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www.neomondo.org.br NEOMON DO UM OLHAR CONSCIENTE Ano 4 - Nº 37 - Setembro 2010 - Distribuição Gratuita A última fronteira AMAZôNIA 12 34 06 Roberto Romano Império disfarçado Usina de Belo Monte Árdua empreitada Cidade de Santo André Na contramão

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www.neomondo.org.br

NeoMoNdoum olhar conscienteAno 4 - Nº 37 - Setembro 2010 - Distribuição Gratuita

A última fronteiraAmAzôniA

12 3406

Roberto Romano

Império disfarçado

Usina de Belo monteÁrdua empreitada

Cidade de Santo AndréNa contramão

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Vem aí a

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3neo mondo - maio 2008

Vem aí a

não temos dúvida: a TV mundial não será a mesma depois da chegada da NEO MONDO TV.

InstitutoInstituto

NeoMondo

NeoMondo

Um olhar conscienteUm olhar consciente

Em seu quarto ano de circulação a NEO MONDO salta das páginas virtuais e impressas para se tornar, na Web, parte da revolução digital. A NEO MONDO TV quer ser um marco no cenário da comunicação audiovisual.

No momento em que a televisão brasileira completa seus 60 anos, a NEO MONDO TV é um ousado projeto, em parceria, de uma publicação que, em seus 4 aninhos, se sente segura para dar passos mais largos com informação qualificada em tempo integral, alicerçada em tecnologia de ponta.

A NEO MONDO TV está segura de dar sua contribuição para enriquecer o comportamento das pessoas com o que há de mais preciso e precioso no conhecimento de conceitos e práticas que tornem este Planeta mais sustentável e com qualidade de vida melhorada.

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CULTURA, LAZER E ARTE

Seções

Roberto Romano império disfarçado

Artigo – Dr. Marcos Lúcio Barreto“Projeto Pomar”

06

Artigo – Natascha TrennepohlBiorremediação

Só água no escapamento Ônibus movido a hidrogênio

mEio AmbiEnTE

4 neo mondo - setembro 2010

Diretor Responsável: Oscar Lopes Luiz

Diretor de Redação: Gabriel Arcanjo Nogueira(MTB 16.586)

Conselho Editorial: Oscar Lopes Luiz, Marcio Thamos, Dr. Marcos Lúcio Barreto, Terence Trennepohl, João Carlos Mucciacito, Rafael Pimentel Lopes, Denise de La Corte Bacci, Dilma de Melo Silva, Natascha Trennepohl, Rosane Magaly Martins e Vinicius ZambranaRedação: Gabriel Arcanjo Nogueira (MTB 16.586), Rosane Araujo (MTB 38.300) e Antônio Marmo (MTB 10.585)Estagiário: Bruno MolineroRevisão: Instituto Neo MondoDiretora de Arte: Renata Ariane RosaDiagramação: Renata Rodrigues VialliProjeto Gráfico: Instituto Neo Mondo

Tradução: Efex Idiomas - Tel.: 55 11 8346-9437Diretor de Relações Internacionais: Vinicius ZambranaDiretor Jurídico: Dr.Erick Rodrigues Ferreira de Melo e Silva

Correspondência: Instituto Neo MondoRua Primo Bruno Pezzolo, 86 - Casa 1 - Vila Floresta - Santo André – SPCep: 09050-120

Para falar com a Neo Mondo:[email protected]@[email protected]

Para anunciar: [email protected]. (11) 4994-1690

Presidente do Instituto Neo Mondo:[email protected]

Expediente PublicaçãoA Revista Neo Mondo é uma publicação do Instituto Neo Mondo, CNPJ 08.806.545/0001-00, reconhecido como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), pelo Ministério da Justiça – processo MJ nº 08071.018087/2007-24.

Tiragem mensal de 70 mil exemplares com distribuição nacional gratuita e assinaturas.

Os artigos e informes publicitários não representam necessariamente a posição da revista e são de total responsabilidade de seus autores. Proibido reproduzir o conteúdo desta revista sem prévia autorização.

23

Energia do amanhãQual caminho a seguir?

EspECiAL AmAZôniAPASPor um país mais respeitável

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Cidade de Santo André na contramão do bom senso

12

pERfiL

Artigo – Márcio Thamosa origem do mundo

30

Artigo – Denise de La Corte Bacci Geociências e educação ambiental

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EnERGiA LimpA

bioCombUsTíVEL

PAS Presença ordenadora do estado

44

EspECiAL AmAZôniA

Usina de Belo Monte Árdua empreitada

Artigo – Terence Trennepohl o agronegócio e o mercado norte-americano

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É com grande satisfação que preparamos mais uma edição de NEO MONDO. Estamos chegando à reta final na escolha dos nossos governantes e, pensando nisso, entrevistamos o doutor em Filosofia Política e professor titular de Ética e Filosofia Política da Unicamp, Roberto Romano.

Ele é categórico ao dizer que o que há no Brasil é uma falsa federação ou, como dizem os juristas, vivemos sob império disfarçado. Leia e clareie suas ideias sobre cidadania, meio ambiente, ética etc.

Em 5 de setembro é comemorado o Dia da Floresta Amazônica, e NEO MONDO não poderia deixar a data passar em branco - ou seria em “carvão”? A situação é preocupante, por isso dedicamos um caderno especial sobre este ícone mundial da biodiversidade, onde estão a maior bacia hidrográfica e a maior floresta tropical do mundo.

Desde 2008 acompanhamos o Plano Amazônia Sustentável (PAS) e fomos saber o que foi feito neste período.

Nosso repórter Bruno Molinero esteve na floresta e nos traz informações valiosas sobre a tão polêmica Usina de Belo Monte, com opiniões de especialistas sobre a construção desta hidrelétrica no Rio Xingu.

Esta é apenas uma parte do que você vai encontrar nesta edição.

Boa leitura!

25 “FLIP”celebração literária em grande estilo

EspECiAL AmAZôniA

49

EspECiAL AmAZôniA

“Projeto sargento agrário” luz no fim do país

58

Articles in Englishspecial Amazon

Impacts of Belo Monte arduos undertaking

20

26

34

44

Editorial

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EnvironmentSanto André CityDefying common sense

12Oscar Lopes Luiz

Presidente do Instituto Neo [email protected]

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5neo mondo - Julho 2008

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neo mondo - setembro 20106

Para Roberto, “temos uma ética servil e, não, raro, hipócrita... é difícil mudar posturas éticas negativas”

Perfil

R oberto romano, doutor em Filosofia Política e professor titular de Ética e Filosofia Política da unicamp, é categórico: o que há no Brasil é uma falsa federação ou, como dizem juristas, vivemos sob império disfarçado. Para o cientista político, a boa notícia seria uma ruptura com as oligarquias para mudar o cenário sociopolítico nacional.

neo monDo traz, neste Perfil, sua contribuição para candidatos e eleitores clarearem suas ideias e suas práticas sobre temas de suma importância não só da política partidária, mas da cidadania, do meio ambiente, da ética.

roberto não é desses intelectuais que se perdem em elucubrações teóricas, tão-somente, mas é dotado de uma prática so-ciopolítica, como se verá ao longo da entrevista e dos demais textos que tornam este Perfil imperdível.

População condena os ‘corruptos de Brasília’, mas vota em quem traz verbas para a sua região

Gabriel Arcanjo Nogueira

nEO mOnDO: Estamos em mais um ano eleitoral, para escolher os gover-nantes majoritários. Que diferença fundamental o senhor vê no atual quadro político-partidário em relação a períodos anteriores da República? Roberto Romano: Quase nenhuma diferença. Os partidos políticos ainda são dirigidos por oligarquias minúscu-las que se comportam como proprie-tárias das siglas. Em determinadas agremiações os coordenadores estão no poder interno após décadas e déca-das. Eles decidem tudo sem nenhuma consulta séria aos militantes da base partidária. Programas (que são joga-dos ao lixo na primeira oportunidade eleitoreira), candidatos, propaganda, alianças, tudo se decide em pequeno grupo de líderes. Não temos ainda eleições primárias reais nos partidos, de modo que os eleitores escolham todos os itens que formam a ossatura programática e decisória. Enquanto os partidos políticos brasileiros não forem democratizados internamente, veremos o triste espetáculo das elei-ções que mais se parecem com imenso balcão de venda e compras de votos. A lei da ficha limpa, apesar de todos os seus equívocos, ajuda a melhorar o quadro geral. Se fosse conseguido

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o fim do privilégio de foro para os políticos, com participação popular expressiva quanto a que ocorreu no caso daquela lei (mais de 2 milhões de apoios populares), poderíamos dizer que algo se modificou substancialmen-te na política nacional. nEO mOnDO: Passado o ciclo de ditaduras militares, seguido pelo de presidentes messiânicos neoliberais, estaríamos em um ciclo de poder-se eleger políticos comprometidos, ao menos em tese, com conquistas sociais, e não vindos das tradicionais oligarquias. O senhor concorda com essa visão do atual momento político-partidário brasileiro? Roberto Romano: É preciso ir às causas. O defeito maior de nossa vida política e cívica encontra-se na falsa federação brasileira. Na verdade, como afirmam juristas prudentes, temos de fato um império disfarçado. Não possuímos municípios com autonomia, em especial financeira. Aliás, nunca tivemos mu-nicípios em nossa história. Municípios são um invento da república romana. Nenhum outro império antigo conheceu a instituição do município. A Grécia, por exemplo, só teve cidades-estado, não municípios. Estes últimos eram um complexo de autonomia concedido às cidades aliadas de Roma, que ao se inte-grarem no império romano guardavam sua autonomia de culto, de justiça com autoridades civis e impostos próprios. Com a queda do Império do Ocidente, os municípios resistiram às invasões bárbaras, aos senhores feudais, à igreja também feudal. Eles também resistiram ao nascente Estado moderno centra-lizado. Foi com muita luta que o rei centralizador conseguiu vencer, apenas em parte, a resistência de municípios europeus. O começo da intervenção real nos municípios, que lhes diminuiu a autonomia, foi no Renascimento, por volta do século 15 e 16.

nEO mOnDO: Onde entra o Brasil na história?Roberto Romano: Ora, é neste mo-mento que o Brasil passou a existir, ou seja, já sob um centralismo absolutista que não reconhecia autonomias finan-ceiras e jurídicas municipais. Nossas cidades foram, desde o início, origina-das como entrepostos comerciais ou bélicos. Elas não tinham a tradição de luta e de autonomia conhecida pelos municípios europeus. Assim, desde o começo de nossa vida política, tivemos uma crônica de centralização excessiva e abusiva dos poderes centrais, tanto na Colônia quanto no império e na república. Aqui tudo é centralizado no núcleo do poder. Leis uniformes são impostas, sem considerar as diferenças regionais de cultura, economia etc. Em federações já muito centralizadas, como a norte-americana, os Estados e cidades possuem larga margem de autonomia diante do poder central. Aqui não. Resulta que a maior parte dos impostos segue diretamente para os cofres federais com retorno penoso aos municípios. O único meio de conseguir obras e verbas para as regiões e urbes é praticando, no Congresso Nacional, a

política corrupta e corruptora do “é dando que se recebe”. E as popu-lações locais, embora condenando da boca para fora os “corruptos de Brasília”, só votam nos deputados, senadores, governadores e prefeitos que trazem verbas para a sua região. Ou seja, temos uma ética servil e, não raro, hipócrita vigorando entre políticos e população. Sem federa-lizar de fato o país (tarefa árdua que exigiria muitos e muitos anos e iniciativas corajosas de verdadeiros estadistas), o Brasil continuará a ter-ra dos coronéis que, em oligarquia, vendem seus votos ao ou exercem chantagens sobre os presidentes da República, pouco importa a colora-ção ideológica ostentada por eles.

nEO mOnDO: Como a população poderia de fato pensar e agir pelo bem comum? Roberto Romano: Se existisse de fato uma ruptura com as oligarquias que servem de canal entre cidades/Estados e Brasília, levando recursos para as regiões em troca de votos congressu-ais para o Executivo federal, teríamos uma excelente notícia. Infelizmente não é o que assistimos.

Eleitor não interfere na “ossatura programática e decisória”; apenas

participa do “triste espetáculo de venda e compras de votos

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nEO mOnDO: É possível ter uma ideia clara sobre se, hoje, há moral em algum dos partidos que disputam a Presidência, para ficarmos apenas no cargo de maior peso nos destinos do País? Roberto Romano: Existe a moral correta em muitos partidos. Mas moral não é ética. Esta última opera coleti-vamente nos partidos e na sociedade, sendo vincada de hábitos não de-mocráticos e não igualitários. Assim, vários segmentos políticos trazem per-cepção e prática moral nova ao qua-dro nacional. Mas enquanto a ética dos partidos e de boa parte da socie-dade for a ética do favor, da violência face a face, da esperteza, não teremos mudanças morais significativas.

nEO mOnDO: Em outras palavras, a ética na política ainda é possível? Roberto Romano: A ética é o complexo de hábitos, posturas, orientações intelectuais e volitivas que definem uma coletividade. Tais hábitos, uma vez inseridos no coti-diano, tendem a se transformar em uma espécie de segunda natureza, sendo praticados de modo automá-tico. Uma das tarefas mais difíceis da política é mudar hábitos que se transformaram em ética. No mundo moderno, apenas revoluções virulen-tas (como a inglesa do século 17, a norte-americana e a francesa do 18, as revoluções democráticas e socia-listas dos séculos 19 e 20) mudaram hábitos tradicionais arraigados. Se eles melhoraram ou não, é discutível. Mas mudar a ética é uma tarefa gi-gantesca, só possível em prazo longo e com muito empenho no sentido do Bem Comum.

nEO mOnDO: Há políticos mais ou menos prontos para as responsabili-dades que os aguardam, aí nos mais diversos níveis de poder, seja Legisla-tivo seja Executivo?

A pauta verde corresponde a fortes anseios da humanidade e dos brasileiros e não deve ser usada

apenas como instrumento para captar votos“

”Roberto Romano: Sim, existem políti-cos empenhados no Bem coletivo, em todos os segmentos e partidos. Mas eles são presos em verdadeiras jaulas burocráticas e oligárquicas, que não raro lhes retiram todo entusiasmo de-mocrático, igualitário, de justiça etc. Se encontramos um político assim, nosso dever é dar-lhes o máximo apoio, porque nada mais solitário do que ser justo em estruturas sociais ou políticas injustas.

nEO mOnDO: O senhor tem, como poucos, a capacidade de conciliar co-nhecimento e clareza em transmiti-lo. O que cabe a cada eleitor(a) pesar no momento da escolha e, de outro lado, que aspectos cada candidato deve levar em conta para corresponder a essas expectativas? Roberto Romano: Deve ponderar em especial a prudência e humildade verdadeiras dos candidatos. Se eles forem arrogantes, jamais aprenderão lições políticas que sejam eficazes para o respeito do eleitor. Além dis-so, o que pretende fazer o referido candidato. Candidatos que prome-tem coisas que seriam de um âmbito bem maior ao seu (por exemplo, que caberiam à Presidência da República ou à ONU, sendo a pessoa aspirante a um cargo menor) não mostram prudência e saber (não me refiro, de modo algum, a saber científico ou técnico, mas ao saber prudencial, o que se adquire com o tempo e com a educação política).

nEO mOnDO: É possível vislumbrar alguma agenda verde dos partidos? Ou basta termos um partido com sigla que lembra a causa? Roberto Romano: O Partido Verde foi pioneiro da referida agenda e deve ser elogiado por sua coragem. Hoje, graças ao seu labor, os demais partidos notaram que a pauta verde corresponde a fortes anseios da hu-

manidade e dos brasileiros. Esperemos que tais partidos não usem apenas aquela trilha como instrumento para captar votos, mas que inscrevam suas determinações no cotidiano político e jurídico nacional.

nEO mOnDO: A escola no Brasil, desde o pré às instituições de ensino superior, pode fazer o que para que o meio ambiente se torne matéria obrigatória? E aos governos o que compete nesse mesmo sentido? Roberto Romano: Sim, me parece que é preciso aprender, desde os mais tenros anos, a respeitar o pequeno mundo que nos foi reservado. As ciências e as técnicas, bem como as artes e as humanidades, deve-riam mostrar o quanto estamos em simbiose com o nosso planeta. Aos governos, deveria caber a tarefa de bem administrar nosso trato com o meio ambiente. Seria um exemplo notável. Infelizmente estamos muito longe de tal coisa.

nEO mOnDO: O senhor partilha da tese, defendida por exemplo pelo pensador Leonardo Boff, da gover-nança planetária como saída para salvar a Mãe Terra? O que fazer para viabilizá-la? Roberto Romano: Não partilho desse programa político, embora o respeite. Creio que será preciso ainda muito tempo até que ocorra uma transformação na humanidade, a partir da qual os Estados nacionais deixarão de ser o sustentáculo dos povos. O problema da governança planetária é o mesmo, mudada a urgência, dos planos de paz elabora-dos na modernidade, como é o caso dos planos de Paz Perpétua. Enquan-to existir guerra para usufruto dos bens materiais do planeta, é muito difícil se falar em acordo ou harmo-nia política global.

nEO mOnDO: A arquiteta, com espe-cialização em filosofia e meio ambien-te, Vania Velloso, fala em re-educação pela sustentabilidade. Algo como uma saída para sanar o caos urbano, a de-gradação de recursos hídricos. Deve-se começar por onde: nas escolas ou nos gabinetes políticos?

neo mondo - setembro 20108

Perfil

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Roberto Romano: Como disse antes, uma das tarefas mais árduas é modificar uma ética que se definiu como segunda natureza. Creio que a educação escolar pode fazer sua par-te, bem como os gabinetes políticos. Mas apenas uma prática volitiva e a cada hora mais urgente pode trazer mudanças significativas. Vejam-se a lei contra a bebida alcoólica e a lei contra o cigarro: só com muita atividade dos médicos, ecologistas, jornalistas, juristas, professores, sacerdotes, elas apresentam hoje alguma chance de se instalar nas pessoas, gerando novos hábitos. A guerra movida contra tais leis mostra o quanto é difícil mudar posturas éticas negativas.

nEO mOnDO: Citando Frei Betto, a principal crítica que ele faz ao gover-no Lula é que se passaram 8 anos, e nenhuma das reformas estruturais foi feita: nem agrária nem tributária nem política nem a da saúde nem a da educação. Em que ordem de importância o senhor as colocaria e por quê?

Roberto Romano: A escolha do presidente e de seu partido pelas formas estabelecidas no Estado brasileiro (conivência com oligar-quias e oligarcas, alianças conser-vadoras e pouco republicanas, polí-tica econômica que favorece mais o capital financeiro etc.) impediu que iniciativas democráticas fos-sem assumidas com radicalidade. Por exemplo: quais passos foram dados para marcar uma nova práti-ca federativa no Brasil no período Lula? Poucos. Se somarmos os poucos passos dados em governos anteriores, veremos que a soma só leva à reprodução do centralismo excessivo, que impede a iniciativa dos municípios e de seus cidadãos. Uma iniciativa formidável do PT, antes de chegar ao poder, era o Orçamento Participativo. Ele seria um educador coletivo que geraria lideranças para a dura tarefa das reformas, pois estas últimas não podem vir apenas de cima. O que ocorreu com iniciativas como a do Orçamento Participativo?

9 neo mondo - setembro 2010

“Gosto de música, das artes em geral e de poesia. Na verdade, no meu trabalho em Filosofia, sempre insiro a estética e a política. Num de meus livros, Conservadorismo Romântico, falo justamente sobre a arte ro-mântica na política conservadora dos séculos XIX e XX, sobre a Doutrina das Cores de Goethe. Para mim, a estética, a política e a ética têm de ser vistas sob o prisma da beleza e da verdade.”

Dessa maneira, Roberto Romano faz a sua apresentação pela internet. Mais que isso, mostra - a exemplo de sua dedicação a pesquisas, dos cinco livros escritos como autor e outros tantos como colaborador, dos artigos e entrevistas em publicações brasileiras e das conferências e palestras no Brasil e no exterior - que, para ele, a teoria na prática é que vale.

nEO mOnDO: O senhor conhece ou participou de algum estudo a respeito de como encaminhar essas pendências? A Unicamp, por exemplo, realizou algum trabalho nesse sentido? Roberto Romano: Existem trabalhos de grupos e setores. Mas uma crítica que sempre faço é que nenhuma universidade brasileira se empe-nha coletivamente no estudo das questões nacionais. Este é um ponto negativo em nossas excelentes uni-versidades públicas. nEO mOnDO: A seu ver, o meio aca-dêmico-científico nacional é ouvido na medida certa por empresas e gover-nos, e mesmo ONGs? Há algum caso bem-sucedido de parceria que envolva esses segmentos sociais? Roberto Romano: Existem, sim, casos de estudos e parcerias grupais ou em âmbito restrito. Eles são bem-sucedidos. Mas creio ser tempo de as universidades elaborarem, com os go-vernos e sociedade, planos de estudo e inserção definidos rigorosamente.

A teoria que na prática vale

A TEoRiA

• Graduado em Filosofia pela USP.

• Pós-graduação na USP e na Escola de Altos Estudos Sociais de Paris, onde se doutorou em 1978.

• Livre docente adjunto e professor titular da Unicamp. Foi diretor Associado da Faculdade de Educação.

• Membro da Cadi, integrou o Consu e a Congregação do IFCH. Leciona História da Filosofia Moderna na graduação e Ética e Filosofia na pós-graduação do IFCH.

nA pRÁTiCA

• Pesquisador 1-A do CNPq. Orientou dez dissertações de mestrado e cinco teses de doutoramento.

• Assessor ad hoc do CNPq, da Capes, da Fapesp, da Faperj, da Fapemig e do Faep.

