monografia joão pedagogia 2012

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1 UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS VII COLEGIADO DE PEDAGOGIA – COLPED JOÃO ASSIS SILVA OLIVEIRA HISTÓRIA DE MULHERES PROFESSORAS: A HISTÓRIA DE VIDA E FORMAÇÃO DE DONA VANDA Senhor do Bonfim 2012

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Page 1: Monografia João Pedagogia 2012

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB

DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS VII

COLEGIADO DE PEDAGOGIA – COLPED

JOÃO ASSIS SILVA OLIVEIRA

HISTÓRIA DE MULHERES PROFESSORAS: A HISTÓRIA DE VIDA E

FORMAÇÃO DE DONA VANDA

Senhor do Bonfim2012

Page 2: Monografia João Pedagogia 2012

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB

DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS VII

COLEGIADO DE PEDAGOGIA – COLPED

JOÃO ASSIS SILVA OLIVEIRA

HISTÓRIA DE MULHERES PROFESSORAS: A HISTÓRIA DE VIDA E

FORMAÇÃO DE DONA VANDA

Monografia apresentada ao Departamento de Educação / Campus VII – Senhor do Bonfim, da Universidade do Estado da Bahia, como parte dos requisitos para obtenção de graduação no Curso de Pedagogia com Habilitação em Docência e Gestão de Processos Educativos.

Linha de Pesquisa: Cultura Escolar

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Maria Gloria da Paz

Senhor do Bonfim2012

Page 3: Monografia João Pedagogia 2012

3

JOÃO ASSIS SILVA OLIVEIRA

HISTÓRIA DE MULHERES PROFESSORAS: A HISTÓRIA DE VIDA E

FORMAÇÃO DE DONA VANDA

Monografia apresentada ao Departamento de Educação / Campus VII – Senhor do Bonfim, da Universidade do Estado da Bahia, como parte dos requisitos para obtenção de graduação no Curso de Pedagogia com Habilitação em Docência e Gestão de Processos Educativos.

Aprovada em ____ de ________________ de 2012.

BANCA EXAMINADORA

______________________________________________________________

Prof.ª Dr.ª Maria Gloria da Paz - Universidade do Estado da Bahia –UNEB

Orientadora

_____________________________________________________________

Prof.ª..................................................................................................

Examinadora

____________________________________________________

Prof.ª..................................................................................................

Examinadora

Page 4: Monografia João Pedagogia 2012

4

EPÍGRAFE

Quem és Tu Mulher?

Sou quase como vocês homens.Sou guerreira, justiceira,

cumpridora de meus deveres, masdesconhecida de meus direitos.

Sou tua mulher; sou tua mãe,

sou mãe de teus filhos,sou tua namorada,

sou tua amiga,sou mulher.

Mas quem és tu mulher?

Sou mãe, sou advogada,

sou médica,sou faxineira,

sou mulher-da-vida,sou professora.

sou também a flor que encanta seu jardim,a estrela que ilumina o seu céu, mesmo em noites de escuridão.

Roni Roque da Silva

Page 5: Monografia João Pedagogia 2012

5

DEDICATÓRIA

A minha mãe, Irene, em nome de todas as

mães deste vasto mundo.

A Dona Eulina, em nome das professoras de

outrora que tanto contribuíram para o

crescimento educativo e social de tantas

pessoas.

Page 6: Monografia João Pedagogia 2012

6

.AGRADECIMENTOS

A Deus, com sua sublime bondade, por permitir que este trabalho fosse iniciado,

desenvolvido e, finalmente, concluído.

A Prof. Dr.ª Gloria da Paz, minha orientadora, mulher sábia, que me guiou neste

caminho, levando-me passo a passo, até chegar ao destino tão almejado.

Aos professores e a Universidade do Estado da Bahia – CAMPUS VII, por estes

anos de crescimento.

Aos meus familiares e amigos que sempre estiveram ao meu lado.

Aos colegas universitários por quantos trabalhos, quantos conhecimentos

partilhados.

A Senhora Perpetua em nome dos familiares de Dona Vanda

A Dona Terezinha em nome de todos os depoentes.

A Senhora Aldalice, mulher guerreira, uma verdadeira líder. Sempre sorridente e de

bem com a vida. Por suas palavras de animo e conforto.

A Jaciane, Ani, que é de Deus. É meu presente de Deus. Uma preciosidade na

minha vida. Que com seu jeito simples e carinhoso sempre soube dar-me forças

para continuar. Sempre me incentivando a continuar firme e forte. Minha musa

inspiradora.

Page 7: Monografia João Pedagogia 2012

7

LISTA DE ABREVIATURAS

Dr.ª – Doutora

Ed. – Editora

(Org.) – Organização

Prof.ª – Professora

P. - Página

Trad. - Tradução

Page 8: Monografia João Pedagogia 2012

8

RESUMO

O presente trabalho de conclusão de curso: História de mulheres professoras: a

história de vida e formação de dona Vanda, tem como objetivo demonstrar a

importância da mulher na educação, refletindo a cerca das contribuições desta

educadora na comunidade de Missão do Sahy. A metodologia aplicada nesta

pesquisa foi a história oral, através de entrevista semi-estruturada. Foram coletados

depoimentos de cinco pessoas do povoado, sendo estes, ex-alunos e familiares de

Dona Vanda. As fontes escritas utilizadas foram: Josso (2004), Louro (2007), Perrot

(2007), Nóvoa (2007) e outros autores. Por fim, apresentamos os resultados

alcançados revelando que são pequenos trabalhos como o de Dona Vanda que

fazem a diferença na melhoria educativa e social.

Palavras - chave: História de professores, história de vida e formação,

Professora Vanda.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...........................................................................................................10

CAPÍTULO I...............................................................................................................12

1.1. HISTÓRIA DE PROFESSORAS.........................................................................12

1.2. HISTÓRIA DE VIDA E FORMAÇÃO..................................................................17

CAPÍTULO II............................................................................................................21

2. Procedimentos Metodológicos.......................................................................21

2.1. A pesquisa.....................................................................................................21

2.2. Os instrumentos............................................................................................21

2.3. As fontes de pesquisa..................................................................................24

2.4. O local da pesquisa......................................................................................26

CAPITULO III...........................................................................................................27

3. Os resultados da pesquisa.............................................................................28

CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................35

REFERÊNCIAS........................................................................................................36

ANEXOS

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INTRODUÇÃO

O presente estudo tem como tema a História de Mulheres Professoras, com um

recorte sobre A História de Vida e Formação da Professora Vanda Pereira da Silva.

