noções de hidrodinâmica -

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Máquinas Termohidráulicas de Fluxo 01 de fevereiro de 2010 Alex N. Brasil 1 1. NOÇÕES DE HIDRODINÂMICA 1.1. Breve Histórico Obras hidráulicas de certa importância remontam à antiguidade: na Mesopotâmia existiam canais de irrigação construídos na planície situada entre os rios Tigre e Eufrates e em Nipur (Babilônia) existiam, coletores de esgotos desde 3750 A.C. Os egípcios, no período da XII dinastia (2000-1785 A.C.) realizaram importantes obras hidráulicas, inclusive o lago artificial Meris, destinado a regularizar as águas do baixo Nilo. Alguns princípios da Hidrostática foram enunciados por Arquimedes 1 no seu tratado sobre corpos flutuantes (250 A.C.). A bomba de pistão foi concebida pelo físico grego Ctesibius e inventada pelo seu discípulo Hero, 200 anos antes da era Cristã. Grandes aquedutos romanos foram construídos em varias partes do mundo, a partir de 150 A.C. No século XVI a atenção dos filósofos voltou-se para os problemas encontrados nos projetos de chafarizes e fontes monumentais, tão em moda na Itália. Assim foi que Leonardo da Vinci 2 apercebeu-se da importância de observações nesse setor. Um novo tratado publicado em 1586 por Stevin 3 e as contribuições de Galileu 4 , Torricelli 5 e Daniel Bernoulli 6 constituíram a base para o novo ramo científico. Devem-se a Euler 7 as primeiras equações gerais para o movimento dos fluidos. No seu tempo os conhecimentos que hoje constituem a Mecânica dos Fluidos apresentavam-se separados em dois campos distintos: A “Hidrodinâmica teórica” que estudava os fluidos perfeitos e a “Hidráulica empírica”, em que cada problema era investigado isoladamente. Infelizmente os seus estudos foram feitos separadamente nesses dois sentidos. A associação desses dois ramos iniciais, constituindo a “Mecânica dos Fluidos”, deve-se principalmente à Aerodinâmica. 1 Arquimedes (287?-212 A.C.) Geômetra, analista e engenheiro grego. 2 Leonardo da Vinci (1452-1519) Pintor, Arquiteto, Escultor e Filósofo Italiano. 3 Simão Stevin (1548-1620) Grande engenheiro civil e militar, Contador e Estatístico Holandês. 4 Galileu (1564-1642) Grande Astrônomo e pesquisador Italiano. 5 Evangelista Torricelli (1608-1647) Físico Italiano, discípulo de Galileu. 6 Daniel Bernoulli (1700-1782) Cientista Suíço, Fundador da Física Matemática. 7 Leonardo Euler (1707-1783) Matemático, Físico e Astrônomo Suíço.

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Máquinas Termohidráulicas de Fluxo

01 de fevereiro de 2010 Alex N. Brasil

1

1. NOÇÕES DE HIDRODINÂMICA

1.1. Breve Histórico

Obras hidráulicas de certa importância remontam à antiguidade: na Mesopotâmia existiam canais de irrigação construídos na planície situada entre os rios Tigre e Eufrates e em Nipur (Babilônia) existiam, coletores de esgotos desde 3750 A.C.

Os egípcios, no período da XII dinastia (2000-1785 A.C.) realizaram importantes obras hidráulicas, inclusive o lago artificial Meris, destinado a regularizar as águas do baixo Nilo.

Alguns princípios da Hidrostática foram enunciados por Arquimedes1 no seu tratado sobre corpos flutuantes (250 A.C.).

A bomba de pistão foi concebida pelo físico grego Ctesibius e inventada pelo seu discípulo Hero, 200 anos antes da era Cristã.

Grandes aquedutos romanos foram construídos em varias partes do mundo, a partir de 150 A.C.

No século XVI a atenção dos filósofos voltou-se para os problemas encontrados nos projetos de chafarizes e fontes monumentais, tão em moda na Itália. Assim foi que Leonardo da Vinci2 apercebeu-se da importância de observações nesse setor. Um novo tratado publicado em 1586 por Stevin3 e as contribuições de Galileu4, Torricelli5 e Daniel Bernoulli6 constituíram a base para o novo ramo científico.

