movimentos migratórios de populações marítimas portuguesas · movimentos migratórios de...

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    Movimentos migratrios de populaes martimasportuguesasHenrique Souto

    Gegrafo, Departamento de Geografia e Planeamento Regional,Faculdade de Cincias Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa

    Av. Berna, 26 - C, 1069-061 Lisboa.

    ResumoOs assalariados rurais e os pescadores encontram-se entre os grupos

    populacionais que mais saem da sua terra em busca de melhores condies de vida. Nopossuindo a propriedade do solo (no caso dos assalariados rurais) ou trabalhando nummeio de propriedade comum (os pescadores) a motivao para partir maior. No casoconcreto das populaes piscatrias, acresce muitas vezes a mobilidade do recurso vivoexplorado e a propriedade da embarcao e das artes de pesca. Juntam-se, assim, doisfactores que contribuem para os seus movimentos, no passado muitas vezes efectuados emembarcao prpria, que servia de local de trabalho e de habitao. Foi assim quemuitos locais da costa portuguesa foram povoados.

    No se pretendendo fazer um trabalho exaustivo (que est por fazer), sublinham-se trs movimentos migratrios protagonizados por populaes ribeirinhas portuguesas,em trs perodos distintos: 1) O papel de lhavos, murtoseiros e varinos na colonizaodo litoral Norte e Centro de Portugal (e seu encontro com algarvios), na transio dosculo XIX para o XX; 2) Migraes da Praia da Vieira para o Rio Tejo, na primeirametade do sculo XX; 3) Movimentos temporrios de trabalho de pescadores portuguesespara a costa atlntica francesa, na actualidade.

    Palavras-chave: Migraes, Pescadores, Pesca.

    Introduo

    As motivaes para os movimentos migratrios de populaes ribeirinhas (leia-se

    de pescadores) no difere, na essncia, das constatadas para os restantes grupos

    populacionais, nomeadamente a busca de melhores condies de vida em locais diferentes

    dos da sua origem. Particularizam-se, porm, por estas populaes retirarem o seu sustento

    do meio aqutico, extraindo-lhes os recursos vivos que nele vivem, caracterizados por

    serem de propriedade comum e de ocorrncia e acessibilidade variveis no espao e no

    tempo. A esta motivao primordial acrescentam-se outras relacionadas quer com a

    industrializao da pesca (nomeadamente no perodo de desenvolvimento da indstria

    conserveira, que criou oportunidades de trabalho nos portos mais importantes) quer com

    limitaes ou restries legais a esta actividade. No menos importante foram as alteraes

    verificadas na linha de costa, que na orla sedimentar ocidental portuguesa, particularmente

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    na regio lagunar de Aveiro, obrigaram muitos pescadores a abandonar, temporria ou

    definitivamente, as suas terras.

    Fig. 1 - Principais migraes internas de pescadores emPortugal Continental referidas no presente texto.

    1. O papel de lhavos, murtoseiros e varinos na colonizao do litoral Norte e Centro

    de Portugal (e seu cruzamento com algarvios)1

    A variabilidade do recurso explorado, de causas muitas vezes difceis de

    estabelecer, aparece por vezes evidente. Assim, uma das regies que mais migrantes

    originou, a da laguna de Aveiro (vulgo Ria de Aveiro), parece ter a sua gnese em

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    alteraes no meio lagunar, que ora proporcionava boas condies de vida ora a tornava

    extremamente difcil, fenmeno muito comum at ao incio do sculo XX, altura em que se

    estabilizou a ligao ao oceano, precisamente porque as alteraes na laguna dependiam

    essencialmente das condies dessa ligao. Sendo assim, no de estranhar que lhavos,

    murtoseiros e varinos se tenham transformado no grupo que mais se movimentou e

    estabeleceu no litoral portugus, particularmente at ao rio Sado e costa de Tria2, tendo a

    particularidade dos movimentos se fazerem por mar3.

    hoje ponto assente que lhavos, murtoseiros e varinos se deslocavam pela costa

    em busca de locais piscosos, estabelecendo-se, num primeiro tempo, apenas na poca da

    safra, construindo para isso habitaes precrias com materiais locais (palheiros), que eram

    abandonados aps o perodo de pesca, para num segundo tempo se sedentarizarem, dando

    assim nascimento a praticamente todas as praias de palheiros entre a laguna de Aveiro e a

    Praia da Vieira. Em alguns locais constituram importantes comunidades, como na Nazar,

    onde os lhavos foram um dos grupos mais importantes, seno o mais importante (Caneco,

    1999).

