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VERBO jurídico ® ANDREIA VALADARES FERRA Admissibilidade de nova acusação por assistente

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VERBO jurídico ®

ANDREIA VALADARES FERRA

Admissibilidade de nova acusação por assistente

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VERBO jurídico Admissibilidade de nova acusação por assistente : 2

Admissibilidade de nova acusação por assistente

ANDREIA VALADARES FERRA

Decisão Instrutória Instância Central do Tribunal da Comarca de Santarém – Secção de Instrução Criminal Data: 30-10-2014

SUMÁRIO:

— Admissibilidade de nova acusação particular deduzida pelo assistente, após o Ministério Público decl a nulidade do processado. — Efeito do prazo processual preclusivo previsto no artigo 285.º, n.º 1 do C.P.P.

=DECISÃO INSTRUTÓRIA=

I – RELATÓRIO

1.1.- A Acusação

Iniciaram-se os presentes autos com a queixa apresentada por A…., contra B….,

imputando ao arguido a prática de factos suscetíveis de integrar, um crime de injúria agravada, p.

e p. pelos artigos 181.º, 183.º e 184.º, todos do Código Penal.

*

Realizadas as diligência probatórias tidas por relevantes, o Ministério Público proferiu

despacho, a fls. 170, onde considerou existirem indícios suficientes dos factos denunciados, os

quais podem integrar o crime de injúria, de natureza particular nos termos do artigo 181.º e 188.º

do Código Penal, tendo determinado a notificação do assistente A.... para querendo em dez dias

deduzir acusação particular, nos termos do disposto no artigo 285.º do Código de Processo

Penal.

Em 14.10.2013, a fls. 174 a 177, o assistente A.... deduziu acusação particular contra o

arguido B.... pela prática de um crime de injúria agravada, p. e p. pelos artigos 181.º, 183.º e 184.º,

todos do Código Penal.

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O Ministério Público, a fls. 183, profere despacho, onde aderindo aos fundamentos do

despacho proferido a fls. 170, acompanha a acusação particular deduzida pelo assistente.

Remetidos os autos à distribuição, foi rejeitada a acusação do assistente por ilegitimidade

para deduzir acusação por crime de natureza semi-pública, cuja legitimidade incumbe ao

Ministério Público, o que comporta a nulidade da mesma (fls. 194 e 195).

O Assistente (fls. 202) e Ministério Público (fls. 205) prescindiram do prazo de recurso

para impugnação do despacho de rejeição da acusação pelo Juiz, proferido a fls. 194 e 195.

Por despacho proferido em 07.01.2013, a fls. 205 e 206, o Ministério Público por entender

ter havido mero lapso por parte do assistente na invocação do artigo 184.º do Código Penal, e

apenas por um mero erro de forma o prosseguimento da acção penal foi afectado, pelo que

determinou a nulidade do processado desde a notificação para a acusação particular até à remessa

dos autos para distribuição, nos termos do disposto nos artigos 119.º, al. b) e 122.º, n.ºs 1 e 2,

ambos do C.P.P., renovando o despacho de fls. 170.

A fls. 218 a 222, o assistente A.... deduziu acusação particular contra o arguido B.... pela

prática de um crime de injúria agravada, p. e p. pelo artigo 181.º, do Código Penal.

*

1.2.- O requerimento de abertura de instrução

Inconformado o arguido requereu a abertura de instrução, alegando, como questão prévia

a inadmissibilidade da nova acusação particular deduzida pelo assistente, com a consequente

preclusão do prazo processual previsto no artigo 285.º, n.º 1 do C.P.P.

Alega ainda a insuficiência da prova produzida em inquérito, e à cautela requer a suspensão

provisória do processo.

Conclui pela prolação de despacho de arquivamento dos autos ou não pronúncia.

Requereu o Interrogatório de arguido e a inquirição de três testemunhas.

*

1.3.- Diligências instrutórias e debate instrutório

Foi declarada aberta a instrução e deferido Interrogatório do arguido e a inquirição das

três testemunhas arroladas pelo arguido no R.A.I.

No decurso do debate instrutório foi requerida como prova suplementar que se

tomassem declarações ao assistente, o que foi deferido.

*

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Não se afigurando necessária a realização de outras diligências complementares em sede

de instrução, teve lugar o debate instrutório, com observância do legal formalismo, conforme

resulta da respetiva ata.

*

II. Saneamento

O tribunal é competente.

*

Da Inadmissibilidade da nova acusação particular deduzida pelo assistente, com a

consequente preclusão do prazo processual previsto no artigo 285.º, n.º 1 do C.P.P.

