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Data (Abril, 2018) Tese de Doutoramento em Relações Internacionais Narrativas dos Direitos Humanos em Portugal Marta Sofia Camelo Pita

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  • Data (Abril, 2018)

    Tese de Doutoramento em Relaes Internacionais

    Narrativas dos Direitos Humanos em Portugal

    Marta Sofia Camelo Pita

  • Tese apresentada para cumprimento dos requisitos necessrios obteno do grau de

    Doutor em Relaes Internacionais, realizada sob a orientao cientfica de Prof. Doutor

    Manuel Canaveira

  • AGRADECIMENTOS

    Agradeo a boa orientao, abertura e pela disponibilidade imediata, orientao e a

    ajuda demonstrada para permitir o incio e desenvolvimento deste trabalho ao Prof. Dr.

    Manuel Canaveira.

    , importante reconhecer colaborao do Instituto de Histria Contempornea (IHC) que

    permitiu o desenvolvimento da tese. , tambm, de agradecer a disponibilidade da

    AIDDH - Associao para a investigao e Desenvolvimento dos Direitos Humanos que

    ajudou a manter a perspectiva e organizao no trabalho directo.

    s minhas amigas, especialmente Maria Miranda, Paula Machado e Maria Santos que

    foram impulsionando a minha fora de modo a concretizar este grande objectivo. As

    trs amigas foram companheiras oferecendo as suas melhores caractersticas, a Maria

    Miranda com a sua racionalidade e calma, Maria Santos com a sua paixo e a Paula

    Machado com a sua f. E a todos os meus amigos, que pelo seu apoio de pares

    ajudaram-me, ouvindo aos meus queixumes e alegrias, a manter a verdadeira sade

    mental. E a todos os meus amigos, que nunca deixaram de estar presentes e ajudaram a

    manter a crena de finalizao deste trabalho.

    E por fim, mas de certeza o agradecimento mais importante, famlia, que com o seu

    manto protector assegurou as diversas reas da minha vida, ajudando-me no longo e

    rduo caminho que me permitiu chegar aqui. Com especial ateno aos meus pais que

    apesar dos problemas que surgem esto sempre presentes e disponveis. E aos meus

    filhos que preenchem a minha vida com amor e alegria.

  • NARRATIVAS DOS DIREITOS HUMANOS EM PORTUGAL

    HUMAN RIGHTS NARRATIVES IN PORTUGAL

    MARTA SOFIA CAMELO PITA

    A presente tese teve como objectivo por um lado compreender as narrativas dos Direitos Humanos em Portugal e como estas se coadunavam com as das instituies internacionais. Pretendeu-se perceber a evoluo dos Direitos Humanos em Portugal, como Portugal posicionava perante outros Pases ou instituies e como os outros percepcionavam Portugal. Este posicionamento influencia as relaes sociais e politicas entre Portugal e os actores internacionais. Foi interessante analisar como Portugal foi evoluindo na rea dos Direitos Humanos e compreender se a percepo internacional era igual aquela que se pretendia transmitir atravs dos programas de Governo, legislao nacional e Planos Nacionais. Outra aferio de elevada relevncia foi as questes com que Portugal se debatia internacionalmente e como fez, como foi o exemplo de Timor-Leste, Macau e, at mesmo Estados Unidos, perante a situao dos voos da CIA e da Guerra do Iraque e Afeganisto. Apesar de Portugal demonstrar evoluo positiva em algumas reas, existem outras que infelizmente tem provocado algum atrito com as instituies internacionais, principalmente na questo da justia portuguesa. Outras reas cuja avaliao mais negativa so: liberdade de opinio, direito vida privada e familiar, a discriminao e propriedade. Por outro lado, Portugal avaliado positivamente quanto ao trabalho, especificamente o infantil e a discriminao de gnero, e a liberdade de religio em Portugal. Assim, compreendeu-se nas vrias reas dos Direitos Humanos as dificuldades que foram surgindo, como estas foram ultrapassadas, e como a situao foi utilizada para Portugal evoluir e fazer evoluir os outros. No entanto, era importante continuar a expandir o trabalho sobre Portugal e os Direitos Humanos focalizando questes como a aplicao dos Tratados e legislao, a compreenso dos Direitos Humanos por parte da populao portuguesa e relao de Portugal com os actores nacionais e internacionais que laboram na rea dos Direitos Humanos.

    Palavras-chave: Direitos Humanos; Portugal; Relaes Internacionais.

  • ABSTRACT

    This thesis aimed to firstly understand the narratives of Human Rights in Portugal and how they connected with those of international institutions. It was intended to understand the evolution of Human Rights in Portugal, as Portugal positioned before other countries or institutions and how others perceived Portugal. This position influences the social and political relations between Portugal and the international actors. It was interesting to analyze how Portugal evolved in the field of Human Rights and understand if the international perception was the same one that was intended to convey through government programs, national legislation and national plans. Another measurement of high relevance were issues which Portugal internationally debated and as how it did, for example the case of East Timor, Macau and even the United States, concerning the CIA flights and the Iraq and Afghanistan War. Although Portugal demonstrated positive developments in some areas, there are others that unfortunately have caused some friction with international institutions, mainly on the question of Portuguese justice. Other areas whose assessment is negative are: freedom of speech, right to private and family life and property discrimination. On the other hand, Portugal is rated positively about the work, specifically child and gender discrimination, and freedom of religion in Portugal. An understanding was made in the various areas of human rights, namely in the difficulties that arose, how these were overcome, and how the situation was used to evolve Portugal and evolve others. However, it was important to continue to expand the work on Portugal and Human Rights focusing on issues such as the application of the Treaties and legislation, the Portuguese population on the understanding of Human Rights and Portugal relationship with national and international actors that operate on Human Rights. Keywords: Human Rights; Portugal; International Relations.

  • ndice

    INTRODUO ...................................................................................................................... 1

    Definio do objecto de estudo ...................................................................................... 1

    Justificao epistemolgica .......................................................................................... 11

    Justificao Metodolgica e Problematizao.............................................................. 15

    Capitulo I: Perspectiva Interna ......................................................................................... 24

    Justia............................................................................................................................ 24

    Polcias ...................................................................................................................... 24

    Prises ....................................................................................................................... 26

    Tribunais ................................................................................................................... 29

    Menores .................................................................................................................... 33

    Informao ................................................................................................................ 35

    Relaes Internacionais ................................................................................................ 36

    Europa ....................................................................................................................... 38

    Naes Unidas........................................................................................................... 46

    OTAN ......................................................................................................................... 49

    Estados Unidos da Amrica ...................................................................................... 50

    Mdio Oriente ........................................................................................................... 54

    Amrica do Sul .......................................................................................................... 57

    frica ......................................................................................................................... 57

    Timor ......................................................................................................................... 61

    sia ............................................................................................................................ 64

    Rssia ........................................................................................................................ 65

    Famlia ........................................................................................................................... 66

    Famlia ....................................................................................................................... 66

    Aborto ....................................................................................................................... 68

    Maternidade e Paternidade ...................................................................................... 70

    Adopo .................................................................................................................... 72

    Propriedade .................................................................................................................. 73

    Religio.......................................................................................................................... 74

    Eleies, Governo e poder local ................................................................................... 78

  • Corrupo ..................................................................................................................... 80

    Opinio .......................................................................................................................... 81

    Meios de Comunicao ............................................................................................. 81

    Liberdade de Opinio ................................................................................................ 83

    Igualdade de gnero ..................................................................................................... 85

    Segurana Social ........................................................................................................... 90

    Trabalho ........................................................................................................................ 94

    Sade .......................................................................................................................... 104

    Educao ..................................................................................................................... 112

    Cultural........................................................................................................................ 116

    Migrao ..................................................................................................................... 118

    Discriminao .............................................................................................................. 123

    Capitulo II: Perspectiva Externa ...................................................................................... 126

    Justia.......................................................................................................................... 127

    Polcias .................................................................................................................... 127

    Prises ..................................................................................................................... 133

    Tribunais ................................................................................................................. 137

    Menores .................................................................................................................. 146

    Informao .............................................................................................................. 147

    Relaes Internacionais .............................................................................................. 148

    Europa ..................................................................................................................... 149

    Naes Unidas......................................................................................................... 150

    OTAN ....................................................................................................................... 150

    Estados Unidos da Amrica .................................................................................... 151

    Mdio Oriente ......................................................................................................... 153

    Timor ....................................................................................................................... 154

    frica ....................................................................................................................... 155

    sia .......................................................................................................................... 156

    Rssia ...................................................................................................................... 157

    Famlia ......................................................................................................................... 158

    Famlia ..................................................................................................................... 158

    Aborto ..................................................................................................................... 162

    Maternidade e Paternidade .................................................................................... 163

    Adopo .................................................................................................................. 164

  • Propriedade ................................................................................................................ 165

    Religio........................................................................................................................ 166

    Eleies, Governo e poder local ................................................................................. 168

    Corrupo ................................................................................................................... 169

    Opinio ........................................................................................................................ 171

    Meios de Comunicao ........................................................................................... 171

    Liberdade de Opinio .............................................................................................. 173

    Igualdade de gnero ................................................................................................... 179

    Segurana Social ......................................................................................................... 184

    Trabalho ...................................................................................................................... 184

    Sade .......................................................................................................................... 188

    Educao ..................................................................................................................... 188

    Migrao ..................................................................................................................... 189

    Discriminao .............................................................................................................. 200

    CONCLUSO .................................................................................................................... 206

    Contributos do estudo ................................................................................................ 206

    Aspectos negativos em Portugal ................................................................................. 208

    Aspectos positivos em Portugal .................................................................................. 212

    Investigaes futuras .................................................................................................. 214

    Continuidade ........................................................................................................... 214

    Legislao VS Preconceitos e Esteretipos ............................................................. 215

    Bibliografia ...................................................................................................................... 217

  • 1

    INTRODUO1

    A presente investigao debrua-se sobre as Narrativas dos Direitos

    Humanos em Portugal analisando a perspectiva interna e a externa pois a relao

    com os outros estabelece-se a partir do que pensamos de ns mesmos e o que

    os outros pensam de ns. No pretendendo assim ser um debate jurdico sobre

    os Direitos Humanos.