Devem-se a Euler7 as primeiras equações gerais para o movimento dos fluidos. No seu tempo os conhecimentos que hoje constituem a Mecânica dos Fluidos apresentavam-se separados em dois campos distintos: A “Hidrodinâmica teórica” que estudava os fluidos perfeitos e a “Hidráulica empírica”, em que cada problema era investigado isoladamente. Infelizmente os seus estudos foram feitos separadamente nesses dois sentidos.

A associação desses dois ramos iniciais, constituindo a “Mecânica dos Fluidos”, deve-se principalmente à Aerodinâmica.

1

Arquimedes (287?-212 A.C.) Geômetra, analista e engenheiro grego.2

Leonardo da Vinci (1452-1519) Pintor, Arquiteto, Escultor e Filósofo Italiano.3

Simão Stevin (1548-1620) Grande engenheiro civil e militar, Contador e Estatístico Holandês.4

Galileu (1564-1642) Grande Astrônomo e pesquisador Italiano.5

Evangelista Torricelli (1608-1647) Físico Italiano, discípulo de Galileu.6

Daniel Bernoulli (1700-1782) Cientista Suíço, Fundador da Física Matemática.7

Leonardo Euler (1707-1783) Matemático, Físico e Astrônomo Suíço.

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2

Convém ainda mencionar que a Hidráulica sempre constituiu fértil campo para as investigações e análises matemáticas tendo dado lugar a estudos teóricos que frequentemente se afastaram dos resultados experimentais. Várias expressões assim deduzidas tiveram de ser corrigidas por coeficientes práticos, o que contribuiu para que a Hidráulica fosse cognominada a “ciência dos coeficientes”. As investigações experimentais tornaram famosos vários físicos da Escola Italiana, entre estes Venturi8, Bidone e outros.

Apenas no século XIX, com o desenvolvimento da produção de tubos de ferro fundido, capazes de resistir a pressões internas relativamente elevadas, com o crescimento das cidades e importância cada vez maior dos serviços de abastecimento de água e ainda em conseqüência do emprego de novas máquinas hidráulicas é que a Hidráulica teve um progresso rápido e acentuado.

As investigações de Reynolds, os trabalhos de Rayleigh e as experiências de Froude constituíram a base científica para esse progresso.

As usinas hidroelétricas começaram a ser construídas no fim do século passado.

Aos laboratórios de hidráulica devem ser atribuídos os desenvolvimentos mais recentes.

1.2. Hidráulica e Mecânica dos Fluidos

Embora hoje em Hidráulica se inclua o estudo de outros líquidos, até há bem pouco tempo todo o trabalho experimental se limitava à água.

Muito mais geral é a Mecânica dos Fluidos que abrange problemas relativos a líquidos e gases.

Definição Fluido: um fluido é uma substância que se deforma continuamente sob a aplicação de uma tensão de cisalhamento (tangencial), não importa quão pequena ela possa ser. Ou seja, são denominados fluidos as substâncias que oferecem pequena resistência à deformação e que tomam a forma dos corpos com os quais estão em contato. Sob a ação de esforços tangenciais os fluidos deformam-se continuamente.

Assim, os fluidos compreendem as fases líquida e gasosa (ou de vapor) das formas físicas nas quais a matéria existe. A distinção entre um fluido e o estado sólido da matéria é clara quando você compara os seus comportamentos. Um sólido deforma-se quando uma tensão de cisalhamento lhe é aplicada, mas não continuamente.

Na Figura (1.1), os comportamentos de um sólido (Fig. 1.1a) e de um fluido (Fig 1.1b), sob a ação de uma força de cisalhamento constante, são comparados. Na Figura (1.1a), a força de cisalhamento é aplicada sobre o sólido através da placa superior à qual ele está ligado. Quando a força cisalhante é aplicada na placa superior, o bloco deforma-se conforme mostrado. Do estudo da mecânica, sabemos que, desde que o limite elásticodo material sólido não seja ultrapassado, a deformação é proporcional à tensão de cisalhamento aplicada, F A , onde A é a área da superfície em contato com a placa.

