não culpe as estrelas

68

Upload: divino-batista

Post on 01-Oct-2015

49 views

Category:

Documents


1 download

DESCRIPTION

''Sempre que Manu (Manoela) se relacionava com alguém, algo sempre dava errado, e o resultado… acabava sozinha outra vez. Cansada do "entra e sai" de pessoas na sua vida e de sofrer desilusoes, ela desiste de procurar a sua alma gêmea. E tudo ocorreu como previa, exceto quando Rafa (Rafael) pede-a em namoro de verdade. Indecisa, Manu não tem idéia do que responder ao Rafa, pois… e se ela dizer sim, e o namoro acabar como todos os outros? O relacionamento irá por água abaixo? Será que a sua alma gêmea e o Rafael são a mesma pessoa?''

TRANSCRIPT

  • Divino Batista & Maria Luza

    ROMANCE

  • Copyright 2015 do texto: Divino Batista e Maria Luza Copyright 2015 da edio: GTV Editorial

    editora executiva: Amanda Batista

    preparao de texto:

    Divino Batista

    projeto da capa: Divino Batista

    finalizao do arquivo:

    Divino Batista

    Batista, Divino Luza, Maria

    No culpe as estrelas/ Divino Batista e Maria Luza Gois, GTV Editorial, 2015

    1. Romance, Fico Juvenil I. Ttulo.

    II. Recurso Eletrnico

    1 edio Maro 2015

    Reproduo proibida.

    Art. 184 do Cdigo Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

    GTV Editorial [email protected]

    www.cannalgtv.wix.com/livros

  • Dedicamos este livro a todos aqueles que acreditam em seus

    receptivos sonhos e no se deixem cair por pura crtica negativa.

  • Prlogo:

    Manu No sei o que h de errado comigo. Pelo que sei, no nasci com nenhuma doena, e nem sofri nenhum acidente que tenha me causado feridas desagradveis. No posso, porm, fugir do pensamento de que deve existir, sim, um defeito em mim. Um no, vrios (eu creio). S pode ser isso, ou ento como explicar o fato de meus relacionamentos nunca darem certo? Por que os meus poucos namorados nunca se apaixonaram verdadeiramente por mim, da mesma forma que eu me apaixonei por eles? Por que, enfim, meus namoros (se que posso chamar o que vivi de namoro) no duraram mais do que algumas mseras semanas? Talvez eu devesse dar mais ouvidos ao que a Pam e Kelly me dizem. Seja me zoando ou me alertando, nem sei, a verdade que de uns tempos pra c elas comearam a me falar que est escrito na minha testa algo do tipo: "Entre, fique o tempo que quiser e, o principal, bagunce vontade!". Confesso que estou comeando a achar que elas tm razo. Sim, s pode!

  • Porque s algo assim explica a facilidade das pessoas entrarem, fazerem a maior zona e sarem depois, tudo isso sem a menor cerimnia! O difcil dessa situao, porm, no lidar com esse entra e sai. O complicado mesmo perceber que essa baguna toda s se d porque eu mesma dou a chave, abro a porta e de quebra ainda ofereo cafezinho. Mas isso vai mudar! Ah, se vai... ''Voc tem uma nova mensagem'' a janelinha de notificaes do Facebook aparece no meu celular. O Rafael est on-line e, o melhor, ele quer conversar comigo. E agora? O que eu falo?

    Rafa Quando a vida te aproxima de pessoas que tm o dom de ver alm, ela faz tudo parecer mgica. Sobrenatural. E mesmo sabendo que nada foge naturalidade no universo, impossvel conter o espanto quando a sua verdade, essa que voc guarda s pra si, aparece to clara e to bvia para o olhar do outro. Ontem algo assim aconteceu comigo. Mesmo sem me conhecer, ela me viu por inteiro. Mesmo sem trocarmos uma palavra sobre, ela respondeu todas as minhas perguntas.

  • Ela, que com sua voz de anjo encantou meus ouvidos, sem que eu percebesse leu tambm minha alma e fortaleceu a certeza do meu corao. Pelo menos foi assim que eu me senti quando teclamos at a meia-noite de ontem.

  • Droga! Eu no acredito que eu estava a ponto de dizer a ela. Eu realmente iria dizer a ela que estou apaixonado? Logo agora que ela ta se abrindo mais comigo, perdendo pouco a pouco aquele jeito arredio de ser... Ser que o melhor momento, Rafael? E agora? Eu no posso simplesmente voltar e dizer a ela o que eu estava preste a dizer. E se a Manu entender tudo errado? No quero que ela me ignore. No quero perder a amizade

  • da Manu, ainda que agora eu j saiba que a quero na minha vida num papel bem mais especial que o de amiga.

  • 1. Por que nada o que parece ser? Manu

    Acordei hoje de manh ainda com a caneta na mo

    e a minha agenda entreaberta, cada no cho aos ps da cama. Imediatamente me veio lembrana a conversa que tive com o Rafa na noite anterior, as palavras que ele me disse e que pela primeira vez me pareceram carregadas de um significado a mais, as reticncias colocadas ao final de algumas frases que pareciam muito mais um sinal de insegurana que de simples pontuao.

    Era impresso minha ou Rafael estava me flertando quela hora da madrugada? Eu, Manoela, expert em fantasiar tudo o que acontece ao meu redor, no sabia o que pensar, e sem querer deixei que o silncio comeasse a se fazer entre ns. Talvez por ter percebido o meu constrangimento, ou por ter interpretado o meu

  • sbito mutismo como indiferena, sei l, o fato que Rafa

    se despediu rapidamente depois de ter dito que no via hora de nos encontrarmos pessoalmente, que ansiava pelo momento em que poderia me abraar e olhar no fundo do azul dos meus olhos, que ele achava muito mais bonito que o azul do cu e do mar juntos. Literalmente petrificada ao ler aquelas palavras na tela do meu celular, eu mal tive tempo de dizer-lhe o fica com Deus costumeiro quando ele, ploft, desconectou o chat do facebook. No preciso dizer que ainda fiquei por quase meia hora relendo nossa conversa, subindo e descendo a janelinha do messenger, tentando me convencer de que eu estava vendo plo em casca de ovo, chifre em cabea de cavalo e, principalmente, de que o meu amigo virtual no estava se declarando pra mim. Eu preferia acreditar nisso a passar por uma iluso novamente...

    Custei a dormir. Lembrei do modo como Rafael e eu nos conhecemos num grupo de leitura do facebook. Eu f incondicional de romances e ele completamente apaixonado por sagas do tipo Harry Potter e Jogos Vorazes. No incio da nossa amizade eu relutei bastante, policiava a mim mesma constantemente, pois tudo o que eu no precisava naquele momento era arranjar uma paixonite virtual. Mas, com o passar do tempo, uma parte de mim foi relaxando, e sem perceber deixei de temer a proximidade que se fazia cada vez mais entre a gente. Conversvamos praticamente todos os dias, mais de uma vez por dia at, e at esse aparente flerte do Rafa, eu no havia me dado conta do quanto estvamos presentes na vida um do outro, e mais, do quanto ele me faria falta se um dia a gente deixasse de se falar. S de pensar nessa

  • possibilidade, senti um aperto gigante no meu peito. Eu

    no queria, no podia estragar tudo novamente com as minhas fantasias, no com ele. E se Rafa no estivesse se declarando coisa nenhuma? E se fosse coisa da minha cabea, da minha irritante mania de buscar significados inexistentes por trs de palavras que s expressam aquilo que dizem? Eu simplesmente no sabia o que pensar e apesar do relgio no criado-mudo j apontar quase duas horas da manh, comecei a fazer o que sei de melhor: escrever.

    No lembro quando adormeci, e se no fosse o despertador tocando sem parar e as batidas insistentes da minha me na porta do meu quarto, o provvel que eu teria dormido no mnimo at o meio-dia. Nada pior que uma noite mal dormida, certo? Com o meu corpo ainda implorando por pelo menos mais dez minutos na cama sob o calorzinho do edredom, tive que fazer um esforo enorme para levantar e seguir direto para o banheiro. Um banho frio - eu detesto banho frio! - com certeza melhoraria minha cara de sono ou, pelo menos, evitaria os repetitivos comentrios dos meus pais sobre o cuidado que devo ter para dormir cedo, e no ficar na internet at altas horas da madrugada. Enfim, mesmo tendo acabado de acordar, eu estava cansada e no queria outros aborrecimentos logo no incio do dia. Assim, tomei um banho rpido, sequei o cabelo apenas o suficiente para fazer um rabo de cavalo, fiz uma maquiagem leve e vesti a primeira roupa decente que encontrei no guarda-roupa. Trabalhar na biblioteca da cidade s vezes era um saco porque me impedia de usar os jeans e as regatas que eu tanto amo. Acho que fiquei com uma aparncia apresentvel, j que pelo menos dessa vez minha me no disse nada a respeito. Tomei um caf rpido para apro-

  • veitar a carona do meu pai e, assim, evitar o possvel

    atraso que a espera no ponto de nibus causaria. O fato que apesar de parecer mais um dia comum

    na minha vida to marcada pela rotina que eu deliberadamente estabelecera ao longo dos anos, eu sabia que alguma coisa estava fora do lugar. E claro que esse alguma coisa tinha a ver com o Rafa, e com as frases dele que no me saiam da cabea. "Por que ele tinha de me dizer aquilo meu Deus? E ainda mais daquela forma?" Eu repetia essas perguntas pra mim mesma a cada cinco minutos, enquanto desesperadamente tentava me concentrar nos comentrios que o meu pai fazia a respeito do absurdo que era o aumento da gasolina durante essa crise poltica e financeira em que o pas se encontra. Acho que ele acabou percebendo que eu no estava muito atenta aos seus desabafos, coitado, e optou por ligar o cd player e deixar que Never say never do The Fray preenchesse o silncio dentro do carro. "Pxa, valeu mesmo Pai!" - eu disse mentalmente - ""Nunca diga nunca" era exatamente o que eu precisava ouvir pra ficar ainda mais confusa no que diz respeito a todo esse meu recente conflito de sentimentos envolvendo o Rafael."

