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17° Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas Panorama da Pesquisa em Artes Visuais – 19 a 23 de agosto de 2008 – Florianópolis

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MUSEU ABERTO: A CIDADE COMO MUSEU E O MUSEU COMO PRÁTICA ARTÍSTICA

Lilian Amaral

Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo, Brasil / Universidade

Complutense Madrid, Espanha.

[email protected]

Resumo Projeto transdiciplinar com ênfase nas atuais abordagens dialógicas estabelecidas entre arte e esfera pública. Discute o estatuto contemporâneo do museu como espaço de investigação e interlocução artística com base em ações e experiências processuais e colaborativas. Desenvolve procedimentos inspirados nas práticas museais, tendo os imaginários urbanos como território de análise, configurando novas arqueologias da memória urbana contemporânea. Palavras-chave Arte colaborativa, esfera pública, imaginários urbanos, arqueologia da memória, documentário. Abstract Transdisciplinary project focused on contemporary dialogic aproach based on art and public sphere. It discusses the role of contemporary museum as a research’s space and artistic conversation. It develops procedures inspired on museum practices and it has the urban imaginaries as territories of analyses, configurating new archeology’s of contemporary urban memory. Key-words Collaborative art, public sphere, urban imaginary, memory’s archeology, documentary.

Introdução

Incorporado como procedimento metodológico da investigação de

doutorado “Museu Aberto: A Cidade como Museu e o Museu como Prática

Artística”, de Lilian Amaral, o projeto Casa da Memória – Núcleo da Memória

Audiovisual da Paisagem Humana da Vila de Paranapiacaba, São Paulo/Brasil,

integra o Projeto “Museu a Céu Aberto” aprovado pelo IPHAN/Ministério da

Cultura, 2007.

Concebido como espaço interdisciplinar para análise das interlocuções e

mediações que se dão hoje entre áreas do documentário, seus correlatos e as

artes visuais, no primeiro módulo, realizado entre Agosto e Dezembro de 2006,

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na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, elaborou-se

a Videoinstalação MultipliCity – DVD, como estratégia para delinear os contornos

do Museu de Experiências Pessoais, um dos territórios para os quais a

investigação aponta, utilizando o vídeo como recurso documental de ações

artísticas e de narrativas coletivas.

O processo que se estendeu ao longo do ano de 2007 com o

desenvolvimento de workshops e pesquisas das quais participaram especialistas

brasileiros e estrangeiros, constituiu as bases do projeto Casa da Memória –

Núcleo da Memória Audiovisual da Paisagem Humana de Paranapiacaba que

terá inauguração posterior à realização, em Dezembro do mesmo ano, do

projeto 24h: una linea en la ciudad, proposta interdisciplinar de arte urbana com

base em Barcelona, que desde 2003 propõe intervenções efêmeras no espaço

público, criando uma rede de ações artísticas que ocorrem simultaneamente em

cidades européias e latino americanas1.

A realização consecutiva de lançamento da Casa da Memória articulada

ao projeto 24h: una linea en la ciudad promove reflexões e ações acerca dos

imaginários urbanos da Vila de Paranapiacaba em diálogo com outros contextos

culturais nacionais e internacionais, estimulando produções audiovisuais que

serão incorporadas ao acervo em construção da Casa da Memória, cuja

inauguração ocorre em Maio de 2008.

O foco atual da pesquisa em processo é o estatuto contemporâneo do

Museu como lugar para a prática artístico-crítica, tendo nas memórias individuais

e coletivas e na arte colaborativa sua estrutura e corpo poético.

CASA DA MEMÓRIA2

Núcleo da Memória Audiovisual da Paisagem Humana de Paranapiacaba, 2007.

Curadoria Lilian Amaral

Proposta de investigar e operar as memórias individuais e coletivas dos

moradores da Vila de Paranapiacaba, articulando-as numa perspectiva

documental audiovisual sistemática com bases tecnológicas. Casa da Memória 1 POCS http://www.pocs.org/ 2 www.casadameoria.wordpress.com

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constitui-se a partir de um Projeto Processual Colaborativo, do qual participam

especialistas brasileiros e estrangeiros em diversas áreas do conhecimento –

artes audiovisuais, arquitetura, urbanismo, preservação e reabilitação do

patrimônio, história oral, antropologia e arte/educação.

Define-se como Núcleo da Memória Audiovisual da Paisagem Humana em sua

interface direta com o território, configurando-se como espaço experimental,

intermidiático e interdisciplinar contemporâneo, expositivo, educativo e local de

encontro para mostras, cursos, palestras, oficinas, apresentações, audições,

projeções, assim como de um Centro de Documentação e Referência da

Paisagem Humana da Vila de Paranapiacaba.

