monografia rosemaide pedagogia 2003

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0 UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS VII CRIANÇAS QUE TRABALHAM E ESTUDAM EM UMA ESCOLA DE PINDOBAÇU – BAHIA ROSEMAIDE FERREIRA DA SILVA SENHOR DO BONFIM – BAHIA 2009

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Pedagogia 2003

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Page 1: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

0

UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB

DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS VII

CRIANÇAS QUE TRABALHAM E ESTUDAM EM UMA

ESCOLA DE PINDOBAÇU – BAHIA

ROSEMAIDE FERREIRA DA SILVA

SENHOR DO BONFIM – BAHIA

2009

Page 2: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

1

ROSEMAIDE FERREIRA DA SILVA

CRIANÇAS QUE TRABALHAM E ESTUDAM EM UMA

ESCOLA DE PINDOBAÇU – BAHIA

Trabalho monográfico apresentado como

pré-requisito para conclusão do curso de

Licenciatura em Pedagogia, Habilitação

nas séries iniciais, do Ensino

Fundamental, pelo Departamento de

Ensino – Campus VII, do Estado da

Bahia.

Orientadora: Simone Wanderley

SENHOR DO BONFIM – BAHIA

2009

Page 3: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

2

ROSEMAIDE FERREIRA DA SILVA

CRIANÇAS QUE TRABALHAM E ESTUDAM EM UMA

ESCOLA DE PINDOBAÇU – BAHIA

Aprovada em _______/________/__________ ______________________________________________ Orientador _______________________________________________ Avaliador

_______________________________________________ Avaliador

Page 4: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

3

A Deus, amigo de todas as horas.

Aos colegas da turma de pedagogia 2003,

em especial as minhas amigas Edileuza,

Eneandra e Vanessa por compartilhar os

momentos de aflição, angústias e

alegrias.

Aos meus familiares, Beatriz, Charlene,

Daniel, Maria e Rosa.

Ao querido Heliton por estar presente em

minha vida em todos os momentos.

Aos alunos, que contribuíram comigo para

realização desta pesquisa.

Muito obrigada!

Page 5: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

4

AGRADECIMENTOS

Ao Departamento de Educação Campus VII. Aos funcionários, a cada

professor que contribuiu com seu conhecimento para realização deste trabalho, em

especial ao professor Ozelito, as professoras Simone Wanderley, Rita Braz, Fani

Quitéria.

Obrigada!

Page 6: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

5

Trabalho infantil é a última forma de

escravidão do mundo. (STREEP, M.)

Page 7: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

6

LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Distribuição por setor do trabalho infantil

Figura 02. Gênero dos participantes da pesquisa

Figura 03 Série freqüentada pelas crianças/trabalhadores das comunidades de

Gameleira e Várzea de Cima, em Pindobaçu, Bahia

Figura 04 Turno no qual as crianças trabalham

Figura 05. Comunidades onde moram as crianças entrevistadas

Figura 06 Quanto aos pais estarem vivos

Figura 07a. Causas do trabalho realizado pelas crianças entrevistadas

Figura 7b Atividades realizadas pelas crianças trabalhadoras

Figura 8 a. Opinião das crianças sobre gostar ou não do trabalho que executam

Figura 8b. Valor recebido pelas crianças como pagamento pelo seu trabalho

Figura 9. Idade em que as crianças começaram a trabalhar

Figura 10. Índice de repetência dos alunos pesquisados

Figura 11. Os sonhos das crianças trabalhadoras que participaram da pesquisa

Figura 12. Conseqüências do trabalho infantil sobre a freqüência escolar

Page 8: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

7

LISTA DE ABREVIATURAS

DMCTI – Dia Mundial Contra o Trabalho Infantil

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IPEC – Programa Internacional de Eliminação do Trabalho Infantil

OIT – Organização Internacional do Trabalho

ONGs – Organizações Não Governamentais

ONU – Organização das Nações Unidas

PETI – Programa de Erradicação do Trabalho Infantil

PNAD – Pesquisa Nacional de Amostragem e Domicílio

SAEB – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica

TV – Televisão

Page 9: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

8

RESUMO

Em todo o mundo verifica-se o grande número de crianças que trabalham e estudam. No Brasil, existe uma quantidade significativa de crianças e adolescentes que realizam as duas atividades: estudo e trabalho. De acordo com dados divulgados pala pesquisa nacional de amostra de domicílios (PNAD), (2007) cerca de 12% das crianças e adolescentes na faixa etária de oito a désseis anos estudam e trabalham. Logo, esta pesquisa investiga a visão que as crianças têm sobre trabalho. Para tanto foi coletado dados no período de 15 a 30 de maio de 2008, através de questionários aplicados as onze crianças, residentes na Fazenda Gameleira e Fazenda Várzea de Cima, situados no município de Pindobaçu, Bahia. Tomamos como referencia no conceito das palavras chave autores como: Porto Huzak (2005), Martins (1979), Kassouf (1999), Corazza (2002), Pires (1988), Postman(1999), Agambem (2005), Esterci (1994), entre outros. Elegemos para o desenvolvimento deste trabalho, a pesquisa qualitativa por fornecer uma melhor compreensão e por nos aproximar da realidade pesquisada, os instrumentos para a coleta de dados foram questionários fechado e entrevista estruturada. Ao analisar os dados obtidos nesta pesquisa, os resultados apontaram à existência do trabalho infantil nestas comunidades, e percebe-se a importância da renda gerada pelas crianças no orçamento familiar, como também se comprovou que rendimento escolar é afetado por esta situação.

Palavras-chave: trabalho infantil, renda e rendimento escolar.

Page 10: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

9

SUMARIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 11

CAPÍTULO I

CRIANÇA TRABALHANDO: CONSTRUÇÃO OU DEGRADAÇÃO? ........................ 14

CAPÍTULO II

A INFÂNCIA, A EDUCAÇÃO, O TRABALHO EMANCIPADOR E O TRABALHO

INFANTIL .................................................................................................................. 17

II.1 Considerações sobre a infância ....................................................................... 17

II.2 A escola e seu processo de emancipação ....................................................... 22

II.3 O trabalho emancipador e o trabalho infantil degradador ................................ 24

II.4 O trabalho emancipando o homem .................................................................. 24

II.4.1 O trabalho infantil ...................................................................................... 27

II.4.2 Fatores que ocasionam o trabalho infantil ................................................. 33

II.4.3 Conseqüências do trabalho infantil ........................................................... 34

II.4.4 O aluno que trabalha ................................................................................. 35

CAPÍTULO III

METODOLOGIA ........................................................................................................ 38

III.1 Tipo de pesquisa utilizada .............................................................................. 38

III.2 Lócus da pesquisa .......................................................................................... 38

III.3 Sujeitos envolvidos ......................................................................................... 39

III.3.1 Instrumentos utilizados ............................................................................. 39

III.3.2 Questionário fechado ............................................................................... 39

III.3.3 Entrevista ................................................................................................. 39

III.3.4 Coleta de dados ....................................................................................... 40

CAPÍTULO IV

ANÁLISE DOS RESULTADOS OBTIDOS ................................................................ 41

IV.1 Perfil dos alunos que participaram do estudo ................................................. 41

IV. 2 O posicionamento dos alunos entrevistados ................................................. 45

IV.2.1 Com relação aos motivos pelos quais as crianças trabalham e quais as

atividades realizadas .......................................................................................... 45

IV.2.2 Quanto à questão: “Você gosta do trabalho que realiza? Quanto ganha

por dia com o seu trabalho?” .............................................................................. 48

Page 11: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

10

IV.2.3 Quanto à idade em que começaram a trabalhar ...................................... 50

IV.2.4 Em resposta à questão: O que você gostaria de fazer se não tivesse que

trabalhar?” .......................................................................................................... 51

IV.2.5 Motivos pelos quais as crianças não estudam ......................................... 52

IV.2.6 Quanto à repetição de série pelas crianças que estudam ....................... 53

IV.2.7 Quanto ao futuro das crianças ................................................................. 54

IV.2.8 Em relação às conseqüências do trabalho infantil para o rendimento

escolar. ............................................................................................................... 55

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 57

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 59

APÊNDICE ................................................................................................................ 62

APÊNDICE A ............................................................................................................. 63

QUESTIONÁRIO APLICADO ÀS CRIANÇAS QUE ESTUDAM E TRABALHAM,

RESIDENTES NAS FAZENDAS GAMELEIRA E VARZEA DE CIMA, PINDOBAÇU,

BAHIA ....................................................................................................................... 63

Page 12: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

11

INTRODUÇÃO

Para que se adquira a cidadania propriamente dita, para que o homem

pertencente a uma sociedade democrática atinja o estágio de cidadão, são

necessárias duas condições básicas: a educação e trabalho. O trabalho é toda

atividade praticada pelo homem, é o ato humano realizado com o intuito de gerar

fonte de renda e de subsistência. Ele existe desde o momento que o homem

começou a transformar a natureza e o ambiente ao seu redor, desde o momento em

que começou a fazer utensílios e ferramentas. Portanto trabalho é o esforço humano

dotado de um propósito e que envolve a transformação da natureza através do

dispêndio de capacidades físicas e mentais.

Em virtude disso, o trabalho é uma atividade que não foi criada para ser

exercida por crianças e adolescentes abaixo de 14 anos. Nessa faixa de idade eles

devem estar freqüentando a sala de aula e se preparando para futuramente, ocupar

uma vaga no mercado de trabalho. Quando uma criança ou adolescente trabalha

para se manter ou ajudar sua família financeiramente, está caracterizado o trabalho

infantil, tão combatido pelos governos e Organizações Não Governamentais (ONGs)

de diversas nações.

Nesta pesquisa foi abordado o trabalho infantil, um tema tão polêmico e cheio

de controvérsias porque afasta o aluno da escola. A ausência da criança na escola e

o trabalho infantil são fenômenos que andam juntos. A educação elementar não

existe nos países onde a incidência do trabalho infantil é muito grande e quando

existe, a qualidade do ensino é deficiente.

No Brasil atualmente existem milhões de crianças que trabalham e estão fora

das salas de aula. Existem também crianças que trabalham e estão freqüentando a

escola, embora precariamente. As primeiras evidências do trabalho infantil

ocorreram por ocasião da escravidão no Brasil que durou quatro séculos, quando os

filhos dos escravos faziam o mesmo trabalho que seus pais. Quando surgiu o

processo da industrialização, continuou a exploração do trabalho executado pela

criança, que perdura até os dias de hoje.

Page 13: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

12

Segundo dados da Pesquisa Nacional de Amostragem e Domicílio (PNAD)

(IBGE, 1995), crianças de 10 a 14 anos, de um total de 17,6 milhões, trabalham

atualmente no Brasil,. Este fato conduz a uma baixa escolaridade, principalmente

nos Estados da região Nordeste. O trabalho infantil não se explica por

unicausalidade. Fatores como a pobreza, a cultura, carência de ofertas de

escolaridade de qualidade e inexistência de políticas públicas perseverantes, se

interagem de tal maneira que em certas circunstâncias há predomínio de uns sobre

os outros.

Existe também o fato do trabalho infantil ser relativamente normal, quando se

trata de crianças trabalhando em emissoras de TV como cantores e atores mirins.

Nesse caso especificamente, o fator que leva essas crianças a trabalharem é a

cultura, pois os pais dessas crianças acham que não tem nada demais e que esse

trabalho que elas realizam não prejudica em nada o seu desenvolvimento. Ledo

engano. Seja qual for o tipo de trabalho, ele prejudica sim, o desenvolvimento

harmonioso da criança. Neste caso, as crianças deixaram de viver o período de sua

infância e assumiram responsabilidades de adultos.

