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NeuroAtual

Volume 3, número 5, 2007

NEUROLOGIA GERAL

Dr. Osvaldo M. Takayanagui

Viral encephalitis: a clinician’s guide. Solomon T et al. Pract Neurol, 7: 288, 2007.

É extremamente assustador presenciar a progressão de um quadro infeccioso

viral para confusão mental, coma e morte em poucos dias, apesar de todos os esforços

terapêuticos. Mesmo quando sobrevive aparentemente intacto, sua família relata não ser

a mesma pessoa de antes, com distúrbios de personalidade, irritabilidade e

comprometimento da memória recente. A despeito do recente avanço da neuroimagem,

dos métodos de identificação viral, dos antivirais e drogas imunomoduladoras e dos

cuidados de neurointensivismo, a evolução catastrófica não é incomum.

Adicionalmente, o número crescente de pacientes imunodeprimidos, que podem ter

infecção viral do SNC, e a disseminação de arboviroses constituem novos desafios aos

clínicos. O objetivo deste artigo é a revisão da investigação e tratamento de pacientes

com suspeita de encefalite viral.

O que encefalite?

A encefalite significa um processo inflamatório do parênquima cerebral e pode

ser causada diretamente por uma variedade de vírus, sendo importantes os Herpesvírus e

alguns arbovírus. Outros microorganismos podem também causar encefalite,

particularmente os protozoários, tais como Toxoplasma gondii, e bactérias, como a

Listeria monocytogenes e Mycobacterium tuberculosis. Para o HIV, que infecta o

cérebro mas sem causar inflamação, não se emprega o termo encefalite. A encefalite

pode também ocorrer como um fenômeno imunomediado, por exemplo, na

encefalomielite disseminada aguda (ADEM) e na encefalite límbica paraneoplásica. No

sentido estrito, a encefalite é um diagnóstico patológico que deveria ser feito apenas

após confirmação tecidual, por autópsia ou por biópsia cerebral. Entretanto, na prática, a

maioria dos pacientes é diagnosticada se apresentar quadro clínico sugestivo (febre,

cefaléia, rebaixamento do nível de consciência, evidência de inflamação no cérebro, tais

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como pleocitose no LCR ou inflamação na neuroimagem, especialmente se o agente

causal for identificado). As causas tóxicas e metabólicas da encefalopatia podem ser

habitualmente diferenciadas da encefalite viral pela ausência do quadro febril agudo,

início insidioso, contagem normal de células no LCR e sem anormalidades focais na

ressonância magnética. Vários agentes infecciosos que provocam encefalite podem

também causar meningite, mielite ou radiculite, em diversas combinações, situações em

que a denominação mais correta seria meningencefalite, encefalomielite,

meningoencefalorradiculte, etc. O termo encefalite límbica se refere à encefalite do lobo

temporal (e freqüentemente de outras estruturas límbicas) e a rombencefalite à

encefalite do tronco encefálico.

Cerca de 70% dos casos de encefalite pelo HSV-1 já apresentam anticorpos,

indicando que o mecanismo mais comum é a reativação do vírus; entretanto, não está

claro se esta reativação ocorre no gânglio trigeminal ou de uma latência no próprio

cérebro. Diferentemente dos adultos, a encefalite por HSV-1 nas crianças ocorre durante

a infecção primária.

O HSV-2 é geralmente transmitido por via sexual. Nos Estados Unidos, cerca de

20% dos indivíduos são soropositivos para esse vírus. As síndromes neurológicas

conseqüentes ao HSV-2 são meningite, especialmente a recorrente, encefalite,

particularmente nos neonatos, e radiculite lombosacra. A maioria dos casos de

meningite recorrente, previamente denominada meningite de Mollaret, é causada pelo

HSV-2. Para alguns autores, a denominação meningite de Mollaret deve ser reservada

aos casos de meningite recorrente de causa desconhecida.

Epidemiologia

A incidência anual de encefalite é de 5 a 10 casos/100.000 habitantes,

predominantemente nos jovens e idosos. A encefalite por HSV é a encefalite mais

diagnosticada nos países industrializados, com uma incidência anual de 1 caso/250.000

ou 500.000. A maioria dos casos de encefalite por HSV é devida ao HSV-1 e cerca de

10% por HSV-2. Este último ocorre tipicamente em indivíduos imunodeprimidos e

neonatos em quem surge infecção disseminada.

Quando suspeitar de encefalite?

A apresentação clássica de encefalite viral é sob a forma de febre alta, cefaléia,

náusea, vômitos e alteração da consciência, freqüentemente associada a crises e sinais

neurológicos focais. As alterações da função mental superior incluem letargia,

sonolência, confusão, desorientação e coma. Com o advento do PCR, têm sido

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diagnosticados casos mais sutis de encefalite por HSV com febre baixa, distúrbios da

fala (disfasia e afasia), distúrbios comportamentais confundíveis com quadros

psiquiátricos ou conseqüentes ao uso de drogas ou de álcool, ocasionalmente com

conseqüências trágicas. Por vezes as crises podem ser as manifestações inaugurais.

No exame físico procure evidências de crises motoras sutis, analisando o língua

e a mucosa bucal buscando sinais de mordedura. Pesquise meningismo e sinais

localizatórios (diferenciação com abscessos) ou paralisia flácida (envolvimento

medular). Tremor ou movimentos anormais podem indicar envolvimento de gânglios da

base, como na infecção pelo vírus West Nile ou outro flavivírus ou toxoplasmose. Uma

encefalopatia febril aguda com neuropatia de nervos cranianos baixos associada a

mioclonia sugere rombencefalite, observada com enterovírus ou listeria. A surdez é

comum na caxumba e em algumas infecções por ricketsia. Fraqueza de membros

superiores e fasciculação sugerem mielite cervical, por exemplo por arbovirus. A

encefalite associada a radiculite ocorre com CMV e EBV.

Exames iniciais

O hemograma pode mostrar leucocitose ou leucopenia. A hiponatremia por

síndrome de secreção inapropriada de hormônio antidiurético é comum na encefalite.

Elevação de amilase é freqüente na caxumba. O HIV deve ser pesquisado,

especialmente se a causa da infecção for incerta.

Os aspectos controversos do Líquido cefalorraquiano

Embora o exame do LCR seja de fundamental importância, há inúmeros

aspectos polêmicos. Se o paciente estiver apresentando lesão com efeito de massa ou

hipertensão intracraniana, a realização da punção pode ser perigosa, sendo recomendada

a análise prévia da tomografia computadorizada (TC). As situações em que a

neuroimagem deveria preceder o LCR seriam: presença de sinais neurológicos focais (p.

ex. hemiparesia), crises epilépticas, pacientes imunodeprimidos, papiledema e coma. As

opiniões a respeito do grau de rebaixamento do nível de consciência para a indicação da

TC variam amplamente e depende de quão rapidamente a TC poderia ser realizada. Se a

TC puder ser efetuada rapidamente, de modo que o LCR não seria retardado por mais de

1 ou 2 horas, seria perfeitamente razoável proceder dessa forma. Contudo, num paciente

com leve confusão sem sinais localizatórios o LCR poderia ser realizado prontamente,

sem a desnecessária demora da TC. Se houver previsão de demora de várias horas para

a realização da TC, estaria justificado o início do tratamento empírico com antibióticos

e antivirais. Não há regras estabelecidas sobre de até quanto seria aceitável a demora

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para a introdução do tratamento. Na meningite bacteriana, o retardo de mais de 6 horas

entre a chegada do paciente no hospital e o início da antibioticoterapia está associado a

pior prognóstico. Na encefalite por HSV-1, a evolução desfavorável está relacionada

com demora de 2 dias ou mais entre a hospitalização e o início do antiviral.

Nos pacientes com suspeita de meningite bacteriana ou encefalite viral, mesmo

que o tratamento antimicrobiano tenha sido instituído, o exame do LCR é ainda

essencial, pois este auxilia no diagnóstico e na conduta futura. É inaceitável a

justificativa de que o LCR seja inútil nos casos de tratamento empírico e esta postura

deve ser desencorajada, pois pode impedir o diagnóstico de outras doenças que exijam

correção terapêutica, além de aumentar o risco de reações adversas de medicamentos

administrados desnecessariamente.

Alterações do LCR

Na encefalite, ocorre elevação da pressão, pleocitose de 5-1000 células/mm3

com predomínio linfocitário. Contudo, na fase inicial da infecção a contagem celular

pode estar normal ou apresentar predomínio de neutrófilos, da mesma forma que na

meningite viral. A glicorraquia é normal nas infecções virais, embora possa estar

levemente reduzida na infecção por caxumba ou por enterovírus. A taxa de proteínas

está elevada, entre 0,5 e 1 g/l.

Diagnóstico virológico

O diagnóstico definitivo de uma infecção viral do SNC é baseado na

demonstração do vírus por cultura ou por PCR do tecido cerebral ou do LCR ou, então,

pela demonstração de anticorpos específicos no LCR.

PCR no LCR

O diagnóstico de encefalite viral era fundamentado na biopsia cerebral, mas

atualmente muitos vírus importantes podem ser detectados por PCR.

O PCR para os Herpesvirus apresenta sensibilidade e especificidade superiores a

95%, mas pode ser negativo nos primeiros dias da doença ou após 10 dias. A

investigação inicial em indivíduos imunocompetentes deve incluir PCR para Herpes

simplex e para Varicella zoster, pois são potencialmente tratáveis com aciclovir. O PCR

para enterovirus é habitualmente incluído por ser causa freqüente de meningite viral.

Nos pacientes imunodeprimidos, o PCR para EBV e para CMV deve ser pesquisado.

A elevada sensibilidade do PCR para os herpesvirus constitui um problema,

especialmente com EBV e CMV, cujos resultados podem ser de difícil interpretação. A

maioria da população adulta pode ter sido infectada por esses vírus e contê-los no

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interior dos linfócitos. Assim, a detecção desses agentes pelo PCR é motivo de

discussão; representaria uma infecção patogênica ou seria meramente a presença de

linfócitos infectados. Nesse sentido, o PCR quantitativo pode esclarecer esta dúvida.

Pesquisa de anticorpos

Os testes de pesquisa de anticorpos continuam tendo papel importante no

diagnóstico de muitas infecções virais do SNC. Os métodos tradicionais requerem a

demonstração da elevação de 4 vezes do título de anticorpos nas amostras de soro entre

a fase aguda e o período de convalescência, coletadas após 2-4 semanas. Infelizmente, a

coleta do período de convalescência é freqüentemente esquecida.

A presença no LCR de anticorpos IgM específicos contra um determinado vírus

em títulos superiores aos do soro é indicativa de produção local de anticorpos no SNC

em resposta à infecção. A detecção de IgM é especialmente útil nas infecções por

flavirirus, mas tem menor importância nas herpéticas que ocorrem mais comumente por

reativação. Ao contrário da IgM, a IgG é encontrada no LCR, numa relação de 1/200 da

concentração sérica. Assim, numa infecção aguda primária, IgG está elevada mais

tardiamente que IgM, tanto no soro como no LCR. Nas reativações e nas infecções

secundárias, o IgG tende a aumentar mais precocemente e em maior intensidade que o

IgM.

A detecção de bandas oligoclonais é um indicador pouco específico de que o

paciente tem um processo inflamatório no SNC. O imunoblotting das bandas contra as

proteínas virais tem sido utilizado, mas habitualmente como recurso de pesquisa para

estabelecer a causa da inflamação – p. ex. HSV-1 ou HSV-2.

No diagnóstico de infecções herpéticas, deve-se pedir o PCR na fase aguda. Se

negativo, e se a suspeita continuar sendo forte, o PCR deve ser repetido dentro de

alguns dias (pode ser negativo nas amostras obtidas muito precocemente). Se 2 amostras

de LCR revelarem PCR negativo para HSV a infecção por este agente é improvável. Se

por qualquer razão o LCR não for colhido, ou o PCR não tiver sido solicitado, pode ser

útil a pesquisa de produção intratecal de anticorpos contra HSV por IgM, IgG ou

imunoblotting numa fase mais tardia (mais de 10 dias de hospitalização).

Neuroimagem e EEG

A TC pode ser normal na fase inicial ou apresentar leve edema na região

frontotemporal com perda do padrão giral. A seguir, surge hipodensidade ou hipersinal

no caso de hemorragia. A RM é geralmente mais sensível, revelando hipersinal nas

áreas afetadas, mas mesmo a RM pode ser normal se realizada muito precocemente.

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O EEG mostra ondas lentas difusas e inespecíficas de encefalopatia, mas pode

ser útil para flagrar crises epilépticas. As descargas epileptiformes lateralizadas

periódicas, tidas como típicas de encefalite por HSV, são na realidade observadas em

várias condições.

Tratamento

Há 3 elementos importantes na conduta de pacientes com encefalite.

1- Verificar se há algum tratamento antiviral ou imunomodulador para reverter a

doença

2- Controlar as complicações imediatas da encefalite

3- Prevenir complicações secundárias ou tardias

Quando iniciar o aciclovir

O aciclovir deve ser iniciado assim que houver suspeita forte de encefalite viral,

baseado nos aspectos clínicos, achados do LCR e/ou de neuroimagem.

O aciclovir é um análogo nucleosídeo que é altamente eficaz contra HSV e

alguns outros herpesvirus, tais como VZV e herpes B.

A administração endovenosa de 10 mg/kg, 3 vezes ao dia, reduz a letalidade de

70% para menos de 20%.

Quando interromper o Aciclovir

Apesar do esquema convencional de Aciclovir ser de 10 dias, muitos

profissionais prolongam o tratamento por 14 ou 21 dias, especialmente nos pacientes

com encefalite herpética confirmada, por causa do risco de recidiva após o esquema de

10 dias de tratamento.

Se o PCR no LCR inicial for negativo para HSV, mas as demais características

forem consistentes com encefalite por HSV, o aciclovir não deve ser interrompido pela

possibilidade do resultado falso negativo do PCR nos primeiros dias. Nessa situação, a

punção deve ser repetida, pois o resultado pode ser positivo após 24-48 horas; mesmo

que dê negativo, o tratamento deve ser mantido por 10 dias. Entretanto, se for

estabelecido um diagnóstico alternativo ou parecer improvável que o paciente tenha

encefalite viral, é razoável a suspensão mais precoce do aciclovir.

