mono reuso da Água brasilia

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REUSO DE GUA PARA IRRIGAO

Cristina Costa Bernardi

2003

Cristina Costa Bernardi

REUSO DE GUA PARA IRRIGAO

Monografia apresentada ao ISEA-FGV/ ECOBUSINESS SCHOOL como requisito para obteno de ttulo de Ps-Graduao, em nvel de Especializao Lato Sensu, modalidade MBA, em Gesto Sustentvel da Agricultura Irrigada, com rea de concentrao em Planejamento Estratgico.

Orientador Ph.D. Gertjan Beekman

Braslia Distrito Federal - Brasil 2003

Cristina Costa Bernardi

REUSO DE GUA PARA IRRIGAO

APROVADA em

Jnio Caetano de Abreu, D.Sc.

Fundao Universidade Federal de So Joo Del Rey

Willer Hudson Ps, Ph.D.

Escola de Engenharia da UFMG

Larcio Couto, Ph.D.

Universidade Federal de Viosa

Ph.D. Gertjan Beekman IICA (Orientador)

Braslia Distrito Federal - Brasil

Ofereo a Deus, por iluminar e guiar meu caminho; aos meus pais, pela constante dedicao e amizade; ao meu marido, pela compreenso e carinho. OFEREO

Aos meus colegas de trabalho que, de alguma forma, apoiando e incentivando, contriburam para meu crescimento intelectual e pessoal. DEDICO

AGRADECIMENTOS

Meus agradecimentos ao meu orientador, que incentivou a participao nesta jornada de conhecimentos, compartilhando suas idias e reflexes e possibilitando assim o aperfeioamento tcnico-especializado. Agradeo tambm aos meus amigos de trabalho e professores da Ecobusiness que contriburam com aportes intelectuais e discusses tcnicas, de grande valia para a elaborao do trabalho. s instituies, tenho a agradecer, inicialmente, ao Instituto Interamericano de Cooperao para a Agricultura (IICA) a oportunidade de participao em atividade de capacitao de temtica relevante para a sustentabilidade scio-econmica e ambiental. Com relao instituio promotora, Secretaria de Infra-Estrutura Hdrica, no mbito do Projeto de Cooperao Tcnica entre IICA e Ministrio da Integrao Nacional, e instituio executora, Consrcio ISAE-FGV/Ecobusiness School, agradeo a oportunidade de compor a equipe de estudo e parabenizo pelo xito da iniciativa.

BIOGRAFIA

CRISTINA COSTA BERNARDI, engenheira agrnoma pela Universidade de Braslia, em 1998, cursando, como aluna especial, Mestrado em Planejamento e Gesto Ambiental na Universidade Catlica de Braslia. Atua nas reas de desenvolvimento e acompanhamento de projetos de cooperao tcnica, com enfoque em capacitao nos temas de desenvolvimento sustentvel e meio ambiente. Anteriormente atuou como pesquisadora cientfica na rea de melhoramento gentico vegetal.

SUMRIO LISTA DE SMBOLOS....................................................................................................................... i RESUMO ............................................................................................................................................ ii ABSTRACT....................................................................................................................................... iii 1 INTRODUO ............................................................................................................................... 1 2 REFERENCIAL TERICO ............................................................................................................ 8 2.1 Agricultura irrigada....................................................................................................................... 8 2.2 Oferta e demanda de gua ............................................................................................................. 9 2.3 Vantagens do reuso ..................................................................................................................... 12 2.4 Formas de reuso de gua ............................................................................................................. 13 2.5 Tipos de reuso e suas aplicaes ................................................................................................. 16 2.6 Legislao relativa ao reuso de gua no Brasil ........................................................................... 18 2.7 Resoluo CONAMA n 20/1986 e os usos preponderantes da gua com suas classes ............. 20 2.8 Categorias de reuso e suas limitaes sanitrias e ambientais de aplicao ............................... 23 2.9 Princpio do poluidor-pagador .................................................................................................... 24 2.10 Experincias internacionais de reuso de gua ........................................................................... 25 2.11 Experincias nacionais de reuso de gua .................................................................................. 29 3 MATERIAL E MTODOS ........................................................................................................... 32 3.1 Descrio..................................................................................................................................... 32 4 RESULTADOS E DISCUSSO ................................................................................................... 33 4.1 Relao entre escassez de gua e escassez de alimentos............................................................. 33 4.2 Benefcios agregados da prtica de reuso ................................................................................... 33 4.3 A legislao hdrica e ambiental no Brasil e o reuso de gua ..................................................... 34 4.4 Relao entre o reuso de gua para irrigao e a classificao de corpos de gua com base nos usos preponderantes e prioritrios da Resoluo CONAMA n 20, de 18/06/86 ....................... 35 4.5 Aplicao do princpio poluidor-pagador ................................................................................... 37 4.6 Reflexo das experincias de reuso em outros pases................................................................... 38 4.7 Cultura de reuso e educao ambiental ....................................................................................... 39 4.8 gua como fator econmico de desenvolvimento social............................................................ 40 4.9 Consideraes finais.................................................................................................................... 40