    Estas populaes tambm penetravam nos rios Tejo e Sado (Baldaque da Silva,

    1891) na poca da pesca ao svel, ao que tudo indica utilizando artes de pesca semelhantes

    s usadas nos seus locais de origem (o svel era capturado com uma rede designada

    saveira, semelhante s redes envolventes-arrastantes usadas em lagunas ou no mar, mas

    adaptada ao ambiente dos rios). No Sado no h sinais do seu estabelecimento, mas alguns

    ficaram pelo Tejo, encontrando-se ainda hoje naturais e descendentes destes pescadores.

    Ter sido a grande piscosidade do Tejo a atrair tambm pescadores da Praia da

    Vieira, certamente por possurem laos familiares com os primeiros. De facto, Baldaque da

    Silva (op.cit.) refere no Tejo a presena de pescadores varinos e lhavos e, no especificando

    a sua origem, barcos de pesca nas povoaes a montante de Vila Franca de Xira4.

    1 lhavo e Murtosa constituram dois importantes ncleos da emigrao portuguesa. A estepropsito veja-se Arroteia (1984).2 Os movimentos das populaes ribeirinhas da regio de Aveiro muito anterior ao sculoXIX (Amorim, 2000). A este propsito, Amorim (op.cit.) refere que A praia doFuradouro assim como outras praias ao longo da costa de Aveiro no eram ncleospermanentes. Existiam enquanto a poca de pesca funcionava e esta, sendo sazonal, deAgosto a Outubro, ou Novembro, permitia o desenvolvimento de outras ocupaes na Ria,na agricultura ou ento emigrava. conhecido o processo de disperso e povoamento dolitoral pelos pescadores de Ovar at ao Porto (...), at Caparica, a sul de Lisboa, oumesmo para o Algarve, para Olho. Sabe-se que emigravam, sazonalmente, para o Tejo,como aconteceu aquando do clebre terramoto de Lisboa de 1755 (...).3 Pelo menos assim ocorria no primeiro quartel do sculo XX, como to bem descreveRal Brando em Os Pescadores.4 Baldaque da Silva (op.cit.) refere quarenta barcos varinos, denominados batis-batis,tripulados por oitenta homens, nmero medio destas embarcaes, que do districto de Aveiroemigram para o Tejo; trinta barcos ilhavos, tripulados por quatrocentos e cincoenta homens, quedepois da pesca costeira tarrafa, vo pelo rio acima para a pesca do savel (...) e vinte barcos depesca que ha nas povoaes marginaes de Villa Franca para montante, geralmente com doishomens cada um.

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    Os varinos no se limitavam a viver da pesca pois estabeleceram desde muito cedo

    uma rede de comercializao do svel na regio de Ovar, o que aparece referido em diversos

    relatrios do incio do sculo XX efectuados por oficiais da Marinha5. Num desses

    relatrios encontra-se mesmo anotado que em Ovar, mesmo em perodos de carncia de

    peixe na laguna, nunca faltava o svel, pois era trazido do Tejo por comerciantes da terra.

    Esta propenso dos varinos (sobretudo das mulheres) para o comrcio do peixe agarrou-se-

    lhes de tal forma que ainda hoje, no norte do pas, as comerciantes de peixe so

    designadas por varinas, qualquer que seja a sua origem. E as varinas de Lisboa fazem parte

    da histria da cidade ...

    Outra regio que viu os seus pescadores sarem para outros praias foi o Algarve.

    De vrios locais partiram populaes pobres que se foram estabelecendo pela costa Sul at

    Costa de Caparica, onde se fixaram. Nesta localidade cruzaram-se com os lhavos que a

    tambm se sedentarizaram (Lisboa, 1951). Ainda hoje possvel constatar na Costa da

    Caparica, junto dos pescadores, esta dualidade de origens, traduzida por grande rivalidade

    entre os descendentes de algarvios e os descendentes de pescadores do Norte6, que se

    traduz, ainda hoje, por uma grande depreciao do grupo contrrio.

    Para os algarvios no se sabe bem a motivao para o movimento migratrio, que

    parece ter sido mais intenso nas primeiras dcadas do sculo XX, mas no devero andar

    longe das ms condies de vida e do trabalho sazonal e assalariado nos campos e no mar7.

    Todavia, encontram-se ainda hoje algarvios, ou seus descendentes, principalmente nas terras

    em que a pesca mais se industrializou, num movimento associado difuso de inovaes

    na indstria conserveira e na prpria frota de pesca. De facto, embora esteja por fazer a

    histria da difuso das inovaes tecnolgicas nas pescas portuguesas8, sabe-se que grande

    parte das novidades vieram de Espanha para a costa algarvia, tendo da alastrado pelo pas.

