monografia final - jocelio menezes

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE ECONOMIA, ADMINISTRAÇÃO, ATUÁRIA, CONTABILIDADE E SECRETARIADO EXECUTIVO (FEAACS) DEPARTAMENTO DE TEORIA ECONÔMICA CURSO DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS JOSÉ JOCELIO MENEZES FILHO OS EXEMPLOS DE LONDRES E SÃO PAULO COMO EVIDÊNCIA PARA UMA POLÍTICA DE RESTRIÇÃO VEICULAR EM FORTALEZA FORTALEZA 2013

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEAR

    FACULDADE DE ECONOMIA, ADMINISTRAO, ATURIA, CONTABILIDADE

    E SECRETARIADO EXECUTIVO (FEAACS)

    DEPARTAMENTO DE TEORIA ECONMICA

    CURSO DE CINCIAS ECONMICAS

    JOS JOCELIO MENEZES FILHO

    OS EXEMPLOS DE LONDRES E SO PAULO COMO EVIDNCIA PARA

    UMA POLTICA DE RESTRIO VEICULAR EM FORTALEZA

    FORTALEZA

    2013

  • JOS JOCELIO MENEZES FILHO

    OS EXEMPLOS DE LONDRES E SO PAULO COMO EVIDNCIA PARA UMA

    POLTICA DE RESTRIO VEICULAR EM FORTALEZA

    Monografia apresentada Faculdade de

    Economia, Administrao, Aturia,

    Contabilidade e Secretariado Executivo, como

    requisito parcial para a obteno do Ttulo de

    Bacharel em Cincias Econmicas.

    Orientador: Prof. Marcelo de Castro Callado

    FORTALEZA - CE

    2013

  • Dados Internacionais de Catalogao na Publicao

    Universidade Federal do Cear

    Biblioteca da Faculdade de Economia, Administrao, Aturia e Contabilidade

    M511e Menezes Filho, Jos Jocelio.

    Os exemplos de Londres e So Paulo como evidncia para uma poltica de restrio veicular

    em Fortaleza / Jos Jocelio Menezes Filho 2013. 87 f.; il.; enc.; 30 cm.

    Monografia (graduao) Universidade Federal do Cear, Faculdade de Economia, Administrao, Aturia e Contabilidade, Curso de Cincias Econmicas, Fortaleza, 2013.

    Orientao: Prof. Dr. Marcelo de Castro Callado.

    1.Trnsito urbano - Fortaleza 2.Trnsito - legislao 3.Polticas pblicas I. Ttulo

    CDD 330

  • JOS JOCELIO MENEZES FILHO

    OS EXEMPLOS DE LONDRES E SO PAULO COMO EVIDNCIA PARA UMA

    POLTICA DE RESTRIO VEICULAR EM FORTALEZA

    Esta monografia foi submetida Coordenao do Curso de Cincias Econmicas,

    como parte dos requisitos necessrios obteno do ttulo de Bacharel em Cincias

    Econmicas, outorgado pela Universidade Federal do Cear UFC, e encontra-se

    disposio dos interessados na Biblioteca da referida Universidade.

    A citao de qualquer trecho desta monografia permitida, desde que feita de acordo

    com as normas de tica cientfica.

    Monografia apresentada Faculdade de

    Economia, Administrao, Aturia,

    Contabilidade e Secretariado Executivo, como

    requisito parcial para a obteno do Ttulo de

    Bacharel em Cincias Econmicas.

    Aprovada em: ____/____/______.

    BANCA EXAMINADORA

    ________________________________________________

    Prof. Marcelo de Castro Callado (Orientador)

    Universidade Federal do Cear (UFC)

    ________________________________________________

    Prof. Ricardo Antnio de Castro Pereira

    Universidade Federal do Cear (UFC)

    ________________________________________________

    Prof. Sandra Maria dos Santos

    Universidade Federal do Cear (UFC)

  • AGRADECIMENTOS

    Agradeo, em primeiro lugar, a Deus, por ter me concebido fora de vontade,

    coragem e dedicao, na concluso deste e de muitos outros desafios que esto por vir.

    Aos meus pais, Solange e Joclio, que mesmo morando em outra cidade,

    motivaram-me sempre e tiveram toda a pacincia necessria para comigo. Sem o apoio

    financeiro e, claro, o amor e a confiana demonstrados, nada disso seria possvel.

    Ao meu orientador, Professor Marcelo Callado, por ter cultivado a ideia deste

    trabalho e incentivado a sua realizao. Grande parte de nosso bom relacionamento se deve

    sua pacincia e disposio em ajudar seus alunos. Seu acompanhamento e suas orientaes

    foram fundamentais.

    Aos Professores Ricardo Pereira e Sandra, por aceitarem fazer parte da banca

    examinadora deste trabalho de concluso de curso.

    minha irm, Joana Darc, a quem sempre espero servir de espelho para a vida.

    O seu interesse pelos estudos muito me felicita. Espero v-la em breve ingressando no Ensino

    Superior e, se possvel, em uma universidade pblica.

    Aos meus avs, tios e primos, por sempre acreditarem em meu potencial.

    Agradecimento especial minha prima Eugnia, por sua preocupao e envolvimento direto

    com os resultados deste trabalho.

    minha namorada, Germana, por seu companheirismo e interesse demonstrados,

    discutindo quase que diariamente comigo sobre o andamento deste trabalho. Voc uma das

    pessoas que mais incentivou a conclui-lo, pode ter certeza disso.

    Aos meus amigos, em especial ao Daniel Lustosa pelas colaboraes. Tambm

    aos colegas de faculdade, especialmente Ariston e Edson Barreto, por compartilharem comigo

    vrios momentos, desde os bons aos mais difceis.

    Universidade Federal do Cear, por servir de refgio para aqueles que prezam

    por uma educao de qualidade e acreditam que as instituies pblicas de ensino do pas

    ainda so o melhor lugar para isso.

  • Uma boa cidade no aquela onde os

    cidados pobres tambm tm carro, e sim

    aquela onde, inclusive, os cidados ricos usam

    o transporte coletivo. (Enrique Pealosa)

  • RESUMO

    O trabalho em questo apresenta algumas iniciativas relacionadas busca de solues para o

    problema dos congestionamentos, por meio de restrio do uso veicular, citando como

    exemplos o pedgio urbano, aplicado na cidade de Londres, e o rodzio veicular, na cidade de

    So Paulo. Os dados fornecidos neste estudo constam em publicaes de rgos responsveis

    por gesto de trfego e de controle do transporte coletivo. Diante das experincias observadas,

    realizou-se uma anlise aprofundada e desta foram retiradas informaes quanto eficincia e

    viabilidade dos programas de gerenciamento de trfego exemplificados. Para isso, foram

    realizados estudos de viabilidade tcnica e financeira para a implantao de um programa de

    restrio circulao, assim como a anlise custo-benefcio deste. O intuito era verificar sua

    eficcia, na reduo das externalidades negativas geradas pelo trnsito intenso, e propor a

    implantao do mesmo como medida de gesto do trfego e planejamento urbano na cidade

    de Fortaleza. O resultado revela que a adoo de tais medidas capaz de reduzir as

    externalidades geradas pelo trfego nesta cidade e colaborar com a melhoria da qualidade de

    vida de seus habitantes, inclusive proporcionando a gerao de investimentos para os modais

    coletivos de transporte e os no motorizados. sugerida, portanto, a implantao de um

    pedgio urbano como instrumento de poltica pblica a favor da mobilidade.

    Palavras-chave: Restrio veicular. Externalidades. Mobilidade urbana.

  • ABSTRACT

    The work in question has some initiatives related to the search for solutions to the problem of

    congestion by restricting vehicular use, citing as examples the congestion charge, applied to

    the City of London, and vehicle rotation in the city of So Paulo. The data provided in this

    study appear in publications of agencies responsible for traffic management and control of

    public transport. Given the observed experiences, carried out a thorough analysis and were

    removed this information on the efficiency and feasibility of traffic management programs

    exemplified. For this reason, studies were carried out technical and financial feasibility for the

    implementation of a program of restriction on the movement, as well as cost-benefit analysis

    of this. The aim was to verify their effectiveness in reducing negative externalities generated

    by heavy traffic, and propose the establishment of it as a measure of traffic management and

    urban planning in the city of Fortaleza. The result shows that the adoption of such measures

    can reduce the externalities generated by traffic in this city and contribute to the improvement

    of the quality of life of its inhabitants, including providing investment generation for

    collective modes of transport and non-motorized. Its suggested, therefore, the

    implementation of a congestion pricing as an instrument of public policy for mobility.

    Keywords: Traffic restriction. Externalities. Urban mobility.

  • LISTA DE ILUSTRAES

    Figura 1 Classificao dos bens quanto rivalidade e exclusividade...................... 20

    Grfico 1 A Tragdia do Uso Comum relacionada ao trfego................................... 22

    Quadro 1 Principais caractersticas dos tipos de pedgio urbano.............................. 27

    Figura 2 Posto de identificao eletrnica de pedgio urbano em

    Singapura.................................................................................................... 29

    Tabela 1 Quadro comparativo entre trs pedgios noruegueses (Dados de

    2006)........................................................................................................... 30

    Figura 3 Placas informando a insero na rea de cobrana do Ecopass, em

    Milo.......................................................................................................... 31

    Figura 4 Posto de identificao eletrnica de pedgio urbano em

    Estocolmo................................................................................................... 31

    Figura 5 Sinalizao referente rea do pedgio urbano de Londres...................... 33

    Figura 6 rea de cobertura inicial do Congestion Charging em Londres................ 34

    Figura 7 rea mxima de cobertura do Congestion Charging em Londres,

    removida em 2011...................................................................................... 35

    Figura 8 Trnsito em Bogot no Da sin carro em 2012....................................... 41

    Quadro 2 Vantagens x desvantagens do rodzio veicular.......................................... 42

    Figura 9 Mapa do centro expandido da cidade de So Paulo................................... 44

    Figura 10 Placa referente ao rodzio municipal em So Paulo................................... 45

    Quadro 3 Objetivos e aspectos ambientais dos pedgios urbanos............................. 47

    Quadro 4 Objetivos e aspectos ambientais dos rodzios............................................ 47

    Figura 11 Mapa do metr de So Paulo...................................................................... 50

    Grfico 2 Avaliao dos usurios de nibus municipais na capital paulista.............. 51

    Grfico 3 Evoluo da frota veicular paulistana (2008-2012)................................... 52

    Grfico 4 Distribuio percentual por modais de transporte utilizados RMSP....... 53

    Figura 12 Mapa do metr de Londres......................................................................... 54

    Figura 13 Medida moderadora de trfego.................................................................. 56

    Quadro 5 Relao habitante por automvel das capitais e de Distrito Federal

    (2008)......................................................................................................... 59