Este estudo ficou estruturado em quatro capítulos. No primeiro capítulo

procurou-se trabalhar a educação e o trabalho infantil. Relacionou-se a justificativa e

os objetivos da pesquisa, as questões norteadoras e o local estudado. A intenção foi

verificar o que há de real na questão do trabalho infantil e o que realmente se

verifica nesta prática.

No segundo capítulo faz-se uma abordagem sobre a infância, a educação, e a

escola, traça-se considerações sobre a fase da infância, sobre a escola e seu

processo de emancipação. Como também o trabalho emancipador e o trabalho

infantil degradador, falando-se sobre o trabalho em geral e sobre o trabalho infantil,

sobre as suas causas e conseqüências, sobre o aluno trabalhador. Verifica-se como

o trabalho infantil interfere nos direitos sociais

.

Page 14: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

13

No capítulo três são enumerados os passos que foram seguidos na

elaboração da presente pesquisa: o local estudado, os sujeitos e instrumentos e a

coleta dos dados.

O capítulo quatro analisa e discute os resultados obtidos através da aplicação dos

questionários, fazendo-se um perfil dos alunos que trabalham e citando-se o seu

posicionamento diante do trabalho que realizam. Para finalizar, nas considerações

finais, são citadas as conclusões a que se chegou após analisar os dados contidos

nos questionários.

Page 15: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

14

CAPÍTULO I

CRIANÇA TRABALHANDO: CONSTRUÇÃO OU DEGRADAÇÃO?

A educação é um processo contínuo de construção do homem, é um

processo de aprendizagem que se estende por toda a vida. Educar é permitir ao

homem o desenvolvimento de sua capacidade física, intelectual e moral, visando à

sua melhor integração individual e social. Em termos gerais a educação é o

processo de atuação de uma comunidade sobre o desenvolvimento do indivíduo. E

essa atuação, geralmente, é exercida pela escola.

A escola é um lugar de aprendizagem onde são elaboradas as formas para

desenvolver atitudes e valores e adquirir competências. Ela desempenha um papel

importante no processo de formação de cidadãos, preparando-os para viverem em

uma sociedade da informação e do conhecimento. Ela prepara o aluno para

“futuramente”, disputar o mercado de trabalho e prover sua subsistência.

Atividade consciente e voluntária, pelos quais os homens exteriorizam no mundo fins destinados a modifica-los, de maneira a produzir valores ou bens social ou individualmente úteis e satisfazer suas necessidades (RUSS, 1994, p 297).

Segundo Russ, o trabalho pode ser compreendido como algo relevante para

adultos, e não para crianças que estão no período de formação e desenvolvimento.

Para que a criança se desenvolva harmonicamente, torna-se necessário que

ela se dedique exclusivamente à sua educação, à escola, à sua aprendizagem. Isso

significa que a criança não deve trabalhar, não deve desviar o foco de sua formação,

pois para isso existem os adultos. É a família que deve amparar a criança e não o

contrário.

O trabalho infantil, ou seja, o trabalho remunerado exercido por crianças e

adolescentes, abaixo da idade mínima legal permitida pela legislação de um país, é

anticonstitucional e anti-educacional. O trabalho realizado na faixa etária abaixo de

14 anos obstrui o desenvolvimento educacional das crianças, concorrendo para

Page 16: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

15

diminuir o tempo em que as crianças devem se dedicar às atividades escolares e

extra-escolares. É anticonstitucional por que no Brasil, o inciso XXXIII do Art. 7º da

Constituição Federal proíbe terminantemente a realização de qualquer trabalho aos

menores de 14 anos.

Atualmente, constata-se uma tolerância cada vez menor, por parte da

sociedade, com o trabalho infantil. A imprensa sempre divulga casos de abusos de

crianças que trabalham sem jornada definida ou remuneração adequada.

A atividade laboral exercida em idade muito jovem, impede ou dificulta o

acesso à educação formal. A evasão escolar e o trabalho infantil andam juntos. Nos

países em que a incidência do trabalho infantil é maior, a freqüência escolar é muito

baixa e precária. Geralmente o trabalho infantil possui jornada abusiva (muitas horas

seguidas) e remuneração muito baixa, em condições de risco elevado, deixando o

jovem trabalhador exausto e sem condições de assistir as aulas.

As conseqüências nefastas do trabalho (para ajudar no orçamento familiar)

realizado pelas crianças são: comprometimento do desempenho escolar por que

elas não dispõem de tempo para um estudo extra-escolar, tempo este que é

necessário para a preparação de seu conhecimento; o desequilíbrio de desempenho

entre as crianças que trabalham e as crianças que possuem tempo integral para

estudar, o que contribui para a evasão escolar; obstrução do tempo necessário à

aprendizagem, que é constituído pelas horas que a criança passa na escola e pelas

horas em que ela realiza suas tarefas extra-classe, necessárias ao aprimoramento

do seu conhecimento.

Além disso, a longo prazo, as crianças ao se tornarem adultos, vão entrar no

mercado de trabalho com pouca ou nenhuma qualificação, o que lhes privará de

obter uma renda que satisfaça as suas necessidades materiais. Diante desses fatos

é que se justificou a execução deste estudo.

Nas comunidades de Gameleira e Várzea de Cima, situadas na cidade de

Pindobaçu, existem crianças que trabalham como também crianças que estudam e

ao mesmo tempo trabalham para ajudar no orçamento de suas famílias. Então

Page 17: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

16

surgiram assim algumas inquietações: Porque essas crianças trabalham? Será que

elas conseguem conciliar o estudo e o trabalho? Como será o seu desempenho

escolar? Qual a sua postura diante disso? Estas são as questões geradoras do

presente trabalho monográfico.

A questão a ser testada é a de que o trabalho precoce não é necessário para

uma vida bem-sucedida. Ele não qualifica e, portanto, é inútil como mecanismo de

promoção social. O trabalho precoce exercido pelas crianças que estão

freqüentando a escola impede que elas realizem as tarefas adequadas à sua idade

como se apropriar dos conhecimentos, e de viver plenamente sua infância. Enfim, o

trabalho infantil não se justifica e não é solução para nada, ao contrário, é um

problema dos grandes.

Na execução deste trabalho, o objetivo geral foi verificar qual a visão que as

crianças trabalhadoras rurais têm sobre o trabalho. Com objetivos específicos visou-

se:

– Identificar qual a visão que as crianças têm sobre trabalho infantil;

– Identificar as causas que levam as crianças a trabalharem;

– Investigar se as crianças gostam de trabalhar.

Page 18: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

17

CAPÍTULO II

A INFÂNCIA, A EDUCAÇÃO, O TRABALHO EMANCIPADOR E O TRABALHO

INFANTIL

II.1 Considerações sobre a infância

A definição de infância difere de um país para outro. Em alguns países ela é

relacionada apenas à idade cronológica e em outros está relacionada aos fatores

sociais e culturais, além de se considerar a idade. Com relação ao trabalho infantil, a

faixa etária segue a legislação de cada país, ou seja, cada nação determina a partir

de que faixa etária é considerado trabalho infantil.

No Brasil, o período da vida humana que se inicia no nascimento e vai até aos

doze anos é chamado de infância. Nesse período acontece um acentuado

desenvolvimento físico, e psíquico e onde são firmadas as bases da personalidade.

É um período no qual a criança cresce fisicamente e matura-se psicologicamente.

Todas as crianças possuem algumas necessidades físico-psicológicas que precisam

ser cumpridas e atendidas para que a criança cresça normalmente. Entretanto:

Criança e adolescente foram, por muito tempo, segmentos ignorados enquanto pessoas. A história deste grupo aponta para uma trajetória marcada pela violência adultocêntricas, onde o abandono era prática aceita e o infanticídio era uma das formas usadas para suprimir da sociedade pessoas vistas como ‘inadequadas’ aos padrões sócio-econômicos, culturais e morais da época (ÁRIES, 1981, p. 57).

As crianças, nos tempos antigos, eram abandonadas, eram sacrificadas e

oferecidas aos deuses para aplacar a sua ira. O infanticídio era um procedimento

normal em algumas sociedades medievais. Em Esparta e em Roma, as crianças

deficientes eram eliminadas; na Idade Média, elas eram abandonadas como

estratégia de controle do direito à herança; outras eram doadas aos mosteiros para

evitar a fragmentação da propriedade e garantir a sucessão dinástica (WINNICOTT,

1975).

Page 19: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

18

Áries (1981) salienta que o abandono de crianças contava com a

complacência das autoridades e até da Igreja que era conivente com essa situação.

As formas de violência praticadas contra as crianças eram perversas pois elas

podiam ser vendidas como escravas, podiam ser usadas na mendicância (sendo

inclusive mutiladas para despertar maior piedade) ou então entregues a mosteiros.

Nas sociedades ocidentais, as crianças nos séculos VI, VII, eram frequentemente

vítima de práticas de infanticídio e abandono. A primeira lei que proibia o infanticídio

data de 374 d.C.

Os gregos diziam que a infância era um período fantástico para o aprendizado

e que era uma fase privilegiada da vida humana. No período da Idade Média não há

um conceito exato de adulto e muito menos de criança e a infância se estendia

apenas até os sete anos. Nesta época não existia o mundo da infância, as crianças

freqüentavam festas em que homens e mulheres alcoolizados se comportavam

vulgarmente, sem pudor na frente dos menores. A criança, nesse período era

invisível (ÁRIES, 1981).

A idéia de infância, afirmam Porto e Huzak (2005), foi concretizada a partir da

invenção da imprensa por Gutemberg, em meados do século XV. Por volta do

século XVIII foram criados dois conceitos sobre a infância. Em um deles, a criança

era vista como uma “folha em branco” a ser preenchida a caminho da maturidade.

Tudo se constituía num processo de desenvolvimento do aprendizado, nada

importando o biológico. O outro conceito dizia que a criança era importante em si

mesma, um cidadão em potencial.

No final do século XIX, estabelece-se uma discussão que fundamenta até os

dias de hoje os debates sobre a infância. Defendia-se que a criança não era uma

tabula rasa, devendo-se levar em conta as exigências feitas pela sua natureza, pois

do contrário poderiam ocorrer disfunções de sua personalidade. A partir disso ela

passou a ser entendida como possuidora de suas próprias regras de

desenvolvimento, sua própria natureza, e que estas características próprias,

inerentes, inalienáveis não devem ser reprimidas com o risco de não se alcançar

uma maturidade plena e adulta (PORTO e HUZAK, 2005).

Page 20: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

19

Portanto, desde os tempos remotos e até no século XVI, essa fase de vida

não era reconhecida como infância e a criança era vista como um pequeno adulto,

convivendo desde cedo com o trabalho e as preocupações comuns aos adultos.

Somente a partir do século XVII a criança passou a ser olhada como criança. Nessa

época os poderes públicos e a Igreja passaram a combater o infanticídio.

Atualmente, é uma fase reconhecida por todos e inclusive já tem até uma educação

personalizada. Esse reconhecimento ocorreu no século XIX que foi chamado de “o

século da criança” na Europa. No século XX surgiu a declaração dos direitos da

criança (1959) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), afirma Heywood

(2004).

A infância é ao mesmo tempo, “uma fase de crescimento e preparação para

assumir a autonomia futura, e uma fase de vida em si mesma plena, quando temos

diante de nós, o humano ‘sob forma’ infantil”. (WINNICOTT, 1975, p. 13). É um

período da vida em que o ser humano não precisa ainda produzir sua sobrevivência,

é um tempo útil de preparação para a vida produtiva.

Essa fase da vida do ser humano é mais longa e incomparavelmente mais

complexa que a dos animais. É o tempo em que a criança deve ser introduzida na

riqueza da cultura humana, reproduzindo para si qualidades especificamente

humanas.

