montavÃo_estratificação educacional no brasil no século xxi

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INTRODUÇÃO E stratificação educacional refere-se à relação entre as origens so- ciais e o alcance educacional dos estudantes. Quanto mais mobili- dade social permite uma sociedade, mais aberta e possivelmente de- mocrática ela é, e assim um sistema escolar é mais aberto ou democráti- co quanto menor for a correlação entre a origem social do aluno e seu desempenho durante o processo escolar (Silva, 2003). A importância da escola como mecanismo de mobilidade é destacada pela teoria da modernização (Parsons, 1970; Treiman, 1970), que proje- ta a educação como principal mecanismo de equalização das oportuni- dades sociais, capaz de superar as velhas e rígidas estruturas de trans- missão direta de status entre gerações. Visões menos otimistas sobre o papel da escola na sociedade também têm recebido destaque no campo de pesquisas educacionais. As princi- pais são as teorias reprodutivistas (Bowles e Gintes, 1976; Bourdieu e Passeron, 1977), que percebem a educação na sociedade moderna como um instrumento de reprodução e dominação social, usado pelas classes dominantes para transmitirem seu capital cultural e assegurar que seus filhos atinjam ao menos posições sociais semelhantes às suas. 389 Revista Dados – 2011 – Vol. 54 n o 1 1ª Revisão: 11.04.2011 DADOS – Revista de Ciências Sociais , Rio de Janeiro, vol. 54, n o 2, 2011, pp. 389 a 430. Estratificação Educacional no Brasil do Século XXI Arnaldo Mont'Alvão Doutorando em Sociologia do Programa de Pós-Graduação em Sociologia, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Mobilidade social, estratificação educacional, sociologia urbana, migrações são suas áreas de interesse. Belo Horizonte, MG, Brasil (e-mail: [email protected])

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  • INTRODUO

    E stratificao educacional refere-se relao entre as origens so-ciais e o alcance educacional dos estudantes. Quanto mais mobili-dade social permite uma sociedade, mais aberta e possivelmente de-mocrtica ela , e assimum sistema escolar mais aberto ou democrti-co quanto menor for a correlao entre a origem social do aluno e seudesempenho durante o processo escolar (Silva, 2003).

    A importncia da escola como mecanismo de mobilidade destacadapela teoria damodernizao (Parsons, 1970; Treiman, 1970), que proje-ta a educao como principal mecanismo de equalizao das oportuni-dades sociais, capaz de superar as velhas e rgidas estruturas de trans-misso direta de status entre geraes.

    Vises menos otimistas sobre o papel da escola na sociedade tambmtm recebido destaque no campode pesquisas educacionais. As princi-pais so as teorias reprodutivistas (Bowles e Gintes, 1976; Bourdieu ePasseron, 1977), que percebem a educao na sociedade modernacomo um instrumento de reproduo e dominao social, usado pelasclasses dominantes para transmitirem seu capital cultural e assegurarque seus filhos atinjamaomenos posies sociais semelhantes s suas.

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    DADOS Revista de Cincias Sociais, Rio de Janeiro, vol. 54, no 2, 2011, pp. 389 a 430.

    Estratificao Educacional no Brasildo Sculo XXI

    Arnaldo Mont'AlvoDoutorando em Sociologia do Programa de Ps-Graduao em Sociologia, da UniversidadeFederal de Minas Gerais (UFMG). Mobilidade social, estratificao educacional, sociologiaurbana, migraes so suas reas de interesse. Belo Horizonte, MG, Brasil (e-mail:[email protected])

  • Modelos analticos variados modelo de seletividade diferencial(Mare, 1980, 1981), hiptese da desigualdade maximamente mantida(Raftery e Hout, 1993), hiptese da desigualdade efetivamente mantida(Lucas, 2001) etc. instigados pelo debate entre estas correntes, tm in-vestigado, ao longo das ltimas dcadas, e para uma variedade consi-dervel de pases, a relao entre expanso escolar e estratificao edu-cacional, apontando relaes mais complexas do que, a princpio, asteorias anteriores seriam capazes de explicar no mundo contempo-rneo.

    Este texto apresenta, emprimeiro lugar, uma sntese do processo de ex-panso educacional no Brasil, para ento discutir as principais aborda-gens e modelos dedicados relao entre expanso escolar e estratifi-cao educacional em vrios pases. A anlise comparativa permiteque as questes discutidas em cada pas tragam insights para discussoe melhor compreenso do caso brasileiro. Em seguida, usando dadosdas PNADs 2001, 2004 e 2007, sero testadas hipteses relativas aosefeitos das origens sociais sobre as possibilidades de alcance educacio-nal dos estudantes nos ensinos de segundo e terceiro graus no pas, le-vando-se em conta as principais abordagens tericas e analticas inter-nacionais, com especial ateno hiptese da desigualdade efetivamentemantida. Esta anlise pretende oferecer um quadro analtico da estrati-ficao educacional no Brasil na primeira dcada do sculo XXI, tendocomo pano de fundo a transmisso de desigualdades no acesso aos sis-temas pblico e privadode educao, do ensinomdio universidade.

    EXPANSO EDUCACIONAL NO BRASIL

    Apartir dos anos 1970 aprofundam-se as mudanas sociais, polticas edemogrficas que criaram as condies sociais mais favorveis para apopulao em idade escolar bsica. Adiminuio do nmero de filhospor mulher, o aumento da densidade populacional nas cidades e maisdisponibilidade de escolas permitiram que as coortes mais jovens des-frutassemde umambientemais propcio para amelhoria da realizaoescolar (Silva e Hasenbalg, 2000).

    Nesse perodo, o nmero geral de matrculas do sistema de ensino foimultiplicado por 2,7 vezes. A taxa de analfabetismo cai de 50,5%, em1950, para 14,7% em 1996 (Castro, 1998), e chega-se ao patamar de cer-ca de seis anos de educao mdia no pas. O ensino fundamental du-plicou de tamanho, a taxa lquida de escolarizao da populao de 7 a

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  • 14 anos subiu para 96% no ano 2000, praticamente atingindo a univer-salizao do acesso a este nvel do sistema.

    Aexpansomais recente tem priorizado o ensinomdio e o superior, oque, segundo Silva (2003), se deve a uma conjuno de aumento da de-manda, polticas pblicas, diminuio dos custos familiares e maioracessibilidade. O ensino mdio passou de um patamar de um milhopara mais de sete milhes de estudantes matriculados. As maiores ta-xas de incremento neste nvel so encontradas na regio Nordeste,que, somente no perodo entre 1997 e 2002, apresentou elevao de92% no nmero de matrculas uma vez que concentrava maior con-tingente populacional at ento fora do sistema escolar.

    Estimativas indicam que aps o ensino primrio praticamente ter atin-gido cobertura universal, o ensino mdio caminha na mesma direo,com cobertura de mais de 85% da populao de jovens entre 15 e 17anos de idade em 2001 (Soares e Alves, 2003). Contudo, a defasagementre idade e srie neste nvel de ensino muito alta, chegando a 51%em 2002, ou seja, mais da metade dos alunos que cursam o ensino m-dio foram reprovados pelo menos uma vez ao longo do ciclo escolar.Como essa proporo era de 76% em 1970 (Silva, 2003), verifica-se pro-gressiva reduo da defasagem possivelmente pela implementaode programas de ciclos e promoo automtica, entre outros. No quetoca diviso setorial, a rede privada abrangia, em 1997, 27% do totaldematrculas do ensinomdio, percentual que, dois anos depois, se re-duz para 19% (Cury, 2002).

    Diferenas raciais e de gnero so marcantes nessa fase do sistema es-colar. Dados da PNAD 2007 apontam que mulheres apresentammaiortendncia a completar o ensino mdio, seja em escola pblica 56%,contra 44%de homens ou privada 52%, contra 48% , e a entrar paraa universidade 61%, contra 39% na rede pblica, 55% contra 45% narede privada. J sobre diferenas entre grupos raciais, permanecem asdesvantagens da populao negra e parda no acesso e realizao esco-lar no Brasil. Hasenbalg e Silva (1990) mostram que, alm da maiorproporo de crianas no brancas entre as que entram tardiamente naescola, entre as que no tm acesso algum ao sistema escolar a popula-o no branca trs vezes maior que a branca. Alm disso, apresen-tam uma trajetria escolar mais lenta e acidentada, com desvantagensem todos os nveis de ensino, mesmo nos nveis de maior renda fami-liar. Dados da PNAD 2007 mostram que enquanto no brancos so

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  • maioria a completar o ensino mdio na escola pblica 54%, contra46% de brancos , tornam-se minoria dos que concluem este nvel naescola privada 36%, contra 64% de brancos. Na entrada para o nvelsuperior, brancos somaioria nas duas redes 61%na pblica e 74%naprivada.

    O nvel superior tambm se expandiu significativamente. SegundoSchwartzman (1988), desde os anos 70, em virtude da crescente de-manda, houve um aumento considervel de instituies privadas,abrangendo um nmero de alunos que em poucos anos ultrapassou ode estudantes das universidades pblicas. Criou-se um sistema de en-sino superior altamente estratificado em universidades pblicas depesquisa concentrados na regio Sudeste, universidades pblicas es-palhadas pelo pas com nvel de qualidademenor, e instituies priva-das em vrios estados do pas com qualidade ainda menor.