• Coordenou durante dois anos a Frente Nacional em Defesa da Ciência e Tecnologia.

• Foi presidente da Comissão de Perícias da Unicamp, no período em que resolveu, de modo positivo, a questão das “Ossadas de Perus”.

• Distinguido, em 2000, pela Associação Juízes para a Democracia como defensor dos direitos humanos no Brasil.

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Em um dos livros de que participou: Tiradentes, um presí-

dio da ditadura, Roberto escreveu apenas um capítulo. Espa-

ço suficiente para relatar e analisar o período em que o Brasil

viveu sob o terror estatal, com projeções que soam como

alerta. Reproduzo alguns trechos.

“A cada instante, a violência mostrava soberania. Alguém,

ao lado, enlouqueceu de fato. Músicas variadas, conforme

a visão dos prisioneiros, eram entoadas. Católicos berravam

um absurdo: ‘ Vai trabalhar pelo mundo afora, eu estarei até

o fim contigo’. Liberais cantavam a ‘Marselhesa´. Comunistas

repetiam as novas versões da ‘Internacional´. Sangue, sons,

corpos esmagados. Almas jogadas entre o medo e a esperan-

ça. Salve regina ... cantavam de vez em quando os frades.

Clima de pentecostes com apocalipse.”

Roberto é implacável ante a complacência de quem

estava à frente da Igreja paulistana na época ou era in-

fluente sobre ela. “D. Rossi deu uma declaração ao Estado

de S. Paulo: ‘ Se eles, os dominicanos, de fato falsificaram

documentos, serão expulsos da Igreja´. Santo homem. Fi-

quei na cela, durante dias, sem ser molestado. Enquanto

isso, os frades continuavam a ser interrogados, tanto pelo

delegado Fleury quanto na delegacia de cultos. Do fundo

de uma cortina, foi-lhes dirigida a palavra por uma voz in-

confundível, a de Lenildo Tabosa Pessoa. A náusea atingia

seu ponto máximo.”

Roberto não poupa também a ignorância tragicômica

dos que desconheciam as regras básicas da clandestini-

dade. “A primeira e suprema é o cuidado com a língua”,

constata. Antes tivessem lido “Plutarco sobre a curiosida-

de e a garrulice”, lamenta. Para o professor de Ética e Fi-

losofia Política, “foi semelhante exército de Brancaleone

que enfrentou o monopólio da força física estatal, poten-

cializado pela ditadura e pela propaganda da imprensa”.

Roberto questiona: “Quantos adversários do regime ti-

nham uma noção aproximada de seu perfil, de sua dinâmica,

de seu alcance?”. E defende “a importância da educação ci-

dadã, teórica e prática”, ao discorrer:

“O cabresto ideológico, os preconceitos, a fé absoluta

no valor das ideologias, a repressão interna nos partidos,

o velho oportunismo, tudo isso armou os militantes com

instrumentos letais, mas desarmou a sua inteligência, em-

botando-a. Quem deseja libertar um povo através desses

meios cumpre uma tarefa impossível e indesejável. Foi essa

a lição que eu tirei da época. Espero que semelhante au-

toritarismo... seja banido do universo espiritual brasileiro.

“Com a ‘ globalização’ da miséria e o renascimento

dos vários neofascismos - na esteira do desemprego, com

a hegemonia das finanças sobre a produção -, precisamos

de pessoas lúcidas, corajosas, conhecedoras do mundo em

que vivem, sem medo ou esperança, mas com força para

entender e agir de modo livre. E isso, cada vez mais, é di-

fícil de se encontrar ...

“...E o mundo caminha para o fascismo, com passos rá-

pidos. Sobrará força crítica para enfrentar a nova maré de

imbecilização das massas, em proveito deste ou daquele

Führer? Quem viver verá”.

Peripécias de um conferencista

na elaboração desta matéria, en-trevistado e entrevistador divagam um pouco sobre os tempos em que estuda-ram Filosofia, na capital paulista. era o período de vigência do famigerado ai 5, “coisas desagradáveis aconte-cendo....”. o primeiro virou brilhante pensador; o segundo, jornalista que dá pro gasto.

roberto tem um jeito peculiar de relembrar, mais que isso, a origem do nome. “minha família viveu em itapeva (sP) e, mais particularmente, no antigo núcleo colonial Barão de antonina. minha madrinha de batismo, minha

avó, era católica fervorosa. tanto que deu o nome de ‘romano’ ao meu pai, em homenagem à igreja católica apos-tólica romana. assim, ‘romano’ não é nome de família, mas apenas de meu pai, como em luiz carlos, e dos filhos dele. na verdade o nome de família é português (da silva), e outros nomes de minha família são ribeiro, marins, sal-les. como vê, nada de italiano.

“tenho passado coisas engraçadas por causa do nome/sobrenome. cer-ta feita eu iria fazer uma palestra na associação Judaica. enquanto espe-rava o começo, na porta de entrada,

chegou-se a mim um velhinho muito velhinho mesmo. Deu um abraço e me disse em belíssimo italiano: ‘tenho muito prazer de ouvir um intelectual como o senhor, de origem italiana’. era o cônsul honorário da itália em são Paulo. atordoado, sussurrei para um outro velhinho judeu, ao qual muito respeito, perguntando o que eu deve-ria fazer. ‘Finja’, me disse ele baixinho. então repliquei ao primeiro velhinho, em italiano, que a honra era minha, de ter como ouvinte um outro italiano... É o que torquato acetto chamaria Dela dissimulazione onesta...”

Perfil

“O mundo caminha para o fascismo”

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neo mondo - setembro 2008 A

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na contramão do

Meio Ambiente

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13 neo mondo - setembro 2010

A cidade de Santo André (no ABC Paulista) tem, na administração pública, discurso avançado e prática perdulária no trato do lixo; falta apoio efetivo a cooperativas

e sobra descaso com usina que serviria à regiãoGabriel Arcanjo Nogueira

E nquanto a bomba-relógio do lixo urbano descansa em mãos de quem deveria saber cuidar dele,

responsáveis de organismos públicos parecem tratar a questão como se fos-se brincadeira de esconde-esconde, no caso empurra-empurra. santo andré, por exemplo, o “a” do aBc Paulista, para não ser o “Z” em questão ambiental, precisa cuidar-se para não virar imenso lixão a céu aberto. ao menos no que concerne a coleta de lixo comum e reci-clado, cuidados sanitários - pega-se lep-tospirose no calçadão, a poucos metros do Paço municipal –, apoio a cooperati-vas de catadores.

o município, que já teve pioneira usi-na de compostagem, corre o risco de vê-la sucateada enquanto não existe nada de concreto para substituí-la. o complexo, instalado no bairro do Pedroso, não cons-ta das prioridades do semasa, o que no mínimo é um escandaloso descaso com o que de bom existe e que daria para tratar o lixo da região.

Bomba-relógio é como o instituto Gea – Ética e meio ambiente costuma referir-se ao lixo. no que diz respeito à coleta seleti-va , o Gea avalia que se trata de processo novo no Brasil, “em que ainda estamos en-gatinhando”. o que não pode é retroceder ou andar na contramão do razoável, como parece acontecer em santo andré, no aBc Paulista. “sempre há senões”, diz ana ma-ria D. luz, presidente do Gea. mas o que acontece numa cidade, que já contou com uma usina de compostagem pioneira, hoje enferrujando e correndo o risco de virar sucata, já é forte demais.

Visão avançadalincoln Grillo, prefeito do município

de 1977 a 1982, lembra que deu especial ênfase à área de saúde pública, ao “pla-nejar para governar”. entre outras ações, criou a usina de compostagem do lixo, “com capacidade para beneficiar todo lixo do Grande aBc”, não apenas da cidade que administrava. Por aí se vê a sua visão de meio ambiente avançada.

além de ter construído parques e jar-dins, decidiu tornar de utilidade pública a chácara Baronesa , entre santo andré e são Bernardo, e fez plantar cerca de 100 mil ár-vores em todo o perímetro urbano. mas a menina dos olhos, o toque futurista de sua administração foi a usina, “classificada pela universidade de tübingen, na alemanha, e por membros da organização Pan-ame-ricana de saúde como uma das melhores usinas de lixo do Brasil”, recorda-se.

lincoln lamenta que não se vejam po-líticos com a estatura do estadista e afirma sobre a usina: “comentam que estão preten-dendo vendê-la como sucata para o ferro-velho, depois de a terem desativado para en-tregar a limpeza pública à iniciativa privada”.

o cidadão lincoln revela toda sua indig-nação ao avaliar: “se o Brasil fosse um país sério, e a Justiça funcionasse, os autores de desmandos administrativos desta ordem se-riam responsabilizados civil e criminalmen-te”. sem citar nomes, diz que teve “inimigos ferozes, dominados pela inveja, que corrói mais do que a ferrugem”. se traduzirmos in-veja por falta de visão administrativa, desca-so com a coisa pública, no caso da usina foi o que causou toda a ferrugem que a tornou inútil em tão pouco tempo.

hoje em dia, quando mais se fala em meio ambiente e sustentabilidade, a impressão que fica é a de que se fos-se aproveitado, como se deve, o que de bom já existia, se teria avançado muito mais. até quando o poder público no Brasil e em cada município – que é onde o cidadão vive, trabalha, estuda, inves-te, paga impostos – irá na contramão do bom senso, ao procurar tão-somente o novo pelo novo?

Dificuldade de ser ouvidoa presidente do Gea indaga: “Por que

se faz tão pouco?”. e ela mesma responde: “Falta vontade política a governantes”. se poucas pessoas participam, acredita, “é por falta de investimento em programas de educação ambiental e mobilização, além de não haver garantia de que todo o trabalho de separar seja recompensado, isto é, que o material vá mesmo para reciclagem”.

Falta vontade política a governantes, bem como conhecimento técnico de gerenciadores dos programas

“”

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ao revelar que enfrenta dificuldades em ser ouvido pelos responsáveis pela co-leta seletiva, em geral, o Gea corrobora o que também acontece com cooperativas. estas, na visão do instituto, não são vistas como deveriam ser e, muito menos, incen-tivadas. o que representa um grave erro por ser o lixo uma bomba-relógio da socie-dade moderna. “cooperativas de catadores são uma das poucas e reais possibilidades de inclusão na sociedade de uma popula-ção que não tem escolaridade nem atende às condições impostas pelo mercado para sua contratação”.

este que seria o lado bom, todavia não é o que vê em muitos casos. “a situação em que (as cooperativas) se encontram não é das melhores. Porque não há com-preensão do poder público e da própria sociedade de suas necessidades, para que consigam realmente realizar um serviço público de qualidade”. as prefeituras não podem ignorar o que têm diariamente diante dos seus olhos: a coleta de lixo.

Para entender melhor a questão

Estima-se que uma família de 4 pes-soas descarte, por ano, cerca de 500 kg de material reciclado, para 2,4 mil kg de lixo que acaba em aterros sa-nitários ou incineradores. Este dado toma por base o que uma família de San Diego, Califórnia, nos Estados Unidos, fez questão de mostrar num trabalho da National Geographic Society, publicado no Brasil por O Estado de S. Paulo com o título A Aventura do Conhecimento

Compostagem é técnica utilizada em escala industrial, em especial no tra-tamento do lixo urbano e dos dejetos residuais do tratamento das águas. Usina, entendida como conjunto de máquinas que transforma maté-rias-primas ou semiacabadas em produtos finais(no caso, lixo urbano, do qual se aproveitam os elementos ricos em minerais e matéria orgânica, que podem ser destinados ao enri-quecimento do solo).

muitas delas pecam, segundo o Gea, pela “falta de infraestrutura, acompanhamento administrativo, capacitação técnica, edu-cação ambiental da população”.

ana maria insiste num aspecto: “Pode até haver boa vontade do poder público, mas falta conhecimento técnico aos ge-renciadores dos programas, falta verba”. o Gea acredita que um programa de coleta seletiva, para ser benfeito, tem de “ser in-tegrado a cooperativa de catadores, preci-sa de muito planejamento e investimento do município”. algo, na visão do instituto, bem mais complicado do que, por exemplo, a coleta e disposição do lixo comum.

a análise do Gea é direta e reta: “mas, para isso, investem-se fortunas e paga-se faustamente a empreiteiras. Para os programas de coleta seletiva, há pou-quíssimo planejamento e quase na de in-vestimento. Que projeto pode dar certo assim? tudo é visto muitas vezes como um programa assistencial. no entanto, falamos da destinação adequada do lixo,

Meio Ambiente

o que é um problema grave para todas as cidades médias e grandes”, acrescenta. Que a carapuça sirva para quem ainda dispor de algum bom senso.

Tecnologia definitivao serviço municipal de saneamento

ambiental de santo andré (semasa), por meio de sua assessoria de imprensa, infor-ma que na atual administração, tem como prioridade na área ambiental “definir a tec-nologia definitiva para a disposição final dos resíduos sólidos e preservar as aPPs”.

mas a usina de compostagem não faz parte dessa prioridade, esclarece. “o semasa não tem projeto para a ativação da usina de compostagem. no momento, a autarquia es-tuda várias tecnologias utilizadas no mundo para a instalação de uma usina de resíduos sólidos na cidade. entre as funções desse equipamento estariam a reciclagem da cons-trução civil, aproveitamento dos gases oriun-dos do lixo orgânico com geração de energia, captação de recursos por meio do crédito de carbono e produção de subprodutos dos re-síduos secos”, explica.

ou seja, ficamos no terreno das boas in-tenções. troca-se o certo, porém largado às traças, pelo que ainda está por vir. tanto que as funções ficam no condicional: “estariam”, diz a nota da assessoria de imprensa.

as duas cooperativas de reciclagem que a cidade possui, instaladas no aterro sanitário de santo andré, lembra o sema-sa, “são responsáveis pela triagem, separa-ção e venda de recicláveis”. Quanto ao fu-turo delas, a nota enviada a neo monDo é evasiva: “com a instalação da nova usina de reciclagem o semasa alocará estas coo-perativas no novo espaço”.

Setor desvalorizadoarmando neves, empresário do setor

de reciclagem há 40 anos, garante que o presente dessas cooperativas é preocupan-te e deixa a desejar num aspecto que para esse tipo de atividade é fundamental: o apoio efetivo do poder público. isto por-que “há falta de incentivo à coleta seleti-va no município”. o que, para armando, mostra a fragilidade dessa área. Para o em-presário, “tem de ser feito algo específico para torná-la um segmento, de fato, assu-mido pelo semasa”.

Para armando, “a autarquia precisa tam-bém fazer com que a educação ambiental esteja presente não apenas em escolas, mas também envolva as famílias dos nossos es-tudantes e a sociedade como um todo”.

Ana Maria, presidente; Araci, diretora de projetos; e Mariana, técnica do GEA, na linha de frente da reciclagem da Cooperativa Nova Esperança do Pantanal, na região metropolitana de São Paulo

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O Instituto GEA – Ética e meio am-biente e presta assessoria a prefeitu-ras e empresas com ênfase em cursos de formação de cooperativas. Em sua visão, a cooperativa ideal é aquela em que a gestão é solidária, em que todos são donos e partilham o lucro. A gestão igualmente é compartilha por todos na tomada de decisões.“O apoio do poder público é impres-cindível, até porque a responsabilida-de pela coleta de lixo é da Prefeitura. É ela quem deve zelar e fazer de tudo pra que esse serviço seja feito da melhor forma. E não há como

ignorar a necessidade da coleta se-letiva no gerenciamento de resíduos de uma cidade”, diz Ana Maria.A diretora pede aos governos munici-pais que façam programas de coleta seletiva sérios e bem planejados, com apoio efetivo a cooperativas, e ousem criar leis que apoiem a reciclagem e os programas ambientais. “Não há incentivo, por exemplo, para a empre-sa que quiser investir em programas ambientais, como há para programas culturais”, conclui a presidente. Para contatar o GEA, acesse www.institutogea.org.br

na avaliação do semasa, “santo andré faz parte do pequeno grupo de 6% das ci-dades brasileiras que oferece a coleta seleti-va”. a assessoria de imprensa da autarquia informa que em levantamento realizado pelo compromisso empresarial para reci-clagem (cempre), em 2008, o município é um dos cinco no país que oferece o serviço em 100% da cidade. o que o semasa credita à grande adesão popular, crescente desde que a coleta foi iniciada em 2000.

“em 2009, o semasa integrou toda a população em uma campanha por meio da unidade de resposta audível (ura), que orientou os moradores sobre a separação correta dos resíduos recicláveis, além de informar o dia e o horário em que o cami-nhão de coleta seletiva passa em cada rua. a ação, vencedora do prêmio ecoPet 2009, concedido pela abiPet, contribuiu para aumentar o volume coletado para 8.433 toneladas, o maior da história”, cita, para lembrar que “a coleta de úmidos na cidade registra média de 18 toneladas/mês”.

a nota é otimista, ao afirmar que “san-to andré tem um dos sistemas de coleta seletiva mais avançados do país”.

no município há organismos aos quais compete prioritariamente cuidar do meio ambiente por meio de ações que a autar-quia considera relevantes. nada que pre-veja o uso da usina de compostagem. o semasa acredita no acerto da política am-biental de santo andré, por contar “com diversos meios para promover a capacita-ção, educação, proteção e a conservação do meio ambiente do município, entre eles o Fundo municipal de Gestão e saneamento ambiental de santo andré (Fumgesan)”. mecanismo que, para a autarquia, “é uma maneira de fomentar a execução de proje-tos que visem o cuidado com o meio am-biente e a qualidade de vida da cidade. o Fumgesan tem como objetivo concentrar recursos para projetos de interesse am-biental dentro de santo andré”.

a assessoria de imprensa do semasa cita ainda como exemplo de ação ambien-tal o edital que, lançado a cada ano, trata da seleção de projetos. em 2010, o tema é “educação ambiental e consumo cons-ciente”, com divisão nos subtemas “uso racional da água” e “Destinação adequada de resíduos sólidos”.

“cada projeto é analisado pelo conse-lho gestor. aqueles que forem habilitados serão votados pelo comugesan, que esco-lherá o vencedor”. o semasa salienta que

para este ano serão liberados até r$ 330 mil para as duas propostas aprovadas, que dividirão o prêmio. com a condição de os projetos serem direcionados e executados em santo andré.

Parcerias com universidades da região também são desenvolvidas pelo semasa, finaliza a nota.

neo monDo dá a sua contribuição

ao município em que fica sua sede, para que os responsáveis por uma área tão estratégica da administração pública ana-lisem em profundidade e com seriedade a matéria, na qual trazemos subsídios preciosos a quem deveria interessar, em suma, a qualidade de vida da população.

meio ambiente tratado com ética

O Semasa acredita que, ao longo dos seus 40 anos de existência, tornou-se reconhecido no país por seu van-guardismo tecnológico e qualidade na prestação de serviços.Numa trajetória que começou em 1969, a autarquia em princípio zelava apenas pela água e esgoto da cidade. Mas aí cresceu, agregou serviços, transformando-se na primeira orga-nização brasileira a integrar todas as dimensões do saneamento. Sua Assessoria de Imprensa lembra as principais fases por que passou o Sema-sa, numa evolução que se concentra do final dos anos 1990 para cá:

• em 1997, assumiu o serviço de drenagem urbana de Santo André

• em 1998, a gestão ambiental passou a fazer parte da autarquia, incluindo o processo de licenciamentos am-bientais, fiscalização e educação

• em 1999, agregou a gestão dos re-síduos, administrando a coleta de lixo, dividido entre secos e úmidos, além do Aterro Municipal de Santo André em 2001, incorporou a Defesa Civil em 2010, ampliou suas fronteiras, ao agregar uma área de atuação, a meteorologia

Todas as dimensões do saneamento

  

Já já te mando outras duas, também com crédito GEAParabéns pela empresa que vcs criaram. Gabriel.

Na reciclagem a única brincadeira que vale é o que é possível fazer da matéria-prima

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Defying

environment

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Santo André´s public administration talks the talk, but its waste management practices squander money, take cooperative waste collection organizations for granted,

and neglect the organic composting facility that used to serve the region.Gabriel Arcanjo Nogueira

There’s lack of political will, as well of lack of technical knowledge on the

part of program administrators“

While the time-bomb of urban was-te rests in the hands of those who were supposed to take care of it,

those in charge of public agencies seem to deal with the problem as if they were playing hide-and-go-seek, or rather, hot potato. santo andré, for example, the a of são Paulos aBc region, should have its letter changed to Z, for zero when it comes to sanitation issues. in fact, the city should be concerned about not turning into a huge open air garbage dump. Waste collection, as far as recycled waste is concerned, is still far from satisfactory, sanita-tion is precarious – cases of leptospirosis have been reported originating from the open sho-pping mall area, just a few yards from the city hall – and no support is given to cooperative selective waste collection organizations.

the city that was once a pioneer in com-post technology now undergoes the risk of scrapping its composting facility without any alternative to effectively substitute it. the composting plant, located in the Pedro-so district, is not listed among semasa’s priorities; that is, at the very least, tremen-dous disregard towards a technology that has worked well and which could handle the organic waste generated in the region.

time-bomb is how the Gea – ethics & environment institute refers to waste. With regard to selective collection Gea considers it a recent project in Brazil for which we are still taking “baby steps”. What we cannot do is take “steps back” or defy common sense, which is precisely what santo andré, in the Greater aBc region of são Paulo, is doing. there are always but’s, says ana maria D. luz, President of Gea, but what is happening to this city once a pioneer in compost techno-logy with its composting plant left to rust and be scrapped, is simply unacceptable.

Foresightlincoln Grillo, mayor of santo andré

from 1977 to 1982, remembers giving spe-cial emphasis to public health while dra-wing up his “government plan”. among other acts, he created the composting Faci-lity, which was “capable of handling all or-ganic waste from the entire Greater aBc”, not only that originating from santo an-dré. that is a good sample of his foresight in terms of advanced environmental care.