Fatores de pior prognóstico

Embora o tratamento com aciclovir tenha reduzido a mortalidade da infecção

pelo HSV, a morbidade permanece elevada. Os fatores de pior prognóstico após a

encefalite por HSV são: idade superior a 60 anos, profundidade do coma, retardo entre a

admissão hospitalar e início do aciclovir (especialmente se superior a 2 dias). Dos

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sobreviventes, 2/3 dos casos apresentam seqüelas neuropsiquiátricas, incluindo

comprometimento da memória (69%), distúrbios de personalidade e do comportamento

(45%), disfasia (41%) e epilepsia (25%).

The neurotropic herpes viruses: herpes simplex and varicella-zoster. Steiner I et al.

Lancet Neurol, 6: 1015, 2007.

O Herpes simplex tipos 1 e 2 (HSV-1 e HSV-2) e o vírus Varicella zoster (VZV)

estabelecem uma infecção latente nos gânglios de raízes dorsais por toda a vida do

indivíduo. A partir deste reservatório, eles podem se reativar e causar morbidade e

mortalidade no ser humano. Embora esses agentes variem nas doenças clinicas e na

estrutura molecular, eles compartilham várias características no comprometimento

infeccioso do SNC. O HSV-1 é o agente causal de encefalite, da cegueira corneana e

diversas doenças do sistema nervoso periférico. O HSV-2 é responsável por

meningencefalite nos neonatos e por meningite nos adultos. A reativação de VZV é

associada com herpes zoster e complicações do SNC como mielite e vasculopatias

focais. Este artigo apresenta a revisão dos aspectos biológicos, médicos e neurológicos

das infecções agudas, latentes e reativações dos herpesvírus neurotrópicos.

Infectious neuropathy. Freitas MRG. Curr Opin Neurol, 20: 548, 2007.

É um excelente artigo de revisão preparado por um pesquisador brasileiro,

profundo conhecedor de neuropatias periféricas infecciosas.

Hanseníase

A hanseníase é uma das neuropatias periféricas tratáveis mais freqüentes.

Embora sua prevalência esteja em declínio, representa ainda um dos maiores problemas

de saúde pública em cerca de 80 países da Ásia, África e América Latina.

Afeta habitualmente a pele e os nervos. Há, no entanto, uma forma neurítica

pura na ausência de lesões dermatológicas, freqüentemente não diagnosticada. Alguns

estudos relatam que 4-10% dos pacientes com hanseníase apresentam o envolvimento

neural puro, manifestando-se mais comumente sob as formas mononeurite ou

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mononeurite múltipla. Em poucos casos, ocorre uma neuropatia simétrica distal com

comprometimento da sensibilidade termo-algésica, mas sem fraqueza muscular.

O envolvimento de nervos cranianos não é tão raro. Há evidências clínicas de

comprometimento desses nervos em 18% dos pacientes com hanseníase, sendo o facial

e o trigêmeo os mais afetados.

Num estudo de 19 pacientes com a forma neural pura, a mononeuropatia

representou 79%, mononeuropatia múltipla 10,5% e polineuropatia 10,5%. O nervo

ulnar foi o mais acometido. O padrão ENMG foi predominantemente axonal (94,7%).

Embora a ENMG não contribua para o diagnóstico da forma neural pura, pode

identificar o tipo de comprometimento de nervos periféricos. A hanseníase causa uma

neuropatia predominantemente axonal, mais acentuada nos membros inferiores e a

resposta simpática cutânea é quase sempre anormal.

O autor analisa também as neuropatias causadas pelo vírus da hepatite C, HIV e

na doença de Lyme.

HIV-associated cryptococcal meningitis. Jarvis JN et al. AIDS, 21: 2119, 2007.

Tratamento antifúngico

O tratamento antifúngico atualmente recomendado é baseado nos resultados de

um estudo randomizado publicado há uma década. O esquema inicial foi com

anfotericina B (0,7 mg/kg/d) com ou sem flucitosina (100 mg/kg/d) por 2 semanas,

seguidos de um período de consolidação com fluconazol (400 mg/d) ou itraconazol (400

mg/d). A justificativa era o controle da infecção com esquema inicial mais rápido de

anfotericina, substituindo-a para medicamentos melhor tolerados.

Se surgir comprometimento renal, a alternativa seria a anfotericina lipossomal.

Hipertensão liquórica

Um sério problema no tratamento da meningite por criptococos é a elevação da

pressão intracraniana, com mais da metade dos pacientes apresentando pressão inicial

do LCR superior a 25 cm H2O e quase um terço dos casos valores superiores a 35 cm

H2O. A hipertensão liquórica é associada a comprometimento cognitivo, maior

freqüência de lesões de nervos cranianos e maior mortalidade em curto prazo. O motivo

é debatido, mas está provavelmente relacionado à dificuldade de reabsorção do LCR nas

vilosidades aracnoídeas pela presença do microorganismo e de polissacárides. Isto é

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consistente com a associação entre a hipertensão e títulos mais elevados do antígeno e

maior taxa de positividade da tinta da China, e poderia também explicar a normalidade

do tamanho ventricular.

A recomendação atual sugere a realização de punções diárias para todos os

pacientes com níveis pressóricos superiores a 25 cm H2O, com remoção de volume de

LCR suficiente para reduzir a pressão em até 50%, até que a pressão de abertura

permaneça normal por vários dias. Não está claro qual o volume máximo que possa ser

retirado com segurança numa punção, mas parece ser razoável o de 20 a 30 ml.

Não há qualquer evidência a favor do uso de manitol, acetazolamida ou

corticosteróide com a finalidade de controlar a pressão elevada do LCR.

Meningite criptocócica na Síndrome de Reconstituição Imunológica (SRI)

O início da terapia antiretroviral pode levar à recuperação da resposta

imunológica contra organismos viáveis ou mortos, assim como contra restos

antigênicos. Isto, por sua vez, pode acarretar um quadro de deterioração clínica

paradoxal, com o surgimento de doença criptocócica previamente subclínica ou

recorrência de uma infecção adequadamente tratada. A meningite criptocócica na SRI

tem sido relatada em 6-30% dos pacientes com meningite criptocócica após o início do

tratamento antiretroviral, podendo ser, por vezes, fatal. Num estudo americano, a

mediana para o início dos sintomas foi de 30 dias após a introdução do esquema

terapêutico, mas há relatos de muitos meses. O diagnóstico de meningite por SRI é de

exclusão e os seguintes elementos apóiam a suspeita:

- associação temporal entre o início do tratamento antiretroviral com as manifestações

clínicas

- evidência de SRI (elevação da contagem de CD4)

- exclusão de explicações alternativas

- características clínicas (p. ex. linfadenopatia), citologia (pleocitose) ou histopatologia

consistente com resposta imunológica mediada por células

- cultura para criptococcos negativa.

A ocorrência de meningite criptocócica por SRI tem implicações sobre o melhor

momento para o início do tratamento retroviral, devendo decidir entre o maior risco

dessa complicação com o início precoce e o risco de outras complicações da Aids pela

demora excessiva. A maioria dos investigadores sugere um intervalo de 4 semanas entre

o antifúngico e o esquema antiretroviral.

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Mozart’s movements and behavior: a case of Tourette’s syndrome? Ashoori A et al.

J Neurol Neurosurg Psychiatry, 78: 1171, 2007.

Nesta interessante revisão, os autores exploram o freqüente questionamento:

“Mozart tinha síndrome de Tourette?”

Embora haja numerosos relatos atribuindo a personalidade e o comportamento

peculiares de Mozart a um espectro de doenças neurocomportamentais, tais como

síndrome de Tourette, autismo, síndrome de Asperger, transtorno de déficit de atenção e

hiperatividade, distúrbio obsessivo-compulsivo e doenças neuropsiquiátricas pediátricas

autoimunes associadas com infecção estreptocócica, as evidências de alguma dessas

moléstias são precárias. Se o comportamento de Mozart era nada mais que um reflexo

de sua personalidade ímpar ou de uma doença neurológica mais complexa agravada

posteriormente durante sua vida por pesadas cobranças por parte de seu pai e da

sociedade, seu comportamento tem sido motivo de debate em sua biografia.

Em suas cartas, Mozart fazia uso excessivo de palavras obscenas, focando

principalmente defecação e vulgaridades anais, sugerindo coprografia. Joseph Lange,

seu cunhado (casado com a irmã de Constanze Weber, sua esposa), relatou que Mozart

tinha um comportamento imaturo, especialmente em suas conversas e atitudes, por

vezes falando de forma desconexa e confusa. Embora a coprolalia seja uma

característica da síndrome de Tourette, não está presente em todos os pacientes, nem é

específico da doença. Para alguns estudiosos, esta característica de Mozart pode

simplesmente refletir um estilo de fala que era um comportamento aceitável na

população de classe média do sul da Alemanha ou influenciado por sua família, sendo

conseqüente ao humor satírico e hipomaníaco e mais intencional que involuntário, ou

pode ser resultante da influência da mãe em seu comportamento de humor

“Salzburguês”.

Além do comportamento vulgar, Mozart fazia caretas e apresentava movimentos

repetitivos e inadvertidos com as mãos e pés, e pulava, atribuídos por alguns

pesquisadores como tiques motores e fônicos como parte da síndrome de Tourette.

Várias descrições detalham seu comportamento hiperativo. Por exemplo, enquanto

compunha, ele estava envolvido simultaneamente com outras atividades como

caminhar, cavalgar e jogar bilhar. Sophie Haible, sua cunhada, escreveu em uma das

cartas que ele freqüentemente limpava seus lábios com guardanapos, fazia caretas, batia

suas mãos ou pés em objetos. Várias outras pessoas de seu convívio descreveram seus

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maneirismos e gesticulações constantes que eram relacionados a tiques faciais e

corporais.

Umas das doenças mais comumente associadas a outros sintomas da síndrome

de Tourette é a doença obsessivo-compulsiva. Realmente, Mozart exibia características

que sugeriam fortemente obsessão por objetos, pensamentos e repetição de certos atos.

Por exemplo, uma de suas maiores obsessões era seu medo injustificado de que sua

esposa pudesse abandoná-lo e também excessivamente obcecado com o modo de

higiene de sua esposa. Seu humor oscilava subitamente entre depressão e

expansibilidade, sem motivo aparente, sugestivo de doença bipolar, outra comorbidade

freqüentemente encontrada em gênios criativos. O comportamento socialmente

incomum de Mozart certamente contribuiu para as dificuldades financeiras que o

impediram de alcançar o sucesso material. Nannerl, sua irmã, escreveu que Mozart

permaneceu, até o fim de sua vida, com comportamento infantil e que jamais aprendeu a

exercer as formas mais elementares de auto-controle.

Vários elementos do comportamento de Mozart podem indicar a presença de

transtorno de atenção e hiperatividade durante sua infância, prolongando-se na sua vida

adulta. Para alguns estudiosos, os relatos de seu comportamento excêntrico teriam sido

exagerados e sua impulsividade seria meramente um traço de sua personalidade e não

uma doença psiquiátrica.

Permanece ainda desconhecida a dimensão da influência de suas experiências na

infância, de seu estilo de vida sob intensa pressão, da genialidade inata e do

extraordinário talento nas suas realizações e insucessos. As lições de sua vida podem ter

implicações importantes para outros indivíduos altamente talentosos cujos atributos

especiais podem levá-los ao sucesso ou, em contrapartida, ao obstáculo para seu

desenvolvimento emocional e torná-los vulneráveis ao estresse e ao fracasso.

Se Mozart teve realmente a síndrome de Tourette, ele foi claramente capaz de

superar as dificuldades, em contraste com uma pequena minoria de pacientes com esta

doença, cujos tiques ou comorbidades são incapacitantes.

When the brain plays music: auditory-motor interactions in music perception and

production. Zatorre RJ et al. Nature Rev Neurosci, 8: 547, 2007.

A execução de músicas é uma atividade humana natural, presente em todas as

sociedades, e um dos desafios mais complexos em exigência cognitiva que a mente

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humana pode ser confrontada. Em contraste com as atividades sensitivo-motoras, a

execução musical exige uma concatenação extremamente precisa de diversas ações

hierarquicamente organizadas, implementadas através de diversos sistemas efetores, de

acordo com o instrumento musical envolvido. Os autores revisam a literatura sobre a

neurociência cognitiva dos domínios tanto motores como auditivos, destacando a

importância das interações entre estes sistemas num contexto musical, e propõem

algumas idéias relativas ao papel do córtex pré-motor na integração das maiores

características organizacionais da música com adequação de ações temporais e

organizadas.

Comentário: É um excelente artigo de revisão, apresentando os recentes conhecimentos

da participação integrada de diferentes partes do SNC no complexo e dinâmico processo

de execução de instrumentos musicais.

A pianist’s recovery from stroke. Toole JF et al. Arch Neurol, 64: 1184, 2007.

O objetivo deste artigo é identificar as vias alternativas da recuperação da capacidade de

tocar piano após um infarto cerebral esquerdo causando paralisia do braço e mão do

lado direito.

É um relato de caso analisando a habilidade de coordenação bimanual empregando

testes estruturados de capacidade motora e neuroimagem.

Um pianista profissional de 63 anos de idade apresentou infarto lacunar na cápsula

interna direita que resultou em hemiparesia contralateral com imobilidade da mão e

dedos por 13 semanas. Após 6 meses ele tinha recuperado a habilidade bimanual para

tocar piano, “ignorando” sua mão esquerda concentrando-se e discutindo assuntos não

relacionados à música enquanto tocava.

A avaliação neurológica incluiu tomografia computadorizada, ressonância magnética

funcional e tomografia por emissão de pósitron.

Os padrões de ativação na ressonância magnética funcional correlacionaram com

movimentos rápidos dos dedos de cada mão, demonstrando que vias subcorticais e

cerebelares eram ativadas durante a função motora de sua mão esquerda. A ativação

cerebral e cerebelar contralateral ocorreu com os movimentos de ambas as mãos.

Durante a execução com os dedos da mão esquerda havia uma ativação cerebelar

bilateral, parietal, pré-motora esquerda e talâmica.

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Os padrões de ativação estavam relacionados à execução musical e eram distintos

daqueles envolvidos em procedimentos mais simples tais como os de oposição dos

dedos.

Examine eye movements. Kennard C. Pract Neurol, 7: 326, 2007.