    De acordo com Martins (2000), este nvel de ensino vem crescendo aumamdia de 7% ao ano, considerando-se todas as modalidades e ins-tituies, pblicas ou privadas. O nmero de instituies de ensino su-perior atinge 973 em 1998, sendo que 79% delas so privadas, e abran-gem 62% das matrculas. Em 2004, de acordo com dados do INEP(2006), o nmero dematrculas no setor privado j chega a 71%, ou seja,mais de dois teros do sistema superior de ensino, sendo que em 2006 onmero de instituies neste setor atinge a incrvel marca de 89%.

    Todavia, mesmo diante da visvel expanso, o baixo rendimento inter-no do sistema escolar como um todo no consegue assegurar o acessodamaior parte da populao que sai do nvel primrio aos nveis supe-riores,mostrando-se, assim, um sistemamarcado por alto grau de sele-tividade. Aps a quase universalizao da educao primria, parte dapresso social desloca-se para a transio para o ensino superior. Acadamil alunos que iniciam seu ciclo escolar na primeira srie do ensi-no primrio, apenas 56 (5,6%) tendiam a ingressar no ensino superiorna dcada de 1970 (MEC, 2002). Em 2007, como mostram os dados daPNAD, essa quantidade sobe para 146 (14,6%).

    De acordo com relatrio do INEP (2006), no que concerne desigualda-de de acesso, 50% dos jovens de 18 a 24 anos, provenientes de famliascom renda acima de cinco salrios mnimos, esto matriculados emcursos de nvel superior, enquanto apenas 12% dos jovens na mesmafaixa de idade em famlias comat trs salriosmnimos estomatricu-lados neste nvel. Como aponta Castro (2006), 70% dos estudantes des-

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  • te nvel de ensino vm da camada dos 20%mais ricos do pas. Polticaspblicas implementadas na ltima dcada como o REUNI e os pro-gramas de cotas e bnus das universidades pblicas tm ampliado aspossibilidades de acesso de estudantes de camadas mais pobres ao en-sino superior,mas o nvel de acesso que proporcionamest longe de re-solver o problema crnico de estratificao educacional.

    O quadro geral, neste incio de sculo, de, por um lado, melhoria dosindicadores bsicos, devido melhoria social da famlia, mudanas es-truturais (urbanizao, industrializao, mudanas no mercado detrabalho) e melhor desempenho do sistema escolar como um todo (Sil-va eHasenbalg, 2000; Silva, 2003). Por outro lado, no h indcios de re-duo da estratificao educacional, ou seja, do efeito das origens soci-ais sobre o alcance educacional dos indivduos.

    Boudon (1974) j havia advertido sobre a controversa relao entre ex-panso escolar e estratificao educacional, apontando que a primeirano leva necessariamente ao arrefecimento da segunda.

    PRINCIPAIS ABORDAGENS TERICAS

    A Hiptese Meritocrtica

    A hiptese meritocrtica postula que os processos de modernizaosocial maior desenvolvimento econmico e institucional, maior ur-banizao das sociedades e transio demogrfica so fatores que le-vam diminuio do efeito das origens sociais sobre o alcance educaci-onal do indivduo (Treiman, 1970; Hauser e Featherman, 1976). O pro-cesso de desenvolvimento econmico ampliaria as oportunidades deeducao para toda a sociedade, implicando a superao das limita-es impostas pelas caractersticas adscritas, e a valorizao das carac-tersticas adquiridas pelo indivduo, principalmente relacionados aeducao, ocupao, poder e prestgio (Davis e Moore, 1945; Lenski,1966; Parsons, 1970; Treiman, 1970). Aeducao seria o principal vetordemobilidade social, permitindo que indivduos, independentementede sua origem socioeconmica, raa ou sexo, alcanassem melhoresposies do que sua gerao anterior. Ou seja, indivduos com origemem estratos diferentes da sociedade, homens ou mulheres, pretos oubrancos, teriam chances semelhantes de ter acesso educao e, conse-quentemente, de alcanar boas posies no mercado de trabalho.Quanto mais moderna e industrializada uma sociedade, mais oportu-nidades educacionais ela oferece, mais extensivo o alcance do siste-

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  • ma e maiores as chances de um indivduo ascender socialmente atra-vs das habilidades conquistadas por seu alcance educacional, e nomais por critrios de origens familiares e herana de status social(Treiman, 1970). Nesse sentido, o desenvolvimento econmico, ao pro-mover a universalizao da educao, levaria a um processo de deses-tratificao da sociedade, equalizando as oportunidades de mobilida-de social e aquisio de status.

    Os efeitos deste processo so sintetizados por Treiman (1970) em pro-posies bsicas, que pressupem que: (1) a influncia direta do statusocupacional do pai sobre o do filho deve ser mais fraca em sociedadesmais industrializadas; (2) a influncia direta da educao sobre o al-cance ocupacional deve ser mais forte em sociedades mais industriali-zadas; (3) em sociedades mais industrializadas o status dos pais tempapel menos importante na realizao educacional1.

    Embora evidncias tenham apontado para uma diminuio da desi-gualdade educacional ao longo do sculo (Hauser e Featherman,1978), a aplicao emprica da teoria da modernizao e da hiptesemeritocrtica tem mostrado resultados contraditrios, que sero dis-cutidos a seguir.

    As Teorias Reprodutivistas

    Tericos da reproduo social propem enxergarmos o processo de ex-panso educacional no comomecanismo de universalizao de opor-tunidades, mas, sim, como ummecanismo de reproduo das relaesde dominao entre classes sociais (Bowles e Gintis, 1976; Bourdieu ePasseron, 1977; Collins, 1979).

    Para os autores da teoria da correspondncia (Bowles e Gintis, 1976), a es-cola deve ser entendida como uma instituio que, ao facilitar a inte-grao de jovens ao mercado de trabalho, serve como mecanismo deperpetuao das relaes sociais da vida econmica. O processo de es-colarizao funciona, assim, comomecanismo de internalizao de va-lores, normas e comportamentos ditados pela classe dominante.

    A teoria da violncia simblica (Bourdieu e Passeron, 1977), por sua vez,analisa as escolas como um campo social relativamente autnomo, emque a produo cultural torna-se instncia de mediao de componen-tes que facilitam a reproduo social. Esta teoria afirma que o sistemaeducacional assegura a posio de grupos dominantes, enfatizando a

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  • comunicao desigual e o processo de socializao atravs do desco-nhecimento da natureza arbitrria das normas, resultando num tipode instituio que mais conserva relaes de desigualdades do quepropicia inovaes. O sistema privilegia aqueles estudantes equipa-dos commais capital cultural bens e investimentos, materiais ou no,transmitidos, principalmente, pela famlia e elimina progressiva-mente aqueles que no possuemomesmo capital. Estemesmo sistema,atravs, sobretudo, da pedagogia escolar todas as formas de instru-o, sejam elas dentro da famlia, da escola, ou qualquer outro lugar ,ajuda a naturalizar as desigualdades no alcance escolar entre indiv-duos oriundos de diferentes classes sociais, baseando-se emdiferenasdemrito individuais, demonstradas atravs de procedimentos de tes-te. Falha durante a progresso das sries atribuda inadequao doindivduo e por ele aceita como destino inexorvel, passiva ou superfi-cialmente contestada atravs do envolvimento em subculturas contra-escolares. Aviolncia simblica reside, ento, no sucesso da ao peda-ggica que torna relaes arbitrrias de poder emautoridade legtima.

    Desigualdades oriundas do capital cultural so, assim, a primeira ra-zo para a persistncia da desigualdade social, de forma que a imposi-o de significados implica a reproduo da estrutura de distribuiode capital cultural e, consequentemente, da estrutura social emgeral.

    A Abordagem da Escolha Racional

    Boudon (1974) e, posteriormente, Goldthorpe (1996), levantam crticass teses funcionalistas, afirmando que s possvel entender a persis-tncia das desigualdades no alcance educacional se se levar em contadois tipos de efeitos: os primrios, que criam diferenciais de classe noalcance inicial e, ento, na habilidade demonstrada na escola; e os se-cundrios, que operam pormeio das decises feitas pelos estudantes eseus pais sobre as opes presentes quando atingem determinandoponto de transio no ciclo escolar: ficar na escola ou no? Ter cursosacadmicos ou vocacionais? Buscar um curso superior? Assim, o estu-dante e sua famlia tm sempre uma possibilidade de escolha, a qual tomada com base nos custos e benefcios de cada opo. Se a avaliaode que a opo de prosseguir at os nveis mais altos no to favor-vel assim para a melhoria do nvel de vida, estudantes oriundos dasclasses mais baixas optaro por encerrar os estudos mais cedo em bus-ca de mais experincia no mercado de trabalho. No final, a estratifica-o do alcance educacional e do ocupacional resulta da avaliao que

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  • as famlias de classes sociais mais baixas fazem a respeito das opesmais ambiciosas como sendomenos favorveis, reforando os padresde desigualdade no acesso s posies mais altas do sistema escolar eda estrutura de ocupaes em geral.

    Gerber (2000) acredita que o caso da Rssia enquadra-se nesta aborda-gem. O balano entre custo e beneficio feito pelas famlias, tendo comopano de fundo crises econmicas e institucionais, no propicia umapercepo de reduo dos custos do processo educacional,mesmo comprocessos de expanso e reformas. O balano favorece, outrossim, ummenor alcance ocupacional como forma de entrar mais rapidamentenomercado de trabalho, favorecendo a expanso de um setor informalcada vez maior no pas.

