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UNEB – UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS I Maria da Purificação Santos Santana EDUCAÇÃO INFANTIL: OS DESAFIOS DO ATENDIMENTO VOLTADO PARA UMA EDUCAÇÃO DE QUALIDADE Salvador 2009

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UNEB – UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS I

Maria da Purificação Santos Santana

EDUCAÇÃO INFANTIL: OS DESAFIOS DO ATENDIMENTO VOLTADO PARA UMA EDUCAÇÃO DE QUALIDADE

Salvador 2009

MARIA DA PURIFICAÇÃO SANTOS SANTANA

EDUCAÇÃO INFANTIL: OS DESAFIOS DO ATENDIMENTO VOLTADOS PARA UMA EDUCAÇÃO DE QUALIDADE

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção da graduação em Pedagogia, com Habilitação em Gestão e Coordenação do Trabalho Escolar, do Departamento de Educação da Universidade do Estado da Bahia, sob orientação da Profª Dra. Elizabete C. Santana

Salvador 2009

FICHA CATALOGRÁFICA – Biblioteca Central da UNEB Bibliotecária: Jacira Almeida Mendes – CRB: 5/592

Santana, Maria da Purificação Santos Educação infantil : os desafios do atendimento voltado para uma educação de qualidade / Maria da Purificação Santos Santana . - Salvador, 2009. 67f. Orientadora: Elizabete Conceição Santana. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) - Universidade do Estado da Bahia. Departamento de Educação. Colegiado de Pedagogia. Campus I. 2009. Contém referências. 1. Educação de crianças - Brasil. 2. Ensino fundamental - Bahia. 3. Educação pré-escolar I. Santana, Elizabete Conceição. II. Universidade do Estado da Bahia, Departamento de Educação. CDD: 372.298142

MARIA DA PURIFICAÇÃO SANTOS SANTANA

EDUCAÇÃO INFANTIL: OS DESAFIOS DO ATENDIMENTO VOLTADO PARA UMA EDUCAÇÃO DE QUALIDADE

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção da graduação em Pedagogia com Habilitação em Gestão e Coordenação do Trabalho Escolar do Departamento de Educação da Universidade do Estado da Bahia, sob orientação da Profª Dra. Elizabete C. Santana.

Aprovada em: _____ de __________________ de 2009.

BANCA EXAMINADORA

______________________________________________ Professora Drª. Elizabete C. Santana – UNEB

______________________________________________

Professora Rilza Cerqueira Santos – UNEB

______________________________________________ Professor Otoniel Vitor C. Rocha – UNEB

______________________________________________

Professora Maria Olivia Matos – UNEB

Dedico esse trabalho a todas as pessoas que direta ou indiretamente deram sua inestimável contribuição. Em especial a: Professora Elizabete Santana, minha competente e paciente orientadora; Minha família, porto seguro para todas as horas; Aos colegas, especialmente a Geórgia e Lílian, pois sem elas não teria o mesmo brilho; Acima de todos, a Deus que os colocou em meu caminho para ajudar, amar e proteger.

A principal meta da educação é criar homens que sejam capazes de fazer coisas

novas, não simplesmente repetir o que outras gerações já fizeram. Homens que

sejam criadores, inventores, descobridores. A segunda meta da educação é formar

mentes que estejam em condições de criticar, verificar e não aceitar tudo que a elas

se propõe.

Jean Piaget

RESUMO

Esse trabalho de conclusão do Curso de Graduação de Pedagogia com Habilitação em Gestão e Coordenação do Trabalho Escolar teve como objetivo conhecer o funcionamento de uma instituição de educação infantil e comparar aspectos desse funcionamento com os padrões de qualidade sugeridos nos documentos oficiais e em textos de autores interessados na temática. A pesquisa realizada adotou uma abordagem qualitativa cujo principal procedimento utilizado foi a observação participante, pois esta permite uma melhor compreensão das atitudes, interesses, fatos e inter-relações existentes na instituição pesquisada. A conclusão foi da existência de um distanciamento entre os padrões oficiais de qualidade e os praticados na instituição. Palavras chaves: Assistencialismo. Educação Infantil. Qualidade.

ABSTRACT

This work of completion of undergraduate courses with Proof of Pedagogy in Management and Coordination of Work School aimed to know the functioning of an institution of early childhood education and compare aspects of working with quality standards suggested in official documents and texts by authors interested in the topic. The research conducted has adopted a qualitative approach whose main procedure used was participant observation, as this allows a better understanding of attitudes, interests, events and inter-relationships in the institution studied. The conclusion was the existence of a gap between the official standards of quality and practiced in the institution. Key words: Care. Child Rearing. Quality

10

SUMÁRIO

Nenhuma entrada de sumário foi encontrada.1 INTRODUÇÃO

A educação Infantil, suas particularidades, seu currículo, a forma de

atendimento, e sua história, temas estudados na Disciplina Referenciais Teóricos-

Metodológicos da Educação Infantil, suscitaram o desejo de conhecer de perto o que

acontece em uma escola desse nível de ensino.

Como Secretária de uma escola pública do ensino fundamental me intrigava a

queixa das mães sobre as poucas vagas oferecidas para crianças com menos de

sete anos e a quase inexistência, em alguns bairros, de creches oferecidas pelo

Estado e Município. Ao juntar as duas visões, acadêmica e profissional, surgiu muito

naturalmente a opção pela Educação Infantil como área de estágio e tema para o

projeto de pesquisa a ser desenvolvido como Trabalho de Conclusão do Curso de

Pedagogia.

Quem oferece a Educação Infantil? De que maneira está sendo oferecida? Há

atendimento suficiente? O que dizem as leis sobre esse atendimento? Essas

indagações me impulsionaram e guiaram os primeiros momentos da elaboração

dessa monografia.

Ao iniciar a pesquisa descobri que é muito recente considerar “Educação” o

que geralmente se oferecia às crianças pequenas nos estabelecimentos de ensino

voltados para o seu atendimento. Tratava-se, quando muito, de acolhimento,

assistência ou guarda, o período de tempo em que as crianças ficavam separadas

de sua família e entregues aos cuidados de pessoas de boa vontade, para alimentar,

proteger e promover cuidados de higiene.

No inicio da pesquisa bibliográfica para elaboração do projeto de estágio,

enfrentei dificuldades para encontrar livros sobre o assunto. Considerei insuficiente

os títulos disponíveis nas bibliotecas pesquisadas e nas livrarias visitadas,

principalmente no que diz respeito à gestão e à coordenação pedagógica. Percebi

em alguns textos, que a influência do histórico assistencialista e filantrópico a que

11

esse nível de educação era anteriormente associado, restringia existência de uma

boa bibliografia a respeito do tema.

No que diz respeito à documentação oficial, a Constituição Federal de 1988,

ao considerar a Educação Infantil como um direito da criança e um dever do Estado

veio proporcionar um grande salto para reverter a situação da educação para

crianças pequenas. Muitos estudos foram feitos e documentos foram elaborados

como: O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, 1990); a Lei de Diretrizes e

Bases 9.394/96 (LDB 1996); Referenciais Curriculares para a Educação Infantil

(RCNEI 1998); Parâmetros Nacionais de Qualidade para a Educação Infantil (2006).

Além da literatura a respeito do tema, faltava a aproximação da realidade. O

que acontecia no cotidiano das escolas com respeito à qualidade do ensino

oferecido às crianças pequenas? Foi o que procurei verificar durante o estágio

curricular do curso de Pedagogia, realizado em uma instituição de educação infantil

e na elaboração da monografia de conclusão de curso quando tomei como objeto de

pesquisa os padrões de qualidade no atendimento da população de 0 a 6 anos

oferecido pelo Centro Nova Semente.

Tomando-se por base autores como Rizzo (2006), Abramowicz e Wajskop

(1995), Goldschmied e Jackson (2006), Sanches (2003), e as recomendações

encontradas nos documentos oficiais, considera-se educação de qualidade aquela

que privilegia a adequação dos espaços e do ambiente, a organização de uma

rotina diária voltada para a função indissociável do cuidar e educar, pautada no

currículo específico para Educação Infantil abrangendo os três grandes eixos: o

brincar, o movimento e o conhecimento de si e do outro, e os tipos de interação

realizadas entre professor-aluno. Tudo isso estando em conformidade com as

diretrizes curriculares nacionais e com as normas legais locais, que garantam a

melhoria da qualidade do ensino e da aprendizagem.

Nessa monografia, aliou-se o estudo de bibliografia sobre a Educação Infantil a

uma situação de convivência da pesquisadora com o seu objeto de pesquisa, em um

espaço destinado a esse nível de educação. Durante o estágio no Centro Nova

Semente, ao mesmo tempo em que era desenvolvido um projeto de intervenção

destinado a contribuir para a melhoria da prática pedagógica das professoras,

realizavam-se observações para colher informações sobre o funcionamento e a

qualidade do atendimento dispensado aos alunos.

12

No primeiro momento da análise de documentos oficiais (relatórios

estatísticos e estudos realizados pela Prefeitura Municipal de Salvador) buscou-se

conhecer o atendimento de crianças de 0 a 6 anos de idade em Creches e escolas

de Educação Infantil, considerando que ainda é muito recente a inclusão dos alunos

de 6 anos no ensino fundamental. Para isso, foram utilizados os resultados dos

Censos escolares para o Brasil, a Bahia e Salvador que proporcionaram uma visão

geral da situação educacional nos últimos anos. Essas informações constituem o

primeiro capítulo da monografia.

No segundo capitulo, procurou-se verificar as recomendações de diversos

autores e dos documentos oficiais brasileiros a respeito da educação de crianças

pequenas e do bom atendimento na Educação Infantil.

O terceiro capítulo traz a análise dos padrões de qualidade do Centro Nova

Semente no atendimento dos alunos da Educação Infantil. Buscou-se relacionar o

conhecimento da sua estrutura física, do seu funcionamento e das inter-relações

existentes naquele espaço com os atuais parâmetros de qualidade defendidos por

teóricos e por setores do governo responsáveis pela administração da Educação

Infantil.

.

13

2 METODOLOGIA

A pesquisa realizada adotou uma abordagem qualitativa, pois esta teve o

ambiente natural como fonte direta de dados e a pesquisadora como seu principal

instrumento. Os dados coletados foram predominantemente descritivos. Nela

encontram-se descrições de pessoas, situações, acontecimentos, incluindo algumas

falas de professoras e da diretora do Centro Nova Semente. A atenção da

pesquisadora esteve sempre voltada para o processo educacional que ali se

desenvolvia, a fim de verificar como este processo se manifestava nas atividades,

nos procedimentos e nas interações cotidianas. Buscava-se conhecer se a

instituição observava a legislação que dá suporte a esse nível de ensino e

determinar o nível de qualidade do atendimento realizado.

2.1 O LEVANTAMENTO DOS DADOS

O principal procedimento de pesquisa utilizado foi a observação participante,

realizada no período de 23 de julho a 22 de setembro de 2008, durante o Estágio

Supervisionado do Curso de Pedagogia com Habilitação em Gestão e Coordenação

do Trabalho Escolar.

O projeto de Estágio Supervisionado possibilitou uma intervenção na área de

Gestão e Coordenação junto ao corpo docente do Centro Nova Semente. Atendeu

às necessidades de atualização de conhecimentos das professoras sobre a

Pedagogia de Projetos. Tais necessidades foram observadas durante as atividades

que antecedem o Estágio Supervisionado e tinha como objetivo principal promover

14

uma reflexão sobre educação infantil e sobre os fundamentos teóricos da Pedagogia

de Projetos.

Assim, atividades de formação continuada foram desenvolvidas com o

objetivo específico de:

- Aumentar a confiança das professoras, para que se sentissem aptas à

elaboração e aplicação da Pedagogia de Projetos no seu cotidiano;

- Auxiliar as professoras a se apropriarem das questões básicas da teoria

para construção de projetos didáticos, entendendo-os como um meio de

tornar a aprendizagem das crianças mais significativas.

- Apoiar os professores na construção e execução de um projeto didático.

Foram realizadas palestras, discussões, leitura orientada de textos,

observação do trabalho das professoras, oficinas para elaboração de projeto,

atividades em sala de aula dirigidas pela pesquisadora, acompanhamento e

observação das turmas durante a chegada ao centro, na merenda, recreio, almoço e

em situação de atividades extraclasse.