Nesse período a criança já vive uma atividade intensa de formação de funções psíquicas, capacidades e habilidades que não são visíveis a olhos que entendem o desenvolvimento dessas funções e qualidades humanas como sendo naturalmente dado. Com isso, esse período não pode ser encurtado ou obstaculizado pela antecipação de tarefas para cuja realização justamente se formam as bases nessa idade (SCHWARTZMAN, 2001, p. 16)

Segundo Schwartzman (2001, p. 18) uma das características qualitativas do

desenvolvimento infantil “envolve a distinção de dois planos de desenvolvimento,

estreitamente vinculados, mas não idênticos e freqüentemente confundidos,

constituídos pelo desenvolvimento funcional e pelo desenvolvimento geral ou

evolutivo”. O desenvolvimento funcional acontece com a assimilação dos

conhecimentos que acarretam mudanças pontuais que não levam a transformações

significativas no desenvolvimento geral da personalidade.

Page 21: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

20

O segundo plano de desenvolvimento (o desenvolvimento geral ou Evolutivo)

se refere à reestruturação do sistema de relações da criança com as demais

pessoas e à passagem a novos níveis de atividade, permitindo a formação de novos

níveis de compreensão da realidade e acarretando transformações significativas na

personalidade da criança, afirma Rizzini (1999).

De acordo com Javeau (2005, p. 385) A infância deve ser considerada “uma

população com pleno direito (científico), com seus traços culturais, seus ritos, suas

linguagens, suas ‘imagens-ações’, com suas estruturas e seus modelos de ações”.

Para Piaget (1982) a infância está dividida em três períodos: o período

sensório-motor que começa no nascimento e chega até aos 24 meses de idade, o

período pré-operacional de 2 a 7 anos e o período das operações concretas de 7 a

12 anos.

No período sensório-motor acontece a formação dos esquemas que

permitirão organização inicial dos estímulos ambientais, Uma das funções da

inteligência será, portanto, nesta fase, a diferenciação entre os objetos externos e o

próprio corpo, pois nele irá ocorrer a organização psicológicas básica em todos os

aspectos (perceptivo, motor, intelectual, afetivo, social ).

No período pré-operacional ocorre o desenvolvimento da linguagem, mas

existe a ausência do pensamento conceitual. O período das operações concretas é

marcado por grandes aquisições intelectuais, e a criança tem um conhecimento real,

correto e adequado de objetos e situações da realidade externa. As ações físicas

passam a ser internalizadas, passam a ocorrer mentalmente.

Uma fase influencia as demais fases e por isso, tudo o que acontece na

infância pode alterar o comportamento do adulto. Toda e qualquer experiência vivida

na infância influencia a estrutura nervosa e fica guardada na memória. Cada período

de vida pode ser um aperfeiçoamento ou não, do período anterior e uma preparação

para o posterior. Então, tudo o que acontece na infância irá repercutir, positiva ou

negativamente, na vida adulta (GHIRALDELLI, 1997).

Page 22: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

21

Na infância verifica-se a necessidade que a criança sente em brincar e esse

ato é indispensável à saúde física, emocional e intelectual da criança. A brincadeira

contribui para tornar um adulto eficiente e equilibrado. Ao brincar, a criança

descobre, aprende, cria e adquire habilidades, além de ter estimulada a sua

curiosidade, autonomia e autoconfiança. As brincadeiras infantis desenvolvem a

linguagem, o pensamento e a atenção.

A qualidade de oportunidades que estão sendo oferecidas à criança através de brincadeiras e brinquedos garante que suas potencialidades e sua afetividade se harmonizem. As situações problemas contidas na manipulação dos jogos e brincadeiras fazem a criança crescer através da procura de soluções e de alternativas. O desempenho psicomotor da criança enquanto brinca alcança níveis que só mesmo a motivação intrínseca consegue. Ao mesmo tempo favorece a concentração, a atenção, o engajamento e a imaginação. Como conseqüência a criança fica mais calma, relaxada e aprende a pensar, estimulando sua inteligência (CORAZZA, 2002, p. 36).

Além disso, o ato de brincar contribui para o processo de socialização das

crianças, fazendo com que elas realizem atividades coletivas, influenciando

positivamente a aprendizagem e a aquisição de novos conhecimentos. Por todos

esses motivos é importante que a criança tenha respeitado o direito de viver a sua

infância, dedicando todo seu tempo para aprender novos conhecimentos. É

necessário que ela brinque, estude e viva como criança. Quando o círculo da

infância é rompido, surgem conseqüências desastrosas para o desenvolvimento da

criança. O que ocorre na infância vai refletir na vida adulta, ressalta Agambem

(2005)

Segundo Postman (1999) a criança é sempre vista como dependente do

adulto, livre ainda das implicações trazidas pelo mundo do trabalho, por isso mesmo,

é tratada como ser incompleto que precisa ser educado sob a lógica do sistema

econômico/cultural. Entretanto, em virtude de contextos familiares diferenciados

como pais que trabalham fora, pais separados, escolas de tempo integral,

conturbadas relações entre escola e família, escassez de passeios ou

acompanhamento a programas de adulto, longos períodos em frente à TV, as

crianças têm sido compelidas a assumirem responsabilidades sobre si mesmas.

Page 23: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

22

Agambem (1999) também enfatiza que a criança atualmente, é impelida a um

precoce amadurecimento. As brincadeiras de rua e os brinquedos manuais já não

estão mais disponíveis para ela. Até no vestuário percebe-se a pressa em adultizar

uma criança, porque as crianças são vestidas com roupas sensuais, salto alto, usam

maquiagem e acessórios exagerados. Tudo isso leva a crer que a concepção de

infância dos dias atuais, apesar de tudo o que já foi feito, é semelhante à da Idade

Média, quando a criança era olhada como um adulto em miniatura. É importante

então que a escola lute contra a adultização da criança, para que ela usufrua o

período da infância.

II.2 A escola e seu processo de emancipação

Acredita-se, afirma Romanelli (1997), que a escola surgiu em Atenas no ano

de 600 a.C. Nessa época existiam os mestres e o pedagogo, e este era um escravo

cujo trabalho era conduzir o aluno para a vida e para o saber.

A educação durante o Império Romano, era comunitária e os reis aravam a terra junto com os seus servos, os filhos eram educados pela mãe até os sete anos e depois passavam a ser responsabilidade dos pais. Com o enriquecimento da nobreza, as terras foram e o nobre passou a se preocupar com as regras dos impérios, dividindo a educação em classes sociais. O Mestre escola vendia a educação como se fosse mercadoria em suas lojas de ensino dentro de mercados (ROMANELLI, 1997, p. 47).

Em Roma, afirma Freitas (2003), o ensino primário surgiu no Século V a.C., o

ensino secundário apareceu em meados do século III a. C. e o ensino superior por

volta do Século I a.C. A primeira escola surgiu em Roma no século VI d.C. Com a

criação da escola surgiram as hierarquias sociais e a educação tornou-se um ensino

que inventa a pedagogia, transformando “todos” em educador. O saber era

transmitido desigualmente, promovendo a diferença.

No Brasil, a escola surgiu com a vinda da Companhia de Jesus ao Brasil em

1549, quando os jesuítas começaram a colonização e evangelização dos índios.

Quinze dias depois da chegada desses religiosos, já funcionava uma escola que

ensinava a ler e escrever. Inicialmente, eles ministraram a educação elementar para

a população índia e branca em geral (salvo as mulheres), educação média para os

Page 24: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

23

homens de classe dominante, parte da qual continuou nos colégios preparando-se

para o ingresso na classe sacerdotal, e educação superior religiosa só para esta

última. As escolas nessa época preocupavam-se apenas em alfabetizar o aluno, ou

seja, em ensinar a ler e escrever corretamente. (ROMANELLI, 1997, p. 35).

O espaço escolar é um ambiente no qual se desenrolam as diversas relações

entre alunos, professores e equipe técnica. Ele foi criado para ensinar conteúdos e

dotar os alunos de habilidades necessárias à sua participação na sociedade em que

vive. Conduz o aluno na compreensão da sua realidade, contribuindo para a sua

transformação. Assim, todos os alunos têm direito a formação escolar e a realizar

seus projetos.

A escola deve ser um espaço privilegiado, rico em recursos que promova a

aprendizagem, num ambiente onde os alunos possam construir os seus

conhecimentos segundo os estilos individuais de aprendizagem que os caracteriza.

Cabe a ela dotar o aluno de capacidades que permitam no seu futuro profissional

aprender qualquer assunto que lhe interesse.

Ela deve prover os indivíduos "não só, nem principalmente, de

conhecimentos, idéias, habilidades e capacidades formais, mas também, de

disposições, atitudes, interesses e pautas de comportamento" (SACRISTÁN &

GOMÉZ, 2000, p. 36). Além disso, deve priorizar a socialização do aluno,

preparando-o para se incorporar no mundo do trabalho e na vida pública.

Para Sacristán e Gómez (2000) a escola possui diversas funções como:

função reprodutora, educativa, compensatória e transformadora. A função

reprodutora é a socialização do aluno, a função educativa é a inserção de

conhecimentos, a função compensatória é neutralizar as desigualdades e a função

transformadora é a reconstrução de conhecimentos, atitudes e conduta dos alunos.

Através da escola o indivíduo se emancipa, ao promover mudanças no seu interior e

na sociedade em que vive contribuindo para a transformação social e se

capacitando para o trabalho.

Page 25: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

24

II.3 O trabalho emancipador e o trabalho infantil degradador

Desde o início dos tempos os homens vêm trabalhando, cada qual em suas

habilidades, compromissos ou propensões. Do homem da caverna até os dias

atuais, eles lutam pela sua sobrevivência física e propagação da espécie, pela

dignidade e melhores condições de vida.

II.4 O trabalho emancipando o homem

O ato de trabalhar é tão antigo quanto o próprio homem. Cipola (2001, p. 18)

refere que o “segundo texto grego mais antigo, cerca de cem anos mais novo que os

poemas épicos de Homero, é um poema de Hesíodo (800 a.C.), intitulado ‘Os

Trabalhos e os Dias’, que canta o trabalho de um agricultor”. Nos tempos antigos o

trabalho era uma atividade própria dos escravos e tanto as autoridades como as

pessoas de bem não deviam trabalhar.

No começo dos tempos, o trabalho era a luta constante para sobreviver (acepção bíblica). A necessidade de comer de se abrigar, etc. era que determinava a necessidade de trabalhar. O avanço da agricultura, de seus instrumentos e ferramentas trouxe progressos ao trabalho. O advento do arado representou uma das primeiras revoluções no mundo do trabalho. Mais tarde, a Revolução Industrial viria a afetar também não só o valor e as formas de trabalho, como sua organização e até o aparecimento de políticas sociais (RIZZINI, 1999, p. 44).

De acordo com Ariés (1981) nos tempos primitivos, na Babilônia, Egito, Israel,

e outros países, havia o trabalho escravo e o trabalho livre executado por artesãos.

Existiam o escravizador e o escravo. As sociedades escravistas dos tempos antigos

foram a egípcia, a grega e a romana. Nesse tempo, todas as atividades eram

realizadas por escravos. Havia também os artesãos e estes não tinham patrão,

trabalhavam por conta própria. Na Idade Média o trabalho era realizado pelo servo,

que era um pouco mais livre que os escravos. O servo podia sair das terras do seu

senhor e ir para onde quisesse desde que não tivesse dívidas a pagar. Na servidão,

o servo não trabalhava para receber uma remuneração, mas para ter o direito de

morar nas terras do seu senhor.

Page 26: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

25

Com o advento da modernidade, acabaram a escravidão e a servidão e todos

precisaram trabalhar para sobreviver. Aliás, o trabalho está intimamente ligado à

essência do homem, ele não é apenas um instrumento gerador de renda, mas, um

ato necessário à realização do homem. O trabalho é um fator da organização

econômica, política e social. Ele estrutura não somente a relação do homem com o

mundo, mas também as suas relações sociais.