    Na realidade regime internacional de Direitos Humanos foi bem-sucedido

    no sentido de estabelecer normas e padres internacionais de comportamento

    que permitem que a actuao dos Estados seja avaliada e julgada.

    Definio do objecto de estudo

    Os direitos do homem definem-se como sendo prerrogativas, regidas por regras,

    que a pessoa detm nas suas relaes com os particulares e com o Poder2

    (Mourgeon, 1981).

    A noo de que os seres humanos tm Direitos tem origem na Europa

    Medieval, com a Magna Carta (1215) que enuncia os Direitos Humanos, mais

    conhecido por Habeas Corpus tendo esta mais tarde influenciado a legislao de

    alguns pases, como por exemplo os Estados Unidos da Amrica como se pode

    verificar na U. S. Bill of Rights (1789) e na Declarao de Independncia os

    Estados Unidos (1776), bem como a Frana como se pode perceber ao analisar a

    Declarao dos Direitos dos Homens e dos Cidados (revoluo Francesa, 1789) e

    o Reino Unido como se pode concluir atravs do descrito no Liberal Position on

    Rights, escrito durante a Guerra Civil Inglesa. Existem duas componentes bsicas

    no que concerne os Direitos Humanos. A primeira compreende o Direito vida,

    liberdade, posse segura de propriedade, liberdade de expresso nesta

    componente define-se que s se pode restringir os direitos de um para proteger

    1 Este texto no foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortogrfico

    2 Mourgeon, J. (1981). Os Direitos do Homem, pg 30. Mem Martins: Publicaes Europa-Amrica

  • 2

    os direitos de outrem. A segunda componente refere-se ao facto de atribuir aos

    governos a proteco destes direitos e devendo ser julgados perante o

    desempenho desta sua funo (Brown, 2001).

    As Revolues Francesa e Americana foram concebidas na contemplao

    racional dos Direitos Humanos, dos quais so de referir que todos os homens so

    livres e iguais, tendo o direito liberdade, propriedade, segurana e resistncia

    opresso sem prejuzo para o prximo (Paine, 1998). Contudo, haveria que ter

    em conta que as Naes so a fonte de soberania e como tal, nenhum indivduo

    ou grupo tem o direito a qualquer autoridade que no provenha da Nao

    (Paine, 1998).

    Existem trs geraes de Direitos Humanos que evoluram ao longo do

    tempo. A primeira gerao est associada aos direitos civis e polticos, associados

    a outros direitos como a liberdade de expresso (liberalismo Ocidental; (Karns &

    Mingst, The United Nations: Centerpiece of Global Governance. International

    Organizations: The Politics and Processes of Global Governance, 2004b)). A

    segunda gerao referente aos direitos sociais, econmicos e culturais que so

    indispensveis para a dignidade e livre desenvolvimento da personalidade

    (Brown, 2001). E a terceira gerao centra-se na ideia de que certos grupos (e.g.

    indgenas, povos coloniais, mulheres, crianas) tm direitos colectivos como a

    autodeterminao e o desenvolvimento social e econmico (Karns & Mingst, The

    United Nations: Centerpiece of Global Governance. International Organizations:

    The Politics and Processes of Global Governance, 2004b). O terico Mourgeon

    (1981) acrescenta que a terceira gerao reflecte igualmente o direito ao

    desenvolvimento, ambiente seguro, direito paz e segurana e o direito

    felicidade.

    Paine (1998) faz outra anlise diferenciando entre Direitos Naturais e

    Direitos Civis. Os Direitos Naturais so aqueles que so inerentes existncia do

    prprio ser humano, estes so relativos aos direitos intelectuais e o direito de

    agir em conformidade com o seu conforto e felicidade. Os Direitos Civis so

    referentes qualidade do sujeito enquanto membro da sociedade.

  • 3

    Independentemente do que foi anteriormente exposto, o conceito

    alicerce dos Direitos Humanos que todos os indivduos enquanto seres

    humanos tm direitos fundamentais e que estes devem ser defendidos pelos

    Estados. Ao longo do tempo o conceito de Direitos dos Homens foi-se alargando

    para permitir a introduo de novos grupos como as mulheres, os escravos e as

    crianas na definio dos Homens (Brown, 2001), e assim, passou a denominar-

    se Direitos Humanos.

    Os Direitos Humanos so princpios universais e indicam que as pessoas

    devem ser tratadas como seres humanos e no como indivduos pertencentes a

    uma comunidade especfica (Nardin, 2009). Estes so percepcionados como

    sendo inerentes e inalienveis a todos os seres humanos pois no podem ser

    dados nem tirados independentemente da nacionalidade, gnero, idade, raa e

    estatuto. Os Direitos Humanos estabelecem um fundamento legal

    emancipao, justia e liberdade, sendo a sua negao uma afronta para com a

    dignidade e condio humana (Burchill, 2009). Os Estados que tratam

    eticamente os seus cidados e lhes permitem uma participao significativa no

    processo poltico so percepcionados como menos ameaadores na cena

    internacional (Burchill, 2009). Estes direitos foram evoluindo medida que as

    prticas culturais e legais do Mundo Ocidental foram mudando, como empatia

    pelo sofrimento humano, rejeio da tortura e redefinio das relaes humanas

    (Burchill, 2009). No entanto, um facto que os Direitos Humanos esto limitados

    pelas prticas sociais e culturais que variam de regio para regio (Brown, 2001)

    e por isso devero procurar uma linguagem que faa sentido para todos.

    Dever existir uma traduo dos Direitos Humanos para o nvel documental, ou

    seja, legislao internacional e nacional.

    A perspectiva de defesa dos Direitos Humanos implica que os vrios

    Estados cuidem de forma mais proactiva da sua populao e que prestem mais

    ateno ao que se passa nos outros locais fora do seu territrio. Esta ateno

    implica que haja uma alterao nas relaes internacionais pois os Estados esto

    constantemente sob avaliao. Assim sendo as relaes polticas entre as vrias

  • 4

    Naes sofre constantes adaptaes devido ao escrutnio e olhar atento das

    populaes e dos outros Estados.

    Os Estados tm vindo progressivamente a trabalhar em valores

    transculturais e padres ticos como demonstrado no desenvolvimento dos

    Direitos Humanos e na legislao criminal internacional (Linklater, 2009). Todavia

    recentemente, os Direitos Humanos sofreram um ataque sua forma o que

    provocou algumas fendas, como se poder perceber atravs do exemplo da luta

    contra o terrorismo que justificaram situaes de tortura, encarceramento sem

    julgamento, entre outros (Burchill, 2009).

    Os Direitos Humanos no devem ser somente analisados a nvel dos

    Estados tal como Margaret Keck e Kathryn Sikkink demonstraram pois as

    organizaes no-governamentais so um veculo para defesa destes tentando

    alterar a forma como o Estado exerce o seu poder (Reus-Smit, 2009). A nvel

    global as normas e instituies podem ter uma influncia considervel (Donnelly,

    2009). Seguindo uma lgica construtivista das Relaes Internacionais os agentes

    ou unidades de anlise podem ser Estados, movimentos sociais, corporaes,

    organizaes internacionais, entre outros. Todos estes agentes podem

    influenciar a criao de normas, identidades e comportamentos dos Estados, e

    vice-versa (Paul & Mark, 2009). Com isto no se pretende negar o sistema de

    soberania dos Estados mas sim demonstrar que a sociedade internacional e as

    suas instituies foram moldadas por diferentes agentes (Reus-Smit, 2009).

    As organizaes no-governamentais internacionais permitiram a

    construo de instrumentos jurdicos internacionais que foram aceites e

    ratificados por diversos Pases. Tal s foi possvel devido a um perodo da Histria

    Mundial que chamou a ateno para graves violaes dos Direitos Humanos.

    Em 1919, no fim da primeira Guerra Mundial, ocorreu a criao da

    Sociedade das Naes mas no contemplava nenhuma proviso explcita sobre

    os Direitos Humanos, partindo do pressuposto que os Estados Membros seriam

  • 5

    governados atravs da legislao em vigor e dos direitos individuais (Brown,

    2001).

    O fim da Segunda Guerra Mundial chamou a ateno para o holocausto e

    assim focalizou os Direitos Humanos como uma questo internacional fulcral

    pois o respeito destes iria permitir o prevalecer da Paz. Estes acontecimentos

    focaram o facto de que a defesa dos cidados nem sempre poder depender do

    Estado, pois quando este o agressor, os indivduos no tm possibilidades de se

    defender nem a quem recorrer. Por esta razo procedeu-se criao de cdigos

    legais, instrumentos e instituies, entre os quais a Declarao Universal do

    Direitos Humanos, a Conveno Internacional dos Direitos Civis e Polticos, e a

    Conveno Internacional dos Direitos Econmicos, Sociais e Culturais

    complementados com o papel simblico mas no menos importante de

    instituies como Tribunal de Justia Internacional e da Organizao

    Internacional de Trabalho (Burchill, 2009).

    Ao longo do tempo foi elaborada legislao internacional na rea dos

    Direitos Humanos, sendo esta progressivamente mais especfica nas

    problemticas que pretendia focar.

    Na conferncia de Paz em Paris onde se desenvolveu o draft da Carta das

    Naes Unidas, na qual estavam descritas as 4 liberdades fundamentais: vida,

    liberdade, propriedade e expresso (Karns & Mingst, The United Nations:

    Centerpiece of Global Governance. International Organizations: The Politics and

    Processes of Global Governance, 2004b). A Carta das Naes Unidas permitiu

    uma extenso da Liga das Naes no que concerne aos Direitos Humanos pois

    fazia referncia explcita a estes como tributo ao impacto dos horrores

    vivenciados na Segunda Guerra Mundial (Brown, 2001). A Carta das Naes

    Unidas foi o documento legal fundador das Naes Unidas desenvolvido em dois

    conjuntos de reunies entre Agosto e Outubro de 1944.