    Grfico 5 Histrico de evoluo da frota veicular de Fortaleza................................. 60

    Quadro 6 Comparativo dos veculos registrados pelo Detran (Fortaleza)................. 61

  • Figura 14 A dinmica da perda de competitividade do transporte pblico urbano

    (TPU).......................................................................................................... 63

    Grfico 6 IPK do transporte pblico em Fortaleza (2000-2010)................................ 65

    Figura 15 Mapa do metr de Fortaleza....................................................................... 66

    Grfico 7 Proporo de pessoas ocupadas de acordo com o tempo deslocamento

    dirio (trajeto de ida para o trabalho)......................................................... 68

    Figura 16 Elementos bsicos que compem o SINIAV............................................. 74

    Quadro 7 Estimativa de arrecadao anual bruta do pedgio urbano........................ 76

  • LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    ALS Area Licensing Scheme

    ANTP Agncia Nacional de Transportes Pblicos

    BHTRANS Belo Horizonte Transportes

    BRS Bus Rapid System

    BRT Bus Rapid Transit

    CET Companhia de Engenharia de Trfego

    CPTM Companhia Paulista de Trens Metropolitanos

    DENATRAN Departamento Nacional de Trnsito

    DETRAN Departamento Estadual de Trnsito

    EMTU/SP Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de So Paulo

    ERP Eletronic Road Pricing

    ETUFOR Empresa de Transporte Urbano de Fortaleza

    FENABRAVE Federao Nacional da Distribuio de Veculos Automotores

    FGV Fundao Getlio de Vargas

    Ipea Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada

    IPECE Instituto de Pesquisa e Estratgia Econmica do Cear

    IPI Imposto sobre Produtos Industrializados

    IPK ndice de passageiros por quilmetro

    IPVA Imposto sobre a Propriedade de Veculos Automotores

    METROFOR Metr de Fortaleza

    NTU Associao Nacional das Empresas de Transportes Urbanos

  • RFID Radio-Frequency Identification

    RMSP Regio Metropolitana de So Paulo

    Seinfra Secretaria da Infraestrutura do Estado do Cear

    SINIAV Sistema Nacional de Identificao Automtica de Veculos

    SITFOR Sistema Integrado de Transportes de Fortaleza

    SPTrans So Paulo Transportes

    SRA Swedish Road Administration

    STPC Sistema de Transporte Pblico Complementar

    STTP Sistema de Transporte Pblico de Passageiros do Municpio

    TfL Transport for London

    TPU Transporte pblico urbano

    TRANSFOR Programa de Transporte Urbano de Fortaleza

    VLT Veculo leve sobre trilhos

    VTPI Victoria Transport Policy Institute

  • SUMRIO

    1 INTRODUO........................................................................................... 14

    2 A TEORIA ECONMICA SOBRE AS EXTERNALIDADES

    NEGATIVAS PROVENIENTES DO TRNSITO................................. 17

    2.1 O conceito de externalidades..................................................................... 18

    2.2 Correo das falhas de mercado geradas pelo trfego............................ 21

    2.3 Solues encontradas para A Tragdia do Uso Comum..................... 21

    3 A EXPERINCIA DOS PROGRAMAS DE RESTRIO

    VEICULAR PELO MUNDO.................................................................... 24

    3.1 Polticas de desestmulo ao uso de automveis......................................... 24

    3.1.1 Medidas fsicas............................................................................................. 24

    3.1.2 Medidas regulamentares.............................................................................. 25

    3.1.3 Medidas fiscais............................................................................................. 25

    3.2 Pedgio urbano........................................................................................... 26

    3.2.1 Caracterizao e classificao dos pedgios urbanos................................ 26

    3.2.2 Contextualizao.......................................................................................... 27

    3.2.3 London Congestion Charging O caso de Londres.................................. 32

    3.2.3.1 Introduo.................................................................................................... 32

    3.2.3.2 Objetivos....................................................................................................... 32

    3.2.3.3 Caractersticas.............................................................................................. 33

    3.2.3.4 Resultados..................................................................................................... 35

    3.2.3.5 Lies............................................................................................................ 37

    3.3 Rodzio de Veculos..................................................................................... 38

    3.3.1 Operao Horrio de Pico (Rodzio) O caso de So Paulo................. 42

    3.3.1.1 Introduo..................................................................................................... 42

    3.3.1.2 Objetivos....................................................................................................... 44

    3.3.1.3 Caractersticas.............................................................................................. 45

    3.3.1.4 Resultados..................................................................................................... 46

    3.4 Aspectos ambientais dos programas de restrio veicular..................... 46

    3.5 Reflexes contextuais sobre So Paulo e Londres................................... 48

    4 ANLISE ECONMICA DO CENRIO OBSERVADO E DOS

    RESULTADOS OBTIDOS: O CASO DE FORTALEZA...................... 58

  • 4.1 Mercado consumidor automotivo............................................................. 58

    4.1.1 Motivos para a preferncia pelo transporte individual.............................. 61

    4.2 Transporte pblico coletivo....................................................................... 62

    4.3 Mobilidade urbana..................................................................................... 67

    4.3.1 Poltica Nacional de Mobilidade Urbana Lei n 12.587/2012................. 69

    4.4 Anlises de viabilidade para um programa de restrio ao uso

    veicular em Fortaleza................................................................................. 71

    4.4.1 Anlise custo-benefcio................................................................................ 71

    4.4.2 Viabilidade tcnica....................................................................................... 73

    4.4.3 Viabilidade financeira................................................................................. 74

    4.5 Consideraes finais................................................................................... 75

    5 CONCLUSO............................................................................................ 78

    REFERNCIAS......................................................................................... 80

    ANEXO A MAPA DA REDE DO TRANSPORTE

    METROPOLITANO DE SO PAULO................................................... 85

    ANEXO B MAPA DE FORTALEZA POR SECRETARIAS

    REGIONAIS............................................................................................... 86

    ANEXO C MAPA DO PROJETO DE LINHAS PARA O METR

    DE FORTALEZA AT 2025..................................................................... 87

  • 14

    1 INTRODUO

    O crescimento populacional registrado no perodo ps-guerra e o fenmeno da

    urbanizao foram responsveis por desenvolver mais rapidamente as grandes cidades j

    existentes em todo o mundo. A infraestrutura destas cidades acompanhou, com alguma

    distncia, o movimento iniciado pelo crescimento populacional e construiu seus sistemas

    rodovirios que se conhece hoje. A tendncia urbanizao foi um dos fatos marcantes no

    conjunto das modificaes econmicas e sociais ocorridas no sculo passado, inclusive o

    incremento da frota veicular, com a popularizao dos automveis e o melhoramento da

    qualidade das vias pblicas.

    As pessoas no esto interessadas em pagar mais taxas, dada a relativa alta carga

    tributria j existente no Brasil. Porm, muitas delas concordam que o estresse causado pelo

    trnsito das grandes metrpoles brasileiras tambm gera inmeros prejuzos, como um maior

    desperdcio de combustvel, maior nmero de acidentes, aumento da poluio sonora e

    atmosfrica, e aquele que talvez seja o pior de todos eles: o tempo desperdiado.

    Se tudo o que foi falado a respeito do tema no atingisse as pessoas, no haveria

    discusso, o assunto dar-se-ia por encerrado e todos ficariam felizes por no terem que pagar

    mais um tributo ao governo. Acontece que essa a realidade vivenciada diariamente pela

    maioria das pessoas e envolve questes que esto ligadas aos valores defendidos por cada um,

    entre eles, ter um pouco mais de tempo de lazer ao invs de horas e horas desperdiadas em

    engarrafamentos semanalmente.

    Solues comeam a ser propostas, a fim de resolver ou pelo menos amenizar a

    situao das metrpoles. A inteno a de que sejam criadas formas de desestimular o uso

    excessivo dos automveis particulares, optando-se pelo sistema de transporte pblico coletivo

    ou outros meios alternativos, como a bicicleta.

    O exemplo mais significativo de como solucionar problemas relativos ao trnsito

    das grandes metrpoles o da cidade-estado de Singapura, no sudeste asitico, que j em

    1975, implantou um pedgio urbano conhecido por Area Licensing Scheme ALS (Regime

    de Licenciamento de rea), cujo intuito era aumentar em 40% a frota de nibus, introduzir 70

    km de faixas seletivas e estabelecer um novo sistema de transporte de massa (CMARA E

    MACEDO, 2004), a fim de se evitar que os congestionamentos continuassem interrompendo

  • 15

    o fluxo normal do trfego. O pedgio urbano de Singapura funciona at os dias de hoje e j

    sofreu modificaes, de forma a adaptar-se s novas necessidades e realidade local.

    O objetivo do presente trabalho analisar a eficcia dos programas de

    gerenciamento do trfego urbano, testando a viabilidade daquele que se mostrar mais eficiente

    na reduo dos congestionamentos, de modo a sugeri-lo como instrumento de poltica pblica

    para a cidade de Fortaleza. Seguindo o exemplo de outras grandes cidades do mundo, como

    Singapura, Oslo, Estocolmo, Milo, Jacarta, entre outras, Londres e So Paulo tambm

    interferiram no direito de ir e vir de seus moradores, aplicando-lhes metodologias restritivas, a

    fim de se evitar o agravamento da situao, devido ao intenso trfego de veculos. chegada

    a vez de a capital cearense participar deste tipo de experincia que, pode-se afirmar, mais

    cedo ou mais tarde iria tornar-se necessria. O fato da aplicao, pelas autoridades

    responsveis, deste tipo de medida ocorrer independe das anlises obtidas, mas de interesse

    conseguir chegar a um resultado coerente e que possua aplicabilidade para o caso em questo.

    A experincia de Fortaleza, em relao s elevadas taxas do fluxo de veculos,

    proporciona aos cidados uma sensao de incmodo e a dvida se haver ou no solues

    daqui a alguns anos. A cidade, assim como outras tantas metrpoles brasileiras, tem

    apresentado alteraes em sua configurao urbana no decorrer dos anos e, mesmo assim, os

    problemas s parecem agravar-se. no sentido de mostrar que existem solues passveis de

    serem aplicadas que o presente trabalho est sendo desenvolvido.

    A justificativa deste trabalho baseia-se, portanto, na quase inexistncia de estudos

    e iniciativas de desestmulo ao uso do transporte individual em Fortaleza, na tentativa de

    reduzir os nveis de trfego atuais. Alm das cidades de Londres e So Paulo, considerar-se-

    o para o estudo outros exemplos de grandes metrpoles mundiais, como poder ser

    verificado na terceira seo, que viram em tais programas a nica sada vivel para seus

    problemas relativos ao trnsito.