Esta escolha se deu primeiramente porque este assunto está ligado as minhas

origens; sou residente na comunidade de Missão do Sahy, e percebo que a maioria

da população comenta sobre a atuação de Dona Vanda na educação deste

povoado, outra razão advém da necessidade de dar visibilidade a estes

personagens que contribuíram para a formação das pessoas que por aqui nasceram

ou que ainda residem nesta comunidade.

O fato de tentarmos reconstituir a história de alguém tem a finalidade de dar

conhecimento sobre esta pessoa e seus feitos, até porque muitos da nova geração

desconhecem a sua própria origem, sabendo muito pouco sobre si mesmo, sobre o

povoado em que residem e suas personalidades. Pensando sobre a valorização da

cultura da nossa comunidade e das pessoas que aqui nasceram, criaram vínculos,

estabeleceram relações e contribuíram para o seu crescimento, é que desejo

estudar a história de vida da professora Wanda Pereira da Silva, reconstituindo

partes de sua história a partir da oralidade das pessoas que a conheceram e que

foram seus alunos.

Na história de vida de professores, são de grande importância os registros sobre a

sua atuação na educação na solução de problemas relacionados com as

comunidades, na formação dos cidadãos, dos seus agentes sociais e políticos,

especialmente quando se trata das comunidades rurais. Este também é um dos

motivos que nos impulsiona a trazer à luz histórias de educadores, em sua maioria,

leigos, sem formação acadêmica, e que através das práticas e de suas próprias

experiências conseguiam iniciar o processo de letramento das pessoas.

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CAPITULO I

1.1. HISTÓRIA DE PROFESSORAS

Diferente do modelo da mulher administradora da família, a dona do lar, que fora

historicamente transmitido e muitas vezes reproduzido como certo, muitas mulheres

provedoras de suas famílias, corajosamente, enfrentam a realidade sozinhas com

seus filhos, e buscam através do trabalho os meios de sustento da sua família.

Tomando para si esta iniciativa, não ficam à mercê da sorte, e mesmo em situação

diferenciada ou quando são casadas, não ficam a depender dos recursos do marido.

Na maioria das vezes, as mulheres da classe popular ou da zona rural recebem um

salário irrisório pelo trabalho exercido, o que as fazem procurar alternativas, assim

como as frentes de emergência durante os períodos de seca, colocarem as filhas

mais velhas para trabalhar na cidade como domésticas, dentre outras formas de

obtenção de renda para a família.

Por influencia do mercado, do êxodo rural e da industrialização crescente, a vida das

mulheres também sofreu grandes modificações, mudaram a vida das mulheres que

aprenderam a desempenhar atividades que antes eram exclusivas dos homens. A

educação foi a forma que as mulheres encontraram para se libertar da condição de

submetimento em que viviam.

As primeiras escolas, em maior número para meninos, foram fundadas por

congregações e ordens religiosas femininas ou masculinas e eram mantidas por

professores leigos. Professores para ensinar aos meninos e professoras para as

meninas. Esses por sua vez deveriam ser pessoas dignas socialmente. O ensino era

basicamente centrado na formação de habilidades para ler, escrever, contar e

conhecimento sobre a doutrina cristã.

Em muitos momentos as disciplinas mais complexas eram confiadas aos

professores e esses também recebiam uma remuneração maior que as mulheres.

Page 12: Monografia João Pedagogia 2012

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Para os povos descendentes indígenas, a educação escolar, acontecia de forma

elementar, a educação nestas comunidades, realizava-se no seio familiar, tendo

como pano de fundo as praticas e os costumes do grupo de origem; o acesso a uma

escolarização mais ampla, se tornava mais difícil, principalmente por habitarem mais

distantes dos grandes centros, onde se concentravam os colégios, cabendo-lhes

apenas o acesso ao ensino das primeiras letras.

Para as filhas de grupos sociais privilegiados, o ensino da leitura, da escrita e das

noções básicas de matemática era geralmente complementado pelo aprendizado do

piano e do francês que, na maior parte dos casos, era ministrado em suas próprias

casas por professores particulares, ou em escolas religiosas. As habilidades com as

agulhas, os bordados, as rendas, as habilidades culinárias, bem como as

habilidades de mando das crianças e serviçais, também faziam parte da educação

das moças; acrescida de elementos que pudessem torná-las uma esposa agradável

e capaz de representar o marido socialmente.

Ainda que o reclamo por uma educação feminina viesse a representar, sem duvida

um ganho para as mulheres, sua educação continuava a ser justificada por seu

destino de mãe. Tal justificativa já estava exposta na primeira lei de instrução publica

do Brasil, de 1827.

As mulheres carecem tanto mais de instrução, porquanto são elas

que dão a primeira educação aos seus filhos. São elas que fazem os

homens bons e maus; são as origens das grandes desordens, como

dos grandes bens; os homens moldam a sua conduta aos

sentimentos deles.

Para muitos, a educação feminina não poderia ser concebida sem uma solida

formação cristã, que seria a chave principal de qualquer projeto educativo. Pois,

predominava a moral religiosa, onde se esperava que as meninas e jovens

conservassem uma imagem de pureza. Portanto, não podendo estas, ficar no

mesmo espaço que os homens.

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Em meados do século XIX, foram tomadas medidas para atender aos reclames de

que faltam mestres e mestras de boa formação. Foram criadas escolas formadoras

de docentes, as escolas normais. Elas atendiam ambos os sexos, porém homens

ficavam separados das mulheres em classes separadas. ( LOURO, 2008 ).

O objetivo das escolas normais era formar profesores (as) para atender o aumento

de alunos. Porém, o êxito não foi alcançado como era esperado porque as escolas

estavam formando mais mulheres que homens. Os homens estavam abandonando,

aos poucos, a sala de aula.

Ao final dos anos 60 e na década de 70 torna-se mais forte a questão do

pofissionalismo do ensino. A legislação para o setor tona-se mais minunciosa e

extensa; procedimentos e relações de ensino são disciplinados, especialmente,

através da burocratização das atividades ecolares da edição de livros e manuais

para docentes, da revitalização de disciplinas como educação moral e cívica, da

preferência politico-ideológica dos professores, etc.