A palavra “trabalho” origina-se do latim tripallium, o nome de um instrumento

com o qual se castigavam os escravos no tempo do Império Romano (ESTERCI,

1994). Essa palavra se refere a todas as atividades humanas, ou seja, todo ato

humano é trabalho. É trabalho a atividade realizada pela mulher que cuida da casa e

dos filhos, é trabalho a composição de um poema, é trabalho o que o operário faz

nas indústrias, é trabalho o processo de ensino realizado pelos professores. Ele está

intimamente associado à existência humana por que além de satisfazer as

necessidades de sobrevivência do homem, contribui para a “estruturação psíquica, a

transformação do ambiente em que ele vive e também a sua realização pessoal”,

afirma Furtado (1995). Logo:

A essência do homem é a sua atividade produtiva. O homem, entre todos os seres, é o que foi destinado a trabalhar e arrancar da natureza para que ele possa existir, o que tem de produzir suas condições materiais de vida, enquanto os animais reproduzem sua existência de acordo com a natureza. Se, portanto, a sua essência está nessa capacidade transformadora, a história será a história dos seres humanos reais, portanto, as representações, os conceitos, as idéias são produtos da atividade humana, de acordo com o modo como é organizada a atividade produtiva (FURTADO, 1995, p. 46).

Sempre foi dito que o trabalho dignifica o homem, é essencial ao seu

aprimoramento, crescimento, aprendizagem, subsistência. É uma lei da natureza,

por isso mesmo que constitui uma necessidade. O espírito trabalha, assim como o

corpo, por isso o trabalho não se constitui apenas em ocupações materiais, as

atividades podem ser também intelectuais ou morais (SENTO-SÉ, 2000).

Acredita-se que o ato de trabalhar aperfeiçoa a inteligência humana. Como

afirma Esterci (1994, p. 48) "Sem o trabalho, o homem permanece na sua infância

Page 27: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

26

intelectual; ele proporciona a alimentação, a segurança, o bem-estar”. As

necessidades básicas de qualquer cidadão provêm do trabalho digno, e todos têm

direito a ele. Ele é uma conseqüência da natureza corpórea do homem. O trabalho é

honra, é dignidade, é alavanca que impulsiona o progresso e engrandece o espírito

humano.

Geralmente, afirma Furtado (1995), o trabalho é visto apenas como uma

maneira de se ganhar dinheiro e adquirir conforto e poder, por que o dinheiro traz

como conseqüência o poder. Quando se pensa dessa forma, o trabalho se torna um

fardo, uma tortura, acarretando desequilíbrios físicos e mentais. Essa é uma visão

materialista do ato de trabalhar, na qual ele funciona apenas como um meio de

subsistência biológica. Entretanto, ele possui além dessa, uma outra função que é a

da valorização e aperfeiçoamento pessoal, por que através dele o homem

desenvolve sua capacidade de pensar, de sentir, de crescer interiormente.

Ele propicia um sentido para a vida para a vida humana, dignifica-a, mas, o

homem não deve idolatrá-lo procurando nele o único sentido de sua vida, por que a

partir daí, ele se tornará uma escravidão e ao invés de dignificá-lo passa a ultrajá-lo.

Toda atividade deve ser sempre organizada e desenvolvida no pleno respeito da

dignidade humana e ao serviço do bem comum. Portanto:

O homem trabalha porque precisa prover a sua subsistência. Mas, ao mesmo tempo, ele trabalha para ser digno, para ser valorizado como pessoa. Quando o homem não trabalha está destruindo sua esperança e ignorando seu talento e colocando em risco o seu futuro (FURTADO, 1995, p. 58).

Alguns economistas dizem que a fonte de toda riqueza é o trabalho. Porém,

ele é mais do que isso: é a realização de toda vida humana, é sinal de caráter,

orgulho e satisfação. É a satisfação do dever cumprido, é a manifestação da

dignidade humana.

Martins (1993, p. 77) salienta que para Karl Marx “o trabalho é uma

manifestação, a única manifestação da liberdade humana, da capacidade humana

de criar a própria forma de existência específica”. Continua afirmando Marx que o

Page 28: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

27

trabalho desperta as forças da natureza e que quanto mais o homem se apodera

dessas forças naturais, mais a natureza contribui com os interesses humanos.

II.4.1 O trabalho infantil

O termo criança relaciona-se a brincadeiras e aprendizagem, jamais a

trabalho. O trabalho infantil refere-se ao conjunto de atividades realizadas por

crianças para possibilitar sua sobrevivência ou a de outros, estejam ou não

recebendo remuneração. Ele é exercido por qualquer pessoa (criança ou

adolescente) abaixo de 16 anos de idade e impede que ela aproveite sua infância,

que freqüente a escola, que se desenvolva e tenha boa educação, como também

causa sérios problemas físicos ou psicológicos (CAVALIERI, 2000).

Qualquer atividade realizada por crianças abaixo de 16 anos com o objetivo

de usufruir renda, é considerada como trabalho infantil. Ele afasta as crianças das

brincadeiras e da vida escolar fazendo com que ela amadureça precocemente. Está

presente no cotidiano das menos e das mais favorecidas economicamente, de forma

diferenciada. As crianças menos favorecidas trabalham em atividades fisicamente

penosas ao passo que as mais favorecidas trabalham atuando na televisão, nas

passarelas, e até mesmo junto aos pais ajudando-os em seus negócios. Entretanto

estas duas maneiras de trabalhar prejudicam as crianças, impedindo-as de se

desenvolverem.

Será que toda atividade realizada por uma criança é considerada como

trabalho? Não. O trabalho infantil que é condenado pela Constituição Federal

Brasileira é o que corresponde a atividades produtivas, remuneradas ou não, com o

intuito de buscar renda para se manter. Se a criança, em sua casa, arruma seus

brinquedos, ajuda a mãe nas tarefas domésticas, ajuda o pai em tarefas simples

como lhe levar a marmita no trabalho, mas que vai à escola regularmente, não está

exercendo o trabalho infantil. Entretanto, se ela realiza essas atividades diariamente

nas casas dos outros, durante o dia todo, e se essas atividades produtivas se

sobrepõem às educativas, está caracterizado o trabalho infantil.

Porto e Huzak (2005) enfatizam que é considerado trabalho infantil quando a

jornada se estende por todo o dia, não dando à criança a oportunidade de freqüentar

Page 29: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

28

regularmente a escola, colocando-a muitas vezes em contato com produtos

químicos, equipamentos perigosos e outros perigos de rua. São trabalhadores

infantis aqueles que vivem nas ruas vendendo bugigangas, engraxando sapatos,

catando lixo nos lixões, lavando carros e exercendo outras atividades. Essas

crianças não terão chances de estudar e serão certamente adultos desempregados

ou subempregados.

No Brasil, afirma Schwartzman (2001), a Constituição determina que até os

16 anos incompletos, crianças e adolescentes estão proibidos de trabalhar, exceto o

trabalho exercido como aprendiz, permitido a partir dos 14 anos, nas atividades que

apresentem os requisitos legais para a aprendizagem profissional. Mas nem sempre

foi assim por que:

Por volta do século XIII, encontramos também os primórdios da profissionalização de crianças que entre oito e dez anos de idade eram entregues aos mestres artesãos e às meninas eram ensinados ofícios que as tornariam boas donas de casa (ARIÉS, 1981, p. 62).

No século XVI, as caravelas portuguesas utilizavam crianças para serem

grumetes e pajens nos navios. Outro dado terrível é que 4% dos negros trazidos

como escravos eram crianças para trabalhar nas lavouras, para serem carregadores,

mensageiros, pajens e saco de pancadas das crianças brancas. (ARIÉS, 1981).

França, Bélgica e Estados Unidos apresentavam altas taxas de crianças

trabalhando por volta de 1830 a 1840. Em meados de 1861 um censo realizado na

Inglaterra mostrou que quase 37% dos meninos e 21% das meninas de 10 a 14

anos trabalhavam nas indústrias têxteis e nas minas de carvão (DEL PRIORI, 2000).

Nas fábricas têxteis de São Paulo, nos anos de 1901 a 1905, 23% dos operários

eram crianças.

O trabalho infantil, reconhecidamente ilegal até os 15 anos pela Constituição

Brasileira, “acompanha a própria trajetória do país enquanto colônia, quando

crianças descendentes de negros e índios eram obrigadas a incrementar a mão-de-

obra das fazendas” (DEL PRIORI, 2000).

Page 30: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

29

No Brasil, as primeiras menções ao trabalhão realizado por crianças se

referem à época da escravidão, quando os filhos dos escravos acompanhavam seus

pais nas diversas atividades que exigiam esforços muito superiores às suas

possibilidades físicas. No final do século XIX, com o surgimento da industrialização,

15% dos empregados na indústria eram formados por crianças e adolescentes. Um

quarto da mão-de-obra empregada no setor têxtil de São Paulo eram crianças. No

século XX, na capital paulista, 40% dos trabalhadores do setor têxtil eram crianças e

jovens (OIT, 2003).

Ainda segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT, 2003), 70%

das atividades infantis são desempenhadas na agricultura, pesca e caça; 13% no

comércio atacado e varejo; 10% nos serviços domésticos; 4% nos serviços de

transportes, armazenamentos e comunicação, e os 3% restantes são atribuídos à

construção e a mineração (Figura 1).

70,00%

13,00%

10,00%4,00% 3,00%

Agricultura, Caça e Pesca Atacado e varejo

Serviços domésticos Transportes, armazenamento e comunicação

Construção e Mineração

Figura 1. Distribuição por setor do trabalho infantil.

Fonte: OIT (2003)

Atualmente existem crianças trabalhando como engraxates, o vendedor de

gibis e de beijus e até como vendedores de drogas. Além dessas atividades existem

crianças envolvidas com o tráfico de drogas, delitos e prostituição, mas é difícil

precisar quantas nisso por que são atividades clandestinas.

Conforme relatos de Martins (1979), a mão-de-obra infantil aumentou depois

da Revolução Industrial. Segundo ele, para trabalhar com máquinas não se

Page 31: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

30

necessita de força muscular, o que permite a contratação de mulheres e crianças.

Logo:

[...] de poderoso meio de substituir trabalho e trabalhadores, a maquinaria transformou-se imediatamente em meio de aumentar o número de assalariados, colocando todos os membros da família do trabalhador, sem distinção do sexo e de idade, sob o domínio direto do capital... (CALVEZ, 1966, p. 78).

Entretanto Kassouf (1999) garante que com o crescimento da livre indústria e

das empresas no século XVII, as crianças já eram submetidas a longas jornadas de

trabalho, bem antes da revolução Industrial.

Dados da Organização das Nações Unidas (ONU) demonstram que

atualmente cerca de 200 milhões de crianças trabalham em todo o mundo, sendo

que 126 milhões realizam atividades perigosas (CORAZZA, 2002). No século XXI

muitas crianças têm que trabalhar para sobreviver e isso é degradante para qualquer

país, por que a criança deveria ter tempo livre para brincar e investir na sua

formação. A globalização, afirma Pires (1988), é vista por muitos como um incentivo

ao trabalho infantil, com a imagem de multinacionais contratando crianças para suas

fábricas. Pires (1988, p. 13) afirma: “Os pais não colocam seus filhos para trabalhar

por maldade ou indiferença, mas somente por necessidade”.

Este fato é contrário à Lei Federal nº. 8.069/90 de 23 de julho de 1990, afirma

Cavalieri (2000), que garante às crianças o direito à educação, a brincadeiras e à

proteção, além do convívio familiar e comunitário. O Estado, a família e a sociedade

civil são responsáveis por garantir esses direitos, prega a Constituição Brasileira:

Art. 4. É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder

Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à

vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização

e à convivência familiar e comunitária.

Art. 60. É proibido qualquer trabalho a menor de catorze anos de idade, salvo

na condição de aprendiz.