  • 6

    Na conferncia de So Francisco em 25 de Abril de 1945, delegados de 50

    Estados3 modificaram e finalizaram o que j havia sido negociado (Karns &

    Mingst, The United Nations: Centerpiece of Global Governance. International

    Organizations: The Politics and Processes of Global Governance, 2004b). Nesta

    conferncia encontravam-se representados grupos das igrejas, grupos de paz e

    delegados de pequenos Estados que facilitaram uma incluso da linguagem dos

    Direitos Humanos para a promoo e encorajamento destes e das liberdades

    fundamentais para todos, um carcter humanitrio e a obrigao de promoo

    do respeito universal dos Direitos Humanos (Karns & Mingst, The United Nations:

    Centerpiece of Global Governance. International Organizations: The Politics and

    Processes of Global Governance, 2004b). A 28 de Julho de 1945, com a

    aprovao pelo Senado, os Estados Unidos ratificaram o Carta demorando

    apenas 3 meses para ter o nmero suficiente de Pases necessrio ratificao

    do documento (Karns & Mingst, The Role of the United Nations in Human Rights

    Promotion. International Organizations: The Politics and Processes of Global

    Governance, 2004a). O prembulo do Carta contm referncias aos Direitos

    Humanos em que os Estados devem respeitar o princpio da igualdade de

    Direitos e autodeterminao das pessoas (Karns & Mingst, The Role of the

    United Nations in Human Rights Promotion. International Organizations: The

    Politics and Processes of Global Governance, 2004a). Assim, as Naes Unidas

    comearam a ter autoridade legal para definir e codificar os Direitos Humanos.

    A Declarao dos Direitos Humanos de 1948 das Naes Unidas permitiu

    que pela primeira vez na comunidade internacional uma tentativa de definir um

    cdigo compreensvel para o governo interno dos Estados Membros com um

    padro comum dos objectivos de todas as pessoas e naes (Karns & Mingst, The

    United Nations: Centerpiece of Global Governance. International Organizations:

    The Politics and Processes of Global Governance, 2004b). O domnio do Ocidente

    na Declarao demonstrado pela nfase da liberdade poltica. A Declarao

    3 Argentina, Austrlia, Bielorrssia, Blgica, Bolvia, Brasil, Canada, Chile, China, Colmbia, Costa Rica, Cuba,

    Dinamarca, Repblica Dominicana, Equador, Egipto, El Salvador, Etipia, Frana, Grcia, Guatemala, Haiti, Honduras, ndia, Iro, Iraque, Lbano, Libria, Luxemburgo, Mxico, Holanda, Nova Zelndia, Nicargua, Noruega, Panam, Paraguai, Peru, Filipinas, Polnia, Rssia, Arabia Saudita, Africa do Sul, Sria, Turquia, Ucrnia, Reino Unido, Estados Unidos, Uruguai, Venezuela, Checoslovquia

  • 7

    teve a ratificao por parte de 18 Estados Membros e 8 abstenes por parte da

    frica do Sul, Unio Sovitica e Pases do Bloco Sovitico (Brown, 2001). A

    Declarao Universal dos Direitos Humanos no tem carcter legal mas sim

    declaratrio que foi mantido para prevenir a controvrsia4. No entanto, o seu

    contedo visto como menos problemtico e universal do que a questo do seu

    cumprimento (Brown, 2001).

    A Comisso dos Direitos Humanos tem a responsabilidade primria de

    formular e negociar importantes documentos para posteriormente definir as

    normas dos Direitos Humanos, com a Declarao Universal dos Direitos

    Humanos e convenes internacionais (Karns & Mingst, The United Nations:

    Centerpiece of Global Governance. International Organizations: The Politics and

    Processes of Global Governance, 2004).

    Durante a Guerra Fria, o Ocidente fazia condenaes verbais regulares

    sobre as violaes de Direitos Humanos que ocorriam na Unio Sovitica e Pases

    satlites, mas uma interveno era vista como impensvel devido ao seu poder

    destes ltimos (Brown, 2001). No Ps-Guerra Fria pareceu possvel uma

    abordagem mais directa quanto s violaes dos Direitos Humanos que iam

    ocorrendo, fortalecida pelo facto de existir a tendncia de responsabilizar os

    governos pelos seus actos (Brown, 2001). Durante este perodo ocorreu,

    tambm, a formao dos Tribunais Internacionais e Tribunal Penal Internacional

    que demonstram que h um acordo cada vez mais crescente quanto a uma aco

    contra as grandes violaes dos Direitos Humanos, e que esta deve ser efectuada

    pela comunidade internacional.

    Durante a Conveno de Haia e Genebra definiu-se a conduta a ter

    durante a Guerra. No Congresso de Viena ocorreu a fuso entre os Direitos das

    Mulheres e os Direitos Humanos, resultando em 1993 na Declarao sobre a

    Eliminao da Violncia Contra as Mulheres adoptada pela Assembleia Geral das

    Naes Unidas. Tambm se estabeleceram Convenes onde se descreveu uma

    4 Lembrando que na altura a Unio Sovitica seria contra ao direito de propriedade, Arbia

    Saudita contra a liberdade de religio, e frica do Sul contra igualdade

  • 8

    legislao contra a escravatura enquanto a Conveno do Trabalho descreveu os

    padres dos locais de trabalho (Brown, 2001)

    Em 1966, a Assembleia Geral das Naes Unidas aprovou a Conveno

    Internacional dos Direitos Econmicos, Sociais e Culturais e a Conveno

    Internacional dos Direitos Civis e Polticos, ambos operativos em 1976 seguidas

    pelas ratificaes dos Estados Membros, apesar de nem todos terem assinado.

    Estas convenes com a Declarao dos Direitos Humanos so conhecidas como

    Internacional Bill of Rights (Brown, 2001). A Conveno Internacional dos

    Direitos Econmicos articula direitos econmicos e sociais normalmente

    defendidos pelos pases comunistas, a Conveno Internacional dos Direitos Civis

    e Polticos promove liberdades civis e polticas usualmente advogadas pelas

    democracias liberais (Cole, 2005). Os Estados tm 2 anos aps a ratificao da

    Conveno Internacional dos Direitos Econmicos para entregar um relatrio

    sobre a implementao deste. Estes relatrios devem ser reelaborados de 5 em 5

    anos, o que nem sempre acontece e quando ocorre efectuado pelo prprio

    Estado. No caso da Conveno Internacional dos Direitos Civis e Polticos

    elabora-se o primeiro relatrio 1 ano aps a ratificao e posteriormente sempre

    que o Comit o requisitar (Cole, 2005).

    Entretanto foram formuladas diversas Convenes e Tratados cujo

    objecto so as mulheres, a escravatura e os trabalhos forados, tortura,

    refugiados, apartheid e discriminao. Alguns dos padres dos Tratados,

    Convenes e da Declarao dos Direitos Humanos esto traduzidos nas

    Constituies Nacionais, documentos legais, onde so muitas vezes

    referenciados (Karns & Mingst, The United Nations: Centerpiece of Global

    Governance. International Organizations: The Politics and Processes of Global

    Governance, 2004).

    A nvel europeu, os Estados-Membro da Unio Europeia, a Comisso

    Europeia e o Parlamento Europeu proclamaram em 2000, em Nice, a Carta

    Fundamental dos Direitos Fundamentais da EU. Nesta descreviam todos os

    direitos pessoais, civis, polticos, econmicos e sociais. Este documento

  • 9

    pretendia envolver todas as instituies europeias, parlamentos nacionais e a

    sociedade em geral (Directorate-General Justice, s.d.).

    A Conveno Europeia dos Direitos Humanos e as prticas europeias

    nesta rea implicaram alteraes profundas na soberania dos Estados ao

    contrrio da Declarao Universal dos Direitos Humanos das Naes Unidas que

    no implicava uma modificao efectiva da soberania (Sikkink, 1993).

    No mbito dos Direitos Humanos, os Tratados so obrigaes legais

    internacionais, que os Estados acordaram. Estes Tratados podem ser

    convenes, protocolos, pactos que so ratificados, aceites ou aprovados e em

    que os Estados se comprometem atravs de e uma assinatura de autenticao

    (OHCHR, International Human Rights Law And The Role Of The Legal Professions:

    A General Introduction, 2003).

    Quando um Estado ratifica um Tratado Internacional, assume a

    responsabilidade de o implementar a nvel nacional e fazer a sua monitorizao.

    Cada Estado deve entregar periodicamente um relatrio sobre as medidas que

    foram tomadas para a implementao dos Tratados, sendo este analisado por

    Treaty Bodies juntamente com diversas informaes de outras fontes.

    esperado que os Estados tomem todas as medidas necessrias para a

    implementao das recomendaes dos Treaty Bodies (OHCHR, Treaty Bodies,

    2009).

    Durante a implementao dos Tratados as suas obrigaes so de boa

    f (pacta sunt servanta), o que significa que o Estado responsvel pelas suas

    actuaes, especificamente nos Direitos Humanos, mesmo que estas no sejam

    intencionais, sem que estas obrigaes impliquem a perda de soberania dos

    Estados (Karns & Mingst, The Role of the United Nations in Human Rights

    Promotion. International Organizations: The Politics and Processes of Global

    Governance, 2004). Os Tratados dos Direitos Humanos tm o objectivo de criar

    normais gerais que so iguais para todos os Estados de forma a assegurar a

    proteco efectiva dos direitos dos indivduos e grupos (OHCHR, Treaty Bodies,

    2009).

  • 10

    A promoo dos Direitos Humanos um dos objectivos fundamentais das

    Naes Unidas desde sua criao, onde tem feito enormes progressos no

    estabelecimento de padres legais e no estabelecimento de mecanismos de

    monitorizao da sua implementao. A legislao Internacional sobre os

    Direitos Humanos explicita obrigaes que os Estados tm de respeitar ao

    tornarem-se partes de Tratados internacionais. A obrigao de respeitar a

    legislao internacional significa que todos os Estados no devem interferir ou

    violar os Direitos Humanos de indivduos ou grupos. Atravs da ratificao de

    Tratados Internacionais de Direitos Humanos os Governos traduzem estas

    obrigaes e deveres em leis e medidas nacionais.