Besides building parks and public gar-dens, he opened the ‘Baronesa’ Farm – be-tween santo andré and são Bernardo – to the public and also planted approximately 100 thousand trees within the urban pe-rimeter. But the apple of his eyes was the composting plant, which was “classified by the university of tübingen, Germany, and by members of the Pan-american he-alth organization as one of the best waste treatment facilities in Brazil”, recalls the former mayor.

Grillo resents the fact that there are no true statesmen left to elect and says that “rumor has it that the composting fa-cility will be scrapped and the metal sold to junk dealers, after deactivating it and fully passing on waste treatment to the private sector”.

lincoln Grillo, as a citizen, reveals to us his indignation in a statement: “if Brazil were a serious country and our legal system worked, politicians guilty of such heedless-ness would be taken to court and criminally charged”. Without ‘naming names’, he says he has had “fierce enemies, blinded by envy, and envy which corrodes more than rust”. if envy can be translated into lack of adminis-trative vision and disregard for public assets, then that is the rust which has taken over

the composting facility, rendering it useless in such a short period of time.

nowadays, when environmental is-sues and sustainability are so in vogue, the impression we have is that if we took ad-vantage of what already exists and works, as we should, we would have made much more progress. until when will public ad-ministration, both at higher realms and at the municipal level, which is where citizens live, work, study, invest, and pay taxes – insist in defying common sense seeking to invest only in novelties?

Hard to be heardthe President of Gea asks: “Why is so

little done?” to which she also answers: “lack of political will on the part of government lea-ders”. if citizens do not fight this scenario “it’s because there’s no investment in environmen-tal awareness programs and in mobilizing pe-ople to adhere to recycling; besides, there’s no guarantee that all the waste selection would bear any fruit – that is; that it would actually be recycled at the end of the process”.

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To better understand the issue

It is estimated that the average family of 4 people annually discar-ds 500Kg of recyclable materials in every 2.4 thousand kg of waste taken to a waste dump facility or to be incinerated. This information is based on the average family of San Diego, California, and was published overseas by the National Geographic Society and in Brazil by O Estado de São Paulo under the heading Know-ledge Adventure.

Composting is a technology used in large industrial scale, especially in the treatment of urban waste, sewage, and water treatment residues. The Facility in question is composed of several machines to turn these raw-materials into semi-finished goods (in the case of urban waste, elements rich in minerals and organic matter can be obtained, which can be used as fertilizer)

environment

Ana Maria, GEA President; Araci, Projects Director; and Mariana, technician, at the forefront of the �Nova Esperança do Pantanal� cooperative recycling initiative in metropolitan São Paulo

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By revealing that myriad hindrances make it difficult to be heard by selective wa-ste collection officers, the Gea corroborates the allegations of what generally happens to cooperative selective collection initiatives, which, in the institute’s understanding, are not taken seriously at all, let alone motivated to work. this is a huge mistake, since waste is a time-bomb sitting on modern society’s lap and “cooperative waste collection initiati-ves are one of the few possibilities of effecti-ve social inclusion for the illiterate population who can’t meet the minimum requirements imposed by the work market”.

indeed, this constructive alternative har-dly ever comes true; “the situation in which they (the cooperative groups) are found is worrisome. there’s no understanding on the part of the public sector and even of society of what they need to become quality public ser-vice suppliers”. city halls cannot deny what is in their faces on a daily basis: miserable peo-ple collecting waste. if they don’t do a better job it is because, according to Gea, “there’s no

infrastructure, administrative follow-up, tech-nical training, or environmental education for the population”.

ana maria insists that “there might even be politicians of good will, but the people managing these programs lack technical trai-ning and budget to do a good job”. Gea be-lieves that for a waste collection program to be effective “it must be integrated with the cooperative collection groups; it must be well drawn up; and that requires sufficient muni-cipal investments”, which in the institute’s viewpoint, is much more complicated and time-consuming than regular, non-selective waste collection. and Gea is very straight forward: “For such collection, private com-panies are hired and paid a fortune, whereas for selective collection programs there’s very little planning and hardly any investment. What project can possibly go right under such conditions? the cooperative system is often seen as social work. however, we’re talking about giving recyclable waste a due destination, which is a tremendous problem

for all medium-size and bigger urban cen-ters”, she adds. may common sense prevail, should any politicians still have any left.

Ultimate technologythe environmental sanitation service

of santo andré (semasa), through its Press office, states that during the current term of office their environmental priority is “to select a definitive technology for the final disposal of solid waste whilst protecting Per-manent Preservation areas (PPas)”. But the organic composting facility is not part of such priority. they claim that “semasa has no on-going projects to activate the composting Facility. We are currently researching into se-veral technologies used world-wide to imple-ment a solid Waste treatment Facility in the city. the functions of the equipment to be chosen would encompass civil construction material recycling, organic waste gas energy generation, carbon credit generation, and the generation of by-products originating from dry residues”, they explain.

in other words, hell is paved with good intentions. We are leaving aside something that works in the hopes of implementing something yet to be invented. so much so the tone of their reply is hypothetical; “would encompass”, states the note from the Press office.

the two cooperative selective collec-tion organizations the city actually has, both located at the sanitary landfill of santo andré, are, according to semasa, “responsible for the identification, separa-tion and selling of recyclable waste”. as for their future, the note sent to neo monDo is also evasive: “upon implementation of the new recycling Facility, semasa shall duly relocate such organizations”.

Depreciated sectorarmando neves, an entrepreneur in

the recycling segment for 40 years, guaran-tees that the current state of these collec-tion groups is worthy of concern, lacking something fundamental to their prosperity: effective government support. this happens because “there are no incentives for selective collection in this town”, which, in armando’s opinion, shows just how fragile this area is. For him “something specific must be done to make it an actual economic activity accepted by semasa”. he thinks “the autarchy must also ensure that environmental education is in place, not only at school, but also involving the students’ families and society at large”.

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GEA – Ethics & Environment Institute provides support to companies and City Halls giving special emphasis to coo-perative organizational training. Their standpoint is that an ideal cooperative organization’s management is solidary and all profits are shared among its members. Management is equally shared by all during decision-making processes. “Support from the public sector is a must, especially because the responsibility for refuse and waste collection is the City Hall’s. They should, therefore, do everything in their power to make sure this service is done as well

as possible. Selective waste collection is a need which can’t be ignored in a city”, says Ana Maria. She asks munici-pal governments to implement serious and well planned selective collection programs, providing effective support to cooperative waste collection orga-nizations and creating laws to support recycling and environmental programs. “There are no incentives, for instance, for companies willing to invest in envi-ronmental programs; only for cultural programs”, concluded GEA’s President. To contact the GEA Institute, visit www.institutogea.org.br

Ethically treating the environment

SEMASA believes that in its 40 years of existence it has become nationally known for its pioneering approach to technology and for the quality of its services. Since 1969 the autarchy, which first only took care of the water and sewers of Santo André, has grown and aggregated services, becoming the first Brazilian organization to monopolize all dimensions of sanitation. Its Press Office reminds us of the main phases SEMASA has gone through, especially from 1990 to-date:

• In 1997 SEMASA took on urban draining services for Santo André

• In 1998 environmental management became part of SEMASA, including, inspection, education, and the grant of environmental licenses

• In 1999 it aggregated residue management, waste collection admi-nistration and the separation of dry and humid waste, besides taking over Santo André�s sanitation landfill; in 2001 SEMASA incorporated Civil Defense and, in 2010, broadening its scope of action even further, it also became responsible for the official regional weather forecast.

All dimensions of sanitation

  

Já já te mando outras duas, também com crédito GEAParabéns pela empresa que vcs criaram. Gabriel.

The only amusing thing about recycling is what can be made out of its raw-materials

according to semasa santo an-dré is part of the selective 6% of Brazi-lian municipalities with selective waste collection”. their Press office informed us that a survey carried out by the or-ganization of Business commitment to recycling (cempre) shows that in 2008 the city was one of the five in the country to have implemented this service in 100% of the municipal area, to which semasa accredits growing popular adhesion sin-ce 2000. “in 2009 semasa engaged the entire population in a campaign using the audible response unit (ura), which guided city dwellers on how to correctly separate recyclable waste and informed them of the collection timetable for each street. the initiative won abiPet’s ecoPet award in 2009 for increasing the collec-ted volume to 8,433 tons – the greatest in history. humid waste collection in this city amounts to an average of 18 tons/month”. and they confirm their opti-mism by stating that “santo andré has one of the most advance selective waste collection systems in the country”.

there are agencies in the city whose primary responsibility is to look after the environment through actions deemed re-levant by semasa. nothing remotely fo-resees the reactivation of the composting Facility. Yet semasa believes in santo andré’s due adjustment of the environ-mental policy because they can count on “numerous ways of fostering training, education, protection, and environmen-tal preservation in the city, amongst which the santo andré municipal admi-nistration and environmental sanitation Fund (Fumgesan). that is a mechanism, which, for semasa, translates into a means of fostering the execution of pro-jects aiming to protect the environment and quality of life in the city. Fumgesans objective is to concentrate resources of environmental interest to santo andré.

semasa’s Press office still used the official bill which annually selects envi-ronmental projects as an example; “in 2010 the theme was ‘environmental edu-cation and conscientious consumption’, subdivided into “rational Water usage” and “correct solid residue separation”. each project is assessed by the adminis-trative council; those that pass are vo-ted by comugesan, and the winners are then chosen. semasa highlights that this year a budget of r$330 thousand

has been approved for the two approved proposals, who will share the prize under the sole condition that the projects be directed and carried out in santo andré.

Finally, “Partnerships with local uni-versities are also made by semasa” wraps up the note.

neo monDo is hereby contributing to the betterment of the city where it is headquartered so that those responsible for such a strategic public administration area may analyze this article seriously and in depth, where precious informa-tion is made available to the parties con-cerned in order to – in a nutshell: impro-ve the quality of life of the population.

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neo mondo - setembro 201020

O Programa Brasileiro Pro H2 inclui o País num seleto time de apenas 5 nações em todo o mundo que busca dominar a tecnologia das células combustíveis a hidrogênio. São Paulo começou a testar agora em agosto

o primeiro ônibus movido a H2, já entrando numa segunda fase do projeto.Antônio Marmo

energia Limpa

Só ÁGUA no escapamento

A empresa municipal de transpor-tes urbanos (emtu) finalizou a primeira bateria de testes com o

ônibus movido a hidrogênio transportando 3 toneladas de areia ensacada pelo corre-dor metropolitano são mateus–Jabaquara, na capital e entre setembro e outubro deve começar os testes com passageiros.

Do cano de descarga vem a melhor notí-cia: dali sai apenas vapor d’água, nem um grama a mais de material particulado.

a emtu/sP, coordenadora nacional do projeto, é a responsável pelo acom-panhamento e avaliação do desempe-nho dos veículos que circularão nas 13 linhas do corredor metropolitano aBD

(são mateus–Jabaquara), operado hoje pela concessionária metra.

“são testes muito importantes do ponto de vista operacional, examinando-se a via-bilidade econômica do projeto pois se trata de tecnologia e forma novas de transpor-te”, disse o governador José serra durante a apresentação do veículo, no dia 1º de julho.

Começam em São Paulo os testes com ônibus a hidrogênio

com

unic

ação

em

tu

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o governador acrescentou que “o Bra-sil é um dos cinco países do mundo, além dos estados unidos, canadá, alemanha e Japão, que dominam a tecnologia e que têm ônibus movidos a hidrogênio. tam-bém é importante salientar que somos o único, entre esses países, que detém uma tecnologia híbrida, como segunda opção para o ônibus a hidrogênio: a eletricidade”.

esta fase inicial de testes irá até o iní-cio de 2011, com os quatro ônibus previs-tos no projeto. após o período de testes, os veículos serão incorporados à frota operacional do corredor.

o cientista marcelo linardi, do instituto de Pesquisas energéticas e nucleares (ipen), havia adiantado no 7º congresso Brasileiro sobre eficiência energética, ocorrido no início de junho, informações que só foram divulga-das no dia 7 de julho pelo jornal o estado de s. Paulo dando conta de que “ônibus movidos a hidrogênio já chegaram em são Paulo e no rio de Janeiro, para testes”.

segundo linardi, o Programa Brasileiro Pro h2, do ipen, “virou modelo para o Pro-grama das nações unidas para o Desenvol-vimento (PnuD), visando a demonstrar a viabilidade dos ônibus, a infraestrutura de produção de hidrogênio e abastecimento, em condições reais de operação, desenvolver es-pecificação para ônibus com célula a combus-tível baseado nos chassis e carrocerias brasi-leiras, acelerar a comercialização deste tipo de ônibus e adquirir e disseminar cultura técnica (operação, manutenção e fabricação)”.

a intenção é operar os ônibus por 4 anos no corredor metropolitano são mateus–Jabaquara, instalar e operar es-tação de produção, armazenamento e reabastecimento de hidrogênio. o pro-grama está dividido em 4 fases, estando a primeira, de estudo de viabilidade e estratégia, já concluída.

a segunda fase é esta que começa agora, com a “demonstração da viabilidade opera-

Teste em condições reaiso projeto começou há 15 anos, quando

a empresa metropolitana de transportes urbanos de são Paulo, empresa vinculada à secretaria de estado dos transportes metro-politanos (emtu/sP), e o ministério das mi-nas e energia iniciaram estudos para o uso do hidrogênio como combustível em ônibus urbanos, utilizando o corpo de pesquiadores do instituto de Pesquisas energéticas e nu-cleares (ipen), em parceria com a usP.

o Programa das nações unidas para o Desenvolvimento (PnuD) destinou us$ 16 milhões do Global environmental

Facility (GeF) para a iniciativa. o Brasil foi beneficiado com o financiamento por ser um país de economia emergente, maior produtor e o maior mercado consumidor de ônibus do mundo.

construído em caxias do sul (rs) pela tuttotrasporti e pela marcopolo, o protótipo já foi homologado. o projeto prevê a fabricação de até quatro veículos, mais a montagem da estação de produção de hidrogênio e abastecimento dos ôni-bus, em são Bernardo do campo, com o apoio técnico da Petrobrás, da Br Distri-buidora e da aes eletropaulo.

cional de até 5 ônibus e da infraestrutura de produção e abastecimento de h2”. na fase 3 será construída garagem para 200 ônibus e infraestrutura de produção de hidrogênio e abastecimento. a última fase já prevê a pro-dução em escala comercial e industrial.

Realidade ou sonho?Falando no 7º congresso Brasileiro so-

bre eficiência energética , o cientista marce-lo linardi mostrou no painel “a economia do hidrogênio e as células a combustível: realidade ou sonho?” que o Programa Bra-sileiro Pro h2 propõe ações integradas e de cooperação para o desenvolvimento de uma tecnologia nacional para a produção limpa e eficiente de energia elétrica basea-da em células a combustível por hidrogênio (PemFc e soFc) e aplicação estacionária.

todas as ações em andamento visam a desenvolver recursos humanos nesta área, criar as condições necessárias para o estabelecimento de uma indústria nacio-nal em células a combustível, tornando o Brasil competitivo internacionalmente na área e a motivar a utilização de siste-mas de células a combustível, utilizando bio-hidrogênio, vale dizer, produzir h2 a partir do etanol.

o programa brasileiro envolve aproxi-madamente 30 pesquisadores em tempo

integral ou parcial incluindo mais de 25 estudantes. em andamento desde 2000, o programa já produziu 10 teses,15 em andamento, 16 patentes, 4 prêmios, mais de 70 publicações e cerca de 120 participa-ções em congressos.

Copa de 2014a expectativa é que o País utilize esses

veículos já na copa do mundo em 2014 e nas olimpíadas em 2016 mas a previsão mais otimista é de que a popularização de carros movidos a hidrogênio só deve ocor-rer na próxima década, a partir de 2020.

os veículos a hidrogênio não apresen-tam nenhuma emissão de material parti-culado (fumaça, poeira ou gases), mas ao lado do hidrogênio verde há também o hi-drogênio poluidor, gerado a partir de gás natural, combustível fóssil. nesse caso, não há vantagens no uso.

o processo de produção de hidrogê-nio é chamado de eletrólise, que usa a energia elétrica para quebrar molécula de água (h20) recuperando o hidrogênio. o princípio de funcionamento de uma cé-lula a combustível consiste, em resumo, na entrada de hidrogênio de um lado da célula e de oxigênio do outro lado. no centro, entre os eletrodos, existem o ele-trólito e o catalisador.

Desenvolver recursos humanos nesta área, criar as condições para implantar uma indústria nacional de Células a Combustível e motivar a utilização desse sistema utilizando

bio-hidrogênio, vale dizer, produzir H2 a partir do etanol, são os objetivos da proposta.

O PROGRAMA PRO H2

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SANDUÍCHE DE ELETRODOS E CATALISADORES

a contaminação do solo e da água por metais pesados é o grande problema com as baterias atuais. marco Fraga, chefe do laboratório de catálise do instituto na-cional de tecnologia (int), explica que sua substituição em aparelhos portáteis reduz os riscos ambientais.

o sistema de célula a combustível não produz nenhum tipo de poluente. É dife-rente daquele dos ônibus com motores a diesel, no qual a energia térmica é trans-

embora o hidrogênio não ocorra livre na atmosfera, devendo ser produzido in-dustrialmente, a abundância do elemento no Planeta e a água como produto da reação química em células de combustível o colo-cam como a melhor opção para o futuro.

células a combustível são dispositivos que convertem diretamente a energia quí-mica em energia elétrica e calor - ao con-trário dos métodos tradicionais, em que a energia química passa por diversas fases até se tornar elétrica.

a célula é uma espécie de “sanduíche” de eletrodos e catalisadores que gera ener-gia elétrica a partir do hidrogênio retirado do gás natural, gasolina, álcool ou meta-nol. linardi, que trabalha desde 1998 com os componentes da célula, não é o único no Pais a perseguir a construção de um protótipo de 1 quilowatt (kW) de potência.

“Queremos também patentear o pro-cesso de fabricação dos componentes da nossa célula”, diz linardi. a tecnolo-gia desenvolvida será repassada para a electrocell, empresa incubada no centro incubador de empresas tecnológicas (cietec) que possui um projeto de cons-trução de célula no Programa de inova-ção tecnológica em Pequenas empresas (Pipe) da Fapesp.

montagem especialModelo de série da Marcopolo foi transformado para receber o sistema a hidrogênio

Tanque de hidrogênio

Células a combustíveis

Motores de tração elétrica

Controladores e distribuidores de energia

Ventiladores do sistema de resfriamento dos motores

elétricos, da célula e dos sistemas auxiliares

formada em energia mecânica, ao mesmo tempo em que o combustível queimado gera resíduos poluentes.

a energia elétrica, depois de armaze-nada nas baterias, movimenta o motor elétrico de tração (similar ao de um tró-lebus), instalado no eixo traseiro do ôni-bus, gerando energia mecânica.

Propulsão híbridao ônibus que já corre na capital é hí-

brido (célula a combustível a hidrogênio + três baterias de alto desempenho) e possui autonomia de rodagem de 300 km com o uso do hidrogênio. se necessário, conse-gue rodar mais 40 km utilizando a energia reservada nas baterias. Pode ser operado exclusivamente com as células a combus-tível, somente com as baterias ou utilizar os dois sistemas simultaneamente.

o veículo tem capacidade para arma-zenar 45 kg de hidrogênio em nove tan-ques, e sua média de consumo é de 15 kg de hidrogênio a cada 100 km percorridos.

o ônibus também conta com um dispo-sitivo de regeneração do sistema de frena-gem (aproveitamento do calor), semelhante ao empregado na Fórmula 1, no qual a ener-gia é armazenada nas baterias e usada na necessidade de maior potência na movimen-tação do veículo (em subidas, por exemplo).

Um sanduíche de eletrodos e catalisadores gera energia elétrica a partir do hidrogênio retirado de fontes não poluidoras como o etanol. O ônibus armazena 45 kg de H2 consumindo 15 kg a cada 100 km.

energia Limpa

O hidrogênio é o elemento químico mais abundante da Terra. Prevê-se que até 2020, em vez de uma bateria de níquel-cádmio,

celulares e laptops usarão H2 como fonte de energia,

Inversores de corrente

elétrica

com

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ação

em

tu

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neo mondo - setembro 2010 23

Dr. Marcos Lúcio BarretoPromotor de Justiça

do Meio Ambiente de São PauloE-mail: [email protected]

Dr. Marcos Lúcio Barreto

I nvocamos oportuno e profundo pen-samento de Gabriel Garcia marquez, salvo engano, para referendar a ideia

do que estamos tentando aplicar na cida-de de são Paulo. mais ou menos, afirmava (reprovável desleixo verificado na ocasião, nos impede de reproduzi-lo com exati-dão): foi-se o tempo em que o homem se empenhava em identificar o que o nosso planeta poderia lhe oferecer; agora, no sé-culo XXi, impõe-se ao homem indagar o que ele pode oferecer ao nosso planeta.

cientes da necessidade de uma postura proativa, no intuito de buscarmos iniciativas voltadas à melhoria da nossa qualidade de vida, em função dos duros castigos já sofridos pelo meio ambiente que nos cerca, recente-mente nos deparamos com a possibilidade de prestarmos nossa contribuição nesse sentido.

tal se verificou quando assumimos pro-cedimento existente na Promotoria de Jus-tiça do meio ambiente da comarca de são Paulo, instaurado para investigar as causas da poluição sonora dessa cidade, além das possíveis medidas atenuantes ou saneado-ras a esse problema. calcados em pareceres técnicos informativos de que, dentre diver-sas providências, projetos de intensa arbo-rização nos principais corredores de veículos na cidade de são Paulo poderiam amenizar o excesso de ruído neles produzidos, enxerga-mos um “pretexto” para desenvolvermos, no âmbito municipal, iniciativa bem-sucedida, já aplicada em esfera estadual.