    Alm do mtodo de pesquisa bibliogrfica, o trabalho em questo se utilizar da

    metodologia da anlise de custo-benefcio, atravs da relao benefcio-custo, no intuito de

    testar a viabilidade do projeto de implantao de um modelo de gesto do trfego, com carter

    restritivo circulao veicular, em Fortaleza. Na obteno das estimativas dos nveis de

    arrecadao e de capacidade de implantao e manuteno do programa, realizar-se-o as

    avaliaes de viabilidade tcnica e financeira do mesmo.

  • 16

    Por questes tcnicas, no ser adentrado o assunto no tocante de como ocorrer a

    implantao das estruturas tecnolgicas que integraro o sistema proposto a ser adotado em

    Fortaleza. Todavia, buscar-se- analisar os detalhes mais pertinentes, principalmente os de

    cunho econmico, exprimindo as solues encontradas nas cidades exemplificadas, de modo a

    propor as mais eficazes e que possuam adequabilidade realidade cearense.

    Vale ainda salientar que este estudo no visa encerrar as discusses sobre o tema,

    mas sim estimular a existncia de novos trabalhos, de modo a contribuir para uma melhor

    soluo para a questo do trnsito na cidade de Fortaleza.

    De forma a colaborar com o entendimento daqueles que o venham a fazer uso,

    este trabalho est dividido em cinco sees, sendo esta a primeira delas, referente sua

    introduo ao tema.

    A segunda seo apresenta o arcabouo terico que rodeia alguns conceitos

    econmicos, com destaque para o conceito de externalidade, tornando-se personagem

    principal em certos momentos do trabalho. Termina-se com a discusso sobre a natureza das

    vias pblicas e a existncia de A Tragdia do Uso Comum, ocasionada pelo uso

    indiscriminado destas.

    A terceira seo, por sua vez, responsvel por realizar uma abordagem sobre os

    principais programas de gerenciamento de trfego urbano implantados pelo mundo at os dias

    atuais e como se comportaram os agentes, de modo a adaptar-se a tais mudanas. Evidenciam-

    se as cidades de Londres e So Paulo e suas experincias quanto existncia de programas de

    restrio ao uso veicular e seus impactos. realizado um comparativo entre as duas cidades,

    de modo a verificar a situao do trfego em momentos pr e ps-aplicao de seus

    respectivos programas.

    Na quarta seo realizado um panorama sobre a situao do trnsito na cidade

    de Fortaleza. Alm disso, aplicada a metodologia de viabilidade tcnica e econmica, aps a

    definio do programa de restrio veicular mais indicado para esta cidade, de modo a sugerir

    sua implantao.

    E, por fim, a quinta seo apresenta a concluso do trabalho, com base na

    demonstrao dos resultados obtidos e a proposta de implantao de um modelo de restrio

    veicular mais adequado realidade do trnsito na cidade de Fortaleza.

  • 17

    2 A TEORIA ECONMICA SOBRE AS EXTERNALIDADES NEGATIVAS PROVENIENTES DO TRNSITO

    A definio exata daquilo que, por natureza, possui classificao exclusiva de bem

    pblico ou bem privado, vem sofrendo certas modificaes nos manuais de microeconomia.

    As novas caractersticas incorporadas por alguns desses bens, advm da evoluo das

    interaes entre os agentes econmicos, algumas antes mesmo inexistentes. Exemplo tpico e

    que vem tomando forma na teoria econmica o caso das vias pblicas. O que, por definio,

    deveria ser essencialmente um bem pblico, de certo tempo tem apresentado caractersticas

    diferenciadas. Tais caractersticas so decorrentes de modificaes sofridas pelo bem, no que

    diz respeito ao tratamento de solues para novos problemas que o atingem diretamente.

    A restrio veicular, em vias pblicas de grandes metrpoles mundiais, uma

    delas e vem se tornando uma prtica comum e quase que necessria, a fim de solucionar

    problemas relacionados s externalidades negativas geradas como: a poluio atmosfrica, os

    acidentes de trnsito, o uso sem precedentes dessas vias e, principalmente, as muitas horas

    perdidas semanalmente em congestionamentos, pelos usurios constantes destas.

    Em horrios de pico, em que o trfego de veculos nas ruas normalmente

    intenso, as filas de congestionamento chegam a dezenas de quilmetros facilmente em alguns

    centros urbanos. Na realizao deste trabalho, dois bons exemplos sero constantemente

    citados e tero suas possveis solues como base para futuras comparaes: o pedgio urbano

    utilizado na cidade de Londres e o sistema de rodzio, este aplicado na cidade de So Paulo.

    Apesar de possurem objetivos iniciais distintos e adotarem, na sua realizao,

    vrios mtodos no tratamento e na gesto da questo do trfego, ambas as cidades usufruem

    de seus sistemas at hoje, podendo trocar experincias com outros grandes centros e servirem

    de modelo para novas investidas. Os resultados acarretados obtiveram impactos sobre os

    hbitos das pessoas diretamente afetadas e a maneira como elas passaram a tratar as propostas

    e a adoo das medidas para se reduzir o fluxo de automveis em situaes especficas.

    No menos interessante buscar compreender a ligao existente entre o

    crescimento econmico e o agravamento de problemas relacionados s externalidades

    negativas geradas pelo trfego, como vem acontecendo ultimamente em alguns pases a

    exemplo do Brasil. Adquirir automveis visto, em algumas sociedades, o primeiro

    indicativo ou mesmo o sinnimo de elevao do status social. No caso brasileiro, a recente

  • 18

    expanso das classes C e D revelou no s um aumento de riqueza no pas, mas um maior

    nmero de veculos circulando nas ruas e, consequentemente, o surgimento de mais

    problemas, resultados destes incrementos na frota.

    O crescimento econmico, por sua vez, compreendido apenas pelos indicadores

    quantitativos da economia, os quais no buscam criar relaes com o bem-estar populacional.

    Taylor (2002 apud TORRES, 2007, p. 1) considera os congestionamentos como um dos

    principais problemas gerados pelo trfego, ao afirmar que [...] como se os

    congestionamentos fossem considerados uma doena do crescimento um mal inevitvel,

    um indicador da vitalidade econmica. Os seus transtornos fazem parte dos problemas da

    vida na cidade grande.

    2.1 O conceito de externalidades

    Inicialmente, o problema parte do princpio das externalidades negativas geradas

    pela utilizao indiscriminada das vias pblicas, devido falta de gesto necessria,

    responsvel pelo uso desse bem.

    Para uma melhor abordagem, faz-se necessrio, primeiramente, uma compreenso

    do que seriam as externalidades. interessante a definio de Hunt (1981, p. 412), quando

    este afirma:

    Sempre que a utilidade para um indivduo no seja uma questo puramente pessoal,

    individual, quer dizer, sempre que a utilidade para uma pessoa seja afetada pelo

    consumo de outras pessoas (ou pela produo das firmas), estes efeitos interpessoais

    so chamados de externalidades.

    Tem-se, portanto, o entendimento de que uma ao privada possa gerar efeitos

    colaterais que afetem outros indivduos de alguma maneira, seja gerando benefcios ou custos

    aos demais.

    O conceito de externalidade est atrelado a efeitos que no so repassados de

    forma coerente ao mercado, ocasionando as falhas de mercado que se refletiro, muitas vezes,

    em questes de interesse pblico, principalmente quando envolvem bens essencialmente

    pblicos.

    Para Varian (2002, p. 671), uma externalidade de consumo ocorre:

  • 19

    [...] se um consumidor se preocupar diretamente com a produo ou consumo de

    outro agente. Por exemplo, tenho preferncias definidas sobre meu vizinho tocar

    msica alta s trs da madrugada, ou sobre a pessoa sentada a meu lado num

    restaurante fumar um charuto barato ou sobre a quantidade de poluio produzida

    pelos automveis de minha cidade.

    O autor refere-se externalidades de consumo negativas. Elas so responsveis

    por restringir ou, de alguma forma, perturbar o bem-estar dos demais agentes envolvidos.

    Estes, por sua vez, estariam dispostos a pagar um preo pela no reduo de seu bem-estar,

    caso este bem (poluio sonora ou atmosfrica) estivesse disponvel no mercado.

    Para o caso em especfico, o que interessa principalmente demonstrar que este

    tipo de externalidade gerada, por exemplo, pode estar levando as pessoas que enfrentam

    congestionamentos nas grandes cidades a estarem dispostas a aceitar medidas para a reduo

    dos impactos ocasionados pelo fluxo intenso de automveis nas vias pblicas. Mesmo que tais

    medidas incluam o pagamento de uma taxa para dirigir em determinado permetro ou ainda

    no poder utilizar seu carro por alguns dias da semana.

    As vias pblicas, originalmente, possuem classificao de bem pblico. Ou seja,

    so bens no rivais (o uso de um consumidor adicional no impede os demais de usufrurem o

    bem) e no exclusivos (as pessoas no podem ser impedidas de utiliz-lo). Pindyck e

    Rubinfeld (2010, p. 546) definem este tipo de bem como sendo [...] uma mercadoria que

    pode ser disponibilizada a baixo custo para muitos consumidores, mas, assim que ela

    ofertada para alguns, torna-se muito difcil evitar que outros tambm a consumam.

    Pindyck e Rubinfeld (2010, p. 602) mostram ainda como ocorre o uso de tais

    bens. Continuam, afirmando que:

    [...] para alguns bens, os consumidores adicionais no ocasionam custos.

    Consideremos a utilizao de uma estrada durante um perodo de pouco trnsito.

    Como a estrada j existe e no h congestionamento, o custo adicional de sua

    utilizao igual a zero. Ou ento consideremos a utilizao de um farol por um

    navio. Desde que o farol esteja construdo e em funcionamento, seu uso por uma

    embarcao adicional no acrescentaria nada a seu custo operacional.

    O diagrama abaixo responsvel por esclarecer o movimento que vem ocorrendo

    na definio do conceito de vias pblicas e que motivou a presente pesquisa. O modelo que

  • 20

    segue apresentado na Figura 1 apenas uma adaptao do que pode ser encontrado em alguns

    manuais de microeconomia.

    Figura 1 Classificao dos bens quanto rivalidade e exclusividade

    RIVALIDADE

    SIM NO

    SIM

    EXCLUSIVIDADE

    NO

    Fonte: Elaborada pelo prprio autor.

    O que vem ocorrendo nos grandes centros urbanos o apelo para a soluo do

    problema do trfego que, alm de piorar a situao do ar, tem ocasionado grandes

    desperdcios de tempo com os congestionamentos, principalmente nos horrios de rush,

    gerando um grande aumento nos custos sociais.