    MODELOS ANALTICOS

    O Modelo de Mobilidade Educacional

    Em trabalho pioneiro, Spady (1967) analisou a mobilidade educacio-nal em termos de probabilidades de se completar transies educacio-nais nos EUA. Props-se a ver o sistema educacional como um proces-so de seleo que separa e elimina estudantes desprovidos de motiva-es, oportunidades e habilidades adequadas, em vrios pontos do ci-clo escolar, nos quais atritos em larga escala afetam as crianas dasclasses mais baixas nas primeiras transies do sistema. Calculando asprobabilidades gamma para cada transio encontrou que, embora osnveis de alcance educacional tenham aumentado para todos os gru-pos de status ao longo das coortes, as diferenas entre estudantes dealta e baixa origem social no que diz respeito ao acesso educao su-perior aumentaram. Por outro lado, o efeito da educao paterna sobreas chances de o filho iniciar e completar o ensino secundrio decresce-ram ao longo das coortes. Quando a varivel raa introduzida, o al-cance de brancos supera o de no brancos em todos os grupos de statuse, embora estas diferenas sejammaiores nos nveis mais baixos de es-colaridade, elas so considerveis tambm nos nveis mais altos. As-sim, ainda que tenha aumentado a nfase no treinamento e na educa-o, que tm como consequncia o enfraquecimento das caractersticasatribudas por meio do status familiar, este mesmo treinamento podeaumentar a influncia da origem social na diferenciao de status, umavez que crianas oriundas de famlias com statusmais alto apresentamvantagens competitivas especiais, derivadas de seu processo de socia-

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  • lizao. Tais capacidades permitemque essas crianas tenham chancesmuito maiores de manter, ou mesmo melhorar, o nvel de status em re-lao ao de seus pais, em comparao com crianas provenientes de fa-mlias com status social mais baixo.

    O Modelo de Seletividade Diferencial

    O modelo de seletividade diferencial proposto por Mare (1980, 1981) sevale de regresses logsticas sobre as chances de um estudante atingirdeterminadas transies no ciclo escolar, levando-se em conta a evolu-o do efeito das origens sociais ao longo das coortes. Ao contrrio dosmodelos de regresso lineares at ento utilizados (Blau e Duncan,1967; Hauser e Featherman, 1976) que indicam a estabilidade do efei-to das origens sociais ao longo dos anos de escolaridade completos ,este modelo separa os efeitos marginais das distribuies e apresentarazes de chance mais confiveis.

    Este modelo mostrou que, nos EUA, as origens sociais influem de ma-neira diferenciada em cada uma das transies, cuja direo geral oenfraquecimento do efeito das origens ao longo das transies, ou seja,o efeito da origem social mais forte nas primeiras transies, para oensino bsico e secundrio. Isto se explica, na mesma direo propostapor Spady, pelo processo de seleo social que faz com que crianas declasses sociais mais baixas encarem barreiras seletivas severas nas pri-meiras transies educacionais, o que faz com que s os estudantesmais dedicados e motivados provenientes destas classes consigamprogredir at as transies mais elevadas. Quando as taxas de transi-o so altas, somente os estudantesmenosmotivados e dedicados dasclasses baixas falharo, e quando as taxas forem baixas, somente osmais dedicados conseguiro progredir. Nesse sentido, a correlao en-tre origem socioeconmica e variveis intervenientes como atitudes emotivaes, geralmente nomedidas nas pesquisas que determinamo sucesso educacional menor quanto mais alta for a transio, fazen-do comque, dessa forma, o efeito indireto da origem,mediado pela ati-tude e motivao, seja reduzido ao longo das transies.

    Mare encontrou um padro constante de efeito ao longo das coortes,ou seja, o efeito das origens sociais no diferente entre indivduos decoortes mais novas e mais velhas dentro de cada ponto de transio,batendo de frente com os postulados da teoria da modernizao.

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  • Acoletnea organizada por Shavit e Blossfeld (1993), prope uma an-lise dos sistemas de estratificao educacionais em treze pases, a par-tir do modelo de seletividade diferencial2. As evidncias desta colet-nea apontam que em praticamente todos se verifica a diminuio doefeito das origens sociais ao longo das transies e a estabilidade doefeito das origens sociais sobre o alcance escolar ao longo das coortes.Embora as propores de estudantes de todas as classes sociais queatendem a todos os nveis educacionais tenham aumentado, as vanta-gens associadas com as origens sociais mais privilegiadas persistemem quase todos os pases. As nicas excees so a Sucia e a Holanda,onde houve declnio do efeito das origens sociais por conta de polticasde equalizao de condies socioeconmicas. Os pesquisadores con-cluem sobre a aplicabilidade das propostas do modelo de seletividadediferencial e propemumpadro universal de entendimento dos siste-mas de estratificao educacional: os sistemas se abrem, passo a passo,da base para cima, de forma que as coortes vo sucessiva e lentamenteavanando dentro da hierarquia educacional, mas os maiores nveiseducacionais permanecem razoavelmente exclusivos, o que faz comque verdadeiros gargalos sejam criados na transio para o nvel supe-rior, privilegiando o acesso daqueles oriundos de grupos socioecono-micamente avantajados.

    Treiman et alii (2003), analisando 29 pases, apontam que, embora emtodos tenha havido uma enorme expanso educacional, os efeitos dasorigens sociais permaneceram estveis em pelo menos vinte pases, aopasso que nos outros verifica-se declnio do efeito da educao do pai,e em outros se verifica aumento.

    Tais modelos foram tambm aplicados para o Brasil. Silva et alii (1985)analisaram tendncias temporais na estratificao educacional brasi-leira e encontraram uma forte estabilidade temporal do efeito das ori-gens sociais, principalmente da educao paterna, no alcance educaci-onal dos filhos, ao longo de coortes entre 1912 e 1956. Os autores con-cluramque a sociedade brasileira permaneceu comamesma estruturade estratificao educacional nesse perodo de 40 anos, apesar do reco-nhecido processo de desenvolvimento e modernizao socioeconmi-ca, contrariando as proposies da tese da modernizao.

    Silva (2003) analisa o processo de expanso educacional entre 1981 e1999, valendo-se de dados das PNADs para estes dois anos, mais o anode 1990. O estudo revelou que a transio para a primeira srie do ensi-

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  • no bsico atinge a quase universalizao de acesso e que, em conso-nncia comos achados dos estudos anteriores, o efeito das variveis deorigem social tende a declinar progressivamente ao longo das transi-es, exceto pelas variveis renda cujo efeito aumenta ao longo dastransies, refletindo o impacto da ampliao do ensino privado pago e raa, cujo efeito tambm cresce conforme se eleva a transio. Os re-sultados indicam o deslocamento da seletividade econmica e racialpara os nveis mais elevados do ciclo escolar. No que concerne s ten-dncias temporais, estas indicam certa estabilidade no efeito da rendae uma diminuio gradual do efeito da cor ao longo dos anos, indican-do uma tendncia diminuio das desigualdades de cor na realizaoescolar ao longo das coortes.

    Fernandes (2005) analisa dados da PNAD 1988, principalmente no quese refere ao efeito das origens socioeconmicas, da raa e origem urba-na nas transies escolares. Encontra uma reduo do efeito da educa-o dos pais ao longo das coortes, mesmo padro apresentado pelo g-nero. Contudo, o efeito de raa e origem urbana apresenta padrooposto, pois indivduos com origem urbana tendem a alcanar maiorrealizao educacional, e raa apresenta um efeito significante e cres-cente ao longo das coortes. A autora conclui que o efeito da origem so-cioeconmica forte nos primeiros nveis educacionais e fraco nos lti-mos, o que implica que os indivduos que alcanamnveis educaciona-is superiores so mais homogneos em relao herana socioecon-mica e dependemmais de habilidades e motivao para prosseguiremna sua realizao educacional do que de suas origens socioeconmi-cas. O efeito da raa, por outro lado, indica que as barreiras dentro dosistema educacional so fortes e resistem expanso. A pesquisadoraconclui que as proposies do modelo de Mare s podem ser apoiadasparcialmente para o Brasil, pois, embora amaioria das variveis de ori-gem apresente efeito decrescente da primeira ltima transio (12anos ou mais de escolaridade), tal proposta, que diz que a diminuiodos efeitos de origem ao longo das transies se explica pela diminui-o na heterogeneidade de origens sociais, no nos diz por que o efeitoda raa to alto nas ltimas transies.

    Por fim, Torche (2010), analisando dados da Pesquisa de Padres deVida 1996/1997, mostra que houve um aumento das desigualdades deacesso s transies para se completar o ensino mdio e entrar para auniversidade ao longo das coortes no Brasil e em outros pases daAmrica Latina. Aponta que o processo de expanso educacional no

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  • Brasil pode ser comparado ao de outros pases como a Rssia, onde oagigantamento da educao bsica, e at mesmo do ensino mdio, quepropiciou mais alcance educacional a todas as classes, no acompa-nhado pelo ensino superior, criando-se um verdadeiro gargalo nessatransio, aumentando, assim, a competio por um nmero escassode posies privilegiadas.