Page 32: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

31

A legislação de cada país é que determina até que idade o indivíduo é considerado criança. Na Inglaterra a idade mínima é de 13 anos, na Bélgica e na maioria dos países da América Latina é de14 e em países como Suíça, Alemanha, Itália e Chile a idade mínima é 15 anos (ANTUNES, 2003, p. 88).

Nos países subdesenvolvidos onde muitas famílias ficam à margem da

concentração de renda nacional, onde impera a pobreza e os problemas

econômicos, os índices de crianças que trabalham é muito alto. Nesse caso, os pais

suprem suas necessidades básicas mediante a utilização da mão de obra infantil.

Então, percebe-se que o maior motivo que faz com que a criança precise trabalhar é

a pobreza, conseqüência do desemprego. Outras causas mais freqüentes que

tentam explicar a alocação da criança para o trabalho é a escolaridade dos pais, a

idade em que os pais começaram a trabalhar e o local de residência (CAVALIERI,

2000).

O desemprego conduz à falta de condição para suprir as necessidades

básicas de uma família (alimentação, moradia) e em virtude disso, muitas famílias se

vêem obrigadas a mandar seus filhos para as ruas a fim de fazerem bicos ou

mendigar, com o intuito de ajudar na sua sobrevivência. Acontece que o trabalho

realizado por crianças, interfere na freqüência e aproveitamento da escola.

Estudos realizados por Cavalieri (2000) indicam que há diferenças entre as

taxas de escolarização das crianças e adolescentes ocupados e dos não-ocupados.

Este estudo estimou que o percentual de crianças e adolescentes de 5 a 15 anos de

idade, ocupados, sem instrução ou com menos de um ano de estudo (28,0%) era

superior ao dos não-ocupados (15,7%). O percentual dos ocupados com 8 a 10 anos

de estudo (10,0%) era inferior ao dos não-ocupados (14,2%).

A correlação entre trabalho infantil e a freqüência escolar é bastante

significativa, pois a quantidade de crianças que não estudam e trabalham é

praticamente o dobro das que apenas estudam. Martins (1993) salienta que o

trabalho infantil marginaliza a criança porque ela não pode viver sua infância

(brincando e aprendendo) e nem é preparada para se tornar uma cidadã plena, ou

seja, ela perde sua infância e a oportunidade de uma boa educação.

Page 33: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

32

Ghiraldelli (1997) informa que dados do CEPAL relacionam que

aproximadamente uma em cada 10 crianças entre 10 e 14 anos, trabalha no Brasil.

Essas crianças têm menor oportunidade de freqüentar a escola regularmente e,

mesmo quando conseguem freqüentar não tem tempo para estudar, o que aumenta

a repetência e a evasão. Outra conseqüência do trabalho infantil é a baixa

escolaridade que limita as oportunidades de emprego qualificado e sem qualificação

a remuneração é mais baixa.

O que acontece então quando os pais colocam suas crianças para trabalhar?

Há uma redução no rendimento escolar e prováveis problemas de saúde em uma

fase adulta da vida. Ocorre um aumento imediato de renda na família, mas, em

contrapartida, haverá a perda de uma melhor remuneração futura porque as

crianças não puderam estudar e nem se capacitar a melhores empregos. Assim,

continuará o ciclo repetitivo de pobreza já experimentado pelos pais. Isto acontece

em todo o mundo como enfatiza Freitas (2003, p. 112):

Na África os conhecidos como "Mercadores de homens" compram crianças por um dinheiro miserável e as obrigam a trabalhar em plantações de algodão e cacau. As meninas são humilhadas, sofrem abuso e muitas vezes machucadas se algo não está de acordo com as famílias dos ricos.

De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios

(IBGE, 2004) 5,3 milhões de crianças na faixa de 5 a 16 anos trabalham em todo o

país, sendo que destes, 75% estavam na agricultura. No Brasil, na região do semi-

árido, no período do plantio e colheita, milhares de crianças brasileiras que residem

em zonas rurais são afastadas da escola para trabalharem na lavoura.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2004)

é na área rural que se concentra o maior uso da mão-de-obra infantil. Conforme a

PNAD (2006)1 53% dos meninos e 46,5% das meninas, de 05 a 15 anos, que

trabalham no Brasil, vivem no meio rural e trabalham na área agrícola. O maior

número de crianças trabalhadoras do Brasil, encontra-se no estado da Bahia. Para

se ter uma idéia 9,13% das crianças baianas trabalha para sobreviver, enquanto que

a média no Brasil se encontra em 6,33% (IBGE, 2004)

Page 34: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

33

No mundo inteiro cerca de 350 milhões de crianças, na faixa etária de 5 a 17

anos, trabalham para prover a sua subsistência, informam a Organização

Internacional do Trabalho (OIT) e o Programa Internacional de Eliminação do

Trabalho Infantil (IPEC, 2005). A maior parte dessas crianças vive na Ásia, África e

Oriente Médio.

II.4.2 Fatores que ocasionam o trabalho infantil

Vários estudos foram realizados por economistas, afirma Kassouf (2001),

para entender porque as crianças precisam trabalhar. Eles deduziram que os fatores

predisponentes à realização do trabalho infantil são: a pobreza, cultura, grau de

escolaridade dos pais das crianças, tamanho da família, local de residência, idade

em que os pais começaram a trabalhar, sexo do responsável pela família e a renda

da família (KASSOUF, 2001).

A pobreza é citada como um dos fatores mais importantes porque nas nações

ricas quase inexiste o trabalho infantil. Vários estudos mostram que o aumento da

renda familiar reduz a probabilidade de a criança trabalhar e aumenta a de estudar.

A cultura, ou seja, o meio social ao qual os pais pertencem, determina a maneira de

pensar, pois alguns pais mesmo tendo boa situação financeira acham normal seus

filhos trabalharem em novelas, em programas infantis na TV. Quanto maior a

escolaridade dos pais menor é a taxa das crianças que trabalham, por que eles

entendem que o trabalho atrapalha a freqüência escolar (KASSOUF, 2001).

Quanto à estrutura familiar, quanto maior é o número de filhos, mais

necessidade os pais têm de colocá-los para trabalhar ainda crianças. Isso acontece

nas famílias pobres. Com relação ao sexo do responsável pela família, vê-se que

crianças de família chefiada por uma mulher têm maior probabilidade de trabalhar.

Em relação ao local de residência, as crianças da zona rural trabalham mais do que

as crianças da zona urbana. Outro ponto determinante do trabalho infantil é a

entrada precoce dos pais no mercado de trabalho, isto é, pais que trabalharam

desde crianças, são mais propensos a colocar os filhos para trabalhar.

Page 35: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

34

II.4.3 Conseqüências do trabalho infantil

Os efeitos danosos do trabalho realizado por crianças se refletem sobre a

educação, o salário e a saúde. O trabalho exercido durante a infância impede a

aquisição de educação, conforme foi comprovado pela Pesquisa Nacional por

Amostra de Domicílio (PNAD, 2003). Nesta pesquisa ficou evidenciado que quanto

mais jovem a pessoa começa a trabalhar, menor é o seu salário na fase adulta. Isto

acontece por que o jovem não pode freqüentar a escola e não adquiriu

conhecimentos que o capacitasse a um melhor emprego (KASSOUF, 2001).

De acordo com os dados do Sistema Nacional de Avaliação da Educação

Básica (SAEB, 2003) em teste aplicado aos alunos de escolas públicas e privadas,

ficou comprovado que o trabalho infantil fora do domicilio da criança diminui

consideravelmente o desempenho escolar (cerca de 20%). Os alunos que

trabalhavam obtiveram menos pontos do que os que só estudavam. As atividades

realizadas pelas crianças para sobreviver provocam impactos sobre a performance

escolar e consequentemente, sobre seu futuro.

Em relação à saúde da criança, o trabalho infantil altera o estado de saúde

tanto na fase inicial da vida como na fase adulta. Para Martins (1993) existem

diferenças físicas, biológicas e anatômicas entre as crianças e os adultos; elas são

mais vulneráveis ao calor, produtos químicos e ao barulho, e podem, sofrer danos

irreversíveis em seu organismo. Além disso, os equipamentos dos locais de trabalho

não foram idealizados para crianças e podem acarretar fadiga e acidentes. Por

exemplo: uma criança que trabalha carregando peso sofre deformações em sua

coluna vertebral.

O trabalho precoce, seja qual for, prejudica o psicológico da criança, uma vez

que ela não vivencia a fase mais pura de sua vida: a infância! Ela não tem tempo

para brincar, para realizar todas as atividades que são peculiares a esse período de

vida. Por exemplo, o trabalho realizado em novelas retira da criança o seu tempo de

brincar; pode até não prejudicar sua freqüência às aulas, mas não lhe deixa tempo

para o lazer.

Page 36: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

35

O combate ao trabalho infantil é tão relevante que foi criado um dia para

promover a conscientização sobre sua ilegalidade: do dia 12 de junho é consagrado

ao Dia Mundial Contra o Trabalho Infantil (DMCTI). Em prol dessa luta também foi

criado no Brasil o Estatuto da Criança e do Adolescente que promoveu mudanças

significativas nas políticas públicas sobre os direitos da criança. Foram criados

também programas governamentais como o Bolsa-Escola e o Programa de

Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) implantado em 1996 (RIZZINI, 1999).

O objetivo do programa PETI é retirar crianças, na faixa etária de 7 a 14 anos,

do mercado de trabalho e conduzi-las à jornada escolar ampliada, na qual elas são

obrigadas a freqüentar as aulas e a participarem de atividades culturais e esportivas.

Além do PETI, várias organizações governamentais e não-governamentais têm

programas para crianças envolvidas no trabalho precoce, retirando-as e as

conduzindo para a escola. Após a segunda guerra mundial foi criada a Organização

Internacional do Trabalho pela Conferência da Paz, que também se engaja na luta

ao trabalho infantil (JAVEAU, 2005).

II.4.4 O aluno que trabalha

Para se falar do aluno que também trabalha, deve-se inicialmente, falar da

importância da educação e da escola em sua vida. Para Sacristán e Gómez (2000)

educação é um processo de atuação de uma comunidade sobre o desenvolvimento

do indivíduo a fim de que ele possa atuar em uma sociedade pronta para a busca da

aceitação dos objetivos coletivos. Para isso, deve-se considerar o homem no plano

físico e intelectual, consciente das suas possibilidades e limitações, e capaz de

compreender a realidade do mundo que o cerca.

Educação é o “processo de desenvolvimento da capacidade física, intelectual

e moral da criança e do ser humano em geral, visando à sua melhor integração

individual e social”, ressalta Calvez (1966, p. 88).

A Constituição Brasileira ressalta que a educação, é um direito de todos e

dever do Estado e da família, e será promovida e incentivada com a colaboração da

Page 37: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

36

sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o

exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

De acordo com Corazza (2002) educação é um processo, que ocorre

gradativamente (uma série de acontecimentos, uma somatória) de desenvolvimento

da capacidade física, intelectual e moral do ser humano. Por isso é importante que a

criança e o adolescente sejam educados, freqüentem a escola, para aconteça o seu

desenvolvimento físico e intelectual. Muitos educadores e organizações que

combatem o trabalho infantil são taxativos em afirmar que ele prejudica o

aproveitamento escolar da criança, além de sua capacidade de criar, tornando-as

adultos precoces.

Acredita-se que é o progressivo empobrecimento da classe trabalhadora,

onde se verifica a necessidade de incorporar mais membros da família no mercado

de trabalho. Quem mais sofre com essa situação é o aluno da escola pública. Mas, o

que acontece com esse aluno que precisa trabalhar ainda tão cedo? Ele chega à

escola, cansado e mal alimentado o que limita o seu potencial, pois tem menos

tempo ou quase nenhum para se preparar para as avaliações, para preparar suas

atividades extra-classe. Geralmente, ele dorme tarde, acorda cedo, alimenta-se mal,

trabalha mais de oito horas por dia e já chega à escola em precárias condições

físicas e intelectuais.