PROJETO POMAR

nos referimos ao Projeto Pomar, co-nhecido por aqueles que habitam a cidade de são Paulo e desenvolvido pela secreta-ria estadual do meio ambiente, na gestão do governador mário covas (1994/98), que permitiu, mediante o apoio da iniciativa privada, que todo o extenso trecho da marginal Pinheiros fosse rearborizado.

Vendendo a ideia de que cada empresa convidada a participar do projeto adotaria um determinado trecho daquela via expres-sa, mediante o pagamento dos custos do respectivo reflorestamento e a possibilida-de de divulgação do nome da marca corres-pondente como contrapartida, a secretaria do meio ambiente do estado de são Paulo não teve maiores dificuldades de encontrar interessados nessa simpática iniciativa.

o resultado dessa ideia, desde a sua implantação, é motivo de celebrações por toda a comunidade, especialmente por aqueles que por ali trafegam e que hoje podem desfrutar de um cenário repleto de uma vistosa e bem cuidada vegetação, até então inexistente.

espelhados nesse projeto, lançamos a ideia de implementá-lo agora no âmbito municipal, igualmente convidando a ini-ciativa privada a adotar as vias de grande tráfego da cidade, promovendo-se uma intensa arborização nesses corredores de veículos, com as decorrentes melhorias advindas (paisagísticas, térmicas, sonoras, atmosféricas, dentre outras).

Por essa nossa iniciativa, após algu-mas reuniões já realizadas, conseguimos junto à secretaria de coordenação das subprefeituras a criação, através da Porta-ria nº 1391/09, de um Grupo de trabalho intersecretarial para análise, estudo e im-plantação do programa de arborização dos corredores de veículos da cidade de são Paulo, sendo, por ora, acenado com a des-necessidade do apoio privado verificado no Projeto Pomar.

Diante desses acertos já firmados, portanto, a expectativa que se tem é de que, vencidos alguns trâmites burocrá-ticos e próprios até de um empreendi-mento dessa envergadura, a cidade de são Paulo possa, em breve, dispor de milhares de novas árvores, todas elas espalhadas por vias de intenso tráfego de veículos, com suas decorrentes me-lhorias, ao mesmo tempo em que possa servir de modelo para novas iniciativas de gênero em outras grandes cidades do nosso país.

a(s) cidade(s), o meio ambiente e o planeta, com certeza, agradecerão...

– A VEz DO mUniCÍPiO

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neo mondo - outubro 2008A

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neo mondo - setembro 2010 25

“L ugar meu tinha de ser a con-cruz dos caminhos.” É com essa conclusão poética que

riobaldo, célebre personagem de Gran-de sertão: Veredas, chega à encruzilhada. Depois de se embrenhar pelo sertão, o en-contro dos dois caminhos é a chave de seu futuro. o mesmo acontece com o Brasil atu-al. em uma encruzilhada energética, o país tem à sua frente inúmeras possibilidades. e nosso amanhã depende dessa escolha.

o caminho mais evidente é o do etanol. com um dos programas de biocombustível mais avançados do mundo, não seria espan-toso se a cana se transformasse na matriz energética brasileira. mas há também a op-ção do petróleo. o pré-sal pode transformar o Brasil em um dos mais prósperos produto-res. Por outro lado, tímidos e um pouco es-quecidos, há outros rumos, como o da ener-gia solar, o da eólica e o de tantas outras que aproveitam nosso potencial natural.

e eis que se forma um gigante ponto de interrogação sobre nossas cabeças. afi-nal, vivemos um momento de renovação das matrizes energéticas, com o fim cada vez mais próximo da era do petróleo. Qual caminho escolher? embora o ufanismo te-levisivo e comovente, é quase unanimidade que o pré-sal não é a solução mais indicada. “o Brasil surgiu na dianteira da discussão do biocombustível. a energia eólica e a solar finalmente começaram a ser levadas

A energia

a sério. Porém, com o pré-sal, a discussão mudou de eixo. a energia renovável perdeu terreno”, afirma ricardo Young, ex-presi-dente do instituto ethos.

o mundo está discutindo uma econo-mia e, sobretudo, uma saída energética de baixo carbono. o acidente no Golfo do mé-xico foi uma ilustração trágica dos perigos da atual matriz. estamos nos preparando para entrar no mundo pós-petróleo. e o Brasil anda no contrafluxo. contudo, se-gundo marcos Jank, presidente da união da indústria da cana-de-açúcar (unica), “o pré-sal não vai sombrear o etanol de cana. É uma coisa passageira, pois vai na contra-mão do que o Brasil estava fazendo”.

Usinas adormecidasPara Jank, a cana é o novo paradigma

energético, pois tem capacidade de produzir combustível e, inclusive, energia elétrica de baixo carbono. “o Brasil tem três Belos mon-tes adormecidos nos canaviais. É só utilizar o bagaço e a palha da cana em caldeiras de alta pressão para gerar bioeletricidade. não é preciso construir hidrelétrica”, afirma. o au-mento da produtividade a partir do avanço tecnológico é a saída mais eficiente para o entrave energético nacional.

não é dessa forma que enxerga o pes-quisador antonio nobre, do instituto na-cional de Pesquisas da amazônia (inpa). “se todo petróleo for substituído por etanol, não

haverá área suficiente no mundo”, declara. tanto um como outro são combustíveis ob-soletos. a solução seria a energia solar e a eólica, somadas ao avanço tecnológico. atu-almente, 80% do potencial do combustível é gasto no motor. com uma máquina mais avançada, não precisaríamos aumentar a produção energética – seja plantando mais cana seja explorando o pré-sal. “Vivemos uma ditadura da oferta. Procura-se oferecer cada vez mais, sem se questionar a deman-da”, alerta antonio. ou seja, ele propõe uma mudança de leitura. em vez de a tecnologia servir para produzir mais, ela deve colaborar para se necessitar cada vez menos.

mas isso não é tarefa simples. De acor-do com o pesquisador, os lobbies das gran-des corporações mantêm o sistema atual. o custo total de Belo monte, por exemplo, seria suficiente para a construção de um complexo eólico no nordeste. É muito mais interessante do ponto de vista sustentável, mas não do ponto de vista empresarial. no Pará, a forte indústria do alumínio conso-me a maior parte da energia elétrica gerada. “nós ficamos totalmente refém dos interes-ses dos grandes grupos”, alerta.

não é fácil decidir qual caminho se-guir. sustentabilidade, economia, pla-nos estratégicos e interesses diversos se esbarram nessa encruzilhada. e a batata quente fica para o próximo morador do Palácio do Planalto.

do amanhã

Mundo procura saída energética de baixo carbono; especialistas brasileiros apontam alternativas

Bruno Molinero

energia Limpa

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FLiP

A oitava edição da Festa Literária Internacional de Paraty foi marcada pela diversidade de temas e de autores participantes

Rosane Araujo

celebração literária em grande estilo

Tenda dos autores foi palco de discussões emocionantes e acaloradas

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Cultura, Lazer e Arte

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27 neo mondo - setembro 2010

S e a edição deste ano da Flip, realiza-da de 4 a 8 de agosto, em Paraty, no rio de Janeiro, reuniu menos públi-

co do que a anterior (entre 15 e 20 mil pes-soas, segundo a produção do evento, contra 25 mil da edição passada), o mesmo não se pode dizer sobre o sucesso e a atenção mi-diática que a Festa recebeu em 2010.

a cobertura não deixou a desejar e cada dia uma nova discussão esquentava o noticiário.

tudo muito natural, considerando o caldeirão de assuntos abordados nas 18 mesas que compuseram o evento.

a oitava edição trouxe política, escra-vidão, quadrinhos, ebook e ipad.

“este foi o ano mais interessante de todos, com a programação mais variada”, declarou a mentora intelectual da Flip, liz calder.

segundo ela, vários dos 21 convidados estrangeiros – entre os 147 autores pre-sentes – confidenciaram-lhe tratar-se do melhor festival de literatura de que jamais participaram. “a Flip também tem um im-pacto crescente e considerável junto ao público e às editoras estrangeiras, promo-vendo a literatura brasileira no exterior”, garantiu liz durante coletiva que marcou o balanço da Feira.

Para mauro munhoz, diretor-geral, o adiamento para agosto em função da copa do mundo e a comemoração do Dia dos Pais, no último dia da Festa, foram as principais causas da redução de público, em comparação ao ano passado.

em relação ao orçamento, houve um salto de r$ 5,9 milhões em 2009 para r$ 6,3 milhões neste ano.

munhoz lembrou que essa receita tam-bém cobre as diversas ações da casa azul, associação criada em 1994 (veja mais deta-lhes no quadro da página 28).

a previsão é de que, em 2011, a Flip volte a ser realizada no começo de julho ou mesmo no fim de junho.

sobre a manutenção da diversida-de de temas, liz calder preferiu não se apressar. “tudo depende da interação dos autores quando se encontram, de que autores serão convidados, de que livros estarão sendo lançados”, ponderou.

Polêmicas, farpas, humorcom tantos nomes de peso, a festa

começou a gerar polêmica antes mesmo de acontecer.

Para substituir o escritor italiano an-tonio tabucchi, que desistiu de participar devido a problemas de saúde, foi chama-do o poeta maranhense Ferreira Gullar, recém-premiado com o camões, prêmio mais importante da língua portuguesa.

o convite de “última hora” recebeu du-ras críticas do escritor e colunista de o Glo-bo, Zuenir Ventura, que considerou uma “indelicadeza” com o poeta tão premiado.

Para o bem da Festa, a mágoa não foi compartilhada por Gullar, cuja participa-ção foi reconhecidamente um dos pontos mais emocionantes do evento.

o cancelamento da participação do can-tor e compositor lou reed, fundador do grupo Velvet underground, que alegou “mo-tivos pessoais”, também deu o que falar.

ao contrário do que aconteceu no caso do autor italiano, os organizadores optaram em não escalar um substituto para reed.

no lugar de sua mesa, a Flip resolveu homenagear os escritores carlos Drum-mond de andrade e José saramago, mor-to em junho deste ano.

na homenagem a saramago, o destaque foi a apresentação de um trecho de 40 minu-tos do filme José & Pilar, dirigido pelo jovem português miguel Gonçalves mendes. trata-se de um documentário sobre os últimos dias do escritor, desenvolvido em associação com a produtora o2 Filmes, de Fernando meirelles, e a espanhola el Deseo, de Pe-dro almodóvar. o lançamento está previs-to para 16 de novembro, simultaneamente no Brasil, na espanha e em Portugal, mas a apresentação da Flip serviu de aperitivo para os fãs do premiado autor português.

nem tudo, porém, foram flores na oi-tava Flip. o clima também esquentou em alguns momentos.

um dos mais comentados foi a troca de farpas entre o escritor anglo-indiano salman rushdie e o crítico literário inglês terry eagleton.

rushdie abriu fogo ao reclamar da in-clusão de seu nome em um grupo de auto-res neoconservadores que estaria dissemi-nando a “islamofobia”.

“ser acusado de fazer parte da agenda de Bush e cheney me parece muito ofensi-vo e desonesto. o termo técnico para esse tipo de afirmação é mentira”, disse.

no dia seguinte, eagleton não fugiu da polêmica: “Gostaria que salman rushdie e outros dissessem em voz mais alta e clara que veem uma distinção entre o islã e os radicais do islã, em vez de agirem como se a tradição ocidental fosse absolutamente livre de barbaridades”.

O mediador Claudinei Ferreira, com o tradutor alemão Berthold Zilly e o escritor Benjamin Moser

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Ferreira Gullar, que emocionou na mesa “Gullar, 80”

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neo mondo - outubro 200828

outro ponto muito comentado do even-to, a participação do quadrinista norte-ame-ricano robert crumb, também não gerou consenso entre participantes e imprensa.

enquanto muitos fãs comemoravam a inédita presença de um dos fundadores do movimento underground, alguns veículos da imprensa destacaram seu mau humor perante o assédio da mídia.

avesso aos holofotes, crumb irritou-se com fotógrafos para quem fez gestos obsce-nos durante suas caminhadas pela cidade.

Durante a apresentação de sua mesa, porém, redimiu-se, esbanjando bom humor. ”Quando disse que iria ao Brasil, me disseram para prestar aten-ção na bunda das mulheres daqui. e realmente são grandes, saias curtas, muita perna de fora. imagino isso no verão”, brincou.

e foi assim, entre piadas, lágri-mas e farpas que mais uma edição da Flip aconteceu.

sorte de quem participou.

2003 A Flip é criada e insere o Brasil no

calendário internacional de literatura. Realizada na Casa da Cultura, foi

transmitida para a Tenda da Matriz (a atual Tenda do Telão) e contou com a presença de Eric Hobsbawn,

Chico Buarque, Caetano Veloso, entre outros.

2004 A Flip ficou maior e começou a

acontecer na Tenda dos Autores. A Tenda da Matriz foi ampliada,

com público de 1.100 pessoas Nascem Flipinha, evento educativo especialmente dedicado ao público infantil, Flip Etc., com programação voltada para cinema e teatro, e a

Oficina Literária.

2005 São criadas a Biblioteca da Flipinha e

a Ciranda de Máscaras e Bonecos.

2006 Flip Etc. se volta às manifestações

culturais locais.

2007 A Flipinha alcança a zona rural e a Flip registra recorde de público na

cidade (20 mil pessoas).

2008 É criada a Tenda dos Autógrafos e pela primeira vez o evento é

transmitido ao vivo pela internet. A Tenda do Telão ganha tradução

simultânea.

2009 É criada a Mesa Zé Kleber para

discutir políticas públicas ligadas ao universo cultural e urbano.

Flip Etc. vira Flip - Casa da Cultura. É criada a FlipZona, um programa edu-cativo de inclusão social voltado para os jovens paratienses. Pela primeira vez também, o evento usa mídias

sociais como ferramenta de divulgação e de democratização de conteúdo.

FONTE: Assessoria de Imprensa Flip –

A4 Comunicação

Histórico Flip Confira a seguir trajetória

da principal feira literária do país

Os quadrinistas Robert Crumb e Gilbert Shelton durante a mesa “A Origem do Universo”

“A arte existe porque a vida só não basta”.

Ferreira Gullar, poeta, cronista, dramaturgo e ensaísta

“Para nós, cubanos, o mar é uma parede vertical, como um muro. Sou personagem de romance, vivo numa ilha”

Wendy Guerra, autora de Nunca fui Primeira-Dama

“Trata-se do segundo escritor mais lido do planeta. Os brasileiros não deveriam se envergonhar dele. Imagine se eu tivesse vergonha de toda a merda cultural que meu país exporta”

Benjamim Moser, americano, biógrafo de Clarice Lispector, sobre Paulo Coelho

“Nos anos 50 não estávamos a fim de discutir a obra de Gilberto Freyre, e havia a ideia de que esse trabalho que fazíamos, de questionar a ideia de democracia racial, se contrapunha ao dele”.

Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente da República

“Estou esperando minha mãe morrer para escrever um livro realmente erótico.”

Isabel Allende, best-seller mundial

Flip 2010 em letras

Uma seleção de frases de quem deu o que falar

Flip 2010 em números

• De 15 a 20 mil visitantes• 147 autores, 21 deles estrangeiros• O site da Flip recebeu 47.651 acessos, com uma média de

7 mil visitantes por dia e um pico de 14.000 • Receita de R$ 6,3 milhões

Cultura, Lazer e Arte

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29 neo mondo - setembro 2010

Muito mais do que a badalação gerada nos cinco dias em que se realiza, a Flip atua continuamente no dia-a-dia de quem vive em Paraty por meio de projetos educacionais orga-nizados pela Associação Casa Azul, idealizadora da Feira.

Seu principal programa educativo recebeu o nome de Flipinha e acontece de janeiro a dezembro com ações envol-vendo alunos e professores da rede es-colar da cidade em inúmeras atividades de incentivo à leitura e de valorização do patrimônio cultural local.

Durante a Flip, a Tenda da Flipi-nha é o ponto de encontro das ativi-dades realizadas ao longo do ano.

Na edição de 2010, a tenda infantil comemorou a criação do Projeto Mar de Leitores, que incluiu a obrigatoriedade da hora/aula de leitura na grade curricular das escolas da cidade.

Assim como a Flip, a Flipinha homenageou o sociólogo e escritor Gilberto Freyre.

“Para nossa surpresa, tivemos 7 mil participantes na Praça da Matriz na sexta-feira, por ocasião do evento Arte na Praça – Saberes e Fazeres

de Paraty”, revelou Cristina Maseda, coordenadora da Flipinha.

Ela esperava que a adesão fosse menor neste ano, já que a Feira acon-teceu durante o período letivo.

Na mesma linha, o projeto educa-cional continuado FlipZona envolve a rede de ensino de Paraty, mas nele o público-alvo são os jovens.

Na programação estão oficinas de produção e edição de áudio e vídeo, caracterização teatral, produção de texto, animação, videogame, fotogra-fia, debates com escritores e pro-fissionais, exibição de filmes, entre outras atividades.

Os mais de 40 jovens envolvidos no projeto, que já vinham trabalhan-do juntos há três meses no Ponto de Cultura Casa Azul, produziram 32 reportagens, 15 delas em vídeo, material que foi publicado no site da FlipZona.

Um número ainda maior de jovens – cerca de 150 – participou da Hora da Estrela, na qual foi aber-to espaço para que integrantes da comunidade apresentassem suas cria-ções em teatro, cinema, vídeo, poesia ou qualquer outra manifestação.

Jovens da cidade mostraram sua produção cultural durante a Festa Literária

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Programação infantil garantida na Flipinha – incentivo à leitura faz

parte do programa contínuo

Ações sociais consolidaram-se em 2010

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Wikimedia

S e pudéssemos retroceder na linha do tempo rumo a um passado cada vez mais distante, cada vez mais

longínquo, sempre mais remoto, sempre mais e mais imemorial, encontraríamos a origem primeira de tudo o que há no mundo, descobriríamos então o princípio comum de todas as coisas.

atualmente nos acostumamos a ou-vir falar da teoria do Big bang como ten-tativa de explicar a origem do universo. na antiguidade, gregos e romanos fala-vam do “caos Primordial”. antes de toda a natureza que nos rodeia, antes das ter-ras, dos vales, dos montes e das florestas, antes do céu, do sol, da lua e das estrelas, antes do oceano, dos mares, das fontes e

Mitologia clássica:

A ORiGEm DO mUnDOdos rios, antes dos ventos, das chuvas, da neve e das tempestades, antes, muito antes de nós – e até mesmo dos próprios deuses olímpicos – havia somente o caos. não era o nada, bem ao contrário, pode-se dizer que era o tudo em potên-cia, um todo inteiramente confuso, in-forme, massa bruta, desestruturada, mas que continha em si todas as coisas ainda não delineadas. matéria elementar, imó-vel, mas em contínua agitação interna, animada pelo conflito fundamental de tudo o que ainda não existia. como can-ta ovídio (43 a. c. - 17 d. c.) nos versos latinos do início das metamorfoses, de acordo com a tradução do famoso poeta português Bocage (1765-1805),

Forma nenhuma em nenhum corpo havia,e neles uma coisa a outra obstava,Que em cada qual dos embriões enormesPugnavam frio, e quente, úmido, e seco,mole, e duro, o que é leve, e o que é pesado.

era o caos a latência indefinida de tudo à espera do tempo ordenador, um improvável celeiro de puras possibilida-des, a única face da natureza anterior às manifestações particulares da vida, uma face completamente obscura, indistinta.

num dado instante, do vasto seio desse abismo escuro, das vagas entranhas dessa amplidão amorfa, surge Gaia, a ter-ra. separada então daquele todo incerto, suspensa no espaço indefinido e equilibra-da por seu próprio peso, com sua firmeza

30 neo mondo - setembro 2010

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neo mondo - setembro 2010 31

Marcio Thamos

Mitologia clássica:

constante e seu nítido contorno, impõe um limite ao caos, tornando-se uma refe-rência sólida para a criação do mundo ain-da indeciso. na solidão mais ancestral do cosmos primitivo, Gaia criou primeiro um ser semelhante a si mesma que pudesse cobri-la e envolvê-la por inteiro, conforme conta na teogonia o vate grego hesíodo (provavelmente séc. Viii a. c.) – nasceu assim urano, o céu estrelado. o mundo passa a ter embaixo e em cima, um chão e um teto, dois corpos ao mesmo tempo comparáveis e contrários, que se com-põem e se completam. Da mesma maneira solitária, sem depender de nenhuma outra força, a frutuosa mãe-terra concebeu Pon-to, o mar ondeante, que a circunda. em se-

Doutor em Estudos Literários. Professor de Língua e Literatura Latinas

junto ao Departamento de Linguística da UNESP-FCL/CAr,

credenciado no Programa de Pós-Graduação em Estudos Literários da mesma instituição. Coordenador do Grupo de Pesquisa LINCEU

– Visões da Antiguidade Clássica.E-mail: [email protected]

A ORiGEm DO mUnDOguida, unindo-se a urano, o primogênito que se deitava sem cessar sobre ela, Gaia gerou muitos filhos. inicialmente surgiu uma raça bruta e violenta, os primeiros descendentes do céu e da terra – os ti-tãs e as titânides, seis irmãos e seis irmãs que, por sua vez, juntando-se em pares, foram responsáveis pela geração de várias divindades secundárias que povoaram o mundo nascente.

a partir daí, a terra será o palco de uma sucessão de dramas e conflitos envol-vendo sua progênie, verá o triunfo de uns e a queda de outros, assistirá a batalhas gigantescas até a ascensão de Júpiter como senhor supremo do universo. então, a Grande mãe testemunhará ainda a criação

do homem, por engenho e arte de um de seus netos, Prometeu, o maior benfeitor da humanidade. são estórias da mitologia clássica que pretendo continuar contando aqui se os deuses assim permitirem.

