nostermosdoCódigo
Civil:
“Art.1.641.Éobrigatóriooregimedaseparaçãodebensnocasamento:
I — das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do
casamento; II—da pessoamaior de setenta anos; III—de todos os que dependerem, para casar, de
suprimentojudicial”.
Esse artigo, em nosso sentir, desafia o jurista a tentar realizar uma
interpretaçãoconstitucional,especialmentenaperspectivadosuperiorprincípio
daisonomia.
Aliás, vamos além: o dispositivo, posto informado por uma suposta boa
intenção legislativa, culmina, na prática, por chancelar situações de inegável
injustiçaeconstitucionalidadeduvidosa.
Aprimeirahipóteseprevistaédemaissimplesentendimentoeaceitação.
Impõe-seoregimedeseparaçãoobrigatóriaparaaspessoasquecontraíremo
matrimônioemviolaçãodascausassuspensivasdomatrimônio(art.1.523).
Asegundasituaçãoprevistananormaéabsurdaeinconstitucional.
A alegação de que a separação patrimonial entre pessoas que convolarem
núpciasacimados70anos teriao intuitodeprotegero idosodas investidasde
quempretendaaplicaro“golpedobaú”nãoconvence.
E, se assim o fosse, esta risível justificativa resguardaria, em uma elitista
perspectiva legal, uma pequena parcela de pessoas abastadas, apenando, em
contrapartida,umnúmeromuitomaiordebrasileiros.
NãopodemosextrairdessanormaumainterpretaçãoconformeaConstituição.
Muitopelocontrário.
O que notamos é uma violência escancarada ao princípio da isonomia, por
contadoestabelecimentodeumaveladaformadeinterdiçãoparcialdoidoso.
Avançadaidade,porsisó,comosesabe,nãoécausadeincapacidade!
Se existe receio de o idoso ser vítima de um golpe por conta de uma
vulnerabilidade explicada por enfermidade ou deficiência mental, que seja
instaurado procedimento próprio de interdição, mas disso não se conclua em
favordeuma inadmissível restriçãodedireitos, simplesmenteporcontada sua
idade.
Aliás,com70anosoumais,apessoapodepresidiraRepública.
PodeintegraraCâmaradeDeputados.
OSenadoFederal.
Enãopoderiaescolherlivrementeoseuregimedebens?
Nãopodemostentarencontrarrazãoondeelasimplesmentenãoexiste.Nessa
linha, concluímos pela completa inconstitucionalidade do dispositivo sob
comento (art. 1.641, II), ainda não pronunciada, em controle abstrato,
infelizmente,peloSupremoTribunalFederal 287.
Finalmente, dispõe o referido artigo que também será aplicado o regime de
separação legal em face daqueles que, para casar, dependeram de suprimento
judicial.
Assim, em situações específicas relativas a menores, em que se exige
pronunciamento judicial, comoemcasodedivergência entreospaisoudenão
alcancedaidadenúbil,évedadoaosnubentesalivreescolhadoregimedebens.
Se, em uma análise mais superficial, tal norma afigura-se justificável, a
mantençadessemesmoregimedeseparação,aolongodetodaumavida,podenão
serasoluçãomaisadequada 288.
Passadas em revista tais importantes noções, enfrentemos, agora, a instigante
temáticaatinenteà“sucessãopelodescendente”.
4.3.Sucessãopelodescendente
A sucessão pelo descendente, no Código Civil de 1916, era extremamente
simplificada, namedida em que o seu art. 1.603, com dicção direta, deferia a
herançaàprimeiraclassedeherdeiros, semquehouvessedireitoconcorrencial
denenhumoutrosucessor 289.
Ocorre que, como anunciado linhas acima, o codificador de 2002 alterou
sobremaneira a matéria, ao deferir ao cônjuge sobrevivente, a depender do
regimedebensadotado,direitodeconcorrercomodescendentenaherançado
falecido.
Em outras palavras, posto o descendente permaneça na primeira classe
sucessória,a(o)viúva(o)sobreviventepoderácomeleconcorrer,nostermosdo
(aindapolêmico)incisoIdoart.1.829doCódigoCivil:
“Art.1.829.Asucessãolegítimadefere-senaordemseguinte:
I—aosdescendentes,emconcorrênciacomocônjugesobrevivente,salvosecasadoestecomofalecido
noregimedacomunhãouniversal,ounodaseparaçãoobrigatóriadebens(art.1.640,parágrafoúnico);ou
se,noregimedacomunhãoparcial,oautordaherançanãohouverdeixadobensparticulares”.
Dasualeitura,podemosconcluiroseguinte.
Falecidooautordaherança,estaserádeferidaao(s)seu(s)descendente(s),1.ª
classesucessória 290, respeitadaa regrasegundoaqualoparentemaispróximo
excluiomaisremoto 291.
A questão, porém, não é mais tão simples como outrora, pois é preciso
verificarsehaveráaconcorrênciado(a)cônjugeemrelaçãoaodescendente,nos
termosdoreferidoincisoIdoart.1.829.
Nos termos desse dispositivo legal, havendo cônjuge sobrevivente (viúva ou
viúvo),esteNÃOterádireitodeconcorrercomodescendente, seo regimede
bensadotadofoide:
a)comunhãouniversal;
b)separaçãoobrigatória 292;ou
c)comunhãoparcial,seoautordaherançaNÃOdeixoubensparticulares.
Por outro lado,haverá, SIM, direito de concorrer com o descendente, se o
regimedebensadotadofoide:
a)participaçãofinalnosaquestos;
b)separaçãoconvencional;ou
c)comunhãoparcial,seoautordaherançadeixoubensparticulares.
A proibição da concorrência sucessória quando o regime de bens adotado
houvessesidoodacomunhãouniversaloudaseparaçãoobrigatóriaéfacilmente
explicada.
Noprimeiro caso, entendeuo legisladorque aopçãopela comunhão total já
conferiria ao sobreviventeoamparomaterialnecessário, emvirtudedas regras
atinentesaoprópriodireitodemeação 293.Nosegundocaso,acontrariosensu,
uma vez que a própria lei instituiu uma forçada separação patrimonial, sentido
nãohaveriaemsedeferirumacomunhãodebensapósamorte.
No caso da comunhão parcial, todavia, a compreensão da proibição
concorrencialnãoétãosimplesassim.
Por issomesmoamatériaensejaumaexplicaçãomaisminuciosa,oqueserá
feitonopróximosubtópico.
4.3.1.Correntesexplicativasdaconcorrênciadodescendentecomocônjugesobrevivente,noregimedacomunhãoparcial
A norma legal proíbe que o cônjuge sobrevivente, que fora casado sob o
regimedecomunhãoparcialdebens,concorracomosdescendentesnaherança,
casoofalecidoNÃOhajadeixadobensparticulares.
Trata-se da regra do “duplo não”: se “NÃO” deixou bens particulares,
concorrência“NÃO”haverá.
Em outras palavras, sem prejuízo do seu direito próprio de meação, a(o)
viúva(o) terádireitoconcorrencial,emfacedosdescendentes,quantoaosbens
particularesdeixadospelofalecido,quandooregimeadotadohouversidooda
comunhãoparcialdebens.
Nessesentido,comhabitualerudição,GISELDAHIRONAKAensina:
“Oprimeirodestespressupostosexigidospelaleiéodoregimematrimonialdebens.Bemporissooinc.
I do art. 1.829, anteriormente reproduzido, faz depender a vocação do cônjuge supérstite do regime de
bens escolhido pelo casal, quando de sua união, uma vez que o legislador enxerga nessa escolha uma
demonstração prévia dos cônjuges no sentido de permitir ou não a confusão patrimonial e em que
profundidadequeremveroperadatalconfusão.
Assim, não será chamado a herdar o cônjuge sobrevivo se casado com o falecido pelo regime da
comunhãouniversaldebens(arts.1.667a1.671doatualCódigoCivil),oupeloregimedaseparação
obrigatóriadebens(arts.1.687e1.688,combinadocomoart.1.641).
Porfim,aquelescasaisque,tendosilenciadoquandodomomentodacelebraçãodocasamento,optaramde
forma implícita pelo regime da comunhão parcial de bens, fazem jus àmeação dos bens comuns da
família, como se de comunhão universal se tratasse, mas passam agora a participar da sucessão do
cônjugefalecido,naporçãodosbensparticularesdeste” 294.
Deacordocomalógicalinhaderaciocínio,ateordocritérioescolhidopelo
legislador—nosentidodequecônjugesobrevivente(queforacasadoemregime
de comunhão parcial) somente terá direito concorrencial quando o falecido
houver deixado bens particulares—, é forçoso convir que tal direito incidirá
apenassobreessaparceladebens.
Mesmoquemantenhamosumacertareservacríticaquantoàopçãolegislativa
— na medida em que, em geral, os casais constroem seu patrimônio,
conjuntamente, somente após a união conjugal, resultando muito pouco na
categoria de “bens particulares”— o fato é que a interpretação da norma sob
comento, tal como redigida, conduz-nos à conclusão de que o direito
concorrencialreconhecidoaocônjugesobreviventelimita-se,defato,aoâmbito
dosbensexclusivosdofalecido.
Masamatérianãoépacífica,comoanotaobrilhanteZENOVELOSO:
“Mas não é pacífico, nem unânime, o parecer de que o cônjuge sobrevivente casado sob o regime da
comunhão parcial só irá concorrer com os descendentes quanto aos bens particulares: alerte-se, de
passagem,quepoucostemassãotranquilosnodireitosucessóriodoscônjuges.MariaHelenaDiniz(Curso
deDireitoCivilBrasileiro;DireitodasSucessões,22.ed.SãoPaulo:Saraiva,v.6,p.122)adverteque
setratadeumaquestãopolêmica,eenunciaquenaconcorrênciacomdescendente,seoregimedebens
foiodacomunhãoparcial,nãosedevemconsiderarapenasosbensparticularesdofalecido,mastodoo
acervohereditário,‘porquealeinãodizqueaherançadocônjugesórecaisobreosbensparticularesdo
decujuseparaatenderaoprincípiodaoperabilidade,tornandomaisfácilocálculoparaapartilhadaparte
cabível a cada herdeiro’. Além disso, acrescenta, a herança é indivisível, deferindo-se como um todo
unitário, ainda que vários sejamos herdeiros (CC, art. 1.791 e parágrafo único). Entendem, igualmente,
que, nesse caso, a concorrência do cônjuge com os descendentes envolve os bens particulares e os
comuns:GuilhermeCalmonNogueiradaGama,InáciodeCarvalhoNeto,LuizPauloVieiradeCarvalhoe
Mario Roberto Carvalho de Faria, segundo levantamento feito por Francisco José Cahali (Direito das
Sucessões, 3. ed., com Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, São Paulo: Revista dos Tribunais,
2007,n.9.4,p.189)” 295.
Emumprimeiromomento,defato,seguíamosalinhadepensamentosegundoa
qual ao cônjuge sobrevivente assistiria o direito de concorrer com os
descendentesemfacedetodaaherança.
E,comoditoacima,ponderáveisargumentoshánessesentido.
Dentre eles, destacamos o fato de a restrição aos bens particulares poder
esvaziar completamente a norma, namedida em que, namaioria das vezes, os
casais brasileiros somente amealham patrimônio ao longo da própria união
conjugal,formandoumamassa“comum”debens.
Além disso, não se pode desprezar a circunstância de que tal limitação não
existe nem em face da(o) companheira(o) viúva(o), a teor do tão criticado art.
1.790doCódigoCivilde2002.
Entretanto, após detida ponderação, concluímos que mais acertada é a
interpretaçãolimitativadodireitosucessóriodocônjuge.
O legislador não poderia fazer uma inócua referência à expressão “bens
particulares”, se não pretendesse, em verdade, com isso, limitar o direito
concorrencialdocônjugeaessacategoriadebens.
Trata-sedeumainterpretaçãológicaerazoável.
Ademais, o direito próprio de meação em face do patrimônio comum já
garantiria justo amparo à viúva em face dos bens construídos ou havidos
conjuntamente,aolongodomatrimônio.
Por isso, posicionamo-nos junto aos autores 296 que entendem haver direito
concorrencial da(o) viúva(o) — que fora casada(o) em regime de comunhão
parcialdebens—,somentequantoaosbensparticularesdeixadospelofalecido.
Oenunciado270daIIIJornadadeDireitoCivil,postuladodedoutrina,aponta
namesmadireção,aodisporque:
“Oart.1.829,inc.I,sóasseguraaocônjugesobreviventeodireitodeconcorrênciacomosdescendentes
do autor da herança quando casados no regimeda separação convencional de bens ou, se casados nos
regimes da comunhão parcial ou participação final nos aquestos, o falecido possuísse bens particulares,
hipóteses emque a concorrência se restringe a tais bens, devendo os bens comuns (meação) ser
partilhadosexclusivamenteentreosdescendentes”(grifamos).
Filiamo-nos, nesse contexto, à linha de pensamento segundo a qual o direito
concorrencialdocônjugesobrevivente(queforacasadoemregimedecomunhão
parcialdebens)limita-seaosbensparticularesdeixadospeloautordaherança.
Trata-sedeposicionamentoqueseconsolidounoSuperiorTribunaldeJustiça:
“Seçãouniformizaentendimentosobresucessãoemregimedecomunhãoparcialdebens
Ocônjugesobrevivente,casadosoboregimedacomunhãoparcialdebens,concorrecomosdescendentes
nasucessãodofalecidoapenasquantoaosbensparticularesqueestehouverdeixado,seexistirem.Esseé
o entendimento daSegundaSeçãodoSuperiorTribunal de Justiça (STJ) em julgamento de recurso que
discutiuainterpretaçãodapartefinaldoincisoIdoartigo1.829doCódigoCivil(CC)de2002.
AdecisãoconfirmaoEnunciado270daIIIJornadadeDireitoCivil,organizadapeloConselhodaJustiça
Federal (CJF), e pacifica o entendimento entre aTerceira e aQuartaTurma, que julgammatéria dessa
natureza.
O enunciado afirma que ‘o artigo 1.829, I, do CC/02 só assegura ao cônjuge sobrevivente o direito de
concorrência com os descendentes do autor da herança quando casados no regime da separação
convencionaldebensou,secasadosnosregimesdacomunhãoparcialouparticipaçãofinalnosaquestos,
ofalecidopossuíssebensparticulares,hipótesesemqueaconcorrênciaserestringeataisbens,devendo
osbenscomuns(meação)serempartilhadosexclusivamenteentreosdescendentes’.
SegundooministroRaulAraújo,queficouresponsávelporlavraroacórdão,oCC/02modificouaordem
devocaçãohereditária,incluindoocônjugecomoherdeironecessário,passandoaconcorreremigualdade
decondiçõescomosdescendentesdofalecido.
Emborahajaessaprerrogativa,amelhor interpretaçãodapartefinaldesseartigo,segundooministro,no
quetangeaoregimedecomunhãoparcialdebens,nãopoderesultaremsituaçãodedescompassocoma
queteriaomesmocônjugesobreviventenaausênciadebensparticularesdofalecido” 297.
Nesse contexto, afinal, uma pergunta se impõe: o que se deve entender por
“bensparticulares”?
Éoqueenfrentaremosnopróximosubtópico!
4.3.2.Compreensãodaexpressão“bensparticulares”paraefeitodeconcorrênciadocônjugesobreviventecomodescendente
Afinal, o que significa a expressão “bens particulares” para efeito de
concorrência do cônjuge sobrevivente que fora casado no regime de comunhão
parcialdebens?
Asuadefinição,emnossosentir,nãoérevestidadegrandecomplexidade.
Aomenos,emteoria.
Reputam-se“particulares”osbensintegrantesdopatrimônioexclusivodecada
cônjuge, tais como: os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe
sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-
rogados em seu lugar; os bens adquiridos com valores exclusivamente
pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares; as
obrigaçõesanterioresaocasamento;asobrigaçõesprovenientesdeatosilícitos,
salvo reversão em proveito do casal; os bens de uso pessoal, os livros e
instrumentosdeprofissão;osproventosdotrabalhopessoaldecadacônjuge;as
pensões,meios-soldos,montepioseoutrasrendassemelhantes;e,ainda,todosos
bens cuja aquisição tiver por título causa anterior ao casamento (arts. 1.659 e
1.661doCC).
Mas,naprática,nãoétãosimplesassim.
Tomemos, como exemplo, a previsão legal segundo a qual os “proventos do
trabalho pessoal de cada cônjuge” (art. 1.659, VI) não entram na comunhão
parcial,ouseja,sãobensexclusivos.
Por provento, entenda-se toda e qualquer retribuição devida por conta do
trabalhopessoaldomaridooudamulher.
Aoestabeleceraincomunicabilidadedosproventos,olegisladorfirmaaregra
segundoaqualodireitoquecadacônjugetemaoseusalário—ouàretribuição
emgeral—integraoseupatrimôniopessoaleexclusivo.
Nessalinhadeintelecção,dissolvidoocasamento,porexemplo,odireitoque
omarido temdeperceber,mêsamês,o saláriopagopelo seuempregadornão
integraráoacordodepartilha.
Trata-sededireitopessoaleexclusivo.
Enote-sequeoeventualpagamentodepensãoalimentícia,incidentenosalário,
ampara-se em outras bases, nada tendo que ver com exercício de direito de
meação.
Direito ao salário, portanto, ou a qualquer outra retribuição, não integra
divisãodebens.
Advertimos,todavia,queosbenscompradoscomessesvalores,porseuturno,
sãopartilháveis,porcontadaregrageral,quedetermina,nacomunhãoparcial,a
divisão dos bens adquiridos onerosamente por um ou ambos os cônjuges: o
salárioquerecebodaempresaemquetrabalhoémeu;todavia,ocarroqueeu
compro com ele, no curso do casamento, pertencerá, por metade, à minha
esposa.
Éassimqueoperaoregimedecomunhãoparcialdebens.
E, caso o valor do salário (ou da retribuição) seja aplicado em poupança,
previdência privada, ações ou outro fundo de investimento, os rendimentos ou
dividendosapartirdaígeradossão,consequentemente,comunicáveis.
Importantepontodamatéria,todavia,mereceserdestacado.
A despeito de a regra ser clara quanto à incomunicabilidade dos proventos
pessoaisdecadacônjuge,existeentendimentonoSuperiorTribunaldeJustiça,de
matizcontralegem,nosentidodeadmitir—tantonacomunhãoparcialcomona
universal—adivisãodecréditotrabalhista.
Na letra fria da lei, tal julgado, como vimos, não encontraria respaldo.
Todavia,partindodeumaconcepçãoampladoconceitodepatrimôniocomum,o
ilustreMinistroRelatorRUIROSADODEAGUIARentendeu,aojulgaroREsp
421.801/RS, que “para amaioria dos casais brasileiros, os bens se resumemà
renda mensal familiar. Se tais rendas forem tiradas da comunhão, esse regime
praticamentedesaparece”.
Cuida-se de um entendimento polêmico, reafirmado em mais de uma
oportunidadepeloegrégioTribunal:
“Verba decorrente de reclamação trabalhista. Integração na comunhão. Regime da comunhão parcial.
DisciplinadoCódigoCivilanterior.1.JádecidiuaSegundaSeçãoque‘integraacomunhãoaindenização
trabalhistacorrespondenteadireitosadquiridosduranteotempodecasamentosoboregimedacomunhão
universal’(EREspn.421.801/RS,RelatorparaacórdãooMinistroCesarAsforRocha,DJde17/12/04).
Não hámotivo para excepcionar o regime da comunhão parcial considerando o disposto no art. 271 do
Código Civil anterior. 2. Recurso especial conhecido e provido” (REsp 810.708/RS, Rel. Min. Carlos
AlbertoMenezesDireito,3.ªTurma,j.15-3-2007,DJ,2-4-2007p.268).
Eainda:
“Direitocivil e família.Recursoespecial.Açãodedivórcio.Partilhadosdireitos trabalhistas.Regimede
comunhãoparcialdebens.Possibilidade.Aocônjugecasadopeloregimedecomunhãoparcialdebensé
devidaàmeaçãodasverbastrabalhistaspleiteadasjudicialmenteduranteaconstânciadocasamento.As
verbasindenizatóriasdecorrentesdarescisãodecontratodetrabalhosódevemserexcluídasdacomunhão
quando o direito trabalhista tenha nascido ou tenha sido pleiteado após a separação do casal. Recurso
especialconhecidoeprovido”(REsp646.529/SP,Rel.Min.NancyAndrighi,3.ªTurma,j.21-6-2005,DJ,
22-8-2005,p.266).
Créditos trabalhistas depositados em conta, em nome do falecido, portanto,
segundo a letra da lei, integrariampatrimônio exclusivo, sobre o qual incidiria
eventualdireitosucessóriodocônjugesobrevivente,casadoemcomunhãoparcial
debens,ateordoart.1.829,I.
Todavia, seguindo-se o entendimento esposado pelo Superior Tribunal de
Justiça,peloqualtaisvaloresconsistiriamempatrimôniocomum,adespeitodo
direitoàmeação,nãoassistiriadireitosucessórioalgum.
Tudodependeria,portanto,dapremissadaqualseparta.
Alémdisso, reveste-se de grande dificuldade a apuração dos “bensmóveis”
exclusivosdofalecido,namedidaemque,porserem,emgeral,desprovidosde
registro — diferentemente dos imóveis —, podem gerar dúvida quanto à sua
titularidade, quando desacompanhados de documentos comprobatórios da sua
propriedade.
Etodaaanáliseprecisaráserfeita,nobojodoinventáriooudoarrolamento,
namedidaemqueodireitosucessóriodocônjugesobrevivente,queforacasado
no regime da comunhão parcial, deve limitar-se aos bens exclusivos deixados
pelofalecido.
4.3.3.Concorrênciadodescendentecomocônjugesobrevivente,noregimedaseparaçãoconvencionaldebens
Outro delicado problema diz respeito ao direito concorrencial quando os
cônjugeshouveremsidocasadospeloregimedaseparaçãoconvencionaldebens.
Conforme mencionamos, nos termos do inciso I do art. 1.829, direito
concorrencialdocônjugesobreviventetambémhaverá,seforacasadonoregime
deseparaçãoconvencionaldebens.
Note a peculiaridade, amigo leitor: o descendente herdará menos, se a(o)
viúva(o)doseufalecidopai(oumãe)—quenãonecessariamenteserá também
suagenitora(ougenitor)—houversidocasadoem“separaçãoconvencionalde
bens”.
Valedizer, se JoãoeMariaoptarampor seunirmatrimonialmente segundoo
regimedeseparaçãoconvencional,comamortedequalquerdeles,osfilhos(do
falecido)suportarãoaconcorrênciadaviúva(ouviúvo)que,conformedito,não
necessariamenteéoseupaiouasuamãe.
E isso soa muito estranho, pois, se optaram por uma completa separação
patrimonialdurante todaavida,não teria sentidoseestabelecerumacomunhão
forçadacomosherdeirosdofalecidoapósamorte.
E, se os sucessores forem descendentes exclusivos do falecido, a situação
ganhacontornosmaisabsurdosainda.
Sejáédifícilparanós,bacharéisemDireito,compreendermosessasituação,
violadora do bom senso, imagine-se para o brasileiro comum, que não detenha
conhecimentotécnico-jurídico.
Sentido algum há no direito concorrencial do cônjuge supérstite, quando foi
adotado, ao longo de toda uma vida em comum, o regime de separação
convencionaldebens 298.
É bem verdade que, nesse ponto, o Superior Tribunal de Justiça tentou
contornaroabsurdodaconcorrênciadedireitosucessóriodaviúva(o)quefora
casada(o) em separação convencional, sob o argumento de que o regime da
separaçãoobrigatóriaseriaumgêneroqueabrangeriatambémodaseparação
convencional, e que, por isso, dada a exclusão do direito daquele casado no
regime obrigatório, amesma ressalva incidiria em face daqueles que optaram,
mediantepactoantenupcial,peloregimeconvencional:
“Direitocivil.FamíliaeSucessões.Recursoespecial. Inventárioepartilha.Cônjugesobreviventecasado
pelo regime de separação convencional de bens, celebrado pormeio de pacto antenupcial por escritura
pública.Interpretaçãodoart.1.829,I,doCC/02.Direitodeconcorrênciahereditáriacomdescendentesdo
falecido.Nãoocorrência.
—Impositivaaanálisedoart.1.829,I,doCC/02,dentrodocontextodosistemajurídico,interpretandoo
dispositivoemharmoniacomosdemaisqueenfeixamatemática,ematentaobservânciadosprincípiose
diretrizes teóricasque lhedão forma,marcadamente, adignidadedapessoahumana,que se espraia, no
planodalivremanifestaçãodavontadehumana,pormeiodaautonomiadavontade,daautonomiaprivada
e da consequente autorresponsabilidade, bem como da confiança legítima, da qual brota a boa-fé; a
eticidade, por fim, vem complementar o sustentáculo principiológico que deve delinear os contornos da
normajurídica.
—AtéoadventodaLein.6.515/77(LeidoDivórcio),vigeunoDireitobrasileiro,comoregimelegalde
bens, o da comunhão universal, no qual o cônjuge sobrevivente não concorre à herança, por já lhe ser
conferida ameação sobre a totalidade do patrimônio do casal; a partir da vigência da Lei doDivórcio,
contudo,oregimelegaldebensnocasamentopassouaserodacomunhãoparcial,oquefoireferendado
peloart.1.640doCC/02.
—Preserva-seoregimedacomunhãoparcialdebens,deacordocomopostuladodaautodeterminação,
aocontemplarocônjugesobreviventecomodireitoàmeação,alémdaconcorrênciahereditáriasobreos
bens comuns, mesmo que haja bens particulares, os quais, em qualquer hipótese, são partilhados
unicamenteentreosdescendentes.
—Oregimedeseparaçãoobrigatóriadebens,previstonoart.1.829, inc. I,doCC/02,égênero
quecongregaduasespécies:(i)separaçãolegal;(ii)separaçãoconvencional.Umadecorredalei
e a outra da vontade das partes, e ambas obrigamos cônjuges, uma vez estipulado o regime de
separaçãodebens,àsuaobservância.
—Não remanesce, para o cônjuge casadomediante separação de bens, direito àmeação, tampouco à
concorrência sucessória, respeitando-se o regime de bens estipulado, que obriga as partes na vida e na
morte.Nosdoiscasos,portanto,ocônjugesobreviventenãoéherdeironecessário.
— Entendimento em sentido diverso suscitaria clara antinomia entre os arts. 1.829, inc. I, e 1.687, do
CC/02,oquegerariaumaquebradaunidadesistemáticadaleicodificada,eprovocariaamortedoregime
deseparaçãodebens.Porisso,deveprevalecerainterpretaçãoqueconjugaetornacomplementaresos
citadosdispositivos.
—Noprocessoanalisado,asituaçãofáticavivenciadapelocasal—declaradadesdejáainsuscetibilidade
deseu reexamenestavia recursal—éaseguinte: (i)nãohouve longaconvivência,masumcasamento
que durou meses, mais especificamente, 10 meses; (ii) quando desse segundo casamento, o autor da
herança já havia formado todo seu patrimônio e padecia de doença incapacitante; (iii) os nubentes
escolheram voluntariamente casar pelo regime da separação convencional, optando, por meio de pacto
antenupcial lavrado em escritura pública, pela incomunicabilidade de todos os bens adquiridos antes e
depoisdocasamento,inclusivefrutoserendimentos.
— A ampla liberdade advinda da possibilidade de pactuação quanto ao regime matrimonial de bens,
previstapeloDireitoPatrimonialdeFamília,nãopodesertoldadapelaimposiçãofleumáticadoDireitodas
Sucessões,porqueofenômenosucessório‘traduzacontinuaçãodapersonalidadedomortopelaprojeção
jurídicadosarranjospatrimoniaisfeitosemvida’.
—Trata-se,pois,deumatodeliberdadeconjuntamenteexercido,aoqualofenômenosucessórionãopode
estabelecerlimitações.
—Se o casal firmou pacto no sentido de não ter patrimônio comume, se não requereu a alteração do
regimeestipulado,nãohouvedoaçãodeumcônjugeaooutroduranteocasamento,tampoucofoideixado
testamentooulegadoparaocônjugesobrevivente,quandoserialivreelícitaqualquerdessasprovidências,
nãodeveointérpretedaleialçarocônjugesobreviventeàcondiçãodeherdeironecessário,concorrendo
comosdescendentes,sobpenadeclaraviolaçãoaoregimedebenspactuado.
—Haveria,induvidosamente,emtaissituações,aalteraçãodoregimematrimonialdebenspostmortem,
ou seja, como fimdocasamentopelamortedeumdoscônjuges, seria alteradoo regimede separação
convencional de bens pactuado em vida, permitindo ao cônjuge sobrevivente o recebimento de bens de
exclusivapropriedadedoautordaherança,patrimônioaoqualrecusou,quandodopactoantenupcial,por
vontadeprópria.
—Porfim,cumpre invocaraboa-féobjetiva,comoexigênciade lealdadeehonestidadenacondutadas
partes,nosentidodequeocônjugesobrevivente,apósmanifestardeformalivreelícitaasuavontade,não
podedelaseesquivare,porconseguinte,arvorar-seemdireitodoqualsolenementedeclinou,aoestipular,
no processo de habilitação para o casamento, conjuntamente com o autor da herança, o regime de
separaçãoconvencionaldebens,empactoantenupcialporescriturapública.
—Oprincípiodaexclusividade,queregeavidadocasalevedaainterferênciadeterceirosoudopróprio
Estadonasopçõesfeitaslicitamentequantoaosaspectospatrimoniaiseextrapatrimoniaisdavidafamiliar,
robusteceaúnicainterpretaçãoviáveldoart.1.829,inc.I,doCC/02,emconsonânciacomoart.1.687do
mesmo código, que assegura os efeitos práticos do regime de bens licitamente escolhido, bem como
preservaaautonomiaprivadaguindadapelaeticidade.
Recursoespecialprovido.
Pedidocautelarincidentaljulgadoprejudicado”(STJ,3.ªTurma,REsp992.749/MS,Rel.MinistraNANCY
ANDRIGHI,j.1.º-12-2009,DJe,5-2-2010)(grifosnossos).
Trata-sedeumaargumentaçãobem-intencionada,quebuscasanaraincoerência
legislativa,mas,que,datavenia,nãoseafiguraamaisadequada.
Com efeito, não há sentido em se considerar “obrigatório” o regime da
separação convencional — aquele em que a separação de bens é livremente
escolhida—,pelosimplesfatodesetratardeumregimedebensprevistoporlei.
Ofatodeaseparaçãoconvencional“obrigar”oscônjugesapósasuaadoção
nãoretiraasuanaturezanegocial,traduzidanopacto,pelaóbviacircunstânciade
quetodonegóciojurídicodeverávincularaspartespactuantes.
Issoéconsequênciaimediatadoprincípiodopactasuntservanda.
Confundir,portanto,aseparaçãoobrigatória(previstaemcasodeincidênciade
umadashipótesesprevistasnoart.1.641,aexemplododescumprimentodecausa
suspensivadocasamento)comaseparaçãoconvencionalsubverteporcompletoa
lógicadosistema.
Emsíntese:aseparaçãoconvencionalé,semsombradedúvida,umregimede
benscompletamentediferentedodaseparaçãoobrigatóriaecomestenãopode
serconfundido.
Aliás,pelosimplesfatodeserescolhidolivrementepelasprópriaspartespor
meiodopactoantenupcial,jamaispoderiaserintituladode“obrigatório”.
Écomoserotulássemosigualmenterecipientescomconteúdoscompletamente
distintos.
Ora, se a norma contida no inciso I do art. 1.829 é infeliz — dada a
contradição acima apontada—busquemos outros caminhos hermenêuticos para
permitira suaaplicaçãopossível,masnãoutilizemosumargumentodesse teor,
porcontadasuacompletaimpossibilidadejurídica.
Com isso, não deixamos de louvar a bela intenção do julgado, que pretende
contornaroabsurdolegislativodesepermitirconcorrênciasucessóriaemfavor
de quem, ao longo de toda uma vida, optou por uma completa separação
patrimonial 299.
Mas,poroutrolado,issonãonosconduzaaceitarlinhaargumentativaexposta,
que categoriza como “legal” um regime livremente convencionado, mediante a
celebraçãodeumnegóciojurídico.
Emnossosentir,oafastamentodanormapoderiasedarnaperspectivadasua
própriainconstitucionalidade.
O art. 5.º, XXX, da Constituição Federal erige à categoria de direito
fundamentalo“direitoàherança”.
Trata-se,portanto,deumdireitoinseridonoroldecláusulaspétreas,revestido
deumajuridicidadesuperior.
Esseargumento,porsisó,jáserviriaparaafastaravalidadejurídicadeuma
norma infraconstitucional que pretendesse, em grave afronta ao postulado da
razoabilidade e à própria vontade presumível do falecido, adstringir o direito
conferidoaosseussucessores.
Nãopoderia,pois,olegislador,aferroefogo,aniquilaraautonomiaprivada
manifestadapelofalecidoaolongodetodaumavida.
Emoutraspalavras,afigura-secomoumdurogolpeaoprincípiodavedação
ao retrocesso, norma posterior que admita uma atípica “comunhão patrimonial
postmortem”,emfrancodesrespeitoaodireitoconstitucionalàherança 300.
Compreendida a sucessão pelo descendente — e todas as intrincadas
repercussõesacarretadaspelanovadisciplinacodificada—passemosadissertar
sobreotemadasucessãopeloascendente.
4.4.Sucessãopeloascendente
Bemmaissimpleséoregramentodasucessãopeloascendente,osegundona
ordemdevocaçãohereditária.
Vale a pena, nesse ponto, passarmos em revista algumas noções acerca do
parentesco em linha reta, para o adequado entendimento da norma prevista no
incisoIIdoart.1.829doCódigoCivil,oraestudada.
Tradicionalmente, os vínculos de consanguinidade geram o que se
convencionouchamardeparentesconatural.
NodizerdeBEVILÁQUA:
“Oparentescocriadopelanaturezaésempreacognaçãoouconsanguinidade,porqueéauniãoproduzida
pelo mesmo sangue. O vínculo do parentesco estabelece-se por linhas. Linha é a série de pessoas
provindasporfiliaçãodeumantepassado.Éairradiaçãodasrelaçõesconsanguíneas” 301.
Entretanto, ainda que tradicionalmente o parentesco natural toque a
consanguinidade,arelaçãoparentalemlinharetapode,perfeitamente,aplicar-se
ao vínculo familiar parental não consanguíneo, como se dá no caso da filiação
adotiva.
Afinal,alguémnegariaqueopaidoadotadoéseuparenteemlinharetaem1.º
grau?
Este, portanto, é, à luz do princípio da afetividade—matriz do conceito de
família —, o melhor entendimento, porquanto não hierarquiza os vínculos de
famílianomeropressupostodaconsanguinidade.
Oparentescoemlinharetaestáprevistoexpressamentenoart.1.591doCC:
“Art. 1.591. São parentes em linha reta as pessoas que estão umas para com as outras na relação de
ascendentesedescendentes”.
Verticalmente,parentesconsanguíneosemlinharetadescendemunsdosoutros,
semlimitaçãodegraus:neto-filho-pai-avôetc.
Assim, cada linha é subdividida em graus, de maneira que, dada a
proximidade,opai(1.ºgrau)éparentemaispróximodoqueoavô(2.ºgrau).
Subindooudescendo,nãoimporta,osindivíduosserãoconsideradosparentes
emlinhareta,adinfinitum.
Estudamos,anteriormente,odireitosucessóriodos“descendentes”dofalecido
(filhos, netos, bisnetos etc.), e, agora, cuidaremos dos seus ascendentes (pais,
avós,bisavósetc.).
Nessecontexto,partimosdapremissadeque,nãoexistindodescendentes(1.ª
classe sucessória), a herança será deferida aos ascendentes, independentemente
dograudeparentescoqueo sucedidomantinhacomesseparentena linha reta,
respeitadaaregradequeoparentemaispróximo(opai,porexemplo)excluio
maisremoto(oavô):
“Art.1.836.Nafaltadedescendentes,sãochamadosàsucessãoosascendentes,emconcorrênciacomo
cônjugesobrevivente.
§1.ºNaclassedosascendentes,ograumaispróximoexcluiomaisremoto,semdistinçãodelinhas”.
Assim, por exemplo, se Joaquim falece, não deixando descendentes, a sua
herança, segundo as regras da sucessão legítima, deverá ser deferida aos seus
ascendentes vivos, preferindo-se o pai vivo ao avô (visto que o parente mais
próximo,comodito,excluiomaisremoto) 302.
Vale lembrar,nesseponto,que,na linhaascendente—contrariamenteaoque
ocorrenadescendente—,nãoexiste“direitoderepresentação” 303.
Por fim, devemos salientar que o cônjuge sobrevivente (a viúva ou viúvo)
concorrerá com o herdeiro ascendente, independentemente do regime de bens
adotado, diferentemente do que ocorre, como vimos acima, quando a
concorrênciasedáemfacededescendentesdodecujus.
Emtalcaso,concorrendocomascendenteemprimeirograu(opaiouamãedo
falecido), ao cônjuge tocará um terço da herança (1/3); caber-lhe-á ametade
(1/2)desta,todavia,sehouverumsóascendentevivo,ousemaiorforaquelegrau
(concorrendocomosavós,porexemplo).
Talregra,positivadanoart.1.837 304doCódigoCivil,é,nasuaparteinicial,
declaraobviedade,seaintençãofoidarumaequanimidadearitmética,umavez
que, concorrendo com um ou dois ascendentes, a divisão por dois ou três lhe
garantiráexatamenteopercentualdefinido.
Odiferencialestá,apenas,quandoconcorrercomascendentesdegrausuperior,
pois, aí, sim, ficará garantidametade da herança, dividindo-se o remanescente
entre os demais (imagine-se, por exemplo, que haja quatro avós sobreviventes.
Neste caso, o cônjuge ficará com metade, cabendo aos avós partilharem o
restante).
Entendida a sucessão pelo ascendente, passemos a enfrentar a sucessão do
cônjuge.
4.5.Sucessãopelocônjuge
OCódigoCivilde1916nãoatribuíaaocônjugeviúvoostatusqueavigente
leilheconfere.
No regramento anterior, pois, o consorte sobrevivente não era considerado
herdeironecessário,nem,muitomenos,eradetentordedireitoconcorrencialem
face de ascendentes ou descendentes, como se dá na vigente normatização,
conformevimosnostópicosanteriores.
Talvezporisso,comoformadecompensarapoucaamplitudedasuatutela,a
legislação pretérita houvesse consagrado, em favor da(o) viúva(o), “direitos
sucessóriosparalelos”:ousufrutovidualeodireitorealdehabitação.
Por isso mesmo, antes de enfrentar a compreensão da efetiva disciplina da
sucessão pelo cônjuge, parece-nos fundamental compreender cada um desses
direitos.
Vamosaeles.
4.5.1.Ousufrutovidual
Ousufrutovidual 305 foi consagrado pela Lei n. 4.121, de 1962 (Estatuto da
MulherCasada),mediantealteraçãodoart.1.611doCódigode1916,quepassou
ateraseguinteredação:
“§1.ºOcônjugeviúvoseoregimedebensdocasamentonãoeraodacomunhãouniversal, terádireito,
enquantoduraraviuvez,aousufrutodaquartapartedosbensdocônjugefalecido,sehouverfilhodesteou
docasal,eàmetadesenãohouverfilhosemborasobrevivamascendentesdodecujus”.
Tratava-se, pois, de um usufruto concedido ao cônjuge sobrevivente (que
houvesse sido casado sob regime que não fosse o de comunhão universal),
enquanto durasse a sua viuvez, incidente sobre 25% dos bens do falecido, se
houvesseprolecomumouexclusiva,ousobre50%daherança,senãohouvesse
filhos,aindaqueexistissemascendentes 306.
Apardesefundamentarnarelaçãomatrimonialqueuniaocônjugeaofalecido,
tratava-se, em essência, de um direito real na coisa alheia, que deveria, pois,
observarassuaspertinentesprescriçõeslegais,conformeodecididopeloSTJ:
“CIVILECOMERCIAL.RECURSOESPECIAL.SOCIEDADEANÔNIMA.AÇÕES.USUFRUTO
VIDUAL.EXTENSÃO.DIREITODEVOTO.
1. Os embargos declaratórios têm como objetivo sanar eventual obscuridade, contradição ou omissão
existentenadecisãorecorrida.
Inexisteofensaaoart.535doCPCquandooTribunaldeorigempronuncia-sede formaclaraeprecisa
sobreaquestãopostanosautos,assentando-seemfundamentossuficientesparaembasaradecisão,como
ocorridonaespécie.
2.Oinstitutodousufrutovidualtemcomofinalidadeprecípuaaproteçãoaocônjugesupérstite.
3.Nãoobstantesuas finalidadesespecíficasesuaorigem legal (direitode família),emcontraposiçãoao
usufrutoconvencional,ousufrutovidualédireitorealedeveobservaradisciplinageraldoinstituto,tratada
nosarts.713eseguintesdoCC/16,bemcomoasdemaisdisposiçõeslegaisqueaelefazemreferência.
4.Onu-proprietáriopermaneceacionista, inobstanteousufruto,e sofreosefeitosdasdecisões tomadas
nasassembleiasemqueodireitodevotoéexercido.
5.Aousufrutuáriotambémcompeteaadministraçãodasaçõeseafiscalizaçãodasatividadesdaempresa,
masessasatividadespodemserexercidassemqueobrigatoriamenteexistaodireitodevoto,atéporqueo
direitodevotosequerestá inseridono roldedireitosessenciaisdoacionista, tratadosnoart.109daLei
6.404/76.
6.O art. 114 da Lei 6.404/76 não faz nenhuma distinção entre o usufruto de origem legal e aquele de
origem convencional quando exige o consenso entre as partes (nu-proprietário e usufrutuário) para o
exercíciododireitodevoto.
7.Recurso especial desprovido” (REsp 1169202/SP,Rel.Min.NancyAndrighi, 3.ª Turma, j. 20-9-2011,
DJe,27-9-2011).
Por incidir em uma fração da herança, concluía-se facilmente tratar-se de
institutodeaplicaçãotormentosa.
Mormente nas situações em que não houvesse bom e cordial relacionamento
entreaviúva(ouviúvo)eosdemaisherdeiros,aapuraçãodosbensqueseriam
objetodessedireitorealnãoseafiguravacomotarefafácil 307.
Em atitude louvável, o codificador de 2002 extinguiu o usufruto vidual —
certamente por levar em conta a dificuldade de sua aplicação e, também, a
ampliaçãodoâmbitodetuteladocônjugesobrevivente—,mantendo,apenas,o
direitorealdehabitação.
Nessesentido,preleciona,comhabitualprecisão,ROLFMADALENO:
“Não é preciso muito esforço para detectar a fileira de problemas causados pela concessão judicial
indistintadousufrutovidual.Começaquebloqueiaalivredisposiçãodosbensherdados,queficampresos
pelousufrutoqueseestendesobreageneralidadedosbensdeixadosdeherança.
Semprefoimuitodiscutidoocaráteralimentardousufrutovidual,permitindosuadispensaquandooviúvo
recebessebensconsideradossuficientesparagarantirasuasubsistênciapessoal.
Discutiu-se a possibilidade de concentração do usufruto num único ou em bens certos, previamente
definidos, de modo a não causar o usual embaraço dos herdeiros que veem seus bens hereditários
vitaliciamentevinculadosaocônjugecredordousufrutovidual.
E, principalmente, discutiu-se a completa irracionalidade de estender o usufruto vidual a bens que não
tivessem a sua aquisição ligada ao casamento ou à união estável, gerando imensuráveis prejuízos e
incontáveis injustiças, criadasdebreve relaçõesde concubinatodepoucas luas epoucosbens,masque
conferiamàcompanheiraviúvaousufrutosobretodaaherançadofalecido,incidindosobrebensquenão
foramadquiridosnaconstânciadaunião.Têmsidocausadosconstrangimentosparaosdescendentesque
devem, por lei, garantir o usufruto para o cônjuge ou concubino sobrevivente, muito embora os bens
tivessem sido adquiridos antes da união, talvez pela primeira esposa do sucedido e talvez genitora dos
herdeirosdescendentes,constrangidosagarantiremousufrutodasegundamulherdeseupai.
Para tranquilidade dos operadores do direito sucessório, o novo Código Civil, acertadamente, mantém
apenasodireitorealdehabitaçãoeextirpaousufrutovidualquesecompensacomainclusãodosupérstite
naordemnecessáriadevocaçãohereditária” 308.
Eemqueconsisteodireitorealdehabitação?
Éoqueveremosemseguida.
4.5.2.Direitorealdehabitação
Odireitorealdehabitação,previstooriginalmenteno§2.ºdoart.1.611do
Código Civil brasileiro de 1916 309, permaneceu consagrado, como dito, em
nossonovosistemacodificado.
Em verdade, vale registrar que a Lei n. 9.278, de 1996, ao disciplinar
importantes aspectos da união estável, também previu o instituto, mais
precisamentenoparágrafoúnicodoseuart.7.º:
“Art.7.ºDissolvidaauniãoestávelporrescisão,aassistênciamaterialprevistanestaLeiseráprestadapor
umdosconviventesaoquedelanecessitar,atítulodealimentos.
Parágrafoúnico.Dissolvidaauniãoestávelpormortedeumdosconviventes,osobrevivente terádireito
real de habitação, enquanto viver ou não constituir nova união ou casamento, relativamente ao imóvel
destinadoàresidênciadafamília”.
Nessa vereda, o art. 1.831 do vigente Código Civil, assegura ao cônjuge
sobrevivente,qualquerquesejaoregimedebens,semprejuízodaparticipação
que lhe caiba na herança, direito real de habitação relativamente ao imóvel
destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a
inventariar.
Anormaébem-intencionada.
Pretende-se,comisso,naperspectivadodireitoconstitucionalàmoradia(art.
6.ºdaCF), impedirqueaviúva (ouviúvo)—mormente aquelede idademais
avançada—seja alijadodoúnico imóvel integrantedomontepartível, emque
residiudurantetodaumavidacomofalecido.
Seodireitosucessórioparalelonãoexistisse,havendooutrosherdeiros,obem
seria partilhado e, certamente, salvo acordo entre os próprios interessados,
culminariaporseralienado,repartindo-seareceitageradae,porconsequência,
desalojando-seaviúva(ouviúvo)queláresidia.
Diferença fundamental há entre a vigente norma do Código Civil e a sua
correspondenteregranaleirevogada.
Issoporque,noCódigode1916,odireitoreal,postoexistisse,conformeselê
no referido§2.ºdoart.1.611, sofriauma limitação legal,namedidaemquea
viúva(ouviúvo)somentepoderiaexercê-losefossecasada(o)“soboregimeda
comunhãouniversal”.
Corretamente,emnossosentir,ocodificadorde2002suprimiuareferênciaao
regime da comunhão universal, para consagrar o benefício a todo cônjuge
sobrevivente,nostermosdoreferidoart.1.831,qualquerquefosseoregimede
bens.
Ora,seofundamentodanormaéagarantiamaior,deíndoleconstitucional,de
resguardodoprópriodireitoàmoradia,sentidonãohaveriaemcondicioná-loa
determinadoregimedebens 310.
E,poróbvio,dispensamaiordigressãoofatodeanormaconstantenoreferido
artigonãoterretroatividade:
“DIREITODAS SUCESSÕES. RECURSOESPECIAL. SUCESSÃOABERTANAVIGÊNCIADO
CÓDIGO CIVIL DE 1916. CÔNJUGE SOBREVIVENTE. DIREITO DE USUFRUTO PARCIAL.
ART. 1.611, § 1.º. DIREITO REALDE HABITAÇÃO. ART. 1.831 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002.
INAPLICABILIDADE. VEDAÇÃO EXPRESSA DO ART. 2.041 DO NOVO DIPLOMA.
ALUGUÉISDEVIDOSPELAVIÚVAÀHERDEIRARELATIVAMENTEA3/4DOIMÓVEL.
1. Em sucessões abertas na vigência do Código Civil de 1916, a viúva que fora casada no regime de
separaçãodebenscomodecujus,temdireitoaousufrutodaquartapartedosbensdeixados,emhavendo
filhos(art.1.611,§1.º,doCC/16).OdireitorealdehabitaçãoconferidopeloCódigoCivilde2002à
viúvasobrevivente,qualquerquesejaoregimedebensdocasamento(art.1.831doCC/02),não
alcançaassucessõesabertasnavigênciadalegislaçãorevogada(art.2.041doCC/02).
2.Nocaso,nãosendoextensívelàviúvaodireitorealdehabitaçãoprevistonoart.1.831doatualCódigo
Civil, os aluguéis fixados pela sentença até 10 de janeiro de 2003— data em que entrou em vigor o
EstatutoCivil—,devemserampliadosaperíodoposterior.
3.Recursoespecialprovido”(REsp1204347/DF,Rel.Min.LuisFelipeSalomão,4.ªTurma,j.12-4-2012,
DJe,2-5-2012)(grifamos).
Mas,nesseponto,umaindagaçãoinstigantemereceserfeita.
Essedireitorealdehabitaçãoduraráatéquando?
Logicamente,éumdireitotemporário.
Extingue-se “pela morte ou pelo término do estado de viuvez do
sobrevivente” 311.
Conclui-se,pois,que,seaviúva(ouviúvo)morreroucasar-senovamente,o
direito que lhe fora conferidodesaparecerá, consolidando-se a propriedade em
poderdosdemaisherdeiros.
Poroutrolado, temosque,emcasodeconcubinatoouuniãoestável—posto
configurarem-se como situaçõesnãomodificativasdo estadocivil—,odireito
realdehabitação,dadooseucaráterassistencial,tambémseextinguirá.
Sobre a diferença entre “concubinato” e “união estável”, já tivemos a
oportunidadedeanotar,emnossovolumededicadoaoDireitodeFamília:
“Hoje,porém,comosedepreendedeumasimplesleituradojátranscritoart.226daConstituiçãoFederal,
aexpressãoconsagradaéuniãoestável.
Tecnicamente,porém,nãoémaisaceitávelconsiderarasinonímia(e,apartirdestemomento,seráevitada
a sua utilizaçãoneste capítulo, já que superada a análise histórica) coma expressão ‘concubinato’, pois
esta, na forma do art. 1.727, CC/2002, constitui umamodalidade específica para designar relações não
eventuais,entrehomememulher,impedidosdecasar.
Auniãoestável,nessediapasão,traduzumaconstitucionalformadefamília,motivopeloqualnemsequer
recomendamos as expressões, consagradas pelo uso, de ‘concubinato puro’ (como sinônimo de união
estável) e ‘concubinato impuro’ (para significar a relação paralela ao casamento ou mesmo à união
estável),pelaevidenteconfusãoterminológica” 312.
Em síntese: enquanto durar a viuvez ou não se constituir nova relação de
companheirismo ou concubinato, o direito real de habitação deverá ser
preservado.
Assim,umarelaçãodesimplesnamorodaviúva(ouviúvo)nãodeveconduzir
àextinçãododireito,comosedá,analogamente,nocasodapercepçãodepensão
alimentícia:
“DIREITODEFAMÍLIA.CIVIL.ALIMENTOS.EX-CÔNJUGE.EXONERAÇÃO.NAMOROAPÓS
A SEPARAÇÃO CONSENSUAL. DEVER DE FIDELIDADE. PRECEDENTE. RECURSO
PROVIDO.
I—Não autoriza exoneração da obrigação de prestar alimentos à ex-mulher o só fato desta namorar
terceiroapósaseparação.
II—Aseparaçãojudicialpõetermoaodeverdefidelidaderecíproca.Asrelaçõessexuaiseventualmente
mantidas com terceiros após a dissolução da sociedade conjugal, desde que não se comprove
desregramentodeconduta,não têmocondãodeensejaraexoneraçãodaobrigaçãoalimentar,dadoque
não estão os ex-cônjuges impedidos de estabelecer novas relações e buscar, em novos parceiros,
afinidadesesentimentoscapazesdepossibilitar-lhesumfuturoconvívioafetivoefeliz.
III — Em linha de princípio, a exoneração de prestação alimentar, estipulada quando da separação
consensual,somentesemostrapossívelemumadasseguintessituações:a)convolaçãodenovasnúpcias
ouestabelecimentoderelaçãoconcubináriapeloex-cônjugepensionado,nãosecaracterizandocomotalo
simplesenvolvimentoafetivo,mesmoabrangendorelaçõessexuais;b)adoçãodecomportamentoindigno;
c)alteraçãodascondiçõeseconômicasdosex-cônjugesemrelaçãoàsexistentesaotempodadissolução
dasociedadeconjugal”(STJ,REsp111.476/MG,Rel.Min.SalviodeFigueiredoTeixeira,4.ªTurma,j.25-
3-1999,DJ,10-5-1999,p.177).
É,semdúvida,amelhordiretrizsobreotema.
4.5.3.Disciplinaefetivadasucessãodocônjuge
Emquepeseaimportânciadamatériatratadanossubtópicosanteriores,nãohá
como se negar que a grande revolução por que passou o direito sucessório do
cônjuge,apartirdoCódigode2002,decorreu,nãodapreservaçãododireitoreal
de habitação ou da extinção do usufruto vidual, mas, sim, da sua elevação ao
status de herdeiro necessário, e, ainda, do direito concorrencial conferido em
facedosdescendenteseascendentes,conformejámencionadolinhasatrás.
Mas para que lhe seja reconhecida legitimidade sucessória, uma importante
regradeveserobservada:
“Art.1.830.Somenteéreconhecidodireitosucessórioaocônjugesobreviventese,aotempodamortedo
outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato hámais de dois anos, salvo prova,
nestecaso,dequeessaconvivênciasetornaraimpossívelsemculpadosobrevivente”.
Em outras palavras, falida a afetividade, não há que se reclamar direito
sucessório.
Louvamos, aliás, a referência à separação de fato, porquanto, ainda que
formalmenteexistenteasociedadeconjugal,sentidoalgumhaveriaemseadmitir
direitosucessórioemfavordequemnadamaisrepresentavanavidadofalecido.
Discordamos,outrossim,àmençãoaoprazomínimodedoisanos.
Na medida em que, como se sabe, a união estável pode configurar-se a
qualquertempo,nãoérazoávelestabelecer-seumlapsomínimodeseparaçãode
fato — como conditio sine qua para a legitimidade sucessória — se, antes
mesmo da consumação do biênio, a parte já pode ter formado outro núcleo
familiar.
Valedizer,CarmelaestáseparadadefatodeseumaridoAlissonháumanoejá
constituinovafamíliacomoseucompanheiroJordão.SeAlisson,antesdoprazo
bienal,morre,poróbvio,jánãoteriasentidoalgumconferir-sedireitoaCarmela,
integrantedeoutronúcleofamiliar!
Mas,inadequadamente,anormasomentevedaalegitimidadesucessóriaapóso
prazodedoisanosdeseparaçãodefato.
Por outro lado, a separação judicial — que, em nosso sentir, a partir da
Emenda n. 66/2010, desapareceu 313—, assim como, logicamente, o divórcio,
operaperdadalegitimidadesucessóriadocônjugesobrevivente.
Finalmente, ainda no âmbito da sucessão do cônjuge, um delicado problema
nosécolocadopeloart.1.832,quedispõe:
“Art.1.832.Emconcorrênciacomosdescendentes(art.1.829,incisoI)caberáaocônjugequinhãoigual
aodosquesucederemporcabeça,nãopodendoasuaquotaserinferioràquartapartedaherança,sefor
ascendentedosherdeiroscomqueconcorrer”.
Asuadicçãoéaparentementesimples.
Ao dizer que o cônjuge sobrevivente “herda por cabeça”, quis o legislador
conferir-lhetratamentoisonômicoemfacedosdemaisherdeiros.
Exemplo:Joaquim,casadocomAlicia,morre.Alémdaviúva,eledeixoudois
filhos(comuns,ouseja,doprópriocasal),JoséeJoãoe,ainda,doisnetosPolie
Manu,filhosdoseufalecidofilhoPolicarpo(pré-mortoemrelaçãoaJoaquim).
CasoAlicia concorra comosdescendentes, herdará “por cabeça”, ou seja, por
igual, cabendo-lhe¼daherança. José e João tambémherdarão¼, cadaum, e,
finalmente, Poli e Manu, herdeiros por estirpe, dividirão a fração de ¼ que
caberiaaoseufalecidopaiPolicarpo.
Masanormafoimaisalém,aodisporqueocônjugesobreviventeterádireito
a,nomínimo,25%daherançaseconcorrercomfilhoscomunsdocasal.
Emoutras palavras, se o cônjuge supérstite concorrer comum filho, herdará
metade;comdoisfilhos,herdará1/3;comquatrofilhos,1/4daherança;mas,se
concorrer com cinco ou mais, terá garantido um percentual mínimo de 1/4,
cabendoaosdemaissucessoresdividirorestante.
Noexemplodadoacima, seAlicia concorresse comdez filhos comuns, teria
direitoa25%daherança,cabendoaosdemaisherdeirosoquesobrasse.
Note,pois,amigoleitor,que,noCódigode2002,nãoéincorretoafirmarqueo
cônjugepodetermaisdireitodoqueoprópriofilho,oqueéumaincoerênciacom
a circunstância de precedência dos descendentes, em relação aos cônjuges, na
ordemdevocaçãohereditária.
Por outro lado, concorrendo com descendentes exclusivos do falecido, não
haverá direito a esse percentualmínimo, demaneira que herdará simplesmente
“porcabeça”.
Tudo estaria bem, se o legislador não houvesse olvidado um aspecto muito
importante.
E se o cônjuge sobrevivente concorrer com filiação híbrida, ou seja,
descendentescomuns(docasal)eexclusivosdofalecido?
Haveriadireitoaomínimode25%ounão?
Olegislador,inadvertidamente,silenciou,gerando,comisso,complexaquestão
aserenfrentadapeladoutrinaejurisprudência.
Sobre o tema, confiram-se os ensinamentos de GISELDA MARIA
FERNANDESNOVAESHIRONAKA:
“Questão mais tormentosa de se buscar solucionar, relativamente a essa concorrência prevista pelo
dispositivo em comento, é aquela que vai desenhar uma hipótese em que são chamados a herdar os
descendentes comuns (ao cônjuge falecido e ao cônjuge sobrevivo) e osdescendentes exclusivos do
autordaherança,todosemconcorrênciacomocônjugesobrevivo.OlegisladordoCódigoCivilde2002,
embora inovador na construção legislativa de hipótese de concorrência do cônjuge com herdeiros de
convocaçãoanterioràsuaprópria,infelizmentenãofezaprevisãodahipóteseagoraemapreço,chamada
dedescendentesdosdoisgrupos,querdizer,osdescendentescomunseosdescendentesexclusivos.Eé
bastante curioso, até, observar essa lacuna deixada pela nova Lei Civil, uma vez que em nosso país a
situação descrita é comuníssima, envolvendo famílias constituídas por pessoas que já foram unidas a
outras, anteriormente, por casamento ou não, resultando, dessas uniões, filhos (descendentes, enfim) de
origensdiversas” 314.
Infelizmente,anormaédefeituosa.
Ao deixar de fazer referência ao problema da concorrência com a filiação
híbrida, o legislador abriu espaço à indesejável insegurança jurídica, dada a
ausência de um critério legal único e homogêneo, gerando acesa polêmica
doutrinária 315.
Em nosso sentir, invocando a “lógica do razoável” de RECASÉNS
SICHES 316,considerandoqueoespíritodanormaéagarantiadaconcorrência
docônjugecomosdescendentes,bemcomoquealiteralidadedopreceitolegalé
evidente,entendemosqueodispositivopreservaopercentualmínimode25%da
herançaapenasnahipótesedeaviúva(ouviúvo)concorrersomentecomfilhos
comuns.
Postoanormanãosejaclaranesteponto,razãonãohaveria,emnossosentir,
para se beneficiar o cônjuge sobrevivente quando concorresse comalgum filho
exclusivodofalecido.
Ademais,anorma,porrestringirdireitosdosdescendentes,primeiraclassede
sucessores,deveserinterpretadarestritivamente,impedindo-se,comisso,queo
benefícioaocônjugesobreviventeseconvertaeminjustoprivilégio.
Com isso, estaria prestigiado o princípio constitucional da igualdade 317,
especificamente,noplanohorizontal,paraumtratamentoisonômicodosfilhos.
Finalmente, não havendo descendentes, caso concorra com ascendente em
primeirograu,aocônjugetocaráumterçodaherança;caber-lhe-áametadedesta
sehouverumsóascendente,ousemaiorforaquelegrau,ateordojámencionado
art.1.837dovigenteCódigoCivil.
Exemplifiquemos.
João morre. Deixa a saudosa viúva Luisa. Não há descendentes. Luisa
concorrerácomospaisvivosdeJoão,cabendo-lhe1/3daherança.Se,todavia,
João tiver apenas um dos pais vivos, ou, caso falecidos, houver deixado avós
paternose/oumaternos(ouascendentesemgrausuperior),aviúvaterágarantida
ametadedaherança.
Trata-se,definitivamente,deregradeintelecçãoimediata.
Porfim,naformadoart.1.838,emfaltadedescendenteseascendentes,será
deferidaasucessãoporinteiroaocônjugesobrevivente.
Internalizada a dificultosa disciplina da sucessão do cônjuge, enfrentemos,
agora,ocriticadoregimedesucessãopela(o)companheira(o)novigenteCódigo
Civilbrasileiro.
4.6.Sucessãopela(o)companheira(o)
Conforme vimos em momento anterior 318, causa estranheza a péssima
localizaçãodasregrasconstantesnoart.1.790doCódigoCivil.
O legislador, inadvertidamente, resolveu inserir o regramento específico da
sucessão legítima pela(o) companheira(o) viúva(o) entre as regras gerais e os
princípiosdoDireitoSucessório.
Note-se que amatéria, em verdade, é típica da regulamentação da Sucessão
Legítima, e não da parte introdutória das Sucessões, o que talvez infira um
preconceitosub-reptícioemfacedarelaçãodecompanheirismo.
E, se não bastasse a sua desastrada topografia, o seu conteúdo não é dos
melhores,recebendo,porpartedadoutrina,duríssimascríticas.
Sobreoreferidoartigo,desabafaALDEMIROREZENDE:
“Pensamos que o artigo 1.790, do Código Civil, deve ser destinado à lata do lixo, sendo declarado
inconstitucionale,apartirdaí,simplesmenteignorado,anãoserparafinsdeestudohistóricodaevolução
dodireito.Talartigo,numfuturonãomuitodistante,poderáserapontadocomoexemplodosestertoresde
umaépocaemqueolegisladordiscriminavaafamíliaqueseformavaapartirdauniãoestável,tratando-a
comosefossefamíliadesegundacategoria” 319.
Adiante-se,porém,queoreconhecimentodapossibilidadedesucessãopelo(a)
companheiro(a)nãoéumainovaçãodoCódigoCivilbrasileirode2002.
Defato,anteriormenteaotextoconstitucionalde1988,quandoainfluênciade
determinada ideologia acabava por restringir uma tutela jurídica positivada de
relações afetivas não matrimonializadas, foi a jurisprudência 320, em atitude
praeter legem, que foi garantindo, paulatinamente, direitos aos conviventes,
inclusive,combasenaLein.6.858/80 321,acondiçãodedependente,pelomenos
paracréditosdenaturezaprevidenciária,bemcomoparabensdemenormonta.
Coube à Constituição Federal de 1988, porém, imprimir novo significado à
relação de companheirismo, reconhecendo-a como modalidade familiar, o que
passouainfluenciaralegislaçãoinfraconstitucionalposterior.
Nessaesteira,nocamposucessório,apartirdadécadade1990,passouater
o(a) companheiro(a) uma proteção legal, nos planos do Direito de Família e
Sucessório,atéentãoinexistente.
ALein.8.971,de29dedezembrode1994,nessetema,garantiuaoconvivente
ameaçãodosbenscomunsparaosquaistenhacontribuídoparaaaquisição,de
formadiretaouindireta,aindaqueemnomeexclusivodofalecido(art.3.º),bem
como estabeleceu o direito ao usufruto de parte dos bens do falecido, alémde
incluirocompanheirosobreviventenaterceiraordemdavocaçãohereditária(art.
2.º).
JáaLein.9.278/96,emseuart.7.º,parágrafoúnico,garantiuodireitorealde
habitaçãoaoconviventesobrevivente,enquantovivesseounãoconstituíssenova
uniãooucasamento,emrelaçãoaoimóveldestinadoàresidênciafamiliar.
Assim, o que se esperaria da nova codificação civil era que ela viesse,
finalmente,igualarotratamentoentrecônjugesecompanheiros,evitandoqualquer
alegaçãodetratamentodiscriminatório.
Ledoengano.
Comefeito,otextooriginaldoprojetodoCódigoCivilbrasileironadaprevia
sobreotema.
Até mesmo pela necessidade de uma suposta adequação ao novo texto
constitucional, foi acrescido ao Capítulo I do Título I do Livro V, quando da
aprovação do projeto pelo Senado Federal, um artigo que não constava do
Projetode1975,porforçadaEmenda358.
O projeto, finalmente aprovado, modificou o texto original, gerando o que
consideramos um verdadeiro desconserto jurídico, o art. 1.790, que teve a
seguinteredaçãofinal:
“Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens
adquiridosonerosamentenavigênciadauniãoestável,nascondiçõesseguintes:
I—seconcorrercomfilhoscomuns, terádireitoaumaquotaequivalenteàquepor lei foratribuídaao
filho;
II—seconcorrercomdescendentessódoautordaherança,tocar-lhe-áametadedoquecouberacada
umdaqueles;
III—seconcorrercomoutrosparentessucessíveis,terádireitoaumterçodaherança;
IV—nãohavendoparentessucessíveis,terádireitoàtotalidadedaherança” 322.
Sobre o tema, confira-se o depoimento abalizado de GISELDA MARIA
FERNANDESNOVAESHIRONAKA:
“OAnteprojeto deCódigoCivil elaborado em 1972 e o Projeto apresentado para discussão em 1975 e
aprovado naCâmara dosDeputados em1984 não previamqualquer regra relativamente à sucessão de
pessoas ligadasentre siapenaspelos laçosdoafeto.FoioSenadorNélsonCarneiro,emsua incessante
luta pela modernização das relações familiares brasileiras, quem apresentou aquela Emenda 358, antes
referida, no sentido de garantir direitos sucessórios aos conviventes. Como lembra Zeno Veloso 323, a
emenda foi claramente inspirada no Projeto de Código Civil elaborado porOrlandoGomes nos idos da
décadade60doséculoXX,antes,portanto,daigualdadeconstitucionalmentegarantida.Bempor isso,o
artigo em que resultou, este, de número 1.790, é de cariz retrógrado referentemente à legislação
anteriormentesumariada,dadécadade1990doséculoXX” 324.
Emvezdebuscarumaequiparaçãoquerespeitasseadinâmicaconstitucional
—umavezquediferençanãodevehaverentreaviuvezdeumaesposa(oudeum
marido)eadeumacompanheira(oucompanheiro),poisambasmantinhamcomo
falecido um núcleo de afeto—, o legislador, em franca violação do princípio
constitucionaldavedaçãoaoretrocesso 325,minimizou—esobcertosaspectos
aniquilou—odireitohereditáriodacompanheira(o)viúva(o).
O mal localizado, pessimamente redigido e — em nosso entender 326 —
inconstitucional art. 1.790 do vigente Código Civil brasileiro confere à
companheira(o)viúva(o)—emtotaldissonânciacomotratamentodispensadoao
cônjuge—umdireitosucessóriolimitadoaosbensadquiridosonerosamente 327
nocursodaunião(oquepoderia resultarnaaquisiçãodaherançapelopróprio
Município 328),alémdecolocá-la(o)emsituaçãoinferioraoscolateraisdomorto
(umtioouumprimo,porexemplo).
De fato, trata-se de tratamento demeritório da união estável em face do
matrimônio, com uma disciplina que a desprestigia como forma de relação
afetiva.
Ademais,odispositivoémuitomalpensado,umavezquenãoprevêasituação
cadavezmaiscorriqueiradehavertantofilhoscomunsquantofilhosdeumsódos
membros da união estável.Emocorrendo tal situação, e levando “emponta de
faca” a previsão codificada, poder-se-ia chegar novamente a uma situação de
tratamento diferenciado de filhos, para efeitos do quinhão hereditário que lhes
seria cabível, o que é vedado constitucionalmente e por nós intensamente
combatidoemdiversostópicosdestaobra 329.
Em outras palavras, na interpretação literal do dispositivo, se a viúva (ou
viúvo) concorrer com filhos comuns (filhosdocasal), herdapor igual,ou seja,
terádireitoaumaquotaequivalenteàqueporleiforatribuídaaofilho;mas,se
concorrercomdescendentessódoautordaherança(filhosounetos,porexemplo,
exclusivosdele),tocar-lhe-áametadedoquecouberacadaumdaqueles.
Mas, e se concorrer com “filiação híbrida”, filhos comuns (do casal) e
exclusivos(apenasdofalecido)?
Olegislador,maisumavez,nãoapresentasolução.
Diantedisso,adoutrinaseesforçouparatentarbuscarumaresposta,comobem
anota FLÁVIO TARTUCE, inclusive com referência a uma complexa fórmula
matemática:
“Situação não descrita na norma refere-se à sucessão híbrida, ou seja, caso em que o companheiro
concorre,aomesmo tempo,comdescendentescomunseexclusivosdoautordaherança.Nãoseolvide
queaexpressãosucessãohíbridafoicunhadaporGiseldaMariaFernandesNovaesHironaka,professora
titular daUniversidade de São Paulo. Sobre tal problemática, existem três correntes fundamentais bem
definidas:
1.ªCorrente—Emcasosdesucessãohíbrida,deve-seaplicaroincisoIdoart.1.790,tratando-setodosos
descendentes como se fossem comuns, já que filhos comuns estão presentes. Esse entendimento é o
majoritárionatabeladoutrináriadeCahali:CaioMáriodaSilvaPereira,ChristianoCassettari,Francisco
Cahali,InáciodeCarvalhoNeto,JorgeFujita,JoséFernandoSimão,LuizPauloVieiradeCarvalho,Maria
Berenice Dias, Maria Helena Daneluzzi, Mário Delgado, Rodrigo da Cunha Pereira, Rolf Madaleno e
SílviodeSalvoVenosa.
2.ªCorrente—Presente a sucessão híbrida, subsume-se o inciso II do art. 1.790, tratando-se todos os
descendentescomosefossemexclusivos(sódoautordaherança).Esteautorestáfiliadoatalcorrente,
assimcomoGustavoRenéNicolau,MariaHelenaDiniz,SebastiãoAmorim,EuclidesdeOliveiraeZeno
Veloso.Ora,comoasucessãoédofalecido,emhavendodúvidaporomissãolegislativa,osdescendentes
devemser tratadoscomosendodele,dofalecido.Anote-seque julgadodoTJSPadotouessacorrente,
concluindo que entender de forma contrária violaria a razoabilidade: ‘INVENTÁRIO. PARTILHA
JUDICIAL. PARTICIPAÇÃO DA COMPANHEIRA NA SUCESSÃO DO DE CUJUS EM
RELAÇÃO AOS BENS ADQUIRIDOS ONEROSAMENTE NA CONSTÂNCIA DA UNIÃO
ESTÁVEL. CONCORRÊNCIA DA COMPANHEIRA COM DESCENDENTES COMUNS E
EXCLUSIVOSDOFALECIDO.HIPÓTESENÃOPREVISTAEMLEI.ATRIBUIÇÃODECOTAS
IGUAISATODOS.DESCABIMENTO.CRITÉRIOQUEPREJUDICAODIREITOHEREDITÁRIO
DOS DESCENDENTES EXCLUSIVOS, AFRONTANDO A NORMA CONSTITUCIONAL DE
IGUALDADEENTREOSFILHOS(ART.227,§6.ºDACF).APLICAÇÃO,PORANALOGIA,DO
ART.1790,IIDOCÓDIGOCIVIL.POSSIBILIDADE.Soluçãomaisrazoável,quepreservaaigualdade
dequinhõesentreosfilhos,atribuindoàcompanheira,alémdesuameação,ametadedoquecouberacada
um deles. Decisão reformada Recurso provido’ (TJSP, Agravo de instrumento n. 994.08.138700-0,
Acórdãon.4395653,SãoPaulo,SétimaCâmaradeDireitoPrivado,Rel.Des.ÁlvaroPassos,julgadoem
24/03/2010,DJESP15/04/2010.Nomesmosentido:TJSP,Agravodeinstrumenton.652.505.4/0,Acórdão
n. 4068323, São Paulo,QuintaCâmara deDireito Privado,Rel.Des. RobertoNussinkisMacCracken,
julgadoem09/09/2009,DJESP05/10/2009)
3.ªCorrente—Nasucessãohíbrida,deve-seaplicarfórmulamatemáticadeponderaçãoparasolucionaro
problema.Entretantasfórmulas,destaca-seaFórmulaTusa,elaboradaporGabrieleTusa,comoauxílio
doeconomistaFernandoCuriPeres.Afórmulaéaseguinte:
2(F+S)x=---------------------------------------------------------xH2(F+S)2+2F+S
2F+SC=------------------------xX2(F+S)
Legenda
X=oquinhãohereditárioquecaberáacadaumdosfilhos.
C=oquinhãohereditárioquecaberáaocompanheirosobrevivente.
H=ovalordosbenshereditáriossobreosquaisrecairáaconcorrênciadocompanheirosobrevivente.
F=númerodedescendentescomunscomosquaisconcorraocompanheirosobrevivente.
S=onúmerodedescendentesexclusivoscomosquaisconcorraocompanheirosobrevivente” 330.
Nessecontextodegrandedivergênciadoutrinária,éfirmeonossopensamento
no sentidoda inconstitucionalidade do art. 1.790, namedida emque afronta o
princípiodavedaçãoaoretrocesso(CANOTILHO),aomenoscabaradignidade
conferidaàuniãoestável,enquantonúcleoafetivofamiliar,peloart.226,§3.º,da
ConstituiçãoFederal.
Atacandoodispositivo,disparaZENOVELOSOaflechadoseugênio:
“Haveráalgumapessoanestepaís, juristaou leigo,queassegureque tal soluçãoéboae justa?Porque
privilegiar a esse extremo vínculos biológicos, ainda que remotos, em prejuízo dos laços do amor, da
afetividade?Porqueosmembrosdafamíliaparental,emgrautãolongínquo,devemterpreferênciasobre
afamíliaafetiva(queemtudoécomparávelàfamíliaconjugal)dohereditando?” 331.
Sustentamos,nessediapasão,aineficáciadopresentedispositivo,devendo-se
aplicar, portanto, em favor da companheira (ou companheiro) viúva(o), o
regramento do cônjuge sobrevivente, com exceção da regra que confere a este
últimoacondiçãodeherdeironecessário(art.1.845),namedidaemque,porse
tratardenormarestritivadaliberdadetestamentáriadofalecido,nãocomportaria
interpretaçãoextensiva 332.
Esta,inclusive,foiaorientaçãoadotadapelosJuízesdasVarasdeFamíliade
Salvador,naIJornadadeDireitodeFamília,promovidapelaCorregedoriaGeral
deJustiçadoTJBA,sobacoordenaçãodeumdoscoautoresdestaobra:
“Enunciadon. 13—Oart. 1.790doCódigoCivil viola o superior princípiodavedação ao retrocesso e
desrespeita a condição jurídica da(o) companheira(o) como integrante de umnúcleo familiar equiparado
àqueleformadopelocasamento,razãoporquepadecedeabsolutainconstitucionalidade.
Enunciado n. 14—Emvirtude da inconstitucionalidade do art. 1.790 doCódigoCivil, devem-se aplicar
à(ao)companheira(o)viúva(o)asmesmasregrasquedisciplinamasucessãodocônjuge,comexceçãoda
normaqueconsideraesteúltimoherdeironecessário(art.1845),porquanto,dadaasuanaturezarestritiva
dedireito(doautordaherança),nãocomportariainterpretaçãoextensivaouanalógica” 333.
É,emnossoentender,amelhordiretriz.
E, para a nossa alegria, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE
878.694, firmouentendimentono sentidoda inconstitucionalidadedo tratamento
sucessóriodiferenciadodocônjugeedocompanheiro.
DestacamosexcertodovotodoeminenteMin.LuísRobertoBarroso:
DIREITO CONSTITUCIONAL E CIVIL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO
GERAL. INCONSTITUCIONALIDADE DA DISTINÇÃO DE REGIME SUCESSÓRIO ENTRE
CÔNJUGESECOMPANHEIROS.
1. A Constituição brasileira contempla diferentes formas de família legítima, além da que resulta do
casamento.Nesserolincluem-seasfamíliasformadasmedianteuniãoestável.
2. Não é legítimo desequiparar, para fins sucessórios, os cônjuges e os companheiros, isto é, a família
formada pelo casamento e a formada por união estável.Tal hierarquização entre entidades familiares é
incompatívelcomaConstituição.
3.Assimsendo,oart.1.790doCódigoCivil,ao revogarasLeisns.8.971/94e9.278/96ediscriminara
companheira(oucompanheiro),dando-lhedireitossucessóriosbeminferioresaosconferidosàesposa(ou
aomarido),entraemcontrastecomosprincípiosdaigualdade,dadignidadehumana,daproporcionalidade
comovedaçãoàproteçãodeficienteedavedaçãodoretrocesso.
4.Comafinalidadedepreservarasegurançajurídica,oentendimentoorafirmadoéaplicávelapenasaos
inventários judiciais emque não tenha havido trânsito em julgadoda sentença de partilha, e às partilhas
extrajudiciaisemqueaindanãohajaescriturapública.
5.Provimentodorecursoextraordinário.Afirmação,emrepercussãogeral,daseguintetese:
“Nosistemaconstitucionalvigente,é inconstitucionaladistinçãoderegimessucessóriosentrecônjugese
companheiros, devendo ser aplicado, em ambos os casos, o regime estabelecido no art. 1.829 do
CC/2002”.
EmoutrotrechooMinistroafirma:
“Fica claro, portanto, queo art. 1.790doCC/2002é incompatível comaConstituiçãoFederal.Alémda
afrontaàigualdadedehierarquiaentreentidadesfamiliares,extraídadoart.226daCartade1988,violou
outrostrêsprincípiosconstitucionais,(i)odadignidadedapessoahumana,(ii)odaproporcionalidadecomo
vedaçãoàproteçãodeficiente,e(iii)odavedaçãoaoretrocesso”.
Aguardemos,então,apartirdaconclusãodojulgamento,ajurisprudênciaque
seráformadasobessanova(emaisjusta)perspectiva 334.
4.7.Sucessãopelocolateral
Consideram-separentes,emlinhacolateral,naformadoart.1.592doCódigo
Civil 335,aquelaspessoasprovenientesdomesmotronco,semdescenderemumas
dasoutras.
Horizontalmente, parentes consanguíneos em linha colateral são aqueles que,
sem descenderem uns dos outros, derivam de um mesmo tronco comum, a
exemplo dos irmãos (colaterais de segundo grau), tios/sobrinhos (colaterais de
terceirograu)ouprimosentresi(colateraisdequartograu).
Oparentescocivil,porsuavez,porinserirapessoanocontextofamiliarcomo
sedescendênciagenéticahouvesse,amolda-seaessaperspectivadeanálise(ex.:
omeuirmãoéparentecolateraldesegundograu,nãoimportandoseforaadotado
ounão).
A única modificação substancial do vigente Código Civil brasileiro, em
relaçãoàdisciplinanormativaanterior 336, foiprecisamenteareduçãodolimite
legaldoparentescopor colateralidade,quepassoudo sextograuparaoquarto
graucivil.
Trata-sedeumcritérioqueacompanhaatradicionalregradodireitoàherança:
“Art. 1.839. Se não houver cônjuge sobrevivente, nas condições estabelecidas no art. 1.830, serão
chamadosasucederoscolateraisatéoquartograu”.
Valeaindaacrescentarque,segundooart.1.840,naclassedoscolaterais,os
mais próximos excluem os mais remotos, salvo o direito de representação
concedidoaosfilhosdeirmãos 337.
Ponto importanteaserconsideradoéadiferençade tratamento jurídicoentre
irmãosunilaterais(apenasporpartedopaioudamãe)ebilaterais(germanos),a
teordosarts.1.841e1.842doCC.
“Art.1.841.Concorrendoàherançadofalecidoirmãosbilateraiscomirmãosunilaterais,cadaumdestes
herdarámetadedoquecadaumdaquelesherdar.
Art.1.842.Nãoconcorrendoàherançairmãobilateral,herdarão,empartesiguais,osunilaterais”.
Ou seja, se Carmelo morre deixando três irmãos: Salomé, Salominho e
Salomete, caso o primeiro seja o único irmão bilateral (por parte de pai e de
mãe),eleherdaráodobrodoquecouberaosoutrosirmãos.
Emdidáticoexemplo,ensinaMARIAHELENADINIZ:
“Paraefeitodeherançadecolateral,oart.1.841doCódigoCivildistingueoirmãobilateralougermano,
filhodomesmopaiedamesmamãe,do irmãounilateralconsanguíneoouuterino,aqueleemquesóum
dosgenitoreséomesmo,estabelecendo:Concorrendoàherançadofalecidoirmãosbilateraiscomirmãos
unilaterais,cadaumdestesherdarámetadedoquecadaumdaquelesherdar.Hipóteseemqueasucessão
se opera por direito próprio, partilhando-se o quinhão hereditário por cabeça, atendendo-se, porém, ao
privilégiodequegozamos irmãosgermanos.Aesserespeito,esclarecedoréoexemplodadoporClóvis
Beviláqua, a saber: o de cujus deixa uma herança de R$ 240.000,00 a dois irmãos bilaterais e a dois
irmãosunilaterais.Osunilateraisreceberãoduasporçõessimpleseosbilaterais,duasporçõesdobradas,ao
todoseisporções.AssimplesserãodovalordeR$40.000,00(R$240.000,00÷6=R$40.000,00),eas
dobradasdeR$80.000,00(R$40.000,00×2),deformaque:(R$80.000,00×2)+(R$40.000,00×2)=R$
240.000,00. Essa partilha submete-se à seguinte regra, que é infalível, qualquer que seja o número de
irmãos unilaterais ou bilaterais. Cada irmão bilateral é representado pelo algarismo 2 e cada irmão
unilateral pelo 1; divide-se a herança pela soma destes algarismos; o quociente encontrado,multiplicado
pelos respectivosalgarismos representativosdosbilaterais eunilaterais, seráaquotahereditáriadecada
um” 338.
CLÁUDIOGRANDEJR.ponderaarespeitodaeventualinconstitucionalidade
dotratamentodiferenciadoentreirmãos:
“Ora, os irmãos unilaterais são tão irmãos como os bilaterais e os adotivos. Um exemplo demonstra
claramente a inconstitucionalidade da regra. Suponhamos que uma pessoa faleça sem deixar
descendentes. Não tendo mais ascendentes e sendo solteiro e descompromissado, são chamados à
sucessãoseuscolaterais(CC,art.1.839).Osmaispróximossãoseusirmãos:umbilateral,outrounilateral
eumterceiroadotivo.Aopédaletra,ounilateralreceberiametadedoquecoubesseaogermano.Maseo
adotivo? Receberia igual ao bilateral em franca discriminação em desfavor do unilateral?Ou omesmo
tantoqueeste,sendodiscriminadoemfacedobilateral?
Não há solução para o problema utilizando-se das prefaladas regras do Código Civil porque elas são
simplesmente inconstitucionais! Feito todo esse raciocínio, a Constituição se apresenta bemmais clara:
todosos filhos terãoosmesmosdireitos,oponíveiscontra todos, inclusiveospróprios irmãos.Osartigos
1.841e1.843denossoprincipaldiplomacivilcriaramnoâmbitodoparentescoconsanguíneoumadistinção
inconciliável com a equiparação constitucional da filiação. Como igualar a filiação civil com a filiação
consanguíneaseatémesmoestacomportadesníveisinternos?
Qualquersoluçãoà luzdosmencionadosartigos implicariaemodiosasegregação.Seoadotivoherdarà
semelhança do irmão germano estar-se-ia discriminando o unilateral e, por conseguinte, a filiação
consanguínea. Por outro lado, recebendo como o unilateral, discriminar-se-ia a filiação adotiva, o que é
constitucionalmenteintolerável.
Arespeitodoassuntoajurisprudênciaéescassaeadoutrinaassustadoramentesilenciosa.Amaioriados
autorestacitamenteaceitaaconstitucionalidadedosartigos.Dentreaspoucasexceções,RubianedeLima
admiteexpressamenteaconstitucionalidadeda lei,pois se ‘aherançavemporpartedepaiedemãe;o
parentescoéduplo.Setodostêmosmesmospais,recebemigualmenteeseoparentescoadvierdeumsó,
herda-sesomenteporpartedaquele’(Manualdedireitodassucessões.Curitiba:Juruá,2003,pg.92).
Comadevidavênia,oargumentonãoprospera,eisquepodeperfeitamenteacontecerdeoirmãonãoter
recebidoherançanenhumadospaiseangariadotodoseupatrimônioporesforçopróprio.
Alémdisso,oanteriorexemploenvolvendooirmãoadotivoelucidaconvincentementequeaConstituição,
ao equiparar os filhos havidos ou não no casamento e os adotivos, implicitamente também findou por
equiparartodososirmãosconsanguíneosentresie,demodogeral,oparentescoresultantedafiliação.Se
fezomais,logicamenteomenosfoifeitodemodosubentendido.
Dessemodo,aderradeiraconclusãoéadequeosarts.1.614e1.617,§§2.ºe3.º,doantigoCódigoCivil
foram revogados pela Constituição Federal, enquanto os recentes arts. 1.841 e 1.843, §§ 2.º e 3.º, do
diplomaemvigorsãoinconstitucionais” 339.
Trata-se de uma interessante reflexão, posto ainda não exista — ao menos
desconhecemos—pronunciamentodefinitivodoSupremoTribunalFederalnesse
sentido.
Enquantoisso,ficaoconviteàreflexão.
Emconclusão,valeacrescentaraindaque,emboratioesobrinhosejam,ambos,
parentesemterceirograu 340,casoconcorramentresi,aherançaserádeferidaao
sobrinho,porexpressadeterminaçãolegal:
“Art.1.843.Nafaltadeirmãos,herdarãoosfilhosdestese,nãooshavendo,ostios”.
E os parágrafos do mesmo dispositivo, ao tratar da concorrência entre
sobrinhos,mantémamesmaideiajámencionada,nosentidodebeneficiarfilhos
deirmãosbilaterais.
“§1.ºSeconcorreremàherançasomentefilhosdeirmãosfalecidos,herdarãoporcabeça.
§2.ºSeconcorremfilhosdeirmãosbilateraiscomfilhosdeirmãosunilaterais,cadaumdestesherdaráa
metadedoqueherdarcadaumdaqueles.
§3.ºSetodosforemfilhosdeirmãosbilaterais,outodosdeirmãosunilaterais,herdarãoporigual”.
E um importante aspecto não pode ser olvidado: por serem sucessores
meramente facultativos, para excluir os herdeiros colaterais da sucessão, basta
queotestadordisponhadeseupatrimôniosemoscontemplar(art.1.850doCC),
o que não poderá dar-se com os descendentes, ascendentes ou o cônjuge
(herdeirosnecessários),porcontadoseuinafastáveldireitoàlegítima(art.1.845
doCC).
Por fim, não sobrevivendo cônjuge, ou companheiro, nem parente algum
sucessível, ou tendo eles renunciado à herança, poderá o patrimônio deixado
beneficiaropróprioenteestatal.
4.8.Sucessãopeloentepúblico
Nãoéadmissível,emregra,haverumpatrimôniosemumtitular.
Assim, aberta a sucessão com o falecimento do autor da herança, é preciso
verificarquemseráonovosenhordamassapatrimonial.
Naformadoart.1.844doCC/2002:
“Art. 1.844. Não sobrevivendo cônjuge, ou companheiro, nem parente algum sucessível, ou tendo eles
renunciadoaherança,estasedevolveaoMunicípioouaoDistritoFederal, se localizadanas respectivas
circunscrições,ouàUnião,quandosituadaemterritóriofederal”.
Ouseja,nãohavendoquemsehabilitecomo legítimosucessordaherança,o
Estado,nasentidadesfederativasdoMunicípioouDistritoFederal,quandoos
bens estejam localizados nas respectivas circunscrições, ou daUnião, quando
situadaemterritóriofederal,assumiráatitularidadedetalpatrimônio.
Trata-sedematéria jápornósenfrentada,nocapítulodedicadoaoestudoda
herançajacenteouvacante 341,aoqualremetemosoamigoleitor.
CapítuloXII
DireitodeRepresentação
Sumário:1.Introdução.2.Brevehistóricoeconsideraçõesterminológicas.3.Conceito.4.Características.
5.Fundamentoefinalidade.6.Efeitos.7.Consideraçõesfinais.
1.INTRODUÇÃO
Aregrageralnoordenamento jurídicobrasileiro,comojávisto,énosentido
dequeoherdeiromaispróximoexcluiomaisremoto.
Todavia,essaregranãoéabsoluta.
Talflexibilizaçãosedápormeiodoinstitutododireitoderepresentação,que
éobjetodopresentecapítulo.
Vamosconhecê-lo.
2.BREVEHISTÓRICOECONSIDERAÇÕESTERMINOLÓGICAS
Trata-se de instituto que já era conhecido do Direito Romano, conforme
prelecionamRIPERTeBOULANGER,emseuclássicoTratadodeDireitoCivil:
“Larepresentaciónexistíayaenelderechoromano,aunquesunombrefueseignorado.EnlasInstitutasde
Justinianosedicequeloshijospueden‘inpatrissuilocumsuccedere’(III,I,6).Primitivamentelimitadaa
losdescendientes,larepresentaciónfueextendidabajoJustinianoaloshijosdeloshermanosohermanas”.
EconcluemdiscorrendosobreaaceitaçãodoinstitutonoDireitoFrancês:
“Larepresentaciónfueampliamenteadmitidaporelderechorevolucionário.Laleydel8deabrilde1791
la admitia hasta el infinito en línea colateral. Se veía enElla la ventaja de favorecer a las generaciones
jóvenesydeasegurarladivisióndelosbienes” 342.
Observamos, portanto, que, ao longo dos séculos, o direito de representação
manteve a sua essência e a precípua finalidade de evitar injustiças na
transmissibilidade da herança, para impedir que os sucessores de um herdeiro
pré-mortonadarecebessem.
A expressão “direito de representação”, todavia, adotada também por nossa
legislação,nãoéamaisfeliz,emnossoentender 343.
Com efeito, uma leitura apressada poderia fazer pensar que haveria alguma
afinidade como instituto da “representação” (legal ouvoluntária), que tempor
finalidade atribuir a outrem a prática de determinados atos em nome do
representado 344.
Amençãoà“representação”apenassejustificapelaconcepçãofictíciadeque
ossucessoresestariamherdandocomorepresentantesdofalecido.
Nãosetratadisso,definitivamente,pois,soboprismaeminentementetécnico,
representaçãonãohá.
Trata-se,portanto,demeraficção.
De fato,a finalidadedo instituto,comodito,éapenasmanteroequilíbriona
distribuição da herança entre os herdeiros, impedindo assim que a
premoriência 345—ouseja,apré-mortedeumdeles—,bemcomoaexclusãoda
própriasucessão,sejamotivopara impedira justaextensãododireitoaosseus
sucessores 346.
3.CONCEITO
Conceitualmente, no âmbito sucessório, a representação traduz um direito
conferido aos sucessores do herdeiro pré-morto ou excluído da sucessão, para
quepossamreceberapartequecaberiaaoprópriorepresentado.
Contorna-se,comisso,umaoblíquaviolaçãoaoprincípiodaisonomia,como
veremosabaixo.
Emnossodireitopositivo,dispõeoart.1.851doCódigoCivil:
“Art.1.851.Dá-seodireitoderepresentação,quandoa leichamacertosparentesdofalecidoasuceder
emtodososdireitos,emqueelesucederia,sevivofosse”.
Exemplifiquemos,paramelhorcompreensãodoinstituto.
Imagine-sequeoautordaherança (José) tenhadois filhos: Josuée Jodascil.
QuandodofalecimentodeJosé,seufilhoJosuéjáhaviafalecido,porémdeixara
seusprópriosfilhos,CalistoeCarmelo,ouseja,netosdodecujus.Peloinstituto
dodireitoderepresentação,CalistoeCarmeloherdarãooquinhãoquecaberiaao
seupai,Josué,repartidoigualmenteentreeles(art.1.855doCC/2002),quinhão
estequeteráomesmovalordoqueorecebidoporJodascil.
Ou seja, Calisto e Carmelo representarão o seu pai Josué, pré-morto,
incorporandoaquiloqueaelecaberia,sevivofosse.
Em termosnuméricos: se o valor daherança equivaler aR$100.000,00, em
vez de Jodascil recebê-la integralmente (já que Josué era pré-morto), receberá
apenas R$ 50.000,00, percebendo Calisto e Carmelo, cada um, o valor de R$
25.000,00.
Observe-se que, se Jodascil também fosse pré-falecido, deixando um filho,
Jodascil Jr., os três netos do autor da herança, por estarem na mesma classe,
receberiamcadaumdelesacota-partedaherançadeR$100.000,00,qualseja,a
parceladeR$33.333,33.
4.CARACTERÍSTICAS
Alguns aspectos do instituto, para melhor caracterização, merecem ser
explicitados.
O primeiro soa óbvio: é preciso que a pessoa “representada” esteja
impossibilitadadereceberaherança.
Arepresentação,nessecontexto,aplica-sequandoorepresentadoépré-morto
em face do autor da herança, ou, ainda, quando haja sido excluído por
indignidade,umavezqueestaconsideraosucessorafastadodasucessãocomose
herdeironuncahouvessesido(art.1.816doCC) 347,regrajáaplicadahámuitono
ordenamentojurídicobrasileiro 348.
Osegundoaspectodizrespeitoàlinhasucessóriaemqueodireitoéexercido.
De fato, na formado art. 1.852doCC,o “direitode representaçãodá-sena
linharetadescendente,masnuncanaascendente”.
A representação na linha descendente, prevista na primeira parte do
dispositivo, é de fácil intelecção e já fora explicitada ao longo do presente
capítulo.
Jáasegundapartedanorma,queprevêaimpossibilidadederepresentaçãona
linharetaascendente,mereceserilustradaparaescoimardúvidas.
ImaginequeestamosatratardoinventáriodeJoão(autordaherança).Elenão
deixoudescendentes.Apenasestãovivosasuamãeeasuaavópaterna(amãedo
seupai,falecidoantesdele).Ora,nessecaso,aavópaterna(mãedopaideJoão)
não herdará por direito de representação. Toda a herança irá para a mãe de
João.
Situação diversa ocorre na linha transversal ou colateral 349, uma vez que o
direitoderepresentaçãoéapenasreconhecidoemfavordo(s)filho(s)do irmão
pré-morto 350.
Éopreceitodoart.1.853doCC:
“Art.1.853.Nalinhatransversal,somentesedáodireitoderepresentaçãoemfavordosfilhosdeirmãos
dofalecido,quandocomirmãosdesteconcorrerem”.
Ouseja,apenaso(s)sobrinho(s)—filho(s)doirmãopré-morto—temdireito
derepresentação.
Figuremosmaisumexemplo.
Huguinhomorre, deixandoum irmãovivo,Zezinho, e os filhosdo seu irmão
pré-morto(Luisinho).Emtalhipótese,metadedaherançairáparaZezinho(irmão
sobrevivente) e a outra metade para os seus sobrinhos, que herdarão
representandoopai(Luisinho).
Mas note que, na linha colateral, o direito de representação limita-se aos
sobrinhos.Valedizer,filhosdesobrinhos(aquelesaquemocostumenominoude
“sobrinhos-netos”)nãopoderãoherdarpordireitoderepresentação 351.
Finalmente,aindatratandododireitoderepresentação,algumascircunstâncias
serevestemdeacesapolêmicaemfacedalegitimaçãoparaherdar.
Neste ponto, vale transcrever trechos da lição sempre erudita de CARLOS
ROBERTOGONÇALVES,comamplavisãodoutrináriaelegislativa:
“Predominanadoutrina,noentanto,oentendimentodequealegitimaçãoparaherdaréaferidaemrelação
aosucedidoenãoaorepresentado,comosustentaWASHINGTONDEBARROSMONTEIRO.
Namesma esteira a lição de PONTESDEMIRANDA: ‘Quem foi deserdado por alguém, ou julgado
indigno para lhe suceder, pode representar tal pessoa, porque a deserdação ou indignidade somente
concerne à herança de quem deserdou, ou para a qual foi julgado indigno. Basta que possa herdar da
terceirapessoa.Paraseherdar,bastaqueodecujonão tenhadeserdadoo interessado,nemtenhaesse
sidojulgadoindigno’.
Dessemodo,obtemperaSILVIORODRIGUES,‘ofilhoquerenunciouaherançadeseupai,ouqueseja
indignode recebê-la,pode,nãoobstante, representandoopai, recolheraherançadoavô,anãoserque,
comrelaçãoaesteascendentemaisafastado(oavô),seja,também,indignodesuceder’.
Nessesentidodispõem,expressamente,osCódigosCivisitaliano(art.468,al.2)eportuguês(art.2.043),
afirmandoesteúltimo:‘Osdescendentesrepresentamoseuascendente,mesmoquetenhamrepudiadoa
sucessãodesteousejamincapazesemrelaçãoaele’” 352.
Parece-nos o melhor entendimento, tendo em vista tudo que já se afirmou
anteriormentesobreotemada“indignidade” 353.
5.FUNDAMENTOEFINALIDADE
Há,indubitavelmente,umafundamentaçãomoralquerespaldaoinstituto.
Nessesentido,observaSÍLVIODESALVOVENOSA:
“Arepresentaçãofoicriada,jánoDireitoRomano,pararepararpartedomalsofridopelamorteprematura
dospais” 354.
Assim,temodireitoderepresentaçãoumfundamentomoral,poisvisaadarum
tratamento equânime a herdeiros do autor da herança, poupando-lhes da
infelicidadedupladaperdadeseuascendenteimediatamentediretoetambémde
benefícios potenciais que lhes seriam garantidos, se não tivesse ocorrido o
falecimentodaquele.
Note-se queháumabuscapara equilibrar a distribuiçãodaherança entre os
legitimados a suceder, todos ligados afetivamente, de forma presumida, ao de
cujus.
6.EFEITOS
Oefeitobásicoda representação sucessória é o reconhecimentododireito à
herançaaossucessoresdopré-mortooudaqueleexcluídodasucessão.
Sehouverumúnicorepresentante, receberáesteexatamenteomesmovalora
quefariajusorepresentado(herdaráporcabeça).
Havendomaisdeum,dividir-se-áacota-parteemtantasfraçõesquantoforo
númeroderepresentantes(herdarãoporestirpe 355).
Éestaalinhadosarts.1.854e1.855doCC:
“Art.1.854.Osrepresentantessópodemherdar,comotais,oqueherdariaorepresentado,sevivofosse.
Art.1.855.Oquinhãodorepresentadopartir-se-áporigualentreosrepresentantes”.
Parece-nos,semdúvida,amelhordisciplina.
Valedestacar,ainda,que,naformadoart.2.009doCódigoCivil,quando“os
netos,representandoosseuspais,sucederemaosavós,serãoobrigadosatrazerà
colação,aindaquenãoohajamherdado,oqueospaisteriamdeconferir” 356.
Trata-sederegraquesejustificanamedidaemquevisaaimpedirviolaçãoda
legítimadosherdeirosnecessários.
7.CONSIDERAÇÕESFINAIS
Por fim, vale tecer algumas importantes considerações acerca do tema ora
analisado.
Registre-se que não se admite a representação na renúncia da herança,
conformeseverificadoart.1.811doCC 357.Emoutraspalavras,orenuncianteé
considerado como se herdeiro nunca houvesse sido, razão por que os seus
descendentesnãopoderãorepresentá-lo.
Por outro lado, nada impede que o renunciante da herança de uma pessoa a
representeemoutra.
Éoqueestabeleceoart.1.856:
“Art.1.856.Orenuncianteàherançadeumapessoapoderárepresentá-lanasucessãodeoutra”.
Dessa forma,mesmo que o filho tenha renunciado à herança do pai, nada o
impededeatuarcomorepresentantedoseuascendentediretonaherançadoavô.