Excelente artigo sobre a semiologia do movimento ocular extrínsico, explicando

com belas ilustrações as diferentes técnicas de investigação clínica de desalinhamento

ocular, diplopia monocular e binocular, movimentos sacádicos, nistagmo optocinético,

etc.

Neuroimaging in trauma. Gallgher CN et al. Curr Opin Neurol, 20: 403, 2007.

Excelente artigo sobre os achados de tomografia computadorizada na fase aguda

do trauma crânio-encefálico, objetivando a identificação de lesões que exigem

intervenção neurocirúrgica imediata, e da importância da ressonância magnética na fase

subaguda. Discute também o papel de técnicas complementares de neuroimagem, como

o SPECT e o PET.

Is depression overdiagnosed? Parker G; Hicke I. BMJ, 335: 328, 2007.

É um artigo em que primeiro autor apresenta argumentos defendendo a idéia de

que a depressão é superestimada e o segundo negando esta possibilidade.

Comentário: Ao término da leitura, os argumentos de que o diagnóstico esteja sendo

realmente superestimado são mais convincentes. Vale ressaltar que os critérios

diagnósticos de depressão não estão rigorosamente estabelecidos e há um enorme

interesse econômico das indústrias farmacêuticas na prescrição de antidepressivos.

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Hypertonic saline: first-line therapy for cerebral edema? Ziai WC wt al. J Neurol

Sci, 261: 157, 2007.

Este artigo destaca os dados clínicos e experimentais, controvérsias e mecanismos de

ação atribuídos à osmoterapia com soluções salinas hipertônicas na arena de cuidados

intensivos. O enfoque é dirigido ao tratamento com soluções hipertônicas nos

paradigmas comumente destacados para o comprometimento cerebral agudo incluindo

traumatismo cranioencefálico, edema pós-operatório, hemorragia intracraniana, edema

cerebral associado aos tumores e acidente vascular cerebral isquêmico.

Autoimmune encephalopathies. Vernino S et al. Neurologist, 13: 140, 2007.

A avaliação de pacientes com distúrbios comportamentais e cognitivos de instalação

recente pode ser desafiadora. O diagnóstico diferencial inclui doenças psiquiátricas,

distúrbios metabólicos e tóxicos e infecções, além de doenças priônicas (doença de

Creutzfeldt-Jakob) e demências degenerativas rapidamente progressivas. Algumas

encefalopatias subagudas são causadas por mecanismos autoimunes ou inflamatórios,

reconhecidas pela associação com marcadores de autoanticorpos e/ou clara resposta ao

tratamento imunomoderador. Esta revisão descreve as características clínicas dessas

encefalopatias autoimunes potencialmente reversíveis.

A síndrome de Morvan, a encefalite paraneoplásica límbica, a encefalite autoimune

límbica não-paraneoplásica apresentam detalhes clínicas e laboratoriais características.

A encefalite límbica é caracterizada pelo comprometimento de memória recente, crises

parciais complexas do lobo temporal e sintomas psiquiátricos. Os achados típicos da

RM são sinais de anormalidade nos lobos temporais mesiais sem reforço na fase

contrastada. A síndrome de Morvan apresenta alterações comportamentais, alucinações,

insônia acentuada, hiperatividade autonômica e neuromiotonia. A autoimunidade

tireoidiana (por vezes denominada encefalopatia de Hashimoto) tem ampla variedade de

apresentação clínica, num cenário de comprometimento cognitivo com tremor, crises,

eventos similares a AVC (incluindo afasia transitória) e níveis normais de hormônios

tiroidianos. Na ausência de achados sorológicos diagnósticos, a melhora clínica com

corticosteróides pode ser a única evidência de encefalopatia autoimune.

Conclusões; As encefalopatias autoimunes são causa importante de declínio cognitivo e

comportamental progressivo e permanecem provavelmente subdiagnosticadas. Com o

16

aumento de suspeita clínica, estas doenças podem ser identificadas e tratadas com

sucesso.

Epidural blood patch in post dural puncture headache: a randomised, observer-

blind, controlled clinical trial. Van Kooten F et al. J Neurol Neurosurg Psychiatry, in

press.

A cefaléia representa 10% a 40% das complicações da punção liquórica. Pode surgir

imediatamente após o exame, mas em 90% das vezes surge depois de 48 horas. Em 80%

dos indivíduos, a queixa desaparece em até 7 dias; menos comumente persiste por

semanas ou até mesmo por meses. Apesar de várias medidas preventivas, a cefaléia pós-

punção continua sendo incapacitante. Nessas situações, o blood patch pode ser uma

intervenção benéfica, com vários estudos observacionais referindo sucesso em 70% a

90% dos casos. Entretanto, há apenas 7 estudos controlados e, mesmo assim, a

efetividade do blood patch não está firmemente estabelecida.

O objetivo deste estudo é a avaliação de eficácia do blood patch no tratamento da

cefaléia pós-punção lombar.

É um estudo randomizado e controlado, comparando o blood patch com o tratamento

conservador, consistindo de repouso no leito por 24 horas e ingestão de volume

adequado de líquidos. Pacientes que referissem cefaléia moderada ou acentuada por

mais de 24 horas (menos de 7 dias) após a realização do exame do LCR eram

randomizados para um dos procedimentos. O blood patch consistiu na injeção de 15 a

20 ml de sangue venoso no espaço epidural. Aos pacientes do grupo controle foi

recomendada a ingestão de pelo menos 2 litros diários de líquidos. O desfecho primário

foi a presença de cefaléia 24 horas após o início do tratamento e o secundário foi a

persistência do sintoma após 7 dias e a duração da dor.

Foram analisados 40 pacientes, 19 recebendo o blood patch e 21 o tratamento

conservador.

Com 24 horas de randomização, a cefaléia esteve presente em 11 (58%) no grupo

tratado com blood patch contra 19 (90%) naqueles com tratamento conservador

(p=0,03). Ao final de 7 dias, a cefaléia persistia em 3 (16%) no grupo submetido ao

blood patch contra 18 (86%) no grupo controle (p<0,001).

17

Concluem os autores que o blood patch é um tratamento eficaz na cefaléia pós-punção,

propiciando resolução do quadro numa grande proporção dos pacientes. Mesmo nos

demais, o procedimento reduz a intensidade da dor e permite o retorno às atividades

rotineiras.

Topiramate for treating alcohol dependence. A randomized controlled trial.

Johnson BA et al. JAMA, 298: 1641, 2007.

Hipoteticamente, o topiramato pode melhorar o desfecho do etilismo entre os

indivíduos dependentes, reduzindo os efeitos de reforço do álcool através da facilitação

da função de GABA e inibição das vias glutaminérgicas no sistema corticomesolímbico.

O objetivo do estudo foi determinar se o topiramato seria um tratamento eficaz e

seguro da dependência ao álcool.

Durante o período de Janeiro de 2004 a Agosto de 2006, 371 homens e mulheres

diagnosticados como dependentes do álcool participaram do estudo duplo-cego,

randomizado e controlado com placebo, em 17 locais dos Estados Unidos. O topiramato

(até 300 mg/d) foi administrado a 183 indivíduos e o placebo a 188.

O topiramato foi mais eficaz que o placebo na redução da percentagem de

consumo pesado de álcool. Os efeitos adversos foram também superiores no grupo

topiramato, incluindo parestesia, alteração da gustação, anorexia e dificuldade na

concentração.

Concluem os autores que o topiramato é um tratamento promissor para a

dependência ao álcool.

18

CEFALÉIA

Drª. Célia Aparecida de Paula Roesler

Hypnic headache successfully treated with botulinum toxin type A. Marziniak M et

al. Cephalalgia, 22: 1082, 2007.

Cefaléia hípnica é uma dor de cabeça primária, de intensidade moderada, contínua, que

acorda o paciente de seu sono. Os critérios de diagnóstico segundo o ICHD-II

descrevem a cefaléia hípnica como uma dor de cabeça sem sintomas autonômicos, com

não mais de um dos três sintomas a seguir: náusea, fotofobia ou fonofobia e pelo menos

duas das três características: ocorrência maior ou igual a 15 vezes por mês, duração

mais longa do que 15 minutos após acordar, primeira ocorrência após os 50 anos e

também não deve ser atribuída a outro transtorno.

A cefaléia hípnica é geralmente fraca a moderada, porém, dor forte é relatada por 20%

dos pacientes. A dor é bilateral em cerca de dois terços dos casos e a crise dura

geralmente entre 15 a 180 minutos, podendo ter duração maior. A incidência desse tipo

de dor de cabeça é baixa e estudos duplos-cegos não existem. O tratamento mais eficaz

tem sido feito com lítio, com uma boa resposta em 26 de 35 casos. Outras estratégias

profiláticas incluem o uso de indometacina, cafeína, flunarizina e melatonina.

Estudo de caso:

Uma mulher de 58 anos foi diagnosticada com uma história de cefaléia de 14 anos, com

dores bilaterais com ocorrência regular às 2 e às 3 horas da manhã após dormir às 23

horas. Essas dores tinham duração variável entre 2 e 10 horas. Devido a esse longo

tempo de existência, ela tomou por conta própria diversos medicamentos e reportou

melhora moderada com o uso de ácido acetil salicílico e um efeito ainda melhor em

remédios que continham cafeína.

19

Suspeitando migrânea, seu médico prescreveu triptanos. Após o tratamento com 5mg de

zolmitriptano, a cefaléia hípnica teve uma melhora, reduzindo o tempo para 30-60

minutos e com somente uma leve dor de cabeça presente.

A paciente recebeu 75U em injeções de BOTOX, aplicadas em diversos pontos, e

apresentou melhora na intensidade 10 dias após a primeira aplicação, apesar de melhora

quase imperceptível na freqüência. Após a segunda aplicação, 3 meses depois, houve

um decréscimo significativo na freqüência e após 1 ano e 4 tratamentos a paciente ficou

livre de dor. Inicialmente, o período sem dor durou apenas 3 meses, mas foi prolongado

para 5.

Foi concluído que toxina botulínica do tipo A pode ser usada profilaticamente como

tratamento alternativo em pacientes que não toleram lítio ou terapia com indometacina.

Estudos controlados parecem ser muito difíceis, dado a pequena incidência desse tipo de

cefaléia e, por esta razão, estudos de casos parecem ser a melhor maneira para se ganhar

informações sobre esse tipo de dor de cabeça.

Lower cervical disc prolapse may cause cervicogenic headache: prospective study

in patients undergoing surgery. Diener HC et al. Cephalalgia, 27: 1050, 2007.

O termo cefaléia cervicogênica foi introduzido por Sjaastad em 1983. As mais

importantes características são a dor originando do pescoço e se alastrando para a

cabeça, provocada por movimentos do pescoço ou posturas e patologia da coluna

cervical. Há entretanto controvérsias quanto à possibilidade de que um prolapso num

disco cervical inferior poderia causar dor de cabeça.

Neste estudo os pacientes foram submetidos a cirurgias de descompressão de disco e os

resultados foram analisados comparativamente observando-se melhora ou não da dor de

cabeça. A hipótese dos pesquisadores era de que pacientes com compressão de disco

cervicais inferiores não teriam mais dor de cabeça do que o grupo controle com

compressão de disco lombar.

20

A hipótese original de que a protusão de disco cervical não poderia estar associada com

dor de cabeça cervicogênica foi rejeitada por duas razões:

a) pacientes com protusão de disco cervical tiveram uma incidência de dor no pescoço e

dor de cabeça mais freqüente que os controles;

b) remoção do disco cirurgicamente resultou em significada redução da dor no pescoço/

dor de cabeça e cefaléia cervicogênica.

Em resumo, esse estudo prospectivo indica que a dor de cabeça cervicogênica pode ter

uma grande melhora pela remoção da protusão de disco em pacientes com compressão

cervical abaixo de C4.

21

NEUROLOGIA COGNITIVA E DO ENVELHECIMENTO

Dr Rogério Gomes Beato

Dr Paulo Caramelli

Eficácia e eventos adversos dos inibidores da colinesterase e da memantina na

demência vascular: meta-análise de ensaios clínicos controlados e randomizados.

[Efficacy and adverse effects of cholinesterase inhibitors and memantine in

vascular dementia: a meta-analysis of randomised controlled trials.] Kavirajan H et

al. Lancet Neurol 6: 782, 2007.

A demência vascular (DV) possui uma prevalência global de 1,2 a 4,2% em

pessoas com idade igual ou superior a 65 anos. Os inibidores da colinesterase (IChE) e a

memantina são aprovados para uso em doença de Alzheimer. Entretanto, o uso dessas

medicações na demência vascular ainda é questão de discussão.

O objetivo do artigo foi fazer revisão dos estudos publicados e não publicados

do uso dos IChE e da memantina na DV.

Foram selecionados três ensaios clínicos realizados com donepezil, dois com

galantamina, um com rivastigmina e dois com memantina. A duração dos ensaios

clínicos foi de 24 a 28 semanas. Todos foram randomizados, duplo-cegos e controlados

com placebo.

A eficácia da medicação foi avaliada pela ADAS-cog e por escalas de impressão

clínica global. Em seis estudos foi utilizado o Mini-Exame do Estado Mental (MEEM).

A idade média dos pacientes foi 72,3 a 75,1 anos nos ensaios com IChE e 76,4 a

77,4 nos ensaios com memantina. A proporção de homens por ensaio foi de 53 a 61%

para os IChE, e de 51 a 53% para os ensaios com memantina. Houve predomínio de

indivíduos da raça branca (81 a 99%). Os escores médios do MEEM no início do

tratamento variaram de 19,3 a 23,0 nos trabalhos onde foram utilizados os IChE, o que

indica demência leve, e variaram de 16,9 a 17,5 nos ensaios com memantina, o que foi

indica o diagnóstico de demência moderada.

O padrão de doença encéfalo-vascular variou nos estudos. A prevalência de

doença extensa da substância branca variou de 18 a 64% nos ensaios com IChE e de 76

a 79% em um ensaio com memantina, indicando uma larga heterogeneidade na seleção

22

das amostras. Aproximadamente 12 a 46% dos pacientes dos estudos com IChE e 30 a

35% dos pacientes dos estudos com memantina apresentavam lesões corticais. Em dois

ensaios clínicos não havia informação sobre a distribuição das lesões.

Em todos os trabalhos foram observadas diferenças significativas em relação à

ADAS-cog. Os pacientes que receberam medicamentos tiveram melhor desempenho na

ADAS-cog e no MEEM nos trabalhos nos quais estes instrumentos foram utilizados.