    Papai me deixou na calada da biblioteca exatamente s 8h:56mim. Eu cheguei portanto 4 minutos adiantada e tudo teria sado de uma forma quase perfeita se meu celular no tivesse comeado a vibrar dentro da bolsa que eu sempre carrego comigo. Dentro dela eu tenho praticamente um kit de sobrevivncia, alm das roupas que levo para trocar na academia e, claro, das apostilas do curso de fotografia. Como caminhar at minha sesso na biblioteca e encontrar o celular dentro da bolsa ao mesmo tempo, antes que ele parasse de chamar?

  • Eu no seria a Manoela se conseguisse realizar tal

    faanha, n? Ento acabei me embaralhando toda ao deixar cair meu estojo de maquiagem na entrada do prdio, enquanto procurava o bendito telefone, o que no fim das contas nem adiantou muito. Ele parou de tocar antes que eu o alcanasse, e eu s pude perceber que era o Rafa por causa do seu nmero e da sua foto que ficou estampando a tela do aparelho que, agora, eu segurava nas minhas mos trmulas. "OMG! O que ele quer agora?!" - eu me perguntei enquanto apanhava minha maquiagem no cho. "Calma, Manuzinha, ele te liga todos os dias, por que no faria isso hoje?" - meu lado sensato pareceu ter acordado finalmente e, com esse pensamento eu consegui finalmente caminhar at o meu balco de trabalho na ala 1 do prdio. Pena que no consegui escapar do olhar quase mortal da dona Carmen, a diretora geral da biblioteca Machado de Assis.

    Depois de quase quinze minutos de sermo da queridssima senhora, finalmente pude parar um pouco os meus pensamentos e me concentrar no caos que minha vida tinha se tornado desde a madrugada. Putz! Por que no escutei pelo menos ontem os conselhos da minha me, e fui dormir s 23h? Se tivesse feito isso, o Rafa no teria me falado todas aquelas coisas e consequentemente eu no estaria hoje com a cabea cheia de minhocas. Por Deus! Ser que existe uma garota mais analfabeta do que eu nesses assuntos do corao? Por que pra mim as coisas nunca se apresentam como realmente so? At ontem ele era apenas meu amigo, o cara com que eu abria o meu corao, a pessoa para quem eu falava sobre o quanto a solido me assusta e do medo que eu tenho de envelhecer sozinha. Pelo menos era como amigo que eu o enxergava... T, tudo bem... Eu reconheo que no gosto

  • muito de v-lo falar sobre as amigas da faculdade,

    principalmente quando o assunto tem a ver com a tal Priscila. No tem muito tempo ele me disse - um tanto envergonhado - estar suspeitando que ela sentisse algo alm de amizade por ele. "Vira e mexe a Pri arranja um jeito de me abraar ou mesmo me tocar, Manu." - ele falou, e desde ento eu fico me perguntando como uma garota pode ser assim, to atirada. Que raiva dessa menina! An? Perai, como assim? O que estou pensando?!! Aaaah, no! Isso no pode est acontecendo!!! Ser que eu me apaixonei pelo Rafa e no percebi essa tragdia at ontem? Jesus Cristinho, pensa bem garota, ele, Rafael seu amigo. S seu amigo, lembre-se disso e no confunda as coisas!

    Estava com minha mente completamente confusa quando escuto a notificao de uma nova mensagem no celular. Pego o aparelho no meu bolso e vejo rapidamente na tela:

    Pronto. Ligar para o Rafa nunca foi difcil pra

    mim, mas, dessa vez, eu preferiria mil vezes subir e descer

  • correndo o Everest, a ter que fazer isso no estado de

    confuso em que eu me encontro. Bom, acho que no tenho alternativa, no vou ter como fugir dele o tempo todo, e para falar a verdade, eu nem quero isso. Na verdade, eu nem sei o que quero, j que agora no tenho certeza do papel que ele quer que eu tenha na vida dele. O que eu sei, a nica coisa que sei, que eu me detestaria se por conta dessa histria que por enquanto s existe na minha cabea, eu visse a estragar a nossa amizade. Eu no me perdoaria se isso acontecesse. Pensando nessa possibilidade e sentindo um aperto no peito, disquei rapidamente o nmero do Rafa na tela. No segundo toque ele atende.

    Oi, Manu. Que bom que voc retornou minha ligao.

    Oi, Rafa. Ento, eu me atrasei toda hoje cedo e acabei no conseguindo te atender quando voc ligou. T tudo bem? Aconteceu alguma coisa? perguntei tentando esconder o nervosismo que por pouco no me tirava a voz.

    Ah, ta sim. Tudo bem. Liguei porque queria conversar sobre ontem, sobre eu ter sado daquele jeito no meio da nossa conversa, quase.

    Huumm... relaxa Rafa. Eu tambm j estava com sono... comecei a dizer quando ele me interrompeu.

    No, Manu. ... huum... eu no estava com sono, s pensei que talvez estivesse indo longe demais.

    Ai meu Deus, o que ele vai dizer agora. Me ajuda, meu pai!

    Como assim, indo longe demais? perguntei depois do silncio que ficou do outro lado.

  • Manu, quando a gente vai se encontrar

    pessoalmente? J tem o qu, oitos meses que nos conhecemos?

    Sim, oito meses e 13 dias eu falei e depois me dei conta da bandeira que dei.

    Nossa, voc contar at os dias me deixa contente, talvez seja sinal de que voc est to ansiosa quanto eu. ele falou sorrindo, e fazendo aquele barulhinho engraado que eu j conhecia por causa das nossas conversas no skype.

    Ah, voc sabe que sou boa de memria, n? tentei disfarar.

    Sim, eu sei. ele riu novamente e continuou - Mas me diz, quando a gente vai poder se encontrar? Nossas cidades nem so to distantes uma da outra. Eu posso ir a ou, se voc preferir, pode vir aqui me visitar. O que voc acha?

    Foi a que me veio memria s comemoraes relativas s festas juninas e ao arrai do Departamento de Cincia e Tecnologia Aeroespacial, aqui em So Jos dos Campos. Pensei que esse seria um momento legal para a gente se encontrar.

    Rafa, ento, lembra que te falei que daqui h quinze dias ser o aniversrio da cidade? perguntei.

    Claro. Lembro sim, o que isso tem a ver com o nosso encontro?"

    "Nosso encontro", essas duas pequenas palavras ficaram ecoando dentro da minha cabea, e eu nem me dei conta de que tinha ficado calada at ouvir os chamamentos repetitivos dele no outro lado da linha.

    Manu? Manu? Cad voc? Ainda ta a?

  • An... ah.. t, t sim. que... ento, na abertura

    das comemoraes vai haver um baile de mscaras, se voc pudesse vir, acho que seria uma noite bacana para a gente se encontrar. eu respondi j me arrependendo de ter comeado esse convite.

    Claro que eu posso ir, Manu! - ele falou, rindo novamente Na verdade eu vou adorar ir. Te encontrar tudo o que quero...

    Eu no o deixei continuar porque eu no sabia o que ele iria dizer, e aquela conversa j tinha se estendido demais naquele momento.

    Legal ento, Rafa. Combinado. Preciso desligar agora, a dona Carmem t vindo inventei uma meia mentira e eu j levei uma bronca dela hoje, no quero levar outra e ser acusada de assassinato depois. disse tentando fazer graa.

    Tudo bem. Beijo, Manu. Mais tarde a gente se fala. Tchau.

    Tchau, Rafa. Beijo.

    ***

  • 2. Quando os sentimentos se transformam...

    Rafa Eu estava com muita, mais muita dor de cabea

    quando o porteiro veio me avisar que o Olly (o meu cachorro) tinha fugido outra vez. A verdade que se arrependimento matasse, eu estaria morto literalmente. Por que cargas dgua no aproveitei o feriado do carnaval para me dedicar aos meus romances, ao invs de sair por a com os meus dois piores/melhores amigos de infncia e tomar o maior porre da minha vida? Eu poderia ter recusado o convite deles, inventado uma desculpa qualquer que, certamente, no faria diferena nenhuma, pois eles torrariam minha pacincia da mesma forma, mas, enfim, poderia ter dito um simples e objetivo no. Mas eu estava to apreensivo quando eles me ligaram, tinha acabado de conversar com a Manu e achava que tinha feito a maior burrada da minha vida. Eu precisava relaxar e por isso falei para eles virem me buscar, apesar de no relgio j apontar quase 1h da manh.