Outraimportanteobservação,finalmente,éfeitaporSÍLVIOVENOSA:
“Comoaquotadopré-mortoédistribuídaporestirpe,sealgumherdeirodessaestirperenunciaàherança,
aparterenunciadasóacresceàpartedosherdeirosdomesmoramo,istoé,trêsnetosrepresentamopai.
Umdosnetosrenuncia.Aquotadestaestirpeficadivididaentreosoutrosdoisnetosquenãorenunciaram.
Nãoseacresce,comessarenúncia,omonte-morgeral,istoé,apartedesserenunciantenãovaiparaos
que recebem por direito próprio, nem para a representação de outro herdeiro pré-morto. Como o
representante é sucessor do autor da herança, existe uma única transmissão patrimonial. Há um único
impostodevido” 358.
Valedizer,Aldo,BrunoeClementerepresentamopaiFrancisco(pré-morto),
naherançadoavô.ElesconcorremcomostiosRufinoeCelino.Se,porexemplo,
Aldorenunciar,asuaquotairáacresceràsdosseusoutrosdoisirmãos(Brunoe
Clemente),enãoàsquotasdostios.Emresumo:Rufinoherdará1/3,Celino1/3,e
o outro 1/3 será dividido entre Bruno e Clemente, representando o seu pai
Francisco.
ÉasoluçãoapresentadapelonossoDireito.
CapítuloXIII
SucessãoTestamentária
Sumário:1.Consideraçõesiniciais.2.Noçõesgeraissobreotestamento.2.1.Sobreopoderdetestar.2.2.
Conceito e natureza jurídica. 2.3. Características essenciais. 2.4. Modalidades classificatórias do
testamento.3.Algumaspalavrassobreavisãohistóricadotestamento.4.Aspectosrelevantesdoplanoda
validade aplicável ao testamento. 4.1. Manifestação de vontade livre e de boa-fé. 4.2. Capacidade de
testar. 4.3. Objeto do testamento. 4.4. Forma prescrita em lei. 4.5. Prazo das ações de invalidade de
testamento. 5. O testamenteiro. 5.1. Conceito e natureza jurídica. 5.2. Formas de designação. 5.3.
Requisitos para o exercício. 5.4. Atribuições. 5.5. Retribuição. 5.6. Prazo. 5.7. Responsabilidade. 5.8.
Extinçãoregulardatestamentaria.5.9.Destituiçãoourenúnciadotestamenteiro.6.Regênciatemporalda
leireguladoradasucessãotestamentária.
1.CONSIDERAÇÕESINICIAIS
Com o capítulo anterior, acreditamos haver alcançado uma abrangente
compreensãodasnoçõesgeraissobreaSucessão.
Observe-se, inclusive,que tais temáticassãodestinatáriasdosTítulos I (“Da
SucessãoemGeral”)eII(“DaSucessãoLegítima”)doLivroV(“DoDireitodas
Sucessões”)dovigenteCódigoCivilbrasileiro.
Chegaaserirônicoque,noBrasil—emque,pormúltiplasrazões,nãoháuma
culturadeusodotestamento—,reservem-se,novigenteCódigoCivil,28artigos
à Sucessão Legítima (arts. 1.829 a 1.856), aqui já analisada, enquanto, na
Testamentária, haja uma regulamentação maior, com 134 artigos de lei (arts.
1.857a1.990).
Iniciamos, pois, agora, o estudo da matéria correspondente ao Título III,
dedicadoàSucessãoTestamentária,comênfasenasregrasgeraisdotestamentoe
nacapacidadedetestar.
2.NOÇÕESGERAISSOBREOTESTAMENTO
No presente tópico, analisaremos o conceito de testamento, bem como a sua
naturezajurídicaeclassificação,permitindoumaamplavisãosobreotema.
Todavia, antes disso, parece-nos relevante tecer algumas considerações
preliminaresacercado“PoderdeTestar”.
2.1.Sobreopoderdetestar
Emqueconsisteexatamenteochamado“PoderdeTestar”?
De fato, conforme consta no dicionário Aurélio, a expressão “testar”, na
acepçãoaquitrabalhada,podeserassimentendida:
“Testar.[Dolat.testari.]V.t.d.ei.1.Deixaremtestamento;legar:“Testouàmulhertodososseusbens”.
T.d.2.Deixarcomoemtestamento;transmitir,passar, legar:‘Nenhumséculo,depoisderijolidar,sefoi
envolver no sudário do passado, sem testar à história mais um nome, um feito, um laurel, uma glória’
(Antero deQuental,Prosas, I, p. 45).3.Deixar pormorte; deixar emdisposição testamentária. Int.4.
Fazeroseu testamento: ‘Morreusemtestar’; ‘Enquantodurouo inventário,eprincipalmenteadenúncia
dadaporalguémcontraotestamento,alegandoqueoQuincasBorba,pormanifestademência,nãopodia
testar,onossoRubiãodistraiu-se’(MachadodeAssis,QuincasBorba,p.39).T.i.5.Dispor(dealguma
coisa)emtestamento:‘Testoudetodososseusbens’.6.Dartestemunho;testemunhar.(Pres.ind.:testo,
etc.;pres.subj.:teste,testes,teste,testemos,testeis,testem.Cf.testo(ê),textoeteste,s.m.,etêxteis,pl.
detêxtil.)” 359.
Aideiade“testar”,portanto,nopresentecontexto,édedispor,pormeiodeum
instrumento formal, chamado testamento, de seus bens, de forma total ou
parcial,apósoadventodamorte.
Estaconcepção,inclusive,seextraidoprópriocaputdoart.1.857dovigente
CódigoCivilbrasileiro 360.
A fundamentação deste “Poder de Testar” está justamente na autonomia da
vontade e no exercício do direito de propriedade, uma vez que, se o testador
poderiadispordosbensemvida,porquenãoautorizar,atendendoàsuavontade,
oseudirecionamentopostmortem?
Contudo, tal disposição de bens, por vezes, não poderá ser total, quando
houver a necessidade de preservação da legítima, na forma do § 1.º do
mencionado dispositivo 361. A disposição, portanto, somente se dará de forma
total quando inexistirem herdeiros necessários (descendentes, ascendentes ou
cônjuge) 362.
Vale destacar, porém, que o testamento também é o meio hábil para
manifestaçõesdevontadedeconteúdonãoeconômico, conformeestabeleceo§
2.º do mencionado dispositivo normativo (“§ 2.º São válidas as disposições
testamentáriasdecaráternãopatrimonial,aindaqueotestadorsomenteaelasse
tenha limitado”), tudo em observância ao princípio do respeito à vontade
manifestada,pornósaquitantasvezesreferido 363.
Assim, em testamento, não há falar somente em transferência de bens do
patrimônio próprio para o de outra pessoa, mas também em diversas outras
diligências,desdeumamanifestaçãoautobiográficasobreotestadoresuavisão
de vida, até a determinação de preceitos que, somente de forma indireta,
poderiamapresentarefeitoeconômico.
Dentretaisdisposições,semumaespecíficanaturezaeconômicaepatrimonial,
a título meramente exemplificativo 364, podemos lembrar, porque previstas no
própriotextocodificado:
a)adisposiçãogratuitadoprópriocorpo(art.14,caput) 365;
bacriaçãodeumafundação(art.62,caput) 366;
c)asubstituiçãodeterceirodesignadoemcontrato(art.438,parágrafoúnico) 367;
d)asubstituiçãodebeneficiárioemsegurodevida(art.791,caput) 368;
e)ainstituiçãodecondomínioedilício(art.1.332,caput);
f)oreconhecimentodefilhos(art.1.609,III) 369;
g)anomeaçãodetutor(art.1.634,IV,eart.1.729,parágrafoúnico) 370;
h)ainstituiçãodebemdefamília(art.1.711,caput) 371;
i)areabilitaçãodoindigno(art.1.818,caput) 372;
j)oestabelecimentodecláusulasrestritivas(art.1.848,caput);
k)adeserdação(art.1.964,caput) 373;
l)arevogaçãodetestamentoanterior(art.1.969,caput) 374;
m)anomeaçãodotestamenteiro(art.1.976) 375;
n)despesasdesufrágiospelaalmadofalecido(art.1.998) 376;
o)adispensadecolação(art.2.006) 377.
A determinação de tais diligências, como visto, pode ser feita pela via
testamentária.
Mas,afinaldecontas,oqueéumtestamento?
Éoqueseenfrentaránopróximosubtópico.
2.2.Conceitoenaturezajurídica
Oqueéumtestamento?
Sea religião cristão compreendecomouma formade aliança 378 e a poesia
permite visualizá-lo como uma tentativa de controle póstumo da destinação do
quedeixamos 379,juridicamenteoconceitoébemmaissimples.
OCódigoCivilbrasileirode1916,emseuart.1.626,apresentavaumconceito
legaldetestamento.
Estabeleciaoreferidodispositivonormativo:
“Art.1.626.Considera-setestamentooatorevogávelpeloqualalguém,deconformidadecomalei,dispõe,
notodoouemparte,doseupatrimônio,paradepoisdasuamorte”.
Seécertoquenãoépapeldaleiestabelecerconceitos—oquefoiobservado
pelovigenteCódigoCivilBrasileiro—,ofatoéqueoantigoconceitolegalnão
eradetodoruim.
Naverdade,asimperfeiçõestécnicasdaantigadefiniçãopodiamserresumidas
emduas.
Aprimeiraéaausênciademençãoàpossibilidadedeutilizaçãodotestamento
parafinalidadesdistintasdadisposiçãopatrimonial,comojávimos.
Asegundaimprecisãoconsisteemdefinirotestamentocomoum“atojurídico”
—oquepoderiaremeteràconfusãoconceitualcomoatoemsentidoestrito 380
—enão,emrespeitoàsuapróprianatureza,comoumnegóciojurídicounilateral.
Sim, a natureza jurídica do testamento é a de um negócio jurídico
unilateral 381.
Emnossosentir,onegóciojurídicotraduzuma“declaraçãodevontade,emitida
emobediência aos seus pressupostos de existência, validade e eficácia, como
propósito de produzir efeitos admitidos pelo ordenamento jurídico pretendidos
peloagente” 382.
Umtestamento,portanto,nadamaisédoqueumnegócio jurídico,peloqual
alguém, unilateralmente, declara a sua vontade, segundo pressupostos de
existência,validadeeeficácia,comopropósitodedispor,notodoouemparte,
dos seus bens, bem como determinar diligências de caráter não patrimonial,
paradepoisdasuamorte.
Eisonossoconceito,intimamenterelacionadoànaturezajurídicadoinstituto.
Vejamos,agora,ascaracterísticasessenciaisdotestamento.
2.3.Característicasessenciais
Para a compreensão das características essenciais do testamento, parece-nos
relevantedestacarque,quando,emnossoesforçodesistematização,afirmamoso
que“é”umtestamento,revelandoasuanaturezajurídica,talvezsejaimportante
tambémregistraroqueele“nãoé”.
É importante ressaltar que, embora seja um negócio jurídico, não é o
testamento um contrato, uma vez que lhe falta a bilateralidade peculiar à
caracterizaçãodeumafiguracontratual.
Com efeito, conforme já conceituamos alhures, um “contrato é um negócio
jurídico pormeio do qual as partes declarantes, limitadas pelos princípios da
função social e da boa-fé objetiva, autodisciplinamos efeitos patrimoniais que
pretendematingir,segundoaautonomiadassuasprópriasvontades” 383.
Inexiste, portanto, no testamento, esta participação de outros sujeitos na
manifestação da vontade, ou, em outras palavras, o núcleo básico de todo o
contrato: o “consentimento” das partes contratantes, indispensável em sua
conformaçãonuclear.
Daí a primeira característica essencial do testamento, qual seja, a sua
unilateralidade, seguindo-se o seu evidente caráter personalíssimo, a teor do
art. 1.858: “o testamentoé atopersonalíssimo,podendo sermudadoaqualquer
tempo”.
Porisso,háavedaçãoaochamadotestamentoconjuntivo 384,qualseja,aquele
elaboradopormaisdeumsujeitonomesmodocumento 385.
O mesmo dispositivo supratranscrito apresenta ainda outra importante
característicadotestamento:asuarevogabilidade.
Comefeito,nãosepoderianegarao testador,porforçadoprópriopostulado
da autonomia privada, a prerrogativa de reescrever os termos da sua vontade
declarada,quantasvezesoachasseconveniente 386.
Damesmaforma,éotestamentoumnegóciojurídicosolene,emqueaformaa
seradotada,deacordocomaintençãodotestador,éimpostaporlei,sobpenade
nulidade.
A solenidade é, sem dúvida, uma das características mais evidentes do
testamento,emqueapreocupaçãocomaformaélevadaagrauextremo,oquese
observatambémemoutrossistemasnormativosestrangeiros 387.
Sobreo tema,observao insuperávelPONTESDEMIRANDAqueoEstado,
aoprotegeradisposiçãodeúltimavontade,
“cerca-a de formas, que a livrem de insídias emaquinações. Continua, ao explicar que a exigência de
formatestamentáriaevitaqueotestadorapressadamentemanifesteavontadeedecertomodomostra-lhe
queédegranderelevânciaoatoquevaipraticar.Poroutrolado,diminuiaspossibilidadesdepressões,de
violências, de erros e de atendimentos a pedidos e promessas.Além disso, a presença de testemunhas
concorre para que se contenha, pondere e se precate o testador. Todo intervalo entre a deliberação de
testareafeituradotestamentofortaleceameditaçãododisponente.Quantoaterceiros,asformalidades
testamentáriaspõemotestadorasalvodefalsificaçõesedefalsidades,bemcomodeviolências.Muitose
sabe sobre osmales que resultavam das cartas de consciência.Herdeiros legítimos eram lesados pelas
coaçõesdeestranhos,queotestadorbeneficiava,edaspreteriçõesmomentaneamentecausadas.Pessoas
estranhas,enãosóparentes,erampostasdeladoporcircunstânciasdeintranquilidadedotestador.Nãosó
herdeiroslegítimos.Daínãobastaroescrito,pormaisperfeitoeverdadeiroqueseja,paraqueserepute
feito o testamento. O rigor formal protege o testador e os que seriam por ele declarados herdeiros ou
legatários.Trata-sedeatodeúltimavontade,razãoporqueatécnicalegislativatambémhádecogitarde
formalidadesqueasseguremaconservaçãodonegóciojurídico.(...)Comospressupostosdeforma,oque
se tempor fitoémaior segurançanaexpressãodavontadeenaconservaçãodo instrumento. (...)Seo
testamentonãosatisfazasexigênciasformais,oualgumasdelas,testamentonãohá.Seasatisfaçãoéque
foiinsuficiente,hánulidade.Serincompletaaobservância,ouserirregular,faznulootestamento.Nãoter
havidocumprimentodequalquerdospressupostos,qualquerqueseja,nãoéinfraçãodalei;éomissãode
requisitoparaaexistênciadetestamento” 388.
Porisso,observaRolfMadaleno:
“Este conjunto de formalidades que dá uma ritualização essencial e necessariamente formal à facção
testamentária,própriaeinerenteaesseatojurídicounilateral,quecontaseusefeitosparaquandoseuautor
jánãomaisestiverpresenteparadefendê-lo,dissoimportandocadapassodoseuritualedaspessoasque,
conjuntamente,participamdo testamento, semprecomo intuitodeassegurara liberdadedo testadorea
veracidadedesuasdisposições” 389.
Por fim, como última característica essencial do testamento, precisamos
lembrardasuagratuidade,namedidaemqueaobeneficiáriodeumtestamento
não se impõe uma contraprestação, como se dá, por exemplo, no contrato de
compraevenda.
Na mesma linha, o herdeiro jamais poderá “comprar” uma quota ou todo o
patrimônio de um testador ainda vivo, sob pena de configurar um ato
expressamentevedadopelonossoordenamento jurídico,ealtamente reprovável
sobopontodevistamoral,ochamadopactacorvina 390.
Nãoseconfunda,porém,ocarátergratuitodadisposiçãotestamentáriacoma
possibilidadedeestabelecimentodeumônus,modoouencargo(quenãoconstitui
tecnicamente uma contraprestação), o que é perfeitamente aceitável, na
perspectivadoplanodeeficáciadonegóciojurídico 391.
Posto isso, passemos, agora, a tecer algumas considerações classificatórias
acercadotestamento.
2.4.Modalidadesclassificatóriasdotestamento
Toda classificação, assim como toda conceituação, depende muito da visão
metodológicadequemaescolheouapresenta.
Noquedizrespeitoaotestamento,oprópriotextocodificadoseencarregoude
estabelecer as duas formas possíveis de classificação, em função das
circunstânciasdesuaelaboração.
A forma ordinária de testamento é aquela elaborada em uma conjuntura de
normalidade,deacordocomapreferênciadotestador.
Já a forma extraordinária ou especial de testamento é aquela realizada em
funçãodecircunstânciaspeculiaresoudedificuldadesfáticasdavidadotestador.
Quandoalguémfala,porém,em“espécies”de testamento,estáse referindoa
subdivisõesdestaclassificaçãoprimária,asaber,emrelaçãoàformaordinária,
os testamentos público, cerrado e particular, e, sob a forma especial, os
testamentosmarítimo,aeronáuticoemilitar.
Cadaumadessas espécies serápornós analisada emmomentopróprio 392, a
eles acrescentando a compreensão da figura jurídica do codicilo, que é uma
disposiçãodeúltimavontadedemenormonta 393.
Façamos, agora, algumas importantes observações de cunho histórico a
respeitodotestamento.
3.ALGUMASPALAVRASSOBREAVISÃOHISTÓRICADOTESTAMENTO
Antes da Roma antiga, não hámaiores informações acerca da existência do
testamentocomoinstitutojurídico 394.
Conforme já visto em momento anterior 395, a ideia de sucessão,
historicamente, sempre esteve ligada, em sua gênese, à preservação do culto
religiosoedapropriedadefamiliar.
Sobreotema,ensinavaCAIOMÁRIODASILVAPEREIRA:
“Não se conhecendo no direito oriental primitivo vestígios de sucessão testamentária, sua origem é
apontada nas civilizações do ocidente. E a noção primeira de transferência por declaração de vontade
aparececomoumatodeadoção (adoptio inhereditatem), que seria a origemgenética do testamento.
Umpassoàfrenteéainstituiçãodeumherdeiro,nafaltadequemseriadeiure(ocontinuadordoculto
doméstico), encarregado de distribuir os bens àqueles que ode cujus indicava, conservando contudo a
casa,queforaocentrodafamília.
Em Roma, o testamento foi conhecido muito cedo e assumiu feições de tal importância, que Cícero o
proclamou omais grave da vida do cidadão.Dele participava toda a comunidade, procedendo-se à sua
homologaçãoperanteascúriasreunidas(incalatiscomitiis),umavezverificadaainexistênciadeheredes
sui,deagnados,eaindadealguémpertencenteàgensdo testador,aquemosbensdevessemcaberde
direito.(...)Estaaprovaçãopelascúriasrestringiaaospatríciosasucessãotestamentária,umavezqueos
plebeusnãotinhamassentonoscomitiacuriata.Aelesfoi,todavia,admitidotestarsoboutraforma,quejá
traduz ummomento novo da evolução testamentária: por um lado, criou-se o testamento in procinctu
(aprovado, perante o exército formado), e o testamentum per aes et libram, fundado na ideia de
mancipatio,quesimbolizavaumaespéciedevenda,naqualapareciamofamiliaevenditor(testador)eo
familiaeemptor(aceitantedaherança),comainterveniênciadolibripens(representandooEstado),em
presençadecincotestemunhas.Acerimônia,complexaeformal,terminavacomumadeclaraçãoverbaldo
testador(nuncupatio),pelaqualratificavaoquesefizera,comoatodesuavontade” 396.
NalinhadecompreensãodaimportânciadotestamentoparaoDireitoRomano,
observavaORLANDOGOMES:
“Conheceram os romanos várias e sucessivas formas de testamento. Antes da Lei das XII Tábuas: o
testamento in calatis comitis, feito em tempo de paz, perante as cúrias reunidas, e o testamento in
procinctu,feitoemtempodeguerra,nocampodabatalha.Taisformasforamsubstituídasnaleireferida
pelo testamentoper aes et libram, que consistia em venda fictícia da sucessão, perante testemunhas.
Importandomancipatio, o testamento, assim feito, era irrevogável. O pretor simplificou essa forma de
testamento, substituindo a participação do libripens e do familiae emptor por mais duas testemunhas.
Concedia-seasucessãobonorumpossessivo.NoBaixoImpério,o testamentopretorianofoisubstituído
poruma formacompreensivadas anteriores edenominada tripertitum por Justiniano.Do testamento in
calatis comitis, tomou a rogação de testemunhas; do testamento per aes et libram, a presença das
antestata;edotestamentopretoriano,aassinaturadeseptemtestibus” 397.
AIdadeMédianãoprestigiouoinstitutojurídicodotestamento.
Ao contrário, muito por força da influência eclesiástica, houve um
esvaziamento do seu uso, embora, em reação ao poder do clero, tenha surgido
uma contramarcha posterior de (re)valorização da manifestação póstuma da
vontade.
Nesse sentido, preleciona SÍLVIO DE SALVOVENOSA, “fazendo a ponte”
comodireitobrasileiropré-codificado:
“Não foi, entretanto, o testamento romano recebido na forma originária pelas legislaçõesmodernas.Na
IdadeMédia, inclusive, sua função achava-se praticamente extinta, servindo apenas para fazer legados
piosproBonoetremediuanimae (Nonato,1957,v.1:75).Tornou-secostumedeixarsemprealgoparaa
Igreja.Ofalecidoqueseolvidavaeralogosocorridopelosherdeiros,quesupriam‘afalta’.Essecostume,
contudo, teve o eficaz resultado de fazer os povos bárbaros assimilarem a noção de testamento, à qual
eramtotalmenteavessos.Entreosgermanos,otestamentodifundiu-selentamenteporinfluênciadaIgreja.
Em Portugal, as Ordenações Afonsinas aceitaram e adotaram a noção romana de testamento, assim
tambémacompilaçãofilipina.
Dessemodo, antesdoCódigoCivilde1916, as formas instrumentárias, segundoasordenações filipinas,
eram: o testamento aberto ou público, feito por tabelião; o testamento cerrado, com o respectivo
instrumentodeaprovação;otestamentofeitopelotestador(particular)ouporoutrapessoaeotestamento
per palavra (nuncupativo), com a assistência de seis testemunhas. Segundo Itabaiana de Oliveira
(1987:153),ataisespéciesdetestamento,pertencentesàcompilaçãofilipina,oscivilistasacrescentaram:o
testamentomarítimo,otestamentoadpiascausas,otestamentointerliberos,otestamentorurefactum,
o testamento pestis tempore e o testamento conjuntivo o demão comum, todos revigorados doDireito
RomanodoBaixoImpério” 398.
Especificamente no Brasil, a incidência da legislação portuguesa no Brasil Colônia (e Vice-Reino)
acompanhouatendênciaeuropeiadaépoca.
Novamentevalemo-nosdo testemunhohistóricodeCAIOMÁRIODASILVA
PEREIRA:
“Nosso direito anterior ao Código Civil de 1916 consagrou nas Ordenações as velhas modalidades
testamentárias que o chamadoBreviário de Alarico (Lex Romana Wisigothorum) adotara: aberto ou
público, cerrado oumístico, particular ou ológrafo, nuncupativo ou por palavras (Ordenações, Livro IV,
Título80),aqueacresciamosjuristasoutrasespécies,comomarítimo,depaiparafilho,adpiascausas,
interliberos,rurefactum,temporepestis,conjuntivooudemãocomum.
Poroutrolado,opodercrescentedocleroimpunhataisexigênciasaumasociedadeeminentementecristã,
quetornavaquaseobrigatóriasasdeixasafavordaIgreja,atravésdetestamentoquesefaziaperanteo
pároco,empresençadeduastestemunhas.
A títulode coibiros abusos clericais edefender as tradições lusas, contraos excessosde romanismo,o
MarquêsdePombalbaixouasLeisde25dejunhode1766e9desetembrode1769,aprimeira,anulando
ostestamentosemfavordequemosescrevesseousugerisse,oudascorporaçõesaquepertencesse,ou
feitos por pessoas gravemente enfermas; e a segunda, reforçando a sucessão legítima. A legislação
pombalinafoisuspensaempartepeloDecretode17dejunhode1778” 399.
Em nossa primeira codificação civil, buscou-se disciplinar, efetivamente, a
SucessãoTestamentária.
Para isso, foram instituídas as já mencionadas espécies pública, cerrada e
particulardetestamento,alémdomarítimoemilitar.
Admitiu-se,porexceção,ochamadotestamentonuncupativo,masapenascomo
forma de testamento militar 400, valendo registrar haver sido vedado
expressamenteotestamentoconjuntivooudemãocomum 401.
Navigentecodificaçãobrasileira,adiretriz foramantida,acrescentando-sea
figuradotestamentoaeronáuticocomoformaespecial 402.
4.ASPECTOSRELEVANTESDOPLANODAVALIDADEAPLICÁVELAOTESTAMENTO
Identificadootestamentocomoumatodenaturezanegocial,faz-senecessário
visualizá-lo sob a perspectiva do plano de validade do negócio jurídico,
respeitadasassuaspeculiaridades.
Poderíamostratarestaquestãosobaóticadostrêsplanosdonegóciojurídico,
asaber:existência,validadeeeficácia.
Todavia, como o plano de validade já pressupõe o de existência — um
testamentosemefetivamanifestaçãodavontade,porexemplo,seriaconsiderado
inexistente juridicamente — e como o plano de eficácia é consequencial 403,
parece-nos que a visão dos aspectos relevantes do testamento como negócio
jurídicodeveráabranger:
a)manifestaçãodevontadelivreedeboa-fé;
b)capacidadedoagente;
c)possibilidade,licitudeedeterminabilidadedoobjeto;
d)formaadequada(incasu,prescritaemlei).
Tudoissoparamelhorpermitiroadequadoentendimentodamatéria.
Frise-se,outrossim,maisumavez,queoenfrentamentodetaispressupostos,na
perspectiva da validade negocial, respeitará a tessitura própria e peculiar do
testamento.
Vamosaeles.
4.1.Manifestaçãodevontadelivreedeboa-fé
Do ponto de vista existencial, para que haja um negócio jurídico, é
imprescindívelhaverumamanifestaçãodevontade.
Taldeclaraçãovolitiva,por suavez,paraque seja consideradaválida,deve
seremanadadeformalivreedeboa-fé.
Omesmo,naturalmente,sedácomotestamento.
Por issomesmo, qualquer umdos defeitos que invalidamo negócio jurídico
podeserinvocado,emaçãoprópria,paraimpugnarotestamento 404.
4.2.Capacidadedetestar
Paraqueumnegóciojurídicosejaconsideradoválido,éprecisoqueoagente
emissordavontadetenhacapacidadeparaasuarealização.
Sobreotema,jáescrevemosemvolumeanterior:
“Adquiridaapersonalidadejurídica,todapessoapassaasercapazdedireitoseobrigações.
Possui,portanto,capacidadededireitooudegozo.
Todoserhumanotem,assim,capacidadededireito,pelofatodequeapersonalidadejurídicaéumatributo
inerenteàsuacondição.
(...)
Nem toda pessoa, porém, possui aptidão para exercer pessoalmente os seus direitos, praticando atos
jurídicos,emrazãodelimitaçõesorgânicasoupsicológicas.
Sepuderematuarpessoalmente,possuem,também,capacidadedefatooudeexercício.
Reunidososdoisatributos,fala-seemcapacidadecivilplena.
(...)
Nãoháqueseconfundir,poroutrolado,capacidadeelegitimidade.
Nem toda pessoa capaz pode estar legitimada para a prática de um determinado ato jurídico. A
legitimaçãotraduzumacapacidadeespecífica.
Emvirtudedeuminteressequesequerpreservar,ouemconsideraçãoàespecialsituaçãodedeterminada
pessoaque se quer proteger, criaram-se impedimentoscircunstanciais, que não se confundem com as
hipóteses legais genéricas de incapacidade. O tutor, por exemplo, embora maior e capaz, não poderá
adquirirbensmóveisouimóveisdotutelado(art.1.749,I,CC/2002eart.428,I,CC/1916).Doisirmãos,da
mesmaforma,maioresecapazes,nãopoderãosecasarentresi(art.1.521,IV,CC/2002,eart.183,IV).
Em tais hipóteses, o tutor e os irmãos encontram-se impedidos de praticar o ato por falta de
legitimidadeoudecapacidadeespecíficaparaoato” 405.
No que diz respeito ao tema da capacidade em matéria sucessória, a
capacidade testamentária passiva já foi por nós tratada quando enfrentamos o
temada“vocaçãohereditária” 406.
Como negócio jurídico, outrossim, a realização de um testamento pressupõe
umacapacidadejurídicaativa.
Sobreotema,estabeleceoart.1.860doCC:
“Art. 1.860. Além dos incapazes, não podem testar os que, no ato de fazê-lo, não tiverem pleno
discernimento.
Parágrafoúnico.Podemtestarosmaioresdedezesseisanos”.
Ocaputdodispositivoé,emnossaopinião,declarezameridiana.
Aincapacidadecivil,bemcomoaausênciadeplenodiscernimento,afiguram-
se,logicamente,comoóbicesparaapráticapessoaldeumatojurídico.
Todavia, o parágrafo único do referido dispositivo excepciona a regra, em
favordosmenorespúberes,oquemerecealgumasconsiderações.
Sobreestaquestão,observaSÍLVIOVENOSA:
“Quantoaofatodesepermitirquemaioresde16anosseutilizemdetestamentoemambososdiplomas,o
interesseé,comoregra, teórico,poisnessa idadedificilmentealguémpensaráematodeúltimavontade,
masapossibilidadeexisteeéissoqueimporta.Aslegislaçõescomparadastambémtrazemidadesmínimas
aproximadasouigualanossa.Assim,orelativamentecapaztemplenacapacidadedetestar.Trata-se,pois,
deumacapacidademaisampladoqueacapacidadegeral.Importapensarque,parafazertestamento,a
lei procura reconhecer no sujeito um certo grau de discernimento. Acertadamente, a lei entende que o
maiorde16anos temessediscernimentoparamanifestaravontade testamentária.Casonãofossea lei
expressa, necessitaria da assistência do pai ou responsável, tal o impossibilitaria de testar, dado o
personalismo do ato já aqui estudado. A origem dessa capacidade vem do Direito Romano, quando se
adquiria a capacidade em geral com a puberdade, não havendo, em princípio, uma idade
predeterminada” 407.
Saliente-sequeoreconhecimentolegaldacapacidadedetestardomaiorde16
anosimplica,semdúvida,adesnecessidadedaassistênciaparasuarealização,já
que,juridicamente,issoseriaumcontrassenso,dadoocaráterpersonalíssimodo
testamento.
Observe-se que o fato de se reconhecer capacidade para testar não significa
dizerqueomenorpúberehajasidoemancipado.
Seráeleaindamenore incapazpara todososdemaisatosdavidacivil,mas
estaráautorizadopelalei,deformaexcepcional,afazerotestamento.
Se, por acaso, o menor for emancipado por outros meios que a lei permita
(pelo casamento, por exemplo), isto ainda não o autorizaria a fazer testamento,
dadaaespecificidadedacapacidadesucessóriaparatestar 408.
Registre-se,porfim,queacapacidade,naturalmente,éaferidanomomentoda
realização do negócio jurídico testamentário, não importando a situação fática
anteriorouposterior,umavezquea“incapacidadesupervenientedotestadornão
invalida o testamento, nem o testamento do incapaz se valida com a
superveniênciadacapacidade”,conformeprevêoart.1.861doCC.
4.3.Objetodotestamento
Seguindoorigormetodológicoaquiexposto,lembremosque,tambémdoponto
devistaexistencial,parahaverumnegóciojurídico,éimprescindívelaexistência
deumobjetoespecífico.
Vale salientar que o objeto não precisa ter conteúdo necessariamente
patrimonial,umavezqueotestamentotambémémeiohábil,comovisto,paraa
determinaçãodedisposiçõesdecaráternãoeconômico.
E, comoconsequência lógicadaperspectivaexistencial,paraqueonegócio
tenhavalidade, o objetodeve ser lícito, possível e determinado, ou aomenos,
determinável.Careceriadevalidade,porexemplo,umtestamentoquetivessepor
objetoatransmissibilidadedeumafazendaadquiridadeformacriminosa.
Por fim, apenas para efeito didático, frisamos que o tema das “Disposições
Testamentárias”, disciplinado nos arts. 1.897 a 1.911 do vigente Código Civil
brasileiro,seráobjetodeapreciaçãoemcapítulopróprioposterior 409.
4.4.Formaprescritaemlei
Paraqueumnegócio jurídicoexista,éprecisohaveruma forma,ouseja,um
“meiopeloqualavontadesemanifeste”.
E, para que tenha validade, a forma ou será livre (art. 107 do CC) ou
“prescritaemlei”.
Eissoésobremaneiraimportanteparaotestamento.
Trata-se, como visto, de um negócio jurídico solene, em que a norma legal
impõe determinado revestimento para o ato, traduzido em uma forma especial
paraasuavalidade.
Éoquesechamadenegócioadsolemnitatem.
Nocasodo testamento(negóciojurídicounilateral),alei impõedeterminada
forma(ordináriaouextraordinária),nãoreconhecendoliberdadeaotestadorpara
elaborá-lodeacordocomasuavontade,oquepodeserobjetodeaçãoespecífica
paraoreconhecimentodenulidade.
Arriscamosdizer,inclusive,quetalvezotestamentoseja,dentretodososatos
negociaisexistentes,aoladodocasamento,odemaiorrigorformalparaefeitode
reconhecimentodesuavalidade.
4.5.Prazodasaçõesdeinvalidadedetestamento
Odescumprimento de qualquer um dos requisitos de validade do testamento
gera,porconsequência,apossibilidadedesuaimpugnaçãojudicial.
OvigenteCódigoCivilbrasileiro trouxeexpressaprevisãodeprazopara tal
postulação.
Comefeito,estabeleceoart.1.859doCC:
“Art.1.859.Extingue-seemcincoanosodireitodeimpugnaravalidadedotestamento,contadooprazoda
datadoseuregistro”.
Observe-sequesetratadeumprazodecadencialpeculiar.
E,justamenteporsernormaespecial,talprazoprevaleceinclusiveemfacede
eventuais causas de nulidade absoluta do negócio jurídico, a exemplo da
incapacidadeabsolutadoagenteouda impossibilidadedoseuobjeto,asquais,
emregra,nostermosdoart.169,nãocomportariamprazoparaasuaimpugnação.
Nessesentido,observaoamigoVENOSA:
Lembremos que o novo Código fixou em cinco anos o prazo decadencial para impugnar a validade do
testamento, contado o prazo da data de seu registro (art. 1.859). Ao mencionar impugnação, o novo
diplomasereferetantoaoscasosdenulidadecomodeanulabilidade.Comisso,derrogaaregrageraldo
art.169, segundooqualonegócio jurídiconulonãoé suscetíveldeconfirmação,nemconvalidaçãopelo
decurso do tempo. A natureza do testamento e as dificuldades que a regra geral da imprescritibilidade
ocasionaria forçou essa tomada de posição pelo legislador. Essa exceção ao princípio geral vem
demonstrar que não é conveniente essa regral geral de não extinguibilidade com relação aos negócios
nulos. Melhor seria que se abraçasse a corrente doutrinária anterior que entendia que os atos nulos
prescrevemnoprazomáximoestabelecidonoordenamento.Nessecampodenulidades,porém,háquese
atentar para as hipóteses de inexistência de testamento, quando qualquer prazo extintivo se mostra
inaplicávelparasuadeclaração,comoocorre,porexemplo,nahipótesedeperfeitaausênciadevontadedo
testador” 410.
Daformacomoestáredigidoodispositivo,háqueseinterpretarqueocorreo
prazo decadencial de cinco anos para impugnação do testamento, no que diz
respeito a qualquer requisito de validade, menos em relação aos vícios de
consentimento 411.
Eporquenãoseaplicaroprazo tambémparaaanulabilidadedecorrentede
víciosdeconsentimento?
Porque,emfacedetaiscausas,háoutroprazoaplicável.
Éoprazodequatroanos,previstonoart.1.909doCC 412.
Porumaquestãoderigormetodológico,voltaremosatratardessaquestãoem
capítulo próprio, quando abordarmos especificamente o tema da invalidade do
testamento 413.
Enfrentemos,agora,comosedevedaraexecuçãodotestamento.
Para isso,compreendamosuma importante figuraparaoefetivocumprimento
dadisposiçãodeúltimavontade:otestamenteiro.
5.OTESTAMENTEIRO
Aberta a sucessão, com o falecimento do autor da herança, não há como
adivinharseexisteounãoumtestamento.
E, levando-se em consideração a inexistência de uma tradição cultural
brasileiradeconfecçãodotestamento,aímesmoéquenãosepodepresumirque
hajasidofeitotalnegóciojurídico.
Nessecontexto,surgeafiguradotestamenteiro.
Adisciplina jurídicada atuaçãodesse sujeito está prevista nos arts. 1.976 a
1.990dovigenteCódigoCivilbrasileiro.
Embora inserido, como dito, na parte final codificada da disciplina
testamentária, parece-nos importantíssimo falar dessa figura jurídica neste
momento,emquechegamosaofinaldasnoçõesgeraissobreotestamento.
Em que consiste, afinal, a figura do testamenteiro? Como ele pode ser
escolhido? Quem pode exercer tal mister? Quais são suas atribuições e
obrigações? Há algum tipo de retribuição pela atividade? Qual é a sua
responsabilidade?Comosedáporcumpridasuamissão?Podeeleserdestituído?
Pretendemosresponderatodasasperguntasnospróximossubtópicos.
5.1.Conceitoenaturezajurídica
Como o testamento não se cumpre em um passe de mágica, é preciso que
alguém diligencie o quanto necessário para a realização das disposições de
últimavontadedotestador.
Éestejustamenteopapeldotestamenteiro.
Testamenteiroéosujeito—designadopelotestadorounomeadopelojuiz—
parafazercumprirasdisposiçõesdeúltimavontade.
SeguindoadoutrinadeORLANDOGOMES,quatroteorias tentamexplicara
naturezajurídicadatestamentaria,asaber:
a)mandato;
b)representação;
c)tutela;
d)ofícioprivado.
Considerarotestamenteiroummandatárionãonospareceadequado.
Defato,nãosepodeconsiderá-loummandatáriodotestador,pelosimplesfato
dequeamorteextingueomandato.Damesmaforma,nãoérazoávelimaginá-lo
como um mandatário dos herdeiros, legatários ou credores da herança
simplesmenteporqueelesnãolhedelegaramquaisquerpoderes.
Damesma forma, inaplicável é a teoria da representação, uma vez que esta
pressupõe uma manifestação de vontade que inexiste, de fato, no momento da
atuaçãodotestamenteiro.Alémdisso,arepresentaçãoimplicacondutaemnomee
nointeressedorepresentado,oquenãoéocasodatestamentaria.
Vercomotutelatambémsoaestranho,tendoemvistaqueosprópriosherdeiros
instituídos podem ser encarregados da execução do testamento quando não há
testamenteironomeado.
Melhoréreconhecer,comoinsuperávelprofessorORLANDOGOMES,quese
trata,efetivamente,deumofícioprivado:
“A execução testamentária é considerada um ofício privado, entendido como um conjunto de poderes
atribuídos em lei a determinada pessoa, que se apresentam, do mesmo modo, como deveres. O
testamenteirodeveprovidenciar a execuçãodo testamento, defender-lhe a validade e praticar atos para
atenderainteressessuscitadosnomesmotempo.Exerce,emsuma,verdadeiromunus,oriundodenegócio
unilateral, em nome próprio, com poderes e deveres peculiares. Contudo, não está obrigado a aceitá-lo,
nemseexige,paraarecusa,qualquerescusaprevistaemlei.Seria,emresumo,umofíciodeassunção
facultativa, o que não deixa de constituir uma anomalia. Explica-se, entretanto, por não ser munus
público” 414.
Parece-nosamelhorexplicação.
De fato, embora com características próprias, o ofício de testamenteiro tem
muitospontosdeaproximaçãocomafunçãoexercida,porexemplo,porumperito
emumprocessojudicial.
Trata-seefetivamentedeummúnus,masquenãosepodeconsiderarpúblico,
umavezqueserefereainteressesevidentementeprivados,bemcomo,conforme
veremos em tópico posterior 415, em razão de o testamenteiro, caso não seja
herdeirooulegatário,poderser,inclusive,remuneradoportalmister.
5.2.Formasdedesignação
Comoumtestamenteiropodeserescolhido?
Asformasdedesignaçãodeumtestamenteiroacabampordelimitarasformas
detestamentaria.
A primeira forma é o chamado testamenteiro testamentário, ou seja, aquele
queénomeadopeloprópriotestador.
Édessamodalidadequetrataoart.1.976doCC:
“Art.1.976.Otestadorpodenomearumoumaistestamenteiros,conjuntosouseparados,paralhedarem
cumprimentoàsdisposiçõesdeúltimavontade”.
Chama-se testamenteiro legítimo o cônjuge, a quem cabe a execução
testamentária,nafaltadenomeaçãopelotestador.
Por fim, tem-se também o chamado testamenteiro dativo, que é aquele
nomeado subsidiariamente pelo magistrado, na ausência de designação pelo
testadoredecônjugesobrevivente.
As duas outras modalidades estão previstas no mesmo dispositivo legal, a
saber,oart.1.984doCC,quepreceitua:
“Art.1.984.Nafaltadetestamenteironomeadopelotestador,aexecuçãotestamentáriacompeteaumdos
cônjuges,e,emfaltadestes,aoherdeironomeadopelojuiz”.
Vale registrar a ausência demenção ao companheiro entre os testamenteiros
legítimos,oquesomentepodeseexplicarpelofatodeoCódigoCivilbrasileiro
de2002nãoincluirocompanheiroentreosherdeirosnecessários.
Observe-se, finalmente, que é possível a nomeação de mais de um
testamenteiro.
5.3.Requisitosparaoexercício
Quempodeexerceroofíciodetestamenteiro?
Aprincípio,qualquersujeitocapazpodeserdesignadocomotestamenteiro.
Não há qualquer impedimento de que seja um herdeiro ou legatário, mas
também não há óbice em se nomear alguém estranho à legitimação hereditária
passiva.
Observe-se, porém, que a testamentaria é uma atividade personalíssima, que
nãopodeserdelegada,emboraseadmitaarepresentaçãopormeiodemandato.
Talafirmaçãoédepreendidadoprópriotextodoart.1.985doCC:
“Art.1.985.Oencargodatestamentarianãosetransmiteaosherdeirosdotestamenteiro,nemédelegável;
mas o testamenteiro pode fazer-se representar em juízo e fora dele,mediantemandatário com poderes
especiais”.
Não há falar, porém, em exercício compulsório da testamentaria, sendo
imprescindível a aceitação do testamenteiro, em qualquer uma das suas três
formas(testamentário,legítimooudativo).
Arecusa,todavia,deveserjustificada.
Talaceitaçãopodesertácita,simplesmentepelosilêncioquandodanomeação
ou pelo exercício efetivo das diligências necessárias para o cumprimento das
disposiçõesdeúltimavontade.
A importância da aceitação se justifica pelas inúmeras atribuições do
testamenteiro,comrepercussãodegranderesponsabilidadepatrimonial.
Éoqueveremosnospróximossubtópicos.
5.4.Atribuições
Oofícioprivadodetestamenteiroédegranderesponsabilidade.
Com efeito, não havendo cônjuge ou herdeiros necessários, o testador tem a
prerrogativadeconcederaotestamenteiroaposseeaadministraçãodaherança,
ou de parte dela, podendo qualquer herdeiro requerer partilha imediata 416, ou
devoluçãodaherança,habilitandootestamenteirocomosmeiosnecessáriospara
o cumprimento dos legados, ou dando caução de prestá-los, conforme
estabelecidolegalmente 417.
Porissomesmo,naformadoart.1.978doCC,tendootestamenteiroapossee
a administração dos bens, incumbe-lhe requerer inventário e cumprir o
testamento.
Eestaé,semdúvida,aatribuiçãoprimordialdotestamenteiro:fazercumpriro
testamento.
Por tal razão,o“testamenteironomeado,ouqualquerparte interessada,pode
requerer,assimcomoo juizpodeordenar,deofício,aodetentordo testamento,
queolevearegistro”,conformeautorizaoart.1.979doCC.
É importantedestacarque,apriori,o testamenteiroéo sujeitoque, em tese,
mais tem interesse em defender as disposições de última vontade, seja pela
confiança que lhe foi demonstrada pelo testador (ao nomeá-lo), seja por ser
potencialmenteumdosbeneficiáriosdaherança,comocônjugeououtroherdeiro.
Assim,assumeeleopapeldemaior“defensor”dasdisposiçõestestamentárias,
devendosernecessariamenteouvidoemqualquerdiscussãosobresuavalidadee
eficácia,nabuscadoefetivocumprimentodavontadedotestador.
Taldeverdecorre,inclusive,deprevisãolegalespecífica,asaber,oart.1.981
doCC,quepreceitua:
“Art. 1.981. Compete ao testamenteiro, com ou sem o concurso do inventariante e dos herdeiros
instituídos,defenderavalidadedotestamento”.
Eéclaroqueasatribuiçõesaquimencionadasnãosãotaxativaseexaustivas,
uma vez que, sendo o cumprimento do testamento a missão primordial do
testamenteiro, muitas outras diligências podem ser determinadas pelo próprio
testador,observados,obviamente,oslimiteslegais 418.
Porfim,valedestacar,naformadoart.1.990doCC,quese“otestadortiver
distribuído toda a herança em legados, exercerá o testamenteiro as funções de
inventariante”.
5.5.Retribuição
Háalgumtipoderetribuiçãopelaatividadedetestamenteiro?
Asfunçõesdotestamenteiropresumem-segratuitas,quandoforeleherdeiroou
legatário.
Todavia, não sendo a testamentaria exercida por herdeiro ou legatário,mas,
sim, por terceiro nomeado pelo testador, haverá, em regra, a necessidade de
remuneraroindivíduoquedesempenharátãoimportanteofício.
Afinal,todotrabalhoédignoedevegerarumaretribuição.
Aúnicaexceçãoàregrabásicaderetribuiçãoéaprópriavontadedotestador,
que pode estabelecer a existência de um testamenteiro, sem uma paga
correspondente.
Mas, por óbvio, também por isso, pode o testamenteiro nomeado recusar o
ofícioatribuído.
Não sendo, portanto, vedada a retribuição no testamento, qual seria o valor
dessajustaretribuição?
Tal importância deverá ser fixada judicialmente, havendo parâmetros legais
comfaixasparaasuadelimitação.
Éaprevisãoconstantenoart.1.987:
“Art. 1.987. Salvo disposição testamentária em contrário, o testamenteiro, que não seja herdeiro ou
legatário,terádireitoaumprêmio,que,seotestadornãoohouverfixado,serádeumacincoporcento,
arbitradopelojuiz,sobreaherançalíquida,conformeaimportânciadelaemaioroumenordificuldadena
execuçãodotestamento.
Parágrafo único. O prêmio arbitrado será pago à conta da parte disponível, quando houver herdeiro
necessário”.
Note-sequeháumamargemdediscricionariedadeparaomagistrado fixaro
valor,devendovariar,apriori,entre1%a5%sobreovalordaherançalíquida.
Trata-se de uma verba paga pelo trabalho prestado e pela administração da
herança,quedeveserconsideradaumadespesajudicialdoinventário.
Vintena ou prêmio é o nome que se dá à retribuição que se outorga ao
testamenteiropeloserviçoporeleprestado.Perceba-sequenãosetratadeuma
liberalidade, mas, sim, de uma gratificação pro labore, remuneratória da
testamentaria.
A expressão “vintena” é utilizada justamente porque o máximo de 5%
corresponde a 1/20daherança líquida, que deve ser entendida como o saldo,
depois de pagas as dívidas preexistentes à abertura da sucessão, bem como as
despesasreligiosasefunerárias,alémdocusteiodoinventário 419.
Observe-sequeanossacodificaçãocivilestipulaumparâmetromínimoparaa
fixação do prêmio ou vintena, no caso do regular desempenho do ofício de
testamenteiro,oqueinexistenalegislaçãoprocessualcivilcorrespondente 420.
Eseotrabalhodotestamenteiro,emboracumprido, tenhasidofeitodeforma
poucoeficiente?
A jurisprudência temadmitidoumaponderaçãodomagistrado,nesteaspecto,
desdequefundamentada 421.
Valedestacarque,emcoerênciaànaturezaremuneratóriadoprêmioouvintena,
casovenhaafalecerotestamenteironocursodaexecuçãodotestamento,caberá
aos seus herdeiros a parte do prêmio, proporcional ao trabalho desempenhado,
conforme arbitrar o magistrado, observando-se, obviamente, os limites legais
aquimencionados.
Comootestamenteirotambémpodeserherdeirooulegatário,aleifacultaaele
apossibilidadede“preferiroprêmioàherançaouaolegado”(art.1.988doCC).
Daí se conclui que o prêmio ou vintena não se cumulam com a herança ou
legadooutorgados.
Sobreotema,observavaCAIOMÁRIODASILVAPEREIRA:
“Conformevistoacima,o testamenteiroquefor legatárioouherdeironãofaz jusàvintena.Masaquise
trata do herdeiro testamentário, nãodoherdeiro legítimo, que, recebendo seu quinhãoope legis, não se
confunde a sua vocação sucessória, que é independente da existência do testamento, com a função
testamentária, peculiar à sucessão em face de vontade do defunto. Nas mesmas condições acha-se o
herdeironecessário.E,porextensão,o raciocíniocompreendeaesposadoherdeiro, seocasamento for
emregimedecomunhãodebens,sejaparaexcluí-ladoprêmio,seforoseumaridoherdeiroinstituído,seja
paraselhereconhecerdireitoemcasocontrário.Mas,acimadetudo,prevalecendoavontadedotestador,
perceberá a vintena o herdeiro instituído, se o testador assim dispuser, com extensão ao seu cônjuge
sobreviventeemeeiro” 422.
Exemplificando:seCarmeloinstitui,portestamento,Frisbicomoseuherdeiro
ou legatário, nomeando-o também como testamenteiro, pode Frisbi optar pelo
valordoprêmioouvintenaemvezdaherançaoulegado.Isso,poroutrolado,não
ocorreriacomCarmeloJr.,filhodeCarmeloeherdeironecessário.
Parece-nos que a lógica da interpretação sistematizada do dispositivo, em
conjuntocomojátranscritoart.1.987doCC,éafixaçãodoprêmioouvintena
emvalor pecuniário, abrindo-se a exceção apenas para quando o testamenteiro
formeeiro.
Porfim,casovenhaaseranuladootestamento 423,nãoháfalaremprêmioou
vintena,umavezqueinexistiriacausaválidaarespaldartalpagamento 424.
5.6.Prazo
Háprazoparacumprimentodasdiligênciaspelotestamenteiro?
Háparâmetrolegal,aindaqueflexível,sobreestaquestão.
Éoquepreceituaoart.1.983:
“Art. 1.983.Não concedendo o testador prazomaior, cumprirá o testamenteiro o testamento e prestará
contasemcentoeoitentadias,contadosdaaceitaçãodatestamentaria.
Parágrafoúnico.Podeesseprazoserprorrogadosehouvermotivosuficiente”.
É possível a prorrogação do prazo, a critério do juiz, em havendo “motivo
suficiente”.
Nãonos agradaousodapalavra “motivo”no referido conceito aberto, pois
essa noção é carregada de subjetivismo, por remeter o intérprete a uma
circunstância interna, de natureza psicológica: todo motivo está encerrado na
mentedoagente.
Maisadequadoseriao legisladorutilizarumaexpressãoobjetiva,aexemplo
dejustificativa,justacausaou,ainda,fundamentosuficiente.
5.7.Responsabilidade
Qualéaresponsabilidadejurídicadotestamenteiro?
Aperguntaparecemuitosimples,masmerecealgumasreflexões.
Defato,estabeleceoart.1.980donossoCódigoCivil:
“Art.1.980.O testamenteiroéobrigadoacumprirasdisposições testamentárias,noprazomarcadopelo
testador, e adar contasdoque recebeuedespendeu, subsistindo sua responsabilidadeenquantodurar a
execuçãodotestamento.
Ou seja, há, por força dessa responsabilidade, uma obrigação legal do
testamenteirodeprestarcontas.
Esehouvermaisdeumtestamenteiro?
Aquestãoérespondidapeloart.1.986doCC/2002:
“Art.1.986.Havendosimultaneamentemaisdeumtestamenteiro,quetenhaaceitadoocargo,poderácada
qualexercê-lo, em faltadosoutros;mas todos ficamsolidariamenteobrigadosadarcontadosbensque
lhesforemconfiados,salvosecadaumtiver,pelotestamento,funçõesdistintas,eaelasselimitar”.
Trata-se de uma solidariedade passiva prevista em lei, que somente será
afastadasehouver,comovisto,especificaçãodeatribuiçõesdistintaseestanques
(perfeitamentedelimitadas)decadatestamenteiro.
5.8.Extinçãoregulardatestamentaria
Comosedeveextinguirregularmenteatestamentaria?
Ou, em outras palavras, como deve ser considerada cumprida a missão do
testamenteiro?
Arespostaéóbvia.
Com o regular cumprimento das disposições testamentárias e a consequente
prestaçãodecontasnojuízocorrespondente.
Parece-nos lógico que tal cumprimento somente pode ser certificado
judicialmente, depois de realizadas todas as diligências determinadas pelo
magistradoparaaformaçãodeseuconvencimento 425.
Todavia,podeocorrerumaextinçãoextraordináriadatestamentaria.
5.9.Destituiçãoourenúnciadotestamenteiro
Alémdotérminonatural,comoseudevidocumprimento,sãopossíveisoutras
formasdeextinçãodatestamentaria.
Aprimeiraépeladestituição(tambémchamadaderemoção)dotestamenteiro,
afastamentodecorrentedoinfielcumprimentodamissãodatestamentaria.
Eoquefazercomoprêmioouvintena?
Arespostatambémparecelógica:asuaperda.
Éoquedispõeoart.1.989doCódigoCivil:
“Art.1.989.Reverteráàherançaoprêmioqueo testamenteiroperder,por ser removidooupornão ter
cumpridootestamento”.
Parece-nos óbvio que, para haver a remoção do testamenteiro, deve-se
observarodevidoprocessolegal,comagarantiadocontraditório.
Sobreotema,observaSÍLVIOVENOSA:
“Sempre há que se conceder direito de defesa ao testamenteiro. Situações haverá, contudo, em que a
suspensãoimediatadocargosefaznecessária,dependendodagravidadedasituaçãoenfrentada.Podeo
juiz usar do poder geral de cautela conferido pelo CPC. Se infundada a remoção, sujeitar-se-ão os
interessadosquelhederamcausaaumaindenização.Semprequehágestãodeinteressesalheios,nãohá
necessidadedequealeiodiga,masamágestãoautorizaaremoção.Istoseapuraránocasoconcreto.O
pedidoderemoçãoprocessa-senojuízodoinventário,emapartado.Senãohálide,tratando-sededecisão
sumária, fica aberto às partes o recurso às vias ordinárias. A remoção pode ocorrer de ofício ou por
iniciativa do Ministério Público ou de qualquer interessado. Pode cessar também a testamentaria com
pedido de exoneração do próprio testamenteiro. Só que para a demissão do encargo, ao contrário da
aceitação, como vimos, deve haver uma justificativa; deve o testamenteiro alegar uma ‘causa legítima’
para a escusa (art. 1.141 do CPC), em virtude das implicações atinentes à gestão de interesses
alheios” 426.
Por fim, admite-se, como segunda forma de extinção da testamentaria, a
“demissão” por parte do testamenteiro, o que nos parece o exercício de um
direito potestativo, apenas condicionado à devida prestação de contas até a
efetivaliberação.
AouvidadosinteressadosedoMinistérioPúblicoédiligênciaindispensável,
emnossavisão,especialmenteparapermitiracorretaprestaçãodecontasatéo
momentodoefetivoafastamentodotestamenteiro.
E,atéquesejatomadaadecisãodojuizsobreopedidodeafastamento,coma
eventual substituição do testamenteiro originário, sua permanência no encargo
seráexigidajuridicamente.
6.REGÊNCIATEMPORALDALEIREGULADORADASUCESSÃOTESTAMENTÁRIA
Para arrematar o presente capítulo, parece-nos relevante tecer algumas
considerações acerca da lei reguladora da sucessão testamentária, matéria que
mereceumamelhorsistematizaçãoteórica.
Istoporque,conformeensinavaORLANDOGOMES:
“A sucessão testamentária rege-se diferentemente conforme o momento que se considere. Cumpre
distinguir,comefeito,omomentodafeituradotestamentododaaberturadasucessão;otestamentifactio
activadotestamentifactiopassiva” 427.
Aleivigentenadatadotestamentoregulaacapacidadedotestadoreaforma
extrínsecadotestamento.
De fato, conforme já vimos, a “incapacidade superveniente do testador não
invalida o testamento, nem o testamento do incapaz se valida com a
superveniênciadacapacidade”(art.1.861doCC).
Nomesmosentido,asupremaciaconstitucionaldoatojurídicoperfeitoexigeo
respeito à lei regentenomomentoda elaboraçãodo testamento, aplicando-seo
tradicionalprincípioromanotempusregitactum.
Tudo issoporqueo testamento,comonegócio jurídico, deve ser regidopela
normadomomentodasuaelaboração.
Poroutrolado,aefetivasucessãotestamentária(odireitoàherança),deveser
regida pela lei do momento da abertura da sucessão, com o falecimento do
testador.
Emoutraspalavras,noquedizrespeitoàleivigentenomomentodaabertura
da sucessão (na data damorte), esta regerá a vocação hereditária (o direito à
herança)eaeficáciajurídicadasdisposiçõestestamentárias.
Exemplifiquemos:SALOMÃOredigeumtestamento,respeitandoaleivigente
na época da sua elaboração, no sentido de comparecerem duas testemunhas ao
ato.Aindaqueleiposterioraumenteessenúmeroparatrês,otestamentoéválido
eeficaz(poisaleiqueregeotestamentoéadaépocadasuafeitura).Poroutro
lado, caso ele deixe parte da sua herança para um gato, circunstância
hipoteticamentepermitidanadatadaelaboraçãodo testamento,se,ao tempoda
morte,a leivigentenegaressedireito,adeixaperderáeficácia (poisa leique
regeodireitoàherançaéadotempodaaberturadasucessão).
Sobreotema,observouORLANDOGOMES:
“Preceito legal que viesse proibir a sucessão testamentária dos médicos do testador aplicar-se-ia
imediatamente, atingindo os contemplados em testamento anterior. Disposição que viesse a permitir o
legadoperrelationemvalidariaadeixadesseteorconstantedotestamentoanteriormentefeito.
Em se tratando, porém, de disposição testamentária que subordine o direito doherdeiro instituído a uma
condiçãosuspensiva,aplica-sealeivigenteaotempoemqueseverificaoevento,umavezqueacondição
suspendeaaquisiçãododireito,oqualsomentesetransmitecomoseuimplemento” 428.
Finalizando este tópico, vale registrar que o Livro Complementar das
DisposiçõesFinaiseTransitóriasdoCódigoCivilbrasileirode2002trouxeduas
regrasespecíficassobreasucessãotestamentária.
A primeira delas se encontra em evidente consonância com a visão aqui
proposta.
Trata-sedoart.2.041,quepreceitua,inverbis:
“Art.2.041.AsdisposiçõesdesteCódigo relativasàordemdavocaçãohereditária (arts.1.829a1.844)
não se aplicamà sucessão aberta antes de suavigência, prevalecendoodispostona lei anterior (Lei n.
3.071,de1.ºdejaneirode1916)”.
Comoparecelógico,seasucessãofoiabertaantesdavigênciadonovoCódigo
Civilbrasileiro,éaleirevogadaquedisciplinaráasuaaplicação.
Oart.2.042,porsuavez,dispõe:
“Art.2.042.Aplica-seodispostonocaputdoart.1.848,quandoabertaasucessãonoprazodeumano
apósaentradaemvigordesteCódigo,aindaqueotestamentotenhasidofeitonavigênciadoanterior,Lei
n.3.071,de1.ºdejaneirode1916;se,noprazo,otestadornãoaditarotestamentoparadeclararajusta
causadecláusulaapostaàlegítima,nãosubsistiráarestrição”.
A matéria se refere ao estabelecimento de cláusulas de inalienalibilidade,
impenhorabilidadeouincomunicabilidade.
No vigenteCódigoCivil brasileiro, tais cláusulas se tornaram excepcionais,
dependendodefundamentaçãoemjustacausa.
Assim,asuaaplicaçãoparasucessõesabertasnavigentecodificação,mesmo
quandoprevistasemtestamentoelaboradoanteriormente,somenteseráaceitável
sehouverumaditamentoparaadeclaraçãodajustacausae,ainda,respeitadoo
prazodeumanodaentradaemvigordoCódigoCivilbrasileirode2002.
Aberta a sucessão após um ano de tal marco temporal, a cláusula não será
consideradaválida,reconhecendo-seinsubsistente.
CapítuloXIV
FormasOrdináriasdeTestamento
Sumário: 1. Introdução. 2. Algumas palavras sobre formas proibidas de testamento. 3. Testamento
público. 3.1. Requisitos de validade. 3.2. Das peculiaridades do testamento público por características
pessoaisdotestador.3.3.Aspectosprocessuais.3.4.Consideraçõesacercadapublicidadedestaformade
testamento. 4. Testamento cerrado. 4.1. Requisitos de validade. 4.2. Sobre a confecção do testamento
cerrado. 4.3. Das peculiaridades do testamento cerrado por características pessoais do testador. 4.4.
Procedimento para abertura do testamento cerrado. 5. Testamento particular. 5.1. Noções gerais. 5.2.
Aspectosprocessuais.
1.INTRODUÇÃO
Comojáfoivistoanteriormente 429,aformaéessencialparaotestamento.
E é justamente sobre forma que versa o presente capítulo, bem como o
subsequente.
De fato, na diretriz estabelecida pelo art. 1.862 doCC, há trêsmodalidades
ordináriasdetestamento:opúblico,ocerradoeoparticular.
Trata-se de três espécies distintas de manifestação testamentária, que se
diferenciamjustamentepeloaspectodaforma.
A ela se agregam três outras formas do negócio jurídico testamentário, tidas
comoextraordinárias,excepcionaisouespeciais,poisadmitidaspelolegislador
para casos muito restritos, a saber, os testamentos militar, marítimo e
aeronáutico 430.
Foradessasmodalidadesordináriasouextraordinárias—oumesmosehouver
descumprimentodosritosparaelasprevistos—aconsequêncialógico-normativa
éadeclaraçãodenulidade,nãoalcançandoosefeitosplanejadospelotestador.
2.ALGUMASPALAVRASSOBREFORMASPROIBIDASDETESTAMENTO
Estabelece o art. 1.863 que é “proibido o testamento conjuntivo, seja
simultâneo,recíprocooucorrespectivo”.
Entende-se por testamento conjuntivo, de mão comum ou mancomunado
aqueleelaboradopormaisdeumsujeitonomesmodocumento.
Conforme observam os amigos FLÁVIO TARTUCE e JOSÉ FERNANDO
SIMÃO:
“O testamento conjuntivo ou de mão comum é aquele feito por mais de uma pessoa no mesmo
instrumento.Na realidade, aproibiçãodesse tipode testamentonão tem relação coma forma,mas sim
como fatodeo legisladorentenderqueo testamentoéatopersonalíssimoequenãopodeser feitopor
duas pessoas, sob pena de assumir caráter contratual repudiado pelo ordenamento e lhe retirar uma de
suasprincipaiscaracterísticas:apessoalidadeearevogabilidadeaqualquertempo” 431.
A ideia de tal restrição tem por finalidade garantir a idoneidade da
manifestação de vontade do testador, que deve praticar um ato pessoal e
individualizado,seminfluênciadiretadequemquerqueseja.
Sobreasmodalidadesdetestamentoconjuntivo,temos:
a) simultâneo, aquele em que os sujeitos testam, ao mesmo tempo, em
benefício de terceiro. Exemplo: Luiza e Beatriz fazem testamento único,
designandoFernandacomosuaúnicaherdeiradapartedisponível;
b) recíproco, quando os sujeitos instituem um ao outro como herdeiros, de
formaqueo testadorsobrevivente recebaaherançadooutro.Exemplo:Luizae
Beatrizfazemtestamentoúnico,emqueLuizadesignaBeatrizcomosuaherdeira
dapartedisponívelevice-versa;
c)correspectivo,quandoabenesseestabelecidaporumdossujeitosaooutro
temumacorrespondênciaequivalente.Exemplo:LuizaeBeatrizfazemtestamento
único, em que Luiza designa Beatriz como herdeira de um determinado bem
imóveleBeatrizdesignaLuizacomoherdeiradeoutrobemimóvel,havendouma
potencialtrocadebenefíciosentreastestadoras.
Claroquenadaimpedequeduaspessoas,emtestamentosseparados(aindaque
realizados na mesma data e local), façam disposições de seu patrimônio,
elegendoumaooutrocomodestinatáriodesuaherança.
O que é vedado pelo sistema legal brasileiro é apenas a realização de
instrumento único, que presumiria jure et de jure uma violação da livre
manifestaçãodevontade.
Por fim,valedestacarqueochamado testamentonuncupativoou inextremis
tambémnãoéválido,emregra,noordenamentojurídicobrasileiro.
Trata-sedamodalidadetestamentáriaemqueotestadornarraverbalmentesuas
declaraçõesdeúltimavontadepara testemunhas,oque,novigenteordenamento
jurídico,somenteéadmissívelparaosferidosdeguerra,naformadoart.1.896
doCC,oqueseráobjetodeanáliseespecíficanopróximocapítulo 432.
3.TESTAMENTOPÚBLICO
Entende-sepor testamentopúblicoaqueleelaboradopor tabelião (ouporseu
substitutolegal),devidamenteregistradoemcartório,naperspectivadoprincípio
dapublicidade.
Trata-se de um negócio jurídico solene, para o qual a lei expressamente
estabelecerequisitosformaisdevalidade,cujodescumprimentodeveimportarna
nulidadedacláusulacorrespondenteouatémesmodetodooato 433.
Enfrentemos,pois,osseusrequisitos.
3.1.Requisitosdevalidade
O testamento, como negócio jurídico que é, submete-se aos seus Planos de
Existência,ValidadeeEficácia 434.
Especificamente no campo da validade, para os negócios solenes (ad
solemnitatem),umdosrequisitosoupressupostoséaformaprescritaemlei.
Acodificaçãocivildetermina,por isso, todoumritoparaacelebraçãodesta
modalidadetestamentária,emumaverdadeira“liturgia”,quetemporfinalidade,
obviamente, a garantia e o respeito à vontade manifestada do testador 435,
relevanteaspectoque,nofinaldascontas,sequer,porprincípio 436,prestigiar.
Tradicionalmente, para a elaboração de um testamento público exigia-se que
fosse manuscrito, tomando o oficial (tabelião ou seu substituto ou equivalente
legal)portermoasdeclaraçõesdotestador.
Essasdeclaraçõesverbais,devidamenteconvertidasemtextoescrito,deveriam
ser lidas publicamente em voz alta pelo tabelião ou pelo próprio testador, na
presençaumdooutroetambém,naépoca,decincotestemunhas.
Tais testemunhas,ditas instrumentáriasou instrumentais, firmavamavalidade
doato,subscrevendoodocumento juntamentecomo testadoreo tabelião.Uma
assinaturaposteriornãopoderia serconsideradaválida,emrazãodopostulado
dasegurançajurídica.
Atualmente, a respeito do testamento público, dispõeo art. 1.864doCódigo
Civil:
“Art.1.864.Sãorequisitosessenciaisdotestamentopúblico:
I — ser escrito por tabelião ou por seu substituto legal em seu livro de notas, de acordo com as
declaraçõesdotestador,podendoesteservir-sedeminuta,notasouapontamentos;
II—lavradooinstrumento,serlidoemvozaltapelotabeliãoaotestadoreaduastestemunhas,aumsó
tempo;oupelotestador,seoquiser,napresençadestasedooficial;
III—seroinstrumento,emseguidaàleitura,assinadopelotestador,pelastestemunhasepelotabelião.
Parágrafoúnico.O testamentopúblicopodeserescritomanualmenteoumecanicamente,bemcomoser
feitopelainserçãodadeclaraçãodevontadeempartesimpressasdelivrodenotas,desdequerubricadas
todasaspáginaspelotestador,semaisdeuma”.
Dotextolegaltranscrito,vê-sequeaideiatradicionalcontinuabasicamentea
mesma,havendoumaflexibilizaçãonoquedizrespeitoàrazoávelpossibilidade
deotestadorlevarescritosparaestimularsuamemória,comominutas,notasou
apontamentos.
Nãosedispensa,porém,aleituraemvozalta,diantedastestemunhas(duasna
vigentecodificação,enquanto,nacodificaçãoanterior, eramcinco,na formado
mencionadoart.1.632, I,doCC/1916),do testadoredo tabelião,pois isso faz
parte da publicização do ato, com o registro de tal fato no livro próprio, bem
comoaassinaturadosenvolvidos,deformaagarantiradevidaciênciadetodas
assuascláusulas.
Questão interessante seria discutir se um testamento, firmado na vigência do
CC/1916, com apenas duas testemunhas, poderia ser considerado válido se a
morteocorresseapartirdavigênciadoCódigode2002.
Emlinhadeprincípio,concluiríamospelanulidadedoato,namedidaemque,
como visto no capítulo antecedente, os requisitos de validade do testamento
deveriamseraferidosnomomentodasuacelebração.
Todavia, levando-se em conta que toda aferição de invalidade deve ter em
perspectiva a existência de um potencial prejuízo, sob pena de a justa forma
ceder lugar ao formalismo leviano, outra linha de pensamento afigura-se mais
razoável.
Ora, se o próprio legislador cuidou de reduzir o número de testemunhas
exigidas — para a lavratura de um ato que, por natureza, já é praticado na
presençadotabelião—,justificativanãohaveriaparaserecusaravalidadedeste
testamento, pelo simples fato de ter sido subscrito pelo número de testemunhas
quealeimaisnovapassouaexigir.
Seopróprio legisladorconsiderouexcessivooquantitativoanterior,porque
desconsideraravontadedotestadorcombaseemumargumentoinsustentável?
E, ainda sobre a feitura do documento, é claro que a expressão “livro de
notas”,constantedotextolegal(art.1.864,I),nãodeveserinterpretadadeforma
tãoestrita,admitindo-sealavraturaemlivrodefolhassoltas.Claroque,mesmo
assim,é indispensávela rubrica,pelo testador,de todasaspáginas,demodoa
certificarasuaveracidade.
Comisso,nãodescartamosapossibilidadedeseutilizaremmeioseletrônicos
parao registroearquivamentodoato,oquenãopoderá,poróbvio, implicaro
afastamento das regras básicas de solenidade,mas, apenas, uma adaptação aos
novostempos,respeitadas,nesseparticular,asnormasadministrativasexpedidas
pelasCorregedoriasdosTribunais.
Vale destacar também que, embora não haja mais regra equivalente àquela
contida no parágrafo único do art. 1.632 doCC/1916, é forçoso convir que as
declarações do testador devem ser feitas em língua nacional. Caso algum dos
presentesnãosaibasemanifestarnalinguagempátria,seránecessárioumtradutor
juramentado(público)paraservirdeintérprete,umavezquenãosepodeexigir
que o tabelião ou seu substituto legal se expressem em língua estrangeira, bem
comotenhamastestemunhasdomíniosobreoreferidoidioma.
Mas, instigando-se a dialética, pergunta-se: e se todos dominarem o idioma
estrangeiro,aindaassimseránecessáriaatraduçãojuramentada?
Entendemos que amanifestção em língua nacional é imprescindível no caso
concreto,justamentepelacircunstânciadesetratardeumtestamentopúblico 437.
Observe-se, inclusive, a contrario sensu, que, no testamento cerrado, há
autorizaçãoexpressa,noart.1.871 438,parasuaredaçãoemidiomaestrangeiro,
conformeseverificaránotópicopróprio 439.
3.2.Daspeculiaridadesdotestamentopúblicoporcaracterísticaspessoaisdotestador
Há algumas situações em que podem ocorrer certas dificuldades para a
manifestaçãodavontadedotestador.
Éocaso,porexemplo,doindivíduoanalfabetoouque,poralgumalimitação
físicatemporária(ex:braçosengessados)oupermanente(ex.:braçosamputados),
nãotenhacondiçõesdefirmarotestamento.
Nessecaso,invoca-seoart.1.865doCC:
“Art. 1.865. Se o testador não souber, ou não puder assinar, o tabelião ou seu substituto legal assim o
declarará,assinando,nestecaso,pelotestador,e,aseurogo,umadastestemunhasinstrumentárias”.
Esealimitaçãofísicaforsurdezoucegueira?
Parataishipóteses,estabelecemosarts.1.866e1.867doCódigoCivil:
“Art. 1.866. O indivíduo inteiramente surdo, sabendo ler, lerá o seu testamento, e, se não o souber,
designaráquemoleiaemseulugar,presentesastestemunhas.
Art.1.867.Aocegosósepermiteo testamentopúblico,que lheserá lido,emvozalta,duasvezes,uma
pelo tabelião ou por seu substituto legal, e a outra por uma das testemunhas, designada pelo testador,
fazendo-sedetudocircunstanciadamençãonotestamento”.
Observe-sequenãoháqualquervedação—oqueseriadeconstitucionalidade
duvidosa— às pessoas com tais necessidades especiais para testar, apenas se
buscandomaiorsegurançanasuamanifestaçãodevontade 440.
3.3.Aspectosprocessuais
OCódigodeProcessoCivil de2015, emseus arts. 735a737 (equivalentes
aos arts. 1.125 a 1.129 do CPC-1973), estabelece regras processuais para
testamentosecodicilos 441.
Taisregrasgenéricasdevemseraplicadasaotestamentopúblico,porforçado
mencionadoart.736,quedispõe:
“Art.736.Qualquerinteressado,exibindootrasladoouacertidãodetestamentopúblico,poderárequerer
ao juiz que ordene o seu cumprimento, observando-se, no que couber, o disposto nos parágrafos do art.
735”.
Assim, noticiada judicialmente a existência do testamento, o magistrado
formalizará essa presença, determinará a conclusão dos autos e a oitiva do
Ministério Público, passando a determinar o seu registro, arquivamento e
cumprimento, se não detectar vício externo que o macule de nulidade ou
falsidade.
Nessalinha,dispõeoart.735doCódigodeProcessoCivilde2015:
“Art. 735. Recebendo testamento cerrado, o juiz, se não achar vício externo que o torne suspeito de
nulidadeoufalsidade,oabriráemandaráqueoescrivãooleiaempresençadoapresentante.
§1.ºDotermodeaberturaconstarãoonomedoapresentanteecomoeleobteveotestamento,adataeo
lugardofalecimentodotestador,comasrespectivasprovas,equalquercircunstânciadignadenota.
§ 2.ºDepois de ouvido oMinistérioPúblico, não havendodúvidas a seremesclarecidas, o juizmandará
registrar,arquivarecumprirotestamento.
§3.ºFeitooregistro,seráintimadootestamenteiroparaassinarotermodatestamentária.
§ 4.º Se não houver testamenteiro nomeado ou se ele estiver ausente ou não aceitar o encargo, o juiz
nomearátestamenteirodativo,observando-seapreferêncialegal.
§ 5.º O testamenteiro deverá cumprir as disposições testamentárias e prestar contas em juízo do que
recebeuedespendeu,observando-seodispostoemlei”.
3.4.Consideraçõesacercadapublicidadedestaformadetestamento
Naturalmente, como a própria nomenclatura sugere, o testamento público é
caracterizadopelaamplapublicidade.
A ideia é, evidentemente, dar maior visibilidade ao testamento (e, por
consequência,aoseuconteúdo),comoumaformadeotestadordeixarclaro,para
toda a sociedade (notadamente aos potenciais interessados em seu patrimônio),
qualéasuaintençãoequemfoibeneficiado,porsuarazãooucoração,comoo
destinatáriodesuaherança.
Todavia,dopontodevistadasegurançaindividual,seriaissoconveniente?
Defato,nãosepodeolvidar,nacontemporaneidade,osriscosquesepassam
com a publicização de dados pessoais. Divulgação de salários, pensões,
aplicações ou outros bens pode atrair o interesse de indivíduos mal-
intencionados.
Sobreotema,observamFLÁVIOTARTUCEeJOSÉFERNANDOSIMÃO:
“Pois bem, visando a regulamentar a questão da publicidade, emSãoPaulo, no ano de 2002, oColégio
NotarialcriouoRegistroCentraldeTestamentos.Trata-sedeumbancodedadoscomtodososcartórios
da capital que registra a existência demais de 200mil testamentos e sua eventual revogação desde a
décadade1970.
Para disciplinar o assunto, as Normas de Serviço da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de São
Paulo,pormeiodoProvimento25de2005(item26daSeçãoXIV),determinamqueosserventuáriosdos
CartóriosdeNotasedosCartóriosdeRegistroCivildasPessoasNaturaiseAnexosdeNotasdetodoo
EstadodeSãoPauloremetamaoColégioNotarialdoBrasil,SeçãodeSãoPaulo,atéo5.ºdiaútildecada
mês,relaçãoemordemalfabéticadosnomesconstantesdostestamentoslavradosemseuslivros,esuas
revogações,edosinstrumentosdeaprovaçãodetestamentoscerrados,ouinformaçãonegativadaprática
dequalquerdessesatos.Assim,requeridaaaberturadasucessão,poderãoosMM.JuízesdeDireitodo
Estado de São Paulo oficiar aoColégioNotarial doBrasil, Seção de São Paulo, solicitando informação
sobreaexistênciadetestamento.
O item 26 ainda determina que a informação sobre a existência ou não de testamento de pessoa
comprovadamentefalecidasomenteseráfornecidamedianterequisiçãojudicialouapedidodointeressado
deferido pelo juiz corregedor permanente da Comarca. O interessado deverá recolher a importância
equivalentea0,5UFESP(UnidadeFiscaldoEstadodeSãoPaulo)eapresentarrequisiçãodiretamenteao
ColégioNotarial doBrasil, SeçãodeSãoPaulo. Isso, inclusivepor vale postal ouordemdepagamento,
salvo em caso de assistência judiciária. Como se percebe, portanto, o acesso ao testamento público no
Estado de São Paulo já foi restringido pelas normas da Corregedoria do Tribunal de Justiça. Para a
consultaao texto integraldasnormas,veja-seositedaAssociaçãodosRegistradoresdoEstadodeSão
Paulo(<http://www.arpensp.org.br>.Acessoem:15jul.2006)” 442.
Delegelata 443,porém,nãoháleiquegenericamenterestrinjaoacesso,oque
selamenta,dadasassuasboasintenções.
E,paraevitaracontrovérsia,oquedevefazerotestadorserealmentenãotiver
qualquerinteressequeoutraspessoasconheçamoconteúdodassuasdisposições
testamentáriasantesdoadventodasuamorte?
Respondendoaessereclamo,conheçamosumasegundamodalidadeordinária
detestamento:otestamentocerrado.
4.TESTAMENTOCERRADO
A segunda forma ordinária de testamento prevista no vigente Código Civil
brasileiro é o Testamento Cerrado, também conhecido como “Testamento
Secreto”,“TestamentoMístico”ou“NuncupaçãoImplícita” 444.
Trata-sedeumapeculiarmodalidadetestamentária,escritapelopróprioautor
(ouporalguém,aseupedido)e,porele,assinada,comconteúdoabsolutamente
sigiloso.
Oseuregistrocartorárioapenascertificaasuaexistência,nãoalcançadooseu
conteúdosecreto.
Apalavra“cerrado”éutilizadaaqui justamentenosentidodequese tratade
umadisposiçãotestamentária“fechada”,ouseja,deconhecimentoextremamente
limitado, restrito apenas ao testador. Daí decorre, também, a referência “a
segredo ou misticismo” em algumas das denominações pelas quais essa
modalidadetestamentáriaéconhecida.
A vantagem de tal forma reside justamente na circunstância de que a
manifestaçãodevontadedo testadorpoderásermantidaemsigilo, inclusivedo
tabelião (ou seu substituto legal) e das testemunhas, que somente presenciarão,
comodito,aexistênciadotestamento.
Sobre as vantagens de tal forma testamentária, ensina CARLOS ROBERTO
GONÇALVES,lembrandotambémliçõesdosimortaisCARLOSMAXIMILIANO
ePONTESDEMIRANDA:
“A vantagem que tal modalidade testamentária apresenta consiste no fato de manter em segredo a
declaração de vontade do testador, pois em regra só este conhece o seu teor. Nem o oficial nem as
testemunhas tomam conhecimento das disposições, que, em geral, só vêm a ser conhecidas quando o
instrumentoéabertoapósofalecimentodotestador.
Se o testador permitir, o oficial público poderá lê-lo e verificar se está de acordo com as formalidades
exigidas.Mas isso é exceção.O testador temdireito a esse segredo, que não lhe pode ser negado por
aquele, a pretexto de que, para o aprovar, precisa lê-lo. Pode ser, como pondera PONTES DE
MIRANDA,‘queodisponentesópelosegredotenhaescolhidotalformatestamentária,queevitaódiose
discórdiasentreherdeiroslegítimosouparenteseestranhosesperançososdeherançaselegados’ 445.
Por isso, embora não seja tão frequente como o testamento público, é a forma preferida para ‘evitar o
espetáculo dos ódios e dissensões que deflagram no seio das famílias e amarguram os últimos dias do
disponente,quandosesabem,comantecedência,osnomesdospreteridosedosmelhoraquinhoados’ 446.
No testamentocerrado,dizPONTESDEMIRANDA,‘háoportunidadediscreta,paraadeserdação,ou
perdão a indigno, clausulação de inalienalibilidade ou de incomunicabilidade dos bens ab intestato ou
intestato, nomeação de tutor ou curador, reconhecimento de filhos, medidas sobre funerais, esmolas e
recomendaçõesmaisoumenosveladas’ 447e 448”.
É realmente a vantagemdessamodalidade testamentária, pouco difundida no
País.
4.1.Requisitosdevalidade
A Seção III (“Do Testamento Cerrado”) do Capítulo III (“Das Formas
OrdináriasdoTestamento”)estabelece,emseuart.1.868,algumasformalidades
paraavalidadedessaformatestamentária.
Senão,vejamos:
“Art. 1.868.O testamento escritopelo testador, ouporoutrapessoa, a seu rogo, epor aquele assinado,
seráválidoseaprovadopelotabeliãoouseusubstitutolegal,observadasasseguintesformalidades:
I—queotestadoroentregueaotabeliãoempresençadeduastestemunhas;
II—queotestadordeclarequeaqueleéoseutestamentoequerquesejaaprovado;
III—queotabeliãolavre,desdelogo,oautodeaprovação,napresençadeduastestemunhas,eoleia,em
seguida,aotestadoretestemunhas;
IV—queoautodeaprovaçãosejaassinadopelotabelião,pelastestemunhasepelotestador.
Parágrafoúnico.Otestamentocerradopodeserescritomecanicamente,desdequeseusubscritornumere
eautentique,comasuaassinatura,todasaspáginas”.
Comefeito,a intençãoédequeo testamentoseja feitopelopróprio testador
(embora se admita que seja feito por terceiro, a seu pedido), manuscrito,
aceitando-se a forma mecânica (datilografada ou digitada), desde que seja
numeradaeautenticadapeloprópriosubscritor.
Note-sequenãohámençãonotextolegalàleituradoconteúdodotestamento.
Ou seja, deve ele ser apresentado sem que o oficial de registro o leia
inteiramente,determinandoanormalegalapenasqueo tabeliãocomece“oauto
de aprovação imediatamente depois da última palavra do testador, declarando,
sob sua fé, que o testador lhe entregou para ser aprovado na presença das
testemunhas;passandoacerrarecoseroinstrumentoaprovado”.
Esenãohouvermaisespaçolivre?
Asoluçãoédadapeloparágrafoúnicodomesmodispositivo,aoexplicitarque
se“nãohouverespaçonaúltimafolhadotestamento,parainíciodaaprovação,o
tabeliãoaporáneleoseusinalpúblico,mencionandoacircunstâncianoauto”.
Observe-se,ainda,queastestemunhastambémpresenciamapenasaexistência
dotestamentoeoseuregistropelotabelião,enãooseuconteúdo.
Lavradooautodeaprovação,otestamentopoderáserefetivamentecerradoe
costurado.
Costurado?
Sim, a menção a coser, no transcrito texto legal, refere-se a literalmente
costurar.
Claro que, nos dias atuais, em nosso entender, outras formas de fechamento
podem ser utilizadas pelo tabelião, a exemplo do uso da cola e do selo, não
havendo razão para ficar adstrito à utilização de linha, agulha ou cera de vela
derretida.
Emoutras palavras, não vislumbramos nulidade se o testamento houver sido
efetivamente lacrado21, pois o mais importante é não ter ele sido violado,
respeitando-seavontadedotestador 22. 449
4.2.Sobreaconfecçãodotestamentocerrado 450
Inicialmente, lembremo-nos de importante regra jurídica, de conteúdo
inegavelmenteético,tambémaplicávelaotestamentocerrado:
“Art.1.801.Nãopodemsernomeadosherdeirosnemlegatários:
I — a pessoa que, a rogo, escreveu o testamento, nem o seu cônjuge ou companheiro, ou os seus
ascendenteseirmãos;
II—astestemunhasdotestamento;
III—oconcubinodotestadorcasado,salvoseeste,semculpasua,estiverseparadodefatodocônjugehá
maisdecincoanos;
IV—otabelião,civiloumilitar,ouocomandanteouescrivão,perantequemsefizer,assimcomooque
fizerouaprovarotestamento”.
Assim, qualquer um que esteja envolvido na confecção do testamento não
poderáserherdeirooulegatário.
Aindaquantoaotabelião,normaespecíficaconstantenoart.1.870,dispõeque,
se ele houver escrito o testamento a rogo do testador, poderá, não obstante,
aprová-lo.
Registre-se, finalmente,que,comonãoháciênciadoconteúdodo testamento,
pode ser ele, a teor do art. 1.871 do CC, “escrito em língua nacional ou
estrangeira,peloprópriotestador,ouporoutrem,aseurogo”,lembrandosempre
daimportânciadaassinaturadotestador 451.
Justamenteportalcircunstânciaéque,nadiretrizdodispositivoseguinte(art.
1.872),nãopoderádispordeseusbensemtestamentocerradoquemnãosaibaou
nãopossa ler,pois,assim,nãohaveriacomofirmarpessoalmenteo instrumento
testamentário.
Porfim,estabeleceoart.1.874doCC:
“Art.1.874.Depoisdeaprovadoecerrado,seráotestamentoentregueaotestador,eotabeliãolançará,no
seulivro,notadolugar,dia,mêseanoemqueotestamentofoiaprovadoeentregue”.
Perceba,amigoleitor,queocartórioapenasregistraotestamentocerrado,que
nãoficaráemsuaguarda,mas,sim,doprópriotestador,mantido,pois,oabsoluto
sigilodoseuconteúdo.
4.3.Daspeculiaridadesdotestamentocerradoporcaracterísticaspessoaisdotestador
Assim como ocorre no testamento público, a disciplina legal do testamento
cerradoestabelecealgumaspeculiaridadesemfunçãodecaracterísticaspessoais
dotestador.
Defato,alémdajámencionadarestriçãoimpostaaoanalfabeto 452,estabelece
oart.1.873:
“Art.1.873.Podefazertestamentocerradoosurdo-mudo,contantoqueoescrevatodo,eoassinedesua
mão,eque,aoentregá-loaooficialpúblico,anteasduastestemunhas,escreva,nafaceexternadopapel
oudoenvoltório,queaqueleéoseutestamento,cujaaprovaçãolhepede”.
Observe-se que a disciplina mais rígida, nesse aspecto, relaciona-se com a
própria proteção da pessoa com necessidade especial, buscando-se, de toda
forma,preservaraidoneidadedesuamanifestaçãovolitiva.
4.4.Procedimentoparaaberturadotestamentocerrado
Noquediz respeito aoprocedimentopara conhecimento, abertura, registro e
cumprimentodo testamentocerrado, amatériaé regida tantopeloCódigoCivil
brasileiroquantopelalegislaçãoprocessual(arts.735a737doCPC/2015).
Comefeito,falecidootestador,otestamentodeveserapresentadoaojuiz.
Naformadocaputdoart.735doCPC/2015,omagistrado,aoserprovocado
comaapresentaçãodeumtestamentocerrado,verificará,primeiramente,seeste
seencontraintacto.
Constatandoa inexistênciadeviolações(ouseja,a integridadedo testamento
cerrado), o juiz pessoalmente o abrirá e determinará que o escrivão o leia na
presençadequemoentregou, lavrando-se,emseguida,umautodeabertura,do
qualconstarãoonomedoapresentanteecomoeleobteveotestamento,adataeo
lugar do falecimento do testador, com as respectivas provas, e qualquer
circunstânciadignadenota.
Alógicadoreferidodetalhamento,previstono§1.ºdoart.735doCPC/2015,
éseromaiscircunstanciadopossível,paranãodeixarescaparnadaquepossaser
consideradorelevanteparaarealizaçãodavontademanifestadapelotestador.
Procedida à abertura, será feito o registro do testamento, rumo aos passos
iniciais para seu cumprimento, conforme estabelecem os demais parágrafos do
art.735doCPC/2015,inverbis:
“§2.ºDepoisdeouvidooMinistérioPúblico,nãohavendodúvidasaseremesclarecidas,o juizmandará
registrar,arquivarecumprirotestamento.
§3.ºFeitooregistro,seráintimadootestamenteiroparaassinarotermodatestamentária.
§ 4.º Se não houver testamenteiro nomeado ou se ele estiver ausente ou não aceitar o encargo, o juiz
nomearátestamenteirodativo,observando-seapreferêncialegal.
§ 5.º O testamenteiro deverá cumprir as disposições testamentárias e prestar contas em juízo do que
recebeuedespendeu,observando-seodispostoemlei”.
A ideia, comovisto, é buscar, de todas as formaspossíveis, a realizaçãoda
vontadedofalecido,oquejustificaainiciativajudicialnaespécie.
5.TESTAMENTOPARTICULAR
Por fim, como última forma ordinária de testamento, devemos conhecer o
testamentoparticular.
5.1.Noçõesgerais
O testamento particular é aquele escrito pelo próprio testador 453, sem a
participaçãodetabelião,ecomadispensadoseuregistro 454.
Portalcaracterística,étambémdenominadotestamentohológrafo.
Pode ele, na forma do art. 1.876, ser escrito de próprio punho oumediante
processo mecânico, como datilografia, digitação ou qualquer outro meio
equivalente.
Se for escrito de próprio punho, consideram-se requisitos essenciais à sua
validade:
a)serlidoeassinadoporquemoescreveu;
b) tal leitura e assinatura devem ser testemunhadas por pelo menos três
pessoas,quetambémdevemsubscreverotestamento.
Caso seja elaborado por processo mecânico, não pode conter rasuras ou
espaçosembranco,devendoserassinadopelo testador,depoisde tê-lo lidona
presença tambémde pelomenos três testemunhas, que subscreverão, damesma
forma,taldocumento 455.
Tais testemunhas instrumentárias (ou instrumentais) são indispensáveisparaa
validade do negócio jurídico 456, visto que deverá haver a sua confirmação em
juízo.
Vale destacar que, na codificação anterior, o número exigido de testemunhas
eracinco,na formadoart.1.645, II,doCC/1916, tendo seoperado,pois,uma
reduçãonavigentecodificação 457.
Sobre a elaboraçãodo testamentoparticularnoBrasil, é importantedestacar
que não se exige que ele seja escrito em português, podendo, como autorizado
peloart.1.880,serescritoemlínguaestrangeira,contantoqueas testemunhasa
compreendam.
5.2.Aspectosprocessuais
Talqualotestamentocerrado,adisciplinaacercadoconhecimento,registroe
cumprimento do testamento particular está dividida entre as regras do vigente
Código Civil brasileiro e as normas procedimentais do Código de Processo
Civil.
Falecido o testador, estabelece o art. 1.877 do Código Civil que deve ser
publicadoemjuízootestamento,comacitaçãodosherdeiroslegítimos.
Eaquemcaberequerertalpublicação?
Atribui-se legitimidade ao herdeiro, ao legatário ou ao testamenteiro para
requerer,emjuízo,talpublicaçãodotestamentoparticular,bemcomoaoterceiro
detentor do testamento, se impossibilitado de entregá-lo a algum dos outros
legitimadospararequerê-la,naformadoart.737doCódigodeProcessoCivilde
2015.
Esterequerimento,obviamente,deveviracompanhadodopróprioinstrumento
testamentário.
Deacordocomaregrainsculpidano§1.ºdoreferidoart.737doCódigode
ProcessoCivilde2015,“serãointimadososherdeirosquenãotiveremrequerido
apublicaçãodotestamento”.
Vale destacar que as pessoas que não forem encontradas na comarca serão
intimadasporedital.
Éforçosoconvirqueafinalidadedaoitivadastestemunhaséaconfirmaçãoda
vontade do testador e do conteúdo da cédula, o que se afigura especialmente
relevante, na perspectiva do princípio da segurança jurídica, se levarmos em
contaaausênciaderegistrodotestamento.
Nesse sentido, o caput do art. 1.878 é claro ao estabelecer que se “as
testemunhasforemcontestessobreofatodadisposição,ou,aomenos,sobreasua
leituraperanteelas,esereconheceremasprópriasassinaturas,assimcomoado
testador,otestamentoseráconfirmado”.
Eumaspectodignodenotaéquenãohánecessidadedetodasastestemunhas
confirmarem.
NoCódigoCivilanterior,emqueonúmerodetestemunhasexigidoera,como
visto,decinco,oart.1.648admitiaque, faltandoatéduas testemunhas,poderia
sereleconfirmadoconjuntamentepelastrêsremanescentes 458.
Talpanorama,poróbvio,efetivamentemudouapartirdaentradaemvigordo
CódigoCivilde2002,quepassouaexigirummínimodetrêstestemunhasparaa
validadedotestamentoparticular.
Ora,senãobastasseaalteraçãodonúmerolegalmenteprevistoparaavalidade
do testamento, o parágrafo único do art. 1.878 do Código Civil ressalva
expressamente que, se “faltarem testemunhas, pormorte ou ausência, e se pelo
menosumadelasoreconhecer,otestamentopoderáserconfirmado,se,acritério
dojuiz,houverprovasuficientedesuaveracidade”.
Ouseja,nãoénecessárioum“quórumdemaioriaabsoluta”parareconhecera
validadedotestamentoparticular.
Em verdade, todos os meios de prova podem servir para formar o
convencimento do magistrado, admitindo-se, inclusive, que, excepcionalmente,
possa este reconhecer a veracidade do testamento particular, ainda que sem
testemunhaspresentes,buscandoa realizaçãoefetivadavontademanifestadado
testador 459.
Éaprevisãodoart.1.879doCC,semcorrespondentenacodificaçãoanterior:
“Art. 1.879. Em circunstâncias excepcionais declaradas na cédula, o testamento particular de próprio
punhoeassinadopelotestador,semtestemunhas,poderáserconfirmado,acritériodojuiz”.
Seria, por exemplo, o caso de uma declaração de vontade do testador,
reconhecidadeformaincontroversacomodesualavra,emqueeledispõedeseus
bens, e afirma que, por motivos alheios à sua vontade, não pôde valer-se de
testemunhas, por estar em uma situação de risco, em um retiro espiritual
longínquo,ou,atémesmo,prestesacometersuicídio...
Logicamente,trata-sedeumasituaçãoexcepcionalíssima,quedevesertratada
comcuidadodeourivespelainsegurançaquepodeproporcionar.
CapítuloXV
FormasExtraordináriasdeTestamento
Sumário:1.Consideraçõesiniciais.2.Testamentomarítimoeaeronáutico.2.1.Críticaà“criatividade”da
nova forma codificada. 2.2. Procedimento de elaboração. 2.3. Caducidade. 3. Testamento militar. 3.1.
Procedimento de elaboração. 3.2. Caducidade. 3.3. Observações sobre o testamento nuncupativo. 4.
Discussãosobreapossibilidadejurídicadotestamentovitaloubiológico.
1.CONSIDERAÇÕESINICIAIS
Conforme afirmado e demonstrado em diversas passagens deste livro, o
testamentoéumnegócio jurídico solene, emqueapreocupaçãocoma formaé
levadaagrausextremos.
Assim, como visto no capítulo anterior, a legislação codificada estabeleceu
trêsmodalidadesordináriasdetestamento:opúblico,ocerradoeoparticular,
todasamplaeminuciosamentedisciplinadasnotextolegal.
Todavia, em função de excepcionais condições, em que não há tempo hábil
para realizar todas as formalidades indispensáveis para a validade de um
testamento ordinário, a própria legislação admite formas extraordinárias para
casosmuitorestritos,asaber,ostestamentosmilitar,marítimoeaeronáutico 460.
Registre-se,porém,quesetratadeumaenumeraçãonumerusclausus,ouseja,
na formado art. 1.887, “não se admitemoutros testamentos especiais alémdos
contempladosnesteCódigo”.
Passemos a enfrentar, agora, a disciplinanormativadas espécies codificadas
detestamentosextraordináriosouespeciais.
2.TESTAMENTOMARÍTIMOEAERONÁUTICO
Aprimeiramodalidadedetestamentoextraordinárioéo“testamentomarítimo”.
Trata-se da possibilidade de uma pessoa, viajando em navio nacional— e,
portanto,longedeautoridadesadministrativascomoumtabeliãopararedigirum
testamentopúblicoou receberum testamento cerrado—, testar, napresençade
duastestemunhas.
Agregou-seaele,porforçadanovacodificaçãocivil,afigurado“testamento
aeronáutico”, que se diferencia somente pelo locus onde é realizado (aeronave
emvezdenavio).
Sobre essa “inovação”, apresentaremos algumas considerações críticas no
próximosubtópico.
2.1.Críticaà“criatividade”danovaformacodificada
A previsão de um “testamento aeronáutico” talvez se afigure excessiva e
desnecessária.
Sea intençãodo legisladoreraabarcaroutras formasdemeiode transporte,
em que pessoas estivessem isoladas e impossibilitadas de testar de forma
ordinária,melhorseriadisciplinaramatériagenericamente.
Isso evitaria possíveis inconvenientes no futuro, no sentido de reclamarem a
existênciadeoutrasformasespeciaisdetestamentoparasubmarinosoufoguetes,
porexemplo.
Sem levar em conta ser pouco crível, em termos práticos, a utilidade dessa
modalidadeaeronáuticadetestamento.
CríticasemelhanteéfeitapeloamigoSÍLVIOVENOSA:
“Émuitodifícilqueseelaboretestamentoabordodeaeronave.Seaaeronaveestáemperigo,certamente
ocomandanteeatripulaçãonãoterãotempodepreocupar-secomumtestamento.Seovooénormal,não
haveráomenorinteressedesefazerumtestamentoabordo.Talvezolegisladorjáestivesseprevendoas
viagens interplanetárias, fadadasadurarmesese anos.Seocorrerpousodeemergênciaeodisponente
encontrar-se em local ermo, a situação estará, mais provavelmente, para o testamento descrito no art.
1.879,poisestarãocaracterizadasascircunstânciasexcepcionaisdescritasnalei” 461.
Claroqueapremênciaparasefazerotestamentonãodecorrenecessariamente
de uma emergência coletiva, mas, talvez, muito mais provavelmente, de uma
vontade individual, o que não torna usual ou frequente essa modalidade
testamentária,aptaajustificarumanormatizaçãoespecífica.
Comefeito,muitomelhorseriaagregarasduasmodalidadeseminstitutoúnico,
o qual, genericamente, regularia declarações de última vontade em situações
emergenciaisocorridasemveículosdetransportedequalquernatureza.
Istoporqueaideiabásicaqueregetalespécieéjustamenteaimpossibilidade
material de realizar as formalidades indispensáveis e haver uma autoridade
peranteaqualsepossaapresentaradisposiçãodeúltimavontade.
