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Informativo 573-STJ (12/11 a 25/11/2015) Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Márcio André Lopes Cavalcante ÍNDICE DIREITO CONSTITUCIONAL DEFENSORIA PÚBLICA Legitimidade da Defensoria para propor ACP em defesa de juridicamente necessitados. DIREITO CIVIL RESPONSABILIDADE CIVIL Responsabilidade civil dos genitores pelos danos causados por filho esquizofrênico. COMPRA E VENDA Venda com reserva de domínio e proteção possessória requerida por vendedor. CONTRATO DE SEGURO Cobertura securitária em caso de perda total do bem. CONTRATO DE TRANSPORTE Valor de indenização pelo extravio de mercadorias em transporte aéreo. ARRENDAMENTO MERCANTIL (LEASING) Purgação da mora em contrato de arrendamento mercantil de veículo automotor. CONDOMÍNIO Aplicação de multas sancionatória e moratória por inadimplência condominial contumaz. Cobrança de cota condominial proposta apenas contra o promitente comprador e impossibilidade de penhora do imóvel. ALIMENTOS Execução de alimentos e impossibilidade de efetuar o pagamento das prestações. SUCESSÃO DO CÔNJUGE Discussão de culpa no direito sucessório e ônus da prova. INVENTÁRIO Anulação de doação-partilha não deve ser pedida em processo de inventário. DIREITO DO CONSUMIDOR RESPONSABILIDADE CIVIL Direito à reparação de danos por vício do produto. PUBLICIDADE ENGANOSA Publicidade enganosa por omissão.

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Informativo 573-STJ (12/11 a 25/11/2015) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Márcio André Lopes Cavalcante

ÍNDICE DIREITO CONSTITUCIONAL

DEFENSORIA PÚBLICA Legitimidade da Defensoria para propor ACP em defesa de juridicamente necessitados.

DIREITO CIVIL

RESPONSABILIDADE CIVIL Responsabilidade civil dos genitores pelos danos causados por filho esquizofrênico. COMPRA E VENDA Venda com reserva de domínio e proteção possessória requerida por vendedor. CONTRATO DE SEGURO Cobertura securitária em caso de perda total do bem. CONTRATO DE TRANSPORTE Valor de indenização pelo extravio de mercadorias em transporte aéreo. ARRENDAMENTO MERCANTIL (LEASING) Purgação da mora em contrato de arrendamento mercantil de veículo automotor. CONDOMÍNIO Aplicação de multas sancionatória e moratória por inadimplência condominial contumaz. Cobrança de cota condominial proposta apenas contra o promitente comprador e impossibilidade de penhora do

imóvel. ALIMENTOS Execução de alimentos e impossibilidade de efetuar o pagamento das prestações. SUCESSÃO DO CÔNJUGE Discussão de culpa no direito sucessório e ônus da prova. INVENTÁRIO Anulação de doação-partilha não deve ser pedida em processo de inventário.

DIREITO DO CONSUMIDOR

RESPONSABILIDADE CIVIL Direito à reparação de danos por vício do produto. PUBLICIDADE ENGANOSA Publicidade enganosa por omissão.

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DIREITO EMPRESARIAL

FACTORING Factoring e desnecessidade de notificação de emitente de título de crédito.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

CITAÇÃO Falta de citação e manifestação do réu em agravo de instrumento. RECURSOS Perda do objeto de agravo de instrumento interposto contra decisão de antecipação de tutela. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA Impugnação ao cumprimento de sentença e necessidade de garantia do juízo. PROCESSO COLETIVO Legitimidade da Defensoria para propor ACP em defesa de juridicamente necessitados.

DIREITO PENAL

DOSIMETRIA DA PENA Exclusão de circunstância judicial reconhecida na sentença deve gerar diminuição da pena. CRIME CONTINUADO Impossibilidade de aplicação concomitante da continuidade delitiva comum e específica

DIREITO PROCESSUAL PENAL

TRIBUNAL DO JÚRI Como fica a ordem dos quesitos se o réu alegou legítima defesa e desclassificação.

DIREITO TRIBUTÁRIO

IMPOSTO DE RENDA Incide imposto de renda sobre o adicional de 1/3 (um terço) de férias gozadas. ISS Incidência de ISS sobre montagem de pneus.

DIREITO PREVIDENCIÁRIO

PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR Tutela antecipada e devolução de benefício previdenciário complementar.

DIREITO CONSTITUCIONAL

DEFENSORIA PÚBLICA Legitimidade da Defensoria para propor ACP em defesa de juridicamente necessitados

Importante!!!

A Defensoria Pública tem legitimidade para propor ação civil pública em defesa de interesses individuais homogêneos de consumidores idosos que tiveram plano de saúde reajustado em razão da mudança de faixa etária, ainda que os titulares não sejam carentes de recursos econômicos.

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A atuação primordial da Defensoria Pública, sem dúvida, é a assistência jurídica e a defesa dos necessitados econômicos. Entretanto, também exerce suas atividades em auxílio a necessitados jurídicos, não necessariamente carentes de recursos econômicos.

A expressão "necessitados" prevista no art. 134, caput, da CF/88, que qualifica e orienta a atuação da Defensoria Pública, deve ser entendida, no campo da Ação Civil Pública, em sentido amplo. Assim, a Defensoria pode atuar tanto em favor dos carentes de recursos financeiros como também em prol do necessitado organizacional (que são os "hipervulneráveis").

STJ. Corte Especial. EREsp 1.192.577-RS, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 21/10/2015 (Info 573)

Veja comentários em Direito Processual Civil.

DIREITO ADMINISTRATIVO

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Improbidade administrativa e conduta direcionada a particular

Não ensejam o reconhecimento de ato de improbidade administrativa eventuais abusos perpetrados por agentes públicos durante abordagem policial, caso o ofendido pela conduta seja particular que não estava no exercício de função pública.

STJ. 1ª Turma. REsp 1.558.038-PE, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 27/10/2015 (Info 573).

Imagine a seguinte situação adaptada: Dois policiais rodoviários federais, durante uma blitz, abordaram um motorista de forma extremamente truculenta e desrespeitosa. O Ministério Público ajuizou ação de improbidade contra os policiais. A defesa alegou que não ficou caracterizado ato de improbidade, uma vez que este pressupõe, obrigatoriamente, uma lesão direta à própria Administração e não a terceiros, haja vista que o bem jurídico que se deseja proteger é a probidade na Administração Pública. No caso concreto, não teria havido lesão à Administração, mas apenas ao particular (motorista). O caso chegou até o STJ. Houve prática de ato de improbidade administrativa? NÃO. Não ensejam o reconhecimento de ato de improbidade administrativa eventuais abusos perpetrados por agentes públicos durante abordagem policial, caso o ofendido pela conduta seja um particular que não estava no exercício de função pública. O fato de a probidade ser atributo de toda atuação do agente público pode suscitar o equívoco interpretativo de que qualquer falta por ele praticada, por si só, representaria quebra desse atributo e, com isso, faria com que ele ficasse sujeito às sanções da Lei nº 8.429/92. Contudo, o conceito jurídico de ato de improbidade administrativa, por ser uma sanção, não pode ser um conceito elástico, isto é, não pode ser ampliado para abranger situações que não tenham sido contempladas expressamente pelo legislador. Dessa forma, considerando o conceito restrito de improbidade, vê-se que o referencial da Lei nº 8.429/92 é o ato do agente público frente à coisa pública a que foi chamado a administrar. Nas palavras do Min. Relator, "somente se classificam como atos de improbidade administrativa as condutas de Servidores Públicos que causam vilipêndio aos cofres públicos ou promovem o enriquecimento ilícito do próprio agente ou de terceiros, efeitos inocorrentes neste caso". Obs: além dos atos mencionados pelo Min. Relator, constitui também ato de improbidade administrativa a conduta do agente público que atenta contra os princípios da administração pública (art. 11 da Lei nº

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8.492/92). O ato acima exposto, na minha opinião, poderia ser enquadrado neste artigo. STJ, contudo, não se manifestou de forma expressa sobre esse ponto. Para fins de concurso, é importante guardar o precedente acima, que pode ser cobrado em uma prova, mas é possível que, no futuro, esse entendimento seja revisto. Abuso de autoridade Vale ressaltar, por fim, que, em tese, a conduta dos policiais poderia ser enquadrada, criminalmente, como abuso de autoridade previsto no art. 4º, "h", da Lei nº 4.898/65:

Art. 4º Constitui também abuso de autoridade: (...) h) o ato lesivo da honra ou do patrimônio de pessoa natural ou jurídica, quando praticado com abuso ou desvio de poder ou sem competência legal;

DIREITO CIVIL

RESPONSABILIDADE CIVIL Responsabilidade civil dos genitores pelos danos causados por filho esquizofrênico

Importante!!!

Os pais de portador de esquizofrenia paranoide que seja solteiro, maior de idade e more sozinho, têm responsabilidade civil pelos danos causados durante os recorrentes surtos agressivos de seu filho, no caso em que eles, plenamente cientes dessa situação, tenham sido omissos na adoção de quaisquer medidas com o propósito de evitar a repetição desses fatos, deixando de tomar qualquer atitude para interditá-lo ou mantê-lo sob sua guarda e companhia.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.101.324-RJ,Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 13/10/2015 (Info 573).

Imagine a seguinte situação hipotética: Luís, 36 anos, possui esquizofrenia e, em um dia de surto, agrediu fisicamente Paula (sua vizinha). Vale resaltar que Luís sofre deste distúrbio desde os 18 anos de idade, já tendo sido internado uma vez. A vítima ajuizou ação de indenização por danos materiais e morais contra sua mãe (Maria). A mãe de Luís contestou a ação argumentando que não poderia ser responsabilizada pelos atos do filho, considerando que ele é maior de idade e mora sozinho, não havendo como ela exercer qualquer controle sobre ele. A mãe de Luís pode ser responsabilizada civilmente pelos danos causados pelo filho? SIM. Os pais de portador de esquizofrenia paranoide que seja solteiro, maior de idade e more sozinho têm responsabilidade civil pelos danos causados durante os recorrentes surtos agressivos de seu filho, no caso em que eles, plenamente cientes dessa situação, tenham sido omissos na adoção de quaisquer medidas com o propósito de evitar a repetição desses fatos, deixando de tomar qualquer atitude para interditá-lo ou mantê-lo sob sua guarda e companhia. O STJ entendeu que, no caso analisado, caberia à genitora tomar cuidados para, ao menos, tentar evitar que seu filho, portador de esquizofrenia paranoide, cometesse agressões contra terceiros. Como não houve essa diligência por parte da mãe, o Tribunal entendeu que ficou caracterizada a sua flagrante omissão no cumprimento das suas obrigações como genitora, o que a obriga a indenizar os danos causados pelo seu filho. Veja alguns trechos da ementa do julgado:

(...) 4. "Exemplo de doença mental que se manifesta periodicamente no paciente é a esquizofrenia,

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conhecida como doença do 'espírito dividido' (denominação vinda do grego, e formada das palavras skizo, que significa divisão, e phrenos, com a tradução de espírito). Durante seus surtos, que podem durar um mês, o paciente é assaltado por delírios e alucinações, ouvindo vozes e vendo seres imaginários, sofrendo ideias de perseguição e possessões de espíritos estranhos. Sem dúvida, traz distúrbios mentais, o que enquadra a doença no rol das incapacitantes" (RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família. 9ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 916). 5. O art. 1.590 do CC/2002 estende ao incapaz - absoluta ou relativamente - as normas pertinentes à guarda dos filhos menores. Nesse enfoque, é importante destacar que a guarda representa mais que um direito dos pais em ter os filhos próximos. Revela-se, sobretudo, como um dever de cuidar, de vigiar e de proteger os filhos, em todos os sentidos, enquanto necessária tal proteção. 6. Consta do acórdão recorrido que o primeiro réu, apesar de maior, é portador de esquizofrenia paranoide, mora sozinho, tem surtos periódicos e agride transeuntes. Sua genitora (segunda ré), plenamente ciente da situação e omissa no cumprimento de suas obrigações em relação ao filho incapaz e na adoção de medidas com o propósito de evitar a repetição de tais fatos, deve ser responsabilizada civilmente pelos danos morais sofridos pela autora, decorrentes de lesões provocadas pelo deficiente. (...) (STJ. 4ª Turma. REsp 1101324/RJ, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 13/10/2015)

Estatuto da Pessoa com Deficiência Vale ressaltar que, com o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), que entrou em vigor após esse julgado, a pessoa com deficiência mental não é mais considerada nem absoluta nem relativamente incapaz. Mesmo assim, penso que a conclusão do acórdão permanece a mesma. Isso porque essa nova determinação da Lei nº 13.146/2015 teve como objetivo valorizar a dignidade da pessoa com deficiência e não visou, em nenhum momento, mitigar a responsabilidade dos pais dessas pessoas. Tanto isso é verdade que as pessoas com deficiência podem ainda ser submetidas à curatela caso a deficiência seja de tal forma grave a ponto de ela não ter condições de exercer pessoalmente os atos da vida civil.

COMPRA E VENDA Venda com reserva de domínio e proteção possessória requerida por vendedor

Ainda que sem prévia ou concomitante rescisão do contrato de compra e venda com reserva de domínio, o vendedor pode, ante o inadimplemento do comprador, pleitear a proteção possessória sobre o bem móvel objeto da avença.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.056.837-RN, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 3/11/2015 (Info 573).

O que é a compra e venda com reserva de domínio? Trata-se do contrato de compra e venda no qual existe uma cláusula prevendo que o comprador ficará desde logo na posse direta do bem, mas que ele só irá adquirir realmente o domínio (só se tornará dono) depois de pagar integralmente o preço. O vendedor transmite desde logo a posse, comprometendo-se a transferir o domínio tão logo o comprador pague a integralidade do preço. A venda com reserva de domínio (pactum reservati dominii) encontra-se disciplinada nos arts. 521 a 528 do Código Civil:

Art. 521. Na venda de coisa móvel, pode o vendedor reservar para si a propriedade, até que o preço esteja integralmente pago.

Exemplo A venda com reserva de domínio é normalmente utilizada pelas grandes lojas de departamento quando vendem a prazo eletrodomésticos de maior valor, como televisões, geladeiras, fogões etc.

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Bens móveis perfeitamente caracterizados Só pode ser objeto de venda com reserva de domínio a coisa móvel perfeitamente caracterizável.

Art. 523. Não pode ser objeto de venda com reserva de domínio a coisa insuscetível de caracterização perfeita, para estremá-la de outras congêneres. Na dúvida, decide-se a favor do terceiro adquirente de boa-fé.

Características A cláusula de reserva de domínio deve ser estipulada por escrito. Para valer contra terceiros, o contrato precisa ser registrado no domicílio do comprador (art. 522). A serventia competente para esse registro é o RTD (Registro de Títulos e Documentos). Se o bem vendido foi um automóvel, caberá a anotação do gravame no Certificado de Registro do Veículo (CRV), nos termos da Lei nº 11.882/2008:

Art. 6º Em operação de arrendamento mercantil ou qualquer outra modalidade de crédito ou financiamento a anotação da alienação fiduciária de veículo automotor no certificado de registro a que se refere a Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, produz plenos efeitos probatórios contra terceiros, dispensado qualquer outro registro público.

Apesar de a venda com reserva de domínio não ser o mesmo que alienação fiduciária, aplica-se aqui o mesmo raciocínio que inspirou a edição da súmula 92 do STJ:

Súmula 92-STJ: A terceiro de boa-fé não é oponível a alienação fiduciária não anotada no certificado de registro do veículo automotor.

Se a coisa perecer, quem sofre o prejuízo é o comprador (possuidor direto): Como vimos acima, tão logo o contrato é assinado, a posse direta do bem passa para o comprador. A titularidade do bem (propriedade) só será transferida após o pagamento integral. No entanto, mesmo sem ser ainda o dono, o comprador tem o dever de cuidar da coisa. Isso porque se ela perecer (estragar completamente) ou se deteriorar, quem irá sofrer com esse prejuízo será ele (possuidor direto).

Art. 524. A transferência de propriedade ao comprador dá-se no momento em que o preço esteja integralmente pago. Todavia, pelos riscos da coisa responde o comprador, a partir de quando lhe foi entregue.