Veio o arguido suscitar a inadmissibilidade da acusação particular ora apresentada pelo

assistente, com fundamento que foi expressamente notificado o assistente para deduzir acusação

particular pelo artigo 181.º do Código Penal, pois caso assim não fosse e se estivesse perante o

mesmo crime mas na forma agravada prevista no artigo 184.º do C.P., incumbiria ao M.P. deduzir

acusação, tendo ainda assim o assistente optado por deduzir acusação particular pela prática do

crime de injúria agravada, tendo sido esta acusação liminarmente rejeitada, nos termos do

disposto no artigo 311.º do C.P.P.

Alega não estar em causa, conforme defendido pelo M.P. e assistente, um simples erro

de forma, nem tão pouco um mero lapso susceptível de sanação, dado que, a ser assim, nem

sequer haveria fundamento para o despacho de fls. 194 e 195 que rejeitou liminarmente a

mencionada acusação particular, encontrando-se ainda precludido o prazo a que alude o artigo

285.º do C.P.P, sob pena de o assistente poder deduzir acusação particular a todo o tempo, tendo

o M.P. procurado sanar os seus próprios lapsos, bem como os lapsos do assistente, a verdade é

que a nulidade da acusação particular oportunamente deduzida pelo assistente não tem a

virtualidade de fazer o inquérito recuar no tempo a um momento anterior à notificação do artigo

285.º do C.P.P.

Cumpre apreciar e decidir.

Não podemos de fazer referência, antes de mais, que tendo o Assistente desde o início

da sua queixa manifestado a sua qualificação jurídica dos factos como injúria agravada, p. e p.

pelos artigos 181.º, 183.º e 184.º, todos do Código Penal, que o M.P. aquando do encerramento

do inquérito não se tenha pronunciado sobre a natureza semi-pública do crime imputado pelo

assistente ao arguido, ao invés nada disse, procedendo à notificação ao assistente para querendo,

em dez dias, deduzir acusação particular, nos termos do disposto no artigo 285.º do Código de

Processo Penal.

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No entanto, e apesar da notificação do M.P., o assistente A.... deduziu acusação particular

contra o arguido B.... pela prática de um crime de injúria agravada, p. e p. pelos artigos 181.º,

183.º e 184.º, todos do Código Penal, crime para o qual não tinha legitimidade para deduzir

acusação, por se tratar de crime de natureza semi-pública.

Tendo ainda o Ministério Público, a fls. 183, acompanhado a acusação particular deduzida

pelo assistente por crime de natureza semi-pública, crime para o qual o assistente não tinha

legitimidade para deduzir acusação, mas sim o M.P.

Ora, se o assistente é notificado pelo Ministério Público, findo o inquérito, nos termos

e para os efeitos do disposto no artigo 285.º do Código de Processo Penal, apenas lhe é lícito

deduzir acusação por crime particular, e, caso o assistente entenda indiciar-se com suficiência a

prática pelo arguido de crime público ou semi-público, resta-lhe, tão-só, ou arguir, perante o

próprio agente do Ministério Público que ordenou a notificação, a omissão da acusação, por parte

deste, pelo crime público ou semi-público ou suscitar a intervenção do superior hierárquico do

aludido agente do Ministário Publico (artigo 278.º do C.P.P.) ou requerer a abertura da instrução

[artigos 278.º e 287.º, n.º 1, alínea c), ambos do C.P.P], o que não sucedeu no caso sub judice.

Acontece que: “Integra a nulidade insanável da alínea b) do artigo 119º do C.P.P. a adesão

posterior do Ministério Público à acusação deduzida pelo assistente relativa a crimes de natureza

pública ou semi-pública e fora do caso previsto no artº 284º, nº1, do mesmo diploma legal” – cfr.

Assento nº1/2000, in DR Série I-A, de 6/1/2000.

Isto porque, a ordem da sucessão das acusações do M.P. e do assistente é imperativa,

surgindo, no tocante aos crimes públicos e semi-públicos, a deste necessariamente na sequência

da acusação proferida por aquele e condicionada a esta (art.º 284º, nºs 1 e 2).

A subsequente adesão do M.P. à acusação do assistente não supre a nulidade decorrente

da omissão inicial da acusação pública, tal como a acusação do Ministério Público em crime

particular não sana a inexistência da acusação que deve ser formulada pelo assistente.

Acresce que a lei, ao contrário do que dispõe relativamente aos crimes particulares (artº

284º, nº 2, al. a), não prevê que a acusação pública possa limitar-se à adesão da acusação do

assistente (artº 285º, nº3).

Assim sendo, estaríamos perante a nulidade insanável da falta de promoção do processo

pelo Ministério Público (artº 119º, al. b) do CPP), que determina a invalidade do despacho de

encerramento do inquérito e dos subsequentes termos (artº122º, nº1 do CPP).