    Agora estava eu ali, com uma dor de cabea dos infernos, e sem me lembrar muita coisa do que fizemos na balada, a no ser do fato de ter sido carregado por Rodrigo e Marcelo. Imagino que eles me trouxeram para o meu apartamento e me jogaram na cama, o que me faz constatar que eles no so amigos to ruins assim. Mas, a pior parte de toda essa histria foi ter sido acordado pelo irritante barulho do despertador no meu celular. Minha vontade ao ouvir o bendito alarme foi a de jogar o

  • aparelho na parede e voltar a dormir, mas a a campainha

    comeou a tocar repetidamente e, mesmo me arrastando pelas paredes, eu tive de levantar. Era seu Rogrio, o porteiro do prdio, que ansioso me falava sobre mais uma fuga do Olly.

    Desculpe, Sr. Rafael, mas quando dei por mim, o danado do cachorro, que alis super esperto, j havia pulado a catraca e atravessado para o outro lado da rua. seu Rogrio desabafava, enquanto eu rezava para que ele colocasse um ponto final naquela histria.

    No se preocupe com isso, seu Rogrio! Daqui a meia hora ele est de volta, como sempre. grunhi, enquanto andava de um lado para o outro como um bbado ainda perdido entre os sonhos.

    Tudo o que eu queria era deitar na minha enorme cama de casal e voltar a dormir. O Olly no tinha tanta importncia naquele momento. Eu tinha certeza de que ele voltaria. Ele sempre voltou. E dessa vez no seria diferente, seria?

    Depois de tranqilizar seu Rogrio, dei meia volta e entrei novamente no elevador. Por um segundo eu acreditei que acabaria dormindo ali mesmo, o que provavelmente teria acontecido se meu celular no tivesse vibrado no bolso da minha cala jeans, causando-me um pequeno e angustiante susto. Custei a peg-lo e quando o fiz, vi o rosto do co-responsvel pela minha ressaca no visor do aparelho.

    O que voc quer comigo a essa hora, Rodrigo? eu disse entre os bocejos, assim que coloquei o celular sobre a orelha.

    Reclamando de qu, Rafael? Pela a primeira vez na vida voc desgrudou sua bunda dessa cadeira para fazer algo de verdade. ele me desafiou do outro lado

  • da linha No sei como voc suporta passar horas e

    horas em frente esse computador. Alis, aposto que voc j est sentado naquela cadeira outra vez.

    No tenho tempo para ouvir cimes de amigo, Rodrigo. eu o encarei, mesmo estando apenas pelo telefone Parece a minha me me dando sermo, cara. Tem que aprender a respeitar a minha privacidade, afinal, no perco o meu tempo perguntando o que voc faz com a sua. E quer saber por que eu passo muito tempo com a bunda colada naquela cadeira? muito simples, cara. Eu tenho uma srie de livros que ainda no terminei, e caso voc j tenha se esquecido deste detalhe, devia ao menos ter uma ideia da importncia que isso tem para mim. Ou eu entrego essa srie em duas semanas, ou digo adeus a minha carreira de escritor.

    Eu no fazia ideia de que me tornaria um escritor aos vinte e dois anos de idade, e muito menos que as coisas se desenrolariam to rapidamente. Tudo aconteceu quase que num piscar de olhos. Num pequeno intervalo de tempo em que me inscrevi em um grupo literrio no facebook e criado um pequeno romance de trinta linhas, que a pedido dos leitores e participantes do grupo, acabou virando uma histria de 476 pginas. Foi assim meio por acaso e tambm por causa dos leitores que eu decidi mergulhar nesse universo dos livros. Ainda me lembro de alguns comentrios, e de vrias garotas do grupo dizendo o quanto haviam se identificado com os personagens do meu pequeno romance. De todos os feedbacks que recebi por conta desse primeiro livro, um deles me chamou a ateno e, na poca, eu nem sabia que em pouco tempo a tal garota apaixonada por romances viria se tornar uma das pessoas mais especiais na minha vida.

  • De novo a mesma histria, Rafael? Voc no se

    cansa nunca? Rodrigo ainda berrava do outro lado da linha Se esse for realmente o problema, comece a me agradecer a partir de agora, meu camarada. Pois eu sei como fazer voc d um ponto final nessa srie. Quantos volumes voc j escreveu mesmo?

    Trs, Rodrigo, mas so sete ao total. E eu s consegui finalizar o terceiro dessa srie at o momento, acredita? Ainda tenho mais quatro volumes para escrever. desabafei, por fim. No fazia ideia do quanto a vida de um escritor poderia vir a ser to complicada. Na verdade, eu no sabia por onde comear e principalmente quando aquilo tudo acabaria, mas agradecia a Deus pela minha inspirao ter dado o ar da sua graa a funcionar novamente.

    Acho que voc deveria se inspirar um pouco em voc mesmo, amigo. Quem sabe assim voc no percebe o quanto chato ter que passar horas e horas com a bunda pregada nessa cadeira? sugeriu Rodrigo, ainda no outro lado da linha E falando nisso, voc j conversou com a tal da Manoela depois de ontem noite?

    claro, a Manoela. Conheci a Manu atravs de um dos meus posts no

    grupo literrio. De incio a gente conversou s atravs dos comentrios, mas quando dei por mim, j tnhamos aberto uma conversa privada no chat do facebook e passado mais de duas horas teclado. Sabe aquela afinidade imediata que voc descobre existir entre voc e outra pessoa? Foi assim que com a gente. Foi assim que descobri que como eu, ela tambm apaixonada por livros principalmente os romances. A medida que conversvamos descobramos outras tantas coisas em comum: msicas, filmes, sries de

  • TV, e foi assim, de uma forma natural, que passamos a

    nos falar constante e diariamente. Inicialmente eu no me dei conta do que estava

    acontecendo, somente sentia uma vontade de lagar tudo quando a via online. Por vezes deixei os meus livros de lado s para conversar com ela. E nesses momentos a gente falava bobeiras, ria, compartilhvamos desejos e sonhos. Manu to sonhadora quanto eu e acho que isso foi o que nos aproximou de uma forma to especial pelo menos pra mim. Ela uma garota incrvel apesar de ter algumas minhocas na cabea. Alis, essa a nica coisa que no entendo nela. Como uma mulher linda pode ser to insegura? s vezes eu tenho vontade de abra-la, principalmente quando ela me fala do medo que tem de se tornar uma velha ranzinza e solteirona. Abra-la. Esse desejo comeou a se fazer cada vez mais forte e foi a que tudo comeou a ficar difcil pra mim.

    A gente se conhece h uns oito meses mais ou menos, mas eu percebi que meus sentimentos mudaram em relao a ela. A amizade inicial deu espao a um sentimento mais forte, ao desejo de querer estar por perto, de querer toc-la, abra-la... E foi por causa desse desejo que ontem eu acabei me precipitando e dizendo coisas que no deveria, pelo menos no naquela hora. Eu tenho certeza de que a assustei, droga! Mas, cara, est ficando cada vez mais difcil segurar esse sentimento. Eu adoro o fato de que, s de ouvir sua voz meiga, diferente de todas as outras, o meu mundo se reveste de infinitas e lindas cores. , eu no posso negar que estou apaixonado pela Manoela e me detestaria se, por causa da minha atitude impulsiva de ontem ao falar-lhe todas aquelas coisas, ela se afastasse. Eu preciso fazer alguma coisa, pensei, e ouvi os gritos do Rodrigo no outro lado da linha:

  • Cara, cad voc? No pode mais ouvir falar o

    nome da tal garota que sai fora de rbita, ? Ah, Rodrigo, me d um tempo! Acabei de

    acordar depois do porre da noite passada, minha cabea ta para explodir, ento me deixa voltar para a minha cama, ta? Mais tarde a gente se fala. falei ao mesmo tempo em que desliguei o telefone, enquanto saia do elevador e entrava no meu apartamento. Olhei para o relgio no meu pulso e ainda no era nem 7 horas da manh. Voltaria a dormir por pelo menos uma hora e quando acordasse tentaria encontrar uma forma de falar com a Manu.

    Droga! grunhi ao ouvir os conhecidos arranhes na porta. Olly estava de volta.

    Levantei da cama e ao passar pela sala vi que no relgio da parede j apontava 8h45. Manu j deve estar a caminho da biblioteca, pensei, enquanto abri a porta do apartamento e dei passagem ao cachorro mais folgado de todos os tempos. Olly tinha trs anos e era realmente uma figura. Ele tem sido minha nica companhia desde que resolvi morar sozinho e sai da casa dos meus pais, e por isso amo demais esse pestinha. Voltando ao meu quarto, me dirigi ao banheiro para escovar os dentes e percebi - quando me olhei no espelho - que a cara de ressaca ainda estava visvel em mim, apesar da dor de cabea j haver passado. Graas a Deus. Voltando ao quarto, peguei o celular sobre a cama e decidi acabar de uma vez com aquela aflio. Disquei o nmero da Manu e no consegui evitar o sorriso a ver a foto dela na tela do aparelho enquanto completava a chamada. Droga! O celular dela chamou, chamou e acabou caindo na caixa postal. Ser que ela est me evitando? Eu preciso saber!