Ex: se João compra uma TV em 12x com reserva de domínio e no terceiro mês o ladrão furta o bem, ele deverá pagar as nove prestações que faltam mesmo sem ficar com a coisa. Existe uma regra que diz o seguinte: "res perit domino" (a coisa perece para o dono), ou seja, se o bem pereceu, quem deve sofrer o prejuízo é o proprietário. O art. 524 acima analisado é uma exceção a essa regra. Na compra com reserva de domínio vigora a regra do "res perit emptoris" (a coisa perece para o comprador). Em caso de mora do comprador, o vendedor terá três opções: a) Ação executiva (execução do contrato) Ocorre quando o contrato assinado preenche os requisitos para ser considerado um título executivo extrajudicial, nos termos do art. 585, II, do CPC 1973 (art. 784, III, do CPC 2015). b) Ação de cobrança Se o contrato assinado não preenche os requisitos para ser considerado um título executivo, o vendedor poderá ajuizar ação cobrando as prestações vencidas e vincendas e o que mais for devido. Repare, portanto, que, em caso de atraso, ocorrerá o vencimento antecipado das parcelas futuras. Ex: eram 12 parcelas; depois da 4ª, o comprador tornou-se inadimplente; logo, todas as 8 restantes já são consideradas vencidas. Vale ressaltar que, se o vendedor conseguir receber esse valor pleiteado na ação, o bem objeto do negócio jurídico passa a pertencer ao comprador.

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c) Ação de reintegração de posse da coisa vendida (alguns autores defendem que seria uma ação de busca, apreensão e depósito, com base no art. 1.071 do CPC 1973, que não foi repetido no CPC 2015) Caso opte por pedir a reintegração de posse (ou busca e apreensão), mesmo depois de ter de volta o bem o vendedor poderá reter as prestações pagas até o necessário para cobrir a depreciação da coisa, as despesas feitas e o que mais de direito lhe for devido (art. 527). Em outras palavras, o vendedor poderá utilizar o valor já pago pelo comprador para cobrir seus prejuízos. Isso porque a coisa foi usada e já não vale o mesmo do que quando era nova. Além disso, o vendedor teve despesas com notificação extrajudicial etc. Se as prestações pagas pelo comprador forem maiores do que os gastos do vendedor, ele deverá devolver o excedente ao comprador. Se forem menores, ele poderá ajuizar ação de cobrança para pleitear o restante.

Vale ressaltar que se o vendedor quiser ajuizar a ação de reintegração de posse da coisa vendida, ele não precisará previamente pedir a rescisão do contrato, podendo propor desde logo a ação possessória. Nesse sentido, decidiu o STJ: Ainda que sem prévia ou concomitante rescisão do contrato de compra e venda com reserva de domínio, o vendedor pode, ante o inadimplemento do comprador, pleitear a proteção possessória sobre o bem móvel objeto da avença. STJ. 4ª Turma. REsp 1.056.837-RN, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 3/11/2015 (Info 573). Não há necessidade de ajuizamento preliminar de ação rescisória do contrato para a obtenção da retomada do bem porque não se trata, aqui, da análise do ius possessionis, mas sim do ius possidendi: Ius possessionis: é o direito de posse, ou seja, é o poder sobre a coisa e a possibilidade de sua defesa

por intermédio dos interditos (interdito proibitório, de manutenção da posse ou de reintegração de posse). Trata-se de conceito que se relaciona diretamente com a posse direta e indireta.

Ius possidendi: é o direito à posse decorrente do direito de propriedade, ou seja, é o próprio domínio. Em outras palavras, é o direito conferido ao titular de possuir o que é seu, independentemente de prévio ajuizamento de demanda objetivando rescindir o contrato de compra e venda, uma vez que, nos contratos com cláusula de reserva de domínio, a propriedade do bem, até o pagamento integral do preço, pertence ao vendedor, ou seja, não se consolida a transferência da propriedade ao comprador.

A ação de reintegração de posse aqui é baseada, como dito, no ius possidendi, ou seja, no direito do vendedor de exigir a posse pelo fato de ser o dono. Constituição do devedor em mora Quando o comprador atrasar o pagamento das prestações, o vendedor deverá constituí-lo em mora, o que poderá ser feito mediante protesto do título ou interpelação judicial (art. 525). Só após tomar essa providência é que o credor poderá ajuizar as ações acima explicadas.

Instituição financeira que paga o preço da coisa ao vendedor, subroga-se em seus direitos Algumas vezes pode acontecer de a loja vender parceladamente ao comprador e receber o dinheiro da venda à vista ou logo depois de uma instituição financeira. Isso é feito para que a loja tenha capital de giro e, obviamente, o banco irá cobrar do vendedor um valor por este adiantamento. Se essa situação se verificar, a instituição financeira irá se subrogar nos direitos do vendedor e, assim, se o comprador tornar-se inadimplente, ela poderá exercer os direitos e ações decorrentes do contrato como se fosse o vendedor. Vale ressaltar que, no momento da assinatura do contrato, o comprador deverá ser informado e concordar com essa operação.

Art. 528. Se o vendedor receber o pagamento à vista, ou, posteriormente, mediante financiamento de instituição do mercado de capitais, a esta caberá exercer os direitos e ações decorrentes do contrato, a benefício de qualquer outro. A operação financeira e a respectiva ciência do comprador constarão do registro do contrato.

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CONTRATO DE SEGURO Cobertura securitária em caso de perda total do bem

Ainda que o sinistro tenha ocasionado a perda total do bem, a indenização securitária deve ser calculada com base no prejuízo real suportado pelo segurado, sendo o valor previsto na apólice, salvo expressa disposição em contrário, mero teto indenizatório.

A indenização a ser recebida pelo segurado no caso de sinistro deve corresponder ao real prejuízo do interesse segurado. Há de ser apurado por perícia técnica o alcance do dano. O limite máximo é o da garantia fixada na apólice. Se os prejuízos forem menores do que o limite máximo fixado na apólice, o segurador só está obrigado a pagar por aquilo que realmente aconteceu.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.473.828-RJ, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 27/10/2015 (Info 573).

O que é o contrato de seguro? No contrato de seguro, “o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados” (art. 757 do CC). Em outras palavras, no contrato de seguro, uma pessoa física ou jurídica (chamada de “segurada”) paga uma quantia denominada de “prêmio” para que uma pessoa jurídica (“seguradora”) assuma determinado risco. Caso o risco se concretize (o que chamamos de “sinistro”), a seguradora deverá fornecer à segurada uma quantia previamente estipulada (indenização). Ex.: João celebra um contrato de seguro do seu veículo com a seguradora X e todos os meses paga R$ 100,00 como prêmio; se, por exemplo, o carro for roubado (sinistro), a seguradora deverá pagar R$ 30 mil a título de indenização para o segurado. Nomenclaturas utilizadas nos contratos de seguro Risco: é a possibilidade de ocorrer o sinistro. Ex.: risco de morte. Sinistro: o sinistro é o risco concretizado. Ex.: morte. Apólice (ou bilhete de seguro): é um documento emitido pela seguradora, no qual estão previstos os

riscos assumidos, o início e o fim de sua validade, o limite da garantia e o prêmio devido e, quando for o caso, o nome do segurado e o do beneficiário.

Prêmio: é a quantia paga pelo segurado para que o segurador assuma o risco. O prêmio deve ser pago depois de recebida a apólice. O valor do prêmio é fixado a partir de cálculos atuariais e o seu valor leva em consideração os riscos cobertos.

Indenização: é o valor pago pela seguradora caso o risco se concretize (sinistro). Feitas estas considerações, imagine a seguinte situação hipotética: O comerciante "XX" fez um seguro da sua loja. Na apólice do seguro estava previsto que a indenização máxima a ser paga seria de R$ 500 mil. Determinado dia, houve um incêndio que destruiu todo o imóvel e os produtos que ali estavam. Segundo o laudo do Corpo de Bombeiros, houve perda total. O comerciante cobrou da seguradora a indenização no valor de R$ 500 mil. A seguradora, por sua vez, aceitou pagar apenas R$ 300 mil, afirmando que isto é quanto valia a loja e os equipamentos ali existentes, conforme a perícia constatou. Este seria o prejuízo real suportado pelo segurado. Quem tem razão no caso concreto: o segurado ou a seguradora? A seguradora. Ainda que o sinistro tenha ocasionado a perda total do bem, a indenização securitária deve ser calculada com base no prejuízo real suportado pelo segurado, sendo o valor previsto na apólice, salvo expressa disposição em contrário, mero teto indenizatório. STJ. 4ª Turma. REsp 1.473.828-RJ, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 27/10/2015 (Info 573).

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Princípio indenitário O CC/2002 prevê, em seu art. 781, o chamado princípio indenitário, nos seguintes termos:

Art. 781. A indenização não pode ultrapassar o valor do interesse segurado no momento do sinistro, e, em hipótese alguma, o limite máximo da garantia fixado na apólice, salvo em caso de mora do segurador.

Esse dispositivo impõe, portanto, dois limites para a indenização a ser paga, que não pode ser superior:

ao valor do interesse segurado no momento do sinistro (dano efetivo suportado);

ao limite máximo da garantia prevista na apólice. Dessa forma, o total da indenização está, em regra, limitado ao valor do dano atual e efetivo sofrido (e não ao valor que foi segurado). Em outras palavras, deve-se pagar pelo prejuízo que a pessoa sofreu (limitado ao valor máximo previsto na apólice). Isso se justifica porque o contrato de seguro não deve ser causa de enriquecimento do segurado. O seu objetivo é apenas o de restabelecer a situação das coisas, em nível patrimonial, ao mesmo patamar que tinha antes do sinistro. Em suma, a indenização não pode ultrapassar o valor de mercado do bem no momento do sinistro. Veja o que diz a doutrina sobre o tema: "(...) a indenização a ser recebida pelo segurado, no caso da consumação do risco provocador do sinistro, deve corresponder ao real prejuízo do interesse segurado. Há de ser apurado por perícia técnica o alcance do dano. O limite máximo é o da garantia fixada na apólice. Se os prejuízos forem menores do que o limite máximo fixado na apólice, o segurador só está obrigado a pagar o que realmente aconteceu." (DELGADO, José Augusto. Comentários ao Novo Código Civil - Das Várias Espécies de Contrato. Do Seguro. TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. (Coord.). Volume XI. Tomo I. Rio de Janeiro: Forense. 2004, p. 456). Em suma: a indenização não pode ultrapassar o valor de mercado do bem no momento do sinistro. No caso concreto, conforme atestou a perícia, a loja, com todos os seus utensílios, valia R$ 300 mil. Logo, este é o valor que deve ser pago de indenização, ainda que a apólice previsse o montante máximo de R$ 500 mil.

CONTRATO DE TRANSPORTE Valor de indenização pelo extravio de mercadorias em transporte aéreo

Em caso de extravio de mercadoria no transporte internacional envolvendo consumidor, aplica-se a indenização tarifada previstas na Convenção de Varsóvia?

NÃO. Caracterizando-se como consumidor a parte lesada no contrato de transporte de mercadoria, não se aplica a indenização tarifada prevista na legislação do transporte aéreo nacional ou internacional. O que vale é o princípio da reparação integral, com base no CDC (STJ. 4ª Turma. AgRg no Ag 1409204/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 25/09/2012).

Em caso de extravio de mercadoria no transporte internacional envolvendo negócio empresarial (não consumidor final), aplica-se a indenização tarifada prevista na Convenção de Varsóvia?

SIM. 4ª Turma. REsp 1.162.649-SP, Rel. originário Min. Luis Felipe Salomão, Rel. para acórdão Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 13/5/2014 (Info 541).

NÃO. Deve ser aplicado o Código Civil. Assim, a indenização pelo extravio de mercadoria transportada por via aérea, prévia e devidamente declarada, com inequívoca ciência do transportador acerca de seu conteúdo, deve corresponder ao valor integral declarado, não se aplicando, por conseguinte, as limitações tarifadas prevista no Código Brasileiro de Aeronáutica e na Convenção de Varsóvia. Foi o que decidiu a 3ª Turma do STJ no REsp 1.289.629-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 20/10/2015 (Info 573).

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Imagine a seguinte situação hipotética: A empresa “MED” comprou dos EUA uma máquina que seria utilizada em suas atividades empresariais. A máquina foi despachada do estrangeiro para o Brasil por via aérea. No momento do envio, foi declarado à companhia aérea, por meio de um documento chamado "conhecimento aéreo", que se tratava de uma máquina "XX", cujo valor era "YY". Ocorre que a máquina enviada foi danificada durante o transporte. Diante disso, a “MED” ajuizou ação de indenização por danos materiais contra a companhia aérea que fazia o transporte do produto. A relação entre a “MED” e a companhia aérea é regida pelo CDC? Essa ação de indenização pode ser julgada tendo como base o CDC? NÃO. Na hipótese em foco, a mercadoria transportada destinava-se a ampliar e a melhorar a prestação do serviço da empresa “MED” e, por conseguinte, aumentar os lucros. Logo, ela não pode ser considerada consumidora já que não era a destinatária final do produto. Não é possível nem mesmo aplicar a teoria finalista mitigada para alargar o conceito de consumidor, uma vez que a empresa importadora (“MED”) não apresenta vulnerabilidade ou hipossuficiência, o que afasta a incidência das normas do CDC. Dessa forma, inexiste relação de consumo, circunstância que impede a aplicação das regras específicas do CDC. Contestação: tese da indenização tarifada (Convenção de Varsóvia) O custo do conserto da máquina foi de R$ 50 mil, sendo este o valor cobrado pela empresa. Na contestação, contudo, a companhia aérea alegou que, no transporte internacional, deve vigorar os limites de indenização impostos pela "Convenção de Varsóvia". A Convenção de Varsóvia é um tratado internacional, assinado pelo Brasil e promulgado por meio do Decreto nº 20.704/31 (posteriormente modificado com os Protocolos de Haia e de Montreal - Decreto nº 5.910/2006), e que prevê regras para o transporte aéreo internacional. Essa Convenção estipula valores máximos que o transportador aéreo poderá ser obrigado a pagar em caso de extravio de mercadorias (US$ 20,00 por kg de mercadoria). Ocorre que se for aplicada a Convenção de Varsóvia, a empresa somente irá receber R$ 20 mil. A indenização, em caso de extravio de mercadoria em transporte aéreo internacional, deverá seguir as regras da Convenção de Varsóvia?

1ª corrente: SIM. Incide a Convenção de Varsóvia e seus aditivos ao transporte aéreo internacional, que impõem a indenização tarifada para efeito de reparar os danos causados à mercadoria transportada. Afasta-se a indenização tarifada apenas quando efetuada declaração especial de valor mediante o pagamento de eventual taxa suplementar (Protocolo Adicional n. 4, art. 22, item 2, "b"). Nesse sentido: STJ. 4ª Turma. REsp 1.162.649-SP, Rel. originário Min. Luis Felipe Salomão, Rel. para acórdão Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 13/5/2014 (Info 541). É a posição tradicional do STJ. 2ª corrente: NÃO. A 3ª Turma do STJ entendeu pela absoluta inaplicabilidade da indenização tarifada prevista na Convenção de Varsóvia, inclusive nas hipóteses em que a relação jurídica estabelecida entre as partes não seja uma relação de consumo. A limitação tarifária contemplada pela Convenção de Varsóvia afronta o direito à reparação integral dos danos prevista pela CF/88 como um direito fundamental (art. 5º, V e X), bem como pelo Código Civil, em seu art. 994. Além disso, a limitação prévia e abstrata da indenização não atende ao princípio da proporcionalidade, já que desconsidera a gravidade e a repercussão dos danos injustamente percebidos pela vítima do evento. A limitação da indenização inserida pela Convenção de Varsóvia justificava-se pela necessidade havia na época (década de 1930) de se proteger as empresas de transporte aéreo que estavam começando a

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desenvolver suas atividades e que tinham grandes dificuldades uma vez que se tratava de um meio de transporte ainda muito arriscado. Essa realidade histórica não se verifica nos dias atuais, não sendo mais necessária essa proteção especial. Em virtude de tais argumentos, a 3ª Turma do STJ entendeu que não devem ser aplicadas as regras de limitação de indenização previstas na Convenção de Varsóvia. Não incidindo mais a Convenção de Varsóvia, aplica-se: a) o CDC, caso a relação jurídica seja de consumo; b) o Código Civil, na hipótese de ser uma relação de consumo. No caso do Código Civil, o art. 750 afirma que o transportador se responsabilizará pelos valores constantes no conhecimento de transporte, ou seja, pelos valores das mercadorias previamente declaradas pelo contratante ao transportador. Assim, a indenização pelo extravio de mercadoria transportada por via aérea, prévia e devidamente declarada, com inequívoca ciência do transportador acerca de seu conteúdo, deve corresponder ao valor integral declarado, não se aplicando, por conseguinte, as limitações tarifadas prevista no Código Brasileiro de Aeronáutica e na Convenção de Varsóvia. STJ. 3ª Turma. REsp 1.289.629-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 20/10/2015 (Info 573). E se, no caso concreto, houvesse uma relação de consumo? Em outras palavras, se o destinatário da mercadoria extraviada fosse consumidor? Neste caso, não há dúvidas no STJ de que deve ser aplicado o CDC (e não a Convenção de Varsóvia). Veja precedentes de ambas as turmas:

(...) É iterativa a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça no sentido de prevalência das normas do Código de Defesa do Consumidor, em detrimento das disposições insertas em Convenções Internacionais, como as Convenções de Montreal e de Varsóvia, aos casos de falha na prestação de serviços de transporte aéreo internacional, por verificar a existência da relação de consumo entre a empresa aérea e o passageiro, haja vista que a própria Constituição Federal de 1988 elevou a defesa do consumidor à esfera constitucional de nosso ordenamento. (...) (STJ. 4ª Turma. AgRg no AREsp 145.329/RJ, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 20/10/2015)

(...) A responsabilidade civil das companhias aéreas em decorrência da má prestação de serviços, após a entrada em vigor da Lei n. 8.078/90, não é mais regulada pela Convenção de Varsóvia e suas posteriores modificações (Convenção de Haia e Convenção de Montreal) ou pelo Código Brasileiro de Aeronáutica, subordinando-se, portanto, ao Código de Defesa do Consumidor. (...) (STJ. 3ª Turma. AgRg no AREsp 409.045/RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 26/05/2015)

Portanto, caracterizando-se como consumidora a parte lesada no contrato de transporte de mercadoria, não se aplica a indenização tarifada prevista na legislação do transporte aéreo nacional ou internacional. O que vale é o princípio da reparação integral, com base no CDC. Veja como o tema já foi cobrado em provas: (Juiz Federal TRF4 - banca própria) Conforme jurisprudência pacificada no âmbito do Superior Tribunal

de Justiça, a responsabilidade civil do transportador aéreo pelo extravio de bagagem ou de carga rege-se pelas normas especiais do Código Brasileiro de Aeronáutica e da Convenção de Varsóvia, afastando-se as normas do Código de Defesa do Consumidor – CDC. (ERRADO)

(Promotor MP/PI 2012 CESPE - adaptada) No que tange aos direitos do consumidor, segundo a jurisprudência do STJ, a responsabilidade civil das companhias aéreas por má prestação de serviços subordina-se ao CDC, e não à Convenção de Varsóvia. (CERTO)

(Juiz Federal TRF1 - XV concurso - prova oral) No contrato de transporte aéreo, deve ser aplicado o CDC, o Código Aeronáutico ou a Convenção de Varsóvia?