A observação participante permite ao observador uma melhor compreensão

das atitudes e interesses das pessoas do grupo pesquisado visto que, de certa

forma, ele está inserido no grupo e nas relações interpessoais que o ajudarão a

conhecer as características, sentimentos e anseios de maneira mais natural. Esse

método de pesquisa tem a grande vantagem das pessoas agirem naturalmente, sem

inibições ou tentativas de mascarar a realidade, pois devido a interação existente

entre pesquisador e pesquisado não há o sentimento de que ali está um estranho a

lhe observar. Haguette (1995, p.71) cita Schwartz e Schwartz que dizem:

O papel do observador participante pode ser tanto formal como

informal, encoberto ou revelado, o observador pode dispensar

muito ou pouco tempo na situação da pesquisa; o papel do

observador participante pode ser uma parte integral da estrutura

social, ou ser simplesmente periférica com relação a ela.

2.2 A SISTEMATIZAÇÃO DOS DADOS LEVANTADOS

15

Uma primeira sistematização dos resultados das observações realizadas foi

apresentada no relatório de estágio. Posteriormente, buscou-se uma forma de

análise que permitisse elaborar conclusões relacionadas com os objetivos da

pesquisa, que eram: conhecer o funcionamento de uma instituição de educação

infantil e comparar aspectos desse funcionamento com os padrões de qualidade

sugeridos nos documentos oficiais e em textos de autores interessados na temática.

Realizou-se então uma nova leitura dos padrões de qualidade presentes nos

textos dos Parâmetros de Qualidade para Educação Infantil, dos Referenciais

Curriculares para Educação Infantil (RCNEI-1998) e de autores como: Abramowicz,

Rizzo, Goldschmied e Sanches.

A leitura de referências sobre a “Escala de Avaliação de Ambientes Coletivos

para Crianças de 0-30 meses”, citadas por Lima e Bhering ( p.19 ), indicou a

possibilidade de usar o referido instrumento para sistematizar os dados

levantados.(Tabela 6 )

Os dados foram então agrupados de acordo com as sete categorias

contempladas na escala: 1- Espaço e mobiliário; 2-Rotinas de cuidado pessoal; 3-

Linguagem oral e compreensão; 4- Atividades; 5- Interação; 6- Estrutura do

Programa: 7- Pais e equipe.

A partir dessa sistematização procedeu-se à análise e discussão da situação

do funcionamento da Creche Nova Semente.

16

3 ATENDIMENTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: BRASIL, BAHIA E

SALVADOR

Sabe-se que, historicamente, o surgimento da pré-escola e, especialmente, das

creches não esteve relacionado a objetivos pedagógicos, mas a questões

econômicas vinculadas às necessidades das mães que ao ingressarem no mercado

de trabalho precisavam de um local para deixar seus filhos enquanto cumpriam suas

jornadas diárias de trabalho.

Embora os estudos sobre o desenvolvimento da criança demonstrem que os

estímulos recebidos, tanto na creche quanto na educação infantil, marcam de forma

duradoura a vida escolar e as aptidões futuras, no Brasil ainda é pequeno o número

de crianças atendidas na Educação Infantil. Esse tipo de educação começa a

expandir-se no país a partir da década de 70, do século XX, através da ação de

instituições privadas. No caso das creches a expansão deve-se ás instituições de

cunho assistencial.

Os dados disponíveis através do Censo Escolar realizado pelo INEP/MEC, em

2007, revelam que naquele ano 4.918.984 crianças foram atendidas na creche e na

pré-escola o que não representa nem 5,0 % da matrícula inicial total da Educação

Básica na modalidade regular registrada para todo país (Tabela 1). Esse percentual

indica a existência de um longo caminho ainda a percorrer quanto à inclusão da

população a que se destina a educação infantil

Apesar da grande importância desses dados para a educação das crianças de

0 a 6 anos, o registro estatístico ainda não é suficientemente abrangente para

subsidiar o delineamento de políticas de inclusão e atendimento. Os dados das

creches, por exemplo, começaram a ser levantados em 1998, quando foi feito o

cadastramento das escolas destinadas a atender crianças de 0 a 3 anos de idade,

em todo país. Sabe-se que esses dados são bastante incompletos quando se trata

das creches, pois um grande número desses estabelecimentos ainda funciona de

17

maneira informal, visto que não estão vinculados ao sistema educacional e, sendo

assim, não constam nas estatísticas oficiais.

Tabela 1

BRASIL. Matrícula Inicial na Educação Básica na modalidade regular, 2007

Dependência Administrativa e

localização

ENSINO REGULAR

Ensino infantil Ensino fundamental

Ensino

Médio TOTAL

creche Pré-escola Anos iniciais Anos Finais

Estadual

urbana 8.488 151.794 3.523.534 7.123.419 73.019.027 83.826.262

rural 257 16.511 271.333 327.568 56.739 672.408

Municipal

urbana 932.230 2.965.866 8.648.029 4.157.452 1.327.488 18.031.065

rural 104262 743.576 3.360.765 1.250.144 476.130 5.934.877

TOTAL (estadual e municipal)

Absolu

tos 1.048.237 3.870.747 15.803.661 12.878.503 74.879.384

108.464.612108.480.532

% 0,97 3,57 14,57 11,87 69,04 100,00

Fonte: MEC/INEP. Resultados do Censo de 2007 Disponível em : http://www.inep.gov.br/imprensa/noticias/censo/escolar/news08_01.htm.. Acesso em 19/02/2009 através de:

http://www.sec.ba.gov.br/estatistica/resultado_censo_2007.htm

3.1 ATENDIMENTO DA CRIANÇA DE 0 A 6 NO ESTADO DA BAHIA

Em 2007 foram atendidas 497.386 crianças na educação infantil do Estado da

Bahia. Neste Estado, como no restante do país a matrícula é predominantemente

18

viabilizada através da rede municipal de ensino tanto no que diz respeito à creche

como à pré-escola. São atendidos pelo município 382.212 dos 405.684 alunos da

pré-escola e 75.865 dos 91.702 dos que estão em creches (Tabela 2 ).

A Tabela 3 evidencia que houve no período que vai do ano 1999 ao ano 2007

um aumento de 28,9% na matrícula total da Educação Infantil. Os números

ressaltam a retirada progressiva do Estado e o crescimento das matrículas na

esfera municipal refletindo o cumprimento do preceito de divisão das

responsabilidades determinado na LDB 9394/96.

Os dados evidenciam também que em 2007 houve uma queda das matrículas

na rede particular, que se reflete no total da matrícula em todas as redes sem,

contudo, implicar em decréscimo da taxa global de crescimento; O gráfico I confirma

o que revela a Tabela 3. Ao longo dos nove anos considerados o crescimento tem

sido constante, porém muito discreto, apesar dos pequenos saltos observados entre

2000 e 2001 e entre 2005 e 2006.

Tabela 2

BAHIA. Matrícula na educação infantil por fase, localização e dependência administrativa, 2007

FASE

TOTAL

DEPENDÊNCIA ADMINISTRATIVA

FEDERAL ESTADUAL MUNICIPAL PRIVADA

Creche 91.702 - 607 75865 15.230

Pré-escola 405.684 - 1216 382.212 76.256

Total 497.386 - 1823 404.077 91.486

Fonte: MEC/INEP. Resultados do Censo de 2007 publicado no. DOU. 10 /01/ 2008 Disponível em: http://www.inep.gov.br/imprensa/noticias/censo/escolar/news08_01.htm

Acesso em 19/02/2009

19

Tabela 3

BAHIA. Matrícula inicial na educação infantil por dependência

Administrativa. 1999-2007

Ano Total Geral Var.Anual Federal Estadual Municipal Particular

1999 385.944 6,8 27 10.284 260.532 115.101

2000 408.580 5,9 49 11.352 287.320 109.859

2001 462.962 13,3 - 10.983 335.663 116.316

2002 475.676 2,7 - 9.873 341.186 124.617

2003 486.527 2,3 - 9.545 352.218 124.764

2004 478.278 -1,7 - 8.502 346.694 123.082

2005 532.093 11,3 - 8.044 389.693 134.356

2006 552.332 15,5 - 7.853 400.581 143.898

2007 497.386 -6,5 - 1.823 404.077 91.486

Taxa de Cres. 99/07 (%) 28,9 - - 100,0 -82,3 55,1 -20,5

Fonte:BAHIA.SEC,MEC/INEP: Ação Educar: Qualidade, compromisso de todos Elaboração dos dados e da tabela: BAHIA.SEC-SUPAV/CAI.

20

GRÁFICO I

EVOLUÇÃO DA MATRÍCULA INICIAL NA EDUCAÇÃO INFANTIL,

BAHIA 1999-2007

Fonte: BAHIA. SEC,MEC/INEP Elaboração:BAHIA. SEC-SUPAV/CAI

Na Tabela 4 os mesmos dados do Censo do ano de 2007, anteriormente

analisados através da sistematização elaborada pela Secretaria da Educação, foram

utilizados pelo INEP para demonstrar a distribuição da matrícula inicial em creches e

pré-escola por idade dos alunos1.

Segundo o Art. 30 da LDB 9.394/96, o atendimento na Educação Infantil deve

se dar em::

- creches ou entidades equivalentes, para crianças de zero a três anos de

idade;

- pré-escola para crianças de quatro a seis anos de idade

1 A diferença entre os totais das tabelas elaboradas a partir dos dados do MEC/INEP e a sistematização dos dados realizada pela Secretaria de Educação do Estado da Bahia deve-se a diferentes critérios de inclusão dos dados levantados e não invalidam a análise que pretendeu apenas mostrar os grandes contornos do problema. Note-se que em ambos os casos tratam-se de dados relativos ao mesmo levantamento – o Censo Escolar 2007.

21

Tabela 4

BAHIA. Número de alunos da Educação Infantil por

fases e faixa etária, 2007

fases

Faixa etária

Total

Faixa Etária

Até 3 anos 4 e 5 anos 6 a 9 anos Mais de 9 anos

Creche 90.986 48.228 39.625 3.094 39

Pré-escola 398.196 13.458 214.564 168.636 1.538

TOTAL

ABSOLUTOS 489.182 61.686 254.189 171.730 1577

% 100,00 12,61 51,96 35,11 0,32

Fonte: MEC/Inep.Sinopse Estatística da Educação Básica 2007 (atualizada em 26/01/2009)

Acesso em 19/02/2009 através de: http://www.inep.gov.br/basica/censo/Escolar/Sinopse/sinopse.asp

Notas do INEP: 1) Não inclui alunos de turmas de atendimento complementar.

2) O mesmo aluno pode estudar em mais de uma UF.

Pelos dados da Tabela 4, existem 13.458 alunos de até 3 anos de idade

freqüentando a pré-escola, quando o ideal seria que estes ainda estivessem em

creches.

Na faixa etária de 4 e 5 anos, quando as crianças devem ser atendidas em

pré-escolas, 39.625 alunos encontram-se ainda freqüentando as creches. E, o mais

preocupante quanto à defasagem idade-série é que ainda existem na Bahia 173.307

crianças entre 6 e mais de 9 anos de idade que frequentam creches ou ainda estão

matriculadas na pré-escola, quando já está em vigor a determinação da inclusão de

22

crianças a partir de 6 anos de idade no Ensino Fundamental, que agora deve ser de

9 anos. Há, também, 13.458 alunos precocemente matriculados na pré-escola.

3.2 ATENDIMENTO DA CRIANÇA DE 0 A 6 ANOS NO MUNICÍPIO DE

SALVADOR

A LDB 9.394/96 define que o executivo municipal seja o responsável pelo

acompanhamento, controle e supervisão da Educação Infantil nas áreas de

educação, saúde e assistência, isso com a colaboração das demais esferas do

governo e da sociedade.

O diagnóstico que integra o documento Políticas e Diretrizes para o

Desenvolvimento Infantil Integral e Integrado, elaborado pela Prefeitura de Salvador,

em 2004, indicava que a participação da esfera pública na oferta de creches e pré-

escolas era pequena em relação à demanda da população do município, nessa

época.

Entre 1980 e 2000 a população de Salvador apresentou um acréscimo

absoluto de 907.241 habitantes (aumento relativo de 63,4%). Mas, nas duas ultimas

décadas, Salvador vem apresentando taxas decrescentes do crescimento da parcela

mais jovem de sua população. O decréscimo é mais expressivo na faixa etária de 0

a 3 anos a qual, em 1980, representava 11,9% da população total. Essa taxa

apresentou o valor de 7,5% em 1991 e de 6,8% em 2000. O grupo etário das

pessoas de 4 a 6 anos cuja participação na população total era de 7,3%, em 1980,

passou para 5,2% em 2000.

O documento indica que, de acordo com Censo Escolar de 2002, existia um

déficit de vagas para Educação Infantil, mesmo levando-se em conta a expansão de

matriculas verificada entre 1999 e 2002 ( 70,7%). Vale ressaltar que o documento

da Prefeitura Municipal também registra que no ano 2000, a população de zero a

três anos de idade, em Salvador, era de 167.000, enquanto o total de crianças

freqüentando creches, em 2002, incluídas aquelas com mais de três anos de idade,

somava apenas 6.007.