Devido a chegarem já cansados na sala de aula, os alunos que trabalham não

apresentam um aproveitamento ideal das aulas. Por isso Postman (1999) ressalta

que a criança e o adolescente devem ser considerados seres em formação e como

tal, afastados do mercado de trabalho e direcionados para a escola. O lugar deles é

na escola e não na fábrica, na lavoura ou em qualquer tipo de atividade econômica

que prejudique psicológica e fisicamente o seu desenvolvimento (MARTINS, 1993).

Muitas pessoas acham que é melhor a criança trabalhar do que ficar nas ruas,

o que segundo estudos já realizados por Sento Sé (2000) não corresponde à

verdade por que seja na rua ou no trabalho precoce, a criança está sujeita a muitos

perigos em função de sua imaturidade.

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37

Nas ruas, crianças e adolescentes podem se envolver com exploração sexual, tráfico de drogas e outras mazelas que venham a comprometer seu desenvolvimento psico-social. No trabalho, dentre outros males, carregamento de peso e permanência em posturas viciosas provocam deformações, principalmente nos ossos longos e coluna vertebral, aliados à nutrição deficiente, os esforços excessivos também podem prejudicar a formação e o crescimento da musculatura (SENTO SÉ, 2000, p. 44).

Quando um trabalho é exercido por longos anos desde muito cedo, durante

muitas horas por dia, acaba prejudicando o desenvolvimento físico, psicológico,

intelectual e social das crianças. Um estudo realizado por Esterci (1994) demonstrou

que muitas crianças sentiam dores musculares por conta de postura, e sofriam

também com asma e danos psíquicos, em virtude do trabalho precoce. A

“representação de mundo das crianças vai se construindo na rua e não na escola,

longe do modelo de desenvolvimento instituído pela sociedade. Mais tarde, ela pode

estar reproduzindo às violações a que foram expostas precocemente”, explicou

Esterci (1994, p. 71).

Para Pires (1998) são três os motivos históricos que levam as crianças

brasileiras a serem exploradas no trabalho, “entre eles estão a necessidade de

contribuir na renda da família, as crenças que o trabalho é um aprendizado para o

futuro e que é melhor a criança trabalhar que ficar na rua ou não ter atividade”. O

que se percebe é que normalmente os trabalhadores infantis não são crianças que

vivem na rua, eles têm família, freqüentam a escola e pelo menos o pai, a mãe ou

irmãos mais velhos também trabalham.

Pires (1998) salienta que a “exposição da criança ao trabalho precoce

compromete o desenvolvimento biopsicossocial da criança e do adolescente”.

Estando ainda em formação, seus organismos estão predispostos aos agentes

agressivos presentes nos ambientes de trabalho, podendo adquirir sérias

debilidades, prejudicando o crescimento e desenvolvimento, comprometendo seu

futuro.

Page 39: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

38

CAPÍTULO III

METODOLOGIA

III.1 Tipo de pesquisa utilizada

Elegemos para essa pesquisa a abordagem qualitativa, por definir-se como

de relevância social por aproximar-nos de uma realidade, pois através da percepção

da complexidade é que nos questionamos e buscamos desvendar os significados do

trabalho infantil.

Esse tipo de pesquisa nos leva a uma melhor análise do objeto estudado, pois

Ludke (1986. apud BOGDAM e BIKELEN, 1982) diz que:

A pesquisa qualitativa ou naturalista envolve a obtenção de dados descritivos, obtidos no contato direto do pesquisador com a situação estudada, enfatiza mais o processo do que o produto e se preocupa em retratar a perspectiva dos participantes (p. 13).

Por meio da pesquisa qualitativa pode-se perceber, refletir, através do objeto

estudado, as expectativas, e os anseios através do contato direto com a realidade

dos sujeitos pesquisados, pois essa pesquisa caracteriza-se como de relevância

social através da aproximação da realidade a ser estudada, e Ludke ( 1985 ) apud

Bogdan e Biklen (1982 ) através das características básicas que configuram esse

tipo de pesquisa, afirmam que:

O interesse do pesquisador ao estudar um determinado problema é verificar

como ele se manifesta nas atividades, nos procedimentos e nas interações

cotidianas. (p.12)

III.2 Lócus da pesquisa

Este estudo foi realizado nas comunidades denominadas Fazenda Gameleira

e Fazenda Várzea de Cima, situadas no município de Pindobaçu, Bahia. O

município esta situado no centro norte baiano, mais especificamente no microrregião

Page 40: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

39

de senhor do Bonfim e faz fronteiras com os municípios de Campo Formoso, Antonio

Gonçalves, Mirangaba, Filadélfia e Saúde. O número de crianças pesquisadas foram

seis na Fazenda Gameleira, e cinco na Fazenda Várzea de Cima.

III.3 Sujeitos envolvidos

Inicialmente registrou-se 11 crianças sendo 06 meninos e 05 meninas, cuja

faixa etária variava de 10 a 15 anos. Em seguida, contatou-se com essas crianças

para fazer o convite para participar da pesquisa. Tomou-se então essa amostra de

11 alunos que estudam e trabalham para responderem ao questionário, no sentido

de apreender um pouco da realidade daqueles que vivem cotidianamente envolvidos

com a questão do trabalho e do estudo.

III.3.1 Instrumentos utilizados

A coleta de dados foi norteada por meio de questionário fechado onde se

buscou a definição do perfil dos sujeitos pesquisados e, entrevistas estruturadas que

foram analisadas após a interpretação das transcrições, onde procuramos através

dos questionamentos verificar como as crianças vêem o trabalho no seu cotidiano.

III.3.2 Questionário fechado

Marconi Lakatos (1996) define questionário como: “... um instrumento de

coleta de dados, constituído por uma série ordenada de perguntas que devem ser

respondidas por escrito e sem a presença do entrevistador” (p. 88).

Partindo desse pressuposto é que elegemos o questionário, pela necessidade

de levantar dados suficientes para traçar o perfil dos sujeitos pesquisados, buscando

delinear os sujeitos em seus aspectos peculiares.

III.3.3 Entrevista

Segundo Goode e Hatt (1968), mas de que outros instrumentos de pesquisa,

que em geral estabelecem uma relação hierárquica entre o pesquisador e o

Page 41: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

40

pesquisado, na entrevista a relação que se cria é de interação, havendo uma

atmosfera de influencia recíproca entre quem pergunta e responde.

A grande vantagem da entrevista sobre outras técnicas, é que ela permite a

captação imediata e corrente da informação desejada, praticamente com qualquer

tipo de informante e sobre os mais variados tópicos como pontua Goode e Hatt

(1968):

Como se realiza de maneira exclusiva, seja com indivíduos ou com grupos, a entrevista permite correções, esclarecimentos e adaptações que a tornem sobre maneira eficaz na obtenção das informações desejadas. Enquanto outros instrumentos têm seu destino selado no momento em que sai das mãos do pesquisador que os elaborou, a entrevista ganha vida ao se iniciar o dialogo entre o entrevistador e o entrevistado (Goode e Hatt).

Esse instrumento de pesquisa nos leva a uma interação mais próxima com os

sujeitos pesquisados, desvendando o objeto de estudo.

III.3.4 Coleta de dados

O trabalho de campo teve início através de visitas às Fazendas pesquisadas.

Foi realizado um levantamento inicial do número de crianças que trabalhavam e das

que estudavam e trabalhavam e em seguida, foi aplicado o questionário no período

de 15 a 30 de maio de 2008. Os dados obtidos foram analisados e discutidos no

capítulo “Análise dos Resultados Obtidos”.

Page 42: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

41

CAPÍTULO IV

ANÁLISE DOS RESULTADOS OBTIDOS

O trabalho infantil nas Fazendas Gameleira e Várzea de Cima, situadas em

Pindobaçu, Bahia, é uma realidade, como ficou comprovado nos dados obtidos

neste estudo. Portanto, neste capítulo serão abordados os resultados e verificadas

as suas conseqüências.

IV.1 Perfil dos alunos que participaram do estudo

Após leituras das transcrições do material, foi realizada uma análise do

conteúdo a partir de categorias definidas, como sexo, idade, série freqüentada, turno

em que as crianças trabalham, freqüência da escola, local de residência e filiação.

Com a codificação dessas unidades em gráficos, foi delineado um perfil das

crianças.

Presenciaram-se nas comunidades da Fazenda Gameleira e Várzea de Cima,

alunos com idade anticonstitucional para o trabalho, mas que estavam trabalhando;

dos 11 alunos que participaram da pesquisa, 45% se encontravam na faixa etária de

13 a 16 anos, 46% possuíam de 11 a 12 anos e os demais (9%) se situavam de 08 a

10 anos (Figura 01).

9,00%

46,00%

45,00%

De 5 a 10 anos De 11 a 12 anos De 13 a 16 anos

Figura 02. Faixa etária dos alunos que participaram da pesquisa

Fonte: Questionário fechado aplicado aos entrevistados

Page 43: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

42

O trabalho infanto-juvenil, que no Brasil abrange a faixa etária de 06 a 16

anos, faz com que a criança assuma responsabilidades de adulto, como a luta pela

própria sobrevivência e do grupo familiar, transformando-se em adulto quando ainda

está em formação. Ao se relacionar com o mundo do trabalho, passa a ser obrigada

a ter responsabilidades que não são próprias para a sua idade e que lhe

desoportuniza a garantia dos direitos elementares como escolarização, lazer,

esporte e enfim, de sua preparação para a vida adulta. Nessa faixa de idade, a

criança não deve pensar no trabalho como fonte de sobrevivência, não deve se

envolver com os problemas da fase adulta, ao contrário, deve lhe ser assegurada a

vivência de sua infância e puberdade, para que tenha um desenvolvimento

completo.

Entre os pesquisados, a maioria é de meninos, sem que haja, entretanto,

diferenças notáveis entre os sexos, pois 55% pertenciam ao sexo masculino e 45%

ao sexo feminino (Figura 02).

45,00%

55,00%

Feminino Masculino

Figura 03. Gênero dos participantes da pesquisa Fonte: Questionário fechado aplicado aos entrevistados

Do total da amostra, 9% freqüentam da 1ª à 4ª série do Fundamental I, 73%

está cursando da 5ª à 8ª série do Ensino fundamental II, e 18% não estuda (Figura

03).

Page 44: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

43

9,00%

73,00%

18,00%

1ª a 4ª Série do Fundamental I 5ª a 8ª Série fundamental II Não estudam

Figura 04. Série freqüentada pelas crianças/trabalhadores das

comunidades de Gameleira e Várzea de Cima, em

Pindobaçu, Bahia

Fonte: Questionário fechado aplicado aos entrevistados

Quanto ao turno em que trabalha (Figura 4), a maioria (46%) dos alunos

afirmou que é na parte da tarde (vespertino), porque vão à escola pela manhã.

Outros (36%) disseram ser no turno matutino, e as crianças que não estudam (18%),

trabalham o dia todo.

36,00%

46,00%

18,00%

Turno matutino Turno vespertino O dia todo

Figura 04. Turno no qual as crianças trabalham

Fonte: Questionário fechado aplicado aos entrevistados

Page 45: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

44

Portanto, estas últimas não podem freqüentar a escola por que o trabalho

ocupa todo seu tempo. Quanto às crianças que trabalham apenas um turno, são

prejudicadas também em seus estudos porque não lhes sobra tempo para fazer as

atividades e nem repassar os conteúdos que foram vistos na escola.

Quanto ao local em que residem, 64% das crianças moram na Fazenda

Gameleira e as demais (36%) na Fazenda Várzea de Cima (Figura 5), que são

comunidades relativamente pobres, o que contribui para o trabalho infantil.