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Obs1: a Convenção de Varsósia prevê limites de indenização para os casos de transporte aéreo internacional; para as situações de transporte aéreo nacional (doméstico), a Lei nº 7.565/86 (Código Brasileiro de Aeronáutica) foi quem trouxe tais limites. Para a maioria da doutrina e jurisprudência, tais limites impostos pelo CBA não são mais válidos, devendo ser aplicado o CDC (para as relações consumeristas) ou o CC (para os casos não envolvendo consumidores). Resumindo: Em caso de extravio de mercadoria no transporte internacional envolvendo consumidor, aplica-se a indenização tarifada previstas na Convenção de Varsóvia? NÃO. Caracterizando-se como consumidor a parte lesada no contrato de transporte de mercadoria, não se aplica a indenização tarifada prevista na legislação do transporte aéreo nacional ou internacional. O que vale é o princípio da reparação integral, com base no CDC. STJ. 4ª Turma. AgRg no Ag 1409204/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 25/09/2012. Em caso de extravio de mercadoria no transporte internacional envolvendo negócio empresarial (não consumidor final), aplica-se a indenização tarifada prevista na Convenção de Varsóvia? • SIM. 4ª Turma. REsp 1.162.649-SP, Rel. originário Min. Luis Felipe Salomão, Rel. para acórdão Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 13/5/2014 (Info 541). • NÃO. Deve ser aplicado o Código Civil. Assim, a indenização pelo extravio de mercadoria transportada por via aérea, prévia e devidamente declarada, com inequívoca ciência do transportador acerca de seu conteúdo, deve corresponder ao valor integral declarado, não se aplicando, por conseguinte, as limitações tarifadas prevista no Código Brasileiro de Aeronáutica e na Convenção de Varsóvia. Foi o que decidiu a 3ª Turma do STJ no REsp 1.289.629-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 20/10/2015 (Info 573). Obs: o tema acima não deveria ser perguntado em uma prova objetiva; no entanto, caso o seja, penso que o candidato deverá responder que não se aplica a Convenção de Varsóvia (adotando-se o entendimento da 3ª Turma). Isso porque se trata de julgado posterior e que enfrentou de forma mais aprofundada o assunto.

ARRENDAMENTO MERCANTIL (LEASING) Purgação da mora em contrato de arrendamento mercantil de veículo automotor

Importante!!!

Em contrato de arrendamento mercantil de veículo automotor - com ou sem cláusula resolutiva expressa -, a purgação da mora realizada nos termos do art. 401, I, do CC deixou de ser possível somente a partir de 14/11/2014, data de vigência da Lei 13.043/2014, que incluiu o § 15º do art. 3º do Decreto-Lei 911/1969.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.381.832-PR, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 5/11/2015 (Info 573).

Conceito O arrendamento mercantil (também chamado de leasing) é uma espécie de contrato de locação, no qual o locatário tem a possibilidade de, ao final do prazo do ajuste, comprar o bem pagando uma quantia chamada de valor residual garantido (VRG). O arrendamento mercantil, segundo definição do parágrafo único do art. 1º da Lei nº 6.099/74, constitui "negócio jurídico realizado entre pessoa jurídica, na qualidade de arrendadora, e pessoa física ou jurídica, na qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo especificações da arrendatária e para uso próprio desta."

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Opções do arrendatário: Ao final do leasing, o arrendatário terá três opções: • renovar a locação, prorrogando o contrato; • não renovar a locação, encerrando o contrato; • pagar o valor residual e, com isso, comprar o bem alugado. Exemplo: “A” faz um contrato de leasing com a empresa “B” para arrendamento de um veículo 0km pelo prazo de 5 anos. Logo, “A” pagará todos os meses um valor a título de aluguel e poderá usar o carro. A principal diferença para uma locação comum é que “A”, ao final do prazo do contrato, poderá pagar o valor residual e ficar definitivamente com o automóvel.

Obs: é muito comum, na prática, que o contrato já estabeleça que o valor residual será diluído nas prestações do aluguel. Assim, o contrato prevê que o arrendatário já declara que deseja comprar o bem e, todos os meses, junto com o valor do aluguel, ele paga também o valor residual de forma parcelada. Como dito, isso é extremamente frequente, especialmente no caso de leasing financeiro. O STJ considera legítima essa prática? SIM. Trata-se de entendimento sumulado do STJ:

Súmula 293: A cobrança antecipada do valor residual garantido (VRG) não descaracteriza o contrato de arrendamento mercantil.

Modalidades de leasing: Existem três espécies de leasing:

Leasing FINANCEIRO

Leasing OPERACIONAL

Leasing DE RETORNO (Lease back)

Previsto no art. 5º da Resolução 2.309/96-BACEN

Previsto no art. 6º da Resolução 2.309/96-BACEN

Sem previsão na Resolução 2.309-BACEN

É a forma típica e clássica do leasing. Ocorre quando uma pessoa jurídica (arrendadora) compra o bem solicitado por uma pessoa física ou jurídica (arrendatária) para, então, alugá-lo à arrendatária.

Ocorre quando a arrendadora já é proprietária do bem e o aluga ao arrendatário, comprometendo-se também a prestar assistência técnica em relação ao maquinário.

Ocorre quando determinada pessoa, precisando se capitalizar, aliena seu bem à empresa de leasing, que arrenda de volta o bem ao antigo proprietário a fim de que ele continue utilizando a coisa. Em outras palavras, a pessoa vende seu bem e celebra um contrato de arrendamento com o comprador, continuando na posse direta.

Ex: determinada empresa (arrendatária) quer utilizar uma nova máquina em sua linha de produção, mas não tem recursos suficientes para realizar a aquisição. Por esse motivo, celebra contrato de leasing financeiro com um Banco (arrendador), que compra o bem e o arrenda para que a empresa utilize o maquinário.

Ex: a Boeing Capital Corporation® (arrendadora) celebra contrato de arrendamento para alugar cinco aeronaves à GOL® (arrendatária) a fim de que esta utilize os aviões em seus voos. A arrendadora também ficará responsável pela manutenção dos aviões.

Ex: em 2001, a Varig®, a fim de se recapitalizar, vendeu algumas aeronaves à Boeing® e os alugou de volta por meio de um contrato de lease back. O nome completo desse negócio jurídico, em inglês, é sale and lease back (venda e arrendamento de volta).

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Normalmente, a intenção da arrendatária é, ao final do contrato, exercer seu direito de compra do bem.

Normalmente, a intenção da arrendatária é, ao final do contrato, NÃO exercer seu direito de compra do bem.

Em geral é utilizado como uma forma de obtenção de capital de giro.

Imagine a seguinte situação: João adquiriu na concessionária “XX" um veículo 0km. Como não tinha condições de pagar o carro à vista, o consumidor, no ato da compra, dentro da própria concessionária, fez um financiamento (arrendamento mercantil, também chamado de leasing) com o Banco. João pagou uma parte à vista e comprometeu-se em quitar o restante do carro em 60 prestações mensais sucessivas. O contrato já estabelecia que o valor residual estava diluído nas prestações, de forma que, pagas todas as parcelas, já seria transferida a propriedade plena do bem para o adquirente. Ocorre que ele deixou de pagar a partir da 40ª prestação. O Banco enviou uma notificação extrajudicial para João que, mesmo assim, continuou inadimplente. Diante disso, a instituição financeira ajuizou ação de reintegração de posse. O juiz concedeu a liminar, determinando a devolução do carro arrendado para o Banco. Depois que viu que perdeu realmente o carro, João fez uma "cota" com parentes e conseguiu o dinheiro para pagar a dívida. Assim, ele depositou em juízo o valor das parcelas vencidas e dos consectários contratuais e judiciais e pediu a revogação da liminar e a restituição do veículo. Em outras palavras, o que João pediu foi a purgação da mora, ou seja, o pagamento das parcelas vencidas como forma de extinguir os efeitos da inadimplência (mora). O pedido de João é amparado pela legislação? É possível a purgação da mora nos contratos de arrendamento mercantil (leasing)?

Até a Lei nº 13.043/2014 (14/11/2014): SIM O STJ entendia que era possível a purgação da mora do devedor em contrato de arrendamento mercantil, a despeito da ausência de previsão na Lei nº 6.099/74, haja vista a regra geral do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor. A partir da Lei nº 13.043/2014 (14/11/2014): NÃO A Lei nº 6.099/74 dispõe sobre o tratamento tributário das operações de arrendamento mercantil, mas não trata, de forma detalhada, a respeito das regras e procedimentos aplicáveis nos casos de leasing. Pensando nisso, a Lei nº 13.043/2014 acrescentou o § 15 ao art. 3º do DL 911/69, afirmando que o procedimento adotado pelo DL 911/69 para o caso de inadimplemento do devedor na alienação fiduciária, inclusive o regramento sobre a ação de busca e apreensão, deveria ser também aplicado para o arrendamento mercantil. Assim, a partir da Lei nº 13.043/2014, os procedimentos previstos no art. 2º, caput e § 2º e no art. 3º do DL 911/69 (regras relacionadas com a alienação fiduciária) passaram a ser aplicados às operações de arrendamento mercantil (leasing). Ocorre que os §§ 1º e 2º do art. 3º do DL 911/69 não autorizam a purgação de mora, ou seja, não permitem que o devedor pague somente as prestações vencidas. Para que o devedor consiga ter o bem de volta, ele terá que pagar a integralidade da dívida, ou seja, tanto as parcelas vencidas quanto as vincendas (mais os encargos), no prazo de 5 dias após a execução da liminar. Em nosso exemplo, João teria que pagar todas as 20 parcelas restantes.

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CONDOMÍNIO Aplicação de multas sancionatória e moratória por inadimplência condominial contumaz

Importante!!!

Se o condômino descumpre reiteradamente o dever de contribuir para as despesas do condomínio (inciso I do art. 1.336 do CC), o condomínio poderá aplicar contra ele, além da multa moratória (§ 1º do art. 1.336 do CC), multa sancionatória em razão de comportamento "antissocial" ou "nocivo" (art. 1.337 do CC).

Assim, o condômino que deixar de adimplir reiteradamente a importância devida a título de cotas condominiais poderá, desde que aprovada a sanção em assembleia por deliberação de 3/4 (três quartos) dos condôminos, ser obrigado a pagar multa em até o quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade da falta e a sua reiteração.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.247.020-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 15/10/2015 (Info 573).

Despesas condominiais (Cota ou taxa condominial) Um dos deveres dos condôminos é o de pagar as despesas condominiais, que, na linguagem cotidiana, são chamadas de cotas ou taxas condominiais. Esse dever está previsto no art. 1.336 do CC:

Art. 1.336. São deveres do condômino: I - contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção;

Multa e juros no caso de inadimplência Se o condômino atrasar o pagamento da cota condominial, o condomínio poderá cobrar multa e juros de mora:

Art. 1.336 (...) § 1º O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito.

Juros de mora Multa moratória

Em regra, será de 1% ao mês. A convenção de condomínio poderá fixar taxa de juros inferior (o que é raro) ou superior (o que é possível segundo o STJ REsp 1002525/DF).

Em regra, será de 2% sobre o débito. A convenção de condomínio poderá fixar taxa de multa inferior. A convenção NÃO pode prever multa superior a 2%. Este é o limite máximo (teto).

Existem alguns condôminos, contudo, que frequentemente atrasam a taxa do condomínio. Neste caso, será possível que o condomínio tome alguma atitude para coibir essa prática? SIM. Se o condômino descumpre reiteradamente o dever de contribuir para as despesas do condomínio (inciso I do art. 1.336 do CC), o condomínio poderá aplicar contra ele, além da multa moratória (§ 1º do art. 1.336 do CC), multa sancionatória em razão de comportamento "antissocial" ou "nocivo" (art. 1.337 do CC). Assim, o condômino que deixar de adimplir reiteradamente a importância devida a título de cotas condominiais poderá, desde que aprovada a sanção em assembleia por deliberação de 3/4 (três quartos) dos condôminos, ser obrigado a pagar multa em até o quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade da falta e a sua reiteração. Veja o que diz o Código Civil:

Art. 1.337. O condômino, ou possuidor, que não cumpre reiteradamente com os seus deveres perante o condomínio poderá, por deliberação de três quartos dos condôminos restantes, ser constrangido a pagar multa correspondente até ao quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade das faltas e a reiteração, independentemente das perdas e danos que se apurem.

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Parágrafo único. O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento anti-social, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembléia.

O caput do art. 1.337 do CC inovou ao permitir a aplicação de "multa" de até o quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais (5x o valor da cota condominial), em face do condômino ou possuidor que não cumpra reiteradamente com os seus deveres com o condomínio, independente das perdas e danos que eventualmente venham a ser apurados. A doutrina afirma que o art. 1.337 do CC trata do chamado "condômino nocivo" ou "antissocial". Normalmente, os livros dão como exemplos o caso do condômino que pratica prostituição no imóvel, faz "jogo do bicho", promove brigas etc. É possível incluir o condômino que reiteradamente atrasa a cota condominial no conceito de "condômino nocivo" ou "antissocial"? SIM. Segundo o STJ, o "condômino nocivo" ou "antissocial" não é somente aquele que pratica atividades ilícitas, utiliza o imóvel para atividades de prostituição, promove a comercialização de drogas proibidas ou desrespeita constantemente o dever de silêncio, mas também aquele que deixa de contribuir de forma reiterada com o pagamento das despesas condominiais. O caput do art. 1.337 do CC utilizou uma redação aberta e previu, de forma genérica, que a multa poderá ser aplicada ao condômino "que não cumpre reiteradamente com os seus deveres perante o condomínio", sem fazer qualquer restrição ou óbice legal que impeça a aplicação ao devedor contumaz de débitos condominiais. Não haveria bis in idem ao se aplicar a multa do § 1º do art. 1.336 cumulativamente com a multa do art. 1.337? NÃO. Isso porque são multas com natureza e finalidade distintas. Multa do § 1º do art. 1.336: tem natureza jurídica moratória; Multa do art. 1.337: tem caráter sancionatório. Ademais, essa cumulação se justifica em função de um valor superior chamado de "solidariedade condominial", segundo a qual todos os condôminos devem cumprir seus deveres a fim de que seja garantida a continuidade e manutenção do próprio condomínio, impedindo que haja a ruptura da sua estabilidade econômico-financeira, o que provocaria dano considerável aos demais comunheiros. A atitude do condômino que reiteradamente deixa de contribuir com o pagamento das despesas condominiais viola os mais comezinhos deveres anexos da boa-fé objetiva, principalmente a cooperação e lealdade, devendo tal atitude ser rechaçada veementemente, já que coloca em risco a continuidade da propriedade condominial. Exige-se reiteração da conduta Importante esclarecer que a aplicação da sanção com base no art. 1.337, caput, do Código Civil exige que o condômino seja devedor reiterado e contumaz em relação ao pagamento dos débitos condominiais, não bastando o simples inadimplemento involuntário de alguns débitos. Direito de defesa Vale ressaltar que, para que o condomínio aplique essa multa, é necessário que garanta ao condômino direito ao contraditório e à ampla defesa. Assim, a sanção prevista para o comportamento antissocial reiterado de condômino não pode ser aplicada sem que antes lhe seja conferido o direito de defesa. STJ. 4ª Turma. REsp 1.365.279-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 25/8/2015 (Info 570).