São valorizados o carater profissional da atividade, através das qualidades como

afeto, espontaneidade e informalidade nas relações intra escolares. Há uma

tendência em se substituir a representação da professora como mãe espiritual por

uma nova figura: a da profissional do ensino.

A partir dai era exigido do professor uma ocupação bastante itensa com atividades

de ordem administrativas e de controle; sua forma de ensinar deveria ser mais

técnica, eficiente e produtiva.

Reivindicar o reconhecimento como profissional também se constituia numa forma

de mulheres professoras lutarem por salários iguais aos dos homens e por

condições de trabalho adequadas.

Um aspecto muito forte na questão do gênero é o da diferença, que, na pespectiva

pós-estruturalista, é um processo social estritamente vinculado à significação.

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Identidade e diferença não são condições inerentes aos gêneros ou as culturas, não

sendo possível reduzi-las a algo fixo, estável, unico, homogêneo. Estas so podem

ser percebidas como construção, efeito, processo de produção e ato performativo.

Que apenas por uma repetição exaustiva, acabam por produzir efeitos de realidade.

Por um lado, como uma espécie de reafirmação da função afetiva e de sua

importância central na atividade docente, muitas professoras e professores

subvertem a pretendida propaganda desejada pelos orgãos educacionais, modificam

as tarefas e atividades programadas, introduzem caracteristicas próprias aos

sistemas de instrução e passam a usar a tia como uma denominação substituta a de

professora.

Outra forma de resistência se dá na luta pelos direitos trabalhistas. Professores e

professoras vão buscar formas de reivindicar semelhantes aos operarios. Criam-se

centros de professores e sindicatos que expressão suas reivindicações através de

greves e de manifestações publicas de maior visibilidade e impacto social. São os

movimentos dos trabalhadores da educação.

A professora sindicalizada, denominada de trabalhadora da educação, é

representada pela mulher militante, disposta a ir às ruas lutar por melhores salários

e melhores condições de trabalho. Ela deve ser capaz de parar suas aulas; gritar

palavras de ordem; expor publicamente sua condição de assalariada, não mais de

mãe, tia ou religiosa, exigir o atendimento de seus reclames. Face à discreta

professorinha do incio do século, o contraste parece evidente: são outros gestos,

outa estética outra ética.

Portanto, retomando o processo histórico da educação escolar vemos o quanto esta

tem tomado varias mudanças no decorrer dos anos e o professor, pivô deste

processo, é encaminhado a acompanhar essas inovações.

Page 15: Monografia João Pedagogia 2012

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Inúmeras linhas de conceitos e modelos de ensino são postos em evidência e

discutidos como o melhor método a ser trabalhado no ambiente escolar. Trazem

novas abordagens e requerem nova formação dos docentes para acompanha-los.

Progressivamente, a atenção exclusiva às práticas de ensino tem vindo a ser

analisada e reconhecida de modo a valorizar a pessoa do professor, sua vida e não

somente sua função enquanto profissional formador. Essa visão valoriza e fortalece

a identidade do educador. Pois, esta é auto reconhecida quando a pessoa encontra-

se naquilo que faz, quando se sente responsável por aquela área que atua, ciente

de que sua identidade não é algo produzível.

Todavia, a identidade do professor é fruto daquilo que ele controla dentro da sua

função, é o elo entre sua pratica de ensinar e a autonomia que tal realização lhe

proporciona. O profissional professor e a pessoa do professor são duas coisas que

andam juntas, uma contribui com a outra e ambas dependem uma da outra.

Contudo, a realidade é mais sofrida, no nordeste do Brasil onde está maior parte sob

a responsabilidade dos professores não qualificados. Esses professores, a maioria

mulheres, são responsáveis pela escola que é negligenciada por muitos dos

governos muncipais. Ganhando os menores salários, sem orientação apropriada,

sem condições, esses trabalhadores rurais dividem seu tempo entre trabalho

agrícola e gestão de sala de aula.

Esta tem sido abalada nos últimos anos por uma pressão tripla: classes mais baixas

requerem uma escola de qualidade, a Unesco e outras agências internacionais

exigem que a escola seja capaz de responder às solicitações da globalização, a

globalização do capital, o Ministério da Educação do Brasil promulgaram leis que

exigem a profissionalização de todos os professores no país.

Como para não graduados professores, vários estudos mostram que a situação é

complexa: sua existência decorre da realidade estrutural e cíclica do nordeste do

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país que são responsáveis pela existência das escolas rurais e que estes

professores têm uma história comum que não deve ser negligenciada.

Outro ponto prejudicial ao ensino das classes rurais é a exigencia do cumprimento

de conteúdos curriculares que são desenvolidos para a realidade urbana, onde

sabemos que tem suas diferenças.

1.2. HISTÓRIA DE VIDA E FORMAÇÃO.

Identificamo-nos com as nossas experiências, nos fixamos nelas. E diante das

potencialidades e fragilidades prosseguimos nossa história de vida com uma maior

visibilidade.

Todavia, em se tratando de experiência e vivência, Josso (2004), esclarece em seus

estudos a diferença existente entre estes termos, ao considerar que a experiência

nasce de uma postura refletida, isto é, o sujeito reflete sobre as vivências de sua

vida. Esta reflexão permite que as vivências se transformem em experiências de

vida. Para tanto dar importância à narrativa de formação do sujeito, que mesmo

adquirida tecnicamente, destaca-se como essencial às subjetividades e

singularidade do mesmo.

A formação descreve os processos que afetam a nossa subjetividade. Ela indica

assim, um dos caminhos para que o sujeito oriente, com lucidez, as próprias

aprendizagens e o seu processo de formação.

Segundo Josso (2004), as nossas culturas ocidentais contemporâneas, fundadas no

livre empreendimento e na capacidade de iniciativa criadora, obrigam-nos a ter

cenários de vida, enquanto as formas e os conteúdos educativos procuram orientar

e conter essa criatividade. Se a inovação nasce de individualidades inquietas, os

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procedimentos da sua legitimação social são um testemunho da tensão frágil entre

tradição e modernidade.

O conceito de experiência formadora implica uma articulação conscientemente

elaborada entre atividade, sensibilidade, afetividade e ideação. Articulação que se

objetiva numa representação e numa competência.

Através da experiência temos a possibilidade de poder avaliar situações, podemos

analisar mais precisamente atividades e acontecimentos novos.