    A aplicao de um programa de restrio veicular como o rodzio, por exemplo,

    tende a transformar as vias pblicas, com caractersticas de recursos em comum, novamente

    em bens pblicos. O pedgio urbano, com objetivos diferenciados do rodzio, tende a

    transform-las em monoplios naturais, a partir do momento em que passa a cobrar pelo seu

    uso. Porm, o que se visa realmente obter o resultado dessas transformaes e se estas esto

    conseguindo cumprir com suas intenes inicialmente propostas, que a de reduzir um ou

    mais dos tipos de externalidades que possam ser provenientes do trnsito.

    A literatura afirma que os monoplios tendem a ser ineficientes, dado o fato de a

    produo sempre ser inferior a quantidade tima, cobrando inclusive preos mais altos, acima

    do custo marginal. Devido a perda de excedentes por parte do consumidor e do produtor,

    gerado um peso morto, representado pelos custos sociais (PINDICK e RUBINFELD, 2010).

    Torres (2007, p. 14) cita Vasconcelos (2001) ao afirmar que este chama a

    ateno para a distino que se deve fazer entre as externalidades provocadas pelos indivduos

    congestionamentos, acidentes, poluio, sobretudo e aquelas de responsabilidade do poder

    pblico a organizao do ambiente construdo e os correspondentes conflitos de trfego.

    BENS PRIVADOS

    Vias pblicas congestionadas e com

    pedgio.

    MONOPLIO NATURAL

    Vias pblicas no congestionadas

    e com pedgio.

    RECURSOS EM COMUM

    Vias pblicas congestionadas e sem

    pedgio.

    BENS PBLICOS

    Vias pblicas no congestionadas

    e sem pedgio.

  • 21

    Remete-se s falhas de mercado que, por muitas vezes, necessitam da interveno do Estado,

    o qual seria o nico ator interessado em intermediar operaes desta natureza.

    Do ponto de vista do trfego urbano, a sobreutilizao das modalidades de

    transporte individual, e a consequente subutilizao do transporte coletivo, podem

    ser caracterizadas como falha de mercado. Se, por um lado, o uso do transporte

    individual gerador de externalidades negativas (poluio do ar e

    congestionamento), por outro, o uso do transporte coletivo redutor destas

    (GOMIDE E MORATO, 2012, p. 17).

    2.2 Correo das falhas de mercado geradas pelo trfego

    No intuito de corrigir as falhas de mercado, geradas pelo uso indiscriminado dos

    automveis nas vias pblicas urbanas, o poder pblico dever agir objetivando a melhor

    alocao dos recursos. Segundo Gomide e Morato (2011, p. 17), existem duas formas mais

    usuais para se chegar a uma alocao mais eficiente dos recursos disponveis.

    A primeira delas por comando e controle. Segundo os autores, este modelo de

    regulao caracteriza-se por envolver o monitoramento constante do comportamento dos

    agentes atingidos e consequente aplicao de punies, caso ocorra desobedincia s normas.

    Equivaleria, portanto, proibio de circulao veicular, assim como a aplicada nos sistemas

    de rodzio.

    A segunda forma por incentivos. Novamente, segundo os autores, essa forma de

    regulao almeja a mudana de comportamento dos agentes regulados para um nvel mais

    prximo do desejado. Para isso, o regulador deve montar uma estrutura de incentivos de modo

    que o regulado informe suas preferncias. Os pedgios urbanos funcionam desta forma

    quando impem um custo financeiro adicional utilizao dos veculos. De alguma forma, o

    governo est incentivando a populao ao uso do transporte coletivo ou outros menos

    poluentes, como bicicletas, por exemplo. No final das contas, essa induo comportamental

    gera uma mudana nas preferncias dos usurios, sem a necessidade de proibies.

    2.3 Solues encontradas para A Tragdia do Uso Comum

  • 22

    A utilizao sem precedentes dos bens pblicos leva a um caso conhecido na

    teoria econmica como A Tragdia do Uso Comum. Ela se refere ao fato de que o resultado

    das interaes econmicas ser ineficiente quando os direitos de propriedade no forem bem

    definidos. Varian (2002) cita o exemplo de um vilarejo agrcola onde os habitantes podem

    criar seu gado em um pasto comunitrio. Depois de analisar o caso em que o pasto de

    propriedade privada e algum estabelece o nmero de vacas que podem ser criadas no espao

    delimitado, o autor parte para o caso em que o acesso livre e irrestrito, e chega seguinte

    concluso: [...] mas o que ele (habitante) deixa de considerar em seu clculo o fato de que

    sua vaca reduzir a produo de leite de todas as outras. Como ele ignora o custo social de sua

    compra, haver vacas em excesso no pasto comum (VARIAN, 2002, p. 689).

    Adaptando para o caso em voga, as vias pblicas urbanas tambm devero

    apresentar uma superlotao, isso se no houver a presena de um mecanismo que restrinja

    sua utilizao. No Grfico 1, pode-se observar como se d ilustrativamente a situao em

    questo.

    Grfico 1 A Tragdia do Uso Comum relacionada ao trfego

    Fonte: Nash (2007, p. 12)

    A linha APC representa o custo mdio privado, percebido por cada um dos

    usurios que decidirem trafegar pela via. A linha MC, por sua vez, representa o custo

    marginal dos usurios em conjunto. A diferena existente entre as duas linhas, ou seja, c* e co,

    exatamente o custo das externalidades geradas, os quais se diferenciam aps o ponto de

    congestionamento fc ser atingido.

  • 23

    As solues possveis para o problema A Tragdia do Uso Comum seriam duas:

    ou que a propriedade passe a ser privada, afim de que algum formule as regras para o uso

    eficiente da mesma; ou que se crie um sistema de leis que realizem essa funo, desde que

    seja bem definido e no apresente ambiguidades (VARIAN, 2002).

    Alm do que, para ser eficiente, a tarifa de congestionamento deve corresponder

    ao custo externo do trfego, significando a internalizao1 da externalidade, o que eliminaria

    a falha de mercado e permitiria o alcance da condio de mximo bem-estar social, conhecido

    na teoria econmica pelo conceito de Eficincia ou timo de Pareto2. Mas no segundo

    ponto observado por Varian (2002) em que a figura do Estado, presente nas sociedades

    democrticas atuais, incorporada, com a funo de criar leis que levem a uma utilizao

    racional das vias pblicas.

    1 Com a aplicao da tarifa, objetiva-se garantir que o motorista assuma o custo total por suas aes.

    2 Desenvolvido pelo economista italiano Vilfredo Pareto, afirma que uma situao tima no sentido de Pareto

    se no for possvel melhorar a utilidade de um agente sem reduzir a utilidade dos demais agentes envolvidos

    (VARIAN, 2002).

  • 24

    3 A EXPERINCIA DOS PROGRAMAS DE RESTRIO VEICULAR PELO

    MUNDO

    A presente seo objetiva verificar as caractersticas dos principais programas de

    restrio veicular existentes pelo mundo. Os modelos de gerenciamento de controle do trfego

    considerados para o estudo, ou seja, os pedgios urbanos e os rodzios, so analisados

    pormenorizadamente, englobando os casos das cidades de Londres e So Paulo e suas

    medidas para conter as externalidades negativas geradas pelo intenso fluxo de automveis.

    Aps analisar seus resultados separadamente, faz-se necessrio realizar algumas

    comparaes, a fim de demonstrar a real situao em que se encaixam os centros urbanos

    escolhidos como exemplo e as concluses que se podem retirar, teis criao de novos

    programas de gerenciamento de trfego.

    3.1 Polticas de desestmulo ao uso de automveis

    Entre as polticas de desestmulo ao uso de automveis nos grandes centros

    urbanos, o poder executivo pode-se utilizar de medidas formuladas em trs nveis. So eles:

    medidas fsicas, regulamentares e fiscais. Vale ressaltar que tais medidas atuam

    essencialmente sobre restries de circulao veicular e estacionamento (CRUZ, 2006, p. 23).

    3.1.1 Medidas fsicas

    Objetivam restringir circulao e estacionamento em algumas reas, com o auxlio

    de barreiras fsicas ou mudanas na infraestrutura (CRUZ, 2006). Entre elas, pode-se citar:

    Moderao de trfego Dar-se- conforme alteraes geomtricas realizadas na

    via, atravs da construo de lombadas, sinuosidades ou mesmo de rotatrias especiais, em

    alguns casos. Tais medidas reduzem a velocidade do trfego imposto na via, o que acaba por

    desestimular a utilizao desta pelos motoristas.

    Sinalizao Visam limitar ou restringir determinadas manobras de parada ou

    estacionamento. A sinalizao pode ocorrer pelo uso de placas (vertical) ou pinturas na

    prpria via (horizontal). Como exemplo, pode-se citar o fato de no poder estacionar em

    determinadas ruas, visto a presena de sinalizao indicativa.

  • 25

    Clulas de trfego Barreiras fsicas impedem a existncia de mais de uma

    entrada em determinada rea. Tal passagem tambm servir como sada para quem adentrar

    no espao delimitado. A reduo dos fluxos de passagem serve como forma de controle,

    evitando o uso indiscriminado pelos motoristas.

    3.1.2 Medidas regulamentares

    Coexistem mediante legislao especfica. O controle e a fiscalizao ocorrem

    conforme as restries previstas em tal legislao (CRUZ, 2006). So elas:

    Limitao de vagas Corresponde a obrigatoriedade de existncia de vagas

    especiais, destinadas a idosos ou pessoas com mobilidade reduzida (deficientes fsicos).

    Restrio de horrio ou limitao de estacionamento Equivale a placas

    especiais de permisso de estacionamento. Alm de simbolizarem a permisso de estacionar,

    informam logo abaixo quais as condies a serem respeitadas para que seja permitido

    estacionar.

    Restrio de circulao Caracteriza os rodzios municipais, como os aplicados

    em Cidade do Mxico, So Paulo e Bogot. Algumas imposies caractersticas so utilizadas

    como, por exemplo, a definio dos dias de rodagem com base nos finais das placas dos

    veculos particulares.

    3.1.3 Medidas fiscais

    A cobrana pela utilizao da infraestrutura viria se d atravs de taxao sobre a

    circulao e o estacionamento de veculos, em determinados permetros (CRUZ, 2006).

    Elevao de carga tributria sobre estacionamentos particulares O aumento

    dos impostos cobrados aos estabelecimentos que funcionam como estacionamentos

    particulares devero ser repassados indiretamente aos motoristas, mediante elevao dos

    preos por utilizao destes. Serve como desestmulo ao uso de automveis particulares,

    conforme o encarecimento dos custos transacionais finais.

    Cobrana de estacionamento em vias pblicas Determinadas vias podem

    fazer parte de uma nova modalidade de cobrana: pagar para estacionar, na prpria via

  • 26

    pblica, est tornando-se algo comum nos grandes centros urbanos. Equivale dizer que, para

    poder deixar o carro em algumas ruas da cidade, necessrio realizar pagamento antecipado,

    o que d o direito de estacionar. O exemplo mais comum conhecido por estacionamento em

    Zona Azul, aplicado em algumas cidades brasileiras.