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A doutrina especializada também possui o mesmo entendimento. Nesse sentido, confira a conclusão da I Jornada de Direito Civil do CJF:

Enunciado 92-CJF: Art. 1.337: As sanções do art. 1.337 do novo Código Civil não podem ser aplicadas sem que se garanta direito de defesa ao condômino nocivo.

CONDOMÍNIO Cobrança de cota condominial proposta apenas contra o promitente comprador e

impossibilidade de penhora do imóvel

Em ação de cobrança de cotas condominiais proposta somente contra o promissário comprador, não é possível a penhora do imóvel que gerou a dívida - de propriedade do promissário vendedor -, admitindo-se, no entanto, a constrição dos direitos aquisitivos decorrentes do compromisso de compra e venda.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.273.313-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 3/11/2015 (Info 573).

Imagine a seguinte situação hipotética: João celebrou um compromisso de compra e venda com Pedro. Por meio do contrato, Pedro (promitente vendedor) comprometeu-se a vender a João um apartamento no edifício “Jardim Feliz”. Em contrapartida, João obrigou-se a pagar o valor do imóvel parcelado. Ao final, sendo efetuado todo o pagamento, Pedro transferiria a propriedade do bem. Durante a vigência do contrato, João ficaria na posse do apartamento e lá já iria morar. João começou a morar no apartamento e, por conta de dificuldades financeiras, ficou inadimplente com as despesas condominiais. O condomínio ajuizou ação de cobrança das dívidas condominiais apenas contra João (promitente comprador). Na fase de cumprimento de sentença, será possível penhorar o apartamento para pagar a dívida? NÃO. Em ação de cobrança de cotas condominiais proposta somente contra o promissário comprador, não é possível a penhora do imóvel que gerou a dívida. Isso porque o imóvel ainda pertence ao promissário vendedor. A promessa de compra e venda de imóvel faz nascer para o promissário comprador o direito à aquisição do bem. A propriedade, no entanto, continua sendo do promitente vendedor. Ao promissário comprador cabe, após o pagamento total do preço, exigir a outorga da escritura definitiva. Somente a partir de então, com o registro deste título, é que passará o até então promissário comprador a ser o proprietário do bem. Assim, somente haverá a transferência da propriedade com o registro do título translativo no Registro de Imóveis (art. 1.245 do Código Civil). Enquanto não registrado, o alienante continuará a ser dono do imóvel. Admitir entendimento contrário significaria aceitar que bem de terceiro (proprietário) responda por dívida em processo no qual ele não figurou como parte, o que não é permitido pela legislação. O que o condomínio poderá fazer neste caso? Poderá pedir a penhora dos direitos aquisitivos decorrentes do compromisso de compra e venda. Em outras palavras, pode-se penhorar os direitos que o promitente comprador tenha em relação ao contrato de promessa de compra e venda. Penhorados esses direitos, é como se o condomínio assumisse o lugar do promitente comprador nas vantagens que decorrem do compromisso de compra e venda. Ex: se, por algum motivo, for desfeito o contrato de promessa de compra e venda, o promitente vendedor deverá devolver parte dos valores pagos pelo promitente comprador; neste caso, essa soma seria repassada ao condomínio para pagar a dívida (e não ao promitente comprador).

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E se a ação de cobrança tivesse sido proposta também contra o promitente vendedor, neste caso, seria possível a penhora do imóvel? SIM. Se o titular do direito de propriedade (promitente vendedor) figurar no polo passivo da demanda, será possível a penhora do imóvel, como garantia da dívida (STJ. 3ª Turma. REsp 1.442.840-PR, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 6/8/2015. Info 567).

ALIMENTOS Execução de alimentos e impossibilidade de efetuar o pagamento das prestações

Importante!!!

Em execução de alimentos pelo rito do art. 733 do CPC 1973 (art. 528 do CPC 2015), o acolhimento da justificativa da impossibilidade de efetuar o pagamento das prestações alimentícias executadas desautoriza a decretação da prisão do devedor, mas não acarreta a extinção da execução.

Se o juiz acolher a justificativa do executado, ele deverá intimar o credor para que ele informe se deseja: i) desistir da execução; ii) suspender a execução que foi proposta pelo rito do art. 733 do CPC 1973 (art. 528 do CPC 2015) aguardando para ver se a situação econômica do devedor se modifica; ou iii) mudar o rito da execução para o do art. 732 do CPC 1973 (art. 523 do CPC 2015), que não prevê prisão civil, mas apenas medidas patrimoniais, como a penhora e expropriação de bens.

Para que o devedor consiga por fim à obrigação alimentícia, deverá ajuizar ação de exoneração ou de revisão de alimentos.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.185.040-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 13/10/2015 (Info 573).

Imagine a seguinte situação hipotética: João paga mensalmente pensão alimentícia em favor de seu filho Lucas. Ocorre que, por estar enfrentando dificuldades financeiras, o pai atrasou os últimos pagamentos. Diante disso, Lucas ajuizou execução de alimentos sob o rito do art. 733 do CPC 1973 (art. 528 do CPC 2015) pedindo a prisão civil do devedor. O juiz mandou intimar o executado pessoalmente para, em 3 dias: a) pagar o débito; b) provar que o fez (provar que já pagou a dívida); ou c) justificar a impossibilidade de efetuá-lo (provar que não tem condições de pagar). João demonstrou que está com uma doença muito grave, razão pela qual não tem podido trabalhar, vivendo atualmente apenas de um benefício pago pelo INSS. Ademais, relatou que Lucas possui 25 anos e não estuda, razão pela qual não teria mais direito à pensão alimentícia. O magistrado, acolhendo a justificativa do devedor, negou a prisão civil. Ocorre que o juiz foi além e disse que estava demonstrado que não havia mais obrigação alimentar, razão pela qual extinguiu a execução. Agiu corretamente o magistrado ao extinguir a execução? Acolhida a justificativa do executado, deverá o juiz, além de afastar a prisão civil, extinguir a execução? NÃO. Em execução de alimentos pelo rito do art. 733 do CPC 1973 (art. 528 do CPC 2015), o acolhimento da justificativa da impossibilidade de efetuar o pagamento das prestações alimentícias executadas desautoriza a decretação da prisão do devedor, mas não acarreta a extinção da execução. Desse modo, o juiz agiu corretamente ao não decretar a prisão do executado, mas não podia ter extinguido a execução.

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O que o juiz deveria ter feito no caso? Deveria ter negado a prisão civil, porque realmente a justificativa apresentada era pertinente, e depois disso, deveria ter intimado o credor para que ele informasse se desejava: desistir da execução; suspender a execução que foi proposta pelo rito do art. 733 do CPC 1973 (art. 528 do CPC 2015)

aguardando para ver se a situação econômica do devedor se modifica; mudar o rito da execução para o do art. 732 do CPC 1973 (art. 523 do CPC 2015), que não prevê prisão civil,

mas apenas medidas patrimoniais, como a penhora e expropriação de bens.

Mas os argumentos do executado eram tão fortes... o que ele pode fazer para extinguir a obrigação? O devedor terá que ajuizar ação de exoneração ou de revisão de alimentos. Assim, esse tema terá que ser discutido em ação própria. Na doutrina, existe divergência sobre o tema, mas o entendimento do STJ acima exposto é defendido por Luiz Rodrigues Wambier:

"(...) Por isso, acatando a justificativa do devedor, o juiz não extingue o processo de execução, como nas circunstâncias anteriores, mas, consultado o credor, o transmuda em outro meio de execução, podendo, para tanto suspender o processo até que o devedor se encontre em uma das situações capazes de viabilizar a execução (obtenha emprego, com salário passível de desconto; venha a adquirir bens penhoráveis etc.). A justificativa do devedor não pode representar afronta à coisa julgada. Ainda que se admita certo grau de cognição com a justificativa (inclusive, se necessário, prova em audiência), a impossibilidade de pagar a prestação há de ser apenas a momentânea, não alcançando o título. Se o devedor está obrigado a prestar alimentos, apenas mediante ação revisional de alimentos poderá pleitear a sua exoneração ou redução. A justificativa, pois, somente significa a demonstração da impossibilidade ocasional de pagamento, e não a exoneração." (WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: execução. São Paulo: RT, 2012, p. 613)

INVENTÁRIO Anulação de doação-partilha não deve ser pedida em processo de inventário

Na hipótese em que o autor da herança tenha promovido em vida a partilha da integralidade de seus bens em favor de todos seus descendentes e herdeiros necessários, por meio de escrituras públicas de doação nas quais ficou consignado o consentimento de todos eles e, ainda, a dispensa de colação futura, a alegação de eventual prejuízo à legítima em decorrência da referida partilha deve ser pleiteada pela via anulatória apropriada, e não por meio de ação de inventário.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.523.552-PR, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 3/11/2015 (Info 573).

Noção geral sobre colação Quando uma pessoa morre, o Código Civil prevê diversas regras para que o patrimônio do falecido seja partilhado entre os seus herdeiros. Ex: se o falecido tiver deixado filhos: o cônjuge supérstite poderá ou não concorrer com eles na divisão da herança (teremos que analisar o regime de bens). Entre os filhos, por sua vez, não existe distinção, devendo cada um deles receber o mesmo quinhão. Ocorre que pode acontecer de o falecido, quando ainda era vivo, ter “doado” alguns de seus bens para os descentes ou para seu cônjuge/companheiro. Ex: João possuía dois apartamentos e três filhos; quando ainda estava vivo, João doou um apartamento para o filho 1 e outro para o filho 2, não doando nada para o filho 3.

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Na situação narrada no exemplo, repare que houve uma distribuição desigual do patrimônio. Assim, quando João morresse, sua esposa e o filho 3 ficariam, em tese, sem herança porque ele, ainda em vida, doou os bens para os outros filhos. O legislador entendeu que esse cenário não seria “justo” e, por isso, criou uma regra para proteger os herdeiros necessários contra doações que forem feitas durante a vida do falecido e que não invadirem a legítima sem respeitar a igualdade que deve existir entre os herdeiros necessários que concorrem entre si. Assim, em nosso exemplo, depois que João falecer, o CC impõe que os filhos 1 e 2 deverão “devolver” os apartamentos doados e estes imóveis, juntamente com o restante da herança deixada pelo morto, serão divididos entre os herdeiros na forma prevista pela lei. Conceito de colação Colação é... - o dever imposto pelo Código Civil - aos herdeiros necessários do falecido - no sentido de que, se eles receberam alguma doação do falecido quando este ainda era vivo, - serão obrigados a trazer de volta para o monte esses bens - a fim de que, reunido todo o patrimônio que pertencia ao morto, - ele seja partilhado entre os herdeiros na forma prevista na lei. Previsão no Código Civil A colação está disciplinada nos arts. 2.002 a 2.012 do CC. Feitas essas considerações, imagine a seguinte situação hipotética: João era um homem muito rico e, para evitar que houvesse disputas depois de sua morte, resolveu doar, por meio de escrituras públicas, ainda em vida, todos os seus bens para os herdeiros. Nas escrituras públicas constou a concordância de todos os herdeiros necessários acerca das doações que foram feitas, ficando expresso, ainda, que não haveria colação no futuro. Depois que João morreu, um dos filhos, o mais encrenqueiro de todos, ingressou com pedido na Justiça para abertura do inventário de seu falecido pai. Segundo alegou este filho, as doações que foram feitas pelo pai em vida não foram válidas, já que ele foi prejudicado porque ficou com os piores imóveis. Assim, pediu que fosse instaurado processo de inventário a fim de que se procedesse a colação de todos os bens doados com o objetivo de que se realizasse nova partilha entre os herdeiros. O juiz do inventário deve aceitar o pedido? NÃO.

Na hipótese em que o autor da herança tenha promovido em vida a partilha da integralidade de seus bens em favor de todos seus descendentes e herdeiros necessários, por meio de escrituras públicas de doação nas quais ficou consignado o consentimento de todos eles e, ainda, a dispensa de colação futura, a alegação de eventual prejuízo à legítima em decorrência da referida partilha deve ser pleiteada pela via anulatória apropriada, e não por meio de ação de inventário. STJ. 3ª Turma. REsp 1.523.552-PR, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 3/11/2015 (Info 573).

Inventário Inventário é o processo judicial instaurado com o objetivo de se apurar quais foram os bens deixados pelo falecido e, após isso, realizar a partilha entre os herdeiros. Consiste, portanto, na descrição pormenorizada dos bens da herança, tendente a possibilitar o recolhimento de tributos, o pagamento de credores e, por fim, a partilha.

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Doação-partilha No caso concreto, houve o que vulgarmente se denomina "doação-partilha", ou seja, a doação, para os herdeiros dos bens ainda em vida. Nesta situação, entende-se que não há doação propriamente dita, mas sim um inventário antecipado, em vida. Logo, não é cabível a colação. Se houve alguma ilegalidade ou se a partilha foi errada, ela deverá ser rescindida ou corrigida.

Não era cabível inventário, mas sim ação ordinária de anulação Diante disso, no caso concreto, o autor não tem interesse de agir para a abertura de inventário, já que este não teria qualquer utilidade. O eventual prejuízo à legítima do herdeiro necessário em decorrência de partilha em vida dos bens feita pelo pai falecido deve ser buscada pela via da ação anulatória (e não por meio de ação de inventário). Afinal, se não há bens a serem partilhados, não há a necessidade de processo do inventário.

SUCESSÃO DO CÔNJUGE Discussão de culpa no direito sucessório e ônus da prova

Importante!!!

Não tem nos livros!!!

Ocorrendo a morte de um dos cônjuges após dois anos da separação de fato do casal, é legalmente relevante, para fins sucessórios, a discussão da culpa do cônjuge sobrevivente pela ruptura da vida em comum, cabendo a ele o ônus de comprovar que a convivência do casal se tornara impossível sem a sua culpa.

Assim, em regra, o cônjuge separado há mais de dois anos não é herdeiro, salvo se ele (cônjuge sobrevivente) provar que não teve culpa pela separação.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.513.252-SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 3/11/2015 (Info 573).

Se a pessoa morrer e for casada, o cônjuge terá direito à herança? O cônjuge é herdeiro? SIM. O cônjuge é herdeiro necessário (art. 1.845 do CC). Exceção: O cônjuge não será herdeiro se, quando houve a morte, o casal estava separado há mais de dois anos, nos termos do art. 1.830 do CC:

Art. 1.830. Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente.

Resumindo: Regra 1: o cônjuge sobrevivente (viúvo/viúva) tem direito sucessório. Regra 2: o cônjuge sobrevivente (viúvo/viúva) não terá direito sucessório se, quando seu(ua) esposo(a)

morreu, eles estavam separados judicialmente ou divorciados. Regra 3: o cônjuge sobrevivente não terá direito sucessório se, quando seu(ua) esposo(a) morreu, eles

estavam separados de fato há mais de dois anos. Exceção à regra 3: o cônjuge sobrevivente, mesmo estando separado de fato há mais de dois anos no

momento da morte, continuará tendo direito sucessório se ele (cônjuge sobrevivente) não teve culpa pela separação de fato.

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O art. 1.830 do CC fala em "culpa" e a doutrina brasileira possui ojeriza (aversão) à culpa na relações familiares. Diante disso, indaga-se: esse dispositivo continua válido e sendo aplicável pela jurisprudência? SIM. Ocorrendo a morte de um dos cônjuges após dois anos da separação de fato do casal, é legalmente relevante, para fins sucessórios, a discussão da culpa do cônjuge sobrevivente pela ruptura da vida em comum. Assim, o STJ continua aplicando o art. 1.830 do CC, que permanece válido. Críticas da doutrina Como já dito, esse dispositivo é amplamente criticado pela doutrina brasileira, principalmente, no que diz respeito à possibilidade de discussão de culpa como requisito para se determinar a exclusão ou não do cônjuge sobrevivente da ordem de vocação hereditária.