    A Abordagem do Curso de Vida

    Em estudo sobre pases europeus, Muller e Karle (1993) mostram quetodos apresentamomesmopadro nas taxas de transio, sendo o efei-to das origens sociais mais alto na primeira transio, para o ensino b-sico, tornando-semenor medida que avanamas transies. Aprinci-pal explicao para esse efeito, segundo estes pesquisadores, no resi-de na maior seleo social nas primeiras transies, mas recai sobre asmudanas nas relaes entre estudantes e seus pais. Ao passar dastransies, e medida que os estudantes se tornammais velhos, eles fi-cam menos dependentes dos pais socioeconomicamente, o que, por-tanto, define que o efeito das origens deve ser gradativamente menorao longo das transies.

    A Hiptese MMI

    Tendo como referncias o modelo analtico da seletividade diferenciale a abordagem da escolha racional, Raftery e Hout (1993) propuserama hiptese da desigualdade maximamente mantida maximally maintainedinequality (MMI) a partir da anlise dos efeitos da expanso do siste-ma de ensino irlands. Esta hiptese prope que a desigualdade deacesso a um determinado nvel de ensino s declinar quando houversaturao do acesso quele nvel por parte dos estudantes oriundosdas classes sociais privilegiadas e, assim, a presso desloca-se para astransies subsequentes do sistema escolar.

    Ahiptese postula que a expanso do sistema educacional no implicanecessariamente a reduo das desigualdades sociais, mas, sim, queestas tendem a permanecer estveis, ou mesmo a se ampliarem, umavez que os grupos j em vantagem aproveitaro melhor as novas posi-es disponibilizadas. As taxas de transio e razes de chance entreorigens sociais e transies educacionais permanecem, ento, as mes-mas para sucessivas coortes, a no ser que elas sejam foradas amudardevido ao aumento dasmatrculas. Somente quando houver uma satu-rao nas chances de determinados grupos emvantagem completarem

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  • uma transio algo prximo a 100% de acesso que os nveis de de-sigualdade comeam a cair. Segundo os propositores da tese, a MMIpode ser tomada como parmetro para estudos comparados de estrati-ficao educacional, pois consegue captar a dinmica da expanso ediferenciao dos sistemas educacionais num nmero considervel depases.

    A coletnea de Shavit e Blossfeld (1993) aponta que a MMI plausvelpara vrios dos pases estudados, exceto para aqueles onde a quedadas desigualdades ocorreu antes da saturao da educao bsica pe-los grupos privilegiados (Sucia eHolanda), ou a saturao do acesso educao bsica ocorreu semque necessariamente as desigualdades ti-vessem sido reduzidas como consequncia (Estados Unidos). Ambosos casos indicam que aMMI no consegue explicar ummodelo univer-sal de reduo dos efeitos das origens sociais, no sentido de que ela no capaz de prever todas as formas pelas quais a desigualdade no alcan-ce escolar pode ser realizada.

    Sobre sua validade para o caso da expanso escolar brasileira, Silva(2003) aponta que a quase universalizao do acesso primeira transi-o, a reduo dos efeitos das variveis de origens sociais ao longo dastransies, e o consequente deslocamento da seletividade escolar paraos nveis mais altos poderiam ser tomados como indicativos da satura-o no nvel bsico de ensino e deslocamento das desigualdades naschances de escolarizao para os nveis mais elevados. Por outro lado,o comportamento do efeito da varivel raa, que aumenta nas transi-es mais altas, mas diminui ao longo das coortes, e as declinantes di-ferenas entre reas rurais e urbanas, so destoantes e no permitemaceitar a MMI como totalmente aplicvel neste contexto.

    A Hiptese EMI

    Estudos recentesmostram que omodelo logstico de transies, at en-to utilizado por boa parte dos trabalhos sobre estratificao educacio-nal, apresenta uma limitao relacionada suposio de que indivdu-os progridem ao longo do sistema educacional numa sequncia unili-near (Breen e Jonsson, 2000; Lucas, 2001). Omodelo de seletividade di-ferencial e aMMI, cujos pressupostos se baseiam nestemodelo, no se-riam capazes de perceber os aspectos qualitativos do processo de estra-tificao educacional em tempos de expanso. Emmuitos pases o sis-tema educacional divide-se em caminhos alternativos (tracking) nos

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  • quais os indivduos, diferenciados tanto por suas origens sociais quan-to pelo empenho escolar, podem realizar diferentes probabilidades decontinuao escolar.

    Ao ignorar tais aspectos qualitativos, o modelo logit tradicionalmenteusado tende a subestimar o efeito da origem social nas primeiras tran-sies e superestimar este efeito na transio para a educao superior(Breen e Jonsson, 2000). Alm disso, sofre com umproblema de hetero-geneidade no mensurada, que surge como possvel explicao para odeclnio dos efeitos das origens sociais ao longo das transies, o que reconhecido por Mare (1994), que introduz informaes sobre irmosdos estudantes para tentar corrigir esse problema3.

    Breen e Jonsson (2000) estimam, ento, modelos logsticos multinomi-ais para estudo do processo de estratificao educacional na Sucia.Controlam pelo desempenho do estudante, em termos de notas, paraminimizar efeitos de seleo devido habilidade cognitiva. Mostramque o track escolhido pelo estudante influencia a probabilidade de rea-lizar transies subsequentes, e que as probabilidades de se completara transio para a educao superior altamente correlacionada com onvel educacional dos pais, o que faz com que estudantes de classes emdesvantagem, para completarem esta transio, tenhammaior suporteda escola e de seu prprio desempenho.

    Nesta linha de argumentao, Lucas (2001) prope a hiptese da desi-gualdade efetivamente mantida (EMI), que afirma que atores com vanta-gens socioeconmicas asseguram para si mesmos e sua famlia algumgrau de vantagem onde quer que seja possvel, seja quantitativa ouqualitativa. Enquanto aMMI sugere que a competio por um nvel deeducao que j universal ser zero, a EMI prope que mesmo em n-veis universalizados existir competio, a qual ocorrer pelo tipo, ouqualidade, da educao alcanada. Uma vez que determinado nveleducacional atinja saturao, em vez de a presso ser necessariamentedeslocada para o nvel superior, como pressupe a MMI, desigualda-des nas chances de alcance educacional neste nvel podem ser substitu-das por desigualdades nas chances de acesso aos caminhos mais sele-tivos e prestigiados. Filhos de pais emvantagem socioeconmica seroalocados para posies vantajosas quantitativa e qualitativamente nosistema escolar.

    Analisando dados para o sistema escolar dos EUA, onde a expanso dosistema de ensino foi feita base da diferenciao de tracks, o acadmi-

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  • co e o vocacional, no ensino secundrio e superior, Lucas mostra aplausibilidade dessas proposies, indicando que estudantes proveni-entes de classes sociais mais altas, mesmo que muitas vezes apenasmedianos em termos de habilidades, apresentam mais chances de se-rem alocados para o caminho commais prestgio (track acadmico) doque um estudante dedicado proveniente de classes mais baixas, o qualtem grandes chances de ser alocado para um community college, cami-nho commenor prestgio. Este ltimo caminho atrativo para crianasoriundas de famlias mais modestas, uma vez que fornece habilidadesbsicas que facilitam o acesso mais rpido ao mercado de trabalho,mesmo que apenas para ocupaes de baixo status social. Os achadosindicam ainda que a origem social (educao dos pais e renda fami-liar), alm do nmero de irmos, importam mais para a transio aoensino superior que para se completar o ensino secundrio, o que, se-gundo o autor, joga por terra um dos principais pressupostos da abor-dagem do curso de vida de que o feito diminui ao longo das transiesdada amenor dependncia dos estudantes em relao a seus pais me-dida que estes vo ficando mais velhos , mas est de acordo com opressuposto da MMI do deslocamento da seleo social para os nveismais altos medida que os mais baixos vo atingindo saturao. A ex-panso do ensino secundrio e superior no pas no implicou, assim, areduo de desigualdades e o fim da competio, como prev a MMI,mas, sim, deixou mais claro que o ensino secundrio um importanteespao de competio, no qual a origem social importa muito.

    Ayalon e Shavit (2004) estimaram modelos multinomiais para a reali-zao escolar em Israel. Mostram que a elegibilidade para o track aca-dmico est correlacionada com etnicidade e classe social, de forma fa-vorvel a judeus de origens tnicas europeias, membros das classes so-ciaismais altas. Encontraramque o efeito das origens sociais sobre o al-cance educacional passa a declinar ao longo das coortes, mesmo antesda saturao. Contudo, os que mais se beneficiaram foram os grupostnicos mais privilegiados, que asseguram mais chances de admissopor uma universidade de prestgio. Aexpansomediante a diferencia-o cria uma situao em que a educao se torna, sim, mais acessvel,mas tambm vem acompanhada do fato de que os grupos mais fortesretm hegemonia sobre o track acadmico, cujo retorno no mercado detrabalho maior do que o track vocacional. A disponibilidade de edu-cao vocacional habilitou o sistema a absorver grupos em desvanta-gem no nvel secundrio sem perturbar os interesses sociais de gruposem vantagem na estratificao educacional.

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  • A expanso do ensino ps-secundrio nos EUA tambm pode ser en-tendida sob essa mesma perspectiva. Achados de vrios trabalhos in-dicam que o aumento das taxas de matrcula de minorias na educaosuperior foimaior que as de brancos,mas que, por outro lado, estasmi-norias tnicas esto sobrerrepresentadas em programas de dois anos ecommunity colleges, enquanto o acesso s melhores universidades maior entre brancos (Ayalon et alii, 2001; Karen, 2002).