    Pedgio urbano Para poder ter acesso a determinados limites urbanos, o

    usurio de veculo particular, que decidir realizar a viagem utilizando-se deste, dever

    desembolsar uma quantia referente a utilizao do espao pblico. Possibilita diversas formas

    de efetuar o pagamento: antecipado, presencial, transferncia eletrnica ou mediante registro

    de cobrana, com pagamento posterior.

    3.2 Pedgio urbano

    Entre as medidas fiscais de desestmulo ao uso de automveis supracitadas,

    encontra-se o pedgio urbano. Esta medida possui extrema importncia para o

    desenvolvimento da atual pesquisa, especialmente quando classificada como programa de

    gerenciamento de trfego urbano.

    3.2.1 Caracterizao e classificao dos pedgios urbanos

    Os pedgios urbanos, aps serem caracterizados, podem ser classificados quanto

    forma ou ao tipo. No que se refere forma de aplicao das tarifas, ou seja, seu objetivo, os

    pedgios podem ser de financiamento, de regulao ou ambiental (CETUR, 1994 apud

    Torres, 2007, p. 50).

    O pedgio de financiamento tem por finalidade gerar receitas a serem utilizadas

    na expanso, manuteno ou construo de vias. No possuem o intuito de restringir o

    trfego, visto que isso acarretaria reduo em suas receitas. No caso do pedgio de regulao,

    sua finalidade maximizar o bem-estar social, atravs da reduo ou eliminao das

    externalidades oriundas do trfego intenso. Seu foco no est voltado para a gerao de

    receitas e, desse modo, poder utilizar-se de tarifas variveis (TORRES, 2007).

    O pedgio ambiental, por sua vez, equivale a uma extenso do de regulao, visto

    que considera no apenas a questo dos congestionamentos, mas principalmente os danos

    causados por estes ao meio ambiente, seja em relao poluio atmosfrica e/ou sonora

  • 27

    (TORRES, 2007). Mesmo assim, o pedgio poder ter carter estritamente ambiental, como

    o caso de Milo, que ser apresentado mais adiante.

    No que se refere ao tipo, os pedgios urbanos podem classificados em trs, desde

    que levados em considerao na anlise, conjuntamente, sua abrangncia e forma de

    aplicao. So eles: pedgio de eixo ou de concesso, pedgio de corda (cordon toll) e

    pedgio de zona. Como pode ser observado abaixo, o Quadro 1 resume suas principais

    caratersticas:

    Quadro 1 Principais caractersticas dos tipos de pedgio urbano

    Pedgio de eixo ou de

    concesso

    Pedgio de corda ou

    cordo (Cordon toll) Pedgio de zona

    Finalidade Financiamento de

    infraestruturas

    Controle do trfego

    em uma rea

    delimitada

    Controle do trfego em

    uma rea delimitada

    Abrangncia Uma nica via expressa,

    ponte ou tnel

    Todas as vias no

    interior do cordo

    Todas as vias no interior

    da zona delimitada

    Fato gerador da

    cobrana

    Passar pelo posto de

    coleta (praa de pedgio)

    Cruzar o permetro

    do cordo de acesso

    rea restrita

    Entrar, circular ou

    estacionar no interior da

    zona restrita

    Formas de

    fiscalizao e

    cobrana

    Manual ou automtica na

    praa de pedgio

    Fiscalizao

    eletrnica e cobrana

    automtica

    Fiscalizao eletrnica e

    cobrana automtica

    Perodo de cobrana Todos os dias (24 h) Dias teis (manh e

    tarde)

    Dias teis (manh e

    tarde)

    Flexibilidade da

    tarifa Fixa Varivel Fixa ou varivel

    Eficcia na

    arrecadao Alta Baixa Baixa

    Eficcia na

    eliminao de

    congestionamentos

    Baixa Alta Alta

    Exemplos Ponte Rio-Niteri Singapura Londres

    Fonte: Adaptado de Gomide e Morato (2011).

    3.2.2 Contextualizao

    A expresso pedgio urbano, apesar de no definir com exatido os objetivos dos

    programas desse cunho, atualmente a mais utilizada e aceita, inclusive no meio acadmico

    dos cursos de Engenharia de Trfego e Urbanismo. Tambm conhecido por congestion

    charging, urban toll ou ainda congestion pricing, o pedgio urbano no uma ideia nova,

    como muitas pessoas podem suspeitar, devido sua recente notoriedade na mdia.

  • 28

    Segundo Lucas Junior (2009), o economista canadense William Vickrey,

    considerado o pai do pedgio urbano, j propunha medidas de restrio veicular em 1952, a

    fim de colaborar para uma maior fluidez do trnsito em New York. Seus esforos foram

    reconhecidos e ele foi o vencedor do Prmio Nobel de Economia em 1996.

    Tarifar os congestionamentos, nada mais do que uma forma de realizar a

    regulao por meio de incentivos. No indica exatamente uma proibio, mas sim um

    incentivo a comportar-se da forma que se desejada. Logo, mediante a taxao pela utilizao

    das vias pblicas congestionadas, a contrapartida do pedgio urbano seria uma via mais livre,

    que levaria o seu usurio a realizar um deslocamento mais rpido (GOMIDE E MORATO,

    2011).

    Na dcada de 70, duas cidades elaboraram projetos at ento inovadores, no que

    diz respeito ao gerenciamento do trfego urbano, a fim de limitar o intenso fluxo de veculos

    automotores, com a implantao de pedgios urbanos. Foram elas Londres, que acabou por

    arquivar o projeto por aproximadamente 30 anos, e Singapura, que o implantou em pouco

    tempo e obteve sucesso em relao aos seus objetivos inicialmente propostos (CMARA E

    MACEDO, 2004).

    A cidade-estado de Singapura foi a primeira cidade a experimentar um sistema de

    gesto de trfego baseado em restrio veicular. Estima-se que cerca 45.000 veculos

    trafegavam no permetro do centro urbano, no horrio matutino de pico. O projeto inicial

    abrangia uma rea 7,2 km2 e com um horrio reduzido, apenas de 7:30 s 9:30, de segunda a

    sbado. Logo estendeu-se s 10:15 e posteriormente passou a compreender um intervalo no

    perodo do rush da tarde, conforme cita Lucas Junior (2009). Os resultados foram positivos,

    com o aumento do uso do transporte pblico e consequente reduo do uso de automveis.

    Segundo Cmara e Macedo (2004), o governo local registrou uma reduo de 45% do trfego

    e de 25% dos acidentes de trnsito, logo aps a implementao do pedgio.

    Entre as mudanas mais significativas, o pedgio passou a ser automatizado3 e

    atualmente cmeras registram a entrada do veculo na rea pedagiada, que cobrar ou no a

    tarifa graas a um equipamento que dever ser instalado no para-brisa dos carros. Os portais

    que registram a passagem dos automveis, como o mostrado na Figura 2, ainda utilizam

    radiofrequncia para identificar o uso do equipamento, inclusive um carto com crditos

    3 O sistema conhecido por Eletronic Road Pricing (ERP) possibilita, inclusive, criar taxas especficas para cada

    tipo de veculo, de acordo com cada situao de trfego (GOMIDE E MORATO, 2011).

  • 29

    recarregvel. O horrio de cobrana, que agora compreendido de 7:30 s 19:00, tem a

    determinao dos valores a serem pagos mediante vrios fatores, incluindo tipo de veculo,

    local, horrio e ndices de congestionamento na regio. Com base nos dados disponibilizados

    pela VTPI em 2005, Lucas Junior (2009, p. 25) discorre sobre as mudanas realizadas no

    pedgio e conclui que, com o novo sistema:

    [...] houve uma reduo de 24.700 carros no perodo de pico e um aumento na

    velocidade em 22%. Houve tambm uma reduo de 13% no trfego total da zona

    pedagiada, passando de 270.000 para 235.100 veculos/dia. Tambm foi reduzido o

    nmero de carros com um nico ocupante, alm da mudana do horrio de viagens,

    que passaram a ser feitas em perodos menos congestionados.

    Singapura obteve sucesso com a implantao de seu sistema de restrio veicular,

    visto que conseguiu uma maior conscientizao da populao em relao aos custos gerados

    pelos congestionamentos, assim como alterou os hbitos de boa parte de seus usurios, o

    suficiente para comprovar a eficincia do esquema, mediante as pontuais intervenes

    realizadas pelas autoridades responsveis.

    Figura 2 Posto de identificao eletrnica de pedgio urbano em Singapura

    Fonte: http://vejasp.abril.com.br/

    Assim como Singapura, outras cidades implantaram sistemas de pedgio urbano,

    entre elas algumas cidades norueguesas. A primeira delas foi Bergen, j no ano de 1986.

    Depois dela vieram Oslo (1990), Trondheim (1991), Kristiansand (1997), Stavanger (2001),

    Namsos (2003) e Tnsberg (2004). A medida foi bem aceita pela populao e, por este

    motivo, obteve sucesso em sua propagao. Porm, vale ressaltar que, alm de servir para

    conter os primeiros congestionamentos, os esquemas de restrio veicular na Noruega tinham

  • 30

    como principal objetivo a gerao de receitas para serem reinvestidas nos sistemas de

    transporte, como a construo de novas vias. Suas funes, portanto, diferem dos demais

    pedgios, visto que no objetivam inibir o trfego. Por este motivo, os pedgios noruegueses

    so justificados por cobrarem taxas bem inferiores s cobradas em Londres ou Singapura, por

    exemplo.

    O exemplo da capital Oslo tambm interessante: a cobrana feita 24 horas

    desde sua inaugurao, em qualquer dia da semana, com tarifa nica para qualquer horrio

    (LUCAS JUNIOR, 2009, p. 29). Isso ocorre desde o incio devido a promessa de instalao

    do pedgio para arrecadao exclusiva para as obras do sistema virio e infraestrutura dos

    transportes coletivos. difundido o uso de tags nos veculos: equipamentos eletrnicos por

    meio dos quais possvel identificar automaticamente o pagamento antecipado do pedgio,

    evitando assim a necessidade de utilizar do pagamento manual. Em Bergen, por exemplo, a

    Swedish Road Administration (SRA), agncia governamental responsvel pela administrao

    e manuteno dos pedgios no pas, disponibiliza planos que equivalem a pagamentos anuais

    do pedgio e que acaba por gerar um desconto no valor final desembolsado.

    Tabela 1 Quadro comparativo entre trs pedgios noruegueses (Dados de 2006)

    Fonte: LUCAS JUNIOR (2009).