O mais importante, porém, é, como já aqui destacado, a existência de um
comandante,reconhecidocomoautoridadenomeiodetransporte,equepossadar
um cunho de solenidade, funcionando como oficial público nos atos praticados
(pormaissimplificadosquesejam).
Vencidastaisquestõesprévias,compreendamosasformaseoprocedimentode
elaboraçãodosnossosTestamentosMarítimoeAeronáutico.
2.2.Procedimentodeelaboração
Dispõeoart.1.888,sobreotestamentomarítimo:
“Art. 1.888. Quem estiver em viagem, a bordo de navio nacional, de guerra ou mercante, pode testar
perante o comandante, em presença de duas testemunhas, por forma que corresponda ao testamento
públicoouaocerrado.
Parágrafoúnico.Oregistrodotestamentoseráfeitonodiáriodebordo”.
A primeira observação a se fazer é que, embora configure como forma
extraordináriadetestamento,corresponderá,defato,aoformatodostestamentos
públicooucerrado,deacordocomointeresseeavontadedotestador.
Ou seja, mesmo sendo uma modalidade especial, ela é apenas uma
simplificaçãoprocedimentaldasduasmencionadasformasordinárias,emfunção
dascircunstânciaspeculiaresemqueéfeitaadisposiçãodeúltimavontade.
Saliente-se,apropósito,aexigênciadeduastestemunhasparaavalidadedessa
espécie de testamento, tal qual se exige também no testamento público— art.
1.864,II—enocerrado—art.1.868,I,dovigenteCódigoCivilbrasileiro.
Éóbvioquenãoháfalar,nessamodalidade,emtestamentoparticular,tendoem
vistaaspeculiaridadesinformaisdessaespécietestamentária.
Registre-se,ainda,que,notestamentomarítimo,exige-seexpressamentequeo
naviosejanacionalparasereconhecerasuavalidade.Issoporqueocomandante
equivalerá a uma autoridade brasileira para a celebração do negócio jurídico
unilateral,oquenãoseriapossívelemumaembarcaçãoestrangeira.
Entendemos, pelos mesmos motivos, que o raciocínio deveria ser aplicado
tambémaotestamentoaeronáutico,modalidadequeestudaremosaseguir.
Ainda sobre o navio, entendemos que ele pode ter qualquer natureza, ao
mencionar o dispositivo legal a expressão “de guerra oumercante”, devendoo
adjetivo“mercante”serinterpretadodeformaampla,paraabarcarqualquernavio
comercial,inclusiveaquelesdestinadosacruzeirosmarítimosdepasseio.
Quanto ao testamento aeronáutico, dispõe o Código Civil, em dispositivo
semelhanteaoqueregeamodalidademarítima:
“Art. 1.889. Quem estiver em viagem, a bordo de aeronave militar ou comercial, pode testar perante
pessoadesignadapelocomandante,observadoodispostonoartigoantecedente”.
Perceba-se que o supratranscrito dispositivo usa o adjetivo “comercial”, em
vezde“mercante”,oqueatendemuitomaisaosentidodanorma.
Elaboradoodocumento,otestamentomarítimoouaeronáutico,naformadoart.
1.890, ficará sob a guarda do comandante, que o entregará às autoridades
administrativasdoprimeiroportoouaeroportonacional,contrareciboaverbado
nodiáriodebordo.
2.3.Caducidade
As formas extraordinárias de testamento são decorrentes de uma autorização
legal para simplificação do procedimento de elaboração testamentária, em
decorrênciadecircunstânciaspeculiares.
Nas hipóteses dos testamentos marítimo e aeronáutico, a circunstância
diferencial,queforneceosuportefáticoparaasuautilização,éestar,otestador,
emviagem,sempossibilidadedecomparecimentopessoalao“mundoexterior”.
Seoavançotecnológicodosmeiosdecomunicaçãopermitemocontatoforado
ambientedaembarcação(navioouaeronave),ofatoéqueaindanãoépossível
“teletransportar” o indivíduo para praticar as solenidades necessárias para a
elaboraçãodeumtestamentopúblicoouumtestamentocerrado.
Daíjustifica-seautilizaçãodessasformasespeciais.
Assim, conforme preceitua o art. 1.892, não terá validade o testamento
marítimo,aindaquefeitonocursodeumaviagem,se,aotempoemquesefez,o
navioestavaemportoondeotestadorpudessedesembarcaretestarnaforma
ordinária.
Earazãoéóbvia.
Seotestador tinhaapossibilidadedefazersuadisposiçãodeúltimavontade
pelaformaordinária,nãosejustificariaaviaexcepcional.
Sóna impossibilidadedeacesso“à terra firme”, comcondiçõesde testarna
formaordinária,équeseaceitaaviaextraordinária.
Note-sequeaprevisãoélimitadaaotestamentomarítimo,jáque,nocasodo
testamentoaeronáutico,comoasviagensdeaviãosãomaiscurtas,édispensável
aprevisão,umavezqueelesóacabaporserfeitodeformaemergencial.
Nessa mesma linha, perderá eficácia o testamento marítimo, assim como o
aeronáutico, se o testador nãomorrer na viagem, nemnos noventa dias após o
desembarque,ondepudessetestarpelaformaordinária.
Ocorrerá,pois,acaducidadedotestamento.
Éaprevisãodoart.1.891doCódigoCivil:
“Art.1.891.Caducaráo testamentomarítimo,ouaeronáutico, seo testadornãomorrernaviagem,nem
nosnoventadiassubsequentesaoseudesembarqueemterra,ondepossafazer,naformaordinária,outro
testamento”.
Passemos,agora,pois,àúltimaespécieautônomadetestamentoextraordinário.
3.TESTAMENTOMILITAR
O testamentomilitar é aquele feitopormilitarouporoutrapessoaa serviço
dasForçasArmadasemcampanha,dentrodopaísouforadele,assimcomoem
praça sitiada, ou que esteja de comunicações interrompidas, na presença de
testemunhas.
Talconceitodecorrediretamentedocaputdoart.1.893doCódigoCivil:
“Art.1.893.O testamentodosmilitaresedemaispessoasaserviçodasForçasArmadasemcampanha,
dentrodoPaísouforadele,assimcomoempraçasitiada,ouqueestejadecomunicaçõesinterrompidas,
poderáfazer-se,nãohavendotabeliãoouseusubstitutolegal,anteduas,outrêstestemunhas,seotestador
nãopuder,ounãosouberassinar,casoemqueassinaráporeleumadelas”.
A justificativa para essa modalidade extraordinária também é evidente:
inserido o sujeito no esforço militar de guerra, com potencial risco de vir a
sucumbir,nãoérazoávelimaginarqueteriadecorreraumtabeliãoparafazerum
testamento.
A situação excepcional autoriza o modelo simplificado, que possui, porém,
tambémumiterprocedimentalpróprioparasuaelaboração.
3.1.Procedimentodeelaboração
Assim como as especiais modalidades já vistas (testamentos marítimo e
aeronáutico), certas regras peculiares lhes são aplicadas, considerando-se a
ausênciadoritocomumdelavraturaouregistrodoatoperanteumtabelião.
Odiferencialbásicoéqueaautoridadeadministrativanão será,obviamente,
um oficial de registro, mas sim, como nas modalidades anteriores, um
comandante,oficial,chefeouautoridadeadministrativacorrespondente.
Aliás,pelaprópriahierarquiamilitar,poderávariarapatente,grauoupostodo
oficialouautoridadequeacompanharáafeituradoato.
De fato, se o testador pertencer a corpo ou seção de corpo destacado, o
testamento será escritopelo respectivo comandante, aindaquedegraduaçãoou
postoinferior,conformepreceituao§1.ºdoart.1.893.
Por outro lado, na formadeterminadapelo § 2.º domesmodispositivo, se o
testador estiver em tratamento em hospital, o testamento será escrito pelo
respectivooficialdesaúde,oupelodiretordoestabelecimento.
A lógica, portanto, é a observância da disciplina militar, reconhecendo-se
competência, sempre que possível, ao oficial em comando na unidade
correspondente.
Eseotestadorforjustamenteomilitarmaisgraduado?
Nessasituação,observando-seahierarquia,estabeleceo§3.ºqueotestamento
seráescritoporaquelequesubstituirooficialdemaiorpatente.
Perceba-sequeanormaautorizaqueotestamentosejaescritopor terceiro,o
que é plenamente razoável na situação em tela, principalmente levando-se em
consideraçãoapossibilidadedeotestadorestarferidoemcombate.
Epode-seabrirmãodaassinatura?
Alógicaéqueaassinaturadotestadorcertifiqueaautenticidadedodocumento,
mas,obviamente,dadasascircunstâncias,poderáhaverumaassinaturaarogo,ou
seja,porterceiro,nahipótesedeotestadornãotercondiçõesdeassinar(ounão
souberfazê-lo).
Nessecaso,onúmerode testemunhasque,ordinariamente,édeduaspassaa
serdetrês,casoemqueodocumentoseráassinadoporumadelas.
Tudoemproldasegurançajurídica.
Todavia, podendoo testador escrever, poderá apresentar o testamento aberto
oucerrado,ateordoart.1.894doCódigoCivil:
“Art.1.894.Seotestadorsouberescrever,poderáfazerotestamentodeseupunho,contantoqueodatee
assineporextenso,eoapresenteabertooucerrado,napresençadeduas testemunhasaoauditor,ouao
oficialdepatente,quelhefaçaasvezesnestemister.
Parágrafoúnico.Oauditor,ouooficialaquemotestamentoseapresentenotará,emqualquerpartedele,
lugar, dia, mês e ano, em que lhe for apresentado, nota esta que será assinada por ele e pelas
testemunhas”.
A possibilidade de entregá-lo cerrado é um meio de garantir o sigilo do
conteúdodasuadisposiçãodeúltimavontade.
3.2.Caducidade
Assim como ocorre nos testamentos marítimo e aeronáutico, o testamento
militartambémpodecaducar.
Vejamosoquedispõeoart.1.895doCC/2002:
“Art.1.895.Caducaotestamentomilitar,desdeque,depoisdele,otestadoresteja,noventadiasseguidos,
em lugar onde possa testar na forma ordinária, salvo se esse testamento apresentar as solenidades
prescritasnoparágrafoúnicodoartigoantecedente”.
Ouseja,decorrendooprazodenoventasdiasseguidosemqueotestadoresteja
em lugar onde possa testar na forma ordinária, faz-se presumir a cessação dos
efeitosdotestamento.
O referido dispositivo, todavia, ressalva a circunstância de ter havido o
registro efetivodo testamentoperante o auditor ouoficial, coma assinatura do
testadoredastestemunhas.
Nessecaso,asuarevogaçãosomentesedarádeformaexpressa,inexistindoa
possibilidadedecaducidade.
Poróbvio,seocorreraaberturadasucessão(comofalecimentodotestador)
duranteacampanhaouaténoventadiasdasuabaixa,haveráaproduçãototalde
efeitosdotestamentomilitar.
3.3.Observaçõessobreotestamentonuncupativo
Os termos “nuncupação” (substantivo) e “nuncupativo” (adjetivo) têm, como
significado,umadesignaçãooral 462.
Na vigente codificação civil brasileira, a nomenclatura não é expressamente
utilizada,pelomenosnoquedizrespeitoàSucessãoHereditária,diferentemente
doquesedánoDireitodeFamília 463.
AdoutrinaespecializadaemDireitodasSucessões, todavia,usaa expressão
paracaracterizarotestamentomilitarfeitopelaformaoral.
Trata-se de uma especial modalidade testamentária em que o testador narra
verbalmente suas declarações de última vontade para testemunhas, o que, no
vigenteordenamentojurídico,somenteéadmissívelparaaspessoasempenhadas
emcombateouferidasdeguerra,naformadoart.1.896:
“Art. 1.896.As pessoas designadas no art. 1.893, estando empenhadas em combate, ou feridas, podem
testaroralmente,confiandoasuaúltimavontadeaduastestemunhas.
Parágrafo único. Não terá efeito o testamento se o testador não morrer na guerra ou convalescer do
ferimento”.
Trata-se,portanto,dochamadotestamentonuncupativoouinextremis.
Observe-se que tal forma também caducará, caso não ocorra a abertura da
sucessão(leia-seofalecimentodotestador).
A menção a “convalescer do ferimento”, se interpretada literalmente, é
desnecessária,senãoilógica,pois,mesmoferido,masestandovivo,nãoháfalar
emsucessão.
A única forma de interpretar a referência, nesse aspecto, é imaginar que o
testador teria sobrevivido à guerra, mas permanecido sem condições de se
comunicar durante algum tempo até o advento de sua morte. Isso porque,
realizadootestamentooralesobrevivendootestador,complenacapacidadepara
testar a posteriori, perderá ele os seus efeitos, ainda que venha a falecer
posteriormente.
4.DISCUSSÃOSOBREAPOSSIBILIDADEJURÍDICADO
TESTAMENTOVITALOUBIOLÓGICO
Encerramos este capítulo apresentando algumas rápidas noções acerca do
chamadotestamentovitaloubiológico,tambémconhecidocomodeclaraçãode
vontadeantecipada,ou,emlínguainglesa,“livingwill”,comoéconhecidonos
EstadosUnidos.
Trata-se de um ato jurídico pormeio do qual o pacientemanifesta, prévia e
expressamente, o desejo de querer ou não receber determinado tratamento ou
cuidado médico, no momento em que estiver incapacitado de expressar
livrementeasuavontade.
Não se afigura, em verdade, inteiramente apropriada a expressão testamento
“vital”, na medida em que esta manifestação — que também é calcada na
autonomiaprivada—cuidaderegularaspectosexistenciaisdavidaterminalde
umpaciente,ouseja,diantedaiminentemãoinexoráveldamorte.
Dequalquermaneira, independentementeda terminologiaadotada, trata-sede
uminstitutodegrandeimportânciajurídicaesensibilidadesocial,amparadopelo
princípio maior da dignidade da pessoa humana, e que, recentemente, fora
disciplinado administrativamente por Resolução do Conselho Federal de
Medicina 464:
“RESOLUÇÃOCFMn.1.995/2012
(PublicadanoDOUde31deagostode2012,SeçãoI,p.269-270)
Dispõesobreasdiretivasantecipadasdevontadedospacientes.
OCONSELHOFEDERALDEMEDICINA,nousodasatribuiçõesconferidaspelaLein.3.268,de30
desetembrode1957,regulamentadapeloDecreton.44.045,de19dejulhode1958,epelaLein.11.000,
de15dedezembrode2004,e
CONSIDERANDO a necessidade, bem como a inexistência de regulamentação sobre diretivas
antecipadasdevontadedopacientenocontextodaéticamédicabrasileira;
CONSIDERANDOanecessidadededisciplinaracondutadomédicoemfacedasmesmas;
CONSIDERANDO a atual relevância da questão da autonomia do paciente no contexto da relação
médico-paciente,bemcomosuainterfacecomasdiretivasantecipadasdevontade;
CONSIDERANDO que, na prática profissional, os médicos podem defrontar-se com esta situação de
ordeméticaaindanãoprevistanosatuaisdispositivoséticosnacionais;
CONSIDERANDOqueosnovosrecursostecnológicospermitemaadoçãodemedidasdesproporcionais
queprolongamosofrimentodopacienteemestado terminal, semtrazerbenefícios,equeessasmedidas
podemtersidoantecipadamenterejeitadaspelomesmo;
CONSIDERANDOodecididoemreuniãoplenáriade9deagostode2012,RESOLVE:
Art. 1.º Definir diretivas antecipadas de vontade como o conjunto de desejos, prévia e expressamente
manifestadospelopaciente,sobrecuidadosetratamentosquequer,ounão,recebernomomentoemque
estiverincapacitadodeexpressar,livreeautonomamente,suavontade.
Art. 2.º Nas decisões sobre cuidados e tratamentos de pacientes que se encontram incapazes de
comunicar-se, ou de expressar de maneira livre e independente suas vontades, o médico levará em
consideraçãosuasdiretivasantecipadasdevontade.
§1.ºCasoopacientetenhadesignadoumrepresentanteparatalfim,suasinformaçõesserãolevadasem
consideraçãopelomédico.
§ 2.º O médico deixará de levar em consideração as diretivas antecipadas de vontade do paciente ou
representanteque,emsuaanálise,estiverememdesacordocomospreceitosditadospeloCódigodeÉtica
Médica.
§3.ºAsdiretivasantecipadasdopacienteprevalecerãosobrequalqueroutroparecernãomédico,inclusive
sobreosdesejosdosfamiliares.
§4.ºOmédicoregistrará,noprontuário,asdiretivasantecipadasdevontadequelhesforamdiretamente
comunicadaspelopaciente.
§5.ºNãosendoconhecidasasdiretivasantecipadasdevontadedopaciente,nemhavendorepresentante
designado, familiares disponíveis ou falta de consenso entre estes, o médico recorrerá ao Comitê de
Bioética da instituição, caso exista, ou, na falta deste, à Comissão de Ética Médica do hospital ou ao
Conselho Regional e Federal deMedicina para fundamentar sua decisão sobre conflitos éticos, quando
entenderestamedidanecessáriaeconveniente.
Art.3.ºEstaresoluçãoentraemvigornadatadesuapublicação”.
Note-se que a previsibilidade do testamento vital nada tem que ver com a
eutanásia, namedida emqueomédiconão atua ativamentepara interromper a
vida,massimcomaortotanásia,porquantoomédico, justificadamente,apenas
suspenderáounãoutilizaráumrecursooumecanismoqueparaliseouretardeo
processonaturaldamorte.
Em verdade, é somente uma forma de permitir que a pessoa possa declarar
antecipadamentequerecusaterapiasmédicasqueprolongariamdolorosamentea
suaexistência,emdetrimentodasuaqualidadedevida.
Porisso,nãoháqualquerilicitudeemtalprática.
Este também é o posicionamento de DIMAS MESSIAS DE CARVALHO e
DIMASDANIELDECARVALHO:
“Assim, não constitui qualquer ilícito acolher a vontade do paciente expressa no testamento vital, pois a
pessoahumanatemodireitodeliberdadeemnãoquerersesubmeteratratamentosdesnecessáriospara
prolongaraagoniaeosofrimentodavidameramentevegetativa.Alémdosofrimentocausadoàprópria
pessoa, violando a dignidade, também sofrem os familiares. Portanto, perfeitamente possível e legal a
disposição de vontade expressada em testamento vital, por pessoa capaz e consciente, quanto aos
procedimentos médicos que aceita ou rejeita em caso de enfermidade terminal, quando já estiver
impossibilitada demanifestar sua vontade.O testamento pode ser efetuado na forma pública, perante o
tabelião de notas, mediante escritura declaratória, ou escrito particular autêntico, já que, como não é
previstolegalmente,nãoseexigemosmesmosrequisitosdostestamentoscomuns” 465.
Sobre a sua natureza jurídica, prelecionam os talentosos amigos FLÁVIO
TARTUCEeJOSÉFERNANDOSIMÃO:
“Emsuma,trata-se,emregra,deumatojurídicostrictosensuunilateral,quepode,sim,produzirefeitos,
uma vez que o seu conteúdo é perfeitamente lícito. Eventualmente, apenas nos casos em que houver
disposiçõesnãopatrimoniais,comoaquelasrelativasàdoaçãopostmortemdepartesdocorpo(nostermos
do art. 14 doCódigoCivil), ao destino do corpo, ao sufrágio da alma, ao enterro, entre outros, é que o
institutoseriaassemelhadoaumtestamento,naverdade,maispróximodeumcodicilo,nostermosdoart.
1.881doatualCódigoCivilbrasileiro.
Concluindo,oque sepercebe éque a expressão testamentovital oubiológico não é correta quanto à
categorização jurídica, pois o que se propõe não é um testamento em si. Por isso, propomos que a sua
denominação,naprática,sejaalteradaparadeclaraçãovitaloubiológica” 466.
Nãopensamosexatamenteassim.
Quando o indivíduo expressa antecipadamente a sua vontade por meio do
testamento vital, optando por recusar ou aceitar determinada intervenção ou
tratamento— escolhendo, pois, determinado efeito ou resultado pretendido—,
manifesta,emverdade,emsuaformamaispura,asuaautonomiaprivada.
Ora, e se assim o é, mal algum há em se considerar, nessa perspectiva, o
testamentovital,um“atonegocial” 467.
Autonomia privada, em nossa linha de pensamento, pode, indiscutivelmente,
justificar o caráter negocial de um ato, ainda que diga respeito a aspectos
extrapatrimoniaisouexistenciaisdavidahumana.
Emoutraspalavras,nãoapenasquandocelebramosumcontratodecomprae
venda de um carro, mas, especialmente, quando optamos pela reprodução
assistida ou realizamos um testamento vital, estamos, sem dúvida, realizando
declaraçõesnegociaiscalcadasnoprincípiosolardaautonomiaprivada.
Isso porque tal postulado jamais poderia, dada a sua grandeza, encastelar-se
emrelaçõeseminentementeeconômicasoupatrimoniais,sobpenadecolocarmos
os mais sensíveis e virtuosos valores da alma abaixo de anseios e bens
meramentemateriais.
CapítuloXVI
Codicilo
Sumário:1.Esclarecimentotopológico.2.Conceitoedenominação.3.Finalidadeeobjetodoinstituto.4.
Forma.5.Relaçãodocodicilocomotestamento.6.Revogação.
1.ESCLARECIMENTOTOPOLÓGICO
Apóscompreender cadaumadasmodalidadesde testamento, épreciso tecer
algumasbrevesconsideraçõesacercadafigurajurídicadocodicilo.
Embora seja um instituto jurídico formalmente localizado noCapítulo IV do
Título III (“Da Sucessão Testamentária”) do Livro V (“Do Direito das
Sucessões”),justamenteentreoscapítulosdestinadosàcompreensãodasformas
ordinárias (“Capítulo III”) e especiais (“Capítulo V”), a busca por uma
sistematização teóricacoerente—queéumadasnossasmaiorespreocupações
nesta obra — fez com que optássemos pela sua análise somente após o
exaurimentodoestudodasmodalidadestestamentárias.
Issoporqueocodicilonãoénecessariamenteumconsectáriológicodasformas
ordinárias de testamento, nem, muito menos, um prelúdio das modalidades
especiais.
Feitoo “esclarecimento topológico” sobre aorganizaçãoquepropusemos ao
tema,passemosaconheceradisciplinajurídicadocodicilo,começandocomseu
conceitoedenominação.
2.CONCEITOEDENOMINAÇÃO
Conceitualmente, o codicilo é um negócio jurídico unilateral de última
vontade,peloqualoautordaherançapodedisporsobreoseuenterroevalores
depequenamonta.
O termo “codicilo” é derivado do latim codicillus, sinônimo de codiculus,
diminutivo de codex. Significava originariamente tabuinhas para escrever,
passandoadesignarescritoou“pró-memória” 468.
Trata-se,portanto,deumtextoescrito,datadoeassinadoporalguém 469.
Mas qual é a particularidade dessa declaração de vontade, que mereceu
tratamentopróprioporpartedolegislador?
É que, por meio dele, seu autor poderá expressar certas manifestações de
vontade,arespeitodeprovidênciasmenoresquequerveratendidas,apósasua
partidadoplanoterreno.
Todavia, o codicilo não se presta para qualquer finalidade de disposição
patrimonialpóstuma,conformeveremosemseguida.
3.FINALIDADEEOBJETODOINSTITUTO
Comodito,nãoéqualquerdisposiçãodeúltimavontadequepodeserobjetode
umcodicilo.
Comefeito,afinalidadedocodiciloébemrestrita.
Naformadoart.1.881doCódigoCivil:
“Art.1.881.Todapessoacapazdetestarpoderá,medianteescritoparticularseu,datadoeassinado,fazer
disposiçõesespeciaissobreoseuenterro,sobreesmolasdepoucamontaacertasedeterminadaspessoas,
ou, indeterminadamente, aos pobres de certo lugar, assim como legarmóveis, roupas ou joias, de pouco
valor,deseuusopessoal”.
Como se vê do texto legal, a finalidade do codicilo é uma disposição
patrimonialpostmortemdemenormonta, seja referenteaoprópriopassamento
de seu autor (como, por exemplo, se pretende ser sepultado ou cremado, bem
como se pretende seguir algum ritual religioso específico), seja para dispor de
bens(dinheiro,móveis,roupasoujoias)depoucovalor.
Assim,tem-sequeoobjetodocodicilosignificanormalmenteumadespesade
menorpotencialeconômico 470.
Masoquepodeserconsideradoumadespesademenorpotencialeconômico?
Oconceito é subjetivo 471 e deve ser interpretadode acordo comouniverso
patrimonialdoautordocodicilo(chamadocodicilante),umavezquedeterminado
bem, considerado de pequeno valor financeiro, pode ser efetivamente parte
significativadoespólio 472.
Sobre sufrágios por intenção da alma do falecido, vale destacar que o art.
1.998 estabelece que as “despesas funerárias, haja ou não herdeiros legítimos,
sairão do monte da herança; mas as de sufrágios por alma do falecido só
obrigarãoaherançaquandoordenadasemtestamentooucodicilo” 473.
Uma disposição demaior repercussão, que é a nomeação ou substituição de
testamenteiro, por sua vez, pode ser feita através de codicilo, na forma do art.
1.883doCódigoCivil 474.
Da mesma forma, consideramos perfeitamente razoável a utilização de um
codiciloparaofimdesemanifestarperdãoaoindigno,tendoemvistaamençãoà
expressão“ouemoutroatoautêntico”nocaputdoart.1.818.
Tema interessanteé saber se,pormeiodeumcodicilo,poder-se-iaoperaro
reconhecimento de filiação, por traduzir um “escrito particular”, a teor do art.
1.609,II,dovigenteCódigoCivil 475.
Não havendo dúvida quanto à autenticidade da declaração, o codicilo, em
nosso sentir, poderá, indiscutivelmente, servir como meio idôneo ao
reconhecimento voluntário de filho 476, à luz do princípio da veracidade da
filiação,casoemque,nesteponto,deveserconsideradoirrevogável.
4.FORMA
Diferentementedotestamento,ocodicilotemformasimplificada,bastandoque
o seu autor—o qual, obviamente, deve ter capacidade de testar— redija um
escrito particular, datando-o e assinando-o, sem necessidade expressa de
testemunhasoudequalqueroutraformalidade.
Se a forma é aparentemente livre, não se pode deixar de salientar a
imprescindibilidade do registro da data e assinatura, como elemento essencial
paraoreconhecimentodavalidadedamanifestaçãodevontade 477.
E,comoobservaMARIAHELENADINIZ:
“Devido à sua pouca projeção, não se subordina aos requisitos testamentários formais. Apesar de não
estarsujeitoarequisitodeforma,ocodicilodeverá,seestiverfechado,serabertodomesmomodoqueo
testamento cerrado (CC, art. 1.885), exigindo-se necessariamente a intervenção do juiz competente, ou
seja,ojuizdaprovedoria,comaobservânciadoCódigodeProcessoCivil,art.1.125” 478.
Umaperguntaimportanteésaberseocodiciloprecisaserredigidodepróprio
punho.
Acompreensãohistóricadoinstitutoapontanosentidodequeocodicilotenha
realmentedeserhológrafo,ouseja,escritopelopróprioautor.
Emverdade,emborajustificáveldopontodevistahistórico,acreditamosque
seja perfeitamente possível flexibilizar essa interpretação, partindo-se do
pressupostodequeoprincípiodaboa-fé, tambémdisciplinadordoDireitodas
Sucessões, justificaria o ato lavrado pormeiosmecânicos ou eletrônicos,mais
condizentescomoestágiotecnológicodosnossosdias.
Assim,aexigência—inexistentenovigente texto legal—dequeocodicilo
tenhadesermanuscrito,emborapresentedeformamuitocomumnopassado, já
tendeasersuperada.
Sobre o tema, e na mesma vereda, observam FLÁVIO TARTUCE e JOSÉ
FERNANDOSIMÃO:
“Aúnicaressalvaaser feitaéque,assimcomoocorrecomtestamentoparticular,seocodicilofor feito
mecanicamente,todasaspáginasdeverãoestarassinadaspeloautordocodicilo.Nessesentido,oProjeto
276/2007,antigoPL6.960/2002,corrigeoequívocodoatualCódigoCivileacrescentaumparágrafoúnico
nos seguintes termos:O escrito particular pode ser redigido ou digitadomecanicamente, desde que seu
autornumereeautentique,comasuaassinatura,todasaspáginas” 479.
Aindaa respeitodaforma,parece-nos interessantediscutirseamanifestação
codicilardeveserfeitademaneiraexclusiva.
A questão é compreender se, por exemplo, em uma carta sobre a vida ou
mesmoemumpoema,poderiaodeclaranteestabelecerumcodicilo,mesmonão
sendotaldocumentofeitoúnicaeexclusivamenteparatalfinalidade.
Entendemos que a resposta é positiva, desde que seja possível aferir a
seriedade e a autenticidade da manifestação realizada, de forma a atender ao
objetivodocodicilo.
Finalmente,éprecisodestacararegradoart.1.885,dequese“estiverfechado
ocodicilo,abrir-se-ádomesmomodoqueotestamentocerrado”.
Assim, deve o juiz verificar se o codicilo está intacto, abrindo-o e
determinando que o escrivão o leia na presença de quem o entregou, com a
posterior lavratura de auto de abertura, na forma do § 1.º do art. 735 do atual
CódigodeProcessoCivil.
Valeregistrar,porém,queo§3.ºdoart.737doCPC/2015mandaaplicarao
codicilo,bemcomoaostestamentosmarítimo,aeronáutico,militarenuncupativo,
as regrasdo testamentoparticular,oquesoaumtanto inadequado,umavezque
não há necessariamente testemunhas no codicilo, não sendo a sua presença, a
priori,umrequisitoindispensávelparasuavalidade.
Também criticando dispositivo análogo da legislação anterior, observava
ORLANDOGOMES:
“Faz-seporescritoparticular,datadoeassinado,semestarsujeito,pelainsignificânciadoseuconteúdo,às
solenidadesdo testamento,mas, se estiver fechado, abre-sedomesmomodoqueo testamentocerrado.
Ignorandoessemandamento,prescreveuoCódigodeProcessoCivilquesuaexecuçãodeveobedeceràs
regrasprescritasparaaconfirmaçãodotestamentoparticular.Necessáriopassouaser,emconsequência,
o requerimento para publicação em juízo do codicilo e a inquisição de testemunhas se houver, para a
confirmação. Esse tratamento dado ao codicilo é inspirado no equívoco de supor que ainda é aquele
pequeno testamento quando até o Código Civil, há mais de sessenta anos, já abandonara tal
figuração” 480.
Realmente,éumacontradiçãoevidente.
5.RELAÇÃODOCODICILOCOMOTESTAMENTO
Ocodiciloconvive,semnenhumaincompatibilidade,comotestamento.
Nessesentido,observe-seoart.1.882doCódigoCivil:
“Art.1.882.Osatosaqueserefereoartigoantecedente,salvodireitodeterceiro,valerãocomocodicilos,
deixeounãotestamentooautor”.
E isso vale para qualquer modalidade de testamento, seja ordinária ou
especial.
Registre-se, inclusive, que uma declaração de última vontade, supostamente
feita como codicilo, caso atenda às solenidades testamentárias pertinentes,
poderávalercomoumtestamento,sendoassimconsiderado.
Maspoderiaumcodicilorevogarumtestamento?
Arespostaénegativa,emvirtude,especialmente,damaiorformalidadedeque
serevesteotestamento.
6.REVOGAÇÃO
O codicilo, como, em regra, qualquer manifestação de vontade, pode ser
revogado.
Arevogação consiste em umamodalidade de desfazimento de determinados
negócios jurídicos, mediante uma declaração de vontade contrária àquela
anteriormenteemitida.
Nessesentido,dispõeoart.1.884doCódigoCivil:
“Art. 1.884. Os atos previstos nos artigos antecedentes revogam-se por atos iguais, e consideram-se
revogados,se,havendotestamentoposterior,dequalquernatureza,esteosnãoconfirmaroumodificar”.
Um codicilo, portanto, revoga-se por outro codicilo, ou, ainda, mediante a
feituradetestamentoposterior,ordinárioouespecial,seestenãoomodificarou
confirmar.
Anorma,pois,conduz-nosà ideiadequeaelaboraçãodeumtestamentoque
não façamençãoao codicilo—confirmando-ooumodificando-o— torná-lo-á
semefeito.
Finalmente, uma observação feita por SÍLVIO VENOSA chama a nossa
atenção.
Lembra, o ilustre jurista, não haver espaço, no Direito brasileiro, para a
chamada “cláusula conciliar”, pela qual o testador dizia que “se seu ato não
valessecomotestamento,queservissecomocodicilo” 481.
Pensamos que, em certas e justificadas situações, a teor do princípio da
conservação do negócio jurídico, uma declaração testamentária pode ser
aproveitadacomocodicilo,aexemplodahipóteseemqueumtestamentoinválido
por violação da legítima também dispôs a respeito de rituais fúnebres ou
pagamentodepequenasdespesascomsolenidadesreligiosas.
Éocasodeseaproveitar,excepcionalmente,partedoatodeúltimavontade,
comocodicilo.
CapítuloXVII
DisposiçõesTestamentárias
Sumário:1.Finalidadedocapítulo.2.Delimitaçãoconceitualdeumadisposiçãotestamentária.3.Tipologia
dasdisposiçõestestamentárias.4.Sobreainterpretaçãodotestamento.5.Sobreanomeaçãodeherdeiros
e a distribuição de quinhões ou bens individualmente considerados. 6. Sobre a validade das cláusulas
testamentárias.7.Prazoparaimpugnaçãodasdisposiçõestestamentárias.8.Daslimitaçõesdeeficácia.9.
Cláusulasderestriçãodepropriedade.
1.FINALIDADEDOCAPÍTULO
Assentada a compreensão conceitual da estrutura do testamento, o que inclui
toda a visão classificatória do instituto, é hora de apreciar os seus elementos
intrínsecos.
Entenda-se o seu conteúdo por meio das suas regras interpretativas,
proibitivas,restritivase,inclusive,permissivas.
Trata-se, portanto, de um panorama sobre o Capítulo VI (“Das Disposições
Testamentárias”),versandosobreosarts.1.897a1.911dovigenteCódigoCivil
brasileiro.
Vamosaele.
2.DELIMITAÇÃOCONCEITUALDEUMADISPOSIÇÃO
TESTAMENTÁRIA
Tecnicamente,oqueéumadisposiçãotestamentária?
Trata-se de uma manifestação da vontade, ordinariamente reduzida a termo,
constituindoparteintegrantedeumtestamento.
Opronunciamentodavontade,aoserpositivado,ganhanormalmenteoformato
de uma cláusula, como um tópico entre diversos outros de um conjunto de
deliberações.
Observe-sequeamençãoàcláusulatestamentária,todavia,nãodevelimitar-se
aoregistroescritoeorganizadodadisposição,mas,sim,devesercompreendida
comoaprópriaexteriorizaçãodavontade.
Assim, não é porque não esteja sistematizada ou em linguagem técnica que
deva ser desconsiderada, pois o mais importante é que demonstre a vontade
inequívocadotestador,observando-seosrequisitosdevalidadedadeclaração.
Compreendamos,nopróximotópico,atipologiadessasdisposições.
3.TIPOLOGIADASDISPOSIÇÕESTESTAMENTÁRIAS
Uma cláusula testamentária pode ter natureza patrimonial e conter uma
disposiçãodeúltimavontadesemconteúdopatrimonializado 482.
Também quanto ao seu formato, pode ela, conforme dispõe o art. 1.897 do
CódigoCivil 483,serelaboradacomumteorsimplesedireto,semlimitaçõesno
planodaeficácia,ouestarsubmetidaaumacondição(“cláusulacondicional”)ou
aumencargo,ônusoumodo(“cláusulamodal”),bemcomoatreladaaumcerto
motivo 484.
Entende-sepornomeaçãopuraesimplesadisposiçãotestamentáriaenunciada
sem qualquer limitação, produzindo seus efeitos imediatamente. Nessa linha,
transmitem-se,incontinenti,apropriedadeeapossedaherançaaoherdeiro,ea
propriedade ao legatário, já que, no caso deste último, não se pode imitir na
posseporautoridadeprópria(arts.1.784e1.923,§1.º,doCC) 485.
Compreenda-se como nomeação condicional (“sob condição”) a disposição
testamentáriasubmetidaaumeventofuturoeincerto.
Interprete-senomeaçãomodal(“paracertofimoumodo”)comoadisposição
testamentária aque seja impostauma restriçãoda liberalidade.Não se tratade
umacontraprestação,mas,sim,deumônus.
Na tipologia da nomeação de cláusulas testamentárias, hão de se incluir
também,porforçadautilizaçãodaexpressão“porcertomotivo”,asnomeações
causais,quedevemserentendidascomoaquelasrelacionadasaumadeterminada
justificativaexpressanotestamento.
Éocaso,porexemplo,deFulanodeixarumbemparaCicrano,portersidoele
quemlheprestousocorroemumacidente.SequemprestousocorrofoiBeltrano,
é para este que o bem deve ser direcionado, se efetivamente for possível
identificar a pessoa que o testador pretendia favorecer, tendo em vista que foi
explicitadaacausadaliberalidade 486.
Parece-nos razoável defender, inclusive, que se trata de uma aplicação
semelhante àquela propugnada pela teoria dos motivos determinantes, tão
prestigiadanoDireitoAdministrativo.
Vale registrar, ainda, apenas a título de complementação, que defendemos o
entendimentosegundooqualovigenteCódigoCivilbrasileiroécausalista,tendo
emvistaqueconsiderou,emseuart.166,III(semcorrespondêncianacodificação
anterior), como causa de nulidade absoluta, a situação em que “o motivo
determinante,comumaambasaspartes,forilícito” 487.
Não se admitem, porém, cláusulas submetidas a termo, conforme se pode
verificardoart.1.898doCC:
“Art. 1.898. A designação do tempo em que deva começar ou cessar o direito do herdeiro, salvo nas
disposiçõesfideicomissárias,ter-se-ápornãoescrita”.
Ressalvam-se de tal vedação, porém, as substituições fideicomissárias, que
serãoapreciadasemcapítulopróprio 488.
4.SOBREAINTERPRETAÇÃODOTESTAMENTO
Relevante parece-nos tecer algumas considerações sobre a interpretação do
testamento, compreendido, como sabemos, como umnegócio jurídico unilateral
dedisposiçãodeúltimavontade.
EmsuaParteGeral,oCódigoCivilbrasileiroestabelece:
“Art.114.Osnegóciosjurídicosbenéficosearenúnciainterpretam-seestritamente”.
Seessaéa regrageralde interpretaçãodedisposiçãoemnegócios jurídicos
benéficos, a exemplodeumadoação,háuma regraprópria e específicaparao
testamento.
Está ela prevista no art. 1.899 do Código Civil, que também merece ser
transcrito:
“Art.1.899.Quandoacláusulatestamentáriaforsuscetíveldeinterpretaçõesdiferentes,prevaleceráaque
melhorassegureaobservânciadavontadedotestador”.
Tal regra é a prova inequívoca da consagração positivada do Princípio do
RespeitoàVontadeManifestada,pornósjámencionado 489.
Tomandocomobaseessaregrafundamentaldeinterpretaçãotestamentária 490,
passemosacompreenderadisciplinacodificadadanomeaçãodeherdeirospelo
testamento.
5.SOBREANOMEAÇÃODEHERDEIROSEADISTRIBUIÇÃODEQUINHÕESOUBENSINDIVIDUALMENTECONSIDERADOS
Respeitadaalegítima(quandoháherdeirosnecessários),temotestadortodaa
partedisponíveldoseupatrimônioparadisporpormeiodotestamento.
E, se não há legítima a preservar, poderá o testador dispor de todo o seu
patrimônio,daformacomolheaprouver.
Afinal,umadasfaculdadesdodireitodepropriedadeéjustamenteopoderde
dispor.
Sendo válida a disposição testamentária, qualquer sujeito, com capacidade
sucessóriapassiva,poderáserdestinatáriodopatrimôniodofalecido, inclusive
osnecessitadosemgeral.
Sobretalpossibilidade,preceituaoart.1.902doCódigoCivil:
“Art.1.902.Adisposiçãogeralemfavordospobres,dosestabelecimentosparticularesdecaridade,oudos
deassistênciapública,entender-se-árelativaaospobresdolugardodomicíliodotestadoraotempodesua
morte,oudosestabelecimentosaísitos,salvosemanifestamenteconstarquetinhaemmentebeneficiaros
deoutralocalidade.
Parágrafoúnico.Noscasosdesteartigo,asinstituiçõesparticularespreferirãosempreàspúblicas”.
A diretriz primordial, como dito, é preservar sempre a vontade do testador,
buscandocompatibilizá-laquandohouverimprecisõesque,apriori, impediriam
asuaefetivação.
Assim, se, nomeu testamento, eu testo todo ou parte domeu patrimônio aos
pobres, semindicá-los,a interpretaçãoaserdadaàdisposiçãoénosentidode
restringir aos pobres do local do meu próprio domicílio, salvo disposição
expressaemsentidocontrário.
Note-sequeasinstituiçõesparticulares,nostermosdoparágrafoúnicoacima
mencionado,preferirãoàspúblicas.
Isso porque o legislador, certamente, parte do pressuposto de os
estabelecimentosparticulares,geridospormembrosdaprópria sociedadecivil,
dependeremmaisde recursosalheios,namedidaemquenão têmopermanente
apoiodopróprioEstado.
Aindasobreanomeaçãodeherdeiros,umaspectodevesersalientado:oque
fazersehouveralgumerronadesignaçãodapessoadoherdeiro?
Aquestãoérespondidapelojámencionadoart.1.903:
“Art. 1.903. O erro na designação da pessoa do herdeiro, do legatário, ou da coisa legada anula a
disposição, salvo se, pelo contexto do testamento, por outros documentos, ou por fatos inequívocos, se
puderidentificarapessoaoucoisaaqueotestadorqueriareferir-se”.
É o caso, já visto, de alguém dispor, em testamento, em benefício de uma
determinada pessoa, por ela lhe ter salvado a vida, mas for apurado,
posteriormente,quequemlheprestouosocorroefetivamentefoioutrem.
Tal regra decorre do próprio princípio da conservação do negócio
jurídico 491, em que se busca preservá-lo em situações de vícios sanáveis,
evitando-se, assim, um indesejável reconhecimento de invalidade, que
desprezariaavontademanifestadadotestador.
Observe-seque,naformadoart.1.904,se“otestamentonomeardoisoumais
herdeiros, sem discriminar a parte de cada um, partilhar-se-á por igual, entre
todos,aporçãodisponíveldotestador”.
Parece-nos, sem dúvida, uma regra bastante razoável, pois, para preservar
justamentea inteirezadavontadedo testador,nãosedevemfazer ilaçõessobre
porcentagensoudivisõesentreherdeirosigualmentenomeados.
Massetalnomeaçãonãoforabsolutamenteisonômica?
E se o testador nomear individualmente alguns herdeiros (ex.: Fulano,
Beltrano e Cicrano) e coletivamente outros (ex.: os membros da Banda de
MúsicaTreblebes),oquefazer?
Arespostaétrazida,emdicçãoclara,peloart.1.905:
“Art.1.905.Seotestadornomearcertosherdeirosindividualmenteeoutroscoletivamente,aherançaserá
divididaemtantasquotasquantosforemosindivíduoseosgruposdesignados”.
Noentanto,se,propositalmente,oumesmoporum“errodeconta”,o testador
determinar quotas para cada herdeiro, não absorvendo toda a herança
disponível?
Mais uma vez o codificador se preocupou com tal questão prática,
estabelecendo, em seu art. 1.906, justamente, que, se “forem determinadas as
quotas de cada herdeiro, e não absorverem toda a herança, o remanescente
pertenceráaosherdeiros legítimos,segundoaordemdavocaçãohereditária”,o
que,emumainterpretaçãológica,parece-nos,defato,amelhorsolução.
E, por fim, se forem determinados os quinhões de uns e não os de outros
herdeiros,oquefazer?
Arespostapareceóbvia!
Outorgar primeiro as porções hereditárias dos herdeiros com quinhão
predeterminado, distribuindo, somente após isso, o que restar, por igual, aos
demaisherdeiros, tendo sido tal conclusão estabelecida expressamenteno texto
codificado 492.
Em conclusão, vale destacar que, em respeito ao poder de disposição do
testador, da mesma forma como ele, observada a legítima, pode designar um
herdeiro (ou legatário) como destinatário específico de um bem, também pode
estabelecerrestriçõesaquebensespecíficossejamatribuídosaquemquerque
seja.
Éaregraprevistanoart.1.908:
“Art.1.908.Dispondootestadorquenãocaibaaoherdeiroinstituídocertoedeterminadoobjeto,dentreos
daherança,tocaráeleaosherdeiroslegítimos”.
Talrestrição,porém,comoparecelógico,tambémdeveobservarasregrasda
Sucessão Legítima, pois, caso o herdeiro instituído seja, coincidentemente, o
únicoremanescente,alimitaçãonãopoderáproduzirefeitos.
6.SOBREAVALIDADEDASCLÁUSULASTESTAMENTÁRIAS
O testamento é um negócio jurídico unilateral (por emanar de uma única
manifestaçãodevontade)eformal(poisdeveobservarrigorosospressupostosde
validade).
Por isso, além das regras gerais de invalidade dos negócios jurídicos—
perfeitamente aplicáveis,mutatismutandis, aos testamentos—, tambémno que
diz respeito às cláusulas testamentárias, preocupou-se o codificador com o
estabelecimentoderegrasespecíficasdenulidade:
“Art.1.900.Énulaadisposição:
I — que institua herdeiro ou legatário sob a condição captatória de que este disponha, também por
testamento,embenefíciodotestador,oudeterceiro;
II—queserefiraapessoaincerta,cujaidentidadenãosepossaaveriguar;
III—quefavoreçaapessoaincerta,cometendoadeterminaçãodesuaidentidadeaterceiro;
IV—quedeixeaarbítriodoherdeiro,oudeoutrem,fixarovalordolegado;
V—quefavoreçaaspessoasaquesereferemosarts.1.801e1.802”.
A primeira hipótese caracteriza uma modalidade específica de estipulação
testamentária vedada, a saber, aquela que imponha ao beneficiário uma
disposiçãoequivalenteemfavordoprópriotestadoroudeterceiro,oquemuito
seassemelhaàhipótesejávistadetestamentoproibido 493.
Sobreotema,ensinamFLÁVIOTARTUCEeJOSÉFERNANDOSIMÃO:
“Acondiçãocaptatóriaéaquelaemqueavontadedomortonãoéexternadalivremente,quersejaporque
houvedoloquerporquedecorreudepactosucessório(BEVILÁQUA,Clóvis.CódigoCivil...,1955,v.VI,
p.103).Entretanto,explicaSilvioRodriguesque‘nãosetratadaproibiçãogenéricadacaptaçãodolosada
vontade,emqueacláusulatestamentáriaéanulável,combasenoart.171,II,doCódigoCivil,emvirtude
daexistênciadeumvíciodavontade,ouseja,odolo,masdeumanulidadeabsoluta,inspiradanamesma
ideia de interesse geral, que veda os pactos sucessórios’ (Direitocivil..., 2002, v. 7, p. 185).O que se
percebeéqueotratamentolegislativoédiversodaqueleconstantedaParteGeraldoCódigoCivil.
Em verdade, estamos diante de regra que decorre do art. 426 do CC, daquela notória divisão entre
institutoscontratuaisesucessórios,peloqualénuloocontratoquetenhaporobjetoherançadepessoaviva
(pactacorvina).Sendoassim,tambéménulaacláusulatestamentáriaemqueháumatrocadefavores
pelaqualotestadordeclaraquenomeiacertapessoaherdeirasobacondiçãodeelanomearumterceiro
comoherdeiro.Comoexemplo,‘deixomeusbensaPabloseeledeixartodososseusbensaRodolfo’” 494
(grifamos).
Note-se,pois,que,damesmaformaqueseproíbe testamentoqueviseauma
troca de favores, uma cláusula testamentária de mesma natureza também é
proibida.
Como vimos em tópico anterior neste mesmo capítulo 495, é perfeitamente
possívelestabelecerumanomeaçãocondicionaldeherdeiros.
Oquenãoé admissível éo condicionamentoaumadisposição testamentária
em benefício próprio ou de terceiro, em uma verdadeira e lamentável
manifestaçãoquidproquo 496,comoseotestamentofosseumaviaadequadapara
oestabelecimentodebarganhas.
A segunda e a terceira hipóteses específicas de nulidade de disposição
testamentáriasereferemaosujeitoporelabeneficiado.
Ao contrário do que se possa imaginar, em uma primeira leitura, não há
impedimentolegaldeseestabelecerdisposiçãotestamentáriaapessoaincerta.
Pode-se,sim,disporbensaumapessoasemindividualizá-la.
Mas essa pessoa indeterminada precisa ser, no mínimo, determinável, de
acordocomamanifestaçãodavontadedoprópriotestador.
Assim, é possível estabelecer disposições, como visto, para pessoas que
realizaram determinadas condutas (por exemplo, dispor em benefício de quem
realizou uma boa ação específica), mesmo quando o testador não a conheça
individualepessoalmente.
O que não se pode é estabelecer genericamente alguém sem um mínimo de
determinabilidade.
Por isso, não se pode testar em benefício de alguém cuja identidade não se
possaaveriguar(incisoII)oudelegaradeterminaçãodesuaidentidadeaterceiro
(incisoIII),poisissofariacomqueavontadedotestadorficassedependenteda
manifestaçãodavontadedeoutrem.
Um exemplo ilustrará a última hipótese: deixo 1/3 daminha herança para a
pessoaqueSalomãoindicar.
Haveria, pois, no caso, uma inaceitável interferência de terceiro na
manifestaçãodevontadedotestador.
Da mesma forma, como não se pode delegar a terceiro a designação do
herdeiro,tambémnãosepodecometeraoutremovalordolegado(incisoIV).
Comentandoo dispositivo, observamos amigosFLÁVIOTARTUCEe JOSÉ
FERNANDOSIMÃO:
“Novamente, a razão da nulidade é óbvia, pois se o testador deixasse a terceiros a fixação do legado,
estaria transferindo o próprio direito de testar, que é personalíssimo. O objeto do legado deve ser
determinado ou determinável de acordo com os elementos contidos no próprio testamento, para que a
efetivavontadedomorto,enãoadoherdeiroou legatário, seja respeitada.Aliás, todasascondiçõesde
certonegóciodeixadasaoarbítriodecertapessoasãonulas,poraplicaçãoanalógicadaregraqueproíbea
condiçãopuramentepotestativa(art.122doCC).
Comoexceçãoaodispositivo,valeráadisposiçãoemremuneraçãodeserviçosprestadosaotestador,por
ocasiãodamoléstiadequefaleceu,aindaquefiqueaoarbítriodoherdeirooudeoutremdeterminarovalor
dolegado(art.1.901,II,doCC).Trata-sedeumasucessãoonerosa,poisadeixanãoconstituiverdadeira
liberalidade,jáqueobeneficiárioprestouserviçosaofalecido.
Oinstitutotrazsituaçãoqueseassemelhaàdoaçãoremuneratóriaqueéfeitaparaagradeceraumserviço
prestado por uma pessoa que não se torna credora em razão deste, bem como em agradecimento por
determinada atitude do donatário. Como dispõe o art. 540 do atual Código, não se trata de um ato de
liberalidade em si, mas somente na parte que exceder o serviço prestado. Vale dizer, contudo, que a
diferençaentreosinstitutoséque,nadoação,odisponentecelebracontratoqueproduzefeitosemvida.Já
nadisposiçãotestamentária,estasóproduzefeitosapóssuamorte” 497.
Talatoépersonalíssimo,e,porisso,indelegável,sendonuladeplenodireito
qualquerdisposiçãonessesentido.
Por fim, é forçoso convir que serão nulas as disposições testamentárias
dirigidas a pessoas com impedimentos legais sucessórios (inciso V), por
careceremdevocaçãohereditáriaespecífica 498.
Poroutro lado,estabeleceu,ocodificador,previamente,o reconhecimentoda
validadededisposiçõestestamentáriaspoucoortodoxas.
Falamos,nessecaso,doart.1.901doCódigoCivil:
“Art.1.901.Valeráadisposição:
I— em favor de pessoa incerta que deva ser determinada por terceiro, dentre duas oumais pessoas
mencionadas pelo testador, ou pertencentes a uma família, ou a um corpo coletivo, ou a um
estabelecimentoporeledesignado;
II—emremuneraçãodeserviçosprestadosaotestador,porocasiãodamoléstiadequefaleceu,aindaque
fiqueaoarbítriodoherdeirooudeoutremdeterminarovalordolegado”.
Aprimeirasituaçãoéumaexceçãoaparenteàregradenulidadededisposição
queremetaparaterceiroaescolhadepessoaincerta.
Isso porque a menção a pessoa incerta diz respeito a uma coletividade
específica,emqueoâmbitodeescolhajáestádelimitadopelotestador,apenas
autorizando que o terceiro escolha o beneficiário entre algumas pessoas
determinadas.
Aexemplificaçãoajudaacompreendermelhoraquestão.
Seria absolutamente nula uma cláusula que dispusesse em favor de quem
Fulano escolhesse. Por outro lado, seria perfeitamente aceitável a disposição
paraBeltranoouCicrano,remetendoaescolhaaFulano.
Asegundahipótese,previstanodispositivo,éadaestipulaçãoderemuneração
porserviçosprestadosaotestador,porocasiãodamoléstiadequefaleceu.
Arazoabilidadedaautorizaçãolegalparece-nosevidente.
De fato, nem sempre o falecimento vem a ocorrer quando o indivíduo ainda
estáplenamentecapazdemanifestarasuavontade.Imagine-se,porexemplo,que
otestador,depoisdeestabeleceracláusula,venhaaentraremcomaoupadecer
longotemposemcondiçõesdeexpressarseuconsentimento.Somenteumdomde
profecia poderia prever quem especificamente se encarregaria a cuidar do
pacienteequantotempooudedicaçãoseriamdespendidos...
Assim, uma disposição geral para que o patrimônio do testador remunerasse
serviçosprestadosporocasiãodamoléstiaquelhetiroudoplanodeexistência,
pode ter, sem problemas, tal âmbito de amplitude, remetendo a herdeiro ou a
outremadeterminaçãodovalorrazoávelparaaremuneraçãodetalnobrelabor.
7.PRAZOPARAIMPUGNAÇÃODASDISPOSIÇÕESTESTAMENTÁRIAS
O caput do art. 1.909 do Código Civil traz uma disposição absolutamente
desnecessária.
Com efeito, ao afirmar que são “anuláveis as disposições testamentárias
inquinadasdeerro,dolooucoação”nadaacrescentaaodireitopositivoregente
da matéria, uma vez que é regra assente, na parte geral do Código Civil
brasileiro,queosnegóciosjurídicoscelebradoscomtaisvíciosdeconsentimento
sãoanuláveis 499.
E, em seu parágrafo único, estabelece, ainda, o prazo decadencial de quatro
anos para se exercer o direito potestativo de anular a disposição por vício de
vontade,contadosdequandoointeressadotiverconhecimentodovício.
Talprazo se coadunacoma regrageraldo art. 178doCódigoCivil, para a
anulaçãodosnegóciosjurídicos,queétambémdequatroanos 500.
Todavia, não se pode deixar de registrar que, para outras hipóteses de
impugnação da validade do testamento, fora previsto o prazo específico e
diferenciado de cinco anos, conforme se lê no art. 1.859, contados da data do
registro,dicotomiaprazalquepoderiatersidoevitada 501.
Conformejáanotamos 502,talprazoquinquenalprevaleceriainclusiveemface
de eventuais causas de nulidade absoluta do negócio jurídico, a exemplo da
incapacidadeabsolutadoagenteouda impossibilidadedoseuobjeto,asquais,
emregra,nostermosdoart.169doCódigoCivil,nãocomportariamprazoparaa
suaimpugnação.
Nessesentido,relembremosaliçãodeSÍLVIOVENOSA:
“Lembremos que o novoCódigo fixou em cinco anos o prazo decadencial para impugnar a validade do
testamento, contado o prazo da data de seu registro (art. 1.859). Ao mencionar impugnação, o novo
diplomasereferetantoaoscasosdenulidadecomodeanulabilidade.Comisso,derrogaaregrageraldo
art.169, segundooqualonegócio jurídiconulonãoé suscetíveldeconfirmação,nemconvalidaçãopelo
decurso do tempo. A natureza do testamento e as dificuldades que a regra geral da imprescritibilidade
ocasionaria forçou essa tomada de posição pelo legislador. Essa exceção ao princípio geral vem
demonstrar que não é conveniente essa regral geral de não extinguibilidade com relação aos negócios
nulos. Melhor seria que se abraçasse a corrente doutrinária anterior que entendia que os atos nulos
prescrevemnoprazomáximoestabelecidonoordenamento.Nessecampodenulidades,porém,háquese
atentar para as hipóteses de inexistência de testamento, quando qualquer prazo extintivo se mostra
inaplicávelparasuadeclaração,comoocorre,porexemplo,nahipótesedeperfeitaausênciadevontadedo
testador” 503.
Podemos, então, concluir que, nos termos do referido art. 1.859, o prazo
decadencialdecincoanosparaimpugnaçãodotestamentodizrespeitoaqualquer
defeitodevalidade, comexceçãodosvíciosdeconsentimento referidosnoart.
1.909.
Trata-sedematériaque, semdúvida, poderia ter sidomaisbem tratadapelo
legislador.
8.DASLIMITAÇÕESDEEFICÁCIA
Aindanadisciplinadasdisposiçõestestamentárias,estabeleceoart.1.910:
“Art. 1.910. A ineficácia de uma disposição testamentária importa a das outras que, sem aquela, não
teriamsidodeterminadaspelotestador”.
Parece-nosqueoreferidodispositivoexplicitaoóbvio.
De fato, por uma lógica regra de causalidade, não podem ser consideradas
eficazesdisposiçõesquese fundamentamemoutrasque tenhamsidodeclaradas
ineficazes.
Explicando o dispositivo, sintetizam DIMAS MESSIAS DE CARVALHO e
DIMASDANIELDECARVALHO:
“Anulidadepodeserdopróprio instrumento(testamento)ouapenasdequalquerumadesuascláusulas.
Naúltimahipótese,aideiadominante,emfacedoprincípiodadefesadotestamento,équeanulidadede
umacláusulanãodeveráprejudicarorestodoinstrumento,devendoaslícitasseremmantidas.Entretanto,
seascláusulas lícitas foramentrosadasoudecorrentesdasnulas,esemestasnãoseriamdeterminadas,
tambémsãoineficazes(art.1.910,CC)” 504.
Assim, inspirando-nos na vetusta ideia segundo a qual “o acessório segue a
mesmasortedoprincipal”,seháumarelaçãoevidenteentreduasdisposições,a
pontodeseconcluirque,semuma,aoutranãoproduziriaefeitos,nãohácomo
subsistirtalrelação.
E,comoderradeiro tópicodestecapítulo, tratemosda relevantíssimaquestão
dascláusulasrestritivasdepropriedade.
9.CLÁUSULASDERESTRIÇÃODEPROPRIEDADE
Entreoenormeplexodecláusulastestamentáriaspossíveis,aleiautorizaqueo
testador,emsuadisposiçãodeúltimavontade,estipulerestriçõesaolegadoouà
herança, impondo-lhes os gravames de inalienabilidade, incomunicabilidade ou
impenhorabilidade.
Éaregradoart.1.911doCódigoCivil:
“Art. 1.911. A cláusula de inalienabilidade, imposta aos bens por ato de liberalidade, implica
impenhorabilidadeeincomunicabilidade.
Parágrafoúnico.Nocasodedesapropriaçãodebensclausulados,oudesuaalienação,porconveniência
econômicadodonatáriooudoherdeiro,medianteautorização judicial,oprodutodavendaconverter-se-á
emoutrosbens,sobreosquaisincidirãoasrestriçõesapostasaosprimeiros”.
Entenda-seporinalienabilidadearestriçãoàtransferênciadobematerceiros,
sejaatítulogratuitoouoneroso.
Por impenhorabilidade, por sua vez, compreenda-se a restrição da
possibilidadedeconstriçãojudicial.
Jáporincomunicabilidade,depreenda-searestriçãoàtransferênciadefração
ideal do bem ao cônjuge (ou companheiro) quando da formação de um núcleo
familiar,restriçãoestafeitacomafinalidadedeproteçãoprópriobeneficiáriodo
testamento 505.
Vale destacar que a regra do caput, de que a inalienabilidade implica
automaticamente tanto impenhorabilidade quanto incomunicabilidade, acaba por
acolher, em sede legal, antiga diretriz jurisprudencial do Supremo Tribunal
Federal 506,oquenosparece,apriori,muitorazoável.
De fato, se tal não ocorresse, seria fácil “escapulir” da regra legal de
inalienabilidade, pois bastaria, por exemplo, o herdeiro assumir dívidas até o
valor do bem e, a posteriori, indicá-lo na execução para penhora, ou, então,
casar-se em regime de comunhão universal, para, em seguida, divorciar-se,
partilhandoopatrimôniorecebido.
Claro que, por vezes, em função de peculiaridades da situação concreta, tal
impenhorabilidadenãodeveserconsideradadeformaabsoluta,oquetambémse
vislumbranapráticajudiciária:
“RECURSO ESPECIAL. SUCESSÃO. DÍVIDAS DO MORTO. TESTAMENTO QUE GRAVA OS
IMÓVEISDEIXADOSCOMCLÁUSULASDEINALIENABILIDADEEIMPENHORABILIDADE.
POSSIBILIDADEDEPENHORA,EMEXECUÇÃOMOVIDAPORCREDORDODECUJUS.
1. Os bens deixados em herança, ainda que gravados com cláusula de inalienabilidade ou de
impenhorabilidade,respondempelasdívidasdomorto.
2.PorforçadoArt.1.676doCódigoCivilde1916,asdívidasdosherdeirosnãoserãopagascomosbens
que lhes foram transmitidos em herança, quando gravados com cláusulas de inalienabilidade e
impenhorabilidade, por disposição de última vontade. Tais bens respondem, entretanto, pelas dívidas
contraídaspeloautordaherança.
3.Acláusulatestamentáriadeinalienabilidadenãoimpedeapenhoraemexecuçãocontraoespólio”(STJ,
REsp998031/SP,RecursoEspecial2005/0072290-4,Rel.Min.HumbertoGomesdeBarros,j.11-12-2007,
DJ,19-12-2007,p.1230,Lex-STJ,v.223,p.267;RT,v.871p.207).
Observe-se, finalmente, que a vigente codificação civil, de forma inovadora,
abrandou o rigor da cláusula, para permitir, na forma do parágrafo único
supratranscrito, por conveniência econômica do beneficiário e mediante
autorização judicial, a alienação dos bens gravados, convertendo-se o valor
apurado em outros bens, sobre os quais incidirão as restrições apostas aos
primeiros.
Além disso, reforçando o caráter relativo da inalienabilidade, a conversão
tambémé aplicável para hipóteses de desapropriação, caso emque o valor da
indenizaçãoconverter-se-áemoutrosbens,sobreosquaiscontinuarãoa incidir
osgravames.
O referido parágrafo único, em nosso sentir, não foi plenamente técnico ao
mencionarque“oprodutodavendaconverter-se-áemoutrosbens”,porquanto,
posto se possa falar em “venda” no caso de alienação por conveniência
econômicadoherdeiro,amesmaexpressãonãosepodeempregarparaocasoda
expropriação.
Além disso, note, amigo leitor, que também há a menção ao “donatário”,
emboraestejamosatratardoestudodeumacláusulaatinenteao“testamento”,e
nãoao“contratodedoação”.
Mas,pondodeladoessesaspectosterminológicos,osentidodanormaéclaro:
ovalorapurado—quersejanocasodavenda,quersejanodadesapropriação—
converter-se-á em outro(s) bem(ns), o(s) qual(is) passará(ão) a ser objeto dos
gravames.
Finalmente, parece-nos plenamente razoável defender-se, em situações
excepcionais, a eventual possibilidade da revogação de tais cláusulas, com a
finalidadedeseimprimirfunçãosocialàpropriedadeedepreservaradignidade
da pessoa do proprietário, o que tem encontrado guarida na jurisprudência
pátria 507.
Éo caso, por exemplo, deobeneficiárioprecisarvendero imóvel recebido
paraempregartodoovalorapuradonocusteiodeumacomplexacirurgia.
Atítulodeconclusão,valeacrescentarainda,apardapolêmicaarespeitodo
tema,haverentendimentojurisprudencialnosentidodeseadmitirausucapiãodo
bemclausulado 508.
Porfim,comojáafirmamosanteriormente,oCódigoCivilbrasileirode1916
admitia a possibilidade de o testador também clausular a legítima, o que fora
restringidopelavigentecodificação,quecondicionouogravameàocorrênciade
justacausa 509,temajáabordadoemcapítuloanterior 510.
CapítuloXVIII
Legados
Sumário: 1. Introdução. 2. Noções conceituais. 3. Sujeitos. 4. Objeto. 5. Tipologia. 6. Efeitos. 7.
Pagamento.8.Caducidade.
1.INTRODUÇÃO
Normalmente,quandosefalaemherança,tem-seemmenteatransferênciatotal
ouparcialdetodaamassapatrimonialdeixadapelo“decujus”.
Todavia, também é possível, sempre por meio da declaração de última
vontade,oestabelecimentodeumatransferênciadebensespecíficos.
Trata-sedolegado,objetodopresentecapítulo.
2.NOÇÕESCONCEITUAIS
Legado, em linhas gerais, é um bem certo e determinado (ou,
excepcionalmente, determinável), deixado pelo autor da herança, a alguém,
denominadolegatário,pormanifestaçãoexpressaemtestamentooucodicilo.
Aideiaparecemuitosimples:seoherdeirosemprerecebeatítulouniversal,
istoé,atotalidadeoufraçãoideal(metade,umterço,umquinto)dopatrimônio,o
legatáriorecebebemdestacado,singularizado,extraídodauniversalidade,como,
por exemplo, uma casa ou um veículo especificado pelo autor da herança em
testamento.
No ordenamento jurídico brasileiro, é da essência do legado ser uma
liberalidademortiscausa a título singular, constituindo-se uma atecnia falar-se
emlegadosuniversais 511.
Issonão impede,porsisó,que todaaherançasejaobjetode legados,desde
que todos os bens componentes do espólio tenham sido individualmente
designadosnotestamentooucodicilo.Isso,obviamente,somenteocorrerásenão
houver necessidade de respeito à legítima, ou seja, na hipótese de inexistirem
herdeirosnecessários 512.
Sobreotema,registraCARLOSROBERTOGONÇALVES:
“Poucoimportaonomequenotestamentosedêàliberalidade,ouseja,seodisponentedesignaoherdeiro
comonomedelegatárioouse,vice-versa,chamaolegadodeherança.Nãohápalavrassacramentais.O
quecontaéaessênciadadeclaraçãopelaqualsequalificaavontadetestamentáriarelativamenteauma
pessoaouaumacoisa.Todavezquesedeixacertoobjeto,nãooacervooupartealíquotadomesmo,toda
vezqueasucessãoseverificaatítuloparticular,édelegadoquesetrata” 513.
Aobservaçãoparece-nosbastanterelevante.
Defato,éprecisocompreenderolegadocomoumamanifestaçãodirecionada
nosentidodeseatribuiratitularidadededeterminadobem(oueventualmenteum
direito) a alguém, como decorrência do respeito ao princípio da vontade
manifestada 514.
3.SUJEITOS
São sujeitos indispensáveis do legado o autor da herança (legante) e o
beneficiáriodolegado(legatário).
Todavia,oinstitutocomportaeventualmenteapresençadeoutrossujeitos.
Nesse sentido, ensina o amigo e brilhante jurista CARLOS ROBERTO
GONÇALVES:
“Quando o legado é atribuído a herdeiro legítimo (que passa a cumular as qualidades de herdeiro e
legatário), denomina-se prelegado (praelegatum) ou legado precípuo (praecipuum). Pode haver,
portanto,comosujeito,alémdo testadoredo legatário,a figuradoprelegatáriooulegatário precípuo,
querecebeolegadoetambémosbensqueintegramoseuquinhãonaherança.
Oherdeiroencarregadodecumprirolegadoéchamadodeonerado.Oneradoougravadoé,pois,oque
devepagarolegado;legatário,ouhonrado,oquerecebeadádivaouliberalidade.
Se omesmo objeto cabe a vários beneficiados, eles se denominam colegatários. Se a um legatário é
impostaaentregadeoutrolegado,desuapropriedade,aestesedenominasublegado,esublegatário,à
pessoa a que o bem se destina. Por conseguinte, o onerado tanto pode ser um herdeiro como um
legatário” 515.
Conhecidas essas expressões subjetivas, teçamos algumas considerações
acercadoobjetodolegado.
4.OBJETO
Oquepodeserobjetodeumlegado?
Emregra,qualquerbempassíveldeindividualizaçãoequeintegreaesferade
titularidadejurídico-patrimonialdoautordaherança.
Daí a afirmação lógica, constante do art. 1.912 do vigente Código Civil
brasileiro,dequeé“ineficazolegadodecoisacertaquenãopertençaaotestador
nomomentodaaberturadasucessão”.
Isto não quer dizer que, nomomento da estipulação do legado, o instituidor
tenhanecessariamentedejápossuirobemlegado,mas,sim,dequeistodeverá
serverificadonomomentodaaberturadasucessão(ouseja,comamortedoautor
dadisposiçãodeúltimavontade).
Talafirmaçãoimplica,poroutrolado,que,seeratitularquandodaestipulação
do legado,mas o deixou de ser quando da abertura da sucessão, a disposição
testamentáriaquedar-se-áineficaz.
Nesse aspecto foimuitomais técnico o novel codificador, se comparado ao
legisladorde1916, namedida emque este últimocomina a “nulidade”do ato,
quando, em verdade, como dito acima, é caso de reconhecer a sua
“ineficácia” 516.
Tambémaplaudindoanovaredação,comentaPAULOLÔBO:
“O legado de coisa alheia, previsto na legislação anterior, foi suprimido peloCódigoCivil.Não hámais,
portanto, referência legal a esse anômalo legado, porque a eficácia de qualquer legado depende de sua
precisa existência na data da abertura da sucessão. Se, nessa data, inexistir a coisa, o legado é
simplesmente ineficaz, superando-se a imputação de nulidade, aludida na legislação anterior.Oplano da
validadenãoéafetado,poisdecorredadeclaraçãoválidadavontadedo testador.Masa inexistênciada
coisanomomentodesuamorteatingeoplanodaeficácia, tornandoadisposição testamentária ineficaz.
Nãoháimpedimentolegal,contudo,deotestadorestabelecê-lo,noâmbitodesuaautonomiaprivada,mas
seráineficazseacoisanãoestiveremsuatitularidadenomomentodaaberturadasucessão.Acríticade
PontesdeMiranda(1973,v.57,§5.762)ànulidadedetallegado,fixadanoart.1.678doanteriorcódigo,
influenciouacorretaalusãodonovoCódigoàineficácia.Tambémrepercutiusuacríticaaomomentoaser
considerado, que não poderia ser o da data do testamento (como se a aquisição posterior operasse a
retroeficácia,ou,oqueépior,aconvalescença),massimodadatadamortedotestador.Nodireitoatual
apenasse levaemcontaoqueestána titularidadedo testadornadatadasuamorte,paraqueo legado
possaserconsideradoeficaz” 517.
Seguindotaldiretriz,estabeleceoart.1.916doCC/2002:
“Art.1.916.Seotestadorlegarcoisasua,singularizando-a,sóteráeficáciaolegadose,aotempodoseu
falecimento,elaseachavaentreosbensdaherança;seacoisa legadaexistirentreosbensdotestador,
masemquantidadeinferioràdolegado,esteseráeficazapenasquantoàexistente”.
Issoquerdizerqueéabsolutamenteineficazqualquerlegadosobrebemdeque
o autor da herança não seja titular, de forma plena, total e incondicionada, na
aberturadasucessão?
Não,amigoleitor!
Desconfie sempre de afirmações peremptórias sobre regras aparentemente
absolutas...
Excepcionalmente,admite-seumlegadosobrebemquenãopertençaaoautor
daherança.
Tudodependerá,obviamente,dostermosdamanifestaçãodeclarada.
Nessalinha,estabelecemosarts.1.913e1.914doCódigoCivil:
“Art.1.913.Seotestadorordenarqueoherdeirooulegatárioentreguecoisadesuapropriedadeaoutrem,
nãoocumprindoele,entender-se-áquerenunciouàherançaouaolegado.
Art. 1.914. Se tão somente em parte a coisa legada pertencer ao testador, ou, no caso do artigo
antecedente,aoherdeiroouaolegatário,sóquantoaessapartevaleráolegado”.
Na ideia propugnada no primeiro dispositivo, tem-se que é possível (e
potencialmenteeficaz)estabelecerumlegadoemqueobemtransferidonãoéde
propriedadedoautordaherança,mas,sim,deumterceiro,quetambéméherdeiro
oulegatário.
Ahipóteseé,efetivamente,deumacondiçãosuspensivadaeficáciadolegado,
emqueainérciadoherdeirooulegatárioseráinterpretada,jureetdejure,como
uma renúncia à herança ou legado, revertendo os bens correspondentes para a
legítima.
Damesmaforma,observando-seosegundodispositivotranscrito,adaptar-se-á
adisposiçãoparaocasodetitularidadeparcialdobemlegado.
Nessemesmodiapasão,mesmoqueobemnãoestejapresentenopatrimôniodo
testador,maspossaseradquiridoporsercoisagenérica,adisposiçãoéválidae
eficaz.
E tal registro deve ser feito, pois, excepcionalmente, admite-se também o
legadodecoisaincerta.
Nessesentido,confira-seoart.1.915:
“Art.1.915.Seolegadofordecoisaquesedeterminepelogênero,seráomesmocumprido,aindaquetal
coisanãoexistaentreosbensdeixadospelotestador”.
Eaquemcabecumprirtaldeterminação?
Em nosso sentir, caso haja testamenteiro 518, naturalmente será dele a
atribuição, se estabelecidanasdisposições testamentárias, umavezque é eleo
responsáveldeterminadopeloautordaherançaparacumprimentodotestamento.
Inexistindo, porém, pessoa especificamente designada para o mister de
cumprimentodolegado 519,aincumbênciaserádosherdeirose,nãooshavendo,
aos legatários, naproporçãodoqueherdaram,na formado art. 1.934 520 como
aprofundaremosemtópicoposterior 521.
Observe-seque tal atribuição segueadisciplinageraldasobrigaçõesdedar
coisaincerta,naperspectivadaregrasegundoaqualogêneronãoperece 522.
Registre-se,porfim,naformadoart.1.917,queo“legadodecoisaquedeva
encontrar-seemdeterminado lugar só teráeficácia senele forachada, salvo se
removidaatítulotransitório”.
A inteligência do dispositivo segue a lógica do instituto: só é possível legar
bensquepossamserindividualizadoseefetivamentetransferidosnomomentoda
sucessão.Ora,seobemnãoestánolugarquefoiindicadopeloautordaherança,
sendo tal indicação do local parte da declaração de última vontade, não há, a
priori, como distingui-lo de outros bens iguais que estejam em outro lugar
(ressalvadaaremoçãotransitória,conformeconstanotextolegaltranscrito).
Individualizado o objeto do legado, é este que deve ser entregue, na forma
como se encontrava ao falecer o testador, que declarou sua intenção de vê-lo
passar à titularidade de alguém específico, transferindo-lhe este bem na sua
integralidade,comtodasassuascaracterísticas 523.
Feitas tais considerações genéricas sobre o objeto dos legados, façamos um
pequenoesforçoclassificatóriodosmodospelosquaissemanifestaoinstituto.
5.TIPOLOGIA
O vigente Código Civil contemplou diversas modalidades em sua parte
introdutóriadadisciplinadoslegados.
Apluralidadedelegadosé,portanto,aregranoDireitoSucessóriobrasileiro.
Desnecessária,porém,parece-nostalpreocupaçãoemtrazertantas“espécies”
delegados,umavezqueamatérianãoédetaxatividadenormativa,devendoser
taismençõesconsideradasmeramenteexemplificativas 524.
Todavia, como estão elas efetivamente mencionadas na codificação,
apresentaremosumarápidasistematizaçãodasmodalidadesmencionadasnotexto
legal.
Jáconhecidasasregrascodificadassobrelegadodecoisacerta,bemcomoa
situaçãoexcepcionaldelegadodecoisaincerta,valeregistrarquetambémpode
haver legado de direitos (pessoais ou reais), como direitos de crédito ou
usufruto, incluindo-se até mesmo prestações de fazer (como a de prestar
alimentos).
Noquediz respeitoao legadodecrédito, estabeleceovigenteCódigoCivil
brasileiro:
“Art. 1.918.O legadode crédito, oude quitaçãode dívida, terá eficácia 525 somente até a importância
desta,oudaquele,aotempodamortedotestador.
§1.ºCumpre-seolegado,entregandooherdeiroaolegatáriootítulorespectivo.
§2.ºEstelegadonãocompreendeasdívidasposterioresàdatadotestamento”.
Observadas as regras de vocação hereditária 526, qualquer pessoa pode ser
beneficiáriade legados, inclusiveumcredor,nãohavendonecessariamenteuma
compensaçãodedívidaportaldisposiçãodevontade,naformadocaputdoart.
1.919doCC 527.
A contrario sensu, pode o testador, também, valer-se dessa disposição para
efetivarumacompensaçãodecréditos.
Aratio da norma é garantir efetivamenteo cumprimentodo legado, devendo
eventualcréditodolegatárioemface(dopatrimônio)dotestadorsercobradoem
facedoespólio,nãosendocompensável,salvovontademanifestadoseuautor.
Dispositivodeintelecçãomenosimediataéoparágrafoúnicodareferidaregra
legal.
Defato,aoseafirmarque“subsistirá integralmenteo legado,seadívida lhe
foiposterior,eotestadorasolveuantesdemorrer”,parecequequisolegislador,
permitam-nos a expressão coloquial, “chover no molhado”, uma vez que se a
dívidaéposteriore já foisolvida,éóbvioquenãoháoquesequercogitarem
compensar. Contudo, o sentido da norma é o mesmo: preservar o legado e a
vontade do testador, não se admitindo interpretações que o vinculem a uma
causalidadenãoexpressa.
Osdireitosreais,obviamente,tambémpodemserobjetodelegado.
Afinaldecontas,apropriedadeéumadasbasesdoDireitodasSucessões.
Porisso,noâmbitodolegadodedireitosreais,bensmóveiseimóveis,objeto
de propriedade do testador, bem como certos direitos reais na coisa alheia,
podemserlegados.
Napartegeralsobrelegados,duasregrasespecíficasdedireitosreaisdevem
sermencionadas.
Aprimeira,dizrespeitoaolegadodeusufruto,emque,porforçadoart.1.921,
quando este for estipulado sem limitação temporal, “entende-se deixado ao
legatárioportodaasuavida”.Trata-sedeumusufrutovitalício,mas,obviamente,
nãoperpétuo,extinguindo-secomamortedolegatário.
Asegundaregraseencontraesculpidanoart.1.922:
“Art.1.922.Seaquelequelegarumimóvellheajuntardepoisnovasaquisições,estas,aindaquecontíguas,
nãosecompreendemnolegado,salvoexpressadeclaraçãoemcontráriodotestador.
Parágrafo único.Não se aplica o disposto neste artigo às benfeitorias necessárias, úteis ou voluptuárias
feitasnoprédiolegado”.
Trata-sederegradeevidenteclareza.
O legado, como qualquer disposição testamentária, deve ser interpretado
restritivamente.
Assim,qualqueraquisiçãoposterioraoestabelecimentodo legado,aindaque
vizinha,nãooamplia,salvomanifestaçãoespecíficadotestador.
Isso não se confunde com benfeitorias, uma vez que acompanham a própria
coisaprincipal,esedestinamàpreservação,aperfeiçoamentoouembelezamento
do mesmo bem (no caso, o objeto do legado) 528, devendo ser aplicada a
tradicionalregradequeoacessóriosegueasortedoprincipal.
Por fim, registre-se que também se admite o estabelecimento de legado de
alimentos, os quais, não sendo especificados em seu valor, deverão ser
interpretados, na forma do art. 1.920, como abrangendo o “sustento, a cura, o
vestuário e a casa, enquanto o legatário viver, além da educação, se ele for
menor”.
Ressaltamos, por fim, mais uma vez, que a tipologia apresentada não é
exaustiva.
Oúnicopontocomumdetodasessasmodalidadesclassificatóriasnosparece,
porém, o caráter patrimonial ou econômico da disposição, na perspectiva do
princípiodaautonomiaprivadaaplicadoaessetipoderelaçãojurídica.
Estudemos,agora,osefeitosdolegado.
6.EFEITOS
Conformejáestudamos,atransmissãodosbensdaherançasedáipsofactodo
eventomortis,porforçadoPrincípiodaSaisine 529.
Omesmosedáem relaçãoao legado, conformeseverificadoart.1.923do
CódigoCivil:
“Art.1.923.Desdeaaberturadasucessão,pertenceaolegatárioacoisacerta,existentenoacervo,salvo
seolegadoestiversobcondiçãosuspensiva.
§1.ºNãosedeferedeimediatoapossedacoisa,nemnelapodeolegatárioentrarporautoridadeprópria.
§2.ºOlegadodecoisacertaexistentenaherançatransferetambémaolegatárioosfrutosqueproduzir,
desdeamortedotestador,excetosedependentedecondiçãosuspensiva,oudetermoinicial”.
Observe-se,todavia,comcuidado,atécnicalegislativa.
Oquesetransmiteimediatamentecomamorteéapropriedade,nãoapossedo
bemlegado. .
Aregrado§2.º,porsuavez,nadamaisdizdoqueaaplicaçãodadisciplina
legaldosfrutos,que,comobensacessórios,seguemamesmasortedoprincipal.
A ressalva final, por sua vez, afigura-se desnecessária, pois, se houve
estabelecimento de condição (suspensiva) ou termo (inicial) pelo testador,
somentecomasuaimplementaçãoéquepoderáproduzirefeitos,oqueépróprio
doplanodaeficáciadoatonegocial 530.
Justamenteporissoéquepreceituaoart.1.924:
“Art. 1.924. O direito de pedir o legado não se exercerá, enquanto se litigue sobre a validade do
testamento,e,noslegadoscondicionais,ouaprazo,enquantoestejapendenteacondiçãoouoprazonãose
vença”.
Reconhecida a validade do negócio jurídico testamentário e não havendo
qualquer elemento acidental que retire sua eficácia, deve produzir efeitos
imediatamente.
Pode o legado, por sua vez, constituir-se em uma transferência patrimonial
monetária,aqual,obviamente,precisaráserrealizadaporalguém.
Nessecaso,oCódigoCivilbrasileiroestabelecealgumasimportantesregras.
O legado em dinheiro, nessa linha, “só vence juros desde o dia em que se
constituir emmora a pessoa obrigada a prestá-lo”, conforme estabelecido pelo
art.1.925.Talsedápelanecessidadedeseinterpelarapessoaobrigadaaprestar
tal legado,que,muitasvezes,podenemtersidocientificadaainda.Nessecaso,
não seria razoável se imputar juros quando não se tem fixado um termo
inequívocoparacaracterizaçãodamora,àluzdodeverdeinformaçãoemanado
dacláusulageraldeboa-féobjetiva 531.
Tratando-se de pagamento único, em valor fixo, a questão fica bem simples
realmente.
Maseseahipótesefordepagamentossucessivos?
Sobreotema,estabelecemosarts.1.927e1.928donossoCódigoCivil:
“Art.1.927.Seolegadofordequantidadescertas,emprestaçõesperiódicas,datarádamortedotestador
oprimeiroperíodo, e o legatário terádireito a cadaprestação, umavez encetado cadaumdosperíodos
sucessivos,aindaquevenhaafalecerantesdotermodele.
Art.1.928.Sendoperiódicasasprestações,sónotermodecadaperíodosepoderãoexigir.
Parágrafoúnico.Seasprestaçõesforemdeixadasa títulodealimentos,pagar-se-ãonocomeçodecada
período,semprequeoutracoisanãotenhadispostootestador”.
Registre-se,porém,que,nocasodeo“legadoconsistiremrendavitalíciaou
pensão periódica, esta ou aquela correrá da morte do testador”, como
estabelecidopeloart.1.926.
Eseolegadofordedarumacoisaincerta?
Na situação de legado “genérico”, há uma natural adaptação das regras do
DireitodasObrigações,conformejámencionamoslinhasacima.
Issoporque,seguindoa tradiçãodonossoDireito,oart.244doCC/2002 532
estabelece que, nas obrigações de dar coisa incerta, a escolha pertence ao
devedor.
Adaptando-seessaideiaaoDireitoSucessório,atribuiu-seodireitodeescolha
aoherdeiro,que,emgeral,éooneradoparaocumprimentodolegado:
“Art. 1.929. Se o legado consiste em coisa determinada pelo gênero, ao herdeiro tocará escolhê-la,
guardandoomeio-termoentreascongêneresdamelhorepiorqualidade”.
Poroutrolado,“quandoaescolhafordeixadaaarbítriodeterceiro;e,seeste
não a quiser ou não a puder exercer, ao juiz competirá fazê-la, guardado o
disposto na última parte do artigo antecedente”, como estabelecido pelo art.
1.930.
Quebrando a lógica da escolha “pelamédia”, o sistema codificado amplia a
liberdadedolegatário,quandootestadoratribuiaeleodireitodeescolha.
Nessesentido,estabeleceoart.1.931:
“Art.1.931.Seaopção foideixadaao legatário,estepoderáescolher,dogênerodeterminado,amelhor
coisaquehouvernaherança;e, senestanãoexistircoisade talgênero,dar-lhe-ádeoutracongênereo
herdeiro,observadaadisposiçãonaúltimapartedoart.1.929”.
Ea“quebradelógica”éperfeitamentedefensável.
Defato,seotestadorexpressamenteautorizouaescolhapelolegatário,oque
não estava obrigado a fazer, atribuiu a ele, com efeito, uma prerrogativa
diferenciada,facultando-lheaescolhadamelhorcoisa.
Tratando-se, não de legado de coisa incerta,mas, sim, de legado alternativo
(obrigação única compluralidade de objetos e dever de escolha de apenas um
deles), a “adaptação” doDireito dasObrigações à disciplina das Sucessões é
fielmenteseguida,presumindo-sedeixadaaoherdeiroaopção(art.1.932).
Porfim,saliente-seque,independentementedequemsejaotitulardodireitode
escolha (herdeiro ou legatário), o sistema codificado reconhece a sua
transmissibilidadecausamortis 533.
7.PAGAMENTO
A Seção II do Capítulo VII (“Dos Legados”) do Livro V (“Do Direito das
Sucessões”) do vigente Código Civil brasileiro é intitulada “Dos efeitos do
legadoedoseupagamento”.
Faz-senecessário teceralgumasconsideraçõesacercadaacepçãodapalavra
“pagamento”.
Está ela utilizada em seu sentido técnico-jurídico, que a identifica com o
“cumprimento”deobrigação jurídica,enãocomosentidocoloquialdeentrega
dedinheiro 534.
Porisso,amigoleitor,esclarecemosque,quandofalarmosem“pagamento”do
legado,entenda-sepor“cumprimento”dadisposiçãotestamentária.
Feitoesseesclarecimento,aperguntaaserfeitaé:aquemcabeocumprimento
(oupagamento)dolegado?
A resposta se encontra expressa no art. 1.934 do vigente Código Civil
brasileiro:
“Art. 1.934. No silêncio do testamento, o cumprimento dos legados incumbe aos herdeiros e, não os
havendo,aoslegatários,naproporçãodoqueherdaram.
Parágrafoúnico.Oencargoestabelecidonesteartigo,nãohavendodisposiçãotestamentáriaemcontrário,
caberáaoherdeirooulegatárioincumbidopelotestadordaexecuçãodolegado;quandoindicadosmaisde
um,osoneradosdividirãoentresioônus,naproporçãodoquerecebamdaherança”.
Obviamente, não se podeolvidar da figura do testamenteiro, que, caso tenha
sidodesignadoparatalmister,será,emnossopensar,apessoaresponsávelpela
tarefa,aplicando-seosupramencionadodispositivodeformasubsidiária,nocaso
denãohaversidoindicadotalsujeito.
Oque sedeve fazer,porém,quandose tratardeumsublegado 535, ou seja, a
hipótesedeolegadoconsistiremcoisapertencenteaherdeirooulegatário?
Nessasituação,oherdeirooulegatárioonerado—encarregadodecumpriro
legado—seráúnicaeexclusivamenteotitulardessebem 536,tendo,naformado
art.1.935,direitoderegressoemfacedosdemaiscoerdeiros,pelaquotadecada
um,salvoseocontrárioexpressamentedispôsotestador.
É preciso explicar melhor a possibilidade de ação regressiva contra os
coerdeiros.
Defato,aregra,comovistonoart.1.934,éocumprimentodoslegadospelos
herdeirose,nãooshavendo,aoslegatários,naproporçãodoqueherdaram.
Isso é fácil de visualizar, quando se estabelece, por exemplo, o legado de
determinada importância (R$ 10.000,00, por exemplo). Se apenas um é
encarregadodepagarolegado,faráissoexclusivamente.Semaisdeumherdeiro
ou legatário forem encarregados, farão cada um segundo o quinhão hereditário
quelhesfoireservado.
Todavia, o transcrito art. 1.935 trata de uma situação diferenciada: o legado
não é de bemda parte disponível da herança,mas, sim, da propriedade de um
herdeirooulegatáriodesignado.
Justamenteporissosóelepodecumprir.
Masnãoestáobrigado,apriori,acumprir.
Trata-sedeumônus,cujobônuséprecisamenteaaceitaçãodaherançaoudo
legado 537.
Caso o herdeiro ou legatário designado não cumpra efetivamente o legado,
entende-se que renunciou à herança ou ao legado, na forma do art. 1.913 do
CódigoCivil.
Cumprindo-o, porém, com a consequente diminuição imediata do seu
patrimônio pessoal para a realização de tal mister, garante o dispositivo um
“ressarcimento parcial”, consistente no regresso, em face dos coerdeiros,
observadaaproporçãodaquota-partedecadaum.
Nessa situação, recomenda-se ao herdeiro ou legatário designado que
verifique, “na ponta do lápis”, se é economicamente razoável a aceitação da
deixaemfacedacorrespondenteobrigaçãoassumida.
Atémesmoporquenadaimpedequeotestadorvedeapossibilidadedodireito
deregresso,conformeconstadapartefinaldodispositivoaquicomentado.
Emais!
Naformadoart.1.936,as“despesaseosriscosdaentregadolegadocorremà
contadolegatário,senãodispuserdiversamenteotestador”.
Definitivamente,podenãovalerapena.
Por fim,nos legadoscomencargo,aplica-seao legatárioamesmadisciplina
dasdoaçõesde igualnatureza(art.1.938doCC),quaissejam,asdoaçõescom
encargo,aqueserefereoart.553donossoCódigo 538.
Arrematandoestecapítulo,enfrentemosacaducidadedolegado.
8.CADUCIDADE
Olegadodecorredeumadisposiçãotestamentária.
Logo, como cláusula de um negócio jurídico, ainda que unilateral, está
submetidaaosplanosdeexistência,validadeeeficácia.
Existenteacláusula,ela,porcerto,podeserdeclaradanulaouanulável,caso
violealgumaregradevalidade.
Considerada válida, seu destino é o cumprimento, o que tratamos no tópico
anterior.
Pode,poroutro lado,o testador, aqualquer tempo revogá-la, excluindo-ado
testamento.
Abstraídas,porém,assituaçõesdeinvalidadeerevogação,umlegadopoderá
sofrerosefeitosdacaducidade.
Eoquesignificaisso?
Simplesmenteaperdadaeficácia,decorrentedecircunstânciaposterioràsua
estipulação.
Essaineficáciasupervenientepodesertotalouparcial,adependerdoalcance
dofatolimitadore/oudonúmerodelegadosestabelecidos.
Nessesentido,estabeleceoart.1.940:
“Art. 1.940. Se o legado for de duas ou mais coisas alternativamente, e algumas delas perecerem,
subsistiráquantoàsrestantes;perecendopartedeuma,valerá,quantoaoseuremanescente,olegado”.
Equecausasseriamessasqueretirariamaeficáciadoslegados?
A matéria é disciplinada pelo art. 1.939 da vigente codificação civil
brasileira 539,quemanteve,mutatismutandis,asrazõesoutroraprevistasnoart.
1.708doCódigoCivilbrasileirode1916.
As hipóteses, todas elencadas no referido dispositivo, podem ter natureza
objetiva,namedidaemqueserefiramaoobjetodolegado,ouíndolesubjetiva,
quandoserelacionaremàfiguradolegatário.
Ascausasobjetivassão:
a) Modificação de forma da coisa: se, depois do testamento, o testador
modificar a coisa legada, ao ponto de já não ter a forma nem lhe caber a
denominaçãoquepossuía(incisoI).
Nessasituação,oqueseteméaimpossibilidadedeindividualizaçãodacoisa,
naformacomoestabelecidanadisposiçãolegatária.
Eminteressanteobservação, lembramosamigosFLÁVIOTARTUCEeJOSÉ
FERNANDOSIMÃO:
“ParaEduardodeOliveiraLeite,ahipóteseseaplicaquandoacoisalegadasofrerespecificação(hipótese
deouroembarrasqueétransformadoemanéis,ouseja,dealteraçãodacoisaporumtrabalhohumano);
confusão(quandoduascoisaslíquidasougasosassemisturam,taiscomovinhoeágua),comistão(quando
duascoisassólidassemisturam,taiscomoosaleoaçúcar)ouquandoocorreadjunção(sobreposiçãode
coisas,talcomoatintaqueéaplicadasobreatela,formandoumtodo)(Direitocivil...,2004,v.6,p.249).
Éimportantedestacarqueacaducidadesóocorrequandoatransformaçãodacoisaéfeitapelotestador
ou à sua ordem. Na hipótese de alteração provocada por terceiro ou de caso fortuito, o legado
subsistirá” 540.
Registramos que, em sua parte final, a ratio da previsão normativa é
efetivamenteaperdadaformadacoisapelaatuaçãodotestador.
Talvezvalhaapena,porém,ponderar,mesmosemprevisãolegalespecífica,se
o dispositivo não poderia ser aplicável também para situações em que a
transformaçãoocorraporcircunstânciadistinta,umavezqueseobemchegoua
um ponto de não merecer sequer a denominação que possuía, potencialmente
perderiasentidoolegado.
b) Alienação total ou parcial da coisa: se o testador, por qualquer título,
alienarno todoouemparteacoisa legada,caducaráo legadoatéondeacoisa
deixoudepertenceraotestador(incisoII).
Conforme já vimos, o normalmente esperado é que o bem legado integre o
patrimônio do testador (embora haja a previsão da situação excepcional de
legadodecoisaalheia—art.1.913).
Nessecontexto,sevieraalienarobem—venderoudoar,porexemplo—o
legadoquedar-se-áineficaznoslimitesdopatrimôniodequesedispôs.
c)Perecimentoouevicção 541dacoisa:seacoisaperecerouforevicta(perda
pelo reconhecimento, judicial ou administrativo, do direito anterior de terceiro
sobre o bem), vivo ou morto o testador, sem culpa do herdeiro ou legatário
incumbidodoseucumprimento(incisoIII).
A hipótese é autoexplicativa, haja vista que é lógico que a perda do objeto
constituisituaçãodeineficáciadolegado.
Jáascausassubjetivas,porsuavez,são:
a)ExclusãodaSucessão:seo legatárioforexcluídodasucessão,nos termos
doart.1.815(incisoIV).
Otemadaexclusãodasucessãojáfoitratadopornósemcapítuloanterior 542.
Eaideiaésimples:seoindivíduofoiexcluídodasucessão,nostermosdoart.
1.815, perderá a condição de legatário. Assim, a previsão do legado, embora
existenteeválida,torna-seineficazporfaltadebeneficiáriolegitimado.
b)Premoriência:seolegatáriofalecerantesdotestador(incisoV).
Ofalecimentodolegatário,poróbvio,fazcessarasuapersonalidadejurídica.
Se esta ocorrer antes da abertura da sucessão, qualquer disposição
testamentáriaqueaelesereferirseráabsolutamenteineficaz.
Emsentidocontrário,sevierafalecerposteriormenteàaberturadasucessão,
já terá adquirido o direito ao legado, e, por consequência, os seus herdeiros
habilitar-se-ãoparareceberacoisalegada 543.
Compreendida a disciplina jurídica dos legados, convidamos você, amigo
leitor, a seguir conosco, no interessante estudo do Direito de Acrescer e da
ReduçãodasDisposiçõesTestamentárias.
CapítuloXIX
DireitodeAcrescereReduçãodasDisposiçõesTestamentárias
Sumário:1.Introdução.2.Direitodeacrescer.3.Reduçãodasdisposiçõestestamentárias.
1.INTRODUÇÃO
Nopresentecapítulo,cuidaremosdetratardedoistemasbastantesignificativos
paraaSucessãoTestamentária:odireitodeacrescereareduçãodasdisposições
testamentárias.
Trata-sedematériasque,postodespertemaatençãodadoutrina,encontram-se
detalhadamentepositivadasemnossoCódigoCivil.
2.DIREITODEACRESCER
Segundo ARMANDO GONÇALVES COIMBRA, inúmeras teorias tentaram
fundamentarjuridicamenteodireitodeacrescer 544.
Para a teoriadaunidadedoobjeto, defendida porBRUNNETTI, o instituto
sobcomentojustificar-se-ianofatodeossucessoresseremchamadosareceber
um objeto inteiro, de maneira que, faltando um desses beneficiados, os outros
teriamodireitodereceberaporçãofaltosa,queseriaacrescidaàsua.Trata-se
de teoria falível, segundoo jurista português, citandoPIRESDELIMA,pois a
própria herança é considerada uma universalidade, um todo único, até que se
ultimeapartilha.
Segundoateoriadaunidadededesignação,defendidaporNICOLÓ,odireito
de acrescer seria baseado no fato de os sucessores serem designados
unitariamente, ou seja, na mesma oportunidade, ou no mesmo ato, o que
justificariaqueoquinhãodeumacrescesseaodooutro.Tambémnãoconvence,
poisaosherdeirospodemserexpressamenteatribuídasquotasdiferentes.
Paraateoriadavontadedalei,odireitodeacresceramparar-se-iananorma
legal,enãonavontadedodecujus.Talideianãosesustenta,namedidaemqueo
próprio direito de acrescer poderá ser afastado pelo querer previamente
manifestadopelofalecido.
Finalmente, temos a teoria da vontade presumida do testador, adotada em
Portugal,segundoGONÇALVESCOIMBRA,etambémnoBrasil,segundoaqual
odireitodeacrescerfunda-senavontadepresumidadoautordaherança:
“Verificadosospressupostosdoacrescer,nãoestabelecendootestadorumasubstituiçãoenãoresultando
dotestamentoumadiversavontadedodecujusaplica-seodireitodeacrescer,poisnãoépossíveloutra
alternativa” 545.
Emnossodireitopositivo,odireitodeacrescer,reguladoapartirdoart.1.941
doCódigoCivil, é conferido quando vários herdeiros, pelamesma disposição
testamentária, forem conjuntamente chamados à herança em quinhões não
determinadosequalquerdelesnãopuderounãoquiseraceitá-la.Nessecaso,a
sua parte acrescerá à dos coerdeiros, ressalvado o eventual direito do
substituto 546.
Assim, uma disposição testamentária que contemple Huguinho, Zezinho e
Luisinho,semespecificaroquinhãodecadaum,poderáadmitiraincidênciado
direitodeacrescer,emfavordosdemaiscoerdeirosremanescentes,seHuguinho
renunciaràherança,edesdequenãotenhasidoprevistoumsubstituto.
Na mesma linha, a teor do art. 1.942, o direito de acrescer competirá aos
colegatários, quando nomeados conjuntamente a respeito de uma só coisa,
determinadae certa,ouquandooobjetodo legadonãopuder serdividido sem
riscodedesvalorização 547.
Nota-se,portanto,queodireitodeacresceréaplicadoquandoossucessores
sãoconjuntamentechamadosasuceder,emquinhõesnãodeterminados.