    Hout (2006) compara a estratificao educacional em 25 pases partici-pantes do International Social Survey Programme (ISSP) em 1999, en-tre eles o Brasil, a fim de verificar a pertinncia das hipteses MMI eEMI. Mostra que a MMI encontra suporte nas economias de mercado,mesmo naquelas em desenvolvimento, como o Brasil, uma vez que oefeito das variveis de origem social includas nosmodelos cai medi-da que estes pases atingem saturao nos nveis bsicos de educao.Por outro lado, a MMI no se aplica a sociedades que fizeram parte dobloco socialista, pois entre estas o efeito da origem social sobre o alcan-ce educacional diminui com as coortes sem que tenha havido satura-o dos nveis bsicos quando o efeito comeou a diminuir e, assim, oresultado no consistente com aMMI,mas plausvel para a EMI. Parao autor, isso explicado pela capacidade de os governos socialistas, an-tes de 1991, diminurem desigualdades entre classes sociais.

    A Hiptese da Transformao Socialista

    Pesquisas em pases participantes socialistas, todavia, apontam o ou-tro lado dessa questo. Szelenyi e Aschaffenberg (1993), para a Hun-gria, Wong (1998), para a Tchecoslovquia, Heyns e Bialeck (1993),para a Polnia, Zhou et alii (1998), para a China, e Gerber (2000), para aRssia, indicam a persistncia, oumesmo o recrudescimento, das desi-gualdades sociais, embora seja fato que oportunidades educacionaispara as classes mais baixas foram expandidas com o estabelecimentodo regime socialista. A hiptese da transformao socialista argumentaque o efeito das origens sociais reemerge posteriormente a umperodode declnio e relativa equalizao das oportunidades educacionais,dado que o socialismo gera uma nova classe de burocratas similar sclasses dominantes em economias capitalistas, e que usa polticas deEstado para obter privilgios para eles mesmos e suas famlias. As no-vas elites estabelecem seus privilgios e ganham controle sobre o siste-ma escolar, assegurando vantagens para seus prprios filhos.

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  • Como aponta Gerber (2000), a Rssia apresenta uma das histrias demaior sucesso entre pases do bloco comunista. Em 1989, 94%da popu-lao urbana e 84% da populao rural haviam completado pelo me-nos o nvel secundrio. Criou-se, a, um gargalo, dado que o ensino su-perior no se expandiu na mesma proporo que os anteriores, e, as-sim, a presso por acesso foi deslocada para este nvel. As aes no fo-ram capazes de promover a equalizao geral das oportunidades, per-sistindo o efeito das origens sociais e mesmo do lugar de residncia(Gerber eHout, 1995). Crises econmicas e caos poltico desde o esface-lamento do regime socialista tiveram forte impacto negativo no siste-ma educacional, cuja proporo da retrao no encontra similar noincio dos anos 90. Como consequncia, houve umaumento aindamaissignificativo damagnitude das desigualdades de acesso ao nvel supe-rior. As evidncias do efeito das origens sociais derivadas da formaode uma classe burocrtica so ainda mais destacadas. Gerber (2000)mostra que, alm das variveis clssicas de origem socioeconmica, ofato de um dos pais ter pertencido ao Partido Comunista exerce umaenorme influncia sobre as oportunidades educacionais dos filhos emcoortesmais jovens, aumentando o alcance escolar. De acordo comTre-iman et alii (2003), a reproduo educacional apresenta-se atualmentemuito forte entre naes antes pertencentes ao bloco comunista, maiorat do que em vrias economias de mercado.

    HIPTESES

    So trs as principais hipteses a serem testadas nas anlises:

    Hiptese 1: Baseando-se na literatura sobre os modelos de transio,testa-se que o efeito das origens sociais no diminui ao longo das coor-tes no caso deste trabalho, ao longo da dcada , ao contrrio do queproporia a teoria da modernizao;

    Hiptese 2: Baseando-se na hiptese da desigualdade maximamente man-tida, ser testada a suposio de que o efeito das origens sociais maiorna transio para o ensino superior que na transio para a conclusodo ensino mdio;

    Hiptese 3: Tendo como referncia a hiptese da desigualdade efetiva-mente mantida, testa-se que grupos sociais com vantagens socioecon-micas e de capital cultural procuram resguardar para seus filhos o tipode ensino mais prestigiado e que traduz mais vantagens futuras.

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  • METODOLOGIA DE ANLISE

    Fontes de Dados

    Os dados so provenientes da Pesquisa Nacional por Amostra de Do-miclios (PNAD), realizada pelo IBGE. Apesquisa entrevista indivdu-os em todo o pas, baseando-se numa amostra de domiclios estratifica-da por clusters.

    O estudo baseia-se em dados das PNADs 2001, 2004 e 2007. A PNAD2007 a ltima rodada da pesquisa que est disponvel para o pblicoacadmico, e somente a partir de 2001 a PNAD passou a incluir umaquesto sobre a rede de ensino cursada pelo indivduo, se pblica ouprivada.

    So utilizadas subamostras para cada ano da pesquisa. O primeiro se-leciona apenas indivduos cuja condio na famlia filho(a), a fim dese poder estimar o efeito da origem social (pais) sobre o alcance educa-cional. O segundo corte refere-se idade, quando so escolhidos aque-les que estejam entre 17 e 25 anos, dado que 17 a idade regular para secompletar o ensino mdio, e 25 a idade na qual a maioria dos indiv-duos j completou o seu ciclo escolar. As subamostras resultantes sode 26.555 indivduos para 2001 15.570 para a transio 1, e 10.985para a transio 2 , 34.404 para 2004 19.075 na transio 1, e 15.329 natransio 2 e 36.293 para 2007 19.344 na transio 1, e 16.949 na tran-sio 2.

    A interpretao dos coeficientes dos modelos seguir estratgia suge-rida para amostras estratificadas (Hasenbalg e Silva, 1991; Silva, 2003;Fernandes, 2005). Sugere-se que concluses feitas a partir deste mto-do de amostragemno sejam interpretadas damesma forma que as ob-tidas a partir de amostras aleatrias simples, uma vez que estimaesfeitas a partir de amostras estratificadas e multiestgio tendem a su-bestimar o erro padro. Assim, o t de studentmaior que 3 a opo su-gerida para se evitar a subestimao do erro.

    Variveis

    As variveis independentes includas nos modelos foram inspiradasno trabalho de Silva (2003), que introduz ummodelo com variveis re-lacionadas tanto ao indivduo quanto ao domiclio e ao contexto regio-

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  • nal. Foram acrescentados termos interativos . Todas as variveis sodescritas a seguir.

    Variveis Dependentes

    As variveis dependentes referem-se s transies escolares:

    Transio 1 (t1): dado que iniciou o ensino mdio, se o completou ouno; a varivel codificada em 0 para os que abandonaram este cicloantes de termin-lo (referncia), em 1 para os que o completaram emescola pblica, e em 2 para os que o completaram em escola privada.

    Transio 2 (t2): dado que completou o ensinomdio, se iniciou educa-o superior ou no; codificada em 0 para os que concluram o ensinomdio, mas no buscaram vaga na educao superior (referncia), 1para os que buscaram vaga em universidades pblicas e 2 para os quebuscaram vaga em universidade privada.

    T2 (referncia: escola pblica): esta varivel uma recodificao da an-terior, na qual a referncia agora a escola pblica. Permitirmensurara diferena direta entre completar uma transio na escola privada, emrelao escola pblica.

    Variveis Independentes

    Idade: varivel de controle do fluxo do indivduo no sistema escolar.Neste estudo, sua amplitude dos 17 aos 25 anos. Idade ao quadrado introduzida para captar amedida na qual a idade passa a exercer efeitonegativo sobre a escolaridade.

    Gnero: tendo em vista o maior alcance educacional feminino, estavarivel dicotmica apresenta homens com valor 0 emulheres com va-lor 1.

    Raa: codificada em duas variveis indicadoras, uma para pardos(pardos = 1 e outros = 0) e outra para brancos (brancos =1 e outros = 0),tendo como referncia a categoria pretos. Embora seja comum agregarpardos e pretos como no brancos ver, por exemplo, Silva eHasenbalg (2000) e Silva (2003) , ser analisado em que medida estascategorias sociais apresentam chances diferentes de sucesso nas tran-sies educacionais, sendo, por isso, separadas aqui4.

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  • Educao do chefe: varivel que representa o capital cultural da fam-lia, codificada em anos completos de escolaridade do indivduo carac-terizado como chefe da famlia. Mensura o impacto deste capital naspossibilidades de um indivduo completar determinada transio.

    Renda familiar per capita: mede o impacto do capital econmico fami-liar sobre as probabilidades de o estudante alcanar alguma das transi-es. Espera-se que quanto maior a renda, maior o acesso educaosuperior, e, em especial, s universidades da rede privada; a amplitudeda renda familiar de 0 at 30 salrios mnimos, no intuito de se evitarque outliers atrapalhem a anlise.

    Chefia feminina: assim comoutilizada emLucas (2001) e Silva (2003), indicadora de famlia quebrada; espera-se que em familias com che-fia feminina estudantes apresentem menor probabilidade de comple-tar as transies, em relao a abandonar a escola.

    Nmero de filhos: indica o peso da composio familiar sobre as possi-bilidades de alcance educacional, de forma que em famlias commaiornmero de filhos a probabilidade de estes completarem as transiesso menores. Tambm funciona como controle da heterogeneidadeno mensurada.

    rea: dadas as maiores dificuldades de acesso aos ensinos mdio e su-perior em reas rurais, esta variavel foi codificada em duas variveisindicadoras: uma para reas metropolitanas e outra para reas urba-nas no metropolitanas, tendo reas rurais como referncia.