Rolf Madaleno, por exemplo, em texto carregado de ironia, fala que o art. 1.830 institui a “culpa mortuária” ou "culpa funerária", ressaltando a dificuldade de produção da prova após o falecimento de um dos cônjuges, que poderá gerar longas e desgastantes discussões processuais (Rolf Madaleno, A concorrência sucessória e o trânsito processual: a culpa mortuária., In: Revista brasileira de direito de família, v. 7, n. 29, p. 144-151, abr./maio 2005).

Paulo Lôbo sustenta que a imputação da culpa do falecido pela separação de fato viola os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, impedindo que o falecido possa contraditar a acusação de culpa (Direito Civil: Sucessões. São Paulo: Saraiva, 2014).

Francisco José Cahali e Giselda Hironaka são também críticos da previsão e observam que a imputação de culpa para fins de direito sucessório representa verdadeiro retrocesso, principalmente diante da EC 66/2010, que trouxe a possibilidade da dissolução do casamento diretamente por divórcio sem observação de tempo mínimo de convivência ou discussão de culpa (CAHALI, Francisco José; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Direito das Sucessões. 5ª ed. São Paulo: RT, 2014).

Apesar disso, o STJ considerou que não há que se falar em ilegalidade ou impertinência da discussão da culpa no vigente direito sucessório, devendo ser mantida a aplicação do art. 1.830 do CC para os casos em que ele regular. Qual será o parâmetro utilizado pelo juiz para aferir a culpa de que trata o art. 1.830 do CC? O magistrado deverá utilizar como critérios os motivos elencados no art. 1.573 do CC, que caracterizam a impossibilidade da comunhão de vida:

Art. 1.573. Podem caracterizar a impossibilidade da comunhão de vida a ocorrência de algum dos seguintes motivos: I - adultério; II - tentativa de morte; III - sevícia ou injúria grave; IV - abandono voluntário do lar conjugal, durante um ano contínuo; V - condenação por crime infamante; VI - conduta desonrosa. Parágrafo único. O juiz poderá considerar outros fatos que tornem evidente a impossibilidade da vida em comum.

De quem é o ônus de provar a culpa mencionada no art. 1.830 do CC? O cônjuge sobrevivente é quem deverá provar que não teve culpa? Ou os demais herdeiros interessados (exs: filhos, irmãos etc.) na herança é que deverão provar que o falecido não teve culpa? O ônus da prova é do cônjuge sobrevivente. O cônjuge sobrevivente é que deverá provar que não teve culpa pela separação. Ele que terá que comprovar que a convivência se tornou impossível sem culpa sua. Se o cônjuge sobrevivente não conseguir provar isso, ele não terá direito à herança.

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Isso se justifica porque, conforme se verifica da ordem de vocação hereditária prevista no art. 1.829 do CC/2002, o cônjuge separado de fato é exceção à ordem de vocação. Assim, em regra, o cônjuge separado há mais de dois anos não é herdeiro, salvo se ele (cônjuge sobrevivente) provar que não teve culpa pela separação. Resumindo: Ocorrendo a morte de um dos cônjuges após dois anos da separação de fato do casal, é legalmente relevante, para fins sucessórios, a discussão da culpa do cônjuge sobrevivente pela ruptura da vida em comum, cabendo a ele o ônus de comprovar que a convivência do casal se tornara impossível sem a sua culpa. STJ. 4ª Turma. REsp 1.513.252-SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 3/11/2015 (Info 573).

DIREITO DO CONSUMIDOR

RESPONSABILIDADE CIVIL Direito à reparação de danos por vício do produto

Não tem direito à reparação de perdas e danos decorrentes do vício do produto o consumidor que, no prazo decadencial, não provocou o fornecedor para que este pudesse sanar o vício.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.520.500-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 27/10/2015 (Info 573).

Imagine a seguinte situação hipotética: João comprou um carro usado da revendedora "XX" Em março/2010, João descobriu que o veículo estava com um problema no ar condicionado e o levou para consertar na oficina "ZZ". Em novembro/2010, o consumidor ingressou com ação de indenização contra a revendedora "XX" cobrando o valor gasto com o conserto. O pedido terá êxito? NÃO. No caso concreto, houve decadência do direito do consumidor de reclamar o vício. Vamos entender com calma a situação: João, ao falar do problema de seu carro, sempre utiliza a expressão “defeito”. Para fins de direito do consumidor, trata-se realmente de “defeito”? NÃO. Juridicamente falando, segundo a concepção majoritária, o problema apresentado no carro de João classifica-se como “vício” e não “defeito”.

Vício Defeito

Vício é a inadequação do produto ou serviço para os fins a que se destina. Ex: Paulo compra um Playstation e ele não liga.

Defeito diz respeito à insegurança do produto ou serviço. Ex: Paulo compra um Playstation, ele liga o aparelho, começa a jogar e, de repente, o videogame esquenta muito e explode, ferindo-o.

O vício pode ser de duas subespécies: vício de qualidade ou de quantidade. No caso concreto, trata-se de um vício de qualidade do produto, previsto no art. 18 do CDC:

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Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

Qual é o prazo de que o consumidor dispõe para reclamar sobre a existência de vícios do produto ou serviço? Tais prazos estão previstos no art. 26 do CDC: se o serviço ou produto for considerado “NÃO DURÁVEL”: 30 dias; se o serviço ou produto for considerado “DURÁVEL”: 90 dias. Os prazos acima mencionados são prescricionais ou decadenciais? Decadenciais, tanto que o art. 26 do CDC fala em “caducar”, expressão utilizada para a decadência. A partir de quando são contados esses prazos? Se o vício for APARENTE (de fácil constatação): conta-se da data da entrega do produto ou do término

da execução do serviço. Se o vício for OCULTO: conta-se do momento em que ficar evidenciado o vício.

Vício aparente ou de fácil constatação é aquele que não exige do consumidor médio nenhum conhecimento especializado ou apreciação técnica (perícia), por decorrer de análise superficial do produto (simples visualização ou uso), cuja constatação é verificável de plano, a partir de um simples exame do bem ou serviço, por mera experimentação ou por “saltar aos olhos” ostensivamente sua inadequação (REsp 1.161.941-DF).

Resumindo:

PRAZOS DECADENCIAIS PARA RECLAMAR VÍCIOS DO PRODUTO OU SERVIÇO

Produto ou serviço Prazo Início da contagem

Não durável 30 dias Vício aparente: data da entrega do produto ou serviço. Vício oculto: momento em que evidenciado o vício. Durável 90 dias

Desse modo, o consumidor deveria ter reclamado com o fornecedor no prazo decadencial após o surgimento do vício. Como não o fez neste prazo, houve a decadência, não tendo ele direito à reparação pelos prejuízos sofridos.

Não tem direito à reparação de perdas e danos decorrentes do vício do produto o consumidor que, no prazo decadencial, não provocou o fornecedor para que este pudesse sanar o vício. STJ. 3ª Turma. REsp 1.520.500-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 27/10/2015 (Info 573).

PUBLICIDADE ENGANOSA Publicidade enganosa por omissão

É enganosa a publicidade televisiva que omite o preço e a forma de pagamento do produto, condicionando a obtenção dessas informações à realização de ligação telefônica tarifada.

STJ. 2ª Turma. REsp 1.428.801-RJ, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 27/10/2015 (Info 573).

Imagine a seguinte situação adaptada: Determinada empresa comercializava seus produtos por meio de um canal de TV fechada, que ficava 24h por dia apenas anunciando as mercadorias.

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Nos comerciais e programas dessa empresa eram mostrados os benefícios dos produtos, como funcionam, as coisas que podem ser feitas com ele etc. No entanto, o mais importante eles não informavam: o preço. Se o telespectador quisesse saber quanto custava o produto e as condições de pagamento, ele precisava ligar para um número telefônico pagando a tarifa pela ligação. Diante disso, um órgão de defesa do consumidor considerou que esta prática violaria o dever de informação do consumidor e ajuizou ação civil pública contra a empresa.

A publicidade desenvolvida pela empresa foi considerada adequada (correta)? NÃO. Houve publicidade enganosa. É enganosa a publicidade televisiva que omite o preço e a forma de pagamento do produto, condicionando a obtenção dessas informações à realização de ligação telefônica tarifada.

Dever de informar Ao tratar sobre a oferta nas práticas comerciais, o CDC, em seu art. 31, determina que os fornecedores têm o dever de informar, nos seguintes termos:

Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores. Parágrafo único. As informações de que trata este artigo, nos produtos refrigerados oferecidos ao consumidor, serão gravadas de forma indelével.

O dever de informar deve ocorrer em todas as fases da relação consumidor/fornecedor, mas especialmente em dois momentos: a) pré-contratual: trata-se da informação que antecede ou acompanha o produto ou serviço. Ex: publicidade na TV, rádio etc.; informações que constam no rótulo ou na embalagem etc.; e b) contratual: consiste na informação oferecida no instante da formalização do ato de consumo, ou seja, no momento da contratação. Publicidade enganosa por omissão É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva (art. 37, caput, do CDC). A publicidade enganosa pode ser de duas espécies: a) comissiva; ou b) omissiva. Publicidade enganosa por COMISSÃO: ocorre quando o fornecedor faz uma afirmação não verdadeira, parcial ou total, sobre o produto ou serviço, capaz de induzir o consumidor em erro (art. 37, § 1º, do CDC). Publicidade enganosa por OMISSÃO: ocorre quando a publicidade deixa de informar dado essencial do produto ou serviço, também induzindo o consumidor em erro por deixar de esclarecer elementos fundamentais (art. 37, § 3º, do CDC). O caso concreto é exemplo de publicidade enganosa por omissão, pois suprime informação essencial sobre o produto, a saber: o preço e a forma de pagamento, os quais somente serão conhecidos pelo consumidor mediante o ônus de uma ligação interestadual e tarifada, mesmo que a compra não venha a ser concretizada. Obviamente, pela via telefônica (interestadual e tarifada) e diante de um operador de telemarketing, o consumidor, que só então conheceu o preço e a forma de pagamento, sente-se mais pressionado a optar pela compra.

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DIREITO EMPRESARIAL

FACTORING Factoring e desnecessidade de notificação de emitente de título de crédito

É desnecessária a notificação de emitente de cheque com cláusula "à ordem", para que o faturizador que tenha recebido a cártula por meio de endosso possa cobrar o crédito decorrente de operação de factoring.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.236.701-MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 5/11/2015 (Info 573).

O que é a factoring? Factoring (ou faturização) é o contrato por meio do qual um empresário (faturizado) cede a uma instituição de factoring (faturizadora), total ou parcialmente, os títulos de créditos recebidos com a atividade empresária para que a factoring antecipe os pagamentos a prazo ou faça apenas a administração desses créditos. Personagens Faturizador: empresa de factoring. Faturizado: cliente. Atividades desempenhadas pela factoring Existem duas modalidades principais de factoring, que se diferenciam entre si pelas atividades desempenhadas pela instituição faturizadora. a) Factoring tradicional (conventional factoring): b) Factoring de vencimento (maturity factoring): O julgado acima trata sobre as atividades desenvolvidas pelas factoring tradicional. Factoring tradicional (conventional factoring) O empresário cede à factoring os títulos de crédito que recebeu em sua atividade empresária e que somente irão vencer em uma data futura, e a empresa de factoring antecipa esse pagamento, recebendo, como contraprestação, um percentual desses créditos. Trata-se de uma forma de o empresário obter capital de giro nas vendas a prazo. Ex.: uma loja recebe um cheque “pré-datado” (pós-datado) para 90 dias no valor de R$ 10 mil. Ocorre que a loja precisa de dinheiro logo. Então, ela cede o cheque para a empresa de factoring, que irá pagar à vista para a loja R$ 9.700,00 e, daqui a 90 dias, irá descontar o cheque, ficando com os R$ 10 mil. A loja recebeu o crédito à vista e teve que pagar um percentual à factoring. É como se o cliente tivesse “vendido” o título para a factoring, que irá cobrar do devedor no momento do vencimento da dívida. O contrato de conventional factoring é um contrato de mútuo? NÃO. Em verdade, consiste em uma compra e venda de créditos (direitos), por um preço ajustado entre as partes. Feitos os devidos esclarecimentos, imagine a seguinte situação: João efetuou uma compra na loja "XX" e pagou com uma cheque "pré-datado" (pós datado) para 90 dias. O cheque foi emitido com cláusula à ordem. A loja "XX", precisando de dinheiro, cedeu o cheque para a empresa de factoring por meio de endosso. No dia do vencimento, a empresa de factoring foi descontar o cheque, mas este não tinha fundos. Diante disso, a empresa levou o cheque à protesto. João afirmou que a cessão do cheque foi ineficaz porque, antes de ela ocorrer, a loja deveria tê-lo notificado, conforme exige o art. 290 do CC:

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Art. 290. A cessão do crédito não tem eficácia em relação ao devedor, senão quando a este notificada; mas por notificado se tem o devedor que, em escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.

A tese de João está correta? NÃO. É desnecessária a notificação de emitente de cheque com cláusula "à ordem", para que o faturizador que tenha recebido a cártula por meio de endosso possa cobrar o crédito decorrente de operação de factoring. Endosso transmite os direitos resultantes do cheque independentemente de prévia notificação O art. 20 da Lei do Cheque (Lei nº 7.357/85) estabelece que o endosso transmite todos os direitos resultantes do cheque. O art. 22, por sua vez, afirma que o detentor de cheque "à ordem" é considerado portador legitimado, se provar seu direito por uma série ininterrupta de endossos, mesmo que o último seja em branco. Assim, o cheque endossado confere ao endossatário os efeitos de cessão de crédito sem que seja necessário observar as formalidades do art. 290 do CC. Lei do Cheque prevalece em relação ao Código Civil O art. 290 do CC não se aplica para o caso de endosso de cheque. Isso porque a Lei do Cheque (Lei nº 7.357/85) é lei especial e, portanto, prevalece sobre a lei geral (Código Civil). Cláusula à ordem Cláusula à ordem: neste caso, para que haja transferência da titularidade do título, além da entrega do

documento, é necessário que haja o endosso. O título com cláusula à ordem se transfere mediante endosso. Ex: cheque ao portador. A doutrina afirma que existe uma presunção de que todos os títulos de crédito são à ordem. Em regra, para ser “não à ordem”, tal característica deve vir expressamente escrita na cártula.

Cláusula não à ordem: o título é transferido mediante cessão civil. Como já dito, para ser “não à ordem”, isto deve estar expresso.

Solução seria diferente se o emitente tivesse colocado "não à ordem" Se o emitente do cheque tivesse colocado na cártula "não à ordem", neste caso, o título (cheque) somente poderia ser transferido para a factoring por meio de cessão civil. Aí sim, seria aplicável o art. 290 do CC. Mas, como já explicado, a cláusula "não à ordem" só vale se estiver expressa. Se não tiver nada escrito, entende-se que o título foi emitido com cláusula "à ordem". Como não havia essa cláusula "não à ordem", o endosso já serve para transmitir todos os direitos resultantes do cheque, não sendo necessário que sejam observadas as formalidades da cessão ordinária civil de crédito, isto é, a notificação prevista no art. 290 do CC.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

CITAÇÃO Falta de citação e manifestação do réu em agravo de instrumento

Não supre a falta de citação em ação revisional de alimentos o comparecimento do réu para contraminutar agravo de instrumento contra decisão denegatória de tutela antecipada, sem que haja qualquer pronunciamento na ação principal por parte do demandado.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.310.704-MS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 10/11/2015 (Info 573).