5 CONCLUSES ............................................................................................................................. 44 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS.............................................................................................. 48 ANEXO DE TABELAS ................................................................................................................... 51 GLOSSRIO .................................................................................................................................... 52

LISTA DE SMBOLOS

ADEQ ADWR CIRRA CNRH

Arizona Department of Environmental Quality Arizona Department of Water Resources Centro Internacional de Referncia em Reuso de gua Conselho Nacional de Recursos Hdricos

CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente COT DBO DQO ETE IBGE IFPRI IICA IWMI OMM OMS PNMA PNRH Carbono Orgnico Total (COT). Demanda Bioqumica de Oxignio Demanda Qumica de Oxignio Estao de Tratamento de Esgotos Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica International Food Policy Research Institute Instituto Interamericano de Cooperao para a Agricultura International Water Management Institute Organizao Meteorolgica Mundial Organizao Mundial da Sade Poltica Nacional do Meio Ambiente Poltica Nacional de Recursos Hdricos

SABESP Companhia de Abastecimento Bsico do Estado de So Paulo USP WHO Universidade de So Paulo World Health Organization

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RESUMO

BERNARDI, Cristina Costa. REUSO DE GUA PARA IRRIGAO. Braslia: ISAEFGV/ECOBUSINESS SCHOOL, 2003. 52p. (Monografia - MBA em Gesto Sustentvel da Agricultura Irrigada, rea de concentrao Planejamento Estratgico) A gua um recurso cada vez mais escasso, seja pelo crescimento populacional, com aumento da demanda, seja pela reduo da oferta, especialmente pela poluio dos mananciais. Conseqentemente, o preo terico da gua tende a elevar-se. No contexto de escassez de gua que atinge vrias regies do Brasil, associada aos problemas de qualidade da gua, surge, como alternativa potencial de racionalizao, a reutilizao da gua para vrios usos, inclusive para irrigao. So vrios os benefcios agregados na prtica de reuso na irrigao, incluindo a recarga do lenol fretico e a fertirrigao de diversas culturas, respeitando os limites sanitrios e ambientais de aplicao para garantia do nvel de qualidade. Apesar de alguns pases j estabelecerem mercados de gua, incluindo gua de reuso, e do Brasil realizar a prtica de reuso em alguns estados, inexiste legislao especfica brasileira tratando da temtica. O presente trabalho, ao servir como consulta bibliogrfica e estmulo reflexo e anlise do tema, podendo contribuir na elaborao de propostas de instrumentos legais, demonstra a importncia da utilizao da tcnica de reuso de gua para irrigao, salientando a necessidade de regulamentao especfica, com os cuidados cabveis na proteo ambiental e conservao da qualidade da gua. A abordagem do trabalho considera duas dimenses fundamentais na prtica do reuso: anlise da tendncia formao e/ou fortalecimento do mercado de gua de reuso no Brasil; e anlise da postura que o setor pblico deve exercer frente questo. Baseado em experincias nacionais e internacionais, percebe-se que h tendncia de expanso do mercado de gua de reuso no Brasil, para fins diversos, como irrigao, cabendo ao setor pblico regulamentar e fiscalizar esse mercado, por meio de uma gesto participativa, tornando assim a prtica de reuso um eficiente instrumento de gesto dos recursos hdricos no Brasil.

Comit Orientador: Gertjan Beekman - IICA (Orientador).ii

ABSTRACT

BERNARDI, Cristina Costa. WATER REUSE FOR IRRIGATION. Braslia: ISAEFGV/ECOBUSINESS SCHOOL, 2003. 52p. (Monograph - MBA in Maintainable Administration of Irrigated Agriculture, area of concentration Strategic Planning) Water is becoming a scarce resource due to the population growth and increase of demand, as well as, due to the reduction of its availability in terms of quantity and quality. As a result, the value of water also tends to increase at a fast rate. Within the water scarcity context that afflicts several regions in Brazil, associated to poor water quality, a feasible option would be the reuse of water for various uses and specifically irrigation. A number of benefits can be derived from reuse practices associated to the irrigated agriculture, such as aquifer recharge, recovery of phreatic levels and fertirrigation of a variety of crops within appropriate sanitary and health limits and environment constraints to assure safe water quality standards. A few countries have already created water markets including reused water as a commodity. In Brazil some States reuse water, however, without a proper set of laws or regulations applicable to recycling and reuse of water. The aim of this monograph is to provide bibliographic references on the water reuse topic and to stimulate thoughts and in depth analysis of the subject contributing to the growing need to have a proper legislation proposed, elaborated and implemented. It also highlights the importance of the use of this technology in irrigation and watering practices, based on proper standards and regulations vis--vis the environment protection and water quality conservation. The approach of this paper focuses mainly on two fundamental dimensions regarding water reuse practices: analysis and trends of the strengthening of water reuse markets in Brazil; and analysis of the degree of acceptance of the Public Sector in view of this new trend. Based on national and international experiences, it is clear that there is a growing trend of the water reuse market in Brazil for various objectives including irrigation; it is Public Sector responsibility to regulate and supervise this market by means of a joint and participatory management. In this respect water reuse practices may become instrumental in integrated water resources management in Brazil.