No entanto, “o C.P.P. estabelece uma regra de aproveitamenrto dos actos subsequentes que

não tenham um nexo de dependência lógica e valorativa com o acto nulo, (…) trata-se, afinal, de

operar a redução do acto nulo, salvando a parte do acto que se não mostre viciada” (neste sentido

Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do C.P.P, pg. 318, Universidade Católica Portuguesa,

Dez. 2007)

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É o que sucede no caso concreto.

Senão vejamos,

O despacho proferido pelo M.P., a fls. 205 e 206, determinou a nulidade do processado

desde a notificação para a acusação particular até à remessa dos autos para distribuição, nos

termos do disposto nos artigos 119.º, al. b) e 122.º, n.ºs 1 e 2, ambos do C.P.P., se bem que

acabou o M.P. com este despacho por sanar a nulidade por si cometida ao não se ter pronunciado

sobre o crime de natureza semi-pública, imputado pelo assistente ao arguido.

No entanto, já não poderá, em nosso entender, este despacho que determinou esta

nulidade ter o condão de afectar a acusação particular deduzida pelo assistente, bem como a sua

notificação nos termos do artigo 285.º do C.P.P, e respectivo prazo, uma vez que a notificação

efectuada encontra-se correctamente efectuada, porquanto o M.P. determinou a notificação do

assistente para querendo, em dez dias, deduzir acusação particular, nos termos do disposto no

artigo 285.º do Código de Processo Penal pelo crime de injúria, de natureza particular, nos

termos do artigo 181.º e 188.º do Código Penal, não estando esta notificação ferida de qualquer

nulidade ou viciada, tanto assim o foi que a nova notificação foi feita nos mesmos moldes.

Acrescido da circunstância, que a entender-se assim, sempre que o assistente se enganasse

na qualificação jurídica do crime na acusação particular, deduzindo a mesma por crime para o

qual não teria legitimidade, sendo a mesma necessariamente nula, poderia o Ministério Público

determinar a sua nulidade e conceder-lhe novo prazo para sanar a mesma, e proceder às

respectivas correcções e aperfeiçoamento, fazendo-se tábua rasa do prazo processualmente

previsto no artigo 285.º do C.P.P

Pois, não esqueçamos que por similitude, não podendo o juiz proferir despacho de

aperfeiçoamento de requerimento de abertura de instrução requerida pelo assistente quando não

contenha a narração dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena, por

legalmente inadmissível (cfr. Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 7/2005, de 4 de

Novembro (DR nº 212, I-Série A)), por maioria de razão não poderá o Ministério Público com

tal declaração de nulidade, alargar por via de tal despacho um prazo de caducidade para o exercício

de um direito (previsto no artigo 285.º do C.P.P), por tal claramente violar e contender com os

direitos de defesa do arguido, mormente o direito de saber que a sua situação processual ficará

estabilizada naquele hiato temporal.

O prazo estabelecido no artigo 285º, nº 1 do C.P.P. é um prazo peremptório, pelo que o

seu decurso faz extinguir o direito de praticar o acto.

Pelo que, sendo a notificação efectuada ao assistente, em 30.09.2013 (cfr. fls. 171 e 172)

válida, não padecendo de qualquer vício e/ou nulidade, não restam quaisquer dúvidas que a

acusação particular por si deduzida contra o ora arguido, em 20.01.2014 (a fls. 212 a 216) é

manifestamente extemporânea, por há muito se ter ultrapassado o prazo peremptório

expressamente previsto no artigo 285.º do C.P.P.

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Ora, a dedução de acusação particular fora do prazo legal previsto no artigo 285.º do

C.P.P. tem um efeito processual preclusivo, que impede o exercício do direito que o assistente

pretende agora exercer nos presentes autos.

Na verdade, o legislador propositadamente omitiu uma disposição que permitisse a

repropusitura da acção penal pelos factos (neste sentido vide Paulo Pinto de Albuquerque,

Comentário do CPP, 3ª edição, Universidade Católica Editora, p. 205 e 747).

Pelo exposto, declaro extinto o procedimento criminal pelos factos imputados pelo

assistente ao arguido.

*

Custas pelo assistente, fixando-se a taxa de justiça pelo seu mínimo legal.

Registe em livro próprio na secção.

Notifique.

*

(decisão processada em computador e revista pela signatária, e redigida de acordo com a antiga grafia art.º 94º, nº 2, do C.P.P.)

A Juíza de Direito,

(Andreia Valadares Ferra)

ANDREIA VALADARES FERRA Portal Verbo Jurídico | 02-2015