  • Decidi preparar meu caf, j que meu estomago

    tinha acordado tambm. Peguei uma caixa de Nescau na geladeira e passei dois pes com queijo na chapa. Foi o mximo que eu pude fazer por mim mesmo naquele momento. A verdade que eu no parava de pensar na Manoela e esperei por mais de meia hora que ela retornasse minha ligao, mas nada, nem sinal da garota que passara a ocupar um lugar especial no meu corao. 9h35 e eu no aguentei mais esperar. Sabia que ela estava no trabalho, por isso resolvi no mais ligar, somente mandar um SMS.

    Digitei rapidamente na tela e larguei o celular sobre a mesa da cozinha. Seja o que Deus quiser pensei, enquanto me preparava para comear a lavar as coisas do caf que acabara de tomar. Eis, ento que o celular comea a tocar. Eu estava ansioso demais para qualquer coisa e atendi antes do terceiro toque.

    Oi, Manu. Que bom que voc retornou minha ligao. falei, tentando esconder o nervosismo.

  • Oi, Rafa. Ento, eu me atrasei toda hoje cedo e

    acabei no conseguindo te atender quando voc ligou. T tudo bem? Aconteceu alguma coisa?

    Ah, ta sim. Tudo bem. Liguei porque queria conversar sobre ontem, sobre eu ter sado daquele jeito no meio da nossa conversa, quase.

    Huumm... relaxa Rafa. Eu tambm j estava com sono... comecei a dizer quando ele me interrompeu.

    No, Manu. ... huum... comecei a procurar a melhor forma de falar ...eu no estava com sono, s pensei que talvez estivesse indo longe demais. expliquei, finalmente.

    Como assim, indo longe demais? ela perguntou parecendo confusa e assustada.

    Manu, quando a gente vai se encontrar pessoalmente? J tem o qu, oito meses que nos conhecemos? decidi seguir por outro caminho dessa vez.

    Sim, oito meses e 13 dias ela respondeu rapidamente, e foi impossvel evitar o sorriso de satisfao que essa informao to detalhada me trouxe.

    Nossa, voc contar at os dias me deixa contente, talvez seja sinal de que voc est to ansiosa quanto eu. comentei.

    Ah, voc sabe que sou boa de memria, n? ela disse simplesmente.

    Sim, eu sei. e ri de forma menos bvia dessa vez Mas me diz, quando a gente vai poder se encontrar? Nossas cidades nem so to distantes uma da outra. Eu posso ir a ou, se voc preferir, pode vir aqui me visitar. O que voc acha?

  • Rafa, ento, lembra que te falei sobre o arrai

    do DCTA? ela perguntou sem esconder certa indeciso na voz.

    Claro. Lembro sim, o que isso tem a ver com o nosso encontro? questionei e, por um momento pensei que esse seria mais um dos motivos que impediriam da gente se encontrar. E, para completar minha aflio, s conseguia ouvir o som do silncio no outro lado da linha.

    Manu? Manu? Cad voc? Ainda ta a? chamei.

    An... ah... t, t sim. que... ento... Se voc pudesse vir, acho que seria uma noite bacana para a gente se encontrar. ela disse finalmente.

    Claro que eu posso ir, Manu! Na verdade eu vou adorar ir. Te encontrar tudo o que quero... antes que eu percebesse o que estava falando, essas palavras me fugiram da boca.

    Legal ento, Rafa. Combinado. Preciso desligar agora, a dona Carmem t vindo, e eu j levei uma bronca dela hoje, no quero levar outra e ser acusada de assassinato depois. ela falou, fazendo graa timidamente, e de um jeito que s ela consegue.

    Tudo bem. Beijo, Manu. Mais tarde a gente se fala. Tchau. eu disse por fim.

    Tchau, Rafa. Beijo. e desligou. Pronto. Apesar de todos os pesares eu poderia

    relaxar um pouco. Manu no me pareceu diferente por causas das coisas que deixei escapar ontem, e no mais, finalmente conseguimos marcar uma data para nos encontrarmos. H tempos eu vinha insistindo nisso, mas ora ela tinha trabalho da biblioteca atrasado, ora eram as aulas do curso de fotografia que lhe tomavam todo o tempo. O fato que para ela sempre havia um empecilho

  • e eu no queria forar a barra. Tudo bem que acabei

    fazendo isso dessa vez, mas, caramba, l se vo oito meses e treze dias como ela mesma disse. J est na hora da gente sair do mundo virtual, certo? O difcil agora seria esperar por esses benditos quinze dias e pelo tal arrai em So Jos dos Campos.

  • 3. Ansiedade o meu nome

    Manu

    Eu sei que foi ultra-mega infantil ter praticamente

    desligado o celular na cara do Rafa, mas eu no saberia o que dizer se ele seguisse naquele momento pelo caminho que eu estou achando que ele est seguindo. Agora que eu estou confusa a respeito do que sinto por ele, se ele demonstrar realmente outro sentimento alm de amizade por mim, vai ser praticamente impossvel rolar uma conversa decente entre a gente, pelo menos at que chegue o grande dia. Ah meu Deus! E pensar que o baile daqui a quinze dias, o que eu vou fazer da minha vida.

    Dona Carmem foi at um anjo pra mim depois da minha conversa com o Rafa, j que me encheu de formulrios da biblioteca para atualizar. Eu no imaginaria que estivssemos com tantos livros desaparecidos, ou melhor, emprestados e no devolvidos. Fazer todo esse levantamento ocupou todo o meu dia, e quase me faz sair atrasada para a aula do meu curso de fotografia. Ainda bem que o nibus no atrasou e o trnsito no estava dos piores, j que seria praticamente impossvel ter chegado no Centro de Ensino s 18h em ponto. Foi s o tempo de descer do nibus, encontrar as meninas no Caf da esquina e seguimos para a aula. Pam e Kelly estavam eufricas por causa do SMS que mandei na minha hora do almoo.

    E a, Manuzita, qual a do seu amigo virtual? Pam perguntou frisando a expresso amigo virtual, ao mesmo tempo em que piscava o olho pra Kelly.

  • Ah, Pam! Nem comea, por favor. No coloca

    mais ideias na minha cabea. Ontem quase no consigo dormir pensando no que ele me disse. desabafei.

    No se trata de colocar ideias na sua cabea, Manu a Kelly, que at ento observava, entrou na conversa Mas de te fazer enxergar o que voc finge ou prefere no ver.

    A Kelly a criatura mais racional e objetiva que eu conheo, s vezes penso que ela tem um chip no lugar do corao.

    Kelly, as coisas no so simples assim, t? Rafael e eu j nos conhecemos a quase 9 meses, eu gosto dele e sinto que ele gosta de mim, mas no sei dizer at onde esse sentimento vai... eu disse me justificando.

    Ento por que voc no chega e pe logo as cartas na mesa? Os pingos nos is? ela pergunta e me olha com aquela expresso que faz com que eu me sinta totalmente estpida.

    T! Eu entendi que eu posso fazer isso, ok? Mas... digo retorcendo as mos enquanto a gente caminha pelo corredor que leva sala de aula ...eu tenho medo, gente! Tenho de entrar numa outra histria que, no fim das contas, estava mais na minha cabea.

    Olha, Manu, voc nunca vai encontrar o prncipe encantado dos seus sonhos se voc se deixar levar pelo medo de se arriscar, viu? Tudo bem que o Fernando, o Tho e o Max te fizeram sofrer, mas voc h de convir que acabou dando muita corda pra eles. A corda que eles usaram para te enforcar no final. a Kelly disse quando a gente chegou nossa sala, e eu sinceramente agradeci a Deus por isso. Eu sei que o que ela me disse era a pura verdade, mas, como dizem, a verdade di, n?

  • Falar que mal me concentrei no contedo que estava sendo exposto durante a aula desnecessrio. As palavras da Kelly ecoavam na minha cabea, e quanto mais elas se repetiam dentro de mim, mais eu via verdade em cada uma delas. Meus trs relacionamentos foram mais uma idealizao minha que um namoro de verdade. Por menor que tenha sido o tempo em que fiquei com o Fernando, o Tho e o Max, ainda assim eu demorei a perceber o que eles nem faziam questo de esconder. Para mim a gente estava numa relao sria, enquanto para eles eu no passava de uma ficante. Tla. No fosse a Pam e a Kelly para me abrirem os olhos, o provvel que eu teria me afundado em desiluses ainda mais dolorosas.