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Imagine a seguinte situação hipotética: João Jr. ajuizou ação de revisão de alimentos contra seu pai João pedindo o aumento da pensão paga. O réu não foi localizado para ser citado. O juiz indeferiu a tutela antecipada, tendo sido interposto agravo de instrumento. No Tribunal de Justiça, o Desembargador Relator determinou a intimação do pai (agravado), tendo ele sido encontrado, apresentando, inclusive, contrarrazões. O TJ deu provimento ao agravo e, concedeu a tutela antecipada na instância recursal, aumentando o valor da pensão alimentícia. Em 1ª instância, o réu continuou sem participar dos atos do processo por não ter sido achado no momento da citação. Diante disso, o autor peticionou ao juiz pedindo que fosse decretada a sua revelia, com o consequente julgamento antecipado da lide. Segundo argumentou o autor, o réu teve ciência inequívoca da existência da ação revisional de alimentos, considerando que foi intimado nos autos do agravo de instrumento. Para o requerente, deve ser aplicado o raciocínio contido no art. 214, § 1º do CPC 1973 (art. 239, § 1º do CPC 2015), segundo o qual "o comparecimento espontâneo do réu ou do executado supre a falta ou a nulidade da citação". A tese do autor foi aceita pelo STJ? NÃO. Não supre a falta de citação em ação revisional de alimentos o comparecimento do réu para contraminutar agravo de instrumento contra decisão denegatória de tutela antecipada, sem que haja qualquer pronunciamento na ação principal por parte do demandado. A ação só produz efeitos para o réu a partir de quando é regularmente citado ou, na falta de citação, desde quando comparece espontaneamente em juízo. Se o réu de ação revisional de alimentos - a despeito de ter apresentado resposta em agravo de instrumento, tendo, portanto, tomado ciência da ação principal - não se pronuncia nos autos da ação revisional, resta ausente um dos elementos essenciais da citação: a oportunidade da parte de se manifestar. Desse modo, na hipótese em análise, não há como suprir a falta de citação, sob pena de violação dos princípios do contraditório e da ampla defesa.

RECURSOS Perda do objeto de agravo de instrumento interposto contra decisão de antecipação de tutela

A superveniência de sentença de mérito acarreta a perda do objeto do agravo de instrumento interposto contra decisão anteriormente proferida em tutela antecipada.

STJ. Corte Especial. EAREsp 488.188-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 7/10/2015 (Info 573).

Imagine a seguinte situação hipotética: João ajuizou ação contra Pedro e requereu uma tutela antecipada (no novo CPC: "tutela provisória"). Após ouvir a ré, o juiz proferiu uma decisão interlocutória denegando a tutela. Contra essa decisão, João interpôs agravo de instrumento para o Tribunal de Justiça. Enquanto o agravo ainda aguardava para ser julgado, o juiz prolatou a sentença resolvendo o mérito da lide. Diante disso, indaga-se: o agravo de instrumento ainda terá que ser julgado pelo TJ? NÃO. A superveniência de sentença de mérito acarreta a perda do objeto do agravo de instrumento interposto contra decisão anteriormente proferida em tutela antecipada.

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CUMPRIMENTO DE SENTENÇA Impugnação ao cumprimento de sentença e necessidade de garantia do juízo

Na fase de cumprimento de sentença, não é cabível a apresentação de impugnação fundada em excesso de execução (art. 475-L, V, do CPC 1973) antes do depósito da quantia devida (art. 475-J, caput, do CPC 1973); contudo, se mesmo assim ela for apresentada, não haverá preclusão da faculdade de apresentar nova impugnação a partir da intimação da penhora realizada nos autos (art. 475-J, §1º, do CPC 1973).

Com o CPC 2015, essa decisão perde relevância, já que não é mais necessária garantia do juízo para que o executado apresente impugnação.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.455.937-SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 3/11/2015 (Info 573).

Imagine a seguinte situação hipotética: “A” ajuíza uma ação de cobrança contra “B”. O juiz julga a sentença procedente, condenando “B” a pagar 1 milhão de reais a “A”. “B” perdeu o prazo para a apelação, de modo que ocorreu o trânsito em julgado.

O que acontece agora? “A” terá que ingressar com uma petição em juízo requerendo o cumprimento da sentença.

O início da fase de cumprimento da sentença pode ser feito de ofício pelo juiz? NÃO. O cumprimento da sentença que reconhece o dever de pagar quantia, provisório ou definitivo, só pode ser feito a requerimento do exequente (art. 513, § 1º do CPC 2015). Cabe ao credor o exercício de atos para o regular cumprimento da decisão condenatória, especialmente requerer ao juízo que dê ciência ao devedor sobre o montante apurado, consoante demonstrativo discriminado e atualizado do crédito (art. 524 do CPC 2015). Em outras palavras, o início da fase de cumprimento da sentença exige um requerimento do credor:

Art. 523. No caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exequente, sendo o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver.

A partir do requerimento do credor, o que faz o juiz? O juiz determina a intimação do devedor para pagar a quantia em um prazo máximo de 15 dias. Não ocorrendo pagamento voluntário neste prazo, o débito será acrescido de multa de 10% e, também, de honorários de advogado de 10% (art. 523, § 1º, do CPC 2015). Esse prazo de 15 dias, previsto no art. 523 do CPC 2015 (art. 475-J do CP 1973), é contado a partir de quando? Da intimação do devedor para pagar. Não basta que o devedor já tenha sido intimado anteriormente da sentença que o condenou. Para começar o prazo de 15 dias para pagamento, é necessária nova intimação. Assim, a multa de 10% depende de nova intimação prévia do devedor. A forma dessa intimação está prevista no art. 513 do CPC 2015:

Art. 513 (...) § 2º O devedor será intimado para cumprir a sentença: I - pelo Diário da Justiça, na pessoa de seu advogado constituído nos autos; II - por carta com aviso de recebimento, quando representado pela Defensoria Pública ou quando não tiver procurador constituído nos autos, ressalvada a hipótese do inciso IV; III - por meio eletrônico, quando, no caso do § 1º do art. 246, não tiver procurador constituído nos autos IV - por edital, quando, citado na forma do art. 256, tiver sido revel na fase de conhecimento. § 3º Na hipótese do § 2º, incisos II e III, considera-se realizada a intimação quando o devedor houver mudado de endereço sem prévia comunicação ao juízo, observado o disposto no parágrafo único do art. 274.

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§ 4º Se o requerimento a que alude o § 1º for formulado após 1 (um) ano do trânsito em julgado da sentença, a intimação será feita na pessoa do devedor, por meio de carta com aviso de recebimento encaminhada ao endereço constante dos autos, observado o disposto no parágrafo único do art. 274 e no § 3º deste artigo.

Essa multa de 10% pode ser aplicada em caso de execução provisória ou somente se houver trânsito em julgado? Este tema é muito importante porque houve alteração com o CPC 2015. Veja:

CPC 1973: somente na execução definitiva CPC 2015: execução definitiva ou provisória

A multa de 10% é própria da execução definitiva, de modo que deve ter havido o trânsito em julgado da sentença. A execução provisória de sentença não comporta a cominação da multa prevista no art. 475-J do CPC (STJ AgRg nos EDcl no REsp 1229705/PR).

A multa e os honorários a que se refere o § 1º do art. 523 são devidos também no cumprimento provisório da sentença condenatória ao pagamento de quantia certa. Trata-se de previsão expressa do novo CPC (art. 520, § 2º).

Se o devedor condenado é intimado para pagar e não efetua o pagamento no prazo de 15 dias, o que acontecerá em seguida? 1) o montante da condenação será automaticamente acrescido de multa de 10% + honorários de 10%; 2) será expedido mandado para que sejam penhorados e avaliados os bens do devedor para satisfação

do crédito. Neste momento, inicia-se a execução forçada do título diante do não cumprimento espontâneo.

Se for efetuado o pagamento apenas parcial, a multa e os honorários incidirão sobre o restante que faltou (art. 523, § 2º do CPC 2015). Na fase de cumprimento de sentença existe alguma forma de “defesa” do devedor? SIM. A defesa típica do devedor executado no cumprimento de sentença é a chamada impugnação. Quais as matérias que poderão ser alegadas na impugnação?

CPC 1973 CPC 2015

Art. 475-L. A impugnação somente poderá versar sobre: I — falta ou nulidade da citação, se o processo correu à revelia; II — inexigibilidade do título; III — penhora incorreta ou avaliação errônea; IV — ilegitimidade das partes; V — excesso de execução; VI — qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que superveniente à sentença.

Art. 525 (...) § 1º Na impugnação, o executado poderá alegar: I - falta ou nulidade da citação se, na fase de conhecimento, o processo correu à revelia; II - ilegitimidade de parte; III - inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação; IV - penhora incorreta ou avaliação errônea; V - excesso de execução ou cumulação indevida de execuções; VI - incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução; VII - qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que supervenientes à sentença.

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Importante. Para que o devedor apresente impugnação, é indispensável a garantia do juízo, ou seja, é necessário que haja penhora, depósito ou caução? CPC 1973: SIM. CPC 2015: NÃO. No novo CPC, a impugnação independe de prévia garantia do juízo. Qual é o prazo para a apresentação da impugnação? 15 dias. Importante: o CPC 2015 prevê expressamente que, se for mais de um executado (litisconsórcio) e eles tiverem diferentes procuradores, de escritórios de advocacia distintos, o prazo para impugnação será em dobro, ou seja, 30 dias (art. 525, § 3º). A partir de quando é contado o prazo para que o executado ofereça impugnação? CPC 1973: o prazo é contado da intimação do auto de penhora e avaliação (art. 475-J, § 1º). CPC 2015: o prazo de 15 dias para impugnação inicia-se imediatamente após acabar o prazo de 15 dias

que o executado tinha para fazer o pagamento voluntário (art. 525, caput). Não é necessária nova intimação. Acabou um prazo, começa o outro.

Art. 525. Transcorrido o prazo previsto no art. 523 sem o pagamento voluntário, inicia-se o prazo de 15 (quinze) dias para que o executado, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos próprios autos, sua impugnação.

Apresentação de impugnação sem garantia do juízo no CPC 1973: Na égide do CPC 1973, se a parte devedora apresentasse impugnação sem garantia do juízo, a impugnação não deveria ser conhecida, tendo em vista que, como já explicado, a garantia do juízo era requisito necessário à admissão da impugnação ao cumprimento de sentença no Código passado. Contudo, o STJ decidiu que, se o devedor propusesse essa impugnação mesmo assim, ela não seria conhecida, mas ele (executado) poderia, no futuro, caso houvesse penhora, apresentar de novo a impugnação porque agora sim estaria garantido o juízo. Veja, em resumo, o que decidiu o STJ: Na fase de cumprimento de sentença, não é cabível a apresentação de impugnação fundada em excesso de execução (art. 475-L, V, do CPC 1973) antes do depósito da quantia devida (art. 475-J, caput, do CPC 1973); contudo, se mesmo assim ela for apresentada, não haverá preclusão da faculdade de apresentar nova impugnação a partir da intimação da penhora realizada nos autos (art. 475-J, §1º, do CPC 1973). STJ. 3ª Turma. REsp 1.455.937-SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 3/11/2015 (Info 573). Com o CPC 2015, essa decisão perde relevância, já que, como vimos acima, não é mais necessária garantia do juízo para que o executado apresente impugnação.

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PROCESSO COLETIVO Legitimidade da Defensoria para propor ACP em defesa de juridicamente necessitados

Importante!!!

Atualize o Info 541-STJ

Atualize seu livro de 2014

A Defensoria Pública tem legitimidade para propor ação civil pública em defesa de interesses individuais homogêneos de consumidores idosos que tiveram plano de saúde reajustado em razão da mudança de faixa etária, ainda que os titulares não sejam carentes de recursos econômicos.

A atuação primordial da Defensoria Pública, sem dúvida, é a assistência jurídica e a defesa dos necessitados econômicos. Entretanto, também exerce suas atividades em auxílio a necessitados jurídicos, não necessariamente carentes de recursos econômicos.

A expressão "necessitados" prevista no art. 134, caput, da CF/88, que qualifica e orienta a atuação da Defensoria Pública, deve ser entendida, no campo da Ação Civil Pública, em sentido amplo. Assim, a Defensoria pode atuar tanto em favor dos carentes de recursos financeiros como também em prol do necessitado organizacional (que são os "hipervulneráveis").

STJ. Corte Especial. EREsp 1.192.577-RS, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 21/10/2015 (Info 573)

Imagine a seguinte situação hipotética: Determinado plano de saúde reajustou o valor das mensalidades para os usuários com idade superior a 60 anos (idosos). A Defensoria Pública ajuizou ação civil pública contra esse aumento. O juiz, contudo, decidiu que a Defensoria Pública não tinha legitimidade para o oferecimento da ação. Segundo o magistrado, ao optar por contratar plano particular de saúde, parece intuitivo que não se está diante de um consumidor que possa ser considerado necessitado, a ponto de ser patrocinado, de forma coletiva, pela Defensoria Pública. Assim, o grupo em questão não é apto a conferir legitimidade ativa adequada à Defensoria Pública, para fins de ajuizamento de ação civil. Houve recurso da Defensoria Pública alegando que o grupo por ela defendido na ação pode ser considerado necessitado sob o ponto de vista jurídico, de forma que justificaria a atuação do órgão. A Defensoria Pública tem legitimidade para, neste caso concreto, propor a ACP? SIM. A Defensoria Pública tem legitimidade para propor ação civil pública em defesa de interesses individuais homogêneos de consumidores idosos que tiveram plano de saúde reajustado em razão da mudança de faixa etária, ainda que os titulares não sejam carentes de recursos econômicos. Necessitados jurídicos A atuação primordial da Defensoria Pública, sem dúvida, é a assistência jurídica e a defesa dos necessitados econômicos. Entretanto, ela também exerce atividades de auxílio aos necessitados jurídicos, os quais não são, necessariamente, carentes de recursos econômicos. Isso ocorre, por exemplo, quando a Defensoria exerce as funções de curador especial (art. 9º, II, do CPC 1973 / art. 72, parágrafo único, do CPC 2015) e de defensor dativo (art. 265 do CPP). No caso, além do direito tutelado ser fundamental (direito à saúde), o grupo de consumidores potencialmente lesado é formado por idosos, cuja condição de vulnerabilidade já é reconhecida na própria CF/88 (art. 230). Expressão necessitados deve ser entendida em sentido amplo A expressão "necessitados" prevista no art. 134, caput, da CF/88, que qualifica e orienta a atuação da Defensoria Pública, deve ser entendida, no campo da Ação Civil Pública, em sentido amplo.

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Assim, a Defensoria Pública pode atuar tanto em favor dos carentes de recursos financeiros (necessitados em sentido estrito/pobres) como também em prol do necessitado organizacional, também chamados de "hipervulneráveis" (nomenclatura cunhada pelo Min. Herman Benjamin). Hipervulneráveis Hipervulneráveis é uma expressão que abrange determinadas classes de pessoas que, por conta de sua real debilidade perante abusos ou arbítrio dos detentores de poder econômico ou político, 'necessitem' da mão benevolente e solidarista do Estado para sua proteção, mesmo que contra o próprio Estado. Dentre eles se incluem:

indivíduos socialmente estigmatizados ou excluídos

crianças;

idosos;

pessoas com deficiência;

gerações futuras. Essa é a opinião também de Ada Pellegrini Grinover: "(...) Quando se pensa em assistência judiciária, logo se pensa na assistência aos necessitados, aos economicamente fracos, aos "minus habentes". E este, sem dúvida, o primeiro aspecto da assistência judiciária: o mais premente, talvez, mas não o único. Isso porque existem os que são necessitados no plano econômico, mas também existem os necessitados do ponto de vista organizacional. Ou seja, todos aqueles que são socialmente vulneráveis: os consumidores, os usuários de serviços públicos, os usuários de planos de saúde, os que queiram implementar ou contestar políticas públicas, como as atinentes à saúde, à moradia, ao saneamento básico, ao meio ambiente etc. (...) (Parecer sobre a legitimidade da Defensoria Pública para o ajuizamento de ação civil Pública. In: Revista da Defensoria Pública. Ano IV. São Paulo: Nº II. 2011. Disponível na internet em: <http:⁄⁄www.defensoria.sp.gov.br⁄dpesp⁄repositorio⁄20⁄RevistaDefensoria.pdf> fls. 154-156).

DIREITO PENAL

DOSIMETRIA DA PENA Exclusão de circunstância judicial reconhecida na sentença deve gerar diminuição da pena

Caso o Tribunal, na análise de apelação exclusiva da defesa, afaste uma das circunstâncias judiciais (art. 59 do CP) valoradas de maneira negativa na sentença, a pena base imposta ao réu deverá, como consectário lógico, ser reduzida, e não mantida inalterada.

STJ. 6ª Turma. HC 251.417-MG, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 3/11/2015 (Info 573).

Imagine a seguinte situação hipotética: João foi condenado pela prática do crime de roubo (art. 157, caput, do CP), tendo o juiz, na dosimetria da pena, considerado a existência de três circunstâncias judiciais negativas (art. 59, do CP), quais sejam, a culpabilidade, a personalidade e as circunstâncias do crime. Em razão disso, fixou a pena em 5 anos de reclusão. O réu interpôs apelação e o TJ, no acórdão, reconheceu a presença de apenas duas circunstâncias judiciais negativas (a culpabilidade e as circunstâncias do crime). Apesar disso, manteve a pena em 5 anos de reclusão, porque entendeu necessários e suficientes para a punição e prevenção do crime. Agiu corretamente o TJ?