Em nenhum dos ensaios clínicos observou-se melhora em termos das atividades de vida

diária. Em nenhum dos três ensaios nos quais foi avaliado o comportamento por

intermédio do Inventário Neuro-Psiquiátrico (NPI) foi verificado efeito significativo a

favor do tratamento medicamentoso. Também não foram observadas alterações

significativas em relação ao comportamento e às atividades funcionais nas escalas GBS

e NOSGER nos ensaios com memantina.

Na avaliação das funções cognitivas pela meta-análise os IChE produziram

diferenças significativas nos escores do ADAS-cog, variando de – 1,10 pontos no

estudo com rivastigmina a – 2,17 no grupo de donepezil (10 mg). Nos ensaios com

galantamina, somente nos pacientes com DV a diferença foi de – 1,60. Nos estudos com

memantina, a diferença na ADAS-cog foi – 1,86.

Os escores do NPI foram, em média, baixos no início dos estudos. Não foram

observados efeitos negativos pela meta-análise nos dois ensaios com a galantamina.

Não houve diferença entre droga e placebo no ensaio com a rivastigmina.

A razão de chance (Odds Ratio; OR) para a interrupção do tratamento por

qualquer razão foi maior nos pacientes tratados com donepezil (10 mg), rivastigmina e

galantamina. O OR para a interrupção do tratamento por qualquer razão não foi maior

nos pacientes tratados com donepezil (5 mg) e com memantina.

No geral, não houve diferença significativa entre drogas e placebo em relação ao

número de mortes ocorridas durante os ensaios. Entretanto, no ensaio 319 com o

donepezil foi observado risco aumentado de morte (1,7% X 0%).

Em relação aos efeitos colaterais, o uso dos IChE foi muito associado com risco

de sintomas gastrointestinais adversos. Os efeitos colaterais observados foram: insônia,

anorexia, náusea, diarréia. A memantina não foi associada com risco aumentado de

efeitos adversos.

Apesar do efeito positivo consistente sobre a ADAS-cog e o MEEM, não foram

verificados efeitos sobre as medidas globais, o que reduz seu significado clínico do

tratamento.

23

Nos estudos onde foram utilizados os critérios NINDS-AIREN, houve variação

significativa da extensão, do tipo e da localização da doença encéfalo-vascular. Os

autores ressaltam que pacientes com mecanismos de lesão diferentes podem ter sido

incluídos dentro do diagnóstico de DV, o que pode levar a respostas terapêuticas

diferentes. Os ensaios tiverem em média duração de seis meses e foram desenhados

especificamente para avaliar efeitos sintomáticos mais do que efeitos neuroprotetores.

Nos pacientes que receberam placebo foi observada estabilidade cognitiva durante o

período de seguimento, sendo necessário que sejam realizados estudos com períodos

mais prolongados.

Os autores concluíram que a heterogeneidade clínica dos pacientes com DV

limita a generalização dos resultados por que o efeito do tratamento em subgrupos de

pacientes ou em pacientes específicos não pode ser definido. Uma meta-análise

individual de pacientes é necessária para produzir informações mais específicas sobre as

respostas ao tratamento em relação ao tipo e à gravidade da demência. A evidência

disponível indica que os IChE produzem efeitos reduzidos sobre a cognição, de

significado clínico incerto, e ocasionam efeitos colaterais significativos. Assim, os

dados são insuficientes para indicar o uso de IChE em pacientes com DV. Apesar da

evidência de maior tolerabilidade, o uso de memantina também não pode ser indicado.

O nível educacional retarda o declínio acelerado em um teste de memória em

pessoas que desenvolvem demência. [Education delays accelerated decline on a

memory test in persons who develop dementia. ] Hall CB et al. Neurology, 69: 1657,

2007.

Vários artigos têm evidenciado que nível educacional baixo é um fator de risco

para a doença de Alzheimer.

O objetivo do presente trabalho foi testar a hipótese de reserva cognitiva pelo

estudo do efeito do nível educacional sobre o declínio de memória durante a fase pré-

clínica da demência.

Foram avaliados 117 indivíduos normais do ponto de vista cognitivo que faziam

parte do estudo de envelhecimento do bairro do Bronx, Nova York (EUA), e que

desenvolveram demência no decorrer do estudo. Todos os participantes foram

24

submetidos à avaliação clínica, funcional e neuropsicológica em cada visita. Os

pacientes com suspeita de demência foram submetidos à tomografia de crânio e a

exames laboratoriais para exclusão de causas reversíveis de demência. O teste de

memória utilizado para predição de demência foi o Teste de Memória Seletiva de

Buschke (SRT).

A idade média dos participantes no início do estudo foi de 81 anos. Houve

predomínio de mulheres (68%) e de indivíduos de raça branca (90%). Todos os

pacientes falavam inglês. O tempo médio de seguimento antes do aparecimento da

demência foi de 5,6 anos. A maior parte dos pacientes recebeu diagnóstico de doença de

Alzheimer provável ou possível (61 pacientes), de demência vascular provável ou

possível (24 pacientes), de demência mista (24 pacientes) e outros subtipos de demência

(8 pacientes). Em relação ao nível educacional, nove participantes tinham até três anos

de escolaridade, 23 tinham de 4 a 6 anos, 37 de 7 a 9 anos e 27 de 10 a 11 anos. Dos 21

participantes que completaram o ensino médio, dois tinham completado alguns anos de

estudo na universidade, quatro tinham completado o curso universitário e sete tinham

completado algum curso de pós-graduação. Os indivíduos com média de oito anos de

educação formal começaram a apresentar declínio acelerado de memória 5,5 anos antes

do diagnóstico de demência. O atraso no início de declínio acelerado para cada ano de

educação formal além da média relatada pelos participantes do estudo foi de 0,21 anos.

Isso significa que indivíduos com curso universitário completo (16 anos de

escolaridade) apresentam um tempo estimado de declínio de memória acelerado de 3,8

anos antes do diagnóstico de demência, enquanto que indivíduos com apenas quatro

anos de escolaridade apresentam um tempo estimado de declínio de memória de 6,3

anos antes do diagnóstico. Após o início do declínio da memória os participantes com

média de 8 anos de educação formal apresentaram redução de 2,4 pontos por ano no

escore do SRT, o que resultou em um declínio médio de 1,18 unidades na época do

diagnóstico. Cada ano adicional de educação formal resultou em um aumento no nível

de declínio da memória de 0,1 unidades por ano.

Os autores concluíram que o declínio de memória foi significativo muitos anos

antes do diagnóstico de demência, durante a fase pré-clínica. O nível educacional teve

um efeito positivo sobre o início do declínio acelerado da memória, retardando-o e

deixando-o mais próximo da época do diagnóstico de demência. Entretanto, uma vez

que o declínio da memória se iniciou, ele ocorreu de maneira mais rápida nos indivíduos

que possuíam maior escolaridade.

25

Os autores salientaram algumas limitações do estudo que impedem que suas

conclusões sejam generalizadas. Foram analisados apenas os pacientes que

desenvolveram demência durante o período de acompanhamento, o que impossibilita a

comparação de indivíduos normais com pacientes com demência em fase pré-clínica. A

medida do nível educacional utilizada foi o número de anos completos de estudo e para

se testar a hipótese da reserva cognitiva seria melhor a utilização de alguma medida

qualitativa. Foi utilizado apenas um teste de memória para predição de demência (SRT).

Além disso, o tamanho da amostra foi relativamente pequeno, com predomínio do sexo

feminino e de indivíduos de raça branca. O número de indivíduos que concluíram algum

curso de pós-graduação foi pequeno.

A relação entre atividade cognitiva e risco de desenvolver a doença de Alzheimer.

[The relation of cognitive activity to risk of developing Alzheimer`s disease. ]

Wilson RS et al. Neurology, 69, 2007 (no prelo).

A realização de atividades cognitivas freqüentes pelos idosos tem sido associada

a um menor risco de desenvolvimento de doença de Alzheimer, mas a base desta

associação não é totalmente compreendida.

O objetivo do presente artigo foi avaliar o efeito da prática de atividades

cognitivas freqüentes em idosos sobre o risco de desenvolvimento de doença de

Alzheimer.

Participaram do estudo 775 pacientes que foram submetidos a uma avaliação

inicial e, posteriormente, a avaliações anuais. Cada avaliação foi composta pela história

clínica, exame neurológico completo e testagem das funções cognitivas. A avaliação da

participação em atividades cognitivas foi realizada com um questionário estruturado

com perguntas sobre a prática de tais atividades nas várias fases da vida, incluindo a

realização destas no momento do estudo. Os pacientes foram submetidos a um total de

duas a seis avaliações.

A idade média dos pacientes foi de 80,4 anos, com média de 14,5 anos de

educação e MEEM de 28. Houve predomínio de mulheres (75%) e de brancos (91%).

Em geral, níveis mais elevados de atividade cognitiva pregressa e presente

foram associados a melhor função cognitiva, nível sócio-econômico mais elevado e

26

maior atividade física. Para se determinar a relação entre a atividade cognitiva e o risco

de DA foi construído um modelo de riscos proporcionais. As pessoas inativas do ponto

de vista cognitivo apresentaram 2,6 mais chances de desenvolverem doença de

Alzheimer em comparação com pessoas ativas cognitivamente. A freqüência de

atividade cognitiva no passado também foi associada com redução do risco de

desenvolver doença de Alzheimer (RR = 0,56). A prática de atividades cognitivas

freqüentes também foi associada com menor incidência de comprometimento cognitivo

leve (RR = 0,71).

Os autores concluíram que idosos ativos do ponto de vista cognitivo

apresentaram menor probabilidade de desenvolver comprometimento cognitivo leve e

demência em comparação com idosos que realizaram atividades cognitivas com menor

freqüência. Os autores discutiram a hipótese de que a inatividade cognitiva poderia ser

um sinal inicial da doença de Alzheimer que antecede o quadro demencial. A atividade

cognitiva foi um fator preditivo do desenvolvimento de comprometimento cognitivo

leve, mas este não foi um fator preditivo do declínio subseqüente da atividade cognitiva.

Esta observação, em conjunção com a evidência que associa a prática de atividades

cognitivas à redução de risco de desenvolvimento de demência, não sustenta a hipótese

de que a atividade cognitiva pouco freqüente é um fator preditivo da doença de

Alzheimer porque é um pródromo da mesma.

A atividade cognitiva pode ser um indicador para algumas outras variáveis

relacionadas à doença de Alzheimer. Em particular, pessoas que são cognitivamente

mais ativas podem ter sempre sido mentalmente mais ativas durante a vida e essas

experiências cumulativas seriam mais importantes do que a prática de atividades

cognitivas após os 60 anos. Nesse sentido, os autores analisaram tanto a prática

pregressa quanto atual de atividades cognitivas em um mesmo modelo estatístico e

verificaram que o efeito da prática pregressa foi eliminado enquanto o da prática atual

não se modificou de maneira signiticativa.

Os autores discutem também que a associação de atividades cognitivas com a

manutenção das capacidades cognitivas pode ser a conseqüência de mudanças

estruturais e funcionais que ocorreram nos sistemas neurais em resposta aos estímulos

ambientais.

Os autores salientam algumas das limitações do estudo. Os dados foram

baseados em um grupo selecionado e o período médio de observação foi inferior a três

anos. Além disso, a medida do nível prévio de atividade cognitiva foi baseada em

27

relatos retrospectivos e pode ter ocorrido algum tipo de viés no processo de coleta de

dados.

28

NEUROIMUNOLOGIA Dr. Marcos Moreira

Dr. Fernando Faria Andrade Figueira

Dr. Damacio Ramón Kaimen-Maciel

CCR5-Delta32 genetic polymorphism associated with benign clinical course and

magnetic resonance imaging findings in Brazilian patients with multiple sclerosis.

Kaimen-Maciel DR et al. Int J Mol Med, 20:337, 2007.

O receptor de quimiocinas CCR5 está implicado na patogenia da Esclerose Múltipla

(EM) e essa pesquisa foi realizada para verificar a associação entre a deleção do CCR5-

∆32 em 124 pacientes com EM na região Sul do Brasil. 98 pacientes (79,0%)

apresentaram a forma remitente-recorrente de EM (EMRR), 17 (13,7%)

secundariamente progressiva (EMSP); 8 (6,5%) primariamente progressiva (EMPP) e 1

(0,8%) síndrome clinicamente isolada (CIS). O grupo controle consistiu de 127

doadores sadios de sangue da mesma região geográfica. A gravidade da doença foi

avaliada clinicamente usando a escala expandida do estado de incapacidade – EDSS.