64,00%

36,00%

Fazenda Gameleira Várzea de Cima

Figura 05. Comunidades onde moram as crianças entrevistadas

Fonte: Questionário fechado aplicado aos entrevistados

Com relação aos pais, 91% das crianças são filhos de pais vivos e apenas 9%

são órfãos (Figura 6), o que não justificaria o fato das crianças precisarem trabalhar,

mas considerando-se a pobreza da região, os pais são às vezes, forçados a lançar

mão do trabalho para seus filhos.

Page 46: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

45

9,00%

91,00%

Crianças orfãs Crianças com pais vivos

Figura 06. Quanto aos pais estarem vivos Fonte: Questionário fechado aplicado aos entrevistados

IV. 2 O posicionamento dos alunos entrevistados

A análise dos conteúdos dos discursos foi embasada nas temáticas descritas

nos capítulos anteriores, onde se pretendeu discutir e relacionar os conteúdos com

referenciais de autores que estudaram estas questões. Este trabalho apresenta

resultados produzidos por uma investigação que teve como propósito analisar

discursos sobre a exploração do trabalho infantil nas comunidades da Gameleira e

Várzea de Cima, do município de Pindobaçu, no Estado da Bahia.

IV.2.1 Com relação aos motivos pelos quais as crianças trabalham e quais as

atividades realizadas

Buscando responder à questão porque as crianças trabalham e que

atividades realizam no decorrer deste trabalho, procurou-se verificar as causas que

levam essas crianças a trabalharem ainda tão novas. A análise das entrevistas

recolhidas permite afirmar que 73% das crianças disseram trabalhar porque

precisam ajudar o pai nas despesas da casa. As demais crianças (27%) não

conseguiram explicar suas razões (Figura 7a).

Page 47: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

46

73,00%

27,00%

Para ajudar o pai na renda da casa Outras razões não especif icada

Figura 7a. Causas do trabalho realizado pelas crianças entrevistadas Fonte: Questionário fechado aplicado aos entrevistados

Por acreditar que as atividades que realizam no seu dia a dia Quanto a

atividade que elas realizam, a maioria (55%) informou que é atividade agropecuária,

outras (36%) disseram ser atividade doméstica (dentro e fora de seu lar) e uma

minoria (9%) disse vender geladinho (Figura 7b).

55,00%

9,00%

36,00%

Atividade agropecuária Vende geladinho Atividades domésticas

Figura 7b. Atividades realizadas pelas crianças trabalhadoras

Fonte: Questionário fechado aplicado aos entrevistados

Page 48: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

47

O fato das crianças trabalharem para ajudar o pai nas despesas, demonstra o

quadro de pobreza da comunidade onde moram. A pobreza contribui para o ingresso

precoce de crianças no mundo do trabalho. Como a baixa renda é insuficiente para a

subsistência das famílias, elas incluem todos os seus membros (inclusive as

crianças) no mercado de trabalho para complementar a renda familiar.

Estes resultados são enfatizados pela Organização Internacional do Trabalho

(OIT,1993), ao afirmar que as crianças são utilizadas em diversas modalidades de

emprego no campo, na cidade, no lar, na rua, em artesanatos, no comércio, em

plantações, minas e fábricas.

O maior percentual de crianças trabalha em atividades agropecuárias, como

se pode ver acima. Realmente, nas leituras realizadas para fundamentação teórica,

fala-se que é na área rural onde persiste maior incidência de trabalhadores mirins,

que vão ao campo ajudar seus pais na colheita e nos cuidados com o gado. A

utilização de mão de obra infantil na agricultura acontece porque os pais exercem

também atividades na lavoura e, como precisam produzir mais para serem pagos,

iniciam precocemente suas crianças no trabalho, não se importando com a

educação das mesmas.

Um dos resultados acima condiz com a afirmação de Kassouf (2001) quando

ele informa que as atividades realizadas dentro de casa em troca de teto, comida e

roupa, são caracterizadas como trabalho infantil. O autor ainda diz que esse tipo de

trabalho acarreta uma série de seqüelas nas crianças, como problemas de coluna

por excesso de peso, riscos de acidentes com facas e outros instrumentos e até

espancamentos. Provoca também danos psicológicos, por terem que abandonar

suas famílias e irem morar em outra casa, onde não são tratados como membros da

família. Eles se sentem excluídos pelos proprietários da casa onde trabalham, por

não receberem o afeto necessário à sua faixa de idade.

Page 49: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

48

IV.2.2 Quanto à questão: “Você gosta do trabalho que realiza? Quanto ganha

por dia com o seu trabalho?”

Quando questionadas sobre a questão de gostar do trabalho que executam,

as crianças entrevistadas, 55% disseram que gostam de trabalhar e apenas 45%

delas responderam que não gostam e que adorariam ficar brincando ou estudando

(Figura 8a).

55,00%

45,00%

Gostam do trabalho que reaslizam Não gostam

Figura 8a. Opinião das crianças sobre gostar ou não do trabalho que

executam Fonte: Questionário fechado aplicado aos entrevistados

Quanto ao pagamento que recebem, os valores divergiram de uma para

outra, cada valor correspondendo a 9% dos entrevistados. O maior percentual (55%)

de crianças afirmou que não recebem nada, trabalham fazendo serviços domésticos

dentro do próprio lar, ajudando a mãe que trabalha fora (Figura 8b).

Page 50: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

49

9,00%9,00%

55,00%

9,00%

9,00%9,00%

De R$ 5,00 a R$ 8,00 De R$ 5.00 a R$ 6,00 Nada R$ 12,00 R$ 10,00 R$ 50,00

Figura 8b. Valor recebido pelas crianças como pagamento pelo seu

trabalho Fonte: Questionário fechado aplicado aos entrevistados

Percebe-se pelos dados acima que as crianças se consideram responsáveis,

sentem-se provedores da família, gostam de seu trabalho porque conseguem

ganhar algum dinheiro e se sentem importantes por isso. No início até estranham o

fato de trabalhar, mas quando começam a ganhar algum dinheiro se entusiasmam e

passa a gostar do que fazem. Geralmente elas dizem que gostam de trabalhar, mas

dizem também que ficam muito cansadas na escola e acabam faltando bastante.

Acontece que as sociedades humanas são marcadas pela desigualdade

social, possuindo um modelo econômico que oferece espaços e até incentiva a

incorporação da mão-de-obra infanto-juvenil, privilegiando o lucro acima dos valores

humanos. Além disso, o desemprego e a pobreza fazem com que os pais coloquem

seus filhos para trabalhar desde pequenos, para sobreviver.

O valor recebido pelas crianças fica aquém dos valores recebidos pelos

adultos, variando de R$ 5,00 até R$ 50,00. Geralmente elas dão todo o valor para a

família ou então ficam com a metade do dinheiro para uso próprio. E mesmo aquelas

crianças que ficam com algum dinheiro, é para comprar caderno, livro, tênis, roupas.

Ou seja, de qualquer forma compram coisas para a sua sobrevivência. Como se

pode observar as crianças são mal remuneradas e, no entanto, fazem o serviço de

Page 51: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

50

um adulto. É por isso que muitos empregadores preferem empregar crianças, para

terem menos despesas com pagamento de salários.

IV.2.3 Quanto à idade em que começaram a trabalhar

As crianças entrevistadas começaram a trabalhar muito cedo, como

comprovam os resultados obtidos: 25% iniciaram seu trabalho aos seis anos, 17%

com oito anos de idade, 25% aos 10 anos, 25% com 11 anos e 8% a partir dos 12

anos de idade (Figura 9).

25,00%

17,00%

8,00%25,00%

25,00%

Começam a trabalhar com 6 anos de idade Com 8 anos de idade

Com 12 anos de idsde Desde os 10 anos

Com 11 anos

Figura 9. Idade em que as crianças começaram a trabalhar Fonte: Questionário fechado aplicado aos entrevistados

A entrada precoce das crianças no mercado de trabalho está associada à

pobreza de suas famílias. Diante desta situação, questiona-se como estas crianças

podem chegar a um estágio de cidadania, se a educação a qual lhes é necessária, é

obstruída pela sua condição de trabalhadores infantis. De acordo com Ghiraldelli

(1997, p. 45) “o trabalho infantil é uma das formas mais cruéis de se negar o futuro

ao ser humano”.

Ghiraldelli (1997) ressalta ainda que tendo que trabalhar desde cedo, a

criança perde a infância para ajudar no sustento da família e com isso deixa de

estudar, de brincar e de se tornar um cidadão apto a enfrentar os enormes desafios

do mundo que o cerca.

Page 52: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

51

IV.2.4 Em resposta à questão: O que você gostaria de fazer se não tivesse que

trabalhar?”

Algumas respostas para esta questão foram variadas, mas todas tinham um

ponto em comum: brincar! Outras respostas coincidiram no item - estudar. É por isso

que muitos autores enfatizam que um dos prejuízos que o trabalho precoce traz para

a criança é a perda de sua infância, a perda dos momentos de lazer, a ausência das

brincadeiras. Eis algumas respostas encontradas:

“Brincar com meus amigos”; “Tomar banho no rio e jogar bola”; “Usava todo

meu tempo apenas para passear”; “Jogar bola”; “Estudar e andar de bicicleta”;

“Estudar, brincar de bola e andar de bicicleta”; “Ficar dormindo o dia todo e

brincando”; “Passear e estudar”.

Pelas respostas observadas, percebe-se que até as crianças acham

importante estudar. A escola é insubstituível para a socialização e o aprendizado em

geral, afirma Martins (1993). Percebe-se ainda que elas sentem falta de viver sua

infância, quando mencionam que gostariam de jogar bola, nadar no rio, andar de

bicicleta e estudar, ou seja: brincar!

Postman (1999, p. 18) ressalta que

Toda criança tem o direito de viver a sua infância. As atividades que predominam nesse período são as que envolvem movimento e criação de significados, fazendo com que a criança se desenvolva como um ser de cultura. Atividades como desenhar, brincar de faz-de-conta, cantar, dançar, ouvir histórias, são muito importantes para a criança porque ela é um ser em formação de sua identidade.

As brincadeiras são tão importantes quanto o estudo. Quando as crianças

brincam conseguem encontrar respostas a várias indagações, podem sanar

dificuldades de aprendizagem, bem como interagir com as outras crianças. Ao

brincar a criança está exercitando suas potencialidades, adquire conhecimento sem

medo, desenvolve a sociabilidade, desenvolve-se intelectual, social e

emocionalmente. O ato de brincar é fundamental para a formação da criança em

todas as etapas da sua vida.

Page 53: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

52

Ao se iniciarem precocemente no mercado de trabalho as crianças e os

adolescentes não têm acesso ao lazer nem a recreação, são literalmente excluídas

do mundo lúdico e prazeroso e isso lhes faz muita falta, afirma Postman (1999).

IV.2.5 Motivos pelos quais as crianças não estudam

As duas crianças trabalhadoras que não freqüentam a escola e participaram

desta pesquisa, quando se perguntou as razões que as levavam a não estudar,

responderam:

Porque não gosto de estudar (CRIANÇA 1). Porque acho difícil trabalhar e estudar ao mesmo tempo (CRIANÇA 2).

Às vezes acontece uma criança que trabalha dizer que não gosta da escola.

O problema é que como não pode freqüentar devidamente o espaço escolar, ela não

se sente atraída por ele e pouco consegue se identificar com os rituais da escola,

chegando mesmo a dizer que a escola não é boa para ela, que nasceu mesmo foi

para trabalhar. A partir do convívio no mundo do trabalho e sem freqüentar a escola,

ela vai aprendendo a não se sentir capaz, se sentindo pouco "inteligente",

acreditando não ser capaz de aprender os conteúdos escolares, por isso não gosta

de estudar.