    Caso existam violaes do que est estipulado nos Tratados, as pessoas

    podem apresentar queixa dentro da jurisdio dos Estados que aceitaram

    formalmente estes procedimentos, de forma a serem analisados pelos Treaty

    Bodies. A aceitao formal pode transparecer na forma de ratificao de outros

    Tratados intitulados de Protocolos Opcionais, ou atravs de declaraes

    especficas feitas pelos Estados que so fornecidas pelo Tratado (OHCHR,

    International Human Rights Law And The Role Of The Legal Professions: A

    General Introduction, 2003).

    Antes de apresentar uma queixa deve-se primeiro tentar todas as outras

    formas de queixa a nvel nacional antes desta ser dirigida ao Comit. Depois de

    se ter tentado sem sucesso medidas nacionais, as queixas a apresentar no

    Comit devem ser submetidas pessoalmente pela alegada vtima, um

    representante ou outra pessoa desde que tenha autoridade de se pronunciar em

    representao da vtima. A queixa dever ser sobre uma violao um direito

    especfico descrito num Tratado e no podero ser analisadas se a mesma

    questo estiver a ser investigada por outra organizao internacional, como por

    exemplo o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos e a Comisso Interamericana

    sobre Direitos Humanos (OHCHR, International Human Rights Law And The Role

    Of The Legal Professions: A General Introduction, 2003).

  • 11

    Existem custos perante o no cumprimentos dos Tratados ratificados

    sendo estes para as Naes o manchar da sua reputao a nvel das relaes

    internacionais e por esta razo muitas assumem compromissos que acham que

    partida esto em condies de corresponder, outro custo ser a adaptao do

    que est descrito no Tratado em polticas e prticas nacionais (Cole, 2005).

    A questo da ratificao de tratados internacionais muito importante

    pois so marcos para cada Nao e para a sociedade internacional uma vez que

    so demonstraes formais da defesa dos Direitos Humanos. No entanto, os

    Tratados s so efectivamente importantes quando se verifica a aplicao

    destes. A teoria racionalista chama ateno para um factor muito relevante pois

    afirma que ratificao de tratados sendo voluntria permite que os Estados

    escolham aqueles tratados que tero menos custos para eles (Cole, 2005). Isto

    significa que as Naes podero assinar tratados que sejam de fcil aplicao.

    Isto bvio em situaes em os Tratados assinados so aqueles que afirmem

    defender aquilo que o Pas j o faz por si. Outra questo o assinar de Tratados

    cuja monitorizao e imposio seja dbil, ou seja, ser fcil para um Estado

    ratificar algo quando sabe que no ser avaliado nem obrigado a responder

    perante aquilo que assinou. Isto , a ratificao de Tratados poder ser

    simplesmente uma questo simblica ou ritualista.

    Justificao epistemolgica

    Portugal tem sido defensor dos Direitos Humanos ao longo dos tempos.

    Ao analisarmos de um ponto de vista evolutivo, verifica-se que foi proposta pela

    primeira vez, a 10 de Maro de 1852, em sesso da Cmara dos Deputados, com

    o aditamento ao Acto Adicional Carta Constitucional, a abolio da pena de

    morte para os crimes polticos. A ltima execuo de pena de morte por delitos

    civis, em Portugal, ocorreu, em Lagos, em 1846. J em 1867, no reinado de D.

  • 12

    Lus, foi aprovada a lei que aboliu a pena de morte para todos os crimes, excepto

    os militares. A proposta partiu do Ministro da Justia de ento, Conselheiro

    Augusto Csar Barjona de Freitas. Quanto aos crimes militares, a ltima pena de

    morte executada ocorreu em Frana quando um soldado do Corpo

    Expedicionrio Portugus foi condenado por espionagem. A pena de morte foi

    retirada da Constituio da Repblica em 1976 (Assembleia da Repblica

    Portuguesa, 2007).

    Na temtica da escravatura de referir a importncia que o Marqus de

    Pombal teve. Durante o seu governo foram redigidas leis que dificultavam ou

    impediam a escravatura. de referir a lei de 1761, onde se proibiu o transporte

    de escravos negros, de ambos os sexos, dos portos da frica, Brasil e da sia para

    Lisboa, e a lei de 1771 onde se estipulava que todos os negros que nascessem

    aps a sua publicao seriam livres.

    Em 1854, foram redigidas leis contra escravatura para que estas

    terminassem em 20 anos de modo a emergir uma fora laboral livre. Perante a

    emancipao foram formulados diversos instrumentos legais com a finalidade de

    obrigar os ex-escravos a trabalhar, como por exemplo a lei da vadiagem (Miers &

    Roberts, 1988). A Sociedade das Naes criou a Comisso Temporria da

    Escravatura desenvolveu a Conveno da Escravatura, na qual a escravatura e o

    comrcio de escravos foram abordados, sendo ratificada por Portugal a 4 de

    Outubro de 1927. Isto tem elevado significado pois durante sculos Portugal foi

    um dos maiores comerciantes de escravos.

    Em 1926, houve uma revolta militar que ps termo Primeira Repblica,

    iniciando-se um regime ditatorial em 1932 que esteve sob o presidncia do Prof.

    Dr. Antnio de Oliveira Salazar at 1968. Durante a ditadura foram impostas

    diversas formas de atentando aos Direitos Humanos, entre as quais a proibio

    de liberdade de pensamento e a perseguio, encarceramento, tortura e

    assassinato de homens e mulheres. Em 1968, Prof. Dr. Antnio de Oliveira

    Salazar foi substitudo pelo Dr. Marcello Caetano, perodo em que a represso e

    a censura diminuram, construindo-se uma ala liberal dentro do partido nico

  • 13

    existente5. No entanto, decorria a guerra colonial onde vrios crimes de guerra

    ocorreram entre os quais violaes, mutilaes, fuzilamentos, decapitao de

    supostos terroristas (crianas, mulheres e homens) para que as suas cabeas

    ficassem expostas perante a populao local. Uma das piores imagens que

    chocou a comunidade nacional e internacional foi o jogo de futebol com cabeas

    decapitadas.

    Durante a presidncia de Prof. Dr. Antnio de Oliveira Salazar, a 2 de

    Agosto de 1946, o ento Embaixador em Washington remeteu um telegrama ao

    Secretrio-geral das Naes Unidas, Sobolev, em que apresentava o interesse de

    Portugal em tornar-se Membro das Naes Unidas. Esta foi recusada apesar de a

    candidatura incluir o convite de trs membros permanentes do Conselho de

    Segurana, a Frana, os Estados Unidos da Amrica e o Reino Unido. Esta recusa

    deveu-se ao direito de veto da URSS, que fazia o mesmo a outros pases

    candidatos (como a ustria, a Finlndia, a Irlanda). A adeso de Portugal s foi

    possvel quando se abriu uma negociao entre EUA e URSS para a entrada de

    vrios pases candidatos. A entrada de Portugal nas Naes Unidas ocorreu

    finalmente em 14 de Dezembro de 1955.

    Noutro momento, Portugal assinou a sua entrada na Organizao do

    Tratado do Atlntico Norte (OTAN) desde a sua fundao, a 4 de Abril de 1949

    com base no Tratado do Atlntico Norte. A organizao constitui um sistema de

    defesa colectiva, que prev que quando qualquer um dos seus Estados-Membros

    seja atacado, tal seja considerado um ataque contra todos os restantes membros

    o que implicaria uma resposta defensiva por parte de todos.

    A Revoluo dos Cravos liderada pelo Movimento das Foras Armadas,

    ocorreu 1974 terminando com o regime ditatorial. Este movimento opunha-se s

    guerras nas colnias portuguesas, nomeadamente em Angola, Moambique e

    5 interessante saber que a Amnistia Internacional foi fundada em 28 de Maio de 1961, tendo

    origem numa notcia publicada no "The Observer" em que era referida a priso de dois estudantes

    portugueses por terem gritado Viva a Liberdade! na via pblica.

  • 14

    Guin. A transio para democracia comeou com a eleio de uma Assembleia

    Constitucional (Freedom House, 2003). A Constituio da Repblica Portuguesa

    foi decretada e aprovada a 2 de Abril de 1976 em que a Assembleia Constituinte

    afirma a deciso do povo portugus de defender a independncia nacional, de

    garantir os direitos fundamentais dos cidados, de estabelecer os princpios

    basilares da democracia, de assegurar o primado do Estado de Direito

    democrtico e de abrir caminho para uma sociedade socialista, no respeito da

    vontade do povo portugus, tendo em vista a construo de um pas mais livre,

    mais justo e mais fraterno (cit. Prembulo da Constituio Portuguesa). Este

    um passo marcante na defesa dos Direitos Humanos em Portugal, atravs do

    qual ficaram legislados direitos como a proibio da discriminao no exerccio

    de direitos, o direito vida, o direito liberdade e segurana, direito liberdade

    religiosa e de ensino, o direito de reunio e a liberdade de associao. Foi

    findada a polcia poltica e terminou a censura. No outro ponto mais especfico,

    as mulheres tiveram acesso a novas profisses e acesso mais facilitado ao

    emprego.

    Foi criado o Conselho da Revoluo em Maro de 19756 cujas funes

    incluam o exerccio de poderes constituintes e a vigilncia pelo cumprimento do

    Programa do Movimento das Foras Armadas e das leis constitucionais. Em

    Fevereiro de 1981, o Conselho da Revoluo foi dotado de um Regimento

    Interno, que informava da sua composio, atribuies e competncias e o seu

    funcionamento. Aps o perodo de transio, ocorreu a primeira reviso

    constitucional, entre 23 de Abril de 1981 e 12 de Agosto de 19827, tendo o

    Conselho da Revoluo deixado de integrar os rgos de soberania sendo

    consequentemente extinto. As suas funes foram distribudas pelo Presidente

    da Repblica, Assembleia da Repblica e Tribunal Constitucional.