    Outros pedgios urbanos conhecidos e importantes por agregarem valor

    restrio veicular imposta so os de Estocolmo e Milo. Possuem implantaes recentes (2006

    e 2008, respectivamente), mas j apresentam resultados positivos. O esquema de Milo,

    conhecido por Ecopass, tem o propsito de reduzir os nveis de poluio do ar no centro da

    cidade e investir o valor da arrecadao no financiamento de projetos de transporte pblico e

  • 31

    de outros meios no poluentes. O de Estocolmo, por sua vez, passou por votao, por meio de

    um plebiscito, aps uma fase de testes com durao de 7 meses. O funcionamento definitivo

    veio no incio de 2007, com a aprovao pela implantao do projeto, por parte da populao.

    Segundo Domingues (2010), atualmente, 20% dos carros parou de circular pelo centro da

    cidade e as emisses de gases poluentes reduziram em 14%.

    Figura 3 Placas informando a insero na rea de cobrana do Ecopass, em Milo

    Fonte: http://milano.corriere.it/

    Figura 4 Posto de identificao eletrnica de pedgio urbano em Estocolmo

    Fonte: http://agenciat1.com.br/

  • 32

    3.2.3 London Congestion Charging O caso de Londres

    3.2.3.1 Introduo

    Segundo dados divulgados do ltimo censo realizado, em 2011, a capital do Reino

    Unido contava com uma populao de 8.173.900 residentes. Atualmente, a terceira cidade

    mais populosa da Unio Europeia e tambm uma das maiores densidades demogrficas do

    continente. Consequentemente, o trnsito de Londres tem de tudo para ser um dos mais

    caticos do mundo, mas no . Mesmo com toda sua complexidade, graas ao pedgio urbano

    implantado em fevereiro 2003, Londres possui hoje um trnsito mais rpido, se comparado ao

    de 10 ou 11 anos atrs. Londres hoje o melhor exemplo no que diz respeito a modelos de

    restrio de uso veicular, dadas suas propores relativas demografia e importncia de seu

    comrcio mundialmente conhecido. Segundo Guimares (2007), estimativas mostravam que

    os veculos gastavam cerca de 4,2 minutos para percorrer a distncia de 1 km na rea que viria

    a ser pedagiada, enquanto o tempo ideal deveria ser de 1,9 minutos.

    Conforme observado por Cmara e Macedo (2004), o pedgio urbano de Londres

    foi o primeiro entre os programas existentes a considerar a gesto de trfego como forma de

    reduzir os congestionamentos e arrecadar recursos simultaneamente. Singapura, por exemplo,

    intencionava reduzir os congestionamentos, porm a arrecadao era consequncia, e no um

    objetivo plenamente definido. Historicamente, as taxas cobradas em Singapura sempre

    apresentaram valores inferiores s de Londres.

    3.2.3.2 Objetivos

    Inicialmente, o pedgio urbano londrino objetivava reduzir os nveis de trfego,

    na regio do centro da cidade, de algo entre 10% e 15%, assim como arrecadar recursos que

    deveriam ser investidos na rede de transportes, principalmente nas modalidades nibus e

    outras no motorizadas. O plano ainda inclua a reduo dos congestionamentos na rea

    pedagiada entre 20% e 30%, a melhora nos servios de nibus urbano, um aumento

    substancial nos nveis de confiana nas viagens realizadas com o uso de automvel e uma

    distribuio de cargas e servios mais eficiente, conforme observado por Lucas Junior (2009).

    Chegou-se a esse consenso aps a realizao de pesquisas de opinio pblica, para assim

  • 33

    direcionar da melhor forma as polticas pblicas, de modo a se obter um resultado mais

    adequado aos ensejos da populao.

    Figura 5 Sinalizao referente rea do pedgio urbano de Londres

    Fonte: http://noticias.uol.com.br/

    3.2.3.3 Caractersticas

    Na poca de sua implantao, os motoristas que decidissem entrar na rea coberta

    pelo pedgio, no intervalo entre 7:30 e 18:30 nos dias teis, eram obrigados a pagar 5 (R$

    27,00). Segundo Cmara e Macedo (2004), o permetro de 21 km, conforme pode ser

    visualizado na Figura 5, equivale ao centro expandido de Londres. Desde o incio, o

    monitoramento feito por meio de cmeras, entre fixas e mveis, que identificam o veculo

    atravs da captao das imagens de suas placas, ocorrendo tanto na entrada, no trfego interno

    e em sua sada. Um sistema retroalimentado responsvel por verificar se o pagamento foi

    realizado ou no.

    Novamente, Cmara e Macedo (2004) afirmam que, caso o motorista no

    realizasse o pagamento entre a 0:00 do dia da viagem e a 0:00 do dia subsequente, deveria

    desembolsar 10 ao invs de 5. A multa, para quem pagasse aps o prazo estipulado acima,

    subiria para 80, com o envio da notificao e do boleto a ser realizado para a residncia do

    infrator. Aps 28 dias, o valor passaria a ser de para 120. Em julho de 2005, o valor dirio

    da taxa do pedgio foi reajustado para 8.

  • 34

    Figura 6 rea de cobertura inicial do Congestion Charging em Londres

    Fonte: TfL (2003).

    Em 2007, novas alteraes foram feitas e a rea de cobertura foi expandida.

    Atualmente o pagamento pode ser realizado via internet, bancas de jornais, estabelecimentos

    comerciais, centrais de atendimento telefnico, mensagens de texto do celular, entre outros. O

    horrio e os dias de cobrana tambm foram alterados e agora ocorrem entre 7:00 e 18:00,

    todos os dias da semana. As multas por atraso tambm foram reajustadas e passaram a custar

    100 para o dia seguinte e 150 para atraso superior a quatro semanas. Caso o pagamento

    seja realizado no prazo de 14 dias, o valor de 100 da multa cai pela metade. Essa regra, por

    sinal, era vlida para os valores anteriores (LUCAS JUNIOR, 2009).

    Bicicletas, motocicletas, nibus, txis e servios de socorro so, por natureza,

    isentos da taxao. Adicionalmente, portadores de deficincia fsica e motoristas de veculos

    com nmero de lugares igual ou superiores a nove, podem conseguir registro especial que os

    autorize a utilizar a rea pedagiada, sem registrarem a cobrana. E, por ltimo, veculos que

    utilizem combustveis alternativos, bem menos poluentes e que se enquadrem no padro Euro

    IV mximo de 0,5 g/Km de monxido de carbono emitidos tambm esto isentos. Para as

    pessoas que residem na rea, um desconto de 90% no valor da taxa do pedgio concedido.

  • 35

    As alteraes continuaram ocorrendo, devido a necessidade de novas adaptaes

    ao programa. Conforme dados mais recentes foram sendo divulgados, BHTRANS (2010)

    citou que, atualmente, os motoristas gastam cerca de R$ 35,00 para poderem circular no

    permetro do centro expandido de Londres, no perodo que vai de 7:00 s 18:00. A entrada

    livre noite e, agora, tambm nos feriados e finais de semana.

    Em 2011, a zona de pedgio retornou aos seus limites originalmente propostos e o

    valor do pedgio foi novamente reajustado, passando a custar 10. Isso ocorreu aps a

    avaliao dos resultados e de consultorias realizadas.

    Figura 7 rea mxima de cobertura do Congestion Charging em Londres, removida em

    2011

    Fonte: http://i-likeitalot.blogspot.com/ (2011).

    3.2.3.4 Resultados

    Conforme o relatrio da TfL de 2004, os resultados foram bastante positivos em

    relao aos que eram esperados. Os nveis de congestionamento reduziram em torno de 30%.

    Logo, com cerca de 60 a 70 mil carros a menos nas ruas de Londres, o trnsito pde fluir de

  • 36

    forma melhor, o que elevou as velocidades mdias em 17%, passando de 14,3 km/h, antes da

    existncia do pedgio, para 16,7 km/h em poucos meses aps sua implantao.

    As pessoas alteraram seus hbitos de deslocamento, visto que houve um

    acrscimo de 20% no nmero de viagens realizadas com bicicletas e 30%4 com o uso de

    motocicletas, conforme observao de Lucas Junior (2009). Tais alteraes citadas

    impactaram em uma melhor qualidade do ar, dada a reduo na emisso de poluentes, tanto na

    rea pedagiada como em suas adjacncias. Acompanharam o mesmo movimento de queda, a

    poluio sonora e a violncia no trnsito.

    A maior demanda pelos transportes coletivos foi acompanhada pelas melhorias no

    servio prestado. Ainda em 2003, observou-se um aumento de 20% na demanda pelas viagens

    de nibus. Os passageiros tambm puderam usufruir de um servio mais confivel, havendo

    um aumento na oferta de veculos em 23%, dados os investimentos realizados como retorno

    implantao do modelo de restrio veicular. O tempo de espera foi reduzido em 30% e o

    ndice de atrasos devido aos congestionamentos foi derrubado em 60%. O metr tambm

    recebeu investimentos provenientes dos recursos do pedgio, assim como a criao de novas

    ciclovias e ampliao das j existentes foi possibilitada (CMARA E MACEDO, 2004).

    Os impactos nas externalidades geradas pelos congestionamentos foram sentidos

    pela populao. Uma sensvel melhoria na qualidade de vida das pessoas que necessitavam se

    deslocar ao centro de Londres, antes e depois da implantao do pedgio, foi responsvel por

    uma maior aprovao por parte da populao ao programa. Muitos dos que criticaram o

    sistema antes mesmo de ele existir, possivelmente, mudaram de opinio e passaram a apoi-

    lo, conforme anunciado pelo ento prefeito de Londres, Ken Livingstone.

    A taxa de congestionamento foi uma soluo radical para um problema de longa

    data. Antes da introduo do encargo, as estradas de Londres eram obstrudas por

    trfego lento e congestionamento e estavam custando 2 milhes de libras (esterlinas)

    aos negcios por semana. O esquema tem feito uma grande diferena na obteno de

    mobilidade em Londres novamente. Menos veculos na zona (pedagiada),

    juntamente com servios de nibus melhores e mais rpidos e percursos mais

    confiveis, fazem de Londres um lugar muito melhor para se trabalhar, viver e

    visitar. Apesar das terrveis previses antes do lanamento do sistema, a taxa de

    congestionamento revelou-se um sucesso e por isso que quase trs quartos dos

    londrinos agora apoiam o programa - porque ele funciona.

    Fonte: TfL (2004a, traduo nossa).

    O comrcio de Londres apresentou certa reduo nas vendas, logo nos primeiros

    meses da implantao do pedgio urbano. Porm, segundo especialistas, isso se deu devido a

    4 Segundo Domingues (2010), esse valor j apresenta 43% de aumento.

  • 37

    interdio de uma das linhas do metr que d acesso ao centro da capital inglesa. Estudos

    mostram que o nmero de viagens rea pedagiada foi reduzido em apenas 6%, e que,

    portanto, no haveria motivos para ocasionar perdas significativas ao comrcio da regio.