8 Giovanni Battista Venturi (1746-1822) Padre, professor e Hidráulico Italiano.

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3

Para repetir a experiência com um fluido entre as placas, delimitaremos um elemento fluido, conforme mostrado pelas linhas cheias na Fig. (1.1b). Enquanto a força F estiver aplicada na placa superior, a deformação do elemento fluido aumenta continuamente. O fluido em contato direto com a fronteira sólida tem a velocidade da própria fronteira; não há deslizamento. Este é um fato experimental baseado em numerosas observações do comportamento dos fluidos. A forma do elemento fluido em instantes sucessivos

0 1 2t t t , é mostrada (Fig. 1.1b) pelas linhas tracejadas. Como o movimento do fluido

continua sob a aplicação de uma tensão cisalhante, podemos, alternativamente, definir um fluido como uma substância incapaz de suportar tensão de cisalhamento quando em repouso.

Figura 1.1 – Comportamento de um sólido e de um fluido soba ação de uma tensão de cisalhamento constante.

Os fluidos compreendem os líquidos e gases. Os primeiros caracterizam-se pela constância de seu volume em determinada temperatura, podendo por isso encherparcialmente um vaso. Os gases, tomando a forma do recipiente que os envolve ocupam-no totalmente.

A pequena densidade e alta compressibilidade dos gases são características importantes.

1.3. Massa Específica, Peso Específico e Densidade

Conceito A massa específica ou densidade absoluta de uma substância é expressa pela massa

da unidade de volume dessa substância.

Para um corpo de massa M,

M

V

massa

volume

3

M

L

(1.1)

S.I.:3

kg

m

Absoluto: 3

g

cm

Inglês: 3

slug

pe

Conceito Chama-se densidade relativa ou simplesmente densidade d de um material a relação

entre a massa específica desse material e a massa específica de uma substância tomada por base: no caso de líquidos esta substância é a água; tratando-se de gases geralmente se adota o ar.

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4

2H O

d

[adimensional] (1.2)

fluido ou sólido

padrão

d

Conceito Denomina-se peso específico () de um material homogêneo ao peso da unidade do volume desse material.

γ m gV peso

volume

γ g 3

F

L

(1.3)

S.I.:3

N

m

Absoluto: 3

dyna

cm

Inglês: 3

lbf

pe

Estas propriedades variam com a temperatura e pressão, porém a variação é relativamente pequena.

1.4. Sistemas de Unidades

Há mais de uma maneira de selecionar a unidade de medida para cada dimensão primária. Apresentaremos apenas os sistemas de unidades mais comuns na engenharia para cada um dos sistemas básicos de dimensões.

a) MLtT

O SI, que é a abreviatura oficial em todas as línguas do Système International d’Unités,9

é uma extensão e refinamento do sistema métrico tradicional. Mais de 30 países declararam o SI como único sistema legalmente aceito.

No sistema de unidades SI, a unidade de massa é o quilograma (kg), a unidade de comprimento, o metro (m), a unidade de tempo, o segundo (s), e a unidade de temperatura, o kelvin (K). A força é uma dimensão secundária, e a sua unidade, o newton N), é definida da segunda lei de Newton como

F m a

2

Lm

tF

(1.4)

9 American Society for Testing and Materials, ASTM Standard for Metric Practice, E380-97. Conshohocken, PA: ASTM, 1997.

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5

Newton N :

2 2

1 m m1 N 1 kg 1 kg

s s

No sistema de unidades Métrico Absoluto, a unidade de massa é o grama, a unidade de comprimento, o centímetro, a unidade de tempo, o segundo, e a unidade de temperatura, o kelvin. Uma vez que a força é uma dimensão secundária, a sua unidade, o dina, é definida em termos da segunda lei de Newton como

dina:

2 2

1 cm cm1 dyn 1 g 1 g

s s

2

cm1 dyn 1 g

s

2

-32

10 m1 10 kg

s

-52

m1 dyn = 10 kg N

s

-51 dyn = 10 N

b) FLtT

No sistema de unidades Gravitacional britânico, a unidade de força é a libra força (lbf), a unidade de comprimento é o pé (pé), a de tempo, o segundo (s), e a de temperatura, oRankine (°R). Como a massa é uma dimensão secundária, a sua unidade, o slug, édefinida em termos da segunda lei de Newton como

kgf:

2

1 m1 kgf = 1 utm

s

1 utm = 9,8 kg .