Configura-se no âmbito da experimentação de práticas artísticas

contemporâneas que investigam os imaginários urbanos a partir das fronteiras e

potências entre linguagens, meios e contextos, com base em processos

colaborativos com perspectivas de apropriação, pertencimento e ressignificação

do patrimônio material e imaterial.

Envolve a comunidade de moradores no processo de desenvolvimento do

projeto colaborativo, tendo os Monitores Ambientais e Culturais de

Paranapiacaba como Agentes da Memória e Mediadores por excelência,

estabelecendo articulações entre arte e vida, individual e coletivo, imaginários

urbanos e suas representações, o local e o global.

Num momento em que o fluxo, deslocamento, transitoriedade e velocidade

caracterizam a dinâmica de trocas – informações, conhecimento, comunicação

contemporânea, e em um contexto em que o Brasil se vê pressionado a

repensar sua infraestrutura no âmbito dos transportes, tendo como agravante os

recentes desdobramentos resultantes do colapso aéreo especialmente vivido na

cidade de São Paulo em Julho de 2007, parece-nos extremamente oportuno

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colocar em pauta discussões que apontem perspectivas de revitalização do

transporte ferroviário que há tanto tempo tem sido relegado à obsolescência e ao

esquecimento, apontando possibilidades de reinvenção real e simbólicas de

preservação do patrimônio, promovendo a mobilização crítica e a transformação

social por meio de diálogos mediados pela arte e criatividade. 3

Tempo Presente e a História

O mundo contemporâneo caracteriza-se por transformações aceleradas da

noção relacionada ao tempo, ao espaço e à individualidade.

Todas elas abrigam a figura do excesso, característico da supermodernidade.

O “lugar antropológico” passa a ser definido como aquele que é vivido para

quem vive lá, e também para aqueles que vêm de fora e tentam interpretá-lo. Tal

lugar opõe-se ao que se denomina “lugares da memória”, os quais suscitam a

nostalgia, a recordação.

Antropologia do aqui e agora

O etnólogo em exercício é aquele que se encontra em algum lugar [seu aqui do

momento]. A pesquisa antropológica trata, no presente, da questão do outro. Ela

o trata no presente, o que basta para distingui-la da história. Enquanto no “lugar

antropológico” seu habitante “não faz a história, mas vive na história” [práticas

socioculturais do presente], nos “lugares da memória” apreende-se “a imagem

do que não somos mais”, pois seu significado está na memória, no passado.

Outra noção de tempo presente articula-se com o conceito de história de Walter

Benjamim. Em tal conceito, o passado ainda tem algo a dizer, e o presente

contém o passado que não foi redimido.

3 Paranapiacaba foi a primeira vila ferroviária do Brasil, construída pelos ingleses em meados do século XIX, a partir da qual se desenvolveu a conexão entre o interior e o litoral, estimulando a economia cafeeira, a imigração, notadamente de portugueses e espanhóis e a tecnologia do transporte ferroviário. Constitui-se como um dos cem sítios de maior relevância mundial de caráter histórico, ambiental e humano, reconhecida pela UNESCO em 2002.

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Documentário: Realidade/Ficção

Olgária Matos vê a imagem localizada a meio caminho entre o sensível e o

inteligível. É a “imaterialidade material” [Matos, 1991:17] que remete a uma força

fora do comum, excedente a si mesma e referida a uma efetualidade mágica

[imagem no sentido de reprodução, de representação].

Representação A aproximação do filme documentário com aquilo que se vive ou viveu é o que

leva à afirmação de que é nas representações que esse gênero de filme faz, que

o diferencia da ficção, e não na sua construção como texto, porque ambos são

textos.

Diferenciação Essa diferenciação é importante, mas, com os recursos disponíveis atualmente,

o documentarista/historiador/artista/”artógrafo”4 [Irwin, 2008] pode alterar de tal

modo a imagem, recriar situAÇÕES, que o documentário final não será mais

uma representação do mundo vivido, e sim algo que diz respeito ao mundo

imaginado.

De que outro modo pode um “passado”, por definição constituído de eventos,

processos, estruturas, etc. não mais perceptíveis, ser representado em qualquer

consciência ou discurso, a não ser de modo “imaginário”?

DocumentAÇÃO: O Artista como documentarista ou etnólogo A Autoria Compartilhada: proporcionada pelo recurso da história audiovisual

pautada pelo trabalho coletivo.