    Assim os portugueses podem, atravs de eleies democrticas, escolher

    os representantes da Assembleia da Repblica que so eleitos de 4 em 4 anos

    6 Lei n. 5/75 de 14 de Maro, Decreto-Lei n. 147-D/75 de 21 de Maro, Decreto-Lei n. 246-B/75 de 21 de

    Maio 7 Lei Constitucional n. 1/82 de 30 de Setembro - Primeira Reviso da Constituio (art. n. 91, art. n. 110,

    art. n. 124, art. n. 146, art. n. 154, art. n. 247)

  • 15

    atravs do voto popular e do sistema de representao proporcional. O

    Presidente da Repblica eleito por maioria para mandatos de 5 anos, podendo

    ser reeleito uma vez, mas no tem poderes executivos, podendo no entanto,

    atrasar legislao atravs do veto, enviar matrias legislativas ao Tribunal

    Constitucional e dissolver a Assembleia e decretar eleies. O Presidente recebe

    o apoio do Conselho de Estado, constitudo pelo Primeiro-ministro, Presidente

    do Tribunal Constitucional, Provedor da Justia, Presidentes dos Governos

    regionais, antigos Presidentes da Repblica eleitos, 5 cidados eleitos pela

    Assembleia da Repblica e 5 cidados seleccionados pelo Presidente (Conselho

    de Estado - Estatuto dos Membros, 1984). Os Portugueses tm o direito de se

    organizar em Partidos polticos e outros grupos polticos da sua escolha, excepto

    organizaes de ndole fascistas. As regies autnomas dos Aores e Madeira

    apresentam especificidades atravs do regime poltico e administrativo,

    produzindo legislao e dispondo de poderes executivos prprios e autnomos.

    Assim, com o fim da ditadura de 40 anos e atravs de uma revoluo

    pacfica feita com cravos e quase sem balas, Portugal entra na 2 Repblica.

    Uma Repblica com um idealismo talvez utpico de mudar o Mundo de dentro

    para fora. Acaba-se a guerra colonial com todos os seus crimes dando

    independncia aos povos dessas regies, terminam a censura e exlios, libertam-

    se presos polticos, e estabelece a liberdade e igualdade entre todos, com o

    respeito pelos Direitos Humanos.

    Justificao Metodolgica e Problematizao

    Para a realizao da presente investigao, a recolha de narrativas foi

    efectuada atravs da anlise de vrios textos oficiais, tanto nacionais como

    internacionais. Foram, ento, base de anlise, na vertente interna, publicaes

    do Dirio da Assembleia da Repblicado que se refere as reunies plenrias e

  • 16

    solenes, e relatrios, programas de Governo e artigos de jornais. A nvel

    internacional, ou seja externa, foram analisados relatrios e publicaes das

    Naes Unidas, relatrios e publicaes do Conselho da Europa e do Tribunal

    Europeu dos Direitos Humanos, publicaes da Freedom House, relatrios da

    Amnistia Internacional, relatrios da Human Rights Watch, relatrios do

    Departamento de Estado dos Estados Unidos Os instrumentos utilizados so

    baseados numa abordagem qualitativa que permitem dados mais ricos e

    contextualizados (Jackson & Philips, 2003). O objectivo da anlise qualitativa

    atravs de temas comuns ao longo da tcnica analtica de codificao de texto. A

    anlise foi efectuada atravs das narrativas que transpareciam nas conversas.

    Rappaport refere que a metodologia das narrativas tornou-se parte

    significativa do reportrio das cincias sociais e pode ser uma estratgia para

    explorar as ligaes entre nveis de anlise (Salzer, 1998). A abordagem das

    narrativas advoga o pluralismo, relativismo e subjectividade, sendo a

    investigao feita atravs da anlise de materiais narrativos cujos dados so

    recolhidos como uma estria (Lieblich, Tuval-Mashiach, & Ziber, 1998). Langdon

    refere em 2000 (Boehs, 2000) narrativa consiste em contar um acontecimento

    numa sequncia estruturada, onde se pode descrever um passado distante,

    tempos histricos, factos recentes tais como acontecimentos pessoais ou que

    envolvem outras pessoas, ou ainda relatar factos que nunca ocorreram.

    De forma a balizar temporalmente os dados a recolher, foi decidido

    focalizar o perodo entre I Governo Constitucional ao XVIII Governo, ou seja,

    entre 23 de Julho de 1976 e 21 de Junho de 2011. A anlise das narrativas dos

    textos seleccionados orgnica e encontra-se sempre em crescimento pois a

    histria desenvolve-se de dia para dia o que implica barreiras temporais.

    Os temas elegidos para a anlise dos textos foram baseados na

    Declarao Universal dos Direitos do Homem.

  • 17

    Tema geral

    A Assembleia Geral

    Proclama a presente Declarao Universal dos Direitos do

    Homem como ideal comum a atingir por todos os povos e todas

    as naes, (), por desenvolver o respeito desses direitos e

    liberdades e por promover, por medidas progressivas de ordem

    nacional e internacional, o seu reconhecimento e a sua aplicao

    universais e efectivos tanto entre as populaes dos prprios

    Estados membros como entre as dos territrios colocados sob a

    sua jurisdio.

    Relaes

    Internacionais

    Artigo 3.

    Todo o indivduo tem direito vida, liberdade e segurana

    pessoal.

    Justia

    Artigo 4.

    Ningum ser mantido em escravatura ou em servido; a

    escravatura e o trato dos escravos, sob todas as formas, so

    proibidos.

    Migrao

    Artigo 5.

    Ningum ser submetido a tortura nem a penas ou tratamentos

    cruis, desumanos ou degradantes.

    Justia

    Artigo 6.

    () direito ao reconhecimento em todos os lugares da sua

    personalidade jurdica.

    Justia

    Artigo 7.

    Todos so iguais perante a lei e, sem distino, tm direito a

    igual proteco da lei. Todos tm direito a proteco igual contra

    qualquer discriminao que viole a presente Declarao e contra

    Justia

    Discriminao

  • 18

    qualquer incitamento a tal discriminao.

    Artigo 8.

    () direito a recurso efectivo para as jurisdies nacionais

    competentes contra os actos que violem os direitos

    fundamentais reconhecidos pela Constituio ou pela lei.

    Justia

    Artigo 9.

    Ningum pode ser arbitrariamente preso, detido ou exilado.

    Justia

    Artigo 10.

    () direito, em plena igualdade, a que a sua causa seja equitativa

    e publicamente julgada por um tribunal independente e

    imparcial ()

    Justia

    Artigo 11.

    1. Toda a pessoa acusada de um acto delituoso

    presume-se inocente at que a sua culpabilidade fique

    legalmente provada no decurso de um processo pblico em

    que todas as garantias necessrias de defesa lhe sejam

    asseguradas.

    2. Ningum ser condenado por aces ou omisses

    que, no momento da sua prtica, no constituam acto

    delituoso face do direito interno ou internacional. Do

    mesmo modo, no ser infligida pena mais grave do que a que

    era aplicvel no momento em que o acto delituoso foi

    cometido.

    Justia

    Artigo 12.

    Ningum sofrer intromisses arbitrrias na sua vida privada, na

    sua famlia, no seu domiclio ou na sua correspondncia, nem

    ataques sua honra e reputao. ()

    Famlia

    Opinio

    Artigo 13. Migrao

  • 19

    1. () direito de livremente circular e escolher a sua residncia

    no interior de um Estado.

    2. () direito de abandonar o pas em que se encontra, incluindo

    o seu, e o direito de regressar ao seu pas.

    Artigo 14.

    1. () direito de procurar e de beneficiar de asilo em outros

    pases.

    2. () no pode, porm, ser invocado no caso de processo

    realmente existente por crime de direito comum ou por

    actividades contrrias aos fins e aos princpios das Naes

    Unidas.

    Migrao

    Artigo 15.

    1. () direito a ter uma nacionalidade.

    2. Ningum pode ser arbitrariamente privado da sua

    nacionalidade nem do direito de mudar de nacionalidade.

    Migrao

    Artigo 16.

    1. A partir da idade nbil, o homem e a mulher tm o

    direito de casar e de constituir famlia, sem restrio alguma

    de raa, nacionalidade ou religio. Durante o casamento e na

    altura da sua dissoluo, ambos tm direitos iguais.

    2. O casamento no pode ser celebrado sem o livre e

    pleno consentimento dos futuros esposos.

    3. A famlia o elemento natural e fundamental da

    sociedade e tem direito proteco desta e do Estado.

    Famlia

    Artigo 17.

    1. Toda a pessoa, individual ou colectivamente, tem

    direito propriedade.

    2. Ningum pode ser arbitrariamente privado da sua

    Propriedade

  • 20

    propriedade.

    Artigo 18.

    ()direito liberdade de pensamento, de conscincia e de

    religio; este direito implica a liberdade de mudar de religio ou

    de convico, assim como a liberdade de manifestar a religio ou

    convico, sozinho ou em comum, ().

    Religio

    Artigo 19.

    () direito liberdade de opinio e de expresso, o que implica o

    direito de no ser inquietado pelas suas opinies e o de procurar,

    receber e difundir, sem considerao de fronteiras, informaes

    e ideias por qualquer meio de expresso.

    Opinio

    Artigo 20.

    1. () direito liberdade de reunio e de associao pacficas.

    Opinio

    Artigo 21.

    1. () direito de tomar parte na direco dos negcios

    pblicos do seu pas, quer directamente, quer por intermdio

    de representantes livremente escolhidos.

    2. () direito de acesso, em condies de igualdade, s

    funes pblicas do seu pas.

    3. A vontade do povo o fundamento da autoridade dos

    poderes pblicos; e deve exprimir-se atravs de eleies

    honestas a realizar periodicamente por sufrgio universal e

    igual, com voto secreto ou segundo processo equivalente que

    salvaguarde a liberdade de voto.