    Regio: o Nordeste, por seu menor nvel educacional geral, foi defini-do como categoria de referncia para trs variveis indicadoras: Su-deste, Sul e Norte/Centro-Oeste.

    Termos interativos foram estimados entre a renda familiar ou educa-o do chefe e raa, chefia feminina e regies do pas.

    Modelos de Anlise

    Tendo como referncia o modelo proposto pela hiptese EMI, as anli-ses deste trabalho sero baseadas emmodelos logsticosmultinomiais.

    Sero estimados trsmodelos para cada ano da PNAD: umpara a tran-sio 1 e outro para a transio 2, nos quais os indivduos que abando-nam a escola so categoria de referncia, e o ltimo tambm para a

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  • transio 2,mas com a escola pblica como referncia. Temos ento umtotal de nove modelos.

    Limitaes do Modelo

    Levando-se em conta que a PNAD no um survey especializado emestratificao educacional, variveis importantes para um estudocompleto das transies educacionais no esto presentes no banco dedados. Os modelos aqui estimados no permitiro, como o de Lucas(2001), mensurar como o desempenho e o caminho do estudante atdeterminada transio influenciamna sua alocao naquela transio.

    O problema de heterogeneidade no mensurada reduzido dada apresena da varivel relativa ao nmero de filhos no domiclio, em es-tratgia similar apresentada por Mare (1994) e Lucas (2001).

    Estatsticas Descritivas

    ATabela 1 indica a proporo de indivduos em cada tipo de transio erede escolar, para os trs anos da pesquisa analisados.

    Tabela 1

    Proporo de Estudantes, por Rede de Ensino e Transio Escolar

    Brasil, 2001, 2004, e 2007

    Transies Caminhos2001 2004 2007

    N % N % N %

    Transio 1 (completarensino mdio)

    No completou 7.137 45,8 8.040 42,1 7.680 39,7

    Rede pblica 7.452 47,9 7.679 40,3 8.715 45,1

    Rede privada 981 6,3 3.356 17,6 2.949 15,2

    Transio 2 (acesso educao superior)

    No completou 8.434 76,8 11.037 72 11.667 68,8

    Rede pblica 745 6,8 1.269 8,3 1.684 9,9

    Rede privada 1.806 16,4 3.023 19,7 3.598 21,2

    Fonte: Elaborao prpria a partir de dados das PNADs 2001, 2004 e 2007.

    Tendncias apresentadas na Tabela 1 indicam a diminuio gradual donmero de estudantes que abandonam a escola sem completar o ensi-no secundrio, a constncia dos que completam esta transio no siste-ma pblico e aumento do nmero de estudantes que completamo ensi-no mdio no sistema privado. A rede pblica representa a maioria dosque completam esta transio.

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  • Para a transio 2 tambm se verifica a diminuio gradual do nmerode indivduos que abandonam a escola antes de entrar para a universi-dade e, consequentemente, o aumento dos que completam esta transi-o, tanto na rede privada quanto na pblica. Arede privada abrange amaioria dos que completam esta transio, evidenciando a superiori-dade quantitativa da rede privada nesta transio escolar.

    As correlaes entre as variveis envolvidas nos modelos indicam queno h problemas de colinearidade entre elas que afete a confiabilida-de dos modelos5.

    Resultados

    As tabelas a seguir apresentamos resultados dosmodelos estimados.

    Destaca-se, em primeiro lugar, o ajuste dos modelos. O qui-quadrado(2) o mecanismo utilizado. Os modelos apresentam 28 graus de li-berdade. Assim, comparando-se o qui-quadrado dos modelos com oqui-quadrado de referncia a 28 graus de liberdade (41,337), todos osmodelos estimados apresentamqui-quadradosmuito superiores ao dereferncia, mostrando-se assim bem ajustados.

    O pseudoR2 (Cox e Snell) indica que as variveis includas explicamde24% a 27%, em 2001, 29% a 41%, em 2004, e 26% a 37%, em 2007, da va-rincia6. Comparando-se com o R2 de 27% encontrado por Ayalon eShavit (2004) para o caso israelense, verifica-se que os modelos expli-cam proporo semelhante a modelos para outros contextos.

    Nas tabelas seguintes, os coeficientes indicam a razo de chance (Exp)de um indivduo, com determinada caracterstica, completar a transi-o na rede pblica, ou privada, em relao aos que abandonaram a es-cola sem completar a transio7. A probabilidade final dada por:(Exp- 1) *100. Acoluna 5 diz respeito aomodelo que tem como refern-cia a escola pblica. Acoluna que indica a relao entre abandonar a es-cola e a escola pblica neste modelo foi suprimida, j que ela tambmrepetiria a coluna 3.

    Os coeficientes com significncia estatstica (t > 3) so indicados porum asterisco. Os termos interativos, estimados separadamente, foramincludos nestas tabelas para aproveitamento de espao.

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    Che

    fiafeminina*rend

    afamiliar

    1.070

    1.188*

    1.094*

    1.128*

    1.031

    Sudeste

    *ed

    ucaodochefe

    0.959*

    0.911*

    1.028

    0.970*

    0.944*

    Sul*

    educaodochefe

    0.976

    0.891*

    1.017

    0.976

    0.960

    Norte/centro-oeste

    *ed

    ucaodochefe

    0.993

    0.980

    0.992

    0.994

    1.002

    Sudeste

    *rend

    a0.699*

    1.161

    0.870*

    0.868*

    0.998

    Sul*

    rend

    a0.747*

    1.039

    0.790*

    0.898*

    1.136*

    Norte/Cen

    tro-Oeste

    *rend

    a0.904

    0.865*

    0.863*

    0.864*

    1.001

    PseudoR

    2(Cox

    andSn

    ell)

    0.374

    0.255

    0.255

    29060

    4989

    4989

    -2Log

    Likelihoo

    d30060

    22580

    22580

    N19344

    16949

    16949

    Fonte:Elabo

    raoprpriaapartirdedad

    osdaPNAD2007.

    *Sig.:t

    >3.

    (con

    tinu

    ao)

  • A idade, como esperado, apresenta efeito positivo e a idade ao qua-drado, negativo, o que indica que, quanto mais velho(a) o(a) estudan-te, entre 17 e 25 anos, maiores as chances de ter completado as transi-es.

    O coeficiente da varivel sexo significante e positivo em todas astransies e anos. Mulheres apresentam mais chances de completar aeducao secundria e entrar na universidade, tanto na rede privadaquanto na pblica, do que homens, em relao a no completar estatransio. Essa probabilidade, todavia, maior em escolas privadas doque pblicas. Ao longo da dcada, verifica-se um aumento dessa pro-babilidade em escolas privadas na transio 1, e uma diminuio pro-gressiva na transio 2. Para as escolas pblicas observa-se certa cons-tncia do efeito. Em relao s diferenas de efeito entre as transies,verifica-se diminuio na rede pblica e aumento na rede privada, oque indica que h diminuio do efeito de gnero na transio para aeducao superior em relao educao secundria na rede pblica,mas o contrrio vlido para a rede privada. No que concerne proba-bilidade de se completar a transio 2 numa escola privada em relaoa uma pblica (ltima coluna), verifica-se que o efeito do sexo maisimportante nas escolas privadas, rede em quemulheres tendem a com-pletar a transio para o ensino superior commaior vantagem, emboraesta esteja diminuindo ao longo da dcada. Escolas pblicas, em geral,so mais igualitrias, ou menos desiguais, no que concerne s relaesde gnero.

    As variveis indicadoras de raa, por sua vez, mostram que pardosapresentam vantagens significativas, em relao aos pretos, de acessoao ensino superior, em 2004 e 2007. Em 2004, essa vantagem maior natransio para a escola privada, e em 2007 para a rede pblica. No en-tanto, em ambas as redes essa probabilidade declina da casa dos 50%para prximo de 30% no ltimo ano da pesquisa. No h diferena sig-nificativa entre pardos e pretos no que diz respeito a completar a tran-sio 2 na rede particular em relao rede pblica.

    H vantagens de brancos na probabilidade de completar as duas tran-sies, em todos os anos, em relao aos negros. No geral, o efeito muito maior na rede privada do que na pblica, em relao a abando-nar a escola. Para a transio 1, o efeito declina ao longo dos anos para arede pblica, o que, junto com a ausncia de diferenas entre pardos epretos, pode ser indicativo da diminuio de desigualdades de raa no

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  • acesso e completude da educao secundria na educao pblica. Poroutro lado, o efeito aumenta paulatinamente na rede privada, indican-do o recrudescimento de desigualdades raciais nesta rede de ensino aolongo da dcada, em relao queles que no completaram a transio.Para a transio 2, verifica-se certa constncia do efeito ao longo da d-cada que, todavia, varia entre 90% e 100%de vantagemdos brancos emrelao aos negros. Mais uma vez, o efeito maior na rede privada. Adiferena entre as transies aponta para o aumento da desigualdadena entrada para a universidade. Brancos, em relao a negros, noapresentam mais probabilidade de acesso rede particular do que emrelao rede pblica neste nvel, indicando que os fatores de diferen-ciao no acesso s diferentes redes de ensino superior so outros.