    O London Congestion Charging caracteriza-se hoje como sendo altamente vivel,

    econmica e financeiramente. No relatrio da TfL, referente a 2011/12, a receita lquida, entre

    abril de 2011 a maro de 2012, correspondeu a 136,8 milhes, mesmo aps a deciso do

    prefeito Boris Johnson em retornar rea originalmente proposta de taxao. A situao

    superavitria possibilita que as melhorias no transporte pblico no parem de ser realizadas.

    3.2.3.5 Lies

    MORATO (2011) cita SANTOS E FRASER (2006) para ressaltar algumas lies,

    retiradas da experincia obtida por Londres, e que devem se levar em conta antes de implantar

    uma tarifa de congestionamento.

    i) Informar e ouvir o pblico de extrema importncia manter o pblico

    informado das intenes de implantao, referente a datas e valores estipulados.

    Alm da divulgao macia, interessante a realizao de pesquisas de opinio;

    ii) No condicionar a deciso a plebiscitos Partir direto para plebiscitos pode no

    ser a melhor soluo. Perodos de implantao provisria, como uma fase de

    testes, possibilitam as pessoas a analisarem os ganhos e perdas para assim

    formarem sua opinio;

    iii) Avaliar criteriosamente o custo x benefcio As diversas anlises feitas em

    Londres possibilitou a tomada de decises de forma mais coerente, minimizando

    possveis erros;

    iv) Avaliar efeitos distributivos Levar-se em considerao ganhadores e perdedores,

    de forma a dirigir polticas compensatrias a estes, minimizando sua insatisfao;

    v) Considerar caractersticas geogrficas locais O fato de o pedgio urbano de

    Londres ter obtido sucesso no implica em sua cpia para poder ser aplicado em

    outras cidades. Caractersticas prprias de cada lugar devem ser levadas em

    considerao;

    vi) No projetar as tarifas com base no custo marginal do trfego Assimetrias de

    informao existem e podem gerar transtornos, devido a ineficincia atingida.

    Aconselha-se experimentar sistemas de fcil compreenso, inclusive.

  • 38

    3.3 Rodzio de Veculos

    Na definio de Lucas Junior (2009, p. 47), o rodzio um modelo de restrio

    veicular que divide os veculos da cidade em grupos, de acordo com o nmero de suas placas,

    permitindo que trafeguem em determinados dias da semana.

    Uma caracterstica marcante dos sistemas de rodzio de veculos que estes se

    baseiam apenas na fiscalizao ostensiva, o que torna seus custos de implantao quase nulos.

    possvel que seu funcionamento se d sem o uso de tecnologia, ao contrrio de outros

    modelos de restrio veicular. Atravs da imposio do poder executivo, em colaborao com

    as autoridades de trnsito locais, ocorre a proibio de circulao de determinados veculos

    em situaes previamente acordadas por lei.

    Em compensao, no h qualquer movimento voltado para a arrecadao de

    receitas, o que implica na inexistncia de gerao de melhorias das infraestruturas virias e de

    transporte, oriundas das aes do programa. Logo, as vias continuam a dar apenas despesas

    (LUCAS JUNIOR, 2009, p. 47).

    Os custos de manuteno de um rodzio, basicamente, se resumem no pagamento

    dos fiscais que monitoram a circulao da frota viria e, quando for o caso, em sistemas de

    cmeras de registro de velocidade5. No entanto, a assimetria de informaes, possibilitada

    pela fiscalizao realizada, em grande parte, apenas por agentes de trnsito, poder vir a

    tornar-se um problema de ineficincia.

    Mas o rodzio possui outra caracterstica intrnseca: apresenta bons resultados no

    curto prazo. Dado o simples crescimento da frota, no longo prazo, os nveis de trfego podem,

    inclusive, ultrapassar os alcanados na situao anterior ao seu estabelecimento.

    Gomide e Morato (2011, p. 38) afirmam que o rodzio uma medida do tipo

    comando e controle e, dessa forma, termina por concluir que os incentivos de curto prazo

    do rodzio servem para:

    [...] a busca de brechas na legislao e tentativa de escapar da proibio, seja por

    meio de fraudes, como a clonagem ou adulterao de placas, ou para a fuga da

    fiscalizao e outras possveis burlas s regras, como a compra de um segundo

    veculo com final de placa diferente, geralmente mais velho e, por conseguinte, mais

    poluidor.

    5 A cidade de So Paulo utiliza as cmeras implantadas do sistema de radares eletrnicos como outro meio para

    monitorar os veculos em circulao. Porm, seu uso bastante limitado.

  • 39

    O que se pode depreender do fragmento acima que, de alguma forma, os

    objetivos iniciais de programas deste porte tendem a no mais ser atingidos, perante as

    inmeras possibilidades de burlar a lei. A compra do segundo automvel, que est entre elas,

    tambm citado por Lucas Junior (2009) como um ponto de ineficincia do modelo. No final

    das contas, as ruas continuaro com o mesmo nmero de carros, ou seno, alcanaro nveis

    superiores.

    A poluio do ar, nos grandes centros urbanos, est entre as principais

    externalidades geradas pelos congestionamentos. Est, inclusive, entre as principais

    motivaes de implantao dos modelos de rodzio veicular pelo mundo, a reduo dos nveis

    de gases poluentes e consequente melhoria da qualidade do ar.

    Desde 1989, a Cidade do Mxico utiliza-se de um sistema que limita os

    automveis a circularem todos os dias pelas ruas da capital e regio metropolitana. O

    programa Hoy no Circula foi originalmente proposto como medida emergencial, devido as

    altas taxas de poluentes existentes no ar da cidade, grande parte deles provenientes dos gases

    liberados pelos automveis. A proposta inicial do programa era apenas a de reduzir os ndices

    de poluio do ar na regio.

    O programa expandiu-se e atualmente inclui tambm a prpria gesto do trfego.

    O controle se d por meio de adesivos coloridos fixados nos carros, os quais indicaro a

    terminao da placa em nmero par ou mpar e a classificao do veculo quanto ao

    desempenho ambiental, dado este verificado mediante inspeo veicular. Em dias alternados,

    os adesivos indicaro quais automveis estaro habilitados a circularem pelas ruas. Segundo

    autoridades mexicanas, a medida contribuiu sensivelmente para a melhoria da qualidade do ar

    na regio, mesmo que para isso tenha sido necessrio aplicar o intervalo de restrio por um

    perodo dirio de 17 horas, em algumas ocasies.

    Outro bom exemplo o da cidade de Bogot. O modelo denominado Pico y Placa

    funciona desde 1998, restringindo a circulao de cerca de 40%6 dos automveis por dia til,

    na capital colombiana. Os horrios de funcionamento iam de 7:00 s 9:00 pela manh e de

    17:30 s 19:30 no perodo da tarde. O esquema obteve sucesso ao apresentar um aumento nas

    velocidades mdias de 14 km/h a 25 km/h e uma reduo nos nveis de trfego nos horrios

    6 So quatro finais de placas, por dia til, que devem obedecer restrio.

  • 40

    no permitidos, o que garantiu o apoio da populao ao programa, segundo Gomide e Morato

    (2011).

    Porm, estudos demonstraram que as pessoas no substituram seus hbitos do uso

    do automvel pelo transporte coletivo. Nem mesmo a implantao do sistema de Bus Rapid

    Transit (BRT) na cidade foi suficiente para alterar as preferncias dos motoristas por realizar

    suas viagens em seus carros prprios. Ao invs do uso do transporte pblico, muitos

    provavelmente alteraram suas rotinas e passaram a utilizar o carro nos horrios no

    abrangidos pela proibio.

    Algumas medidas adicionais foram adotadas, como a ampliao dos horrios de

    restrio7, ampliao da rea de abrangncia do rodzio, aumento do valor das multas e

    sanes a serem aplicadas e o reforo da fiscalizao. Txis e nibus, que no os BRTs,

    tambm foram includos no programa, no intuito de restringir a oferta de outros meios,

    conforme observao de Gomide e Morato (2011).

    Outra medida que a prefeitura da capital colombiana utiliza para desestimular o

    uso de automveis privados denominada Da sin carro. Desde 2001, a medida paliativa foi

    adotada com o intuito de exercer a cidadania e, inclusive, estimular as pessoas a utilizarem o

    transporte pblico da cidade. Ocorre sempre uma vez por ano e no atinge txis e

    motocicletas. O sistema de nibus pblico, conhecido por TransMilenio, o responsvel por

    realizar a locomoo de milhares de pessoas neste dia. Em 2012, uma fonte vinculada

    prefeitura de Bogot informou que 1.090.000 veculos deixaram de ir s ruas, com um

    incremento de 870.000 pessoas a utilizarem o transporte coletivo como forma de

    deslocamento. Nmeros esses que significaram um aumento de 15% no nmero de usurios,

    se comparado a um dia til normal. Desde 2012, a prefeitura est elaborando um plano para

    implantar aquele que viria a ser o primeiro pedgio (essencialmente) urbano na Amrica

    Latina.

    7 Passou a valer de 6:00 s 9:00 e de 16:00 s 19:00.

  • 41

    Figura 8 Trnsito em Bogot no Da sin carro em 2012

    Fonte: http://www.econscientes.com/

    A capital grega, Atenas, tambm utiliza um sistema de rodzio do tipo mpar/par,

    assim como a Cidade do Mxico, desde 1982. Os objetivos eram reduzir o trfego e reverter a

    acentuada degradao do meio ambiente. A reduo do trfego observada foi de 22,5%,

    quando se esperavam cerca de 50%. O aumento de 26% no nmero de txis sugeriu que

    houve a migrao das pessoas para essa modalidade de transporte. Outra corrente de

    estudiosos observou o nmero de excees s regras do rodzio estabelecidas e indicou como

    sendo a principal causa da menor reduo no trfego. Os nveis de emisso de poluentes

    foram reduzidos, conforme Gomide e Morato (2011).

    A cidade de Santiago, capital do Chile, possui tambm um sistema de proibio

    do uso veicular nos moldes do rodzio. Porm, este s entra em vigor quando a cidade

    apresenta nveis crticos de poluio atmosfrica. O esquema possui, portanto, carter

    estritamente ambiental.

    Com base em suas observaes, Litman (2003) apud Gomide e Morato (2011)

    formulou o seguinte quadro, apresentado abaixo como Quadro 2, listando as principais

    vantagens e desvantagens dos programas de rodzio veicular. Vale ressaltar que, na

    formulao deste quadro, o autor no levou em considerao o custo-benefcio do rodzio em

    comparao a outros modelos de restrio veicular, de forma a realizar uma anlise mais

    adequada. evidente que existem outras vantagens e desvantagens, inclusive citadas no

    decorrer deste trabalho, mas que no foram includas no quadro, dado o motivo apresentado.