23

Quanto à pré-escola, assim como para as creches, ainda havia um déficit,

embora em menores proporções. Em 2002, frequentavam a pré-escola em Salvador

36.421 crianças, isso para uma população de quatro a seis anos de idade que, no

ano 2000 totalizava 126.777 pessoas. As redes públicas de ensino abrigavam, no

mesmo ano, apenas 37,7% do total de matriculados na pré-escola, percentual ainda

baixo em relação às médias estadual e nacional, que eram de 73,1% e 74,5%,

respectivamente. (PMS, 2004, p. 17).

Segundo o mesmo documento, entre os anos de 1999 e 2002, a matrícula em

pré-escolas da rede pública aumentou 138,3% enquanto o setor privado reduziu a

sua participação apresentando um decréscimo de 5,2% nas matriculas de crianças

pequenas. Em números absolutos houve um aumento de 5.568 alunos, no período

considerado, tendo as escolas municipais passado a absorver 75,6% do total de

alunos da pré-escola publica.

A Tabela 5 mostra o atendimento das crianças da Educação Infantil em

Salvador, segundo os dados do censo de 2007. Enquanto na Bahia havia, no

mesmo ano, um total de 405.900 alunos matriculados na rede pública de educação

infantil (Tabela 3), Salvador, no mesmo período, contava com 21.567 crianças

matriculadas em escolas públicas. A rede estadual tinha uma matricula inicial de 769

crianças e a rede municipal era responsável por 20.798 alunos, sendo que destes,

4.267 crianças estavam matriculadas em creches.

Tabela 5

SALVADOR. Matrícula na rede pública da Educação Infantil.

2007

Dependência administrativa Creche Escola total

Estadual 211 558 769

Municipal 4267 16531 20798

Total (Estadual e Municipal) 4.478 17.089 21.567

Fonte: MEC/INEP. Resultados do Censo de 2007 Disponível em: http://www.inep.gov.br/imprensa/noticias/censo/escolar/news08_01.htm. Acesso em 19/02/2009 através de http://www.sec.ba.gov.br/estatistica/resultado_censo_2007.htm .

24

3.3 A POLÍTICA DE ATENDIMENTO DA EDUCAÇÃO INFANTIL NA PREFEITURA MUNICIPAL DO SALVADOR

A Secretaria Municipal de Educação e Cultura (SMEC), afirma ter como

Diretrizes Pedagógicas a concretização de ações básicas que visam garantir a

permanência do aluno na escola e o sucesso de sua formação escolar. Desta forma,

espera contribuir para a inclusão social e o exercício da cidadania em situações de

igualdade com crianças, jovens e adultos de condições sociais e econômicas mais

favoráveis, em conformidade com as diretrizes curriculares nacionais e com as

normas legais locais, definindo pressupostos que garantem a equidade e a melhoria

da qualidade do ensino e da aprendizagem.2

A legislação brasileira define que o executivo municipal é responsável pelo

acompanhamento, controle e supervisão da educação infantil. Diante disso, a

Prefeitura de Salvador elaborou, em 2004, com a participação das Secretarias

Municipais de Educação e Cultura, da Saúde, do Trabalho e Desenvolvimento

Social, do Instituto Ação Comunidade e com o apoio da UNICEF/BA o documento

“Políticas e Diretrizes de Desenvolvimento Infantil Integral e Integrado”. Este, então,

serve para orientar as ações promovidas pela Prefeitura Municipal do Salvador, bem

como para estimular e coordenar ações da sociedade com relação ao pleno

desenvolvimento infantil.

O documento propõe políticas e diretrizes direcionadas à criança pequena em

Salvador e declara o compromisso de assegurar de forma efetiva os direitos da

criança de zero a seis anos de idade. Tem como objetivo integrar todas as ações

dirigidas às crianças dessa faixa etária, promovendo a articulação entre as ações

governamentais, as relativas às famílias e as próprias da sociedade civil, tendo

como eixos norteadores de suas ações a atenção à criança, a proteção à

maternidade e o apoio à família.

2 Informações colhidas em visita à Coordenação de Ensino e Apoio Pedagógico da Secretaria Municipal do Salvador, realizada no mês de novembro 2008.

25

Embora os princípios e diretrizes de políticas públicas sejam dirigidos a todas as

crianças pequenas e suas famílias, o Município de Salvador dá especial atenção às

crianças e famílias que têm condições excepcionalmente difíceis. Os princípios que

orientam as políticas para a infância no município são:

1- A criança é sujeito de direitos e prioridade absoluta;

2- A família é o espaço natural de proteção, cuidado e educação da criança

pequena;

3- O município é o responsável imediato pelo desenvolvimento infantil integral, e

é a área de educação a condutora desse processo;

4- A participação da sociedade civil organizada é fundamental na construção,

implementação, acompanhamento e controle social das políticas voltadas

para as crianças pequenas;

5- Os conhecimentos produzidos pelas ciências são igualmente importantes

para o desenvolvimento e implementação das políticas voltadas para as

crianças pequenas.

A compreensão da sociedade atual é que a criança é sujeito de direitos e

prioridade absoluta. O primeiro dos direitos, e que dá sentido aos demais, é o direito

de ser criança, devendo esta, ser respeitada como um ser único, com ritmo próprio

de desenvolvimento, devendo ser protegida, cuidada e amada.

Partindo desses princípios o documento propõe algumas linhas de trabalho que

apoiariam a operacionalização de suas ações, entre as quais destacam-se:

• Universalização da educação infantil, priorizando as áreas da cidade com

maior índice de desemprego, violência e falta de infraestrutura e saneamento

básico, fundamentada nos princípios da inclusão social e da integralidade do

desenvolvimento da criança pequena, e na interação das famílias e

comunidade, de forma a atender toda demanda em tempo integral;

• Coordenação institucional da educação infantil no município, incorporando os

centros públicos estaduais e apoiando financeira e tecnicamente os centros

comunitários e filantrópicos, orientando as instituições privadas, de modo a

assegurar o cumprimento das diretrizes do Conselho Municipal de educação;

26

• Atendimento à criança em dois eixos, cuidar e educar, garantindo a proteção,

assistência e pleno desenvolvimento da criança pequena;

• Qualificação dos atuais profissionais que atuam com crianças de zero a seis

anos nas instituições comunitárias e filantrópicas;

• Implementação de programas de formação continuada, integrando as

diversas áreas que atuam com crianças de zero a seis anos de idade;

• Garantia de um percentual de aplicação do orçamento de educação, para a

Educação Infantil;

• Elaboração de planos plurianuais e anuais integrando os programas e

atividades dos diversos órgãos do Executivo Municipal voltados para a

criança pequena e suas famílias, assegurando os recursos orçamentários

para a execução das políticas e diretrizes assumidas pelo Município.

No ano de 2005 a Prefeitura de Salvador elabora um novo documento divulgando

ações e metas para o período de 2005 a 2008. Trata-se do documento “Educação

de Qualidade, Novos Rumos para a Cidade”. Nesse documento está explícito o

conceito de “Educação de Qualidade” que na visão do município, é aquela que não

visa tão somente a inserção do jovem no mercado de trabalho, mas a que contempla

uma formação humanista pautada em valores éticos, capaz de desenvolver a auto-

estima dos alunos, ampliar a capacidade de pensar, questionar, relacionar e de

aprender a aprender.

Em vista de uma melhor qualidade para a educação propõe as seguintes

diretrizes estratégicas:

a) Equidade e qualidade do processo de ensino e aprendizagem;

b) Democratização do acesso, mediante qualificação, reordenação e expansão da

rede física municipal;

c) Valorização da cultura e saber popular no processo de ensino e aprendizagem;

d) Democratização e modernização da gestão garantindo o caráter participativo e

descentralizado;

e) Valorização e formação continuada dos trabalhadores e trabalhadoras em

educação.

27

Nesse documento, são definidas metas a serem atingidas até 2008 e um

conjunto de ações para viabilizá-las. Dentre as que estão mais diretamente

relacionadas com a Educação Infantil estão as metas de:

-Implantar e implementar as Políticas e Diretrizes de Desenvolvimento Infantil

Integral e Integrado;

-Ampliar o atendimento de crianças de 0 a 3 anos com a municipalização de

46 creches que serão construídas como espaços de Educação Infantil;

-Garantir a graduação de 100% dos professores e a pós-graduação de 50%

dos professores e gestores escolares e dos profissionais que atuam nas

Coordenadorias Regionais de Ensino (CRE) e no Órgão Central, até 2008;

Os dados descritos nesse capítulo permitiram uma visão geral dos aspectos

quantitativos do atendimento na Educação Infantil nos últimos anos no Brasil, na

Bahia e no município de Salvador sem, contudo, tratar de causas e conseqüências.

Se por um lado os resultados dos Censos educacionais dão conta de situações

ainda distantes do ideal, por outro lado, nos diversos documentos da Prefeitura

Municipal do Salvador já se vislumbra uma tentativa de enfrentamento dos desafios

atuais para a educação como um todo: a incorporação na escola de todas as

crianças e jovens em idade escolar e a garantia da sua permanência. Vislumbra-se,

também uma preocupação com a qualidade na educação e com o sucesso escolar.

É a respeito dessa “qualidade” que nos reportaremos no capitulo a seguir.

28

4 FUNDAMENTOS DE QUALIDADE NA EDUCAÇÃO INFANTIL

As mudanças ocorridas na educação infantil nos últimos anos, embora

tenham sido muitas, ainda não atendem de maneira adequada ao que se espera

para o público de 0 a 6 anos. Público esse, que sempre foi alvo de ações de cunho

assistencialista e filantrópico, cuja principal função era de guarda e proteção da

criança, considerando que esta deveria ser preservada de situações de extrema

necessidade e pobreza da sua família.

Com o tempo, além da filantropia, outras atribuições foram sendo assumidas

pelas creches, que passaram a desempenhar uma função sócio-educativa, além da

guarda das crianças enquanto as mães estavam fora de casa. Isso fazia parte da

luta das mulheres trabalhadoras pelo direito de ter um local seguro e de qualidade

para deixar os seus filhos enquanto trabalhavam.

Foi somente quando segmentos da classe média aderiram à utilização de

creches particulares para seus filhos, que a sociedade acordou para as questões

pedagógicas e, sob a pressão desse novo público e dos movimentos operários e

feministas que combatiam a desigualdade social nos anos de 1970 e 1980, abre-se

um diálogo sobre o desenvolvimento infantil e a construção de conhecimento pelas

crianças pequenas. Esses movimentos dão origem à luta pela democratização da

escola pública brasileira favorecendo o reconhecimento, na Constituição Federal de

1988, da educação em creches e pré-escolas como um direito da criança e um

dever do Estado. Assim, está escrito no Artigo 205 da Constituição Federal:

A Educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será

promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao

pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para a cidadania e sua

qualificação para o trabalho.

E o Artigo 206 diz que o ensino será ministrado com base nos princípios

de igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, enquanto no

Artigo 208 lê-se que o dever do Estado com relação à Educação será efetivado com

29

a garantia de atendimento em creches e pré-escolas às crianças de 0 a 6 anos de

idade.

Esses artigos sinalizam para avanços importantes na perspectiva da

qualidade, do pleno desenvolvimento da pessoa e da preparação para o exercício da

cidadania, independente de origem, sexo, etnia, necessidades especiais, classe

social, diversidade cultural ou diferenças regionais.

4.1 A EDUCAÇÃO INFANTIL NA LBB 9394/96

A partir da Constituição Federal de 1988, outras leis e documentos em defesa

da Educação Infantil garantiram o reconhecimento dos direitos das crianças,

reivindicados por movimentos populares e grupos organizados da sociedade civil.

Um desses documentos é o Estatuto da criança e do adolescente (ECA-

1990), que reafirmou em seu Artigo nº 54, o direito ao atendimento em creches e

pré-escola das crianças de zero a seis anos de idade.

A Lei 9394/96, de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) de 20 de dezembro

de 1996, vem complementar o que já havia sido estabelecido na Constituição,

quando no seu Art. 21, deixa claro: “A educação escolar compõe-se de: I –

Educação Básica, formada pela Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino

Médio (...)”. No capitulo sobre a Educação Básica, Seção II, Art. 29, estabelece que:

A Educação Infantil, primeira etapa da Educação Básica, tem como

finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em

seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, completando a ação

da família e da comunidade.