Eestaconjunçãodesucessores,segundoORLANDOGOMES,podesedarde
trêsformas:
“a)Retantum (conjunçãoreal)—ossucessoressãochamados,semdistribuiçãodepartes,emdiversas
disposiçõestestamentárias.Exemplo:emumacláusuladotestamento,diz:deixoomeuimóvelnapraia
paraPedroeemoutracláusulaafirma:deixotambémomeuimóvelnapraiaparaFrancisco;
b)Verbistantum(conjunçãoverbal)—osinstituídossãodesignadosnamesmadisposiçãotestamentária,
com indicação da parte que cabe a cada um, como se dá quando o testador, na mesma cláusula do
testamento, deixa o imóvel a Pedro e a Francisco, especificando que, a cada um, tocará a metade
(50%)dobem;
c)Reetverbis(conjunçãomista)—nestecaso,otestadordesigna,namesmadisposiçãotestamentária,
váriosherdeirosou legatários, semdistribuirou indicar, entreeles, aspartesquecabemacadaum.Éa
hipótese já figuradaemqueumadisposição testamentáriacontemplaHuguinho,ZezinhoeLuisinho, sem
especificar o quinhão de cada um. Diz-se mista, conclui o jurista baiano, ‘porque é re, visto haver
distribuiçãodepartes,averbis,porquenãoháváriasdisposições,senãoumasó’” 548.
A partir do esforço classificatório, amparado na doutrina desse grande
civilista,éforçosoconvirqueodireitodeacrescerocorreránaconjunçãoreale
namista,porquantoosquinhõesdosherdeirosnãoforamespecificados.
Vale dizer, se tais quinhões forem indicados, a admissibilidade do direito
afrontaria o princípio de resguardo à vontadedo testador, namedida emqueo
sucessor seria beneficiado além do limite estipulado pelo próprio autor de
herança.
Comisso,atémesmoopostuladodaautonomiaprivadacairiaporterra.
Assim,umaóbviaconclusãoseimpõe.
Caso não se efetue o direito de acrescer, transmite-se, por consequência,
segundoaordemdevocaçãohereditária,aosherdeiroslegítimos,aquotavagado
nomeado 549.
Eumapeculiarregraéconsagradapeloart.1.945doCódigoCivil:
“Art.1.945.Nãopodeobeneficiáriodoacréscimorepudiá-loseparadamentedaherançaoulegadoquelhe
caiba, salvo se o acréscimo comportar encargos especiais impostos pelo testador; nesse caso, uma vez
repudiado,reverteoacréscimoparaapessoaafavordequemosencargosforaminstituídos”.
Vale dizer, o repúdio à parte acrescida poderá, a depender da circunstância,
resultar na perda da própria deixa, ressalvada a hipótese de a parte acrescida
comportar encargos especiais impostos pelo testador, caso em que poderá ser
separadamenterepudiada.
Por “encargos especiais” entendam-se aqueles ônus especificamente
vinculadosàpartequeseacresceuequesereferiamaosucessororiginal.
Note-se,contudo,que,seosucessorrepudiaroacréscimo(onerado),anorma
dispõequeaparteacrescidatocaráaobeneficiáriodoreferidoencargo.
Todavia,adverteSÍLVIOVENOSA,“nãoserádefácildeslinde,naprática,o
caso concreto. Não se podendo identificar o beneficiário do encargo, ou não
podendoounãoquerendoreceberoacréscimo,estedeveseratribuídoaomonte
hereditário,distribuindo-seaoscoerdeiros” 550.
Finalmente, quanto ao legado de usufruto, caso este seja instituído
conjuntamente a duas ou mais pessoas, a parte da que faltar acresce aos
colegatários,ateordoart.1.946 551.
E,senãohouverconjunçãoentreoscolegatários,ouse,apesardeconjuntos,só
lhesfoilegadacertapartedousufruto,consolidar-se-ãonapropriedadeasquotas
dosque faltarem,àmedidaqueeles foremfaltando.Valedizer,o titulardanua
propriedade 552consolidará,proporcionalmente,asrespectivasquotas.
3.REDUÇÃODASDISPOSIÇÕESTESTAMENTÁRIAS
Inicialmente,édignodenotaqueovocábulo“redução”poderátersignificado
próprionaTeoriaGeraldoDireitoCivil.
Comefeito,conformevimosemnossovolume1,dedicadoaoestudodaParte
Geral:
“Reduçãoéaoperaçãopelaqualretiram-separtesinválidasdeumdeterminadonegócio,preservando-se
asdemais.Cuida-sedeumamedidasanatóriadonegóciojurídico” 553.
EmDireitodasSucessões,reduçãotemoutrosentido.
Conforme vimos ao longo de nossa obra, o Direito brasileiro preserva a
legítimadosherdeirosnecessários.
Nessesentido,comhabitualprecisão,FRANCISCOJOSÉCAHALI:
“Por sua vez, a Sucessão, no direito brasileiro, obedece ao sistema da divisão necessária, pelo qual a
vontadedoautordaherançanãopodeafastarcertosherdeiros—herdeirosnecessários—,entreosquais
deve ser partilhada, nomínimo,metade da herança, em quotas ideais (CC, arts. 1.789, 1.845 e 1.846).
Herdeironecessário,assim,éoparentecomdireitoaumaparcelamínimade50%doacervo,daqualnão
pode ser privado por disposição de última vontade, representando a sua existência uma limitação à
liberdadede testar.Estaclasseécompostapelocônjuge,descendenteseascendentesdodecujus (CC,
1.845), sem limitação de graus quanto aos dois últimos (filhos, netos, bisnetos etc., e pais, avós, bisavós
etc.).Sãoossucessoresquenãopodemserexcluídosdaherançaporvontadedotestador,salvoemcasos
específicosdedeserdação,previstosemlei.Senãoforesteocaso,oherdeironecessárioteráresguardada
suaparcela,casooautordaherançadecidafazertestamento,restringindo-se,destaforma,aextensãoda
partedisponívelparatransmissãodeapenasmetadedopatrimôniododecujus 554.
Ora, diante de tais ensinamentos, concluímos, com facilidade, que o
remanescente pertencerá aos herdeiros legítimos, quando o testador só em
partedispuserdaquotahereditáriadisponível(art.1.966).
Poroutrolado,asdisposiçõesqueexcederemapartedisponível,tantoparao
herdeiro como para o legatário, a teor do art. 1.967, reduzir-se-ão aos limites
dela,deconformidadecomasseguintesregras:
a) em se verificando excederem as disposições testamentárias a porção disponível, serão
proporcionalmentereduzidasasquotasdoherdeiroouherdeirosinstituídos,atéondebaste,e,nãobastando,
tambémoslegados,naproporçãodoseuvalor;
b)seotestador,prevenindoocaso,dispuserqueseinteirem,depreferência,certosherdeiroselegatários,
areduçãofar-se-ánosoutrosquinhõesoulegados,observando-seaseurespeitoaordemestabelecidano
parágrafoantecedente.
Areduçãodadisposição testamentáriavisa, portanto, a recompor a legítima,
ematençãoaodireitodosherdeirosnecessários 555.
A título de ilustração, tomemos alguns exemplos numéricos, no âmbito dos
legados,ensinadospelaqueridaProfessoraMARIAHELENADINIZ:
“Se o legado sujeito à redução consistir em prédio divisível, far-se-á a redução dividindo-o
proporcionalmente (CC, art. 1.968).Separa-se aparcelado imóvelque fornecessáriaparapreencher a
legítimadesfalcada.Seforimpossível,porém,suadivisão,porsetratardeprédioindivisível,eoexcessodo
legadomontaramaisdeumquartodovalordoprédio,olegatárionãoficarácomele,deixando-oempoder
doespólio,tendoapenasodireitodepediraosherdeirosovalorquelhecoubernametadedisponível.Seo
apartamento,objetodolegado,valerR$100.000,00,acusando-seexcessodeR$40.000,00sobrealegítima
(equivalenteamaisde1/4dovalordoprédio),oimóvelpermaneceránoespólioeolegatárioreceberáem
dinheiroR$60.000,00dosherdeiros.Seo seuexcessonão formaisdeumquartodovalordoprédio,o
legatáriooguardará, repondoaosherdeiros,emdinheiro,aparteexcedente (CC,art.1.968,§1.º).Seo
imóvelindivisível,objetodolegado,valerR$100.000,00,apontando-seumexcessodeR$20.000,00sobre
alegítima,portanto,emquantuminferioraumquartodovalordoimóvel,olegatáriocomeleficará,mas
reporáaosherdeirosaimportânciadeR$20.000,00.Todavia,‘seolegatárioforaomesmotempoherdeiro
necessário,poderá inteirarsua legítimanomesmoimóvel,depreferênciaaosoutros,semprequeelaea
parte subsistente do legado lhe absorverem o valor’ (CC, art. 1.968, § 2.º). Bastante elucidativo é o
exemplodadoporWashingtondeBarrosMonteiro:‘oprédiovaleR$1.000.000,00,areduçãodevemontar
a R$ 400.000,00 e a legítima do herdeiro é deR$ 600.000,00. Somando esse último valor com a parte
subsistentedolegadoR$600.000,00+R$600.000,00=R$1.200.000,00,absorvidoficaovalordetodoo
prédio.O interessado receberá assim o imóvel, de preferência aos demais herdeiros, repondo apenas o
excessoR$1.200.000,00—R$1.000.000,00=R$200.000,00” 556.
Vale lembrar que o mecanismo de proteção à legítima não se esgota com a
possibilidade de redução das disposições testamentárias, incidente quando da
colação e conferência dos respectivos quinhões 557, mas, também se opera por
meiodaaçãodenulidadededoaçãoinoficiosa.
Nessesentido,prelecionaumdoscoautoresdestaobra 558:
“OnossoDireitoPositivomanteve apreservaçãoda legítima, circunstânciaque se reflete no âmbitodo
DireitoContratual,especialmentenadoação,consoantepodemosobservardaanálisedosarts.544e549
doCódigoCivil:
‘Art. 544. A doação de ascendentes a descendentes, ou de um cônjuge a outro, importa
adiantamentodoquelhescabeporherança’.
‘Art.549.Nulaétambémadoaçãoquantoàpartequeexcederàdequeodoador,nomomentoda
liberalidade,poderiadisporemtestamento’.
Oqueolegisladorquerimpediréqueodoadordisponhagratuitamentedemaisdametadedasuaherança,
comviolaçãodalegítimadosherdeirosnecessários.Contrariosensu,seoatodeliberalidadenãoatingiro
direitodessacategoriadeherdeiros,seráreputadoválido.
Vale lembrar que para efeito desse cálculo se deverá considerar o valor do patrimônio do disponente,
quandodaalienação(ressuscitou-se,assim,adicçãodoart.1.796doCódigoCivilanterior,revogandoo
art.1.014doCódigodeProcessoCivil).
Interessanteéqueimportantesdiplomaslegaisnomundo,aotratardotema,estabelecemcomoparâmetro
paracálculodadoaçãoinoficiosaaaberturadasucessão:
CódigoCivilargentino:
‘Art.3.477.Losascendientesydescendientes,seanunosyotroslegítimosonaturales,quehubiesen
aceptado laherenciaconbeneficiode inventarioo sinél,debenreunira lamasahereditaria los
valoresdadosenvidaporeldifunto.
Dichosvaloresdebencomputarsealtiempodelaaperturadelasucesión,seaqueexistanonoen
poderdelheredero’.(introduzidopelaLein.17.711)
(...)
NoDireitoPositivobrasileiro, apósaentradaemvigordoCódigonovo,optou-seporparâmetrodiverso,
considerando-seovalordobemdoado,aotempodaliberalidade(art.2.004doCC,analisadoabaixo).
EstaéaprecisapreleçãodePAULOLUIZNETTOLÔBO:
Omomento de cada doação para se aferir o limite, somando-se as anteriores, é fundamental.O direito
brasileironãooptoupelomomentodaaberturadasucessãoparaseverificaroexcessodapartedisponível
oudalegítimadosherdeirosnecessários,masodaliberalidade.Opatrimôniosofreflutuaçõesdevalor,ao
longo do tempo, mercê das vicissitudes por que passa. Se a redução se der posteriormente à data da
doação, comprometendo a legítima, a nulidade não será retroativa. Se houve aumento do patrimônio,
posteriormenteaomomentodadoaçãoemexcesso,nãoalteraestefato;anulidadeécabível.Sedenada
poderiadispor,nomomentodadoação,todaelaénula 559.
Aquestão,todavia,nãoépacífica,havendoentendimentonosentidodequeovalorconsideradoaotempo
da doação somente é sustentável se o bem não mais integrava o patrimônio do donatário, quando da
colação.
Nessesentido,umdos‘EnunciadosdasJornadasdeDireitoCivil’(n.119):
Paraevitaroenriquecimentosemcausa,acolaçãoseráefetuadacombasenovalordaépocadadoação,
nostermosdocaputdoart.2.004,exclusivamentenahipóteseemqueobemdoadonãomaispertençaao
patrimôniododonatário.Seaocontrário,obemaindaintegrarseupatrimônio,acolaçãosefarácombase
novalordobemnaépocadaaberturada sucessão,nos termosdoartigo1.014,demodoapreservar a
quantiaqueefetivamenteintegraráalegítimaquandoestaseconstitui,ouseja,nadatadoóbito(Resultado
dainterpretaçãosistemáticadoCC2003e§§,juntamentecomoCC1.832e844).
Datavenia,nãoconcordamoscomesseentendimento.
Taldiversidadedetratamento,emnossopensar,éinsegura,consagrando‘doispesoseduasmedidas’para
uma situação explicitamente enfrentada e regulada pelo legislador: o art. 2.004, norma específica, é
claroaodisporqueovalordecolaçãodosbensdoadosseráaquele,certoouestimativo,quelhes
atribuiroatodeliberalidade.
Para tornar clara amatéria, umexemplo irá ilustrar a hipótese: imaginemosqueCaio seja titular de um
patrimônioavaliadoem100.000reais.Viúvo,temtrêsfilhos:Mévio,XistoeXerxes.Todos,comosabemos,
herdeirosnecessários.Poisbem.ImaginemosqueCaioresolvadoar50%doseupatrimônio(50.000)para
umterceiro.Nãohaveriaproblema,poisessaquotasairiadasuapartedisponível.Namesmalinha,poderia
tambémdoaressevalorparaumdosherdeirosnecessários(50%),oqual,inclusive,poderiajáreceber,a
títulodeadiantamento,asuapartenalegítima(16,66%).Oqueotestadornãopoderiaseriadoaraparte
disponível (50%) + uma quota que ultrapassasse os 16,66% correspondentes à legítima dos outros
herdeirosnecessários.Tais valores serãoconsideradosquandoda liberalidade, enãonomomento
damortedodoador 560.
Evaleaindalembrar,comLUIZEDSONFACHINeCARLOSEDUARDOPIANOVSKI,que:
O nascimento de mais um filho do de cujus após a doação consumada não alteraria, pois, os efeitos
jurídicos da doação, uma vez que, remarque-se, o excesso é apurado apenas no instante em que a
liberalidadeérealizada 561.
Nesse diapasão, em havendo violação da legítima, a doação, no que concerne a esse excesso, será
consideradanula,ateordoart.549doCódigoCivil” 562.
Tudoademonstrar,portanto,queosistemajurídicobrasileiroaindatemcomo
pedrafundamentalapreservaçãodalegítimadosherdeirosnecessários.
CapítuloXX
Substituições
Sumário: 1. Introdução. 2. Substituição vulgar ou ordinária. 3. Substituição recíproca. 4. Substituição
fideicomissária(fideicomisso).5.Substituiçãocompendiosa.
1.INTRODUÇÃO
Situação possível de ocorrer é a disposição testamentária quedar-se ineficaz
casoosucessornomeadonãorecebaaherança.
Discorrendo a esse respeito em clássica obra, CLÓVIS BEVILÁQUA
prelecionava:
“Prevendoahipótesede falhara instituiçãodeherdeiro,porumacircunstânciaqualquerenãoquerendo
morrer sem sucessores, que lhes continuassem a personalidade e perpetuassem o culto doméstico,
imaginaramos romanos dar, aos herdeiros nomeados, substitutos, que adissem à herança, se porventura
nãoarecolhessemosprimeiros.Substituiçãohereditáriaé,pois,umainstituiçãosubordinadaàoutra” 563.
Afastadaaideia,poucoútileanacrônica,dequeasubstituiçãotestamentária
serviriaparaaperpetuaçãodo“cultodoméstico”dafiguradopater,temosque,
defato,comojáacentuavamosantigos,cuida-sedeumaimportantedisposiçãode
vontadepormeiodaqualéprevistoumsubstitutoparaosucessornomeado,afim
de se preservar, em última ratio, a derradeira manifestação de vontade do
testador.
E, como estamos a tratar daSucessãoTestamentária, a presente figura ganha
ainda mais importância, na medida em que não seria aplicável o direito de
representação 564.
Note-sequeseotestadornomeiaMarcoscomoseuherdeiroeestenãoquerou
não pode aceitar — por haver falecido antes do primeiro, por exemplo— a
ausênciadeprevisãodeumsubstitutoresultarianoretornodadeixaparaomonte
partível,emfavordossucessoreslegítimos.
Mas, por meio da substituição testamentária, como dito, poderá ser
previamentedesignadooutrobeneficiárioparaadiràherança.
Ainda invocando a clássica lição deCLÓVISBEVILÁQUA, valemencionar
que,noatualestágiodonossoDireito,algumasformasdesubstituição,relevantes
no passado, perderam importância e espaço nos dias de hoje, a exemplo da
substituiçãopupilar (aquelaemqueopainomeavaherdeiroaseufilho,parao
casode ele falecer impúbere) eda substituiçãoexemplar ou quase pupilar (a
feitapeloascendentea seusdescendentes impedidosde testar,por enfermidade
mental,porexemplo) 565.
Mais recentemente, discorrendo sobre o tema, observa o professor SÍLVIO
VENOSA:
“Odireitoantigo tambémconheceuasubstituiçãopupilar.Nessadisposição,opater familias designa
umherdeiroaofilhoimpúbere,incapaz,sobseupátriopoder,paraque,emcasodemortetambémdofilho
semtestamento,nãoficasseelesemherdeiro,umavezqueaordemdevocaçãolegítimapoderianãosera
elesatisfatória.No tempodeJustiniano, tambémeraconhecidaasubstituiçãoquasepupilar, dedicada
aosinsanosdemente.Opaipoderiainstituirumherdeiroaofilhomentalmenteincapaz.Essasformasnão
foramadmitidasnodireitoatual” 566.
Remanescem,portanto,emnossosistema,asseguintes formasdesubstituição
testamentária:
a)SubstituiçãoVulgar(Ordinária);
b)SubstituiçãoRecíproca;
c)SubstituiçãoFideicomissária.
Vamosentãocompreendê-las.
2.SUBSTITUIÇÃOVULGAROUORDINÁRIA
Essamodalidadedesubstituiçãoéamaissimplesebásica,caracterizando-se
pelofatodeoprópriotestadorindicarosubstitutoaoherdeirooulegatário 567.
Aseurespeito,dispõeoart.1.947doCódigoCivil:
“Art.1.947.Otestadorpodesubstituiroutrapessoaaoherdeiroouaolegatárionomeado,paraocasode
umououtronãoquererounãopoderaceitaraherançaouolegado,presumindo-sequeasubstituiçãofoi
determinadaparaasduasalternativas,aindaqueotestadorsóaumaserefira”.
Exemplificam, nesse contexto, os brilhantes TARTUCE e SIMÃO, utilizando
personagenscomnomesbastantesugestivos:
“Vislumbrandoumcasoprático,ocorresubstituiçãovulgarquandoo testadornomeiaPabloseuherdeiro,
sendoque,casoelenãoqueiraounãopossareceberaherança,estaserádeRodolfo” 568.
É digno de nota, ainda, que “o substituto fica sujeito à condição ou encargo
imposto ao substituído, quando não for diversa a intenção manifestada pelo
testador,ounão resultaroutra coisadanaturezadacondiçãooudoencargo”, a
teor do art. 1.949.Vale dizer, uma condição estipulada (acontecimento futuro e
incerto que subordina a eficácia da disposição de vontade) ou um encargo
imposto (umônus)poderá recairnosubstituto, salvomanifestaçãoemcontrário
do próprio testador, ou, se o peculiar aspecto do elemento acidental previsto
impedir a sua aplicação em face de outrem (um encargo personalíssimo que
somenteosubstituídopoderiarealizar,porexemplo).
Conforme difundida classificação na doutrina 569, a substituição vulgar ou
ordináriapoderáser:
“a)Singularousimples—casoemqueo testador indicaapenasumsubstitutoaoseusucessor (nomeio
TARTAmeu herdeiro,mas, caso ele não queira ou não possa aceitar, a herança tocará a JOAQUIM).
Note-sequeotestadordirecionaasuavontadeparaapenasumsubstituto,previamenteindicado;
b) Plural ou Plúrima— caso em que o testador indica duas ou mais pessoas para, simultaneamente,
substituírem o herdeiro ou legatário. Esta forma de substituição está prevista na primeira parte do art.
1.948 do vigente Código Civil brasileiro, que dispõe: ‘também é lícito ao testador substituir muitas
pessoasporumasó,ouvice-versa’.Aoadmitir,contrariosensu,quemuitaspessoaspossamsubstituir
umasó, reconhece,pois, a substituiçãoplúrima.Exemplo:nomeioTARTAmeuherdeiro,e, casoelenão
queira ou não possa aceitar, a herança tocará aMARCOS,MAURICIO eMARCELO.Nada impede,
inclusive, combaseno respeito à vontademanifestada, que sejamestabelecidospercentuaismínimosou
máximosparacadaumdossubstitutos”.
Compreendidaa substituiçãovulgar,nas suasmodalidades simples (singular)
ou plúrima (plural), conheçamos, no próximo tópico, a figura da substituição
recíproca.
3.SUBSTITUIÇÃORECÍPROCA
Apardessasduasformasdesubstituiçãovulgarouordinária, temos,ainda,a
recíproca.
Preferimos,metodologicamente,paraamelhorcompreensãodo tema,estudá-
la,nãonobojodasubstituiçãovulgar,masaoseu lado, talcomodispostopelo
CódigoCivil,naSeçãoIdoCapítulo9doLivrodoDireitodasSucessões,ora
estudado.
Trata-sedeopçãometodológicaquepodevariarnadoutrina.
ORLANDOGOMES, por exemplo, afirma que “a substituição recíproca não
constitui modalidade independente, se não elemento acidental em qualquer das
espéciesdesubstituição” 570.
Entendemosque,defato,aessênciaéamesma,masnãosepodenegarcerta
especificidade à substituição recíproca, o que justificaria o seu tratamento
autônomo.
Nessalinha,apontaSÍLVIOVENOSA:
“Aoladodessasubstituiçãovulgar,enomesmonível, coloca-se a substituição recíproca, aquelapela
qual o testador, instituindo vários herdeiros ou legatários, os declara substitutos uns dos outros” 571
(grifamos).
Ora,nalinhadepensamentodoilustrejuristapaulistano,oqueestáaolado(e
nomesmoníveldecertoinstituto)nãoestá,porconsequência,nelecontido.
Trata-se,comefeito,deumamodalidadedesubstituiçãodireta,queguardaa
essênciadavulgar,masque se notabiliza pelo fato de os próprios sucessores
atuarem,unsemfacedosoutros,comoosseusprópriossubstitutos.
Sobreotema,apartefinaldojácitadoart.1.948dispõe:
“Art. 1.948. Também é lícito ao testador substituirmuitas pessoas por uma só, ou vice-versa, e ainda
substituircomreciprocidadeousemela(grifamos).
Note-seque,ateordoart.1.950,se,entremuitoscoerdeirosoulegatáriosde
partes desiguais, for estabelecida substituição recíproca, a proporção dos
quinhões fixada na primeira disposição entender-se-á mantida na segunda; se,
com as outras anteriormente nomeadas, for incluída mais alguma pessoa na
substituição,oquinhãovagopertenceráempartesiguaisaossubstitutos.
Exemplifiquemos.
O testador deixou 1/5 da herança para Alisson, 3/5 para Saló e 1/5 para
Kalline, nomeando-os como substitutos recíprocos.CasoAlissonnãoqueiraou
nãopossaaceitar,asuaparteserádivididaentreSalóeKalline,respeitadasas
proporçõesde3/5e1/5,respectivamente.
Convertendo em números, teríamos o seguinte: em face de uma herança
representadapor1.000,otestadordeixou200paraAlisson,600paraSalóe200
paraKalline.CasoAlissonnãoqueiraounãopossaaceitar,asuaparte,200,será
divididaentreSalóeKalline,ficando150paraSalóe50paraKalline.
Casoseja incluídooutrosubstituto, invocandoamesmahipótese,asoluçãoé
maissimples.
O testador deixou 1/5 da herança para Alisson, 3/5 para Saló e 1/5 para
Kalline. Nomeou-os reciprocamente substitutos, juntamente com Tiago. Caso
Alisson não queira ou não possa aceitar, a sua parte será dividida igualmente
entreSaló,KallineeTiago.
4.SUBSTITUIÇÃOFIDEICOMISSÁRIA(FIDEICOMISSO)
ITABAIANADEOLIVEIRA,emgrandiosaeclássicaobra,assimconceituava
ofideicomisso:
“Asubstituiçãofideicomissáriaéainstituiçãodeherdeirosoulegatários,feita
pelotestador,impondoaumdeles,ogravadooufiduciário,aobrigaçãode,por
sua morte, a certo tempo, ou sob certa condição, transmitir a outro, que se
qualifica de fideicomissário, a herança ou o legado; por exemplo: instituo por
meu herdeiro (ou legatário) Pedro, e, por sua morte, ou findo tal prazo, ou
verificadatalcondição,sejaherdeiro(oulegatário)Paulo” 572.
Datradicionalnoção,jásepodeconcluirqueofideicomissoconsisteemuma
formaindiretaouderivadadesubstituiçãotestamentária,quevisaabeneficiar,em
sequência,maisdeumsucessor.
Vale dizer, a teor do art. 1.951, poderá o testador instituir herdeiros ou
legatários,estabelecendoque,porocasiãodesuamorte,aherançaouolegadose
transmita ao fiduciário (1.º substituto), resolvendo-se o direito deste, por sua
morte,acertotempoousobcertacondição,emfavordeoutrem,quesequalifica
defideicomissário(2.ºsubstituto) 573.
Lembram TARTUCE e SIMÃO que há três espécies de substituição
fideicomissária 574:
“a)Substituição fideicomissária pormorte do fiduciário—casonada diga o testador, a transmissãodos
bensdofiduciárioaofideicomissárioocorrecomamortedoprimeiro(fideicomissoquummorietur) 575.
b)Substituiçãofideicomissáriasobcertacondição—éaquelarelacionadacomumeventofuturoeincerto.
Atítulodeexemplo:JOSÉdeixaosbensaofiduciárioJOÃOqueos transmitiráaoprimeirofilhodeseu
sobrinhoPEDRO,seeste forhomem.Casosejameninaa filhadePEDRO,nãohaverá transmissãoao
fideicomissário.Mesmoque se possa reconhecer o ‘machismo’ da condição, ela é válida em respeito à
vontademanifestadaporquempoderiadisporlivrementedeseupatrimônio.
c)Substituiçãofideicomissáriaatermo—estárelacionadacomumeventofuturoecerto.Exemplo:JOSÉ
deixaosbensaofiduciárioJOÃOpeloprazode10anos,apósoqueeste,então,ostransmitiráaoprimeiro
filho de seu sobrinho PEDRO. Há um prazo determinado para que os bens sejam transmitidos ao
fideicomissário”.
Trêsatores,portanto,participamdadinâmicadoinstituto:
a)otestador—denominadofideicomitente;
b)o1.ºsucessor—denominadofiduciário;
c)o2.ºsucessor—denominadofideicomissário.
Como lembra ORLANDO GOMES, o fideicomisso “caracteriza-se,
subjetivamente,peladuplicidadedaposição jurídicadosdestinatários.Ocupam
posições diversas, mas conexas. Uma, de titularidade temporária, outra
definitiva”, para concluir, em seguida, referindo-se ao fiduciário e ao
fideicomissário:
“Asduasposiçõesassumem-se,logicamente,nomesmomomento,comaaberturadasucessão,adquirindo
o fideicomissário a titularidade de um direito eventual diferido. Converte-se esse direito em adquirido e
atualnumsegundomomentocronologicamenteposterior,odaresoluçãododireitodofiduciário.Coincidem
eseidentificamnomesmoinstanteaperdadodireitoparaumeaaquisiçãopelooutro” 576.
Sem ofuscar o brilho dessas ideias, reputamos um tanto vaga a expressão
“direitoeventualdiferido”,relativoaofideicomissário,mas,defato,naausência
demelhorexpressão,éútilparatraduzirapotencialidadedeumdireitoquenão
seconcretizou,quetantopoderásercondicionalcomosujeitoaumtermo.
Édignode nota queo fiduciário tema propriedade da herança ou legado,
mas restrita e resolúvel — ou seja, temporária—, cabendo-lhe proceder ao
inventáriodosbensgravados,eaprestarcauçãoderestituí-los seoexigiro
fideicomissário(art.1.953doCC).
Nesseponto,salientamosnãohaveróbice,emnossopensar,aqueofiduciário
possa alienar o bem fideicomitido, posto o gravame o acompanhe, o que
implicaráriscodeperdaporpartedoadquirente 577.
Situaçãopeculiar,porseuturno,éadofideicomissoresidual,aquelequerecai
apenassobreosbensremanescentes,nãoalienadospelofiduciário 578.Emoutras
palavras, o testador poderá, à luz doprincípio da autonomiaprivada, autorizar
queofiduciárioalienelivrementepartedosbens,recaindoofideicomissoapenas
noquesobejar.
E, caso o fiduciário renuncie à herança ou ao legado, salvo disposição em
contráriodotestador,defere-seaofideicomissárioopoderdeaceitar(art.1.954
do CC), afastando-se, por óbvio, qualquer pretensão dos eventuais sucessores
legítimos.
Poroutrolado,seoprópriofideicomissáriorenunciaràherançaouaolegado,
ofideicomissocaducará,deixandodeserresolúvelapropriedadedofiduciário,
se não houver disposição contrária do autor da herança (art. 1.955).Omesmo
raciocínio é aplicável para a situação de falecimento anterior do
fideicomissário 579.
E, caso aceite, terá, o fideicomissário, direito à parte que, ao fiduciário, em
qualquertempo,acrescer,respondendopelosencargosremanescentesdaherança,
nostermosdosarts.1.956 580e1.957doCódigoCivil 581.
Umimportanteaspectodeve,ainda,serenfrentado.
O Código Civil de 2002 fora explícito no sentido de que a substituição
fideicomissáriasomentesepermiteemfavordosnãoconcebidosaotempoda
mortedotestador(art.1.952).
Trata-sedeumaconstruçãoinovadora,ausentenodiplomaanterior.
Eque,noplanofático,aniquilouoinstituto.
Aliás,ébemverdadeque,naprática,ofideicomissojáeradepoucautilidade
social,dadaacomplexidadedasuadinâmicaoperacional.
E,nosdiasdehoje,comalimitaçãoimpostapeloCódigode2002,nosentido
dequeasubstituiçãosomenteserápermitidaemfavordaprolenãoconcebidaao
tempo da morte do testador— vedação inexistente no diploma anterior—, é
forçoso convir que a sua aplicação torne-semuitomais frequente nos abstratos
exercíciosacadêmicosdoquenarealidadedavida.
Nãoháomenorsentidoemselimitaruminstitutojálimitadoporsuaprópria
naturezaesemumarazoáveljustificativasocialoudeordempública.
Por outro lado, se, ao tempo da morte do testador, já houver nascido o
fideicomissário?
Em tal caso, consoante o parágrafo único do referido art. 1.952 do Código
Civil (sem equivalente na codificação anterior), o fideicomissário adquirirá a
propriedade dos bens fideicometidos, convertendo-se em usufruto o direito do
fiduciário.
Trata-sedeumasoluçãoconfusa.
Equepioraaindamaisocontextodedecrepitudesocialdoinstituto.
Valedizer,se,aotempodamortedotestador,ofideicomissário(2.ºsubstituto)
jáhouvernascido,apropriedaderesolúveldosbensfideicomitidosnãotocaráao
fiduciário(1.ºsubstituto),mas,tãosomente,odireitorealdeusufruto.
Significaqueofiduciárioexerceráasfaculdadesreaisdegozo,usoefruição
dobem 582,tocandoaofideicomissárioapenasanuapropriedade.
E, como a lei não estabeleceu o período do usufruto, poderá, em tese, ser
vitalício,casonãohajamanifestaçãodotestadoremsentidocontrário.
Éinteressantenotarque,portradição,adoutrinabrasileirasempreseesforçou
emdiferenciarofideicomissodousufruto,namedidaemque:
“porvezes,otestadornãoésuficientementeclaro,oquedámargemadúvidas.Nãoimportaorótulodado
pelotestador,massuaverdadeiraintenção.Seotestadordeterminounadisposiçãoqueosbenspassema
outrapessoa,estaremosgeralmentediantedefideicomisso(Monteiro,1977,v.6:234).Sea instituiçãodo
beneficio é simultânea, haverá usufruto. Na dúvida, a melhor solução é entender que houve usufruto,
porque jáseatribuemdireitos imediatosaambososnomeados,porqueosdireitosdo fideicomissáriosão
falíveis,oquenãoocorrecomonu-proprietário.Nousufruto,nãosepodebeneficiarproleeventualdeuma
pessoa.Issosóocorreráporfideicomisso” 583.
Comefeito,postoadiagnosediferencialaindapossatereventualutilidadena
interpretação de uma cláusula testamentária, caso o fideicomissário já haja
nascidoaotempodamortedotestador,osinstitutossobanálise—fideicomissoe
usufruto—acabam,emtalhipótese,porseconfundir.
Finalmente, cumpre-nos observar que eventual nulidade da substituição
fideicomissária, reputada ilegal, não prejudicará, a teor do art. 1.960, a
instituição,quevalerásemoencargoresolutório.
É o caso, por exemplo, de o testador (fideicomitente) instituir como
fideicomissário um animal de estimação, que, como visto, não tem vocação
sucessória 584, caso em que a instituição valerá em favor do fiduciário,
consolidando-seapropriedadedobemtransmitido.
5.SUBSTITUIÇÃOCOMPENDIOSA
A título de complementação deste capítulo, vale a pena tecer algumas
consideraçõesacercadoinstitutodasubstituiçãocompendiosa.
Existecontrovérsia,inclusive,arespeitodasuadelimitaçãoconceitual.
ITABAIANA DE OLIVEIRA identifica-a com a própria substituição
fideicomissária:
“Esta substituição também se denomina de indireta, porque é concedida em termos oblíquos ou
deprecativos.EéamesmasubstituiçãocompendiosadasOrdenações,livro4,tít.87,§12” 585.
OutralinhadepensamentoéadeCLÓVISBEVILÁQUA,nosentidodequea
compendiosa seria aquela que incluísse, em uma só, a substituição vulgar e a
fideicomissária 586.
É o caso, por exemplo de o testador indicar substituto para o caso de o
fiduciário ou o fideicomissário não poder ou não querer aceitar a instituição.
Exemplo:otestadorestipulaqueaherançairáparaPedro(fiduciário)—e,caso
ele não queira, tocará a José—, transferindo-se, após determinado período de
tempo, a Joaquim (fideicomissário) — o qual poderá ser substituído por
Francisco,senãovieraaceitaradeixa.
Note-se que não há violação da regra proibitiva do fideicomisso além do
segundograu(art.1.959),poisasubstituiçãoseoperaverticalmente,emfacedos
doissucessoresoriginariamenteindicados.
Emnossosentir,a segunda linhadepensamentoémaisconvincenteemelhor
justificaaautonomiadaprópriacategoriaestudada.
Éa substituiçãocompendiosa,portanto, emnossoentender,uma substituição
mista, em que o testador dá potencial substituto tanto ao fiduciário quanto ao
fideicomissário, buscando antever situações emque umou outro não queira ou
nãopossaaceitaraherançaouolegado.
CapítuloXXI
ExtinçãodoTestamento(Invalidade,Caducidade,RevogaçãoeRompimento)
Sumário: 1. Introdução. 2. Considerações classificatórias. 3. Invalidade do testamento. 3.1. Prazo das
ações de invalidade de testamento. 3.2. Conversão do testamento nulo ou anulável. 4. Inexecução do
testamento.4.1.Caducidade.4.2.Revogação.4.3.Rompimento.
1.INTRODUÇÃO
Compreendidaadisciplinanormativaacercadotestamento,noquedizrespeito
à sua conceituação, classificação e tratamento legal 587, é preciso conhecer as
suasmodalidadesextintivasespecíficas.
Isso porque, tratando-se, o testamento, de um negócio jurídico, ainda que
unilateral,aelesãoaplicáveis,mutatismutandis,asformascorrespondentesde
extinçãodosnegóciosjurídicosemgeral.
Como se trata de um instituto com características próprias, algumas das
modalidades, todavia, possuemcertaspeculiaridades legais, cuja análise se faz
imprescindívelparaumaabrangentevisãodotema.
Éessaapropostadopresentecapítulo.
2.CONSIDERAÇÕESCLASSIFICATÓRIAS
A discussão acerca da “extinção do testamento”, em nosso pensar, abrange
tantooplanodavalidadequantoodaeficácia.
No primeiro plano, estudaremos a invalidade do testamento, seja pela
declaração de nulidade absoluta, seja pela decretação da nulidade relativa
(anulabilidade).
Já no campo da eficácia, três temas distintos devem ser enfrentados, quais
sejamacaducidade,arevogaçãoeorompimento,todospressupondoavalidade
donegóciojurídico,mascomdisciplinanormativadiferenciada,inclusivequanto
àssuasconsequências.
Avancemos, portanto, para compreender cada uma das modalidades
separadamente.
3.INVALIDADEDOTESTAMENTO
Reconhecido o testamento comoumnegócio jurídico unilateral, será nulo ou
anulável,adependerdovícioqueoacometa,seguindoasregrasdosarts.166a
184dovigenteCódigoCivilbrasileiro 588.
Assim, seguindo a regra geral das nulidades absolutas, podemos afirmar que
seránulootestamentoquando:
a) celebrado por absolutamente incapaz (aplicação do art. 166, I, do CC):
imagine-seumtestamentofeitoporumacriançade10anosdeidade.Aideiade
incapacidadedevesercompreendidatambémsobaóticadavocaçãohereditária,
sendo nula a disposição para quem não tem capacidade para adquirir por
testamento,como,porexemplo,animaisecoisas 589;
b)forilícito,impossívelouindeterminávelseuobjeto(aplicaçãodoart.166,
II,doCC):éocaso,respectivamente,detestamentosquetransfiramatitularidade
dedrogasproibidas(objetoilícito),benspúblicos(impossíveljuridicamente)ou,
simplesmente,“algumacoisa”semnominá-la(objetoindeterminável);
c)omotivodeterminantefoiilícito(aplicaçãodoart.166,III,doCC):embora
a norma refira “motivo determinante comum a ambas as partes”, não podemos
conceber seja considerado válido um testamento cuja finalidade ou motivo
determinante (causa)afigure-secontráriaaoordenamento jurídico.Valedizer, a
par de sua natureza unilateral, uma causa desvirtuada poderia, sem dúvida,
contaminar o próprio ato.Enão se diga ser, o testamento, umatonegocial não
causal, uma vez que, assim como na doação, objetiva-se deferir um benefício
patrimonial a um terceiro. Ainda que se trate de negócios com características
distintas, ambos sãodotadosdeuma razãocausaldeterminante.Naperspectiva
doantigoditado,aliás,ondeháamesmarazão,devehaveromesmodireito 590;
d)nãorevestiraformaprescritaemleiouforpreteridasolenidadequea lei
considereessencial (aplicaçãodashipótesesdos incisos IVeVdoart.166do
CC):nesseaspecto,éfundamentalressaltaraimportânciaqueédadaàformano
testamento, que pode ser considerado, juntamente com o casamento, um dos
negóciosjurídicosmaissolenesdoordenamentobrasileiro 591;
e)tiverporobjetivofraudarleiimperativa(aplicaçãodoart.166,VI,doCC):
trata-sedehipótesepoucofrequentenaprática,vistoqueteoricamentepossível.É
caso do sujeito que se vale de um testamento para instituir fundação com o
objetivoderealizarlavagemdedinheiroesonegaçãofiscal;
f) a lei taxativamente o declarar nulo ou proibir-lhe a prática, sem cominar
sanção (aplicação do art. 166,VII, doCC): é o caso das formas proibidas de
testamento,aexemplodoconjuntivo 592;
g) simular outro negócio jurídico (aplicação do art. 167 do CC):
diferentemente do dolo, a simulação, tal como tratada em nosso sistema,
pressupõeumacordodevontades.Valedizer,aspartescriamumnegóciojurídico
aparentementenormaldestinadoanãogerarefeitoalgum(simulaçãoabsoluta)ou
aencobriroutronegóciocujosefeitossãoproibidosporlei(simulaçãorelativa).
Ora,considerando-sequeotestamentoé,geneticamente,unilateral,reconhecemos
certa dificuldade em subsumi-lo na presente categoria (negócio simulado), na
medida em que não há convergência de vontades em sua formação, o que não
impedirá, por óbvio, a eventual existência de outros vícios, conforme já
mencionado.Mas,emumsupremoesforçoacadêmico,figuramosapossibilidade
de se tentar encobrir uma doaçãomortiscausa, vedada em nosso sistema, por
meio de um testamento, conferindo-se, de logo, o bem doado, ao donatário.
Haveria uma possível simulação relativa, dados os efeitos imediatos proibidos
quesepretendeuproduzir.
Valedestacar,porfim,queashipótesesdenulidadenãose limitamàsregras
gerais do negócio jurídico, havendo previsão específica de nulidade de
disposiçõestestamentárias,conformeseconstatanaleituradoart.1.900 593.
Namesmalinha,tambémlhessãoaplicáveis,noqueforpossível,asregrasde
nulidade relativa dos negócios jurídicos, previstas no art. 171, notadamente no
quedizrespeitoaosvíciosdeconsentimento.
Todavia,háumaperguntaquenãoquercalar.
Háprazoparaoajuizamentodasaçõesdeinvalidadedetestamento?Qualseria
ele?
Éoqueenfrentaremosnopróximosubtópico.
3.1.Prazodasaçõesdeinvalidadedetestamento
Diante da regra positivada no art. 169 do CC (sem correspondência na
codificação anterior), de que o “negócio jurídico nulo não é suscetível de
confirmação,nemconvalescepelodecursodotempo”,seriapossívelsefalarem
prazoparaoexercíciodeumaaçãodeinvalidadedetestamentonulo?
Issoporque,sendootestamentoumnegóciojurídico,deveriatalregra,emtese,
sertambémaplicávelaele,ouseja,nãodeveriahaverprazoparaoexercíciode
talpostulação,emsetratandodenulidadeabsoluta.
Todavia,nocasodotestamento,háregraespecífica.
Defato,fundamentadonaideiadesegurançadasrelaçõesjurídicas,ovigente
CódigoCivilbrasileiroestabeleceu,noseuart.1.859(semqualquerequivalência
diretanoCC/1916):
“Art.1.859.Extingue-seemcincoanosodireitodeimpugnaravalidadedotestamento,contadooprazoda
datadoseuregistro”.
Trata-se de um prazo decadencial, uma vez que se trata do exercício de um
direitopotestativo.
Emnossalinhadepensamento,entendemossertalprazoaplicáveltantoparaas
nulidadesabsolutasquantoparaasrelativas,porsetratarderegraespecíficada
disciplinatestamentária,oquetemencontradorespaldonadoutrinamajoritária.
Todavia, aquestãonão é tão simples, oquenão chega a surpreender emum
ramodoDireitotãomarcadopordissensõesdoutrinárias,especialmenteemsua
perspectivasistemática 594.
Nesse contexto, reconhecemos, comodito, a existênciadoprazo,denatureza
decadencial,paraadesconstituiçãodonegóciojurídicotestamentário,emfunção
deeventualnulidade,absolutaourelativa.
Contudo, se o prazo genérico, para tal fim, é o quinquenal, previsto no
mencionadoart.1.859,oprazoseráoutro,seanulidade(nestecaso,relativa)for
decorrente de vícios de consentimento— erro, dolo ou coação— compatíveis
comanaturezajurídicadotestamento.
Com efeito, um prazo quadrienal é estabelecido pelo art. 1.909 do CC, nos
seguintestermos:
“Art.1.909.Sãoanuláveisasdisposiçõestestamentáriasinquinadasdeerro,dolooucoação.
Parágrafo único. Extingue-se em quatro anos o direito de anular a disposição, contados de quando o
interessadotiverconhecimentodovício”.
Assim,sistematizandoamatéria,temosqueosprazosdecadenciaisparaaação
deinvalidadedetestamentoserãoosseguintes:
a) cinco anos: ação de invalidade de testamento por nulidade absoluta ou
relativa;
b)quatroanos:açãoanulatóriade testamento(nulidaderelativa),emcasode
erro,dolooucoação.
Dessaconclusãopreliminar,pode-seextrairumasegundacomoconsequência
lógica: o prazoquadrienal, para os vícios de consentimento, coaduna-se coma
regradoart.178doCC,paraosnegóciosjurídicosemgeral.
Mas, uma vez que o testamento é um negócio jurídico, poderia ser ele
submetidoaofenômenodaconversão?
3.2.Conversãodotestamentonuloouanulável
UmadasmaisaplaudidasinovaçõesdoCódigoCivilbrasileirode2002foio
acolhimentodateoriadaconversãodonegóciojurídico.
Comefeito,preceituaoart.170:
“Art.170.Se,porém,onegóciojurídiconulocontiverosrequisitosdeoutro,subsistiráestequandoofima
quevisavamaspartespermitirsuporqueoteriamquerido,sehouvessemprevistoanulidade”.
Conforme já expusemos em outra oportunidade 595,MARCOSBERNARDES
DE MELLO define a medida conservatória como “o expediente técnico de
aproveitar-se comooutro ato jurídicoválido aquele inválido,nuloou anulável,
paraofimaquefoirealizado” 596.
CARLOSALBERTOBITTAR,porsuavez,afirmava:
“Aconversão é, pois, a operaçãopelaqual, comos elementosmateriais denegócionuloou anulado, se
pode reconstituir outro negócio, respeitadas as condições de admissibilidade. Cuida-se de expediente
técnico que o ordenamento põe à disposição dos interessados para imprimir expressão jurídica a
manifestaçõesdevontadenegocial,nãoobedientes,noentanto,apressupostosouarequisitos” 597.
JOÃO ALBERTO SCHÜTZER DEL NERO, em sua excelente tese de
doutoramento Conversão Substancial do Negócio Jurídico, posteriormente
convertida em obra jurídica, adverte que GIUSEPPE SATTA, na Itália, assim
defineaconversão:
“Nalinguagemcomum,entende-seporconversãooatoporforçadoqual,emcasodenulidadedonegócio
jurídicoqueridoprincipalmente,abre-seàspartesocaminhoparafazervaleroutro,queseapresentacomo
quecompreendidonoprimeiroeencontranosescombros(rovine)desteosrequisitosnecessáriosparaa
suaexistência,dequeseriamexemplos:a)umavendasimulada,quepoderiaconterosrequisitosdeuma
doação;eb)umatopúbliconulo,quepoderiaconterosrequisitosdeumaescrituraprivada” 598.
Trata-se,portanto,deumamedidasanatória,pormeiodaqualaproveitam-se
oselementosmateriaisdeumnegóciojurídiconuloouanulável,convertendo-
o, juridicamente, e de acordo com a vontade das partes, em outro negócio
válidoedefinslícitos.
Retira-se, portanto, o ato negocial da categoria em que seria considerado
inválido, inserindo-o em outra, na qual a nulidade absoluta ou relativa que o
inquinaseráconsideradasanada,àluzdoprincípiodaconservação.
Nessediapasão,atente-separaaadvertênciadeKARLLARENZ,nosentidode
quenãoseadmiteaconversãoseonegócioperseguidopelaspartespersegue
finsimoraisouilícitos 599.
A conversão exige, para a sua configuração, a concorrência dos seguintes
pressupostos:
a) material — aproveitam-se os elementos fáticos do negócio inválido,
convertendo-oparaacategoriajurídicadoatoválido;
b) imaterial — a intenção dos declarantes direcionada à obtenção da
conversão negocial, e consequente recategorização jurídica do negócio
inválido.
Podem-seapontaralgunsexemplosclássicosdeconversãosubstancial:anota
promissória nula por inobservância dos requisitos legais de validade é
aproveitadacomoconfissãodedívida;ocontratodecompraevendadeimóvel
valioso, firmado em instrumento particular, nulo de pleno direito por vício de
forma,converte-seempromessairretratáveldecompraevenda,paraaqualnão
seexigeaformapública.
Trata-se,nestalinha,daconversãosubstancial,aqualdizrespeitoaoconteúdo
donegóciojurídicoemsi,enãodaconversãolegal 600.
NocampodasSucessões,semmenoscabarmosaimportânciadaformaparao
negócio jurídico testamentário,parece-nosbastanterazoávelaplicara teoriaem
situações justificadas, como, por exemplo, na hipótese de uma doaçãomortis
causa(inválida),queseconverteriaemestipulaçãotestamentáriadeumlegado,
desdequerespeitadasasnormasdaSucessãoTestamentária,semaocorrênciade
simulaçãoououtrovício,eemseobservandoavontadedofalecido.
Nomesmo sentido, um testamento que trate de um objeto de pequeno valor,
celebradosemaassinaturadetestemunhas,poderiaserconvertidoemcodicilo.
Tambémtrazendovariadosexemplos,ensinamosamigosTARTUCEeSIMÃO:
“Primeiramente,umtestamentocujoobjetosejaumbemdepequenovalorquefoifeitosemassinaturade
testemunhas pode converter-se em codicilo (conversão substancial). A jurisprudência nacional vem
admitindoessaformadeconversão(RT327/277).
Vale dizer que o Código Civil italiano traz exemplo clássico de conversão formal de testamento. O
diplomadeterminaemseuart. 607queo testamentocerrado,umavezquenão tenhaas características
preenchidas, terá efeito como testamento hológrafo, contanto que preencha os requisitos deste (‘Il
testamento segreto, che manca di qualche requisito suo proprio, ha effetto como testamento
olografo,qualoradiquestoabbiairequisiti’).
Imagine-seumtestamentopúblicoquecontacomaassinaturadequatrotestemunhas(apesardealeisó
exigir duas), que, por um lapso, deixa de ser assinado pelo Tabelião. Como instrumento público, o
testamento é nulo, mas converte-se em testamento particular (que só exige a presença de três
testemunhas), ocorrendoa conversão formal, pois a formapúblicanula converte-se em formaparticular
válida.Note-sequeonegóciojurídicooriginaléumtestamentoeoconvertidotambémoé.
Poroutrolado,umadoaçãomortiscausapodeseconverteremlegadosepresentesosrequisitosformais
de validade. Sobre o tema, explica Wania do Carmo de Carvalho Triginelli que ‘no sistema jurídico
brasileironãoépacíficaaadmissãodafiguradadoaçãomortiscausa,emborapareçaserpossívelaceitá-
laatépelofato(nãosó)deoart.314doCódigoCivilde1916aelasereferirexpressamente,apesardea
referência encontrar-se no tópico destinado à doação propter nuptias. Admitida a figura no sistema
jurídico brasileiro, o caso referido seria típico de conversão do negócio jurídico’ (Conversão..., 2003, p.
166).
Emconclusão,comaexpressadisposiçãodoart.170doCCde2002,aconversãodotestamentonulonão
só se torna possível, afastando qualquer debate que exista sob a égide do revogadoCódigoCivil, como
também desejável, pois dá efetividade à vontade do morto, preservando a sua autonomia privada e
conservandoonegóciojurídicocelebrado” 601.
Trata-se,semdúvida,deumateoriabastanteútilparaaobservânciaefetivado
respeito à vontade manifestada do testador, o que deve ser levado em
consideraçãonainterpretaçãodotestamentocomoprincípiobásico,inclusiveem
sededediscussãodeumaeventualinvalidade 602.
Não sendo possível, por outro lado, a conversão do testamento, impõe-se o
reconhecimento da nulidade, caso tenha sidomanejada tempestivamente a ação
própria,passando-seaproduzirosefeitosdaSucessãoLegítima.
4.INEXECUÇÃODOTESTAMENTO
Pelotermo“inexecução”dotestamento,costumamosabrangersituaçõesemque
onegócio jurídico testamentário,mesmoestandoapto,dopontodevistadasua
validade,nãopoderámaisproduzirefeitos.
No esforço sistematizador que empreendemos ao longo da obra, parece-nos
relevante classificar tais situações, todas no plano da eficácia, em três
modalidades:acaducidade,arevogaçãoeorompimentodotestamento.
Vamosconhecê-las.
4.1.Caducidade
Consiste a caducidade de um testamento na perda de sua eficácia por
circunstânciasupervenienteaomomentodasuacelebração.
Trata-se de uma hipótese que não foi mencionada de forma expressa em
capítulopróprionacodificaçãocivil,masqueseencontramencionada,deforma
difusa,emdiversosdispositivosnormativosdotextolegal,inclusivenadisciplina
doslegados,oquejáfoiobjetodeanáliseanterior 603.
Em louvável trabalho classificatório, sintetiza MARIA HELENA DINIZ as
hipótesesdecaducidade:
“Otestamentocaducará:
1.º)Seoherdeiroinstituídopremorreraotestadorousimultaneamenteaele(CC,arts.8.ºe1.943).
2.º)Seonomeadofalecerantesdoimplementodacondiçãodaqualdependiaaherançaoulegado.
3.º) Se a condição suspensiva imposta pelo disponente não puder ser realizada (CC, arts. 125, 1.809 e
1.943).
4.º)Seoherdeiroinstituídoouolegatáriorenunciaràherançaouaolegado,forincapazdeherdaroufor
excluídodasucessão(CC,arts.1.943,1.798,1.799,1.801e1.971).
5.º) Se houver modificação substancial ou perecimento de coisa legada por caso fortuito, pois, se a
destruiçãosederporculpadoherdeiro,olegatárioterádireitoaperdasedanos,e,seocorrerofatopor
atoculposodoprópriolegatário,nenhumdireitolheassiste.
6.º)Se,nashipótesesdetestamentoespecial(marítimo,aeronáuticooumilitar),otestadornãofinarnasua
viagemouemcampanhaounãopromoverasmedidaslegaisparaconvalescerseuatodeúltimavontade
(CC,arts.1.891e1.895).
Havendocaducidadedacédula testamentáriaporqualquerumadessascausas,asucessãotestamentária
transformar-se-áemlegítima,comosenãohouvessequalquer testamento(CC,art.1.788).Entretanto,a
vocaçãodossucessoreslegítimosdeixarádeocorrernoscasosemquehouveradmissibilidadedodireitode
acrescer(CC,arts.1.941a1.943),ou,então,seotestadornomeousubstitutoaoherdeirooulegatário,que
recolheráaherançaouolegado(CC,arts.1.943,1.947e1.951)” 604.
Tomando como premissas as hipóteses sistematizadas pela ilustre professora
citada, entendemos que, ocorrendo a caducidade, duas consequências poderão
advir,deacordocomasregrasdonossoDireitovigente:
a)seaineficáciaabrangeratodososherdeirosoulegatárioseelesnãotiverem
substitutos, toda a herança, por óbvio, passa a ser regulada pelas normas da
SucessãoLegítima;
b) se não abranger todos os herdeiros ou legatários e, não tendo eles
substitutos,emhavendoodireitodeacrescerentreeles,atransmissãodaherança
poderácontinuaraserregidapelaSucessãoTestamentária.
Compreendidaacaducidade,passemosatratardarevogaçãodotestamento.
4.2.Revogação
Conformejáexpusemosemvolumeanterior 605,arevogaçãoconsisteemuma
modalidade de desfazimento de determinados negócios jurídicos, por iniciativa
deumadaspartesisoladamente.
É o exemplo clássico da resilição unilateralmente feita nos contratos de
mandato(arts.682a687doCC)edoação(arts.555a564doCC).
Emboranãosejaumcontrato,mas,sim,umnegóciojurídicounilateral,também
em face do testamento é utilizado o vocábulo “revogação”, no sentido aqui
tratado, o que é objeto de previsão legal expressa (arts. 1.969 a 1.972 do
CC/2002).
Comomodalidadeextintivaespecíficadotestamento,arevogaçãodevesedar
do mesmo modo e forma com que fora feito o negócio jurídico que se quer
revogar 606.
Tal revogação,na formadocaput doart.1.970doCódigoCivil,poderá ser
totalouparcial.
Registre-se,porém,quesearevogaçãoforparcialouseotestamentoposterior
nãocontivercláusularevogatóriaexpressa,onegóciojurídicounilateralanterior
subsisteemtudoquenãoforcontrárioàsnovasdisposiçõestestamentárias.
Regralógicaéestabelecidapeloart.1.971doCódigoCivil:
“Art.1.971.Arevogaçãoproduziráseusefeitos,aindaquandootestamento,queaencerra,vieracaducar
porexclusão,incapacidadeourenúnciadoherdeironelenomeado;nãovalerá,seotestamentorevogatório
foranuladoporomissãoouinfraçãodesolenidadesessenciaisouporvíciosintrínsecos”.
Aproduçãodeefeitosdo testamentorevogadordependerá,portanto,dassuas
própriascircunstâncias.
Com efeito, é forçoso convir que, se o testamento revogatório for anulado,
significa dizer que ele foi rechaçado no plano da validade, não podendo,
naturalmente,produzirefeitos.
Por fim, traz o art. 1.972 do Código Civil uma “presunção de revogação”
quandootestamentocerrado forabertooudilaceradopelo testador (oumesmo
porterceiro,comoseuconsentimento).
Istoporqueédaessênciado testamentocerradoapreservaçãodoseusigilo.
Ora, uma vez tendo sido quebrada a verdadeira garantia de segurança, pelo
própriotestador(ouporterceiroseguindoasuavontade),otestamentoperderáa
suafinalidadee,portanto,asuaprópriaeficácia.
Ocorrendoarevogação,duasconsequênciaslógicaspodemadvir:
a)searevogaçãofortotal,todaaherançapassaaserreguladapelaSucessão
Legítima,casonãohajanovaestipulaçãotestamentária;
b) se a revogação for parcial — isso significa que ainda há disposição
testamentária válida e eficaz —, a herança continuará regida pela Sucessão
Testamentária, obviamente na parte disponível do patrimônio deixado pelo de
cujus,segundoasuavontademanifestada.
Sobre a “revogação do testamento revogatório”, observa ORLANDO
GOMES:
“Emprincípio,oprimeirotestamentorevogadonãorecobrasuaforçacomarevogaçãodotestamentoque
o tornou insubsistente. Produz-se, em suma, o efeito da revogação, tenha sido expressa ou tácita. Pela
circunstância de ter sido, por sua vez, revogado o testamento que o revogara, o anterior não readquire
eficácia.
Nada impede, todavia, que, ao revogar o testamento revogatório, declare o testador a vontade de que
reviva o testamento primitivamente revogado, ou algumas de suas disposições.É lícito ao testador, com
efeito,fazerreviverdisposiçõestestamentáriasjárevogadas,necessáriosendo,porém,quemanifestesua
intenção desenganadamente. Dessa exigência resulta a inadmissibilidade de tácita revogação de
revogação.
Disputou-se acerca da necessidade de repetir o testador as disposições testamentárias as quais quer
revigorar, entendendo numerosos doutores que a ressurreição dependia da reprodução, no terceiro
testamento, de tais cláusulas. Correto, no entanto, é o entendimento contrário. Basta que o testador
confirmeasdeclaraçõesdoprimeiro testamento, atéporque trazendo-asparaooutronãoestará a rigor
revigorando cláusulas insubsistentes, senão renovando-as em outro testamento, por tal modo que não
cogitardoqueforarevogadopelorevogatório.Seria,afinal,novotestamentonaformaenoconteúdo.O
problemadeixariadeexistir.Oriscodeincerteza,invocadopelosquetememasimplesconfirmação,pode
serafastadoporinterpretaçãocuidadosadavontadedotestador” 607.
Compreendidaatemáticadarevogaçãodotestamento,conheçamosasuaúltima
modalidadeextintiva:orompimentodotestamento.
Vamosaela.
4.3.Rompimento
O rompimento (ou ruptura) é uma modalidade extintiva especificamente
aplicávelaotestamento.
De fato, todas as demais modalidades aqui tratadas decorrem, direta ou
indiretamente,dadisciplinageraldonegóciojurídico.
Comorompimento,não.
Trata-sedeumaformamuitopeculiar,emqueosurgimentodeumdescendente
sucessível 608 ou outro herdeiro necessário— que o testador não tinha ou
desconheciaquandotestou—fazcessarosefeitosdotestamento.
Nessesentido,confiram-seosarts.1.973e1.974doCódigoCivil:
“Art. 1.973. Sobrevindo descendente sucessível ao testador, que não o tinha ou não o conhecia quando
testou,rompe-seotestamentoemtodasassuasdisposições,seessedescendentesobreviveraotestador.
Art.1.974.Rompe-setambémotestamentofeitonaignorânciadeexistiremoutrosherdeirosnecessários”.
Osentidodanormaémuitosimples.
Se, quando celebrou o testamento, o testador desconhecia a existência de
herdeiro sucessível, não haveria, por consequência, como lhe direcionar o
patrimônio,emfrancaviolaçãoaoprincípiodaautonomiaprivada.
Omesmoraciocínioseriaaplicávelseaindanãoexistisseoreferidoherdeiro
aotempodafeituradotestamento.
Se o testador, porém, já tinha herdeiros necessários e, mesmo assim, fez a
disposição testamentária não o contemplando ou o excluindo, não há falar em
rompimento 609,poisalegítimafoipreservada24.
Nestalinhaéaprevisãodoart.1.975: 610
“Art. 1.975. Não se rompe o testamento, se o testador dispuser da sua metade, não contemplando os
herdeirosnecessáriosdecujaexistênciasaiba,ouquandoosexcluadessaparte”.
Sobreotema,ensinouORLANDOGOMES:
“Nãoserompeotestamentoseotestadorpreviuaexistência,ousuperveniência,deherdeirosnecessários.
Aprevisãopresume-sequandoeledispõeapenasdametadedaherança.
Não se rompe, outrossim, se não contemplar, na parte disponível, os herdeiros necessários, de cuja
existênciasaiba.Obrigadonãoestandoafavorecê-los,dispensadoseachademencionarasrazõesporque
preferiudeixá-laaestranhos.Nãoháquefalar,nestecaso,emdeserdação.
Importaéqueignoreaexistênciadetaisherdeiros,aotestar.Nadúvida,podetomaracauteladedeclarar
que, se aparecerem, se tenha como eficaz o testamento, sem ofensa à legítima. Domesmomodo, em
relaçãoàpossívelsuperveniência” 611.
Interessante,porfim,mencionarqueumaposteriorsentençaqueacolhapedido
de investigação de paternidade não opera, necessariamente, o rompimento do
testamento, na medida em que, havendo contestado o pedido, o investigado
passaria a ter ciência da possível existência do herdeiro necessário, como já
decidiuoTJSP:
“ROMPIMENTODETESTAMENTO—Partedisponíveldeixadaàviúva—Testadorquejátinhaoutros
descendentes—Posteriorsentençaproferidaemaçãodeinvestigaçãodepaternidadequenãoprovocaa
revogaçãopresumidadotestamento—Testadorquetinhaconhecimentopréviodaexistênciadofilho,pois
contestoua açãoantesda lavraturado testamento—Não incidênciade revogaçãopresumidado artigo
1973doCódigoCivil—Decisãoquedeterminouoregistroeocumprimentodotestamentoquesemantém
— Recurso não provido” (TJSP, Ap. Cív. 4498944800/SP, Rel. Francisco Loureiro, j. 9-10-2008, 4.ª
CâmaradeDireitoPrivado,publicadoem22-10-2008).
AntigojulgadodoSupremoTribunalFederal,aliás,aparentementeapontavana
mesmadireção:
“AÇÃODEINVESTIGAÇÃODEPATERNIDADE.TESTAMENTO.CÓDIGOCIVIL,ART.1.750.
— A procedência da ação de investigação de paternidade não importa no rompimento do testamento
deixadopeloinvestigado,seestenãoignoravaqueoinvestiganteeraseufilho:teserazoável,àvistadoart.
1.750doCódigoCivil.FALTADEPREQUESTIONAMENTODAMATÉRIARELATIVAAOSARTS.
515DOCÓDIGODEPROCESSOCIVILE82E86DOCÓDIGOCIVIL (SÚMULAS282E356).
DISSÍDIODEJURISPRUDÊNCIASUPERADO(SÚMULA286).RECURSOEXTRAORDINÁRIO
NÃOCONHECIDO”(RE105538,Rel.Min.FranciscoRezek,2.ªTurma,j.3-9-1985,DJ,4-10-1985,p.
17209).
Todavia, de tudo não se conclua que a legítima do herdeiro restaria
prejudicada,vistoque,comosabemos,asuaproteçãojurídicaderivadenormas
deordempública.
CapítuloXXII
PlanejamentoSucessório
Sumário: 1. Introdução. 2. Conceito. 3. Regimes de bens e planejamento sucessório. 3.1. Comunhão
parcialdebens.3.2.Comunhãouniversaldebens.3.3.Participaçãofinalnosaquestos.3.4.Separaçãode
bens.3.5. Implicações sucessóriasdo regimedebensadotado.4.ODireitoSocietárioeoplanejamento
sucessório.5.Planejamentosucessórioepartilhaemvida.
1.INTRODUÇÃO
ÉincomumumManualdeDireitodasSucessõesconterumcapítulodedicado
exclusivamenteaoplanejamentosucessório.
Todavia,asexigênciasdasociedadecontemporânea,aliadasaopedidodeum
diletoamigo 612,conduziram-nosaelaboraropresentecapítulo.
De já, anotamos que a nossa pretensão, diante da imensidão do tema, que
desafiaria uma nova obra, é, tão somente, apresentar as noções básicas dessa
especialformadeplanejamento.
Emverdade,postoreconheçamosqueoassuntointeressamaisdepertoàqueles
que acumularam considerável patrimônio durante a vida, é forçoso convir que
mesmoosmenos abastados podem ter fundado interesse em conhecer amelhor
forma de planejar a transferência dos seus bens, a fim de evitar longas e
dolorosasdisputasjudiciais 613.
A amplitude dos efeitos alcançados pelo planejamento sucessório não é, por
óbvio,facilmenteapreensível.
Por isso,cuidaremos,nestecapítulo, respeitandoasdiretrizesdanossaobra,
de traçar um panorama geral da matéria, realçando as suas principais
características e, bem assim, importantes temas que lhe são pertinentes,
relembrando,quandonecessário,conceitosfundamentais já trabalhadospornós,
nesta ou emoutras obras, de forma que o amigo leitor possa encontrar, emum
único lugar e de forma direta, todas as noções básicas para a compreensão do
instituto.
2.CONCEITO
Consisteoplanejamentosucessórioemumconjuntodeatosquevisaaoperara
transferência e amanutenção organizada e estável do patrimônio do disponente
emfavordosseussucessores.
Com acuidade, a respeito do tema, preleciona DANIEL MONTEIRO
PEIXOTO:
“Planejarasucessãosignificaorganizaroprocessodetransiçãodopatrimônio,levandoemcontaaspectos
como (i) ajuste de interesses entre os herdeiros na administração dos bens, principalmente quando
compõemcapitalsocialdeempresa,aproveitando-sedapresençadofundadorcomoagentecatalisadorde
expectativas conflitantes, (ii) organização do patrimônio, de modo a facilitar a sua administração,
demarcando com clareza o ativo familiar do empresarial, (iii) redução de custos com eventual processo
judicial de inventário e partilha que, além de gravoso, adia por demasiado a definição de fatores
importantes na continuidade da gestão patrimonial, e, por último, (iv) conscientização acerca do impacto
tributáriodentreváriasopçõeslícitasdeorganizaçãodopatrimônio,previamenteàtransferência,demodo
areduziroseucusto” 614.
Nessecontexto,éforçosoconvirqueoplanejamentoexige,doprofissionalque
oconduz,umconhecimentointerdisciplinar,queenglobe,especialmente,alémdo
DireitoCivil,oDireitoTributárioeoEmpresarial.
Umexemplomuitosimplesesclareceráaimportânciadotema.
Carmelo,55anos,viúvo,paideMaiconeMailon,ambosfilhosdasuafalecida
esposa,pretendesecasarnovamentecomPenélope,jovemde23anos.
Como fazer para resguardar a herança dos seus filhos? A nova amada terá
direitode concorrer comeles?O regimedebens interfere?Haverámeação?É
possível e recomendável elaborar um testamento?CasoCarmelo seja sócio de
umadeterminadapessoajurídica,comasuamorte,Penélopepassaadeteralgum
direitosocietário?
Todasessasindagaçõesdevemserobjetodeestudonobojodeumcuidadoso
planejamento, a fim de que, com a morte de Carmelo, a sua vontade seja
preservada,naperspectivadosinteressesdaquelesqueficam.
Claro que diversas outras situações, de acentuada complexidade, culminarão
porexigirumdetidoplanejamentosucessório.
Mas,qualquerquesejaahipótese,érecomendáveledemáximacautelaquese
conheçaoregimedebensadotadopelosenvolvidos,casoconstituamsociedade
conjugalouintegremuniãoestável.
Por isso,éfundamentalpassarmosemrevista,nestecapítulo,as linhasgerais
decadaumdosregimesprevistosnoDireitobrasileiro,recordandoasprincipais
diretrizessobreotema.
3.REGIMESDEBENSEPLANEJAMENTOSUCESSÓRIO
O exemplo figurado no tópico anterior bem demonstra a importância de se
conhecer adequadamente o regime de bens adotado, para efeito de se realizar,
comacerto,oplanejamentosucessório.
“Antes de iniciar qualquer planejamento”, observa JANEDEOLIVEIRA, “é
necessário saber o regime de bens adotado pelos cônjuges envolvidos na
sucessão,emrazãodosdireitosoriundosdoregimeescolhido” 615.
Recordemos, pois, de forma individualizada, cada umdos regimes e as suas
principaiscaracterísticas.
Anossaintençãoé,resumidamente,apresentaraslinhasgeraisdecadaregime,
com ênfase para a comunhão parcial, por ser a modalidade mais adotada em
nossasociedade 616.
Etalrevisão,comodito,éindispensável,emqualquerestudosériovoltadoao
planejamentosucessório.
3.1.Comunhãoparcialdebens
Podemosdefiniroregimedecomunhãoparcialdebenscomosendoaqueleem
que há, em regra, a comunicabilidade dos bens adquiridos a título oneroso na
constânciadomatrimônio,porumouambososcônjuges,preservando-se,assim,
comopatrimôniopessoaleexclusivodecadaum,osbensadquiridosporcausa
anteriorourecebidosatítulogratuitoaqualquertempo.
Genericamente, é como se houvesse uma “separação do passado” e uma
“comunhão do futuro” em face daquilo que o casal, por seu esforço conjunto,
ajudouaamealhar.
Trata-se,pois,emnossosentir,deumregimeconveniente,justoeequilibradoe
que, como se sabe, é o regime legal supletivo, caso os noivos não optem por
regimepatrimonialalgum(art.1.640) 617.
Anossadefiniçãopropostatemraiznoart.1.658:
“Art. 1.658. No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na
constânciadocasamento,comasexceçõesdosartigosseguintes”.
Note-se que a comunicabilidade característica desse regime (a
comunicabilidade dos bens aquestos) não é absoluta, sofrendo o temperamento
dosarts.1.659a1.662:
“Art.1.659.Excluem-sedacomunhão:
I—osbensquecadacônjugepossuiraocasar,eosquelhesobrevierem,naconstânciadocasamento,por
doaçãoousucessão,eossub-rogadosemseulugar;
II—osbensadquiridoscomvaloresexclusivamentepertencentesaumdoscônjugesemsub-rogaçãodos
bensparticulares;
III—asobrigaçõesanterioresaocasamento;
IV—asobrigaçõesprovenientesdeatosilícitos,salvoreversãoemproveitodocasal;
V—osbensdeusopessoal,oslivroseinstrumentosdeprofissão;
VI—osproventosdotrabalhopessoaldecadacônjuge;
VII—aspensões,meios-soldos,montepioseoutrasrendassemelhantes.
(...)
Art.1.661.Sãoincomunicáveisosbenscujaaquisiçãotiverportítuloumacausaanterioraocasamento”.
Importantepontodamatéria,todavia,mereceserdestacado.
A despeito de a regra ser clara quanto à incomunicabilidade dos proventos
pessoaisdecadacônjuge,existeentendimentonoSuperiorTribunaldeJustiça,de
matiz nitidamente contra legem, no sentido de admitir — tanto na comunhão
parcialcomonauniversal—adivisãodecréditotrabalhista.
Naletrafriadalei,taljulgado,comovimos,nãoencontrariarespaldo.
Todavia,partindodeumaconcepçãoampladoconceitodepatrimôniocomum,
oilustreministrorelatorRUIROSADODEAGUIARentendeu,aojulgaroREsp
421.801/RSque, “para amaioria dos casais brasileiros, os bens se resumemà
renda mensal familiar. Se tais rendas forem tiradas da comunhão, esse regime
praticamentedesaparece”.
Trata-se de um entendimento polêmico, reafirmado em mais de uma
oportunidadepeloegrégioTribunal:
“Verba decorrente de reclamação trabalhista. Integração na comunhão. Regime da comunhão parcial.
DisciplinadoCódigoCivilanterior.1.JádecidiuaSegundaSeçãoque‘integraacomunhãoaindenização
trabalhistacorrespondenteadireitosadquiridosduranteotempodecasamentosoboregimedacomunhão
universal’(EREspn.421.801/RS,RelatorparaacórdãooMinistroCesarAsforRocha,DJde17/12/04).
Não hámotivo para excepcionar o regime da comunhão parcial considerando o disposto no art. 271 do
Código Civil anterior. 2. Recurso especial conhecido e provido” (REsp 810.708/RS, Rel. Min. Carlos
AlbertoMenezesDireito,3.ªTurma,j.15-3-2007,DJ,2-4-2007,p.268).
“Direitocivil e família.Recursoespecial.Açãodedivórcio.Partilhadosdireitos trabalhistas.Regimede
comunhãoparcialdebens.Possibilidade.Aocônjugecasadopeloregimedecomunhãoparcialdebensé
devidaàmeaçãodasverbastrabalhistaspleiteadasjudicialmenteduranteaconstânciadocasamento.As
verbasindenizatóriasdecorrentesdarescisãodecontratodetrabalhosódevemserexcluídasdacomunhão
quando o direito trabalhista tenha nascido ou tenha sido pleiteado após a separação do casal. Recurso
especialconhecidoeprovido”(REsp646.529/SP,Rel.Min.NancyAndrighi,3.ªTurma,j.21-6-2005,DJ,
22-8-2005,p.266).
No que tange ao FGTS, em se mantendo a linha esposada pelo STJ, a sua
comunicabilidade passa a ser, por consequência, juridicamente possível.Nessa
mesma linha, para a própria união estável, não fazmuito tempo, já houve esse
reconhecimento no Superior Tribunal de Justiça, o que reforça a tese de sua
aplicaçãoaocasamento:
“Direito civil.Família.Açãode reconhecimento edissoluçãodeunião estável.Partilhadebens.Valores
sacadosdoFGTS.—Apresunçãodecondomíniosobreopatrimônioadquiridoporumouporambosos
companheiros a título oneroso durante a união estável, disposta no art. 5.º daLei n. 9.278/96 cessa em
duas hipóteses: (i) se houver estipulação contrária em contrato escrito (caput, parte final); (ii) se a
aquisição ocorrer com o produto de bens adquiridos anteriormente ao início da união estável (§ 1.º).A
conta vinculada mantida para depósitos mensais do FGTS pelo empregador constitui um crédito de
evoluçãocontínua,queseprolonganotempo,istoé,aolongodavidalaboraldoempregadoofatogerador
da referida verba se protrai, não se evidenciando a sua disponibilidade a qualquer momento, mas tão
somentenashipóteses emquea leipermitir.Asverbasdenatureza trabalhistanascidas epleiteadasna
constância da união estável comunicam-se entre os companheiros. Considerando-se que o direito ao
depósito mensal do FGTS, na hipótese sob julgamento, teve seu nascedouro em momento anterior à
constânciadauniãoestável,equefoisacadoduranteaconvivênciapordecorrêncialegal(aposentadoria)
enãopormeropleitodorecorrido,édeseconcluirqueapenasoperíodocompreendidoentreosanosde
1993a1996équedevesercontadoparafinsdepartilha.Recursoespecialconhecidoeprovidoemparte”
(REsp758.548/MG,Rel.Min.NancyAndrighi,3.ªTurma,j.3-10-2006,DJ,13-11-2006p.257).
Emquepeseaausênciaderespaldolegal,édeadmitirqueumacompreensão
maisampladaexpressão“patrimôniocomum”,emumaperspectivasociológica,
realmentepoderiapermitirtalconclusão.
Seguindo ainda a vereda de análise dos bens que não integram a comunhão
parcial, o já transcrito art. 1.661 reafirma a diretriz do regime, ao excluir da
comunhão “os bens cuja aquisição tiver por título uma causa anterior ao
casamento”.
A título ilustrativo, trazemos à baila uma situação frequente em nossa
sociedade.
E que merece ser mencionada, especialmente em um capítulo que cuida de
planejamentodecunhopatrimonial.
Suponha-se que João Regino, solteiro, com o seu esforço pessoal, amealhe
rendimentosuficiente,equite todasasparcelasdoseuapartamento,honrandoa
obrigaçãoassumidacomaconstrutora,consubstanciadanocontratodepromessa
decompraevendaquehouverafirmado.
Muitobem.
Antesdalavraturadaescrituradefinitiva,oportunidadeemqueapropriedade
seria finalmente consolidada em favor do adquirente, Regino apaixona-se por
Edileuzaesecasa.Jácasado,élavradaaesperadaescritura.
Infelizmente,umgolpedodestinofazcomqueReginoeEdileuzasedivorciem,
nobojodeumprocessoemocionalmentetormentoso.
Nesse contexto, um dos pleitos da esposa é, justamente, a divisão do
apartamento, sob o argumento de haver se casado em regime de comunhão
parcial, e, ainda, pelo fato de a propriedade do imóvel somente haver sido
efetivamente adquirida porRegino quando ele já se encontrava casado:afinal,
bens adquiridos onerosamente por um ou ambos os cônjuges, entrariam na
meação...
Ora,diantedoqueexpomosaolongodestecapítulo,e,comamparonoreferido
art.1.661,ficaclaroqueosargumentosdaesposanãoprocedem.
Sãoincomunicáveisosbenscujaaquisiçãotiverportítuloumacausaanterior
aocasamento,aqual,nocaso,éoprópriocontratopreliminardecompraevenda
(promessa),nãomilitando,nessaquadra,emfavordooutrocônjuge,apresunção
deesforçocomum.
Claroestá,todavia,que,separcelasdocontratoforemadimplidasaolongodo
casamento, o outro consorte, neste caso, dada a presunção de esforço comum,
terá, sim, direito proporcional à metade do valor adimplido na constância da
sociedadeconjugal, comodecorrência lógicadaaplicaçãodas regrasgeraisdo
regime.
Nessesentido,jádecidiuoSTJ:
“DIVÓRCIO. PARTILHADE IMÓVELADQUIRIDO PELOVARÃOANTESDOCASAMENTO
PELO SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. PRESTAÇÕES CONCERNENTES AO
FINANCIAMENTO SOLVIDAS COM O ESFORÇO COMUM DO CASAL. ADEQUADA
SOLUÇÃO ENCONTRADA PELO ACÓRDÃO RECORRIDO: A MULHER FICA COM O
DIREITO À METADE DAS PRESTAÇÕES PAGAS NA CONSTÂNCIA DA UNIÃO, MAIS AS
BENFEITORIASREALIZADAS.
—ReconhecidopeloV.Acórdãoqueaaquisiçãodoimóvelsederacomacontribuição,diretaouindireta,
deambososcônjuges, justoe razoávelqueamulher fiquecomodireitoàmetadedosvalorespagosna
constânciadasociedadeconjugal,acrescidodasbenfeitoriasrealizadasnesseperíodo,respeitadoodireito
depropriedadedovarão.
—Pretensão do recorrente demodificar a base fática da lide, ao sustentar que a unidade habitacional
tiverasidocompradacomrecursosexclusivamenteseus.Incidênciadoverbetesumularn.07-STJ.
—Inocorrênciadecontrariedadeàleifederalenãodemonstraçãododissídiopretoriano.
Recursoespecialnãoconhecido”(REsp108.140/BA,Rel.Min.BarrosMonteiro,4.ªTurma, j.8-2-2000,
DJ,2-5-2000p.142).
Parece-nos,semdúvida,amelhordiretrizadisciplinaramatéria.
Poisbem.
Olegisladortambémconsiderourazoável,dadaaabrangênciaeimportânciado
tema,explicitaranaturezadosbensquenecessariamentedevemserconsiderados
partedacomunhão:
“Art.1.660.Entramnacomunhão:
I—osbensadquiridosnaconstânciadocasamentoportítulooneroso,aindaquesóemnomedeumdos
cônjuges;
II—osbensadquiridosporfatoeventual,comousemoconcursodetrabalhooudespesaanterior;
III—osbensadquiridospordoação,herançaoulegado,emfavordeambososcônjuges;
IV—asbenfeitoriasembensparticularesdecadacônjuge;
V — os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do
casamento,oupendentesaotempodecessaracomunhão”.
Por fim, vale salientar que, à luz do art. 1.664 (sem correspondência na
codificaçãoanterior),defácilintelecção,osbensdacomunhãorespondempelas
obrigaçõescontraídaspelomaridooupelamulherparaatenderaosencargosda
família,àsdespesasdeadministraçãoeàsdecorrentesdeimposiçãolegal.
3.2.Comunhãouniversaldebens
Oregimedecomunhãouniversaldebenstendeàunicidadepatrimonial.
AtéaentradaemvigordaLeidoDivórcio(Lein.6.515,de26dedezembrode
1977),eraoregimelegalsupletivo,emnossosistema.
O seu princípio básico determina, salvo as exceções legais, uma fusão do
patrimônio anterior dos cônjuges, e, bem assim, a comunicabilidade dos bens
havidos a título gratuito ou oneroso, no curso do casamento, incluindo-se as
obrigaçõesassumidas:
“Art.1.667.Oregimedecomunhãouniversalimportaacomunicaçãodetodososbenspresentesefuturos
doscônjugesesuasdívidaspassivas,comasexceçõesdoartigoseguinte”.
Com efeito, há determinados bens que a própria lei estabelece devam ser
consideradosexcluídosdacomunhão.
Oart.1.668doCódigoCivilbrasileiroapontataisbens,nosseguintestermos:
“Art.1.668.Sãoexcluídosdacomunhão:
I—osbensdoadosouherdadoscomacláusuladeincomunicabilidadeeossub-rogadosemseulugar;
II — os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a
condiçãosuspensiva;
III — as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou
reverterememproveitocomum;
IV—asdoaçõesantenupciaisfeitasporumdoscônjugesaooutrocomacláusuladeincomunicabilidade;
V—osbensreferidosnosincisosVaVIIdoart.1.659”.
Trata-se de um regime, nos dias de hoje, pouco frequente, por apresentar
possíveisinconveniênciasemcasodedissoluçãodovínculomatrimonial.
3.3.Participaçãofinalnosaquestos
Trata-sedeumainovaçãodoCódigoCivilbrasileirode2002.
Com efeito, o codificador não mais cuidou do antigo regime dotal, que já
estava em desuso, substituindo-o pelo novo regime de participação final nos
aquestos.
Cuida-se, porém, de um modelo complexo, que não tem encontrado muita
aceitaçãonaprática.
Sobreisso,nossoamigoSÍLVIOVENOSAjáprofetizava:
“Émuitoprovávelqueesseregimenãoseadapteaogostodenossasociedade.Porsisóverifica-sequese
tratadeestruturacomplexa,disciplinadapornadamenosdoque15artigos,cominúmerasparticularidades.
Nãosedestina,evidentemente,àmaioriadapopulaçãobrasileira,debaixarendaedepoucacultura.Não
bastasse isso, embora não seja dado ao jurista raciocinar sobre fraudes, esse regime ficará sujeito a
vicissitudeseabrirávastocampoaocônjugedemá-fé” 618.
Namesmalinhaderaciocínio,observouaqueridaMARIABERENICEDIAS:
“O regramento é exaustivo (arts. 1.672 a 1.686) e tem normas de difícil entendimento, gerando
insegurançaeincerteza.Alémdisso,étambémdeexecuçãocomplicada,sendonecessáriaamantençade
umaminuciosa contabilidade, mesmo durante o casamento, para possibilitar a divisão do patrimônio na
eventualidadedesuadissolução,havendo,emdeterminadoscasos,anecessidadederealizaçãodeperícia.
Ao certo, será raramente usado, até porque se destina a casais que possuem patrimônio próprio e
desempenhemambosatividadeseconômicas,realidadesdepoucasfamíliasbrasileiras,infelizmente” 619.
De fato, o regime de participação final, a par de ser dotado de intrínseca
complexidade, acarreta, ainda, a inconveniênciamanifesta da vulnerabilidade à
fraude patrimonial, indesejável aspecto que, por si só, já serviria como
desincentivoàsuaadoção.
Afinal,quempretenderásecasaradotandoumregimeque,emvezdetutelaro
seuinteressejurídico,pudesseservircomoinstrumentofacilitadordedano?
Para entender a essência desse regime patrimonial de bens, as suas
inconveniências epossíveis vantagens, convidamosvocê, amigo leitor, a seguir
conosconestetópico.
Não obstante seja dotado de autonomia jurídica, podemos reconhecer a
participaçãofinalnosaquestoscomoumregimehíbrido—comcaracterísticas
deseparaçãoedecomunhãoparcialdebens.
Poresseregime,duranteocasamento,cadacônjugepossuipatrimôniopróprio
e administração exclusiva dos seus bens, cabendo-lhes, no entanto, à época da
dissolução da sociedade conjugal, direito de meação sobre os bens aquestos
onerosamenteadquiridospeloprópriocasal.
Isso explica a própria denominação do regime, uma vez que, a título de
compensação pelos esforços envidados em conjunto, partilham-se, ao final, os
bensadquiridoscomaparticipaçãoonerosadeambososcônjuges.
Nessediapasão,oart.1.672doCódigoCivil:
“Art. 1.672. No regime de participação final nos aquestos, cada cônjuge possui patrimônio próprio,
consoantedispostonoartigoseguinte,e lhecabe,àépocadadissoluçãodasociedadeconjugal,direitoà
metadedosbensadquiridospelocasal,atítulooneroso,naconstânciadocasamento”.
Uma leitura equivocada desse dispositivo poderia conduzir o intérprete a
confundiropresenteregimecomodecomunhãoparcialdebens.
Masesseerronãodevesercometido.
Nacomunhãoparcial,comunicam-se,emregrageral,osbensquesobrevierem
ao casamento, adquirido por um ou ambos os cônjuges, a título oneroso; na
participaçãofinal,outrossim,acomunicabilidaderefere-seapenasaopatrimônio
adquiridoonerosamentepeloprópriocasal (ex.:acasadepraiaadquiridapelo
esforçoeconômicoconjuntodomaridoedaesposa).
Nãoéporoutra razão,aliás,queoart.1.673 620 dispõeque,naparticipação
final,integramopatrimôniopróprioosbensquecadacônjugepossuíaaocasare
osporeleadquiridos,aqualquertítulo,naconstânciadocasamento.
Ficaclaro,pois,queacomunicabilidadenoregimeoraestudadotocaapenas
aopatrimônioadquiridoemconjunto 621pelosprópriosconsortes.
Outra diferença consiste na incidência de regras próprias para cada regime:
comunhãoparcial—arts.1.658a1.666,participaçãofinalnosaquestos—arts.
1.672a1.686.Porcontadisso,nãosepodefazerincidirregradeumregimeem
outro ou vice-versa.A título de exemplo, entram na comunhão parcial os bens
adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa
anterior do cônjuge (art. 1.660, II), não se podendo aplicar tal norma à
participaçãofinal.
3.4.Separaçãodebens
Oregimedeseparaçãoconvencional(totalouabsoluta)debensédesimples
compreensãoeguardaíntimaconexãocomoprincípiodaautonomiaprivada.
Emcampodiametralmenteopostoaodacomunhãouniversaldebens,comtal
regime, os cônjuges pretendem, por meio da vontade manifestada no pacto
antenupcial, resguardar a exclusividade e a administração do seu patrimônio
pessoal,anteriorouposterioraomatrimônio.
Opensamentosegundooqual“amornãoseconfundecompatrimônio”encontra
aquioseuamparojurídico.
É o exercício da autonomia da vontade que permite, no caso, haver total
divisãodosbensdecadacônjuge,semprejuízodoreconhecimentodaformação
deumafamília.
Esteregimetemcomopremissaa incomunicabilidadedosbensdoscônjuges,
anterioreseposterioresaocasamento.
Éaprevisãodoart.1.687doCódigoCivil:
“Art.1.687.Estipuladaaseparaçãodebens,estespermanecerãosobaadministraçãoexclusivadecada
umdoscônjuges,queospoderálivrementealienarougravardeônusreal”.
Poroutrolado,hásituaçõesemquealeiimpõeoregimedeseparaçãodebens.
Trata-sedodenominadoregimedeseparaçãolegalouseparaçãoobrigatória
de bens, instituído nos termos do art. 1.641 que, por traduzir restrição à
autonomia privada, não comporta interpretação extensiva, ampliativa ou
analógica.
Vejamos,pois,quaissãoassuashipótesesdeaplicação,nostermosdoCódigo
Civil:
“Art.1.641.Éobrigatóriooregimedaseparaçãodebensnocasamento:
I — das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do
casamento;
II—dapessoamaiordesetentaanos;
III—detodososquedependerem,paracasar,desuprimentojudicial”.
Esteartigo,emnossosentir,desafiaojuristaatentarrealizarumainterpretação
constitucional, especialmente na perspectiva do superior princípio da
isonomia 622.
3.5.Implicaçõessucessóriasdoregimedebensadotado
Éforçosoconvirqueoregimedebensrepercutiránadivisãopatrimonial,em
casodedissoluçãodocasamentooudauniãoestável.
Valedizer,refletirá,certamente,noâmbitododireitodemeação:
“Resumindo,eparaoqueédenossointeresse,caberáatítulodemeaçãoaseguinteparceladopatrimônio
comumdeumcasal,acadaumdoscônjuges,emcasodedivórciooumorte:(i)casamentocomcomunhão
universaldebens:50%dosbenscomuns(arts.1.667es.);(ii)casamentocomcomunhãoparcialdebens:
50%dosbenscomuns(arts.1.658es.);(iii)casamentocomparticipaçãofinalnosaquestos:50%dosbens
adquiridosonerosamenteduranteocasamento(arts.1.672es.);(iv)separaçãoconvencionaldebens:não
hámeação (arts. 1.687 e s.); (v) separação obrigatória ou legal: 50%dos bens adquiridos pelo esforço
comum(sociedadedefato),conformeaSúmula377doSTFeoart.1.641doCódigoCivil” 623.
Sucede que meação não é herança, de maneira que, para um adequado
planejamentopatrimonial, tambémestesegundoaspecto—odireitohereditário
emsi—deveráserconsiderado.
Enote-seque,conformejávimos 624,oregimedebensescolhidopoderáinfluir
no direito sucessório do cônjuge sobrevivente, quando concorrendo com
descendentesdofalecido.
Conformejáestudado,ocodificadorde2002deferiuaocônjugesobrevivente,
adependerdoregimedebensadotado,direitodeconcorrercomodescendentena
herançadofalecido.
Em outras palavras, posto o descendente permaneça na primeira classe
sucessória,a(o)viúva(o)sobreviventepoderácomeleconcorrer,nostermosdo
(aindapolêmico)incisoIdoart.1.829doCódigoCivil:
“Art.1.829.Asucessãolegítimadefere-senaordemseguinte:
I—aosdescendentes,emconcorrênciacomocônjugesobrevivente,salvosecasadoestecomofalecido
noregimedacomunhãouniversal,ounodaseparaçãoobrigatóriadebens(art.1.640,parágrafoúnico);ou
se,noregimedacomunhãoparcial,oautordaherançanãohouverdeixadobensparticulares”.
Dasualeitura,podemosconcluiroseguinte.
Falecidooautordaherança,estaserádeferidaao(s)seu(s)descendente(s),1.ª
classesucessória 625, respeitadaa regrasegundoaqualoparentemaispróximo
excluiomaisremoto 626.
A questão, porém, não é mais tão simples como outrora, pois é preciso
verificar se haverá a concorrência do cônjuge em relação ao descendente, nos
termosdoreferidoincisoIdoart.1.829.
Nos termos desse dispositivo legal, havendo cônjuge sobrevivente (viúva ou
viúvo),esteNÃOterádireitodeconcorrercomodescendente, seo regimede
bensadotadofoide:
a)comunhãouniversal;
b)separaçãoobrigatória 627;ou
c)comunhãoparcial,seoautordaherançanãodeixoubensparticulares.
Por outro lado,haverá, SIM, direito de concorrer com o descendente, se o
regimedebensadotadofoide:
a)participaçãofinalnosaquestos;
b)separaçãoconvencional;ou
c)comunhãoparcial,seoautordaherançadeixoubensparticulares.
A proibição da concorrência sucessória quando o regime de bens adotado
houvessesidoodacomunhãouniversaloudaseparaçãoobrigatóriaéfacilmente
explicada.
Noprimeiro caso, entendeuo legisladorque aopçãopela comunhão total já
conferiria ao sobreviventeoamparomaterialnecessário, emvirtudedas regras
atinentesaoprópriodireitodemeação 628.Nosegundocaso,acontrariosensu,
uma vez que a própria lei instituiu uma forçada separação patrimonial, sentido
nãohaveriaemsedeferirumacomunhãodebensapósamorte.
No caso da comunhão parcial, todavia, a compreensão da proibição
concorrencialnãoétãosimplesassim.
O legislador não poderia fazer uma inócua referência à expressão “bens
particulares”, se não pretendesse, em verdade, com isso, limitar o direito
concorrencialdocônjugeaestacategoriadebens.
Trata-sedeumainterpretaçãológicaerazoável.
Ademais, o direito próprio de meação em face do patrimônio comum já
garantiria justoamparoà(ao)viúva(o)emfacedosbensconstruídosouhavidos
conjuntamente,aolongodomatrimônio.
Por isso, posicionamo-nos junto aos autores18 que entendem haver
direito 629concorrencial da(o) viúva(o) — que fora casada(o) em regime de
comunhãoparcialdebens—,somentequantoaosbensparticularesdeixadospelo
falecido.
OEnunciado270daIIIJornadadeDireitoCivil,postuladodedoutrina,aponta
namesmadireção,aodisporque:
“Oart.1.829,inc.I,sóasseguraaocônjugesobreviventeodireitodeconcorrênciacomosdescendentes
do autor da herança quando casados no regimeda separação convencional de bens ou, se casados nos
regimes da comunhão parcial ou participação final nos aquestos, o falecido possuísse bens particulares,
hipóteses emque a concorrência se restringe a tais bens, devendo os bens comuns (meação) ser
partilhadosexclusivamenteentreosdescendentes”(grifamos).
Amatéria,todavia,emnossalinhadeintelecção,aindapendedeuniformização
jurisprudencial no próprio SuperiorTribunal de Justiça e, também, de eventual
pronunciamentofuturodoSupremoTribunalFederal 630.
Atéque issoocorra,portanto, filiamo-nosà linhadepensamentosegundoa
qual o direito concorrencial do cônjuge sobrevivente (que fora casado em
regimedecomunhãoparcialdebens)limita-seaosbensparticularesdeixados
peloautordaherança.
Noâmbitodauniãoestável,nãocuidouolegisladordecondicionarodireito
sucessório do(a) companheiro(a) viúvo(a) a um regime de bens específico,
quandoconcorrendocomoutraclassedesucessores.
E,emgeral,comosesabe,oregimeadotadoéodacomunhãoparcial,ateor
doart.1.725doCódigoCivil 631.
Mas, por outro lado, consagrou um sistema confuso, retrógrado e
flagrantementeinconstitucional,combaseemseuart.1.790 632,porcolocara(o)
companheira(o) viúva(o) em situação pior do que a de um eventual parente
colateralsucessível.
Sobreo referido artigo, aliás, nunca é demais lembrar o desabafodo colega
ALDEMIROREZENDE:
“Pensamos que o artigo 1.790, do Código Civil, deve ser destinado à lata do lixo, sendo declarado
inconstitucionale,apartirdaí,simplesmenteignorado,anãoserparafinsdeestudohistóricodaevolução
dodireito.Talartigo,numfuturonãomuitodistante,poderáserapontadocomoexemplodosestertoresde
umaépocaemqueolegisladordiscriminavaafamíliaqueseformavaapartirdauniãoestável,tratando-a
comosefossefamíliadesegundacategoria” 633.
Esse contexto caótico, pois, poderá surgir no âmbito do planejamento
sucessório, demaneira que é recomendável a elaboração de um testamento—
respeitadas, claro, as limitações da legítima— para permitir maior segurança
jurídicaemfavordacompanheira(oucompanheiro)viúva(o).
4.ODIREITOSOCIETÁRIOEOPLANEJAMENTOSUCESSÓRIO
Emboranãosejamobjetodestaobradigressõesmaisprofundasnocampodo
DireitoEmpresarial,reveste-sedeimportânciaeutilidade,porocasiãodoestudo
do planejamento sucessório, tecermos algumas considerações acerca de
determinadasfigurassocietárias.
Issoporque,desdequeatendidasasprescriçõeslegais,enãoseconfigurando
fraude ou abuso, afigura-se lícita a constituição de determinadas pessoas
jurídicas,quersejaparaassegurarinteressesnoâmbitosucessório,quersejapara
obterbenefíciosfiscaispermitidos.
Éocasodasociedadeholding.
“SociedadeHoldingé,emsentidolato”,comoprelecionaROBERTANIOAC
PRADO,“aquelaqueparticipadeoutras sociedades comocotistaou acionista.
Ou seja, é uma sociedade formalmente constituída, compersonalidade jurídica,
cujo capital social, ou ao menos parte dele, é subscrito e integralizado com
participaçõessocietáriasdeoutraspessoasjurídicas” 634.
Asuabasenormativaéoart.2.º,§3.º,daLein.6.404,de15dedezembrode
1976(LeidasSociedadesAnônimas) 635:
“Art. 2.º Pode ser objeto da companhia qualquer empresa de fim lucrativo, não contrário à lei, à ordem
públicaeaosbonscostumes.
(...)
§3.ºAcompanhiapodeterporobjetoparticipardeoutrassociedades;aindaquenãoprevistanoestatuto,
a participação é facultada como meio de realizar o objeto social, ou para beneficiar-se de incentivos
fiscais”.
Aentidadeassimconstituída,portanto,direcionaasuaatuação,oupartedela,
paraaparticipaçãoemoutraspessoasjurídicas,comosócioouacionista.
Desse simples,mas preciso, conceito, já se pode notar a possível vantagem
provenientedeumaholdingpoderoperar,atuar,eatémesmocontrolar,diversas
outraspessoas jurídicas,pertencenteaummesmogrupofamiliar,evitando,com
isso, que dissensões individuais internas, especialmente entre parentes,
prejudiquemaatividadeeconômicadetodooconjunto.
Nessesentido,observe-seaargutapreleçãodeROBERTAPRADO:
“Alémdisso, sendo tal sociedadeumapessoa jurídicadistinta da(s) operacional(is), ela proporcionauma
maior discrição e confidencialidade em relação a dissidências que podem surgir entremembros de uma
família controladora de sociedade(s) operacional(is). Com isso, aomenos em tese, as decisões chegam
na(s)sociedade(s)controlada(s)maisuniformeseconsolidadas” 636.
OutrafiguradignadenotaéaHoldingPatrimonial.
Essetipodesociedadeéconstituídacomoobjetivodetitularizareadministrar
bens,especialmente imóveis.Valedizer,éumasociedadetipicamentedegestão
patrimonial.
Preleciona,sobreotema,FREDJOHNPRADO:
“Nesses últimos anos, a criação da holding patrimonial tem, a nosso ver, uma posição primordial e
relevantenapassagemdeumageraçãoaoutra,semtraumas.