    Aeducao do chefe apresenta efeito significativo positivo em todos oscaminhos analisados: cada ano a mais de escolaridade do chefe da fa-mlia implica progressivamente maiores chances de se completar o en-sino secundrio e de se acessar o ensino superior, tanto na rede pblicaquanto privada, em relao a abandonar o sistema escolar. Na transi-o 1 o efeito para a rede privada crescente e torna-se maior que paraa rede pblica, ou seja, a educao do chefe mais forte para se comple-tar a transio na escola privada que na pblica. Na transio 2 o efeito semelhante. Na diferena entre as transies, percebe-se que o efeitona segunda maior que na primeira, permitindo aceitar a hipteseMMI para o caso brasileiro, no que concerne educao do chefe. Aolongo da dcada, o efeito da educao do chefe declina um pouco paraa rede pblica na transio 1 tambm sinal de reduo de desigualda-des pela influncia da transmisso de capital cultural , mas aumentaconsideravelmente na rede privada, reforando desigualdades cons-trudas pela transmisso de capital cultural. Na transio 2 encontra-mos o mesmo padro que na transio 1. No que concerne s chancesde se completar a transio 2 na escola privada em relao a completarna rede pblica, a educao do chefe tambm tende a no importar,apesar de em 2007 ser significativa (2,4%).

    A renda familiar, por sua vez, independentemente do clima educacio-nal do domiclio, apresenta efeito significativo em praticamente todosos caminhos, exceto para a rede pblica na transio 1, em todos osanos analisados. Assim, o aumento da educao familiar no faz dife-rena para se completar o ensino secundrio numa escola pblica, emrelao a no complet-lo. Para a rede privada, por outro lado, o efeitoda renda crescente, indo de 7,4%, em 2001, a 51,5%, em 2007. Na tran-

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  • sio 2 h efeito da renda para se entrar numa universidade pblica,efeito tambm crescente ao longo da dcada, o que indica aumento dasdificuldades para estudantes pobres ingressaremnesta rede de ensino.Todavia, o efeito aindamaior na rede privada, e tambm crescente aolongo da dcada, confirmando a importncia da renda para acesso educao superior paga. Verifica-se, por fim, que a renda mais impor-tante para se ter acesso rede privada, em relao rede pblica (colu-na 5).

    Avarivel chefia feminina tem, emgeral, efeito negativo sobre as chan-ces de se completar as transies s no h efeito na transio 1 para arede pblica em 2001. Comparando-se o efeito nas duas transies, ve-rifica-se que ele aumenta na escola pblica, indicando o peso de umafamlia quebrada sobre as possibilidades de se ter acesso a uma boauniversidade pblica, e diminui na privada, abrindo espao para ou-tros fatores determinantes. Esse padro para a rede privada condizcom os achados de Lucas (2001) para os EUA. Ao longo da dcada ob-serva-se aumento do efeito dessa varivel nas chances de se completaras transies na rede privada, enquanto na pblica esse efeito tende aser constante. No que diz respeito s chances de acesso rede privada,em relao pblica, no h efeito significativo.

    O nmero de filhos(as) no domicilio tambm apresenta efeito negati-vo: cada filho(a) a mais representa decrscimo nas chances de se com-pletar uma transio, em relao a abandonar a escola, seja na rede pri-vada ou pblica, para todos os anos pesquisados, comprovando-se oefeito da composio domiciliar sobre as chances de alcance educacio-nal dos indivduos (Silva, 2003). Na transio 1, ao longo da dcada oefeito se torna maior na rede privada com aumento gradativo quena pblica com declnio gradativo , enquanto na transio 2 o efeito constantementemaior para a rede privada. A tendncia geral de de-clnio do efeito, em ambas as redes, ao longo da dcada. H diferenassignificativas de probabilidade de se ter acesso rede privada em rela-o rede pblica, a qual cai de 18% para 10% a menos de chances deacesso a cada filho a mais.

    reas urbanas emetropolitanas apresentam efeito positivo para 2004 e2007 exceto para a rede pblica na transio 2 , mas no em 2001.Tanto para a transio 1 quanto para a 2 o efeito maior para a rede pri-vada que para a pblica, dada a maior disponibilidade de servioseducacionais de nveis secundrio e superior em reas urbanas e me-

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  • tropolitanas. H reduo do efeito ao longo das transies para a redeprivada, e h diferenas significativas entre a probabilidade de se aces-sar o ensino superior na rede privada em relao pblica, em reasurbanas ou metropolitanas, em referncia a uma rea rural, diferenasque tambm apresentam tendncia de diminuio ao longo da dcada,provavelmente devido extenso do ensino pago a distncia para pe-quenas localidades urbanas e reas rurais prximas nos ltimos anos.

    No que toca s diferenas regionais, evidencia-se desigualdades acen-tuadas, principalmente das regies Sudeste e Sul em relao a Nordes-te. O padro de crescimento das desigualdades nas possibilidades dese completar as transies, tanto em rede pblica quanto em privada,ao longo da dcada. As diferenas so maiores na transio 1 e na redeprivada. As chances de acesso rede privada, em relao rede pbli-ca, so positivas em todas as regies em referncia ao Nordeste.

    Aanlise dos termos interativos, por sua vez, indica que o aumento darenda para brancos, em relao ao aumento para pretos, tem, em geral,efeito negativo, ou seja, o aumento da renda temmaior efeito para pre-tos completarem uma transio do que para brancos. Isso mais acen-tuado na rede privada, em ambas as transies. Na rede pblica no hefeito significativo. H efeito crescente ao longo da dcada na rede pri-vada, indicando aumento das chances de se completar a transio paraindivduos de cor preta com maior renda. O aumento da renda parabrancos, em relao ao aumento para pretos, no tem efeito significati-vo no que concerne ao completar a transio 2 na rede privada em refe-rncia rede pblica. A interao cor e educao do chefe no apresen-ta efeito significativo. Tambm aquelas para pardos (educao do che-fe e renda) no apresentam efeito significativo.

    O efeito das interaes da chefia feminina e a renda familiar , em ge-ral, positivo exceto para a rede pblica na transio 1, que no apre-senta efeito , o que quer dizer que o aumento da renda possui maiorefeito para domiclios que no tm chefia feminina, elevando as chan-ces de se concluir as transies para estudantes nestes domiclios emrelao aos que tm chefia feminina.

    Os termos interativos para regies indicam que o aumento da educa-o do chefe no Sudeste e no Sul, em relao ao Nordeste, apresentaefeito negativo, ou seja, o incremento na educao do chefe implica queindivduos tenham maior chance de completar as transies no Nor-deste que nestas regies. O efeito do aumento da educao do chefe nas

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  • chances de se completar a transio na rede privada, em relao p-blica, tambm negativo, ou seja, o aumento da escolaridade do chefe mais importante para se completar as transies na rede pblica doque na privada, no Nordeste em comparao com Sudeste ou Sul.

    A interao das regies com a renda familiar apresenta tendncia pare-cida: o aumento da renda familiar mais importante para se completaras transies no Nordeste do que nas outras regies.

    DISCUSSO

    Este estudo prope uma discusso da estratificao educacional noBrasil, na primeira dcada do sculo XXI. Tendo como referncia vriasabordagens tericas e modelos analticos que tm desvelado a repro-duo das desigualdades sociais por meio da educao ao redor domundo, props-se analisar a influncia das origens sociais nas transi-es educacionais dos estudantes brasileiros para concluso do ensinomdio e acesso ao ensino superior, a partir de modelos que permitis-sem entender o efeito das origens sociais, assim como de variveis fa-miliares e espaciais, no alcance educacional de estudantes nos nveissecundrio e tercirio, na rede pblica e privada.

    Os resultados indicam, em geral, um quadro de alta desigualdade naschances de se completar as transies educacionais, tanto na rede p-blica quanto na rede privada. As variveis que representam a organi-zao familiar mostram que famlias quebradas e aquelas com gran-de prole, prejudicam o desempenho dos estudantes. Ser membro deuma famlia quebrada, durante o ensino secundrio, diminui drastica-mente as chances de se completar essa transio e, consequentemente,de entrar para a universidade.

    Diferenas relacionadas ao nvel de urbanizao indicam que, emboraexistamdesigualdades considerveis de acesso a servios de ensino se-cundrio e superior, com vantagem para reas urbanas e metropolita-nas, h diminuio desse efeito no final da dcada. Aexpanso dos cur-sos no presenciais a distncia podemestar ajudandoneste processo.

    Encontrou-se tambm a permanncia das desigualdades regionais, asquais implicam desvantagem de estudantes nordestinos nas possibili-dades de se completar as transies analisadas, independente da ren-da e do nvel educacional familiares. Aumentos da renda e da educa-

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  • o familiares so, ento, mais importantes para estudantes do Nor-deste que das outras regies em geral.

    No que concerne s origens sociais, possvel verificar que a hiptese 1no pode ser rejeitada, ou seja, que o efeito das origens sociais no ne-cessariamente diminui ao longo das coortes, contrariando o que foiproposto pela teoria damodernizao. Embora o efeito da educao dochefe diminua levemente nas transies para a escola pblica, ele au-menta ou constante nas transies na rede privada. Na comparaodireta entre as redes pblica e privada (coluna 5), tambm se verificaaumento do efeito da educao do chefe na rede privada. O efeito darenda, por sua vez, aumenta marcadamente em todas as transies noperodo estudado, inclusive na rede privada em relao rede pblica.