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neo mondo - outubro 2008A

O papel demora de 3 a 6 meses para se decompor.

Não jogue lixo na natureza. Preserve o planeta.

F_Autodestruicao_41x27,5_Curvs.pdf 9/14/10 11:37:55 AM

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neo mondo - outubro 2008 A

O papel demora de 3 a 6 meses para se decompor.

Não jogue lixo na natureza. Preserve o planeta.

F_Autodestruicao_41x27,5_Curvs.pdf 9/14/10 11:37:55 AM

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especial - Amazônia

impactos de

Grito de guerra (Kararaô), na origem, usina ainda dá o que falar entre estudiosos e ambientalistas, mas parece irreversível

Bruno MolineroEspecial para NEO MONDO

Kararaô - grito de guerra na língua dos Kaiapós - se tornou Belo mon-te. mudança brusca no nome, mas

quase nenhuma no projeto. nem nos per-sonagens. entre eles, indígenas, estudio-sos, ambientalistas, autoridades técnicas e do governo. Para o general eduardo Dias da costa Villas Boas, chefe da assessoria espe-

cial de Gestão de Projetos do estado maior do exército, é preciso tratar a questão de Belo monte com pragmatismo. indígenas e ambientalistas têm pela frente uma em-preitada árdua.

maior obra do Programa de aceleração do crescimento (Pac) e já licenciada, com investimento total de cerca de r$ 19 bilhões,

o governo brasileiro dificilmente deixará que Belo monte seja barrada por ser a sua maior plataforma político-administrativa. De acordo com dados da eletrobrás, a hidrelétrica terá capacidade de gerar mais de 11 mil megawat-ts (mW), tornando-se a segunda maior usina brasileira – atrás somente de itaipu e sua ca-pacidade máxima de 14 mil mW.

Rio Xingu, Altamira - PA

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Brasil no limite Guilherme leite Dias, professor da

Faculdade de economia, administração e contabilidade da universidade de são Paulo (Fea/usP), avalia que o Brasil se en-contra no limite da questão energética. Belo monte seria, portanto, inevitável.

há outros aspectos ligados a Belo monte, e o da urbanização desenfreada, com todos os problemas que acarreta, é um deles. Para o professor e economista Guilherme Dias, a intensa urbanização e consequente inchaço demográfico amazô-nico geraram uma explosão na demanda de energia na região, forçando a constru-ção de novas alternativas energéticas. “se colocarmos 10 ou 15 milhões de pessoas em cidades de porte médio na amazônia, explode a demanda de energia”, diz.

na esteira desse mal maior, vêm tam-bém os típicos das cidades que cresceram sem planejamento, como alto índice de mor-talidade, alta taxa de analfabetismo e sane-amento básico precário. este último está in-tensamente relacionado a Belo monte.

Dados da Prefeitura, colhidos no últi-mo censo, no município de altamira, dão conta de que apenas 1.358 moradores ti-nham acesso à rede de esgoto, ou seja, cer-ca de 1,8% da população. nos demais casos, os moradores utilizavam fossas ou mesmo o rio Xingu como esgotamento sanitário. cerca de 6 mil munícipes não tinham se-quer banheiro em suas casas.

em síntese, Belo monte cheira a de-gradação ambiental.

ambiental”, decreta o militar. Portanto, prag-maticamente, é necessário um pensamento que leve em consideração a relação custo-benefício. Para Villas Boas, “toda vez que se impede de asfaltar uma rodovia, que se im-pede de construir uma linha de transmissão, que se impede de construir uma hidrelétrica, se está inviabilizando o desenvolvimento econômico”. e, consequentemente, poster-gando a degradação do bioma.

Alternativas energéticas embora a usina hidrelétrica seja consi-

derada um modelo de geração de energia limpa, se construída no meio do bioma amazônico, ela pode representar enorme ameaça à biodiversidade e à vida de todas as populações da floresta. Belo monte seria mesmo a melhor solução energética, se con-siderarmos outras fontes, como a eólica e a biomassa, por exemplo?

De acordo com a grande maioria dos pes-quisadores, sim. mesmo no caso da biomassa, maior bandeira energética brasileira a partir do etanol da cana. embora a cana não possa ser cultivada na amazônia, por conta da alta umi-dade, outros exemplos de bioenergia podem ser utilizados – mas com eficiência discutível.

as palmáceas, já comuns no sudeste asi-ático e no Pacífico com eficiência equivalente à do etanol brasileiro, são capazes de gerar fon-tes sustentáveis de energia alternativa a partir de biomassa naquele tipo de clima. outra so-lução possível, segundo o pesquisador marcos Buckeridge, do instituto de Biocências da usP, é o mata-pasto, típica planta brasileira.

Risco à biodiversidade estudiosos e ambientalistas alertam

que a usina atingirá, direta ou indireta-mente, mais de 300 mil pessoas e 11 terras indígenas. além disso, é previsto um ala-gamento de 516 km², que pode colocar em risco a biodiversidade local e trazer impac-tos sociais gravíssimos.

embora os holofotes estejam voltados para a cidade de altamira – principal muni-cípio atingido pelo represamento do Xingu –, Belo monte chegará também aos municípios de senador José Porfírio, Porto de moz, ana-pu, Vitória do Xingu, medicilância, Gurupá, Brasil novo, Placas, uruará e Pacajá.

o general Villas Boas entende que a degradação do rio Xingu já é agressiva na atualidade. Para ele, a usina traria benefí-cios estruturais para as cidades, melhorando seus quadros de saneamento. com isso, os impactos ambientais do empreendimento seriam relativizados. “no caso de Belo mon-te, as pessoas estão se esquecendo de que na cidade de altamira há mais de 100 mil pessoas sem água encanada, jogando todos os seus dejetos no rio Xingu.”

o raciocínio do general é o de que se, por um lado, a usina impactará o meio am-biente, por outro, trará benefícios econô-micos e sociais incontestáveis. Belo monte significaria, nesse sentido, uma chance de desenvolvimento socioeconômico para a região do rio Xingu.

assim, desenvolvimento estaria intrin-secamente ligado à solução da causa am-biental. “Pobreza é sinônimo de degradação

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De acordo com Buckeridge, a eletro-norte já desenvolveu um pirolisador (ins-trumento que promove a decomposição da biomassa) que, com cerca de 2 kg de mata-pasto por dia, consegue alimentar energeticamente uma família de 4 pes-soas. Funciona, mas a eficiência é baixa. essa alternativa acontece apenas nos luga-res em que a energia elétrica não chega. “aonde o ‘linhão’ chega, fica mais barato e eficiente utilizar a eletricidade de hidrelé-trica”, afirma o pesquisador.

a biomassa, portanto, não é tão efi-ciente para a produção de eletricidade. além disso, pode causar impacto am-biental ainda maior que a hidrelétrica. “o impacto [da hidrelétrica], mesmo com a questão dos alagamentos, seria menor do que se eu usasse a bioeletricidade. Porque se for usar biomassa para produzir eletri-cidade, o pessoal vai começar a cortar ár-vore”, alerta.

É claro que, com os alagamentos, per-de-se biodiversidade. mas, para Buckerid-ge, energia é uma necessidade imediata, tendo-se de trabalhar com a noção de im-

pacto mínimo. segundo o professor Gui-lherme Dias, esse impacto mínimo ocorre justamente com a hidrelétrica. além da eficiência indiscutível, as usinas, se pensa-das com cuidado, não representam tantos riscos. “não me parece que os danos das hidrelétricas sejam motivo para ficarmos tão horrorizados, se comparados com as outras alternativas que temos.” Para ele, a exploração do pré-sal representa muito mais riscos ao ecossistema do que as hi-drelétricas amazônicas.

História a perigo É evidente que a construção de Belo

monte impactará ambiental e socialmente a região do Xingu. uma parcela do bioma amazônico será simplesmente submerso com 2/3 da cidade de altamira. contudo, algo muito mais frágil, e menos comenta-do, está em risco: a história.

a amazônia não é formada exclusiva-mente por floresta. sob a proteção da copa das árvores, timidamente repousam enor-mes sítios arqueológicos. cerâmicas ou até aldeias inteiras se escondem debaixo da infértil terra úmida da região. como a pesquisa nessa área é muito recente, não se sabe ainda a quantidade exata de sítios arqueológicos amazônicos. estima-se que, apenas na amazônia central, existam mais de 200.

segundo o arqueólogo e pesquisador do museu de arqueologia e etnologia (mae), eduardo Góes neves, os grandes projetos da amazônia, como barragens e linhas de transmissão, estão gerando gran-des impactos sobre os sítios arqueológicos e, sobretudo, sobre a história brasileira. a grande agravante é que o Brasil não con-ta com número de arqueólogos suficiente para avaliar todos os sítios atingidos. com isso muita informação pode estar sendo jogada no lixo.

a área atingida pelos impactos de Belo monte não é diferente. como a discus-são sobre a hidrelétrica persiste há cerca de 30 anos, alguns estudos preliminares já foram realizados, reunindo um acervo de conhecimento arqueológico sobre a região do Xingu. contudo, com a recente licitação, novos estudos serão necessários, a fim de se avaliar aprofundadamente a presença de patrimônio histórico na área alagada.

Belo monte não é, porém, a única usi-na planejada para a amazônia. no total, cerca de oito hidrelétricas estão nos pla-

nos do governo brasileiro. De acordo com eduardo neves, não há profissionais sufi-cientes para atender tamanha demanda. uma parcela importantíssima da história do Brasil – a história antiga da amazô-nia e sua relação com os povos andinos – pode simplesmente desaparecer, caso os estudos não possam ser realizados da maneira adequada

Exemplo chinês nesse aspecto, segundo o general

Villas Boas, é necessário aprender com a china. a construção da represa da usina de três Gargantas, que tem uma vez e meia a capacidade de itaipu, deslocou 2 milhões de pessoas e mais de 100 sítios arqueológicos milenares.

contudo, para o militar, trata-se de “uma obra fundamental para o desen-volvimento daquele país”. mesmo com o deslocamento de cerca de 2 mil indígenas, que têm seus cemitérios e histórias fixa-dos nas terras do Xingu, Belo monte deve ser tratada da mesma maneira que três Gargantas.

tuíra discorda.

Buckeridge: mata-pasto competindo com “linhão”

Villas Boas: cirurgia à luz de velas

Eduardo Neves: informação jogada no lixo

Guilherme Dias: usina é inevitável

especial - Amazônia

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Tuíra é símbolo da resistência à constru-ção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, e as cinco letras de seu nome con-densam uma das maiores e mais complexas questões brasileiras.

De origem Kaiapó e facão na mão, a vida da índia Tuíra se entrelaça com a história da usina tal qual fibra de jupati em cestaria. A origem da hidrelétrica, por sua vez, remonta ao início dos anos 1980, quando estudos de-monstraram que a região Norte representava cerca de 60% do potencial energético nacio-nal. Foi nessa época que os primeiro esboços

da ainda chamada usina de Kararaô começa-ram a ser traçados.

Embora a construção no rio Xingu afetas-se diretamente o cotidiano dos povos indíge-nas, por conta dos alagamentos e interferên-cias no ecossistema, nem por isso eles foram consultados de início.

Em consequência, 1989 foi marcado pelo I Encontro dos Povos Indígenas do Xingu, que pretendia discutir a questão das hidrelétricas e acabou culminando com a famosa fotogra-fia de Tuíra ameaçando de facão em punho Muniz Lopes, àquela época diretor da Eletro-

Fibra de jupati em cestaria

norte. A advertência e a oposição à constru-ção de Kararaô davam os primeiros passos.

O tempo passou, e Kararaô, o grito de guerra, ecoa ainda hoje. Em 2008, Tuíra mais uma vez ameaçou com seu facão. Dessa vez, contudo, a lâmina teve endereço certo: o braço do funcionário da Eletrobrás Paulo Fernando Rezende. A situação agravou-se ainda mais em 2009, quando Tuíra e os Kaiapós entoaram o verdadeiro kararaô, ameaçando com guerra a construção da hidrelétrica.

O clima de tensão e a repercussão na mí-dia são inegáveis.

um desses casos é a usina de Balbina, próxima à cidade de Presidente Figueire-do, que alagou grande parte de uma terra indígena em sua construção. a hidrelétri-ca, construída para abastecer a cidade de manaus, atualmente só gera todo seu po-tencial durante três meses do ano – e com um custo altíssimo. o que era para ser um grande investimento tornou-se assim um dos maiores erros estratégicos do Brasil. Balbina é insuficiente para suprir a deman-da de energia da capital amazonense.

“a mesma coisa vai acontecer em Belo monte, se construída. Vai-se investir uma fortuna, e essa usina não terá a capacida-de de geração de energia que os estudos dizem que ela vai ter”, acredita ariovaldo. o geógrafo explica que o rio Xingu, assim como o rio uatumã, onde se localiza Bal-bina, apresenta grande oscilação no seu nível entre o período seco e o chuvoso.

iminência de outro apagão Por outro lado, o déficit energético

amazônico é fato – e algo precisa ser fei-to. “nós já tivemos um apagão elétrico e estamos na iminência de ter outro”, aler-ta o general Villas Boas. em humaitá, ci-dade amazonense, há casos de médicos que chegaram a fazer cirurgias à luz de velas, por falta de energia elétrica. nesse sentido, as hidrelétricas seriam a solu-ção mais imediata para a crise energética do norte brasileiro.

entretanto, usina hidrelétrica não sig-nifica necessariamente desenvolvimento econômico e social para a área em que for construída. muito menos garantia de

energia. Grande exemplo disso é a usina de tucuruí, no Pará – a atual maior usina 100% brasileira.

Pouquíssimas pessoas da cidade de tucuruí trabalham efetivamente nela. a ge-ração de emprego, sempre inerente a uma nova construção, não aconteceu de forma massiva. mais grave ainda é o fato de que a energia elétrica gerada tampouco é desti-nada à cidade. De acordo com Pedro ortiz, coordenador do módulo sobre a amazônia do projeto repórter do Futuro, destinado a estudantes de jornalismo, há bairros de tu-curuí que simplesmente não têm luz.

então, para onde ela vai, se não à po-pulação? Para ariovaldo, a eletricidade não está voltada para atender a popula-ção brasileira, mas sim as empresas de processamento de minérios instaladas na amazônia. até mesmo porque a geração de energia não seria necessária para a po-pulação. “a energia de tucuruí é consumida pela Vale do rio Doce para extrair minério de ferro e exportá-lo a preço de uma pizza na quinta avenida de nova York, por tone-lada.” isso explicaria o desabastecimento de alguns bairros daquela cidade.

Villas Boas discorda. a solução dos problemas amazônicos, segundo o ge-neral, só acontecerá com o desenvolvi-mento da região. e as hidrelétricas, Belo monte entre elas, são veículo funda-mental para isso. elas são ferramentas sociais. De forma pragmática, o militar afirma que o pensamento politicamente correto, que não permite que se acolham soluções concretas, impede a resolução das questões amazônicas.

GEóGRAFO PõE EM xEqUE CUSTO-BENEFÍCIO

embora os dados da eletrobrás preve-jam a produção de mais de 11 mil mW, a usina de Belo monte certamente não alcan-çará tamanha geração. isso porque o rio Xin-gu sofre drástica diminuição em sua vazão na época de estiagem. estudos mostram que a hidrelétrica terá capacidade de gerar, em média, 4.428 mW – dado muito aquém do posto de segunda maior usina brasileira.

De acordo com o professor ariovaldo umbelino de oliveira, do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, le-tras e ciências humanas da usP (FFlch/usP), “o grande problema da construção de barragens de hidrelétricas na amazônia é o tamanho dos lagos, se comparado à capa-cidade de geração de energia”.

Para o geógrafo, a amazônia apresenta inúmeros exemplos de usinas hidrelétricas que alagaram grandes áreas, gerando um gran-de impacto ambiental, porém sem produzir quantidade significativa de energia elétrica.

Ariovaldo: minério a preço de pizza

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especial - Amazon

Kararaô - war cry in the Kaiapó lan-guage - became Belo mon-e. a su-dden change in name, but almost

none in the project. nor with the charac-ters involved. among them, indigenous pe-ople, scholars, environmentalists, technical authorities and government. For General eduardo Dias da costa Villas Boas, head

of the special advisory of Project mana-gement of the army, we must address the issue of Belo monte with pragmatism. in-dians and environmentalists are faced with an arduous undertaking.

the largest project of the Growth acce-leration Program (Pac) and already licensed, with total investment of about r$19 billion,

it is unlikely the Brazilian government will let Belo monte be barred because it is its gre-atest political and administrative platform. according to data from eletrobrás, the dam will be capable of generating over 11,000 megawatts (mW), making it the second lar-gest Brazilian plant - second only to itaipú and its maximum capacity of 14, 000 mW.

War cry (Kararaô), of the local Indians, the dam still causes discussions between scholars and environmentalists, but it seems irreversible

Bruno MolineroSpecial for NEO MONDO

Xingú River, Altamira, PA

impacts of

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Brazil on the limitGuilherme leite Dias, a professor

of economics, Business administration and accounting from the university of são Paulo (Fea / usP), evaluates that Brazil finds itself on the limit of the energy issue. Belo monte shall be, the-refore be inevitable.

there are other aspects connected to Belo monte, and rapid uncontrolled urba-nization, with all the problems it brings, is one. For the professor and economist Guilherme Dias, intense urbanization and consequent amazonian demographic swelling produced an explosion of energy demand in the region, forcing the cons-truction of new energy alternatives. “if we put 10 or 15 million people in mid-sized cities in the amazon, the energy demand explodes,” he says.

in the wake of this greater evil, we also find cities that typically without plan-ning, with high mortality, high illiteracy and poor basic sanitation. the latter is strongly related to Belo monte.

Data from the town hall, collected in the last census, in the municipality of altamira, show that only 1,358 resi-dents had access to sewerage, or about 1.8% of the population. in other cases, residents use septic tanks or even the Xingu river for sewage disposal. about 6,000 residents did not even have a toi-let in their homes.

in a nutshell, Belo monte smells of en-vironmental degradation.

thus, development shall be intrinsi-cally linked to the solution of the envi-ronmental cause. “Poverty is synonymous with environmental degradation,” decla-res the General. therefore, pragmatically, we need a kind of thinking that takes into account the cost benefit relationship. For Villas Boas, “every time that you prevents an asphalt highway, which prevents them from building a transmission line, which prevents them from building a hydroelec-tric plant, you are impeding economic de-velopment.” and, consequently delaying the degradation of the biome.

Energy alternativesalthough the hydroelectric power

plant is considered a model of clean energy generation, if it is built in the middle of the amazon biome, it could pose huge threat to biodiversity and the life of all forest peoples. Would Belo monte be the best energy solution, con-sidering other sources such as wind and biomass, for example?

according to the majority of the rese-archers, yes. even in the case of biomass, the biggest Brazilian flag waving energy project, producing ethanol from sugar cane although it cannot be grown in the amazon, due to the high humidity, other examples of bioenergy can be used - but with debatable efficiency.

Palms, already common in southeast asia and the Pacific with efficiency equi-valent to Brazilian ethanol, are capable of

Risk to biodiversityscholars and environmentalists

warn that the plant will affect, directly or indirectly, more than 300,000 people and 11 indigenous territories. moreover, it is predicted that it will flood 516 squa-re kilometers, which could endanger the local biodiversity and cause very serious social impacts.

While the spotlights are on the town of altamira – the main municipality affected by the damming of the Xingu - Belo monte will also affect the muni-cipalities of senator José Porfirio, Porto de moz, ana-pu, Vitória do Xingu, me-dicilância, Gurupá, Brasil novo, Placas, uruará and Pacajá.

General Villas Boas believes that the degradation of the Xingu river is already aggressive today. For him, the plant would bring structural benefits to the towns, improving their sanitation. thus, the environmental impacts of the project would be put in context. “in the case of Belo monte, people are forget-ting that in the town of altamira there are more than 100,000 people without running water, throwing all their waste into the Xingu.”

the general’s reasoning is that if, on the one hand, the plant will impact the environment, on the other, and it will bring indisputable economic and social benefits. Belo monte will signify, in this sense, a chance of socioeconomic develop-ment for the Xingu river region.

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generating sustainable sources of alterna-tive energy from biomass in this kind of weather. another possible solution, ac-cording to researcher marcos Buckeridge, institute of Biosciences usP, is the forest-grassland, a common Brazilian plant.

according to Buckeridge, eletronor-te has already developed a pyrolyser (an instrument that helps the decomposition of biomass) which, with about 2kg of fo-rest-pasture per day, can produce enough energy for a family of 4. it works, but the efficiency is low. this alternative only wor-thwhile in places where there is no electri-city supply. “Where the power lines reach, it is cheaper and more efficient to use elec-tricity from hydro, affirms the researcher.

Biomass is therefore not as efficient for producing electricity. moreover, it can even cause greater environmental im-pact than hydroelectric. “the impact [of hydroelectric power], even with the issue of flooding, would be less than if i used bioelectricity. Because if we use biomass to produce electricity, people will start cutting down trees,” he warns.

it is clear, that with the flooding, bio-diversity will be lost. But for Buckeridge, energy is an immediate need, tending to work with the notion of minimal impact. according to Professor William Day, this minimal impact is precisely what ha-ppens with the dam. Besides the indispu-table efficiency, the hydroelectric power plants, if thought out carefully, do not pose as many risks. “i do not think the damage of the dams is a reason to get too horrified if compared with other alterna-tives we have.” to him, the exploitation of the pre-salt is of much more risk to the ecosystem than the amazonian dams.