O domínio dessas competências implica não apenas uma integração de saber fazer

e ter conhecimento, mas também de subordina-las a uma significação e a uma

orientação no contexto de uma história de vida.

Se a abordagem biográfica da formação, uma vez que ela se centra o aprendente,

permite compreender o que é uma experiência formadora, os trabalhos eventuados

com essa metodologia continuarão a precisar e a afinar a dinâmica da formação e,

por conseguinte, o próprio processo experiencial.

O que está em jogo neste conhecimento de si mesmo não é apenas compreender

com nos formamos por meio e um conjunto de experiências, ao longo da nossa vida,

mas sim tomar consciência de que este reconhecimento de si mesmo como sujeito,

mais ou menos ativo ou passivo segundo as circunstancias, permite a pessoa dai

em diante, encarar o seu itinerário de vida, os seus investimentos e os seus

objetivos, que articule de uma forma mais consciente as suas heranças, as suas

experiências formadoras, os seus grupos de convívio, as suas valorizações, os seus

desejos e o seu imaginário nas oportunidades socioculturais.

Construir a sua história constitui uma prática de encenação do sujeito que se torna

autor a pensar a sua vida na sua globalidade temporal, nas suas linhas de força, nos

seus saberes adquiridos ou nas marcas do passado, assim como na perspectiva dos

desafios do presente entre a memória revitalizada e o futuro já atualizado, porque

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induzido por esta perspectiva temporal. É entrar em cena um sujeito que se torna

autor ao pensar na sua existencialidade. Porque o processo auto reflexivo, que

obriga a um olhar retrospectivo e prospectivo, tem de ser compreendido como uma

atividade de auto interpretação critica e de tomada de consciência da relatividade

social, histórica e cultural dos referenciais interiorizados pelo sujeito e, por isso

mesmo, constitutivos da dimensão cognitiva da sua subjetividade.

O processo de formação, nas dialéticas e nos conteúdos que caracterizam uma

trajetória, é progressivamente explicitado a partir de questionamentos, de hipóteses,

de constatações de recorrência nos comportamentos, nas atitudes ou nas

valorizações, e na maneira de cada um gerir a própria vida.

Nas narrativas de vida é evidente que as vivencias são relatadas, mas contam-nas á

devolvendo-nos uma significação, por mais sumaria que ela seja.

Na abordagem “Histórias de vida e formação”, a reflexão sobre a vida é centrada no

salientar as experiências que consideramos significativas, para compreendermos o

que nos tornamos, nesse dia, e de que forma chegamos a pensar o que pensamos

de nos mesmos, dos outros, do nosso meio humano e natural.

Os gêneros de aprendizagens identificados correspondem a três gêneros de

conhecimento: o saber-fazer consigo mesmo (psicossomático), o sabe-fazer com

outrem ou com objetos mais ou menos complexos (pragmáticos), e o saber-pensar

(explicativo e/ou compreensivo).

O trabalho biográfico sobre o passado se efetua a partir dos interesses, das

questões, das preocupações, das expectativas e dos desejos de um presente que

contem um futuro implícita ou explicitamente projetado. Por isso que considero que a

intensão de caminhar conscientemente para si é um processo-projeto que só

termina no fim da vida.

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Assim, a abordagem de história de vidas pode não apenas provocar um

conhecimento da sua existencialidade e do seu saber-viver com recursos de um

projeto de si auto-orientado, mas convoca ainda o sujeito da formação a reconhecer-

se como tal, a assumir sua quota de responsabilidade no processo, finalmente, a

colocar-se numa relação renovada consigo, com os outros, com o meio humano e

com o universo, na sua vida em geral e no nosso grupo em particular.

Boa parte dos professores leigos era da zona rural. A grande maioria é constituída

de posseiros que complementam o orçamento doméstico como professores. Eram

pessoas que viviam isoladas, precariamente servidos pelos meios de comunicação e

de transporte e que, durante o passar de um tempo, reconhecem seu valor e vão em

busca de resgatar sua identidade, começando a perceber o valor de sua história.

Assim como situa CAMARGO, essa experiência singular, ainda hoje ausente da

História da Educação Brasileira, precisava, urgentemente, ser relatada,

sistematizada e refletida (...). Essa é, portanto, a principal preocupação e objeto

deste trabalho, cuja importância está diretamente relacionada ao despontar de

novos projetos no Brasil em tempos e espaços diferentes. (Camargo 1997, pp. 13,

14)

Para a autora, a experiência de campo não deve ocorrer em um vazio teórico. (...)

Visando, sobretudo, atingir a realidade escolar no contexto rural e indígena, a partir

da observação e da experimentação. Nesta perspectiva, (...) rompe com o ensino

convencional (...). Esta prática teve como estratégia principal o Laboratório Vivencial

- ou seja, a vizinhança do observador que percebe essa realidade a partir de seus

referenciais (...). Apesar de ser o mais "interdisciplinar" dos laboratórios, necessita

de uma metodologia que permita a sistematização do conhecimento. Assim, tal

metodologia teve como fundamentação básica a abordagem etnográfica para o

tratamento do conteúdo observado. (Camargo, 1997, pp. 32-34).

O senso de compromisso na condução educacional emerge constantemente da

leitura, uma vez que vamos sendo introduzidos na importância da história regional

Page 20: Monografia João Pedagogia 2012

20

por intermédio de temas como terra e trabalho, ou descobrindo os conflitos e a

diversidade cultural dos grupos sociais existentes, por meio dos conteúdos.

O ensino primário continuou a ser ministrado por leigos sem qualquer preparo,

existido professores que não ensinavam os alunos “nem a assinarem o nome”, por

não saberem fazer; Somente mais tarde o ensino normal passaria a ser olhado por

seus dirigentes como importante para a comunidade.

O magistério, que era profissão basicamente dos homens, cedeu seu espaço as

mulheres.

Com a defasagem do salário do professor e com a disponibilidade de outras funções

pelas mulheres o magistério enfraqueceu. Com a extinção das escolas normais

contribuiu para o enfraquecimento do mesmo.

Os professores na sua maioria são mulheres. Os homens que atuam no magistério

estão nele até encontrar uma oportunidade de emprego com melhor remuneração.

Havia uma grande predominância de classes multiseriadas, onde se misturava

alunos com grau de aprendizagem diferentes, idade e muitas vezes classe social.