    Resultados relativos desigualdade racial tambmno permitemacei-tar a hiptese meritocrtica para este contexto. Primeiro, mostram quepardos detm vantagens em relao aos pretos para acesso educaosuperior, seja na rede pblica, seja na rede privada. As desigualdadesentre brancos e pretos, por sua vez, so enormes, embora apresentemleve declnio ao longo da dcada. Aexpanso de polticas pblicas quevisam diminuio da desigualdade racial no sistema escolar como oREUNI e os sistemas de cotas e bnus implantados por vrias universi-dades pblicas podem estar ajudando no declnio das desigualdadesnessas transies. Mas a possibilidade de se completar o ensino mdionuma escola privada, pela melhor estrutura escolar que proporcionaaos estudantes, tem sido um dos mecanismos principais que assegu-ramvantagens na competio por vagas no curso superior, e cada vezmais desigual no que diz respeito relao entre brancos e pretos: a di-ferena vai de 50 a 88% numperodo de seis anos. Estes resultados cor-roboram o argumento de Soares e Alves (2003:159), que apontam queas diferena entre brancos e pretos bem maior do que as mudanaspossveis pela interveno de polticas escolares.

    Estes resultados, em geral, questionam a validade da hiptese merito-crtica. Como argumenta Hout (2006), desigualdades educacionaisso recorrentes emqualquer lugar domundo, de forma que estudantescujos pais so altamente educados e ricos tm vantagens sobre estu-dantes cujos pais tm menor nvel educacional e de recursos em qual-quer sociedade, seja empases desenvolvidos ou emdesenvolvimento.Dados de Silva (2003) indicam que, apesar da diminuio do efeito daescolaridade do chefe da famlia ao longo das coortes, houve aumento

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  • do efeito da renda familiar sobre o alcance educacional entre 1981 e2006, o que no permitem aceitar a hiptese meritocrtica. Fernandes(2005) tambm argumenta que a hiptese meritocrtica no pode sercompletamente aceita para o caso brasileiro, pois, em seu estudo, raae origem urbana aumentam seu efeito. Os processos de industrializa-o e desenvolvimento econmico no teriam proporcionado a equali-zao do alcance educacional. Como argumentam Hout e DiPrete(2006) e Goldthorpe (1996), h poucos sinais de que o crescimento eco-nmico, o nvel de consumo e a expanso educacional, por si mesmos,tenham conexo commaior igualdade educacional. E assim, a idia deque as desigualdades em todo o mundo declinariam com o tempo, medida que as sociedades semodernizassem e os sistemas escolares setornassem universais, no se concretizou, comprometendo os funda-mentos bsicos da teoria.

    Ahiptese 2 tambmno pode ser rejeitada. O efeito da renda familiar,de inexistente na transio 1, torna-se altamente positivo na transio 2para o ensino pblico embora para a rede privada essa tendncia sseja encontrada para o ano de 2002, havendo, ento, diminuio doefeito entre as transies. Assim como no estudo de Breen e Jonsson(2000) e Lucas (2001), a educao dos pais importa mais para a transi-o para o curso superior que para se completar o ensino secundrio. Ocapital cultural familiar decisivo no processo de alcance, de formaque indivduos oriundos de famlias com maior volume desse capitaltendem a conquistar maior alcance educacional. Nesse sentido, mos-tra-se improvvel que o efeito das origens socioeconmicas sobre o al-cance educacional diminua mesmo em termos de alto desenvolvimen-to econmico, j que a desigualdade de capital crucial para o processode estratificao educacional.

    O padro de expanso educacional brasileiro pode ser ento entendi-do no mbito do que Shavit e Blossfeld (1993) entendem como padrouniversal de polticas de expanso educacional: os sistemas se abrempasso a passo, da base para cima. Coortes vo sucessivamente avan-ando pequenos passos dentro da hierarquia educacional. Contudo, osmaiores nveis educacionais permanecem razoavelmente exclusivos.Verdadeiros gargalos so criados na transio para o nvel superior, osquais no acompanham o crescimento dos nveis bsicos de ensino, eacabam privilegiando o acesso daqueles oriundos de grupos socioeco-nomicamente bem-sucedidos. Tal padro coerente com as proposi-es da teoria da reproduo (Bourdieu e Passeron, 1977) a qual, embo-

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  • ra no discuta tendncias ao longo das transies educacionais,mostraque o capital cultural o mais importante determinante da persistn-cia da desigualdade escolar , e com a desigualdade maximamente manti-da (Raftery eHout, 1993). As proposies da abordagemdo ciclo de vida,por sua vez, no encontram respaldo nos dados. Os resultados tambmno correspondem aos do modelo de seletividade diferencial (Mare,1980, 1981), que apresenta efeito praticamente inexistente das origensna transio para o ensino superior.

    Um processo de permanente racionamento das credenciais mais altasrestringe a quantidade de candidatos s posies de privilgio na hie-rarquia social, mantendo e legitimando desigualdades no alcance es-colar. O caso brasileiro, como discutiu Schwartzman (1988), apresentasrias dificuldades no que diz respeito equalizao das oportunida-des sociais, uma vez que as questes centrais estabelecidas pela orga-nizao da educao no Brasil, em vez de serem aquelas relacionadas aacesso, equidade, qualidade da educao e desenvolvimento de pes-quisa, so as relacionadas a autonomia, governana e diferenciao,questes polticas que relegam para segundo plano a diminuio dasdesigualdades no alcance escolar.

    Por fim, a hiptese 3 s pode ser parcialmente aceita. Ahiptese da de-sigualdade efetivamente mantida aponta a existncia de caminhos alter-nativos, dentro dos mesmos nveis escolares, pelos quais classes so-ciais procuram reforar suas vantagens na competio pelas posiesmais privilegiadas. Os resultados da renda na transio 1 ausncia deefeito na escola pblica e efeito significativo na rede privada confor-mam o padro da EMI, pois estudar nesta rede no ensino mdio se tra-duz em grandes vantagens na competio por vagas nas universida-des. Por outro lado, o efeito na transio 2, assim como o da educaodos pais para ambas as transies, embora seja levemente superior narede privada, altamente significativo para as duas redes. E como ar-gumenta o propositor da hiptese (Lucas, 2009), a EMI no se preocupaestritamente com o tamanho do coeficiente de efeito das origens so-ciais, mas, sim, com a forma pela qual as origens proporcionam que es-tudantes assegurem os caminhos mais valorizados do sistema educa-cional. No caso da transio para a universidade, os coeficientes dasorigens revelam que estratos socioeconmicos mais altos da popula-o no asseguram necessariamente um caminho especfico, mas pra-ticamente monopolizam o acesso educao superior, seja na rede p-blica a de maior prestgio e que proporcionar maiores retornos ocu-

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  • pacionais , seja na privada. Esta anlise aponta um alto grau de desi-gualdade no acesso educao superior, mas que no necessariamentese conforma aos pressupostos da hiptese EMI.

    Os resultados apresentados indicam que a rede privada mais desi-gual que a pblica. Todavia, embora a escola pblica seja mais demo-crtica o que se comprova pelos efeitosmais baixos das origens socia-is, raa, gnero e regio em relao rede privada , o efeito das ori-gens sociais nesta rede constante, ou mesmo crescente ao longo doperodo analisado, apontando uma tendncia de recrudescimento daestratificao educacional na rede pblica.

    A estabilidade das desigualdades educacionais tem consequnciaspara a mobilidade social e para a estratificao da sociedade. Silva(1999) aponta para uma acentuada estabilidade nos padres de mo-bilidade social no Brasil, pois, embora possa ser detectado um peque-no aumento na mobilidade total no Brasil, liderada pelo aumento damobilidade circular, a estrutura bsica da estratificao da sociedadepermanece praticamente inalterada, com grandes classes isoladasumas das outras. Ribeiro (2003) tambm aponta que, apesar da peque-na diminuio de desigualdades das condies de vida, verifica-seuma continuidade das propores de desigualdades de renda e educa-o superior na estrutura de classes, que temmudadomuito lentamen-te, no havendo nenhuma grandemudana na estrutura da estratifica-o social do pas nas ltimas dcadas.

    A transmisso de desigualdades, mediada pela influncia das origenssociais nas possibilidades de alcance educacional, contraria, ento, ootimismo das teorias da modernizao e industrializao. O conjuntodesses resultados recentes mostra, em certo sentido, o que Sorokin(1964) j havia percebido h quase um sculo: quando desaparece oudiminui o efeito de ummecanismo de reproduo social, em vez de umprocesso de equalizao tem-se, outrossim, o surgimento ou intensifi-cao de outro mecanismo que recrudesce as desigualdades sociais.

    (Recebido para publicao em abril de 2011)(Verso definitiva em agosto de 2011)

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  • NOTAS

    1. Outras quatro proposies so estabelecidas por Treiman (1970), mas estas fogem aoescopo deste trabalho, pois dizem respeito associao entre origem social, taxas demobilidade social e renda.

    2. Os treze pases analisados na coletnea so Alemanha, Inglaterra e Pas de Gales,Sua,Hungria, Polnia, Israel, EUA, Itlia, Taiwan, Japo e Tchecoslovquia,Holan-da e Sucia.

    3. Cameron eHeckman (1998) sugerem outra soluo para a questo da heterogeneida-de, rejeitando o modelo de transies por este no utilizar variveis que variem como tempo. Propem, ento, um modelo de escolha discreta ordenada com heteroce-dasticidade multiplicativa, cuja varivel dependente volta a ser anos completos deescolaridade, s