AtravésdeumaHoldingPatrimonial,épossívelrealizarumplanejamentosucessóriobastanteinteressante
eeficiente.Sucessão,emsentidocomum,implicaaideiadetransmissãodebens.Sucederé,nodizerde
SílvioVenosa,substituir,tomarolugardeoutrem,nocampodosfenômenosjurídicos.
Assim, é possível distribuir os bens da pessoa física, que estarão incorporados à pessoa jurídica, antes
mesmoqueestavenhaa falecer.Evitam-se,destamaneira,asansiedadesporparteda linhasucessória,
postoqueoquinhãodecadaparticipanteficadefinidoantesmesmodofalecimentodosócio.
Outrossim, a transmissão fica facilitada por meio da sucessão de quotas da empresa, senão, vejamos.
Consoanteregraoartigo1.845doCódigoCivilBrasileiro,sãoherdeirosnecessáriososdescendentes,os
ascendenteseocônjuge,sendoqueestesconcorremnamesmaproporçãonameaçãoprevistanoartigo
1.846,queestabelecepertenceraosherdeirosnecessários,deplenodireito,ametadedosbensdaherança,
constituindoalegítima” 637.
Sem dúvida, esse tipo de holding afigura-se mais vantajosa do que um
condomínio, na medida em que as regras desses últimos, naturalmente mais
estáticas,podemseafigurardesvantajosas.
5.PLANEJAMENTOSUCESSÓRIOEPARTILHAEMVIDA
Nada impede,pois,que,emvida,osujeitoefetiveadoaçãodeseusbens—
operandoadenominada“partilhaemvida”—,mantendoemseuprópriofavor,ou
não,areservadousufrutosobreessesbens.
Eoqueseentendesobre“partilhaemvida” 638?
Diferentementedoqueocorrenocontratodecompraevenda,adoaçãofeitade
ascendente a descendente não exige consentimento dos outros herdeiros
necessários.
OCódigoCivilde2002estabeleceque:
“Art.496.Éanulávelavendadeascendenteadescendente,salvoseosoutrosdescendenteseocônjuge
doalienanteexpressamentehouveremconsentido.
Parágrafoúnico.Emambososcasos,dispensa-seoconsentimentodocônjugeseoregimedebensforo
daseparaçãoobrigatória”.
Observe-se,delogo,areferênciafeitaaocônjugedoalienante,oqual,quando
nãocasadonoregimedaseparaçãoobrigatóriadebens,tambémdeveráanuirna
venda.
Tal circunstância se justifica pelo fato de o novo Código haver erigido o
cônjugeàcondiçãodeherdeironecessário.
Édemencionaraindaqueaexpressão“emambososcasos”decorreudeum
erro na condução do projeto do Código Civil, consoante vem registrado no
Enunciado n. 177 da III Jornada de Direito Civil, realizada entre 1.º e 3 de
dezembrode2004.
Defato,porerrodetramitação,queretirouasegundahipótesedeanulaçãode
venda entre parentes (venda de descendente para ascendente), deve ser
desconsideradaaexpressão“emambososcasos”,noparágrafoúnicodoart.496.
Ressalte-se, ainda, que o novo Código, dirimindo qualquer controvérsia, é
claroaodizerqueacompraevendadeascendenteadescendente(nãoapenasdo
pai ao filho,mas tambémdo avô ao neto etc.) éanulável, e não simplesmente
nula.
Tecidas essas breves considerações, podemos concluir que a restrição
negocialsobcomentonãoseaplicaàsdoações,jáque,emsetratandodenorma
restritiva do direito de propriedade do alienante (art. 496), não poderá ser
analisada de forma extensiva, nada impedindo que se possa eventualmente
impugnaroato,comfulcroemoutrosdefeitosdonegócio,previstosemlei.
Assim,odoadorpoderá,independentementedeanuênciaexpressadosdemais
herdeiros, alienar gratuitamente bens do seu patrimônio, podendo, inclusive, e
desdequereserveumarendamínimaparaasuasobrevivênciadigna,efetuar a
denominada“partilhaemvida”,referidanoart.2.018doCódigoCivil:
“Art.2.018.Éválidaapartilhafeitaporascendente,poratoentrevivosoudeúltimavontade,contantoque
nãoprejudiquealegítimadosherdeirosnecessários”.
Referimo-nosàdenominadapartilha-doação,realizadaporatoentrevivos,e
não à partilha-testamento, figuras bem diferenciadas pelo espirituoso jurista
ZENOVELOSO:
“Apartilhapodeserfeitapelopróprioascendente,poratoentrevivosoudeúltimavontade,daíchamar-se
partilha-doação— divisio parentum inter liberos— e partilha-testamento— testamentum parentum
interliberos.Poressemeio,oascendentedistribuiosbensentreosherdeirosnecessários,preenchendoo
quinhãodeles.Exercefaculdadequeécoroláriododireitodepropriedade.Quandorealizadaporatoentre
vivos, a partilha deve obedecer aos requisitos de forma e de fundo das doações. A divisão entre os
herdeiros tem efeito imediato, antecipando o que eles iriam receber somente com o passamento do
ascendente” 639.
Tal partilha deve ser feita com cautela, pois, caso o ato de disposição
ultrapasseametadedisponível,poderáresultarnainvalidademencionadalinhas
acima.
Jácuidamos tambémdeobservarqueovalordosbensdeveráseraferidono
momento da doação, e não quando da morte do doador. Na realidade fática,
contudo,algunsproblemaspoderãosurgir,aexemplodainsegurançageradapara
aspartes,especialmenteodonatário,pornãotercertezaseobemrecebidoviolou
alegítima.
E, de fato, essa preocupação só será definitivamente afastada no inventário,
apósteremsidorealizadasacolaçãoeaconferênciadosbensdoados.
Umespecialcuidado,porém,podeterodoador:fazerconstardoinstrumento
da doação a advertência de que o referido bem está saindo de sua parte
disponíveldaherança.
Essaprovidência,adespeitodenãoevitaracolaçãoparaeventualreposição
da legítima, poderá impedir que o bem transferido seja computado na parte
conferidaaosherdeiroslegitimários.
Expliquemos,exemplificativamente:seodoadorbeneficiouumdosseusfilhos
com um apartamento, tendo registrado que este imóvel sai da sua parte
disponível, caso existam outras doações sem a mesma ressalva, deverão estas
servir para a recomposição do acervo reservado, mantendo-se o apartamento
comointegrantedapartedisponível,desdeque,éclaro,nãocorrespondaamais
de50%detodoopatrimônio.
A partilha em vida, evidentemente, por configurar doação, tem natureza
contratual, e os seus efeitos são inter vivos e imediatos, diferentemente do
testamento,quesomenteproduziráefeitosapósamortedotestador.
Observadas, portanto, as normas em vigor — especialmente sucessórias e
tributárias—apartilhaemvidaé,poróbvio,figurabastantecomumnoâmbitodo
planejamento sucessório, com possível repercussão, até mesmo, no Direito
Societário:
“É comum, em planejamentos sucessórios em que os pais desejem fazer doação de participações
societárias para seus filhos, porém semperder o controle da empresa e tampouco a percepçãode seus
rendimentos, procederem à transferência da nua-propriedade das participações para os filhos,mantendo
parasiousufrutoesalvaguardandoopoderpolítico(direitodevoto)eopodereconômico(recebimentode
dividendosejurossobreocapital)” 640.
Tudo a demonstrar que, quando se trata de planejamento sucessório, a
criatividadeeotalentodojuristaparecemnãoterfim...
Por isso, encerramos este capítulo com a visão poética do tema de um dos
coautoresdaobra:
“PlanejamentoSucessório
Quando,umdia,terminar
aminhajornadaterrena,
queroapenasencontrar
apazemminhapequena
estradadeférteisencontros,
algunstriunfoseacertos,
mastambémdedesencontros,
reencontros,derrotaseapertos...
Nãoqueroqueosquedeixo
disputemospoucosbens
que,commuitaluta,conquistei,
mas,sim,queencontremoeixo
daconcórdiaeharmonia,
nãochorandodebarrigavazia,
nemtendoaamargasensação
dedesamparoesolidão,
sabendoqueeutiveocuidado
dedeixartudoorganizado,
naconsciênciademinhafinitude,
fazendotudoqueeupude
para,seguindominhaverdade,
distribuirsegundoanecessidade
ejustiçadeumapartilhaemvida
deumpatrimônioquepereceerui
poisoqueérealmenteimportante
éherdaroorgulhoeasaudadedoída
somentedequem,emessência,fui,
nãodoqueeutivenaestante” 641.
CapítuloXXIII
Inventário
Sumário:1.Introdução.2.Delimitaçãoconceitualeclassificaçãodoinventário.3.Inventárioeespólio.4.
Administração provisória da herança. 5. O Inventariante. 5.1. Legitimidade para a designação. 5.2.
Atribuições.5.3.Designação.5.4.Remoção.6.Inícioeprazodoinventário.7.Liquidaçãodaherança.7.1.
Sonegados.7.2.Colações.7.3.Pagamentodasdívidas.7.4.Avaliaçãoecálculodoimposto.8.Inventário
negativo. 9. Inventário administrativo. 10. Inventário judicial. 10.1. Procedimento judicial no inventário
comum.10.2.Arrolamento.10.3.Alvarájudicial.
1.INTRODUÇÃO
Nopresentecapítulo,pretendemosexporadisciplinanormativadoinventário
emnossoDireitoPositivo.
Nossocorteepistemológicoécalcadonacompreensãodo institutonocampo
do direito material, sem necessariamente aprofundar minúcias de questões
procedimentais, já que isso ensejaria até mesmo a elaboração de uma obra
específica.
Todavia, reconhecemos ser inevitável tecer algumas considerações, sim, de
aspectos processuais, pelo fato de propugnarmos sempre por uma visão
abrangentedoDireito,acreditandosinceramentequetodadivisãoemramostem
porfinalidadeapenasaspectosdidáticos,sendopapeldojuristacontemporâneoa
lutaporumacompreensãocompletadecadatemaporeleabordado.
Enfrentemos,pois,odesafioaquiproposto.
2.DELIMITAÇÃOCONCEITUALECLASSIFICAÇÃODOINVENTÁRIO
Oqueéuminventário?
Vejamosoquedizodicionarista:
“Inventários.m.(sXIVcf.FichIVPM)1DIR.SUCdescriçãodetalhadadopatrimôniodepessoafalecida,
para que se possa proceder à partilha dos bens 2 a ação intentada para a arrecadação e a posterior
partilhadessesbens(oi.domeutioaindaestácorrendonajustiça)3p.met.odocumentooupapelem
que estão enumerados e descritos esses bens 4 DIR.CIV DIR.PRC no caso de separação judicial,
descriçãoeavaliaçãodosbensdocasal,quandoestesnãoentramemacordoquantoàpartilhadosbens5
DIR.COM descrição e avaliação de todos os bens, ativos e passivos, de uma sociedade comercial 6
levantamentominuciosodoselementosdeumtodo;rol, lista,relação(o i.dasqualidadesedefeitosde
um político)7 qualquer descrição detalhada, minuciosa de algo i. cultural levantamento dos bens
consideradoscomorepresentativosdeumaculturacomvistasasuapreservação• i.depersonalidade
PSICmétodoparadeterminaros traçosdecaráterepersonalidadedeumapessoa,queconsisteemum
sistemadeafirmaçõessimplesouquestõescujasrespostasserãoanalisadaseavaliadasquantitativamente
emfunçãodecategoriasespecíficas ETIM lat.imp.inventarium,li´id´,dorad.deinventum,supn.de
invenire ´achar ;́ f.hist. sXIV inventario, sXIV enuentario, sXV auentayro PAR inventario
(fl.inventariar)” 642.
Do ponto de vista doDireito Sucessório, o inventário pode ser conceituado
comoumadescriçãodetalhadadopatrimônio doautor da herança, atividade
estadestinadaàposteriorpartilhaouadjudicaçãodosbens.
Soboprismaprocessual,outrossim,oinventáriopodeserentendidocomouma
sequênciaordenadadeatostendentesaumfimespecífico.
Não é mais, nos dias de hoje, porém, exclusivamente um procedimento
judicial 643.
De fato, classifica-se, contemporaneamente, o inventário em administrativo
(extrajudicial)oujudicial.
O inventário será extrajudicial, mediante lavratura de escritura pública em
tabelionatodenotas,quandonãohouverdivergênciasentreaspartesinteressadas,
sendotodaselascapazes,encontrando-sedevidamenteassistidasporadvogado.
Se, porém, a sucessão envolver interesse de incapazes ou for hipótese de
disposição de última vontade (testamento), o inventário terá de ser
necessariamentejudicial.
Além dessa classificação básica, teceremos considerações, em tópicos
próprios e específicos, acerca de duas outras modalidades de inventário,
classificadas sob outro viésmetodológico, a saber, os institutos do “Inventário
Negativo”,do“InventárioConjunto”eda“AdjudicaçãoporHerdeiroÚnico”,aos
quaisremetemosoamigoleitor 644.
3.INVENTÁRIOEESPÓLIO
Somente se pode falar em inventário a partir do momento em que este é
formalizado,sejapelaviaextrajudicial,sejapormeiodoprocedimentojudicial
adequado.
Eoutranoção,nessecontexto,devetambémserressaltada:adeespólio.
Observe-seque,talqualaexpressão“inventário”,tambémotermo“espólio”é
plurissignificativo645.
Osignificadoqueinteressa,nocampodasSucessões,é,efetivamente,odeum
conjuntodebensdeixadopelodecujus,equepassaaserconsideradoumente
desprovidodepersonalidade,mascomcapacidadeprocessual,representadopelo
inventariante.
Logo,nãoháqueseconfundir“espólio”com“inventário”.
Oprimeiroésimplesmenteamassapatrimonialcomcapacidadeprocessual.
O segundo é a descrição detalhada do patrimônio do autor da herança,
expressão que identifica também, sob o aspecto dinâmico, o procedimento
administrativo ou judicial tendente à partilha, previsto nos arts. 610 a 646 do
CódigodeProcessoCivilde2015.
4.ADMINISTRAÇÃOPROVISÓRIADAHERANÇA
Naformadoart.1.991dovigenteCódigoCivilbrasileiro,“desdeaassinatura
docompromissoatéahomologaçãodapartilha,aadministraçãodaherançaserá
exercidapeloinventariante”.
Se a administração da herança (e a realização do inventário) cabe ao
inventariante,aperguntaquenãoquercalaré:quemseráoresponsávelatéqueo
inventariantesejaformalmentedesignado?
Oadministradorprovisório,nósrespondemos!
Nessesentido,osarts.613e614doCPC/2015(equivalentesaosarts.985e
986doCódigodeProcessoCivilde1973):
“Art.613.Atéqueoinventariantepresteocompromisso,continuaráoespólionapossedoadministrador
provisório.
Art. 614. O administrador provisório representa ativa e passivamente o espólio, é obrigado a trazer ao
acervo os frutos que desde a abertura da sucessão percebeu, tem direito ao reembolso das despesas
necessáriaseúteisquefezerespondepelodanoaque,pordoloouculpa,dercausa”.
Equempoderáserdesignadoadministradorprovisório?
Arespostaseencontranoart.1.797dovigenteCódigoCivilbrasileiro:
“Art.1.797.Atéocompromissodoinventariante,aadministraçãodaherançacaberá,sucessivamente:
I—aocônjugeoucompanheiro,secomooutroconviviaaotempodaaberturadasucessão;
II — ao herdeiro que estiver na posse e administração dos bens, e, se houver mais de um nessas
condições,aomaisvelho;
III—aotestamenteiro;
IV—apessoadeconfiançadojuiz,nafaltaouescusadasindicadasnosincisosantecedentes,ouquando
tiveremdeserafastadaspormotivogravelevadoaoconhecimentodojuiz”.
Observe-se que o dispositivo legal estabelece uma ordem para o
reconhecimento da legitimidade para atuar como administrador provisório da
herança646,figuradasmaisimportantes,pelomenosatéoadventodaassunçãodo
compromissodoinventariante.
5.OINVENTARIANTE
Oinventarianteéorepresentanteoficialdoespólio,naformadoart.75,VII,
doCódigodeProcessoCivilde2015.
Com efeito, o espólio é representado em juízo, ativa e passivamente, pelo
inventariante(sucedendooadministradorprovisório,que,comoopróprionome
infere, éumsujeito comuma funçãopotencialmente temporária), cabendo-lhe a
zelosaadministraçãodosbenseaprudenteconduçãodoinventário647.
E tal atuação processual do inventariante (em nome do espólio) é
relevantíssima,umavezqueoespóliopodeser,inclusive,autorouréuemações
próprias,mesmonãotendopersonalidadejurídica648.
Registre-se,inclusive,que,naformadoart.110doCódigodeProcessoCivil
de2015,ocorrendoamortedequalquerdaspartes,dar-se-áasubstituiçãopelo
seuespóliooupelosseussucessores,observadoodispostonoart.313domesmo
diplomalegal.
O inventariante deve cumprir a sua função com cautela, evitando excessos e
violação de direitos dos outros herdeiros, que não perdem a prerrogativa de
também defenderem os bens do espólio, uns contra os outros ou em face de
terceiros,namedidaemque,comosabemos,sãotitularesdeumafraçãoidealdo
acervo,atéqueseultimearespectivapartilha649.
5.1.Legitimidadeparaadesignação
O texto legal estabelece uma ordem prioritária para designação do
inventariante650.
Confira-seoart.617doCódigodeProcessoCivilde2015:
“Art.617.Ojuiznomearáinventariantenaseguinteordem:
I—ocônjugeou companheiro sobrevivente, desdeque estivesse convivendocomooutro ao tempoda
mortedeste;
II — o herdeiro que se achar na posse e na administração do espólio, se não houver cônjuge ou
companheirosobreviventeouseestesnãopuderemsernomeados;
III—qualquerherdeiro,quandonenhumdelesestivernaposseenaadministraçãodoespólio;
IV—oherdeiromenor,porseurepresentantelegal;
V—o testamenteiro, se lhe tiver sidoconfiadaaadministraçãodoespólioouse todaaherançaestiver
distribuídaemlegados;
VI—ocessionáriodoherdeirooudolegatário;
VII—oinventariantejudicial,sehouver;
VIII—pessoaestranhaidônea,quandonãohouverinventariantejudicial.
Parágrafoúnico.Oinventariante,intimadodanomeação,prestará,dentrode5(cinco)dias,ocompromisso
debemefielmentedesempenharafunção”.
Trata-sedeumaordemdedesignaçãonãovinculativaouabsoluta,adepender
dascircunstânciasdocasoconcreto.
5.2.Atribuições
Odireitopositivocontempladiversasatribuiçõesaoinventariante.
Defato,estabelecemosarts.618e619doCódigodeProcessoCivilde2015:
“Art.618.Incumbeaoinventariante:
I—representaroespólioativaepassivamente,emjuízoouforadele,observando-se,quantoaodativo,o
dispostonoart.75,§1.º;
II—administraroespólio,velando-lheosbenscomamesmadiligênciaqueteriaseseusfossem;
III — prestar as primeiras e as últimas declarações pessoalmente ou por procurador com poderes
especiais;
IV—exibiremcartório,aqualquertempo,paraexamedaspartes,osdocumentosrelativosaoespólio;
V—juntaraosautoscertidãodotestamento,sehouver;
VI—trazeràcolaçãoosbensrecebidospeloherdeiroausente,renuncianteouexcluído;
VII—prestarcontasdesuagestãoaodeixarocargoousemprequeojuizlhedeterminar;
VIII—requereradeclaraçãodeinsolvência.
Art.619.Incumbeaindaaoinventariante,ouvidososinteressadosecomautorizaçãodojuiz:
I—alienarbensdequalquerespécie;
II—transigiremjuízoouforadele;
III—pagardívidasdoespólio;
IV—fazerasdespesasnecessáriasparaaconservaçãoeomelhoramentodosbensdoespólio”.
5.3.Designação
Adesignaçãodo inventariantegeraumcompromisso legal de cumprir beme
fielmenteassuasatribuições.
Hátodoumiterprocedimentalnestafaseinicialpós-compromisso,afigurando-
serelevantealavraturadeumtermocircunstanciadoeaindicaçãodosbens,em
sedede“primeirasdeclarações”.
Nessesentidoéaprevisãodosarts.620e621doCódigodeProcessoCivilde
2015:
“Art.620.Dentrode20(vinte)diascontadosdadataemqueprestouocompromisso,oinventariantefará
as primeiras declarações, das quais se lavrará termo circunstanciado, assinadopelo juiz, pelo escrivão e
peloinventariante,noqualserãoexarados:
I—o nome, o estado, a idade e o domicílio do autor da herança, o dia e o lugar emque faleceu e se
deixoutestamento;
II—onome,oestado,aidade,oendereçoeletrônicoearesidênciadosherdeirose,havendocônjugeou
companheirosupérstite,alémdosrespectivosdadospessoais,oregimedebensdocasamentooudaunião
estável;
III—aqualidadedosherdeiroseograudeparentescocomoinventariado;
IV—arelaçãocompletae individualizadade todososbensdoespólio, inclusiveaquelesquedevemser
conferidosàcolação,edosbensalheiosqueneleforemencontrados,descrevendo-se:
a)osimóveis,comassuasespecificações,nomeadamentelocalemqueseencontram,extensãodaárea,
limites,confrontações,benfeitorias,origemdostítulos,númerosdasmatrículaseônusqueosgravam;
b)osmóveis,comossinaiscaracterísticos;
c)ossemoventes,seunúmero,suasespécies,suasmarcaseseussinaisdistintivos;
d) o dinheiro, as joias, os objetos de ouro e prata e as pedras preciosas, declarando-se-lhes
especificadamenteaqualidade,opesoeaimportância;
e)os títulosdadívidapública,bemcomoasações,asquotaseos títulosdesociedade,mencionando-se-
lhesonúmero,ovaloreadata;
f)asdívidasativasepassivas,indicando-se-lhesasdatas,ostítulos,aorigemdaobrigaçãoeosnomesdos
credoresedosdevedores;
g)direitoseações;
h)ovalorcorrentedecadaumdosbensdoespólio.
§1.ºOjuizdeterminaráqueseproceda:
I—aobalançodoestabelecimento,seoautordaherançaeraempresárioindividual;
II—àapuraçãodehaveres,seoautordaherançaerasóciodesociedadequenãoanônima.
§ 2.º As declarações podem ser prestadas mediante petição, firmada por procurador com poderes
especiais,àqualotermosereportará.
Art.621.Sósepodearguirsonegaçãoaoinventariantedepoisdeencerradaadescriçãodosbens,coma
declaração,porelefeita,denãoexistiremoutrosporinventariar”.
Eseoinventariantedescumprirsuasatribuições?
Pode ele ser removido, sem prejuízo da responsabilidade patrimonial
correspondente.
Éoqueveremosnopróximosubtópico.
5.4.Remoção
Defato,estabeleceoart.622doCódigodeProcessoCivilde2015:
“Art.622.Oinventarianteseráremovidodeofícioouarequerimento:
I—senãoprestar,noprazolegal,asprimeirasouasúltimasdeclarações;
II — se não der ao inventário andamento regular, se suscitar dúvidas infundadas ou se praticar atos
meramenteprotelatórios;
III—se,porculpasua,bensdoespóliosedeteriorarem,foremdilapidadosousofreremdano;
IV—senãodefenderoespólionasaçõesemqueforcitado,sedeixardecobrardívidasativasousenão
promoverasmedidasnecessáriasparaevitaroperecimentodedireitos;
V—senãoprestarcontasouseasqueprestarnãoforemjulgadasboas;
VI—sesonegar,ocultaroudesviarbensdoespólio”.
Obviamente,égarantidoocontraditórioeaampladefesaparataisacusações:
“Art. 623.Requerida a remoção com fundamento em qualquer dos incisos do art. 622, será intimado o
inventariantepara,noprazode15(quinze)dias,defender-seeproduzirprovas.
Parágrafoúnico.Oincidentedaremoçãocorreráemapensoaosautosdoinventário.
Art.624.Decorridooprazo,comadefesadoinventarianteousemela,ojuizdecidirá.
Parágrafoúnico.Seremoveroinventariante,ojuiznomearáoutro,observadaaordemestabelecidanoart.
617”.
Decididaaremoção,oinventarianteremovidodeveentregarimediatamenteao
substitutoosbensdoespólio.
Caso se omita em tal mister, será compelido mediante mandado de busca e
apreensão, ou de imissão na posse, sem prejuízo de ser sancionado
pecuniariamente, conforme se tratar de bem móvel ou imóvel, tudo conforme
preceituaoart.625doCódigodeProcessoCivilde2015651.
Tudoissoparapreservarosinteressesdosherdeiroseorespeitoàvontadedo
autordaherança,razãoesentidodetodoolabordoinventariante.
6.INÍCIOEPRAZODOINVENTÁRIO
Dispõeoart.1.796doCódigoCivilbrasileiro:
“Art. 1.796. No prazo de trinta dias, a contar da abertura da sucessão, instaurar-se-á inventário do
patrimôniohereditário,peranteojuízocompetentenolugardasucessão,parafinsdeliquidaçãoe,quando
forocaso,departilhadaherança”.
Oprazodetrintadias,previstonalegislaçãodedireitomaterial,foiderrogado
pornormaposterior,asaber,aLein.11.441,de2007,que,aotratardoinventário
administrativo (extrajudicial), tambémmodificou regrasdoCódigodeProcesso
Civilreferentesàmodalidadejudicial,estabelecendoumprazode60(sessenta)
dias652.
Todavia, com a entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2015, o
prazopassouaserde2(dois)meses,conformeestabelecidoemseuart.611,in
verbis:
“Art.611.Oprocessodeinventárioedepartilhadeveserinstauradodentrode2(dois)meses,acontarda
abertura da sucessão, ultimando-se nos 12 (doze) meses subsequentes, podendo o juiz prorrogar esses
prazos,deofícioouarequerimentodeparte.”
O início do inventário inaugura uma espécie de juízo universal, em que se
pretende resolver, emumúnico processo (entendido comoum conjunto de atos
tendentesaumfim), todasasquestõesatinentesà formalizaçãoda transferência
daherança,salvoquandoabsolutamenteinviável.
É a regra do art. 612 do Código de Processo Civil de 2015, que preceitua
literalmente:
“Art.612.Ojuizdecidirátodasasquestõesdedireitodesdequeosfatosrelevantesestejamprovadospor
documento,sóremetendoparaasviasordináriasasquestõesquedependeremdeoutrasprovas”.
Oart.1.771doCódigoCivilbrasileirode1916expressamentepreviaque,“no
inventário,serãodescritoscomindividuaçãoeclarezatodososbensdaherança,
assimcomoosalheiosnelaencontrados”.
Avigentecodificaçãonãotrouxeumdispositivoequivalente,mas,atémesmo
pelacompreensãodoquesejaoinstitutodoinventário,talprovidênciadeveráser
tomadapeloinventarianteparapodercumprirbemefielmenteosseusmisteres.
7.LIQUIDAÇÃODAHERANÇA
Otrabalhofundamentalduranteoprocessodeinventárioé,semdúvida,fazera
devida apuração dos haveres da herança, com o conhecimento do patrimônio
brutoelíquido,verificandoosativoseospassivos.
Para isso, será necessária uma efetiva constatação de cada um dos bens
constantes dopatrimôniodo falecido, o quemuitas vezes podenão encontrar a
devidacolaboraçãodetodososenvolvidos...
Eoquesedevefazernessasituação?
7.1.Sonegados
A lógica do inventário é, definitivamente, a elaboração de uma relação
completadosbensdofalecido.
Assim, qualquer ato atentatório a tal finalidade deve ser juridicamente
rechaçado.
Éocasodasonegaçãodeinformaçõessobrebens.
Eissonãopassouinalbisnotextocodificado.
Comefeito, na formado art. 1.992doCódigoCivil, o herdeiro que sonegar
bensdaherança,nãoosdescrevendonoinventárioquandoestejamemseupoder,
ou,comoseuconhecimento,nodeoutrapessoa,ouqueosomitirnacolação653,a
queosdevalevar,ouquedeixarderestituí-los,deveráperderodireitoquesobre
eleslhecabia.
A ideia é lógica: quem não foi fiel com a verdade, violando o dever de
informar que deriva do superior princípio da boa-fé objetiva, não pode passar
incólume.
Eissoseaplica,inclusive,aoinventariante.
Comefeito,seosonegadorforoinventariante,alémdetalsanção,deveeleser
removido,conformepreceituaoart.1.993dovigenteCódigoCivil,semprecoma
garantiadocontraditórioedaampladefesa.
Valedestacarquesósepodeacusaro inventariantedesonegação,depoisde
encerradaadescriçãodosbens,comadeclaração,porelefeita,denãoexistirem
outros por inventariar e partir, bem como só se pode imputar tal conduta ao
herdeiro, depois de declarar-se no inventário que não os possui, tudo como
determinadopelovigenteart.1.996dacodificaçãocivilbrasileira.
Ecomoseapuratalalegaçãodesonegação?
Estabeleceoart.1.994doCódigoCivil:
“Art.1.994.Apenadesonegadossósepoderequerereimporemaçãomovidapelosherdeirosoupelos
credoresdaherança.
Parágrafoúnico.Asentençaqueseproferirnaaçãodesonegados,movidaporqualquerdosherdeirosou
credores,aproveitaaosdemaisinteressados”.
E,casoosbens jánãoestejamempoderdo sonegador, a teordoart. 1.995,
deverápagaroequivalente,alémdasperdasedanoscorrespondentes.
Todavia, ousando ir além do texto codificado, neste ponto, consideramos
plenamente razoável a busca e apreensão dos bens, caso ainda existentes e em
possedeterceirodemá-fé.
7.2.Colações
Acolaçãoétemáticafascinante.
Porpremissa,todososdescendentesdevemserigualmentetratados654.
Por isso, estabelece o art. 2.002 do Código Civil brasileiro que os
descendentesqueconcorreremà sucessãodoascendente comumsãoobrigados,
justamenteparaigualaraslegítimas,aconferirovalordasdoaçõesquedeleem
vidareceberam,sobpenadesonegação.
Oprazoparatalinformaçãoécomumdequinzedias,contadodaconclusãodas
citações, por aplicação combinadados arts. 627 e 639doCódigodeProcesso
Civilde2015.
Claro que, para cálculo da legítima, o valor dos bens conferidos será
computado na parte indisponível, sem aumentar a disponível, na forma do
parágrafoúnicodomencionadodispositivodoCódigoCivil(art.2002).
Atalprocessodeconferênciadevalores,paraigualaçãodalegítima,édadoo
nomedecolação.
Sobresuafinalidade,estabeleceoart.2.003dovigenteCódigoCivil:
“Art. 2.003. A colação tem por fim igualar, na proporção estabelecida neste Código, as legítimas dos
descendentesedocônjugesobrevivente,obrigandotambémosdonatáriosque,aotempodofalecimentodo
doador,jánãopossuíremosbensdoados.
Parágrafoúnico.Se,computadososvaloresdasdoaçõesfeitasemadiantamentodelegítima,nãohouver
noacervobenssuficientesparaigualaraslegítimasdosdescendentesedocônjuge,osbensassimdoados
serão conferidos em espécie, ou, quando deles já não disponha o donatário, pelo seu valor ao tempoda
liberalidade”.
Sobreovalordecolaçãodosbensdoados,estabeleceoart.2.004dovigente
CódigoCivil:
“Art.2.004.Ovalordecolaçãodosbensdoadosseráaquele,certoouestimativo,quelhesatribuiroatode
liberalidade.
§ 1.º Se do ato de doaçãonão constar valor certo, nemhouver estimação feita naquela época, os bens
serãoconferidosnapartilhapeloqueentãosecalcularvalessemaotempodaliberalidade.
§2.ºSóovalordosbensdoadosentrará emcolação;nãoassimodasbenfeitorias acrescidas, asquais
pertencerãoaoherdeirodonatário,correndotambémàcontadesteosrendimentosoulucros,assimcomo
osdanoseperdasqueelessofrerem”.
Masquaissãoosbenssubmetidosàcolação?
Respondendoatalquestão,determinaoart.2.007:
“Art.2.007.Sãosujeitasàreduçãoasdoaçõesemqueseapurarexcessoquantoaoqueodoadorpoderia
dispor,nomomentodaliberalidade.
§1.ºOexcessoseráapuradocombasenovalorqueosbensdoadostinham,nomomentodaliberalidade.
§2.ºAreduçãodaliberalidadefar-se-ápelarestituiçãoaomontedoexcessoassimapurado;arestituição
seráemespécie,ou,senãomaisexistirobemempoderdodonatário,emdinheiro,segundooseuvalorao
tempo da abertura da sucessão, observadas, no que forem aplicáveis, as regras deste Código sobre a
reduçãodasdisposiçõestestamentárias.
§ 3.º Sujeita-se a redução, nos termos do parágrafo antecedente, a parte da doação feita a herdeiros
necessáriosqueexcederalegítimaemaisaquotadisponível.
§4.ºSendováriasasdoaçõesaherdeirosnecessários,feitasemdiferentesdatas,serãoelasreduzidasa
partirdaúltima,atéaeliminaçãodoexcesso”.
Ehábensdispensadosdacolação?
Sim!
O texto codificado traz diversas (lógicas) exceções de bens que não se
submetemàcolação655.
Todas as hipóteses, porém, se fundamentam em situações fáticas em que a
legítimaépreservada.
Éocaso,porexemplo,daprevisãodoart.2.005:
“Art.2.005.Sãodispensadasdacolaçãoasdoaçõesqueodoadordeterminarsaiamdapartedisponível,
contantoquenãoaexcedam,computadooseuvaloraotempodadoação.
Parágrafoúnico.Presume-seimputadanapartedisponívelaliberalidadefeitaadescendenteque,aotempo
doato,nãoseriachamadoàsucessãonaqualidadedeherdeironecessário”.
Obviamente,tambémdentrodapartedisponível,podeoprópriodoador(autor
daherança)dispensaracolaçãonorespectivotítuloemquerealizouadoaçãoou
mesmoemtestamento656.
Damesmaforma,o institutonãoseprestaaestimulara faltadecuidadodos
paiscomosfilhos,motivopeloqual,naformadoart.2.010,nãovirãoàcolação
os gastos ordinários do ascendente como descendente, enquantomenor, na sua
educação, estudos, sustento, vestuário, tratamento nas enfermidades, enxoval,
assimcomoasdespesasdecasamento,ouasfeitasnointeressedesuadefesaem
processo-crime.
Porfim,aindaquantoabensexcluídosdacolação,registre-sequeas“doações
remuneratórias de serviços feitos ao ascendente também não estão sujeitas a
colação” (art.2.011),oqueéperfeitamenteaceitável, jáquenãoháumcaráter
necessáriodeliberalidadepura.
Regrainteressanteéestabelecidanoart.2.008:
“Art.2.008.Aquelequerenunciouaherançaoudelafoiexcluído,deve,nãoobstante,conferirasdoações
recebidas,paraofimdereporoqueexcederodisponível.
A obrigação de efetivar a conferência para colação, inclusive, não é
personalíssima,transferindo-seaosnetos,naformadoart.2.009:
“Art.2.009.Quandoosnetos,representandoosseuspais,sucederemaosavós,serãoobrigadosatrazerà
colação,aindaquenãoohajamherdado,oqueospaisteriamdeconferir”.
Parece-nos, inclusive, que a melhor técnica recomendaria a utilização da
expressão “descendentes” em vez de “netos”, pois não faz sentido limitar a
obrigaçãoaosegundograudescendente,podendohaversituaçãoderepresentação
combisnetos,tataranetosetc.
Nocasodedoaçãofeitaporambososcônjuges,noinventáriodecadaumse
conferirápormetade,conformeestabeleceoart.2.012doCódigoCivil.
Eseoherdeironegaraocorrênciadorecebimentodosbensoumesmooatode
conferência?
Neste caso, estabelece o art. 641 doCódigo de ProcessoCivil de 2015 um
procedimentoincidentalparaverificaçãodofato,nosseguintestermos:
“Art.641.Seoherdeironegaro recebimentodosbensouaobrigaçãodeosconferir, o juiz,ouvidasas
partesnoprazocomumde15(quinze)dias,decidiráàvistadasalegaçõesedasprovasproduzidas.
§1.ºDeclarada improcedenteaoposição,seoherdeiro,noprazo improrrogávelde15(quinze)dias,não
proceder à conferência, o juizmandará sequestrar-lhe, para serem inventariados e partilhados, os bens
sujeitosàcolaçãoouimputaraoseuquinhãohereditárioovalordeles,sejánãoospossuir.
§ 2.º Se a matéria exigir dilação probatória diversa da documental, o juiz remeterá as partes às vias
ordinárias, não podendo o herdeiro receber o seu quinhão hereditário, enquanto pender a demanda, sem
prestarcauçãocorrespondenteaovalordosbenssobreosquaisversaraconferência”.
Trata-sedemedidasalutardenítidanaturezaacautelatória.
7.3.Pagamentodasdívidas
Oinventáriosomenteconduziráaumaeventualpartilha(ouadjudicação)dos
bensseasdívidasdofalecidohouveremsidopagas.
Nessesentido,dispõeoart.642doCódigodeProcessoCivilde2015:
“Art.642.Antesdapartilha,poderãooscredoresdoespóliorequereraojuízodoinventárioopagamento
dasdívidasvencidaseexigíveis.
§ 1.ºApetição, acompanhada de prova literal da dívida, será distribuída por dependência e autuada em
apensoaosautosdoprocessodeinventário.
§2.ºConcordandoaspartescomopedido,ojuiz,aodeclararhabilitadoocredor,mandaráquesefaçaa
separaçãodedinheiroou,emsuafalta,debenssuficientesparaopagamento.
§3.ºSeparadososbens, tantosquantosforemnecessáriosparaopagamentodoscredoreshabilitados,o
juizmandaráaliená-los,observando-seasdisposiçõesdesteCódigorelativasàexpropriação.
§4.ºSeocredorrequererque,emvezdedinheiro,lhesejamadjudicados,paraoseupagamento,osbens
járeservados,ojuizdeferir-lhe-áopedido,concordandotodasaspartes.
§ 5.º Os donatários serão chamados a pronunciar-se sobre a aprovação das dívidas, sempre que haja
possibilidadederesultardelasareduçãodasliberalidades”.
Éimportantíssimodestacarqueo§1.ºdoart.1.997dovigenteCódigoCivil
brasileiroestabeleceque,tendosidorequeridonoinventário,antesdapartilha,o
pagamento de dívidas constantes de documentos, revestidos de formalidades
legais,constituindoprovabastantedaobrigação,ehouver impugnação,quenão
se funde na alegação de pagamento, acompanhada de prova valiosa, o juiz
mandará reservar, em poder do inventariante, bens suficientes para solução do
débito,sobreosquaisvenhaarecairoportunamenteaexecução.
Nestamesmalinha,aliás,estabeleceoart.643doCódigodeProcessoCivilde
2015:
“Art.643.Nãohavendoconcordânciadetodasaspartessobreopedidodepagamentofeitopelocredor,
seráopedidoremetidoàsviasordinárias.
Parágrafoúnico.Ojuizmandará,porém,reservar,empoderdoinventariante,benssuficientesparapagaro
credorquandoadívidaconstardedocumentoquecomprovesuficientementeaobrigaçãoeaimpugnação
nãosefundaremquitação”.
Trata-se de uma solução bastante razoável para preservar os interesses dos
credoresedosherdeiros,massemdescurardaduraçãorazoáveldoprocesso,já
quesetratadequestãoaserdiscutidaemjuízopróprioeautônomoemrelaçãoao
inventário.
Nestecaso,porém,éestabelecidooprazodetrintadias,no§2.ºdoreferido
art.1.997,paraqueocredordêinícioàaçãodecobrança,sobpenadesetornar
denenhumefeitoaprovidênciaindicada.
Perceba-se que tal prazo não impede o ajuizamento da ação de cobrança,
tornandosemefeitoapenasagarantiapropugnadapelotextolegal.
Valedestacar,porfim,oquedispõeoart.644doCPC/2015:
“Art.644.Ocredordedívidalíquidaecerta,aindanãovencida,poderequererhabilitaçãonoinventário.
Parágrafo único. Concordando as partes com o pedido referido no caput, o juiz, ao julgar habilitado o
crédito,mandaráquesefaçaseparaçãodebensparaofuturopagamento”.
Observe-seapeculiaridadedasituaçãomencionada.
Areferidadívida(obrigaçãotransmissível),emboralíquidaecerta,aindanão
estávencida,mesmotendoocorridoofalecimentododevedor,razãoporquehá
expressamençãoà“concordânciadaspartes”.
Valeaindaacrescentarque, seoherdeiro fordevedoraoespólio, suadívida
serápartilhadaigualmenteentretodos,salvoseamaioriaconsentirqueodébito
sejaimputadointeiramentenoquinhãododevedor,comopreceituaoart.2.001.
Namesmalinha,permiteoart.646doCódigodeProcessoCivilbrasileirode
2015(semprejuízododispostonoart.860domesmodiploma)queosherdeiros,
aosepararembensparaopagamentodedívidas,autorizemqueoinventarianteos
nomeieàpenhoranoprocessoemqueoespólioforexecutado.
Issofacilitaopagamentodasdívidasediminuiasdisputasquandodapartilha
dosbens,naperspectivadoprincípiodaautonomiaprivada.
Observe-se que, na linha do art. 1.998 da codificação civil, as despesas
funerárias,hajaounãoherdeiroslegítimos,sairãosempredomontedaherança;
mas as de sufrágios por alma do falecido só obrigarão a herança quando
ordenadasemtestamentooucodicilo,locusidealparataldeterminaçãodoautor
daherança657.
Nahipótesedehaveraçõesregressivasentreosherdeiros,casoumdelesseja
insolvente, sua cota será dividida proporcionalmente entre os demais,
observando-seoseuquinhãohereditário658.
E não se tratando de questões de alta indagação, o juízo do inventário deve
atrairojulgamentodasquestõespecuniáriasentreosherdeiros659.
Ese,comoémuitocomum,oherdeirofordevedordeterceiros?
Podemoscredoresdesseherdeirosehabilitarnaherança?
Sobreotema,disciplinaoart.2.000dotextocodificado:
“Art.2.000.Oslegatáriosecredoresdaherançapodemexigirquedopatrimôniodofalecidosediscrimine
odoherdeiro,e,emconcursocomoscredoresdeste,ser-lhes-ãopreferidosnopagamento”.
Ainda em relação às dívidas do espólio, registre-se que o legatário também
podeserconsideradopartelegítimaparasemanifestarsobreelas.
Éaprevisãodoart.645doCódigodeProcessoCivilde2015,inverbis:
“Art.645.Olegatárioépartelegítimaparamanifestar-sesobreasdívidasdoespólio:
I—quandotodaaherançafordivididaemlegados;
II—quandooreconhecimentodasdívidasimportarreduçãodoslegados”.
O dispositivo é lógico: quando o interesse do legatário puder ser atingido,
deveelesemanifestararespeitodaquestãoquelhetoca.
7.4.Avaliaçãoecálculodoimposto
OCódigodeProcessoCivilde2015reservaaSeçãoV(“DaAvaliaçãoedo
CálculodoImposto”)somenteparatalfase660.
Como se trata de um iter detalhadamente descrito em lei, caracterizado por
normas de dicção objetiva e eminentemente procedimentais, cuidamos de
transcreverosnovosdispositivosinauguradosapartirdaLeiProcessualde2015:
“Art.630.Findooprazoprevistonoart.627semimpugnaçãooudecididaaimpugnaçãoquehouversido
oposta,o juiznomeará, se foro caso,peritopara avaliarosbensdoespólio, senãohouverna comarca
avaliadorjudicial.
Parágrafoúnico.Nahipóteseprevistanoart.620,§1.º,o juiznomearáperitoparaavaliaçãodasquotas
sociaisouapuraçãodoshaveres.
Art.631.Aoavaliarosbensdoespólio,operitoobservará,noqueforaplicável,odispostonosarts.872e
873.
Art.632.Nãoseexpedirácartaprecatóriaparaaavaliaçãodebenssituadosforadacomarcaondecorre
oinventárioseelesforemdepequenovalorouperfeitamenteconhecidosdoperitonomeado.
Art. 633. Sendo capazes todas as partes, não se procederá à avaliação se a Fazenda Pública, intimada
pessoalmente,concordardeformaexpressacomovaloratribuído,nasprimeirasdeclarações,aosbensdo
espólio.
Art.634.SeosherdeirosconcordaremcomovalordosbensdeclaradospelaFazendaPública,aavaliação
cingir-se-áaosdemais.
Art. 635. Entregue o laudo de avaliação, o juiz mandará que as partes se manifestem no prazo de 15
(quinze)dias,quecorreráemcartório.
§ 1.ºVersando a impugnação sobre o valor dado pelo perito, o juiz a decidirá de plano, à vista do que
constardosautos.
§2.ºJulgandoprocedenteaimpugnação,ojuizdeterminaráqueoperitoretifiqueaavaliação,observando
osfundamentosdadecisão.
Art.636.Aceitoolaudoouresolvidasasimpugnaçõessuscitadasaseurespeito,lavrar-se-áemseguidao
termodeúltimasdeclarações,noqualoinventariantepoderáemendar,aditaroucompletarasprimeiras.
Art.637.Ouvidasaspartessobreasúltimasdeclaraçõesnoprazocomumde15(quinze)dias,proceder-
se-áaocálculodotributo.
Art.638.Feitoocálculo,sobreeleserãoouvidastodasaspartesnoprazocomumde5(cinco)dias,que
correráemcartório,e,emseguida,aFazendaPública.
§ 1.º Se acolher eventual impugnação, o juiz ordenará nova remessa dos autos ao contabilista,
determinandoasalteraçõesquedevamserfeitasnocálculo.
§2.ºCumpridoodespacho,ojuizjulgaráocálculodotributo”.
Tudoissopartedopressupostodequehá,efetivamente,haveresapartilhar.
Esenadaexistirparapartilhar?
Éotemado“inventárionegativo”,aserabordadonopróximotópico.
8.INVENTÁRIONEGATIVO
Não havendo bens a partilhar, o consequente pensamento é no sentido da
desnecessidadedoinventário.
Pareceumaconclusãológica.
Masnãoétãosimplesassim.
No âmbito jurídico,muitas vezes, a necessidade de estabilidade e segurança
faz com que o reconhecimento oficial de uma situação de inexistência seja
exigida.
NaprecisaliçãodeMARIAHELENADINIZ:
“Segundo Itabaiana deOliveira, ‘o inventário negativo é omodo judicial de se provar, para determinado
fim,a inexistênciadebensdoextintocasal’.Deveras,conformeoCódigoCivil,art.1.641, I,combinado
comoart.1.523,I,éobrigatóriooregimedeseparaçãodebensnocasamentodoviúvooudaviúvaque
tenhafilhosdocônjugefalecido,excetosefez inventárioedeupartilhaaosherdeiros.Seoextintocasal
nãopossuíahaveres,nadaimpedeacomunhãopretendida,quevigoraránassegundasnúpcias,anãoser
que haja pacto antenupcial em contrário.Apesar de a lei não exigir a realização do inventário negativo,
promovidopeloviúvoouviúva,paraevidenciarainexistênciadebensdocasalporinventariarepartilhar
aos herdeiros, a doutrina e a jurisprudência o consideram necessário (RF 74:31, 130:303, 102:292; rt,
268:300,488:97),paraqueocônjugeviúvofiqueisentodapenalidadeedoimpedimentoacimamencionado.
Assim, o consorte viúvo, segundo a praxe, apresentará aomagistrado um requerimento dentro do prazo
legaldoart.1.796doCódigoCivil;porém,seultrapassardemuitoesseprazo,qualquerinteressadopoderá
exigirqueprovesuasalegaçõespormeiodetestemunhas,instruídocomacertidãodeóbito,mencionadoo
nomedo inventariado, dia e lugar do falecimento, os nomes, as idades, o estado civil e a residênciados
herdeiros, declarando a inexistência de bens por inventariar e partilhar. Omagistradomandará o viúvo
afirmaraverdadedoconteúdodesuapetição,medianteorespectivotermo,edarvistadosautos,emcurto
prazo, aos herdeiros, aos representantes da Fazenda Pública e aos curadores e órfãos e ausentes, se
houver herdeiro menor, interdito ou ausente. Ouvidos os interessados, estando todos de acordo, o juiz
proferirá sentença, proclamando a negatividade de inventário. Essa decisão será trasladada, mediante
certidão,aosautosdehabilitaçãomatrimonial” 661.
Trata-se,portanto,deumaformaútilerecomendávelderesguardodeeventuais
direitosdointeressado.
9.INVENTÁRIOADMINISTRATIVO
ALei n. 11.441, de 4 de janeiro de 2007, deu nova redação ao art. 982 do
CódigodeProcessoCivilde1973einovouaoadmitiroinventárioextrajudicial,
lavradoporescriturapública,consensualmente,notabelionatodenotas,setodas
as partes interessadas forem capazes, estiverem assistidas por advogado e
concordes,enãohouvertestamento.
Confira-seomencionadodispositivolegaldacodificaçãoanterior:
“Art.982.Havendotestamentoouinteressadoincapaz,proceder-se-áaoinventáriojudicial;setodosforem
capazeseconcordes,poderáfazer-seoinventárioeapartilhaporescriturapública,aqualconstituirátítulo
hábilparaoregistroimobiliário.
§1.ºO tabelião somente lavraráa escriturapública se todasaspartes interessadasestiveremassistidas
por advogado comum ou advogados de cada uma delas ou por defensor público, cuja qualificação e
assinaturaconstarãodoatonotarial(Renumeradodoparágrafoúnicocomnovaredação,pelaLein.
11.965,de2009).
§2.ºAescrituraedemaisatosnotariaisserãogratuitosàquelesquesedeclararempobressobaspenasda
lei(IncluídopelaLein.11.965,de2009)”.
Nãoapenasoinventáriotradicional,mastambémoarrolamentoou,atémesmo,
aadjudicaçãopoderãosedarpelaformaadministrativa,desdequeatendidasas
exigênciaslegais.
Sobre o tema, é importantemencionar aResolução n. 35, de 24 de abril de
2007, do CNJ (alterada pelas Resoluções n. 120 e 179, de 2010 e 2013,
respectivamente),cujotrechoaseguirdestacamos:
“Art. 11. É obrigatória a nomeação de interessado, na escritura pública de inventário e partilha, para
representar o espólio, com poderes de inventariante, no cumprimento de obrigações ativas ou passivas
pendentes,semnecessidadedeseguiraordemprevistanoart.990doCódigodeProcessoCivil.
Art.12.Admitem-seinventárioepartilhaextrajudiciaiscomviúvo(a)ouherdeiro(s)capazes,inclusivepor
emancipação,representado(s)porprocuraçãoformalizadaporinstrumentopúblicocompoderesespeciais
(excluídopelaResoluçãon.179,de3-10-2013)”.
Note-sequesepassouaadmitirqueummesmoadvogadopudesseatuarcomo
procuradoreassistentetécnicodoseuconstituinte:
“OConselhoNacionaldeJustiça(CNJ)decidiu,emsua175.ªSessãoOrdinária,realizadanasegunda-feira
(23/9),alterarparcialmentearedaçãodoartigo12daResoluçãoCNJn.35,de2007,parapermitirqueum
mesmoadvogadoexerçaafunçãodeprocuradoreassessordeseusclientesemprocessosdeescriturade
inventário extrajudicial. A nova redação ficou assim: ‘Art. 12. Admitem-se inventário e partilha
extrajudiciais com viúvo(a) ou herdeiro(s) capazes, inclusive por emancipação, representado(s) por
procuraçãoformalizadaporinstrumentopúblicocompoderesespeciais’.
Opedidode alteração foi apresentadopelaAssociaçãodosAdvogados deSãoPaulo e endossada pela
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), no processo 0000227-63.2013.2.00.0000, relatado pelo
conselheiro Guilherme Calmon. As duas entidades alegaram que o dispositivo proibia o advogado, ‘em
escriturasdeinventárioextrajudicial,departiciparcomoprocuradoreassessordeseusclientes,criando,ao
largodalei,indevidasrestriçõesaoexercíciodaadvocacia’.
Deacordocomaassociação,alémdecriar‘evidenteentraveàatuaçãoprofissional’,onormativodoCNJ
criava ‘umônus adicional aos próprios interessados’, que são forçados a contratar novo advogado para
participar do ato de registro no cartório de notas. ‘Na prática, o advogado que representa os herdeiros
residentesnoexterior,foradacomarcaouque,porqualquermotivo,nãopossamparticiparpessoalmente
doatonotarial, está impedidode, sozinho, lavraraescrituraeo inventárioextrajudicial,poisnãopoderá,
simultaneamente,representarosherdeirosausenteseparticipardoatocomoassistente,tendoemvistaque
terá de se valer do concurso de outro profissional, não raras vezes com atuação meramente formal’,
argumentaramasentidades,segundoorelatóriodoconselheiroGuilhermeCalmon.
A exigência, na avaliação da entidade dos advogados, não tem respaldo na Lei n. 11.441/2007, fere o
Estatuto do Advogado e também aumenta o custo do inventário extrajudicial, estimulando as partes a
recorrer ao inventário judicial. Isso contraria a própria lei cujo objetivo é retirar do Judiciário ‘o
processamentodecausasnãocontenciosas’.
O relator Guilherme Calmon reconheceu que ‘a presença de mais de um advogado na realização da
escriturapública,talcomoprevistanapartefinaldoartigo12,daResoluçãon.35,doConselhoNacional
deJustiça,nãoserevelamedidaqueestejaemsintoniacomoespíritodaLein.11.441/2007’.
Oobjetivodalei,explicouoconselheiro,éa‘desjudicializaçãodosatosenegóciosdisponíveisemrelaçãoà
separação,aodivórcio,aoinventárioeàpartilhaamigáveis’.Noprocessojudicial, lembrouoconselheiro,
umúnicoadvogadopraticatodososatosatéaconclusãodoinventário.OPlenáriodoCNJacompanhouo
votodorelatoreaprovouanovaredaçãodoartigo12daResoluçãoCNJn.35.
GilsonLuizEuzébio
AgênciaCNJdeNotícias”662.
Trata-se de providência que, de fato, desburocratiza o ato, razão pela qual
mereceuanossareferênciaeatenção.
Recentemente,amatériapassouaser tratadapeloCPCde2015,que,emseu
art.610,dispõe:
“Art.610.Havendotestamentoouinteressadoincapaz,proceder-se-áaoinventáriojudicial.
§1.ºSetodosforemcapazeseconcordes,oinventárioeapartilhapoderãoserfeitosporescriturapública,
a qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de
importânciadepositadaeminstituiçõesfinanceiras.
§2.ºO tabelião somente lavraráa escriturapública se todasaspartes interessadasestiveremassistidas
poradvogadooupordefensorpúblico,cujaqualificaçãoeassinaturaconstarãodoatonotarial”.
10.INVENTÁRIOJUDICIAL
Omodelotradicional(e,até2007,único)deinventárioéojudicial.
ComoobservamDIMASMESSIASDECARVALHOeDIMASDANIELDE
CARVALHO,referindo-seaoCPCde1973:
“Oinventáriojudicialpossibilitatrêsritosdistintos,emrazãodapresençadosinteressados,acordoentre
eles,valordosbensouincapacidadedaspartes.Oinventáriocomumoutradicional(arts.982a1.013,
CPC),comfasedistintadepartilha;oinventárionaformadearrolamentosumário(arts.1.031a1.035,
CPC), quando todas as partes forem capazes e concordes, qualquer que seja o valor dos bens; e o
inventário na forma de arrolamento comum (art. 1.036, CPC), quando, mesmo existindo partes
incapazes,ovalordosbensfordepequenovalor(2.000ORTNs).
Oinventáriocomumoutradicionaléutilizadoquandoincabívelasoutrasformas,emrazãodesuasdiversas
fasesemorosidade.
Orequerimentoparaaberturadoprocessodeinventáriodeveocorrernoprazodesessentadiasacontar
damorte,noúltimodomicíliodoautordaherança(arts.96e983,CPC),porquemseencontrenapossee
administraçãodoespólio,cônjugesobrevivente,herdeiro, legatário, testamenteiro,cessionáriodoherdeiro
ou do legatário, credor, síndico da falência de qualquer interessado, pelo Ministério Público, se houver
incapazes,FazendaPública,oudeofíciopeloJuiz(arts.987a989,CPC),instruindo-ocomacertidãode
óbito(art.987,parágrafoúnico,CPC).
Oinventáriojudicialdeveserconcluídonoprazodedozemesessubsequentesàsuaabertura,podendoo
prazoserprorrogadopelojuizdeofícioouarequerimentodaspartes” 663.
Compreendamosoprocedimento.
10.1.Procedimentojudicialnoinventáriocomum
Oinventárioétratado,emnossoCódigodeProcessoCivil,juntamentecoma
partilha,noCapítuloVI(“DoInventárioedaPartilha”).
Observe-seque,havendotestamentoouherdeiroincapaz,adependerdovalor
daherança,oinventáriojudicialtradicionalseráaúnicaformaautorizadadese
formalizareregularizaratransferênciapatrimonialdosbensdodecujus.
Sobrealegitimidadepararequereroinventário,estabelecemosarts.615e616
doCódigodeProcessoCivilde2015:
“Art.615.Orequerimentodeinventárioedepartilhaincumbeaquemestivernaposseenaadministração
doespólio,noprazoestabelecidonoart.611.
Parágrafoúnico.Orequerimentoseráinstruídocomacertidãodeóbitodoautordaherança.
Art.616.Têm,contudo,legitimidadeconcorrente:
I—ocônjugeoucompanheirosupérstite;
II—oherdeiro;
III—olegatário;
IV—otestamenteiro;
V—ocessionáriodoherdeirooudolegatário;
VI—ocredordoherdeiro,dolegatáriooudoautordaherança;
VII—oMinistérioPúblico,havendoherdeirosincapazes;
VIII—aFazendaPública,quandotiverinteresse;
IX—oadministradorjudicialdafalênciadoherdeiro,dolegatário,doautordaherançaoudocônjugeou
companheirosupérstite”.
Vale registrar que a antiga previsão constante no art. 989, CPC-1973, no
sentido de o juiz poder iniciar o procedimento de inventário de ofício, se
nenhumadaspessoaslegitimadasorequeresse,nãotemcorrespondentenoCPC-
2015.
Iniciado o processo, passa-se para a fase de citações e impugnações, como
determinadopeloart.626doCódigodeProcessoCivilde2015.
A finalidade da citação é assegurar o direito de todos os interessados de
apresentareventuaisimpugnaçõesaoinventário664:
“Art. 627. Concluídas as citações, abrir-se-á vista às partes, em cartório e pelo prazo comum de 15
(quinze)dias,paraquesemanifestemsobreasprimeirasdeclarações,incumbindoàspartes:
I—arguirerros,omissõesesonegaçãodebens;
II—reclamarcontraanomeaçãodeinventariante;
III—contestaraqualidadedequemfoiincluídonotítulodeherdeiro.
§ 1.º Julgando procedente a impugnação referida no inciso I, o juiz mandará retificar as primeiras
declarações.
§ 2.º Se acolher o pedido de que trata o inciso II, o juiz nomeará outro inventariante, observada a
preferêncialegal.
§3.ºVerificandoqueadisputasobreaqualidadedeherdeiroaquealudeoincisoIIIdemandaproduçãode
provasquenãoadocumental,ojuizremeteráaparteàsviasordináriasesobrestará,atéojulgamentoda
ação,aentregadoquinhãoquenapartilhacouberaoherdeiroadmitido”.
Concluída essa etapa, os arts. 628 e 629, respectivamente, preveem a
possibilidade de o sujeito preterido poder demandar a sua admissão no
inventário, bem como amanifestação da Fazenda Pública acerca do valor dos
imóveisdescritosnasprimeirasdeclarações.
10.2.Arrolamento
Oarrolamentoé,emessência,umprocedimentosimplificadodeinventário.
A partir da entrada em vigor do CPC de 2015, o arrolamento passou a ser
disciplinadoapartirdoart.659:
“Art. 659. A partilha amigável, celebrada entre partes capazes, nos termos da lei, será homologada de
planopelojuiz,comobservânciadosarts.660a663.
§1.ºOdispostonesteartigoaplica-se,também,aopedidodeadjudicação,quandohouverherdeiroúnico.
§ 2.º Transitada em julgado a sentença de homologação de partilha ou de adjudicação, será lavrado o
formal de partilha ou elaborada a carta de adjudicação e, em seguida, serão expedidos os alvarás
referentesaosbenseàsrendasporeleabrangidos,intimando-seofiscoparalançamentoadministrativodo
impostodetransmissãoedeoutrostributosporventuraincidentes,conformedispuseralegislaçãotributária,
nostermosdo§2.ºdoart.662.
Art. 660. Na petição de inventário, que se processará na forma de arrolamento sumário,
independentementedalavraturadetermosdequalquerespécie,osherdeiros:
I—requererãoaojuizanomeaçãodoinventariantequedesignarem;
II—declararãoostítulosdosherdeiroseosbensdoespólio,observadoodispostonoart.630;
III—atribuirãovaloraosbensdoespólio,parafinsdepartilha.
Art.661.Ressalvadaahipóteseprevistanoparágrafoúnicodoart.663,nãoseprocederáàavaliaçãodos
bensdoespólioparanenhumafinalidade.
Art. 662. No arrolamento, não serão conhecidas ou apreciadas questões relativas ao lançamento, ao
pagamentoouàquitaçãodetaxasjudiciáriasede tributos incidentessobrea transmissãodapropriedade
dosbensdoespólio.
§1.ºAtaxajudiciária,sedevida,serácalculadacombasenovaloratribuídopelosherdeiros,cabendoao
fisco, se apurar emprocesso administrativo valor diverso do estimado, exigir a eventual diferença pelos
meiosadequadosaolançamentodecréditostributáriosemgeral.
§2.ºOimpostodetransmissãoseráobjetodelançamentoadministrativo,conformedispusera legislação
tributária,nãoficandoasautoridadesfazendáriasadstritasaosvaloresdosbensdoespólioatribuídospelos
herdeiros.
Art.663.Aexistênciadecredoresdoespólionãoimpediráahomologaçãodapartilhaoudaadjudicação,
seforemreservadosbenssuficientesparaopagamentodadívida.
Parágrafo único. A reserva de bens será realizada pelo valor estimado pelas partes, salvo se o credor,
regularmentenotificado,impugnaraestimativa,casoemquesepromoveráaavaliaçãodosbensaserem
reservados.
Art. 664. Quando o valor dos bens do espólio for igual ou inferior a 1.000 (mil) salários mínimos, o
inventárioprocessar-se-ánaformadearrolamento,cabendoaoinventariantenomeado,independentemente
deassinaturadetermodecompromisso,apresentar,comsuasdeclarações,aatribuiçãodevaloraosbens
doespólioeoplanodapartilha.
§1.ºSequalquerdaspartesouoMinistérioPúblicoimpugnaraestimativa,ojuiznomearáavaliador,que
oferecerálaudoem10(dez)dias.
§2.ºApresentadoolaudo,ojuiz,emaudiênciaquedesignar,deliberarásobreapartilha,decidindodeplano
todasasreclamaçõesemandandopagarasdívidasnãoimpugnadas.
§3.ºLavrar-se-áde tudoumsó termo,assinadopelo juiz,pelo inventarianteepelaspartespresentesou
porseusadvogados.
§4.ºAplicam-seaessaespéciedearrolamento,noquecouber,asdisposiçõesdoart.672,relativamente
ao lançamento, ao pagamento e à quitação da taxa judiciária e do imposto sobre a transmissão da
propriedadedosbensdoespólio.
§ 5.º Provada a quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas, o juiz julgará a
partilha.
Art.665.O inventárioprocessar-se-á tambémna formadoart.664,aindaquehaja interessado incapaz,
desdequeconcordemtodasasparteseoMinistérioPúblico.
Art.666.IndependerádeinventáriooudearrolamentoopagamentodosvaloresprevistosnaLein.6.858,
de24denovembrode1980.
Art.667.Aplicam-sesubsidiariamenteaestaSeçãoasdisposiçõesdasSeçõesVIIeVIIIdesteCapítulo”.
Destacamos a previsão constante no art. 664 que prevê uma forma de
arrolamentocomum,quandoovalordoespólioforigualouinferiora1.000(mil)
saláriosmínimos.
Note-sequeaantigaprevisãoemOTN(ObrigaçõesdoTesouroNacional)foi
substituídapelareferênciaaosaláriomínimo.
10.3.Alvarájudicial
Aexpediçãodealvarájudicialéumatécnicabastantedifundidanocampodas
sucessões,conformetrataremosnoderradeirocapítulodestelivro665.
Suautilizaçãonãoselimitaaosresíduossucessórios,mastambémsedestinaà
concessãodeautorizaçãojudicialparaapráticadeatosqueoinventariantenão
poderealizardeformaautônoma,como,porexemplo,alienarbensdoespólioou
efetivar transações e pagamentos de dívidas e despesas para conservação e
manutençãodosbens(art.619doCPC/2015).
Sobre espécies de alvarás, observamDIMASMESSIAS DE CARVALHO e
DIMASDANIELDECARVALHO:
“LecionamSebastiãoAmorimeEuclidesdeOliveiraque,nocampodosinventáriosearrolamentos,várias
sãoasespéciesdealvarás,classificáveisemincidentais.
O alvará incidental é o requerido pelo inventariante, herdeiro ou sucessor, no curso do inventário e
juntadonosautos,independentementededistribuição,ensejandodecisãointerlocutória.Efetuadoopedido,
deve ser aberta oportunidade para manifestação das partes, do fisco e do Ministério Público, quando
obrigatóriaaintervenção.Ashipótesesmaiscomunssãoolevantamentodedepósitosparapagamentode
dívidas, despesas de funerais, custas processuais, impostos de transmissão e honorários de advogado;
alienaçãodebensquenão interessamamanutenção,parapagamentodedívidas edespesasdo espólio;
para recebimentooupermutadebens;paraemissãode recibosdeveículosvendidospelo falecido;para
outorgadeescrituras;paraaplicaçãodenumerários;paraorecebimentodeverbas trabalhistasesaques
doFGTSePIS-PASEP,quandoexistemoutrosbensainventariar.Nessescasos,aprestaçãodecontasé
efetuadanormalmentenosautosdoinventárioenoprazodetrintadias.
Oalvaráemapenso é o requeridopor terceiros, desdeque apresentematéria conexa comoprocesso
principal. O pedido deve ser devidamente instruído como documentos e procuração e será autuado
separadamente,sujeitando-seàscustas,eapensadoaosautosprincipais,intimando-separamanifestaros
interessados, a Fazenda e o Ministério Público, se necessário a sua intervenção. O juiz pode ordenar
diligênciasantesdedecidiredecidiráobservandoosinteressesdoespólio,seconcordeoinventarianteea
providênciafornecessária,observandoasnormasdaconveniênciaeoportunidade,aindaquenemtodosos
herdeiros tenhamaquiescido.Existemjulgados,entretanto, indeferindooalvará judicialparaaoutorgade
escritura,quandohárecusaàsuaconcessãopelosherdeiros,postoque,enquantomeroprocedimentode
jurisdiçãovoluntária,nãosedestinaaosuprimentodevontadeprivada,cabendoaointeressadovaler-sedos
meios próprios, como a adjudicação compulsória. A hipótese mais comum é o alvará para autorizar a
outorgadeescriturareferenteaimóvelcompromissadoàvendapelofalecidoejáquitado.
OalvaráindependenteéoquedáefetividadeàLein.6.858/1980,quedispõesobreosbensdispensados
de arrolamento e inventário, como os valores devidos pelo contrato de trabalho, FGTS, PIS-PASEP,
restituiçõesdoimpostoderenda,saldosbancáriosedecadernetasdepoupançaefundosdeinvestimentos,
já abordados. Existindo outros bens, deve ser requerido alvará nos próprios autos do inventário, sendo
incabívelalvaráautônomo.
Olevantamentodosvaloressódependedealvarájudicial,senãohouverdependenteshabilitadosperantea
Previdência Social, entretanto, a histórica resistência dos estabelecimentos bancários em não efetuar o
pagamento, sem determinação da justiça, acaba por obrigar os interessados, mesmo que habilitados, a
requereroalvarájudicial” 666.
Compreendidas todas as principais questões acerca do tormentoso tema do
inventário,enfrentemos,nopróximocapítulo,apartilha.
CapítuloXXIV
Partilha
Sumário: 1. Finalidade do capítulo. 2. Noções conceituais fundamentais. 3. Espécies de partilha. 4.
Legitimidade para requerimento da partilha. 5. Partilha em vida. 6. Isonomia na partilha. 7. Alienação
judicial. 8. Homologação da partilha. 9. Da garantia dos quinhões hereditários. 10. Da invalidade de
partilha:açãoanulatória(anulaçãodapartilha)eaçãorescisória.11.Sobrepartilha.
1.FINALIDADEDOCAPÍTULO
O presente capítulo tem por finalidade apresentar uma visão geral sobre a
“partilha”,complementandoasconsiderações,feitasnocapítuloanterior,sobreo
institutodo“inventário”.
Paraisso,passaremosemrevistatodososdispositivosnormativosespecíficos
do vigente Código Civil sobre o tema, de forma a garantir uma compreensão
efetivamenteabrangentedamatéria.
Vamosaela!
2.NOÇÕESCONCEITUAISFUNDAMENTAIS
Oqueéumapartilha?
Tal qual fizemos no capítulo anterior, comecemos com a definição proposta
pelodicionarista:
“Partilha s.m. (1188-1230 cf JM)1 operação que consiste em dividir em partes; repartição (p. dos
lucros) (p.deumacolheita)2p.met. qualquer quota individual, nesta operação; quinhão, lote3p.met.
característicaprópriadealgooudealguém;apanágio,atributo(afamaéap.dosucesso)4ESTatode
repartir os elementos de uma amostra estratificada de modo que cada parte contenha elementos
provenientesdeumúnicoextrato5JURatopeloqualopartidorprocedeàdivisãodeumpatrimônioentre
osinteressados,ger.eminventáriodepessoamorta,easerhomologadopelojuiz6p.ext.JURatoescrito
pelopartidorparaefeitodepartilha,nosinventários,conformeadecisãodojuiz,homologatóriadoacordo
entreaspartesouqueresolvesobreaformaçãodosquinhõesrespectivos ETIMlat.particúla,ae´parte
pequena ,́ dim. depars,tis´parte ,́ f.divg. vulg. departícula; verpart-; f. hist. 1188-1230partilla, sXV
partilha SIN/VARversinonímiadequinhãoHOM partilha(fl.partilhar)” 667.
Partilha,portanto,importanaideiadedivisãodebensedireitos,atribuindoa
cadaumdosinteressadosumafraçãoideal.
Otermo,alémdeplurissignificativo,nãoéprivativodoDireitodasSucessões.
Comefeito,pode-sefalartambémempartilhadebensquandoháaextinçãode
umnúcleofamiliar(pormeiododivórciooudadissoluçãodeuniãoestável,por
exemplo).Damesmaforma,nãoestariaequivocadaautilizaçãodotermoemuma
extinçãodepessoajurídica,comaatribuiçãodeseusbensremanescentesacada
umdosseus(ex-)sócios.
NoDireitoSucessório,porém,apartilhaéadivisãodopatrimôniolíquidodo
autordaherançaentreosseussucessores.
Essepatrimônioédenominado“montepartilhável”ou“montepartível”.
Ateordosarts.647a658doCódigodeProcessoCivilde2015, trata-seda
fase final do inventário (caso não se trate de um arrolamento ou de uma
adjudicação,casoemqueháherdeiroúnico).
3.ESPÉCIESDEPARTILHA
Talqualo inventário, tambémapartilhapodeseapresentarnasmodalidades
administrativa(extrajudicial)ejudicial.
A partilha extrajudicial é aquela realizada em cartório, por instrumento
público,nobojodeuminventárioadministrativo.
Vale destacar que, na forma do art. 610 do Código de Processo Civil, o
tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas
estiveremassistidasporadvogadooupordefensorpúblico, cujaqualificaçãoe
assinaturaconstarãodoatonotarial.
Observe-se ainda que a expressão “partilha amigável” não é privativa da
modalidade extrajudicial,mas, sim, de toda forma de partilha emque não haja
controvérsia.
Comefeito,dispõeoart.2.015doCódigoCivil:
“Art.2.015.Seosherdeirosforemcapazes,poderãofazerpartilhaamigável,porescriturapública, termo
nosautosdoinventário,ouescritoparticular,homologadopelojuiz”.
Note-se, pois, que pode haver uma partilha amigável judicial, ou seja,
ocorrida,consensualmente,nocursodeumprocesso(porisso“judicial”).
Já a “partilha por ato judicial” é aquela realizada quando os herdeiros
divergiremou sequalquerdeles for incapaz,na formadoart. 2.016doCódigo
Civil 668,pois,nestecaso,existeumpronunciamentodecisóriodojuizarespeito
dadivisãodosbens.
4.LEGITIMIDADEPARAREQUERIMENTODAPARTILHA
Qualquer sujeito, com interesse jurídico no patrimônio do autor da herança,
temlegitimidadepararequererapartilha.
Note-se que se trata de umaprerrogativa quenãopode ser negadanempelo
autordaherançaemdisposiçãodeúltimavontade.
Tal afirmação se extrai da literalidade do art. 2.013 do Código Civil
brasileiro:
“Art. 2.013. O herdeiro pode sempre requerer a partilha, ainda que o testador o proíba, cabendo igual
faculdadeaosseuscessionáriosecredores”.
Istonãoquerdizerqueotestadornãopossainfluirnapartilha.
Aocontrário.
A restrição é apenas quanto a uma eventual tentativa de limitação do
requerimento.
Istoporqueépossível, sim,queo autordaherança,pormeiode testamento,
indique quais bens e valores comporão os quinhões hereditários, obviamente
semprerespeitandoalegítima.
Éoqueseinferedoart.2.014davigentecodificaçãocivil:
“Art. 2.014. Pode o testador indicar os bens e valores que devem compor os quinhões hereditários,
deliberandoelepróprioapartilha,queprevalecerá,salvoseovalordosbensnãocorresponderàsquotas
estabelecidas”.
Adivisãoprévia,em testamento,pode facilitarmuitoaoperaçãodepartilha,
observando-seomultilembradoPrincípiodoRespeitoàVontadeManifestadado
autordaherança669.
Avontademanifestadadoautordaherançaénaturalmentetãorelevantequeo
ordenamento jurídicopositivoadmite, inclusive, a chamada“partilhaemvida”,
daqualjátratamosemcapítuloanterior.
5.PARTILHAEMVIDA
Excepcionalmente, a partilha pode ser realizada em vida, conforme já
vimos670.
Éaprevisãodoart.2.018dovigenteCódigoCivilbrasileiro:
“Art.2.018.Éválidaapartilhafeitaporascendente,poratoentrevivosoudeúltimavontade,contantoque
nãoprejudiquealegítimadosherdeirosnecessários”.
Aquestãoélógica!
Em vida, pode o proprietário dispor de seu patrimônio, desde que não abra
mãodoseumínimoexistencial 671.
Todavia, tratando-sedeumplanejamentosucessório,nãopodeoautordeixar
deobservarasregrasdaSucessãoLegítima,decaráterimperativo.
6.ISONOMIANAPARTILHA
Para que a partilha seja efetivamente equânime é fundamental que todos os
bens, inclusive acessórios, do falecido sejam inventariados, com a informação
correspondentedasuaexistênciaaojuizdacausa.
Nestalinha,dispõeoart.2.020:
“Art. 2.020.Os herdeiros em posse dos bens da herança, o cônjuge sobrevivente e o inventariante são
obrigados a trazer ao acervo os frutos que perceberam, desde a abertura da sucessão; têm direito ao
reembolsodasdespesasnecessáriaseúteisquefizeram,erespondempelodanoaque,pordoloouculpa,
deramcausa”.
Nopartilharosbens,observar-se-á,quantoaoseuvalor,naturezaequalidadea
maior igualdade possível, conforme preceitua o art. 2.017 do Código Civil
brasileiro.
A ideia é buscar garantir quotas equivalentes a todos os herdeiros, o que,
naturalmente, nemsempre é fácil, principalmentequando se tratadepatrimônio
compostodebenscomvaloresdiferentes.
7.ALIENAÇÃOJUDICIAL
Se não for possível acomodar cada bem do espólio nas cotas atribuíveis à
meaçãodoeventualcônjuge(oucompanheiro)sobreviventeeaoquinhãodecada
herdeiro,seránecessárioaliená-lojudicialmente.
Éoquedeterminaoart.2.019:
“Art. 2.019. Os bens insuscetíveis de divisão cômoda, que não couberem na meação do cônjuge
sobrevivente ou no quinhão de um só herdeiro, serão vendidos judicialmente, partilhando-se o valor
apurado,anãoserquehajaacordoparaseremadjudicadosatodos.
§1.ºNãosefaráavendajudicialseocônjugesobreviventeouumoumaisherdeirosrequereremlhesseja
adjudicadoobem,repondoaosoutros,emdinheiro,adiferença,apósavaliaçãoatualizada.
§2.ºSeaadjudicaçãoforrequeridapormaisdeumherdeiro,observar-se-áoprocessodalicitação”.
Alógicaéadaconversãoempecúniadobemquenãoseconseguepartilhar.
Dá-se preferência, obviamente, que o bem fique no patrimônio de um dos
herdeiros, observando-se, sempre, a preservação do interesses de todos os
envolvidos.
8.HOMOLOGAÇÃODAPARTILHA
Nafasefinaldoprocedimento,aspartesdeverão,ateordoart.647doCódigo
deProcessoCivil,formularosrespectivospedidosdequinhão.
Verificadosospedidosdaspartes,deveojuizproferirdecisãodedeliberação
dapartilha,queconsistiránaapreciaçãodaspostulaçõesdaspartes,acolhendo-as
ounão,paraindividualizaroquinhãodecadaherdeiroelegatário.
Há, porém, uma ordem legal de pagamentos a serem realizados quando da
partilha.
Éaprevisãodoart.651doCódigodeProcessoCivil:
“Art. 651.Opartidor organizará o esboçodapartilhade acordo comadecisão judicial, observandonos
pagamentosaseguinteordem:
I—dívidasatendidas;
II—meaçãodocônjuge;
III—meaçãodisponível;
IV—quinhõeshereditários,acomeçarpelocoerdeiromaisvelho”.
Registre-se que a menção do inciso IV ao “coerdeiro mais velho” significa
apenas um critério de ordem de pagamento, nunca de tratamento diferenciado,
inclusivequantoàscotas,entreirmãosouherdeirosdemesmograu.
Feito o esboço, terão as partes o prazo comum de quinze dias para se
manifestar.
Decididasaseventuaisimpugnações,poderáapartilhaserlançadanosautos.
OCódigodeProcessoCivilestabelece,emseuart.653,osrequisitosformais
dapartilha,nosseguintestermos:
“Art.653.Apartilhaconstará:
I—deautodeorçamento,quemencionará:
a)osnomesdoautordaherança,do inventariante,docônjugeoucompanheirosupérstite,dosherdeiros,
doslegatáriosedoscredoresadmitidos;
b)oativo,opassivoeolíquidopartível,comasnecessáriasespecificações;
c)ovalordecadaquinhão;
II—defolhadepagamentoparacadaparte,declarandoaquotaapagar-lhe,arazãodopagamentoea
relaçãodosbensque lhecompõemoquinhão, as característicasqueos individualizameosônusqueos
gravam.
Parágrafoúnico.Oautoecadaumadasfolhasserãoassinadospelojuizepeloescrivão”.
Pagooimpostodetransmissãomortiscausa,juntando-seaosautoscertidãoou
informação negativa de dívida para com a Fazenda Pública, o juiz julgará por
sentençaapartilha,nostermosdoart.654doCPC/2015.
Talsentençageraráumdocumento,queéotítulohábildaefetivaçãoformalda
partilha.
Confira-se,apropósito,oart.655doCódigodeProcessoCivil:
“Art.655.Transitadaemjulgadoasentençamencionadanoart.654,receberáoherdeiroosbensquelhe
tocaremeumformaldepartilha,doqualconstarãoasseguintespeças:
I—termodeinventarianteetítulodeherdeiros;
II—avaliaçãodosbensqueconstituíramoquinhãodoherdeiro;
III—pagamentodoquinhãohereditário;
IV—quitaçãodosimpostos;
V—sentença.
Parágrafo único. O formal de partilha poderá ser substituído por certidão de pagamento do quinhão
hereditárioquandoessenãoexcedera5(cinco)vezesosaláriomínimo,casoemquesetranscreveránela
asentençadepartilhatransitadaemjulgado”.
Porfim,valeregistrarque,naformadoart.656doCódigodeProcessoCivil
de2015,mesmoapóso trânsitoemjulgadodasentençacorrespondente,podea
partilhaseremendadanosmesmosautosdoinventário,convindotodasaspartes,
quandotenhahavidoerrodefatonadescriçãodosbens.
Além disso, o magistrado, de ofício ou a requerimento da parte, poderá, a
qualquertempo,corrigirinexatidõesmeramentemateriais.
9.DAGARANTIADOSQUINHÕESHEREDITÁRIOS
Julgadaapartilha,consumadaestaráadivisãopatrimonialdaherança,motivo
peloqualodireitodecadaumdosherdeiroscircunscrever-se-áaosbensdoseu
quinhão.
Todavia, na forma dos arts. 2.024 e 2.025 do Código Civil, os coerdeiros
continuarãoreciprocamenteobrigadosa indenizar-senocasodeevicção672 dos
bensaquinhoados,cessandotalobrigaçãopelaautonomiadavontade(convenção
emsentidocontrário)ounocasodaevicçãotersedadoporculpadoevicto,ou
porfatoposterioràpartilha.
Porfim,destaque-searegradoart.2.026:
“Art.2.026.Oevictoseráindenizadopeloscoerdeirosnaproporçãodesuasquotashereditárias,mas,se
algumdelesseacharinsolvente,responderãoosdemaisnamesmaproporção,pelapartedesse,menosa
quotaquecorresponderiaaoindenizado”.
Trata-sedeumaregraque resguardaaquele (evicto)que foraprivadodoseu
direitopeloreconhecimentododireitoanteriordeoutrem(evictor).
10.DAINVALIDADEDEPARTILHA:AÇÃOANULATÓRIA(ANULAÇÃODAPARTILHA)EAÇÃORESCISÓRIA
Transitadaemjulgadoasentençahomologatóriadepartilha(amigável),admite,
alegislaçãocodificada,opossívelreconhecimentodesuainvalidade.
Issoporqueapartilhaamigáveltemnaturezaessencialmentenegocial:
“Art. 2.027.Apartilha, umavez feita e julgada, só é anulável pelos vícios e defeitos que invalidam, em
geral,osnegóciosjurídicos”.
Interessante destacar, outrossim, que foi estabelecido um prazo decadencial
diferenciadoparatalanulaçãodapartilha(umano),naformadoparágrafoúnico
doreferidodispositivo.
Talprazo já era existentenoordenamento jurídicobrasileiro anterior à atual
codificaçãocivil,conformeseverificadoart.1.029doCódigodeProcessoCivil
de1973,inverbis:
“Art.1.029.Apartilhaamigável,lavradaeminstrumentopúblico,reduzidaatermonosautosdoinventário
ouconstantedeescritoparticularhomologadopelojuiz,podeseranulada,pordolo,coação,erroessencial
ouintervençãodeincapaz.(RedaçãodadapelaLein.5.925,de1.º-10-1973)
Parágrafo único. O direito de propor ação anulatória de partilha amigável prescreve em 1 (um) ano,
contadoesteprazo:(RedaçãodadapelaLein.5.925,de1.º-10-1973)
I—nocasodecoação,dodiaemqueelacessou;(RedaçãodadapelaLein.5.925,de1.º-10-1973)
II—nodeerrooudolo,dodiaemqueserealizouoato;(RedaçãodadapelaLein.5.925,de1.º-10-
1973)
III—quantoao incapaz,dodiaemquecessara incapacidade. (RedaçãodadapelaLein.5.925,de
1.º-10-1973)”.
Nãosepodiadeixardeobservar,contudo,aatecniadalegislaçãoprocessual,
que utilizou a expressão “prescreve” para um prazo visivelmente decadencial,
umavezquesetratadepostulaçãodenaturezaconstitutivanegativa673.
OCPC/2015corrigiuessadistorção,a teordoseuart.657,parágrafoúnico,
que,maisadequadamente,referequeodireitoàanulaçãoextinguir-se-ianoprazo
deumano,evitando,comisso,amençãoindevidaàprescrição.
Senão,vejamos:
“Art.657.Apartilhaamigável,lavradaeminstrumentopúblico,reduzidaatermonosautosdoinventárioou
constantedeescritoparticularhomologadopelojuiz,podeseranuladapordolo,coação,erroessencialou
intervençãodeincapaz,observadoodispostono§4.ºdoart.966.
Parágrafoúnico.Odireitoàanulaçãodepartilhaamigávelextingue-seem1(um)ano,contadoesseprazo:
I—nocasodecoação,dodiaemqueelacessou;
II—nocasodeerrooudolo,dodiaemqueserealizouoato;
III—quantoaoincapaz,dodiaemquecessaraincapacidade”.
Nãosendohipótesedepartilhaamigável,massimjudicialmenteestabelecida
porsentença,esta,comoprovimentojurisdicionaldefinitivo,podeserobjetode
açãorescisória,conformeestabeleceoart.658doCódigodeProcessoCivilde
2015.
11.SOBREPARTILHA
Como último tema deste capítulo, faz-semister tecer algumas considerações
acercadasobrepartilha.
Trata-se,emverdade,deumapartilhafracionadaeposterior,comodecorrência
desituaçõesfáticasespecíficasqueimpossibilitaramasuarealizaçãooportuna.
Sobreotema,estabelecemosarts.2.021e2.022doCódigoCivil:
“Art.2.021.Quandopartedaherançaconsistir embens remotosdo lugardo inventário, litigiosos,oude
liquidação morosa ou difícil, poderá proceder-se, no prazo legal, à partilha dos outros, reservando-se
aqueles para uma ou mais sobrepartilhas, sob a guarda e a administração do mesmo ou diverso
inventariante,econsentimentodamaioriadosherdeiros.
Art.2.022.Ficamsujeitosasobrepartilhaosbenssonegadosequaisqueroutrosbensdaherançadequese
tiverciênciaapósapartilha”.
Namesmalinha,preveemosarts.669e670doCódigodeProcessoCivil:
“Art.669.Sãosujeitosàsobrepartilhaosbens:
I—sonegados;
II—daherançadescobertosapósapartilha;
III—litigiosos,assimcomoosdeliquidaçãodifíciloumorosa;
IV—situadosemlugarremotodasededojuízoondeseprocessaoinventário.
Parágrafoúnico.OsbensmencionadosnosincisosIIIeIVserãoreservadosàsobrepartilhasobaguarda
eaadministraçãodomesmooudediversoinventariante,aconsentimentodamaioriadosherdeiros.
Art.670.Nasobrepartilhadosbens,observar-se-áoprocessodeinventárioedepartilha.
Parágrafoúnico.Asobrepartilhacorreránosautosdoinventáriodoautordaherança”.
ComoensinaoamigoCARLOSROBERTOGONÇALVES:
“A existência de bens nas situações descritas pode comprometer o bom andamento e finalização da
partilha.Procede-se,então,noprazolegal,àpartilhadosoutrosbens,reservando-seaquelesparaumaou
maispartilhas,adiando-seadivisãodosbensque,pordiversosmotivos,apresentamliquidaçãocomplicada,
ficandoestessobaguardaeadministraçãodomesmooudiversoinventariante,conformeoaprazamento
damaioriadosherdeiros” 674.
Preservam-se,comisso,deumlado,osinteressesdosherdeiros,e,deoutro,o
princípiodaduraçãorazoáveldoprocesso.
CapítuloXXV
ResíduosSucessórios
Sumário: 1. Finalidade do capítulo. 2. Delimitação conceitual. 3. Tratamento jurídico. 4. Resíduos
sucessórioserelaçõestrabalhistas.5.Atítulodearremate.
1.FINALIDADEDOCAPÍTULO
Como último capítulo da presente obra, parece-nos relevante tecer algumas
considerações sobre aquilo que se convencionou chamar de “resíduos
sucessórios”.
Trata-sedematérianãocodificada,mascomtamanhaimportânciadopontode
vista social, que não poderíamos deixar de apreciar nesta obra, dada a nossa
preocupaçãocomumDireitoCivilmaissensívelejusto.
O nosso Código dedica mais de 130 artigos à Sucessão Testamentária,
conferindoumasupremaimportânciaaotestamento.
Talimportânciajurídicaformalnãoseharmonizacomanossarealidadesocial,
em que, matematicamente, a esmagadora maioria dos brasileiros falece sem
deixar declaração de última vontade, quer seja por nunca haver sequer se
preocupadocoma ideiadedeixaresteplano,quersejapelosimples—emais
provável — fato de não ter patrimônio que mereça uma prévia manifestação
volitiva.
Com isso, não estamos pretendendo passar a ideia de que a codificação
devesse pecar pela omissão ou pela falta de apuro, ignorando a figura do
testamento.
Nãoéisso.
Oquelamentamoséaausênciadeatençãoaaspectosmuitomaissignificativos
na vida do cidadão comum, que, ao falecer, simplesmente deixa em favor da
esposaoucompanheiraedosfilhosummerocréditosalarial,dePIS,PASEPou
FGTSemcontacorrente.
Sobreotema,jáadvertiaograndeLUIZROLDÃODEFREITAS:
“aolargodagrandemaioriadenossopovo,destituídodebens,nãoselevandoemcontadireitosoriginários
da morte, que não sejam objeto de transmissão hereditária, posto não lhe guardem a natureza:
levantamentodealvarásdeFGTS,PIS-PASEP, saldosdecontascorrentes,pecúliosetc.Poraípassaa
sucessão damaioria do povo brasileiro. Ainda que não se cuide de Livro tecnicamente apropriado não
custavareferênciaaessepropósito,emsuahomenagemeparaasuasegurança” 675.
Para esses milhares — ou milhões — de brasileiros, o Código Civil,
infelizmente,nãoolhou, relegando,pois,os seus sucessoresoudependentes, ao
amparo normativo de uma lei editada na década de 1980, a qual, a par de
relevante,jáexperimentaospoderososefeitosdaaçãodotempo.
E é sobre este tema, socialmente tão relevante, que nos debruçaremos no
presentecapítulo:osresíduossucessórios.
2.DELIMITAÇÃOCONCEITUAL
Eminúmerassituaçõesfáticas,ocidadão,quandomorre,nãodeixa,emregra,
umpatrimôniosubstancial,mas,sim,namelhordashipóteses,créditosareceber
dealgumasinstituições.
Trata-se, por exemplo, do saldo remanescente de PIS ou PASEP, de FGTS,
crédito salarial, enfim, meros resíduos sucessórios, que desafiam, conforme
veremosainda,umprocedimentomaissimplesparaoseulevantamento.
Os resíduos sucessórios, portanto, consistem em valores de certa expressão
econômica, deixados pelo falecido, limitados por lei, cuja transmissibilidade
tocará aos seus dependentes ou sucessores, mediante expedição de alvará
judicial,independentementedeinventárioouarrolamento676.
Mas qual é, afinal, o tratamento que se dá ao tema no ordenamento jurídico
brasileiro?
Éoqueestudaremosnopróximotópico.
3.TRATAMENTOJURÍDICO
Arespeitodotratamentojurídicodosresíduossucessórios,dispõeoart.1.ºda
Lein.6.858,de24denovembrode1980:
“Art.1.ºOsvaloresdevidospelosempregadoresaosempregadoseosmontantesdascontasindividuaisdo
FundodeGarantiadoTempodeServiçoedoFundodeParticipaçãoPIS-PASEP,nãorecebidosemvida
pelos respectivos titulares, serão pagos, em quotas iguais, aos dependentes habilitados perante a
PrevidênciaSocialounaformadalegislaçãoespecíficadosservidorescivisemilitares,e,nasuafalta,aos
sucessores previstos na lei civil, indicados em alvará judicial, independentemente de inventário ou
arrolamento”.
Note-se que o levantamento de tais valores se dá pormeio da expedição de
uma autorização judicial (alvará), no bojo de um procedimento de jurisdição
voluntária (arts. 719 e seguintes do CPC-2015), que poderá, logicamente,
converter-seemcontencioso,casohajaresistênciaaopedido(art.721doCPC).
As quotas atribuídas amenores, nos termos do § 1.º domesmo dispositivo,
ficarão depositadas em caderneta de poupança, rendendo juros e correção
monetária, e só serão disponíveis após o menor completar 18 (dezoito) anos,
salvo autorização do juiz para aquisição de imóvel destinado à residência do
menoredesuafamíliaouparadispêndionecessárioàsubsistênciaeeducaçãodo
menor.
Pensamos que este depósito em conta bloqueada também se justifica em se
tratando de incapazes em geral, ainda que não sejammenores, caso em que os
seus respectivos curadores deverão justificar o levantamento do valor, sem
prejuízodacorrespondenteprestaçãodecontas.
Umaspecto,todavia,édignodenota.
Omencionado art. 1.º daLei n. 6.858/80 expressamente prevê a preferência
dos “dependentes habilitados perante a Previdência Social ou na forma da
legislaçãoespecíficadosservidorescivisemilitares”,e,somenteemsuafalta,o
direitotocará“aossucessoresprevistosnaleicivil”.
Vale dizer, os dependentes habilitados na previdência social preferem aos
sucessoresemgeral.
Oproblemaéquepodeterhavidoainscriçãodeumdeterminadodependente,
uma companheira, por exemplo, com a preterição dos filhos (sucessores
legítimos), ou, ainda, a inscrição de determinado sucessor e a ausência de
cadastramentodeoutro,damesmaclasseoucategoriasucessória,oqueresultaria
emabsurdainjustiça.
Por isso, sustentamos que os créditos depositados em conta (resíduos
sucessórios)devem,porimperativodejustiça,eemrespeitoaopróprioprincípio
da isonomia, ser igualmente repartidos entre todos os sucessores da mesma
classe,estejaminscritosnaprevidênciaounão677.
Somente esta linha interpretativa se harmoniza com o art. 5.º, XXX, da
ConstituiçãoFederal,queprevêodireitoàherançacomodireitoconstitucional
fundamental.
Inexistindodependentesousucessores,osvaloresdequetrataoart.1.ºdaLei
n. 6.858/80 reverterão em favor, respectivamente, do Fundo de Previdência e
AssistênciaSocial,doFundodeGarantiadoTempodeServiçooudoFundode
ParticipaçãoPIS-PASEP,conformesetratardequantiasdevidaspeloempregador
oudecontasdeFGTSedoFundoPIS-PASEP.
Finalmente, a teor do art. 2.º, o disposto na Lei se aplica às restituições
relativasaoImpostodeRendaeoutrostributos,recolhidosporpessoafísica,e,
nãoexistindooutrosbenssujeitosainventário,aossaldosbancáriosedecontas
de cadernetas de poupança e fundos de investimento de valor até “500
(quinhentas) Obrigações do Tesouro Nacional” (espécie de título da dívida
pública) 678.
Tambémaquisomenteserápossívelosimplesprocedimentoparaconcessãode
alvará,casonãohajaoutrosbensa inventariar,conformelembraoeruditoDes.
EDERGRAF:
“ALVARÁ PARA LEVANTAMENTO DE DEPÓSITOS EM CADERNETA DE POUPANÇA —
APLICAÇÃO DO DISPOSTO NO ART. 2.º DA LEI N. 6.858/80 — IMPOSSIBILIDADE —
EXISTÊNCIADEBENSDERAIZAINVENTARIAR.Odispostonoart.2.º,daLein.6.858/80,que
permite aos herdeiros o levantamento de saldos existentes emcadernetas de poupança emnomedode
cujus,exsurgeinaplicávelnoscasosemquehajaoutrosbensaserinventariados.Emtaissituações,eem
sendoossucessoresmaioresecapazes,proceder-se-áoarrolamento,noqualseráviávelaexpediçãode
alvarájudicialpararesgatedovalordepositado”(Ap.Cív.45.373,Laguna,720653SC1988.072065-3,Rel.
EderGraf,j.31-5-1994,1.ªCâmaradeDireitoComercial).
Na hipótese de inexistirem dependentes ou sucessores do titular, os valores
referidos reverterão em favor do Fundo de Previdência e Assistência Social
(parágrafoúnicodoart.2.º).
Por vezes o pedido de levantamento é feito apenas por um ou alguns dos
legitimados, o que não impede o seu processamento, devendo permanecer, em
conta,asquotascabíveisaosdemaisinteressados.
Nessesentido,oTRFda4.ªRegião:
“PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. CERTIDÃO DA HABILITAÇÃO DE
HERDEIROSPERANTEAPREVIDÊNCIASOCIAL.DISPENSAEMFACEDODISPOSTONOS
ARTS.1.ºE2.º,DALEI6.858/80.1.Diantedodispostonosarts.1.ºe2.ºdaLei6.858/80,opagamento
dosvaloresaquesereferepode, inequivocamente,serfeito,emumsegundograudecomprovação,aos
sucessores previstos na lei civil, indicados em alvará judicial, independentemente de inventário ou
arrolamento, se, no primeiro grau de comprovação, não houver evidência de dependentes habilitados
perante a Previdência Social ou, em se tratando de servidores públicos civis e militares, na forma da
legislação específica que lhes for pertinente (AC 200270000422471/PR, Relator(a) Des. Federal
VALDEMARCAPELETTI,DJU31/03/2004).2.Noquetangeàpossibilidadedeapenasalgunsherdeiros
promoverem a execução, independentemente da manifestação de todos, não há impedimento, uma vez
mantidaaproporcionalidadedoquetocaacadaum.Nãoérazoávelquefiqueprejudicadoorecebimento
doscréditos individuaispelossucessores interessadospor inérciadosdemaissucessores,osquaispodem
até mesmo recusar seus créditos, visto que são disponíveis” (AG 5831 PR 2005.04.01.005831-8, Rel.
VâniaHackdeAlmeida,j.7-12-2005,3.ªTurma,DJ,22-2-2006,p.584).
Parece-nos,semdúvida,amelhordiretrizsobreamatéria.
4.RESÍDUOSSUCESSÓRIOSERELAÇÕESTRABALHISTAS
Os resíduos sucessórios são extremamente comuns na área trabalhista,
inclusive em sede de processos judiciais em curso, em que o autor —
normalmente um ex-empregado — vem a falecer sem ter recebido os seus
créditos.
Nesta situação, a primeira disciplina jurídica aplicável é, sem dúvida, a
habilitaçãoincidental,previstanosarts.687a692doCódigodeProcessoCivil
de2015.
Todavia,nadaimpedequeaLein.6.858,de1980,tantasvezesaquireferida,
possaserinvocada,deformaanalógica,parafacilitareviabilizaroacessoatais
créditosaossucessoresdoempregadofalecido.
Nesse sentido, há entendimento jurisprudencial, o que conta com o nosso
veementeaplauso679.
5.ATÍTULODEARREMATE
Comestecapítulo,encerramosoúltimovolumedanossacoleção.
Vislumbramos o sistema positivado do moderno Direito Civil brasileiro,
iniciandocomaanálisedosseuspressupostosteóricos,passandopeladisciplina
jurídica da vida privada do cidadão desde antes de nascer (quando, no v. I,
reservado à “Parte Geral”, tratamos do nascituro), para chegar, após longa e
deslumbranteviagem,atédepoisdoseufalecimento,comoestudodoDireitodas
Sucessões,napresenteobra.
Para nós, foi uma grande honra e prazer ter tido sua companhia nesta
maravilhosajornada.
Desejamosqueelatenhasidomuitoproveitosa.
Equeoutrasvenham!
Torceremospara que tenhamosnovamenteodistinto carinhodonosso amigo
leitor.
Aofuturo!
ComDeus,sempre!
Referências
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ALVARENGA, Robson de. “Fideicomisso.” Disponível em: <http://www.irib.org.br/html/boletim/boletim-iframe.php?be=1194>.Acessoem:30jul.2013.
AMARAL,Francisco.DireitoCivil—Introdução.3.ed.RiodeJaneiro:Renovar,2000.
AMORIM,Sebastião;OLIVEIRA,Euclides.InventáriosePartilhas—DireitodasSucessões—TeoriaePrática.21.ed.SãoPaulo:Leud,2008.