History in peril clearly, the construction of Belo

monte will cause environmental and social impact on the Xingu region. an area of the amazon biome will be simply submerged along with two thirds of the town of altamira. however, something much more fragile and less talked about, is at risk: history.

the amazon is not composed exclu-sively of forest. under the protection of trees, quietly lie huge archaeological si-tes. ceramics or even whole villages are hidden under the infertile wetland in the region. as research in this area is very re-cent, we do not yet know the exact quan-tity of archaeological sites in the amazon. it is estimated that only in the central amazon, there are more than 200.

according to archaeologist and rese-archer at the museum of archaeology and ethnology (mae), eduardo Góes neves, major projects in the amazon, such as dams and transmission lines, are causing major impacts on archaeological sites and espe-cially on Brazilian history. the major ag-gravating factor is that Brazil does not have sufficient number of archaeologists to assess all the sites affected. With this, a lot of infor-mation may be being thrown in the trash.

the area impacted by Belo monte is no different. as the discussion has continued on the dam for about 30 ye-ars, some preliminary studies have been performed, bringing together a collection of archaeological knowledge about the Xingu region. however, with the recent auction, further studies will be needed in order to thoroughly evaluate the presen-ce of heritage in the flooded area.

Belo monte is not, however, the only plant planned for amazonia. in

total, about eight hydroelectric plants are included in the government’s plans. according to eduardo neves, there are not enough qualified workers to meet such demand. a very important part of Brazil’s history - the ancient history of the amazon and its relationship with the andean peoples - can simply disa-ppear; case studies cannot be conduc-ted appropriately.

Chinese examplein this aspect, according to General

Villas Boas, it is necessary to learn from china. the construction of the dam of three Gorges power plant, which is one and half times the capacity of itaipú, displaced 2 million people and over 100 ancient archaeological sites.

however, for the General, it is “a work central to the development of the coun-try.” even with the displacement of about 2,000 indians, who have their cemeteries and stories set in the lands of the Xingu, Belo monte should be treated in the same way as the three Gorges.

tuíra disagrees.

especial Amazon

Buckeridge: forest-pasture vs. “power lines”

Villas Boas: surgery by candleligh

Eduardo Neves: Information tossed away

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Guilhermae: plant is inevitable

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tuíra is a symbol of resistance to the construction of the hydroelectric plant of Belo monte, on the river Xingu and the five letters of its name condenses one of the largest and most complex is-sues in Brazil.

of Kayapó origin and machete in hand, the life of the tuíra indian inter-twines with the history of the plant just like jupati fibers in basketry. the origin of the dam, go back to the early 1980s, when studies showed that the north represented approximately 60% of do-

mestic energy potential. it was from the plant, still called Kararaô, that the lines began to be plotted.

even though construction on the Xingu river will directly affect the dai-ly lives of indigenous peoples, on ac-count of flooding and interference in the ecosystem, they were not consulted first.

consequently, 1989 was marked by the First meeting of indigenous Peoples of the Xingu, which intended to discuss the issue of the dams and culminated with the famous photograph of north

Jupati fiber in basketry

tuíra. the warning and the opposition to the construction of Kararaô took their first steps.

time passed, and Kararaô, the war cry still echoes today. in 2008, tuíra once again threatened someone with a mache-te. this time, however, the blade had the right address: the arm of eletrobrás worker Paulo Fernando rezende. the situation deteriorated further in 2009 when tuíra and the Kaiapós chanted the real Kararaô, threatening war on the construction of the dam.

pact, but without producing a significant quantity of electricity.

one such case is the Balbina dam, near the city of Presidente Figueiredo, which flooded much of an indigenous territory in its construction. the hydroelectric power station, built to supply the city of manaus, currently only generates its full potential for three months of the year - and with a very high cost. What was to be a great in-vestment thus became one of the biggest strategic mistakes of Brazil. Balbina is insu-fficient to meet the electricity demand for the capital of amazonas.

“the same thing will happen in Belo monte, if built. We are going to invest a fortune and this plant will not have the capacity to generate the electricity that stu-dies say it will have,” believes ariovaldo. the geographer says the Xingu river, as well as the river uatumã, where Balbina is, demonstrates large fluctuations in its level between the dry and wet sea sons.

Another blackout imminentmoreover, the amazon electricity de-

ficit is a fact - and something needs to be done. “We already had an electrical bla-ckout and we’re about to have another,” warns General Villas Boas. in humaitá, an amazonian city, there are cases of doctors performed surgery by candlelight, due to lack of electricity. in this sense, the hydroelectric plants would be the most immediate solution to the energy crisis in northern Brazil.

however, hydroelectricity does not necessarily mean economic and social de-

velopment for the area in which it is built. much less a guarantee of electricity. a pri-me example is the plant at tucurui in Para - the current largest 100% Brazilian plant.

Very few people in the town of tu-curui actually work at it. the generation of employment, always associated with a new construction, has not happened to a great extent. even worse is the fact that the electricity generated is not even trans-mitted into town. according to Pedro or-tiz, coordinator of the amazon module in the reporter of the Future project, aimed at journalism students, there are neigh-borhoods in tucurui that simply don’t have electricity.

so, where does it go, if not to the lo-cal population? For ariovaldo, electricity is not geared toward meeting the needs of the Brazilian population, but for mineral processing companies located in the ama-zon. really, the electricity generated is not needed by the population. “the tucurui electricity is used by Vale do rio Doce to extract iron ore and export it for the price of a pizza per ton, on Fifth avenue in new York.” this would explain the shortage in some neighborhoods of the city.

Villas Boas disagrees. the solution of the amazonian problems, the Gene-ral says, will only occur with the develo-pment of the region. the hydroelectric plants, Belo monte plant among them, are key vehicles for this. they are social tools. Pragmatically, the General affirms, that po-litically correct thinking, does not permit accommodating concrete solutions, it pre-vents the resolution of amazonian issues.

GEOGRAPHER qUESTIONS COST-BENEFIT RATIO

although eletrobrás data predict production of more than 11,000mW, the Belo monte plant will certainly not reach such production. this is because the Xingu river suffers a drastic reduc-tion in its flow during the dry season. studies have shown that the dam will be capable of generating an average of 4,428mW - far below the ranking of se-cond largest plant in Brazil.

according to Professor ariovaldo um-belino de oliveira, of the Department of Geography of the Faculty of Philosophy and humanities at usP (FFlch / usP), “the great problem of the construction of hydro-electric dams in the amazon is the size of the lakes, if compared to the capacity of power generation.”

For the geographer, the amazon has numerous examples of hydroelectric po-wer stations that have submerged large areas, creating a big environmental im-

Ariovaldo: ore at “pizza price”

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O conhecimento geológico tem sido utilizado pela sociedade ao longo da história de manei-

ra a prover as necessidades básicas em termos de recursos minerais (pesquisa e prospecção mineral), exploração de ma-teriais energéticos (combustíveis fósseis), na construção de obras civis (habitação, barragens, rodovias, túneis) e na desco-berta de novos bens minerais. mais re-centemente o papel das Geociências visa atender às demandas por soluções aos problemas ambientais, voltado às áreas de risco, desertificação, geoflutuações e mudanças globais. esses aspectos relacio-nam-se à educação ambiental na medida em que faz-se necessária a compreensão do papel do indivíduo perante as mudan-ças que estão ocorrendo hoje no planeta

e Educação Ambi ental

e da responsabilidade diante dessas trans-formações. a compreensão geológica da natureza, ainda pouco divulgada e manti-da no espaço dos especialistas, cede lugar, na sociedade, às leituras fragmentárias e não-históricas da natureza. Vivemos um momento em que as ciências da terra e o modelo de pensamento científico tipifica-do pelos geocientistas são mais aplicáveis às incertezas e complexidade da sociedade moderna e, desta forma, refletem melhor as complexidades que enfrentamos como seres históricos.

a educação ambiental é uma vertente da educação que agrega as diversas áreas do conhecimento e seus respectivos con-teúdos (científicos, metodológicos, atitudi-nais) na construção de um saber integrado para a compreensão das questões ambien-

tais nos diversos aspectos: econômicos, sociais, culturais, científico-tecnológicos e políticos, de forma a repensar nossa atua-ção no mundo, a despertar uma consciên-cia planetária e formar um cidadão atuan-te na sociedade.

o termo Geociências abrange as diver-sas ciências da terra, englobando as inter-relações da hidrosfera, litosfera, atmosfera e biosfera. mais recentemente incluiu-se nas quatro esferas anteriores a noosfera (ou antroposfera), definida como a interfe-rência do homem com as demais esferas.

as Geociências sintetizam os conheci-mentos sobre as diversas formas de mo-vimento da matéria que tomam parte na evolução do sistema natural integrado, que é o planeta terra. a Geologia é consi-derada uma ciência histórica, pois estuda

GEOCiênCiAS

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Denise de La Corte Bacci

Denise de La Corte BacciGraduada em Geologia pela UNESP,

Campus de Rio Claro, mestrado em Geo-ciências e Meio Ambiente pela UNESP e

doutorado em Geociências e Meio Ambi-ente pela UNESP. Estágios na Università

di Milano e University of Missouri_Rolla. Pós-doutorado em Engenharia Mineral

pela POLI-USP. Atualmente é docente do Instituto de Geociências da USP.

E-mail: [email protected]

e Educação Ambi ental

os processos naturais que ocorrem no do-mínio do planeta terra e procura traços, marcas, vestígios de tais processos de tal forma a interpretá-los e compreendê-los ao longo do tempo e de como se desenvol-veram historicamente, ou seja, é também uma ciência indutiva.

com o crescimento do debate ambien-tal, o conhecimento geológico passou a ser utilizado de forma aplicada à resolução de problemas ambientais, em áreas de risco geológico, no planejamento urbano, no uso e ocupação do meio físico, nas avalia-ções de impacto ambiental e recuperação de áreas degradadas e, em especial, as áre-as de mineração.

apesar de seu desenvolvimento con-temporâneo, as Geociências e a educação ambiental apresentaram um distancia-

mento, permanecendo cada uma, respec-tivamente, nas esferas de atuação técnica e educacional.

muitas das preocupações ambientais que assolam a sociedade atual apresentam uma natureza geocientífica. segundo Fan-tinel (2000), isso pode acarretar em danos econômicos, sociais e ambientais em esca-la planetária. comprometimento da quali-dade e disponibilidade dos recursos natu-rais não renováveis, do solo, água e ar, em virtude das formas de explotação e benefi-ciamento inadequados, com a ocupação de áreas de risco e/ou execução de interven-ções ambientais que potencializam o risco; desertificação, geoflutuações e mudanças globais são alguns dos problemas de filia-ção geológica que afligem a humanidade e que podem, no futuro, colocar em risco as condições terrestres de sustentação da vida, pelo menos a da espécie humana.

todos esses aspectos relacionam-se de alguma forma à educação ambiental, na compreensão do papel do indivíduo perante as mudanças que estão ocorren-do hoje no planeta e da responsabilidade diante dessas transformações.

uma das preocupações da educação ambiental é a reflexão sobre a mudança dos valores culturais que sustentam o es-tilo de produção e consumo da sociedade moderna. a educação ambiental, desen-volvida como tema transversal, oferece a oportunidade da prática interdisciplinar e os conteúdos das Geociências podem servir como tema gerador dessas práticas, contextualizados nas escalas local e global. o educador em Geociências e educação ambiental, segundo a proposta pedagógi-ca do curso de licenciatura em Geociên-cias e educação ambiental da usP, desde 2004, tem o objetivo de levar o conheci-mento do funcionamento do meio físico dentro de uma perspectiva de evolução dinâmica e histórica da natureza ao longo do tempo geológico. com abordagem in-terdisciplinar, desperta os indivíduos para

o significado das múltiplas atividades hu-manas de utilização racional dos materiais geológicos e de ocupação e interferência no meio físico. este conjunto de conheci-mentos e ideias é essencial para promover uma nova relação do ser humano com a natureza, contribuindo para a formação de cidadãos críticos e responsáveis com relação à ocupação do planeta e utilização de seus diversos recursos. além disso, cria meios para diminuir o impacto ambiental das atividades econômicas e também bus-ca soluções para os problemas já existen-tes de degradação do meio ambiente.

o educador em Geociências e edu-cação ambiental, utilizando os conheci-mentos do sistema terra, tem condições de pensar a realidade de forma complexa e abordar o tema do meio ambiente de forma a atingir os objetivos da educação ambiental. Diferencia-se, assim, do mo-delo tradicional das ciências, promovendo o crescimento da consciência sobre um planeta dinâmico e em constante transfor-mação, de forma a alterar o quadro atual de degradação socioambiental.

consideramos que as discussões dos conteúdos das Geociências ampliam a vi-são dos indivíduos de forma significativa, não fragmentada, não linear e estabele-cem conexões, expressas por característi-cas criativas, sem mecanismos repetitivos e descontextualizados, propiciando o co-nhecimento em uma rede de relações sig-nificativas e transformadoras.

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A construção do novo Brasil na Amazônia visa promover uma síntese entre crescimento econômico, preservação ambiental e inclusão social Gabriel Arcanjo Nogueira

PAS, presença ordenadora do Estado

Um dos desdobramentos da Operação Arco Verde é a criação de brigadas de prevenção a queimadas: “repressão a desmatamento com políticas de cidadania”

especial - Amazônia

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Alberto, da SAE, ressalta: “no Programa Terra Legal, cerca de 85% das famílias

beneficiadas são agricultores familiares”

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aea construção de grandes uhes em vetor de

desenvolvimento sustentável para a região. sabemos que qualquer grande obra em uma região ainda não consolidada pode agravar conflitos e promover desordem ambiental. Grandes obras atraem um fluxo migratório de difícil controle. embora tais obras empre-guem muita gente durante a construção da barragem, os empregos são temporários. o súbito afluxo de mão-de-obra e capital pode causar surtos inflacionários locais (no setor de imóveis, por exemplo) e a valorização de ati-vos pode aguçar conflitos pela posse da terra.

“além disso, grandes uhes causam im-pactos ambientais, tanto no rio quanto em sua região de influência. as uhes de santo antônio e Girau, em construção, no rio ma-deira, e a uhe de Belo monte, no rio Xingu, trazem alguns avanços importantes em rela-ção à experiência anterior, como em tucuruí.

“o primeiro é a utilização da tecnologia de turbinas bulbo, que, aproveitando a pró-pria correnteza do rio, exige barragens me-nores e, assim, reduzem drasticamente a área alagada. a barragem de itaipu tem 196 metros de altura. tucuruí tem 78 metros de altura. as uhes do rio madeira têm altu-ra máxima de 18 metros. a área alagada é pouco maior do que a de cheias habituais.

“o segundo avanço é a utilização de can-teiros de obras inspirados nas plataformas de petróleo, que reduzem o impacto ambiental causado nos locais de construção. o terceiro e mais importante é que, no caso da uhe de Belo monte, está sendo elaborado um plano de desenvolvimento sustentável. o Plano de Desenvolvimento regional sustentável do Xingu reúne instituições federais, estaduais e governos municipais em uma série de ações de ordenamento, fomento produtivo e inves-timentos em infraestrutura complementar. Dentre as ações de ordenamento, destaque para a regularização fundiária de proprieda-des rurais e de lotes urbanos, que terão forte efeito de redução de conflitos.

“a inserção da construção das uhes no contexto de um plano de desenvolvi-mento regional amplo e articulado é a ma-nifestação prática da diretriz de aproveita-mento econômico com impacto ambiental e social positivo preconizada pelo Pas”.

Arco Verde ampliada

responsável pelo ordenamento am-biental, a operação arco Verde foi um dos destaques de neo monDo na edição sobre a amazônia em 2009. o secretário diz que ela “não só continua, como foi ampliada. em seu primeiro ano, foram 36 os municípios atendidos. agora são 43 municípios.

N eo monDo continua nesta edição o acompanhamento que tem feito do Plano amazônia sustentável

(Pas), pelo que a iniciativa representa na es-tratégia de desenvolvimento da região. um de nossos entrevistados é alberto lourenço, secretário de Desenvolvimento sustentável da secretaria de assuntos estratégicos (sae).

alberto ressalva que o Plano é de cunho estratégico, abrange toda a política federal para a amazônia legal, incluindo as instân-cias de cooperação com estados e municípios e, como tal, não tem desdobramento progra-mático próprio. mas, esclarece, “suas diretri-zes se traduzem nos diversos programas e ações do Plano Plurianual (PPa) e nas inicia-tivas de mudança institucional do governo fe-deral. as diretrizes do Pas se estruturam em torno de um princípio básico: a necessidade de se promover uma síntese entre crescimen-to econômico, preservação ambiental e inclu-são social na amazônia. Para tanto, o Pas preconiza a reconstrução da presença ordena-dora do estado, o que depende da cooperação crescente entre os três níveis da Federação”.

o secretário reconhece que há resultados auspiciosos. exemplos são o ritmo de des-matamento no acre, que é baixo e cadente; a consciência do protagonismo dos cidadãos no desenvolvimento sustentável parece arrai-gado; e a repercussão política parece positiva. isso num estado com tremendas restrições de logística. Já no marajó, uma das regiões mais carentes de toda a amazônia, as principais ações implementadas até agora são a regulari-zação fundiária - nenhuma área da amazônia teve até agora maior porção dos produtores beneficiados com títulos e concessões de di-reito de uso do que o marajó.

alberto ressalta a importância das parce-rias, a mais importante delas o Programa terra legal, em que cerca de 85% das famílias bene-ficiadas são agricultores familiares; dos inves-timentos em logística para a amazônia legal, que quebra inércia de quase 3 décadas; e cita a necessidade de a transformação industrial da produção em níveis tecnológicos crescentes ser feita não em são Paulo, mas sim no acre, no amapá, próximo das regiões extrativistas.

Para facilitar a leitura, dividimos a en-trevista em tópicos, a começar de um tema que está na ordem do dia e cujos desdo-bramentos estão na matéria “impactos de Belo monte”, a partir da página 34.

Avanços de Belo monte

alberto discorre: “É sabido que quase todo o potencial hidrelétrico brasileiro ainda não explorado está na amazônia: cerca de 120 milhões de mW. o desafio é transformar

“a operação arco Verde foi concebida como o braço de apoio e fomento necessá-rio para contrabalançar os efeitos da repres-são ao desmatamento. Quando o ibama fe-cha um conjunto de serrarias clandestinas, como fez em tailândia, no Pará, em 2008, acaba gerando desemprego e crise no co-mércio local, o que era explorado politica-mente pelos próprios desmatadores.

“a operação arco Verde mostra que a po-lítica de ordenamento ambiental - repressão aos desmatamentos ilegais - vem acompa-nhada de políticas de cidadania e de apoio à produção sustentável. são 21 instituições fe-derais, coordenadas pela casa civil e com par-ticipação de instituições estaduais, com ações que vão desde esforço concentrado para emis-são de documentos pessoais e concessão de aposentadorias a planejamento urbano com sensoreamento remoto; de ações de difusão de tecnologias avançadas da embrapa à inclu-são digital pela criação de telecentros públicos.

“e o desmatamento vem caindo ano a ano (ver gráfico na página 47). entre 2008 e 2009, tivemos pouco mais de 7 mil km2 de desmatamento, cerca de um terço da média histórica. a expectativa para 2009/2010 (o desmatamento é medido entre 1º. de agosto e 31 de julho do ano seguinte) é de desmata-mento entre 5 e 7 mil km2, o que é extraor-dinário, uma vez que 2010 é não só um ano eleitoral, como de forte crescimento da eco-nomia e do preço das commodities”.

Parcerias emblemáticas

iniciativa conjunta por excelência, o Pas é movido em grande parte por parce-rias. alberto reconhece que é difícil falar delas porque “seria preciso examinar os programas de todos os ministérios”. mas não deixa a pergunta sem resposta:

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Entre as ações de ordenamento ambiental, o Programa 1 Bilhão de Árvores conta com a adesão de pessoas de todas as idades

“Vou me limitar a apontar algumas, mais emblemáticas ou mais interessantes. uma delas é o Fundo amazônia. constituído com uma doação inicial de u$ 200 milhões do rei-no da noruega e ampliada por doações pos-teriores da própria noruega e da alemanha, entre outros, o Fundo amazônia é implemen-tado pelo BnDes, com a presença de ministé-rios, representações estaduais e da sociedade civil em seu comitê orientador. todas as deci-sões são tomadas por consenso.

“Já foram financiadas, a fundo perdido, ações de regularização ambiental, apoio a comunidades da floresta e implementação de estruturas estaduais de gestão ambien-tal. o Fundo dispõe hoje de cerca de r$ 600 milhões e continua recebendo projetos.

“a parceria mais importante em curso na amazônia, no entanto, é o Programa ter-ra legal, que tem avançado muito além de nossas próprias expectativas. a sae iniciou a reflexão sobre como enfrentar o caos fun-diário da amazônia ainda em 2008 e, desde então, participou da elaboração da mP 458, de sua tramitação no congresso e, agora, acompanha a implementação da nova lei.

“o terra legal é coordenado pela secretaria executiva do ministério do Desenvolvimento agrário. conta com o apoio da estrutura do incra na amazô-nia e, mais importante, tem uma relação muito boa com os institutos estaduais de terra. são duas tarefas principais: titular as cerca de 300 mil famílias que ocupam terras públicas federais, em alguns casos há mais de 30 anos; e transferir a 172 municípios as áreas em que se constitu-íram seus perímetros urbanos, para que as prefeituras titulem as cerca de 400 mil famílias ocupantes.