    As duas horas e meia de aula transcorreram dentro do normal, e eu de fato teria tirado todo o proveito delas se no estivesse totalmente perdida no mar das minhas memrias. Eu s tenho 23 anos, poxa, e no entendo o porqu de s vezes minhas experincias me pesarem tanto. Por que no consigo ser mais desencanada como a Pam, ou racional e prtica como a Kelly? Por que as coisas me afetam tanto? Eu pensava sobre isso quando a Pam quase gritou no meu ouvido:

    Acorda, Manu! A aula j terminou, menina! T, eu sei. T indo, poxa! resmunguei. Seguimos as trs at a parada de nibus, j que no

    teramos a carona do pai da Kelly que estava numa viagem de trabalho.

    E a, Manu, algum sinal do Rafa? a Kelly perguntou quando subimos no nibus.

    No, quer dizer, a gente se falou hoje cedo e combinamos de nos falar a noite. Mas to off no facebook.

  • Eita, por que voc complica tanto sua vida, hein

    garota? Manda uma mensagem, v se ele ta online... Voc tambm precisa fazer alguma coisa se quer resolver esse conflito que ta na sua cabea! mais uma vez a Kelly me alertou, e embora eu reconhecesse que ela estava tentando me ajudar, tive vontade de mand-la calar a boca.

    Eu vou mandar uma mensagem, Kelly, mas no agora. T cansada, o dia foi longo e preciso de um banho, ok? Depois eu vejo o que fazer em relao a tudo isso. acho que falei num tom mais spero que o pretendido, porque minhas duas amigas no disseram mais nada at que nos despedirmos, quando elas desceram nas suas paradas.

    Cheguei em casa por volta das 22h:00 e o costumeiro barulho da TV me fez perceber que mame me esperava na sala. Dormindo, por sinal. Dei-lhe um beijo na testa e disse-lhe que j podia ir para o quarto. Ela me olhou por um instante e perguntou se estava tudo bem. As mes parecem ler sempre a nossa alma, n? E isso eu no sei ainda se bom ou ruim.

    Sim, me. Est tudo bem, eu s tive um dia cansativo. respondi enquanto seguia para o meu quarto.

    Depois de um banho rpido, j com meu pijama do ursinho Pooh, sentei-me na cama com o notebook no colo. Claro que eu queria que o Rafa estivesse online. No tinha ideia sobre o que iramos conversar, mas precisava ter cer-teza de que a nossa amizade continuava igual, indepen-dente do que quer fosse isso que, agora, estava aconte-cendo entre a gente. No pude deixar de perceber o sorriso espontneo que me surgiu nos lbios quando vi a bolinha

  • verde ao lado do nome Rafael_Almeida. Esperei um

    pouco e decidi comear nossa conversa.

    Ai, meu Deus, tudo menos esse vcuo nas nossas

    conversas, por favor! Se tem uma coisa que me deixa desconfortvel essa troca de emoticcons que, na minha

  • opinio, no nada mais que uma tentativa frustrada de

    preencher um silncio gritante...

    No consegui dizer mais nada. Depois a gente ainda conversou durante algum

    tempo, ele me falou sobre a srie que est escrevendo, e que est preocupado porque agora que est finalizando o

  • terceiro livro. Rafa escritor, e seu talento notrio para

    a escrita. No demora, ele ser descoberto por uma grande editora e seus livros se tornaro um grande sucesso, tenho certeza disso. Por ora, essa minha nica certeza em relao a ele, que droga!

    Quando desliguei o notebook meu sono ainda no havia dado as caras. Alis, sempre assim. Ansiedade e insnia andam de mos dadas na minha vida, e se uma se faz presente, traz sempre a outra a tira colo, e eu j devia estar acostumada com isso. que viver pra mim sempre foi meio que ter de atirar no escuro. Bem que eu queria pensar de outra forma, ser diferente, ser aquele tipo de pessoa que, quando toma uma deciso, pronto, esquece tudo que ficou pra trs, aquela que no estremece quando se depara com vrias possibilidades, que no paralisa diante da necessidade de fazer escolhas. Mas, pacincia... No sou assim!

    Eu no sei, na verdade nunca soube me entregar aos acontecimentos, deixar fluir... Fao planos, analiso, visualizo os prs e os contras e, quanto mais mergulho nesses pensamentos, mais em dvida eu fico. O fato que preciso saber a direo das coisas, preciso ter um certo controle sobre a minha vida. T, eu sei que mesmo as nossas certezas so incertas. Sei que independente e apesar de ns, existe uma direo maior regendo tudo, e a vida, como um quebra-cabea, vai aos poucos encaixando as pecinhas em seus devidos lugares, mas, ainda assim, eu preciso de algumas garantias. E nesse momento da minha vida, quando os meus sentimentos em relao ao Rafa esto to confusos, quando o que eu sabia em relao aos sentimentos dele por mim j no me parece to certo, j no estou to segura e, pior, temo que a qualquer momento gente deixe de se falar.

  • 4. Enquanto a inspirao no chega...

    Rafa

    Depois de alguns minutos diante do meu monitor, a minha inspirao parecia ter evaporado por pelo menos dez minutos, o que me pareceu dcadas j que em nenhum momento na minha vida ou simplesmente na minha carreira como escritor ocorreu-me uma fatalidade dessas pelo menos no at o momento. O que de fato desnecessrio para um jovem escritor que ainda precisa finalizar outros quatro volumes. Droga! No fazia ideia de como a vida de um escritor era complicada. E eu que pensava que para seguir uma carreira como essa s precisvamos escrever qualquer coisa e pronto, deixar o pblico decidir e opinar em relao ao enredo construdo at ento. No qualquer texto, claro, mas uma narrativa criativa-construtiva que motive e incentive os leitores. A princpio eu sabia de c e salteado essas tcnicas de escrita, mas agora depois de tudo o que est acontecendo em relao a esse inexplicvel sentimento por Manoela seja qual for a tcnica de escrita, simplesmente no consigo us-la. Droga! Droga! Droga! Sem chances, a nica alternativa enquanto minha inspirao insistisse na ideia de ficar por pelo me-

  • nos 1km de distncia da minha mente era postar as 30 linhas que eu j havia escrito antes da tragdia acontecer. Pelo menos assim, no perderei os meus fieis leitores-seguidores assduos que volta e meia me pedem para postar as continuaes dos meus romances no Wattpad. J se passaram duas semanas sem sucesso na tentativa de finalizar esse captulo para presentear os meus leitores, no poderia me atrasar nem um dia a mais e, ento, partindo desse ponto de vista que, movendo a seta com um breve movimento com o mouse, posicionei-a em cima do boto ''buscar'', apertando-o logo em seguida. Abri o link no mesmo segundo e aguardei a pgina carregar, sem nem piscar os olhos. A velocidade da internet era uma droga, ento fiquei observando os elementos surgirem lentamente na tela. ''Seja o que Deus quiser'' pensei esperanoso e nada confiante, pois os comentrios dos leitores fazem toda a diferente na minha opinio. Segundos depois passei a observar os diversos comentrios dos captulos anteriores, enquanto o resultado estatstico do captulo atual no dava as caras. Foi ento que a primeira notificao apareceu. Caramba, em menos de segundos j se podiam ver mais de trezentos comentrios no captulo atual. Passei a ler um por um, na esperana de que os leitores tenham gostado da minha escrita at ento e eis que um enorme sorriso transpareceu sobre o meu rosto, acompanhado pelo um brilho no olhar ao ler os seguintes comentrios:

    Parabns, Rafael, gostei muito, espero poder ler todos os seus livros. Esse foi o primeiro livro que eu li at o final

  • cara, acredita? Rodrigo Salles

    Adorei o livro, ele muito legal,

    estimula a leitura at mesmo de quem no gosta, pois prende muito a nossa ateno e no d para parar de ler. Os fatos realmente esto presentes na nossa vida. Parabns, Cara!

    Marcelo Augusto O livro timo, Rafael. A leitura

    bem fcil de se entender alm dos assuntos que so muito estimulantes e interessantes. desse tipo de incentivo que ns precisamos para nos interessarmos cada vez mais pela a leitura.

    Priscila Cortes

    At a Pri deixou seu comentrio. Isso me surpreendeu pra valer, pois no fazia a mnima ideia de que os meus dois melhores/piores amigos acompanhavam a srie pela qual estou escrevendo. Caramba! Aps um tempo visualizando mais de 394 comentrios sobre o captulo novo postado em apenas quinze minutos no meu perfil do Wattpad, o meu aparelho celular vibrou em cima da minha escrivaninha. Havia deixado o meu facebook-mensseger aberto, e quando chequei a caixa de mensagem no consegui segurar o sorriso. Era a nica pessoa capaz de me deixar ainda mais feliz do que j estava aps ter lido tudo aquilo: Manu.

  • Droga! Mesmo tentando ser engraado, eu sabia que uma hora ou outra isso acabaria acontecendo. No gosto dessas pausas casuais que s acontecem enquanto estamos dialogando com algum durante uma simples conversa on-line. Principalmente quando se trata das nicas pessoas especiais em nossas vidas. Pelo menos a Manu era a primeira da minha lista de pessoas especiais.