AULETE,Caldas.DicionárioContemporâneodaLínguaPortuguesa.RiodeJaneiro:Delta,1958.v.III.
BARBOSA,MárioFigueiredo.AindaQuestõesJurídicas.Salvador:Quarteto,2009.
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BEVILÁQUA,Clóvis.CódigoCivildosEstadosUnidosdoBrasil.RiodeJaneiro:Ed.Rio,1975.
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1Lembrando,nesteponto,oimortalGonzaguinha,nalindaletradamúsica“Oqueé,oqueé”:
“Somosnósquefazemosavida
Comoder,oupuder,ouquiser...
Sempredesejada
Pormaisqueestejaerrada
Ninguémqueramorte
Sósaúdeesorte...”.
2 Sobre o tema Fato Jurídico e a sua classificação, confira-se o Capítulo IX (“Fato Jurídico em SentidoAmplo”)dov.I(“ParteGeral”)dapresentecoleção.
3Relembrando:acondiçãoéumacontecimentofuturoeincertoquesubordinaaeficáciajurídicadonegócio;aopassoqueo termoéumacontecimento futuro e certo.Sobreo tema, confira-se tambémoCapítuloXV(“PlanodeEficáciadoNegócioJurídico”)dov.I(“ParteGeral”)dapresentecoleção.
4 Sobre a ausência, confira-se o Subtópico 7.2.1 (“Ausência”) do Capítulo IV (“Pessoa Natural”) do v. I(“ParteGeral”)destacoleção.
5CC/2002:
“Art.7.ºPodeserdeclaradaamortepresumida,semdecretaçãodeausência:
I—seforextremamenteprovávelamortedequemestavaemperigodevida;
II— se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até dois anos após otérminodaguerra.
Parágrafo único.A declaração damorte presumida, nesses casos, somente poderá ser requerida depois deesgotadas as buscas e averiguações, devendo a sentença fixar a data provável do falecimento” (semequivalentenoCC/1916).
6Confiram-seosCapítulosXXIII(“Inventário”)eXXIV(“Partilha”)destevolume.
7“Obnóxio/cs/adj.(1619cfQuad)1quesesubmeteservilmenteàpunição2quenãotemvontadeprópria;escravo,dependente3nefasto, funesto,nefando;ofensivo,nocivo4vulgar,corriqueiro;baixo,vil5 esquisito,estranhoETIMlat. obnoxius,a,um‘responsávelperantealei,culpadode,submetido,colérico,quenãotemvontade própria, indigno, exposto a, perigoso, arriscado, nocivo’; ver ‘noc- SIN/VAR, ver sinonímia decanalha e antonímia de favorável ANT altivo, benéfico; ver tb. sinonímia de elevado, favorável einsigne” (AntônioHouaiss eMauro de SallesVillar,DicionárioHouaiss da Língua Portuguesa, Rio deJaneiro:Objetiva,2001,p.2042).
8ClóvisBeviláqua.DireitodasSucessões,4.ed.,RiodeJaneiro-SãoPaulo:FreitasBrastos,1945,p.14-15.
9AntonMenger,ElDerechoCivilyLosPobres,Granada:EditorialComares,1998,p.341.
10Idem,ibidem,p.342.
11“Éprecisoteravistaperturbadaporalgumpreconceitoparanãoreconhecer,nodireitosucessório,umfatorpoderosoparaaumentodariquezapública;ummeiodedistribuí-ladomodomaisapropriadoàsuaconservaçãoeaobem-estardosindivíduos;umvínculoparaaconsolidaçãodafamília,sealeilhegaranteogozodosbensde seusmembros desaparecidos na voragem damorte; e um estímulo para sentimentos altruísticos, porquetraduzsempreumafeto,querquandoéavontadequeofazmover-se,querquandoaprovidênciapartedalei”(ClóvisBeviláqua,DireitodasSucessões,4.ed.,RiodeJaneiro-SãoPaulo:FreitasBastos,1945,p.16).
12ConstituiçãoFederal/88:
“Art.5.ºTodossãoiguaisperantealei,semdistinçãodequalquernatureza,garantindo-seaosbrasileiroseaosestrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e àpropriedade,nostermosseguintes:
(...)
XXII—égarantidoodireitodepropriedade;
XXIII—apropriedadeatenderáasuafunçãosocial;
(...)
XXX—égarantidoodireitodeherança.”
13 Rudolf Meyer-Pritzl, Staudinger BGB — Kommentar zum Bürgerlichen Gesetzbuch mitEinführungsgesezt und Nebengesezt — Eckpfeiler des Zivilrechts, Berlin, 2008, p. 1146. No originalalemão:“DasErbrechtknüpftaneinsozialesFaktum,denTodeinesMenschen,an.Regelungsgegenstanddes5.BuchesistderÜbergangderprivatenVermögensrechtedesErblassersaufdieErben:‘DasErbrechthatdieFunktion, das Privateigentum als Grundlage, der eigenverantwortlichen Lebensgestaltung mit dem Tod desEigentümersnichtuntergehenzulassen,sondernseinenForbestandimWegederRechtsnachfolgezusichern’.ErstdasVorhandenseindesErbrechtsgewährleistetdieBeständigkeitdesPrivateigentumüberdenTodhinausundträgtsowesentlichdazubei,dassesseineWirkungvollentfaltenkann.DasGrundgesetzgarantiertinArt.14Abs1EigentumundErbrecht.DasErbrechtstehtdamit ineinemengenZusammenhangmitderprivatenEigentumsverfassung.Insofernwirdgelegentlichauchvonder‘AkzessorietätdesErbrechts’gesprochen:Nurin dem Umfang, in dem das Eigentum garantiert ist, kann das Erbrecht die Funktion der Weitergabe desPrivateigentums ausüben.Aus der engenVerbindung zwischen Eigentum und Erbrecht ergibt sich auch dieTestierfreiheit des Erblassers als eines der erbrechtlichen Grundprinzipien” (Tradução livre de Pablo StolzeGagliano).
14Especificamentenocampodasrelaçõesdefamília,játivemosoportunidadededissertarsobretalprincípio,
motivopeloqualremetemosoleitoràleituradosubtópico4.7(“PrincípiodaIntervençãoMínimadoEstadonoDireitodeFamília”)doCapítuloII(“PerspectivaPrincipiológicadoDireitodeFamília”)dov.VI(“DireitodeFamília—AsFamíliasemPerspectivaConstitucional”)destacoleção.
15Sobreotema,confira-seoinsuperávelOrlandoGomes,Sucessões,RiodeJaneiro:Forense,2004,p.9-10.
16“DireitodePrimogenitura.PROTOTOKIA:(primeiro)e(tornar-se):direitodoprimogênito,primogenitura,direitodeprimogenitura.Odireitodeprimogenituraconstitui-senaporçãoespecialdoprimogênito.Deacordocom a Bíblia, o direito de primogenitura, em seu conjunto, inclui a porção dobrada de terra, a realeza e osacerdócio. O sacerdócio conduz as pessoas a Deus e a realeza traz Deus às pessoas” (Disponível em:<http://www.desfrute.net/dicionario.php?t=516>.Acessoem:18fev.2012).
17Washington deBarrosMonteiro,Curso deDireito Civil—Direito das Sucessões, 3. ed., São Paulo:Saraiva,1959,p.205.
18Esta consideração crítica fora apresentadanaobraOContratodeDoação, de autoria de Pablo StolzeGagliano,SãoPaulo:Saraiva,desdeasuaprimeiraedição(2007),p.37-39.
19 Posição defendida pelo inspirado Prof. Dr. Francisco José Cahali em uma das suas fecundas aulasministradasnoMestradoemDireitoCivildaPUCSP,disciplinaDireitodasSucessõesII,nosegundosemestrede2004.
20SílviodeSalvoVenosa,DireitoCivil—DireitodasSucessões,3.ed.,SãoPaulo:Atlas,2003,p.17.v.7.
21 Confira-se o Subtópico 4.1 (“Princípio da Saisine”) do Capítulo II (“Principiologia do Direito dasSucessões”)destaobra.
22 Sobre o tema, confira-se novamente o Capítulo VIII (“Bens Jurídicos”) do v. I (“Parte Geral”) destacoleção.
23Destaque-se,apropósito,queoart.155,§3.º,equipara“àcoisamóvelaenergiaelétricaouqualqueroutraquetenhavaloreconômico”paraefeitodatipificaçãodochamado“gato”(subtraçãodeenergiaelétrica)comofurto.
24Váriosdoutrinadoresjáadmitem,aindaqueindiretamente,aexpressão“patrimôniomoral”,emboramuitosnãoausemexpressamente.Atítuloexemplificativo,confiram-seCarlosAlbertoBittar(ReparaçãoCivilporDanos Morais, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993), Wilson Melo da Silva (O Dano Moral e suaReparação,3.ed.,RiodeJaneiro:Forense,1983),MariaHelenaDiniz(CursodeDireitoCivil,3.ed.,SãoPaulo:Saraiva,1996,v.7),SérgioSevero(OsDanosExtrapatrimoniais,SãoPaulo:Saraiva,1996),AugustoZenun(DanoMoralesuaReparação,4.ed.,RiodeJaneiro:Forense,1996),ClaytonReis(DanoMoral,4.ed., Rio de Janeiro: Forense, 1995), Fabrício Zamprogna Matielo (Dano Moral, Dano Material eReparação,2.ed.,PortoAlegre:Sagra-Luzzatto,1995),ChristinoAlmeidadoValle(DanoMoral,1.ed.,2.tir.,RiodeJaneiro:Aidê,1994),RodolfoPamplonaFilho (ODanoMoralnaRelaçãodeEmprego, 3. ed.,
SãoPaulo:LTr,2002),entreoutros.
25Mais uma vez, remetemos o leitor ao indicadoCapítuloVIII (“Bens Jurídicos”) do v. I (“ParteGeral”)destacoleção.
26Confira-seoCapítuloIV(“AdministraçãodaHerança”)destevolume.
27Confira-seoCapítuloVI(“CessãodeDireitosHereditários”)destevolume.
28 Vale destacar, neste aspecto, a chamada “sucessão trabalhista”, prevista nos arts. 10 e 448 daConsolidaçãodasLeisdoTrabalho.Sobreotema,confira-seotópico4(“ANaturezadosInteressesObjetodeSucessãoHereditária”)doCapítuloIII(“DisposiçõesGeraissobreaSucessão”)destevolume.
29Outraexpressãoamplamenteutilizadaparacaracterizaroautordaherança—ofalecido—é“decujus”.Trata-sedepalavraquenão admitenenhum tipode conjugaçãoou alteraçãodegênero eque, emverdade,consisteemtrechodeumaexpressão latina (“decujussucessioneagitur”)usadaparase referiràpessoa“decuja”sucessãosetrata.Napráticajurídica,acabousetornandoumsinônimode“pessoafalecida”,emumeufemismoparaamenizaradurezadeexpressõescomo“defunto”ou“morto”.
30Confira-se,entreoutros,oCapítuloXIII(“SucessãoTestamentária”),emespecial,destevolume.
31Confira-seoCapítuloXXV(“ResíduosSucessórios”)destevolume.
32“Art.1.829.Asucessãolegítimadefere-senaordemseguinte:
I—aosdescendentes,emconcorrênciacomocônjugesobrevivente,salvosecasadoestecomofalecidonoregimedacomunhãouniversal,ounodaseparaçãoobrigatóriadebens(art.1.640,parágrafoúnico);ouse,noregimedacomunhãoparcial,oautordaherançanãohouverdeixadobensparticulares;
II—aosascendentes,emconcorrênciacomocônjuge;
III—aocônjugesobrevivente;
IV—aoscolaterais”.
33Confira-seoCapítuloXI(“SucessãoLegítima”)destevolume.
34Referimo-nosàprevisãoexpressadocaputdoart.37daConstituiçãoFederal:
“Art.37.AadministraçãopúblicadiretaeindiretadequalquerdosPoderesdaUnião,dosEstados,doDistritoFederaledosMunicípiosobedeceráaosprincípiosdelegalidade,
impessoalidade,moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (omissis)” (Redação dada pelaEmendaConstitucionaln.19,de1998).
35 Desenvolvemos anteriormente essa ideia no v. VI (“Direito de Família”) desta coleção, maisespecificamente no subtópico 3.1 (“Princípio da Dignidade da Pessoa Humana”) do seu Capítulo II(“PerspectivaPrincipiológicadoDireitodeFamília”),aquiadaptado.
36GrandeDicionárioEnciclopédicoRIDEEL,org.porH.MaiadeOliveira,SãoPaulo:Rideel,1978,v.4,p.889.
37 Gustavo Tepedino, A Parte Geral do Novo Código Civil — Estudos na Perspectiva Civil-Constitucional,RiodeJaneiro:Renovar,2002,p.XXV.
38 Também neste tópico, faz-se uma releitura de ideias expostas anteriormente a esta obra, maisespecificamente no subtópico 3.2 (“Princípio da Igualdade”) doCapítulo II (“Perspectiva Principiológica doDireitodeFamília”)dov.VI(“DireitodeFamília”)destacoleção.
39 Confira-se o tópico 2 (“Compreensão do Direito Sucessório: Conceito e Fundamentação Jurídico-Ideológica”)doCapítuloI(“IntroduçãoaoDireitodasSucessões”)destevolume.
40“PROCESSUALCIVILEADMINISTRATIVO.RECURSOESPECIAL.DESAPROPRIAÇÃOPARAFINS DE REFORMA AGRÁRIA. MANDADO DE SEGURANÇA COM O OBJETIVO DESUSPENDER/ARQUIVAR PROCESSO ADMINISTRATIVO INSTAURADO PARA VERIFICAR OCUMPRIMENTO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZARCRITÉRIOSDENATUREZATRIBUTÁRIACOMOFORMADEDIMENSIONARIMÓVEISRURAISPASSÍVEIS, OU NÃO, DE EXPROPRIAÇÃO. FALECIMENTO DO PROPRIETÁRIO DO IMÓVELRURAL. NÃO EFETIVAÇÃO DA PARTILHA. ART. 1.791 E PARÁGRAFO ÚNICO DO CÓDIGOCIVILVIGENTE.PRINCÍPIODASAISINE.NÃOINCIDÊNCIA.PRESUNÇÃOJURIS TANTUM DEQUEGOZAOREGISTROIMOBILIÁRIO.NÃOOCUPAÇÃOIRREGULARDAFAZENDAÀÉPOCADAVISTORIA.ALEGAÇÃODEAFRONTAAOART.535DOCPCNÃOCARACTERIZADA.1.Casoem que se impetra mandado de segurança contra ato administrativo do Superintendente do Incra emMarabá/PA, a fim de suspender e arquivar o processo administrativo n. 54600.001152/2003-41, que foiinstauradoparaverificaroefetivocumprimentodafunçãosocialdoimóvelruraldenominado‘FazendaTibiriça,Pimenteira’ou‘NossaSenhoradeNazaré’e,seforocaso,declararo interessesocialparafinsdereformaagráriaquantoaoimóvelaludido.2.Inexisteafrontaaoart.535doCPCquandooTribunaldeorigem,emborasucintamente,pronuncia-sedeformaclaraesuficientesobreaquestãopostanosautos.Saliente-se,ademais,que omagistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos deduzidos pela parte, desde que os
fundamentosutilizadostenhamsidosuficientesparaembasarodecisum.3.Osarts.46,§6.º,e50,§6.º,do
EstatutodaTerra(Lein.4.504/64)eoart.24eosseusincisosII,IIIeIVdoDecreton.55.891/65referem-se, exclusivamente, a critérios de natureza tributária, para possibilitar o cálculo do coeficiente deprogressividadedoITR.Logo,édefesaautilizaçãodessesparâmetrostributáriosparadimensionarseimóveisrurais são passíveis, ou não, de expropriação para fins de reforma agrária. 4. A proteção conferida pelasaisineaoherdeiro,adespeitodeoart.1.784doCódigoCivilemvigordisporque, ipsislitteris: ‘[a]berta asucessão,aherança transmite-sedesde logoaosherdeiros legítimose testamentários’,deveser interpretadoemparcimôniaaoart.1.791eoseuparágrafoúnicodomesmodiplomaemfoco,adiantetranscritos,inverbis:‘Art.1.791.Aherançadefere-secomoumtodounitário,aindaqueváriossejamherdeiros.Parágrafoúnico.Até a partilha, o direito dos coerdeiros, quanto à propriedade e posse, será indivisível, e regular-se-á pelasnormas relativas ao condomínio’. Nessa linha de raciocínio, infere-se que o instituto da saisine, emboraassegure a imediata transmissão da herança, deve ser obtemperado que, até a partilha, os bens serãoconsiderados indivisíveis. 5. A presunção iuris tantum de que goza o registro imobiliário impõe que todaalteraçãoobjetivaousubjetivaquantoaoimóvelhádeser,paraquesurtaefeitonomundojurídico,averbadajuntoaocompetenteregistro.6.OTribunalaquo,comcogniçãoplenáriaeexaurientesobreoacervofático-probatóriodosautos,concluiuqueavistoriafoirealizadaentreosdias22e27desetembrode2003,enquantoqueainvasãodatade28deoutubrode2005.Portanto,nãoincide,incasu,aproibiçãoinsertano§6.ºdoart.2.ºdaLein.8.629/93,comredaçãoconferidapelaMedidaProvisórian.2.183-56,de24deagostode2001.7.Recursoespecialconhecidoeprovido”(STJ,REsp1161535/PA,Rel.Min.BeneditoGonçalves,1.ªTurma,j.1.º-3-2011,DJe,10-3-2011).
41Confira-seosubtópico4.1(“PrincípiodaSaisine”)destecapítulo.
42 Confira-se o tópico 1 (“A Boa-Fé como um Princípio Jurídico”) do Capítulo V (“Boa Fé Objetiva emMatériaContratual”)dotomo1(“TeoriaGeral”)dov.IV(“Contratos”)destacoleção.
43Nessesentido,MaxKaser,DireitoPrivadoRomano(RömischesPrivatrecht),Lisboa:FundaçãoCalousteGulbenkian,1999,p.154,item3.
44 Bruno Lewicki, Panorama da Boa-Fé Objetiva, in Problemas de Direito Civil Constitucional, coord.GustavoTepedino,RiodeJaneiro:Renovar,2000,p.58.
45JudithMartins-Costa,ABoa-FénoDireitoPrivado,SãoPaulo:RevistadosTribunais,2000,p.124.
46JudithMartins-Costa,ob.cit.,p.129.
47PauloRobertoNalin,Ética e Boa-Fé no AdimplementoContratual, coord. Luiz Edson Fachin, Rio deJaneiro:Renovar,1998,p.188.
48Confira-seotópico5(“Otestamenteiro”)doCapítuloXIII(“SucessãoTestamentária”)destevolume.
49Confira-seoCapítuloVIII(“ExcluídosdaSucessão”)destevolume.
50“Direitodassucessões.Recursoespecial.Inventário.Decujusque,apósofalecimentodesuaesposa,comquem tivera uma filha, vivia, em união estável, hámais de trinta anos, com sua companheira, sem contrairmatrimônio.Incidência,quantoàvocaçãohereditária,daregradoart.1.790doCC/02.Alegação,pelafilha,dequearegraémaisfavorávelparaaconviventequeanormadoart.1.829,I,doCC/02,que incidiriacasoofalecidoesuacompanheirativessemsecasadopeloregimedacomunhãoparcial.AfirmaçãodequeaLeinãopodeprivilegiarauniãoestável,emdetrimentodocasamento.
— O art. 1.790 do CC/02, que regula a sucessão do de cujus que vivia em comunhão parcial com suacompanheira, estabelece que esta concorre com os filhos daquele na herança, calculada sobre todo opatrimônioadquiridopelofalecidoduranteaconvivência.
—A regrado art. 1.829, I, doCC/02, que seria aplicável caso a companheira tivesse se casado comodecujus pelo regime da comunhão parcial de bens, tem interpretação muito controvertida na doutrina,identificando-setrêscorrentesdepensamentosobreamatéria:(i)aprimeira,baseadanoEnunciado270dasJornadas deDireitoCivil, estabelece que a sucessão do cônjuge, pela comunhão parcial, somente se dá nahipóteseemqueofalecidotenhadeixadobensparticulares,incidindoapenassobreessesbens;(ii)asegunda,capitaneadaporpartedadoutrina,defendequeasucessãonacomunhãoparcialtambémocorreapenasseode cujus tiver deixado bens particulares,mas incide sobre todo o patrimônio, sem distinção; (iii) a terceiradefende que a sucessão do cônjuge, na comunhão parcial, só ocorre se o falecido não tiver deixado bensparticulares.
—Nãoépossíveldizer,aprioristicamenteecomasvistasvoltadasapenasparaasregrasdesucessão,queaunião estável possa ser mais vantajosa em algumas hipóteses, porquanto o casamento comporta inúmerosoutrosbenefícioscujamensuraçãoédifícil.
—Épossível encontrar, paralelamente às três linhasde interpretaçãodo art. 1.829, I, doCC/02defendidaspela doutrina, uma quarta linha de interpretação, que toma em consideração a vontade manifestada nomomentodacelebraçãodocasamento,comonorteparaainterpretaçãodasregrassucessórias.
— Impositiva a análise do art. 1.829, I, do CC/02, dentro do contexto do sistema jurídico, interpretando odispositivo em harmonia com os demais que enfeixam a temática, em atenta observância dos princípios ediretrizesteóricasquelhedãoforma,marcadamenteadignidadedapessoahumana,queseespraia,noplanoda livre manifestação da vontade humana, por meio da autonomia privada e da consequenteautorresponsabilidade, bem como da confiança legítima, da qual brota a boa-fé; a eticidade, por fim, vemcomplementarosustentáculoprincipiológicoquedevedelinearoscontornosdanormajurídica.
—AtéoadventodaLein.6.515/77(LeidoDivórcio),vigeunoDireitobrasileiro,comoregimelegaldebens,odacomunhãouniversal,noqualocônjugesobreviventenãoconcorreàherança,por já lheserconferidaameaçãosobreatotalidadedopatrimôniodocasal;apartirdavigênciadaLeidoDivórcio,contudo,oregimelegal de bens no casamento passou a ser o da comunhão parcial, o que foi referendado pelo art. 1.640 doCC/02.
—Preserva-seo regimedacomunhãoparcialdebens,deacordocomopostuladodaautodeterminação,aocontemplaro cônjuge sobrevivente comodireito àmeação, alémdaconcorrênciahereditária sobreosbenscomuns,mesmoquehaja bens particulares, os quais, emqualquer hipótese, sãopartilhados apenas entre osdescendentes.
Recurso especial improvido” (STJ, REsp 1117563/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3.ª Turma, j. 17-12-2009,DJe,6-4-2010).
51Paraaprofundamentodotema,confira-seoCapítuloXI(“PlanodeExistênciadoNegócioJurídico”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção.
52Confira-seosubtópico4.6(“PrincípiodoRespeitoàVontadeManifestada”)destecapítulo.
53“Saisine—Cont.const.1.Opérationconsistantàdéférerumtextejuridique(loivotée,traitéinternational)devant le juge constitutionnel et ayant pour effet principal de déclencher le controle de constitutionnalité. 2.Lettreadresséeparlêsrequérantsaujugeconstitutionnelmentionnantparfoislêsgriefsopposésàl’encontred’uneloietpubliéeauJournalOfficieldelaRépubliquefrançaiseemannexedeladécisionconstitutionnelle”(CABRILLAC,Rémy(direction).DictionnaireduVocabulaireJuridique.Paris,ÉditionsduJuris-Classeur,2002, p. 342). Em tradução livre de Rodolfo Pamplona Filho: “Saisine — Cont. const. 1. Procedimentoconsistenteemsubmeterumtextolegal(leiaprovada,tratadointernacional)aoTribunalConstitucionalecomoprincipalefeitodeprovocarocontroledeconstitucionalidade.2.PetiçãodirigidapelosrequerentesaoTribunalConstitucional declarando as alegações eventualmente opostas em face de uma lei e publicada no DiárioOficialdaRepúblicaFrancesa,noanexodajurisdiçãoconstitucional”.
54 Albert Dauzat, Jean Dubois e Henri Mitterand, Nouveau Dictionnaire Étimologique et Historique,Larousse,1971.
55Ediçãode1968(verb.Saisine,p.832).
56DicionárioHouaissdaLínguaPortuguesa,publicadopeloInstitutoAntônioHouaissdeLexicografia,Riode Janeiro, 2001. Observo que nenhum outro léxico, dentre os consultados, registra o vocábulo “saisina”(CaldasAulete,LaudelinoFreire,SilveiraBueno,AntenorNascentes,AurélioBuarquedeHolandaFerreira).NemorecentíssimodicionáriodaAcademiadeCiênciasdeLisboa.
57 Luís Camargo Pinto de Carvalho. “Saisine e Astreinte”. Disponível em:<http://www.irineupedrotti.com.br/acordaos/modules/news/article.php?storyid=3171>. Acesso em: 15 abr.2011.
58 Em tradução livre de Rodolfo Pamplona Filho: “O servo morto dá posse ao vivo, seu herdeiro maispróximo”.
59 Sobre esse brocardo e sua tradução, confira-se STOLZE, Pablo. “Der Tote erbt den Lebenden” e oestrangeirismo indesejável. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3.274, 18 jun. 2012. Disponível em:
<http://jus.com.br/artigos/22040>.Acessoem:6jun.2014.
60CaioMáriodaSilvaPereira,InstituiçõesdeDireitoCivil—Sucessões,17.ed.,RiodeJaneiro:Forense,2009,v.VI,p.15.
61Emboraamatériaaindasejaaprofundadaemcapítuloposterior—confira-seoCapítuloV(“AceitaçãoeRenúncia daHerança”) deste volume—, é possível sintetizar trêsmomentos distintos para a transferência,nestecaso,dapropriedadedodecujusparaseusherdeiros:“comamorte,asucessãoficavaaberta(delata),e somente com o fato da aceitação (acquisitio) se integrava na titularidade do herdeiro; entre a abertura(delatio)eaaceitação(acquisitio)permaneciaaherançaemestadodejacência(hereditasiacens).Nestafase intermediária, a herança tinha representante e ação, o que levou a reconhecer-lhe personalidade. Aproposiçãonãoé, todavia,unânime,encontrandocontradita sériaemSavigny” (CaioMáriodaSilvaPereira,InstituiçõesdeDireitoCivil,cit.,p.15).
62MárioFigueiredoBarbosa,AindaQuestõesJurídicas,Salvador:Quarteto,2009,p.13-14.
63 Sobre o tema da classificação dos bens, confira-se o Capítulo VIII (“Bens Jurídicos”) do v. I (“ParteGeral”)destacoleção.
64Roberto deRuggiero, Instituições deDireito Civil—Direito dasObrigações eDireitoHereditário,Campinas:Bookseller,1999,v.3,p.395.
65 “EMENTA: CONSTITUCIONAL. REFORMA AGRÁRIA. DESAPROPRIAÇÃO. MANDADO DESEGURANÇA.LEGITIMIDADEDOCOERDEIROPARAIMPETRAÇÃO[ART.1.º,§2.º,DALEIN.1.533/51]. SAISINE. MÚLTIPLA TITULARIDADE. PROPRIEDADE ÚNICA ATÉ A PARTILHA.ALTERAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. ART. 46, § 6.º, DO ESTATUTO DA TERRA. FINALIDADEESTRITAMENTETRIBUTÁRIA.FINALIDADEDOCADASTRONOSNCR-INCRA.CONDOMÍNIO.AUSÊNCIA DE REGISTRO IMOBILIÁRIO DE PARTES CERTAS. UNIDADE DE EXPLORAÇÃOECONÔMICA DO IMÓVEL RURAL. ART. 4.º, I, DO ESTATUTO DA TERRA. VIABILIDADE DADESAPROPRIAÇÃO.ART.184,DACONSTITUIÇÃODOBRASIL.2.Qualquerdoscoerdeirosé,àluzdoquedispõeoart.1.º,§2.º,daLein.1.533/51,partelegítimaparaaproposituradowrit.3.Asaisine tornamúltipla apenas a titularidade do imóvel rural, que permanece uma única propriedade até que sobrevenha apartilha[art.1.791eparágrafoúnicodovigenteCódigoCivil].4.Afinalidadedoart.46,§6.º,doEstatutodaTerra[Lein.4.504/64]éinstrumentarocálculodocoeficientedeprogressividadedoImpostoTerritorialRural—ITR.Opreceitonãodeveserusadocomoparâmetrodedimensionamentodeimóveisruraisdestinadosàreforma agrária, matéria afeta à Lei n. 8.629/93. 5. A existência de condomínio sobre o imóvel rural nãoimpede a desapropriação-sanção do art. 184 da Constituição do Brasil, cujo alvo é o imóvel rural que nãoestejacumprindosuafunçãosocial.Precedente[MSn.24.503,RelatoroMinistroMARCOAURÉLIO,DJde05.09.2003].6.OcadastroefetivadopeloSNCR-INCRApossuicaráterdeclaratórioetemporfinalidade:i]olevantamentodedadosnecessáriosàaplicaçãodoscritériosdelançamentosfiscaisatribuídosaoINCRAeàconcessão das isenções a eles relativas, previstas na Constituição e na legislação específica; e ii] o
levantamentosistemáticodosimóveisrurais,paraconhecimentodascondiçõesvigentesnaestruturafundiáriadasváriasregiõesdoPaís,visandoàprovisãodeelementosqueinformemaorientaçãodapolíticaagrícolaaser promovida pelos órgãos competentes. 7.O conceito de imóvel rural do art. 4.º, I, doEstatuto daTerra,contempla a unidade da exploração econômica do prédio rústico, distanciando-se da noção de propriedaderural.Precedente[MSn.24.488,RelatoroMinistroEROSGRAU,DJde03.06.2005].8.Oregistropúblicoprevalecenosestritostermosdeseuconteúdo,revestidodepresunçãoiuristantum.Nãosepodetomarcadaparteidealdocondomínio,averbadanoregistroimobiliáriodeformaabstrata,comopropriedadedistinta,parafinsdereformaagrária.Precedentes[MSn.22.591,RelatoroMinistroMOREIRAALVES,DJde14.11.2003eMSn.21.919,RelatoroMinistroCELSODEMELLO,DJde06.06.97].Segurançadenegada”(STF,MS24573,Rel.Min.GilmarMendes,Rel. p/ acórdãoMin.ErosGrau,Tribunal Pleno, j. 12-6-2006,DJ, 15-12-2006).
66SílviodeSalvoVenosa,DireitoCivil—DireitodasSucessões,3.ed.,SãoPaulo:Atlas,2003,p.38(Col.DireitoCivil,v.7).
67“Oinstitutodequetrataoartigojustifica-sepelaadoçãodosistemadeaceitaçãoabenefíciodeinventáriopordisposiçãolegaloperadapeloCódigode1916.ComolembraCaioMáriodaSilvaPereira,aaceitaçãodaherança nesse sentido ‘entrou nos costumes’ e passou para o direito positivo. A aceitação a benefício deinventárioconsistiaemumaopçãopostaàdisposiçãodoherdeiroparaqueesteaceitasseapenasoativodaherança,desobrigando-sequantoà totalidadedopassivo.Apondotalcláusula,oherdeiro,quandochamadoadeliberar,aceitavaaherança,desdequenãolhecausassenenhumprejuízodecorrentedaverificação,feitanoinventário,dequeoativosuperavaopassivo.Casocontrário,quandoopassivosuperavaoativo,oaceitanteabenefíciodeinventárioeratidocomoumaceitantecondicional,limitadoàresponsabilizaçãodasdívidasdodecujusatéomontantequehouvesseherdado”(GiseldaMariaFernandesNovaesHironaka,Comentários aoCódigoCivil—ParteEspecial:doDireitodasSucessões(arts.1.784a1.856),coord.AntônioJunqueiradeAzevedo,2.ed.rev.,SãoPaulo:Saraiva,2007,p.75.v.20).
68 “DIREITOCIVIL. AÇÃODEALIMENTOS. ESPÓLIO. TRANSMISSÃODODEVER JURÍDICODEALIMENTAR.IMPOSSIBILIDADE.1.Inexistindocondenaçãopréviadoautordaherança,nãoháporque falar em transmissão do dever jurídico de prestar alimentos, em razão do seu caráter personalíssimo e,portanto, intransmissível. 2. Recurso especial provido” (STJ, REsp 775.180—MT (2005/0137804-9), Rel.Min.JoãoOtáviodeNoronha).
69PabloStolzeGaglianoeRodolfoPamplonaFilho,NovoCursodeDireitoCivil—DireitodeFamília—AsFamíliasemPerspectivaConstitucional,SãoPaulo:Saraiva,2011,v.VI,p.691-692.
70Confira-seoCapítuloXII(“DireitodeRepresentação”)destevolume.
71“FORODASUCESSÃO.TESTAMENTO. INVALIDADEPARCIAL,PARASERCONTEMPLADOHERDEIRO NECESSÁRIO, RECONHECIDO POR SENTENÇA POSTERIOR À MORTE DOTESTADOR. REALIDADE DE PROVAS QUE AUTORIZA A SOLUÇÃO ADOTADA, EM
ATINÊNCIA AO CONTIDO NO ART. N. 1.570, DO CÓDIGO CIVIL. EMBARGOS REJEITADOS”(STF, RE 13010 embargos, Rel. Min. Anibal Freire, Rel. p/ acórdãoMin. Macedo Ludolf— Convocado,TribunalPleno,j.3-1-1951,DJ,5-4-1951).
72GiseldaMariaFernandesNovaesHironaka,ComentáriosaoCódigoCivil—ParteEspecial:doDireitodasSucessões (arts. 1.784a1.856), coord.Antônio JunqueiradeAzevedo,2. ed. rev.,SãoPaulo:Saraiva,2007,p.28-29.v.20.
73“DIREITO INTERNACIONALPRIVADO.ART.10,PARÁG.2,DOCÓDIGOCIVIL.CONDIÇÃODEHERDEIRO.CAPACIDADEDESUCEDER.LEIAPLICÁVEL.CAPACIDADEPARASUCEDERNÃOSECONFUNDECOMQUALIDADEDEHERDEIRO.
Esta tem a ver com a ordem da vocação hereditária que consiste no fato de pertencer a pessoa que seapresentacomoherdeiroaumadascategoriasque,deummodogeral,sãochamadaspelaleiàsucessão,porissohaverádeseraferidapelamesmaleicompetentepararegerasucessãodomortoque,noBrasil,‘obedeceàleidopaísemqueeradomiciliadoodefunto’(art.10,caput,daLICC).
Resolvida a questão prejudicial de que determinada pessoa, segundo o domicílio que tinha o de cujus, éherdeira, cabe examinar se a pessoa indicada é capaz ou incapaz para receber a herança, solução que éfornecidapelaleidodomicíliodoherdeiro(art.10,parág.2,daLICC).
Recursoconhecidoeprovido”(STJ,REsp61.434/SP,Rel.Min.CesarAsforRocha,4.ªTurma,j.17-6-1997,DJ,8-9-1997,p.42507).
74“APLICAÇÃODALEIN4.121DE27DEAGOSTODE1962.NÃOTÊMEFEITORETROATIVO,ASSUCESSÕESABERTASANTESDASUAVIGÊNCIA.NÃOCONHECIMENTODORECURSO”(STF,RE60230,Rel.Min.ThemístoclesCavalcanti,2.ªTurma,j.20-11-1968,DJ,27-12-1968).
75 No CC/1916: “Art. 1.577. A capacidade para suceder é a do tempo da abertura da sucessão, que seregularáconformealeientãoemvigor”.
76Confira-se,novamente,osubtópico4.1(“PrincípiodaSaisine”)destecapítulo.
77 “AÇÃODE INVESTIGAÇÃODE PATERNIDADEE PETIÇÃODEHERANÇA.A Lei n. 883, de1949, não se aplica a sucessões já encerradas com a partilha dos bens dode cujus investigado entre seusherdeiros legítimos. Recurso Extraordinário conhecido e desprovido” (STF, RE 40817, Rel. Min. HenriqueD'Avila,1.ªTurma,j.29-10-1959,DJ,16-1-1960).
78“EMENTA:DIREITODASSUCESSÕES.FILHOSADOTIVOS.PRETENDIDAHABILITAÇÃONAQUALIDADE DE HERDEIROS DOSDECUJUS. INDEFERIMENTO CALCADO NO FATO DE AABERTURADASUCESSÃOHAVEROCORRIDOANTESDOADVENTODANOVACARTA,QUEELIMINOUOTRATAMENTOJURÍDICODIFERENCIADOENTREFILHOSLEGÍTIMOSEFILHOSADOTIVOS,PARAFINSSUCESSÓRIOS.ALEGADAOFENSAAOPRINCÍPIODAISONOMIAEAO
ART.227,§6.º,DACONSTITUIÇÃO.Inconstitucionalidadeinexistente.Asucessãoregula-seporleivigenteàdatadesuaabertura,nãoseaplicandoasucessõesverificadasantesdoseuadventoanormadoart.227,§6.º,daCartade1988,queeliminouadistinção,atéentãoestabelecidapeloCódigoCivil (art.1.605e§2.º),entre filhos legítimos e filhos adotivos, para esse efeito. Discriminação que, de resto, se assentava emsituaçõesdesiguais,nãoafetando,portanto,oprincípiodaisonomia.Recursonãoconhecido”(STF,RE163167,Rel.Min.IlmarGalvão,1.ªTurma,j.5-8-1997,DJ,31-10-1997).
79Sobreotemadaultratividade,confira-seosubtópico3.3(“AplicaçãoTemporaldeNormas”)doCapítuloIII(“LeideIntroduçãoàsNormasdoDireitoBrasileiro”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção.
80“DIREITODASSUCESSÕES.RECURSOESPECIAL.PACTOANTENUPCIAL.SEPARAÇÃODEBENS.MORTEDOVARÃO.VIGÊNCIADONOVOCÓDIGOCIVIL. ATO JURÍDICO PERFEITO.CÔNJUGESOBREVIVENTE.HERDEIRONECESSÁRIO.INTERPRETAÇÃOSISTEMÁTICA.
1. O pacto antenupcial firmado sob a égide do Código de 1916 constitui ato jurídico perfeito, devendo serrespeitadososatosqueosucedem,sobpenademaltratoaosprincípiosdaautonomiadavontadeedaboa-féobjetiva.
2. Por outro lado, ainda que afastada a discussão acerca de direito intertemporal e submetida a questão àregulamentaçãodonovoCódigoCivil,prevaleceavontadedotestador.Comefeito,ainterpretaçãosistemáticado Codex autoriza conclusão no sentido de que o cônjuge sobrevivente, nas hipóteses de separaçãoconvencionaldebens,nãopodeseradmitidocomoherdeironecessário.
3.Recurso conhecido e provido” (STJ,REsp 1111095/RJ,Rel.Min.CarlosFernandoMathias (JuizFederalconvocadodoTRF1.ªRegião),Rel.p/acórdãoMin.FernandoGonçalves,4.ªTurma,j.1.º-10-2009,DJe,11-2-2010).
81 “LEGADO. FIEL CUMPRIMENTO DA CLÁUSULA TESTAMENTÁRIA. ARTIGO 1.690 DOCÓDIGO CIVIL. Consistindo o legado em um determinado apartamento, ou no “dinheiro equivalente”, apretensão do legatário, nos termos do artigo 1.690 do Código Civil, é a entrega do imóvel ou de seu valoratualizado aomomentodo cumprimentodadisposiçãodeúltimavontade.Postergadapor anos a entregadolegado, a pesquisa do “equivalente”, através de reavaliações atualizadas, é exigível pelo legatário. RecursoEspecialconhecidoeprovido”(STJ,4.ªTurma,REsp11883/SP,RecursoEspecial1991/0011951-2,Rel.Min.AthosCarneiro,j.29-4-1992,DJ,25-5-1992,p.7400).
82“CIVIL.TESTAMENTOPÚBLICO.VÍCIOSFORMAISQUENÃOCOMPROMETEMAHIGIDEZDO ATO OU PÕEM EM DÚVIDA A VONTADE DA TESTADORA. NULIDADE AFASTADA.SÚMULAN.7-STJ.
I.Inclina-seajurisprudênciadoSTJpeloaproveitamentodotestamentoquando,nãoobstanteaexistênciadecertosvícios formais, a essênciadoato semantém íntegra, reconhecidapeloTribunal estadual, soberanonoexame da prova, a fidelidade da manifestação de vontade da testadora, sua capacidade mental e livre
expressão.
II.‘Apretensãodesimplesreexamedeprovanãoensejarecursoespecial’(Súmulan.7/STJ).
III.Recursoespecialnãoconhecido”(STJ,REsp600.746/PR,Rel.Min.AldirPassarinhoJunior,4.ªTurma,j.20-5-2010,DJe,15-6-2010).
83Note-se,inclusive,que,comconstantefrequêncianoscursosdegraduaçãoepós-graduaçãoemDireito,amatéria “Direito das Sucessões” é ensinada conjuntamente ou em sequência ao estudo da disciplina dasrelaçõesdefamília.
84Confira-seoCapítuloVIII(“ExcluídosdaSucessão”)destevolume.
85 Confira-se o Capítulo XIX (“Direito de Acrescer e Redução das Disposições Testamentárias”) destevolume.
86Confira-seotópico5(“AConfusaDisciplinaJurídicadaSucessãopelo(a)Companheiro(a)”)destecapítulo.
87Confiram-seosCapítulosVII(“VocaçãoHereditária”)eXI(“SucessãoLegítima”)destevolume.
88A saber, o LivroV, sendo os quatro anteriores reservados ao “Direito das Obrigações” (I), “Direito deEmpresa” (II), “DireitodasCoisas” (III) e “DireitodeFamília” (IV),havendo, ainda,o livro complementar,quetratadasdisposiçõesfinaisetransitórias.
89Releia-seo tópico4.1 (“PrincípiodaSaisine”)doCapítulo II (“PrincipiologiadoDireitodasSucessões”)destevolume.
90Confira-seoCapítuloXIII(“SucessãoTestamentária”)destevolume.
91Confira-seoCapítuloVII(“VocaçãoHereditária”)destevolume.
92Confira-seoCapítuloXI(“SucessãoLegítima”)destevolume.
93 Confira-se o tópico 2 (“Compreensão do Direito Sucessório: Conceito e Fundamentação Jurídico-Ideológica”)doCapítuloI(“IntroduçãoaoDireitodasSucessões”)dopresentevolume.
94 Para aprofundamento do tema, confira-se o Capítulo XI (“Pagamento com Sub-rogação”) do v. II(“Obrigações”)destacoleção.
95Sobreotema,confira-seotópico4(“DanoReflexoouemRicochete”)doCapítuloV(“ODano”)dov.III(“ResponsabilidadeCivil”)destacoleção.
96“AÇÃODEINDENIZAÇÃOPORDANOSMORAIS—USODEIMAGEMDEPESSOAMORTA—DANOPORRICOCHETE—DIVULGAÇÃOSEMAUTORIZAÇÃO—UTILIZAÇÃOMERAMENTEINFORMATIVA — AUSÊNCIA DE DANO — INDENIZAÇÃO INDEVIDA — RECURSOIMPROVIDO.—Osdireitosdapersonalidadeestãovinculados, inexoravelmente,àprópriapessoahumana,razãopelaqualsãotachadosdeintransmissíveis.Conquantoessapremissasejaabsolutamenteverdadeira,osbens jurídicos protegidos por essa plêiade de direitos compreendem aspectos da pessoa vista em simesma,comotambémemsuasprojeçõeseprolongamentos.—Apessoaviva,portanto,podedefender—atéporqueditointeresseintegraaprópriapersonalidade—osdireitosdapersonalidadedapessoamorta,desdequetenhalegitimidadepara tanto.Talpossibilidaderesultanasconsequênciasnegativasque,porventura,ousoilegítimodaimagemdoparentepodeprovocarasieaonúcleofamiliaraoqualpertence,porquantoatingeapessoade
formareflexa.Éoqueadoutrina,modernamente,chamadedanomoralindiretooudanomoralporricochete.
—Ousode imagemfeitode formaofensiva, ridículaouvexatória impõeodeverde indenizarpor supostosdanosmorais.Quando,aocontrário,aimagemcaptadaenaltecerapessoaretratada,nãohácomosefalaremdanomoral”(TJMG,Ap.Cív.1.0701.02.015275-0/001—NumeraçãoÚnica:0152750-16.2002.8.13.0701—ComarcadeUberaba—Apelante(s):LuizRenatoOliveiraGomes—Apelado(a)(s):FahimMiguelSawan—Rel.Exmo.Sr.Des.FabioMaiaViani).
97Confira-seoCapítuloXI(“SucessãoLegítima”)destevolume.
98Confira-seosubtópico4.2(“PessoasJurídicas”)doCapítuloVII(“VocaçãoHereditária”)destevolume.
99Sobreotema,confira-seotópico10(“ExtinçãodaPessoaJurídica”)doCapítuloVI(“PessoaJurídica”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção.
100ConsolidaçãodasLeisdoTrabalho:
“Art. 10. Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seusempregados.
(...)
Art.448.Amudançanapropriedadeounaestruturajurídicadaempresanãoafetaráoscontratosdetrabalhodosrespectivosempregados”.
101Paraumaprofundamentosobreotema,emumaperspectivadadisciplinadasrelaçõescivis,confira-seosubtópico4.1(“CessãodoContratodeTrabalho”)doCapítuloXX(“TransmissãodasObrigações:cessãodecrédito,cessãodedébito(assunçãodedívida)ecessãodecontrato”)dov.II(“Obrigações”)destacoleção.
102Confira-seoCapítuloXI(“SucessãoLegítima”)destevolume.
103SobreotemadaUniãoEstável,emgeral,confira-seoCapítuloXIX(“UniãoEstável”)dov.6(“DireitodeFamília”)destacoleção.
104Lein.6.858,de24denovembrode1980(dispõesobreoPagamento,aosDependentesouSucessores,deValoresNãoRecebidosemVidapelosRespectivosTitulares).
105Nãoháequivalenteespecíficonacodificaçãoanterior.Anormacorrespondentenoantigosistemaéoart.2.ºdaLein.8.971/94,queestabeleceu:
“Art.2.ºAspessoasreferidasnoartigoanteriorparticiparãodasucessãodo(a)companheiro(a)nasseguintescondições:
I—o(a)companheiro(a)sobrevivente terádireitoenquantonãoconstituirnovaunião,aousufrutodequartapartedosbensdodecujus,sehouverfilhosoucomuns;
II—o(a)companheiro(a)sobreviventeterádireito,enquantonãoconstituirnovaunião,aousufrutodametade
dosbensdodecujus,senãohouverfilhos,emborasobrevivamascendentes;
III—nafaltadedescendentesedeascendentes,o(a)companheiro(a)sobreviventeterádireitoàtotalidadedaherança”.
106 ZenoVeloso,Do direito sucessório dos companheiros, inDireito de Família e o Novo Código Civil,coord.MariaBereniceDiaseRodrigodaCunhaPereira,BeloHorizonte:DelRey,2005,p.233.
107GiseldaMariaFernandesNovaesHironaka,ComentáriosaoCódigoCivil—parteespecial:dodireitodassucessões (arts. 1.784 a 1.856), coord.Antônio Junqueira deAzevedo, 2. ed. rev., SãoPaulo:Saraiva,2007,p.55-56.v.20.
108Confira-seoCapítuloXI(“SucessãoLegítima”)destevolume.
109Confiram-seosCapítulosVI(“CessãodeDireitosHereditários”)eXXIII(“Inventário”)destevolume.
110Releia-seotópico4.1(“PrincípiodaSaisine”)doCapítuloII(“PrincipiologiadoDireitodasSucessões”)destevolume.
111Otemadocondomínioéobjetodeanálisepormenorizadanov.V(“DireitodasCoisas”)destacoleção.
112Confira-seoCapítuloV(“AceitaçãoeRenúnciadaHerança”)destevolume.
113“DIREITODASSUCESSÕES.DIREITODEPREFERÊNCIA.SENDOINDIVISÍVELOBEMAOQUAL CONCORREM VÁRIOS HERDEIROS, APLICA-SE, EM CASO DE CESSÃO DE QUOTASHEREDITÁRIAS,AREGRADOARTIGO1.139DOCÓDIGOCIVIL,SEALGUMDOSHERDEIROSEXERCERODIREITODEPREFERÊNCIA.RECURSOCONHECIDOEPROVIDO”(STJ,RE112791,Rel.Min.CarlosMadeira,2.ªTurma,julgadoem15-9-1987,DJ9-10-1987).
114 “Art. 1.796. No prazo de trinta dias, a contar da abertura da sucessão, instaurar-se-á inventário dopatrimôniohereditário,peranteojuízocompetentenolugardasucessão,parafinsdeliquidaçãoe,quandoforocaso,departilhadaherança”.
115Sempre lembrandodoPrincípio (Non)UltraViresHereditatis, insculpido no art. 1.792 doCC/2002, inverbis: “Art. 1.792. O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança; incumbe-lhe,porém, a prova do excesso, salvo se houver inventário que a escuse, demonstrando o valor dos bensherdados”.Releia-seo tópico4.2(“Princípio(Non)UltraViresHereditatis”) doCapítulo II (“PrincipiologiadoDireitodasSucessões”)destevolume.
116“Art.618.Incumbeaoinventariante:
I— representar o espólio ativa e passivamente, em juízo ou fora dele, observando-se, quanto ao dativo, odispostonoart.75,§1.º;
II—administraroespólio,velando-lheosbenscomamesmadiligênciaqueteriaseseusfossem;
III—prestarasprimeiraseasúltimasdeclaraçõespessoalmenteouporprocuradorcompoderesespeciais;
IV—exibiremcartório,aqualquertempo,paraexamedaspartes,osdocumentosrelativosaoespólio;
V—juntaraosautoscertidãodotestamento,sehouver;
VI—trazeràcolaçãoosbensrecebidospeloherdeiroausente,renuncianteouexcluído;
VII—prestarcontasdesuagestãoaodeixarocargoousemprequeojuizlhedeterminar;
VIII—requereradeclaraçãodeinsolvência.
Art.619.Incumbeaindaaoinventariante,ouvidososinteressadosecomautorizaçãodojuiz:
I—alienarbensdequalquerespécie;
II—transigiremjuízoouforadele;
III—pagardívidasdoespólio;
IV—fazerasdespesasnecessáriasparaaconservaçãoeomelhoramentodosbensdoespólio.”
117Confira-seoCapítuloXXIII(“Inventário”)destevolume.
118“Art.75.Serãorepresentadosemjuízo,ativaepassivamente:
I—aUnião,pelaAdvocacia-GeraldaUnião,diretamenteoumedianteórgãovinculado;
II—oEstadoeoDistritoFederal,porseusprocuradores;
III—oMunicípio,porseuprefeitoouprocurador;
IV—aautarquiaeafundaçãodedireitopúblico,porquemaleidoentefederadodesignar;
V—amassafalida,peloadministradorjudicial;
VI—aherançajacenteouvacante,porseucurador;
VII—oespólio,peloinventariante;
VIII — a pessoa jurídica, por quem os respectivos atos constitutivos designarem ou, não havendo essadesignação,porseusdiretores;
IX— a sociedade e a associação irregulares e outros entes organizados sem personalidade jurídica, pelapessoaaquemcouberaadministraçãodeseusbens;
X — a pessoa jurídica estrangeira, pelo gerente, representante ou administrador de sua filial, agência ousucursalabertaouinstaladanoBrasil;
XI—ocondomínio,peloadministradorousíndico.
§ 1.º Quando o inventariante for dativo, os sucessores do falecido serão intimados no processo no qual oespóliosejaparte.
§ 2.º A sociedade ou associação sem personalidade jurídica não poderá opor a irregularidade de suaconstituiçãoquandodemandada.
§3.ºOgerentedefilialouagênciapresume-seautorizadopelapessoajurídicaestrangeiraarecebercitaçãoparaqualquerprocesso.
§4.ºOsEstadoseoDistritoFederalpoderãoajustarcompromisso recíprocoparapráticadeatoprocessualpor seus procuradores em favor de outro ente federado, mediante convênio firmado pelas respectivasprocuradorias.”
119 “AGRAVO DE INSTRUMENTO. AUTOS DE INVENTÁRIO. RENÚNCIA AO CARGO PELOINVENTARIANTE. NECESSÁRIA APRECIAÇÃO DO JUÍZO. RESPONSABILIDADE DO
INVENTARIANTE PERDURAATÉ SUAEFETIVA SUBSTITUIÇÃOCOMANOMEAÇÃODEUMNOVO INVENTARIANTE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. Acordam osSenhores integrantes da Décima Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, porunanimidadedevotos,emconcederparcialprovimentoaoAgravodeInstrumento,nostermosdovoto”(TJPR,AI5499558PR0549955-8(TJPR),datadepublicação:9desetembrode2009).
120Lembramosque tambémno regramentodo arrolamentoháprevisãodenomeaçãodeum inventariante,conformeart.660,I,doCódigodeProcessoCivilde2015:
“Art.660.Napetiçãodeinventário,queseprocessaránaformadearrolamentosumário,independentementedalavraturadetermosdequalquerespécie,osherdeiros:
I—requererãoaojuizanomeaçãodoinventariantequedesignarem;”.
121 “APELAÇÃOCÍVEL.AGRAVORETIDO. RESPONSABILIDADECIVIL. ILEGITIMIDADEDEPARTE.CURADOR.INVENTARIANTE.VENDADEBENSCUJOPRODUTONÃOREVERTEUEMFAVOR DO ESPÓLIO. PREJUÍZO. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. QUANTUM.HONORÁRIOSDEADVOGADO.SANÇÃODOART.161DOCPC.NÃOAPLICAÇÃO.
1.Conhecidooagravoretido,porquantoaagravante,postulandoexpressamente,emsuasrazõesdeapelação,seuconhecimentoporestaCorte,sedesincumbiudoônusimpostopeloart.523,capute§1.°,doCPC.
2. Mantida a decisão que indeferiu a substituição de uma testemunha, porque inocorrente qualquer dashipótesesdoart.408doCPC,equeindeferiuaouvidadeoutrasduas,porquantoarroladasintempestivamente—maisdeseismesesdepoisdadataaprazada.Nãoconfiguraçãodecerceamentodedefesa.Agravoretidodesprovido.
3.Legitimidadeativadoespólio.Oalegadodanomaterialfoiperpetradoaoespólio,eseapresentedemandafoi ajuizada antes do julgamento definitivo da partilha— estando-se aguardando a sobrepartilha—, não háfalar em ilegitimidade de parte. Não se trata demero litígio entre herdeiros,mas sim de demanda visandoresguardardireitodoespólio.
4.Osréus—curadordainterdita,ele,einventariante,ela,casadosentresi—sãoefetivamenteresponsáveispeloprejuízomaterialperpetradoaoespólio,umavezque,sejapordolo,sejaporculpa,permitiramque4.126sacasdearrozpertencentesà falecida fossemnegociadas semqueacontraprestaçãopecuniária revertesseemfavordainterditaoudeseuespólio.
5.Refeitoocálculodovalordaindenização.Sefaltamaoespólio,desde09.09.1998,4.126sacasdearroz,eestas, no período, estavam avaliadas em R$ 19,75 a saca, o valor do débito, em 09.09.1998 era de R$81.488,50(4.126x19,75=81.488,50).Talquantiadeveseracrescidadejurosdemorade0,5%aomêsdesde09.09.1998atéaentradaemvigordoCCde2002—11.02.2003—,quando,apartirdeentão,passarãoaopercentualde1%aomês.Acorreçãomonetáriaincidirádesde09.09.1998,sendoadotadocomoindexadoroIGP-M.Súmulas43e54doSTJ.
6.Mantidooquantumdoshonoráriosadvocatíciosem20%dacondenação.Art.20,§3.°,doCPC.
7.Inaplicávelasançãodoart.161doCPC.Sublinhartrechosdedepoimentosnãoconfiguraacondutavedadaportaldispositivo.Precedentes.Ademais,nãoháprovasdequetaltenhasidofeitopelopatronodoautor.
AGRAVO RETIDO DESPROVIDO. REJEITADA A PRELIMINAR. APELOS PARCIALMENTEPROVIDOS. UNÂNIME” (TJ RS, Ap. Cív. 70015991631, 9.ª Câmara Cível, Rel. Iris Helena MedeirosNogueira,j.16-8-2006).
122CódigoPenal:
“Apropriaçãoindébita
Art.168.Apropriar-sedecoisaalheiamóvel,dequetemaposseouadetenção:
Pena—reclusão,deumaquatroanos,emulta.
Aumentodepena
§1.ºApenaéaumentadadeumterço,quandooagenterecebeuacoisa:
I—emdepósitonecessário;
II—naqualidadedetutor,curador,síndico,liquidatário,inventariante,testamenteirooudepositáriojudicial;
III—emrazãodeofício,empregoouprofissão”.
123 Sobre o tema, confira-se o Capítulo III (“Lei de Introdução àsNormas doDireito Brasileiro”) do v. I(“ParteGeral”)destacoleção.
124CódigodeProcessoCivilde2015:
“Art.376.Apartequealegardireitomunicipal,estadual,estrangeiroouconsuetudinárioprovar-lhe-áoteoreavigência,seassimojuizdeterminar”.
125 Confira-se o subtópico 4.1 (“Princípio da Saisine”) do Capítulo II (“Principiologia do Direito dasSucessões”)destevolume.
126Trata-se,nãoédemais relembrar,deprincípio inspiradonoDireito francês (namesma linha,verThiagoFelipeVargasSimões,na inovadoraobraAFiliaçãoSocioafetivae seusReflexosnoDireitoSucessório,SãoPaulo:Fiuza,2008,p.75).
127Confira-seosubtópico4.2(“Princípio(Non)UltraViresHereditatis”)doCapítuloII (“PrincipiologiadoDireitodasSucessões”)destevolume.
128 Confira-se o subtópico 3.5 (“Autonomia da Vontade”) do Capítulo II (“Principiologia do Direito dasSucessões”)destevolume.
129“INVENTÁRIO.RENÚNCIAEXPRESSA.PLANODEPARTILHA.VALIDADE.1.Comamortedoautordaherança,ocorreaaberturadasucessãoe,também,simultaneamente,ofenômenodadelação,períodonoqualaherançaéoferecidaaosucessor,esperandosuaaceitaçãoourenúncia.2.Arenúnciadaherança,porconstituirexceção,deveserexpressa,devendoconstarexpressamentedetermojudicialoudeinstrumentopúblico,consoanteestabelececlaramenteoart.1.806doCódigoCivil.3.Assim,osherdeirosrenunciantesnãopodem ser incluídos no plano de partilha, como determinado pelo Dr. Juiz de Direito, impondo-se adesconstituição da r. decisão atacada para que seja dado prosseguimento ao feito, culminando com ahomologação do plano de partilha apresentado pelos herdeiros restantes. Recurso provido” (TJRS, AI70024749871,7.ªCâmaraCível,Rel.SérgioFernandodeVasconcellosChaves,j.24-9-2008).
130Confira-seotópico3(“RenúnciadaHerança”)destecapítulo.
131 Confira-se novamente o subtópico 4.2 (“Princípio (Non) Ultra Vires Hereditatis”) do Capítulo II(“PrincipiologiadoDireitodasSucessões”)destevolume.
132MariaHelenaDiniz,Curso deDireitoCivil Brasileiro—Direito das Sucessões. 22. ed. São Paulo:Saraiva,2008,p.68.v.6.
133MariaHelenaDiniz,ob.cit.,p.72.
134Confira-seotópico3(“RenúnciadaHerança”)desteCapítulo.
135Sobreasdisposiçõestestamentárias,confira-seoCapítuloXIII(“SucessãoTestamentária”)destevolume.
136Confira-seoCapítuloXII(“DireitodeRepresentação”)destevolume.
137“Art.1.810.Nasucessãolegítima,apartedorenuncianteacresceàdosoutrosherdeirosdamesmaclassee,sendoeleoúnicodesta,devolve-seaosdasubsequente”.
138Oato jurídicoemsentidoestrito, tratadono tópico7 (“AtoJurídicoemSentidoEstrito”)doCapítulo IX(“Fato Jurídico em Sentido Amplo”) do nosso volume 1 (“Parte Geral”), consiste em um simplescomportamentohumano,voluntárioeconsciente,cujosefeitosjurídicossãoimpostosporlei.
139ConstituiçãoFederalde1988:
“Art.5.ºTodossãoiguaisperantealei,semdistinçãodequalquernatureza,garantindo-seaosbrasileiroseaosestrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e àpropriedade,nostermosseguintes:
(...)
XXX—égarantidoodireitodeherança”.
140 Pablo Stolze Gagliano, Código Civil Comentado — Direito Das Coisas, Superfície, Servidões,Usufruto,Uso,Habitação,DireitodoPromitenteComprador,artigos1.369a1.418,coord.ÁlvaroVillaçaAzevedo,SãoPaulo:Atlas,2004,v.XIII,p.97.
141OrlandoGomes,Sucessões,12.ed.,RiodeJaneiro:Forense,2004,p.25.
142“Art.1.806.Arenúnciadaherançadeveconstarexpressamentedeinstrumentopúblicooutermojudicial”.
143 “CIVIL. HERANÇA. RENÚNCIA. A renúncia à herança depende de ato solene, a saber, escriturapúblicaoutermonosautosdeinventário;petiçãomanifestandoarenúncia,comapromessadeassinaturadotermo judicial,nãoproduzefeitos semqueessa formalidadesejaultimada.Recursoespecialnãoconhecido”(STJ,REsp431.695/SP,Rel.Min.AriPargendler,3.ªTurma,j.21-5-2002,DJ,5-8-2002,p.339).
144Note,inclusive,queopróprioparágrafoúnicodoart.1.804dispõequeatransmissãopatrimonial“tem-sepornãoverificadaquandooherdeirorenunciaàherança”.
145 Vanessa Scuro, Aceitação e Renúncia de Herança, disponível em:<http://www.migalhas.com.br/mostra_noticia_articuladas.aspx?cod=110905>,acessoem:29jun.2011.
146Talvezporisso,compropriedade,observaSílvioVenosaqueestaregraprotetivadocréditoé“aplicaçãoespecíficadoprincípiodafraudecontracredores”(DireitoCivil—DireitodasSucessões,4.ed.,cit.,p.37.v.7).
147Sobreotema,cf.PabloStolzeGagliano,OContratodeDoação,3.ed.,SãoPaulo:Saraiva,2010.
148 Pablo Stolze Gagliano, Código Civil Comentado — Direito das Coisas, Superfície, Servidões,Usufruto,Uso,Habitação,DireitodoPromitenteComprador.ObraescritaemhomenagemaoProf.Dr.JoséManoeldeArrudaAlvimNetto,SãoPaulo:Atlas,2004,v.XIII,p.38.
149Veremos,emmomentopróprio (CapítuloXXIII—“Inventário”—destevolume),que,a teordaLein.11.441, de 4 de janeiro de 2007, o inventário ou o arrolamento, não havendo herdeiros incapazes, nemtestamento, poderá ser lavrado, consensualmente, no Tabelionato de Notas, dispensando processo judicial.Trata-se do inventário ou arrolamento administrativo, caso em que a partilha (entre os herdeiros) ou aadjudicação(quandohouverumherdeirosó),dispensa,logicamente,processojudicial.
150“Art.1.947.Otestadorpodesubstituiroutrapessoaaoherdeiroouaolegatárionomeado,paraocasodeum ou outro não querer ou não poder aceitar a herança ou o legado, presumindo-se que a substituição foideterminada para as duas alternativas, ainda que o testador só a uma se refira”.Confira-se oCapítuloXX(“Substituições”)dopresentevolume.
151 “Art. 1.941. Quando vários herdeiros, pela mesma disposição testamentária, forem conjuntamentechamadosàherançaemquinhõesnãodeterminados,equalquerdelesnãopuderounãoquiseraceitá-la,asuaparte acrescerá à dos coerdeiros, salvo o direito do substituto”. Confira-se o Capítulo XIX (“Direito deAcrescereReduçãodasDisposiçõesTestamentárias”)dopresentevolume.
152 Sobre o inventário e o arrolamento administrativos, ver o nosso Capítulo XXIII (“Inventário”) destevolume.
153 “DIREITO DAS SUCESSÕES. DIREITO DE PREFERÊNCIA. Sendo indivisível o bem ao qualconcorremváriosherdeiros, aplica-se, emcasodecessãodequotashereditárias, a regradoartigo1.139doCódigoCivil,sealgumdosherdeirosexercerodireitodepreferência.Recursoconhecidoeprovido”(STF,RE112791,Rel.Min.CarlosMadeira,2.ªTurma,j.15-9-1987,DJ,9-10-1987).
154Comosabemos,direitopotestativoéaqueleque,semterconteúdoprestacional,aoserexercido,interferenaesferajurídicaalheiasemqueestapessoanadapossafazer.
155Sobreo tema,veronossov.VI(“DireitodeFamília”),maisespecificamenteno tópico4(“AutorizaçãoConjugal(‘OutorgaUxória’e‘OutorgaMarital’)”)doCapítuloXIII(“RegimedeBensdoCasamento:NoçõesIntrodutóriasFundamentais”).
156Confira-seoCapítuloXVI(“RegimedeBensdoCasamento:SeparaçãoConvencionaldeBens”)dov.VI(“DireitodeFamília”)destacoleção.
157Sobreotema,confira-seotópico“a.5”(“Consideraçõessobreanaturezaimobiliáriadodireitoàsucessãoaberta”)doCapítuloVIII(“BensJurídicos”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção.
158NoCC/2002,art.80,II.
159FranciscoJoséCahalieGiseldaMariaFernandesNovaesHironaka,CursoAvançadodeDireitoCivil,SãoPaulo:RevistadosTribunais,2000,p.102.v.6.
160Maria Helena Diniz.Curso de Direito Civil Brasileiro. Direito das Sucessões, 21. ed., São Paulo:Saraiva,2007,p.75.
161“Ementa:COMUNHÃOUNIVERSALDEBENS.Noregimedacomunhãouniversal,maridoemulhersãoverdadeiroscondôminosemtodososbens(excetoosincomunicáveis),estejamosbensondeestiverem,etemnelesametadeideal;dissolvidaasociedadeconjugal,opatrimôniocomuméigualmenterepartidoentreoscônjuges,ouentreosobreviventeeosherdeirosdooutro.ACEITAÇÃODAHERANÇA.Énegóciojurídicoirrevogável — ‘semel heres, semper heres’, e não pode ser parcial; a aceitação dos bens situados noestrangeiro,bemcomoainventariançadosbenssituadosnoBrasil,confirmounoherdeiro-filhoatransmissãoefetuadaexvi legis.RENÚNCIATRANSLATIVADOQUINHÃOHEREDITÁRIOPODESERFEITAPORTERMONOSAUTOS.Omarido,pararenunciaràheranca,precisadaoutorgauxória.DIREITODAMULHER, DE IMPUGNAROATO PRATICADO SEM SUAANUÊNCIA. A concordância damulhercomapartilha, realizadanodesquite,não implicaemtácitaabdicaçãodesuapretensãoahavernovosbens,medianteaanulaçãodarenúnciatranslativaanteriormentepraticadapelocônjugevarão.BENSSITUADOSNOBRASILENAREPÚBLICADOURUGUAI.PROBLEMADAUNIDADEEDAPLURALIDADEDEJUÍZOSSUCESSÓRIOS.APRESENTAÇÃOHISTÓRICADOTEMA.DIREITOCOMPARADO,EPROTEÇÃOAOSNACIONAISQUANDOLHESFORMAISFAVORÁVELALEIDOPAÍS.CÓDIGODEPROCESSOCIVILBRASILEIRO,ART.-89,II.COMPETÊNCIAINTERNACIONALEXCLUSIVA.DISPOSIÇÕESDOCÓDIGOCIVILDOURUGUAI,ONDESEPROCESSOUO INVENTÁRIODOSBENSNAQUELEPAÍSSITUADOS.PRINCÍPIODAEFETIVIDADE.PREVALÊNCIA,PARAOJUIZBRASILEIRO, DA LEIMATERIAL BRASILEIRA. Impende ao juiz brasileiro resguardar, na medida dopossível, a eficácia e a aplicação da lei material brasileira; no caso concreto, a prevalência das normasrelativas à comunhão universal de bens, postergadas no inventário realizado noUruguai. Direito da autora,anuladaarenúncia,ahaverseuquinhãonosbensdeixadospeloprogenitordoex-marido,consideradostantoosbenssituadosnoBrasilcomonoUruguai.Pagamentoaserfeitocombenssituadosemnossopaís.Provimentoparcial da apelação, para cancelar determinados itens do decisum, por importarem condenações dúplices.Manutenção,noessencial,dasentença”(TJRS,AC500297163/RS,Ap.Cível,1.ªCâmaraCível,Rel.AthosGusmãoCarneiro,j.10-6-1980).
“Herança.Renúnciapelomarido.Outorgauxória.Necessidade.Ausêncianaespécie.Ineficáciaconsequentedonegóciojurídicodispositivo.Aplicaçãodosarts.44,III,e235,I,doCódigoCivil.Qualquerquesejaoregimedebens,nãopodeocônjugerenunciaraherança,semconsentimentodoconsorte”(TJSP,Ap.Cív.249.828-1,Rel.Des.CezarPeluso,j.27-8-1996,v.u.).
162“Tributário.Direitoaherança.Renúncia.ImpostodeTransmissão.CódigoCivil(arts.1.582e1.589).Setodosos filhosdoautordaherança renunciama seus respectivosquinhões,beneficiandoaviúva,queera aherdeira subsequente, é incorreto dizer que a renúncia foi antecedida por aceitação tácita da herança.Não
incidência do imposto de transmissão” (STJ, REsp 20183/RJ, 1.ª Turma, Rel. Min. Humberto Gomes deBarros,j.1.º-12-1993,DJU,7-2-1994,p.1131,maioria).
163Art.156daCF:“CompeteaosMunicípios instituir impostossobre: (...) II— transmissão intervivos, aqualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobreimóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição”. Vale lembrar, caro leitor,somente a título de complementação, e para que não pairem dúvidas, que, conforme vimos no capítulo I, odireitoàherançatem,porforçadelei,naturezaimobiliária,oquejustificaaincidênciadanorma.
164 Confira-se o tópico 2 (“Capacidade de Direito e de Fato e Legitimidade”) do Capítulo IV (“PessoaNatural”)donossov.I(“ParteGeral”).
165MarcosBernardesdeMello,AchegasparaumaTeoriadasCapacidadesemDireito,RevistadeDireitoPrivado,SãoPaulo:RevistadosTribunais,jul./set.2000,p.17.
166OrlandoGomes,IntroduçãoaoDireitoCivil,RiodeJaneiro:Forense,2004,p.172.
167SílviodeSalvoVenosa,DireitoCivil—ParteGeral,cit.,p.139.
168Confira-seoCapítuloXIII(“SucessãoTestamentária”)destevolume.
169GeorgesRipert e JeanBoulanger,Tratado deDerechoCivil (según el Tratado dePlaniol), BuenosAires:LaLey,1987,v.I,t.X,p.55.
170 Sobre o tema, confira-se o subtópico 1.3 (“O Nascituro”) do Capítulo IV (“Pessoa Natural”) do v. I(“ParteGeral”)destacoleção.
171 “Ementa: DIREITO CIVIL. SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA. FILHOS LEGÍTIMOS DO NETO.LEGATÁRIOS.ALCANCEDAEXPRESSÃO.INTERPRETAÇÃODOTESTAMENTO.ENUNCIADON.º 5 DA SÚMULA/STJ. LEGATÁRIO AINDA NÃO CONCEBIDO À DATA DO TESTADOR.CAPACIDADESUCESSÓRIA.DOUTRINA.RECURSODESACOLHIDO.
I—Aanálisedavontadedo testadoreocontextoemque inseridaaexpressão ‘filhos legítimos’nacédulatestamentáriavincula-se,naespécie,àsituaçãodefatodescritanasinstânciasordinárias,cujoreexamenestainstânciaespecialdemandariaa interpretaçãodecláusulaea reapreciaçãodoconjuntoprobatóriodosautos,sabidamente vedados, a teor dos verbetes sumulares 5 e 7/STJ.Não se trata, no caso, de escolher entre aacepção técnico-jurídicaeacomumde ‘filhos legítimos’,masdeaprofundar-senoencadeamentodos fatos,como a época em que produzido o testamento, a formação cultural do testador, as condições familiares esobretudo a fase de vida de seu neto, para dessas circunstâncias extrair o adequado sentido dos termosexpressosnotestamento.
II—A prole eventual de pessoa determinada no testamento e existente ao tempo damorte do testador eaberturadasucessãotemcapacidadesucessóriapassiva.
III—Semteremasinstânciasordináriasabordadoostemasdacapacidadeparasucederedaretroatividadedalei,careceorecursoespecialdoprequestionamentoemrelaçãoàalegadaofensaaosarts.1.572e1.577doCódigoCivil.
IV—OSuperiorTribunal de Justiça não tem competência para apreciar violação de norma constitucional,missão reservada aoSupremoTribunal Federal” (STJ,REsp 203137/PR,RecursoEspecial 1999/0009548-0,Rel.Min.SálviodeFigueiredoTeixeira, 4.ªTurma, j. 26-2-2002,DJ, 12-8-2002,p.214,RDR, v. 24, p. 301;RSTJ,v.159,p.428).
172CódigoCivil:
“Art.1.775.Ocônjugeoucompanheiro,nãoseparadojudicialmenteoudefato,é,dedireito,curadordooutro,quandointerdito.
§1.ºNafaltadocônjugeoucompanheiro,écuradorlegítimoopaiouamãe;nafaltadestes,odescendentequesedemonstrarmaisapto.
§2.ºEntreosdescendentes,osmaispróximosprecedemaosmaisremotos.
§3.ºNafaltadaspessoasmencionadasnesteartigo,competeaojuizaescolhadocurador”.
173“§2.ºOspoderes, deveres e responsabilidadesdo curador, assimnomeado, regem-sepelasdisposiçõesconcernentesàcurateladosincapazes,noquecouber.”
174“§3.ºNascendocomvidaoherdeiroesperado,ser-lhe-ádeferidaasucessão,comosfrutoserendimentosrelativosàdeixa,apartirdamortedotestador.”
175CarlosRobertoGonçalves,DireitoCivilBrasileiro.7.ed.,SãoPaulo:Saraiva,2011,p.74.v.VII.
176 “Art. 207. Salvo disposição legal em contrário, não se aplicam à decadência as normas que impedem,suspendem ou interrompem a prescrição.” Sobre o tema, confira-se o Capítulo XVIII (“Prescrição eDecadência”)donossov.I(“ParteGeral”).
177Diferente,poróbvio,éahipótesede“nascercomvida”efalecerinstantesapós,casoemqueconsolidaráosdireitossucessórios,transmitindo-osaosseusprópriossucessores.
178 Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, Comentários ao Código Civil — Parte Especial: DoDireitodasSucessões(Arts.1.784a1.856),coord.AntônioJunqueiradeAzevedo,2.ed. rev.SãoPaulo:Saraiva,2007,p.109-110.v.20.
179Comodesenvolvimentodateoriaconcepcionistaemnossopaís,podeserque,nofuturo,soluçãodiversaprevaleça(sobreasteoriasexplicativasdonascituro,cf.onossov.I,ParteGeral,capítuloIV,item1.3).
180PatríciaRussiePatríciaFontanella, “APossibilidadedaAdoçãodaProleEventualdianteda Incidênciados Direitos Fundamentais nas Relações Privadas”. Disponível em:<www.flaviotartuce.adv.br/artigosc/adocprole_font.doc>.Acessoem:16out.2011.
181 Sílvio Venosa, “Capacidade de Testar e Capacidade de Adquirir por Testamento”. Disponível em:<http://silviovenosa.com.br/artigo/capacidade-de-testar-e-capacidade-de-adquirir-por-testamento>.Acessoem:19out.2011.
182Sobreotema,confira-seoCapítuloXXV(“Filiação”)dov.VI(“DireitodeFamília”)destacoleção.
183JoãoÁlvaroDias,ProcriaçãoAssistidaeResponsabilidadeMédica.Coimbra:CoimbraEd., 1996, p.40.
184 Rafael Junquera de Estéfani, Reproducción Asistida, Filosofía Ética y Filosofía Jurídica, Madrid:Tecnos,1998,p.69.
185MônicaAguiar,DireitoàFiliaçãoeBioética,RiodeJaneiro:Forense,2005,p.119.
186JoséRobertoMoreiraFilho,OsNovosContornosdaFiliaçãoedosDireitosSucessóriosemFacedaReproduçãoHumanaAssistida.Disponívelem:<http://www.abmp.org.br/textos/2556.htm>.Acesso em: 18fev.2012.
187MariaHelenaDiniz,OEstadoAtualdoBiodireito,3.ed.SãoPaulo:Saraiva,2006,p.480.
188Sobreotema,veja-seoCapítuloVI(“PessoaJurídica”)donossov.I(“ParteGeral”).
189 Sobre as sociedades irregulares ou de fato, confira-se o subtópico 5.1 (“Sociedades Irregulares ou deFato”)doCapítuloVI(“PessoaJurídica”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção.
190Confira-seosubtópico7.1.3(“AsFundações”)doCapítuloVI(“PessoaJurídica”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção,que,aqui,sefazumareleitura.
191A fundação pública, instituída pela União, Estado ouMunicípio, na forma da lei, rege-se por preceitosprópriosdedireitoadministrativo,escapando,portanto,comodissemosacima,daperspectivadestaobra.
192CaioMáriodaSilvaPereira,InstituiçõesdeDireitoCivil,19.ed.RiodeJaneiro:Forense,2001,p.223.v.I.
193LincolnAntôniodeCastro,OMinistérioPúblicoeasFundaçõesdeDireitoPrivado,RiodeJaneiro:FreitasBastos,1995,p.26.
194“Art.4.ºAalíneaado§2.ºdoart.12daLein.9.532,de10dedezembrode1997,passaavigorarcomaseguinteredação:
‘Art.12
§2.º
a)nãoremunerar,porqualquerforma,seusdirigentespelosserviçosprestados,excetonocasodeassociaçõesassistenciais ou fundações, sem fins lucrativos, cujos dirigentes poderão ser remunerados, desde que atuemefetivamentenagestão executiva, respeitados como limitesmáximososvalorespraticadospelomercadonaregiãocorrespondenteàsuaáreadeatuação,devendoseuvalorserfixadopeloórgãodedeliberaçãosuperiordaentidade,registradoemata,comcomunicaçãoaoMinistérioPúblico,nocasodasfundações;
’(NR)”
“Art.5.ºAalíneacdoart.1.ºdaLein.91,de28deagostode1935,passaavigorarcomaseguinteredação:
‘Art.1.º
c)queoscargosdesuadiretoria,conselhosfiscais,deliberativosouconsultivosnãosãoremunerados,exceto
no caso de associações assistenciais ou fundações, sem fins lucrativos, cujos dirigentes poderão serremunerados, desde que atuem efetivamente na gestão executiva, respeitados como limites máximos osvalorespraticadospelomercadonaregiãocorrespondenteàsuaáreadeatuação,devendoseuvalorserfixadopeloórgãodedeliberaçãosuperiordaentidade,registradoemata,comcomunicaçãoaoMinistérioPúblico,nocasodasfundações.’(NR)”
“Art.6.ºOincisoIdoart.29daLein.12.101,de27denovembrode2009,passaavigorarcomaseguinteredação:
‘Art.29.
I—nãopercebamseusdiretores,conselheiros,sócios,instituidoresoubenfeitoresremuneração,vantagensoubenefícios, direta ou indiretamente, por qualquer forma ou título, em razão das competências, funções ouatividades que lhes sejam atribuídas pelos respectivos atos constitutivos, exceto no caso de associaçõesassistenciais ou fundações, sem fins lucrativos, cujos dirigentes poderão ser remunerados, desde que atuemefetivamentenagestão executiva, respeitados como limitesmáximososvalorespraticadospelomercadonaregiãocorrespondenteàsuaáreadeatuação,devendoseuvalorserfixadopeloórgãodedeliberaçãosuperiordaentidade,registradoemata,comcomunicaçãoaoMinistérioPúblico,nocasodasfundações;’”
195Com a aprovação doCPC/2015, não hámais a esdrúxula possibilidade de o Juiz “aprovar” o EstatutoelaboradopeloMP(art.1.202doCPC/1973).Oregulamentoatualémaistécnicoepreciso:
“Art. 764.O juiz decidirá sobre a aprovaçãodo estatutodas fundações e de suas alterações semprequeorequeiraointeressado,quando:
I—elafornegadapreviamentepeloMinistérioPúblicoouporesteforemexigidasmodificaçõescomasquaisointeressadonãoconcorde;
II—ointeressadodiscordardoestatutoelaboradopeloMinistérioPúblico.
§1.ºOestatutodasfundaçõesdeveobservarodispostonaLein.10.406,de10dejaneirode2002(CódigoCivil).
§2.ºAntesdesupriraaprovação,ojuizpoderámandarfazernoestatutomodificaçõesafimdeadaptá-loaoobjetivodoinstituidor.”
196Sobreo tema,confira-seoCapítuloXX(“ConcubinatoeDireitosda(o)Amante”)dov.VI (“DireitodeFamília”)destacoleção.
197Sobreotema,confira-seonossoONovoDivórcio(SãoPaulo:Saraiva),bemcomooCapítuloXXIII(“ODivórciocomoFormadeExtinçãodoVínculoConjugal”)dov.VI(“DireitodeFamília”)destacoleção.
198Súmula447doSupremoTribunalFederal:“Éválidaadisposiçãotestamentáriaemfavordefilhoadulterinodotestadorcomsuaconcubina”.
199 Quanto aos animais, o fato de não possuírem “legitimidade sucessória passiva”, objeto do presentecapítulo, não afasta uma reflexãomais detida quanto ao tratamento de sua esfera existencial e a imperiosanecessidadedeproteçãoecuidadoemníveisconstitucionale legal.Sobreoavançodestamatéria, cf.EdnaCardozoDias,“Osanimaiscomosujeitosdedireito”,JusNavigandi,Teresina,ano10,n.897,17dez.2005.Disponívelem:<http://jus.com.br/revista/texto/7667>.Acessoem:25abr.2012.
200JorgeO.Maffia,ManualdeDerechoSucesorio,5.ed.,BuenosAires:Depalma,2002,p.106-107.
Em tradução livre de Rodolfo Pamplona Filho do espanhol para o português (os brocardos latinos forammantidosnaintegridade):
“Comsucesso,temsidoobservadoque,deformacompatívelenãoexcludente,deserdaçãoeindignidadetêmconvividoporséculosnosordenamentosjurídicos.Semanteciparmosoqueserávistoaseguir,deve-seadvertirque, desenvolvida no direito romano, embora tardiamente, foi, então, na era Justiniana, que (a deserdação)mostrou suas notas características, marcando sua diferença em relação à indignidade. A deserdação dosascendentes e descendentes devia se realizar em testamento que contenha a instituição de herdeiros e emdecorrênciadealgumadascausasprevistasporJustiniano,oqueoriginavaumaexclusãodeterminantedequeosbenspassariamdiretamenteparaaquelesquesucederiamemseulugar.Paraaindignidade,noentanto,nãose originou uma verdadeira exclusão inicial, e a situação se firmava na frase cunhada que já lembramos:indignus potest capere sed non potest retinere. Os bens de que era privado o indigno passavam para oTesouropeloprocedimentodacogniçãoextraordinária(bonaereptoria).
TambémoDireitoconsuetudináriofrancêsadmitiuaindignidadeeadeserdaçãocomoinstitutosdiferentes.Noentanto, afastando-se do precedente romano, unificaram-se as causas que, para um e outro, resultaramidênticas,variandoasformasdeseaplicar.Adeserdaçãodependiadavontadeexpressadoautordaherança,manifestadanotestamento,aparecendoaindignidadecomoumaformatácitadaquela,pronunciadapelajustiçaapósamortedoautordaherança,quandoascircunstânciasnãolhepermitiramdeserdaroherdeiroculpado.Ambas produziam efeitos semelhantes, umavez que, ao contrário do sistema romano, os bens excluídos doindigno passavam aos outros sucessores sem que se realizasse a apropriação pelo Estado. A dualidade deinstitutossubsistiuduranteoperíodorevolucionário,desaparecendocomoadventodoCódigoCivilfrancês,queaboliuadeserdação.
OCódigoargentino semanteve fiel às inspirações Justinianas e legislou separadamenteambosos institutos.Nãofaltaramcríticasaestasolução,postulando-seasupressãodadeserdação,porconsiderá-laodiosaeinútil.Então,Bibiloni,aoexcluirorespectivo título,argumentouque, tratadapeloCódigoaexclusãodoherdeirooulegatárioporindignidade,demaneiraabrangenteparatodosostiposdesucessão,perderiaobjetodizerquandooherdeirodeveriaserexcluídodasucessãopordeclaraçãodotestador.OmesmotemperamentofoiadotadopeloProjetode1936,apesardequeMartínezPazcuidoudeapontarque,apesardeaComissãoterseguidoarecomendaçãodoAnteprojeto,asrazõescomqueBibilonifundamentavasuasupressãonãosemostravamtãoconvincentes”.
201Confira-seoCapítuloVII(“VocaçãoHereditária”)destevolume.
202GeorgesRiperteJeanBoulanger,TratadodeDerechoCivil(segúnelTratadodePlaniol),cit.,p.63.
203 Tradução livre de Pablo Stolze Gagliano: “As razões de indignidade sucessória estão taxativamenteprevistas na lei. Tais razões têm em comum o fato de que todas elas constituem condutas criminalmente
relevantes cometidas pelo sucessor contra o autor da herança. Contudo, uma condenação criminal não é
necessária, sendo suficiente a prática de uma ação criminalmente relevante” (RainerHausmann eGerhardHohloch,HandbuchdesErbrechts,2.ed.,Berlin:ErichSchmidtVerlag,2010,p.90).
204CaldasAulete,DicionárioContemporâneodaLínguaPortuguesa,RiodeJaneiro:Delta,1958,p.2738.v.III.
205 Superior Tribunal de Justiça, Noticiário Eletrônico, informativo de 2-3-2006. Disponível em:<http//www.stj.gov.br>.Acessoem:27fev.2012.
206PabloStolzeGagliano,OContratodeDoação:AnáliseCríticadoAtualSistemaJurídicoeos seusEfeitosnoDireitodeFamíliaedasSucessões,3.ed.,SãoPaulo:Saraiva,2010,p.176-178.Mantivemosotextooriginaldosrodapés.
207 “DECLARAÇÃO DE INDIGNIDADE DE HERDEIRO. CARÊNCIA DE AÇÃO PORIMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. As causas que autorizam a exclusão de herdeiro oulegatáriadasucessãoestãotaxativamenteenumeradasnoart.1.595,doCCB,constituindonumerusclausus,enãoadmiteminterpretaçãoextensiva.Nelasnãoseenquadraopretensoabandonomaterialqueoréuteriapraticadoemrelaçãoaoautordaherança.Negaramprovimento”(TJRS,Ap.Cív.70003186897,7.ªCâmaraCível,Rel.LuizFelipeBrasilSantos,j.27-2-2002).Observamosapenasqueoartigocorrespondenteao1.595noCódigoCivilde2002éo1.814.
208 Nesse sentido, observa Orlando Gomes: “A indignidade tem de ser declarada por sentença judicial.Pressupõe,assim,açãoqueasuscite.Aaçãopodeser intentadapelo interessadoemobteradeclaraçãodeindignidade, no prazo de quatro anos, a contar da abertura da sucessão. Podem propô-la somente os quetenhaminteressenasucessão.Aleinãocomportaainterpretaçãoquerestringisseosinteressadosàspessoasqueseriamconvocadasparasubstituiro indigno.Docontrário, limitariaa legitimaçãoativaaosdescendentesdo herdeiro excluído, na sucessão legítima, e ao substituto, na sucessão testamentária” (GOMES, Orlando.Sucessões.12.ed.RiodeJaneiro:Forense,2004,p.36).
209CódigoCivil:
“Art.1.815.Aexclusãodoherdeirooulegatário,emqualquerdessescasosdeindignidade,serádeclaradaporsentença.
Parágrafo único. O direito de demandar a exclusão do herdeiro ou legatário extingue-se em quatro anos,contadosdaaberturadasucessão”.
210Confira-seoCapítuloXVIII(“Legados”)dopresentevolume.
211CódigodeProcessoCivilde2015:
“Art.315.Seoconhecimentodoméritodependerdeverificaçãodaexistênciade fatodelituoso,o juizpodedeterminarasuspensãodoprocessoatéquesepronuncieajustiçacriminal.
§1.ºSeaaçãopenalnãoforpropostanoprazode3(três)meses,contadodaintimaçãodoatodesuspensão,cessaráoefeitodesse,incumbindoaojuizcívelexaminarincidentementeaquestãoprévia.
§2.ºPropostaaaçãopenal,oprocesso ficará suspensopeloprazomáximode1 (um)ano,ao finaldoqualaplicar-se-áodispostonapartefinaldo§1.º.”
212 Código de Processo Civil de 2015: “Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode serrescindidaquando:
I—severificarquefoiproferidaporforçadeprevaricação,concussãooucorrupçãodojuiz;
II—forproferidaporjuizimpedidoouporjuízoabsolutamenteincompetente;
III—resultardedolooucoaçãodapartevencedoraemdetrimentodapartevencidaou,ainda,desimulaçãooucolusãoentreaspartes,afimdefraudaralei;
IV—ofenderacoisajulgada;
V—violarmanifestamentenormajurídica;
VI — for fundada em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou venha a serdemonstradanaprópriaaçãorescisória;
VII—obtiveroautor,posteriormenteaotrânsitoemjulgado,provanovacujaexistência ignoravaoudequenãopôdefazeruso,capaz,porsisó,delheassegurarpronunciamentofavorável;
VIII—forfundadaemerrodefatoverificáveldoexamedosautos.
§1.ºHáerrodefatoquandoadecisãorescindendaadmitirfatoinexistenteouquandoconsiderarinexistentefato efetivamente ocorrido, sendo indispensável, em ambos os casos, que o fato não represente pontocontrovertidosobreoqualojuizdeveriatersepronunciado.
§ 2.º Nas hipóteses previstas nos incisos do caput, será rescindível a decisão transitada em julgado que,emboranãosejademérito,impeça:
I—novaproposituradademanda;ou
II—admissibilidadedorecursocorrespondente.
§3.ºAaçãorescisóriapodeterporobjetoapenas1(um)capítulodadecisão.
§ 4.º Os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo ehomologadospelo juízo,bemcomoosatoshomologatóriospraticadosnocursodaexecução,estãosujeitosàanulação,nostermosdalei.”
213ConstituiçãoFederal:
“Art.5.ºTodossãoiguaisperantealei,semdistinçãodequalquernatureza,garantindo-seaosbrasileiroseaos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e àpropriedade,nostermosseguintes:
(...)
XXXVI—aleinãoprejudicaráodireitoadquirido,oatojurídicoperfeitoeacoisajulgada”.
214 “AÇÃORESCISÓRIA. INVESTIGAÇÃO.PATERNIDADE.EXAME.DNA.Este SuperiorTribunalreiterouoentendimentodequeolaudodoexamedeDNA,mesmorealizadoapósaconfirmaçãopelojuízoadquem da sentença que julgou procedente a ação de investigação de paternidade, é considerado documentonovoparaofimdeensejaraaçãorescisória(art.485,VII,CPC).Precedentescitados:REsp189.306-MG,DJ25/8/2003;REsp255.077-MG,DJ3/5/2004,eREsp300.084-GO,DJ6/9/2004”(STJ,REsp653.942-MG,Rel.Min.HonildoAmaraldeMelloCastro(desembargadorconvocadodoTJ-AP),j.15-9-2009).
“AÇÃORESCISÓRIA—DOCUMENTONOVO—CONCEITO—EFEITO.Odocumentonovo,aqueserefereoinc.VIIdoart.485doCPC,emfelizinovaçãointroduzidaemnossodireito,é,EMPRINCÍPIO,ojáexistentequandodadecisãorescindenda, ignoradopelo interessadooude impossívelobtençãoàépocadautilizaçãonoprocesso, apresentando-se bastante para alterar o resultadoda causa.Tendoodocumento taiscaracterísticas,habilita-seapretensãorescisóriaateracolhidafavorável”(STJ,REsp15.007-0-RJ,Rel.Min.SálviodeFigueiredo, ac. un.,DJ, 17-12-1992—MoacyrRibeiroGalvão e outro vs.Cia.Docas doRio deJaneiro—Advs.:FernandoNevesdaSilvaeJoséGeraldoGrossi;ADCOAS139540).
215Confira-seoCapítuloIX(“HerançaJacente”)destevolume.
216Demonstrandoavisãocríticadalegislaçãopositivada,confira-seointeressanteacórdão:
“APELAÇÃOCÍVEL—DIREITODESUCESSÕES—AÇÃODE INDIGNIDADE—EXISTÊNCIADE UNIÃO ESTÁVEL ENTRE O AUTOR E A RÉ — EX-COMPANHEIRA — AUSÊNCIA DEHERDEIROS NECESSÁRIOS — LACUNA LEGISLATIVA — POSSIBILIDADE JURÍDICA DOPEDIDO—RECURSOPROVIDO—SENTENÇAANULADA.Em se tratando deDireito de Família,devidoàssuaspeculiaridades,ojuiznãopodedeixardesolucionaroconflitodevidoàausênciadenormasqueregule a situação fática a ele submetida.Na lacuna da lei, deve julgar segundo a analogia, os costumes, osprincípios gerais de direito e a jurisprudência. Sendo a ação direito público subjetivo de obter a prestaçãojurisdicional, o essencial é que o ordenamento jurídico não contenha uma proibição ao seu exercício: aí simfaltará a possibilidade jurídica. Se o caso for de ausência de um preceito que ampare, em abstrato, opronunciamentopleiteadopeloautor,aindanãoseestará,verdadeiramente,emfacedaimpossibilidadejurídicadopedido.Manter-seojuizpresoàletradaleisignifica,àmedidaqueasleisenvelhecem,afastar-secadavezmaisdasnecessidadessociais.Nãoenxergarfatosqueestãodiantedosolhosémantera imagemda justiçacega. Condenar à invisibilidade situações existentes é produzir irresponsabilidades, incompatível com aatividadejurisdicional,queestádirigida,exatamente,parasolucionarconflitos,nãoparaprolongá-losounegaraprestaçãojurisdicionaladequadaaocasoconcreto.Seoautornãopossuiherdeirosnecessáriosquepossamvir
a ajuizar ação de indignidade quando este vier a falecer, nem é possível deserdar sua companheira portestamento,emrazãodenãosersuaherdeiranecessária,aaçãodeindignidadeporeleproposta,mesmoqueemvida,apontandoqueacompanheiranãoédignadeherdar,deveserprocessada,diantedalacunalegislativareferente à hipótese contida nos autos. Recurso conhecido e provido para reformar a decisão recorrida,afastando a extinção do processo sem apreciação do mérito, e determinar que o juiz processe a açãodeclaratóriade indignidadepropostapeloautor em facedaex-companheira” (TJMS,Ap.Cív.2007.026708-9/0000-00,deInocência.Rel.Des.DorivalRenatoPavan,de11-9-2008,5.ªTurmaCível).
217 Dada a velocidade com que o direito muda e se transforma, recomendamos ao nosso amigo leitoracompanhar o andamento do projeto no site do Senado:<http://www.senado.gov.br/atividade/materia/Consulta.asp?STR_TIPO=PLS&TXT_NUM=118&TXT_ANO=2010&Tipo_Cons=6&IND_COMPL=&FlagTot=1>.
218 Disponível em: <http://www.senado.gov.br/noticias/ccj-aprova-mudancas-na-exclusao-de-herdeiros-indignos.aspx>.Acessoem:5jan.2012.
219PabloStolzeGaglianoeRodolfoPamplonaFilho,NovoCursodeDireitoCivil—ParteGeral,14.ed.,SãoPaulo:Saraiva,2012,p.93.v.I.
220TrechosextraídosdonossovolumeI,NovoCursodeDireitoCivil—ParteGeral,14.ed.,SãoPaulo:Saraiva,2012,p.220-221.
221CódigoPenal:“Calúnia
Art.138.Caluniaralguém,imputando-lhefalsamentefatodefinidocomocrime:
Pena—detenção,deseismesesadoisanos,emulta.
§1.ºNamesmapenaincorrequem,sabendofalsaaimputação,apropalaoudivulga.
§2.ºÉpunívelacalúniacontraosmortos.
Exceçãodaverdade
§3.ºAdmite-seaprovadaverdade,salvo:
I — se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi condenado por sentençairrecorrível;
II—seofatoéimputadoaqualquerdaspessoasindicadasnon.Idoart.141;
III—sedocrimeimputado,emboradeaçãopública,oofendidofoiabsolvidoporsentençairrecorrível.
Difamação
Art.139.Difamaralguém,imputando-lhefatoofensivoàsuareputação:
Pena—detenção,detrêsmesesaumano,emulta.
Exceçãodaverdade
Parágrafoúnico.Aexceçãodaverdadesomenteseadmiteseoofendidoéfuncionáriopúblicoeaofensaérelativaaoexercíciodesuasfunções.
Injúria
Art.140.Injuriaralguém,ofendendo-lheadignidadeouodecoro:
Pena—detenção,deumaseismeses,oumulta.
§1.ºOjuizpodedeixardeaplicarapena:
I—quandooofendido,deformareprovável,provocoudiretamenteainjúria;
II—nocasoderetorsãoimediata,queconsistaemoutrainjúria.
§ 2.º Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelomeio empregado, seconsideremaviltantes:
Pena—detenção,detrêsmesesaumano,emulta,alémdapenacorrespondenteàviolência.
§3.ºSeainjúriaconsistenautilizaçãodeelementosreferentesaraça,cor,etnia,religião,origemouacondiçãodepessoaidosaouportadoradedeficiência:(RedaçãodadapelaLein.10.741,de2003.)
Pena—reclusãodeumatrêsanosemulta”.(IncluídopelaLein.9.459,de1997.)
222 Confira-se o Capítulo II (“Principiologia do Direito das Sucessões”) deste volume, notadamente ossubtópicos3.5(“AutonomiadaVontade”)e4.6(“PrincípiodoRespeitoàVontadeManifestada”).
223Confira-seosubtópico2.3(“Coação”)doCapítuloXIII(“DefeitosdoNegócioJurídico”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção,que,aqui,sefazumareleitura.
224FranciscoAmaral,DireitoCivil—Introdução,3.ed.,RiodeJaneiro:Renovar,2000,p.491-492.
225 Trechos extraídos do nosso v. I,Novo Curso de Direito Civil— Parte Geral, 14. ed., São Paulo:Saraiva,2012,p.403.
226Versobreotemaemcomento:MariaHelenaDiniz,CursodeDireitoCivilBrasileiro,cit.,p.55-56.
227 Relembremo-nos, a título de ilustração, o conceito de crime impossível, nas palavras de Damásio deJesus: “Nos termosdo art. 17doCódigoPenal, ‘não sepunea tentativaquando,por ineficácia absolutadomeio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime’. Em certas hipóteses,verifica-se,ex-post,queoautorjamaispoderiaatingiraconsumação,querpelainidoneidadeabsolutadomeioexecutório,querpelaabsolutaimpropriedadedoobjetomaterial(pessoaoucoisa).Oinstitutocorrespondeaoque se denomina ‘crime impossível’(1), apresentando três espécies(2): 1.ª) delito impossível por ineficáciaabsolutadomeio;2.ª)delitoimpossívelporimpropriedadeabsolutadoobjetomaterial;3.ª)crimeimpossívelporobra de agente provocador. Ocorre o primeiro caso quando o meio executório empregado pelo insciente
pseudoautor, pela sua natureza, é absolutamente incapaz de causar o resultado (ausência de potencialidadelesiva).Ex.:osujeito,porerro,desejandomataravítimamedianteveneno,colocaaçúcaremsuaalimentação,pensandotratar-sedearsênico(3).Inclui-senessahipóteseachamadatentativairrealousupersticiosa,comoéoexemplodeosujeitodesejarmataravítimamedianteatodemagiaoubruxaria.Nasegundaespécie,inexisteo objetomaterial sobre o qual deveria incidir o comportamento, ou, pela sua situação ou condição, torna-seabsolutamente impossível a produção do resultado visado(4), circunstâncias desconhecidas pelo agente.Ex.:‘A’,pensandoqueseudesafetoestádormindo,golpeiaumcadáver(5).Aterceirahipótesedecrimeimpossívelcorrespondeaodenominadocrimeputativoporobradeagenteprovocador(6).Ex.:alguém,vítimaouterceiro,deformainsidiosa,provocaosujeitoacometerumcrime,aomesmotempoquetomaprovidênciasparaquenãoatinja a consumação.A ineficácia e a impropriedadenão recaemsobreomeio executórionemsobreoobjetomaterial. A impossibilidade absoluta de o delito vir a alcançar omomento consumativo decorre doconjuntodasmedidaspreventivastomadaspeloprovocador.Porisso,aoladodaineficáciaabsolutadomeioeda impropriedade absoluta doobjeto, o art. 17pode ser ampliadopor analogia, estendendo-se a um terceirocaso:odoagenteprovocador,emqueoconjuntodecircunstânciasporeledispostasexcluiapossibilidadedeconsumação do crime(7)” (Crime Impossível e Imputação Objetiva. Disponível em:<http://jusvi.com/artigos/1308>.Acessoem:15jan.2012).