    Eleies, Governo e

    poder local

    Igualdade de

    gnero

    Artigo 22.

    () direito segurana social; e pode legitimamente exigir a

    satisfao dos direitos econmicos, sociais e culturais

    indispensveis, ().

    Segurana Social

  • 21

    Artigo 23.

    1. () direito ao trabalho, livre escolha do trabalho, a

    condies equitativas e satisfatrias de trabalho e proteco

    contra o desemprego.

    2. () direito, sem discriminao alguma, a salrio igual por

    trabalho igual.

    3. () direito a uma remunerao equitativa e satisfatria, que

    lhe permita e sua famlia uma existncia conforme com a

    dignidade humana, e completada, se possvel, por todos os

    outros meios de proteco social.

    4. () direito de fundar com outras pessoas sindicatos e de se

    filiar em sindicatos para a defesa dos seus interesses.

    Trabalho

    Igualdade de

    gnero

    Artigo 24.

    () direito ao repouso e aos lazeres e, especialmente, a uma

    limitao razovel da durao do trabalho e a frias peridicas

    pagas.

    Trabalho

    Artigo 25.

    1. () direito a um nvel de vida suficiente para lhe assegurar e

    sua famlia a sade e o bem-estar, principalmente quanto

    alimentao, ao vesturio, ao alojamento, assistncia

    mdica e ainda quanto aos servios sociais necessrios, e tem

    direito segurana no desemprego, na doena, na invalidez,

    na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de

    subsistncia por circunstncias independentes da sua

    vontade.

    Sade

    Segurana Social

    Artigo 25.

    2.A maternidade e a infncia tm direito a ajuda e a assistncia

    especiais. Todas as crianas, nascidas (), gozam da mesma

    proteco social.

    Famlia

  • 22

    Artigo 26.

    1. () direito educao. A educao deve ser gratuita, pelo

    menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. O

    ensino elementar obrigatrio. O ensino tcnico e

    profissional deve ser generalizado; o acesso aos estudos

    superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade, em

    funo do seu mrito.

    2. A educao deve visar plena expanso da personalidade

    humana e ao reforo dos direitos do homem e das liberdades

    fundamentais e deve favorecer a compreenso, a tolerncia e

    a amizade entre todas as naes e todos os grupos raciais ou

    religiosos, ().

    3. Aos pais pertence a prioridade do direito de escolher o gnero

    de educao a dar aos filhos.

    Educao

    Artigo 27.

    1. () direito de tomar parte livremente na vida cultural da

    comunidade, de fruir as artes e de participar no progresso

    cientfico e nos benefcios que deste resultam.

    2. () direito proteco dos interesses morais e materiais

    ligados a qualquer produo cientfica, literria ou artstica da

    sua autoria.

    Cultura

    De forma a balizar temporalmente os dados a recolher, foi decidido

    focalizar o perodo entre I Governo Constitucional ao XVIII Governo, ou seja,

    entre 23 de Julho de 1976 e 21 de Junho de 2011. A anlise das narrativas dos

    textos seleccionados orgnica e encontra-se sempre em crescimento pois a

    histria desenvolve-se de dia para dia o que implica barreiras temporais.

  • 23

    A concepo de liberdade e igualdade entre todos, com o respeito pelos

    Direitos Humanos, perdurou e concretizou-se em Portugal?

    Hiptese 1 Os Direitos Humanos reflectem-se na formulao das

    narrativas e consequente definio e execuo de polticas e aces portuguesas.

    Hiptese 2 As narrativas na rea dos Direitos Humanos, sejam polticas,

    alteraes na legislao ou aces, nem sempre so vivenciadas pela populao.

    Como se impe as consequncias perante o (in)cumprimento dos

    Direitos Humanos em Portugal?

    Hiptese 3 A definio e execuo de polticas e aces portuguesas, na

    rea dos Direitos Humanos, so determinadas pela avaliao e narrativa

    internacional.

    Hiptese 4 As consequncias perante o (in)cumprimento so mais

    vivenciadas ao nvel da imagem internacional que se projecta.

    Portugal tem um papel relevante na evoluo dos Direitos Humanos a

    nvel internacional?

    Hiptese 5 A definio e execuo de polticas e aces internacionais,

    na rea dos Direitos Humanos, so determinadas pela avaliao e narrativa de

    Portugal.

  • 24

    Capitulo I: Perspectiva Interna 89

    Neste captulo pretende-se analisar a postura interna de Portugal. Como

    Portugal se tem comportado ao longo dos tempos na rea dos Direitos Humanos,

    seja atravs da justia, como se relaciona com os outros na cena internacional,

    na sua percepo de famlia, propriedade, religio, governao, opinio,

    segurana social, trabalho, sade, cultura, entre outros.

    Justia

    Polcias

    Est explanado no Programa do I Governo Constitucional (1976-1978) a

    base da justia, verificando-se uma interpretao e integrao da Declarao

    Universal dos Direitos do Homem em que se exige o respeito dos direitos,

    liberdades e garantias dos cidados. Visto que os cidados gozavam de igualdade

    perante a lei, os privilgios foram abolidos, o que tem especial relevo perante o

    facto de Portugal ter sado de um regime ditatorial. Com esta alterao e

    declaraes desejou-se dar a garantia da igualdade perante a lei, atravs da

    reviso das funes das polcias e dos Tribunais, bem como da respectiva

    legislao (Programa do I Governo Constitucional, 1976).

    No Programa de Governo seguinte informa-se a intransigncia quanto ao

    cumprimento das leis e das decises dos tribunais judiciais para aumentar a

    aco antiterrorista e anticriminal contra o aumento da criminalidade em geral, e

    do trfico e consumo da droga em especfico (Programa do II Governo

    Constitucional, 1978). No III Governo (1978) refere-se um intensificar da aco

    8 III e IV Governo foram constitudos por iniciativa do Presidente da Repblica

    9 Em 6 de Julho de 1979, anunciou o Presidente da Repblica a sua deciso de dissolver a

    Assembleia da Repblica, tendo em vista a realizao de eleies legislativas intercalares, na sequncia da rejeio, pela Assembleia da Repblica, de uma moo de confiana apresentada pelo executivo, dando origem ao V Governo Constitucional.

    http://pt.wikipedia.org/wiki/Assembleia_da_Rep%C3%BAblica

  • 25

    desenvolvida pelas Foras de Segurana, no sentido de preservar e reforar a

    autoridade democrtica e de garantir o exerccio das liberdades fundamentais

    (Programa do III Governo Constitucional, 1978).

    Perante a necessidade de legitimar a autoridade do poder poltico, com a

    disciplina social e com a segurana das pessoas e de bens, considerou-se

    importante assegurar estruturas policiais eficazes, coordenadas e prestigiadas

    pois a funo das foras de segurana estava dispersa por vrios organismos,

    dependentes de Ministrios diversos, desenvolvendo actividades que poderiam

    sobrepor-se, e mesmo assim pareciam ser insuficientes, para garantir a

    segurana pblica (Programa do VIII Governo Constitucional, 1981). Assim, foi

    aceite em Sesso Plenria da Assembleia da Repblica que as polcias teriam a

    funo de defender a legalidade democrtica, a segurana interna e os direitos

    dos cidados e foram definidas as competncias do juiz de instruo, garantindo

    a defesa de direitos fundamentais (Assembleia da Repblica Portuguesa, 1982).

    Os polcias poderiam usar a fora em caso de tentativa de fuga ou perante

    resistncia deteno, no entanto no eram permitidos maus-tratos aos

    detidos. importante referir que quando um caso de maus-tratos policiais surge,

    este analisado em Tribunal Nacional (Human Rights Committee, 1981). Foi

    considerado pelo Governo que os casos de agresso perpetrados por agentes da

    polcia eram situao excepcionais (United States Department of State, 1996).

    Dando continuidade ao atrs referido, o X Governo (1985-1987)

    considerou indispensvel munir as foras e servios de segurana de meios

    humanos e materiais para trabalhar na preveno e represso eficaz de todas as

    aces que, sendo de natureza criminosa, pem em causa valores essenciais ao

    desenvolvimento da vida em comunidade (Programa do X Governo

    Constitucional, 1985). Foi tambm importante formar agentes da polcia, guardas

    prisionais e magistrados, atravs da Comisso para a Promoo dos Direitos

    Humanos e Eliminao da Desigualdade na Educao, a qual uma comisso

    interministerial participando na elaborao dos currculos escolares e programas

    de formao, tendo como objectivo de promover a conscincia pelos cidados

  • 26

    dos Direitos Humanos (Committee on the Elimination of Racial Discrimination,

    1992).

    Quanto s funes e procedimentos das polcias foram especficadas no

    XII Governo funes da polcia municipal (IV Reviso Constitucional - Comisso

    Eventual para a Reviso Constitucional, 1997). Aps alegaes de maus-tratos

    por parte das polcias foi determinado o Regulamento das condies

    materiais de deteno em estabelecimentos policiais. Este regulamento afecta os

    agentes da PSP e guardas da GNR, e estabelece um conjunto de requerimentos

    detalhados para melhorar as condies das custdias policiais. Estipula-se que

    todos os detidos devem ser tratados com humanidade e dignidade e todas as

    detenes devem ser registadas nas esquadras de polcias ou postos (Amnistia

    Internacional, 2000).

    Em 2002, o Governo Portugus trabalhava em conjunto com a Alemanha,

    Itlia e Espanha para desenvolver uma base de dados de crime organizados,

    estruturado pela Europol, com o intuito de melhor registar os movimentos de

    traficantes humanos e outros criminosos, especialmente provenientes da

    Ucrnia e Moldvia (United States Department of State, 2003b).

    Portugal comprometeu-se a restruturar a Polcia Judiciria para criar um

    comando operacional sobre terrorismo, corrupo, trfico de drogas e

    investigao tecnolgica nestas reas (United States Department of State,

    2007b). Sendo que em 2006, foram executados 48 mandatos de buscas sobre

    operaes para investigar situaes de lavagem de dinheiro com os Pases

    lusfonos da frica e Sul da sia que poderiam ser levadas a cabo por

    organizaes extremistas.