  • No tem outro jeito, vou ter que fazer a pergunta que a muito tempo me consome a ponto de me faz perder o sono. Engoli a saliva antes de comear a digitar novamente, no poderia deixar a Manu perdida em devaneios achando que alguma coisa estivesse comeando a nos atrapalhar. Mesmo que isso esteja acontecendo via internet. Amaldioaria-me eternamente por no conseguir conversar com a Manu se por ventura isso acontecer. Eis, ento que enviei a bendita pergunta.

  • Eu ainda no conseguia acreditar que mesmo depois de quase nove meses de intimidade reveladas a Manu insistiria falando aquilo: ''Ah, Rafa, eu espero que a minha timidez no te faa se arrepender de ter vindo me conhecer pessoalmente.'' Certamente a minha malu-quinha ainda alimentava minhocas na cabea, s poderia ser! Ainda bem que digitei exatamente as palavras do modo como eu a vejo. No quero que ela se sinta assim, indiferente das outras garotas da sua idade. E foi ento que decidi mudar de assunto, afinal, ainda me sentia mega-feliz pelo o nmero de comentrios sobre o novo captulo que, na minha opinio, acreditava firmemente no ter ficado to bom assim. Passamos ento a falar sobre os meus livros, embora eles estejam me dando uma maior dor de cabea, e para a minha alegria a Manu tinha exatamente a formula que eu precisava para resgatar a minha to preciosa inspirao.

    * * *

    No dia seguinte, procurei o Olly por todos os cmodos do meu apartamento, mas para a minha surpresa acabei no o encontrando em nenhum dos cmodos. Era s o que me faltava! 9h15 da manh e aquela pestinha havia fugido outra vez, como de costume. ''You can never say never While we don't know when Time and time again Younger now then we were before Don't let me go Don't let me go Don't let me go Don't let me go''

  • Esse o barulho do meu aparelho celular tocando. Havia selecionado a faixa ''Never say never'' de ''The Fray'' como toque de chamada. Fala, cara, me ligando a essa hora da manh em pleno final de semana, ficou doente foi? era o Marcelo no telefone. Ele nunca me ligou a essa hora, e principalmente em pleno final de semana. Pra falar a verdade, ele nunca havia me ligado antes O que aconteceu, cara, fiquei at surpreso com essa sua ligao. Rafa, que voc sabe, n? Eu no posso dizer ''no'' para a filha do chefe na frente dele. o mesmo que pedir para ser despedido sem querer, ento eu o interrompi desta vez, de nervoso: Ento o qu, cara? Fala, desembucha logo de uma vez. Por que voc estar dizendo isso? O que aconteceu? mas nada do Marcelo responder. Apenas um silncio tomou conta do outro lado da linha, at que Oi, Rafa? aquela voz. Certamente no era a do Marcelo, ainda assim conhecia aquela voz era uma voz feminina. H no, no pode ser quem estou pensando que . O que tudo indica que aquela voz s poderia ser da Aqui a Priscila, tudo bem com voc? era s o que me faltava ''Desde quando a maldita precisou usar o telefone do Marcelo?'' tentei raciocinar enquanto ela continua a falar do outro lado da linha Posso passar a mais tarde? Preciso muito conversar contigo, e tenho certeza de que voc ir adorar saber o que eu tenho para te falar. imaginei um sorriso em seu rosto pelo tom da sua voz. Pri no t te ouvindo voc passar aqui no posso estarei ocupado e comecei a fingir que estava ficando ser sinal, e rezava profunda-

  • mente para que a Priscila no percebesse. No estou entendo nada do que voc estar falando, Rafael, acho que o sinal est ruim Gloria! O meu plano deu certo Deva ser a transferncia via satlite, esse maldito sinal nunca prestou aqui do 21 andar do escritrio. Ento passarei a assim mesmo, tudo bem? Assim que chegar te explico melhor. Beijos, Rafa. e desligou. Mais essa agora. Teria que inventar alguma desculpa para o seu Rogrio no deixa-la subir. Inventaria alguma coisa tipo: ter adoecido, que tinha pegado algum vrus contagioso, ou sei l o qu. S no poderia deixar que a Priscila aparecesse aqui justo agora que a minha inspirao resolveu dar as caras (claro, graas a Manu). De maneira alguma eu poderia permitir que isso acontea. No mesmo instante eu agarrei o telefone fixo e disquei o nmero aqui do prdio e para a minha alegria o seu Rogrio quem atendeu no terceiro toque. Forcei um tom de voz pra l de sinistro, e o seu Rogrio acreditou perfeitamente em cada palavra dita. Pronto. Tenho certeza que no receberei visitas to cedo, h no ser a do Dr. Augusto que sempre cuidou da minha sade e tambm a de todos os outros inquilinos aqui do prdio. Seja l o que a Pri queira me contar, tenho a impresso de que no assim to interessante, afinal, nada que tenha relao com a Priscila me interessa. Nunca me interessou, porque agora seria diferente? Aproveitando a chance da minha inspirao ter voltado, dicidi ento sentar-me na minha desconfortvel cadeira diante o meu monitor e escrever mais alguns captulos do meu romance. Quando enfim a tarde se instalou, fui obrigado a

  • me arrastar at a geladeira para preparar alguma coisa, pois as ideias haviam fludo to confortavelmente que, assim que um insistente ''ronc ronc ronc'' comeou a soar no meu estmago, que eu fui perceber que j eram 14h30. Finalmente te encontrei, seu pestinha adorvel. disse, quando o avistei debaixo da enorme mesa de vidro visivelmente bem instalada na sala de jantar, encolhido entre as patas na maior folga do mundo. Ele se levantou no mesmo instante. Olly me olhava radiante, balanando o seu rabo de um lado para o outro do mesmo modo que fazia quando iramos dar uma volta no parque para brincar ou algo parecido. Sentado! ordenei, olhando severamente para ele. Nessa hora at fiquei com pena dele, pois no mesmo instante o coitado se sentou como eu havia ordenado, com as duas patas da frente ainda levantadas. Muito bem! no consegui segurar um sorriso. Resolvi continuar com a brincadeira, sendo que na verdade mesmo eu deveria era estar ensinando-o a se comportar. Late! sei que passei dos limites, confesso. ''Aonde foi que foi que voc tirou essa ideia de pedir para um cachorro latir assim, sem mais sem menos, Rafael?'' pensei enquanto ainda olhava para o Olly que agora j havia se endireitado quando um ''Woof, woof'' saiu da sua boca. Maldito seja. Por incrvel que parea o Olly latiu, e isso permitiu que as lgrimas inundassem os meus olhos de felicidade.

  • No morra nunca! sugeri, apenas. Afinal, no se pode dar ordens a algum pedindo para que no morra. A morte a nica certeza que temos dentre todas as perguntas sem respostas Por favor! realmente estava pendido aquilo ao Olly, e o abracei em seguida, deitando-me no enorme carpete vermelho da sala enquanto recebia suas lambidas.

    * * *

  • 5. Acompanhantes inesperados

    Manu

    Nem lembro ao certo o momento em que adormeci naquela noite. Quanto mais eu pensava em tudo o que estava sentindo, mais confusa eu ficava, e por isso o sono que chegou de repente me veio como um blsamo libertador. Alis, nos ltimos dias, dormir tem sido uma das melhores coisas da minha vida. Isso porque as frias de junho esto chegando e o trabalho na biblioteca aumentou com a chegada de livros novos. Catalog-los no das tarefas mais interessantes, mesmo para mim que adoro tudo o que relacionado literatura . Rafael e eu continuamos nos falando todos os dias, o fim de semana do nosso encontro est chegando, e ao mesmo tempo em que desejo v-lo pessoalmente, sinto um nervoso s de pensar que as coisas podem no se sair to legais entre a gente quando estivermos frente frente. Para ser sincera, eu sinto que de algum modo j esto diferentes, j que meus sentimentos por ele no parecem mais os mesmos. Rafael sempre foi gentil e carinhoso, no sei porque esse jeito dele comeou a me chegar carregado de interesse. Pam e Kelly esto certas que ele deseja muito mais que amizade entre a gente, e praticamente me chamaram de burra quando eu lhes mostrei o nosso histrico de conversa do facebook. Manu, voc pode agilizar a catalogao dessa nova remessa de livros, querida? ouvi a voz estridente da dona Carmen que se aproximava da minha mesa, atrs

  • do balco Hoje j segunda-feira, e voc s tem at sexta, lembra? A partir da prxima semana, comearemos a programao das frias na biblioteca, e nem eu, nem voc, teremos tempo para mais nada com esses corredores lotados de crianas e adolescentes. T quase terminando, dona Carmen! Faltam s os romances e os livros infantis. respondi, tentando pr fim a qualquer outra tentativa dela de falar e, principalmente, me chamar de querida, quando na verdade seus olhos me diziam que o ela queria era ter meu pescoo em suas mos. Bom, ento espero que tudo esteja pronto at quarta-feira. ela finalizou enquanto me olhava com aquela expresso de "eu exijo e ai de voc se no cumprir a tarefa", e retornou sua sala. Aaargh! No bastasse a ansiedade que me dominava e tirava toda a minha ateno da enorme pilha de livros minha frente, ter de trabalhar agora sob presso era tudo o que me faltava para que minha semana se tornasse ainda mais desastrosa. E pensar que alm disso, no sbado comearia o tradicional arrai da cidade, e seria justamente esse o grande dia. Rafael viria de BH e ficaria durante todo o fim de semana. Depois de quase nove meses de conversas on-line, ns nos encontraramos pela primeira vez. E uma parte de mim no conseguia evitar o receio de que, talvez, essa tambm pudesse vir a ser a nica. Mergulhei no trabalho tentando ocupar meus pensamentos, e nem me dei conta que j passava das 18h quando meu celular tocou. h, garota, onde voc t? Pam falou do ou-