228Confira-se o subtópico 3.4 (“Boa-fé”) doCapítulo II (“Principiologia doDireito das Sucessões”) destevolume.
229MaxKaser,DireitoPrivadoRomano(RömischesPrivatrecht),Lisboa:FundaçãoCalousteGulbenkian,1999,p.392.
230SílviodeSalvoVenosa,DireitoCivil—DireitodasSucessões, 3. ed.,SãoPaulo:Atlas, 2003,v. 7, p.286-287.
231SegundoJoséLuizGaviãodeAlmeida,citadoporTartuceeSimão(DireitoCivil,5.ed.,RiodeJaneiro:Forense;SãoPaulo:Método,2012,v.6,p.79): “atécircunstânciasposterioresàmortedoautordaherançapodem ser reconhecidas como provocadoras da indignidade. A deserdação só se estabelece por causasanterioresàmortedoautordaherança,poissóseestabelecepelaviatestamentária”.
232OrlandoGomes,Sucessões,RiodeJaneiro:Forense,2004,p.225-226.
233“AÇÃODEDESERDAÇÃOEMCUMPRIMENTOADISPOSIÇÃOTESTAMENTÁRIA.
1.Excetoemrelaçãoaosarts.1.742e1.744doCódigoCivilde1916,osdemaisdispositivoslegaisinvocadosnorecursoespecialnãoforamprequestionados,incidindoosverbetessumulares282e356,doSTF.
2. Acertada a interpretação do Tribunal de origem quanto ao mencionado art. 1.744, do CC/1916, aoestabelecer que a causa invocada para justificar a deserdação constante de testamento deve preexistir aomomentodesuacelebração,nãopodendocontemplarsituaçõesfuturaseincertas.
3. É vedada a reapreciação do conjunto probatório quanto ao momento da suposta prática dos atos que
ensejaram a deserdação, nos termos da súmula 07, do STJ.Recurso não conhecido” (STJ, ProcessoREsp124313/SP,RecursoEspecial1997/0019264-4,Rel.Min.LuisFelipeSalomão(1140),4.ªTurma,j.16-4-2009,DJe,8-6-2009).
234CarlosRobertoGonçalves,DireitoCivilBrasileiro—DireitodasSucessões,7.ed.,SãoPaulo:Saraiva,2011,p.433.v.VII.
235Paraaprofundaroestudodotema,cf.:PabloStolzeGaglianoeRodolfoPamplonaFilho,NovoCursodeDireitoCivil—DireitodeFamília,2.ed.,SãoPaulo:Saraiva,2012,p.740.v.VI.
236Confira-seosubtópico2.2(“EfeitosdaExclusãoporIndignidade”)destecapítulo.
237O tema do “DireitodeRepresentação” será objeto de capítulo próprio (a saber, o CapítuloXII destevolume),aoqualremetemosonossoamigoleitor.
238WashingtondeBarrosMonteiro,CursodeDireitoCivil—DireitodasSucessões, 38. ed.,SãoPaulo:Saraiva,2011,v.VI,p.268-269.
239OrlandoGomes,Sucessões,RiodeJaneiro:Forense,2004,p.230.Aexpressão(RA)significa“RevisãodoAtualizador”,hajavistaqueofalecimentodeOrlandoGomessedeuem1988.
240Comoinformaçãodelegeferenda,hádeseregistrarqueoProjetodeLein.276/2007(antigoProjetodeLein.6.960/2002)pretendia,comoaperfeiçoamentodacodificaçãobrasileira,inserirum§2.ºaoart.1.965doCC/2002,comaseguinteredação:
“§2.ºSãopessoaisosefeitosdadeserdação:osdescendentesdoherdeirodeserdadosucedem,comoseelemortofosseantesdaaberturadasucessão.Masodeserdadonãoterádireitoaousufrutoouàadministraçãodosbensqueaseussucessorescouberemnaherança,nemàsucessãoeventualdessesbens”.
241Comoditoemnotaderodapéanterior,podeoamigoleitoracompanharoandamentodoprojetonositedoSenado: <http://www.senado.gov.br/atividade/materia/Consulta.asp?STR_TIPO=PLS&TXT_NUM=118&TXT_ANO=2010&Tipo_Cons=6&IND_COMPL=&FlagTot=1>.
242Maisumavez,confira-seosubtópico4.1(“PrincípiodaSaisine”)doCapítuloII(“PrincipiologiadoDireitodasSucessões”)destevolume.
243AurélioBuarquedeHolandaFerreira,NovoDicionárioAuréliodaLínguaPortuguesa,2.ed.,RiodeJaneiro:NovaFronteira,1986,p.979.
244 Sobre o tema, confira-se o subtópico 5.2 (“Grupos Despersonalizados”) do Capítulo VI (“PessoaJurídica”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção.
245CódigodeProcessoCivilde2015:
“Art.75.Serãorepresentadosemjuízo,ativaepassivamente:
(...)
VI—aherançajacenteouvacante,porseucurador;”.
246CarlosRobertoGonçalves,DireitoCivilBrasileiro—DireitodasSucessões,7.ed.,SãoPaulo:Saraiva,2011,p.135.v.VII.
247Sobreotema,confira-seoCapítuloXI(“SucessãoLegítima”)destevolume.
248 “Art. 1.825. A ação de petição de herança, ainda que exercida por um só dos herdeiros, poderácompreendertodososbenshereditários.”
249Releia-seoCapítuloIX(“HerançaJacente”)destevolume.
250OrlandoGomes,Sucessões,RiodeJaneiro:Forense,1998,p.238.
251 Este mesmo fundamento inspira a Súmula 149 do STF: “É imprescritível a ação de investigação depaternidade,masnãooéadepetiçãodeherança”.
252PabloStolzeGaglianoeRodolfoPamplonaFilho,NovoCursodeDireitoCivil—ParteGeral,14.ed.,SãoPaulo:Saraiva,2012,v.I,p.508-509.
253Nessesentido,SílvioVenosa,DireitoCivil—DireitodasSucessões,4.ed.,SãoPaulo:Atlas,p.361.v.7.
254 Nesse sentido, confira-se Adriane Medianeira Toaldo e Clênio Denardini Pereira, “A possibilidade deimprescritibilidade da ação de petição de herança em face da ausência de prazo prescricional na legislaçãovigente. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=5904>.Acessoem:20fev.2012.
255 “EMENTA: Ação de petição de herança. Inventário. Herdeira excluída, indevidamente, da partilha.Nulidade absoluta. Prescrição. Prazo ordinário de 20 (vinte) anos. Artigo 177 do Código Civil de 1916.Ocorrência.Extinçãodoprocesso.Recursoimprovido”(TJMG,Ap.Cív.1.0702.06.284640-8/001,ComarcadeUberlândia, Apelante(s): Iraci Vieira de Araújo, Apelado(a)(s): Geralda Vieira Borba, Rel. Exmo. Sr. Des.NepomucenoSilva,j.27-3-2008,publicadoem29-4-2008).
256Sobreotema,confira-seointeressantecomentáriodoProf.AdrianoGodinhoemseublog.Disponívelem:<http://www.adrianogodinho.com.br/2010/03/peticao-de-heranca-direito.html>.Acessoem:20fev.2012.
257Confira-se o subtópico 3.4 (“Boa-fé”) doCapítulo II (“Principiologia doDireito das Sucessões”) destevolume.
258 No século XV, o Cabo da Boa Esperança representava um dos extremos do mundo. Quando osportuguesesláchegaram,metadedalongaedifícilviagemàtãosonhadaÍndiaestavacumprida.
259OrlandoGomes,ob.cit.,p.37.
260Defato,dispunhaoart.1.721doCódigoCivilbrasileirode1916:
“Art.1.721.Otestadorquetiverdescendenteouascendentesucessívelnãopoderádispordemaisdametadede seusbens; a outra pertencerádeplenodireito aodescendente e, em sua falta, ao ascendente, dosquaisconstituialegítima,segundoodispostonesteCódigo(arts.1.603a1.619e1.723)”.
261Confira-se,especialmente,oCapítulo6daobraOContratodeDoação,dePabloStolzeGagliano(3.ed.,SãoPaulo:Saraiva,2010).
262Beneficiando um terceiro ou atémesmo um dos herdeiros necessários, a teor do art. 1.849 do vigenteCódigo Civil brasileiro: “o herdeiro necessário, a quem o testador deixar a sua parte disponível, ou algumlegado,nãoperderáodireitoàlegítima”.
263 FranciscoCahali eGiseldaMaria FernandesNovaesHironaka,Curso Avançado deDireito Civil —DireitodasSucessões,2.ed.,SãoPaulo:RevistadosTribunais,2003,p.57.v.6.
264WashingtondeBarrosMonteiro,CursodeDireitoCivil—DireitodasSucessões, 3. ed., São Paulo:Saraiva,1959,p.205.v.VI.
265PosiçãodefendidapeloProf.Dr.FranciscoJoséCahaliemumadassuasfecundasaulasministradasnoMestradoemDireitoCivildaPUCSP,disciplinaDireitodasSucessõesII,nosegundosemestrede2004.
266“CIVIL.DOAÇÃOINOFICIOSA.
1.Adoaçãoaodescendenteéconsideradainoficiosaquandoultrapassaapartequepoderiadisporodoador,emtestamento,nomomentodaliberalidade.Nocaso,odoadorpossuía50%dosimóveis,constituindo25%apartedisponível,ouseja,delivredisposição,e25%alegítima.Estepercentualéquedeveserdivididoentreos6(seis)herdeiros,tocandoacadaum4,16%.Ametadedisponíveléexcluídadocálculo.
2. Recurso especial não conhecido” (STJ, REsp 112254/SP, Recurso Especial 1996/0069084-7, Rel. Min.FernandoGonçalves,j.16-11-2004,DJ,6-12-2004,p.313;RSTJ,v.187,p.335;RT,v.834,p.192).
267PabloStolzeGagliano,OContratodeDoação,cit.,p.60-63(mantivemosrodapéscitados).
268PauloLuizNettoLôbo,ComentáriosaoCódigoCivil—ParteEspecial—DasVáriasEspécies deContrato,coord.AntonioJunqueiradeAzevedo,SãoPaulo:Saraiva,2003,p.334.v.6.
269Retornaremosaoproblemadovalordadoaçãoquandotratarmosdoinstitutojurídicodacolação.
270 Luiz Edson Fachin e Carlos Eduardo Pianovski, Uma contribuição crítica que se traz à colação, inQuestõesControvertidas—NoDireitodeFamíliaedasSucessões,SãoPaulo:Método,2005,p.453.v.3.
271Namesmalinha,oCódigoCivilportuguês:“Art.2.104.°1.Osdescendentesquepretendementrarnasucessãodoascendentedevemrestituiràmassadaherança,para igualaçãodapartilha,osbensouvaloresquelhesforamdoadosporeste:estarestituiçãotemonomedecolação”.
272CódigoCivil:arts.2002a2012.Confira-seoCapítuloXIXdestevolume.
273ZenoVeloso,NovoCódigoCivilComentado,coord.RicardoFiuza,SãoPaulo:Saraiva,2002,p.1841.
274PabloStolzeGagliano, inHenriqueFerrazCorrêaMelo,MariaIsabeldoPradoePabloStolzeGagliano,ComentáriosaoCódigoCivilBrasileiro—DoDireito das Sucessões, coords.ArrudaAlvim eTherezaAlvim,RiodeJaneiro:Forense,2008,p.622-623.v.17(mantivemosacitaçãoemrodapé).
275MiguelReale,Visão geral do novoCódigoCivil. JusNavigandi, Teresina, ano 7, n. 54, 1.º fev. 2002.Disponívelem:<http://jus.com.br/revista/texto/2718>.Acessoem:20jul.2012.
276Importantelembraroentendimentopretorianodequea“inalienabilidadeincluiriaaincomunicabilidadedosbens”(Súmula49doSTF).Note,amigoleitor,que,nointeressanteacórdãoaseguir,ojulgadorfezprevaleceravontadedotestador,relativizando,comisso,oentendimentomencionado:“AGRAVODEINSTRUMENTO— INVENTÁRIO — BENS GRAVADOS COM CLÁUSULA TESTAMENTÁRIA DEINALIENABILIDADEE IMPENHORABILIDADE—CLÁUSULADE INCOMUNICABILIDADE—INEXISTÊNCIA — INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 49 DO STF E DO ARTIGO 1.911 DOCÓDIGOCIVIL—EFETIVAVONTADEDOTESTADOR—VIÚVODEHERDEIRA—MEEIROEHERDEIRO—MANUTENÇÃONO CARGODE INVENTARIANTEDOS BENSDEIXADOS PORSEU SOGRO E POR SUA ESPOSA — POSSIBILIDADE — HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS —DECOTE — INCIDENTE PROCESSUAL — ARTIGO 20, § 1.º, DO CPC — AGRAVOPARCIALMENTE PROVIDO. Os preceitos da Súmula 49 do Supremo Tribunal Federal (‘a cláusula deinalienabilidade inclui a incomunicabilidade dos bens’) e do artigo 1.911 do Código Civil (‘a cláusula deinalienabilidadeimpostaaosbensporatodeliberalidadeimplicaimpenhorabilidadeeincomunicabilidade’)nãoprevalecem sobre disposição de última vontade de testador,manifestada demaneira expressa e inequívoca.PorsetrataraespécieemanálisedeIncidenteProcessualrelativoàinterpretaçãodecláusulatestamentária,asucumbênciadeveatingir somenteascustas,nãohavendoquese falaremcondenaçãoemverbahonorária,consoante disposição do § 1.º do artigo 20 doCPC” (100800500126830011/MG 1.0080.05.001268-3/001(1),Rel.ArmandoFreire,j.13-6-2006,publicadoem21-7-2006).
277Mesmo que a cláusula de inalienabilidade haja sido aposta (ou atémesmo a de impenhorabilidade, emnossosentir), seo falecidodeixoudívidas,poderáhaverapenhoradobemgravado,componentedoacervo,comojádecidiuoSTJ:
“RECURSO ESPECIAL. SUCESSÃO. DÍVIDAS DO MORTO. TESTAMENTO QUE GRAVA OSIMÓVEIS DEIXADOS COM CLÁUSULAS DE INALIENABILIDADE E IMPENHORABILIDADE.POSSIBILIDADEDEPENHORA,EMEXECUÇÃOMOVIDAPORCREDORDODECUJUS.
1.Osbensdeixadosemherança,aindaquegravadoscomcláusuladeinalienabilidadeoudeimpenhorabilidade,respondempelasdívidasdomorto.
2.Porforçadoart.1.676doCódigoCivilde1916,asdívidasdosherdeirosnãoserãopagascomosbensquelhes foram transmitidosemherança,quandogravadoscomcláusulasde inalienabilidadee impenhorabilidade,por disposição de última vontade. Tais bens respondem, entretanto, pelas dívidas contraídas pelo autor daherança.
3.Acláusula testamentáriade inalienabilidadenão impedeapenhoraemexecuçãocontraoespólio” (REsp998.031/SP,Rel.Min.HumbertoGomesdeBarros,3.ªTurma,j.11-12-2007,DJ,19-12-2007,p.1230).
278Sobreotemada“Causa”nosNegóciosJurídicos(e,consequentemente,nosatosjurídicosstrictosensu),confira-seosubtópico2.5(“Algumaspalavrassobreacausanosnegóciosjurídicos”)doCapítuloXI(“PlanodeExistênciadoNegócioJurídico”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção.
279SílviodeSalvoVenosa,ob.cit.,p.217-218.
280ClóvisBeviláqua,DireitodasSucessões,4.ed.,RiodeJaneiro/SãoPaulo:FreitasBastos,1945,p.143-144.
281PabloStolzeGaglianoeRodolfoPamplonaFilho,NovoCursodeDireitoCivil—DireitodeFamília—AsFamíliasemPerspectivaConstitucional,2.ed.SãoPaulo:Saraiva,2012,v.VI,cf.caps.XIIIaXVII.
282“Art.258.Nãohavendoconvenção,ousendonula,vigorará,quantoaosbensentreoscônjuges,oregimedecomunhãoparcial.”
283 “Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relaçõespatrimoniais,noquecouber,oregimedacomunhãoparcialdebens.”
284 “Art. 1.668. São excluídos da comunhão: I — os bens doados ou herdados com a cláusula deincomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar; II— os bens gravados de fideicomisso e o direito doherdeirofideicomissário,antesderealizadaacondiçãosuspensiva;III—asdívidasanterioresaocasamento,salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum; IV— as doaçõesantenupciaisfeitasporumdoscônjugesaooutrocomacláusuladeincomunicabilidade;V—osbensreferidosnosincisosVaVIIdoart.1.659.”
285 “Art. 1.673. Integram o patrimônio próprio os bens que cada cônjuge possuía ao casar e os por eleadquiridos, a qualquer título, na constância do casamento. Parágrafo único. A administração desses bens éexclusivadecadacônjuge,queospoderálivrementealienar,seforemmóveis.”
286 E esse direito de meação (incidente no patrimônio comum onerosamente adquirido pelo casal) é tãoimportante que, a teor do art. 1.682, não é renunciável, cessível ou penhorável na vigência do regimematrimonial.Trata-se,inequivocamente,deumanormadeordempública,inalterávelpelavontadedaspartes.
287 “Enunciado n. 2 — Na perspectiva de respeito à dignidade da pessoa humana, é inconstitucional a
imposiçãodoregimedeseparaçãoobrigatóriadebens,previstonoart.1.641,II,doCódigoCivil,àspessoasmaioresdesetentaanos”(IJornadadosJuízesdasVarasdeFamíliadaComarcadeSalvador).
288Asnossasreflexõesecríticasaosregimesdebensencontram-senoscapítulosjáreferidosdanossaobradedicadaaoestudodoDireitodeFamília,aosquaisremetemosonossoestimadoleitor.
289CódigoCivilBrasileirode1916:
“Art.1.603.Asucessãolegítimadefere-senaordemseguinte:
I—aosdescendentes;
II—aosascendentes;
III—aocônjugesobrevivente;
IV—aoscolaterais;
V—aosMunicípios,aoDistritoFederalouàUnião”.
290 Ressalvada a hipótese de um testamento haver dado destinação diversa à metade disponível, toda aherançatocaráodescendente.
291CódigoCivil,art.1.833:“Entreosdescendentes,osemgraumaispróximoexcluemosmaisremotos,salvoodireitoderepresentação”(dispositivosemequivalentediretonoCC/1916).Nesteúltimocaso,herdandopordireitoderepresentação,sucederão“porestirpe”(art.1.835doCC/2002),conformeserávistonoCapítuloXII(“DireitodeRepresentação”),aoqualremetemosoamigoleitor.E,nessecontexto,valeobservaraindaqueosdescendentes de umamesma classe (filhos do falecido, por exemplo) têm, por óbvio, osmesmos direitos àsucessãodoseuascendente,naperspectivadoprincípiodaisonomia,eateordoart.1.834doCódigoCivilde2002(quebaniuaanacrônicaregra—evidentementenãorecepcionadapelaordemconstitucional—doart.1.610doCC/1916).
292Olegisladorerrouaofazerremissãoaoart.1.640,poisareferênciacorretadeveseraoart.1.641.
293 “CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO EMMANDADODE SEGURANÇA. SUCESSÃO LEGÍTIMA.ART.1.829,I,CC/02.CONCORRÊNCIADOCÔNJUGESOBREVIVENTECOMOSDESCENDENTES.CASAMENTONOREGIMEDACOMUNHÃOUNIVERSALDEBENS.EXCLUSÃODOCÔNJUGEDACONDIÇÃODEHERDEIROCONCORRENTE.ATODOJUIZDETERMINANDOA JUNTADAAOS AUTOS DA HABILITAÇÃO E REPRESENTAÇÃO DOS HERDEIROS DESCENDENTES.NATUREZA.DESPACHODEMEROEXPEDIENTE.FUNDAMENTAÇÃO.DESNECESSIDADE.
— A nova ordem de sucessão legítima estabelecida no CC/02 incluiu o cônjuge na condição de herdeironecessárioe,conformeoregimematrimonialdebens,concorrentecomosdescendentes.
— Quando casado no regime da comunhão universal de bens, considerando que metade do patrimônio jápertenceaocônjugesobrevivente (meação),estenão teráodireitodeherança,postoqueaexceçãodoart.
1.829,I,oexcluidacondiçãodeherdeiroconcorrentecomosdescendentes.
—Oatodojuizquedeterminaajuntadaaosautosdahabilitaçãoerepresentaçãodosherdeirosdescendentestemnaturezadedespachodemeroexpediente,dispensandofundamentação,vistoquenãosequalificam,emregra,comoatosdeconteúdodecisório.Precedentes.
Recurso ordinário emmandado de segurança a que se nega provimento” (STJ,RMS 22.684/RJ, Rel.Min.NancyAndrighi,3.ªTurma,j.7-5-2007,DJ,28-5-2007,p.319).
294 Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, “Direito das Sucessões brasileiro: disposições gerais esucessãolegítima.Destaqueparadoispontosdeirrealizaçãodaexperiênciajurídicaàfacedaprevisãocontidano novo Código Civil”, Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 65, 1.º maio 2003. Disponível em:<http://jus.com.br/revista/texto/4093>.Acessoem:13ago.2012.
295ZenoVeloso,DireitoHereditáriodoCônjugeedoCompanheiro.SãoPaulo:Saraiva,2010,p.46.
296Nessesentido,opróprioZenoVeloso(ob.cit.,p.46).PosiçãopeculiaréadaqueridaamigaeprofessoraMariaBereniceDias,segundoaqual,diantedapontuaçãodoreferidoinciso,asucessãodocônjugeficariaexcluídanahipótesedeo falecido terdeixadobensparticulares.Trata-sedeumaposiçãominoritáriaequemereceanossarespeitosareferência(MariaBereniceDias,“Pontofinal.Art.1829,incisoI,donovoCódigoCivil”, Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 168, 21 dez. 2003. Disponível em:<http://jus.com.br/revista/texto/4634>.Acessoem:22ago.2012.
297 Fonte: <http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Comunicação/noticias/Not%C3%ADcias/Seção-uniformiza-entendimento-sobre-sucessão-em-regime-de-comunhão-parcial-de-bens>. Acesso em: 12 nov.2016.
298Háentendimento,todavia,nosentidodaliteralidadedaregra,comoqual,comodito,definitivamentenãoconcordamos: “Ementa: AÇÃO RESCISÓRIA. AÇÃO ORDINÁRIA DE DECLARAÇÃO DACONDIÇÃODENÃOHERDEIRA.CÔNJUGESOBREVIVENTECASADACOMOFALECIDOSOBOREGIMEDASEPARAÇÃOCONVENCIONALDEBENS,MEDIANTEPACTO.CONCORRÊNCIACOMAS DESCENDENTES. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI NOACÓRDÃO.ART. 1.829, I,CC/02. IMPROCEDÊNCIA.TEMPESTIVIDADEDAAÇÃO.Observado oprazo previsto no art. 495 do CPC na propositura da ação rescisória, impõe-se admiti-la como tempestiva.Rejeitada a preliminar de intempestividade deduzida na contestação. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICADOPEDIDO.Hápossibilidadejurídicanopedidorescisório,cujoobjetovisadesconstituircoisajulgadaformalnaprópria decisão rescindenda, ao alegar que o julgado, na decisão inquinada, teriamanifestado interpretaçãoviolando literalmente disposição de lei. Preliminar rejeitada, por maioria. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO.Descabe ser rescindido o acórdão que não desconsidera ou não afronta dispositivos legais,mas apenas dáinterpretação razoável, embora literal, à matéria controvertida. O acórdão rescindendo, ao deliberar que ocônjugesobrevivente,casadopeloregimedaseparaçãoconvencionaldebens,porpactoantenupcial,concorre
à herança com as descendentes do falecido, deu interpretação literal ao precitado art. 1.829, I,CC/02, nãoviolandoqualquerdispositivolegal.AplicaçãodaSúmula343doSTF.Preliminardeintempestividaderejeitada,porunanimidade,epreliminarde impossibilidade jurídicadopedido,afastada,pormaioria,vencidooRelator.Nomérito, ação julgada improcedente, por unanimidade (Segredo de Justiça) (TJRS, AR 70038425567, 4.ºGrupodeCâmarasCíveis,Rel.AndréLuizPlanellaVillarinho,j.10-6-2011).
299OSTJ, todavia, aparentemente, tem trilhado caminhono sentido de consolidar a interpretação literal dodispositivo legal: “AGRAVO REGIMENTALNO RECURSO ESPECIAL. DIREITODAS SUCESSÕES.CÔNJUGE. REGIME DE SEPARAÇÃO CONVENCIONAL DE BENS. HERDEIRO NECESSÁRIO.CONCORRÊNCIA COM DESCENDENTES. POSSIBILIDADE. ART. 1.829, I, DO CÓDIGO CIVIL.PRECEDENTES. SÚMULA N. 83 DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGAPROVIMENTO.
1.Admite-se ao cônjuge casado sob o regime de separação convencional de bens, a condição de herdeironecessário,possibilitandoaconcorrênciacomosdescendentesdofalecido.Precedentes.IncidênciadaSúmulan.83doSTJ.
2.Agravo regimental a que se nega provimento” (AgRg noREsp 1.334.340/MG,Rel.Min.MarcoAurélioBellizze,3.ªTurma,j.17-9-2015,DJe8-10-2015).
“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EMRECURSOESPECIAL.CIVIL.DIREITODASSUCESSÕES.CÔNJUGE.HERDEIRONECESSÁRIO.ART.1.845DOCC/2002.REGIMEDESEPARAÇÃOCONVENCIONALDEBENS.CONCORRÊNCIACOMDESCENDENTE.POSSIBILIDADE.ART.1.829,I,DOCC.SÚMULAN.168/STJ.
1.AatualjurisprudênciadestaCorteestásedimentadanosentidodequeocônjugesobreviventecasadosoboregime de separação convencional de bens ostenta a condição de herdeiro necessário e concorre com osdescendentesdofalecido,ateordoquedispõeoart.1.829,I,doCC/2002,edequeaexceçãorecaisomentenahipótesedeseparaçãolegaldebensfundadanoart.1.641doCC/2002.
2.Talcircunstânciaatrai,nocasoconcreto,aincidênciadoEnunciadon.168daSúmuladoSTJ.
3. Agravo regimental desprovido” (AgRg nos EREsp 1.472.945/RJ, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 2.ªSeção,j.24-6-2015,DJe29-6-2015).
300 Este tema ainda será objeto de muitos debates. Confira-se, a propósito, o noticiário STJ de 13 denovembro de 2014, que admitiu o direito concorrencial em favor de quem foi casado em separaçãoconvencional, tese com a qual não concordamos, conforme vimos acima. Disponível em:<http://www.stj.jus.br/sites/STJ/Print/pt_BR/sala_de_noticias/noticias/ultimas/C%C3%B4njuge-casado-em-separa%C3%A7%C3%A3o-convencional-de-bens-%C3%A9-herdeiro-necess%C3%A1rio-e-concorre-na-sucess%C3%A3o-com-descendentes>.Acessoem:18nov.2014.
301ClóvisBeviláqua,CódigoCivildosEstadosUnidosdoBrasil,RiodeJaneiro:Ed.Rio,1975,p.769.
302Mas, “havendo igualdade em grau e diversidade em linha, os ascendentes da linha paterna herdam ametade, cabendo a outra aos da linha materna” (§ 2.° do art. 1.836 do CC). Vale dizer, João morre semdescendentes, deixando apenas o avô paterno e a avó materna vivos. Eles dividirão a herança (pois háigualdadeemgrau—avós—ediversidadeemlinha—paternaxmaterna).
303Confira-seoCapítuloXII(“DireitodeRepresentação”)destevolume.
304 “Art. 1.837. Concorrendo com ascendente em primeiro grau, ao cônjuge tocará um terço da herança;caber-lhe-áametadedestasehouverumsóascendente,ousemaiorforaquelegrau.”
305“Vidual.[Dolat.viduale.]Adj.2g.Referenteàviuvezouapessoaviúva”(AurélioBuarquedeHolandaFerreira,NovoDicionárioAuréliodaLínguaPortuguesa,2.ed.,RiodeJaneiro:NovaFronteira,1986,p.1776).
306 STJ: “AGRAVOREGIMENTAL.CIVIL.USUFRUTOVIDUAL.—O usufruto vidual independe dasituaçãofinanceiradocônjugesobrevivente.—Ofatodeoviúvoserbeneficiáriode testamentodocônjugefalecido,nãoelideousufrutovidual”(AgRgnoREsp844.953/MG,Rel.Min.HumbertoGomesdeBarros,3.ªTurma,j.11-12-2007,DJ,19-12-2007,p.1223).
307Asdificuldadesnaaplicaçãodoinstitutoerammuitas.Porvezes,osbenscomponentesdoacervohaviamsido alienados, caso em que dever-se-ia apurar a indenização devida à viúva, pelo usufruto não gozado,conforme decidiu o STJ: “AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. CIVIL. SUCESSÃO.USUFRUTO VIDUAL. PARTILHA DE BENS. INOCORRÊNCIA DE TRANSAÇÃO SOBRE ODIREITO DE FRUIR DA ESPOSA SOBREVIVA. COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA. RECURSODESPROVIDO.
1.‘Ousufrutovidual[art.1.611,§1.º,doCC/1916]éinstitutodedireitosucessório,independentedasituaçãofinanceiradocônjugesobrevivente,enãoserestringeàsucessãolegítima.Osúnicosrequisitossãooregimedo casamento diferente da comunhão universal e o estado de viuvez’ (REsp 648.072/RJ, Rel. Min. AriPargendler,DJ23.04.2007).
2.O reconhecimento do direito de fruição da viúva não é obstado se, apesar de existir partilha, o usufrutovidualnãofoinelatransacionado,ousenãoocorreueventualcompensaçãoporessedireito,ou,ainda,senãoexistiu sua renúncia (que não pode ser presumida). Isso porque usufruto vidual e domínio são institutosdiversos,sendoumtemporárioeooutrodecaráterdefinitivo,oquetornadesnecessáriaapréviarescisãoouanulaçãodapartilha,jáquenãosealteraráapropriedadedosbenspartilhados.
3.Se impossível se tornar o usufruto da esposa sobreviva pela alienação dos bens inventariados,deveráelaserindenizada.
4.Agravoregimentalaquesenegaprovimento”(AgRgnoREsp472.465/SP,Rel.Min.VascoDellaGiustina(DesembargadorConvocadodoTJRS),3.ªTurma,j.8-6-2010,DJe,24-6-2010)(grifamos).
308 Rolf Madaleno, “O Novo Direito Sucessório Brasileiro”. Disponível em:<http://www.rolfmadaleno.com.br/rs/index.php?option=com_content&task=view&id=39>.Acesso em: 14 set.2012.
309“Art.1.611.Àfaltadedescendentesouascendentesserádeferidaasucessãoaocônjugesobrevivente,se,aotempodamortedooutro,nãoestavadissolvidaasociedadeconjugal.
§ 1.º O cônjuge viúvo, se o regime de bens do casamento não era o da comunhão universal, terá direito,enquantoduraraviuvez,aousufrutodaquartapartedosbensdocônjugefalecido,sehouverfilhos,desteoudocasal,eàmetade,senãohouverfilhosemborasobrevivamascendentesdodecujus.
§2.ºAocônjugesobrevivente,casadosobregimedecomunhãouniversal,enquantoviverepermanecerviúvo,será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitaçãorelativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único bem daquela natureza ainventariar.”
310Poroutrolado,lamentamosqueocodificadorde2002hajasuprimidoodireitorealdehabitaçãoemfavordofilhocomnecessidadeespecial,nafaltadopaioudamãe,conformepreviao§3.ºdoart.1.611doCódigorevogado, incluído pela Lei n. 10.050 de 2000. Tratava-se de louvável e valorosa regra, que merece serreeditadapelolegisladorbrasileiro.
311SílvioVenosa,DireitoCivil—DireitodasSucessões,cit.,p.112.
312PabloStolzeGaglianoeRodolfoPamplonaFilho,NovoCursodeDireitoCivil—DireitodeFamília—AsFamíliasemPerspectivaConstitucional,2.ed.,SãoPaulo:Saraiva,jan.2012,p.422.v.VI.
313Sobreotema,confira-sePabloStolzeGaglianoeRodolfoPamplonaFilho,ONovoDivórcio,SãoPaulo:Saraiva,2010.
314 Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, Comentários ao Código Civil — Parte Especial: doDireitodasSucessões (arts. 1.784 a 1.856), coord.Antônio Junqueira deAzevedo, 2. ed. rev., SãoPaulo:Saraiva,2007,v.20,p.235.
315 “E se o falecido possuía filhos com o cônjuge sobrevivente,mas os tinha, também, com outra pessoa?Quid juris? É hipótese que oCC não resolveu, expressamente, e que a doutrina e jurisprudência deverãoesclarecer”(ZenoVeloso,DireitoHereditáriodoCônjugeedoCompanheiro,SãoPaulo:Saraiva,2010,p.51).Voltaremosaestatemáticanosubtópico4.6,“Sucessãopela(o)Companheira(o)”,desteCapítulo.
316“Eneltratamientoyenlasolucióndelosproblemashumanos,yentreellosdelosproblemasjurídicos,nose puede conseguir nunca una exactitud, ni una evidencia inequívoca. Esto es imposible, precisamente porvirtuddelhechodelaenormeycomplicadísimamultituddecomponentesheterogéneosqueintervienenenlaconductahumana,ymuyespecialmenteenlosproblemassuscitadosenlasinterrelacioneshumanas.Poreso,esdifícilmentepracticableelpoderabarcarmentalmentetodosesosfactoresytodaslasrecíprocasinfluencias
entredichosfactores”(LuisRecasénsSiches,IntroducciónalEstudiodelDerecho.7.ed.,México:Porrúa,1985,p.255).
EmtraduçãolivredeRodolfoPamplonaFilho:
Notratamentoenasoluçãodeproblemashumanos—e,entreeles,osproblemasjurídicos—nuncasepodeconseguirumaexatidão,nemumaevidênciainequívoca.Issoéimpossível,justamenteemvirtudedofatodeaenorme e complicadíssima multidão de componentes heterogêneos que intervêm na conduta humana e,especialmente,nosproblemassuscitadosnasinter-relaçõeshumanas.Porisso,édificilmentepraticávelpoderabarcarmentalmentetodosessesfatoresetodasasrecíprocasinfluênciasentreessesfatores.
317Reveja-seosubtópico3.2(“Igualdade”)doCapítuloII(“PrincipiologiadoDireitodasSucessões”)destevolume.
318Confira-seotópico5(“AConfusaDisciplinaJurídicadaSucessãopelo(a)Companheiro(a)”)doCapítuloIII(“DisposiçõesGeraissobreaSucessão”)destevolume.
319AldemiroRezendeDantasJr.,Concorrênciasucessóriadocompanheirosobrevivo.RevistaBrasileiradeDireitodeFamília,PortoAlegre:Síntese,IBDFAM,anoVII,n.29,p.128-143,abr./maio,2005.
320SobreotemadaUniãoEstável,emgeral,confira-seoCapítuloXIX(“UniãoEstável”)dov.6(“DireitodeFamília”)destacoleção.
321Lei n. 6.858/80: “Art. 1.ºOs valores devidos pelos empregadores aos empregados e osmontantes dascontas individuaisdoFundodeGarantiadoTempodeServiçoedoFundodeParticipaçãoPIS-PASEP,nãorecebidos em vida pelos respectivos titulares, serão pagos, em quotas iguais, aos dependentes habilitadosperanteaPrevidênciaSocialouna formada legislaçãoespecíficados servidorescivis emilitares, e,na suafalta, aos sucessores previstos na lei civil, indicados em alvará judicial, independentemente de inventário ouarrolamento”.
322Nãoháequivalenteespecíficonacodificaçãoanterior.Anormacorrespondentenoantigosistemaéoart.2.ºdaLein.8.971/94,queestabeleceu:
“Art.2.ºAspessoasreferidasnoartigoanteriorparticiparãodasucessãodo(a)companheiro(a)nasseguintescondições:
I—o(a)companheiro(a)sobrevivente terádireitoenquantonãoconstituirnovaunião,aousufrutodequartapartedosbensdodecujos,sehouverfilhosoucomuns;
II—o(a)companheiro(a)sobreviventeterádireito,enquantonãoconstituirnovaunião,aousufrutodametadedosbensdodecujos,senãohouverfilhos,emborasobrevivamascendentes;
III—nafaltadedescendentesedeascendentes,o(a)companheiro(a)sobreviventeterádireitoàtotalidadedaherança”.
323ZenoVeloso,DireitoSucessóriodosCompanheiros,inDireitodeFamíliaeoNovoCódigoCivil,cit.,p.233.
324 Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, Comentários ao Código Civil — Parte Especial: doDireitodasSucessões(arts.1.784a1.856),coord.AntônioJunqueiradeAzevedo,2.ed.rev.,SãoPaulo:Saraiva,2007,p.55-56.v.20.
325DesenvolvidopelogêniodeJ. J.GomesCanotilho,esse superiorprincípio traduza ideiadequeuma leiinferiornãopodeneutralizarouminimizarumdireitoouumagarantiaconstitucionalmenteconsagrado (verasuagrandeobraDireitoConstitucionaleTeoriadaConstituição,Coimbra:Almedina,1998,emqueenfoca,especialmente,asearadosdireitossociais,p.321).
326OSuperiorTribunaldeJustiçareconheceuarelevânciado tema, tendoasua4.ªTurma,emacórdãodaLavra do Ministro Luis Felipe Salomão, por unanimidade, acolhido incidente de arguição deinconstitucionalidadeedecidido,emdiligência,abrirvistaaoMinistérioPúblicoFederalpara,após,submeteraapreciaçãodo incidente àCorteEspecial, nos termosdovotodoSr.MinistroRelator, que foi acompanhadopelosMinistrosRaulAraújo,MariaIsabelGallottieJoãoOtáviodeNoronha(AInoREsp1.135.354—PB—Processo 2009/0160051-5). No prosseguimento do julgamento, porém, a matéria esbarrou em questãoprocessual,asaber,foidecididoqueacompetênciaparaaapreciaçãodamatériaestariarestritaaoSupremoTribunal Federal, sendo proferido o seguinte julgamento: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL. INCIDENTEDE INCONSTITUCIONALIDADE. RECURSO ESPECIAL FUNDAMENTADO NAINCONSTITUCIONALIDADE.Nãoépossívelconhecerdeincidentedeinconstitucionalidadesuscitadoemrecursoespecialcujofundamentosejaoreconhecimentodainconstitucionalidadededispositivolegal.Emboraquestõesconstitucionaispossamser invocadaspelaparterecorrida,é indubitávelque,emnossosistema,nãocabe ao recorrente invocar tais questões em recurso especial como fundamento para reforma do julgado,sendo o recurso próprio para essa finalidade o extraordinário para o STF. Tem-se, portanto, hipótese deinsuperável óbice ao conhecimento do recurso especial, que também contamina, por derivação natural, oconhecimentodesteincidentedeinconstitucionalidade.Nocaso,oincidentereferia-seaosincisosIIIeIVdoart. 1.790 do CC, que trata da ordem de sucessão hereditária do companheiro ou da companheirarelativamente aos bens adquiridos na vigência da união estável” (AI noREsp 1.135.354-PB,Rel. originárioMin. Luis Felipe Salomão, Rel. para acórdão Min. Teori Albino Zavascki, j. 3-10-2012, divulgado noInformativon.0505,doSuperiorTribunaldeJustiça,referenteaoperíodode20-9a3-10-2012).
327Esse infelizadvérbiodemodo,nocaputdodispositivo,éumverdadeirodesastre,pois,comodito, limitaindevidamenteodireitosucessório,noâmbitodauniãoestável.
328Confira-seosubtópico4.8(“SucessãopeloEntePúblico”)desteCapítulo.
329Releia-seosubtópico4.5.3(“DisciplinaEfetivadaSucessãodoCônjuge”)desteCapítulo.
330 Flávio Tartuce, “Da sucessão do companheiro: o polêmico art. 1.790 do CC e suas controvérsias
principais”, Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2681, 3 nov. 2010. Disponível em:<http://jus.com.br/revista/texto/17751>.Acessoem:17out.2012.
331ZenoVeloso,DireitoHereditáriodoCônjugeedoCompanheiro,SãoPaulo:Saraiva,2010,p.181.
332Sugerimosaonossoleitor,nesseparticular,acompanharaevoluçãojurisprudencial,poissetratadematériaextremamente controvertida. Nesse sentido, vejamos mais detalhes da já citada Arguição deInconstitucionalidade no REsp 1.135.354-PB: “A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) nãoconheceudaarguiçãodeinconstitucionalidadesuscitadapelaQuartaTurmaarespeitodosincisosIIIeIVdoartigo1.790doCódigoCivilde2002,quetratamdaordemdesucessãodocompanheirooudacompanheira,relativamenteaosbensadquiridosnavigênciadauniãoestável.Amaioriadosministrosdocolegiadoacolheuapreliminar levantada pelo ministro Cesar Rocha (hoje aposentado), de não conhecimento do incidente,entendendo que, embora questões constitucionais possam ser invocadas pela parte recorrida, no sistemabrasileiro não cabe ao autor do recurso especial invocar tais questões como fundamento para reforma dojulgado, comoocorreuno caso. ‘O recursopróprio, para essa finalidade, éo extraordinárioparaoSupremoTribunalFederal’,afirmouoministroTeoriZavascki,quetambémacolheuapreliminarevailavraroacórdão.O relator do incidente, ministro Luis Felipe Salomão, quanto à preliminar de conhecimento, votou pelapossibilidade de o STJ apreciar, em controle difuso, a constitucionalidade de lei que lhe é submetida paraaplicação, de forma ampla, como tem sinalizado o STF. ‘No caso, a constitucionalidade ou não de um dosdispositivos legais utilizados como razão de decidir é incidental e fundamental para se aplicar ou não outroartigo de lei à hipótese em julgamento’, afirmou. Quanto ao mérito, o ministro Salomão votou pelainconstitucionalidade dos incisos do artigo 1.790 do CC/2002, para que, na ausência de ascendentes edescendentesdofalecido,ocompanheirosobreviventerecebaatotalidadedaherança”(NoticiárioSTJde15de outubro de 2012. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=107308>.Acessoem:17out.2012.
333 Disponível em: <http://api.ning.com/files/2HQavao77x965y7eYLx-lkyL8Tw4qabFg2b82UtrVd1CIgETdVMedgoVEk3PeqW7atUG*j5llpVhX-q4brAH38XVi-U9p60q/Editorial29.pdf>(eventocoordenadoporPabloStolzeGagliano).
334 Amigo(a) leitor(a), quando elaboramos este tópico, embora a maioria dos Ministros já houvesse sepronunciado pela inconstitucionalidade do tratamento sucessório diferenciado, o julgamento não havia sidoaindaconcluído,emvirtudedepedidodevistadoMin.DiasToffoli.
335“Art.1.592.Sãoparentesemlinhacolateraloutransversal,atéoquartograu,aspessoasprovenientesdeumsótronco,semdescenderemumadaoutra.”
336 Código Civil de 1916: “Art. 331. São parentes, em linha colateral, ou transversal, até o sexto grau, aspessoasqueprovêmdeumsótronco,semdescenderemumadaoutra”.
337“Art.1.853.Nalinhatransversal,somentesedáodireitoderepresentaçãoemfavordosfilhosdeirmãos
dofalecido,quandocomirmãosdesteconcorrerem.”Confira-seoCapítuloXII(“DireitodeRepresentação”)destevolume.
338MariaHelenaDiniz,CursodeDireitoCivilBrasileiro—DireitodasSucessões, 25. ed., SãoPaulo:Saraiva,2011,p.180.v.6.
339 Cláudio Grande Júnior, “A Inconstitucional Discriminação entre Irmãos Germanos e Unilaterais naSucessão dos Colaterais”, Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 194, 16 jan. 2004. Disponível em:<http://jus.com.br/revista/texto/4757>.Acessoem:15out.2012.
340Sobreo temada“contagemdegraus”,confira-seo tópico3 (“VisãoClassificatóriadoParentesco”)doCapítuloXXVI(“Parentesco”)dov.6(“DireitodeFamília”)destacoleção.
341Confira-seoCapítuloIX(“HerançaJacente”)destevolume.
342 Georges Ripert e Jean Boulanger, Tratado de Derecho Civil (segun el Tratado de Planiol) —Sucesiones,BuenosAires:LaLey,1987,v.1,t.X,p.92-93.
Em tradução livre de Rodolfo Pamplona Filho do espanhol para o português (as expressões latinas forammantidaspelocontextodatranscrição):
“Arepresentaçãoexistiajánodireitoromano,emboraoseunomesejaignorado.NasInstitutasdeJustiniano,éditoqueosfilhospodem‘inpatrissuilocumsuccedere’(III,I,6).Originalmentelimitadaaosdescendentes,arepresentaçãofoiestendida,sobJustiniano,aosfilhosdeirmãosouirmãs.
(...)
Arepresentaçãofoiamplamenteapoiadapelodireitorevolucionário.ALeide8deabrilde1791aadmitiaaoinfinitonalinhacolateral.Via-senelaavantagemdefavorecerasgeraçõesmaisjovensedegarantiradivisãodebens”.
343Afirmou, o grandeOrlandoGomes (Sucessões, 7. ed.,Rio de Janeiro: Forense, 1998), tratar-se de uminstituto“malnomeado”,cujanatureza jurídicareveste-sedealtacomplexidade,aosabordediversas teorias(daficção,daconversão,dasub-rogação,daunidadeorgânicaedasubstituiçãoexlege)(p.41-42).
344Sobreotema,confira-seosubtópico2.2.1(“DaRepresentação”)doCapítuloXII(“PlanodeValidadedoNegócioJurídico”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção.
345“Premoriência”,comoditoacima,caracterizaasituaçãoemqueumdosherdeirosépré-mortoemfacedoautordaherança.Nãodevemos, todavia,confundireste instituto jurídicocoma“comoriência”,que traduzasituação,previstanoart.8.ºdoCódigoCivil,emqueduasoumaispessoasfalecemnamesmaocasião,semquesepossamprecisarosinstantesdosóbitos,casoemquesãoconsideradassimultaneamentemortas.
346 Confira-se o subtópico 5.5 (“Efeitos de Deserdação e Direito de Representação”) do Capítulo VIII(“ExcluídosdaSucessão”)destevolume.
347 Sobre o tema, confira-se o tópico 2 (“Exclusão por Indignidade”) do Capítulo VIII (“Excluídos daSucessão”)destevolume.
348 “EXCLUSÃO E DESERDAÇÃO. SÃO PESSOAIS OS EFEITOS DE UMA E DE OUTRA, OSQUAIS, ASSIM, NÃO SE ESTENDEM AOS DESCENDENTES DO EXCLUÍDO OU DODESERDADO. PREVALECE O DIREITO DE REPRESENTAÇÃO, E OS DESCENDENTES DOHERDEIRO EXCLUÍDO OU DO DESERDADO SUCEDEM, COMO SE ELE MORTO FOSSE. AACUSAÇÃOCALUNIOSAQUEFAZPERDERODIREITOHEREDITÁRIOEAQUESEFORMULAEMJUÍZOCRIMINAL.AHERDEIROAQUEMAPROVEITAADESERDAÇÃOINCUMBEPROVARA VERACIDADE DA CAUSA ALEGADA PELO TESTADOR. O PROVEITO SÓ PODE SER OECONÔMICO, NÃO HAVENDO LUGAR PARA O INTERESSE PURAMENTEMORAL” (STF, RE16845,Rel.Min.LuizGallotti,1.ªTurma,j.10-7-1950,DJ,4-4-1952,p.2015;DJ,20-10-1950,p.3490;DJ,17-
8-1950,p.7495).
349Sobreotema,confira-seoCapítuloXXVI(“Parentesco”)dov.VI(“DireitodeFamília”)destacoleção.
350 “EMENTA:SUCESSÃOHEREDITÁRIA—COLATERAIS—DIREITODEREPRESENTAÇÃO.— Na sucessão dos colaterais, a lei substantiva ressalvou o direito de representação que é concedidoestritamenteaosfilhosdeirmãopré-morto,assegurando-lhesasucessãoporestirpequandoconcorreremcomirmãosdofalecido(arts.1.613e1.622—CC1916e1.840e1.853CC2002)”(TJMG,Ag.1.0430.06.500008-4/001,ComarcadeMonteBelo,Rel.Des.WanderMarotta,j.13-3-2007,publicadoem4-5-2007).
351 Sobre o tema, confira-se o tópico 2.6 (“Transmissibilidade do Direito de Aceitação da Herança”) doCapítuloV(“AceitaçãoeRenúnciadaHerança”)destevolume.
352CarlosRobertoGonçalves,DireitoCivilBrasileiro—DireitodaSucessões,2.ed.,SãoPaulo:Saraiva,2008,v.VII,p.198-199.
353RemetemosoleitoraoCapítuloVIII(“ExcluídosdaSucessão”)destevolume.
354SílviodeSalvoVenosa,DireitoCivil—DireitodasSucessões, 3. ed., SãoPaulo:Atlas, 2003, p. 101(Col.DireitoCivil,v.7).
355 “Ementa: CIVIL — AGRAVO DE INSTRUMENTO — INVENTÁRIO — TESTAMENTO —CONDIÇÃO — INEXISTÊNCIA — CONDITIO IURIS — DISPOSIÇÃO PURA E SIMPLES —CONSOLIDAÇÃO DE HERDEIROS TESTAMENTÁRIOS NA ABERTURA DA SUCESSÃO —POSTERIOR FALECIMENTO DE HERDEIRO TESTAMENTÁRIO — DIREITO DEREPRESENTAÇÃO— APLICAÇÃO— CONFIGURAÇÃO DA SUCESSÃO LEGÍTIMA— FILHOPRÉ-MORTO—NETOS—HERDEIROSPORESTIRPE—IMPROVIMENTODAIRRESIGNAÇÃO— INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 121, 1.851 A 1.856, TODOS DO CÓDIGO CIVIL. Na sucessãotestamentária, como na legítima, a ‘disposição pura e simples torna o herdeiro como tal na abertura dasucessão’, portanto, inexistindo condição para que a herdeira testamentária sucedesse, com a morte datestadora, operou-se a aludida sucessão. Se depois de aberta a sucessão testamentária vem a falecer aherdeira, é por força da sucessão legítima dos patrimônios daquela de cujus, que os herdeiros por estirpeherdamosdireitosrecebidos,incasu,pelafalecidaavópaterna,porforçadodispostonotestamento”(TJMG,Ag.1.0701.05.118761-8/001(1),Uberaba,Rel.Des.DorivalGuimarãesPereira,j.18-1-2007,publicadoem2-2-2007).
356Osherdeirosdevem trazer à colaçãoas liberalidadesquehajam recebido,nos termosdos arts. 2.002e2.012doCódigoCivil.Sobreo tema,verPabloStolzeGagliano,OContratodeDoação, 3. ed.,SãoPaulo:Saraiva,2010.
357 “Art. 1.811. Ninguém pode suceder, representando herdeiro renunciante. Se, porém, ele for o únicolegítimodasuaclasse,ousetodososoutrosdamesmaclasserenunciaremaherança,poderãoosfilhosviràsucessão,pordireitopróprio,eporcabeça.”Sobrea renúncia,veroCapítuloV(“AceitaçãoeRenúnciada
Herança”)destevolume.
358SílviodeSalvoVenosa,DireitoCivil—DireitodasSucessões,3.ed.,SãoPaulo:Atlas,2003,p.102.v.7.
359AurélioBuarquedeHolandaFerreira,NovoDicionárioAuréliodaLínguaPortuguesa,2.ed.,RiodeJaneiro:NovaFronteira,1986,p.1671.
360“Art.1.857.Todapessoacapazpodedispor,portestamento,datotalidadedosseusbens,oudepartedeles,paradepoisdesuamorte.”
361“§1.ºAlegítimadosherdeirosnecessáriosnãopoderáserincluídanotestamento.”
362Confira-seaseguintenotíciade7deabrilde2011,queindicapeculiaridadesnotratamentodamatériaemoutrosEstadosnomundo:
“VONTADEPÓSTUMA—Cortebritânicalimitalivreescolhasobreherança(PorAlinePinheiro)
Dispor sobre o próprio dinheiro é um direito garantido pelos ingleses até mesmo depois da morte. NaInglaterra, aquele que quer fazer um testamento antes de morrer não está vinculado a nada, além da suavontade.Podedeixarasuaherançaparaquemescolher,atémesmoexcluirosfilhosdopacote.Pelomenos,éessaaregra.Sãoasexceçõesaela,noentanto,quetêmdesafiadoaJustiçainglesa.
Umaleide1975prevêoscasosemqueavontadeexpressaemtestamentopodeserquestionada.Deacordocom o Inheritance Act 1975 (lei de herança britânica), cônjuges, ex-cônjuges, filhos e outros que eramsustentadospelofalecidopodemquestionarasuaexclusãodotestamento.Comoaregraéqueavontadedodonodopatrimônioprevaleça,sóemalgunscasosaJustiçapodeinterferiremodificarodesejopóstumo.Paradecidir, precisa analisar, por exemplo, a responsabilidade que a pessoa que morreu tinha sobre a que foideserdadaeseestaúltimatemcondiçõesfinanceirasparasesustentarnopresenteenofuturo.
Recentemente,umadecisãodaCortedeApelaçõeslevantouadiscussãosobreodireitodecadaumdecidirodestinodasuaherança,aoabrirmaisumaexceçãoàregra.Otribunalincluiunotestamento,contraavontadedequemoescreveu,umamulherde50anos,saudável.
Melita Jackson morreu em julho de 2004 aos 70 anos. Deixou o seu patrimônio de quase 500 mil librasesterlinas (cerca de R$ 1,2 milhão) para três instituições de caridade que cuidam de cachorros e outrosanimais.Parasuaúnicafilha,HeatherIlott,nãodeixounada.Emumacarta,explicouqueafilhatinhafugidodecasaaos17anos.Casou,tevecincofilhose,aolongodemaisdeduasdécadasdevida,sóviuamãeduasvezes.
ParaMelita,odistanciamentoentreasduaseafaltadeinteressedafilhajustificavaadecisãodenãodeixarnadadoseupatrimônioparaela.Nacarta,publicadaporumadasassociaçõesdecaridadebeneficiadaspelotestamento,Melitaorientouseusadvogadosadefenderoseupontodevista,casoafilharesolvessecobrarnaJustiçaumapartedaherança.
É justamente isto que está acontecendo agora. Heather se sentiu prejudicada pelo testamento da mãe econseguiu,naprimeira instância,odireitodereceber50mil librasdo totaldeixado.Nãosecontentoucomaquantia e recorreu, assimcomoas instituições beneficiadas.Na segunda instância, os voluntários levarama
melhoreadisputafoipararnaCortedeApelações.
Lá,osjulgadoresdecidiramporunanimidadequeHeathertemdireitoareceberumapartedodinheirodamãe.Determinaram,então,queorecursovolteparaquesejajulgadodenovopelasegundainstância,masdestavezapenasparafixarquantoafilhadeserdadadevereceber.
Provedorpóstumo
Paradecidirinterferirnotestamento,aCortedeApelaçõesanalisouajurisprudênciasobreoassuntoaolongodemaisde30anos,quandosurgiuoAct1975.Considerouqueascondiçõesprevistasnanormaparaqueavontadedo falecido sejadescumpridadevemseranalisadasemconjunto.Ouseja,nãobastaqueumadelassejaatendida.Porexemplo,nãobastaqueodeserdadoaleguequenãotemcondiçõesdesesustentar.Precisaficarprovado,também,quequemmorreutinharesponsabilidadesobreele.
NocasodeHeathereMelita,asduasnãoviviamjuntase,emboramãeefilha,umanãodependiadaoutra.Heather,casadaecomcincofilhos,viveemcondiçõesprecárias,comajudadogovernoesemtrabalhar.Atéentão,oentendimentoeraodequeseapessoaésaudávelepodetrabalharoquantoquiser,estácomprovadaa sua capacidade para garantir o seu sustento. Dessa vez, no entanto, os juízes ampliaram o conceito deincapazdetrabalhar.
Paraeles,Heatherparouasuavidaprofissionalhámuitosanosparacuidardosfilhos.Nãoéviávelimaginarqueelaestejaemplenascondiçõesdevoltaraomercadodetrabalhoesesustentar.Juntandoissoàposiçãoderesponsabilidade sobreeladamãe (afinal, sãomãee filha), ficacaracterizadamaisumaexceçãoemqueaJustiçapodeinterferiremodificaraquiloquefoiescritonotestamento.
A decisão não agradou às instituições de caridade beneficiadas com a herança deMelita.Uma delas,TheBlueCross, que cuida de cachorros abandonados, afirmou que o que o tribunal fez foi reinterpretar umajurisprudênciaconsolidadahá30anosequetornouincertoparaaspessoasseodesejodelasvaiserobedecidodepoisdemorrerem.Paraaassociação,adecisãoabreumprecedenteperigoso,jáquequalqueradultopodequestionar o fato de ter sido deixado de fora da herança dos pais”. Disponível em:<http://www.conjur.com.br/2011-abr-07/justica-britanica-limita-liberdade-escolha-heranca>.Acessoem:4 fev.2013).
Confira-se o inteiro teor da decisão britânica em: <http://s.conjur.com.br/dl/decisao-corte-apelacoes-inglaterra.pdf>.
363Confira-seosubtópico4.6(“PrincípiodoRespeitoàVontadeManifestada”)doCapítuloII(“PrincipiologiadoDireitodasSucessões”)destevolume.
364Váriosautores fazemoapanhadodedisposiçõesdenaturezanãopatrimonial,compequenasdiferençasentresi.Confiram-se,nesseaspecto,asseguintesobras:ZenoVeloso,Testamentos—NoçõesGerais;FormasOrdinárias; Codicilo; Formas Especiais, inGiseldaMaria FernandesNovaesHironaka e Rodrigo da CunhaPereira (Coords.),DireitodasSucessões eoNovoCódigoCivil (BeloHorizonte:DelRey, 2004, p. 125-
126); Dimas Messias de Carvalho e Dimas Daniel de Carvalho, Direito das Sucessões (3. ed., BeloHorizonte:DelRey,2011,p.105-106);MariaBereniceDias,ManualdasSucessões(SãoPaulo:RevistadosTribunais, 2008, p. 332-333); Flávio Tartuce e José Fernando Simão,Direito Civil (5. ed., Rio de Janeiro:Forense;SãoPaulo:Método,2012,v.6,p.289);CaioMáriodaSilvaPereira, Instituições deDireitoCivil(17.ed.,RiodeJaneiro:Forense,2010,v.6,p.180),entreoutros.
365Confira-seoitemb(“Direitoaocorpomorto(cadáver)”)dosubtópico7.2.1(“Direitoaocorpohumano”)doCapítuloV(“DireitosdaPersonalidade”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção.
366Confira-seosubtópico7.2.3(“Asfundações”)doCapítuloVI(“PessoaJurídica”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção.
367 Confira-se o Capítulo VII (“Das Estipulações Contratuais em Relação a Terceiros”) do v. IV(“Contratos”),TomoI(“TeoriaGeral”)destacoleção.
368Confira-seoCapítuloXVI (“Seguro”)dov. IV (“Contratos”),TomoII (“ContratosemEspécie”)destacoleção.
369Confira-seotópico3(“ReconhecimentoVoluntário”)doCapítuloXXV(“Filiação”)dov.VI(“DireitodeFamília”)destacoleção.
370Confira-seotópico3(“Tutela”)doCapítuloXXIX(“TutelaeCuratela”)dov.VI(“DireitodeFamília”)destacoleção.
371Confira-seoCapítuloXVIII(“BemdeFamília”)dov.VI(“DireitodeFamília”)destacoleção.
372Confira-seotópico4(“PerdãodoIndigno”)doCapítuloVIII(“ExcluídosdaSucessão”)destevolume.
373Confira-seotópico5(“Deserdação”)doCapítuloVIII(“ExcluídosdaSucessão”)destevolume.
374 Confira-se o Capítulo XXI (“Extinção do Testamento (Invalidade, Caducidade, Revogação eRompimento)”)destevolume.
375Confira-seotópico5(“OTestamenteiro”)destecapítulo.
376Confira-seoCapítuloXVI(“Codicilo”)destevolume.
377Confira-seoCapítuloXXIII(“Inventário”)destevolume.
378“Origemdotermo‘testamento’
Este vocábulo não se encontra na Bíblia como designação de uma de suas partes. A palavra portuguesa‘testamento’correspondeàpalavrahebraicaberith(quesignificaaliança,pacto,convênio,contrato),edesignaaaliançaqueDeusfezcomopovodeIsraelnoMonteSinai,talcomodescritonolivrodeÊxodo(Êxodo24:1-8 e Êxodo 34:10-28). Segundo a própria Bíblia, tendo sido esta aliança quebrada pela infidelidade do povo,Deus prometeu uma nova aliança (Jeremias 31:31-34) que deveria ser ratificada com o sangue de Cristo
(Mateus26:28).OsescritoresdoNovoTestamentodenominamaprimeiraaliançadeantiga(Hebreus 8:13),emcontraposiçãoànova(2Coríntios3:6-14).
Os tradutores da Septuaginta traduziram berith para diatheke, embora não haja perfeita correspondênciaentreaspalavras,jáqueberithdesigna‘aliança’(compromissobilateral)ediatheketemosentidode‘últimadisposição dos próprios bens’, ‘testamento’ (compromisso unilateral). [PedroApolinário.História do TextoBíblico.[S.l.:s.n.],1985]
As respectivasexpressões ‘antigaaliança’ e ‘novaaliança’passaramadesignara coleçãodosescritosquecontém os documentos respectivamente da primeira e da segunda aliança. As denominações ‘AntigoTestamento’ e ‘NovoTestamento’, para as duas coleções dos livros sagrados, começaram a ser usadas nofinaldoséculoII,quandoosevangelhoseoutrosescritosapostólicosforamconsideradoscomopartedocânonsagrado.Otermo‘testamento’surgiuatravésdolatim,quandoaprimeiraversão latinadoVelhoTestamentogrego traduziu diatheke por testamentum. São Jerônimo, revisando esta versão latina, manteve a palavratestamentum, equivalendo ao hebraico berith — ‘aliança’, ‘concerto’, quando a palavra não tinha essasignificação no grego (ver:Vulgata). Afirmam alguns pesquisadores que a palavra grega para ‘contrato’,‘aliança’deveriasersuntheke,por traduzirmelhorohebraicoberith.[PedroApolinário.HistóriadoTextoBíblico.[S.l.:s.n.],1985][LouisBerkhof.TeologiaSistemática.[S.l.:s.n.].ISBN9788576222590]”(Verbete“Bíblia” na Wikipedia. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/B%C3%ADblia>. Acesso em: 31 jan.2013).
379Sobreotema,escreveupoeticamenteumdoscoautoresdestaobra:
“Testamento
Comoseriabompodercontrolar
osrumosdavidadepoisdomeupassar,
emumaextensãopós-mortedoquerer,
comosehouvesseluzapósoanoitecer.
Ensinariatudoquenãodeutempodefalar...
Protegeriatodosaquelesqueaprendiaamar...
Apagariaosrastrosdosmeuserrosnocaminho...
Confortariatodosqueficaramsemcarinho...
Pediriaperdãoaquemeumagoei...
Explicariaoquesentiaquandochorei...
Mostrariaoqueéofracassoeaglória...
Tentariadarumsentidoàminhahistória...
Oregistroautênticodaminhavontade
Adeclaraçãoantecipada(einútil)daminhasaudade
Aeternizaçãodavidaemumúnicomomento
Aforçasimbólicademeutestamento.
Salvador, 23 de maio de 2010” (Rodolfo Pamplona Filho. Disponível em:<http://rodolfopamplonafilho.blogspot.com.br/2010/09/testamento.html>.Acessoem:30jan.2013.
380Esta“imperfeição”éfacilmentecompreendidapelacircunstânciadequeoCódigoCivilbrasileirode1916nãohaviaexpressamenteincorporadoateoriadonegóciojurídico,oquefoisanadopelavigentecodificação.Paramaioresesclarecimentossobreotema,confiram-seosCapítulosIX(“FatoJurídicoemSentidoAmplo”)eX(“NegócioJurídico(NoçõesGerais)”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção.
381“Quantoaonúmerodedeclarantes,osnegóciosjurídicospoderãoser:
a)unilaterais—quandoconcorreapenasumamanifestaçãodevontade(otestamento,arenúncia,p.ex.);
b)bilaterais—quandoconcorremasmanifestaçõesdevontadesdeduaspartes, formadorasdoconsenso(oscontratosdecompraevenda,locação,prestaçãodeserviços,p.ex.);
c)plurilaterais—quandoseconjugam,nomínimo,duasvontadesparalelas,admitindo-senúmerosuperior,todas direcionadas para a mesma finalidade (o contrato de sociedade, p. ex.)” (Pablo Stolze Gagliano eRodolfoPamplonaFilho,NovoCursodeDireitoCivil—ParteGeral,SãoPaulo:Saraiva,jan.2012,p.363.v.I).
382PabloStolzeGaglianoeRodolfoPamplonaFilho,NovoCursodeDireitoCivil—ParteGeral, cit., p.361.
383 Pablo StolzeGagliano e Rodolfo Pamplona Filho,NovoCurso deDireito Civil—Contratos: TeoriaGeral,9.ed.,SãoPaulo:Saraiva,jan.2013,p.49.v.IV,t.I.
384 “CIVIL. TESTAMENTOS CONJUNTIVOS. REALIZAÇÃO EM ATOS DISTINTOS. CC, ART.1.630.NÃOCONFIGURAÇÃO.I.Otestamentoéconsubstanciadoporatopersonalíssimodemanifestaçãode vontade quanto à disponibilização do patrimônio do testador, pelo que pressupõe, para sua validade, aespontaneidade,emquetitulardosbens,emsolenidadecartorária,unilateral,livrementesepredispõeadestiná-losaoutrem,seminterferência,aomenossoboaspectoformal,deterceiros.II.Oart.1.630daleisubstantivacivilvedaotestamentoconjuntivo,emquehá,nomesmoato,aparticipaçãodemaisalguémalémdotestador,aindicarqueoato,necessariamenteunilateralnasuarealização,assimnãoofoi,pelapresençadiretadeoutrotestador,adescaracterizá-locomovíciodanulidade.III.Nãoseconfigurando,naespécie,aúltimahipótese,jáque o testamento dodecujus, deixando suas cotas para sua ex-sócia e concubina, e o outro por ela feito,
constituíramatosdistintos,emquecadaumcompareceuindividualmenteparaexpressarseudesejosucessório,inaplicável, à espécie, a cominaçãoprevistano referenciadodispositivo legal, corretamente interpretadopeloTribunalaquo.IV.Recursoespecialnãoconhecido”(STJ,REsp88388/SP,RecursoEspecial1996/0009897-2,Rel.Min.AldirPassarinhoJunior, j.5-10-2000,DJ,27-11-2000,p.164,JBCC,v.186,p.415;RT, v. 787, p.189).
385 Sobre o tema, confira-se o tópico 2 (“Algumas Palavras sobre Formas Proibidas de Testamento”) doCapítuloXIV(“FormasOrdináriasdeTestamento”)destevolume.
386Ressalve-seahipótesedereconhecimentodefilho:“Art.1.610.Oreconhecimentonãopodeserrevogado,nemmesmoquandofeitoemtestamento”.
387“1.Tendoo testamentosidooutorgadoporumcidadãoportuguêsnoestrangeiro,éa leiportuguesaqueregequantoàsuavalidadeeefeitos.
2. Se na pendência do inventário se suscitarem questões prejudiciais de que dependa a admissibilidade doprocesso ou a definição dos direitos dos interessados directos na partilha que, atenta a sua natureza ou acomplexidadedamatériade factoque lhes está subjacente, nãodevamser incidentalmentedecididas, o juizdeverádeterminarasuspensãodainstância,nostermoseparaosefeitosdodispostonon.1doart.1335.º,doCPC” (confira-se o inteiro teor deste acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra em:<http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/f7f740a31bb16ceb8025797c0038792a?OpenDocument>.Acessoem:15fev.2013).
388PontesdeMiranda,TratadodeDireitoPrivado,RiodeJaneiro:Borsoi,1955,t.LVIII,p.279,apudRolfMadaleno, “Testamento, Testemunhas e Testamenteiro: uma Brecha para a Fraude”. Disponível em:<http://www.rolfmadaleno.com.br/rs/index.php?option=com_content&task=view&id=44#_ftn32>.Acessoem:15fev.2013.
389RolfMadaleno,ob.cit.
390Art.426doCódigoCivil:“Nãopodeserobjetodecontratoaherançadepessoaviva”.
391Sobreotema,confira-seoCapítuloXV(“PlanodaEficáciadoNegócioJurídico”)dov.I(“ParteGeral”)desta coleção, bem como o tópico 3 (“Tipologia das Disposições Testamentárias”) do Capítulo XVII(“DisposiçõesTestamentárias”)destevolume.
392Confiram-seosCapítulosXIV(“FormasOrdináriasdeTestamento”)eXV(“FormasExtraordináriasdeTestamento”)destevolume.
393Confira-seoCapítuloXVI(“Codicilo”)destevolume.
394 “O testamento, aomenos como ato de última vontade como o compreendiam os romanos, no períodoclássico de seu direito, era desconhecido no direito primitivo.Nem sempre a lei e os costumes o admitiam,havendolegislaçõespelasquaiserampunidosaquelesquepretendiaminstituirherdeirosaoarrepiodalei.Na
legislação chinesa, pelos preceitos de Meng-Tseu, aquele que elaborasse um testamento contrariamente àlegislaçãoerapunidocomoitentagolpesdebambu”(CarlosRobertoGonçalves,DireitoCivilBrasileiro, 5.ed., São Paulo: Saraiva, 2011, v. 7, p. 226). Se a ideia permanecesse no direito contemporâneo, restariaperguntar:punidocomo?Sóseo testamentofosseconhecidoantesdoadventodamortee,nestecaso,seriaplenamenterevogável.
395Releia-se o tópico4 (“BreveVisãoHistórica doDireito dasSucessões”) doCapítulo I (“Introdução aoDireitodasSucessões”)destevolume.
396CaioMáriodaSilvaPereira,InstituiçõesdeDireitoCivil,17.ed.,RiodeJaneiro:Forense,2010,p.163-164.v.6.
397OrlandoGomes,Sucessões,RiodeJaneiro:Forense,2004,p.85-86.
398SílviodeSalvoVenosa,DireitoCivil—DireitodasSucessões,3.ed.,SãoPaulo:Atlas,2003,p.130.v.7.
399CaioMáriodaSilvaPereira,InstituiçõesdeDireitoCivil,17.ed.,RiodeJaneiro:Forense,2010,p.165-166.v.6.
400Confira-seoCapítuloXV(“FormasExtraordináriasdeTestamento”)destevolume.
401 Confira-se o tópico 2 (“Algumas Palavras sobre Formas Proibidas de Testamento”) do Capítulo XIV(“FormasOrdináriasdeTestamento”)destevolume.
402Confira-seoCapítuloXV(“FormasExtraordináriasdeTestamento”)destevolume.
403Paraumaprofundamento sobrea fundamentação teóricade taisPlanosdoNegócio Jurídico, sugerimosuma leitura dos Capítulos X (“Negócio Jurídico (Noções Gerais)”), XI (“Plano de Existência do NegócioJurídico”),XII(“PlanodeValidadedoNegócioJurídico”)eXV(“PlanodeEficáciadoNegócioJurídico”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção.
404Sobreo tema,confira-seoCapítuloXIII (“DefeitosdoNegócioJurídico”)dov. I (“ParteGeral”)destacoleção.
405 Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho,Novo Curso de Direito Civil— Parte Geral, SãoPaulo:Saraiva,jan.2012,p.137.v.I.
406Confira-seoCapítuloVII(“VocaçãoHereditária”)destevolume.
407SílviodeSalvoVenosa,DireitoCivil—DireitodasSucessões,cit.,p.140.
408“Comooordenamentoestabeleceuregrasprópriasparaacapacidade testamentáriaativa,mesmoqueomenoratinjaplenacapacidadecivilpelosoutrosmeiosquea leipermite (pelocasamento,porexemplo,comsuplementação judicial de idade), tal não concede legitimação para o ato de última vontade. Portanto, acapacidade para testar é independente da emancipação (Cicu, 1954: 152)” (Sílvio deSalvoVenosa,Direito
Civil—DireitodasSucessões,cit.,p.141).
409Confira-seoCapítuloXVII(“DisposiçõesTestamentárias”)destevolume.
410SílviodeSalvoVenosa,DireitoCivil—DireitodasSucessões,cit.,p.144.
411ValeregistrarqueoantigoProjetodeLein.6.960/2002(jáarquivado),quepretendiareformaroCódigoCivilde2002,propunhaumanovaredaçãoaomencionadoart.1.859:“Extingue-seemcincoanosodireitoderequerer a declaração de nulidade do testamento ou de disposição testamentária, e em quatro anos o depleitearaanulaçãodotestamentooudedisposiçãotestamentária”.
412“Art.1.909.Sãoanuláveisasdisposiçõestestamentáriasinquinadasdeerro,dolooucoação.
Parágrafo único. Extingue-se em quatro anos o direito de anular a disposição, contados de quando ointeressadotiverconhecimentodovício.”
413 Confira-se o Capítulo XXI (“Extinção do Testamento (Invalidade, Caducidade, Revogação eRompimento)”)destevolume.
414OrlandoGomes,Sucessões,RiodeJaneiro:Forense,2004,p.251-252.
415Confira-seosubtópico5.5(“Retribuição”)destecapítulo.
416Sobreotema,confira-seoCapítuloXXIV(“Partilha”)destevolume.
417“Art.1.977.Otestadorpodeconcederaotestamenteiroaposseeaadministraçãodaherança,oudepartedela,nãohavendocônjugeouherdeirosnecessários.
Parágrafo único.Qualquer herdeiro pode requerer partilha imediata, ou devolução da herança, habilitando otestamenteirocomosmeiosnecessáriosparaocumprimentodoslegados,oudandocauçãodeprestá-los.”
418 “Art. 1.982. Além das atribuições exaradas nos artigos antecedentes, terá o testamenteiro as que lheconferirotestador,noslimitesdalei.”
419“Oprêmioécalculadosobretodaaherançalíquida,edenomina-sevintena,porqueomáximodecincoporcentocorrespondeaumvigésimodovalorbásico.Deduzir-se-á,porém,dameaçãodisponível,quandohouverherdeirosnecessários,cujaslegítimasnãodeverãosuportarreduçãoaessetítulo(novoCódigoCivil,art.1.987eseuparágrafoúnico).Por‘herançalíquida’compreende-seosaldo,depoisdepagasasdívidasdodecujus,as despesas com funeral e cerimônias religiosas, e custeio do inventário. Se for somente testamentária asucessão, aplica-se sobre este remanescente o percentual fixado ou arbitrado.Mas se o autor da herançahouverfalecidopartimtestatusetpartimintestatus,aporçãohereditáriaqueconstituiasucessãolegítimanãopodesercomputadaparaefeitodoencargo,porquesobreelanãoatuouavontadedodefunto,porémadalei.Neste caso, então, o valor atingido é o da herança testamentária. Quer, pois, dizer: havendo herdeirosnecessários,oprêmiose imputará sobreapartedaherançadequedispôso testador,deduzida,portanto,dameaçãodisponível tãosomente”(CaioMáriodaSilvaPereira,InstituiçõesdeDireitoCivil, 17. ed.,Riode
Janeiro:Forense,2010,v.VI,p.296).
420 “Art. 1.138. O testamenteiro tem direito a um prêmio que, se o testador não o houver fixado, o juizarbitrará,levandoemcontaovalordaherançaeotrabalhodeexecuçãodotestamento.
§1.ºOprêmio, quenão excederá5% (cincopor cento), será calculado sobre a herança líquida e deduzidosomente dametade disponível quando houver herdeiros necessários, e de todo o acervo líquido nos demaiscasos.
§2.ºSendootestamenteirocasado,soboregimedecomunhãodebens,comherdeirooulegatáriodotestador,nãoterádireitoaoprêmio;ser-lhe-álícito,porém,preferiroprêmioàherançaoulegado.”
421 “CIVIL. SUCESSÕES. TESTAMENTO. VINTENA. IRREGULAR E NEGLIGENTE EXECUÇÃODOTESTAMENTO.—SeélícitoaoJuizremoverotestamenteirooudeterminaraperdadoprêmiopornãocumprir as disposições testamentárias (CPC. Art. 1.140), é-lhe possível arbitrar um valor compatível pararemunerar o trabalho irregular e negligente na execução do testamento” (STJ, REsp 418931/PR, RecursoEspecial2002/0025020-0,Rel.Min.HumbertoGomesdeBarros,3.ªTurma, j. 25-4-2006,DJ, 1.º-8-2006,p.430).
422CaioMáriodaSilvaPereira,InstituiçõesdeDireitoCivil,17.ed.,RiodeJaneiro:Forense,2010,p.297.
423 Confira-se o Capítulo XXI (“Extinção do Testamento (Invalidade, Caducidade, Revogação eRompimento)”)destevolume.
424 Confira-se o Capítulo XXVIII (“Enriquecimento sem Causa e Pagamento Indevido”) do v. II(“Obrigações”)destacoleção.
425 “Testamento. Abertura (execução). Ministério Público (exigências). Poder geral de cautela. 1. Noprocedimento de jurisdição voluntária, ao juiz é lícito investigar livremente os fatos (Cód. de Pr. Civil, art.1.109). 2.É lícita a exigência de certidões negativas, porque só se cumpre o testamento, ‘se lhe não acharvícioexternoqueotornesuspeitodenulidadeoufalsidade’(Cód.dePr.Civil,art.1.126).3.Recursoespecialnãoconhecido”(STJ,REsp95861/RJ,RecursoEspecial1996/0031312-1,Rel.Min.NilsonNaves,3.ªTurma,j.4-3-1999,DJ,21-6-1999,p.149;RDR,v.15,p.268).
426SílviodeSalvoVenosa,DireitoCivil—DireitodasSucessões,cit.,p.321.
427OrlandoGomes,Sucessões,RiodeJaneiro:Forense,2004,p.87.
428OrlandoGomes,Sucessões,cit.,p.87.
429Confira-seoCapítuloXIII(“SucessãoTestamentária”)destevolume.
430 Estas modalidades testamentárias serão objeto de análise específica no Capítulo XV (“FormasExtraordináriasdeTestamento”)destevolume.
431FlávioTartuceeJoséFernandoSimão,DireitoCivil,4.ed.,RiodeJaneiro:Forense;SãoPaulo:Método,2011,v.6,p.315.
432 Confira-se o tópico 3.3 (“Observações sobre o Testamento Nuncupativo”) do Capítulo XV (“FormasExtraordináriasdeTestamento”)destevolume.
433 “DIREITO CIVIL. TESTAMENTO PÚBLICO. FALECIMENTO DA HERDEIRATESTAMENTÁRIA ANTES DA TESTADORA. NOMEAÇÃO POSTERIOR DAS FILHAS DAHERDEIRA POR PROCURAÇÃO PARTICULAR. IMPOSSIBILIDADE. RIGOR FORMAL.SOLENIDADEESSENCIAL.ARTS.1.592,II,1.717E1.746,CC.CONVERSÃODEINVENTÁRIOEMHERANÇAJACENTE.POSSIBILIDADE.ECONOMIAPROCESSUAL.ART.1.142,CPC.RECURSODESACOLHIDO.
I—Amitigação do rigor formal em prol da finalidade é critério que se impõe na interpretação dos textoslegais.Entretanto,nocasodos testamentos,deve-seredobrarozelonaobservânciadaforma, tantopornãoviver o testador no momento de esclarecer suas intenções, quanto pela suscetibilidade de fraudes naelaboraçãodoinstrumentoe,consequentemente,nadeturpaçãodavontadedequemdispõedosbensparaapósamorte.
II—Arevogaçãoparcialdotestamento,parasubstituiraherdeiraanteriormentenomeadaejáfalecida,devedar-sepelomesmomodoeformadoanterior(art.1.746doCódigoCivil),nãotendoaprocuraçãoadjudiciaporinstrumentoparticularessecondãorevogador.
III—Acapacidadeparaadquirirportestamentopressupõeaexistênciadoherdeiro,oulegatário,àépocadamortedotestador.Tendofalecidoantesoherdeiro,perdevalidadeacédulatestamentária.
IV — Na lição de Pontes, ‘a nulidade dos atos jurídicos de intercâmbio ou inter vivos é, praticamente,reparável:fazem-seoutros,comasformalidadeslegais,ouseintentamaçõesquecompensemoprejuízo,comoa açãode in remverso.Não se dá omesmo com as declarações de última vontade: nulas, por defeito deforma,ouporoutromotivo,nãopodemserrenovadas,poismorreuquemasfez.Razãomaiorparaseevitar,nozelodorespeitoàforma,osacrifíciodofundo’(TratadodeDireitoPrivado,t.LVIII,2.ed.,RiodeJaneiro:Borsoi,1969,§5.849,p.283).
V—Iniciadooinventárioe,noseucurso,verificadaainexistênciadeherdeirotestamentário,édeconsiderar-sejacenteaherança,nostermosdoart.1.592,II,CC,casoemque“ojuiz,emcujacomarcativerdomicílioofalecido,procederásemperdadetempoàarrecadaçãodetodososseusbens”(art.1.142,CPC).Aconversãodoprocedimentoeanomeaçãodocuradordácumprimentoaessanormaeatendeaoprincípiodaeconomia
processual, nele expressamente assentado” (STJ, REsp 147959/SP, Recurso Especial 1997/0064432-4, Rel.
Min.SálviodeFigueiredoTeixeira(1088),4.ªTurma,j.14-12-2000,DJ,19-3-2001p.111,Lex-STJ,v.143,p.112).
434 Sobre o tema, confira-se o v. I (“ParteGeral”) destaColeção, notadamente osCapítulosX (“NegócioJurídico (Noções Gerais)”), XI (“Plano de Existência do Negócio Jurídico”), XII (“Plano de Validade doNegócioJurídico”)eXV(“PlanodeEficáciadoNegócioJurídico”).
435“CIVIL.TESTAMENTOPÚBLICO.VÍCIOSFORMAISQUENÃOCOMPROMETEMAHIGIDEZDO ATO OU PÕEM EM DÚVIDA A VONTADE DA TESTADORA. NULIDADE AFASTADA.SÚMULAN.7-STJ.
I.Inclina-seajurisprudênciadoSTJpeloaproveitamentodotestamentoquando,nãoobstanteaexistênciadecertosvícios formais, a essênciadoato semantém íntegra, reconhecidapeloTribunal estadual, soberanonoexame da prova, a fidelidade da manifestação de vontade da testadora, sua capacidade mental e livreexpressão.
II.‘Apretensãodesimplesreexamedeprovanãoensejarecursoespecial’(Súmulan.7/STJ).
III. Recurso especial não conhecido” (STJ, REsp 600746/PR, Recurso Especial 2003/0188859-4, RelMin.AldirPassarinhoJunior(1110),4.ªTurma,j.20-5-2010,DJe,15-6-2010,RT,v.900,p.185).
436Confira-seosubtópico4.6(“PrincípiodoRespeitoàVontadeManifestada”)doCapítuloII(“PrincipiologiadoDireitodasSucessões”)destevolume.
437 Confira-se, a propósito, o subtópico 3.4 (“Considerações acerca da Publicidade desta Forma deTestamento”)destecapítulo.
438“Art.1.871.Otestamentopodeserescritoemlínguanacionalouestrangeira,peloprópriotestador,ouporoutrem,aseurogo.”
439Confira-seosubtópico4.2(“SobreaConfecçãodoTestamentoCerrado”)destecapítulo.
440Sobreo temadapossibilidadedepessoascomnecessidadesespeciais testarem,valeconferiraseguintenotícia,aindaquereferenteatestamentocerrado:
“Éválidotestamentocerradoelaboradoportestadoracomgravedeficiênciavisual
Nadiscussãojurídicasobreavalidadedeumtestamento,oquedeveprevaleceréorespeitoàvontaderealdotestador.Qualqueralegaçãoquejustifiqueanulidadeprecisaestarbaseadaemfatoconcreto,enãoemmerasformalidades.Com essa orientação, aTerceiraTuma doSuperiorTribunal de Justiça (STJ) negou o pedidopara anular o documento testamentário de uma empresária que estaria cega no ato da elaboração de seutestamento.OrelatordorecursofoioministroPaulodeTarsoSanseverino.
De acordo com as informações processuais, as duas únicas sobrinhas de uma senhora falecida em Santa
Catarinaentraramcomaçãodeanulaçãodotestamentocerradoelaboradopelatia,empresáriadacidadedeJaraguádoSul(SC),quemorreusolteiraedeixouseusbensparainstituiçõesdecaridadelocais.Otestamentocerrado, às vezes chamado de secreto oumístico, é aquele documento escrito pelo próprio testador, ou poralguémdesignadoporele,comcarátersigiloso,completadopeloinstrumentodeaprovaçãolavradoporoficialpúblico(tabelião)napresençadecincotestemunhas.
As sobrinhas contestavam a validade do documento, sustentando a incompetência da tabeliã que lavrou otermo de confirmação. Afirmavam, também, que a tia, à época que elaborou o testamento, estariacompletamentecegaesofrendodeproblemasmentaisdecorrentesdesuaidadeavançada.Dessemodo,otipodetestamento(cerrado)serianulo.Osadvogadosdassobrinhasalegaram,ainda,queaempresáriateriasidomanipulada pela pessoa que digitou seu ato de última vontade, por se tratar de uma das beneficiadas pelotestamento. Para corroborar os argumentos, apresentaram laudos médicos e outras provas produzidas deformaunilateral.
Recursos
Opedido, entretanto, foi negado na primeira e segunda instâncias.OTribunal de Justiça deSantaCatarina(TJSC) confirmou a validade do testamento, porque somente quando a cegueira é total é que é vedado àpessoatestarcerradamente.“Talnãoocorrequandooslaudos,juntadosaosautospelasprópriasproponentesdaanulação,deixamentreverapossibilidadedatestadora,emquepeseasuacegueiraiminente,deinteirar-sedo conteúdodo testamento cerradoque incumbiu a terceiro lavrar, aindaque como auxílio de instrumentosoftalmológicosespeciais,quandonãosecomprovaanãoutilizaçãodessesmétodos”,argumentouoTJSC.
SegundoasnormasdaOrganizaçãoMundialdaSaúde(OMS),éconsideradacegaapessoaqueapresenta,noolho,dominantegraudeacuidadevisual inferiora0,1.Segundodadoscontidosnoprocesso,a testadoranãoestava totalmente cega, uma vez que o grau de acuidade visual dela no olho direito era de 0,1. Para ooftalmologistaconsultado,oproblemadaempresáriapodetersidoamenizadopelautilizaçãodelupas,telelupasoumesmopormeiodailuminaçãointensadodocumento.
Testemunhos juntadosaosautos tambématestamquea falecidapermaneceuà frentedasuaempresaatéodia em que foi internada, tendo comparecido pessoalmente ao tabelionato de Jaraguá do Sul, semacompanhantesouauxíliodemuletas,parareafirmarqueotestamentocontestadoeraexpressãodesuarealvontade,assinando-onapresençadatabeliãedetestemunhas.
Inconformadas, as sobrinhas recorreram para o STJ. O relator do processo, ministro Paulo de TarsoSanseverino,nãoencontroubaselegalparaacolheropedido.“Édeseponderar,nostermosdajurisprudênciadestaCasa,queo‘rigorformaldevecederanteanecessidadedeseatenderàfinalidadedoato,regularmentepraticadopelo testador’”,afirmouoministro.Paraele,deve-se interpretaramatéria testamentáriano intuitodefazerprevaleceravontadedotestador.
Emseuvoto,oministrodestacouquereavaliaraconclusãodoacórdãoexigiriareexamedefatoseprovas,o
que não é possível em recurso especial.Omesmo se aplica quanto à alegação de incapacidademental datestadora,queparaoTJSCnãoficoucomprovadadeformaconvincente,isentadedúvidas.Assim,presume-seaexistênciadecapacidadeplena.
Quantoàalegaçãodequeo sigilodo testamento teria sidoquebrado,porquenão teria sidoassinadoapenaspelo testador, oministro disse ‘beirar a irrisão’. ‘Se o documento foi assinado somente pela testadora e astestemunhasfirmaramapenaso termodeencerramentoedemaispapéisquelhesforamapresentados,oatoficourestritoaosseusprópriosfinseastestemunhasnãotiveramconhecimentodoconteúdodotestamento’,concluiu” (Disponível em: <http://stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=99714>.Acessoem:8mar.2013).
441Sobreotema,confira-seoCapítuloXVI(“Codicilo”)destevolume.
442FlávioTartuceeJoséFernandoSimão,DireitoCivil,cit.,p.321.v.6.
443Delegeferenda,valeobservarqueoProjeton.276/2007,deautoriaoriginaldoDeputadoRicardoFiuza(jáfalecido),propugnavapelainserçãodeumsegundoparágrafoaotranscritoart.1.864doCC/2002,comaseguinte redação: “A certidão do testamento público, enquanto vivo o testador, só poderá ser fornecida arequerimentodesteouporordemjudicial”.
444CarlosRobertoGonçalves,DireitoCivilBrasileiro—DireitodasSucessões,5.ed.,SãoPaulo:Saraiva,2011,p.269.v.VII.
445TratadodosTestamentos,v.2,n.282,p.132.
446CarlosMaximiliano,DireitodasSucessões,v.I,n.411,p.469.
447TratadodeDireitoPrivado,v.59,§5.875,p.77.
448CarlosRobertoGonçalves,DireitoCivilBrasileiro—DireitodasSucessões,5.ed.,SãoPaulo:Saraiva,2011,p.270.v.VII.
449 “TESTAMENTO CERRADO. ESCRITURA A ROGO. NÃO IMPORTA EM NULIDADE DOTESTAMENTO CERRADO O FATO DE NÃO HAVER SIDO CONSIGNADO, NA CÉDULATESTAMENTÁRIA,NEMNOAUTODEAPROVAÇÃO,ONOMEDAPESSOAQUE,AROGODOTESTADOR, O DATILOGRAFOU. INEXISTÊNCIA, NOS AUTOS, DE QUALQUER ELEMENTOPROBATÓRIO NO SENTIDO DE QUE QUALQUER DOS BENEFICIÁRIOS HAJA SIDO OESCRITOR DO TESTAMENTO, OU SEU CÔNJUGE, OU PARENTE SEU. EXEGESE RAZOÁVELDOS ARTIGOS 1.638, I, E 1.719, I, COMBINADOS, DO CÓDIGO CIVIL. Entende-se cumprida aformalidade do artigo 1.638, XI, do Código Civil, se o envelope que contém o testamento está cerrado,costuradoelacrado,consignandootermodeapresentaçãosuaentregaaomagistradosemvestígioalgumdeviolação.Recursoespecialnãoconhecido”(STJ,REsp228/MGRecursoEspecial1989/0008511-5,Rel.Min.AthosCarneiro,4.ªTurma,j.14-8-1989,DJ,4-12-1989,p.17884;JBCC,v.156,p.174;RSTJ,v.7,p.284).
450 “AÇÃO DE ANULAÇÃO DE TESTAMENTO CERRADO. INOBSERVÂNCIA DEFORMALIDADESLEGAIS.INCAPACIDADEDAAUTORA.QUEBRADOSIGILO.CAPTAÇÃODAVONTADE. PRESENÇA SIMULTÂNEA DAS TESTEMUNHAS. REEXAME DE PROVA. SÚMULA7/STJ.
1.Emmatéria testamentária,a interpretaçãodeveservoltadanosentidodaprevalênciadamanifestaçãodevontadedotestador,orientando,inclusive,omagistradoquantoàaplicaçãodosistemadenulidades,queapenasnão poderá ser mitigado, diante da existência de fato concreto, passível de colocar em dúvida a própriafaculdadequetemotestadordelivrementedisporacercadeseusbens,oquenãosefazpresentenosautos.
2. O acórdão recorrido, forte na análise do acervo fático-probatório dos autos, afastou as alegações daincapacidadefísicaementaldatestadora;decaptaçãodesuavontade;dequebradosigilodotestamento,edanãosimultaneidadedastestemunhasaoatodeassinaturadotermodeencerramento.
3.Aquestãodanulidadedotestamentopelanãoobservânciadosrequisitoslegaisàsuavalidade,nocaso,nãoprescinde do reexame do acervo fático-probatório carreado ao processo, o que é vedado em âmbito deespecial, em consonância com o enunciado 7 da Súmula desta Corte” (STJ, REsp 1001674/SC, RecursoEspecial2007/0250311-8,Rel.Min.PaulodeTarsoSanseverino(1144),3.ªTurma, j.5-10-2010,DJe, 15-10-2010;RSTJ,v.220,p.385).
451 Flexibilizando essa exigência, confira-se o seguinte acórdão: “TESTAMENTO CERRADO. Auto deaprovação.Faltadeassinaturadotestador.Inexistindoqualquerimpugnaçãoàmanifestaçãodavontade,comaefetivaentregadodocumentoaooficial,tudoconfirmadonapresençadastestemunhasnumerárias,afaltadeassinaturadotestadornoautodeaprovaçãoéirregularidadeinsuficientepara,naespécie,causarainvalidadedoato.Art.1.638doCCivil.Recursonãoconhecido”(STJ,REsp223799/SP,RecursoEspecial1999/0064804-8,Rel.Min.RuyRosadodeAguiar,4.ªTurma,j.18-11-1999,DJ,17/12/1999p.379,Lex-STJ,v.129,p.158;RDR,v.17p.354).
452Releia-seoart.1.872doCC.
453“Ementa:TESTAMENTOPARTICULAR—PROCEDIMENTODEJURISDIÇÃOVOLUNTÁRIA— REQUISITOS DE VALIDADE FORMAL PRESENTES — QUESTIONAMENTOS ACERCA DEREQUISITOS INTRÍNSECOS— IMPOSSIBILIDADE. (...)—O testamento particular é aquele escritopelotestadordeprópriopunhooupormeiodeprocessomecânico,ondeseretrataavontadedodecujuscomrelaçãoàdivisãodeseusbens,sendorequisitosdesuavalidadealeituraeassinaturadotestador,napresençade pelo menos três testemunhas, que também devem assiná-lo.— Com relação aos requisitos intrínsecos,comoovícionamanifestaçãodavontadedotestadoreaveracidadedasinformaçõescontidasnotestamento,seu questionamento não é admitido na estreita via dos procedimentos de jurisdição voluntária” (TJMG,Ap.Cív.1.0693.06.053976-6/001,Rel.Des.DárcioLopardiMendes,j.4-12-2008).
454 Vale destacar que, de tempos em tempos, têm sido apresentados projetos de lei que buscam exigir o
registrodotestamentoparticular.Sobreotema,confira-seaseguintenotícia:“ACâmaraanalisaoProjetodeLei204/11,dodeputadoSandesJúnior(PP-GO),quedeterminaqueotestamentoparticularsóterávalidadesefor registrado até 20dias após sua elaboração, emcartório de registro de títulos e documentos.ApropostaalteraoCódigoCivil(Lei10.406/02).OprojetoéidênticoaoPL4748/09,doex-deputadoCelsoRussomanno,que foi arquivado ao final da legislatura passada. Pela lei atual, para ter validade, o testamento particularprecisa apenas ser lido e assinado na presença de três testemunhas. Os outros dois tipos de testamentosprevistosnoCódigoCivil(públicoecerrado)jásãoobrigatoriamenteregistradosemcartório.Segundooautor,umdosmotivosparao testamentoparticularserpoucousadonoBrasiléa facilidadecomqueelepodeserocultado, destruído ou perdido. ‘Registrado o testamento no cartório, estará acessível aos herdeiros einteressadosqualquertipodepesquisafuturaeatéaobtençãodeumacertidãocomomesmovalorjurídicodooriginal’, argumenta” (Disponível em: <http://www.anoreg.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=16584:proposta-obriga-registro-de-testamento-particular-em-cartorio&catid=5:parlamentar&Itemid=9>.Acessoem:4fev.2013).
455“SUCESSÕES—CONFIRMAÇÃODETESTAMENTOPARTICULAR—VÍCIOSINTRÍNSECOS—NECESSIDADEDEDISCUSSÃOEMAÇÃOPRÓPRIA—ARTS.1.130ESEGUINTESDOCPC—PRESENÇA DOS REQUISITOS LEGAIS DO ART. 1.876 DO CC/2002 — VALIDADE FORMALDECLARADA. — Tratando-se a confirmação de testamento particular de verdadeiro procedimento dejurisdiçãovoluntária,hajavistaterporobjetivoosimplesreconhecimentodeumdireitopreexistente,queparasua validade e eficácia depende da atuação do juiz, a quem cabe apenas o exame de sua validade formal,devem eventuais vícios intrínsecos do testamento ser questionados pelos interessados em ação própria.—Restandodemonstradoteremsidodevidamenteobservadasasformalidadesexigidaspeloart.1.876,§2.º,doCódigo Civil para a validade do testamento particular elaborado por processo mecânico, haja vista estardevidamenteassinadopelo testadorepormais três testemunhas,que, inquiridasemjuízoconfirmaramasualeituraperanteelas,bemcomoaposiçãodesuasrespectivasassinaturasedotestador,nostermosdoart.1.878do Código Civil c/c 1.133 do Código de Processo Civil, a sua confirmação se impõe” (TJMG, Ap. Cív.1.0243.06.000480-7/001, Comarca de Espinosa, Apelante(s): João Batista Gonçalves Espólio de, Repdo. p/Invte.AlvinoJoséGonçalves—Apelado(a)(s):IsabelleKarolineGangussuLeite,Representado(a)(s)p/pai(s)ManoelIvanLeiteeoutro—Rel.Exmo.Sr.Des.EliasCamilo).
456 “CIVIL. TESTAMENTO PARTICULAR. FORMALIDADES. TESTEMUNHA SÓCIA DEENTIDADELEGATÁRIA.Aregrareferenteàproibiçãodesero legatário testemunhanotestamentoédeinterpretação estrita, não atingindo a sócio de entidade beneficiária da liberalidade” (STJ, REsp 19764/SP,RecursoEspecial 1992/0005599-0,Rel.Min.DiasTrindade,3.ªTurma j. 30-11-1992,DJ, 8-2-1993, p. 1028,Lex-STJ,v.45,p.294;RSTJ,v.45,p.300).
457Flexibilizandoaexigênciadonúmeromínimodetestemunhas,valeconferirestepeculiarjulgado:
“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. TESTAMENTO PARTICULAR. ASSINADO POR QUATROTESTEMUNHAS E CONFIRMADO EM AUDIÊNCIA POR TRÊS DELAS. VALIDADE DO ATO.
INTERPRETAÇÃO CONSENTÂNEA COM A DOUTRINA E COM O NOVO CÓDIGO CIVIL,ARTIGO1.876,§§1.ºe2.º.RECURSOESPECIALCONHECIDOEPROVIDO.
1.Testamentoparticular.Artigo1.645,IIdoCPC.Interpretação:Aindaquesejaimprescindívelocumprimentodasformalidadeslegaisafimdepreservarasegurança,averacidadeelegitimidadedoatopraticado,deveseinterpretarotextolegalcomvistasàfinalidadeporelecolimada.Nahipótesevertente,otestamentoparticularfoi digitado e assinado por quatro testemunhas, das quais três o confirmaram em audiência de instrução ejulgamento.Nãohá,pois,motivoparatê-loporinválido.