Em seu Artigo 4º, a LDB, confirmou que o atendimento gratuito em creche e

pré-escola é dever do Estado. Deixou claro, também, que o atendimento a essa

faixa etária está sob a incumbência dos municípios, determinando que todas as

30

instituições de Educação Infantil, públicas e privadas, estejam inseridas no sistema

de ensino.

O Artigo 30 da mesma LDB determina que a Educação Infantil é parte

integrante da primeira etapa da Educação Básica ehttp://www.ssrevista.uel.br/c_v6n2_selma.htm - _ftn3#_ftn3 será oferecida em: “I- creches

ou entidades equivalentes, para crianças de zero a três anos de idade; II- pré-escola

para crianças de quatro a seis anos de idade”. Sendo que, para esta faixa etária, o

atendimento ainda não é obrigatório, como no caso das crianças a partir dos seis

anos de idade.

Gilda Rizzo (2006, p. 42), observa que o desenvolvimento infantil começa a

ser considerado no planejamento do sistema de educação geral e a ser entendido

em suas características, fazendo alusão à LDB, nos seguintes termos:

No Brasil, a nova LDB, de 1996, (...) define a educação infantil como sendo

a primeira etapa da educação básica, tendo por finalidade o

desenvolvimento integral da criança até os seis anos de idade, em seus

aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação

da família e da comunidade. A Lei nº 9.394/96 ainda vai mais além, quando

determina, no seu artigo 31, que a avaliação, na educação infantil, far-se-á

mediante acompanhamento e registro do seu desenvolvimento, sem

objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao ensino fundamental.

Quando a lei define que a educação infantil será parte do desenvolvimento

integral da criança, fica evidente a necessidade de uma ação conjunta de co-

responsabilidade entre a família, comunidade e poder público. E é sob a ótica de

tomar a criança como um todo que o processo de ensino/aprendizagem foi pensado,

inclusive a avaliação da aprendizagem, devendo esta ser processual e acontecer de

forma sistemática e contínua. O acompanhamento e registro do desenvolvimento

devem ter objetivos de diagnóstico sem a pretensão de promoção ou retenção, o

que exige estratégias metodológicas específicas.

Em decorrência da mudança da visão assistencialista para a visão

educacional das creches e pré-escolas, a LDB também prevê que o professor

possua a mesma formação exigida para as séries iniciais do Ensino Fundamental:

nível superior em cursos de licenciatura, admitindo-se, como formação mínima, a

31

oferecida em nível médio na modalidade normal. A Lei estabelece, também, que os

sistemas promoverão a valorização e a formação em serviço desses profissionais. A

esse respeito Sanches (2003, p. 15) escreveu:

Considerando a tradição assistencialista do histórico de creche, o desafio é

integrá-la em uma dimensão educativa, profissionalizando seus

trabalhadores. Isso implica melhorar o atendimento às crianças, nas

creches, numa perspectiva de ação educativa e intencional e de qualidade.

Portanto, o atendimento deve aliar as responsabilidades de abrigo,

alimentação e higiene, aos cuidados de saúde mental, crescimento cultural e

psicopedagógico, enfim, ao desenvolvimento integral da criança. Essa é a tônica dos

discursos e propostas desse novo contexto da Educação Infantil.

4.2 CONCEPÇÃO DE QUALIDADE NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Sabe-se que há alguns anos atrás, muitas mães tinham grande preconceito

em relação ao ambiente “creche”, deixando até mesmo de trabalhar após a

maternidade, quando não tinham o suporte da família, como as avós e as tias.

Acreditava-se que a creche era um “depósito” de crianças, sem nenhum

comprometimento com a educação das mesmas, e onde seus filhos estariam em

contato com vários tipos de “criação” e aprenderiam valores que não eram do seu

agrado. Esse pensamento comum na época, e que ainda faz parte das crenças de

algumas pessoas, considerava a creche como uma instituição para crianças muito

pobres cujas mães não tinham condições de ficar em casa para educá-las de

maneira correta e, até mesmo, para iniciá-las nas “primeiras letras” como era

costume.

Essa desconfiança foi desaparecendo à medida que a creche passou a ter

uma nova conceituação, que foi bem esplanada por Rizzo (2006, p. 49):

32

Creche é, dentro do conceito atual, um ambiente especialmente criado para

oferecer condições ótimas que propiciem e estimulem o desenvolvimento

integral e harmonioso da criança sadia nos seus primeiros três anos de

vida. A verdadeira finalidade da creche é responder pelos cuidados

integrais da criança na ausência da família.

A partir dessa visão, novas diretrizes e parâmetros de ação foram

determinados em atendimento aos novos pontos de vista legal, social e educacional,

em busca de uma nova organização na estrutura funcional das escolas de educação

infantil.

A Constituição de 1988 e a LDB de 1996, estimularam o início de um

processo de reestruturação administrativa, técnica, política e pedagógica junto às

instituições de Educação Infantil, principalmente as atuantes na esfera da

Assistência Social. Para que esse trabalho tivesse o êxito desejado o Ministério da

Educação (MEC), apresenta os documentos Parâmetros Nacionais de Qualidade

para a Educação Infantil e o Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil.

O Referencial Curricular para Educação Infantil (RCNEI 1998) foi concebido

para servir como um guia de reflexão sobre objetivos, conteúdos e orientações

didáticas para profissionais que atuam com crianças de 0 a 6 anos. Dá importante

contribuição ao planejamento, desenvolvimento e avaliação de práticas educativas

visando uma educação de qualidade e o desenvolvimento integral da criança.

Por sua vez, os Parâmetros Nacionais de Qualidade para Educação Infantil

(MEC 2006) foram elaborados com o objetivo de estabelecer padrões de referência

no que se refere à organização e funcionamento das instituições de educação

infantil.

Apesar da existência desses documentos de apoio à prática educativa nas

escolas e creches, ainda é freqüente encontrarmos um pensamento assistencialista

em algumas instituições de educação infantil, principalmente aquelas cujo

atendimento é destinado às crianças cujas famílias têm pouco poder aquisitivo.

Essas entidades, apesar das mudanças, estão processando lentamente as novas

orientações e tardam a descartar a herança construída no tempo em que sua

atividade era destinada a compensar a ausência da família nos cuidados básicos

das crianças pequenas, mas já dão sinais de considerar as perspectivas

33

educacionais. Já se nota uma mudança na visão das pessoas que procuram as

escolas e creches para matricular seus filhos. Segundo o RCNEI (1998, p. 17):

Modificar essa concepção de educação assistencialista significa atentar para

várias questões que vão muito alem dos aspectos legais. Envolve,

principalmente, assumir as especificidades da educação infantil, as relações

entre classes sociais, às responsabilidades da sociedade e o papel do

Estado diante das crianças pequenas.

Educar, segundo o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil

(RCNEI 1999), significa promover situações de cuidados, brincadeiras e

aprendizagem, de forma a possibilitar o desenvolvimento integral da criança,

considerando seus aspectos físicos, emocionais, afetivos, cognitivo e sociais. Para

tanto, ela deve ser considerada um ser humano único, comple to, e que está em

desenvolvimento. Trata-se de mudar a visão de criança como um ser vazio que não

sabe nada e precisa ser preenchido, tão comumente declarado por alguns

professores, para perceber a criança como pessoa competente para interagir e

produzir cultura no meio em que vive. Portanto, o que deve caracterizar a função

atual da Educação Infantil deve ser uma verdadeira integração entre educação e

assistência.

De acordo com os Parâmetros de Qualidade para a Educação Infantil os

objetivos educacionais das creches e escolas para crianças de 0 a 6 anos, devem

ser pautados no currículo específico para Educação Infantil abrangendo os três

grandes eixos: o brincar, o movimento e o conhecimento de si e do outro. Esses

parâmetros consideram que para haver qualidade na educação infantil é necessário

levar em conta que as crianças desde que nascem são:

• Cidadãos de direitos;

• Indivíduos únicos, singulares;

• Seres sociais e históricos;

• Seres competentes, produtores de cultura;

• Indivíduos humanos, parte da natureza animal, vegetal e mineral.

34

Para isso, devem ser criadas condições em que as crianças desfrutem da vida ao

ar livre, aprendendo a conhecer o mundo da natureza em que vivemos,

compreendendo que as nossas ações influenciarão na biodiversidade, e que elas

como ser humano fazem parte da natureza. E isso, diante das atuais condições de

funcionamento de muitas instituições ainda está por acontecer. A maioria das

escolas, especialmente as de cunho comunitário, não apresenta as condições

básicas materiais e físicas para esse atendimento. Por exemplo, superlotam suas

salas. Esse procedimento, com certeza de muito boa vontade, contraria o Parecer

CNE/CEB n° 22/98 de 17/12/98, que trata de questões relativas à qualidade da

educação, e determina que a relação adulto-criança nas instituições de educação

infantil, deve ser de:

• 1 professor para 6 a 8 bebês de 0 a 2 anos;

• 1 professor para cada 15 criança de 3 anos;

• 1 professor para cada 20 crianças de 4 a 6 anos.

Outros parâmetros de qualidade encontram-se no Parecer CNE/CEB nº 04/00, de

16/02/00, que aprovou as Diretrizes Operacionais para a Educação Infantil

(MEC/2006), as quais deliberam sobre a vinculação das instituições de Educação

Infantil aos sistemas de ensino e sobre vários aspectos que afetam a qualidade do

atendimento como: proposta pedagógica, regimento escolar, formação de

professores e outros profissionais, espaços físicos e recursos materiais. Essas

diretrizes definem também a responsabilidade dos municípios que possuem um

Sistema Municipal de Ensino, de autorizar com validade limitada, avaliar e

supervisionar as instituições de Educação Infantil inseridos em seu sistema.

Também de grande relevância para a qualidade na educação de crianças

pequenas são as orientações curriculares e a metodologia que são aplicadas de

maneira intuitiva, sem considerar os fundamentos teóricos apropriados para a

Educação Infantil. Porém, toda ação deve ter uma intencionalidade, respeitando-se

sempre a criança em seu desenvolvimento físico, mental, cognitivo e psicológico. O

currículo da Educação Infantil a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional ganha abrangência com o objetivo de desenvolver as capacidades da

criança de 0 a 6 anos de idade no sentido de integrá-la ao meio social em que vive.

35

Antes, a prática era de formação de hábitos e desenvolvimento psicomotor. (RIZZO,

1992, p. 30).

Segundo os parâmetros e diretrizes oficiais, o trabalho pedagógico para esse

nível de educação deve contemplar Conteúdos Conceituais, Procedimentais e

Atitudinais para cada faixa etária, e ser desenvolvido de maneira integrada às áreas

de estudo: Conhecimento do Mundo, Artes Visuais, Língua Oral, Língua Escrita,

Matemática e Música. Tudo isso considerando ainda, os três grandes eixos

propostos pelo RCNEI (1998): o Brincar, o Movimento e o Conhecimento de si e

do outro. RIZZO (2006, p. 106) sintetiza esse novo momento curricular escrevendo:

Assim como a pré-escola, a creche não visa à escolarização do aluno,

nem à passagem de conteúdo ou matérias, mas ao que é essencial à

aprendizagem futura e à formação de hábitos e atitudes adequados à

melhor utilização da inteligência, das habilidades inatas, fazendo o aluno

ganhar gradativa e crescente autonomia intelectual e social, desenvolvendo

linguagem e pensamento. Visa também ao desenvolvimento de habilidades

psicomotoras, de forma integral e harmoniosa (...) assim como visa à saúde

física e mental da infância de uma sociedade.

Ainda, se encontra o empirismo na educação infantil principalmente em

instituições cuja meta principal é o assistencialismo e a filantropia. O parecer que

estabelece as Diretrizes Operacionais para a Educação Infantil determina que os

fundamentos norteadores dos projetos pedagógicos desenvolvidos nas instituições

de Educação Infantil são:

a) Princípios Éticos da Autonomia, da Responsabilidade, da Solidariedade e do

Respeito ao Bem comum;

b) Princípios Políticos dos Direitos e deveres da Cidadania, do Exercício da

Criticidade e do Respeito à Ordem Democrática;

c) Princípios Estéticos da Sensibilidade, da Criatividade, da Ludicidade, e da

Diversidade de Manifestações artísticas.

É nessa perspectiva que Rizzo (2006) e Sanches (2003) também apontam

elementos que integram o conceito de qualidade na educação infantil. Esses

36

elementos apontam para a qualidade do ambiente físico, da proposta pedagógica,

da relação quantitativa adulto/criança, das relações afetivas que permeiam a

vivencia entre adultos e crianças, da qualificação do pessoal docente, administrativo

e de apoio, etc.