Todavia, o professor leigo escrevia no quadro um exercício para execução na sala,

um texto para leitura e um dever para casa. Ficava sentado na cadeira esperando

que os alunos copiassem, resolvessem os exercícios, enquanto examinava ou

corrigia cadernos, copiava deveres para alunos mais fracos ou mais adiantados.

Chamava aluno por aluno para fazer leitura.

Com o comportamento verbal predominante de dar ordens, ele tentava, sobretudo,

manter a disciplina na sala. Certamente não sabendo como lidar com a

heterogeneidade da turma, voltava-se para o atendimento individual que se resume

na leitura de um pequeno trecho ou correção de um pequeno exercício.

Page 21: Monografia João Pedagogia 2012

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Já o professor habilitado desempenhava sua função dinamicamente, passando o

conteúdo para os alunos e trazendo muitas explicações e exemplos e solicitando a

participação do aluno nas atividades.

Page 22: Monografia João Pedagogia 2012

22

CAPITULO – II

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

2.1. A pesquisa

2.1.1. Tipo de pesquisa: História Oral

A História Oral foi escolhida para estudar a História de Mulheres Professoras, em

especial, a História da atuação da Professora Vanda na educação das pessoas no

povoado de Missão do Sahy. Através da História Oral pudemos colher depoimentos

sobre a educação escolar do povoado na época da professora Vanda.

2.1.2. Os Instrumentos da pesquisa:

Entrevista semiestruturada

2.2. O GUIA DA PESQUISA

BLOCO I: a identificação dos entrevistados

A ficha de identificação é composta por elementos de identificação pessoal:

Nome:

Endereço:

Filiação:

Data de Nascimento:

Naturalidade:

Estado civil:

Escolaridade:

Profissão:

Data:

Page 23: Monografia João Pedagogia 2012

23

BLOCO II;

1. O Senhor (a) conheceu Dona Vanda, fale um pouco sobre a sua vida?

2. De que maneira o trabalho de Dona Vanda contribuiu para a melhoria da

comunidade de Missão do Sahy?

3. Se você foi aluno de Dona Vanda, fale um pouco sobre esta professora e sua

maneira de ensinar.

4. O que você aprendeu com Dona Vanda?

5. Deseja falar mais alguma coisa sobre Dona Vanda?

2.1.1.2. CARTA CESSÃO

CARTA CESSÃO DE DIREITOS SOBRE DEPOIMENTO ORAL PARA A

UNEB/CAMPUS VII – SENHOR DO BONFIM - BA

1 - Pelo presente documento...........................brasileiro, estado civil)......................

(profissão)..........carteira de identidade nº......., emitida por.................... CPF

nº................, residente e domiciliada em..................................................., Município

de Senhor do Bonfim, Bahia. Cede e transfere nesse ato, gratuitamente, em caráter

universal e definitivo ao Campus VII da Universidade Estadual da Bahia (UNEB) a

totalidade dos seus direitos patrimoniais de autor sobre o depoimento prestado no

dia ....de ...................... de 2010, perante o pesquisador João Assis Silva Oliveira.

2 – Na forma preconizada pela legislação nacional e pelas convenções

internacionais de que o Brasil é signatário, o DEPOENTE, proprietário originário do

depoimento de que trata este termo, terá, indefinidamente, o direito ao exercício

pleno dos seus direitos morais sobre o referido depoimento, de sorte que sempre

terá seu nome citado por ocasião de qualquer utilização.

Page 24: Monografia João Pedagogia 2012

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3 – Fica, pois o Campus VII da Universidade do Estado da Bahia (UNEB)

plenamente autorizado a utilizar o referido depoimento, no todo ou em parte, editado

ou integral, inclusive cedendo seus direitos a terceiros, no Brasil e/ou no exterior.

Sendo esta forma legitima e eficaz que representa legalmente os nossos interesses,

assinam o presente documento em 02 (duas) vias de igual teor e para um só efeito.

_____________________________________

[assinatura do entrevistado]

TESTEMUNHAS:

_____________________________________

1ª testemunha

_____________________________________

2ª testemunha

2.2. Fontes

2.2.1. Fontes orais

As fontes orais escolhidas são pessoas da comunidade que foram alunos ou

mantiveram relações familiares com a professora em estudo.

1. Adalgisa Alves do Nascimento.

Filha de Eleotério A. do Nascimento e Odelia A. Rosas. É residente na comunidade,

75 anos de idade, é viúva e natural deste povoado, é aposentada e estudou até a 5ª

serie do ensino fundamental.

2. Maria Perpétua Pereira da Silva

Nascida em Senhor do Bonfim, filha de Felix A. da Silva e Vanda P. da Silva, casada

residente na comunidade de Missão do Sahy, tem 53 anos de idade, é dona de casa

e tem o segundo grau completo.

Page 25: Monografia João Pedagogia 2012

25

3.Terezinha Aquino da Silva

Nasceu em Missão do Sahy, é filha de Pedro Joaquim dos |santos e Maria Xavier da

Silva, tem 79 anos de idade, é viúva e dona de casa, aposentada e foi alfabetizada

pelo antigo programa denominado MOBRAL- movimento brasileiro de alfabetização

4. Eulina Vieira Malta Valadão

Residente na comunidade de Missão do Sahy, nascida na Fazenda Varzinha em

Missão do Sahy, filha de Manoel P. da Silva e Maria dos Santos, é viúva,

aposentada, tem 60 anos de idade, foi professora leiga na comunidade e possui a 5ª

série do ensino Fundamental.

5. Mario Pereira da Silva

Filho de Manoel Pereira da Silva e Maria dos Santos, casado, 60 anos de idade,

aposentado da Via Férrea – Leste Brasileira, a sua escolaridade é o antigo curso

primário.

2.2.2. Fontes escritas

Perrot (2007). Apresenta o anonimato e o ocultamento em que as mulheres têm sido

submetidas, em relação aos homens. Traz a divulgação de fontes, registros, falas,

discursos, imagens, ideias e expressões artísticas sobre elas e por elas produzidas.

Nóvoa (2007). Estabelece a relação entre a profissionalização do professor, a

construção de sua identidade e a historia de sua vida. Valendo-se de uma

retrospectiva histórica, mostra que as tentativas de racionalização do ensino

impuseram a separação entre o eu pessoal e eu profissional do professor.

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Josso (2004). Refere-se a questão do saber e sua relação com os aprendestes.