Amostras de sangue periférico foram obtidas por punção venosa com tubos de coleta a

vácuo, com anticoagulante EDTA. O DNA genômico foi isolado das células do sangue

periférico (PBMC), utilizando-se o método de extração com etanol absoluto gelado e

100ng de DNA foram analisados por PCR. Os primers utilizados para a amplificação do

DNA foram desenhados baseados na seqüência obtida no GenBank. A condição da

reação de amplificação foi realizada utilizando 20mM de Tris HCl pH 8.4, 50mM de

KCl, 1,5mM de MgCl2, 200µM de dNTP e 1.25 unidades da Taq polymerase e consiste

numa desnaturação inicial a 94oC por 5 minutos, seguida de 35 ciclos de um minuto a

94oC, um minuto a 60oC e um minuto a 72oC respectivamente com extensão final de

10 minutos a 72oC. O produto do PCR foi analisado por eletroforese em gel de agarose

a 3% e coloração com brometo de etídio e/ou pela eletroforese em gel de acrilamida

10% e coloração com prata.Dos pacientes com EM estudados, 85 (68,5%) eram

mulheres (p=0,0093). A freqüência do CCR5-∆32 entre o grupo controle foi de 5,5% e

não diferiu significativamente da observada entre os pacientes com EM (4,8%)

(p=0.7337). A média (±SD)de idade do início da doença entre os portadores e não

portadores do alelo do CCR5-∆32 foi de 31.7 (±11.1) e 36.6 (±12.0) anos,

29

respectivamente (p=0.1312). A duração (±SD) da doença foi de 11.2 (±12.9) e 7.7

(±5.6) anos entre o CCR5-∆32 heterozigotos, e CCR5 tipo selvagem, respectivamente

(p=0.396). A média (±SD) EDSS entre os pacientes com EM portadores e não

portadores do alelo CCR5-∆32 foi 2,4±1.2 e 2,67±2.2 respectivamente (p=0.9796). Os

achados de RMN nos pacientes com EM com o genotipo CCR5-∆32 demonstraram

menor positividade com impregnação de gadolíneo (p=0.0013) e menor atrofia cerebral

(p=0.1333) comparados com os pacientes com EM com CCR5 tipo selvagem. Mesmo

as diferenças não sendo significativas o resultado sugere que o início da doença e a

progressão da incapacidade pode estar retardado em pacientes com EM portadores de

CCR5-∆32, e o CCR5-∆32 pode ser considerado um marcador biológico de EM de

prognóstico favorável. Os portadores de CCR5-delta32 estão associados com menor

recorrência e evolução mais benigna da doença associado com RNM de crânio e de

coluna que mostram menos realces patológicos ao gadolíneo e a presença de menor

atrofia demonstrando pouca atividade inflamatória das lesões compatível com a

evolução lenta da doença neste tipo de portadores de EM. Podemos sugerir o CCR5

como candidato potencial para marcador biológico na EM. Polimorfismos nos genes

que codificam as quimiocinas e citocinas e seus receptores têm sido propostos para

conferir susceptibilidade ou proteção na EM, embora as evidências ainda não sejam

definitivas. Entre os polimorfismos que apresentaram associação com a proteção para a

EM incluem o receptor de quimiocina CCR2 (MCP-1 a 4) e o receptor α da interleucina

(IL)-10 (CXCR3). Outros foram associados com maior risco para a EM, como o

receptor de quimiocina CCR5, receptor β de IL-2 e Interferon-γ (IFN- γ). Polimorfismos

em quimiocinas ou seus receptores têm sido associados com susceptibilidade ou

resistência a várias doenças ou às suas variáveis clínicas como MS. É importante

destacar alguns aspectos considerados como pontos chave, quais sejam: (1)

Quimiocinas e seus receptores controlam o tráfico de linfócitos patológicos e

fisiológicos pertinentes à continuidade do processo inflamatório na MS; (2)

Polimorfismos nos genes da quimiocina não estão associados com a resistência à MS,

mas o polimorfismo CCR5-∆32 está associado com a menor atividade da doença, com

um retardo de início da manifestação clínica da doença e com uma evolução mais lenta

da enfermidade, demorando muito mais a se chegar a uma incapacidade; (3) Os

receptores de quimiocinas CCR1, CCR2, CCR5 e CXCR3 são alvos possíveis para

terapia futura da EM por diminuir a atividade da doença; (4) Estudos clínicos de terapia

de receptores de citocinas-quimiocinas em pacientes com MS são esperados em breve.

30

New MRI criteria in the diagnosis of multiple sclerosis. Weinstock-Guttman B et al.

Lancet Neurol, 6(8): 664, 2007.

O diagnóstico da esclerose múltipla (EM) representa um desafio clínico, tanto

por seu variado leque de manifestações como, principalmente, pela ausência de

marcadores específicos. Doença de caráter progressivo e potencialmente incapacitante,

sua abordagem precoce certamente constitui pedra angular para o sucesso terapêutico.

Os critérios diagnósticos propostos por Charles Poser 1 nos anos 80 e ainda

amplamente utilizados, representaram um considerável avanço em sua sistematização,

adotando uma abordagem estratificada e racional, pela primeira vez incluindo achados

paraclínicos, como os do exame do líquido cefalorraquidiano. Em junho de 2000 em

Londres, um Painel Internacional sob a presidência do Prof. Ian McDonald rediscutiu

estes critérios 2 , propondo, com base em dados retrospectivos, incluir achados de

imagem por ressonância magnética (IRM) como subsídio para a caracterização da

disseminação espacial e temporal, fundamento para o diagnóstico da doença. Naquela

ocasião, ficou clara a necessidade de futuras revisões em bases prospectivas, para

análise da validade destes novos critérios. Desde então, mais duas outras revisões, em

2005 3 e mais recentemente em 2006 4, buscaram tornar mais práticas e objetivas tais

evidências, sem prejuízo à sua especificidade e sensibilidade diagnóstica.

Neste interessante artigo editorial, Bianca Weinstock-Guttman e Robert

Zivadinov de Buffallo, NY, nos propõem uma reflexão sobre os recentes estudos

retrospectivos multicêntricos de Josephine Swanton e colaboradores 5, comparando e

analisando criticamente estas diferentes metodologias diagnósticas. Estes trabalhos

discutem o valor preditivo dos distintos critérios para o risco de conversão de síndrome

clínica isolada (CIS) em EM clinicamente definida.

A revisão de 2005 já havia flexibilizado a rigidez dos critérios de disseminação

temporal e espacial originais, de McDonald em 2001, tornando-os mais práticos. Já

Swanton e seu grupo em 2006, simplificaram ainda mais tanto os requisitos para

disseminação espacial quanto temporal da doença, dispensando inclusive a necessidade

de se obter uma seqüência com gadolíneo (ver comentário do trabalho de Swanton na

NeuroAtual anterior), o que seria de grande impacto inclusive econômico.

31

A sensibilidade e acurácia dos critérios de Swanton foram de 77% e 83%

respectivamente, enquanto que as dos critérios de McDonald foram de 46% e 73%. A

especificidade, nos três critérios analisados, manteve-se acima dos 90%.

Os autores seguem sua reflexão ressaltando o curto tempo do trabalho original,

que foi de apenas dois anos. Com seguimento mais longo, mais pacientes com CIS

tenderão a desenvolver EM, o que não invalida o estudo uma vez que o principal

objetivo dos três critérios diagnósticos por imagem é o de permitir um diagnóstico

clínico o mais precocemente possível.

Concluem especulando sobre as possíveis implicações do desenvolvimento

científico no futuro do diagnóstico da EM. O advento de novas tecnologias, como os

aparelhos de alto campo eletromagnético (3T), cortes mais espessos e novas seqüências

de aquisição de imagem, vão certamente influenciar nossa capacidade de visualizar

lesões cada vez menores, em particular na substância branca, obrigando-nos a novas

formulações metodológicas, com impacto positivo tanto na sua sensibilidade quanto na

especificidade.

Referências:

1. Poser CM, Paty DW, Scheimberg I, et al. New diagnostic criteria for multiple

sclerosis: guidelines for research protocols. Ann Neurol 1983; 13: 227-231.

2. McDonald WI, Compston A, Edan G, et al. Recommended diagnostic criteria for

multiple sclerosis: guidelines from the International Panel on the diagnosis of multiple

sclerosis. Ann Neurol 2001; 50: 121–27.

3. Polman CH, Reingold SC, Edan G, et al. Diagnostic criteria for multiple sclerosis:

2005 revisions to the “McDonald Criteria”. Ann Neurol 2005; 58: 840–46.

4. Swanton JK, Fernando KT, Dalton CM, et al. Modification of MRI criteria for

multiple sclerosis in patients with clinically isolated syndromes. J Neurol Neurosurg

Psychiatry 2006; 77: 830–33.

5. Swanton JK, Rovira A, Tintoré M, et al. MRI criteria for multiple sclerosis in

patients presenting with clinically isolated syndromes: a retrospective study. Lancet

Neurology 2007; 8: 677-686

Biosimilars: opportunity or cause for concern? Roger SD et al. J Pharm Pharmaceut

Sci, 10:288, 2007.

32

Medicamentos biológicos (biofarmacêuticos) e biosimilares

De acordo com a European Agency for the Evaluation of Medicinal Products

(EMEA), “medicamentos biológicos” (citados como biofarmacêuticos nesta revisão) são

produtos medicinais contendo proteínas como substâncias ativas derivadas de

biotecnologia. Vendas de biofarmacêuticos atingem atualmente mais de 30 bilhões de

dólares apenas nos Estados Unidos. Esse número está crescendo visto que outros

medicamentos biológicos complexos estão sendo fabricados e lançados no mercado para o

tratamento de várias doenças.

Biofarmacêuticos constituem uma grande proporção de novos medicamentos e muitos

estão sendo desenvolvidos usando-se a mesma tecnologia utilizada para produzir vacinas.

Avanços ao longo do último quarto do século na composição de tecnologia de DNA

permitiram a fabricação em grande escala de proteínas biologicamente compostas dentro de

células vivas.

Biosimilares são fundamentalmente diferentes de drogas químicas genéricas. Existem

diferenças importantes, incluindo o tamanho e complexidade da substância ativa e a

natureza do processo de fabricação. Ao contrário dos medicamentos genéricos clássicos,

biosimilares não são idênticos aos seus produtos de origem e, portanto não deveriam ser

postos no mercado usando-se o mesmo procedimento aplicado aos genéricos.

Quais são algumas das questões que preocupam os segmentos envolvidos? Realização

de testes para similaridade e comparabilidade dos biosimilares com os produtos originais

(inovadores), assim como pautas para programas de farmacovigilância em longo prazo e

determinação de potenciais complicações a curto e longo prazo.

Os biofarmacêuticos usualmente são proteínas de moléculas recombinantes

manufaturadas em células vivas. Processos de fabricação para biofarmacêuticos são

altamente complexos e requerem centenas de passos de purificação e isolação específicas.

Dessa forma, é impossível produzir uma cópia exata de um biofarmacêutico, visto que

mudanças na estrutura da molécula podem ocorrer com mudanças no processo de

produção. Uma proteína pode ser modificada de várias maneiras: cadeias laterais podem ser

adicionadas, o produto pode ter alterações em sua estrutura quartenária ou terciária através

de má dobradura da proteína entre outras. Como o protocolo de fabricação é geralmente

33

uma propriedade da companhia de origem, é impossível para um fabricante de biosimilar

duplicar o processo. Isso torna o processo de fabricação extremamente desafiador, visto

que diferentes processos de fabricação podem invariavelmente conduzir a diferenças

estruturais no produto final. Por sua vez, essas diferenças podem levar a mudanças na

eficácia e, mais essencialmente, em sua habilidade de acionar respostas imunes em

pacientes.

Avaliando a biosimilaridade

Cópias exatas de fármacos sintéticos (pequena molécula) podem ser sintetizadas e

consideradas equivalentes se tiverem a mesma estrutura química, composição e perfis

farmacocinéticos das drogas originais. Com relação aos biofarmacêuticos, entretanto, não é

tão simples. Através de um processo de produção inteiramente diferente, os fabricantes de

biosimilares só podem usar uma molécula que é similar, mas não idêntica ao produto de

origem. Um desafio para os fabricantes de biosimilares é demonstrar que seus produtos têm

suficiente semelhança com o produto original, além de mostrar consistência de qualidade

entre diferentes seqüências de produção durante a fabricação. A manutenção de uma

eficácia consistente do produto é também importante para evitar super-dosagem do produto

e riscos concomitantes de eventos adversos incidentes.

Biofarmacêuticos podem ser tão extensos quanto centenas de kilodaltons, e seus pesos

moleculares podem variar até 1000 daltons. Vários testes in vitro são comumente utilizados

para comparar os aspectos estruturais de biosimilares com suas moléculas originais

incluindo determinações de seqüências de aminoácidos, carga e propriedades hidrofóbicas.

Entretanto, testes in vitro não podem prever atividade biológica in vivo. Apesar das

similaridades em tamanho e estrutura, pode haver diferenças significativas na atividade

biológica. Além disso, atividade biológica in vivo pode também ser afetada na formulação

do produto e acondicionamento, além de manuseio de cadeia fria, visto que esses

parâmetros podem influenciar a presença de impurezas e agregados da proteína. Além

disso, a atividade biológica é difícil de determinar adequadamente, visto que poucos (se

alguns) modelos animais são capazes de fornecer dados que possam ser extrapolados para

uma previsão apurada de atividade biológica em humanos. Em última análise, testes

34

clínicos controlados permanecem sendo os meios mais seguros de demonstrar similaridade

entre uma molécula biosimilar e o produto original na prática clínica. Entretanto, os testes

clínicos podem ser subpotencializados para detectar complicações iatrogênicas

infreqüentes.

Os problemas da imunogenicidade

A preocupação mais crítica com segurança relacionada aos biofarmacêuticos é a

imunogenicidade. Todos os biofarmacêuticos são moléculas biologicamente ativas

derivadas de células vivas e têm o potencial para evocar uma resposta imune. Embora o

potencial imunogênico não possa ser previsto através de análises estruturais ou químicas

dos biofarmacêuticos, vários fatores conhecidos afetam o potencial imunogênico do

produto. A presença de impurezas no produto final, modificações estruturais como

resultado do processo de fabricação e/ou condições de estocagem podem aumentar a

imunogenicidade. Procedimentos de controle de qualidade integrados no processo de

fabricação são de suma importância para assegurar a fabricação de produtos seguros de

qualidade consistente. A via de administração do biofarmacêutico também pode afetar a

imunogenicidade. A via intravenosa é menos imunogênica do que as vias intramuscular e

subcutânea. Fatores relacionados ao paciente são também importantes, tais como o

background genético e expressão HLA do paciente, que tipo de doença está sendo tratada e

o estado imune do paciente.

Os riscos de imunogenicidade podem ser reduzidos através de testes rigorosos do

biofarmacêutico durante seu desenvolvimento. Muitos dos testes são realizados in vitro,

mas alguns modelos animais são empregados sabendo-se que muitas reações imunogênicas

são específicas da espécie. Todos esses testes podem dar uma idéia do potencial antigênico

de um biofarmacêutico, mas não podem prever seus efeitos imunogênicos num paciente

individualmente.

Para uma comparação consistente de resultados, todos os ensaios usados precisam ser

padronizados de acordo com normas e recomendações internacionais. O único meio de

estabelecer segurança de um biofarmacêutico é através de testes clínicos. O monitoramento

a longo prazo dos efeitos em pacientes deve ser empreendido para avaliar adequadamente

35

os efeitos imunogênicos de qualquer biofarmacêutico introduzido no mercado. A

imunogenicidade já provou ser problemática para alguns biofarmacêuticos já introduzidos

no mercado. Anticorpos anti-interferon beta podem afetar a atividade biológica destas

drogas.

Um exemplo que ilustra as graves conseqüências de pequenas mudanças no processo

de fabricação é a que envolve a epoetina alfa. Este medicamento é utilizado para o

tratamento de pacientes com anemia secundária à doença renal crônica, visto que esses

indivíduos são incapazes de produzir quantidades consideráveis de eritropoetina endógena.