2

1 m1 kgf = 9,8 kg

s

2

m1 kgf = 1 kg 9,8

s

2

m1 kgf = 9,8 kg N

s 1 kgf = 9,8 N

21 m s

1 utm

1 g21 cm s

1 kg21 m s

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6

slug:2lbf s

1 slug 1pe

1 slug 32,2 lbm1 pé = 0,305 m

2 2

m pé = 9,8 = 32,2

s sa

2

lbf = = pound per square inch

polpsi

1 pé = 12 pol 1 lbf = 4,45 N

1 pol = 2,54 cm = 0,0254 m

2

lbf = = pound per square feet

pépsf

c) FMLtT

No sistema de unidades inglês Técnico ou de Engenharia, a unidade de força é a libra força (lbf), a unidade de massa, a libra massa (lbm), a unidade de comprimento, o pé, a unidade de tempo, o segundo, e a de temperatura, o Rankine. Uma vez que tanto a força quanto a massa são escolhidas como unidades primárias, a segunda lei de Newton é escrita como

c

m aF

g

(1.5)

Uma libra força (1 lbf) é a força que imprime à massa de uma libra massa (1 lbm) uma aceleração igual à aceleração padrão da gravidade na Terra, 32,2 pé/s2. Da segunda lei de Newton, concluímos que

21 lbm 32,2 pés s1 lbm

cg

ou

232,2 pé lbm lbf scg

A constante de proporcionalidade, cg , tem dimensões e unidades. As dimensões

surgiram porque escolhemos a força e a massa como dimensões primárias; as unidades (e o valor numérico) são uma conseqüência de nossas escolhas para os padrões de medição.

Uma vez que uma força de 1 lbf acelera 1 lbm a 32,2 pé/s2, aceleraria 32,2 lbm a 1 pé/s2. Um slug é também acelerado a 1 pé/s2 por uma força de 1 lbf. Portanto,

1 slug 32,2 lbm

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Dimensão: Grandeza física mensurável.Dimensões básicas: Tempo t

Comprimento L

Massa M

Temperatura T

Força F

Sistemas de unidades.

Sistema Internacional (SI)Sistema absolutoSistema técnicoSistema inglês

Tabela 1.1 – Dimensões básicas em relação aos sistemas de unidades.

SI Absoluto Técnico Inglês Eng. Inglês Téc.Comprimento

Lmetro

mcentímetro

cmmetro

mpé

ftpé

ftMassa

Mquilograma

kggrama

gunidade técnica

de massa utmslug libra-massa

lbmTempo

tsegundo

ssegundo

ssegundo

ssegundo

ssegundo

sTemperatura

Tkelvin

Kkelvin

Kkelvin

KRankine

o RRankine

o R

Força

FNewton

NDina

dynquilograma

força kgflibra-força

lbflibra-força

lbf

A Tabela (1.1) apresenta as dimensões básicas referentes aos principais sistemas de unidades.

Unidades S.I., Prefixos e Fatores de Conversão

Os dados necessários para resolver problemas nem sempre estão disponíveis em unidades coerentes. Assim, é necessário freqüentemente converter de um sistema de unidades para outro.

Em princípio, todas as unidades derivadas podem ser expressas em termos das unidades básicas. Então, apenas os fatores de conversão para as unidades básicas seriam requeridos.