Focaliza a perspectiva existencialista trazendo a importância do singular, do sujeito,

do experiencial, do existencial, da globalidade concreta, e da complexidade dos

processos de formação no movimento de ideias.

Louro (2007). Vem mostrar as diferenças que eram impostas pela sociedade com

relação ao homem e a mulher. A educação a ela imposta. As concepções

tradicionais de postura da mulher. As lutas destas em busca do seu espaço. A

conquista do magistério.

2.3. O local da pesquisa

No ano de 1697 os Franciscanos da Ordem Menor criaram Arraial da Missão de

Nossa Senhora das Neves do Sahy. Seus habitantes, os índios (sobretudo Payayá e

Kariri), foram vistos e tratados como uma fonte de mão de obra para o trabalho do

salitre e nas fazendas de brancos, como está escrevendo numa carta aos frades

franciscanos Luiz César de Meneses (de 12 de março de 1706).

De 24 de julho de 1722 a 5 de junho de 1724 - Missão foi elevada a categoria de vila

(virando um espaço administrativo da Coroa, com a finalidade de administrar a

justiça, efetuar a cobrança dos impostos sobre o ouro produzido pelas minas,

implantar a lei e combater a violência), mas logo depois Missão do Sahy perdeu este

título e importância, sendo esquecida e ignorada. Em 1721, num episodio dramático,

frei capuchinho, Martin de Nantes (francês), evitou a todo custo que o poderoso

Garcia D´Ávila levasse todos os índios da aldeia de Missão do Sahy como escravos

para vendê-los aos senhores de engenho da região. Em 17 de dezembro de 1841 o

juiz de direito de Jacobina, Ângelo Muniz da Silva Ferraz, assinou um documento de

apreensão de todos os bens que pertenciam a Missão. Estes bens deveriam ser

devolvidos ao último frade da Missão, frei Sebastião de Santo Antônio, segundo o

decreto de 16 de maio de 1843 (hoje ninguém sabe, onde pararam estes bens).

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Missão do Sahy hoje conta com uma população de aproximadamente 4.000

pessoas. Seus habitantes sobrevivem de pequenas culturas de subsistência e de

prestação de pequenos serviços, pois suas terras foram transformadas no passado

em latifúndios. Há um pequeno grupo de descendentes de indígenas num local

afastado, denominado "Aldeinha", fazendo o artesanato em cipó e outros artesãos

que desenvolvem suas atividades isoladamente. O distrito de Missão do Sahy é

bastante rico em cultura e história. No passado, já foi uma das localidades mais

importantes da Bahia, quando sendo um posto de fiscalização e administração da

Coroa portuguesa. Mas, depois de perder importância para localidades vizinhas

(como a Vila Nova da Rainha, atual município de Senhor do Bonfim, do qual é hoje

distrito, e Vila de Santo Antônio de Jacobina), Missão do Sahy foi ignorada e

esquecida. Atualmente existem poucos resquícios desse passado. A antiga "Missão

de Saí" dos franciscanos foi extinta em 1864.

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CAPITULO III

3.1. Dona Vanda: quem conheceu fala um pouco sobre sua vida.

Os depoimentos recolhidos sobre a vida de Dona Vanda, ressaltam a sua atuação

como professora na comunidade de Missão do Sahy; inicialmente numa área rural

conhecida como Fazenda Varzinha, onde tinha em sua casa uma escola, ensinando

a ler, escrever e contar. Para muitos dos nossos entrevistados a competência de

Dona Vanda enquanto educadora se sobrepõe ao que se toma como competência

profissional na atualidade, como explica uma das colaboradoras. “As professoras de

hoje num sabe nem a metade dela, ela ensinava aqui, depois adoeceu e parô.”

Dona Vanda foi uma professora leiga, a sua formação advém da pratica, pois não

frequentou o antigo curso de formação de magistério, curso oferecido pelo

Educandário Nossa Senhora do Santíssimo Sacramento - uma escola do ensino

privado, e de difícil acesso aos indivíduos pertencentes ás camadas populares,

especialmente aos residentes na zona rural do município. A maioria dos leigos,

eram pessoas que pouco alfabetizadas, se dispunham a ensinar o pouco que

sabiam para pessoas da comunidade que tinham interesse em aprender.

Dona Vanda ensinou na Fazenda Varzinha do ano de 1952 até 1966. Na época, a

população do povoado era pequena e a convivência entre os moradores era muito

próxima, facilitando o afeto e o respeito. Para esta professora, mãe de família,

tornou-se imperativo ter que mudar-se da zona rural com a sua família para a sede

do povoado de Missão do Sahy, uma vez que seus filhos estavam crescendo e ela

queria que eles tivessem uma educação escolar mais qualificada.

O povoado localizado nas proximidades da cidade de Senhor do Bonfim, facilitava o

seu desejo, dar aos filhos uma escolarização mais significativa. A partir da mudança

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de endereço, e da organização da vida escolar dos filhos, ela começa e exercer a

função de professora no povoado, em sua própria casa, aonde chegou a formar

turmas numerosas de pessoas que queriam aprender a ler e escrever, haja vista que

na época o índice de pessoas analfabetas era muito grande, e os professores leigos,

sempre tinham em sua casa um espaço para mais um aluno. Este era também o

lema de Dona Vanda; e desta maneira, muitas pessoas de Missão do Sahy puderam

ser educados por ela, muitos destes já faleceram, alguns permanecem na

comunidade e outros vivem em outros lugares.

Segundo depoimentos, os alunos gostavam muito dela, pois, apesar do rigor que

exigia no momento das aulas, era uma pessoa bondosa e amiga que queria

somente o bem deles. Educou desde os pais até os filhos e era muito respeitada por

todos. Muitos a tinham como uma segunda mãe e era madrinha de quase todos os

seus alunos. Estes sentiram muito a sua falta.

Madrinha Vanda, eu gostava muito dela, primeiro eu estudei cum a professora Maria Menez, depois foi cum Dona Vanda, ela também foi minha garnde amiga, cumadre e eu senti muito a separação dela, ela ajudou muito as minhas filhas, foi professora delas também, ave Maria, elas respeitava muito ela, elas choraro muito a morte dela, era como parente, num era nada de sangue, mas é como se fosse. Eu conheci esse povo todo, até o pai dela, seu Antônio.