Tais elementos encontram-se consistentemente integrados na “Escala de

Avaliação de Ambientes Coletivos para Crianças de 0-30 meses”, que foi utilizada

por Lima e Bhering, composta de 39 itens, distribuídos entre sete dimensões

relativas a espaço, rotinas de cuidado pessoal, linguagem, atividades, interação,

estrutura do programa e pais e equipe. Esta escala foi aplicada na avaliação de

cinco Centros de Educação Infantil de um município de Santa Catarina (Tabela 6).

37

Tabela 6 Escala de Avaliação de Ambientes Coletivos para Crianças de 0 a 30 meses

Sub-escalas Itens

1. Espaço e mobiliário

1. Espaço interno 2. Moveis para cuidado de rotinas e brincadeiras 3. provisões para relaxamento e conforto

4. Organização da sala 5. Exposição de materiais para crianças

2. Rotinas de cuidado pessoal

6. Chegada/Saída 7. Refeições/merendas

8. Sono 9. Troca de fraldas/Uso de banheiro 10. Práticas de saúde

11. Praticas de segurança

3. Linguagem oral e compreensão

12. Auxilio às crianças para compreenderem a linguagem 13. Auxilio às crianças para usarem a linguagem 14. Uso de livros

4. Atividades

15. Motora fina

16. Atividade física 17. Arte 18. Música e movimento

19. Blocos 20. Dramatizações 21. Areia/Água

22. Natureza/Ciências 23. Uso de TV, vídeo, e/ou computador 24. Promoção da aceitação de diversidade

5. Interação

25. Supervisão do brincar e do processo de aprendizagem

26. Interação criança – criança 27. Interação equipe – criança 28. Disciplina

6. Estrutura do Programa

29. Programação

30. Atividade livre 31. Atividades em grupo 32. Medidas para crianças com necessidades especiais

7. Pais e Equipe

33. Medidas para o envolvimento de os pais

34. Medidas para as necessidades pessoais da equipe Medidas para atender as necessidades profissionais da equipe 36. Interação e cooperação entre a equipe

37. Estabilidade da equipe 38. Supervisão e avaliação da equipe 39. Oportunidade para desenvolvimento profissional

Extraído de: Lima e Bhering. Creche como contexto de Desenvolvimento: Um estudo sobre o ambiente de creches em um município de SC. Comunicação submetida à reunião Anual da Associação Nacional de pós-graduação e Pesquisa em Educação- Anped, 2006. Disponível em:< WWW.anped.org.br/reunioes /29ra/trabalhos/trabalho/GT07-2670-int.pdf>.

Acesso em: 19/02/2009.

38

5 O ATENDIMENTO DE CRIANÇAS DE 2 A 7 ANOS NO CENTRO

NOVA SEMENTE

Após uma passagem rápida em uma creche municipal durante estágio

curricular de co-participação, veio o desejo de conhecer como acontece o

atendimento educacional dedicado às crianças pequenas em creches comunitárias,

o que motiva esse atendimento, e se as recomendações do MEC de educação de

qualidade para as crianças pequenas estão sendo observadas. Procurei adotar

como parâmetros para minhas observações o que recomendam os documentos

oficiais para esse nível de ensino como: Referenciais Nacionais para Educação

Infantil (RCNEI) e os Parâmetros de Qualidade para a Educação Infantil.

5.1 O CENTRO NOVA SEMENTE

As creches comunitárias surgem quando o Estado, a quem é direcionado o

dever e a responsabilidade de oferta, segundo a LDB/96, ainda não consegue

proporcionar vagas para a maioria da população, então, entra em ação pessoas de

boa vontade tentando preencher a lacuna aí existente. Isso aconteceu com Centro

Nova Semente. A sua escolha como objeto de pesquisa e de estágio, deu-se em

primeiro lugar por sua condição de instituição Educação Infantil. A proximidade do

bairro onde trabalho e resido também influenciou essa escolha.

O bairro onde está localizado o Centro Nova Semente faz parte da área do

Cabula, composta de bairros cuja população, em sua maioria, é considerada de

baixa renda. Como todos os bairros de periferia apresenta uma grande deficiência

no atendimento educacional proporcionado pelo poder público, faltando vagas para

crianças de 0 a 5 anos devido a um número insuficiente de escolas e creches na

área, em comparação com a grande densidade populacional.

39

A Creche Escola Centro Nova Semente é uma entidade filantrópica e atende

a crianças a partir de dois anos de idade. Foi fundada, e desde então dirigida, por

uma freira, que foi sensibilizada pela situação de carência social e educacional

daquela comunidade. Está localizada em uma comunidade de baixo poder aquisitivo

e atualmente está ligada a uma casa abrigo para crianças de ambos os sexos, em

funcionamento no mesmo bairro. No inicio de seu funcionamento atendia somente a

crianças da comunidade, hoje também acolhe as crianças do abrigo. O prédio é

próprio, com quatro andares, embora no momento sejam utilizados apenas o térreo

e o subsolo.

Na época do estágio possuía 79 alunos assim distribuídos:

Tabela 7

Quantidade de alunos do Centro Nova Semente por fases e idade

2008

Fases/níveis Quantidade Idade (variação)

G 2-3

-10 alunos do abrigo

-19 alunos da comunidade

2 e 3 anos

G 4-5

- 6 alunos do abrigo

-22 alunos da comunidade

4 a 6 anos

Inicial

-8 alunos do abrigo

-14 alunos da comunidade

6 a 9 anos

Total

-24 alunos do abrigo

-55 alunos da comunidade

Fonte: Pesquisa direta

Quanto ao Corpo Docente, o Centro contava com três professoras:

a) Professora do G 2-3, Nível médio, cursando Pedagogia, funcionária da escola

há 3 anos;

40

b) Professora do G 4-5, Nível médio, funcionária há 5 anos;

c) Professora do Inicial, Nível médio, cursando Pedagogia, funcionária há 9

anos.

Assim como nas primeiras creches, o histórico da Nova Semente foi, a principio,

assistir às crianças em suas necessidades de cuidado, proteção e alimentação e,

em conseqüência, veio a educação. Percebe-se esse apelo assistencialista nas falas

tanto das professoras como da administração ao afirmarem que muitas crianças que

ali se encontram estariam na rua, desamparadas do sistema educacional, não fosse

seu acolhimento pela Instituição. Existe, também, segundo observei nas palavras da

administradora, uma preocupação em não dispensar alunos para proporcionar um

tempo de orientação pedagógica das professoras, pois para muitas crianças esse

seria um dia de alimentação deficiente.

5. 2 O ESTÁGIO

.

O estágio curricular na Creche Escola Nova Semente, exigiu a elaboração de

um projeto de intervenção contemplando aspectos relativos ao planejamento e

gestão escolar, visto que o curso de Pedagogia tem a habilitação em Gestão e

Coordenação do trabalho escolar. Esse estágio tinha o objetivo de proporcionar à

estagiária, conhecimentos técnicos específicos da profissão e, à Instituição,

atividades de formação continuada das professoras, promovendo, assim, ações

efetivas de socialização, colaboração e integração entre a Universidade e a escola.

Como um estágio de intervenção não é comum, as professoras tinham a

expectativa de acolher uma estagiária que fosse trabalhar na sala, com as crianças,

como se observa frequentemente. Da mesma forma, esta também era a fala da

administradora e diretora da Instituição que afirmava desconhecer estágio dessa

natureza. Foi necessário muito diálogo e explicação para que entendessem a nova

proposta, embora ainda permanecesse alguma desconfiança quanto ao que ia

41

acontecer, deixando transparecer nesse momento, certa “resistência”,

principalmente da parte de uma das professoras.

Busquei durante o estágio no Centro Nova Semente o conhecimento da sua

estrutura física, do seu funcionamento e das inter-relações existentes para uma

melhor compreensão da realidade cultural e educacional que esta parcela da

população vivencia. Foi, também, um objetivo perceber o quanto esta instituição

estava aproximada, ou distanciada, dos parâmetros ideais de qualidade para a

educação infantil.

Partindo da realidade encontrada, o desenvolvimento do projeto de estágio,

denominado de “Repensando a Metodologia de Projeto com as Professoras do

Centro Nova Semente”, teve o propósito de realizar encontros de formação, com as

docentes, abordando questões básicas sobre Projetos Didáticos (figura 1). Esta

formação esteve voltada para o desenvolvimento de prática pedagógica com ênfase

na criação de novos meios de conhecer, relacionar, repensar e de produzir novas

experiências de aprendizagem significativas que proporcionasse uma educação de

qualidade para as crianças da Instituição.

O projeto de estágio foi desenvolvido de 14 de agosto a 19 de setembro do ano

de 2008, tendo como metas:

• Realizar 100% dos encontros de formação continuada com as professoras do

Centro Nova Semente;

• Aumentar a confiança e o conhecimento das professoras no trabalho com

Metodologia de projeto e suas questões teóricas básicas;

• Diminuir a incidência de projetos didáticos desenvolvidos sem a devida

sistematização e estrutura apropriada.

As atividades realizadas constaram de apresentação do projeto à direção e

professoras, encontro de sensibilização com as professoras, reuniões do grupo para

estudos sobre Projeto Pedagógico, encontros para oficina de projetos, redação de

mini-projeto. O projeto elaborado em conjunto com as professoras teve como tema

“Brinquedos e Brincadeiras”, e foi planejado para ser desenvolvido com as crianças

do Centro Nova Semente, na semana que antecederia o Dia da Criança. Para

finalizar, houve um encontro para avaliação do estágio e do Projeto, constando de

avaliação oral e escrita, quando as professoras falaram da sua satisfação e

42

agradecimento pelo bom aproveitamento que tiveram com as atividades

desenvolvidas.

Durante o estágio, foram feitas as observações que serviram de base para o

conhecimento desse ambiente educativo, envolvendo os aspectos físicos e humanos

e as interações que ali se processam. Em nenhum momento a pretensão foi de fazer

uma avaliação da Instituição, mas o objetivo sempre foi o de conhecer e de realizar

um confronto entre a realidade observada e os parâmetros de qualidade propostos

para a Educação Infantil.

5.3 ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES LEVANTADAS

LIMA e BHERING, citando Bondioli, diz que a avaliação dos ambientes

educativos para crianças pequenas é um desafio e ela deve ser percebida como um

mecanismo de constante reflexão sobre os aspectos e elementos que compõem

este ambiente, e não como, simplesmente, um mecanismo de medir, julgar,

comparar ou selecionar os contextos para as crianças. BONDIOLI (2004)

No texto “Creche Como Contexto de Desenvolvimento: um estudo sobre o

ambiente de creches em um município de SC”, Lima e Bhering apresentam a

avaliação que fizeram dos aspectos físicos e materiais, relacionais, sociais e

recursos humanos da educação infantil, de cinco Centros de Educação Infantil.

Apresentam o instrumento utilizado para essa tarefa que foi a escala ITERS-R-

Infant and Toddlers Environmemt Tating Scale- Revised (Harms, Cryer, Cliford,

2003) intitulada, em português, “Escala de Avaliação de Ambientes Coletivos para

Crianças de 0-30 meses”. Rocha Lima e Bhering apresentam a referida escala em

seu texto explicando:

43

Esta escala aborda vários elementos que compõem a qualidade da

proposta pedagógica e da escola de educação infantil para crianças entre 0

a 30 meses (FERRARI, 2003; AGUIAR, BAIRRAO E BARROS, 2002)

reunindo vários aspectos levantados por vários profissionais e

pesquisadores da área. Ela é composta de sete sub-escalas (Mobiliário e

disposição de materiais; Rotinas e cuidados pessoais; Linguagem oral e

compreensão; Atividades; Interação; Estrutura do programa e equipe). As

sete sub-escalas possuem trinta e nove itens no total as quais possibilitam

analisar os elementos e organização do ambiente assim como os aspectos

mais subjetivos. (p 6)3

Os itens da escala deveriam servir de base para qualquer instituição desse

nível de ensino pautar sua organização e funcionamento, pois fazem parte das

orientações da legislação vigente que direciona e normatiza o funcionamento e

organização das creches e escolas para a Educação Infantil. A oferta de uma

educação de qualidade para criança pequena precisa atender às necessidades de

aprendizagem e crescimento das crianças. Para isso as Instituições, antes de

qualquer coisa, devem trabalhar para promover uma organização adequada a esse

propósito. Ao falar de organização das instituições de ensino, Colombo (2006 p. 28),

avalia:

Mais do que qualquer outra organização, a instituição de ensino deveria

ser, como empresa, um modelo de aprendizagem para toda comunidade.

Infelizmente, não é isso que acontece em varias escolas. Geralmente

encontramos grandes lacunas entre as competências atuais da instituição

de ensino e o que seria necessário para obter o desempenho desejado.