Na prática, muitas grandezas de engenharia são expressas em termos de unidades definidas, como, por exemplo, o horsepower, a British thermal unit (Btu), o quarto, a milha náutica. As definições de tais grandezas são necessárias, e fatores de conversão adicionais são úteis nos cálculos

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A Tabela (1.3) apresenta as unidades básicas SI e os fatores de conversão necessários, mais algumas definições e fatores de conversão convenientes.

Tabela 1.2 – Unidades S.I. e prefixosa

Tabela 1.3 – Fatores de conversão de definições

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1.5. Equação de Continuidade. Descarga

Consideremos a veia líquida representada na Fig. (1.2). O peso de líquido que, num dado tempo dt, atravessa a seção S1 é o mesmo que, durante esse tempo, atravessa a seção S2, porque, sendo o líquido incompressível, não pode haver concentração ou diluição do conjunto das moléculas e nem há acréscimo ou subtração de matéria à corrente (o sistema é conservativo).

Figura 1.2.

Chamemos de

- o peso específico do líquido (constante)V1 – a velocidade média na seção A;V2 – a velocidade média na seção B.

Temos

1 1 2 2'dP S V dt S V dt

sendo 'dP o peso líquido escoado através de cada seção. Como dt é o mesmo nos dois termos e as seções podem ser quaisquer, desde que normais à direção da velocidade, podemos escrever

constanteP S V (1.6)

que é chamada equação de continuidade.

P é o peso escoado na unidade de tempo que, por sua vez, é igual à massa escoada na unidade de tempo, m , multiplicada pela aceleração g da gravidade, o que permite escrever:

costantem S Vg

(1.7)

e

constanteQ S V (1.8)

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sendo Q o volume escoado na unidade de tempo através de qualquer seção normal do canal.

Dá-se a

P o nome de descarga em peso ou fluxo em peso (grandeza empregada no escoamento de gases e vapores);

m o nome de descarga em massa (grandeza empregada no estudo das turbomáquinas), também representada como ;

e a

Q o nome de descarga em volume, ou simplesmente descarga, fluxo, vazão ou débito (grandeza empregada no escoamento de líquidos).

Unidades de descarga:

3 1m s ; sl ; m3/h; galão/min; pé cúbico por segundo 1cfs 1 cfs 28,321 s .

1.6. Forças exercidas por um líquido em escoamento permanente

Consideremos a veia líquida limitada por paredes de material qualquer ou pelo próprio líquido em movimento, uma vez que, não se podendo interpenetrar, as trajetórias que envolvem a veia se constituem em uma parede.

Figura 1.3.

Nesta veia (Figura 1.3), imaginemos que as seções inicial a0b0 e final a1b1 sejam planas e inclinadas em relação à linha média. A resultante do sistema de forças que o líquido, escoando da seção inicial à final, exerce sobre as paredes da veia é dada pela Eq. (1.9), conforme se demonstra em Hidrodinâmica.

0 0 1 1 0 1F P p S p S m V m V (1.9)

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Assim, o sistema de forças que um líquido em escoamento permanente exerce sobre as paredes de uma veia ou de um dispositivo, no interior do qual escoa, é equivalente ao sistema constituído pelas seguintes cinco forças finitas:

1ª. Peso P do líquido contido na veia considerada, força vertical, atuando de cima para baixo e aplicada no centro de gravidade da massa líquida.

2ª. Força de pressão 0 0p S , normal à seção de entrada, aplicada no seu centro de

gravidade e dirigida de fora para dentro, sendo 0p a pressão unitária e 0S a área

da seção.

3ª. Força de pressão 1 1p S , análoga à precedente, mas aplicada na seção de saída e

também dirigida de fora para dentro.

4ª. Força 0m V , resultante da velocidade, produto desta pela massa escoada na

unidade de tempo, aplicada no centro de gravidade da seção de entrada, tangenciando a linha média, e dirigida de fora para dentro, isto é, com a direção e o sentido da velocidade.

5ª. Força 1m V , análoga à anterior, aplicada na seção de saída e de sentido

contrário ao da velocidade. E a chamada força de reação.