Outro depoimento confirma a proximidade da professora com as famílias da

localidade, uma vivencia muito comum entre os professores leigos que atuavam em

comunidades rurais,

Madrinha Vanda foi minha primeira e única professora, ela começou ensiná na fazenda Varzinha, no ano de 52, me parece, eu sei que eu era pequena na época, mas quando eu fui pra escola, eu tinha 6 anos, porque eu chorava pra ir pra escola, eu via os grande, e ela dizia assim – não, eu num vô deixar ela ir pra escola não, ela ta muito pequena, eu nem me matriculei, que naquele tempo só se matriculava com 7 anos.

Na época a idade exigida para o aluno matricular-se na escola era sete (7) anos,

entendia-se que a criança nesta idade estaria pronta para assimilar os ensinamentos

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e aprender as habilidades de ler, escrever e contar, funções ensinadas nas escolas

elementares da época. Os alunos que conseguiam finalizar os estudos, alcançando

aí o quarto ano primário ou o quinto ano – admissão com Dona Vanda, estes

estavam aptos a criarem as suas próprias escolas e ou a exercer a função de

professor leigo em escolas municipais do povoado.

3.2. O trabalho de Dona Vanda, uma vocação, um dom de Deus.

Dona Vanda era, para muitos, uma pessoa sem defeito que partia o que tinha com

quem precisasse. Quebrando um pouco a hegemonia, também havia aqueles que

reafirmavam a sua atuação enquanto professora, porém, não acreditavam muito em

seu trabalho assistencialista; estes se constituíam em um número reduzido e sem

expressividade. “Ela só era professora, ela num ajudava não, que nada!”

Para a maioria, ela era uma mulher caridosa, costumava ajudar, principalmente,

aqueles que mais necessitavam e procurava atender a todos que a procuravam. “[...]

Mãe gostava de ajudar os otros que precisava, ela só negava se num tivesse como.

Ela ensinava na casa da gente a todo mundo que ia pra lá”. Outro relato destaca a

caridade da professora Vanda, “ [...] ajudava o povo, essa minina da D.., oxe, ela

dava rôpa, a cumade J, ave Maria era assim cum ela... Era gente boa , ajudava

muito!

Apesar de a educação predominante ser a tradicional, muitas atividades que a

professora realizava com os alunos eram bastante diversificadas e interessantes,

pinturas, colagem, enfeites com papel, além de frequentemente sair para passeios

em rios, fazendas e outras localidades adjacentes. A “merenda’” para os alunos era

feita pela própria professora com a ajuda dos alunos maiores, algum tempo depois é

que foi contratada uma pessoa para executar esta função.

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A atuação dos professores leigos foi muito importante especialmente para a zona

rural, num tempo em que poucos tinham o acesso ao meio escolarizado. A formação

de muitas pessoas se deu por estes profissionais que tanto contribuíram para a

educação dos indivíduos que viviam distantes dos grandes centros urbanos. “[...] Os

professores leigos naquela época se doavam, não trabalhavam apenas pelo dinheiro

não, trabalhavam por vocação, aquele dom que tinho recebido de Deus, porque o

salário sempre foi mínimo dos minimo”. (Dona Eulina). A remuneração que os

professores ganhavam era mínima, tão pouco que mal dava para se manter, mesmo

assim, estes não desistiam de fazer o trabalho que haviam escolhido por

necessidade ou por amor, mas um trabalho que tinha o objetivo de melhorara vida

daquelas pessoas.

Dona Vanda era querida por todos, porem não deixava de ter aqueles que por este

ou aquele motivo não gostavam dela. Muitos porque achavam que a falta de

interesse que seus filhos tinham com relação à escola era culpa da professora e

diziam que ela não ensinava corretamente e por isso seus filhos não aprendiam da

mesma forma que os demais alunos.

Todavia aquelas pessoas que tinham acesso ao trabalho dela sabiam o quanto ela

se esforçava e dava tudo de si para que seus alunos aprendessem, era uma

professora muito aplicada, esforçava-se o máximo para que seus alunos

absorvessem todos os conteúdos que ela passava em sala. Gostava de trabalhar

com os alunos, fazendo as atividades sempre em conjunto, fazendo uso da

criatividade.

3.3. Dona Vanda e a sala de aula: tudo que o aluno fazia, a pessoa que

cuidava da turma anotava no caderno.

Dona Vanda, ao mesmo tempo em que dava aula era dona de casa e tinha que

cumprir com os afazeres domésticos. Quando morava e lecionava na Fazenda

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Varzinha, em uma casa cedida por uma família da localidade, ela costumava ir para

rio, que não ficava muito longe da casa, lavar roupa e deixava os alunos com outra

pessoa, muitas vezes com um aluno mais velho, geralmente aquele aluno que

demonstrava ser mais desenvolvido e dedicado aos estudos.

Este aluno era responsável para anotar tudo que acontecesse de errado na classe

em um caderno e depois passar para Dona Vanda. Este aluno por sua vez sentia-se

no dever de registrar tudo, até para demonstrar competência e mostrar-se melhor

que os demais. O aluno que tivesse o nome anotado no caderno por algum ato

errado que tivesse realizado recebia um castigo como forma de punição pelo erro

cometido, exemplificado no depoimento de uma das entrevistadas.

Ela foi pro rio e deixou a classe com uns trinta alunos, que era muito, tudo que o aluno fazia, ela ou ele, a pessoa que ficava cuidando da anotava no caderno, eu coitada , deste tamanho, me deu vontade de cuspir, num fui cuspi dentro da sala e fui botá o rosto assim na janela pra cuspí lá fora e num é que o infeliz colocou meu nome, quando ela chegou, num contou historia, botou todo mundo de castigo, de joelho cum banco na cabeça. E eu era tão pequena que o banco num alcançou a minha cabeça, aí chegou o cumpadre P. e falô: - o que é que tá fazeno esses menino de joelho com um banco na cabeça? Aí ela falou: - Há é porque eu fui pro rio e eles tavo bagunçando, e eu disse: - eu num baguncei, eu simplesmente levantei a cabeça pra cuspi e o R pegou uma vareta de vilão deste tamanho e era pra bater, tu acha? (Dona Eulina).