2.InterpretaçãoconsentâneacomadoutrinaecomonovoCódigoCivil,artigo1.876,§§1.ºe2.º.Aleituradospreceitos insertosnosartigos1.133doCPCe1.648CC/1916deveconduziraumaexegesemaisflexíveldoartigo1.645doCC/1916,confirmadainclusive,peloNovoCódigoCivilcujoartigo1.876,§§1.ºe2.º,dispõe:‘otestamento, ato de disposição de última vontade, não pode ser invalidado sob alegativa de preterição deformalidade essencial, pois não pairam dúvidas que o documento foi firmado pela testadora de formaconscienteenousoplenodesuacapacidademental’.PrecedentesdesteSTJ.
3.Recursoespecialconhecidoeprovido”(STJ,REsp701917/SP,RecursoEspecial2004/0160909-0,Rel.Min.LuisFelipeSalomão,4.ªTurma,j.2-2-2010,DJe,1.º-3-2010).
458“Agravoregimental.Recursoespecialnãoadmitido.Formalizaçãodetestamento.Testemunhas.
1.Oacórdãodeuregularaplicaçãoaoartigo1.648doCódigoCivilde1916,queprevêaexigênciadequepelomenos três testemunhas que assinaram o testamento particular o confirmem. Na hipótese, apenas duas ofizeram,motivo pelo qual, de acordo com a determinação do referido dispositivo, foi indeferido o pedido deformalizaçãodotestamento.
2.Dissídiojurisprudencialnãocaracterizadoporausênciadeidentidadefáticaentreosjulgados.
3. Agravo regimental desprovido” (STJ, AgRg no Ag 621663/MG, Agravo Regimental no Agravo deInstrumento 2004/0090617-7, Rel.Min. CarlosAlbertoMenezesDireito, 3.ª Turma, j. 21-6-2007,DJ, 17-9-2007,p.248).
459 “RECURSO ESPECIAL. TESTAMENTO PARTICULAR. VALIDADE. ABRANDAMENTO DORIGOR FORMAL. RECONHECIMENTO PELAS INSTÂNCIASDEORIGEMDAMANIFESTAÇÃOLIVRE DE VONTADE DO TESTADOR E DE SUA CAPACIDADE MENTAL. REAPRECIAÇÃOPROBATÓRIA.INADMISSIBILIDADE.SÚMULA7/STJ.
I—AreapreciaçãodasprovasquenortearamoacórdãohostilizadoévedadanestaCorte,àluzdoenunciado7daSúmuladoSuperiorTribunaldeJustiça.
II—Nãoháfalaremnulidadedoatodedisposiçãodeúltimavontade(testamentoparticular),apontando-sepreteriçãodeformalidadeessencial(leituradotestamentoperanteastrêstestemunhas),quandoasprovasdosautos confirmam, de forma inequívoca, que o documento foi firmado pelo próprio testador, por livre e
espontâneavontade,eportrêstestemunhasidôneas,nãopairandoqualquerdúvidaquantoàcapacidadementaldodecujus,nomomentodoato.Origorformaldevecederanteanecessidadedeseatenderàfinalidadedoato,regularmentepraticadopelotestador.
Recurso especial não conhecido, com ressalva quanto à terminologia” (STJ, REsp 828616/MG, RecursoEspecial2006/0053147-2,Rel.Min.CastroFilho,3.ªTurma,j.5-9-2006,DJ,23-10-2006,p.313,RB,v.517,p.23).
460“Art.1.886.Sãotestamentosespeciais:
I—omarítimo;
II—oaeronáutico;
III—omilitar.”
461SílviodeSalvoVenosa,DireitoCivil—DireitodasSucessões,3.ed.SãoPaulo:Atlas,2003,p.182.v.7.
462“Nuncupação.[Dolat.nuncupatione.]S.f.Jur.Designaçãoouinstituiçãodeherdeirofeitadevivavoz.
Nuncupativo. [Do lat.nuncupatu, part. pass. de nuncupare, ‘pronunciar em alta voz’, + -ivo.] Adj. ~V.casamento—etestamento—”(AurélioBuarquedeHolandaFerreira,NovoDicionárioAuréliodaLínguaPortuguesa,2.ed.,RiodeJaneiro:NovaFronteira,1986,p.1205).
463OvigenteCódigoCivilbrasileiroutilizaoadjetivo“nuncupativo”apenasnoquedizrespeitoaocasamentoporprocuração,conformeseverificadoseuart.1.542:
“Art. 1.542. O casamento pode celebrar-se mediante procuração, por instrumento público, com poderesespeciais.
§ 1.º A revogação do mandato não necessita chegar ao conhecimento do mandatário; mas, celebrado ocasamento sem que o mandatário ou o outro contraente tivessem ciência da revogação, responderá omandanteporperdasedanos.
§ 2.º O nubente que não estiver em iminente risco de vida poderá fazer-se representar no casamentonuncupativo”.
464Valeapena ler:<http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/CFM/2012/1995_2012.pdf>.Acesso em: 22mar.2013.
465 Dimas Messias de Carvalho e Dimas Daniel de Carvalho, Direito das Sucessões — Inventário ePartilha,3.ed.,BeloHorizonte:DelRey,2011,p.147-148.
466FlávioTartuceeJoséFernandoSimão,DireitoCivil,5.ed.,RiodeJaneiro:Forense;SãoPaulo:Método,2012,p.322.v.6.
467Comovimosemnossovolume1 (“ParteGeral”),Capítulos IX(“FatoJurídicoemSentidoAmplo”)eX(“Negócio Jurídico (Noções Gerais)”), o ato negocial ou negócio jurídico traduz uma declaração devontade pormeio da qual a parte, com amparo no postulado da autonomia privada, e nos limites da funçãosocialedaboa-féobjetiva,escolhedeterminadosefeitoslícitosejuridicamentepossíveis,aexemplodoquesedánocontratoeno testamento.Diferentemente,oato jurídico emsentido estrito consiste emummerocomportamento humano, voluntário e consciente, que gera efeitos previamente determinados pelo
ordenamento,comosedánacaça,napescaouemumanotificação.Note,amigoleitor:nestesúltimos,aparte
nãotemliberdadenaescolhadosefeitosjurídicosdoato(a“aquisiçãodapropriedade”—nacaçaenapesca— dá-se automaticamente, assim como a “comunicação da outra parte” — na notificação). Ora, notestamentovital,éexatamenteamargemdeescolhaedeopçãododeclaranteque justificaasuaexistênciaenquantodeclaraçãoantecipadadevontade .Portudoisso,paranós,énítidaasuanaturezanegocial.
468DePlácidoeSilva,VocabulárioJurídico,15.ed.,RiodeJaneiro:Forense,1998,p.176.
469InformaOrlandoGomesqueo“codiciloeraumpequenotestamento,quesetornouobsoleto.Manteve-ooCódigo Civil, sob forma hológrafa e conteúdo restrito. Não é necessário que o de cujus tenha deixadotestamento”(OrlandoGomes,Sucessões,12.ed.,RiodeJaneiro:Forense,2004,p.96).
470“Apelaçãocível.Açãodeclaratóriadeexistênciadecodicilo.Casoemqueosescritosdeixadospeloautordaherançanãocontêmcaracterísticasdeumcodicilo, senãodeumrascunhode testamento.Bensdevalorelevado que não podem ser objeto de codicilo. Negaram provimento” (TJRS, 8.ª Câmara Cível, Ap. Cív.70040971335,Rel.Des.RuiPortanova).
471“Contémdisposiçõesespeciaissobre:opróprioenterro;esmolasdepoucamontaacertasedeterminadaspessoasou, indeterminadamente,aospobresdecertolugar; legarmóveis,roupasoujoias,depoucovalor,deusopessoaldocodicilante(CC,art.1.881).Ocritérioparaapuraçãodovalorérelativo,devendo-seconsideraroestadosocialeeconômicodocodicilante;paratanto,ojuizexaminará,prudentemente,cadacasoconcreto,considerandoovalordadeixarelativamenteaomontantedosbensdoespólio.ObservaWashingtondeBarrosMonteiroqueháumatendênciadesefixardeterminadaporcentagem,havendo-secomodepequenovaloraliberalidadequenãoultrapassar10%dovalordomonte,podendo,porisso,serobjetodecodicilo(RT,164:287,97:424; 303:272; 327:240; AJ, 101:184): sufrágios por intenção da alma do codicilante (CC, art. 1.998);nomeaçãoesubstituiçãodetestamenteiro(CC,art.1.883),perdãodeindigno(CC,art.1.818)”(MariaHelenaDiniz.CursodeDireitoCivilBrasileiro—DireitodasSucessões,25.ed.,SãoPaulo:Saraiva,2011,p.337).
472 “SUCESSÕES. AÇÃO DE COBRANÇA. VALIDADE E EFICÁCIA DE DISPOSIÇÕES DEÚLTIMA VONTADE. CODICILO. Ainda que admitido na forma datilografada, o codicilo em que hásubstanciaisdisposições sobrecercademetadedosbensdeixadosé imprestávelpara finsdeequiparaçãoatestamento particular. Ausência de requisitos legais e inaplicabilidade do art. 85 do CCB-1916. Zelo naobservância das formas para não se deturpar a verdadeira vontade do disponente. Impossibilidade legal etópica de equiparação a uma cessão de direitos. Informalidade admitida que impede disposições de maiorexpressão financeira, ainda que se discuta o valor pecuniário atribuído. Embargos infringentes desacolhidos,pormaioria”(TJRS,Processo70014509715,Rel.MariaBereniceDias,datadoacórdão:14-7-2006).
473A expressão “sufrágio” é plurissignificativa. Confira-se: “Sufrágio. [Do lat. suffragiu.]S.m. 1. Voto,votação:Homensemulherestêmdireitoaosufrágio.2.Apoio,adesão:Asmedidaspropostasobtiveramosufrágio de todos. 3. Ato pio ou oração pelos mortos” (Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, NovoDicionárioAuréliodaLínguaPortuguesa,2.ed.,RiodeJaneiro:NovaFronteira,1986,p.1626).
474“Art.1.883.Pelomodoestabelecidonoart.1.881,poder-se-ãonomearousubstituirtestamenteiros.”
475Sobreotema,confira-seoCapítuloXXV(“Filiação”)dov.VI(“DireitodeFamília”)destacoleção.
476Nestemesmosentido:SílvioVenosa,DireitoCivil—DireitodasSucessões,cit.,p.195.
477 “EMBARGOS INFRINGENTES. SUCESSÕES. NÃO RECONHECIMENTO DA VALIDADE DOCODICILO.PREVALÊNCIADOTESTAMENTOCERRADO.Umasimplesanotaçãoempapel,semdataouassinaturadadecujus, não pode ser aceita como codicilo, por desobediência ao artigo 1.881doCódigoCivil,devendoprevaleceroválidoeregulartestamentofirmado.Embargosinfringentesacolhidos,pormaioria”(TJRS,EI70034580472,4.ºGrupodeCâmarasCíveis,Rel.ClaudirFidelisFaccenda,j.12-3-2010).
478MariaHelenaDiniz,CursodeDireitoCivilBrasileiro—DireitodasSucessões, 25. ed., São Paulo:Saraiva,2011,p.338-339.v.6.
479FlávioTartuceeJoséFernandoSimão,DireitoCivil,4.ed.,RiodeJaneiro:Forense;SãoPaulo:Método,2011,p.346.v.6.
480OrlandoGomes,Sucessões,12.ed.,RiodeJaneiro:Forense,2004,p.96-97.
481SílvioVenosa,ob.cit.,p.195.
482Releia-seosubtópico2.1(“SobreoPoderdeTestar”)doCapítuloXIII(“SucessãoTestamentária”)destevolume.
483“Art.1.897.Anomeaçãodeherdeiro,oulegatário,podefazer-sepuraesimplesmente,sobcondição,paracertofimoumodo,ouporcertomotivo.”
484 Para maiores esclarecimentos sobre os elementos acidentais do negócio jurídico (termo, condição eônus/modoouencargo),confira-seoCapítuloXV(“PlanodaEficáciadoNegócioJurídico”)dov. I (“ParteGeral”)destacoleção.
485Confira-seoCapítuloXVIII(“Legados”)destevolume.
486Nessesentido,confira-seoart.1.903:
“Art.1.903.Oerronadesignaçãodapessoadoherdeiro,dolegatário,oudacoisalegadaanulaadisposição,salvose,pelocontextodotestamento,poroutrosdocumentos,ouporfatosinequívocos,sepuderidentificarapessoaoucoisaaqueotestadorqueriareferir-se.”
Confira-se o tópico 5 (“Sobre a Nomeação de Herdeiros e a Distribuição de Quinhões ou BensIndividualmenteConsiderados”)destecapítulo.
487Paraumaprofundamentosobreotema,confira-seosubtópico2.5(“AlgumasPalavrassobreaCausanosNegóciosJurídicos”)doCapítuloXI(“PlanodeExistênciadoNegócioJurídico”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção.
488Confira-seoCapítuloXX(“Substituições”)destevolume.
489Confira-seosubtópico4.6(“PrincípiodoRespeitoàVontadeManifestada”)doCapítuloII(“PrincipiologiadoDireitodasSucessões”)destevolume.
490 “DIREITO CIVIL E SUCESSÓRIO. APLICAÇÃO DA ANALOGIA COMO MÉTODOINTEGRATIVO. TESTAMENTO. VALIDADE. PARENTES DE LEGATÁRIO QUE FIGURARAMCOMO TESTEMUNHAS DO ATO DE DISPOSIÇÃO. INTERPRETAÇÃO DO ARTIGO 1.650, DOCÓDIGOCIVIL.
1. Na hipótese, não há se falar em interpretação da lei, mas sim em integração mediante analogia, que,conforme ensina Vicente Rao, ‘consiste na aplicação dos princípios extraídos da norma existente a casosoutrosquenãoosexpressamentecontemplados,mascujadiferençaemrelaçãoaestes,nãosejaessencial’(ODireitoeavidadosdireitos,3.ªedição,SãoPaulo.RevistadosTribunais,1991,p.458/460).
2.O testamento é umnegócio jurídico, unilateral, personalíssimo, solene, revogável, que possibilita à pessoadispordeseusbensparadepoisdesuamorte. Justamenteporessascaracterísticas, tantose faznecessárioobservaropreenchimentodetodososseusrequisitoslegaisparaconceder-lhevalidade.
3.Aenumeraçãocontidanoartigo1.650,nosincisosI,IIeIII,refere-seaosincapazese,nosincisosIVeV,
àqueles que são beneficiários, diretos ou indiretos, do testamento.O legislador busca proteger a higidez e a
validadedadisposiçãotestamentária,vedandocomotestemunhasosincapazeseosquetêminteressenoato.
4. A liberdade de testar encontra restrições estabelecidas na lei, porém esta não distingue, quanto àsconsequênciasjurídicas,asucessãotestamentáriaemrelaçãoaoslegatárioseherdeirosnecessários.
5. Há o mesmo fundamento para a restrição de figurarem como testemunhas, no ato do testamento, osparentesdoherdeiroinstituídoedolegatário:qualseja,ointeressediretoouindiretodobeneficiário,emrelaçãoaoatodedisposiçãodevontade.Inexistediferençaemrelaçãoàsconsequênciasparaoherdeiroinstituídoeolegatário,porissoqueaconclusãodedutivaédequeaoincisoVdoartigo1.650,doCódigoCivilde1916,deveseaplicaramesmaessênciadoincisoIVdodispositivo.
6.NaspalavrasdeClóvisBeviláqua:‘seriaatribuiràleiafeiamáculadeumagrosseirainconsequência,suporque somente o cônjuge ou descendente, o ascendente e o irmão do herdeiro estão impedidos de sertestemunhasemtestamento.Oimpedimentoprevaleceemrelaçãoaocônjugeeaosmencionadosparentesdolegatário’(CódigoCivildoE.U.B.,v.II,6.ªtiragem,RiodeJaneiro:EditoraRio,p.848).
7.Recursoespecialnãoconhecido”(STJ,REsp176473/SP,RecursoEspecial1998/0040096-6,Rel.Min.LuisFelipeSalomão,j.21-8-2008,DJe,1.º-9-2008,Lex-STJ,v.230,p.88;RT,v.878,p.157).
491Paraumaprofundamentosobreotema,confiram-seosCapítulosX(“NegócioJurídico(NoçõesGerais)”)eXIV(“InvalidadedoNegócioJurídico”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção.
492“Art.1.907.Se foremdeterminadososquinhõesdeunsenãoosdeoutrosherdeiros,distribuir-se-áporigualaestesúltimosoquerestar,depoisdecompletasasporçõeshereditáriasdosprimeiros.”
493 Sobre o tema, confira-se o tópico 2 (“Algumas Palavras sobre Formas Proibidas de Testamento”) doCapítuloXIV(“FormasOrdináriasdeTestamento”)destevolume.
494FlávioTartuceeJoséFernandoSimão,DireitoCivil,5.ed.,RiodeJaneiro:Forense;SãoPaulo:Método,2012,p.333.v.6.
495Confira-seotópico3(“TipologiadasDisposiçõesTestamentárias”)destecapítulo.
496Emlatim,literalmente,“istoporaquilo”.
497FlávioTartuceeJoséFernandoSimão,DireitoCivil,cit.,p.334/335.
498 Confira-se o tópico 5 (“Impedimentos Legais Sucessórios”) do Capítulo VII (“Vocação Hereditária”)destevolume.
499Sobreotema,confiram-seosCapítulosXII(“PlanodeValidadedoNegócioJurídico”),XIII(“DefeitosdoNegócioJurídico”)eXIV(“InvalidadedoNegócioJurídico”)dov.I(“ParteGeral”)dapresentecoleção.
500 “Art. 178. É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a anulação do negócio jurídico,contado:
I—nocasodecoação,dodiaemqueelacessar;
II—nodeerro,dolo,fraudecontracredores,estadodeperigooulesão,dodiaemqueserealizouonegóciojurídico;
III—nodeatosdeincapazes,dodiaemquecessaraincapacidade.”
501Saliente-se,maisumavez,queoantigoProjetodeLein.6.960/2002(jáarquivado)propunhaumanovaredação aomencionado art. 1.859, condensando, em uma única regra, os dois prazosmencionados, com aseguinteredação:“Extingue-seemcincoanosodireitoderequereradeclaraçãodenulidadedotestamentooude disposição testamentária, e em quatro anos o de pleitear a anulação do testamento ou de disposiçãotestamentária”.
502Ver tambémo item 4.5 (“Prazo dasAções de Invalidade deTestamento”) doCapítuloXIII (SucessãoTestamentária).
503SílviodeSalvoVenosa,DireitoCivil—DireitodasSucessões,3.ed.,SãoPaulo:Atlas,2003,p.144.v.7.
504DimasMessiasdeCarvalhoeDimasDanieldeCarvalho,DireitodasSucessões—InventárioePartilha,3.ed.,BeloHorizonte:DelRey,2011,p.147-148.
505 “CIVIL. ACÓRDÃO ESTADUAL. NULIDADE NÃO CONFIGURADA. INVENTÁRIO.TESTAMENTO. QUINHÃO DE FILHA GRAVADO COM CLÁUSULA RESTRITIVA DEINCOMUNICABILIDADE.HABILITAÇÃODESOBRINHOSENETOS.DISCUSSÃOSOBREASUAEXTINÇÃOEMFACEDACLÁUSULA,PELOÓBITO,ANTERIOR,DAHERDEIRA,ABENEFICIAROCÔNJUGESUPÉRSTITE.PREVALÊNCIADADISPOSIÇÃOTESTAMENTÁRIA.CC,ARTS.1676E1666.
I. A interpretação da cláusula testamentária deve, o quanto possível, harmonizar-se com a real vontade dotestador,emconsonânciacomoart.1.666doCódigoCivilanterior.
II. Estabelecida, pelo testador, cláusula restritiva sobre o quinhão da herdeira, de incomunicabilidade,inalienabilidadee impenhorabilidade,o falecimentodelanãoafastaaeficáciadadisposição testamentária,desortequeprocedeopedidodehabilitação,noinventárioemquestão,dossobrinhosdadecujus.
III. Recurso especial conhecido e provido” (STJ, REsp 246693/SP, Recurso Especial 2000/0007811-5, Rel.Min.RuyRosadodeAguiar,4.ªTurma,j.4-12-2001,DJ,17-5-2004,p.228).
506 “Súmula n. 49 — 13/12/1963 — Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo TribunalFederal — Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 49. Cláusula deInalienabilidade—ComunicabilidadedosBens.Acláusulade inalienabilidadeincluia incomunicabilidadedosbens.”
507 “DIREITO DAS SUCESSÕES. REVOGAÇÃO DE CLÁUSULAS DE INALIENABILIDADE,
INCOMUNICABILIDADE E IMPENHORABILIDADE IMPOSTAS POR TESTAMENTO. FUNÇÃOSOCIALDAPROPRIEDADE.DIGNIDADEDAPESSOAHUMANA.SITUAÇÃOEXCEPCIONALDENECESSIDADE FINANCEIRA. FLEXIBILIZAÇÃO DA VEDAÇÃO CONTIDA NO ART. 1.676 DOCC/16.POSSIBILIDADE.
1. Se a alienação do imóvel gravado permite uma melhor adequação do patrimônio à sua função social epossibilitaaoherdeirosuasobrevivênciaebem-estar,acomercializaçãodobemvaiaoencontrodopropósitodo testador, que era, em princípio, o de amparar adequadamente o beneficiário das cláusulas deinalienabilidade,impenhorabilidadeeincomunicabilidade.
2.Avedaçãocontidanoart.1.676doCC/16poderáseramenizadasemprequeforverificadaapresençadesituaçãoexcepcionaldenecessidadefinanceira,aptaarecomendara liberaçãodasrestrições instituídaspelotestador.
3.Recursoespecialaquesenegaprovimento”(STJ,REsp1158679/MG,RecursoEspecial2009/0193060-5,Rel.Min.NancyAndrighi,j.7-4-2011,DJe,15-4-2011,RBDFS,v.22,p.130).
508“USUCAPIÃO.Bemcomcláusulade inalienabilidade.Testamento.Art.1.676doCCivil.Obemobjetodelegadocomcláusuladeinalienabilidadepodeserusucapido.Peculiaridadedocaso”(STJ,REsp418945/SP,Recurso Especial 2002/0026936-3, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 15-8-2002,DJ, 30-9-2002, p. 268;RMP,v.19,p.466;RSTJ,v.166,p.442).
509“Direitocivileprocessualcivil.Sucessões.Recursoespecial.Arrolamentodebens.Testamentofeitosoba vigência do CC/16. Cláusulas restritivas apostas à legítima. Inalienabilidade, impenhorabilidade eincomunicabilidade. Prazo de um ano após a entrada em vigor do CC/02 para declarar a justa causa darestriçãoimposta.Aberturadasucessãoantesdefindooprazo.Subsistênciadogravame.Questãoprocessual.Fundamentodoacórdãonãoimpugnado.
—Conformedicçãodoart.2.042c/cocaputdoart.1.848doCC/02,deveotestadordeclararnotestamentoajustacausadacláusularestritivaapostaàlegítima,noprazodeumanoapósaentradaemvigordoCC/02;nahipótesedeotestamentotersidofeitosobavigênciadoCC/16eabertaasucessãonoreferidoprazo,enãotendoatéentãootestadorjustificado,nãosubsistiráarestrição.
—Aotestadorsãoasseguradasmedidasconservativasparasalvaguardaralegítimadosherdeirosnecessários,sendo que na interpretação das cláusulas testamentárias deve-se preferir a inteligência que faz valer o ato,àquelaqueoreduzàinsubsistência;porisso,deve-seinterpretarotestamento,depreferência,emtodaasuaplenitude,desvendandoavontadedotestador,libertando-odaprisãodaspalavras,paraatendersempreasuarealintenção.
—Contudo,apresentelidenãocobrajuízointerpretativoparadesvendaraintençãodatestadora;ojulgamentoéobjetivo,sejaconcernenteàépocaemquedispôsdasuaherança,sejarelativoaomomentoemquedeveriaaditarotestamento,istoporqueveioaóbitoaindadentrodoprazolegalparacumpriradeterminaçãolegaldo
art.2.042doCC/02,oquenãoocorreu,e,porisso,nãohácomoesquadrinharasuaintençãonos3mesesqueremanesciamparacumpriradicçãolegal.
—Nãohouvedescompasso, tampoucodescumprimento,porparteda testadora,comoart.2.042doCC/02,conjugadocomoart. 1.848domesmoCódigo, istoporque foi colhidapor fato jurídico—morte—que lheimpediudecumpririmposiçãolegal,quesóaelacabia,emprazoqueaindanãosefindara.
—O testamento é a expressão da liberdade no direito civil, cuja força é o testemunhomais solene emaisgravedavontadeíntimadoserhumano.
—Aexistênciadefundamentodoacórdãorecorridonãoimpugnado,quandosuficienteparaamanutençãodesuas conclusões em questão processual, impede a apreciação do recurso especial no particular. Recursoespecialprovido”(STJ,REsp1049354/SP,RecursoEspecial2008/0083708-6,Rel.Min.NancyAndrighi,j.18-8-2009,DJe,8-9-2009;RIOBDF,v.56,p.146).
510 Confira-se o subtópico 3.2 (“Justa Causa para Gravação de Bens da Legítima”) do Capítulo XI(“SucessãoLegítima”)dopresentevolume.
511 “Em nosso direito não há legados universais, como no direito francês, e, consequentemente, não hálegatáriosuniversais.Nodireitopátriotodolegadoconstituiliberalidademortiscausaatítulosingular”(CarlosRobertoGonçalves,DireitoCivilBrasileiro—DireitodasSucessões, 5. ed., SãoPaulo: Saraiva, 2011, p.359.v.VII).
512“Ainstituiçãodelegadosdetodaaherançasomenteépossívelsenãohouverherdeirosnecessários,masqualquer parte remanescente da herança, não alcançada por eles, continua sob a titularidade dos herdeiroslegítimos,queaadquiriramporforçadasaisine, inclusiveaFazendaPública” (PauloLôbo,DireitoCivil—Sucessões,SãoPaulo:Saraiva,2013,p.255-256).
513CarlosRobertoGonçalves,DireitoCivilBrasileiro,5.ed.,SãoPaulo:Saraiva,2011,p.360-361.v.VII.
514Novamente, confira-se o subtópico 4.6 (“Princípio doRespeito àVontadeManifestada”) doCapítulo II(“PrincipiologiadoDireitodasSucessões”)destevolume.
515CarlosRobertoGonçalves,DireitoCivilBrasileiro,cit.,p.361.
516Confira-se,apropósito,oart.1.678doCódigoCivilbrasileirode1916:
“Art. 1.678. É nulo o legado de coisa alheia.Mas, se a coisa legada, não pertencendo ao testador, quandotestou,sehouverdepoistornadosua,porqualquertítulo,teráefeitoadisposição,comosesuafosseacoisa,aotempoemqueelefezotestamento”.
517PauloLôbo,DireitoCivil—Sucessões,SãoPaulo:Saraiva,2013,p.255.
518Confira-seotópico5(“OTestamenteiro”)doCapítuloXIII(“SucessãoTestamentária”)destevolume.
519 “Inexistindo a indicação de quem deve dar cumprimento ao legado, cabe aos herdeiros a execução”(MariaBereniceDias,ManualdasSucessões,3.ed.SãoPaulo:RevistadosTribunais,2013,p.405).
520 “Art. 1.934. No silêncio do testamento, o cumprimento dos legados incumbe aos herdeiros e, não oshavendo,aoslegatários,naproporçãodoqueherdaram.
Parágrafo único. O encargo estabelecido neste artigo, não havendo disposição testamentária em contrário,caberáaoherdeirooulegatárioincumbidopelotestadordaexecuçãodolegado;quandoindicadosmaisdeum,osoneradosdividirãoentresioônus,naproporçãodoquerecebamdaherança.”
521Confira-seotópico7(“Pagamento”)destecapítulo.
522 Sobre o tema, confira-se o subtópico 2.1.2 (“Obrigações de Dar Coisa Incerta”) do Capítulo V(“ClassificaçãoBásicadasObrigações”)dov.II(“Obrigações”)destacoleção.
523“Art.1.937.Acoisalegadaentregar-se-á,comseusacessórios,nolugareestadoemqueseachavaaofalecerotestador,passandoaolegatáriocomtodososencargosqueaonerarem.”
524Nomesmosentido,observaPauloLôbo:
“Hálegadosdecoisas,dedireitosreais,dedireitospessoais,deações,deprestaçõesdefazer,decrédito,dedívida,debensalternativos,dealimentos.Apluralidadedemodosde legadoscontinuacomoregranodireitoatual, mas as referências contidas na lei consideram-se como exemplificativas. O Código Civil poderia teravançadoesuprimidoasreferênciasaessesmodos,regulando-osdemodogenéricoedeixandoaotestadoradiscricionariedadeparatal,salvoassituaçõesvedadas”(DireitoCivil—Sucessões,cit.,p.255).
525Ovigentetextolegalédemaiorapurotécnicodoqueorevogado,poisanormacorrespondente(art.1.685doCC/1916)afirmavaqueo“legadodecrédito,oudequitaçãodadívida,valerátãosomente”,enão,comono transcrito art. 1.918, “terá eficácia somente” (ambos os grifos são nossos). De fato, a questão secompreende no plano da eficácia do negócio jurídico, e não no plano da validade. Sobre a importância dosplanosdonegóciojurídicotestamentário,confira-seoCapítuloXIII(“SucessãoTestamentária”)destevolume.
526Confira-seoCapítuloVII(“VocaçãoHereditária”)destevolume.
527“Art.1.919.Nãoodeclarandoexpressamenteo testador,nãose reputarácompensaçãodasuadívidaolegadoqueele façaaocredor”.Sobreapossibilidadedaautonomiadavontaderestringiracompensaçãodecréditos, confira-se o tópico 4 (“Hipóteses de impossibilidade de compensação”) do Capítulo XV(“Compensação”)dov.II(“Obrigações”)destacoleção.
528Sobrebenfeitorias,confira-seaalíneae (“asbenfeitorias”)do subtópico4.2.1 (“ClassificaçãodosBensAcessórios”)doCapítuloVIII(“BensJurídicos”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção.
529 Confira-se o subtópico 4.1 (“Princípio da Saisine”) do Capítulo II (“Principiologia do Direito dasSucessões”)destevolume.
530Sobreotema,releia-seoCapítuloXIII(“SucessãoTestamentária”)destevolumeeconfira-seoCapítuloXV(“PlanodeEficáciadoNegócioJurídico”)dov.I(“ParteGeral”)destaobra.
531Sobreo temados juros, confira-seo tópico3 (“Juros”)doCapítuloXXIII (“Perdas eDanos”)dov. II(“Obrigações”)destacoleção.
532“Art.244.Nascoisasdeterminadaspelogêneroepelaquantidade,aescolhapertenceaodevedor, seocontrárionãoresultardotítulodaobrigação;masnãopoderádaracoisapior,nemseráobrigadoaprestaramelhor.”
533CódigoCivil:“Art.1.933.Seoherdeiroou legatárioaquemcouberaopçãofalecerantesdeexercê-la,passaráestepoderaosseusherdeiros”.
534 Sobre o tema, confira-se o tópico 1 (“Sentido da Expressão ‘Pagamento’ e seus ElementosFundamentais”) do Capítulo VIII (“Teoria do Pagamento— Condições Subjetivas e Objetivas”) do v. II(“Obrigações”)destacoleção.
535Reveja-seotópico3(“Sujeitos”)destecapítulo.
536 “Quem cumpre o legado é o herdeiro, ao qual cometa o testador o encargo. Se incumbiu alguns,
designadamente,devemocumprimento,comoemDireitoRomanojáseestabelecia(hereditaseosobrigat),respondendo na proporção dos respectivos quinhões. O princípio sobrevive no moderno, numa espécie derevivescênciadaantigacautiomuciana, assentandoaindaque senão for feita adesignaçãodosobrigados,todososherdeirosinstituídosresponderãoporele,proporcionalmenteaoqueherdarem(novoCódigoCivil,art.1.934). Equivalendo o legado a um direito de crédito do legatário, há um sujeito passivo, contra o qual seexerce, e que varia conforme à natureza do objeto, exigível de um só herdeiro, do testamenteiro, de outrolegatário,deváriosherdeirosoudetodos,conformesetratedaentregadeumacoisaoudaprestaçãodeumfato,oponívelaumouaoutro,ouatodos”(CaioMáriodaSilvaPereira,InstituiçõesdeDireitoCivil,17.ed.,RiodeJaneiro:Forense,2010,p.260-261.v.6).
537Confira-seoCapítuloV(“AceitaçãoeRenúnciadaHerança”)destevolume.
538“Art.553.Odonatárioéobrigadoacumprirosencargosdadoação,casoforemabenefíciododoador,deterceiro,oudointeressegeral.
Parágrafo único. Se desta última espécie for o encargo, o Ministério Público poderá exigir sua execução,depoisdamortedodoador,seestenãotiverfeito.”
Sobreo tema,confira-seosubtópico9.2 (“DoaçãocontemplativaxDoação remuneratória”)doCapítulo IV(“Doação”)doTomoII(“ContratosemEspécie”)dov.IV(“Contratos”)destacoleção.
539“Art.1.939.Caducaráolegado:
I—se, depois do testamento, o testadormodificar a coisa legada, aopontode já não ter a formanem lhecaberadenominaçãoquepossuía;
II—seotestador,porqualquertítulo,alienarnotodoouemparteacoisalegada;nessecaso,caducaráatéondeeladeixoudepertenceraotestador;
III—seacoisaperecerouforevicta,vivooumortootestador,semculpadoherdeirooulegatárioincumbidodoseucumprimento;
IV—seolegatárioforexcluídodasucessão,nostermosdoart.1.815;
V—seolegatáriofalecerantesdotestador.”
540FlávioTartuceeJoséFernandoSimão,DireitoCivil,5.ed.,RiodeJaneiro:Forense;SãoPaulo:Método,2012,p.372.v.6.
541Sobreotema,confira-seoCapítuloXIII(“Evicção”)dotomoI(“TeoriaGeral”)dov.IV(“Contratos”)destacoleção.
542 Confira-se o tópico 2 (“Exclusão por Indignidade”) do Capítulo VIII (“Excluídos da Sucessão”) dopresentevolume.
543“AçãodeAbertura,RegistroeCumprimentodeTestamento.Premoriênciada legatária.Caducidadedo
legado.Nãocabedireitoderepresentaçãonasucessãotestamentária.Inteligênciadoart.1.939,V,doCódigoCivil.Recursoimprovido”(TJSP,APL276749520108260100/SP0027674-95.2010.8.26.0100,Rel.LuizAntonioCosta,j.3-10-2012,7.ªCâmaradeDireitoPrivado,datadepublicação:5-10-2012).
“Agravo de instrumento. Inventário. Declaração e caducidade de cláusulas do testamento. Pretensão doagravanteemverdeclaradaválidaarevogaçãoparcialdotestamento.Declaraçõesdevontadeposterioresdatestadora. Doação de bem elencado no testamento e posterior transmissão a terceiro. Impossibilidade demeaçãooupartilhadessebemimóvel.Demonstraçãodevontadedequesuapensãofosserecebidaporoutrosfamiliares,anteofalecimentodeseuirmão.Apenascomrelaçãoàcláusula4. aéquemerecesermantidaadeclaração de caducidade, ante a ausência de comprovação de nova intenção, posterior ao testamento e apremoriênciadofavorecido.Recursoparcialmenteprovido”(TJSP,Ag.994080462346/SP,Rel.FábioQuadros,j.13-5-2010,4.ªCâmaradeDireitoPrivado,publicadoem19-5-2010).
544ArmandodeFreitasRibeiroGonçalvesCoimbra,ODireitodeAcrescernoNovoCódigoCivil,Coimbra:Almedina,1974,p.41-43.
545ArmandodeFreitasRibeiroGonçalvesCoimbra,ob.cit.,p.43.
546 O direito de acrescer também poderá ser encontrado em outros campos do Direito Civil, conformepodemos notar a partir da leitura dos seguintes dispositivos, referentes à doação e ao usufruto,respectivamente:
“Art.551.Salvodeclaraçãoemcontrário,adoaçãoemcomumamaisdeumapessoaentende-sedistribuídaentreelasporigual.Parágrafoúnico.Seosdonatários,emtalcaso,foremmaridoemulher,subsistiránatotalidadeadoaçãoparaocônjugesobrevivo”.
“Art.1.411.Constituídoousufrutoemfavordeduasoumaispessoas,extinguir-se-áaparteemrelaçãoacadaumadasquefalecerem,salvose,porestipulaçãoexpressa,oquinhãodessescouberaosobrevivente”(grifamos).
547 Código Civil: “Art. 1.943. Se um dos coerdeiros ou colegatários, nas condições do artigo antecedente,morrerantesdotestador;serenunciaraherançaoulegado,oudestesforexcluído,e,seacondiçãosobaqualfoiinstituídonãoseverificar,acresceráoseuquinhão,salvoodireitodosubstituto,àpartedoscoerdeirosoucolegatáriosconjuntos.Parágrafoúnico.Oscoerdeirosoucolegatários,aosquaisacresceuoquinhãodaqueleque não quis ou não pôde suceder, ficam sujeitos às obrigações ou encargos que o oneravam”. Esta regrasegueamesmainspiraçãoconstantenasnormasanteriores,segundoaqualodireitodeacrescerseráinvocadoquandonãoespecificadooquinhãoouodireitodecadasucessorinstituído.
548OrlandoGomes,Sucessões,12.ed.,RiodeJaneiro:Forense,2004,p.149.
549“Art.1.944.Quandonãoseefetuaodireitodeacrescer,transmite-seaosherdeiroslegítimosaquotavagadonomeado.Parágrafoúnico.Nãoexistindoodireitodeacrescerentreoscolegatários,aquotadoquefaltaracresceaoherdeiroouaolegatárioincumbidodesatisfazeresselegado,ouatodososherdeiros,naproporçãodosseusquinhões,seolegadosededuziudaherança.”
550SílvioVenosa,DireitoCivil—DireitodasSucessões,3.ed.,SãoPaulo:Atlas,2003,p.262.v.7.
551TJRS: “APELAÇÃOCÍVEL. INVENTÁRIO.EXTINÇÃO.LEGADODEUSUFRUTO.DOAÇÃOPOSTERIOR DO IMÓVEL (NUA PROPRIEDADE) AOS FILHOS. ALIENAÇÃO DA COISALEGADA.CADUCIDADEDOLEGADO.ART.1.939DOCC.1)Havendooautordaherançaem1998doado a seus filhos o imóvel que lhe pertencia, reservando-se o usufruto vitalício, correta a conclusãosentencial de que caducou o legado de usufruto testado em 1994 à autora (alienação da coisa legada, art.1.939, II, CCB). 2) Inexistência de outros bens a inventariar que assinala o acerto da decisão extintiva doinventário. APELAÇÃO DESPROVIDA” (TJRS, Ap. Cív. 70044654671, 8.ª Câmara Cível, Rel. RicardoMoreiraLinsPastl,j.20-10-2011).
552Denomina-se “nu-proprietário” o titular do direito real de propriedade que suporta o usufruto instituído.Exemplo:deixoaminhacasaparaPedro,eo legadodousufrutodacasaparaJosé.Joséé“usufrutuário”ePedro“nu-proprietário”.
553PabloStolzeGaglianoeRodolfoPamplonaFilho,NovoCursodeDireitoCivil—ParteGeral,15.ed.,SãoPaulo:Saraiva,2013,p.430.v.I.
Nessesentido,prelecionaCARLOSALBERTOBITTAR:“dá-seareduçãodenegóciosinválidosquandoacausadenulidadeoudeanulabilidaderesideemelementonãoessencialdeseucontexto.Nessahipótese,tem-seporválidoonegócio,aplicando-seoprincípiodaconservação,àluzdavontadehipotéticaouconjectural,daspartes.Assim,naanálisedasituaçãoconcreta,seseconcluirqueosinteressadosoteriamrealizadonapartenãoatingidapelainvalidade,prosperaonegócio,extirpadaadisposiçãoafetada”(CursodeDireitoCivil,RiodeJaneiro:Forense,1999,p.170.v.1).
554 FranciscoCahali eGiseldaMaria FernandesNovaesHironaka,Curso Avançado deDireito Civil —DireitodasSucessões,2.ed.,SãoPaulo:RevistadosTribunais,2003,p.57.v.6.
555 “Art. 1.968. Quando consistir em prédio divisível o legado sujeito a redução, far-se-á esta dividindo-oproporcionalmente.
§1.ºSenãoforpossíveladivisão,eoexcessodolegadomontaramaisdeumquartodovalordoprédio,olegatáriodeixaráinteironaherançaoimóvellegado,ficandocomodireitodepediraosherdeirosovalorquecoubernapartedisponível;seoexcessonãofordemaisdeumquarto,aosherdeirosfarátornaremdinheiroolegatário,queficarácomoprédio.
§2.ºSeolegatárioforaomesmotempoherdeironecessário,poderáinteirarsualegítimanomesmoimóvel,depreferênciaaosoutros,semprequeelaeapartesubsistentedolegadolheabsorveremovalor.”
556MariaHelenaDiniz,Curso deDireitoCivilBrasileiro—Direito das Sucessões, 25. ed., SãoPaulo:Saraiva,2011,v.6,p.293-294.
557Veja-seosubtópico7.2(“Colações”)doCapítuloXXIII(“Inventário”)destevolume.
558PabloStolzeGagliano,OContratodeDoação,3.ed.,SãoPaulo:Saraiva,2010,p.60-63(mantivemososrodapésoriginais).
559PauloLuizNettoLôbo,ComentáriosaoCódigoCivil—ParteEspecial—DasVáriasEspécies deContrato,coord.AntonioJunqueiradeAzevedo,SãoPaulo:Saraiva,2003,p.334.v.6.
560Retornaremosaoproblemadovalordadoaçãoquandotratarmosdoinstitutojurídicodacolação.Confira-se,apropósito,osubtópico7.2(“Colações”)doCapítuloXXIII(“Inventário”)destevolume.
561 Luiz Edson Fachin e Carlos Eduardo Pianovski, Uma contribuição crítica que se traz à Colação, inQuestõesControvertidas—noDireitodeFamíliaedasSucessões,SãoPaulo:Método,2005,p.453.v.3.
562Namesmalinha,oCódigoCivilportuguês:“Art.2.104.º1.Osdescendentesquepretendementrarnasucessãodoascendentedevemrestituiràmassadaherança,para igualaçãodapartilha,osbensouvaloresquelhesforamdoadosporeste:estarestituiçãotemonomedecolação”.
563ClóvisBeviláqua,DireitodasSucessões,4.ed.,RiodeJaneiro-SãoPaulo:FreitasBastos,1945,p.323.
564Tambémnesse sentido, os amigosTartuce eSimão,DireitoCivil, 5. ed.,Rio de Janeiro: Forense; SãoPaulo:Método,2012,p.380.v.6.
565ClóvisBeviláqua,ob.cit.,p.324.
566SílvioVenosa,DireitoCivil—DireitodasSucessões,3.ed.,SãoPaulo:Atlas,2003,p.278.v.7.
567Relembrando,conformeliçãodeMarceloTruzziOtero,“oherdeirosemprereceberáatítulouniversal,istoé, a totalidade do patrimônio ou fração ideal dele (metade, um terço, um quinto). O legatário recebe bemdestacado,singularizado,extraídodauniversalidade,como,porexemplo,umacasaouumveículoespecificadopeloautordaherançaemtestamento(JustaCausaTestamentária—Inalienabilidade,ImpenhorabilidadeeIncomunicabilidadesobreaLegítimadoHerdeiroNecessário,PortoAlegre:LivrariadoAdvogado,2012,p.21-22).
568FlávioTartuceeFernandoSimão,ob.cit.,p.382.
569OrlandoGomes,sobreotema,afirmava:“Onúmerodesubstituídosedesubstitutosconsenteasseguintescombinações:a)singulisingulis.B)unusinlocumplurium;c)plurisinlocumunius;d)plurisindocumplurium”, esclarecendo em seguida: “quando, respectivamente, uma pessoa substitui outra, substitui várias,vários a substituem, ou uma pluralidade substitui outra pluralidade” (Sucessões, 12. ed., Rio de Janeiro:Forense,2004,p.186-187).
570OrlandoGomes,ob.cit.,p.190.
571SílvioVenosa,ob.cit.,p.278.
572ArthurVascoItabaianadeOliveira,CursodeDireitodasSucessões,2.ed.,RiodeJaneiro:Andes,1954,p.192.
573“Art.1.959.Sãonulososfideicomissosalémdosegundograu.”
574FlávioTartuceeJoséFernandoSimão,ob.cit.,p.388.
575Poroutrolado,conformedispõeoart.1.958,caducaráofideicomissoseofideicomissáriomorrerantesdofiduciário,ouantesderealizar-seacondiçãoresolutóriadodireitodesteúltimo;nessecaso,apropriedadeconsolida-senofiduciário,nostermosdoart.1.955.
576OrlandoGomes, ob. cit., p. 195-196.Nesse ponto da sua obra, o brilhante civilista passa em revista asteoriasexplicativasdessaformadesubstituiçãotestamentáriasucessiva(teoriasdatitularidadetemporária,darelaçãomodaledatransmissãodiferida),cujaleituraaquirecomendamos.
577Ofideicomissodeve,inclusive,seraverbadonoRegistroImobiliário,àluzdaLein.6.015,de1973(LeideRegistros Públicos), cujo art. 167 dispõe: “No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos:
(Renumerado do art. 168 com nova redação pela Lei n. 6.216, de 1975.) (...) II — a averbação:
(RedaçãodadapelaLein.6.216,de1975.)(...)11)dascláusulasdeinalienabilidade,impenhorabilidadeeincomunicabilidadeimpostasaimóveis,bemcomodaconstituiçãodefideicomisso”(grifamos).
578 Robson de Alvarenga, Fideicomisso. Disponível em: <http://www.irib.org.br/html/boletim/boletim-iframe.php?be=1194>.Acessoem:30jul.2013.
579 “Direito processual e civil. Sucessões. Recurso especial. Disposição testamentária de última vontade.Substituição fideicomissária.Morte do fideicomissário.Caducidadedo fideicomisso.Obediência aos critériosdasucessãolegal.Transmissãodaherançaaosherdeiroslegítimos,inexistentesosnecessários.
—Nãoseconhecedo recursoespecialquantoàquestãoemqueaorientaçãodoSTJse firmounomesmosentidoemquedecididopeloTribunaldeorigem.
—A substituição fideicomissária caduca se o fideicomissário morrer antes dos fiduciários, caso em que apropriedadedestesconsolida-se,deixando,assim,deserrestritaeresolúvel(arts.1.955e1.958doCC/02).
—Afastadaahipótesedesucessãopordisposiçãodeúltimavontade,oriundadoextintofideicomisso,e,porconsequência,consolidando-seapropriedadenasmãosdosfiduciários,ofalecimentodeumdestessemdeixartestamentoimpõeestritaobediênciaaoscritériosdasucessãolegal,transmitindo-seaherança,desdelogo,aosherdeiroslegítimos,inexistindoherdeirosnecessários.
Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido” (STJ,REsp 820814/SP,RecursoEspecial2006/0031403-9,Rel.Min.NancyAndrighi,3.ªTurma,j.9-10-2007,DJ,25-10-2007,p.168).
580Sobreo“direitodeacrescer”,veja-seoCapítuloXIX(“DireitodeAcrescereReduçãodasDisposiçõesTestamentárias”)destevolume.
581EmnossoCódigoCivil:
“Art. 1.956. Se o fideicomissário aceitar a herança ou o legado, terá direito à parte que, ao fiduciário, emqualquertempoacrescer.
Art. 1.957. Ao sobrevir a sucessão, o fideicomissário responde pelos encargos da herança que aindarestarem”.
582CódigoCivil,art.1.394:“Ousufrutuáriotemdireitoàposse,uso,administraçãoepercepçãodosfrutos”.
583SílvioVenosa,ob.cit.,p.291-292.
584Sobre o tema, releia-se o tópico 6 (“Da ‘VocaçãoHereditária’ deAnimais eCoisas”) doCapítuloVII(“VocaçãoHereditária”)dopresentevolume.
585ArthurVascoItabaianadeOliveira,ob.cit.,p.192.
586ClóvisBeviláqua,ob.cit.,p.325.
587 Reveja-se, em especial, o Capítulo XIII (“Sucessão Testamentária”), notadamente o subtópico 2.2(“Conceito e Natureza Jurídica”) e o tópico 4 (“Aspectos Relevantes do Plano da Validade Aplicável aoTestamento”)esuassubdivisões,destevolume.
588Confira-seoCapítuloIV(“InvalidadedoNegócioJurídico”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção.
589 Sobre tais reflexões, releia-se o Capítulo VII (“Vocação Hereditária”), notadamente o tópico 6 (“Da‘VocaçãoHereditária’deAnimaiseCoisas”).
590Confira-se,apropósito,osubtópico2.5 (“AlgumasPalavrassobreaCausanosNegóciosJurídicos”)doCapítuloXI(“PlanodeExistênciadoNegócioJurídico”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção.
591“Testamento.Nulidade.Testemunhasquenãopresenciaramamanifestaçãodevontadedotestador.Açãorescisóría.PrecedentesdaCorte.
1. Não presenciando algumas das testemunhas a manifestação de vontade do testador, assinandoposteriormente o testamento, está presente a violação ao art. 1.632, I e II, do Código Civil, procedente,portanto,aaçãodenulidadedotestamento.
2. Recurso especial conhecido e provido” (STJ, REsp 294691/PR, Recurso Especial 2000/0137754-0, Rel.Min.CarlosAlbertoMenezesDireito,3.ªTurma,j.13-3-2001,DJ,7-5-2001,p.140;JBCC,v.191,p.197,Lex-STJ,v.144,p.221;RDJTJDFT,v.66,p.138;RSTJ,v.150,p.311).
592 Confira-se, a propósito, o tópico 2 (“Algumas Palavras sobre Formas Proibidas de Testamento”) doCapítuloXIV(“FormasOrdináriasdeTestamento”)destevolume.
593“Art.1.900.Énulaadisposição:
I—queinstituaherdeirooulegatáriosobacondiçãocaptatóriadequeestedisponha,tambémportestamento,embenefíciodotestador,oudeterceiro;
II—queserefiraapessoaincerta,cujaidentidadenãosepossaaveriguar;
III—quefavoreçaapessoaincerta,cometendoadeterminaçãodesuaidentidadeaterceiro;
IV—quedeixeaarbítriodoherdeiro,oudeoutrem,fixarovalordolegado;
V—quefavoreçaaspessoasaquesereferemosarts.1.801e1.802.”
Sobre o tema, confira-se o capítulo xvii (“disposições testamentárias”), notadamente o tópico 6 (“Sobre aValidadedasCláusulasTestamentárias”),aoqualremetemosoamigoleitor.
594 Em posicionamento assumidamente minoritário, defendem os amigos Flávio Tartuce e José FernandoSimão:
“Deinício,cabeumaobservação,eisqueoprazoemquestãoérealmentedenaturezadecadencial,jáquetratade desconstituição de negócio jurídico, nos termos da lição de Agnelo Amorim Filho. Porém, causa
perplexidadeaoestudiosoimaginarqueotestamento,apesardeserumnegóciojurídico,nãosegueamáxima
milenardePaulopelaqualquodinitiumvitiosumest,nonpotesttractustemporisconvalescere,ouseja,quea nulidade absoluta não convalesce como tempo. Por isso é que entendemos que o dispositivo somente seaplicaànulidaderelativa.Nocasodenulidadeabsolutadotestamento,aaçãocorrespondenteéimprescritível.O nosso entendimento, diga-se de passagem, é minoritário na doutrina” (Flávio Tartuce e José FernandoSimão,DireitoCivil,5.ed.,RiodeJaneiro:Forense;SãoPaulo:Método,2012,p.392-393.v.6).
595 Confira-se o tópico 6 (“Conversão do Negócio Jurídico”) do Capítulo IV (“Invalidade do NegócioJurídico”)dov.I(“ParteGeral”)destacoleção.
596MarcosBernardesdeMello,TeoriadoFatoJurídico—PlanodaValidade,2.ed.,SãoPaulo:Saraiva,1997,p.209.
597CarlosAlbertoBittar,CursodeDireitoCivil,RiodeJaneiro:ForenseUniversitária,1994,v.1,p.171.
598 João Alberto Schützer del Nero,Conversão Substancial do Negócio Jurídico, São Paulo: Renovar,2001,p.299-300.
599KarlLarenz,DerechoCivil—ParteGeneral,Madrid:RevistadeDerechoPrivado,1978,p.643.
600Exemplo de conversão legal, combatido por Pontes deMiranda, é encontrado no art. 1.083 doCC:“aaceitaçãoforadoprazo,comadições,restrições,oumodificações,importaránovaproposta”.Defato,assiste razão ao mestre alagoano, uma vez que a “conversão” da aceitação em proposta, por simplesdeterminaçãolegal,esemconcorrênciadavontadedaspartes,nãopodeserigualadaàfiguradequeseestátratando(cf.MarcosBernardesdeMello,ob.cit.,p.214).
601FlávioTartuceeJoséFernandoSimão,ob.cit.,p.400/401.
602“RECURSOESPECIAL.DIREITOCIVIL.AÇÃODEANULAÇÃODETESTAMENTOPÚBLICO.FORMALIDADES LEGAIS. PREVALÊNCIA DA VONTADE DO TESTADOR. REEXAME DEPROVA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃOCONFIGURADA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MODIFICAÇÃO EM RAZÃO DA REFORMADASENTENÇADEPROCEDÊNCIA.POSSIBILIDADE.AUSÊNCIADEOFENSAAOSARTS.460E515DOCPC.
1.Emmatéria testamentária,a interpretaçãodeveservoltadanosentidodaprevalênciadamanifestaçãodevontadedotestador,orientando,inclusive,omagistradoquantoàaplicaçãodosistemadenulidades,queapenasnãopoderásermitigado,diantedaexistênciade fatoconcreto,passíveldeensejardúvidaacercadaprópriafaculdadequetemotestadordelivrementedisporacercadeseusbens,oquenãosefazpresentenosautos.
2.A verificação da nulidade do testamento, pela não observância dos requisitos legais de validade, exige orevolvimentodosuportefáticoprobatóriodademanda,oqueévedadopelaSúmula07/STJ.
3.Inocorrênciadeviolaçãoaoprincípiodaunidadedoatonotarial(art.1632doCC/16).
4.Recursoespecialdesprovido”(STJ,REsp753261/SP,RecursoEspecial2005/0085361-0,Rel.Min.PaulodeTarsoSanseverino,3.ªTurma,j.23-11-2010,DJe,5-4-2011,Lex-STJ,v.261,p.101).
603Confira-seotópico8(“Caducidade”)doCapítuloXVIII(“Legados”)destevolume.
604MariaHelenaDiniz,Curso deDireitoCivilBrasileiro—Direito das Sucessões, 25. ed., São Paulo:Saraiva,2011,p.307-308.v.6.
605 Confira-se o subtópico “b.1” (“Revogação”) do Capítulo XIV (“Extinção do Contrato”) do v. IV(“Contratos”),tomo1(“TeoriaGeral”)destacoleção.
606“Art.1.969.Otestamentopodeserrevogadopelomesmomodoeformacomopodeserfeito.”
607OrlandoGomes,Sucessões,RiodeJaneiro:Forense,2004,p.236.
608 “DIREITO CIVIL. SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA. CONFLITO DE NORMAS. PRIMAZIA DAVONTADEDOTESTADOR.
I—Nos termosdo artigo1.750doCódigoCivil de1916 (a que correspondeo art. 1.973doCód.Civil de2002) ‘Sobrevindo descendente sucessível ao testador, que o não tinha, ou não o conhecia, quando testou,rompe-seotestamentoemtodasassuasdisposições,seessedescendentesobreviveraotestador’.
II—Nocasoconcreto,onovoherdeiro,quesobreveio,poradoçãopostmortem,jáeraconhecidodotestadorque expressamente o contemplou no testamento e ali consignou, também, a sua intenção de adotá-lo. Apretendidaincidênciaabsolutadoart.1.750doCód.Civilde1916emvezdepreservaravontadeesclarecidadotestador,implicariaasuafrustração.
III—Aaplicaçãodotextodaleinãodeveviolararazãodeserdanormajurídicaqueencerra,masédeserecusar,nocasoconcreto,a incidênciaabsolutadodispositivo legal,a fimdesepreservaramenslegis quejustamenteinspirouasuacriação.
IV—RecursoEspecialnãoconhecido”(STJ,REsp985093/RJ,RecursoEspecial2006/0029886-6,Rel.Min.HumbertoGomesdeBarros,Rel.p/acórdãoMin.SidneiBeneti,3.ªTurma,j.5-8-2010,DJe,24-9-2010,Lex-STJ,v.254,p.117).
609 “CIVIL E PROCESSUAL. INVENTÁRIO. NULIDADE DE TESTAMENTO ARGUIDA PELOINVENTARIANTE. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. MATÉRIA NÃO PREQUESTIONADA.SÚMULAS NS. 282 E 356-STF. RESERVA DA LEGÍTIMA. BENS DISPONÍVEIS DEIXADOS ATERCEIRAPESSOA.NASCIMENTODENOVONETODODECUJUSAPÓSAREALIZAÇÃODOTESTAMENTO. PREEXISTÊNCIA DE OUTROS HERDEIROS DA MESMA QUALIDADE.NULIDADEDOATONÃOCONFIGURADA.CÓDIGOCIVIL,ART.1.750.EXEGESE.
I.Ausênciadeprequestionamentoacercadanulidadeprocessualimpeditivadaadmissibilidaderecursalsobtalaspecto,aoteordasSúmulasns.282e356doC.STF.
II.Constituicondiçãoestabelecidanoart.1.750doCódigoCivil,paraorompimentodotestamento,nãopossuirounãoconhecerotestador,aotempodoatodedisposição,qualquerdescendentesucessível,desortequeseelejápossuíavários,comonocasodosautos,onascimentodeumnovonetonãotornainválidootestamentodebensintegrantesdapartedisponívelaterceirapessoa.
III. Recurso especial não conhecido” (STJ, REsp 240720/SP, Recurso Especial 1999/0109814-9, Rel.Min.AldirPassarinhoJunior,4.ªTurma,j.21-8-2003,DJ,6-10-2003,p.273,RSTJ,v.185,p.403).
610 “RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSO CIVIL. HERDEIRO NETO. SUCESSÃO PORREPRESENTAÇÃO. TESTAMENTO. RUPTURA. ART. 1.973 DO CC/2002. NÃO OCORRÊNCIA.LEGADO.DIREITODEACRESCERPOSSIBILIDADE.RECURSONÃOCONHECIDO.
1.Não se conhecedo recurso quanto à alegada divergência, namedida emque se olvidouo recorrente donecessário cotejo analítico entre os julgados tidos por confrontantes, deixando, com isso, de demonstrar anecessáriasimilitudefáticaentreosarrestos,conformeexigênciacontidanoparágrafoúnicodoartigo541doCódigodeProcessoCivile§2.ºdoartigo255doRISTJ.
2.Não se há falar emofensa ao artigo535, incisos I e II, doCódigodeProcessoCivil, porquanto ausentequalqueromissão,obscuridadeoucontradiçãonoacórdãoguerreado.
3.‘Comefeito,quandoaleifalaemsuperveniênciadedescendentesucessível,comocausadeterminantedacaducidadedotestamento,levaemconsideraçãoofatodequeseusurgimentoaltera,porcompleto,aquestãorelativaàs legítimas.Aqui, talnãoocorreu, jáqueresguardou-sea legítimadofilhoe,consequentemente,doneto.’
4.Nãohavendodeterminaçãodosquinhões,subsisteodireitodeacresceraocolegatário,nostermosdoartigo1.712doCódigode1916.
5.Recursonãoconhecido”(STJ,REsp594535/SP,RecursoEspecial2003/0167072-8,Rel.Min.HélioQuagliaBarbosa,4.ªTurma,j.19-4-2007,DJ,28-5-2007,p.344).
611OrlandoGomes,ob.cit.,p.246-247.
612OrenomadoprocessualistaFredieDidierJúniorpediuqueescrevêssemosarespeito.
613“Quemtempatrimôniodevesepreocuparcomaformacomoseusbensserãotransmitidosaosherdeirosapós sua partida. Por mais que pensar na própria morte não seja exatamente empolgante, processos deinventário podem ser longos, complicados e caros, principalmente quando há conflitos entre membros dafamília. Para garantir o bem-estar dos seus entes queridos quando você já não estiver mais por aqui,especialistas em planejamento financeiro recomendam o chamado planejamento sucessório” (6 formas detransferir seus bens aos herdeiros ainda em vida, Julia Wiltgen. Disponível em:http://exame.abril.com.br/seu-dinheiro/aposentadoria/noticias/6-formas-de-transferir-seus-bens-aos-herdeiros-ainda-em-vida?page=4.Acessoem:27out.2013).
614 Daniel Monteiro Peixoto, Sucessão Familiar e Planejamento Tributário I, in Estratégias Societárias,Planejamento Tributário e Sucessório, coord. Roberta Nioac Prado, Daniel Monteiro Peixoto e EuricoMarcosDinizdeSanti,2.ed.,SãoPaulo:Saraiva-FGV,2011,p.138.
615 Jane Resina F. de Oliveira, A Importância do Planejamento Sucessório I. Disponível em:<http://www.portaltudoemfamilia.com.br/cms/?p=874>.Acessoem:27out.2013.
616Paraumaprofundamentodo tema,porém, sugerimosa leituradosCapítulosXIII (“RegimedeBensdoCasamento:NoçõesIntrodutóriasFundamentais”),XIV(“RegimedeBensdoCasamento:ComunhãoParcialdeBens”),XV(“RegimedeBensdoCasamento:ComunhãoUniversaldeBens”),XVI(“RegimedeBensdoCasamento:SeparaçãoConvencionaldeBens”)eXVII(“RegimedeBensdoCasamento:ParticipaçãoFinalnosAquestos”)dov.VI(“DireitodeFamília”)destacoleção.
617Namesmalinha,emcasodeuniãoestável:
“Art.1.725.Nauniãoestável,salvocontratoescritoentreoscompanheiros,aplica-seàsrelaçõespatrimoniais,noquecouber,oregimedacomunhãoparcialdebens”.
618SílviodeSalvoVenosa,DireitoCivil—DireitodeFamília,3.ed.,SãoPaulo:Atlas,2003,p.360.
619MariaBereniceDias,Manual deDireito dasFamílias, PortoAlegre: Livraria doAdvogado, 2005, p.228.
620 “Art. 1.673. Integram o patrimônio próprio os bens que cada cônjuge possuía ao casar e os por eleadquiridos, a qualquer título, na constância do casamento. Parágrafo único. A administração desses bens éexclusivadecadacônjuge,queospoderálivrementealienar,seforemmóveis.”
621 E esse direito de meação (incidente no patrimônio comum onerosamente adquirido pelo casal) é tãoimportante que, a teor do art. 1.682, não é renunciável, cessível ou penhorável na vigência do regimematrimonial.Trata-se,inequivocamente,deumanormadeordempública,inalterávelpelavontadedaspartes.
622Uma compreensão principiológica do instituto pode, inclusive, levar ao reconhecimento de sua eventualinconstitucionalidade. Sobre o tema, confira-se, neste volume, o Capítulo II (“Principiologia do Direito das
Sucessões”), notadamente o subtópico 3.2 (“Igualdade”) e, ainda, em especial, o tópico 7 (“Regime Legal
Obrigatório”)doCapítuloXIII(“RegimedeBensdoCasamento:NoçõesIntrodutóriasFundamentais”)dov.VI(“DireitodeFamília”)destacoleção.
623 Roberta Nioac Prado, Fraude à Meação do Cônjuge, Dissolução Societária e Medidas Processuais(PriscilaMariaPereiraCorrêaFonseca,RobertaNioacPrado,DeborahKirschbaumeKarimeCostalunga),inEstratégias Societárias, Planejamento Tributário e Sucessório, coord. Roberta Nioac Prado, DanielMonteiroPeixotoeEuricoMarcosDinizdeSanti,2.ed.,SãoPaulo:Saraiva-FGV,2011,p.273.Trata-sedeumabelaobraconjunta,querecomendamosparaoestudodoplanejamentosucessório.
624 Complementa a proposta de estudo do planejamento sucessório, especialmente, o nosso Capítulo XI,dedicadoà“SucessãoLegítima”,paraoqualremetemosonossoestimadoamigoleitor.
625 Ressalvada a hipótese de um testamento haver dado destinação diversa à metade disponível, toda aherançatocaráodescendente.
626CódigoCivil,art.1.833:“Entreosdescendentes,osemgraumaispróximoexcluemosmaisremotos,salvoodireitoderepresentação”(dispositivosemequivalentediretonoCC/1916).Nesteúltimocaso,herdandopordireitoderepresentação,sucederão“porestirpe”(art.1.835doCC/2002),conformefoivistonoCapítuloXII(“DireitodeRepresentação”),aoqualremetemosoamigoleitor.E,nessecontexto,valeobservaraindaqueosdescendentes de umamesma classe (filhos do falecido, por exemplo) têm, por óbvio, osmesmos direitos àsucessãodoseuascendente,naperspectivadoprincípiodaigualdade,eateordoart.1.834doCódigoCivilde2002(quebaniuaanacrônicaregra—evidentementenãorecepcionadapelaordemconstitucional—doart.1.610doCC/1916,queestabeleciaque“quandoodescendenteilegítimotiverdireitoàsucessãodoascendente,haverádireitooascendenteilegítimoàsucessãododescendente”).
627O legisladorerrouao fazer remissãoaoart.1.640 (que tratada regrado regime legal supletivo),poisareferênciacorretadeveseraoart.1.641,quetratadashipótesesderegimeobrigatóriodeseparaçãodebens.
628 “CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO EMMANDADODE SEGURANÇA. SUCESSÃO LEGÍTIMA.ART.1.829,I,CC/02.CONCORRÊNCIADOCÔNJUGESOBREVIVENTECOMOSDESCENDENTES.CASAMENTONOREGIMEDACOMUNHÃOUNIVERSALDEBENS.EXCLUSÃODOCÔNJUGEDACONDIÇÃODEHERDEIROCONCORRENTE.ATODOJUIZDETERMINANDOA JUNTADAAOS AUTOS DA HABILITAÇÃO E REPRESENTAÇÃO DOS HERDEIROS DESCENDENTES.NATUREZA.DESPACHODEMEROEXPEDIENTE.FUNDAMENTAÇÃO.DESNECESSIDADE.
— A nova ordem de sucessão legítima estabelecida no CC/02 incluiu o cônjuge na condição de herdeironecessárioe,conformeoregimematrimonialdebens,concorrentecomosdescendentes.
— Quando casado no regime da comunhão universal de bens, considerando que metade do patrimônio jápertenceaocônjugesobrevivente (meação),estenão teráodireitodeherança,postoqueaexceçãodoart.1.829,I,oexcluidacondiçãodeherdeiroconcorrentecomosdescendentes.
—Oatodojuizquedeterminaajuntadaaosautosdahabilitaçãoerepresentaçãodosherdeirosdescendentestemnaturezadedespachodemeroexpediente,dispensandofundamentação,vistoquenãosequalificam,emregra,comoatosdeconteúdodecisório.Precedentes.
Recurso ordinário emmandado de segurança a que se nega provimento” (STJ,RMS 22.684/RJ, Rel.Min.NancyAndrighi,3.ªTurma,j.7-5-2007,DJ,28-5-2007,p.319).
629Nessesentido,opróprioZenoVeloso(DireitoSucessóriodoCônjugeedoCompanheiro,cit.,p.46).Posição peculiar é a da querida amiga e professora Maria Berenice Dias, segundo a qual, diante dapontuaçãodoreferidoinciso,asucessãodocônjugeficariaexcluídanahipótesedeofalecidoterdeixadobens particulares. Trata-se de uma posiçãominoritária e quemerece a nossa respeitosa referência.DIAS,MariaBerenice.“PontoFinal.Art.1829,incisoI,doNovoCódigoCivil.”JusNavigandi,Teresina,ano8,n.168,21dez.2003.Disponívelem:<http://jus.com.br/revista/texto/4634>.Acessoem:22ago.2012.
630Ojulgadoabaixo,emnossosentir,aindanãopacificaapolêmicamatéria,razãoporqueérecomendávelaguardaraconsolidaçãodopensamentojurisprudencial:
“DIREITOCIVIL.RECURSOESPECIAL.INVENTÁRIO.CÔNJUGESUPÉRSTITECASADOCOMODE CUJUS PELO REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. HERANÇA COMPOSTA DEBENS PARTICULARES E BEMCOMUM.HERDEIRONECESSÁRIO. CONCORRÊNCIACOMOSDESCENDENTES. ARTS. ANALISADOS: 1.658, 1.659, 1.661 E 1.829, I, DO CC/02. 1. Inventáriodistribuído em 24/01/2006, do qual foi extraído o presente recurso especial, concluso ao Gabinete em27/05/2013.2.Cinge-seacontrovérsiaadefinirseocônjugesupérstite,casadocomofalecidopeloregimedacomunhãoparcialdebens,concorrecomosdescendentesdelenapartilhadosbensparticulares.3.Noregimedacomunhãoparcial,osbensexclusivosdeumcônjugenãosãopartilhadoscomooutronodivórcioe,pelamesmarazão,nãoodevemserapósasuamorte,sobpenadeinfringiroqueficouacordadoentreosnubentesnomomentoemquedecidiramseuniremmatrimônio.Acasoavontadedelessejaadecompartilhar todooseupatrimônio,apartirdocasamento,assimdeveminstituirempactoantenupcial.4.Ofatodeocônjugenãoconcorrer comos descendentes na partilha dos bens particulares dodecujus não exclui a possibilidade dequalquer dos consortes, em vida, dispor desses bens por testamento, desde que respeitada a legítima,reservando-osoupartedelesaosobrevivente,afimderesguardá-loacasovenhaaantesdelefalecer.5.SeoespíritodasmudançasoperadasnoCC/02foievitarqueumcônjugefiqueaodesamparocomamortedooutro,essaceleumanãoseresolvesimplesmenteatribuindo-lheparticipaçãonapartilhaapenasdosbensparticulares,quando houver, porque podem eles ser insignificantes, se comparados aos bens comuns existentes eamealhados durante toda a vida conjugal. 6.Mais justo e consentâneo com a preocupação do legislador épermitir que o sobrevivente herde, em concorrência com os descendentes, a parte do patrimônio que elepróprio construiu com o falecido, não lhe tocando qualquer fração daqueloutros bens que, no exercício daautonomiadavontade,optou—sejapornãoterelegidoregimediversodolegal,sejapelacelebraçãodopactoantenupcial— por manter incomunicáveis, excluindo-os expressamente da comunhão. 7. Recurso especialconhecidoemparteeparcialmenteprovido”(STJ,Rel.Min.NancyAndrighi,3.ªTurma,j.8-10-2013).
631 “Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relaçõespatrimoniais,noquecouber,oregimedacomunhãoparcialdebens.”
632Cf.onossocitadocapítulo11.
633AldemiroRezendeDantasJr.,Concorrênciasucessóriadocompanheirosobrevivo,RevistaBrasileiradeDireitodeFamília,PortoAlegre:Síntese,IBDFAM,anoVII,n.29,p.128-143,abr./maio2005.
634 Roberta Nioac Prado, Sucessão Familiar e Planejamento Societário II (PRADO, Roberta Nioac,KIRSCHBAUM, Deborah e COSTALUNGA, Karime), in Estratégias Societárias, PlanejamentoTributárioeSucessório.Coords.:RobertaNioacPrado,DanielMonteiroPeixotoeEuricoMarcosDinizdeSanti.2.ed.,SãoPaulo:Saraiva-FGV,2011,p.189.
635 “Em que pese a lei acima tratar das Sociedades Anônimas”, observa TIAGO BARROS, “não existenenhum impedimento para que a sociedadeholding seja formalizada sob a égide das normas referentes àssociedadesporquotasderesponsabilidadelimitadaouqualqueroutrapermitidapelodireitobrasileiro,poisestamodalidade de empresa consistemais em um objetivo da sociedade— controle e gerenciamento de outrasempresas ou patrimônio— do que em um tipo societário específico. Em aspectos gerais, asholdings sãoclassificadas como: a)Holding Pura: é a sociedade empresária que possui como objetivo social apenas aparticipaçãonocapitaldeoutrasempresas,ouseja,suaatividadeéamanutençãodeações/quotasdeoutrascompanhias, de modo a controlá-las sem distinção de local, podendo ter sua sede social transferida semmaiores problemas. b)Holding Mista: é a sociedade empresária que, além da participação e controle deoutras empresas, explora alguma outra atividade empresarial, como prestação de serviços civis e/oucomerciais,sendoestetipoomaisutilizadonopaísporrazõesfiscaiseadministrativas”(TiagoPereiraBarros,PlanejamentoSucessórioeHoldingFamiliar/Patrimonial,JusNavigandi,Teresina, ano18, n. 3529, 28 fev.2013.Disponívelem:<http://jus.com.br/artigos/23837>.Acessoem:4dez.2013).
636RobertaNioacPrado,ob.cit.,p.192.
637FredJohnSantanaPrado,AHoldingcomoModalidadedePlanejamentoPatrimonialdaPessoaFísicanoBrasil, Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2800, 2 mar. 2011. Disponível em:<http://jus.com.br/artigos/18605>.Acessoem:4dez.2013.
638ServiudebaseaestepontodanossaanáliseaobraOContratodeDoação,dePabloStolzeGagliano(3.ed., São Paulo: Saraiva, 2010), onde se pode conferir, além de eventuais referências bibliográficas, outrosaspectosdeaprofundamentopertinentesaestaimportantefiguranegocial(cf.item6.5,capítulo6).
639 Zeno Veloso, Comentários ao Código Civil — Parte Especial — Do Direito das Sucessões, daSucessãoTestamentária,doInventárioedaPartilha(arts.1.857a2.027),SãoPaulo:Saraiva,2003,p.437.v.21.
640 Henrique José Longo, Sucessão Familiar e Planejamento Tributário II, in Estratégias Societárias,
PlanejamentoTributárioeSucessório,p.213.
641 Disponível em: <http://rodolfopamplonafilho.blogspot.com.br/2013/12/planejamentosucessorio.html>.Acessoem:22dez.2013.
642AntônioHouaisseMaurodeSallesVillar,DicionárioHouaissdaLínguaPortuguesa,RiodeJaneiro:Objetiva,2001,p.1643.
643“Inventário,nosentidoestrito,éarelaçãodebensexistentesdeumapessoa,casalouempresa;nodireitodas sucessões é o processo judicial de levantamento e apuração de bens pertencentes ao falecido, visandorepartir o patrimônio entre seus herdeiros, realizando o ativo e o pagamento do passivo. O inventário erasemprejudicialnaredaçãooriginaldoart.982doCódigodeProcessoCivil,aindaquetodasaspartesfossemcapazeseconcordes.ALein.11.441,de4dejaneirode2007,deunovaredaçãoaoart.982doCPCeinovouaoadmitiro inventárioextrajudicial, lavradoporescriturapública,no tabelionatodenotas,se todasaspartesinteressadasforemcapazes,estiveremassistidasporadvogadoeconcordes”(DimasMessiasdeCarvalhoeDimasDanieldeCarvalho,DireitodasSucessões—InventárioePartilha,3.ed.,BeloHorizonte:DelRey,2012,p.215).
644 Confiram-se os tópicos 8 (“Inventário Negativo”), 9 (“Inventário Conjunto”) e 10 (“Herdeiro Único eAdjudicação”)destecapítulo.
645“Espólios.m.(1508CDPI222)1conjuntodecoisasquesãotomadasaoinimigonumaguerra;despojo2produtodeumroubo,deumapilhagem,deumaespoliação3conjuntodosbensquesãodeixadosporalguémaomorrer4JURconjuntodebensqueformamopatrimôniodomorto,aserpartilhadonoinventárioentreosherdeiroseoslegatários;herança
ETIM lat. spollium,u; ´despojo (de um animal), pele, couro; despojo (tomado na guerra), despojos, presa,tomadia ,́esteúltimosentidode´despojosdeuminimigo ;́verespoli-;f.hist1508espolio,1539espollio,1539espolyoSIN/VARversinonímiadepresa
PARespolio(fl.espoliar)”(AntônioHouaisseMaurodeSallesVillar,ob.cit.,p.1235).
646 “RECURSOESPECIAL—AÇÃODECOBRANÇAPROMOVIDAEMFACEDOESPÓLIODODECUJUS—EXTINÇÃODOPROCESSOSEMJULGAMENTODEMÉRITO,PELASINSTÂNCIASORDINÁRIAS, EM FACE DA ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM — REFORMA —NECESSIDADE — ESPÓLIO — LEGITIMIDADE AD CAUSAM PARA DEMANDAR E SERDEMANDADO EM TODAS AQUELAS AÇÕES EM QUE O DE CUJUS INTEGRARIA O POLOATIVOOUPASSIVODADEMANDA,SEVIVOFOSSE(SALVOEXPRESSADISPOSIÇÃOLEGALEMCONTRÁRIO—PRECEDENTE)—RECURSOESPECIALPROVIDO.
I—EmobservânciaaoPrincípiodaSaisine,coroláriodapremissadeque inexistedireitosemorespectivotitular,aherança,compreendidacomosendooacervodebens,obrigaçõesedireitos, transmite-se,comoumtodo,imediataeindistintamenteaosherdeiros.Ressalte-se,contudo,queosherdeiros,nesteprimeiromomento,imiscuir-se-ãoapenasnaposseindiretadosbenstransmitidos.Apossedireta,conformesedemonstrará,ficaráacargodequemdetémapossedefatodosbensdeixadospelodecujusoudoinventariante,adependerdaexistênciaounãodeinventárioaberto;
II—Detodomodo,enquantonãoháindividualizaçãodaquotapertencenteacadaherdeiro,oqueseefetivarásomente com a consecução da partilha, é a herança, nos termos do artigo supracitado, que responde poreventual obrigação deixada pelodecujus.Nessa perspectiva, o espólio, que também pode ser conceituadocomo a universalidade de bens deixada pelo de cujus, assume, por expressa determinação legal, o viésjurídico-formal,que lheconfere legitimidadeadcausam para demandar e ser demandado em todas aquelasaçõesemqueodecujusintegrariaopoloativooupassivodademanda,sevivofosse;
III—Pode-se concluir que o fato de inexistir, até omomento da prolação do acórdão recorrido, inventárioaberto (e, portanto, inventariante nomeado), não faz dos herdeiros, individualmente considerados, parteslegítimaspararesponderpelaobrigação,objetodaaçãodecobrança,pois,comoassinalado,enquantonãohápartilha, é aherançaque respondepor eventualobrigaçãodeixadapelodecujus e é o espólio, comoparteformal,quedetémlegitimidadepassivaadcausamparaintegraralide;
IV—Naespécie,portudooqueseexpôs,revela-seabsolutamentecorretaapromoçãodaaçãodecobrançaem face do espólio, representado pela cônjuge supérstite, que, nessa qualidade, detém, preferencialmente, aadministração,defato,dosbensdodecujus,conformedispõeoartigo1.797doCódigoCivil;
V—RecursoEspecialprovido”(STJ,REsp1.125.510—RS(2009/0131588-0),Rel.Min.MassamiUyeda,j.6-10-2011).
647Dentreoutrasobrigaçõeslegais,oinventariantedeveráprovidenciarasdeclaraçõesdoespólioàReceitaFederaldoBrasil,paraefeitodecumprimentodasnormasreferentesaoImpostodeRenda:
“DECLARAÇÕESDEESPÓLIO—APRESENTAÇÃO
098—Quemdeveapresentarasdeclaraçõesdeespólio?
As declarações de espólio devem ser apresentadas em nome da pessoa falecida, com a indicação de seunúmerodeinscriçãonoCPF,utilizandoocódigodenaturezadeocupaçãorelativoaespólio(81)deixandoembranco o código de ocupação principal, devendo ser assinadas pelo inventariante, que indicará seu nome, onúmerodeinscriçãonoCPFeoendereço.
Enquantonãohouveriniciadooinventário,asdeclaraçõessãoapresentadaseassinadaspelocônjugemeeiro,sucessoraqualquertítuloouporrepresentantedodecujus.
(IN SRF n. 81, de 2001, art. 4.º)” (Disponível em:<http://www.receita.fazenda.gov.br/pessoafisica/irpf/2007/perguntas/espolio.htm>.Acessoem:3jan.2014).
648Sobre a competência territorial nas ações emque o espólio for réu, estabelece o art. 48 doCódigo deProcessoCivilde2015:
“Art.48.O forodedomicíliodoautordaherança,noBrasil, éocompetenteparao inventário,apartilha,aarrecadação, o cumprimento de disposições de última vontade, a impugnação ou anulação de partilhaextrajudicialeparatodasasaçõesemqueoespólioforréu,aindaqueoóbitotenhaocorridonoestrangeiro.
Parágrafoúnico.Seoautordaherançanãopossuíadomicíliocerto,écompetente:
I—oforodesituaçãodosbensimóveis;
II—havendobensimóveisemforosdiferentes,qualquerdestes;
III—nãohavendobensimóveis,oforodolocaldequalquerdosbensdoespólio”.
649“Direitocivil.Recursoespecial.Cobrançadealuguel.Herdeiros.Utilizaçãoexclusivadoimóvel.Oposiçãonecessária.Termoinicial.
—Aquelequeocupaexclusivamenteimóveldeixadopelofalecidodeverápagaraosdemaisherdeirosvaloresatítulodealuguelproporcional,quandodemonstradaoposiçãoàsuaocupaçãoexclusiva.
—Nestahipótese,otermoinicialparaopagamentodosvaloresdevecoincidircomaefetivaoposição,judicialouextrajudicial,dosdemaisherdeiros.
Recursoespecialparcialmenteconhecidoeprovido”(REsp570.723/RJ,Rel.Min.NancyAndrighi,3.ªTurma,j.27-3-2007,DJ,20-8-2007,p.268).
650 “PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. INVENTÁRIO. TESTAMENTO. NOMEAÇÃO DEINVENTARIANTE. ORDEM LEGAL. ART. 990 DO CPC. NOMEAÇÃO DE TESTAMENTEIRO.IMPOSSIBILIDADE.HERDEIROSTESTAMENTÁRIOS,MAIORESECAPAZES.PREFERÊNCIA.
— Para efeitos de nomeação de inventariante, os herdeiros testamentários são equiparados aos herdeirosnecessárioselegítimos.
— Herdeiro menor ou incapaz não pode ser nomeado inventariante, pois é impossibilitado de praticar oureceberdiretamenteatosprocessuais;sendoqueparaosquaisnãoépossívelosuprimentoda incapacidade,umavezqueafunçãodeinventarianteépersonalíssima.
—Osherdeiros testamentários,maioresecapazes,preferemao testamenteironaordemparanomeaçãodeinventariante.
—Existindoherdeirosmaioresecapazes,violaoincisoIII,doart.990,doCPC,anomeaçãodetestamenteirocomo inventariante. Recurso especial conhecido e provido” (STJ, REsp 658.831/RS, Recurso Especial2004/0095197-0,Rel.Min.NancyAndrighi,3.ªTurma,j.15-12-2005,DJ,1.º-2-2006,p.537).
651 “Art. 625. O inventariante removido entregará imediatamente ao substituto os bens do espólio e, casodeixedefazê-lo,serácompelidomediantemandadodebuscaeapreensãooudeimissãonaposse,conformesetratardebemmóvelouimóvel,semprejuízodamultaaserfixadapelojuizemmontantenãosuperioratrêsporcentodovalordosbensinventariados.”
652Sobretalprazo,ensinaPAULOLÔBO:
“ALei n. 11.441/2007, que derrogou o art. 1.796 doCódigoCivil nesse ponto, estipula o prazomáximo de
sessenta dias, a contar da abertura da sucessão, para que seja instaurado o inventário do patrimôniohereditário,prazoessequeseestendeatéocompromissodoinventariante.Tambémseentendequeesseprazodevaserobservadoparaoiníciodalavraturadaescriturapúblicadeinventárioepartilhaamigável,quandoosherdeiros e legatários forem capazes. O prazo total da administração da herança, na realidade da vida, éfrequentementealongado,porqueosherdeirosretardamainstauraçãodoinventário,àsvezesporváriosanos,ou quando a instauração tem a iniciativa de credores, inclusive tributários. Por tais razões, o art. 31 daResolução n. 35/2007 do Conselho Nacional de Justiça estabelece que a escritura pública de inventário epartilha pode ser lavrada a qualquer tempo, cabendo ao notário fiscalizar o recolhimento de eventualmulta,conformeprevisãodalegislaçãoestadualespecífica.
Anorma sobreo tempoé semsançãoparaodescumprimento, ao contráriodoqueestabelecia a legislaçãoanterior.Contudo,deacordocomaSúmula542doSupremoTribunalFederal:‘NãoéinconstitucionalamultainstituídapeloEstado-membro,comosançãopeloretardamentodoiníciooudaultimaçãodoinventário’.
Asquestõesdealtaindagaçãoouqueenvolveremproduçãocontrovertidadeprovasdevemserremetidaspelojuiz do inventário para as vias ordinárias, ainda que, se for o caso, se faça reserva de bens para acautelarinteresses verossímeis. Por exemplo, se a herança envolver a participação do de cujus em sociedadeempresária, nãohavendoprevisão contratual de continuidade com seus sucessores, a apuraçãodoshaveresrevelacontrovérsiadedifícilresolução,porenvolverlevantamentos,balancetesespeciais,parecerescontábeis”(PauloLôbo,DireitoCivil—Sucessões.SãoPaulo:Saraiva,2013,p.271).
653Confira-seopróximoitem,asaber,otópico7.2(“Colações”).
654 Reveja-se, a propósito, o subtópico 3.2 (“Igualdade”) do Capítulo II (“Principiologia do Direito dasSucessões”).
655 Não se trata de uma regra absoluta, na medida em que poderá haver dúvida fundada acerca dapreservação da legítima: “Já cuidamos também de observar que o valor dos bens deverá ser aferido nomomento da doação, e não quando da morte do doador. Na realidade fática, contudo, alguns problemaspoderãosurgir,aexemplodainsegurançageradaparaaspartes,especialmenteodonatário,pornãotercertezase o bem recebido violou a legítima. E, de fato, essa preocupação só será definitivamente afastada noinventário,apósteremsidorealizadasacolaçãoeaconferênciadosbensdoados.Umespecialcuidado,porém,pode terodoador: fazer constar do instrumento da doação a advertência de que o referido bem estásaindo de sua parte disponível da herança. Tal providência, a despeito de não evitar a colação paraeventual reposição da legítima, poderá evitar que o bem transferido seja computado na parte conferida aosherdeiros legitimários.Expliquemosexemplificativamente:seodoadorbeneficiouumdosseusfilhoscomumapartamento,tendoregistradoqueesteimóvelsaidasuapartedisponível,casoexistamoutrasdoaçõessemamesmaressalva,deverãoestasservirparaarecomposiçãodoacervoreservado,mantendo-seoapartamentocomointegrantedapartedisponível,desdeque,éclaro,nãocorrespondaamaisde50%detodoopatrimônio”(PabloStolzeGagliano,OContratodeDoação,cit.,p.75).
656“Art.2.006.Adispensadacolaçãopodeseroutorgadapelodoadoremtestamento,ounoprópriotítulodeliberalidade.”
657Reveja-seoCapítuloXVI(“Codicilo”)destevolume.
658 “Art. 1.999. Sempre que houver ação regressiva de uns contra outros herdeiros, a parte do coerdeiroinsolventedividir-se-áemproporçãoentreosdemais.”
659 “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. INVENTÁRIO. JUÍZO UNIVERSAL. ART. 984, CPC.AJUIZAMENTO DE AÇÃO DE COBRANÇA DE ALUGUEL POR UM HERDEIRO CONTRAOUTRO. FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL. INVENTÁRIO EM TRAMITAÇÃO. RECURSODESACOLHIDO.
I—Asquestõesdefatoededireitoatinentesàherançadevemserresolvidaspelojuízodoinventário,salvoasexceçõesprevistasemlei,comoasmatériasde‘altaindagação’referidasnoart.984,CPC,easaçõesreaisimobiliáriasouasemqueoespólioforautor.Comessasressalvas,oforosucessórioassumecaráteruniversal,talcomoojuízofalimentar,devendonelesersolucionadasaspendênciasentreosherdeiros.
II—Oajuizamentodeaçãoderitoordinário,porumherdeirocontraooutro,cobrandooaluguelpelotempodeocupaçãodeumdosbensdeixadosemtestamentopelofalecido,contrariaoprincípiodauniversalidadedojuízo do inventário, afirmada no art. 984 doCódigo de ProcessoCivil, uma vez não se tratar de questão ademandar‘alta indagação’ouadependerde‘outrasprovas’,masdematéria típicado inventário,que,comocediço,éoprocedimentoapropriadoparaproceder—seàrelação,descriçãoeavaliaçãodosbensdeixadospelofalecido.
III—Eventualcréditodaherdeirapelousoprivativodapropriedadecomumdeveseraventadonosautosdoinventário, para compensar-se na posterior partilha do patrimônio líquido do espólio.O ajuizamento de açãoautônomaparaessefimnãotemnecessidadeparaoautor,quesevê,assim,seminteressedeagir,umadascondiçõesdaação,queseperfazcomaconjugaçãodautilidadeedanecessidade.
IV—Sem prequestionamento, não se instaura a via do recurso especial” (STJ,REsp 190436/SP,RecursoEspecial1998/0072841-4,Rel.Min.SálviodeFigueiredoTeixeira,4.ªTurma, j.21-6-2001,DJ, 10-9-2001,p.392;RDR,v.22,p.318;RSTJ,v.169,p.378).
660 Sem prejuízo de obrigações tributárias de natureza diversa, a exemplo da incidência do imposto detransmissãointervivos emcasode cessãoonerosadedireitohereditário, ouda exigibilidadedo impostoderenda,quandoconfiguradooseurespectivofatogerador,otributomaispeculiaraoprocedimentosucessórioéoimpostocausamortis(preferimosdizer“mortiscausa”,poiselederivado fatodoóbito),decompetênciaestadual,conhecidopelasiglaITCMD,porseaplicartambémàsdoações:“Oimpostocausamortis”,afirmamoscultosSebastiãoAmorimeEuclidesdeOliveira,“temessadenominaçãoporincidirsobreatransmissãododomínioedapossedosbens‘emrazãodamorte’,ouseja,pelaaberturadasucessãoaosherdeiroslegítimosetestamentários.Dá-se,pois,comooóbitodoautordaherança,aplicando-seoimpostopelaalíquotavigentee
conforme o valor atribuído aos bens nessa ocasião. Antigo ‘selo de herança’ (Alvará de 1809), depoischamadode‘impostodeherançaelegados’,temaplicaçãoespecíficaaodireitosucessório,comprevisãodecálculoerecolhimentonoprocessodeinventário(arts.1.012e1.013doCPC)”(InventáriosePartilhas—DireitodasSucessões—TeoriaePrática,21.ed.SãoPaulo:Leud,2008,p.416).OsautoressereferemaoCPCde1973.
661MariaHelenaDiniz,Curso deDireitoCivilBrasileiro—Direito das Sucessões, 25. ed., SãoPaulo:Saraiva,2011,p.428-429.v.6.
662 Notícia extraída do site do CNJ. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/26436-cnj-altera-dispositivo-da-resolucao-35>.Acessoem:3jan.2014.
663DimasMessiasdeCarvalhoeDimasDanieldeCarvalho,ob.cit.,p.216.
664 “Processo civil.Recurso especial. Inventário. Falta de citação do testamenteiro.Ausência de nulidade.Finalidadeatingida.
—Tendo o falecido deixado testamento, é necessária a citação do testamenteiro no processo de inventárioparaquefiscalizeoefetivocumprimentodasdisposiçõestestamentárias.
—Entretanto,tendootestamenteirotomadociênciadatramitaçãodoinventário,prescindívelsuacitação,nãohavendonulidade,poisafinalidadedanormajáteriasidoatingida.
—A falta de impugnação às primeiras declarações pelo testamenteiro implica em sua concordância tácita.Recursoespecialnãoconhecido”(STJ,REsp277932/RJ,RecursoEspecial2000/0094184-0,Rel.Min.NancyAndrighi,3.ªTurma,j.7-12-2004,DJ,17-12-2004,p.514,LexSTJ,v.186,p.105).
665Confira-seoCapítuloXXV(“ResíduosSucessórios”)destevolume.
666DimasMessiasdeCarvalhoeDimasDanieldeCarvalho,ob.cit.,p.277-278.
667AntônioHouaisseMaurodeSallesVillar,DicionárioHouaissdaLínguaPortuguesa,RiodeJaneiro:Objetiva,2001,p.2140.
668 “Art. 2.016.Será sempre judicial a partilha, seosherdeirosdivergirem, assimcomo se algumdeles forincapaz.”
669Mais uma vez, confira-se o tópico 4.6 (“Princípio doRespeito àVontadeManifestada”) doCapítulo II(“PrincipiologiadoDireitodasSucessões”)destevolume.
670Reveja-seo tópico5 (“PlanejamentoSucessórioePartilhaemVida”)doCapítuloXXII (“PlanejamentoSucessório”)destevolume.
671 Sobre o tema, confira-se o sensacional livro de Luiz Edson Fachin,Estatuto Jurídico do PatrimônioMínimo(RiodeJaneiro:Renovar,2001).
672 A evicção traduz a perda do bem em virtude do reconhecimento, judicial ou administrativo, do direitoanteriordeoutrem(sobreotema,veroitem1,CapítuloXIII,donossovolume4,tomoI,dedicadoaoestudodaTeoriaGeraldosContratos).
673 Sobre o tema, confira-se o CapítuloXVIII (“Prescrição eDecadência”) do v. I (“ParteGeral”) destacoleção.
674CarlosRobertoGonçalves,DireitoCivilBrasileiro—DireitodasSucessões,5.ed.,SãoPaulo:Saraiva,2011,p.562.v.VII.
675CitadoporCristianoChavesFarias,in“Achegaspara(alémda)ReformadoCódigoCivil”.Disponívelem:<http://www.unifacs.br/revistajuridica/arquivo/edicao_abril2001/corpodocente/achegas.htm>. Acesso em: 2maio2013.
676E não deve se fazer incidir necessariamente omesmo regramento tributário, como se de inventário ouarrolamento se tratasse: “Em julgamento realizado pela 3.ª Câmara Cível, por unanimidade, foi negadoprovimento ao recurso do Estado de Mato Grosso do Sul contra decisão proferida pelo juiz da Vara deSucessões da Comarca de Campo Grande, nos autos da Ação de Alvará Judicial movida por M.H.C. Asentença de 1.º Grau determinou que valores do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e do Fundo deParticipação (FGTS e PIS-PASEP) de pessoa falecida deve ser pago aos dependentes ou sucessores, pormeiodesimplespedidodealvará,nãosendonecessáriaaaberturade inventárioouarrolamento,quesãoascondiçõesnecessáriasparaa incidênciade impostode transmissãocausamortis. Imposto este reivindicadopeloapelante.Ocernedademandaresumiu-senahipótesedeincidênciadoImpostodeTransmissãoCausaMortis sobreo levantamentodePIS-PASEPeFGTS.No entanto, segundoo art. 1.º daLei 6.858/80, estáprevistoqueoPIS-PASEPeFGTSpodemserpagosaosbeneficiáriospormeiodesimplespedidodealvará,conforme havia decidido o juiz singular. Em regra, com o falecimento de uma pessoa, faz-se necessária aaberturadeinventárioafimderelacionarem-setodososbenspertencentesaofalecido.Todavia,oartigo1.037doCódigo de ProcessoCivil estabeleceu a possibilidade de não ser necessária a abertura de inventário ouarrolamentodebensquandotratar-sedepagamento,aossucessores,devaloresprevistosnaLein.6.858/80,nãorecebidosemvidapelofalecido.JáopagamentodiretodosvalorescontidosnosfundoséestabelecidopeloDecreton.85.845/81.Alémdisso,aLein.8.036/90,quedispõesobreoFGTS,estabeleceemseuartigo20,incisoIV,queacontavinculadadotrabalhadornoFGTSpoderásermovimentadapelosquefarãojus,emcasode falecimentodo trabalhador.Sendoassim,o relatorda apelação,Des.FernandoMauroMoreiraMarinho,verificou que não há qualquer irregularidade a ser apontada e negou provimento ao recurso. Processo n.0050357-25.2010.8.12.0001” (Fonte: JusBrasil. Disponível em: <http://tj-ms.jusbrasil.com.br/noticias/100369836/pis-pasep-e-fgts-de-pessoa-falecida-pode-ser-sacado-sem-inventario>.Acessoem:2maio2013).
677Reconhecemosnãose tratardeposiçãopacífica (CC36.332/SP),masquecontorna,emnossosentir,ainjustiçadeumdependentetermaisdireitodoqueumsucessor,situadonamesmalinhaparentaloucategoriafamiliar.
678Comaextinçãodesteindexador,deve-sefazer,contabilmente,aconversãoparaoíndicecorrespondente.Dequalquermaneira,entendemosque,adependerdascircunstânciasdocasoconcreto,nãohavendooutrosbensainventariar,ojuizpoderárelativizarestalimitação,emrespeitoaoprincípiodaeconomiaprocessualedaduraçãorazoáveldoprocesso.
679SeguenoticiáriodositeJusBrasil,nessesentido(mantivemosotítuloeasreferências):
“Extraídode:AssociaçãodosAdvogadosdeSãoPaulo—5deMarçode2012
Herdeironecessárionãoprecisacomprovaraberturadeinventárioparacobrarcréditotrabalhista
Combasenoartigo1.º,daLein.6.858/80,aplicadaaoprocessoporanalogia,a5.ªTurmadoTRT-MGdecidiuque,noprocessodotrabalho,nãoénecessárioapresentarcertidãodeaberturadeinventárioparademonstraralegitimidadedoherdeironecessário(descendente,ascendenteeocônjuge)paracobrarcrédito trabalhistadoempregado morto. Principalmente, se o reclamante estiver habilitado como dependente do falecido. Osjulgadoresanalisaramorecursodedoisreclamantesquesediziamherdeirosdoempregadofalecidoenãoseconformaramcomaextinçãodoprocessomovidocontraaex-empregadora,pedindoopagamentodeverbastrabalhistas. O juiz de 1.º Grau entendeu que os autores deveriam ter anexado à reclamação carta denomeaçãodeinventarianteeencerrouoprocessosementrarnomérito,porilegitimidadeativa.Examinandooprocesso,odesembargadorJoséMurilodeMoraislembrouoteordoartigo1.ºdaLei6.858/80,segundooqualos valores devidos pelo empregador ao empregado, bem comoomontante deFGTS e doPIS/PASEP, nãorecebidos em vida pelo titular, deverão ser pagos em partes iguais aos dependentes habilitados perante aPrevidênciaSociale,nafaltadestes,aossucessoresprevistosnaleicivil,independentedeinventário.Nocaso,as certidões de óbito e a previdência deixam claro que os reclamantes, mãe e filho menor de idade, sãoherdeiros necessários do empregado falecido, devidamente inscritos na Previdência Social como seusdependentes. Além disso, a reclamante foi quem recebeu as verbas rescisórias do trabalhador e tambémrequereu a abertura do inventário, conformedocumento de andamento processual.Na visão do relator, issotudolevaàconclusãodequeelaéarepresentantelegaldoespólio.Comessesfundamentos,odesembargadorconcluiu pela legitimidade dos reclamantes, observando que, estando o menor assistido pela mãe, não hánecessidadedeatuaçãodoMinistérioPúblicodoTrabalho.FoideterminadooretornodoprocessoàVaradoTrabalhodeorigem,para julgamentodospedidos.ATurma,porunanimidade,acompanhouovotodorelator.Processo n.: 01242-2012-055-03-00-2.Autor: TribunalRegional doTrabalho da 3.ªRegião” (Disponível em:<http://aasp.jusbrasil.com.br/noticias/3069879/herdeiro-necessario-nao-precisa-comprovar-abertura-de-inventario-para-cobrar-credito-trabalhista>.Acessoem:22jun.2013).