  • 42

    Quadro 2 Vantagens x desvantagens do rodzio veicular

    Vantagens Desvantagens

    Aceitao pela populao8, na medida em que observado comprometimento do governo.

    Incentivo ao aumento da frota atravs da aquisio do segundo veculo.

    Sistema de transporte pblico beneficiado no curto prazo, devido o aumento de velocidade mdia no trfego.

    Incentivo a burlas e fraudes.

    Criao de um ambiente socialmente propcio adoo de medidas de restrio ao trfego.

    Tendncia ao aumento de excees a determinadas categorias ou grupos.

    Tendncia ineficcia no longo prazo, devido o crescimento da frota.

    Fonte: Adaptado de Litman (2003 apud Gomide e Morato, 2011, p. 40).

    Diferentemente do pedgio, o rodzio inclui medidas punitivas, e no apenas a

    cobrana de uma taxa pela utilizao das vias. O objetivo deste , portanto, coibir o trfego

    dos automveis que no estiverem condizentes com determinadas condies impostas pelas

    autoridades competentes. Deste modo, o rodzio pode ser considerado um programa de

    restrio veicular mais propriamente dito, dado que no estabelece a opo da utilizao ou

    no dos veculos.

    3.3.1 Operao Horrio de Pico (Rodzio) O caso de So Paulo

    3.3.1.1 Introduo

    A cidade de So Paulo tem registrado, nos ltimos anos, engarrafamentos

    recordes, principalmente nos feriades. Os moradores da capital e regio metropolitana

    costumam viajar para o litoral do estado e quilmetros de filas de carros se formam nas

    rodovias de acesso. Para se ter ideia da gravidade, at o incio do 2013, o recorde histrico de

    congestionamento em So Paulo foi de 295 km de vias totalmente paralisadas ou de trnsito

    lento. Segundo a Companhia de Engenharia de Trfego CET (2013), a marca obtida em

    junho de 2012 foi a maior j registrada desde 1991, quando tiveram incio as medies.

    Segundo dados da Associao Nacional de Transportes Pblicos (ANTP), em

    2010 a cidade de So Paulo contava com uma populao de 10.990.249 habitantes e uma frota

    de 3.736.366 automveis. Equivale a uma proporo de 2,94 habitantes para cada carro.

    Nmeros como esses comprovam a existncia dos congestionamentos na cidade. Conforme

    8 Como exemplo, a Pesquisa Datafolha, divulgada na edio de 06/11/2012 do jornal Folha de So Paulo,

    revelou que apenas 2% dos entrevistados se consideradas as duas categorias de resposta preferem o pedgio, contra 7% a favor do rodzio, pela melhor alternativa para o trnsito de So Paulo.

  • 43

    observado por Domingues (2010), atualmente So Paulo possui nveis de motorizao

    semelhante ao de pases desenvolvidos.

    Segundo dados do DETRAN-SP (2010), a cada dia, em mdia, so colocados 800

    novos veculos nas ruas da cidade. Aliado a uma alta utilizao de veculos, isto

    acarreta episdios de lentido que chegam a atingir 140 km de extenso mdia

    (DOMINGUES, 2010, p. 19).

    Em 2010, o metr, que o meio de transporte coletivo mais utilizado na cidade, j

    transportava algo em torno de 3,3 milhes de pessoas por dia, segundo dados da Prefeitura de

    So Paulo. Mas o crescimento da populao no acompanhado pelo aumento das linhas de

    metr, trem e dos nibus. Isso faz com que as pessoas passem a comprar cada vez mais

    carros, na inteno de um maior conforto para realizar suas viagens (DOMINGUES, 2010).

    A matria publicada pelo site do jornal Estado (So Paulo) em 25/11/2012

    afirmou que os prejuzos ocasionados pelos congestionamentos capital paulistana

    ultrapassam as cifras dos R$ 50 bilhes por ano. As inmeras horas perdidas com os

    deslocamentos realizados dentro da cidade reduzem a produtividade do trabalho e ocasionam

    as enormes perdas financeiras. O levantamento foi realizado pela Fundao Getlio Vargas

    (FGV).

    Os congestionamentos tornaram-se algo do cotidiano dos paulistanos. As pessoas

    criam seus prprios hbitos para evitarem perder horas no trnsito, mas isso j quase no

    mais possvel. Alm das horas desperdiadas diariamente, existem os acidentes de trnsito, a

    poluio e junto com esta os problemas de sade ocasionados pela inalao dos gases

    poluentes provenientes da queima dos combustveis fsseis pelos veculos.

    A prefeitura de So Paulo h tempos busca solues para tais problemas.

    Inspirado no programa supracitado Hoy no Circula, a prefeitura procurou adaptar s suas reais

    necessidades um sistema de gesto de trfego, baseado em proibio de circulao veicular.

    Criado em 1997, o Programa de Restrio ao Trnsito de Veculos Automotores ou foi

    implementado depois de realizadas pesquisas de opinio pblica sobre os congestionamentos

    na cidade. J em 1996, dois esquemas foram introduzidos: um de carter estadual9 e outro

    municipal10

    .

    9 Conhecido por Operao Rodzio.

    10 Conhecido pela expresso Operao Horrio de Pico. Para todo efeito, ser chamado apenas por rodzio no

    presente trabalho.

  • 44

    3.3.1.2 Objetivos

    A Operao Rodzio teve como objetivo minimizar os problemas relativos

    poluio atmosfrica gerada pelo uso dos automveis. Era uma medida de emergncia

    poca, abrangendo a cidade de So Paulo e outras 9 cidades da Regio Metropolitana de So

    Paulo RMSP. Segundo Cmara e Macedo (2004), o programa, que foi voluntrio na fase de

    testes, tornou-se compulsrio em 1997 e foi cancelado em 1999. De agora em diante, apenas o

    rodzio municipal ser levado em considerao nas anlises.

    A Operao Horrio de Pico possua um esquema semelhante ao do rodzio

    estadual, visto que foram criados para funcionar em conjunto. Seu principal objetivo era

    reduzir os nveis de trfego e congestionamentos, atravs da restrio do uso de veculos na

    rea do centro expandido de So Paulo, nos horrios de pico.

    Figura 9 Mapa do centro expandido da cidade de So Paulo

    Fonte: http://www.ebah.com.br/

  • 45

    3.3.1.3 Caractersticas

    O planejamento da Operao Horrio de Pico inclua sua incidncia durante o ano

    todo, com exceo dos meses de janeiro e julho, propositalmente por serem os meses de frias

    escolares. Funciona apenas em dias teis e em duas faixas de horrio: de 7:00 s 10:00 e de

    17:00 s 20:00. A restrio, assim como no Rodzio estadual, ocorre por meio da numerao

    final das placas (CMARA E MACEDO, 2004).

    Todos os veculos esto sujeitos s regras do rodzio, exceto os de servios

    essenciais, nibus urbanos, atendimento mdico, transporte escolar ou os que realizem

    transporte de produtos perecveis. Incluem-se na lista os veculos de pessoas portadoras de

    necessidades especiais ou cncer, mediante cadastramento especial realizado. Em junho de

    2008, o rodzio tambm foi estendido a caminhes, que antes podiam circular livremente pela

    regio.

    Figura 10 Placa referente ao rodzio municipal em So Paulo

    Fonte: http://noticias.band.uol.com.br/

    Outra caracterstica marcante do rodzio a sua suspenso de tempos em tempos.

    Algumas semanas no perodo das festas de fim-de-ano j so costumeiramente inclusas nestas

    suspenses, assim como em dias teis intercalados por feriados. Tais suspenses so

    previamente divulgadas nos meios de comunicao mais abrangentes, a fim de possibilitarem

    a programao por parte dos usurios de veculos prprios.

  • 46

    Ocorrendo o flagrante de irregularidade, mediante comprovao pelos fiscais da

    CET ou pelas cmeras de fiscalizao de velocidade, o motorista do automvel circulando em

    desrespeito s normas ser autuado com multa no valor de R$ 85,13 e quatro pontos em sua

    carteira de habilitao.

    3.3.1.4 Resultados

    A CET responsvel por realizar as avaliaes de resultados do programa e

    anualmente emite relatrios referentes a este. Os primeiros resultados divulgados, portanto,

    apresentaram uma reduo de 18% nos nveis mdios de congestionamento observados na

    rea coberta pelo sistema, durante todo o dia. Durante os horrios de rush, tais redues

    corresponderam a 37% pela manh e 24% pela tarde. Nos anos seguintes, porm, os ndices

    de lentido voltaram a crescer, chegando inclusive a apresentar valores superiores aos do

    perodo anterior ao funcionamento do rodzio (CMARA E MACEDO, 2004).

    As velocidades mdias de alguns corredores sofreram um aumento acima dos

    20%. O centro, por sua vez, no apresentou grandes variaes. Chama ateno tambm a

    reduo do nmero de acidentes de trfego: 10% em 1999. Entre outros resultados, podem ser

    includas as economias de tempo, na ordem de 79%, e de combustvel, em 10%, e a reduo

    nas emisses de poluentes (CMARA E MACEDO, 2004).

    De um modo geral, o rodzio implantado no centro de So Paulo conseguiu

    cumprir com seus objetivos, pelo menos temporariamente. Pesquisas de opinio pblica

    revelaram uma ampla aceitao da medida. Quando perguntados sobre o rodzio ter atendido

    seus objetivos de melhoria do trfego na cidade, os ndices de aprovao registrados foram

    superiores a 60%. No entanto, levantamentos realizados em 2007 pela CET apresentaram um

    agravamento dos ndices de aprovao, aps registros com maior frequncia dos

    congestionamentos, possivelmente ocasionados pelo significativo aumento da frota de

    automveis em So Paulo (DOMINGUES, 2010).

    Por no efetuar cobrana de taxas pelo uso das vias abrangidas pelo permetro

    estabelecido, o rodzio no gerou arrecadao em seus anos de funcionamento, de forma a no

    possuir capacidade de autofinanciamento.

    3.4 Aspectos ambientais dos programas de restrio veicular

  • 47

    Os quadros 3 e 4 realizam uma associao entre os principais programas de

    gerenciamento de controle do trfego urbano, at ento implantados, e suas preocupaes no

    que diz respeito s questes ambientais, com base no que foi observado. O Quadro 3 trata dos

    pedgios urbanos, enquanto o Quadro 4 faz o mesmo para os rodzios.

    O que se pode depreender que, em relao s externalidades geradas, a

    preocupao com a qualidade do ar tem quase sempre estado entre ela