Várias crianças desistem da escola por que não conseguem acompanhar os

seus colegas, em virtude do trabalho que realizam. As respostas acima são

corroboradas por Ghiraldelli (1997) quando ele diz que a criança trabalhadora

permanece, em muitos casos, por anos e anos em uma mesma série. O processo de

repetir faz com que ela internalize a sua própria incompetência. Ninguém precisa

dizer isto para ela. Através de seu insucesso ela vai achando que aquele não é o

melhor lugar para ela e abandona a escola.

Page 54: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

53

IV.2.6 Quanto à repetição de série pelas crianças que estudam

No que se refere aos efeitos do trabalho sobre a escolarização, os prejuízos

citados são a repetência e a evasão, conforme os dados obtidos, onde 78% dos

entrevistados afirmou que já repetiu a mesma série pelo menos uma vez. Apenas

22% deles disseram nunca ter “perdido de ano”, ou seja, nunca repetiram a série

estudada (Figura 10).

78,00%

22,00%

Já repetiu o ano Nunca repetiu ano escolar

Figura 10. Índice de repetência dos alunos pesquisados Fonte: Questionário fechado aplicado aos entrevistados

Uma das crianças que não estuda informou que já estudou e que desistiu na

3ª série do fundamental I.

Estes resultados confirmam que o trabalho infantil acarreta dificuldades de

aprendizado, desde as tarefas simples até as mais complexas como interpretação

de textos, aumentando a repetência e a evasão escolar. Geralmente as crianças que

trabalham são reprovadas de duas a quatro vezes na mesma série, porque mal

aprendem a escrever. O tempo dedicado ao trabalho impede até que o aluno faça as

atividades escolares.

Quem mais sofre com a reprovação é o aluno porque ele passa a se criticar

ou se depreciar e com isso sua auto-estima é rebaixada. A reprovação não deve ser

vista como punição, mas como uma oportunidade para o aluno cumprir o que não

Page 55: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

54

conseguiu em um ano, mas geralmente os alunos não entendem assim e

abandonam a escola. Segundo Schwartzman (2001) o abandono escolar impede a

formação profissional, criando problemas sociais. A defasagem escolar provocada

pela repetência é desgastante e impede a dedicação aos estudos.

IV.2.7 Quanto ao futuro das crianças

Muitos dos meninos que participaram da presente pesquisa, querem ser

policiais (40%) e pedreiros (20%) e as meninas, professora (20%), veterinária (10%)

e atriz (10%) (Figura 11).

20,00%

40,00%

20,00%

10,00%

10,00%

Quero ser professora Meu sonho é ser policial Ser pedreiro Veterinária Atriz

Figura 11. Os sonhos das crianças trabalhadoras que participaram da

pesquisa Fonte: Questionário fechado aplicado aos entrevistados

São os planos que eles têm para seu futuro. Acontece que, ao exercerem

atividades de trabalho conjuntamente com a escola, seus sonhos dificilmente serão

atingidos. O trabalho infantil não dignifica a criança, ao contrário, a escraviza.

Quando ela tem que trabalhar, está deixando para trás seus sonhos, suas

fantasias para compactuar com um mundo insensível. Segundo Postman (1999) a

necessidade do trabalho tem que ser ensinada às crianças com o passar do tempo,

contudo, se são forçadas a trabalhar acabam amadurecendo cedo demais. Perdem

a infância e toda a beleza que existe nela. Muitas deixam de freqüentar a escola.

Page 56: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

55

Outras freqüentam e não conseguem acompanhar direito as aulas por causa do

cansaço.

IV.2.8 Em relação às conseqüências do trabalho infantil para o rendimento

escolar.

As opiniões dos entrevistados sobre esta questão foram variadas. A maioria

(64%) disse que o trabalho não atrapalha o rendimento escolar, porque trabalham

apenas um turno ou então só trabalham quando não é época de provas. Entretanto,

as duas crianças que não estudam (18%), afirmaram que sim, porque ao sair do

trabalho tinham preguiça de ir para a escola, sentiam-se cansadas, e por isso

abandonaram a escola. Outras crianças (18%) disseram que o trabalho atrapalha o

seu desempenho na escola por que elas tiram notas muito baixas (Figura 12).

18,00%

18,00%

64,00%

Sim, porque só tiro notas muito baixa Sim, por isso abandonei a escola

Nãoa atrapalha porque só trabalho um turno

Figura 12. Conseqüências do trabalho infantil sobre a freqüência escolar Fonte: Questionário fechado aplicado aos entrevistados

Percebe-se que as crianças não atribuem o seu fracasso escolar as

atividades realizadas no seu cotidiano.

Algumas crianças não se sentem prejudicadas no estudo porque exercem seu

trabalho de forma sazonal e intermitente, como também só trabalham durante um

turno. Estes resultados contradizem a afirmação de Cavalieri (2000) quando ele

afirma que não importa o período em que o trabalho é executado, ele prejudica o

Page 57: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

56

rendimento da criança na escola de qualquer maneira porque reduz o horário de

execução das tarefas escolares.

Cipola (2001, p. 20) é taxativo ao salientar que as crianças e adolescentes

que trabalham mais de duas horas por dia apresentam prejuízo no desempenho

escolar. Os estudantes que apenas freqüentam a escola aprendem mais quando

comparados com os que estudam e trabalham. Por até duas horas diárias, as

atividades extra-curriculares não competem com os estudos. A criança que trabalha

determinado número de horas por dia perde pontos na variável “desempenho

escolar”.

Devido ao cansaço que provoca, o trabalho infantil prejudica o rendimento

escolar, trazendo como conseqüência as notas baixas que podem influenciar na

personalidade da criança causando baixa-estima. Como afirmaram alguns

entrevistados, o trabalho precoce também provoca desestímulo e faz com que a

criança abandone a escola.

Os dados acima confirmam o que os estudiosos do assunto afirmam. Eles

dizem que o trabalho infantil compromete o desenvolvimento psicossocial da

criança, reduzindo pelo cansaço, a capacidade de concentração da criança,

trazendo riscos para a saúde, conduzindo ao absenteísmo eventual, provocando os

baixos índices de freqüência escolar e os elevados índices de repetência.

O trabalho infantil prejudica o desenvolvimento na escola, a criança não se

qualifica e se torna ainda mais pobre. O mais grave é que a criança, para trabalhar,

deixa de freqüentar a escola, de ter sucesso no seu aprendizado, perdendo as

chances de concorrer a uma melhor colocação no mercado de trabalho quando

adulta.

A baixa escolaridade conseqüente do baixo desempenho escolar, causado

pelo trabalho infantil, tem o efeito de limitar as oportunidades de emprego a postos

que exigem qualificação, mantendo o jovem dentro de um ciclo repetitivo de pobreza

já experimentado pelos pais.

Page 58: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

57

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As conseqüências do trabalho infantil são diversas, especialmente quando a

criança se torna adulta, pois ela se torna um trabalhador desqualificado, ocupando

subemprego ou ficando desempregada. Quase a totalidade dos estudos aborda o

lado da oferta do trabalho infantil, mas é preciso analisar também o lado da

demanda. Entender as razões pelas quais as crianças são contratadas e seus

efeitos na estrutura e no lucro das empresas e nos salários e nível de emprego do

trabalhador adulto é primordial. Eis as conclusões a que se chegou após a análise

dos resultados:

– Algumas crianças trabalham apenas um turno por dia.

– As crianças que trabalham em tempo integral, abandonaram a escola

porque não tinham tempo para estudar.

– As crianças pesquisadas começaram a trabalhar muito cedo, como ficou

comprovado através dos dados obtidos, quando se tomou conhecimento de que

algumas começaram a trabalhar a partir dos oito anos de idade, outras com 10 anos

e outras ainda, com 11 e 12 anos de idade.

– Muitas crianças já repetiram a série que estão cursando.

– Quase todas dizem gostar de trabalhar.

– Os motivos mais citados para o trabalho foram a ajuda em casa para

aumentar a renda familiar.

– Todos os entrevistados disseram que gostariam de brincar e também

estudar.

– Todos sonham com profissões diferentes do trabalho que ora realizam.

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Os dados levantados nesta pesquisa confirmam que o trabalho precoce é

uma das causa da evasão e da repetência escolar, porque algumas crianças

entrevistadas abandonaram a escola em virtude do trabalho que realizam, não

puderam conciliar trabalho e escola. Quase todas elas já foram reprovadas em

alguma série, tornando-se repetentes. Como pôde ser visto, as crianças e

adolescentes em suas falas demonstram ter várias habilidades e potencialidades

que podem ser aprimoradas se lhe forem asseguradas melhores condições de vida.

Percebeu-se que normalmente o trabalho precoce prejudica a escolarização

das crianças e uma futura colocação no mercado de trabalho. Tomou-se

conhecimento de que elas começam a trabalhar tão jovens para ajudar nas

despesas da família.

Constatou-se ainda que, apesar das crianças afirmarem que gostam de

trabalhar, na realidade elas gostam mesmo é de brincar e freqüentar a escola como

foi apurado nas suas respostas. Elas sonham em assumir profissões diferentes

daquelas que ora realizam, ou seja, sonham com um futuro melhor, no qual teriam

condições de viver a sua cidadania.

Diante deste quadro de trabalho infantil nas comunidades de Gameleira e

Várzea de Cima, no município de Pindobaçu, torna-se necessário que novos

estudos sejam realizados em outras comunidades, com o intuito de conduzir as

crianças à escola, conscientizando os seus pais a deixá-las viver sua infância.

Apesar dos avanços desta pesquisa, ainda é preciso investir no levantamento

desta temática, com ênfase para a obtenção de dados de um maior número de

crianças de outras comunidades do município estudado, e de informações mais

precisas quanto ao trabalho infantil nessa região.

O trabalho infantil é um problema social porque a criança que trabalha não

estuda bem, não brinca o suficiente e não se prepara para a vida. Ao contrário, o

trabalho infantil aumenta a desigualdade social porque prejudica o desenvolvimento

físico, psicológico, intelectual e social da criança durante a fase da infância.

Page 60: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

59

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APÊNDICE

Page 64: Monografia Rosemaide Pedagogia 2003

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APÊNDICE A

QUESTIONÁRIO APLICADO ÀS CRIANÇAS QUE ESTUDAM E TRABALHAM,

RESIDENTES NAS FAZENDAS GAMELEIRA E VARZEA DE CIMA, PINDOBAÇU,

BAHIA

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB

DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS VII

A) Perfil dos envolvidos na pesquisa

a) Faixa etária

[ ] 05 A 09 ANOS [ ] 10 a 12 ANOS [ ] 13 A 16 ANOS

b) Sexo

[ ] Masculino [ ] Feminino

c) Série em que estuda

[ ] 1ª a 4ª do Ensino Fundamental I [ ] 5ª a 8ª do Ensino Fundamental II

d) Turno em que trabalha

[ ] Matutino [ ] Vespertino [ ] Noturno

e) Freqüenta a escola

[ ] SIM [ ] NÃO

f) Local onde reside

[ ] Fazenda Gameleira [ ] Fazenda Várzea de Cima

g) Filiação

Pai vivo [ ] SIM [ ] NÃO

Mãe viva [ ] SIM [ ] NÃO

B) Roteiro da entrevista

1) Por que você trabalha? Que atividade você realiza?

________________________________________________

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2) Você gosta do trabalho que realiza? Quanto você ganha por dia com o seu

trabalho?

___________________________________________________________________

3) Com quantos anos começou a trabalhar? ___________________________________________________________________

4) O que você gostaria de fazer se não tivesse que trabalhar?

___________________________________________________________________

5) Se não estuda, porque não o faz?

___________________________________________________________________

6) Já repetiu de ano de estudo? Quantos?

[ ] SIM [ ] NÃO

8) Você tem sonhos para o futuro? ___________________________________________________________________ 9) O trabalho que você desempenha influi no seu rendimento escolar? Como?

__________________________________________________________________