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NÃO. Caso o Tribunal, na análise de apelação exclusiva da defesa, afaste uma das circunstâncias judiciais (art. 59 do CP) valoradas de maneira negativa na sentença, a pena base imposta ao réu deverá, como consectário lógico, ser reduzida, e não mantida inalterada. Se o Tribunal exclui, em apelo exclusivo da defesa, circunstância judicial do art. 59 do CP erroneamente valorada na sentença, deve, como consequência lógica, reduzir a pena imposta e não mantê-la inalterada, pois, do contrário, estará agravando o quantum atribuído anteriormente a cada uma das vetoriais. Ao manter a pena fixada mesmo reconhecendo que uma circunstância judicial não estava presente, o Tribunal acabou incidindo em reformatio in pejus porque piorou a situação do réu.

CRIME CONTINUADO Impossibilidade de aplicação concomitante da continuidade delitiva comum e específica

Se reconhecida a continuidade delitiva específica entre estupros praticados contra vítimas diferentes, deve ser aplicada exclusivamente a regra do art. 71, parágrafo único, do Código Penal, mesmo que, em relação a cada uma das vítimas, especificamente, também tenha ocorrido a prática de crime continuado.

STJ. 6ª Turma. REsp 1.471.651-MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 13/10/2015 (Info 573).

Conceito de crime continuado Crime continuado ocorre quando o agente: - por meio de duas ou mais condutas - pratica dois ou mais crimes da mesma espécie - e, analisando as condições de tempo, local, modo de execução e outras, - pode-se constatar que os demais crimes devem ser entendidos como mera continuação do primeiro. O crime continuado é uma ficção jurídica, inspirada em motivos de política criminal, idealizada com o objetivo de ajudar o réu. Ao invés de ele ser condenado pelos vários crimes, receberá a pena de somente um deles, com a incidência de um aumento previsto na lei. Exemplo Carlos era caixa de uma lanchonete e estava devendo 500 reais a um agiota. Ele decide então, tirar o dinheiro do caixa para pagar sua dívida. Ocorre que, se ele tirasse tudo de uma vez, o seu chefe iria perceber. Carlos resolve, portanto, subtrair 50 reais por dia. Assim, após 10 dias ele consegue retirar os 500 reais. Desse modo, Carlos, por meio de 10 condutas, praticou 10 furtos. Analisando as condições de tempo, local, modo de execução, pode-se constatar que os outros 9 furtos devem ser entendidos como mera continuação do primeiro, considerando que sua intenção era furtar todos os 500 reais. Em vez de Carlos ser condenado por 10 furtos, receberá somente a pena de um furto, com a incidência de um aumento de 1/6 a 2/3. Previsão legal

Art. 71. Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.

Requisitos Para o reconhecimento do crime continuado, são necessários quatro requisitos: 1) Pluralidade de condutas (prática de duas ou mais condutas subsequentes e autônomas);

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2) Pluralidade de crimes da mesma espécie (prática de dois ou mais crimes iguais); 3) Condições semelhantes de tempo, lugar, maneira de execução, entre outras; 4) Unidade de desígnio. Espécies de crime continuado: Existem três espécies de crime continuado: a) Crime continuado simples (comum) b) Crime continuado qualificado c) Crime continuado específico

SIMPLES (OU COMUM) QUALIFICADO ESPECÍFICO

Ocorre quando o agente pratica dois ou mais crimes que possuem a mesma pena.

Ocorre quando o agente pratica dois ou mais crimes que possuem penas diferentes.

Ocorre no caso de:

crimes dolosos

cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa

contra vítimas diferentes

Ex: três furtos simples consumados; dois furtos qualificados tentados.

Ex: dois furtos simples consumados e um tentado; um furto qualificado consumado e um tentado.

Ex: José segue duas mulheres que caminhavam juntas e pratica estupro consumado contra uma e estupro tentado contra a outra.

Como se calcula a pena: aplica-se a pena de um só dos crimes, exasperada (aumentada) de 1/6 a 2/3.

Como se calcula a pena: aplica-se a pena do crime mais grave, exasperada (aumentada) de 1/6 a 2/3.

Como se calcula a pena: aplica-se a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, e aumenta até o triplo (3x). Obs: apesar de não haver previsão legal, a jurisprudência entende que o aumento mínimo é de 1/6.

O critério para o aumento é exclusivamente o número de crimes praticados: 2 crimes – aumenta 1/6 3 crimes – aumenta 1/5 4 crimes – aumenta 1/4 5 crimes – aumenta 1/3 6 crimes – aumenta 1/2 7 ou mais – aumenta 2/3

O critério para o aumento é exclusivamente o número de crimes praticados: 2 crimes – aumenta 1/6 3 crimes – aumenta 1/5 4 crimes – aumenta 1/4 5 crimes – aumenta 1/3 6 crimes – aumenta 1/2 7 ou mais – aumenta 2/3

A exacerbação da pena deverá se nortear por critérios objetivos (número de infrações praticadas) e subjetivos (culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos e circunstâncias do crime). (STJ. 5ª Turma. HC 305.233/SP, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 27/10/2015)

É bom você ler com atenção a previsão legal do crime continuado específico:

Art. 71 (...) Parágrafo único. Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 deste Código.

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Feitos esses esclarecimentos, imagine a seguinte situação hipotética: No dia 10/02, João, mediante grave ameaça, praticou estupro de vulnerável (art. 217-A do CP) contra as adolescentes "A" e "B", suas vizinhas. Essa situação se repetiu durante mais três dias seguidos, até que a mãe das vítimas descobriu o ocorrido. Perceba que, em relação a cada uma das vítimas, houve crime continuado simples (art. 71, caput). Em outras palavras, João praticou quatro estupros contra "A" em continuidade delitiva e quatro estupros contra "B" em continuidade delitiva. O Ministério Público pediu que o magistrado calculasse assim a pena do réu: Primeiro, o juiz deveria aplicar o art. 71, caput (continuidade delitiva simples) para cada um dos crimes. Crime contra "A": pena do art. 217-A (8 anos ou mais, dependente das circunstâncias judiciais,

agravantes etc) aumentada de 1/4 (por causa do art. 71, caput) = 10 anos (8 anos + 1/4). Crime contra "B": pena do art. 217-A (8 anos ou mais, dependente das circunstâncias judiciais,

agravantes etc) aumentada de 1/4 (por causa do art. 71, caput) = 10 anos (8 anos + 1/4). Depois disso, o magistrado deveria pegar a pena de um dos crimes acima (porque idênticos) e sobre

ela aplicar a regra do parágrafo único do art. 71. Ex: 10 anos aumentada até o triplo. Imaginemos que o juiz entenda que deve aumentar em 1/5 a pena, com base no parágrafo único do

art. 71. Logo, a reprimenda final ficaria em 12 anos (10 + 1/5). Em suma, para essa tese, primeiro deve-se aplicar a continuidade delitiva simples e depois a

continuidade delitiva específica. A tese do MP foi aceita pela jurisprudência? NÃO. No caso, houve continuidade delitiva específica (crime continuado específico) entre os estupros praticados contra "A" e "B". Explicando melhor: os estupros praticados contra "A" e "B" amoldam-se à previsão do parágrafo único do art. 71 do CP. Logo, o juiz deverá aplicar apenas esse dispositivo para calcular a pena. Será feito da seguinte forma: calcula-se a pena de um dos crimes (porque são idênticos) e depois aumenta-se essa pena até o triplo. Ex: imagine que o juiz calcule que, não havendo circunstâncias judiciais desfavoráveis (1ª fase da dosimetria) nem agravantes (2ª fase), a pena do estupro deve ficar em 8 anos de reclusão. Então, em seguida, na 3ª fase, o magistrado deverá aplicar o parágrafo único do art. 71 do CP. No caso concreto, ele entendeu que deveria aumentar a pena em 1/5. Logo, a pena total do réu ficará em 9 anos, 7 meses e 6 dias (8 + 1/5). Em suma: Se reconhecida a continuidade delitiva específica entre estupros praticados contra vítimas diferentes, deve ser aplicada exclusivamente a regra do art. 71, parágrafo único, do Código Penal, mesmo que, em relação a cada uma das vítimas, especificamente, também tenha ocorrido a prática de crime continuado. A quantidade de infrações praticadas quanto a todas as vítimas deve ser avaliada de uma só vez, refletindo na fixação do patamar de aumento decorrente da incidência do crime continuado específico, em cuja estipulação também deverão ser observadas as demais circunstâncias mencionadas no art. 71, parágrafo único, do CP. Esse procedimento não faz com que a continuidade delitiva existente em relação a cada vítima específica deixe de ser considerada, mas apenas com que a sua valoração seja feita em conjunto, o que é possível porque os parâmetros mínimo e máximo de aumento previstos no art. 71, parágrafo único, são mais amplos do que aqueles estabelecidos no caput do mesmo artigo.

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DIREITO PROCESSUAL PENAL

TRIBUNAL DO JÚRI Como fica a ordem dos quesitos se o réu alegou legítima defesa e desclassificação

Importante!!!

A tese absolutória de legítima defesa, quando constituir a tese principal defensiva, deve ser quesitada ao Conselho de Sentença antes da tese subsidiária de desclassificação em razão da ausência de animus necandi.

Nos casos, no entanto, em que a tese principal for absolutória (ex: legítima defesa), o quesito de absolvição deve ser formulado antes que o de desclassificação (tese subsidiária). Isso se justifica com o objetivo de garantir a plenitude da defesa, já que a absolvição é mais vantajosa do que a mera desclassificação para outro crime menos grave.

STJ. 6ª Turma. REsp 1.509.504-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 27/10/2015 (Info 573).

VOTAÇÃO NO TRIBUNAL DO JÚRI Concluídos os debates Concluídos os debates entre acusação e defesa, o juiz-presidente do Júri (Juiz de Direito ou Juiz Federal) perguntará aos sete jurados se eles se sentem prontos para julgar ou se ainda precisam de mais algum esclarecimento sobre alguma questão de fato (§ 1º do art. 480 do CPP). Na prática, em 90% dos casos, os jurados respondem que estão habilitados para julgar, até porque não veem a hora de ir para casa. De qualquer forma, se houver dúvida sobre questão de fato, o juiz-presidente prestará esclarecimentos à vista dos autos, ou seja, com base no que tem no processo (§ 2º do art. 480). Os jurados, nesta fase do procedimento, podem ter acesso aos autos e aos instrumentos do crime se solicitarem ao magistrado (§ 3º). É importante o juiz ter especial cuidado com as perguntas que serão feitas pelos jurados, explicando previamente a eles que, ao expressarem sua dúvida, não poderão “adiantar” ou “sinalizar” como irão votar, sob pena de o Conselho de Sentença ter que ser dissolvido, prejudicando todo o dia de trabalho. Sala secreta Não havendo dúvida a ser esclarecida, o juiz, o membro do MP, o advogado, os sete jurados (Conselho de Sentença), o escrivão (diretor de secretaria) e o oficial de justiça irão se dirigir a uma “sala especial” para a votação dos quesitos (art. 485 do CPP). Essa sala especial é chamada, na prática forense, de “sala secreta”, porque é onde ocorrerá a votação. O júri normalmente acontece em um auditório e essa sala especial é um gabinete menor, que fica ao lado do auditório. Se na estrutura do fórum não houver uma sala que possa servir para esse fim, o juiz deverá pedir que todas as pessoas que estão no auditório se retirem e a votação é feita no próprio Plenário. Alguns magistrados permitem que, mesmo durante a votação secreta, estudantes de direito e outros advogados que estejam acompanhando a sessão permaneçam no recinto. Segundo a jurisprudência, essa prática é admitida, não havendo nulidade. Particularmente, contudo, penso que não é o ideal, porque alguns jurados ficam amedrontados e nervosos durante a votação e, por isso, quanto menos pessoas na sala, melhor. Quesitos A votação no Júri ocorre por meio de perguntas escritas que são feitas aos jurados. Essas perguntas são chamadas de “quesitos”. Os jurados respondem depositando em uma urna o papel escrito SIM ou NÃO para cada uma das indagações que são formuladas.

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Art. 482. O Conselho de Sentença será questionado sobre matéria de fato e se o acusado deve ser absolvido. Parágrafo único. Os quesitos serão redigidos em proposições afirmativas, simples e distintas, de modo que cada um deles possa ser respondido com suficiente clareza e necessária precisão. Na sua elaboração, o presidente levará em conta os termos da pronúncia ou das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação, do interrogatório e das alegações das partes.

Art. 483. Os quesitos serão formulados na seguinte ordem, indagando sobre: I — a materialidade do fato; II — a autoria ou participação; III — se o acusado deve ser absolvido; IV — se existe causa de diminuição de pena alegada pela defesa; V — se existe circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena reconhecidas na pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível a acusação.

COMO FICA A ORDEM DOS QUESITOS SE O RÉU ALEGOU LEGÍTIMA DEFESA E DESCLASSIFICAÇÃO Imagine a seguinte situação hipotética: João está sendo acusado de tentativa de homicídio. Levado a julgamento pelo Plenário do Tribunal do Júri, o advogado alegou duas teses em seu favor: legítima defesa e, subsidiariamente, desclassificação para lesões corporais dolosas, considerando que João não teria tido intenção de matar (animus necandi). Votação Concluídos os debates, o juiz, o membro do MP, o advogado e os sete jurados foram para a sala especial, tendo sido formulados os seguintes quesitos:

1º) Quesito sobre a materialidade do fato: “Em XX, por volta de XX horas, na Rua XX, bairro XX, nesta Comarca, a vítima foi atingida por disparos de arma de fogo, sofrendo as lesões descritas no laudo de fls. XX?” Por meio das cédulas, os jurados responderam SIM.

2º) Quesito sobre a autoria: “O acusado foi o autor dos disparos?" Os jurados igualmente responderam SIM a esse quesito.

3º) Quesito genérico da absolvição: “O jurado absolve o acusado?” Quanto a esse quesito, os jurados responderam SIM.

Havia ainda um quarto quesito tratando sobre a desclassificação do crime: “Assim agindo, o acusado deu inicio à execução de um crime de homicídio, que não se consumou por circunstancia alheia à sua vontade?” O juiz decidiu que este quesito não mais precisava ser formulado, considerando que ele ficou PREJUDICADO em razão de os jurados terem respondido SIM para o 3º quesito (absolvição).

Diante disso, o juiz encerrou a votação e prolatou sentença absolvendo o réu. Recurso do Ministério Público O Promotor de Justiça apelou contra a sentença alegando que houve nulidade na formulação dos quesitos. No recurso, sustentou-se que o juiz desrespeitou a ordem legal. Isso porque o quesito da desclassificação deveria ter sido formulado antes da pergunta sobre absolvição.

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Para o MP, o quesito sobre a desclassificação do delito deve ser formulado antes da pergunta se os jurados absolvem o acusado. Isso porque quando a defesa alega que o réu praticou lesão corporal dolosa (e não tentativa de homicídio), na verdade, ela está dizendo que o crime não é de competência do Tribunal do Júri. Logo, é preciso questionar o Conselho de Sentença sobre isso em primeiro plano, pois se está indagando acerca de sua própria competência. A tese do MP foi acolhida pelo STJ? NÃO. A tese absolutória de legítima defesa, quando constituir a tese principal defensiva, deve ser quesitada ao Conselho de Sentença antes da tese subsidiária de desclassificação em razão da ausência de animus necandi. Quesito sobre desclassificação pode ser formulado antes ou depois do quesito genérico de absolvição Pela leitura do § 4º do art. 483 do CPP pode-se concluir que o quesito sobre a desclassificação pode ser formulado antes ou depois do quesito genérico da absolvição. Veja:

Art. 483. Os quesitos serão formulados na seguinte ordem, indagando sobre: I – a materialidade do fato; II – a autoria ou participação; III – se o acusado deve ser absolvido; IV – se existe causa de diminuição de pena alegada pela defesa; V – se existe circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena reconhecidas na pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível a acusação. (...) § 4º Sustentada a desclassificação da infração para outra de competência do juiz singular, será formulado quesito a respeito, para ser respondido após o 2º (segundo) ou 3º (terceiro) quesito, conforme o caso.