Uma mínima mudança na formulação desse produto de epoetina alfa resultou no

desenvolvimento de anticorpos neutralizadores, não apenas à droga em si, mas também à

eritropoetina nativa em alguns pacientes. Muitos pacientes desenvolveram anticorpos anti-

epoetina que neutralizaram ambas, a eritropoetina endógena e a epoetina injetável tornando

a medula óssea aplástica para as células progenitoras eritropoéticas. Embora a causa real

dessa reação imunogênica permaneça desconhecida, uma hipótese é que lixívias resultantes

de interações entre tampões de borracha descobertos e um novo estabilizador utilizados na

formulação do produto poderiam ter levado à produção de anticorpos em alguns pacientes.

Seja qual for a causa verdadeira, esse caso realça o potencial impacto catastrófico que

mínimas mudanças na fabricação podem causar e as dificuldades na produção e formulação

de biofarmacêuticos. Ele também desperta preocupação sobre a segurança de moléculas

biosimilares. Se as moléculas biosimilares são fabricadas utilizando-se um processo

completamente diferente daquele dos produtos originais, resultando em diferenças

bioquímicas e estruturais na molécula original, como pode a segurança delas ser garantida

sem um extenso teste clínico?

O que dizer da substituição?

Pacientes que substituem o medicamento biológico original para um produto similar,

mas não idêntico, podem ter conseqüências importantes. Quando defrontados com a

possibilidade de substituir uma droga original por um produto biosimilar, é importante

considerar cuidadosamente os riscos potenciais para o paciente por exemplo, aqueles

relacionados a uma resposta imunogênica para uma molécula diferente.

36

Embora alguns biosimilares pareçam ser tão seguros quanto seus produtos originais,

qualquer produto com menos exposição ao paciente deveria ser manuseado com cuidado.

Fabricantes e médicos são encorajados a fornecer informação a todos os depositários

(incluindo pacientes, farmacêuticos e outros cuidadores) fornecendo uma avaliação clara

dos riscos envolvidos na troca de um produto estabelecido para seu biosimilar equivalente.

A tolerância de risco dependerá provavelmente de fatores socioeconômicos e individuais,

tais como a gravidade da doença em questão e a política de reembolso de saúde local.

Redução no preço da droga pode ser um fator importante a se considerar em países em

desenvolvimento, ao passo que a segurança do paciente e lealdade à marca podem ser os

principais fatores em países desenvolvidos.

Conclusões

Ao contrário de drogas genéricas, biosimilares não são idênticos aos seus produtos de

origem. A natureza altamente imprevisível de respostas imunes aos biofarmacêuticos

solicita testes apropriados aos biosimilares baseados em fundamento científico e evidência

experimental rigorosa. A entrada de biosimilares no mercado farmacêutico como opção

terapêutica alternativa permanece aberta à especulação. Médicos, farmacêuticos, convênios

de saúde e pacientes precisarão comparar possíveis economias nos custos de medicações

biosimilares versus o risco de complicações iatrogênicas.

37

EPILEPSIA

Dr. Luiz Eduardo Betting

Dr. Fernando Cendes

Epilepsy in pregnancy. Tomson et al. BMJ, 335:769, 2007.

Neste artigo de revisão, os autores detalham alguns problemas terapêuticos que

surgem quando uma paciente com epilepsia em tratamento fica grávida e precisa do

controle adequado das crises bem como de atenção para a segurança fetal.

Epidemiologia: A prevalência de mulheres com epilepsia e gestantes pode atingir até

0.7%. Entretanto, a exposição fetal as medicações antiepilépticas tem aumentado uma

vez que estas medicações vêm sendo utilizadas para outras patologias como distúrbios

psiquiátricos, cefaléia e alterações neuropáticas dolorosas.

Efeitos da gestação na epilepsia: A gestação não afeta o controle das crises na maioria

das mulheres com epilepsia. As flutuações na freqüência de crises observadas durante a

gestação podem ser secundarias às alterações na farmacocinética das medicações neste

período.

Efeitos das crises na gestação: As crises tônico-clônicas generalizadas podem aumentar

a pressão sobre o útero e levar ao trauma se a paciente cair. Podem ocasionar também

acidose láctica que é transferida para o feto. Entretanto, provavelmente a maior causa de

morbimortalidade nesta população é a interrupção do uso da medicação. Estudos

indicam que as crises não contribuem para uma maior taxa de anormalidades

congênitas.

Epilepsia não é indicação para indução do parto ou cesariana eletiva. Cesariana é

necessária geralmente quando ocorrem freqüentes crises tônico-clônicas generalizadas

ou quando as crises comprometem a cooperação da paciente durante o trabalho de parto.

38

Medicações antiepilépticas e riscos para o feto: O risco de malformações é 2-3 vezes

maior que na população em geral. Este risco aumenta quando o tratamento é realizado

em politerapia e os riscos com a monoterapia parecem ser dose dependente. Em

especial, o valproato está associado a uma maior incidência de teratogênese grave

(defeitos do tubo neural) principalmente quando utilizado em altas dosagens. Assim,

esta medicação deve ser evitada em pacientes que planejam a gestação. No entanto a

suspensão abrupta desta medicação não é aconselhada, uma vez que na maioria das

vezes o fechamento do tubo neural já ocorreu quando a gravidez é percebida.

Como monitorizar o tratamento e alterar doses: As concentrações das medicações

antiepilépticas diminuem com o decorrer da gravidez. Este fato pode levar a diminuição

do controle das crises e da exposição fetal. É muito importante ressaltar a necessidade

do uso das medicações. O aumento das dosagens deve ser considerado precocemente se

houver sinais clínicos de piora no controle das crises. As medicações devem ser

utilizadas na menor dose eficaz.

Planejamento gestacional: Gestações não planejadas geralmente são tardiamente

descobertas (posterior a 5-11 semanas). Nesta altura, o período mais sensível do

desenvolvimento fetal já passou. Deste modo, nestas circunstâncias não há necessidade

de alterar a medicação antiepiléptica. O uso de ácido fólico (até 5mg/dia) é

recomendado antes da concepção até o fim do primeiro trimestre.

Manuseio obstétrico e amamentação: Devido ao risco (apesar de pequeno) de

teratogênese das medicações antiepilépticas, estas mulheres necessitam de um pré-natal

mais cuidadoso especialmente quando apresentam crises refratárias. Utilizando a ultra-

sonografia, quase todos os defeitos do tubo neural podem ser diagnosticados com 12-22

semanas de gestação. A amamentação deve ser encorajada.

39

Ictal scalp EEG recording during sleep and wakefulness: diagnostic implications

for seizure localization and lateralization. Buechler et al. Epilepsia (online early

publication): 2007.

Introdução: O sono exerce influência bem conhecida sobre as descargas epileptiformes.

Entretanto, o efeito desta influência sobre o valor localizatório das descargas ictais

ainda foi pouco investigado. Alguns relatos indicam que em pacientes com epilepsia de

lobo temporal, as crises durante o sono apresentam maior tendência a generalização

secundária. Neste estudo, os autores procuram determinar o valor localizatório do EEG

ictal durante o sono comparado com o EEG ictal em vigília.

Métodos: Critérios de inclusão foram: i) pacientes livres de crises pelo menos 2 anos

após lobectomia temporal anterior, ii) idade maior que 12 anos, iii) crises registradas

durante o sono e vigília, iv) traçados de EEG disponíveis para revisão e v) ausência de

outro foco epiléptico. Crises ocorrendo durante o sono foram definidas como: a) crises

precedidas por pelo menos 10 segundos de atividade sugestiva de sono no EEG ou, b)

aquelas em que ocorreram no máximo 10 segundos após o despertar. Os autores

compararam os seguintes pontos: i) presença de artefatos, ii) EEG ictal focal versus não

focal, iii) localização correta.

Resultados: Foram avaliados 28 pacientes com os critérios de inclusão. 134 crises foram

revistas. As diferenças observadas foram:

- EEG ictal durante o sono apresentou capacidade 2,5 vezes maior de registrar

um início focal das crises;

- EEG ictal durante o sono apresentou capacidade 4 vezes maior de localizar

corretamente o início da crise;

- EEG ictal durante o sono mostrou que a crise eletrográfica precede a

manifestação clínica em maior duração.

Conclusão: O EEG ictal durante o sono pode auxiliar na avaliação pré-cirúrgica de

pacientes com epilepsia de lobo temporal.

40

Focal cortical dysplasia: long term seizure outcome after surgical treatment. Kral

et al. J Neurol Neurosurg Psychiatry, 78:853, 2007.

Introdução: Com o desenvolvimento das técnicas de investigação de pacientes com

epilepsia, sobretudo a ressonância magnética de alta resolução o diagnóstico de

displasia cortical focal passou a ser mais freqüente. Alguns estudos descrevem taxas de

remissão de crises após o tratamento cirúrgico desta patologia variando de 40 até 86%.

Este estudo descreve a avaliação a longo prazo em pacientes com a mesma

histopatologia.

Métodos: Estudo retrospectivo avaliando pacientes que apresentavam os seguintes

critérios de inclusão: ressonância magnética (RM) pré-operatória, resultado

neuropatológico, seguimento maior que 36 meses, seguimento anual das crises, uso de

medicação antiepiléptica no pós-operatório e dados socioeconômicos.

Resultados: 49 pacientes preencheram os critérios de inclusão. 98% apresentavam uma

lesão visualizada na RM. Após um seguimento de 8.1 anos em média, 37 (76%) dos

pacientes estavam livres de crises. Dos 49 pacientes incluídos, 23 pacientes (47%)

estavam completamente sem crises desde a cirurgia e 4 (8%) pacientes apresentavam

apenas auras. Durante os 10 anos de seguimento, a proporção de pacientes com

evolução satisfatória diminuiu, principalmente dentro dos 3 primeiros anos. Durante o

seguimento a longo prazo, 48% pararam com o tratamento medicamentoso, 34%

receberam habilitação para dirigir e 57% encontraram emprego.

Conclusão: O tratamento cirúrgico de epilepsias secundarias a displasia cortical focal é

bem sucedido tanto a curto como a longo prazo. Este índice de sucesso permanece

constante principalmente após o terceiro ano de seguimento. Entretanto, estes resultados

não estão necessariamente associados a uma melhor carreira profissional ou melhora na

qualidade de vida.

41

MOLÉSTIAS INFECCIOSAS

Dr. Marcus Tulius T. Silva

Antiretroviral treatment reduces increased CSF neurofilament protein (NFL) in

HIV-1 infection. Ǻsia Mellgren et al. Neurology, 69: 1536, 2007.

Sabemos que desde o início da epidemia do HIV as manifestações neurológicas

são freqüentes, podendo ser diagnosticadas em até 30% dos pacientes ambulatoriais.

Destes, 20% recebiam o diagnóstico de Complexo Demencial da AIDS (ADC) antes do

advento da terapia antiretroviral de alta eficácia (HAART). A neuropatogênese da ADC

envolve tanto mecanismos diretos da infecção do SNC pelo HIV quanto mecanismos

indiretos inflamatórios do HIV que resultam em lesão neuronal. É notório, hoje, que a

HAART mudou o curso da infecção pelo HIV e que a ADC não é vista mais com tanta

freqüência quanto na era pré-HAART.

Uma das questões-chave para quem lida com pacientes infectados pelo HIV é

encontrar um marcador biológico de lesão neuronal. A proteína de cadeia leve

neurofilamento (NFL) é essencial para a manutenção da integridade axonal, e elevação

liquórica desta tem sido observada em várias doenças neurológicas inflamatórias

(esclerose múltipla), degenerativas (ELA) e mesmo em traumatismo craniano

(boxeadores). Em pacientes infectados pelo HIV, a elevação liquórica da NFL também

já foi demonstrada, mas o efeito da HAART nunca havia sido avaliado. Neste estudo,

Mellgren e colaboradores determinam a concentração da proteína NFL em 53 amostras

liquóricas de indivíduos infectados pelo HIV, sendo que destes 21 apresentavam alguma

doença definidora de AIDS (em nove destas o diagnóstico foi ADC). Os autores

quantificaram a NFL em amostras de liquor coletadas 30 dias antes e 90 dias após o

início da HAART.

Considerando o limite normal de 250ng/L (limite este previamente estabelecido

em voluntários saudáveis e com menos de 60 anos de idade) eles verificaram que 21

pacientes apresentavam títulos de NFL acima do limiar normal, sendo que destes 18

tinham alguma doença definidora de AIDS. Estes pacientes com títulos elevados de

NFL antes da HAART tinham menor quantidade de linfócitos T CD4 no sangue

periférico e maior quantidade de neopterina no liquor do que aqueles com títulos de

NFL normais. Dentre os pacientes com títulos elevados estavam os nove pacientes com

42

ADC (mediana de 8000 ng/L). Eles verificaram que 48% dos pacientes com altos títulos

de NFL apresentaram, ao final de três meses de HAART, níveis normais de NFL no

liquor. Dos 32 pacientes que apresentavam títulos de NFL normais antes da HAART

somente quatro não eram assintomáticos. Todos os 32 continuaram a ter títulos normais

após o início da HAART exceto um paciente, que apresentou síndrome de

reconstituição imunológica.

A interpretação dos achados é que a quantificação da proteína NFL (feita através

de um ELISA) parece ser um método confiável para acompanhar os pacientes

infectados pelo HIV em risco de ou já com o diagnóstico de ADC. Quem lida com estes

pacientes reconhece que alguns em uso de HAART e com carga viral absolutamente

controlada no sangue periférico desenvolvem déficits cognitivos ao longo do tempo,

como se o que é observado na periferia (i.e. controle viral) na verdade não

correspondesse ao que ocorre no interior do SNC (i.e., ativação microglial, liberação de

proteínas inflamatórias, cascata inflamatória, etc....). Desta forma, parece que a proteína

NFL pode refletir a lesão neuronal em curso em um paciente “com a infecção pelo HIV

controlada no sangue periférico”.

43

MOLÉSTIAS NEUROMUSCULARES

Dra. Márcia W. Cruz

The role of corticoesteroids in muscular dystrophy: A critical appraisal. Angelini

C. Muscle & Nerve, 36: 424, 2007.

Trata-se de um excelente artigo de revisão sobre o uso do corticóide nas distrofias

musculares no qual o autor faz uma revisão histórica dos ensaios clínicos e da evidência

de benefício do uso do corticóide nesta patologia.