“na regularização fundiária rural, o ca-minho é o cadastramento dos ocupantes, seguido do georreferenciamento dos imó-veis, da averiguação do cumprimento das cláusulas sociais e ambientais (o ocupante é proprietário de outras terras? tem reser-va legal ou está recuperando reserva le-gal? o tamanho da ocupação se enquadra nos critérios da lei, ou seja, é menor que 15 módulos fiscais? etc.) e da emissão dos títulos. a regularização fundiária urbana é mais simples. Basta georreferenciar o perí-metro da área urbana, destacá-lo da gleba e transferi-lo à Prefeitura. a Prefeitura en-tão se encarrega de titular os ocupantes.

“o terra legal está mais avançado em rondônia, estado onde já havia um cadastramento quase completo dos ocu-pantes (praticamente todos os produto-res rurais de rondônia são ocupantes de terras federais). os títulos já estão sendo entregues. não tenho o dado atualizado do número de títulos já emitidos, mas o importante é saber que o terra legal está andando à frente de seu cronograma ori-ginal, que previu concluir a regularização fundiária em 3 anos”.

“Choque de legalidade” continua

na edição de 2009, neo monDo abriu a matéria sobre o Pas falando do “choque de legalidade” apontado pelo en-tão ministro da sae, Daniel Vargas. era a referência à questão premente das reser-vas extrativistas. alberto prossegue:

“a questão das reservas extrativistas (resex) é outro caso de sucesso da polí-tica federal de impor um ‘choque de le-galidade’ na amazônia. como disse o ex-ministro substituto da sae, de 87 resex

e rDss, apenas duas, resex chico men-des e resex alto Juruá, estavam regula-rizadas no início deste ano. a sae levou à casa civíl uma proposta expedita de regularização de todas as resex que esti-vessem dentro de glebas arrecadadas do incra e/ou em várzeas federais e terrenos da marinha, áreas inalienáveis da união.

“em poucos meses já foram regulari-zadas 12 resex. outras 23, incluindo Flo-restas e Parques nacionais, estão sendo preparadas para conclusão do processo de regularização no aniversário de criação do instituto chico mendes de conservação da Biodiversidade (icmBio).

“Dentre as unidades regularizadas, te-mos desde pequenas reservas extrativis-tas, como a resex chocoaré-mato Grosso, com 2.800 hectares, no Pará, ao Parque nacional montanhas do tumucumaque, maior unidade de conservação do mundo, com 3,8 milhões de hectares”.

investimentos em logística

sem logística, não há como avançar numa empreitada de tão longo alcance e significado como o Pas. o secretário avalia:

“o Programa de aceleração do cresci-mento (Pac) dirigiu a grande maioria dos investimentos em logística para a amazô-nia legal, quebrando a inércia de quase 3 décadas, em que a amazônia não recebeu investimentos de vulto em transporte. Des-taque para a pavimentação da Br 163 no Pará, cerca de 800 quilômetros; e para a pa-vimentação da Br 230, a transamazônica, entre marabá e santarém, também no Pará.

“há ainda pavimentação de rodovias federais no acre (Br 364), no amapá (Br 156), no mato Grosso (Br 158 e Br 242), no amazonas (restauração da Br 319). no que tange à multimodalidade há avanços, embora menos expressivos do que os in-vestimentos em infraestrutura rodoviária.

“Destaque para a Ferrovia leste-oeste, que liga sorriso, no mato Gros-so, ao ramal em sentido contrário, vin-do de ilhéus; e para os investimentos em infraestrutura portuária no rio amazonas. não menos importante é o progresso da Ferrovia norte-sul, cujo traçado já beneficia o estado de Goiás e se estenderá até são Paulo.

“o grande desafio de uma abordagem multimodal para o transporte na amazô-nia será a hidrovia teles Pires-tapajós, que alteraria radicalmente os parâmetros de custo de transporte na mais importante região produtora de grãos do Brasil”.

especial - Amazônia

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“Quanto aos polos industriais, não há progresso substancial. o melhor cenário é o do mato Grosso e de rondônia. no pri-meiro caso, já percebemos um avanço con-sistente dos setores industriais à jusante da produção. Grandes plantas de abate de aves e suínos, usinas de esmagamento de grãos e, mais recentemente, criação e be-neficiamento de peixes em grande escala. em rondônia, o estado que tem a estrutura fundiária mais desconcentrada da amazô-nia, é nítida a verticalização de cadeias pro-dutivas, em especial laticínios e frigoríficos.

“É claro que há avanços nos demais es-tados, mas não na escala que desejamos. acredito que as deficiências de infraestrutu-ra expliquem boa parte do atraso no bene-

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Políticas públicas adequadas garantem ao produtor rural mais crédito, assistência técnica e consequente ganho em resultados

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Acumulado Deter* (km2) - Agosto a Maio

Políticas públicas de crédito

um tópico que não poderia faltar nesta conversa com o secretário de Desenvolvi-mento da sae engloba a melhor maneira de desenvolver dois setores socioeconô-micos de suma importância, a agricultura familiar e o polo industrial, de modo a aprimorar um e outro, sem detrimento de qualquer um deles. alberto argumenta:

“Quanto à agricultura familiar, a situa-ção não se distingue do resto do Brasil. há um notável progresso na atuação das políti-cas públicas de crédito, com a ampliação do Pronaf; da assistência técnica, cujo marco regulador foi transformado, ganhando fle-xibilidade e cobertura; e, não nos esqueça-mos, da regularização fundiária.

“cerca de 85% das famílias benefi-ciadas pelo Programa terra legal são agricultores familiares com menos de um módulo fiscal de área ocupada. tal-vez a área que deverá despertar maior atenção no próximo governo seja a as-sistência aos produtores dos Projetos de assentamento. além das políticas públi-cas universais de combate à pobreza, os Projetos de assentamento da amazônia deveriam receber atenção prioritária em pelo menos três frentes: infraestrutura de transporte, ou seja, recuperação de estradas vicinais; assistência técnica de-mocrática e focada em resultados; e es-trutura de comercialização.

“Vale notar que a expansão da atua-ção da conab já resulta em melhora dos termos de troca para os produtores da amazônia, em especial para as populações agroextrativistas.

ficiamento industrial da produção agrícola. outra parte se deve à fragilidade da rede de cidades na provisão de serviços e insumos so-fisticados, demandados pelas indústrias mais modernas. um caso especial é o de polos de beneficiamento de produtos sustentáveis da floresta. a nosso ver, esta é a melhor alterna-tiva para os extrativistas nos próximos anos.

“o extrativismo clássico está conde-nado à estagnação tecnológica e levará à gradual erosão populacional das áreas de floresta. É preciso partir para a transforma-ção industrial da produção em níveis tecno-lógicos crescentes. mas não em são Paulo e sim no acre, no amapá, próximo das regiões extrativistas. o passo mais ousado está sendo dado pelo estado do acre, que induz a instalação de fábricas modernas em Xapuri, ainda que com investimento inicial do próprio estado. as desvantagens locacionais óbvias das regiões extrativistas devem ser contrabalançadas por alguma forma competitiva de subsídio. estamos conduzindo estudos e formulando propos-tas práticas, neste sentido”.

Florestania e regularização fundiária

neo monDo escolheu duas áreas que estão na amazônia legal, para sa-ber o que de concreto se faz na solução de questões que lhes dizem respeito. em que medida a florestania, conceito surgi-do no acre, evoluiu na região ou no es-tado? e se o Pas chegou a marajó, nem sempre lembrada?

alberto reconhece que a primeira per-gunta, “muito interessante, deve ser respon-dida plenamente e em detalhes pelos cida-

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* Detecção do Desmatamento em Tempo Real - Fonte: Inpe/MMA-IbamaPara saber mais sobre desmatamento, ler “Práticas e critérios de sustentabiidade”, na página 52.

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dãos do acre. o conceito básico me parece correto: promover a construção democrática dos direitos de cidadania independente-mente das regiões onde vivem os cidadãos. Propiciar aos que vivem na floresta escolas e saúde de qualidade, não escolas e saúde de segunda classe. os resultados parecem aus-piciosos. o ritmo de desmatamento no acre é baixo e cadente; a consciência do prota-gonismo dos cidadãos no desenvolvimento sustentável parece arraigado; e a repercussão política parece positiva, uma vez que a coali-zão partidária que lançou o conceito na práti-ca tem sido sucessivamente reeleita.

“notem que o acre sofre com tremen-das restrições em logística. o acre não tem pedras. as estradas custam muito mais caro e duram muito menos. os rios são de difícil navegação, especialmente na seca. chegar na ponta é muito difícil. acho que a pavimentação integral da Br 364 vai fazer uma imensa diferença nos indicadores de desenvolvimento econômico do estado.

Liana Utinguassu, que entre outras atividades pró-nações indígenas, edita o portal www.yvykuraxo.org.br, propõe al-guns dados “para reflexões conjuntas e busca de soluções, pois não podemos conceber que se siga ‘caçando’ o Indígena e tratando-o à margem de tudo que diz respeito à vida, nes-ta Terra onde eles sempre foram os grandes cuidadores com conhecimentos inegáveis em Medicina Tradicional, preserva-ção Ambiental e contato Ancestral com respeito à Terra e aos filhos desta Terra”.

Com este argumento, Liana apresenta números preocu-pantes sobre a situação indígena no país:• 71% das crianças e adolescentes indígenas vivem em situa-

ção de pobreza;• 50% deles não têm acesso à água tratada;• 21% dos meninos e meninas indígenas entre 7 e 14 anos

estão fora da escola;• 15% daqueles com idade entre 10 e 15 anos

são analfabetos;• 13% das crianças e adolescentes indígenas trabalham.

E, como não está sozinha na empreitada, deixa duas frases de sabedoria e reflexão de irmãos de outras tribos:

“Antes nós não sabíamos que tínhamos limites, só sabíamos que tudo era floresta... Agora demarcamos nossa área por-que é só o que sobra dos lugares antigos.”

(Kumai, índio do povo Waiampi, Amapá)

“Não digo: eu descobri essa terra porque meus olhos caíram sobre ela, portanto não a possuo. Ela existe desde sempre, antes de mim.”

(Davi Yanomami, pajé e líder do povo Yanomami)

Eles também precisam ser ouvidos

“É bom não esquecer que o conceito de ‘florestania’ não se restringe ao acre. amapá e amazonas, em especial, também se distinguem por políticas de tratamento diferenciado para os povos da floresta.

“como mencionei, o Pas é o arcabouço de diretrizes que norteia toda a política fe-deral e de cooperação federativa na ama-zônia. não é um plano com mecanismos de atuação na ponta. De fato, o marajó é uma das regiões mais carentes de toda a amazônia. nos últimos anos, foi construí-do um plano de desenvolvimento específi-

co, exemplo de cooperação entre governo federal e governo do Pará. as principais ações implementadas até agora são a re-gularização fundiária - nenhuma área da amazônia teve até agora maior porção dos produtores beneficiados com títulos e con-cessões de direito de uso do que o marajó.

“o grande desafio para o marajó, a nosso ver, é encontrar novas vocações econômicas - o turismo é muito promissor; e aumentar o conteúdo tecnológico das vocações tradicio-nais - pecuária extensiva e extração de madei-ras, sem deslocar os produtores familiares”.

A política de ordenamento ambiental - repressão aos desmatamentos ilegais -

vem acompanhada de políticas de cidadania e de apoio à produção sustentável

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É hora de se chegar a reflexões conjuntas e busca de soluções em respeito à Terra e aos filhos desta Terra

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neo mondo - setembro 2010 49

Natascha TrennepohlAdvogada e consultora ambiental

Mestre em Direito Ambiental (UFSC)Doutoranda na

Humboldt Universität (HU) em Berlim.E-mail: [email protected]

Natascha Trennepohl

Correspondente especial de Berlim – Alemanha

O derramamento de petróleo no Golfo do méxico é sem dúvida um dos maiores desastres am-

bientais da história e, com certeza, o maior derramamento de óleo já visto, superando o famoso acidente que aconteceu no alas-ca no final da década de oitenta envolven-do o navio exxon Valdez.

Desde que tudo começou, em meados de abril, foram feitas diversas tentativas para diminuir e estancar o vazamento de óleo. no entanto, os resultados não têm sido satisfatórios. uma imensa parte da região está contaminada, a população lo-cal foi prejudicada e a diversidade bioló-gica está seriamente ameaçada. este é um exemplo claro de que grandes desastres ambientais não trazem apenas conse- quências ambientais, mas também so-ciais e econômicas.

na busca de alternativas para minimi-zar os impactos negativos e auxiliar nas ações de limpeza, cogita-se a utilização de micro-organismos que decompõem po-luentes. essa técnica, também conhecida como biorremediação, não é recente e já foi usada para suavizar a poluição causada por outras atividades.

na verdade, alguns micro-organismos e plantas podem ser usados no tratamento dos derramamentos de petróleo, resíduos industriais, lixo urbano, contaminantes radioativos etc. esses micro-organismos aproveitam como fonte de energia solven-

usar a natureza para salvar a natureza?

tes à base de cloro, detergentes, enxofre, tolueno etc. Pode-se dizer que essa possi-bilidade de utilizar bactérias na degrada-ção de resíduos nocivos tem despertado o interesse dos cientistas e a pesquisa vem se desenvolvendo nas últimas décadas.

a ideia parece simples: usar bactérias para degradar ou remover contaminantes nocivos do meio ambiente, tendo como objetivo principal minimizar o impacto dos poluentes. neste cenário, a biorre-mediação aparenta ser uma alternativa atraente inclusive para a remoção dos Po-luentes orgânicos Persistentes (PoPs) de áreas contaminadas.

no entanto, apesar de ser considerada uma solução para o tratamento dos casos de poluição, essa técnica ainda possui apli-cação limitada, pois é muito difícil, para não dizer impossível, controlar o cresci-mento populacional das bactérias. esse crescimento sofre influência de fatores ex-ternos, tais como ph, temperatura, umida-de, nutrientes disponíveis etc.

sem mencionar que, caso a bactéria seja alterada geneticamente para responder de forma mais veloz e eficiente, questões éticas, além das questões técnicas, passam a fazer parte da discussão, já que nesse caso aconteceria a liberação no ambiente de or-ganismos geneticamente modificados.

na verdade, todo o potencial da bior-remediação ainda não foi explorado. as pesquisas em biotecnologia tendem a se

intensificar na medida em que os méto-dos convencionais para limpeza do solo e das águas subterrâneas se mostram in-suficientes para responder aos problemas da sociedade atual.

assim, apesar de alguns benefícios trazidos pela biorremediação, como a rapidez na descontaminação, a sua im-plementação ainda é um desafio tecno-lógico devido à grande dificuldade de se monitorar as reações entre os micro-organismos e os contaminantes no am-biente, fazendo com que haja hesitação no momento da aplicação em larga esca-la dessa estratégia de limpeza.

como o petróleo é uma mistura de hi-drocarbonetos e pode ser biodegradado, pode-se questionar se não seria o momen-to de se usar a biorremediação para resol-ver o problema da poluição causada pelo acidente envolvendo a British Petroleum (BP) no Golfo do méxico. no entanto, ape-sar de esta técnica apresentar benefícios, muitas questões precisam ser respondidas antes que haja a larga utilização desse ins-trumento na descontaminação de áreas amplamente poluídas.

Biorremediação:

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POR Um PAÍS

O PAS é inquestionável em suas propostas objetivas, diz ambientalista, à frente da Expedição Villas-Bôas

Gabriel Arcanjo Nogueira

Paulo celso Villas-Bôas define-se como ambientalista moderno em sua identificação com a amazô-

nia (desde 1983), que o fez retomar com fôlego e ânimo renovados, a partir de 2005, o projeto expedição Villas-Bôas pelo Brasil, esboçado pelo pai dele.

entre seus objetivos está o de contribuir para a construção de "um país mais respeitá-vel e, em particular, uma amazônia vista como meio de integrar-se homogeneamente a esse País, sem fisiologismo". Paulo celso reveren-cia os "áureos tempos dos inesquecíveis serta-nistas, em que sempre destaco as figuras dos irmãos Villas Boas" (com os quais não tem grau de parentesco - n.r.), mas quer mais:

"sempre procurei espelhar-me no in-questionável orlando Villas Boas, desde os anos 70, e seguir seus passos era um sonho. sobravam para esses irmãos exemplos de valor; eram homens bravos, destemidos e preparados para enfrentar qualquer perigo.

escreveram, por isso, uma bela história de amor ao próximo. o atual projeto (www.expedicaovillasboas.com.br) vai muito além de tudo isso e não gostaria de com-parações. não se espelha em experiências anteriores, visto que se trata de um projeto mais abrangente, não focando apenas o ser-tanismo e o indigenismo.

"hoje, diferentemente do passado, as necessidades do Brasil se revelam num conjunto de ações socioambiental. são po-líticas públicas em que a sociedade tem de ser participativa e não se apresentar como mera espectadora, sofrendo, por exemplo, as consequências de projetos repressivos e traumáticos em sua adaptação."

Tantas "boas intenções" a expedição Villas-Bôas é contempo-

rânea do Pas, ao ressurgir em 2005, já como "proposta oficiosa". Paulo celso re-lata: "Fiz algumas viagens com o meu sau-

doso pai, há uns 25 anos, com o intuito de estudarmos o comportamento da socieda-de brasileira, incluindo aí os índios e não índios. nessa época, entretanto, eu estava em ascensão na minha vida profissional e não poderia incorporar-me a um proje-to dessa envergadura, esboçado pelo meu pai. a Fundação Villas-Bôas (FVB), sob minha responsabilidade, foi registrada em 2008. acompanhamos todas as ações do governo, e são tantos os lançamentos de programas que não damos conta de digerir tantas 'boas intenções'."

Para o ambientalista, em que pese o jogo de interesses, o Pas traz em seu bojo propostas objetivas. mas recomenda: "se-jamos sensatos; do papel para a realidade são outras águas, em alusão a um dito po-pular. o Pas na sua essência é inquestio-nável, com matérias pensadas que, se co-locadas em prática, irão trazer resultados altamente positivos, desde que o governo

mais respeitável

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51 neo mondo - setembro 2010

e o setor produtivo articuladamente pen-sem no bem comum da população - sem o que será mais um programa de governan-tes e não de governo".

Paulo celso deixa a bola com os go-vernadores que assinaram o Plano, ao in-dagar se eles "o implantarão em seus esta-dos ou se será mais uma fonte de renda a ser captada para ações pontuais em cima de interesses, sem que enxerguemos os resultados que a sociedade espera".

De suas andanças pela região (a expe-dição Villas-Bôas já percorreu boa parte do amazonas e do Pará e, no primeiro trimes-tre de 2011, inicia os trabalhos na ilha de marajó), o ambientalista constata: planos e programas como este "só poderão dar realmente resultados se a visão do projeto não estiver centrada em um único minis-tério. no caso, o Pas teve a participação de vários deles; logo a expectativa é grande e eu fico esperando os resultados".

Alinhamento de programas Paulo celso prossegue: "no nosso en-

tendimento, hoje, o ministério do meio ambiente, não por grau de importância, é o centro das atenções de todos os mi-nistérios, levando-se em conta que a co-munidade internacional tem um grande peso na economia de um país. a essa for-ma chamamos de alinhamento de pensa-mento de programas, pois antes mesmo da natureza, o homem é a coisa mais importante e, óbvio, o que ele demanda, com o olhar nas causas e efeitos que in-terferem no seu dia-a-dia, estando ele no meio da floresta ou na área urbana".

Para o ambientalista, "os programas têm que superar desconexão entre os mi-nistérios, principalmente daqueles que têm uma bancada parlamentar mais forte como é o caso do ministério da agricultu-ra e dando aí uma importância, também, para o ministério da reforma agrária,

bem assim outras secretarias de outros ministérios que são polêmicas, tornando-se uma verdadeira torre de Babel".

Paulo celso ressalta que já existe para o marajó uma iniciativa do governo, o Plano de Desenvolvimento territorial sustentável do arquipélago do marajó (Plano marajó) e lem-bra: "tomamos como exemplo os projetos concedidos a algumas comunidades, uma de-las a nossa Várzea, com regularização fundiá-ria, e a cidade de afuá, que saiu na frente com a autorização do plano de manejo de açaizais. a isso chamamos de ação concreta.”

a coesão de todos os municípios é de suma importância para a mudança de com-portamento do homem e da economia de cada uma deles. Para isso os prefeitos têm de entender tecnicamente o que dita o Pas, pos-sibilitando melhor e maior aproveitamento dos projetos a ele atrelados. "nosso papel e de qualquer organização civil será legitimar ações para pressionar os governantes responsáveis pela realização a nível local dos objetivos das políticas públicas”, pondera.

Piores iDHs o ambientalista explica: “nas nossas

andanças por essas regiões, não sentimos nem um avanço nesse sentido; é só miséria com um povo desassistido nas três esferas de governo. há regiões da ilha com os pio-res iDhs. o que resta para essa população é ou só ficar nas estatísticas degradantes ou então se beneficiar das ações concretas e, se for o caso, para hoje - não para o amanhã".

Paulo celso insiste na tese de que o Pas só emplacará se a sociedade fizer intervenção com as três esferas de governo e, se no pró-prio governo, forem aparadas arestas de jo-gos de interesses dos governadores regionais. "nós queremos que o Pas vingue na ilha do marajó, que será a nossa primeira fase, e se transforme em um verdadeiro laboratório desse programa, sem mais nem menos.”

entre os instrumentos fundamentais para sua efetivação, a seu ver, estão o zoneamento ecológico-econômico, a regularização fundiária, o licenciamento ambiental em propriedades rurais e a consolidação de um sistema de áreas protegidas, assim como a gestão ambiental e o ordenamento territorial com inclusão social e cidadania. Para o ambientalista, basta querer porque há recursos para tanto.