  • tro lado da linha e mesmo sem v-la, soube que ela estava abanando as mos como sempre faz quando est impaciente. A gente j entrou para a sala de aula, voc t atrasada. ela reclamou. Putz, Pam! Nem vi o tempo passar. Ainda t na biblioteca terminando de cadastrar os livros novos no sistema. respondi, prendendo o celular entre o ouvido e ombro, enquanto desajeitadamente arrumava minha mesa e colocava meus pertences dentro da bolsa. Acho que no vou mais para o curso, so quase 19h e daqui que o nibus chegue a, a aula j ter praticamente terminado. Vou direto para casa, ok? Ok. Mas, fala, t tudo bem? ela perguntou. Ah... an... t, t sim. T bem. S me perdi no tempo e me atolei no trabalho. No mais, tambm t cansada s. T legal, Manu. A gente se fala ento. Vou desligar, o gato do professor acabou de chegar. Pam disse e desligou o telefone sem nem ao menos me deixar responder. Completamente maluca essa minha amiga. Enquanto o nibus seguia em meio ao trnsito, comecei a pensar no fim de semana. O que exatamente Rafa e eu faramos? Eu sei que ele gosta de filmes tanto quanto eu, assim, o cinema j era um programa garantido, alm das noites no arrai. Mas e durante o resto do tempo? Preciso lembrar de conversar com ele sobre isso, alis, preciso deixar claro que ele ficar na minha casa e fim de papo. Percebi que quando falei sobre isso, ele ficou meio constrangido, e me disse que tinha em mente procurar uma pousada. "NO TEM CABIMENTO, N RAFA? VOC

  • VEM E FICA NA MINHA CASA, J AT FALEI PROS MEUS PAIS." Eu digitei rapidamente no teclado do notebook. "A GENTE V ISSO DEPOIS, MANU. DE TODO MODO, EU NO QUERO DAR TRABALHO" Ele escreveu em seguida. No continuei o assunto naquele momento, mas claro que no desisti da ideia. Se era ele que estava se deslocando para vir me encontrar, arcando com todas as despesas, nada mais justo que ficasse na minha casa e disso eu no iria abrir mo. Terminei de tomar banho e me dirigi para a cozinha. Meu estmago reclamava ateno urgentemente, o que me fez lembrar que eu s tinha tomado um copo de iogurte s 15h l na biblioteca. Agora, quase 21h, eu estava literalmente morrendo de fome. Me, o que tem para comer? gritei na tentativa de que mame me ouvisse l na sala. Guardei macarronada no micro-ondas, Manoela. s voc esquentar. Bendito seja o inventor do micro-ondas, pensei, depois de ter esquentado rapidamente um prato com macarronada. E, enquanto saboreava o que mais me parecia um manjar dos deuses, a tela do meu celular acendeu. Notificao de mensagem do facebook.

  • Ai meu Deus! O que era agora? Ele no vai vir mais, ser? O Rafa desistiu do nosso encontro? Mas foi ele quem insistiu tanto... Por que isso agora? O que t acontecendo? Mil perguntas me passaram pela cabea quando li a mensagem, e me felicitei por no ter mudado meu status no chat quando cheguei mais cedo em casa. Para todos os efeitos eu ainda estava no curso e isso me daria tempo para pensar e me preparar para o que quer que fosse o que Rafa precisava me falar. Desliguei o celular e continuei a jantar, embora j no estivesse com tanta vontade assim. "Ele desistiu do encontro de vocs" uma voz soou dentro de mim e isso foi o bastante para me fazer levantar e colocar a loua suja na pia. Com certeza minha me reclamaria mais tarde ou amanh por eu no ter arrumado a cozinha depois de jantar, eu sei, mas eu j no estava mais com pacincia pra fazer nada. S queria deitar na minha cama e pensar sobre a mensagem do Rafa, sobre o que ela poderia significar. Eram 22h15 e eu no aguentava mais no saber. Fechei a pgina do netflix e abri a do facebook.

  • Orgulho e Preconceito meu filme preferido, mas a verdade que nem Mr. Darcy conseguiu diminuir minha aflio.

    Eu imaginei que ele faria essa pergunta. Nem sei dizer quando e como aconteceu, mas o fato que ao longo dos meses uma rotina foi nascendo entre a gente. Nada combinado ou programado, todavia, aos poucos as nossas mensagens de bom dia no celular se tornaram um hbito dirio, assim como nossas conversas noite. Sabamos todos os horrios e a rotina um do outro e, nesse momento, eu me perguntei se isso era bom ou ruim.

  • Pxa, por que ele no diz logo o que est acontecendo?

    A Priscila? O que essa garota tem a ver com a viagem dele pra c? No, eu no acredito.... E nesse momento os meus dedos foram mais rpidos que o meu autocontrole.

  • Por que exatamente eu disse isso????

    "Siim. Tem todos os problemas, Rafael. Como essa garota se atreve a se meter numa viagem que no tem nada a ver com ela? E como vc aceita? Por que dispensou a carona do Rodrigo ento?" Meus pensamentos pipocavam dentro da minha cabea, enquanto eu olhava para o teclado e no sabia ao certo o que responder. A verdade que pelo visto nosso fim de semana ia ser mais difcil do que eu pensava, embora o meu lado racional me alertasse para que eu mantivesse a calma. "Voc sabe que no existe nada entre eles, Manu. E muito menos entre vocs pelo menos por enquanto. Mantenha a compostura, garota!"

  • Agora sim eu me senti a garota mais estpida de toda a galxia. No, de todo o universo.

  • Gostei dessa ideia.

  • 6. De malas prontas... Rafa

    Eu estava dentro do meu quarto quando meu celular chamou por pelo menos cinco minutos antes de cair pela a quarta vez. Pelo visto aquela ligao precisava ser atendida urgentemente, o problema era que eu no fazia ideia de onde havia colocado o bendito aparelho. No estava em cima da minha escrivaninha, ou em cima da mesa, e muito menos em cima da minha enorme cama de casal. A verdade que se depender da zona de guerra que est o meu apartamento desde que eu dei folga a dona Teresa - minha faxineira - por causa do feriado, eu nunca mais vou achar meu celular ou qualquer outra droga aqui dentro. Ainda mais agora que eu literalmente revirei todo o meu guarda-roupa enquanto tentava arrumar minha pequena - que se tornou grande - mala. Finalmente estou indo viajar para encontrar a Manu, e acho que esse encontro tem tudo para ser perfeito se o... Achei! Finalmente achei o dono do barulho que j estava me fazendo perder o restinho da minha pacincia. Arrastei o dedo pela tela e atendi na, talvez, dcima ligao. Fala, Rodrigo! Por que tanta insistncia, cara? Ser que voc no consegue me deixar em paz, pelo menos at eu conseguir arrumar todas essas malas? desabafei assim que agarrei o telefone e o coloquei sobre a orelha Afinal, j acabou de arrumar as suas? Na verdade eu acabei de estacionar aqui na porta do seu prdio. Que diabos voc tanto enrola, Rafael? No temos tanto tempo assim. Alis, a Priscila quer ir a

  • descobrir porque voc est demorando tanto. Por favor, no me venha com aquele papo de que desistiu de viajar, certo? ele gritava pelo telefone como se fosse o meu irmo mais velho, o que realmente me deixava bem irritado. E, para piorar, ainda havia a Priscila. Rafael, onde voc estava com a cabea quando permitiu que o chato do seu melhor amigo a convidasse? me perguntei nesse momento. Desde o dia em que nos conhecemos na faculdade, a Priscila me pareceu uma garota super expansiva, e em alguns momentos isso at a tornava divertida. Mas com o passar do tempo, e agora com a nossa ainda maior proximidade no escritrio onde trabalho a pelo menos dois anos e ela foi recentemente contratada tenho a impresso de que ela sempre est a procura de um jeitinho de se aproximar, me tocar, chegando ao ponto de invadir minha privacidade. Isso realmente j est me tirando do srio. Como que , cara? Desistir? Eu? Imagina! No esquea que por minha causa que estamos embarcando, ento por que diabos eu iria desistir logo agora? eu disse, tentando dissipar a imagem da Priscila saindo do carro para vir me buscar. Eu at poderia ter bolado um plano, mas depois que o Rodrigo e o Marcelo saram por a anunciando a notcia de que iramos viajar, a Priscila acabou se convidando tambm. O que ser que ela tem na cabea? Nunca vi uma mulher to atirada, eu hein!! Eu at iria dizer alguma coisa contra essa maluquice toda, mas o Rodrigo adorou o fato dela poder ir com a gente, e como o carro da viagem seria o dele, eu no pude argumentar contra.