Nas crianças que mantêm sua capacidade de deambular e naquelas em cadeiras de

rodas, o corticóide mostrou-se eficaz na melhoria da força muscular e em vários

parâmetros funcionais, tais como manutenção da capacidade de deambular.

Mostrou-se ainda eficaz em preservar a função cardíaca e respiratória.

Alguns meninos tiveram sua capacidade deambulatória mantida por anos além do que

seria esperado na evolução natural da doença.

Os esteróides mais usados foram a prednisona e prednisolona, ou o deflazacort. Os

efeitos foram semelhantes, porém o deflazacort esteve menos associado a efeito

colateral, principalmente o ganho de peso.

Não se sabe exatamente qual o mecanismo de ação do corticóide mas postula-se que

seja capaz de regular a transdução do sinal nuclear com ação em alvos genômicos e

proteômicos ainda não identificados. Outra ação possível seria redução de necrose e

inflamação e a possibilidade ainda de induzir a proliferação de mioblastos auxiliando na

regeneração muscular.

A dose estabelecida como eficaz nos diferentes estudos foi a de 0,75 mg / Kg de peso

para a prednisona e de 0,9mg/Kg para o deflazacort.

Os efeitos colaterais são revistos e um guia para prevenção do surgimento dos mesmos

é fornecido, e baseado principalmente no controle dietético, suplementação com

vitamina D, cálcio, e atenção ao peso, altura, pressão arterial e níveis glicêmicos, entre

outros.

O autor termina fazendo uma revisão das novas possibilidades terapêuticas, que são:

terapia gênica, inibição da miostatina por anticorpos específicos, upregulation da

urotropina, uso de células pluripotenciais, terapias essas em fase I de estudo, ou

anterior, sendo apenas o corticóide o padrão ouro atual para o tratamento desta

condição.

44

NEUROLOGIA INFANTIL

Dra. Umbertina Conti Reed

When is enlargement of the subarachnoid spaces not benign? A genetic

perspective. Paciorkowski AR et al. Pediatric Neurology, 37: 1, 2007.

O aumento ou alargamento do espaço subaracnóideo (ESA) ocorre em

aproximadamente 75% das crianças macrocefálicas que evoluem com desenvolvimento

neuropsicomotor normal, sendo motivo de preocupação para os pais e um desafio

diagnóstico para pediatra e neurologista infantil. Geralmente ocorre em topografia

bifrontal e acompanha-se de alargamento da fissure interhemisférica, sendo os

ventrículos de tamanho normal ou levemente aumentado. Nestas condições representa

uma entidade benigna, motivo pelo qual o autor recomenda que o termo “alargamento

benigno do ESA na infância” seja preferido ao termo “hidrocefalia externa” que é

tradicionalmente empregado na literatura médica. Supõe-se que nas crianças

neurologicamente normais o aumento do ESA seja decorrente das variações fisiológicas

da capacidade de absorção do líquido cefalorraquidiano (LCR), que em algumas seria

reduzida por conta da imaturidade das vilosidades aracnóideas. Portanto, espera-se uma

resolução do aspecto radiológico do quadro através do amadurecimento destas

vilosidades por volta de 18-24 meses de idade, embora em geral a criança permaneça

macrocefálica ao longo da vida. A recorrência familiar da macrocefalia é um dado que

deve ser valorizado nestes casos benignos, ocorrendo muito freqüentemente.

Excepcionalmente as crianças que apresentam o quadro podem cursar com um leve

atraso motor transitório devido ao aumento do segmento cefálico. O autor faz um breve

resumo da fisiologia da circulação liquórica e, a seguir discute os métodos diagnósticos

salientando que na criança com desenvolvimento normal, bastaria um acompanhamento

clínico; entretanto, é comum que os pediatras solicitem exames radiológicos, entre os

quais o ultrassom nem sempre é conclusivo, devendo-se então preferir a Ressonância

Nuclear à TC pela sua maior resolução e devido aos riscos inerentes à irradiação

trazidos pela última. Considera que para evitar interpretações errôneas, o radiologista

deve estar atento ao estado de hidratação e nutrição, além eventual concomitância com

hipomagnesemia, bem como com córtico ou quimioterapia. Também é fundamental

45

diferenciar o aumento benigno do ESA do aumento que ocorre em casos de atrofia

cerebral, nos quais se nota alargamento de todos os giros e geralmente atrofia

subcortical associada.

Entretanto, no caso de o aumento do ESA ocorrer em crianças com atraso do

desenvolvimento ou não se resolver após os dois anos de vida, deve ser feita uma

investigação diagnóstica mais ampla e alguns diagnósticos diferenciais devem ser

considerados, dos quais os principais são as seguintes condições genéticas:

determinadas mucopolissacaridoses, acondroplasia, síndrome de Sottos e acidúria

glutárica tipo I. O diagnóstico precoce de algumas destas entidades é muito importante

para aquelas nas quais novas estratégias terapêuticas estão surgindo, tais como algumas

formas de mucoplissacaridoses e acidúria glutárica tipo I. Além de apresentar os

principais aspectos que sugerem o diagnóstico destas entidades, o autor discute para

cada uma AA possíveis causas do aumento do ESA.

Nas mucopolissacaridoses, o aumento do ESA pode ser uma conseqüência direta da

dificuldade de absorção do LCR devido ao espessamento meníngeo causado pelo

depósito de glicosaminoglicanas no tecido conetivo que margeia a aracnóide. O

alargamento do ESA é mais comumente observado nas mucopolissacaridoses tipo IIIA

e IIIB e após os dois anos de idade pode-se desenvolver uma hidrocefalia comunicante.

Na acondroplasia causada por mutações de novo no gene FGFR3 e, portanto sem

história familiar, o alargamento do ESA pode ser um sinal importante para o

diagnóstico precoce em crianças macrocefálicas e de baixa estatura bem como

encurtamento proximal dos membros, que ainda não manifestam displasi esquelética

importante.

46

Na síndrome de Sotos a maioria dos pacientes apresenta o alargamento do ESA, cuja

explicação suscita discussões: poderia ser um efeito secundário do crescimento

acelerado do crânio já que o encéfalo apresenta volume normal ou estaria relacionada

com outras anormalidades estruturais do corpo caloso e do trígono dos ventrículos

laterais que são indicativas do atraso do amadurecimento do sistema nervoso central.

Pode-se postular que o atraso do desenvolvimento neuronal presente na síndrome

poderia coexistir com um atraso no amadurecimento da absorção do LCR no ESA.

Em pacientes com acidúria glutárica tipo I é comum existir aumento do ESA e do

espaço subdural anteriormente aos lobos frontais e temporais cuja etiopatogemia

também não está clara. Embora a disfunção mitochondrial decorrente dos níveis

elevados do ácido 3-hidroxiglutárico tenha sido proposta para explicar a necrose

estriatal associada com esta doença não há indícios de que uma disfunção metabólica

possa também causar o aumento do ESA.

47

Vaccination, seizures and ‘vaccine damage’. Brown NJ et al. Curr Opin Neurol, 20:

181, 2007.

Apesar do progresso científico que tornou as vacinas cada vez mais eficazes e seguras,

continua a existir na mídia uma publicidade negativa que tem afetado a taxa de

vacinação das crianças e expondo-as ao possível efeito devastador de algumas doenças

infecciosas. Em relação às vacinas utilizadas na atualidade, a incidência de crises febris

é mais baixa e não há indícios conclusivos de que sejam inerentemente epileptogênicas

ou causem encefalopatias. Esta revisão avalia três situações que relacionam as vacinas

com efeitos neurológicos adversos: o risco de crises epilépticas desencadeadas pela

vacinação, a encefalopatia pós-vacinal e as alterações de comportamento do espectro do

autismo que comumente se associam a crises epilépticas e têm sido atribuídas a

determinados esquemas vacinais.

O autor enfatiza que não há ainda uniformidade entre os estudos que avaliam os efeitos

adversos das vacinas porque nos países em desenvolvimento, devido a problemas de

custo, ainda não existe amplo acesso às novas e mais seguras vacinas que estão sendo

utilizadas nos últimos 15 anos, tais como o esquema tríplice no qual o componente

anti-pertussis inclui o antígeno acelular e o esquema polivalente difteria/tétano/

pertussis acelular/hepatite B/pólio inativado/Haemophilus influenzae tipo B, no qual

foram aperfeiçoados número e concentração de antígenos, bem como dos componentes

aditivos.

O cálculo do risco de crises febris ocorrendo nas primeiras 72 horas após a vacinação

deve levar em conta a possibilidade de se tratar de crianças já predispostas e em uma

idade em que há alta possibilidade de episódios infecciosos febris ocorrendo

independentemente da vacinação em si. Não há estudos comparando o risco de crises

febris em crianças em estado pós-vacinal e em crianças que estão febris por outras

causas. Adicionalmente, o novo esquema acelular da vacinação antipertussis tem

diminuído substancialmente a ocorrência de febre pós-vacinal e o risco de crises febris

passou de 1:2250 com o antigo preparado para 1: 20000 com o novo tipo.

O risco de recorrência das crises febris ou de desenvolvimento de epilepsia bem como

48

de afecções neurológicas posteriores é o mesmo em crianças que tiveram a primeira

crise febril com e sem associação com a vacinação. O diagnóstico de crises febris não

deve ser considerado contra-indicação para a vacinação, embora a febre possa

desencadear uma crise. Entretanto, em crianças que estejam apresentando um quadro

neurológico em evolução e ainda não diagnosticado, a vacinação antipertussis costuma

ser adiada até ocorrer estabilidade do quadro, embora não haja evidências concretas

para esta recomendação.

A eventual occorrência de crises epilépticas e de regressão do desenvolvimento em

seguida à vacinação em crianças previamente sadias tem suscitado inúmeras e confusas

discussões sobre a possibilidade de a vacinação ser o agente causador de uma

encefalopatia pós-vacinal, apesar da enorme heterogeneidade relativa ao tipo de vacina,

tempo decorrido entre a vacinação e o início da encefalopatia e qualidade e intensidade

dos sintomas neurológicos. A encefalopatia mioclônica severa da infância ou síndrome

de Dravet, cada vez mais diagnosticada, é uma entidade que se inicia em crianças por

volta de seis meses de idade, através de crises hemiclônicas prolongadas ou crises febris

generalizadas que se acompanham por lentificação do desenvolvimento

neuropsicomotor e regressão durante o segundo ano de vida, além do aparecimento de

outros tipos de crises. O diagnóstico é baseado nos aspectos eletroclínicos, sendo

confirmado pelo encontro de mutação no gene da subunidade alfa do canal de sódio

neuronal. Cerca de 80% dos pacientes com a síndrome de Dravet têm a mutação, a qual

é de novo em 95%. O início da síndrome na idade na qual é administrada a vacinação

antipertussis e a possibilidade da primeira crise ocorrer nas primeiras 72 horas após a

vacinação, levaram à suposição de que a síndrome fosse causada pela vacinação,

suposição reforçada pela falta de história familiar. Os autores analisaram 14 casos de

encefalopatia epiléptica supostamente desencadeada pela vacinação dos quais 12

preenchiam os critérios para o diagnóstico da síndrome de Dravet; destes 11

apresentaram a referida mutação que não existia nos pais de nove das crianças que se

submeteram a estudo molecular. Assim, os autores recomendam que em casos similares

seja efetivado o estudo molecular antes de se valorizar um eventual efeito adverso da

vacina.

49

Quanto ao surgimento de comportamento do espectro do autismo associado a crises

epilépticas em seguida à vacinação MMR, tipicamente administrada aos 12-18 meses de

idade, novamente há inúmeras controvérsias, existindo fortes evidências de que apesar

do início da regressão comportamental ser valorizada pelos pais após a vacinação, a

anamnese cuidadosa pode identificar que sintomas sutis já estavam presentes

anteriormente. Os autores também analisam as controvérsias surgidas a respeito de que

determinados tipos de componentes virais ou de aditivos contendo etilmercúrio

presentes em determinados subtipos de vacinas anti-sarampo poderiam estar associados

ao aumento gradativo da incidência do autismo universalmente. Estas suposições foram

afastadas graças a estudos epidemiológicos conclusivos e também pelo fato de o

autismo ter se tornado de diagnóstico mais fácil e mais preciso, particularmente na

atualidade quando os estudos moleculares começaram a mostrar uma forte implicação

genética com numerosos loci e alguns genes envolvidos.

50

NEUROGENÉTICA

Dr. Renato Puppi Munhoz

Prospective neuroimaging study in hereditary spastic paraplegia with thin corpus

callosum. Franca MC Jr et al. Mov Disord, 22:1556, 2007.

Paraplegia espástica hereditária (PEH) pode ser dividida em forma pura ou complexa de

acordo com a presença de sinais adicionais aos piramidais de MMII. A PEH com atrofia

de corpo caloso (PEH-ACC) é uma forma complexa, descrita inicialmente em japoneses

com herança autossômica recessiva. Sinais adicionais incluem quase invariavelmente

retardo mental e podem incluir ataxia, sinais extrapiramidais, neuropatia periférica e

epilepsia. O primeiro lócus relacionado à PEH-ACC foi identificado no cr. 15q13-15 e

denominado SPG11. Recentemente ficou demonstrado que a PEH-ACC tem uma

heterogeneidade genotípica importante com várias famílias sem linkage com loci

conhecidos e outras com mutações em outros loci como SPG 4, 7 e 21.

Este estudo realizado pelos grupos de Neurologia e Genética da Universidade Estadual

de Campinas analisou 45 pacientes com PEH e herança recessiva, encontrando 13

pertencentes a 7 famílias que preenchiam critérios para PEH-ACC. Do ponto de vista

radiológico, estes pacientes apresentavam ACC e atrofia cerebelar significativa em

relação aos outros pacientes. Análise prospectiva mostrou que esta alteração é

progressiva com redução volumétrica das estruturas afetadas significativa após apenas 2

anos em relação à primeira avaliação de imagem. Nenhum dos pacientes apresentou

linkage com o lócus de SPG11.

A conclusão do estudo é de que PEH-ACC provavelmente tem distribuição mundial e

grande heterogeneidade genotípica apesar de algumas similaridades em relação ao

fenótipo.

51

Safety and tolerability of gene therapy with an adeno-associated virus (AAV)

borne GAD gene for Parkinson's disease: an open label, phase I trial. Kaplitt MG

ET al. Lancet, 369: 2097, 2007.

