mulher - bancarios-es.org.br fileção da população negra na socie-dade brasileira. o dia nacional...

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Informativo do Sindicato dos Bancários/ES - Coordenador Geral: Carlos Pereira de Araújo - Diretor de Imprensa: Jonas Freire Santana - Editoras: Lara Abib (MTb 2669-ES) e Bruna Mesquita Gati - MTb 3049-ES - Diagramação: Jorge Luiz (MTb 041/96) - nº 99 - Novembro/2012 - [email protected] - Tiragem: 10.000 exemplares Editorial Abayomi Em novembro, o Jornal Mulher 24 Horas dedica suas páginas à reflexão sobre a inser- ção da população negra na socie- dade brasileira. O Dia Nacional da Consciência Negra, celebrado no dia 20 de novembro, coincide com o dia da morte de Zumbi, o grande líder do Quilombo dos Palmares, respeitado herói da re- sistência antiescravagista. Estampado em sua capa, a edição traz as bonecas abayo- mi. De origem iorubá, a palavra abayomi quer dizer encontro pre- cioso. As bonecas foram criadas dentro dos porões dos navios negreiros, que viajavam da Áfri- ca ao Brasil, trazendo milhares de mulheres negras, mães, que, na tentativa de diminuir a agonia sofrida por suas crianças, retalha- vam parte de suas vestes para a fabricação dos brinquedos. Passados mais de 120 anos após a abolição da escra- vatura no Brasil, a agonia da po- pulação negra permanece, diluí- da entre os milhares de negros e negras vitimados cotidianamen- te pelo preconceito e exclusão social. Para a categoria bancária, o período impõe a necessidade de repensar as relações étnicas estabelecidas no ambiente de trabalho para, finalmente, rom- per com o racismo estabelecido nos e pelos bancos. 18 anos Mulher 24 HORAS 4 Anemia Falciforme: Racismo institucional na saúde Campanha Salarial 2012: pauta de igualdade de oportunidades não avança VEJA NESTA EDIÇÃO RESGATE Alzira Rufino* Sou negra ponto final devolvo-me a identidade rasgo a minha certidão sou negra sem reticências sem vírgulas sem ausências sou negra balacobaco sou negra noite cansaço sou negra ponto final 2 Sou negra ponto final devolvo-me a identidade rasgo a minha certidão sou negra sem reticências sem vírgulas sem ausências sou negra balacobaco sou negra noite cansaço sou negra ponto final

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Informativo do Sindicato dos Bancários/ES - Coordenador Geral: Carlos Pereira de Araújo - Diretor de Imprensa: Jonas Freire Santana - Editoras: Lara Abib (MTb 2669-ES) e Bruna Mesquita Gati - MTb 3049-ES - Diagramação: Jorge Luiz (MTb 041/96) - nº 99 - Novembro/2012 - [email protected] - Tiragem: 10.000 exemplares

Editorial

AbayomiEm novembro, o Jornal

Mulher 24 Horas dedica suas páginas à reflexão sobre a inser-ção da população negra na socie-dade brasileira. O Dia Nacional da Consciência Negra, celebrado no dia 20 de novembro, coincide com o dia da morte de Zumbi, o grande líder do Quilombo dos Palmares, respeitado herói da re-sistência antiescravagista.

Estampado em sua capa, a edição traz as bonecas abayo-mi. De origem iorubá, a palavra abayomi quer dizer encontro pre-cioso. As bonecas foram criadas dentro dos porões dos navios negreiros, que viajavam da Áfri-ca ao Brasil, trazendo milhares de mulheres negras, mães, que, na tentativa de diminuir a agonia sofrida por suas crianças, retalha-vam parte de suas vestes para a fabricação dos brinquedos.

Passados mais de 120 anos após a abolição da escra-vatura no Brasil, a agonia da po-pulação negra permanece, diluí-da entre os milhares de negros e negras vitimados cotidianamen-te pelo preconceito e exclusão social.

Para a categoria bancária, o período impõe a necessidade de repensar as relações étnicas estabelecidas no ambiente de trabalho para, finalmente, rom-per com o racismo estabelecido nos e pelos bancos.

18 anosMulher 24 horas

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anemia Falciforme:racismo institucional

na saúde

Campanha salarial 2012: pauta de igualdade de

oportunidades não avança

VEJA NESTA EDIÇÃO

RESGATEAlzira Rufino*

Sou negra ponto finaldevolvo-me a identidaderasgo a minha certidãosou negra sem reticênciassem vírgulas

sem ausênciassou negra balacobacosou negra noite cansaçosou negraponto final

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Sou negra ponto finaldevolvo-me a identidaderasgo a minha certidãosou negra sem reticênciassem vírgulas

sem ausênciassou negra balacobacosou negra noite cansaçosou negraponto final

adequados para controlar as crises de dor e demais si-nais e sintomas da doença contribui para o afastamento do paciente dos serviços de saúde e o agravamento do quadro médico.