A Escala de Avaliação de Ambientes coletivos para Crianças de 0 a 30 meses

inclui vários itens contemplados nos parâmetros de qualidade da escola e da

educação infantil. Esses itens encontram-se agrupados em sete sub-escalas

(Tabela 6).

Essas sub-escalas foram utilizadas para organizar a análise descritiva das

informações levantadas na Creche Escola Centro Nova Semente. Considera-se que,

3 Transcrito de acordo com o original

44

de um modo geral, os 39 itens que as compõem são aplicáveis à Educação Infantil

contemplando também as necessidades de crianças de até 06 anos.4

5.4 ANÁLISE DO FUNCIONAMENTO DO CENTRO NOVA SEMENTE

5.4.1 Espaços e mobiliários

Nessa sub-escala, estão os itens de espaço interno; móveis para cuidados de

rotinas e brincadeiras; provisões para relaxamento e conforto; organização da sala;

exposição de materiais para crianças. Dentro desse contexto foi observado que a

Creche Escola Centro Nova Semente tem uma construção onde a fachada de

entrada é toda fechada, sem visualização da rua e ali a criança passa o dia cuja

visão única é a do interior da escola; isso vem de encontro às recomendações para

uma educação infantil de qualidade, que apontam para a necessidade da criança

estar em contato com o ambiente e interagindo com ele. Apenas em algumas

oportunidades extraordinárias os alunos saem da creche e vão até o abrigo e, aí

sim, encontram espaço e interação com a natureza, além de brinquedos em um mini

parquinho ali existente. Essas idas ao abrigo não são freqüentes devido à

dificuldade dos professores em atravessar uma pista com as crianças e à falta de

outras pessoas que as ajudem a cuidar delas nesse espaço mais amplo.

O espaço físico interior do Centro compõe-se de um salão grande, com um

pequeno sanitário e bancos de alvenaria que circundam todo salão, onde todos os

dias as crianças são recebidas pela manhã permanecendo ali algum tempo nas

interações, brincadeiras não direcionadas e orações com músicas nas filas, antes de

entrar nas salas. Este salão dá acesso a um minúsculo pátio descoberto, onde fica a

secretaria, na qual na maioria das vezes não há ninguém para atendimento, pois a

4 Toda a análise tomou como base os documentos anteriores à nova legislação que estabelece como limite para a Educação Infantil a idade de 05 anos.

45

creche não dispõe de pessoal especifico para tal. Junto à secretaria está um

pequeno consultório médico, que funciona uma vez por semana para atendimento

às crianças; o mesmo pátio também dá acesso à cozinha e às três salas utilizadas

para as atividades pedagógicas.

As salas são amplas, com janelas, ventilação e iluminação razoável, e cada

sala dispõe de um sanitário, embora estes não sejam adaptados para a Educação

Infantil, uma vez que tem um único vaso, e não possui divisórias para uso de

crianças de gêneros diferentes. As cadeiras e carteiras são de altura apropriada

para o nível em questão, com mesas grandes cada uma delas com seis cadeiras

formando grupos de alunos, sem distinção de gênero. Há ainda, uma carteira para

professora, um quadro branco, mas de tamanho pequeno; cada sala tem um filtro

com água, um armário e uma estante, esta posicionada bem no alto, contendo os

livros, longe do alcance das crianças. A divisória das salas é de um material que não

isola totalmente os sons produzidos pelas turmas e isso era um ponto de dificuldade

para crianças e professoras, mas não presenciei nenhuma queixa da parte delas.

O acesso para a sala do grupo de crianças de 2 e 3 anos ( G 2-3 ) fica no nível

inferior do prédio, e exigia passar pela cozinha e descer uma escada, sem corrimão.

Esta sala possui janelas grandes que proporciona boa iluminação e ventilação,

cadeiras adaptadas ao tamanho das crianças e um quarto anexo, com colchonetes

onde as crianças dormiam após o almoço, Também era usada como sala de vídeo

para esse grupo. Nesse mesmo espaço há um sanitário com banheiro. A sala não

dava muita possibilidade de locomoção às crianças, pois o seu espaço torna-se

pequeno para acomodar os 28 alunos dessa turma.

5.4.2 Rotinas de Cuidado pessoal

As rotinas de cuidado pessoal incluem itens sobre o momento de chegada e

saída; refeições e merendas; sono; troca de fraldas e uso do banheiro; práticas de

saúde e segurança.

46

Ao observar o momento de chegada das crianças, que acontecia entre as

07:40 e as 8:00h, notei que as crianças eram recebidas por uma ou duas

professoras no salão da entrada, enquanto uma outra ajudava a trazer as crianças

do abrigo. Não havia uma rotina planejada para esse momento inicial. Às vezes,

poucas vezes nos dias que estive presente, era colocado um DVD e TV, de vinte

polegadas, com música ou historinha, mas nem todas as crianças se interessavam

porque a TV ficava em local baixo e a disputa para visualização era grande. Na

maior parte do tempo ficavam correndo ou conversando entre si e com a professora

de maneira aleatória. Estavam sempre muito agitadas, até o momento das filas, e aí

sim havia uma rotina, quando faziam oração, e cantavam sempre as mesmas

músicas. Era difícil controlar as maiores depois de tanta agitação. Às oito horas, e

algumas vezes bem mais tarde, cada professora levava sua turma, e na sala, era

distribuído o primeiro lanche.

Uma situação presenciada que considerei um problema foi quando uma das

professoras adoeceu, repentinamente, ficando ausente nesse dia e as outras duas

assumiram a turma dela, pois não havia ninguém que ficasse com as crianças. Foi

um dia de muita agitação e trabalhos sem aproveitamento.

O almoço das crianças era servido nas salas, pelas próprias professoras

(figura 4). Nas vezes em que presenciei a rotina do almoço, não vi rotina de higiene

como lavagem das mãos antes e escovação dos dentes após o almoço. As crianças

de todos os grupos já possuíam autonomia para irem sozinhas ao banheiro, mas

não foram estimuladas ou solicitadas a higienizar mãos e dentes.

Além das professoras, o Centro Nova Semente contava com mais duas

funcionárias. Uma funcionária estava encarregada pelo preparo do almoço e dos

lanches servidos pela manhã e pela tarde, e a outra, responsável pela limpeza e,

durante o intervalo do almoço das docentes, cuidava de todas as crianças levando-

as para o salão, o mesmo onde também ficavam reunidas na chegada.

Nesse momento do dia não havia nenhuma rotina, nenhuma brincadeira ou

atividade direcionada que pudesse acalmar ou relaxar as crianças. Simplesmente

ficavam soltas nesse espaço, que nessas horas tornava-se pequeno para a

quantidade de crianças; transformava-se assim numa situação de muito estresse

para as crianças menores, deixando-as angustiadas, pois as maiores, por vezes, até

as machucavam, nas correrias desordenadas. A socialização e integração que

47

poderia e deveria ocorrer ali, não acontecia e desperdiçavam-se uma oportunidade

preciosa de promoção de brincadeiras prazerosas e gratificantes, caso a estrutura

física do espaço e a quantidade de pessoas para ficar com as crianças nesses

momentos fossem o ideal. Brincar é uma atividade gratuita, que não tem objetivos

didáticos, não tendo tempo nem lugar determinado para acontecer porque esta é

uma atividade própria da imaginação, mas que precisa de muito tempo e de um

lugar que seja acolhedor. Abramowicz e Wajskop (1995, p. 59) fazem referência a

creches e brincadeiras dizendo:

Nas creches, a brincadeira é educação por excelência. No ato de brincar

ocorrem trocas, as crianças convivem com suas diferenças, se dá o

desenvolvimento da imaginação e da linguagem, da compreensão e

apropriação de conhecimentos e sentimentos, do exercício da iniciativa e

da decisão.

Após esse momento no salão, acontece o momento do sono. Sendo este,

ideal para descanso e relaxamento das crianças, só acontece no G 2-3 quando

voltam à sala após o intervalo de almoço das professoras, e então, as crianças são

colocados para dormir, ainda sob o efeito da agitação anterior. Para Rizzo (2006), o

período anterior ao sono deve ser livre de excitações, pois tranqüilidade, carinho e

atenção facilitam o sono, e este é essencial para a saúde, e a sua escassez provoca

irritabilidade, letargia e anorexia.

O horário de saída era um momento mais calmo. Um pouco antes era servido

o lanche da tarde, depois as professoras levavam as crianças de volta para o salão

e ficavam esperando o responsável. Somente quando todas as crianças da

comunidade saiam, as mesmas professoras levavam as outras crianças de volta

para o abrigo.

O tempo de permanência das crianças no Centro era um total de 8 horas e meia.

Todo esse tempo as professoras estavam com elas, exceto apenas durante um

período de uma hora e meia, dedicada ao almoço, que só acontecia após o almoço

das crianças.

48

5.4.3 Linguagem oral e compreensão

Os itens auxilio às crianças para compreenderem a linguagem, auxilio às

crianças para usarem a linguagem e uso de livros, fazem parte dessa sub-escala. A

linguagem oral possibilita comunicar idéias, pensamentos e intenções de diversas

naturezas, influenciar o outro e estabelecer relações interpessoais. “Seu

aprendizado acontece dentro de um contexto (...) são os sujeitos em interações

singulares que atribuem sentidos únicos às falas”. (RCNEI 1998). Nesse sentido, as

situações que envolvam a fala na educação infantil, devem ser estimuladas em

diversas abordagens como: contar acontecimentos, contar histórias, dar recado,

explicar algo, ou pedir informações para o desenvolvimento das capacidades

comunicativas das crianças de maneira significativa.

As competências da oralidade foram observadas nas crianças no Centro Nova

Semente. Desde o grupo de crianças de dois e três anos no qual já aconteciam

situações envolvendo recados, queixas, reconto de histórias infantis, pedido para ir

ao banheiro e perguntas feitas aos colegas e à professora.

É preciso observar que a linguagem oral e escrita estão presente no cotidiano

das crianças, servem de base para ampliar suas possibilidades de comunicação e

participação nas diversas práticas sociais, sendo, por isso, um dos principais eixos

para educação infantil, e estão relacionadas ao desenvo lvimento gradativo das

capacidades associadas às quatro competências lingüísticas básicas: falar, escutar,

ler e escrever.

Desenvolver a oralidade é uma das habilidades típicas dos primeiros anos de

escolaridade. O RCNEI prevê que os conteúdos ligados a essa área devem ser

divididos em três blocos nas classes de 4 e 5 anos de idade: falar e escutar, práticas

de leitura e práticas de escrita (figura 2). Foi observado que a professora do grupo

de dois e três anos do Centro Nova Semente também já os havia iniciado na escrita

de letras e números e em situações de estímulo à leitura (figura 3). Em nenhum

grupo foi observado o uso de livros didáticos, mas havia livros de histórias infantis,

que eram lidos para elas pela professora de cada grupo.

49

Pode-se praticar a escrita com crianças pequenas de diversas maneiras como:

escrever o próprio nome, produção de textos individuais ou coletivos ditados ao

professor com fins diversos, escrita individual utilizando o conhecimento prévio

disponível no momento, respeitando a sua própria produção e a produção do colega.

Mas, apesar de comprovado que os primeiros anos de vida são de fundamental

importância ao desenvolvimento do individuo, é preciso atenção para propor

atividades de escrita que façam sentido para a criança. Pois ao se promover

experiências significativas de aprendizagem da língua, por meio de um trabalho com

a linguagem oral e escrita, são ampliadas as capacidades de comunicação e

expressão e de acesso ao mundo letrado das crianças.

0(a) professor(a) deve mediar o processo de desenvolvimento da linguagem

auxiliando a construção da fala, estimulando as lembranças das crianças e

provocando narrativas, ajudando-as explicarem para si e para os demais, as

relações e associações contidas em sua fala. Uma das formas é a organização de

rodas de conversa onde possa acontecer um diálogo e interação de idéias. Nesse

exercício, que deve ser cotidiano, as crianças podem melhorar seu nível de

comunicação, expor suas idéias e suas dúvidas, ampliar seu vocabulário, e ainda,

aprender a valorizar as idéias do grupo e a troca de aprendizagens. Essas rodas de

conversa no Centro Nova Semente foram observadas apenas no G2-3. Nos outros

grupos não foram presenciadas situações de direcionamento para o

desenvolvimento da linguagem oral, apenas de linguagem escrita, durante as tarefas

diárias. Isso não quer dizer que estas não existissem em outros momentos não

observados.