    Prises

    Como se pode perceber pela Histria de Portugal, as prises so um tema

    importante, especificamente as detenes e duraes destas. Portugal estipulou

    prazos especficos para as detenes. Sendo na fase de investigao possvel

  • 27

    deter entre 40 a 60 dias, na fase de acusao 4 meses, no entanto, pode ser

    extensvel a pedido do juiz (Human Rights Committee, 1981).

    A temtica das prises muito discutida, sendo que no VI Governo

    apostou-se na valorizao do trabalho profissional, recuperao dos

    estabelecimentos prisionais degradados e na disciplina interna das prises,

    compatibilizando-se a humanizao no tratamento dos reclusos com a

    autoridade do Estado e a segurana dos cidados. Pretendeu-se evoluir o

    pensamento para alm da priso atravs da regulamentao da assistncia

    prisional e ps-prisional para que fosse possvel uma reinsero social completa

    (Programa do IV Governo Constitucional, 1978). Estas medidas tiveram eco

    durante o VIII Governo onde foi estipulada uma poltica criminal, que pretendeu

    lutar contra a criminalidade grave mas sem perder de vista a humanizao das

    penas. Com esta poltica foi necessrio a reorganizao dos servios prisionais

    atravs da constituio de uma lei orgnica, reviso da poltica de assistncia

    prisional e ps-prisional, bem como a alterao do funcionamento dos Institutos

    de Criminologia. No entanto, somente o Programa do XI Governo refere a

    melhoria da formao profissional e do acesso sade dos reclusos. Sendo

    proposto assegurar um sistema gradualmente renovado, respeitador do ser

    humano e da sua dignidade para que o condenado pudesse beneficiar de

    condies facilitadoras reintegrao.

    O sistema prisional foi diversificado em Comunidades Prisionais Jovens,

    Comunidades Prisionais Integradas, Prises Tipo e Prises de Segurana

    Especfica, consoante o tipo de recluso e assim garantir a segurana, a dignidade

    da pessoa e o respeito pelos seus direitos fundamentais (Programa do XII

    Governo Constitucional, 1991). Comea-se a executar uma poltica de separao

    dos detidos em regime de priso preventiva e em cumprimento de pena; de

    jovens e de adultos; e de agentes de crimes em funo da sua gravidade

    (Programa do XIII Governo Constitucional, 1995). Contudo, nem sempre foram

    assegurados estes princpios, juntam-se, por vezes, juvenis com adultos e detidos

    com presos.

  • 28

    Em 1998, o ento Presidente da Repblica, Dr. Jorge Sampaio,

    demostrou-se preocupado com as prises portuguesa, descrevendo-as como um

    verdadeiro escndalo nacional (sic.), referindo a sua sobrelotao10 e

    detenes prolongadas, entre outras situaes precrias (Amnistia Internacional,

    1999). Dez anos mais tarde foi necessrio discutir os problemas existentes nestes

    estabelecimentos, entre os quais a degradao, sobrelotao, falta de condies

    de trabalho dos guardas prisionais, ausncia de planos individuais de

    ressocializao, falta de condies higieno-sanitrias e dificuldade no acesso a

    cuidados de sade. Esta discusso ocorre devido a denncias por parte do

    Provedor de Justia, da Amnistia Internacional, do Sindicato dos Guardas

    Prisionais e outras vrias associaes de defesa dos direitos dos reclusos

    (Assembleia da Repblica Portuguesa, 2008). Eram referidas vrias situaes de

    maus tratos e morte nas prises portuguesas, as quais foram investigadas por

    instituies internacionais, como por exemplo a morte de um preso na priso do

    Linh em 1997 (United States Department of State, 2000).

    Foram desenhadas novas medidas, em 2009, para que os detidos na

    Polcia Judiciria Criminal, e sob a sua administrao, dentro de tribunais e

    servios pblicos de acusao fossem informados de forma compreensiva

    quanto s razes para a sua deteno e os seus direitos. No mesmo ano, foi

    criado o Primeiro Programa para o Combater a Entrada e Circulao de

    Narcticos e outras Substncias Ilcitas em Estabelecimentos Prisionais, foram

    desenvolvidos programas adaptados para intervir em vrios tipos de crimes,

    como por exemplo crimes sexuais, trnsito, desenvolvimento de competncias

    emocionais e preveno do suicdio.

    Apesar de se considerar que a reforma, de 2004, ao sistema prisional

    ainda foi terminada, foram registadas melhorias efectivas, entre as quais a

    abertura de novos estabelecimentos prisionais, diminuio da sobrelotao e

    aumento de pessoal formado (United Sates Department of State, 2006). As

    10

    Por exemplo, em 1998, a priso de Caxias com capacidade de 640 presos, albergava 908 e a priso de Tires com capacidade de 511 albergava 994.

  • 29

    condies das prises foram melhoradas, entre as quais a sobrelotao,

    condies sanitrias (Brtolo, 2013).

    Tribunais

    Com o fim da ditadura, os actos de terrorismos11 foram alvos de anlise

    sendo a sua definio alterada no Cdigo Penal, passando a constituir uma das

    maiores penas para aqueles que atentassem contra o Estado. Seja atravs de

    recrutamento, incitamento em foras militares externas, comportamento

    ofensivo para com os diplomatas que coloque a vida em perigo, crimes contra o

    Presidente da Repblica ou membros de rgos soberanos (Human Rights

    Committee, 1981).

    Portugal foi e continuamente condenado pelo Tribunal Europeu dos

    Direitos do Homem devido aos atrasos da justia. Uma questo de especial

    relevo a necessidade de aumentar a rapidez e eficcia da justia. Neste

    pressuposto, considerou-se imprescindvel libertar os tribunais de actividades

    que poderiam ser resolvidas noutras instncias, desenvolvendo-se para tal

    mecanismos alternativos, especificamente os centros de arbitragem. Estas

    alteraes ocorreram sem colocar em causa que uma justia rpida no podia

    deixar de proteger os cidados contra a criminalidade violenta ou organizada e

    contra a pequena criminalidade (Programa do XI Governo Constitucional, 1987).

    No contnuo desta questo, o XII Governo, pretendeu facilitar o acesso ao direito

    e justia e uma maior transparncia. Para tal, desenvolveram a instalao de

    novos Centros de Arbitragem de Conflitos, para a desjudicializao do sistema,

    incluindo a instalao de Comisses de Proteco de Menores12 (Programa do XII

    Governo Constitucional, 1991). Foram aplicadas medidas de emergncia para

    reduzir o nmero de pendncias e aumentar a rapidez dos processos, atravs do

    11

    Decreto-Lei n. 207-A/75, de 17 de Abril; Lei 24/81, de 20 de Agosto 12

    Decreto-Lei 189/91

  • 30

    reforo do projecto dos Julgados da Paz13 e a criao de jurisdies

    especializadas (Programa do XV Governo Constitucional, 2002).

    A discusso quanto ao descongestionamento dos Tribunais continua ao

    longo dos anos, sendo priorizada no Programa do XVII Governo Constitucional

    (Programa do XVII Governo Constitucional, 2005). Foram aprovadas em 200514 as

    seguintes medidas, alterao ao regime jurdico do pagamento dos prmios de

    seguro15, alterao ao regime jurdico do cheque sem proviso16, Alterao ao

    regime da injuno17, alterao ao regime jurdico das frias judiciais18,

    converso das transgresses e contravenes ainda existentes em contra-

    ordenaes19, incentivos excepcionais para o descongestionamento das

    pendncias judiciais e demonstrao da incobrabilidade de crditos20, criao de

    um tratamento especfico para os litigantes de massa21 e competncia territorial

    para aces relativas ao cumprimento de obrigaes22. Novas medidas foram

    aprovadas em Conselho de Ministros23, em 2007, destacando-se as seguintes,

    estabelecimento de um regime temporrio e especial de incentivo extino da

    instncia24, criao de centros de arbitragem com competncia em matria de

    aco executiva25, reviso do regime jurdico da locao financeira26,

    desjudicializao do processo de inventrio27, criao de um centro de

    13

    Lei n. 78/2001, de 13 de Julho - Lei de Organizao, Competncia e Funcionamento dos Julgados de Paz 14

    Resoluo do Conselho de Ministros n 100/2005 15

    Decreto-Lei n. 122/2005, de 29 de Julho, e Decreto-Lei n. 199/2005, de 10 de Novembro 16

    Lei n. 48/2005, de 29 de Agosto 17

    Decreto-Lei n. 107/2005, de 1 de Julho 18

    Lei n. 42/2005, de 29 de Agosto 19

    Leis n.s 25/2006, de 30 de Junho, 28/2006, de 4 de Julho, e 30/2006, de 11 de Julho (rectificada pela Dec. de Rectificao n. 47/2006, de 7 de Agosto) - Procede converso em contra-ordenaes de contravenes e transgresses em vigor no ordenamento jurdico nacional 20

    Art. 45, art. 66, art. 67 da Lei do Oramento de Estado para 2006 (Lei n. 60-A/2005, de 30 de Dezembro) 21

    Decreto-Lei n. 108/2006, de 8 de Junho 22

    Lei n. 14/2006, de 26 de Abril 23

    Resoluo do Conselho de Ministros n. 172/2007 24

    Decreto-Lei n. 385/2007, de 19 de Novembro 25

    Decreto-Lei n. 226/2008, de 20 de Novembro 26

    Decreto-Lei n. 30/2008, de 25 de Fevereiro 27

    Lei n. 29/2009, de 29 de Junho

  • 31

    arbitragem para dirimir conflitos em matria de propriedade industrial28, criao

    de mais Julgados de Paz29, alterao do regime das custas judiciais30 e reviso do

    regime jurdico dos processos de indemnizao por acidente de viao e do

    regime jurdico da concesso de penses de alimentos ou de sobrevivncia31.