  • Ento acaba logo com isso, seja l o que estiver te prendendo a dentro desse apartamento, e vamos embarcar logo de uma vez, meu camarada. Rodrigo berrava do outro lado da linha Espera um pouco que a Pri quer falar com voc eu escutei o barulho que ela fez assim que pegou o telefone, era como se eu estivesse observando-a segurar o aparelho com as mos. Oi, Rafael? Porque tanta demora, gatinho? No vejo a hora de conhecer aquela sua amiga, a tal de Ma Manu Manuelle. Mais essa agora! Alm de me fazer querer vomitar s de ter ouvido a sua voz, ainda insiste em errar o nome da minha futura namorada. Que Raiva! Ser que a Priscila no percebe que eu s tenho olhos para a Manu, no? Ser que vou conseguir suportar a Priscila durante toda a viagem? O que eu no fao por voc, Manu?! Manoela, no Manuelle, Priscila! corrigi, com certa ironia at J estou descendo. desliguei no mesmo instante, pois no queria que aquela conversa se estendesse por nem um segundo a mais. Principalmente tratando-se da minha colega de trabalho no telefone. Bom, minha bagagem j est pronta, j pus comida e gua pro Olly o bastante para durar at a noite, quando o seu Rogrio vai dar um pulinho aqui e reabastecer as vasilhas do meu adorado pestinha. Bem que eu queria lev-lo com a gente, mas quero estar todo o tempo com a Manu durante esse fim de semana e o Olly acabaria me aprontando das suas e impedindo isso, tenho quase certeza. Confiro mais uma vez o apartamento tentando perceber se no estou esquecendo nada, pego a

  • caixa embrulhada com os presentes que estou levando para a Manoela, as chaves do apartamento que uso para trancar a porta quando saio e sigo direto para o elevador. Quando as portas destes se abrem ao chegar ao trreo, dou de cara com a Priscila (claro!) e o Marcelo, que vem ao meu encontro e me ajuda com a bagagem. Pela cara dele percebo que ele tambm no ta curtindo a ideia de termos justamente a Priscila companhia feminina nessa viagem. Seguimos os trs para o carro, onde o Rodrigo j se encontra super hiper estressado. Putz, ele meu melhor amigo junto com o Marcelo, mas s vezes consegue se tornar o cara mais chato da face da Terra, e eu, por outro lado, estou comeando a achar que teria sido melhor fazer essa viagem de nibus. De Belo Horizonte a So Jos dos Campos onde a Manu mora so por volta de 8 horas de viagem, Marcelo e eu fizemos as contas ontem noite. Com o Rodrigo na direo provvel que a gente leve menos tempo, apesar de que com a falao da Priscila, eu tenha a impresso de que essa viagem durar pelo menos o dia todo. T, eu sei que estou sendo talvez muito cruel com ela nesses ltimos dias, mas que juntando o nervoso do encontro com a Manu e o fato de a Priscila estar indo, meus nervos esto uma pilha. Algo me diz que ela pode vir a atrapalhar esse fim de semana. E se a Manoela achar que existe alguma coisa entre a Pri e eu? Quero nem pensar nisso, eu no perdoaria a intromisso dela na minha viagem nem se ela se mudasse para outro planeta. Isso no pode acontecer. Nada pode estragar os trs dias mais esperados dos meus ltimos oito meses.

    * * *

  • Obrigada, Rafa, por me convidar para participar dessa viagem. a voz da Priscila j estava comeando a me dar nuseas. Ou talvez seja pelo fato de que j haviam se passado duas horas e meia e eu j no suportava mais observar a pista que parecia infinita com a presena da Pri. O fato a Priscila conseguiu transformar a minha maravilhosamente viagem em um dos meus piores pesadelos. Como uma pessoa pode ser assim, meu Deus? Afinal de contas, eu realmente estava mesmo precisando esfriar a minha cabea depois daquela enorme pilha de documentos que me obrigaram a organizar l no escritrio. J estava quase abrindo a boca para lembr-la de que ela mesma a prpria quem se convidou para essa viagem quando o Rodrigo disse por fim: Espero que essa tal de Manoela seja apresentvel, Rafa, e que, principalmente, tenha algumas amigas, porque, francamente meu velho, no vim pagar de motorista de ningum e muito menos ficar segurando vela. Pronto. Era s que me faltava! Alm de ter que suportar toda a viagem ao lado da insuportvel e grudenta Pri, ainda teria que ouvir algo do tipo como reclamaes do meu amigo que, para incio de conversa, nem era para estar me acompanhando nesse momento. E eu pensando que, com a Priscila junto, o Rodrigo acabaria esquecendo a Manu e decidisse lev-la para algum lugar bem distante enquanto eu a Manu estivssemos por a, conhecendo os cartes postais de So Jos dos Campos. Sem comentrios durante a viagem, cara, por favor! desabafei, tentando encontrar uma maneira mais lgica para desencostar os braos entrelaados da Priscila

  • que insistem em grudar no meu ombro a cada dois segundos desde que samos de BH rumo a So Jos dos Campos. Por dentro eu rezava para que a Manu tivesse mesmo duas amigas para a nossa alegria. No que eu esteja querendo satisfazer as vontades dos meus dois piores/melhores amigos (estou em dvida ainda de como devo defini-los), mas o motivo disso tudo se deve ao fato de que essa a primeira vez em que estarei diante da Manoela, e por incrvel que parea, no quero que os dois acabem estragando isso, embora por dentro algo me diz que isso estar para acontecer. A verdade que, todas as vezes em que tento encontrar alguma garota decente desde que decidi morar sozinho naquele apartamento enorme, os dois acabam fazendo exatamente o contrrio do combinado. Uma parte da culpa minha por no aceitar seguir um relacionamento srio com algumas dessas garotas, mas o fato que no d para gostar de pessoas pela qual s querem voc pelo que voc tem (ou faz) ao invs do que voc possa e queira oferecer ao longo do tempo. No que eu esteja me gabando por ter me tornado um escritor aos vinte e trs anos e decidi fazer a minha vida se dividir em milhes de romances pela qual nunca viverei, mas chega de garotas no meu p por causa disso, j basta a Pri que acredita firmemente um dia conseguir se relacionar comigo. ''Ainda bem que voc apareceu, Manu, e bem na hora certa.'' pensei por fim. A propsito, Rodrigo, vocs j sabem o que iro fazer quando chegarmos em So Jos dos Campos? Porque eu a Manu no estaremos includos nisso, tenha certeza disso. eu disse, olhando na direo do Marcelo

  • que por sinal j esperava isso e ao mesmo tempo pendido piedade por ter que suportar a Pri durante toda a viagem sem minha presena. J sim, Rafa! a Pri entrou na conversa pegando um pequeno pedao de papel dobrado que estava na sua bolsa e me entregou com um sorriso amarelo mais largo que eu j havia visto durante toda minha vida Aqui est a nossa lista de afazeres quando por fim chegarmos em So Jos dos Campos. Detalhe por detalhe: onde comeremos, dormiremos, caminharemos Eu no acredito que voc criou uma lista, Priscila! Rodrigo a encarava pelo reflexo do retrovisor, enquanto segurava o volante Caramba, como voc imprevisvel. Eu amo garotas que me surpreendem at mesmo quando eu achava que elas no conseguiriam fazer isso. Um ponto pra voc! Lhe dou cinco estrelas. e dizendo essas palavras ele piscou para ela, esperando um ''obrigado'' em seguida. O que certamente aconteceu logo depois. Hmm obrigada, Rodrigo! agradeceu Priscila, enquanto suas covinhas apareceram Voc at que bonitinho, sabia? ela abaixou os clios e sorriu maliciosamente. Minha surpresa havia dado as caras assim que abri o papel (ou, como a prpria Pri diz: lista de afazeres quando chegarmos a So Jos dos Campos) 1. Pentear os meus cabelos. 2. Vestir algo agradvel para chamar a ateno do Rafael. 3. Conhecer a famosa Manoela. 4. Tentar compreender o que o Rafael viu nela.

  • 5. Conhecer os lugares mais movimentados da cidade. 6. Impedir que o Rafael e a Manoela se encostem (tipo, que ambos se beijem ou algo h mais acontea perante a minha custdia). Mas que diabos isso, Priscila? gritei completamente incrdulo ao ver aquilo. Certamente eu iria mesmo beijar a Manu, mas no esperava que a Pri j estivesse planejando estragar esse momento. O que me fez repetir a pergunta pela qual insiste em me perturbar diante a Priscila: ''Como uma pessoa pode ser assim, meu Deus? C-O-M-O?'' Desculpa, Rafa! Essa era a minha lista anterior, acabei pegando a lista errada espere s um momento que eu j lhe mostro a atual. prosseguiu ela, agora com o papel nas mos depois de ter me arrancado-o, agarrando a bolsa e revirando-a de cima a baixo. ''Se aquela era a lista anterior, no quero nem ver a atual'' pensei, enquanto tentava assimilar tudo aquilo sem perder a cabea. A falta de desconfimetro um problema srio, viu!