Para Vandete Ramos Fer-nandes, presidente da AFES - As-sociação de Portadores de Anemia Falciforme do Espírito Santo - a invi-sibilidade da anemia falciforme nos serviços de saúde, a ausência de in-formação sobre ela nas universida-des, a falta de informação e forma-ção específica para os profissionais, tudo isso é a expressão material do racismo institucional. Até porque essa invisibilidade atinge uma parte da população que já é mais vulnerá-vel, mais pobre, que não tem acesso

Todos esses depoimentos reti-rados do documento “Racismo insti-tucional: um desafio para a equidade no SUS” retratam a ignorância e o desconhecimento a respeito da ane-mia falciforme, que embora seja a doença hereditária mais comum do Brasil, com maior prevalência entre os afro-descendentes, ainda é pouco co-nhecida pelos profissionais de saúde.

Segundo estimativas da Orga-nização Mundial de Saúde (OMS), nascem, anualmente, no Brasil, 2500 crianças com a patologia, das quais 20% morrem antes dos cinco anos de idade por complicações relacionadas a ela. Por não ser um tema de domí-nio dos profissionais de saúde, há di-ficuldades para o diagnóstico adequa-do, o que contribui para o sub-registro dos óbitos causados pela doença. O desconhecimento dos procedimentos

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Racismo institucional na saúdeANEmIA fAlcIfOrmE

A anemia falciforme é cau-sada por uma mutação do gene da hemoglobina que determina a alteração da forma dos glóbulos vermelhos, que se tornam pareci-dos com uma foice. As hemácias se agregam e dificultam a circula-ção do sangue nos pequenos va-sos do corpo. Com a diminuição da circulação ocorrem lesões nos

órgãos atingidos, podendo causar dor, inchaço na mão e nos pés, fe-ridas nas pernas, palidez, atraso no crescimento, icterícia, insuficiência renal, hepática, pulmonar, dor de cabeça, derrame, desmaios, pria-pismo (ereção prolongada e do-lorosa) etc. O diagnóstico precoce da anemia falciforme é muito im-portante. A detecção da doença é

feita através do exame ‘eletrofo-rese de hemoglobina’. O teste do pezinho, realizado gratuitamente antes do bebê receber alta da ma-ternidade, também proporciona o diagnóstico da hemoglobinopatia. Embora a anemia falciforme não tenha cura, o tratamento precoce pode ajudar a aliviar os sintomas e controlar as complicações.

Saiba maiS Sobre a anemia FalciForme

“Quando um paciente negro chega ao hospital com crise de dor por anemia falciforme, é tratado como

viciado em analgésico”. “O meu menino tinha dor no braço e eles engessaram”. “Rapaz, um negão desse tamanho sentindo dor?”. “Eu sentia um cansaço, e me sentia culpada por não dar conta dos serviços de casa, eu estava quase acreditando que era preguiçosa, daí no pré-natal descobriram que eu tinha uma alteração nos glóbulos vermelhos”.

a uma série de serviços e com me-nor grau de escolaridade.

“A anemia falciforme é uma doença que foi descoberta há um sé-culo. Entretanto, um século depois ain-da não se sabe exatamente o que é. Quando eu criei a Associação há dez anos, foi para dar suporte as pessoas com doença falciforme e aos familiares dos falcêmicos. Para difundir informa-ção mesmo, porque a gente chega no SUS e os médicos desconhecem a do-ença, se recusam a atender, falam que a pessoa tem que ser tratada por um hematologista.Isso acontece até com quem paga plano de saúde”, relata.

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Palavra de Mulher

A invisibilidade dotrabalho da mulher negra

Mestre em Estudos de Gênero e Feminismo pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), a professora Zilmar Alverita discute a inserção da

mulher negra no mercado de trabalho brasileiro

O que significa dizer que hoje existe uma “invisibilidade das mulheres negras” no mer-cado de trabalho?

Quando falamos em “invisibi-lidade das mulheres negras” no con-texto específico do trabalho (porque também somos invisíveis em outros contextos sociais) estamos afirmando que os espaços ocupados pelas mu-lheres negras no mercado de traba-lho são espaços de pouco poder. As mulheres negras continuam concen-tradas em alguns “guetos ocupacio-nais”, como por exemplo, os traba-lhos manuais, de baixa remuneração. Sua “invisibilidade” ocorre porque estão realizando trabalhos que, ape-sar de importantes para a sociedade, não são vistos desta forma.

E as desigualdades sala-riais?