A montagem: O momento em que se busca uma articulação entre as etapas que

a antecederam, envolvendo todos os elementos constitutivos do documentário.

Aspectos do Documentário Contemporâneo O documentário contemporâneo, esteve, durante boa parte de sua trajetória,

submetido à etmologia da palavra documento [do latim docere: ensinar, mostrar]

e às funções de revelar, dar a ver, denunciar. Mas o entendimento do

4 a/r/tographer – artist-researcher-teacher, proposições de escritura coletiva na qual artista e comunidade são co-autores de uma mesma narrativa ou texto. Ver Rita Irwin.

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documento está hoje em pleno redimensionamento, na medida em que, munido

de aparatos como celulares ou câmeras digitais, qualquer um está

instrumentalizado a assumir o papel de testemunha. O documentário está

“gualado” ao artista, ao amador ou ao turista, que acidentalmente ou não,

registra uma cena real. Diante desse quadro vimos desafiar o que historicamente

se categorizou chamar de “documentário” e discutir outras acepções para a

prática documental. Flexibilizando de maneira a ocupar um extenso expectro de

práticas artísticas, o documentário é alçado à condição mais de dispositivo do

que de gênero cinematográfico. Nas mãos do artista contemporâneo, torna-se

uma ferramenta com outros usos e funções, que incluem mapear processos,

invenar personagens e construir territórios. Ao invés da função clássica de “azer

ver”, produz uma revisão dos modos de ver; apenas entrevê a realidade,

distinguindo-a de maneira parcial, subjetiva ou imperfeita. Esse estado errante

do documentário contemporâneo – que tramita do cinema à televisão e ganha

impulso nas artes visuais e na internet – é um dos objetivos de aprrensão das

investigações que vimos operando.

Delineamos a seguir, três eixos ou perspectivas que têm caracterizado a

produção contemporânea a partir de suas extremidades, fricções e interstícios.

O primeiro é formado por registros de ações artísticas e se propõe a pensar o

compromisso entre performance e documentação.

A peformance, que em primeira instância se impôs como crítica anti-

mercadológica, está implicada com a negação da obra de arte. Sugere, no lugar

da obra, o acontecimento e a situação efêmera, que a princípio não poderiam

ser retidos. Curiosamente, quanto mais imaterial a obra de arte quer se tornar,

mais objetos são gerados por ela – entre fotografias, textos, filmes e vídeos. A

documentação está intrinsecamente relacionada à performance e os trabalhos

construídos sobre questões processuais têm forte interdependência em relação

ao registro. Há casos em que a obra e o acontecimento e outros em que a ação

só se justifica por estar sendo registrada. Em qualquer caso, todos estão muito

próximos da construção de ficções. Na performance ou na intervenção urbana o

artista inventa situações e nos arremessa a pergunta: que distância há entre

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uma cena criada e uma situação real? Jacques Rancière sugere que a “ficção

não é o fato de contar histórias imaginárias. É a construção de uma relação nova

entre a aparência e a realidade, o visível e sua significação, o singular e o

comum”. Faz sentido considerar a convergência entre a situação inventada pela

performance e a intervenção sobre o fato, praticada pelo “documentário

compartilhado”, do cinema verité, ou pela “dramaturgia de intervenção” do

cinema brasileiro militante das décadas de 1960 e 70? Existe um tensionamento

entre os recursos de fabulação e documentação expandindo os limites destes

dois territórios.

No segundo eixo, do centro da ação a câmera é deslocada para a situação de

invisibilidade e observação Esse posicionamento distante ou com certo recuo,

do acontecimento configura os testemunhos de situações reais. O

comportamento da câmera é mais parecido com o cinema direto norte-

americano, um cinema de observação que produz um testemunho sem jamais

interferir na cena. O vídeo, neste contexto é uma janela onde é projetada uma

ilusão sobre o mundo, lançando a suspeita de que há a iminência para o cidadão

comum tornar-se um personagem aos olhos do outro levantando a questão:

podem os acontecimentos diante da câmera ser captados espontaneamente,

sem qualquer tipo de encenação ou a teatralidade é um princípio inerente ao

comportamento humano [diante da câmera ou não?. Apresenta-se aqui uma

questão comum a todo documentário: a relatividade entre representação e

verdade.

O terceiro eixo é caracterizado tanto pelo uso de um ou mais protocolos

documentais – entrevista, conversa, registro de cena real, narração de história

verídica, testemunho pessoal, etc – quanto pelo desmonte dos mesmos

protocolos, reinventando dramaturgias. Há uma evidente ambivalência da

condição documental construída a partir do diálogo entre a voz do

documentarista e a voz do outro. A voz do autor prevalece nos trabalhos que

funcionam como ensaios, videodiários e narrativas pessoais. Situam-se aqui

trabalhos que que funcionam quase sempre como reflexões em primeira pessoa.