A força de reação é a responsável pelo funcionamento das chamadas máquinas de reação, tanto hidrodinâmicas quanto a gás, e pela propulsão dos foguetes; e suas aplicações no campo da Hidrodinâmica e da Aerodinâmica são muito importantes.

Para se obter a resultante, soma-se geometricamente o peso P com as forças de pressão

0 0p S e 1 1p S , e as devidas às velocidades em 0 a 1, isto é, 0m V e 1m V .

1.7. Energia Cedida por um Líquido em Regime de Escoamento Permanente

Consideremos uma veia líquida em escoamento permanente vencendo certas resistências que podem ser passivas (atritos, turbilhonamentos, etc.), ou outras, como as oferecidas pelo rotor de uma máquina motriz (turbina).

Tomemos desta veia (Figura 1.4) um elemento limitado pelas faces planas ab e a’b’ que formam com o plano normal à linha média um ângulo .

Sejam:

– o peso específico do líquido;

0p – a pressão reinante na face a0b0;

1p – a pressão reinante na face a1b1;

0h – a cota do centro de gravidade da seção de entrada a0b0, contada a partir de

um plano tomado como referência;

1h – a da seção de saída a1b1;

g – a aceleração da gravidade.

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Figura 1.4 – Desnível energético entre as seções S0 e S1.

Procedendo-se ao estudo da ação das forças sobre um elemento de massa líquida e fazendo-se a integração para a seção inicial S0 e a seção final, chega-se à conclusão de que o trabalho T efetuado nem tempo finito t pelo peso P Q t escoando entre as referidas seções da veia líquida é dado pela expressão.

2 20 0 1 1

0 12 2

P V P VT Q t h h P H

g g

(1.10)

onde

P t Q t

é o peso do líquido escoado no temo t, e H representa a grandeza entre colchetes, diferença entre dois trinômios cujas parcelas têm um significado próprio e de grande importância.

2 20 0 1 1

0 12 2

P V P VH h h

g g

(1.11)

Consideremos os termos da Eq. (1.10) sem os índices.

a) Ph Energia de posição

O termo Ph representa o trabalho que o peso P do líquido, situado a uma cota h, acima do plano de referência, pode realizar, se abandonado à ação da gravidade. A essa capacidade de realizar trabalho que o peso possui denomina-se energia de posição, energia potencial de altitude, ou energia topográfica total.

Se P estiver a uma cota – h e, portanto, abaixo do plano de referência, é necessário despender uma energia Ph para elevá-lo ao plano.

Quando P for igual à unidade, a energia de posição, em kgm, será expressa pelo mesmo número que mede, em metros, a cota acima do plano de referência, e, por isso, h é chamado de altura representativa da posição ou energia potencial específica.

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b)p

P Energia de pressão

O termo P p representa o trabalho que o peso P, de líquido de peso específico , pode realizar quando submetido à pressão p. A essa capacidade denomina-se energia potencial de pressão. Então, um elemento líquido, de peso específico quando

submetido à pressão p, pode elevar-se, no vácuo, a uma cota p sob a ação dessa

pressão. O termo p que é homogêneo a um comprimento, é denominado altura representativa de pressão, altura de pressão estática, energia específica de pressão, cota piezométrica ou piezocarga.

Ele representa a altura de urna coluna líquida, de peso específico , supostamente em repouso, e que exerce sobre sua base uma pressão unitária p, não estando sua extremidade superior submetida a pressão alguma.

E comum, porém, nos casos correntes, vir a ter-se uma coluna líquida de altura h em contato com a atmosfera, como acontece na maioria das tubulações de recalque nas instalações de bombas, e desejar-se saber a pressão na base da coluna. Chamando de p a pressão na base e bp a pressão atmosférica ou barométrica, podemos escrever:

bp h p

A altura representativa da pressão será, neste caso,

bpph

2 2

2 3

M LT M LTpL

L L

O segundo termo do 2 membro bp é a altura representativa da pressão atmosférica,

que passaremos a designar por bH . É também chamada de altura barométrica.

Donde

b

ph H

(1.12)

c) Energia cinética

O termo 2 2P V g representa o trabalho que o peso P de líquido, dotado de velocidade

inicial V, é capaz de realizar, elevando-se no vácuo a uma altura igual a 2 2V g acima do plano de referência.