5.4.4 Atividades

Dessa sub-escala fazem parte a atividade motora fina; atividade física; arte;

música e movimento; dramatizações; areia/água; natureza/ciências; uso de TV e ou

computador; promoção da aceitação de diversidade. As atividades devem priorizar o

desenvolvimento de um conjunto de conhecimentos, habilidades, atitudes e valores,

50

adequados a cada faixa etária, que tenham como princípio formar uma criança

saudável e desenvolver sua capacidade de aprender a aprender, sua capacidade de

pensar e estabelecer as bases para a formação de uma pessoa ética capaz de

conviver num ambiente democrático. Devem abranger Artes Plásticas, Música,

Conhecimento da Natureza e da Sociedade, Educação do Movimento, Linguagem

oral e Escrita, segundo autoras como Abramowicz e Wajskop (1995), Rizzo(2006) e

o RCNEI (1998).

A Educação do Movimento constitui uma linguagem que permite às crianças

agirem sobre o meio físico, engatinhando, caminhando, correndo, manuseando

objetos, saltando, brincando sozinhas ou interagindo com outras crianças, adultos ou

até objetos. Ao explorar o ambiente que a cerca a criança aprende a adequar seus

gestos e movimentos às suas intenções e às demandas da realidade.

Gradativamente ela desenvolve atos que exigem coordenação de vários segmentos

motores que facilitarão nas tarefas de recortar, colar, encaixar pequenas peças, etc.

Muitos jogos e brincadeiras que envolvem seqüências motoras para serem

reproduzidas propiciam conquistas no plano da coordenação e precisão dos

movimentos e devem ser utilizados na educação infantil. O Referencial Curricular

Nacional para Educação Infantil (RCNEI), ao abordar a linguagem do movimento diz

que:

As maneiras de andar, correr, arremessar, saltar, resultam das interações

sociais e de relações dos homens com o meio (...) sendo assim,

fazem parte da uma cultura corporal humana, que a criança se apropria ao

brincar, jogar, imitar, o que lhes ampliará os conhecimentos de si mesmas,

das outras pessoas e do ambiente que a cerca”.

Quanto às atividades envolvendo movimento, havia um elemento que

dificultava o planejamento no Centro Nova Semente: o espaço versus quantidade de

crianças. No período dessa pesquisa, o Centro Nova Semente contava com um total

de 79 alunos divididos em três classes. O horário era integral para a maioria deles.

O espaço interno que poderia ser utilizado tornava-se pequeno para as atividades de

rotinas diárias que propiciassem a mobilidade própria da criança, para que ela

pudesse se expressar e se comunicar através dessa interação corporal.

51

Segundo o RCNEI, as ações pedagógicas devem estar voltadas para o

desenvolvimento das capacidades expressivas e instrumentais dos movimentos, de

forma que se possa agir com maior intencionalidade. Os conteúdos para o

movimento devem ser organizados num processo contínuo e integrado de ações,

envolvendo experiências corporais, para que seja possível à criança realizar sozinha

ou em interação, através de brincadeiras, jogos, danças, atividades esportivas,

dentre outras, desde que observadas as condições espaciais e materiais.

Quanto ao componente curricular de Música, sabe-se que é a linguagem que

se traduz em formas sonoras capazes de expressar e comunicar sensações,

sentimentos e pensamento. É uma das formas de expressão humana amplamente

utilizada na educação, especialmente na educação infantil, principalmente como

suporte na formação de hábitos, atitudes e comportamentos como lavar as mãos,

escovar dentes, respeitar a fila, além de memorização de conteúdos relativos a

números e letras do alfabeto, sempre acompanhada por gestos corporais.

Esse não é o caso do Centro Nova Semente. O momento do dia que se

trabalhava de maneira mais sistemática a utilização de música, era na fila de

entrada, pela manhã, ou, muito eventualmente, em atividades nas salas. Percebe-se

uma falta de sistematização e aproveitamento da música nas atividades diárias. O

planejamento didático para a educação infantil precisa contemplar esse componente

curricular rotineiramente, pois o contato intuitivo e espontâneo com a expressão

musical desde os primeiros anos de vida é importante ponto de partida para o

processo de musicalização.

Poucos foram os momentos que o Centro Nova Semente utilizou atividades

como: ouvir música, aprender uma canção, brincar de roda, realizar brinquedos

rítmicos, que segundo o RCNEI (1998) são atividades que despertam, estimulam e

desenvolvem o gosto pela atividade musical, além de atenderem a necessidades de

expressão que passam pela esfera afetiva, estética e cognitiva.

Assim como a música, é necessário contemplar outros ramos de atividades

no currículo para crianças pequenas. Por exemplo, as Artes Visuais que segundo

explicações do RCNEI (1998):

52

O trabalho com as Artes Visuais na educação infantil requer profunda atenção ao respeito das peculiaridades e esquemas de conhecimento próprios à cada faixa etária e nível de conhecimento. Isso significa que o pensamento, a sensibilidade, a imaginação, a percepção, a intuição e a cognição da criança devem ser trabalhadas de forma integrada, visando favorecer o desenvolvimento das capacidades criativas das crianças.

Ao chegar ao Centro Nova Semente para o estágio não visualizei no salão de

entrada nenhuma produção das crianças. Era um espaço bastante frio, contando

apenas com algumas pinturas de motivos florais no alto das paredes, já desgastadas

pelo tempo. Depois de questionamentos sobre a falta de aproveitamento desse

espaço com as atividades das crianças, que tivessem “a cara” do grupo e

favorecesse atribuir ao local uma marca infantil e educativa, senti uma grande falta

de motivação das professoras. Mas durante a semana do dia dos pais foram

construídos alguns cartazes com a participação dos alunos que foram colocados

nesse salão de entrada. Somente na semana da primavera, mais de um mês

depois, quando as professoras prepararam uma pequena caminhada pela rua da

escola, é que novos cartazes foram feitos para esse espaço. Percebi, então, que

faltava a motivação e o empenho de uma coordenadora pedagógica que fomentasse

o desejo e a criatividade das professoras e, fazendo que por sua vez, que estas

incentivassem seus alunos a um trabalho criativo e cultivassem o desejo de mostrar

seus produtos, atitude tão natural em crianças dessa idade.

Nas salas de aula os trabalhos de artes visuais expostos, na maioria das

vezes, eram de pinturas de desenhos mimeografados, muitas vezes com temas das

datas comemorativas, e desenhos livres nos quais não percebi um trabalho

contextualizado, mas como não havia presenciado sua produção, posso estar

falhando na minha observação. Uma coisa pode-se afirmar: não havia o hábito de

renovação constante dessas produções, ficando essas expostas durante muito

tempo. Uma tentativa de atividade diferenciada durante o estágio foi uma oficina de

dobradura de papel feita com os alunos da turma de seis anos.

É muito importante que a equipe de profissionais da educação infantil tenha

uma visão ampla do que é arte visual, considerando que dela fazem parte não

somente os desenhos e as telas, também fotos, outdoors, esculturas, objetos do

cotidiano e até histórias em quadrinho que são parte da cultura e merecem ser

trabalhados em sala. Quanto ao fazer, a criança deve ter liberdade para criar e

utilizar diferentes materiais, dependendo do objetivo da aula.

53

5.4.5 Interação

Fazem parte dessa sub-escala os itens da supervisão do brincar e do

processo de aprendizagem; interação criança-criança; interação equipe-criança;

disciplina. A vida coletiva e as interações nas creches e instituições de Educação

Infantil favorecem as formações de grupos. Segundo Rizzo (2006), é considerado

grupo o conjunto de crianças que freqüentam as mesmas salas, participam das

mesmas atividades, nos mesmos momentos, sob a coordenação de adultos

educadores que passarão a servir como referência, onde o grupo poderá

estabelecer relações de afinidade. Cabendo à instituição estabelecer os critérios de

organização desses grupos que podem ser: grupamento homogêneo por faixa

etária, grupamento por desenvolvimento ou grupamento por afinidade. No caso do

Centro Nova Semente o que determinava a organização dos grupos era a faixa

etária, juntando-se pares de idade: 2/3 anos e 4/5 anos e como só houvesse mais

uma turma, todas as crianças acima de cinco ficavam ali agrupadas.

Durante o dia as atividades desenvolvidas com os adultos e outras crianças,

podem criar situações de estímulo à autonomia e à cooperação, além de

transformar as interações com as outras crianças, com as profissionais e com seus

pais (figura 5). As interações estão presentes nas relações das crianças entre si e

na relação com os adultos e ainda com o ambiente onde ela interage, e nessa

interação se processará o seu desenvolvimento e a sua aprendizagem, e para que

esta aprendizagem seja significativa, os Parâmetros Nacionais de Qualidade para

Educação Infantil (2006. P.18), recomendam:

As crianças precisam ser apoiadas em espaços amplos e ao ar livre;

expressar seus sentimentos e pensamentos; desenvolver a imaginação, a

curiosidade e a capacidade de expressão; ampliar permanentemente

conhecimentos a respeito do mundo e da natureza e da cultura apoiadas

por estratégias pedagógicas apropriadas; diversificar atividades, escolhas e

companheiros de interação em creches, pré-escolas e centros de educação

infantil.

54

Uma educação infantil de qualidade requer uma relação do adulto com a

criança onde esse adulto possa disponibilizar atenção e carinho, pois é na ação e na

interação com os adultos e com outras crianças de sua convivência que a criança

constrói o seu conhecimento e as bases da estrutura de sua personalidade.

Portanto, a quantidade de crianças na sala para cada adulto é um fator complicador

para a qualidade da educação oferecida às crianças pequenas na medida em que

diminui a disponibilidade para que essa interação aconteça de modo satisfatório.

No período dessa pesquisa, o Centro Nova Semente contava com um total de

79 alunos divididos em três classes, com horário integral para a maioria deles. Uma

classe com um grupo de 29 crianças com idade de dois e três anos, o (G 2-3), uma

segunda classe com 28 alunos de quatro e cinco anos de idade, o (G 4-5), e uma

terceira classe com 22 crianças na faixa etária de seis a nove anos. Nessa classe

alguns alunos já estudavam em escolas regulares freqüentando o Centro apenas um

turno.

Nota-se, aquele aspecto já abordado ao discorrer sobre qualidade para

educação Infantil, - a grande vontade em acolher o maior número possível de

crianças contrariando, assim, a recomendação do Parecer CNE/CEB nº 22/98 que

indica para cada professor, grupo de até quinze crianças de até três anos de idade,

ou de vinte alunos na faixa etária de quatro a seis anos. Especialmente se levarmos

em conta que não havia auxiliares de classe, o tamanho dos grupos do Centro Nova

Semente dificultava principalmente um melhor atendimento educativo das crianças.

Rizzo (2006, p. 62-63) escreve sobre a relação de adulto por criança, explicando:

A relação adulto-criança e a quantidade destas, em cada grupo, são

diretamente responsáveis pela qualidade das relações afetivas e

possibilidade de desenvolvimento da linguagem das crianças e

consequentemente desenvolvimento intelectual. (...) a determinação do

número de crianças pode levar em consideração, desde o início, o

estabelecimento de dois adultos para cada grupo, a fim de que seja possível

a qualquer um deles afastar-se para prestar auxílio a uma criança, enquanto

o outro fica com o resto do grupo.

55

O estágio serviu para dar um panorama da realidade de algumas creches e

escolas para o ensino infantil. Diante do observado no Centro Nova Semente,

considerei na relação adulto-criança, que as professoras necessitavam de ajuda

para manter o equilíbrio e a disciplina, pois a quantidade de alunos por sala era

muito grande. Porém, apesar das dificuldades, elas tentavam preservar as bases

afetivas formadas no convívio com seus alunos, verificadas pela emoção com que

realizavam as ações e as interações entre eles.

5.4.6 Estrutura do programa

Consta nessa sub-escala os itens: Programação; Atividade livre; Atividade em

grupo; Medidas para crianças com necessidades especiais.

Os ambientes educativos, especialmente os dedicados às crianças pequenas,

não podem ter uma programação estática, mas flexível de acordo com a realidade

de cada grupo. Segundo Abramowicz e Wajskop (1995), cada ambiente educativo

se constrói e se reconstrói, a cada dia, para dar conta da diversidade de elementos

presentes nesses espaços: elementos humanos, espaciais, sociais, culturais e

econômicos.

Na educação infantil, as atividades propostas devem favorecer a cultura

original da criança. É fundamental que as atividades vivenciadas nesse nível de

escolaridade tenham como ponto de partida as experiências e valores da

comunidade em que vivem, especialmente a dos seus familiares, utilizando

momentos de trabalho orientado e momentos livres, que venham proporcionar o

maior nível de interações possíveis, pois essas interações são condições essenciais

para o desenvolvimento das crianças.