São discursos que não pretendem se passar pelo real e aproximam-se do

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conceito de filme-ensaio, de Arlindo Machado. O cineasta português Pedro

Costa sugere aponta que “é preciso saber onde estamos e a que distância

estamos do que filmamos”. A voz do outro se sobressai nesse tipo de trabalho

com maior comprometimento de observação e articulação de contextos culturais

ou sociais. PAISAGENS DA MEMÓRIA / MEMORYSCAPES. Dar voz ao outro é

ceder a câmera ao outro, são atitudes dos projetos antropológicos dos anos

1970. A ausência do autor no ato da filmagem é outra condição que valoriza a

expressão do outro, indicando a permeabilidade entre as condições eu/outro,

sujeito/objeto, identificação/diferenciação. Fica evidente que mesmo quando o

assunto é o outro, fala-se de si mesmo, questão emblemática que parece estar

por trás de todo impulso documental contemporâneo: a negociação entre

identidades. Estratégias de relação, representação e construção do outro. O

documentário, neste contexto, não é a obra. Por esse motivo está muito próximo

da condição de certos registros de ação porque não abarca toda a complexidade

da experiência gerada pelo acontecimento. Seria, então um problema a

discrepância entre registro e experiência? Talvez a maior diferença entre registro

e documentário seja a impossibilidade de o registro compartilhar da vocação

transcendente do acontecimento. Ao aproximar o documento, a documentação e

o documentário, o objetivo desta análise é identificar atritos e correspondências

entre os campos.5

História Oral, História Audiovisual

A história audiovisual tem forte relação com a história escrita. As palavras

faladas, ao serem transcritas, transformam-se em palavras-escritas. Logo,

constituem-se em meio idôneo de reconstrução da história.

5 Fronteiras da Arte Pública Contemporânea: Corporeidade, Percurso e Composição Urbana. Vídeo resultante de workshop internacional realizado no Sesc Campinas do qual participaram artistas jovens da cidade, estudantes de graduação e pós-graduação em artes da Unicamp e PUC Campinas, com participação de Bia Medeiros, coordenadora do Grupo de Pesquisa Corpos Informáticos da Unb, de Daniel Toso, artista ítalo-argentino residente em Barcelona, sócio fundador do coleitov artístico POCS – www.pocs.org - e Lilian Amaral, também curadora do projeto que a um só tempo desenvoleu ações, composições urbanas e registros em vídeo, produzido coletivamente como resultado do workshop.

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Na História Oral em vídeo, a palavra reaparece, com importância vital também,

só que a palavra filmada, colada à imagem, quando editada, é colada a outras

linguagens, o que resulta em novos tipos de história que os meios audiovisuais

podem oferecer, uma História que corre paralela à história escrita.

História Visual: propiciada pela mudança de suporte.

Ver, conforme Marilena Chauí, é pensar por meio da linguagem. Ver, ainda

segundo a autora, leva as pessoas ao mundo exterior, enquanto ouvir leva-as ao mundo interior [Chauí, 1988].

Na História Oral em vídeo, ver e ouvir são diferentes faces de uma mesma

moeda. A expressão história visual guarda certa impropriedade porque a

narrativa fílmica evoca outras narrativas ou linguagens para além da imagem,

tais como a verbal, a escrita, a sonora e a gestual. Se a denominação de história

visual é inadequada ou não, o que importa é que a história que surge do suporte

vídeo é diferente da história que decorre apenas da linguagem escrita. No

embate entre a história escrita e a história audiovisual há certa desconfiança,

incompreensão ou recusa em aceitar os meios audiovisuais no processo de

recriação histórica, pois advém da pluralidade e diversidade metodológica.

Corporeidade, Percurso e Composição Urbana5 [Medeiros, 2008] Investidos de uma nova atitude estético-crítica pautada numa maior proximidade

entre arte e política, identificamos um conjunto significativo de propostas que

evidenciaram, por meio de inter[in]venções, percursos e composições urbanas,

“a concepção da arte calcada no enraizamento das práticas sociais coletivas,

indicando uma relação produtiva entre arte e gestão do espaço público [...]

resultando em invenções criativas para formas do habitar” [Veloso, 2004-5: 113].