A essa capacidade denomina-se energia cinética ou energia de velocidade.

O termo 2 2V g homogêneo de um comprimento é denominado altura representativa da velocidade, altura de pressão dinâmica, energia atual ou taquicarga. Ele representa

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também a altura a que se elevaria, no vácuo, um corpo pesado que fosse lançado verticalmente com velocidade inicial V.

212

22

LTVL

g LT

Figura 1.5 – Representação da pressão em altura de coluna de líquido.

1.8. Queda Hidráulica. Altura de Elevação

Da expressão (1.10), tiramos

2 20 0 1 1

0 12 2

P V P VTH h h

P g g

(1.13)

em que o 1 membro representa o trabalho realizado ou a energia cedida pela unidade de peso do líquido escoado ao longo do canal ou do dispositivo considerado.

A grandeza convencionalmente designada por H é denominada queda hidráulica ou energia específica sempre que o líquido realiza trabalho ou cede energia, e altura de elevação quando o líquido ganha energia ou sobre ele se executa um trabalho, como ocorre nas máquinas hidráulicas geratrizes (bombas).

A grandeza H representa, em kgm, a energia cedida ou recebida por 1 kgf do líquido ao atravessar o canal ou dispositivo; no primeiro caso, no sentido da seção ab para a seção a’b’ e, no segundo caso, em sentido contrário.

Quando o líquido cede energia, o valor do trinômio é maior na entrada do que na saída e, ao contrário, quando recebe energia, o que é evidente.

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1.9. Perda de Carga

A grandeza H, quando representa energia cedida pelo líquido em escoamento devido ao atrito interno, atrito contra as paredes e perturbações no escoamento, chama-se perda de carga ou energia perdida, e se representa por J. Essa energia por unidade de peso de líquido, em última análise, se dissipa sob a forma de calor. Na Figura (1.6) vemos representadas a veia líquida, as linhas piezométrica e energética, as parcelas da energia nas seções 0 e 1, e a perda de carga H entre as referidas seções, que também representaremos por 1

0J .

Figura 1.6 – Representação das linhas energética e piezométrica entre dois pontos de uma veia líquida.

A determinação da perda de carga J pode ser realizada medindo-se o desnível piezométrico entre os pontos nos quais se deseja conhecer a perda, supondo, no caso, que 0 1V V .

1 0 10

p pJ

Figura 1.7 – Perda de carga entre os pontos 0 e 1 de um tubo horizontal.

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1.10. Unidades de Pressão

As unidades de pressão usuais são as seguintes:-2 4 -21 kgf cm 10 kgf m = 1 atmosfera técnica (at) = 735,6 torr = 100 kPa

= 10 m.c.a. (metros de coluna de água)

= 32,85 pés de coluna de água

= 14,22 psi (lb/in2)

= 0,9678 atm = 9,81 2N cm

1 atmosfera normal (atm) = 10,332 m.c.a. = bH

= 760 mm de Hg (mercúrio) = 14,969 psi = 29,22 in Hg

= 1,013 milibar

= 1,033 2kgf cm = 101,325 2kN m

Atmosfera local ou pressão barométrica local é a atmosfera normal referida ao local.

1 Pascal = 1 2N m = 610 bar

1 kPa (quilopascal) = 0,1 m.c.a., 1 m.c.a. = 10kPa

1 lb/pol.2 = 1 psi = 0,7 m.c.a. = 27 10 -2kgf cm = 2,31 pés c.a.