Sobre o respeito à realidade de cada criança na busca de uma educação

contextualizada Paulo Freire (2001, p. 28) escreveu que cabe:

56

Ao professor ou, mais amplamente, à escola, o dever de não só respeitar os

saberes com que os educandos, sobretudo os das classes populares,

chegam a ela – saberes constituídos na prática comunitária- mas também,

discutir com os alunos a razão de ser de alguns desses saberes em relação

com o ensino dos conteúdos.

Todas as ações constantes da rotina diária da escola devem formar um

conjunto de experiências a fim de desenvolver plenamente as capacidades inatas

das crianças e sua integração social no meio em que elas vivem. Estas ações são a

base do Currículo de atividades apropriado para a educação infantil. Rizzo (2006, p.

80) alerta sobre as atividades curriculares para esse nível de educação ao escrever

que:

Tudo aquilo que acontece com o bebê ou a criança, da hora de sua

chegada no estabelecimento, sua recepção, à hora da saída, sua entrega

aos responsáveis, faz parte do currículo de vida e aprendizagem, age

sobre a sua formação e influencia na estruturação de sua personalidade.

Se positivas e estimulantes, essas experiências estarão contribuindo para o

seu desenvolvimento. Se negativas, ao contrario, poderão estar

contribuindo para a existência de bloqueios ou quaisquer dificuldades de

aprendizagem.

No Centro Nova Semente, a programação das atividades diárias tinha como

ponto de partida um programa anual, elaborado com a orientação de uma pedagoga,

mas não havia um acompanhamento regular do trabalho das professoras, pela

ausência de uma coordenadora pedagógica permanente. O plano anual de ensino,

um para cada grupo, apresentava conteúdos curriculares apropriados, com objetivos

e estratégias, mas que parecia ter sido feito para uma outra realidade, ou seja, era

muito genérico, não se aproximava das possibilidades do espaço e dos materiais

disponíveis no momento.

Trabalhavam-se projetos pedagógicos, mas havia certa indisposição para o

desenvolvimento dos projetos que eram sugeridos por estarem sendo desenvolvidos

em uma escola particular para educação infantil. Chegava até as professoras o

título do projeto, sem que este fosse pensado, sugerido ou discutido por elas e muito

57

menos buscasse atender a uma necessidade ou desejo da comunidade escolar.

Faltava também uma reflexão constante sobre a prática educativa de cada

educadora para adequar a programação de suas atividades a projetos educativos

contextualizados, que tivessem significado para cada grupo e que fossem

prazerosos para todos.

5.4.7 Pais e equipe

Medidas para o envolvimento de pais; medidas para as necessidades

pessoais da equipe; Medidas para atender as necessidades profissionais da equipe;

Estabilidade da equipe; Interação e cooperação entre a equipe; Supervisão e

avaliação da equipe; Oportunidades para desenvolvimento profissional são os itens

dessa sub-escala.

A Educação Infantil de hoje precisa da visão histórica para uma maior

compreensão de sua realidade. Necessário ter em mente que a visão

assistencialista das creches determinou toda estrutura e funcionamento destas.

Desde quando o enfoque dado era o de guarda, de higiene, de alimentação e

proteção das crianças pequenas enquanto os pais trabalhavam, as exigências

quanto ao educador da creche eram reduzidas. Não era necessário possuir um grau

elevado de escolaridade, mas gostar de crianças e ter paciência e cuidado para com

elas. Zenker (2004, p.250-251) ao escrever sobre a temática diz que:

Para trabalhar nas creches, não era preciso formação acadêmica. Por outro

lado, as propostas dos jardins da infância dirigidas às classes média e alta

davam ênfase à socialização da criança e à preparação para o antigo

primário. (...) este cenário começa a mudar. Mudam as formas de pensar e

fazer educação de crianças; o espaço para recebê-las passa a ser

chamado de educativo.

58

A partir de 1996 a Lei de Diretrizes e Bases dispõe, no título VI, artigo 62,

que : “ A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível

superior, em curso de licenciatura, de graduação plena em universidades e institutos

superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do

magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental,

a oferecida em nível médio, na modalidade Normal.

Nesse ponto, foi gratificante verificar que as professoras do Centro Nova

Semente tinham ensino médio completo em magistério e duas delas cursavam o

ensino superior em Pedagogia, (uma delas à distância), e que a freira responsável

pela administração possui formação acadêmica em Pedagogia.

Por outro lado, as professoras não contavam com um serviço regular de

Coordenação da atividade escolar, o que, na maioria das vezes, as deixavam muito

soltas e indecisas, pois, lhes faltava alguém com quem pudesse dividir as

ansiedades, buscar apoio pedagógico, e uma orientação para formação em serviço

que as ajudassem a melhorar suas práticas.

Eventualmente, as educadoras recebiam a visita de uma pedagoga voluntária

que levava temas de projetos didáticos desenvolvidos na escola particular onde ela

trabalhava. Nas visitas ela sugeria, ligeiramente, atividades que poderiam ser

utilizadas para o desenvolvimento desses projetos. Nesses dias, na maioria das

vezes, conversava com as professoras em momentos diferentes, ou seja, uma de

cada vez. Por isso não se considerava esses momentos como reuniões pedagógicas

ou de coordenação, (A C), embora as professoras reclamassem da necessidade

destas dizendo que faziam muita falta.

Ao chegar à Creche Escola Centro Nova Semente para minha primeira

observação encontrei um grupo de professoras desestimuladas, inquietas, com

situações de indisciplina de alunos, especialmente a professora do grupo inicial, e

havia problemas nos relacionamentos interpessoais no grupo de professoras. Outro

fator que me chamou a atenção era o pouco envolvimento dos pais, e a falta de

integração deles com as professoras. Considerei que essa situação seria

minimizada com a presença constante de uma coordenadora das atividades

pedagógicas. Focalizei, então, meu estágio curricular de participação nesse papel

tão necessário para o funcionamento de uma escola.

59

De acordo com o documento “Traçando Caminhos para Sua Prática

Educativa”, elaborado e distribuído pela Secretaria Municipal de Educação de

Salvador, em 2005, compete ao Coordenador iniciativas nas áreas de planejamento,

acompanhamento e monitoramento pedagógico, assim como assistência

pedagógica aos alunos e ao professor. Compete-lhes, pois, a organização das

ações pedagógicas da escola, bem como faz parte do seu trabalho, a planificação,

os estudos, a socialização e a mediação entre os diferentes segmentos da escola.

Vê-se, portanto a pertinência da colocação das professoras, tendo em vista a

necessidade de constante aprimoramento de suas qualidades profissionais, na

medida em que, segundo diz o RCNEI (1998, p 39), o professor tem como função

garantir o bem-estar, assegurar o crescimento e promover o desenvolvimento e a

aprendizagem das crianças da educação infantil sob sua responsabilidade.

Para os encontros de formação com as professoras foi necessário driblar a

falta de espaços e de tempo, desde quando não havia um horário determinado para

formação, os alunos não poderiam ser dispensados e a instituição não dispunha de

pessoal que assumisse as classes nesses momentos.

Por iniciativa da estagiária-pesquisadora e com a aquiescência da direção, foi

providenciado professores voluntários para trabalhar nos dias dos encontros de

formação das professoras, desenvolvendo atividades lúdicas de brincadeiras, oficina

de dobradura de papel, leitura de histórias infantis e música com as crianças. Em

todos os encontros, aconteceram situações imprevistas acarretando algumas

interrupções, já que durante as mesmas, de vez em quando, uma das professoras

era solicitada a dar apoio aos voluntários para diminuir a agitação das crianças.

Nos encontros de formação com as professoras, foram lidos e discutidos

textos sobre Pedagogia de projetos, com partilha de experiências, questionamentos

sobre dúvidas existentes e elaboração de um mini-projeto que foi pensado, discutido

e planejado mediante ação e reflexão da própria prática. Foi interessante perceber a

mudança de posturas e idéias, inclusive a respeito da participação familiar, antes

rejeitada pelas professoras, e sendo incluída nas atividades do projeto elaborado por

elas. Mais gratificante ainda foi ver como esses encontros foram minando

resistências e promovendo a interação e a cooperação na equipe, levando-as a

considerar esta oportunidade como crescimento profissional, promovendo uma auto-

avaliação sincera e uma avaliação positiva de todo o processo de formação

60

acontecido nesses encontros. É importante dizer que esta foi uma experiência de

aprendizagem de forma lúdica. Não o lúdico descontextualizado, do fazer por fazer

simplesmente, mas como o apresentado por Luckesi (2005), no sentido de fazer por

prazer. O fazer prazeroso que dá significado especial ao que se faz, e se manifesta

no interesse em todo processo, tão fundamental para um bom desenvolvimento e

aproveitamento.

5.4.8 Figuras

Figura-1 Encontro de formação sobre Projetos Didáticos com as professoras do Centro Nova Semente

61

Figura-2 Grupo de 4-5 anos em Roda de história no salão de entrada do Centro Nova Semente

Figura-3 Crianças do G 2-3 em momento de pseudo-leitura em sala de aula

62

Figura-4 Hora do almoço no G 2-3, com a professora alimentando uma criança de 2 anos de idade

Figura-5 Momento de interação e diálogo da estagiária com as crianças do G 4-5

63

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa evidenciou que ainda existe uma dicotomia entre o legal e o

real no atendimento educacional para crianças pequenas. Se por um lado, as

propostas educacionais na legislação apontam um grande avanço no

reconhecimento dos direitos da população infantil a uma educação gratuita e de

qualidade, em contrapartida, pelos resultados dos censos escolares, fica claro que

ainda é muito pequeno o número de crianças atendias em creches e pré-escolas,

tanto no Brasil como na Bahia e em Salvador.

É grande o distanciamento existente entre a qualidade do que é oferecido nas

escolas particulares para a população de classe media/alta e a da destinada às

crianças que vivem em bairros de comunidades carentes. A baixa qualidade atinge

mesmo crianças cujos pais podem pagar pelo atendimento em escolinhas

particulares, de mensalidades módicas, pois, na maioria das vezes, estas estão

desvinculadas do sistema municipal da educação, ficando fora das estatísticas que

orientam os financiamentos e das diretrizes e programas oficiais que garantem uma

fiscalização.

Além disso, ainda é freqüente encontrar-se muitas creches de cunho

assistencialista e filantrópico, organizadas por pessoas das comunidades carentes e

que também estão fora das estatísticas dos órgãos públicos. Em tais

estabelecimentos ocorre, então, um distanciamento das diretrizes curriculares

nacionais e das normas legais que garantem a melhoria da qualidade do ensino e o

desenvolvimento integral das crianças, pois estão à margem do sistema oficial.

A descrição da experiência vivenciada no Centro Nova Semente, demonstra o

quanto é necessário que se ofereça subsidio ao professor da educação infantil para

um aprimoramento profissional, tendo em vista uma determinada qualidade que se

pretende alcançar. Mostra, também, o quanto os espaços físicos e as condições

materiais de algumas instituições de educação infantil estão distanciados do que a

legislação prevê para esse nível de ensino.

64

Em vista disso, é necessário enriquecer a qualificação dos profissionais

através de formação continuada, e promover a contratação de um maior contingente

de pessoal, que dê suporte aos professores para que estes possam buscar

instrumentos que minimizem os problemas acarretados pela falta de tempo e

inadequação dos espaços, sabendo-se que problemas estruturais são mais difíceis

de resolver no curto prazo. É preciso deixar claro que as instituições precisam fazer

um grande esforço para se adequar às exigências atuais de uma educação voltada

para a qualidade, pois lutam sempre contra as dificuldades decorrentes da falta de

condições econômicas e sociais.

Igualmente importante nesse estudo foi fazer do estágio curricular um campo

de observação para os conhecimentos práticos de uma teoria que já estava sendo

estudada. A observação se deu de maneira mais natural, onde todos os envolvidos

interagiram sem a retração provocada por uma pesquisa feita através de

questionamentos direcionados, pois não havia o sentido de julgamento. Além disso,

a visão da pesquisadora foi também facilitada na medida em que esteve interagindo

durante todo o tempo com o objeto de sua pesquisa, fazendo com que esta

contribuísse para a construção de um conhecimento vivenciado e, não somente,

teórico.

Pode-se concluir que, se no início o modelo assistencialista da educação

infantil era o ideal para a sociedade da época, os novos tempos exige uma

educação mais voltada para esse novo modo de ver e conceber o desenvolvimento

das crianças pequenas. Falar de qualidade na Educação Infantil, então, é

reconhecer que o termo qualidade não é estático. Tem um dinamismo que dá conta

do que se concebe como sendo o melhor para aquele público, que se encontra em

um certo espaço geográfico e em um tempo determinado. Especialmente neste

caso, a concepção de qualidade continuamente se renova de acordo com as

necessidades e os desejos das crianças, das famílias, dos profissionais da

educação infantil e da sociedade.

65

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