5 Composição Urbana é o conceito utilizado no âmbito dos trabalhos artísticos, performances e acontecimentos realizados em espaços públicos pelo Grupo de Pesquisa Corpos Informáticos, coordenado por Bia Medeiros no Pós-Graduação da Unb. Bia Medeiros. Trajetórias do Corpo. Conjunto Cultural da Caixa.Brasília, 17 de abril a 25 de maio de 2008. Curadoria Priscila Arantes.

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Apresentam uma visão dialógica de espaço da arte, vida cotidiana, corpo e

lugar, acreditando firmemente que é possível construir e reconstruir outros tipos

de cidades, reais e imaginárias.

Na [re]invenção da cidade, o urbanismo cidadão é exercido pelos habitantes e

potencializa os imaginários urbanos [Silva, 2001].

Estudar os urbanismos cidadãos é não somente examinar práticas cidadãs na

construção de identidades sociais e de ações contra os poderes, mas uma

intenção de compreender esses novos modos de apresentação cidadã que

consolidam ou desafiam os modos estabelecidos de viver o presente e de

imaginar o futuro.

No que tange ao direito à cidade, podemos entender que a gestão participativa

está no centro de todas as questões que afetam seu desenvolvimento

democrático, criando o mapa simbólico da cidade para visualizar narrativas em

conflito, capturando a imagem e identidade do lugar.

Críticas contrárias ao marketing urbano, tais como exercícios simplistas e

elitistas, emergem em paralelo a uma demanda para incrementar o orgulho local

e a crença de que utilizando atividades culturais como elemento catalisador para

a recuperação da cidade pode-se ajudar a criar uma ponte entre as

necessidades de imagem externa e identidade local.

Neste sentido, a produção e representação de uma história e/ou imagem

consensual sobre o processo de regeneração urbana podem ser consideradas

como uma manifestação chave da gestão democrática da cidade, criando linhas

de atuação que giram em torno das políticas de representação, das práticas de

legitimação discursivas e da crítica aos modelos de visualidade curatorial,

midiática e urbanística.

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As mercadorias simbólicas serão lidas a partir de suas relações com as práticas

artísticas contemporâneas, com o trabalho criativo e com as novas formas de

produção de subjetividades através da representação cultural, dando visibilidade

a um conjunto de práticas de produção e consumo das identidades locais –

capitais simbólicos culturais – em um contexto bem definido como o do espaço

público intercultural das cidades contemporâneas. Problematizações

1. Reflexões acerca da Arte Contemporânea, Imaginários Urbanos e o

Público: entre a instituição, o mercado, a indústria cultural e o

intertainment.

2. Interterritorialidades : novas gestões, novos territórios. Curadorias,

cartografias, cooperações, trocas, disseminações. O artista como

agenciador.

3. Transformação Social e Inclusão Cultural: O papel e a avaliação da

atuação de organizações não-governamentais, artista – comunidade e a

mídia.

Referências Bibliográficas

CHAUI, Marilena. “Janela da Alma, Espelho do Mundo”, in NOVAES, Adauto [Org]. O

Olhar. SP: Companhia das Letras, 1988.

IRWIN, Rita. ”A/r/tografia: Uma Mestiçagem Metonímica”, in BARBOSA, Ana

Mae e AMARAL, Lilian [Orgs.]. InterTerritorialidade: fronteiras intermídias, contextos e

educação. SP: Editora Senac/SESC, no prelo.

MATOS, Olgária C. F. “Imagens Sem Objetos”, in NOVAES, Adauto [Org]. Rede

Imaginária: televisão e democracia. SP: Companhia das Letras/Secretaria Municipal de

Cultura, 1991.

MEDEIROS, Maria Beatriz de. Trajetórias do Corpo. Conjunto. Cultural da Caixa Brasília, 17 de abril a 25 de maio de 2008

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SILVA, Armando. Imaginários Urbanos. SP: Perspectiva ; Bogotá: Convenio Andrés

Bello, 2001. [Estudos ; 173].

VELOSO, Mariza. Rede Nacional de Artes Visuais. FUNARTE/Ministério da Cultura,

2004/2005.

Curriculum Vitae Lilian Amaral–[email protected] - www.casadameoria.wordpress.com

Artista Audiovisual, especialista e docente na área de Arte Pública Relacional

Contemporânea. Doutoranda em Artes pela ECA/USP. Curadora da Casa da

Memória-Museu a Céu Aberto,IPHAN/MINC. Pesquisadora FAPESG / CNPQ.

Representante Brasileira do POCS/Barcelona.Bolsista Mobilidade Internacional

Santander 2008/Espanha/Universidade Complutense de Madrid.