É preciso "colocar todas as pesqui-sas em ação. caso contrário, é mais um plano de governo que não dará certo. Da nossa parte vamos cutucá-los. É preciso formular políticas que tornem competi-tivos os produtos e serviços oferecidos pela maior floresta tropical do Planeta".

mais respeitávelDesde as suas viagens com o pai - e lá se vão 25 anos - índios e não índios,

como os ribeirinhos das fotos, estão entre os estudos de Paulo Celso

acervo FVB

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FVB

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especial - Amazônia

mauro oliveira Pires, sociólogo e di-retor do Departamento de Políticas para o combate ao Desmatamento/secretaria executiva do ministério do meio ambiente (mma), ressalta a importância das práticas e critérios de sustentabilidade que o gover-no tem procurado adotar em segmentos produtivos, de modo a agregar valor a ações de fiscalização e combate ao desmatamento.

ele cita o Plano Federal para Preven-ção e controle dos Desmatamentos na amazônia legal (PPcDam), lançado em 2004, e fala de seus desdobramentos em ações de 13 ministérios, coordenados pela casa civil da Presidência da república.

"recentemente este Plano foi atuali-zado e iniciativas novas foram incluídas, dentre elas, a operação arco Verde, estra-tégia semelhante a uma força-tarefa que envolve órgãos do governo federal, esta-

dos e municípios, visando à promoção da transição do atual modelo predatório de produção para um novo modelo com sus-tentabilidade, focada nos 43 municípios localizados na fronteira do Desmatamento na amazônia".

Pires acrescenta: "além dessa, o cadas-tramento ambiental rural (car) é outra ini-ciativa inovadora no Plano que possibilitará a regularização ambiental de propriedades rurais na amazônia, independentemente da necessidade de regularização fundiária, medida que facilitará o monitoramento e a recuperação dos passivos ambientais".

em sua estratégia, o mma tem viabi-lizado a assinatura de Pactos setoriais, evi-tando que matérias-primas provenientes de desmatamento ilegal na amazônia sejam processadas, sobretudo no setor da carne, grãos e madeira (ver quadro).

PRáTICAS E CRITéRIOS DE SUSTENTABILIDADE

Fonte: FVB

"Uma vez, em missão no Rio Abacaxi - pró-ximo da divisa com o Pará, a um dia de bar-co da cidade de Nova Olinda no lado oeste do Amazonas, e a dois dias de Manaus -. estávamos num lago pescando para o nosso almoço, quando fomos surpreendidos por um morador da região com uma arma em punho, tipo espingarda Bacamarte, daquela que carrega pela boca. "Perguntou se estávamos utilizando rede, já que não era permitida tal prática. Dissemos que não, e daí nasceu uma conversa sobre a região; conclusão: era um cearense vivendo há muitos anos naquelas bandas. Depois nos levou até suas terras e fiquei estupefato em ver sua plantação no meio da selva amazôni-ca e seus três filhos todos de botina. "Para que ele escoasse sua produção, tinha de viajar um dia até Nova Olinda ou dois dias até Manaus. Num barco pequeno como o dele, isso representava o dobro de tempo. Por outro lado, de todas as cidades da Ilha do Marajó à capital Be-lém se levam duas horas de embarcação

de passageiros ou 3 horas de balsa com carretas e carros. Na Ilha quase nada se planta; 100% dos alimentos consumidos vêm de Belém e de São Paulo. "Nas nossas missões estão demonstradas que as várias concepções de Amazônia se ancoram na concepção sociológica e política de desenvolvimento, ou seja, cada denominação atribuída à região correspon-de a um determinado tipo de intervenção do Estado. O que vemos é que Brasília e os governantes que ficam em suas capitais estão distantes desses Brasis. Eles precisam sair de suas cadeiras e das salas refrige-radas para também ser expedicionários, implantarem o que dita o papel". O relato desse "causo" que Paulo Celso faz, a pedido de NEO MONDO, é esclarecedor. O ambientalista não esmorece: "Sozinhos nada faremos; são políticas públicas que terão de ser discutidas - isso é problema de governo e é de conhe-cimento de todos. Seria hipocrisia de nossa parte falar que iremos reverter essa

situação, mas estaremos interagindo de toda a forma com a coletividade local. Virão para a Ilha do Marajó cientistas, pesquisadores e profissionais de diversos seguimentos, da França que se unirão a nossos profissionais e ONGs genuina-mente brasileiras. Essas, as nacionais, por acordo firmado com a FVB, irão transferir tecnologias, conhecimento do que lá está dando certo. Formaremos líderes para serem multiplicadores de propostas para profissionalização dessas pessoas que só sabem fazer uma atividade, e isso será feito nas dependências de prédios públi-cos se deixarem, se não nós faremos em associações, dentro das igrejas; e se tudo isso falhar, faremos embaixo de tendas para mudança comportamental. "Ressalto que estaremos sendo monitorados por satélite; o Brasil saberá o que estamos fazendo e o que está acontecendo. Na internet não existe rua ou distância, o mundo inteiro estará nos acompanhando, pois o nosso portal é visto em mais de 78 países".

O bacamarte do cearense e seus filhos de botina

Próximos passos da Expedição

• seleção e contratação de ONGs, profissionais de nível superior, universitários e voluntários para a formação de equipes para a execução da 1ª fase da 1ª etapa a ser realizada na Ilha de Marajó

• primeira ação em 2011 tem a parceria com profissionais de empresas europeias

• processo de investigação social e educativa, pontuando os projetos que serão financiados pela França

• expectativa de novos investidores e empresas comprometidas com o socioambiental

• possibilidade de trabalhar com subsídios conforme proposição do PAS

Pires: ampliação e qualificação da assistência técnica a agricultores

familiares, bem como a Moratória da Soja, são resultados palpáveis

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neo mondo - setembro 2010

Transição de modelosoutras ações deste Plano são a es-

truturação e promoção das cadeias pro-dutivas do extrativismo, contempladas e fortalecidas pelas políticas do Programa de aquisição de alimentos (Paa) e do Programa de Garantia de Preços mínimos (PGPm). Para se chegar a esse estágio, Pi-res relata o caminho que foi percorrido, desde a extinção da empresa Brasileira de assistência técnica e extensão rural (embrater), em 1990.

"o Brasil viveu um longo período de es-cassez na disponibilização de conhecimen-tos e tecnologias e de informações sobre os mercados e políticas públicas direcionadas ao desenvolvimento do meio rural. este quadro começou a ser revertido, em 2003, quando o governo federal iniciou o proces-so de construção de uma Política nacional de assistência técnica e extensão rural (ater), implementada pelo ministério do Desenvolvimento agrário (mDa), cujas ações buscam promover a transição dos modelos tradicionais de desenvolvimento rural para modelos sustentáveis de produ-ção, com ampliação e qualificação da assis-tência técnica e extensão rural, direcionada aos agricultores familiares e assentamen-tos da reforma agrária, que também são be-neficiados pelas políticas do Paa e PGPm", explica o sociólogo.

a queda do desmatamento, em si, também é um avanço das políticas públi-cas, em que parcerias são fundamentais, avalia. Pires cita como exemplo bem-sucedido a chamada "moratória da soja":

"Parceria inédita com a associação Brasileira das indústrias de Óleos Vege-tais (abiove) e associação nacional dos exportadores de cereais (anec), que as-sumiram o compromisso de implemen-tar um programa de governança, cujo objetivo é o de não comercializar soja produzida em áreas desmatadas a partir de julho de 2006, no bioma amazônia".

Para o diretor do mma, o efeito ini-bidor dessa iniciativa é notável, como mostram dados do inpe (ver quadro).

Cartilha do desmatamentona execução do PPcDam o mma

tem apoiado a elaboração de Planos es-taduais, que de forma complementar contribuem para viabilizar as suas me-tas e para o alcance das metas estabe-lecidas pelo Plano clima, de redução do desmatamento na amazônia legal em 80%, até 2020.

a cartilha do desmatamento, na visão de Pires, tem sido seguida à risca. "a taxa de desmatamento para o período de 2008 a 2009 (Prodes), na amazônia legal, foi de 7.464 km², a menor dos últimos 21 anos, desde que o instituto nacional de Pesqui-sas espaciais (inpe) monitora a cobertura florestal da amazônia", enumera.

Para o diretor do mma, a contribuição do governo lula para a redução do desma-tamento fica bastante evidente quando se compara a taxa de desmatamento de 2004, medida em 27.772 km², com a taxa de 2009, de 7.464 km². "uma redução de 53% do desmatamento", contabiliza.

"Já em relação à taxa do desmatamen-to para 2010, ainda não temos os dados apurados pelo sistema Projeto de moni-toramento de Desflorestamento na ama-zônia (Prodes), que tem uma metodologia própria e diferenciada dos outros sistemas. mas acredita-se que a taxa do desmata-mento em 2010 cairá ainda mais, ficando próxima a 5.000 km², segundo os dados do sistema Detecção do Desmatamento em tempo quase real (Deter), que detec-tou o corte de 1.808 km² de floresta em 11 meses, contra 3.573 km² registrados entre agosto de 2008 e junho de 2009", afirma.

Pires recomenda cautela, porém, quanto às informações do Deter, no qual "desmatamentos abaixo de 25 hectares não são observados", por ser um sistema "construído para orientar as operações de fiscalização em campo e não para medir a taxa anual do desmatamento".

a escolha do inpe para medir o desma-tamento na região, no entanto, no entender do diretor, é a mais acertada. "atualmente o sistema de monitoramento do Brasil é mo-delo para o mundo, inclusive com reconhe-cimento internacional. em 2007, a revista science publicou artigo elogiando o moni-toramento da floresta amazônica realizada pelo inpe, que a partir de 2003 implantou uma política de dados livres, expondo pu-blicamente seus resultados. a metodologia de cálculo anual da taxa de desmatamento está disponível para todos, assim como os mapas do Deter, disponibilizados mensal-mente nas páginas do inpe. hoje o Deter é exemplo para outros países", afirma..

Fonte: Inpe/MMA

Paulo Celso (à direita), em uma de suas missões, navega por um conjunto de ações socioambiental, em que a sociedade tem de ser participativa

acervo FVBPactos de sustentabilidade

• 31 empresas no setor madeireiro

• 18 em agropecuária

• 13 no cultivo da soja

Plantio em áreas desmatadas

• 52 municípios monitorados

• 98% da soja produzida no bioma Amazônia é proveniente deles

• 194 áreas com indícios de cultura agrícola

• 76 delas plantaram soja em 6,3 mil ha

• 0,25% apenas da superfície total desflorestada, na comparação com os 2,49 milhões de ha desmatados em MT, PA e RO no triênio 2007 a 2009

53

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54 neo mondo - setembro 2010

D ados recentes da united na-tions Framework convention on climate change (unFcc)

colocam china e estados unidos como os maiores emissores de gases de efeito estufa (Gee) do planeta, com aproxima-damente 41,7% do total das emissões de co2 e com 37,46% dos demais gases que compõem o total dessas emissões. o prognóstico para ambos os países não é bom, salvo se medidas de mitigação da emissão desses gases forem tomadas em caráter de urgência.

nos estados unidos, por exemplo, a indústria é responsável por 30% des-sa emissão, enquanto 28% advêm dos transportes, 17% das atividades comer-ciais, 17% das atividades residenciais e 8% da agricultura.

o foco deste artigo é o setor dos transportes, por razões óbvias, princi-palmente porque nesse setor, data ve-nia, o Brasil tem muito a ensinar aos

O agronegócio

americanos e ao mundo. atualmente, em termos globais, o setor de transpor-te é responsável por 13% da emissão de todos os gases de efeito estufa (Gee ou, em inglês, GhG) na atmosfera e 25% da emissão somente de um dos gases anali-sados, o co2.

seguindo essa ótica de oportunida-des e do status propício para o agrone-gócio brasileiro, pesquisa recente da Fao mostrou que o país apresenta a maior área a ser utilizada para expansão do setor agrícola, seguido dos estados unidos e rússia. Diga-se de passagem, china e Índia não possuem nada mais que pode ser utilizado para expansão de seu agronegócio.

Pois bem, a despeito das inúmeras restrições administrativas impostas pela legislação ambiental, e comumente se-guida pela desmedida busca por uma pseudopreservação ambiental de alguns segmentos da sociedade, desapegados

do senso de desenvolvimento em um país carente de infraestrutura, continu-amos a ser o maior produtor mundial de açúcar, café e suco de laranja, e o segun-do produtor mundial de etanol, soja e carne. isso tudo atuando em consonân-cia com as restrições legais impostas, no mais das vezes, décadas atrás e sem o compromisso com o desenvolvimento.

Para ilustrar a razão de buscar incen-tivos tributários e um maior apoio go-vernamental, basta usarmos o exemplo do etanol (da cana-de-açúcar), do qual o Brasil é o segundo produtor mundial (28 bilhões de litros anuais), atrás ape-nas dos estados unidos, que, valendo-se de incentivos altíssimos (em média, us$ 6 bilhões anuais), consegue produzir 45 bilhões de litros de etanol (de milho).

a preocupação dos países desenvol-vidos agora é fixar metas voluntárias para redução e alternar a matriz ener-gética poluente (como o petróleo), por

e o mercado norte-americano

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neo mondo - setembro 2010 55

Terence Trennepohl

Terence TrennepohlSócio de Martorelli e Gouveia Advogados

Senior Fellow na Universidade de Harvard

Doutor e Mestre em Direito (UFPE)Bolsista da CAPES

E-mail: [email protected]

Correspondente especial de Boston – Estados Unidos

meios menos poluentes (como os bio-combustíveis), e como fazer essa transi-lão sem afetar seu atual estágio de de-senvolvimento e com o menor impacto para suas economias.

hoje o mundo depende do petróleo extraído de somente 20 países. no caso do etanol da cana-de-açúcar, por exemplo, mais de 100 países estão aptos a produzi-lo, fornecendo combustível mais limpo para todos os demais, sem contar ainda com um fator importantíssimo, que é o desenvolvimento de áreas subdesenvolvi-das, a exemplo de dezenas de países afri-canos e outros tantos países situados na américa central.

em meados de maio, a time magazi-ne mostrou que o valor investido pelo go-verno obama em energias limpas, no seu primeiro ano, chegou perto dos us$ 90 bi-lhões em sustentabilidade, enquanto nos oito anos do governo Bush somente us$ 14 bilhões foram utilizados para esse fim.

no discurso do `estado da união` (state of the union speech), do final de janeiro, o presidente obama apelou para que o senado aprovasse as leis de mudança climática e que levasse adian-te as propostas de um Climate Change Bill nos próximos meses, a fim de fazer com que os estados unidos pudessem participar do processo de mudança glo-bal. Basta mencionar que o encontro de copenhague - coP 15, não foi um fra-casso como proclamado por algumas vo-zes. Pela primeira vez em muitos anos, governos de vários e importantes países puderam discutir mudanças climáticas em nível global.

Pois bem, no começo deste ano a universidade de harvard publicou dois estudos dando conta das vantagens da implantação da cana-de-açúcar em paí-ses subdesenvolvidos como forma de um upgrade econômico e social nessas regi-ões pobres. além disso, propôs a adoção de uma maior mistura de etanol à gaso-lina americana (que nos estados unidos é de 5% e no Brasil chega a 25%). Demais disso, é importante saber alguns núme-ros impressionantes. enquanto o Brasil tem 36 milhões de veículos, os estados unidos têm 250 milhões. enquanto nos-so consumo de gasolina é de 4 bilhões de galões/ano, os estados unidos conso-mem 140 bilhões/ano.

Para finalizar, e tentando mostrar como estamos aptos e preparados para re-ceber investimentos externos, basta men-cionar as recentes operações envolvendo empresas internacionais em território bra-sileiro, como as da shell X cosan, eth X Brenco e tereos X Guarani, enfim, além dos largos investimentos anteriores na área de biocombustíveis.

enfim, nenhum país do mundo con-seguiu implantar um sistema tão eficien-

te de substituição da gasolina por um combustível menos poluente, como o uso do etanol no Brasil. Demais disso, se a gasolina fosse substituída por 5% de etanol no mundo, o Brasil teria de au-mentar sua produção de 28 milhões de litros em 2010 para 102 bilhões de litros até 2020.

outro mercado importante é a união europeia, que, seguindo a orientação esta-belecida em 2007, ao pretender substituir 5,6% de sua frota por veículos flex-fuel, precisará de aproximadamente 18 bilhões de litros nos próximos anos.

Diante de todos esses dados, só nos resta esperar o movimento do merca-do e aproveitar as oportunidades, pois como dizia churchill, “o pessimista vê dificuldade em cada oportunidade, enquanto o otimista vê oportunida-de em cada dificuldade”.

o Brasil, portanto, há de estar pre-parado para essas oportunidades, que se avizinham num horizonte já não muito distante.

*artigo publicado no Valor econômico de 30 de julho de 2010.

e o mercado norte-americano

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Larissa tem 4 anos e enquanto fala não consegue parar de mexer as pernas. Diferentemente da maior

parte das crianças brasileiras, ela não passa o dia vendo televisão nem implora por um punhado de doces ou por novos brinquedos. isso porque larissa é uma das últimas crianças do Brasil. aqui,

Projeto de subsistência agropecuária tenta dar vida a um dos lugares mais isolados (e importantes) do Brasil:

a fronteira amazônicaBruno Molinero

especial - Amazônia

Luz no fim do país

não em quantidade, mas em distância. ela mora no Pelotão especial de Fron-teira (PeF) de Pacaraima, em roraima. a poucos passos de onde suas sandálias brincam de pêndulo, enquanto a menina versa sobre as cobras e os cinamomos, existe uma cerca. Do lado de lá, bem-vindo à Venezuela.

os PeFs são unidades militares com-pletamente isoladas e dependentes da logística militar. são frágeis comunidades que têm como modesta responsabilidade a manutenção da soberania nacional. laris-sa não tem televisão em casa. a única em que pode assistir a seus desenhos favori-tos fica em uma área comum e não fun-

Sargentos agrários cultivam nos PEFs a cenoura, a banana ou mesmo o peribá que dá maior autonomia ao pelotão e ajuda a

desafogar o transporte de suprimentos

Divulgação

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ciona quando chove. É bom lembrar que chuva e amazônia são quase sinônimas.

o problema enfrentado pelos pelo-tões de fronteira não é apenas isolamen-to e precariedade. não é somente querer ir ao cabeleireiro e não ter duas opções. ou então ter vontade de sair à noite, de melancia com coca-cola ou mesmo de um simples batom e não conseguir. existe um problema logístico grave: ali, não há atividade agropecuária de subsistência. a comunidade, que vela pela soberania do território, é completamente dependente dos grandes centros.

todas as alfaces, roupas e também os doces e brinquedos de larissa saem das grandes capitais amazônicas: manaus e Belém. o bife malpassado que o pelotão de Pacaraima preparou no almoço saiu, muito provavelmente, de algum polo pecuário do centro-sul – há pelo menos 3.000 km. Graças à distância e à dificulda-de de acesso, a chegada de suprimentos à fronteira brasileira é quase uma epopeia.

mas isso pode estar mudando. com o projeto “sargento agrário”, o exército brasileiro planeja transformar essa cul-tura e instaurar a produção agrícola e a criação de pequenos animais nos PeFs. o projeto se baseia no emprego de técnicos agrícolas formados pelas escolas técnicas

do estado do amazonas, contratando-os como sargentos temporários. assim, eles podem trabalhar na fronteira e auxiliar na implantação de uma cultura sustentável de subsistência nos pelotões.

em vez de depender da carne do su-deste ou das frutas do mercado de ma-naus, com esses sargentos agrários, os PeFs colhem a cenoura, a banana ou mes-mo o peribá da própria horta ou planta-ção. há também a criação de galinhas, pei-xes e porcos. além de garantir uma maior autonomia ao pelotão, o projeto ajuda a desafogar o transporte de suprimentos das grandes cidades.

Problema Culturalsegundo o general Bringel, do coman-

do militar da amazônia, “grande parte da população amazônica só planta mandioca. a alimentação básica é peixe e farinha de mandioca. Qualquer outra coisa é importa-da do centro-sul. É um problema cultural”. o projeto visa, portanto, reverter esse qua-dro e, a longo prazo, mudar a cultura da re-gião. e é aqui que mora o maior problema.

a maior parte dos PeFs fica próxima a comunidades indígenas. Por conta do isolamento, são tribos que muitas vezes não têm familiaridade com nossa socie-dade. Portanto, sua economia se baseia

exclusivamente no extrativismo florestal e na caça. antropólogos de plantão, se se-gurem na cadeira. o objetivo do “sargento agrário” é também levar a essas tribos vi-zinhas a prática agropecuária do pelotão.

De acordo com o próprio general, “os indígenas vão ver a gente comendo a car-ne do porco enquanto eles estão comendo mandioca. a gente não vai impor a prática a eles. mas vai chegar uma hora em que eles vão querer uma coisa diferente para comer. e vão começar a plantar e a criar pequenos animais”. Para muitos, isso ape-nas mostra que a prática colonial opressi-va ainda existe. É a colonização através da geração da necessidade.

Desde 2008, quando começou a ser implantado, o projeto gastou mais de r$ 4 milhões. larissa pode não estar fisi-camente próxima dos prazeres da cidade – aliás, o lugar que ela mais gosta é Boa Vista, simplesmente porque lá tem um pu-la-pula. mas agora seus pais criam porqui-nhos em Pacaraima, que já não é tão de-pendente do fornecimento de insumos. o pelotão, ainda, consegue gerar renda com o excedente de produção. a economia e a autonomia estão pouco a pouco aparecen-do na fronteira. mas é necessário cautela. Pois o impacto socio-cultural nas dezenas de tribos indígenas pode ser irreversível.

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