Essa opção do legislador - no sentido de conferir certa flexibilidade à ordem do aludido quesito da desclassificação - ocorreu tendo em vista eventuais dificuldades que poderiam surgir em algumas situações. Se a tese principal é absolutória (ex: legítima defesa), o quesito de absolvição deve ser formulado antes que o de desclassificação (tese subsidiária) Realmente, há entendimento doutrinário no sentido de que a desclassificação, em regra, deve ser questionada antes do quesito genérico relativo à absolvição, justamente porque visa firmar a competência do Tribunal do Júri para decidir o delito doloso contra a vida. No entanto, o STJ afirmou que, no caso concreto, esse entendimento não deve ser adotado, considerando que a tese principal do réu era a legítima defesa (que é mais favorável do que a desclassificação). Dessa forma, em favor da "plenitude de defesa" no Tribunal do Júri, a tese principal deve ser formulada antes de eventuais teses subsidiárias sustentadas na defesa técnica ou na autodefesa. Sendo assim, considerando o fato de que o § 4º do art. 483 do CPP permite a formulação do quesito sobre a desclassificação antes ou depois do quesito genérico da absolvição, estando a defesa assentada em tese principal absolutória (legítima defesa) e tese subsidiária desclassificatória (ausência de animus necandi), a tese principal deve ser questionada antes da tese subsidiária, sob pena de causar enorme prejuízo para a defesa e evidente violação ao princípio da amplitude da defesa. Por isso, a tese de desclassificação, quando subsidiária, deve ser questionada somente após o quesito da absolvição.

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DIREITO TRIBUTÁRIO

IMPOSTO DE RENDA Incide imposto de renda sobre o adicional de 1/3 (um terço) de férias gozadas

Importante!!!

Incide imposto de renda sobre o adicional de 1/3 (um terço) de férias gozadas.

Essa verba tem natureza remuneratória (e não indenizatória) e configura acréscimo patrimonial.

STJ. 1ª Seção. REsp 1.459.779-MA, Rel. para acórdão Min. Benedito Gonçalves, julgado em 22/04/2015 (recurso repetitivo) (Info 573).

NATUREZA DO ADICIONAL DE 1/3 DE FÉRIAS Adicional de 1/3 sobre as férias gozadas O art. 7º, XVII, da CF/88 assegura aos trabalhadores o direito a férias anuais. No mês das férias, o trabalhador, além de ter direito ao descanso, receberá uma verba adicional correspondente a 1/3 a mais do seu salário normal. A isso chamamos de “terço constitucional de férias”, porque foi introduzido pela CF/88. Ex: João recebe o salário de R$ 900,00. Na época das férias, ele receberá, além do salário, R$ 300,00 (1/3) a mais.

Esse 1/3 sobre as férias gozadas é uma verba que tem natureza salarial ou indenizatória? Salarial (há polêmica, mas é o que prevalece atualmente). Esse benefício tem por finalidade conferir ao trabalhador um aumento da sua remuneração durante o período das férias, a fim de que ele possa desenvolver atividades diferentes das que exerce em seu cotidiano (exs: viajar, ir a um restaurante, à praia, ao shopping etc), no intuito de lhe garantir a oportunidade de ter momentos de lazer e prazer, necessários ao restabelecimento do seu equilíbrio físico e mental. Vale ressaltar, no entanto, que o recebimento das férias e do 1/3 a mais são verbas que decorrem normalmente da relação jurídica existente entre o trabalhador e o empregador. São verbas normais, ordinárias, previsíveis e que, portanto, tem a mesma natureza do salário. Nesse sentido, inclusive, o art. 148 da CLT afirma: "A remuneração das férias, ainda quando devida após a cessação do contrato de trabalho, terá natureza salarial, para os efeitos do art. 449". O fato de a verba não constituir ganho habitual (ser paga uma vez só por ano) e de ser destinada, em tese, ao desenvolvimento de atividades que minimizem os efeitos "do desgaste natural sofrido pelo trabalhador" não a transforma em indenização. Ao contrário, essa verba tem natureza salarial por ser um reforço, um acréscimo na remuneração em um período específico e fundamental para o trabalhador, que são as férias. Verbas indenizatórias, por outro lado, são aquelas que têm por objetivo recompor o patrimônio (material ou imaterial) daquele que sofreu uma lesão a algum direito. O 1/3 de férias não se enquadra neste conceito. IMPOSTO DE RENDA E 1/3 DE FÉRIAS Incide imposto de renda sobre o adicional do terço de férias gozadas? O trabalhador terá que pagar imposto de renda sobre essa quantia? SIM. Incide imposto de renda sobre o adicional de 1/3 de férias gozadas. STJ. 1ª Seção. REsp 1.459.779-MA, Rel. para acórdão Min. Benedito Gonçalves, julgado em 22/04/2015 (recurso repetitivo) (Info 573). O adicional do 1/3 de férias tem natureza remuneratória (e não indenizatória). Configura, assim, acréscimo patrimonial para o trabalhador que terá, então, que pagar o imposto de renda, nos termos do art. 43 do CTN:

Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica: I - de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;

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O art. 16 da Lei nº 4.506/64 dispõe que, para fins de imposto de renda, serão classificados como rendimentos do trabalho assalariado todas as espécies de remuneração por trabalho ou serviços prestados no exercício dos empregos, cargos ou funções, tais como: "I - Salários, ordenados, vencimentos, soldos, soldadas, vantagens [...]; II - Adicionais, extraordinários, suplementações, abonos, bonificações, gorjetas; III - Gratificações [...]", entre outros. Se a pessoa for mandada embora sem ter gozado as férias a que teria direito, o empregador deverá pagar uma indenização ao trabalhador. A isso chamamos de “férias indenizadas”. Incide imposto de renda sobre as férias indenizadas (vencidas ou proporcionais) e sobre o respectivo adicional de 1/3? NÃO. Súmula 386-STJ: São isentas de Imposto de Renda as indenizações de férias proporcionais e o respectivo adicional. Se o trabalhador, apesar de já ter adquirido o direito às férias, não vier a delas usufruir, aí neste caso a natureza da verba se transforma: ela deixa de ter caráter remuneratório e passa a ter natureza indenizatória. Isso porque o pagamento será feito para reparar (indenizar) o trabalhador pelo fato de ele ter sido impedido de exercer regularmente um direito. Por ser verba indenizatória, não incidirá imposto de renda. Nesse sentido:

(...) O pagamento feito pelo empregador a seu empregado, a título de adicional de 1/3 sobre férias tem natureza salarial, conforme previsto nos arts. 7º, XVII, da Constituição e 148 da CLT, sujeitando-se, como tal, à incidência de imposto de renda. Todavia, o pagamento a título de férias vencidas e não gozadas, bem como de férias proporcionais, convertidas em pecúnia, inclusive os respectivos acréscimos de 1/3, quando decorrente de rescisão do contrato de trabalho, está beneficiado por isenção (art. 39, XX do RIR, aprovado pelo Decreto 3.000/99 e art. 6º, V, da Lei 7.713/88). (...) (STJ. 1ª Turma. REsp 978.637/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 04/12/2008)

Em suma, não incide imposto de renda sobre os valores percebidos pelo empregado a título de férias indenizadas, em vista do seu caráter indenizatório (STJ. 2ª Turma. AgRg no REsp 1145562/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 22/06/2010). CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA E 1/3 DE FÉRIAS Não se deve confundir imposto de renda com contribuição previdenciária. A contribuição previdenciária é uma espécie de tributo cujo montante arrecadado é destinado ao pagamento dos benefícios do RGPS (aposentadoria, auxílio-doença, pensão por morte etc.). Incide contribuição previdenciária sobre o pagamento das férias e sobre o adicional de 1/3?

Férias gozadas: INCIDE

1/3 de férias gozadas: NÃO INCIDE

Férias indenizadas e 1/3: NÃO INCIDE STJ. 1ª Turma. AgRg no REsp 1.240.038-PR, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 8/4/2014 (Info 541). STJ. 1ª Seção. REsp 1.230.957-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 26/2/2014 (Info 536). QUADRO-COMPARATIVO

IMPOSTO DE RENDA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA

Férias gozadas incide Incide

1/3 de férias gozadas incide não incide

Férias indenizadas e 1/3 não incide não incide

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Por que incide imposto de renda sobre o 1/3 de férias gozadas, mas não incide contribuição previdenciária? O adicional de 1/3 de férias gozadas possui natureza remuneratória (salarial). Logo, é acréscimo patrimonial, devendo incidir imposto de renda. Contudo, não incidirá contribuição previdenciária porque essa verba adicional (1/3) não é incorporada para fins de aposentadoria. Em outras palavras, esse valor que o trabalhador recebe a mais uma vez por ano (adicional de 1/3) não será computado na sua aposentadoria. Logo, não há lógica em que ele pague contribuição previdenciária sobre uma verba que não servirá para seus proventos no futuro. O fundamento adotado diz respeito, portanto, ao caráter retributivo da contribuição previdenciária no cálculo do benefício. Esse argumento não interessa para fins de imposto de renda. Daí a distinção.

ISS Incidência de ISS sobre montagem de pneus

Incide ISS (e não ICMS) sobre o serviço de montagem de pneus, ainda que a sociedade empresária também forneça os pneus utilizados na montagem.

STJ. 2ª Turma. REsp 1.307.824-SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 27/10/2015 (Info 573).

ICMS O ICMS é um imposto estadual previsto no art. 155, II, da CF e na LC 87/96:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: II — operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

Eduardo Sabbag afirma que, resumidamente, o ICMS pode ter os seguintes fatos geradores (Manual de Direito Tributário. 4. ed., São Paulo: Saraiva, 2012, p. 1061):

circulação de mercadorias;

prestação de serviços de transporte intermunicipal;

prestação de serviços de transporte interestadual;

prestação de serviços de comunicação. ISS O ISS significa imposto sobre serviços. Trata-se de um tributo de competência dos Municípios. O ISS incide sobre todo e qualquer serviço, desde que cumpridas duas condições: a) A relação dos serviços sobre as quais incide o imposto deve estar prevista em lei complementar nacional (atualmente a Lei Complementar 116/03). b) Não incide sobre serviços de transporte interestadual, intermunicipal e de comunicação (que são objeto de ICMS). Veja o que diz o art. 1º da LC 116/2003:

Art. 1º O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador.

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Determinada empresa presta serviços de montagem de pneus. Ocorre que, além de montar, ela também fornece os pneus utilizados na montagem. Surgiu, então, uma dúvida: essa empresa, por comercializar mercadorias (pneus), deverá pagar ICMS ou, em virtude de prestar serviços (montagem), deverá pagar ISS? Ou, ainda, uma terceira alternativa: ela terá que pagar ICMS e também ISS? A empresa terá que pagar apenas o ISS. Incide ISS (e não ICMS) sobre o serviço de montagem de pneus, ainda que a sociedade empresária também forneça os pneus utilizados na montagem. Operações puras e operações mistas Podem existir três tipos de operações para fins de incidência de ICMS ou ISS: a) operação pura de circulação de mercadoria: ocorre quando o contribuinte apenas realiza circulação de mercadorias, sem prestar qualquer tipo de serviço. Ex: uma loja de brinquedos. Neste caso, ele só irá pagar ICMS. b) operação pura de prestação de serviços: ocorre quando o contribuinte realiza apenas prestação de serviços sem fornecer mercadorias. Ex: serviços prestados por uma psicóloga. Aqui haverá pagamento apenas do ISS. c) operação mista: ocorre quando o contribuinte realiza prestação de serviços, mas também fornece mercadorias. Ex: a montagem de pneus na qual a própria empresa fornece os pneus. E no caso de operações mistas, haverá pagamento de ICMS ou ISS? REGRA:

Se o serviço prestado estiver na lista anexa da LC 116/2003: haverá pagamento apenas de ISS.

Se o serviço prestado não estiver na lista anexa da LC 116/2003: haverá pagamento apenas de ICMS. EXCEÇÃO: Existem algumas operações mistas nas quais a LC 116/2003 prevê que sobre elas deverão incidir tanto o ISS (sobre o serviço prestado) como também o ICMS (sobre a circulação de mercadorias). É o que preconiza o art. 1º, § 2º da LC:

Art. 1º (...) § 2º Ressalvadas as exceções expressas na lista anexa, os serviços nela mencionados não ficam sujeitos ao Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias.

Lista do anexo da LC 116/2003 admite interpretação extensiva Vale destacar que a jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que a lista de serviços anexa à LC 116/2003, que estabelece quais serviços sofrem a incidência do ISS, é taxativa, mas comporta interpretação extensiva, para abarcar os serviços correlatos àqueles ali previstos expressamente. Nesse sentido: STJ. 2ª Turma. AgRg no AREsp 118.207/SP, Rel. Min. Assusete Magalhães, julgado em 16/09/2014. O serviço de montagem de pneus está previsto no anexo da LC 116/2003? Não expressamente, mas ele pode ser enquadrado, por interpretação extensiva, no item 14.01, por se enquadrar dentro da expressão "manutenção e conservação de veículos":

14.01 – Lubrificação, limpeza, lustração, revisão, carga e recarga, conserto, restauração, blindagem, manutenção e conservação de máquinas, veículos, aparelhos, equipamentos, motores, elevadores ou de qualquer objeto (exceto peças e partes empregadas, que ficam sujeitas ao ICMS).

Assim, por estarem previstos no anexo da LC 116/2003, os serviços de montagem de pneus estão sujeitos apenas ao ISS (e não ao ICMS).

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DIREITO PREVIDENCIÁRIO

PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR Tutela antecipada e devolução de benefício previdenciário complementar

Os valores de benefícios previdenciários complementares recebidos por força de tutela antecipada posteriormente revogada devem ser devolvidos, observando-se, no caso de desconto em folha de pagamento, o limite de 10% (dez por cento) da renda mensal do benefício previdenciário até a satisfação integral do valor a ser restituído.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.555.853-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 10/11/2015 (Info 573).

Imagine a seguinte situação hipotética: João é beneficiário de uma aposentadoria concedida por um plano de previdência privada complementar. João considerou que o valor dos proventos estava menor do que ele teria direito, razão pela qual ajuizou ação pedindo a revisão de sua aposentadoria. O juiz concedeu a tutela antecipada e aumentou em R$ 1 mil o valor da aposentadoria mensal por ele recebida. A sentença foi procedente, porém, em sede de apelação, o Tribunal reformou a decisão, revogando a tutela antecipada. Houve trânsito em julgado, sendo a decisão contrária ao pedido de João. Ocorre que o autor recebeu, durante dois anos, R$ 1 mil a mais em seus proventos por força da tutela antecipada, sendo que esse acréscimo foi, ao final, considerado indevido.

Diante disso, indaga-se: o plano de saúde poderá cobrar de volta os valores que João recebeu a título de tutela antecipada? SIM. A reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos (STJ. 1ª Seção. REsp 1.401.560-MT, Rel. Min. Sérgio Kukina, Rel. para acórdão Min. Ari Pargendler, julgado em 12/2/2014. Recurso Repetitivo. Info 570). As verbas de natureza alimentar do Direito de Família (ex: pensão alimentícia) são irrepetíveis, porquanto regidas pelo binômio necessidade/possibilidade. Esse raciocínio, contudo, não vale para as verbas oriundas de aposentadoria complementar, uma vez que possuem índole contratual, estando sujeitas, portanto, à repetição (devolução) em caso de pagamento indevido por força de tutela antecipada. Assim os valores de benefícios previdenciários complementares recebidos por força de tutela antecipada posteriormente revogada devem ser devolvidos, ante a reversibilidade da medida antecipatória, a ausência de boa-fé objetiva do beneficiário e a vedação do enriquecimento sem causa.

Em caso de revogação da tutela antecipada, o autor terá que devolver os valores recebidos. No entanto, quais são os critérios para que isso seja feito? Essa devolução não poderá comprometer o sustento do indivíduo, em atenção ao princípio da dignidade da pessoa humana. Assim, o STJ definiu que a devolução dos valores recebidos deve ser feita conforme os seguintes parâmetros: a) a entidade de previdência privada deverá ajuizar uma ação de execução da sentença que declarou que o autor não tinha direito; b) caso a pessoa que recebeu indevidamente os valores esteja, atualmente, gozando de algum benefício pago pela entidade (ex: está recebendo aposentadoria), o plano de previdência poderá cobrar os valores mediante desconto em folha de até 10% do benefício que ela estiver recebendo até pagar toda a dívida. Ex: a pessoa recebe R$ 1 mil de aposentadoria e deve R$ 20 mil; a entidade poderá descontar todos os meses R$ 100 (10%) dos proventos da pessoa até que ela quite o débito. Se a pessoa não estiver recebendo benefício previdenciário, a entidade deverá pedir ao juiz a penhora de bens que ela possua em seu nome.

Resumindo: Os valores de benefícios previdenciários complementares recebidos por força de tutela antecipada posteriormente revogada devem ser devolvidos, observando-se, no caso de desconto em folha de pagamento, o limite de 10% (dez por cento) da renda mensal do benefício previdenciário até a satisfação integral do valor a ser restituído. STJ. 3ª Turma. REsp 1.555.853-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 10/11/2015 (Info 573).