Na verdade, a desigualdade salarial é bastante complexa num contexto social como o nosso mar-cado por certa simbiose entre capi-talismo, racismo e patriarcado. Acho importante lembrar que a abolição da escravatura não foi acompanhada de um pro-cesso de inclusão dos negros, que seguiram à margem, sem acesso à uma política de moradia, educação e trabalho. Assim, no nosso contexto social, capitalismo-patriarcalismo-racismo atuam jun-tos, e de forma autônoma, operam demarcando lugares a depender da cor e do pertencimento racial, e a depender do sexo, e sempre de acordo com os interesses do capital.

Zilmar alverita: Universidade Federal da Bahia (UFBa)

Principalmente nos ban-cos privados é raro ver negras como bancárias. Por quê?

Os mecanismos de seleção para o mercado de trabalho, tendo por base a “boa aparência” (em-presas brasileiras já exigiram apre-sentação de fotografias anexada ao curriculum) reservam os melhores postos de trabalho aos homens e às

mulheres que estão de acordo com o padrão de beleza vigente no país: que é um padrão branco e jovem. Trata-se, portanto, de um mecanis-mo que tem em vista a manutenção das desigualdades e dos privilégios existentes entre homens, mulheres brancas e negras.

Qual o papel das cotas na

mudança desse paradigma?É importante lembrar que as

cotas têm um papel essencial no sentido de denunciar o racismo, ne-gado ao longo da história. Sua im-plementação faz com que o Estado brasileiro assuma a existência do ra-cismo e suas consequências na vida da população afrodescendentes no Brasil. As cotas raciais nas universi-

dades e nos concursos públi-cos são importantes porque um número maior de negros e negras passa a ocupar alguns espaços de maior visibilidade

no mundo do trabalho. Mas para enfrentar o racismo e os problemas que a população negra enfrenta no mundo do trabalho no Brasil é fun-damental articular políticas focali-zadas, como as cotas, com políticas estruturais, como a reforma agrária e a demarcação de terras indígenas e quilombolas.

“As mulheres negras continuam concentras em alguns

‘guetos ocupacionais’ ”

Sérgio Cardoso

Mulher 24 horas

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Mulheresantenadas

Bancos perpetuamdiscriminação

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O livro Quarto de Des-pejo é o diário de Caro-lina Maria de Jesus, uma catadora de papéis, semi-analfabeta, negra, pobre,

moradora da favela do Canindé, em São Paulo. Mes-mo sendo de 1960, o livro permanece atual por de-nunciar as condições miseráveis de vida na periferia.

Mais uma vez, os banqueiros demonstraram que não têm interesse em superar as di-

ferenças entre homens e mulheres e brancos e negros nas unidades ban-cárias, deixando de lado a pauta de igualdade de oportunidades durante a Campanha Salarial 2012. Mesmo representando me-tade da categoria (48% do efetivo bancário), as mulheres continuam ocupando postos com menores sa-lários ou recebendo menos pelas mesmas funções exercidas pelos ho-mens. Dados divulgados pelo Minis-tério do Trabalho em 2010 apontam que as mulheres bancárias recebem remuneração média 24% inferior à dos homens. Enquanto o rendi-mento nacional médio dos homens bancários é de R$ 5.022,00, o das

cAmpANhA SAlArIAl 2012

mulheres é de R$ 3.811,00. No aspecto raça, a discri-minação não é diferente. Apenas 19,5% dos trabalhadores do sistema financeiro são negros ou pardos, que ganham, em média, 84,1% do salário dos brancos. Para as mulhe-res negras o quadro de opressão é ainda mais grave: apenas 8% das bancárias são negras. “Essa realidade é resultado do racismo, que, ao contrário do que muitos pensam, não é pratica-do só por pessoas, mas também por empresas, órgãos públicos e bancos, especialmente os privados. Para mudar essa realidade é preciso exi-gir que os bancos adotem medidas de promoção da igualdade como as cotas, por exemplo”, afirma Rita Lima, diretora do Sindicato/ES.

Depois de anos de luta por igual-dade de oportunidades, o Banestes dá um pequeno passo rumo à promoção da igualdade.

Na Campanha Salarial 2012, os trabalhadores conseguiram garantir no Acordo Coletivo uma cláusula que atri-bui ao Banco a responsabilidade por “possibilitar a construção de condições ideais de oportunidades e a melhoria do atendimento a todos os seus empre-gados e usuários, sem distinção quanto a gênero, raça, orientação sexual e por-tador de deficiência física”.

Além disso, o termo determina ainda que o banco tenha “como prin-cípio administrativo na formação in-terna de seus profissionais o combate a todas as formas de discriminação”.

Na avaliação de Rita, o texto, ape-sar de generalista, representa uma vitória para a categoria. “O avanço é resultado direto da luta dos trabalhadores”.

Conquista no Banestes