Um dos principais efeitos indiretos do estado hipodopaminérgico na doença de

Parkinson (DP) é a perda da inibição GABAérgica sobre o núcleo subtalâmico (NST).

Atualmente uma das técnicas neurocirúrgicas para o tratamento da DP é o

“desligamento” da atividade do NST através da realização de subtalamotomias ou

estimulação cerebral profunda deste núcleo.

Este estudo avaliou a segurança, tolerabilidade e eficácia da introdução do gene da

descarboxilase do ácido glutâmico (GAD) no NST através de um vírus adeno-associado

(VAA). A GAD catalisa a síntese de GABA, e desta forma tornaria este circuito mais

fisiológico, um efeito próximo daquele da manipulação neurocirúrgica do NST. O

estudo foi aberto com injeção unilateral do vetor viral (VAA-GAD) no NST em

pacientes com DP. As doses foram divididas em baixa, media e alta. Quatro casos

receberam cada uma destas doses (total 12 pacientes). Os pacientes foram avaliados

clinicamente em OFF e ON no pré operatório e após 1, 3, 6 e 12 meses. Além disso,

todos foram também submetidos a imagem funcional através de PET com 18F-

fluorodeoxyglucose. Os resultados foram surpreendentes: não foram registrados efeitos

adversos, houve melhora significativa nos escores motores (p=0.0015),

predominantemente no lado contralateral àquele onde houve a intervenção, persistindo

por 12 meses. As imagens de PET mostraram uma redução significativa no

metabolismo talâmico, que indica indiretamente menos atividade no NST.

O estudo vem sendo encarado com grande ceticismo, não só pelos resultados, mas

também pelo fato de que o autor principal, Michael Koplitt, um neurocirurgião, é

consultor, acionista e membro do Advisory Board da Neurologix Research, Inc.

empresa responsável pelo desenvolvimento do vetor.

http://www.secinfo.com/dsVsj.z1Bs.htm

52

DOENÇAS DO NEURÔNIO MOTOR/ELA Dr. Mário Emílio Dourado Jr

A causa da ELA não é totalmente esclarecida. Os estudos epidemiológicos e os

experimentos com modelos animais apontam para a presença de múltiplas causas,

apesar de a doença ser classificada como uma entidade única. Acredita-se que existam

diferentes fatores que possam desencadear a doença num indivíduo com determinada

susceptibilidade genética. Dentre os gatilhos para o processo de degeneração do

motorneuronio destacam-se: processo inflamatório, exposição a agentes tóxicos,

endógenos ou exógenos, choque elétrico, atividade física extenuante.

Como prática médica os pacientes com doenças neurodegenerativas do sistema

motor têm recebido orientação de seus médicos para diminuírem a atividade física dada

ao risco de acelerar o processo de morte celular. Entretanto, os estudos epidemiológicos

não foram fortes o suficiente para confirmá-las.

A hipótese de trauma tem renascido principalmente após o relato de 8 mortes por

ELA numa população de 24000 jogadores de futebol da primeira, segunda e terceira

divisão da Liga Italiana entre os anos de 1960 e1996. Chio e col (Brain 128:472–

476;2005), analisando 7325 jogadores da Liga Italiana de Futebol, entre os anos de

1970 e 2001, observaram que a expectativa de desenvolver a ELA era de 6.5 enquanto

que o esperado para a população geral era de 0,77. Uma hipótese para explicar o maior

risco de ELA nos jogadores de futebol seria traumas repetitivos na cabeça ao cabecear a

bola inúmeras vezes.

Head Injury and Amyotrophic Lateral Sclerosis. Chen H et al. Am J Epidemiol,

166:810, 2007.

Os autores realizaram um estudo de caso-controle para examinar a relação entre

trauma craniano e o risco de desenvolver a ELA.

Os pacientes foram recrutados entre os anos de 1993 e 1996 em Boston,

Massachusetts. Dos 154 selecionados, 44 não participaram do estudo por inúmeras

razões. Os casos controles, 256 indivíduos selecionados e que completaram o

questionário, não tinham demência, parkinson, ELA, pos-polio, neuropatia.

53

A todos os participantes eram perguntados se tinham sofrido traumas severos a

tal ponto de necessitar cuidados médicos, por exemplo, praticando esporte, durante uma

briga ou num acidente. Também era perguntado quantas vezes ele sofreu trauma e em

quais partes do corpo houve a lesão (cabeça, tronco, braços, pernas).

Os autores também realizaram uma metanálise com 8 estudos publicados sobre

trauma e ELA.

A média de idade entre os portadores de ELA era de 58,3 anos. Tempo médio

para o diagnóstico foi de 14.3 meses. O início foi bulbar em 24,8% e espinhal em

75,2%. Entre os pacientes do grupo controle, 45% sofreram trauma que requereu

atenção médica. O trauma no grupo controle ocorreu com maior freqüência nas pernas

(20,9%), seguido dos braços (19,2%), cabeça (16,5%) e tronco (11,4).

Entre as partes do corpo, apenas o trauma na cabeça estava associado com ELA

(odds ratio de 1.4), mas não era estatisticamente significante.

Numa análise mais detalhada, indivíduos com traumas repetidos ou com história

de trauma dentro dos 10 anos antes do diagnóstico estavam associados com o maior

risco de desenvolver a ELA (odds ratio de 3.1 e 3.2 respectivamente). Após analisar um

pequeno subgrupo de indivíduos com múltiplos traumas cranianos, o risco de

desenvolver a ELA era de 11 vezes. A forma clínica mais freqüente nos pacientes com

ELA associados ao trauma era a de início bulbar.

O resultado da metanálise revelou associação do risco de desenvolver ELA após

trauma craniano (odds ratio de 1.7).

Entre as principais crítica ao estudo estão a pequena amostra para a análise

estatística e a interpretação individual do que era trauma severo.

Esses resultados, juntamente com o estudo dos jogadores de futebol italianos,

apontam para a associação entre trauma craniano e ELA. Recentemente, Wicks e col,

relataram, no Amyotroph Lateral Scler, 2007;8:177-179, o aparecimento simultâneo de

três casos de ELA em jogadores amadores de futebol que eram amigos. Várias são as

hipóteses para explicar a associação de jogadores de futebol e ELA, tais como: atividade

física intensa, uso de drogas ilícitas para melhorar o desempenho, exposição a pesticidas

e trauma craniano.

Será que o trauma craniano aumenta o risco de desenvolver a ELA ou o paciente

com ELA, numa fase subclinica, tem predisposição para traumatismo? O intrigante e

que trauma em outras partes do corpo não esta associado com ELA.

54

Não é bem conhecido como o trauma pode provocar a ELA. Os mecanismos

propostos são: inflação e ativação da microglia, quebra da barreira hémato-encefálica,

disfunção da mitocôndria e produção excessiva de radicais livres.

Electrical injury and amyotrophic lateral sclerosis: a systematic review of the

literature. Abhinav K et al. J Neurol Neurosurg Psychiatry, 78:450, 2007.

Os autores realizaram uma revisão sistemática na busca da associação entre o

risco de desenvolver ELA após choque elétrico. Os artigos foram selecionados por

vários bancos de dados, incluindo a PubMed e Cochrane Collaboration. O diagnóstico

de ELA, sinais de envolvimento do primeiro e segundo neurônio motor, era baseado nos

critérios do El Escorial. Outras síndromes eram identificadas e classificadas como:

síndrome progressiva do primeiro neurônio motor, síndrome progressiva do segundo

neurônio motor e síndrome não progressiva. Essa ultima era definida como

envolvimento não progressivo do primeiro e/ou do segundo neurônio motor após 6

meses do choque, ou mielopatia.

Quatro categorias de choque foram utilizadas: 300V, 301-1000V, >1000V e

queda de raio.

Entre os anos de 1906 e 2002, trinta e um artigos foram encontrados. Havia 44

pacientes com ELA, 1 com síndrome progressiva do primeiro neurônio motor, 7 com

síndrome progressiva do segundo neurônio motor e 44 com síndrome não progressiva;

com predomínio do sexo masculino (97%). Somente três casos de ELA tinham

confirmação patológica. O tempo médio entre o choque elétrico e o início da doença era

de 2.2 anos para as formas progressivas e 1 semana para as formas não progressivas. O

início era bulbar em apenas 1 paciente no grupo da ELA. No grupo de síndrome não

progressiva apenas 3 indivíduos de 17, o início da doença era diferente do local da

entrada do choque.

Em geral, a síndrome não progressiva estava associada a choques mais intensos,

especialmente a síndrome medular não progressiva (mielopatia). Tabela 1. Esses

55

pacientes podem recuperar parcial ou completamente. Já os pacientes com ELA

relatados na literatura estavam associados a choques elétricos leves.

Segundo os autores, a média de tempo entre o choque e o início da ELA é muito

longo, anos, sugerindo ser um grupo heterogêneo, enquanto que no grupo não

progressivo a média é muito curto, semana, apontando para um fator causal.

O choque elétrico pode causar varias alterações morfológicas no sistema nervoso

central, tais como, cromatólise neuronal, neuronofagia e perda neuronal. Também,

ativação de microglia, infiltração de macrófagos e neutrofilos são encontradas. Em

modelos animais de SOD1, o choque elétrico pode desencadear a cascata de lesão

celular. Porém, nesse estudo epidemiológico a associação entre choque elétrico e ELA

não foi demonstrada.

Tabela 1: distribuição dos casos das síndromes progressivas e não progressivas segundo

intensidade do choque

<300V 301-1000 >1000 Raio

Progressiva 21 12 7 6

Não progressiva 3 5 25 4

56

DOPPLER TRANSCRANIANO Dra. Viviane Flumignan Zétola

Dr. Marcos C Lange

Validação do Doppler Transcraniano em relação a Angiotomografia de crânio na

isquemia cerebral aguda. Tsivgoulis et al. Stroke, 38: 1245, 2007.

O Doppler Transcraniano (DTC) apresenta grande utilidade na avaliação

emergencial de pacientes com doença cerebrovascular isquêmica (DCVi) aguda,

possibilitando a identificação de estenoses e oclusões nas principais artérias

intracranianas, presença de mecanismos compensatórios (uso de colaterais),

monitorização de recanalização e reoclusão, além de permitir a observação de

microembolias em tempo real.

Neste estudo, os autores avaliaram a acurácia do DTC em relação a

angiotomografia de crânio (ATC) em pacientes com DCVi aguda. Foram comparados

132 pacientes atendidos em serviço de emergência com menos de 24 horas do início dos

sintomas. O intervalo máximo entre os exames foi de 2 horas. Em comparação com a

ATC, o DTC apresentou sensibilidade = 79,1%; especificidade = 94,3%; VPP = 87,2%

e VPN = 90,3% com acurácia de 89,4%. Em 7% dos casos o DTC acrescentou dados

complementares a ATC, como embolização em tempo real, uso de colaterais, fluxo

alternante (fenômeno de roubo). Os autores observaram que conforme o local de

oclusão há maior acurácia do DTC em comparação ao ATC (tabela)

Vaso Sensibilidade Especificidade VPP VPN

ACM 90% 97% 90% 97%

ACI 75% 100% 100% 99%

AB 33% 99% 50% 96%

ACM: artéria cerebral média; ACI: artéria carótida interna intracraniana; AB: artéria

basilar.

A ausência de janela temporal, limitação observada entre 5-15% das vezes,

levou a dois resultados de DTC falso-negativos, sendo que os sete falso-negativos

57

restantes ocorreram na circulação posterior (AB distal e AV, n=5) e anterior (ACM M2

distal e ramos, n=2). Os cinco exames de DTC falso-positivos foram atribuídos a sinais

de fluxo mínimo devido angulação sub-ótima na insonação distal da AB (n=1) e ACA

(n=1) e velocidades de padrão estenótico que não se confirmaram pela ATC após a

trombólise (n=2), além de interpretação errada de fluxo colateral (n=1). Em associação

com a ATC, o DTC possibilitou identificar uso de colaterais, embolia em tempo real e

fluxo alternante com características de fenômeno de roubo. Em cinco casos com sinais

de fluxo colateral (artéria oftálmica reversa, uso de ACoA, uso de ACoP), a

identificação de oclusão de ACI proximal foi confirmada por ATC ou arteriografia

digital de vasos cervicais.

Na figura (vide anexo), os autores exemplificam alguns achados: A) presença de

oclusão em ACM M1 esquerda com padrão achatado a 54mm e ACM D normal

(abaixo). B) estenose ACM M1 esquerda com aumento de velocidade e turbulência a

48mm. C) estenose terminal de AV direita com VM 113cm/s a 70mm. Todos estes

achados foram confirmados por ATC (figuras D,E,F)

A ATC é um exame utilizado para avaliação de DCVi aguda por permitir

adequada visualização dos vasos do polígono de Willis, sendo um excelente método de

identificação de estenoses intracranianas (sensibilidade = 100% e VPP = 93,4%) quando

comparada à arteriografia digital. O DTC complementa a ATC por esta não permitir a

identificação de velocidades ou embolia em tempo real. Além disso, é possível a

realização de estímulos para melhor avaliação hemodinâmica através do DTC (índice de

apnéia e teste de hiperemia para fenômenos de roubo). No entanto o DTC também

apresenta limitações devido a ser operador-dependente e por apresentar certas

limitações em relação à topografia vascular. A porção distal da AB e da ACM (M2)

nem sempre é bem insonada, bem como às vezes é difícil adequada diferenciação entre

ACA A1 hipoplásica ou ocluída.

Os autores concluem que o uso do DTC é complementar a ATC na avaliação de

pacientes com DCVi aguda.

COMENTÁRIOS: Esse e outros estudos vêm documentando de forma inequívoca a

importância da utilização do DTC na fase aguda do AVCi. O melhor reconhecimento

dos mecanismos que envolvem a lesão aguda, seja por nos auxiliar na etiologia ou por

58

elucidar os mecanismos compensatórios presentes leva a um manejo mais específico e a

uma prevenção secundária mais eficaz, além de importantes informações prognósticas.

O aspecto terapêutico do DTC ainda está em estudo, no entanto temos evidências

iniciais de grande utilidade Devemos ainda ressaltar que a possibilidade de utilizá-lo a

beira do leito, sem invasibilidade e de fácil repetição, possibilitando monitoração em

tempo real, fazem do DTC uma importante ferramenta no atendimento do AVCI.