    Evidente tambm o papel dos industriais de conservas que se foram aproximando da

    matria prima, isto , instalando-se nos portos onde era mais abundante o peixe, como foi

    o caso de Peniche ou de Matosinhos. Nesse aspecto, Ral Brando elucida-nos quando diz

    que Peniche horrvel devido s indstrias de conservas (do Fialho do Algarve) que

    conspurcam e tornam o ar irrespirvel9.

    5 Documentos existentes no Arquivo da Marinha, em Lisboa.6 Os actuais pescadores da Caparica, descendentes de nortenhos, designam invariavelmente osseus ascendentes como sendo do Norte, no sabendo precisar exactamente de onde. Seriaobviamente de todo o interesse fazer um levantamento dos registos de nascimento at meadosdo sculo XX ...7 No Algarve era muito comum os assalariados agrcolas dedicarem-se aos trabalhos da pescadurante o Vero.8 Ressalvem-se os trabalhos de Ins Amorim, nomeadamente Trabalho e tecnologias das pescas:transferncias de modelos entre Espanha e Portugal: scs. XVIII e incios de XIX, em VIICongresso Internacional da Sociedade Espaola de Historia de las Ciencias y de las Tcnicas,Pontevedra, 1999.9 Os Pescadores, 1923.

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    Curiosamente, a imagem dos algarvios como difusores de inovaes ainda hoje se

    mantm. De facto, encontrmos por diversas vezes, e em diversos locais da costa, a

    justificao para uma nova atitude ou para uma nova tcnica de pesca como tendo sido

    introduzida por pescadores do Algarve.10

    2. Migraes da Praia da Vieira para o rio Tejo

    J referidas no ponto anterior, as migraes de pescadores da Praia da Vieira para o

    rio Tejo ocorreram essencialmente na primeira metade do sculo XX. Como todos os

    movimentos migratrios internos foi primeiro sazonal, levando posteriormente fixao de

    populaes em vrios locais do troo fluvial do Tejo. Popularizadas por Alves Redol na

    sua obra Os Avieiros, talvez o movimento migratrio interno mais conhecido11, embora

    subsistam alguns pontos obscuros (figura 2).

    Atrados pela riqueza do rio, sobretudo em svel, os pescadores migrantes

    exploravam o rio e pescavam, lano aps lano, inmeros destes peixes: chegavam a

    apanhar mais de 1500 de uma s vez, o que d bem a ideia da abundncia deste

    andromo12.

    Quando no pescavam svel (ou savelha) apanhavam enguia, assim percorrendo

    todos os afluentes e valas do rio Tejo: rio S. Estevo, Vala da Azambuja, Pombalinho,

    ... Se a pesca assim o exigisse, dormiam nos barcos, pequenas bateiras que se

    cobriam com um toldo de encerado armado com varas de cana.

    Muitos dos pescadores migrantes desta praia, que se dirigiam para o Tejo13 com o

    objectivo de participar na pesca sazonal do svel, foram-se fixando em vrias reas

    marginais ao rio, onde construam palheiros palafticos. Valada, Reguengo, Palhota,

    Escaroupim, Toureira, foram alguns desses locais, todos implantados nas margens do troo

    fluvial entre Vila Franca de Xira e Santarm. Muitos porm, preferiam a mobilidade e

    viviam nos barcos, deslocando-se com os seus poucos haveres para onde fosse necessrio.

    Esta fixao definitiva no rio Tejo parece ter sido sublinhada pela crise na pesca ocenica

    com artes de arrastar para a praia (xvega).

    10 Por exemplo, o aparecimento recente de uma nova arte de pesca em Matosinhos (a sombreira) atribudo pela maioria dos pescadores a um pescador que a trouxe do Algarve, quando nessaregio no h nada de semelhante! A este propsito veja-se Souto (1998).11 Veja-se, por exemplo, Colas (1992), Santos (1959), Souto (1998), Veiga de Oliveira et al.(1969).12 Andromos so peixes que vivem no oceano mas que se reproduzem em guas doces.13 De acordo com testemunhos vivos, e ao contrrio de lhavos e varinos, estes pescadoresdeslocavam-se para o Tejo por terra (por caminho de ferro e a p).