    O XV Governo Constitucional32, desenvolveu a rea das vtimas, aces de

    tutela dos seus interesses, o combate violncia, particularmente a violncia

    domstica, a explorao da prostituio, o combate s redes de explorao e

    trfico de mulheres e crianas para fins de explorao sexual, incluindo medidas

    de preveno da violncia e de apoio s vtimas, tendo em conta a necessidade

    de cooperao com outros pases. Por outro lado, pretendia-se um combate

    eficaz ao crime mas a salvaguarda dos direitos dos arguidos, a humanizao do

    sistema prisional e a eficincia do sistema de reinsero social e represso e

    reabilitao dos agressores (Programa do XV Governo Constitucional, 2002). Para

    permitir o direito defesa do arguido foram aumentados os meios de defesa do

    deste, no que se refere prova da verdade das imputaes (Programa do XIII

    Governo Constitucional, 1995). Quando algum acusado em Portugal tm

    direito a aconselhamento jurdico e advogado gratuito em Tribunal (Committe

    for Elimination of Racial Discrimination, 1988).

    No XVI Governo Constitucional33 pretendeu-se reforar o apoio s vtimas

    de crimes, atravs de instituies de solidariedade social e reviso do sistema de

    28

    Decreto-Lei n. 143/2008, de 25 de Julho 29

    Decreto-Lei n. 22/2008, de 1 de Fevereiro, Decreto-Lei n. 60/2009, de 4 de Maro, e Decreto-Lei n. 289/2009, de 8 de Outubro 30

    Decreto-Lei n. 34/2008, de 26 de Fevereiro foi, posteriormente, alterado pela Lei n. 43/2008, de 27 de Agosto, pelo Decreto-Lei n. 181/2008, de 28 de Agosto, e pela Lei n. 64-A/2008, de 31 de Dezembro 31

    Decreto-Lei n. 153/2008, de 6 de Agosto 32

    XV Governo Constitucional inicia funes num contexto poltico muito particular: na sequncia de uma crise poltica precipitada pela demisso do anterior Primeiro-ministro, Dr. Jos Manuel Duro Barroso, que obrigou a interromper a meio a legislatura, no quadro de uma grave crise financeira e econmica do Pas e num clima geral de preocupao e de falta de confiana dos Portugueses. Sendo Duro Barroso nomeado para Presidente da Comisso Europeia 33

    O Programa de Governo muito semelhante ao do XV Governo, situao congruente ao que apresentado pelo ento Primeiro-ministro Pedro Santana Lopes que informa querer cumprir o Programa do anterior Governo Constitucional.

  • 32

    indemnizao das vtimas de crimes34 (Programa do XVI Governo Constitucional,

    2004).

    de assinalar que somente com o Programa do XVII Governo

    Constitucional, se precisou a necessidade, de reviso do Cdigo de Processo

    Penal35, onde se explicitam as competncias dos sujeitos e participantes

    processuais (juzes, magistrados do Ministrio Pblico, advogados e rgos de

    polcia criminal) na investigao e garantia dos direitos de vtimas e arguidos,

    designadamente, os regimes do segredo de justia, das escutas telefnicas e da

    priso preventiva, de modo a torn-los inequivocamente congruentes com os

    princpios e normas constitucionais.

    Na temtica do Provedor de Justia cujo cargo foi criado em 1975 com o

    Decreto-Lei n.212/75, de 21 de Abril, o objectivo era fundamentalmente

    assegurar a justia e a legalidade da Administrao Pblica atravs de meios

    informais, investigando as queixas dos cidados contra a mesma Administrao e

    procurando para elas as solues adequadas (sic.) (Histria da Instituio, s.d.).

    Em 2011, na Comisso Eventual para a Reviso Constitucional foi discutido o

    papel do Provedor de Justia. Sendo proposto aumentar as competncias,

    permitindo a possibilidade no s de recomendaes mas tambm intimaes

    para que haja obrigatoriedade de fundamentao do no-cumprimento ou

    cumprimento e possibilidade de reaco quando no h resposta s

    recomendaes. Foi tambm discutido a limitao dos mandatos/ tempo do

    Provedor de Justia para possibilitar a independncia desta figura, e o

    desbloquear da candidatura a Provedor de Justia a um maior nmero de

    proponentes, desde que propostos por mais de 4000 cidados eleitores. Mais, se

    discutiu, a obrigao de cooperao por parte dos visados e a possibilidade de

    cidados militares recorrerem directamente ao Provedor de Justia (igualdade

    entre cidados) (VIII Reviso Constitucional - Comisso Eventual para a Reviso

    Constitucional, 2011)

    34

    Lei n. 104/2009 de 14 de Setembro - Aprova o regime de concesso de indemnizao s vtimas de crimes violentos e de violncia domstica 35

    Lei n. 48/2007, de 29/08, Rect. n. 100-A/2007, de 26/10

  • 33

    Menores

    Numa abordagem quanto matria da Justia de Menores procedeu-se,

    no plano da organizao judiciria, criao de Tribunais de Competncia

    Especializada Mista36, e no domnio da interveno comunitria, criao de

    Comisses de Proteco37, elegendo-se como reas a privilegiar, as da criana e

    do jovem em risco, e da criana maltratada ou negligenciada, bem como a

    ressocializao e gradual integrao na sociedade dos menores desadaptados e

    marginalizados (Programa do XII Governo Constitucional, 1991).

    Na continuao desta poltica que incidia nos menores o XIII Governo

    props aperfeioar e diversificar as formas de apoio e/ou tratamento, em

    actuao conjunta com as autarquias e as IPSS, entre outras, distinguindo

    situaes de disfuncionalidade ou carncia social das situaes relacionadas com

    a delinquncia juvenil. Assim, pretendeu-se assegurar uma coerncia com as

    orientaes j estipuladas pela Unio Europeia, o Conselho da Europa, pela

    Organizao das Naes Unidas e pelas Conferncias de Ministros da Justia dos

    Pases de Lngua Oficial Portuguesa e dos Pases Ibero-Americanos (Programa do

    XIII Governo Constitucional, 1995).

    Mais, pretendeu-se a reforma da proteco de crianas e jovens em

    risco38, sujeitas a maus-tratos, abusos sexuais, abusos de autoridade, negligncia

    e abandono. Por outro lado, esta proteco deveria incluir crianas que, com o

    seu prprio comportamento, coloquem em causa o seu desenvolvimento. Para

    tal, formulou-se uma cobertura nacional de Comisses de Proteco de

    Menores, e um sistema de acolhimento de emergncia temporria (Programa do

    XIII Governo Constitucional, 1995). Por seu lado, o Provedor de Justia criou uma

    linha de Apoio Criana, em 199339, para o atendimento de menores ou adultos

    que tenham conhecimento de situaes em que os direitos das crianas tenham 36

    Decreto-lei 206/91, de 7 de Junho 37

    Decreto-Lei n 189/91 de 17/5 38

    Resoluo do Conselho de Ministros n. 193/97 39

    Em 1988 o IAC Instituto de Apoio Criana criou o SOS-Criana, o Atendimento Telefnico especializado

  • 34

    sido violados, em risco ou negligenciados (Provedor de Justia, 2013). Foi

    lanada, em 2008, a Rede Nacional de Centros Educativos40 com o intuito de

    reabilitar e reintegrar menores (Brtolo, 2013). Aprofundando tambm a

    temtica do jovem na rea criminal definiu-se como objectivo a alcanar

    deteco precoce de situaes de risco ou de delinquncia e preveno de

    reincidncia na prtica de crimes (Programa do XVIII Governo Constitucional,

    2009).

    No XVI Governo aprofunda-se esta temtica ao planear uma poltica

    para a criana de modo a afirmar - o primado do direito na problemtica da

    criana em risco, vitimada ou sem famlia, dando relevo e importncia da

    sociedade civil no apoio criana. Sendo assim, tornou-se necessrio estabelecer

    e reforar pontes activas entre a segurana social e a sade, agilizar as relaes

    entre a segurana social e os tribunais e agilizar e temporizar o acolhimento em

    instituies de todas as crianas. Estipularam-se limite aos perodos de

    permanncia (1 a 3 anos), pois torna-se bvio a importncia de

    desinstitucionalizar crianas atravs da reavaliao, bem como por agilizao

    desburocratizada da adopo (Programa do XVI Governo Constitucional, 2004).

    Foram discutidos os Direitos das Crianas na Assembleia da Repblica, e,

    para tal, incidiu-se sobre a proteco das crianas e jovens em perigo atravs de

    reviso da legislao, do papel das comisses e criao de uma base de dados

    quanto estas crianas. Foi informada a Assembleia que o nmero de crianas e

    jovens em risco teria aumento devido a factores, entre os quais, o abandono, o

    insucesso escolares, os maus-tratos fsicos, os abusos sexuais, a fome e a

    negligncia familiar. Foram referidas dificuldades vivenciadas, como a falta de

    tcnicos, meios financeiros das Comisses e a necessidade das crianas

    poderem, em situaes de risco e quando os pais/ responsveis so as pessoas

    que colocam estas em risco, denunciarem os casos perante o Ministrio Pblico.

    Foi igualmente apresentada a necessidade de preveno, tal como a necessidade

    de colocar o interesse superior da criana acima do interesse superior de pais/

    40

    Portaria n. 102/2008, de 1 de Fevereiro

  • 35

    famlia biolgica negligentes ou maltratantes irrecuperveis (Assembleia da

    Repblica Portuguesa, 2006).

    O Programa do XVII Governo Constitucional desenvolveu esta ltima

    informao e pretendeu um sistema de acompanhamento e avaliao regular

    das instituies do Estado que acolhem crianas em risco e desenvolveu, o j

    referido banco de dados sobre crianas em risco. Tendo como medidas mais

    especficas a desinstitucionalizao de 25% dos jovens acolhidos e utilizao de

    uma rede de apartamentos de autonomizao para jovens em risco e para

    pessoas com deficincia (Programa