A rigidez de Dona Vanda na educação dos alunos fazia com que ela utilizasse os

castigos como uma maneira de conseguir disciplina-los, dessa forma tinha-se a

impressão de que as crianças se tornavam mais atenciosas e obedientes. “Ela era

rígida, ela não batia pra tirar sangue, ela botava de castigo [coloca-se de joelhos

olhando pra parede], e dava bolo... [ Utilizava-se a palmatória para bater nas palmas

das mãos ] Oxe, nego tinha medo, quando via ela, ficava tudo queto, tudo era

afilhado num sabe? Hoje uns foro embora, otros já morrero e só chamavo madrinha

Vanda.”

Naquela época era comum o pai entregar os filhos para que a professora os

educasse, tanto na questão do letramento como também nas questões disciplinares.

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Em sua tese PAZ (2009) comenta alguns recortes de entrevistas, concedidas por

senhoras da comunidade de Missão do Sahy, cujo tema era a disciplina através dos

castigos sofridos pelas crianças na escola.

Perguntadas sobre qual a reação dos seus pais ao saberem que elas sofriam determinados castigos, responderam que os pais achavam que isso era bom, e até sugeriam que fosse feito dessa forma mais vezes, pois servia tanto pra torná-las mais obedientes como para que tivessem mais atenção e aprendessem mais; afinal, estavam ali para serem educadas. Neste relato encontra-se mais um resquício de ancestralidade, segundo Willeke (1974, p. 65), “[...] embora os pais não adotassem o costume de castigar os filhos em casa, eram eles próprios que permitiam e até pediam aos religiosos castigassem os filhos, demonstrando assim a sua confiança na justiça dos abarés educadores.”(p.67).

Vemos neste recorte que a disciplina era um dos pilares da educação religiosa

trazida pelos padres no período da colonização, estas práticas disciplinares como os

castigos físicos e morais, serviam como maneiras de conseguir o controle das

crianças, e através da obediência, prepará-los para o trabalho de evangelização e

civilização, uma pratica que se prolongou por muito tempo na família e nas escolas.

Dona Vanda era uma mulher que primava pela verdade e honestidade e transmitia

esses valores para seus aprendizes. Os indivíduos que passaram pela sua escola e

foram instruídos por ela, tornaram-se cidadãos responsáveis. Estes têm consciência

de que a educação que receberam dela foi o principal fator que contribuiu para que

eles se tornassem homens e mulheres de bem, pessoas integras, motivos que as

fazem lembrar de dona Vanda até hoje.

Eu aprendi com ela foi a ter caráter, responsabilidade Ne tudo aquilo que eu faço. Isso ela sempre passou pra nois, não foi todos os aluno que seguiro, mas esse foi uma contuição, uma lição que ficou. Foi respeitar os outro, principalmente os mais velho, não ter egoísmo e a partilha.

Assim, repassando bons ensinamentos, cultivando a amizade com todos foi que ela

conquistou afeto e respeito. E isso foi transmitido a seus alunos, de forma que

mesmo com o passar dos anos esses ensinamentos não deixam de fazer parte de

suas vidas e são retransmitidos para outras pessoas com as quais convivem.

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Vivendo em um local onde as dificuldades eram muitas, principalmente financeiras,

Dona Vanda nunca se seu deu por vencida batalhava e dava um jeito de reverter a

situação ou ao menos ameniza-la. Foi assim que ela foi professora e mão de família,

foi assim que ela criou e educou seus filhos, dando a estes a oportunidade de ter

uma vida mais tranquila e poder estudar e construir uma carreira profissional.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esse trabalho teve como tema a História de Mulheres Professoras, com um recorte

sobre a História de Vida e Formação da Professora Vanda Pereira da Silva, uma

professora leiga, que atuou entre os anos 50 e 90 na comunidade de Missão do

Sahy, um povoado situado no município de Senhor do Bonfim, Bahia. Teve como

objetivo reconstituir partes de história de vida da professora Vanda Pereira, a partir

da oralidade das pessoas que a conheceram e que foram seus alunos.

O caminho trilhado na construção deste trabalho se deu, a principio, pela

importância dos relatos orais, visto que a oralidade possibilitou o encontro entre a

memória e as lembranças, tornando possível reconstituir em pequenas partes da

trajetória de vida de uma pessoa que com simplicidade e muita força de vontade,

contribuiu de maneira significativa para melhoria de vidas.

Ouvir os colaboradores foi fundamental para saber e poder mostrar o quanto Dona

Vanda, como professora leiga e outros professores com esta mesma formação,

contribuíram para o desenvolvimento educativo e social de comunidades carentes

como esta, em vários recantos do interior da nossa microrregião.

Essas lembranças permitiram redimensionar a importância da trajetória de vida de

uma pessoa e trazer significado a esta existência. Pois, é refletindo acerca de

momentos que, muitas vezes foram imperceptíveis, que conseguimos ré-significar os

valores que por estes foram construídos.

Assim, concluímos dizendo que todo trabalho em prol da educação, da sociedade e

do bem comum, mesmo que em pequena intensidade produzirá efeito e deixará para

sempre a sua pequena marca, foi assim com a professora Vanda Pereira, uma das

ilustres personalidades da educação do povoado de Missão do Sahy, Bahia.

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REFERÊNCIAS

CAMARGO, Dulce Maria Pompêo de. Mundos entrecruzados: Formação de

professores leigos. Ed. Atomo e Alinea. 1997, 176 p.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática

educativa. 31ª, Ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

JOSSO, M.C. Experiência de vida e formação. Trad. José Cláudino e Júlia

Ferreira. São Paulo: Cortez, 2004, 285 p.

LOURO, Guacira Lopes. Mulheres na sala de aula. In: DEL PRIORI Mary (Org.).

História das mulheres no Brasil. 9. ed. São Paulo: Contexto, 2008.

NÓVOA, António. Vidas de professores. Edição/reimpressão: 2007, Porto Editora,

216 p.

PAZ, Maria Gloria da. História de mulheres remanescentes de Missão do Sahy/

Maria Gloria da Paz.- Natal, 2009. 195 p.

PERROT, Michelle. Minha história das mulheres. Trad. Angela M. S. Côrrea. São

Paulo: Contexto, 2007.

ARTIGOS

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010173301999000200008

http://www.anped.org.br/reunioes/27/ge23/t234.pdf

http://www.congressods.com.br/vcopehe/images/trabalhos/3.profissao_docente.Lucy%20Rosane%20O.%20Vieira%20Raposo.pdf

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73301999000200008

http://www.fcc.org.br/pesquisa/publicacoes/cp/arquivos/770.pdf

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