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    Fig. 2 - Migraes de pescadores avieiros(extrado, com modificaes, de Souto (1998).

    medida que a pesca no troo fluvial do rio ia escasseando, devido ao acrscimo

    de efluentes industriais e construo de barragens (dcada de 1960), parte dos pescadores

    que aqui se fixaram foram descendo o rio procura de pescarias alternativas em reas

    supostamente mais ricas: as guas estuarinas. Acresce que j conheciam estas paragens, pois

    desde h muito desciam at elas, no Vero, com o objectivo de vender o melo comprado

    para os lados de Vila Franca. As vendas eram feitas em trs locais da margem norte do

    esturio: Vila Franca de Xira, Alhandra e Pvoa de Santa Iria. Nos anos 1960 constituam

    junto a estas localidades concentraes de barcos, nos quais viviam: o barco servia de casa,

    para o transporte de melo e para a pesca. Alguns construram palheiros sobre estacas, como

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    em Vila Franca de Xira14. Na Pvoa de Santa Iria, o Comandante Tenreiro, ento Ministro

    da Marinha, mandou levantar no fim dos anos 1960 um pequeno bairro, junto ao rio, para

    albergar as famlias de pescadores, na construo do qual estes colaboram com trabalho.

    Alguns destes pescadores da Pvoa, ao que afirmam por dissidncias familiares, acabaram

    por abandonar o Tejo e foram-se instalar no rio Sado, em Alccer do Sal, onde constituram

    um ncleo avieiro que ainda hoje existe, tal como os de Vila Franca, Alhandra e Pvoa de

    Santa Iria. A montante de Vila Franca poucos so os que ainda subsistem.

    3. Migraes contemporneas de pescadores portugueses para o estrangeiro: o

    exemplo da Frana

    Motivaes diferentes parecem conduzir actualmente muitos pescadores

    portugueses para a pesca em pases estrangeiros, onde lhes so oferecidas condies de

    trabalho e remuneratrias muito superiores s oferecidas em Portugal: essencialmente, -

    lhes oferecido trabalho, o que vai escasseando em Portugal.

    As migraes de pescadores do Norte do pas (sobretudo da Torreira e da Pvoa de

    Varzim) para trabalhar em embarcaes da Galiza so j relativamente conhecidas.

    Caracterizam-se por deslocaes exclusivamente de trabalho, isto , o pescador desloca-se

    em grupo ou individualmente em carro alugado para o porto de embarque, parte para cerca

    de duas semanas de pesca, retorna ao porto onde o aguarda o transporte e regressa terra

    para 2 a 3 dias de descanso, aps o que volta a partir para a pesca.

    Mais recentemente, desde 1997/98, muitos tm sido os pescadores que vo

    trabalhar para Inglaterra, Irlanda e Frana. Por escassez de mo de obra nestes pases, so os

    prprios armadores que tomam a iniciativa de contactar organizaes portuguesas

    (associaes de pescadores, sindicatos) no sentido de recrutar pescadores.

    Apesar da barreira lingustica, principal obstculo a uma rpida integrao no

    trabalho a bordo, pescadores de diversas comunidades do Norte do pas tm arriscado a

    integrao em embarcaes estrangeiras. No havendo informao disponvel para outros

    pases, embora por experincia pessoal se saiba que existem15, exemplificar-se- com o caso

    francs.

    Desde essa altura que um sindicato de pescadores do Norte de Portugal recruta e

    presta apoio a pescadores que pretendem trabalhar em Frana. Os movimentos so muito

    semelhantes aos referidos j para as embarcaes galegas, embora no presente caso as

    deslocaes se faam por via area. Conquanto se recrutem pescadores por toda a costa

    14 Na realidade, as autoridades no permitiam as construes, embora por vezes as tolerassempelo seu carcter precrio, como em outras regies. A este propsito veja-se Veiga de Oliveira etal. (1969).15 Tivemos j oportunidade de dialogar com um armador irlands que procurava pescadoresportugueses para trabalhar em arrastes daquele pas.

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    norte, em Dezembro de 2003 as comunidades com maior nmero de pescadores envolvidos

    eram as da Praia de Mira, Costa Nova e Torreira/Murtosa (figura 3). O principal porto de

    destino era St. Malo16, havendo contudo pescadores em muitos outros portos da costa

    atlntica (figura 4).

    Fig. 3 - Comunidades de origem dos pescadores emigrados emFrana (Dezembro de 2003).

    Em Frana, estes pescadores portugueses trabalham sobretudo em arrastes,

    preferindo os armadores francesas, naturalmente, pescadores com experincia nesta arte, o

    que comum na rea de Aveiro, principal porto de armamento destas embarcaes em

    Portugal. Os arrastes franceses, industriais, pescam desde as guas francesas at aos mares

    16 Embora importante, o porto de Saint Malo no rivaliza com os principais portos franceses,nomeadamente Boulogne sur Mer, Lorient e Concarneau. A frota de Saint Malo, maioritariamente

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    da Esccia e da Irlanda. Experincias de trabalho noutro tipo de embarcaes francesas no

    tm sido bem sucedidas por parte de pescadores experientes no arrasto.