= 144 lb/pol.2 = 6.895 2N m = 6.895 Pa

= 51,71 mm de Hg

= 0,068 atm

1 torr (Torricelli) = 1 mm de Hg = 0,001359 -2kgf cm = 0,01934 psi

1 bar = -2 5kgf cm 0,98 psi 0,689 10 2N m = 14,504

1 m.c.a. = 1.000 mm.c.a. = 1.000 2kgf m = 0,10 2kgf cm = 1,422 psi

psia = Pressão absoluta em libras por polegada quadrada

psig = Pressão manométrica ou relativa em libras por polegada quadrada

-2

. . -3

kgf×m

kgf×mm c líquida

ph

1 lb/pé2 = lb/ft2 = 1 psfoot = 47,88 2N m = 47,88 Pa

1 in Hg = 25,4 mm Hg = 3.386 2N m

1 in H2O = 249,1 2N m

Pés de coluna de líq. = 144

psiw

sendo

w = peso específico em lb/pé cúbico.

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1.11. Pressão Absoluta e Pressão Relativa

A superfície de um líquido a uma temperatura de 15°C, sujeita à pressão atmosférica, se diz submetida a uma atmosfera. Se considerarmos a pressão atmosférica ao nível médio do mar, essa pressão é de 10,33 m.c.a. ou 1,033 -2kgf cm , sendo, normalmente

chamada de pressão barométrica e representada, como vimos, por bH .

Se considerarmos a chamada atmosfera técnica, a pressão será de 10 m.c.a, correspondente a 1 -2kgf cm , sendo, pois, muito pequena a diferença entre as duas.

Figura 1.8 – Pressão relativa e pressão absoluta.

A ausência total de pressão representa o vácuo absoluto. Pressões inferiores à atmosférica são vácuos parciais, rarefações ou depressões.

Pressão relativa positiva é a diferença entre a pressão no ponto considerado e a pressão atmosférica (ver Figura 1.8).

. .

b

pos abs

p pH

É medida com os manômetros, e por isso é denominada pressão manométrica.

Pressão relativa negativa é a diferença entre a pressão atmosférica e a pressão no ponto considerado. E chamada vácuo relativo.

. .

b

neg abs

p pH

É medida com os vacuômetros.

Pressão absoluta positiva é a soma da pressão relativa positiva lida no manômetro com a pressão atmosférica.

. .

b

abs pos

p pH

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Pressão absoluta negativa é a diferença entre a pressão atmosférica e a pressão no ponto considerado.

. .

b

abs neg

p pH

Para obter seu valor, tem-se de subtrair do valor da pressão atmosférica o valor da leitura obtida com o vacuômetro.

1.12. Influência do Peso Específico

Na Figura (1.9) acham-se representadas quatro colunas de líquidos diversos, produzindo todas uma pressão de 10 -2kgf cm , acusada nos manômetros. As alturas de coluna líquida correspondentes aos vários líquidos variam com o peso específico.

A instalação de bomba que acusasse no início do recalque p = 10 -2kgf cm no manômetro indicaria que o líquido chegaria a alturas diferentes, conforme seu peso específico (Figura 1.9).

Figura 1.9 – Altura de coluna líquida em função do peso específico do líquido.

Specific weight e specific gravity

Specific weight (W), ou peso especifico de um líquido, é o peso da unidade de

volume desse líquido. Para a água a 20°C (68°F), é de 1 kgf/dm3, ou 62,3 lb de peso por pé cúbico. Specific gravity (S), ou densidade () de um líquido, é a relação entre pesos ou massas de volumes iguais de dois líquidos. Adota-se a água a 20°C como líquido de referência. A densidade não tem unidade.

No sistema americano, 62,3W S , de modo que, para se passar da pressão H em lb/pol.2 (psi) para pés de coluna líquida de peso específico (W) ou densidade (S), tem-se:

2,31 62,3 144

psipésHW W

e

2,31psipésH

S

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1.13. Exercício

Uma tubulação de recalque de bombeamento tem 50,8 cm de diâmetro (20”) e uma curva de 90. O líquido bombeado é óleo de densidade 0,850, e a descarga é de

3 10,203 m s . A perda de carga na curva é de 0,6 metro de coluna de óleo. A pressão na

entrada 1 é de 30 lb/pol.2. (30 0,07 = 2,1 2kgf cm ). Desprezando o peso de óleo, determinar a força resultante exercida pelo óleo sobre a curva (Figura 1.10).

Figura 1.10 – Composição de forces exercidas pelo líquido numa curva.