    O principal empregador uma empresa de St. Malo que tambm possui fbricas

    de transformao em terra. Mas tambm h pescadores a trabalhar para empresas do Grupo

    Intermarch, que domina toda a fileira da pesca e o principal fornecedor de pescado em

    Frana, e para diversos armadores industriais.

    LES SABLES-DOLONE*

    LORIENT

    CONCARNEAU*

    BOULOGNE-SUR-MER

    LE GUILVINECAUDIERNE

    200 km0

    28

    10

    1Nmero depescadores

    FRANA

    ESPANHAPORT

    UGAL

    ST.MALO*

    H.So

    uto

    (200

    3)

    (*) - Ncleos com pescadores j sedentarizados.

    Fig. 4 - Portos de destino dos pescadores portugueses a trabalhar em Frana.

    Embora este movimento seja recente, h j pescadores portugueses radicados em

    Concarneau, Saint Malo e Sables DOlone, no se revelando, pois, estes movimentos

    temporrios de trabalho para o estrangeiro como excepo regra, isto , aps uma fase

    inicial de movimentos temporrios, verifica-se a sedentarizao de alguns migrantes, a que

    se seguir certamente uma terceira fase que pressupe j a radicao na terra de acolhimento.

    constituda por arrastes, desembarca menos de 10 mil toneladas de pescado por ano.

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    Atravessando o sector das pescas em Portugal um perodo menos bom, com

    restries crescentes actividade e consequente perda de emprego17, a oportunidade de

    trabalhar noutros estados comunitrios revela-se boa, sobretudo pelas condies de trabalho

    e pelas remuneraes auferidas18.

    Notas finais

    Quando o peixe escasseia ou deixa de compensar, no raras vezes, ao pescador s

    resta escolher entre o abandono da actividade ou a emigrao. Procurmos dar a conhecer

    alguns dos movimentos migratrios de pescadores, em Portugal, mas tambm para o

    exterior.

    Convm referir que nem sempre na emigrao de pescadores portugueses para o

    estrangeiro se manteve a actividade profissional. Por exemplo, nas dcadas de 1960 e de

    1970 muitos pescadores abandonaram o pas clandestinamente, tal como muitos outros

    nacionais, com destino a diversos pases nos quais passaram a exercer todo o tipo de

    actividades no especializadas. Subestimada no sector das pescas, esta sada de braos

    representou para muitas comunidades um decrscimo na actividade, mas traduziu-se, aps o

    retorno, por muitas casas novas (sempre com um anexo para os proprietrios, j que a casa

    era e habitualmente para arrendar temporada) e novos meios de produo (embarcaes e

    artes prprias). Coincidiu, tambm, com a destruio dos palheiros (considerados sinal de

    pobreza) e o crescimento do turismo balnear. Comeou ento a ocupao catica do litoral

    portugus, precisamente nas praias de pescadores19, que foram sendo secundarizados no

    espao que foi durante largas dcadas exclusivamente construdo e usufrudo por eles.

    Muitos outros movimentos migratrios, externos ou internos, haveria a referir.

    Destes ltimos h um que embora no sendo de pescadores, mas de assalariados agrcolas,

    deu origem a uma comunidade de agro-pescadores nica em Portugal: a Carrasqueira, no

    esturio do Sado, cujo estudo se recomenda a todos os interessados por estas matrias20.

    17 O que no invalida que alguns imigrantes provenientes do Leste da Europa se encontrem atrabalhar na pesca em Portugal.18 O pescador que trabalha em Frana chega a auferir um salrio de 3 500 por ms (cerca dequatro vezes e meia mais do que em Portugal), recebe todos os complementos (por exemplo,abono de famlia), possui seguro de acidentes pessoais e de vida, desconta para a seguranasocial e, se sindicalizado, as suas quotas so descontadas e enviadas para o respectivo sindicato.19 A este propsito, veja-se, da Professora Raquel Soeiro de Brito, Palheiros de Mira, Formaoe Declnio de um Aglomerado de Pescadores, 2 ed. Lisboa: CEG. 1981.20 A propsito da Carrasqueira veja-se, de Fernando Ribeiro Martins e Henrique Souto, Osagricultores-pescadores da Carrasqueira (Esturio do Sado), disponvel em http://e-geo.fcsh.unl.pt/pdf/linhaad_henrique_souto_doc01.pdf

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    Referncias bibliogrficas

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    Publicado em GeoINova, Revista do Departamento de Geografia e Planeamento Regional,FCSH/UNL, N 8 2003, pp. 165-177.