Comit Orientador: Gertjan Beekman - IICA (Orientador).iii

1 INTRODUO

A gua um recurso natural finito e essencial vida, seja como componente bioqumico de seres vivos, como meio de vida de vrias espcies, como elemento representativo de valores sociais e culturais, alm de importante fator de produo no desenvolvimento de diversas atividades econmicas. O volume total de gua no planeta constante, com a gua doce representando cerca de 35 milhes de Km3, ou seja, 2,52% da quantidade total de gua no planeta. O Brasil um pas privilegiado em termos de disponibilidade hdrica global, dispondo de um volume mdio de 257.790 m3/s (considerando o territrio nacional mais a rea de contribuio da Bacia Amaznica alm da fronteira), o que representa um volume per capita de 47.042 m3.Hab/ano, como pode ser observado analisando a TAB. 1. TABELA 1 Disponibilidade hdrica no territrio brasileiro + contribuio da Bacia Amaznica do territrio alm fronteira (Ano 2001) rea Populao Densidade Disponibilid. (m /s) BRASIL 8.512 172.816.651 20,30 257.7903

Disponibilid. Hdrica/Hab. (m3.hab/ano) 47.042

(Km2x103) (Habitantes) (Hab/Km2) Hdrica

FONTE - BEEKMAN, 1995 NOTA - Dados atualizados em 01.08.2000, com taxa de crescimento da populao anual de 1,93% para o ano de 2001, segundo Fonte IBGE, Contagem da Populao 1996 e Censo Demogrfico 2000.

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TABELA 2 Produo hdrica no Brasil e no mundo DADOS Produo hdrica no Brasil (m /s) Produo hdrica no Brasil por habitante (m3.hab/ano) Produo hdrica mundial (m /s) contribuio da Bacia Amaznica alm da fronteira) (m3/s) Relao produo hdrica no Brasil por produo hdrica 11,65 mundial (%) Relao disponibilidade hdrica no Brasil por produo hdrica 17,80 mundial (%) FONTE - BEEKMAN, 1995 Segundo anlise da TAB. 2, verifica-se que a produo hdrica no Brasil corresponde a 11,65% da produo hdrica mundial; enquanto que a disponibilidade hdrica no Brasil (considerando o territrio nacional mais a rea de contribuio da Bacia Amaznica alm da fronteira) corresponde a 17,8% da produo hdrica mundial. Considerando que os recursos hdricos acessveis ao consumo humano direto constituem uma frao mnima do capital hidrolgico, observa-se ainda a cada dia que a gua, em escala mundial, um recurso cada vez mais escasso, seja pelo crescimento da populao e de atividades econmicas, com aumento da demanda, seja pela reduo da oferta, esta condicionada especialmente pela poluio dos mananciais. Por via de conseqncia, o preo terico da gua tende a elevar-se, tendo em vista que a demanda est aumentando e a oferta diminuindo.3 3

VALORES 168.790 30.801 1.448.000

Disponibilidade hdrica no Brasil (territrio brasileiro + rea de 257.790

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O intenso uso e explorao dos recursos hdricos, j limitados, nas atividades de produo e consumo esto degradando-os, sem um consciente reflexo dessa perda coletiva no sistema de preos. Diante disso, revela-se premente a necessidade de reduzir a poluio hdrica, buscar alternativas viveis de aumento da oferta de gua e definir melhor alocao de recursos, relacionando o preo do bem e do servio produzido com a qualidade e quantidade do recurso natural. No contexto do crescente processo de escassez de gua, cabe salientar que o preo desse bem finito tende a ficar cada vez mais alto. A gua de reuso, utilizada para diversos fins, como a irrigao de culturas perenes, tende a apresentar preo mais baixo, reduzindo assim os custos de produo. Na medida em que a cobrana pelo uso da gua, instrumento de gesto j considerado na Poltica Nacional de Recursos Hdricos (Lei n 9.433, de 08/01/97), tornar-se mais abrangente, o mercado de gua de reuso tambm tender a crescer. O dficit hdrico est relacionado tambm com a carncia de alimentos. Em pases nos quais a falta de gua um fator limitante de crescimento, percebe-se a dependncia externa de produtos agrcolas, como gros, por exemplo, que requerem alta necessidade hdrica. Portanto, o problema de escassez de gua tambm um problema de escassez de alimentos. Em funo da escassez de gua que atinge vrias regies do Brasil, associada aos problemas de qualidade da gua, torna-se uma alternativa potencial de racionalizao desse bem natural a reutilizao da gua para vrios usos, inclusive a irrigao agrcola, que representa aproximadamente 70% do

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consumo hdrico no mundo. Assim, a tcnica de reuso tende a ser um eficiente instrumento para a gesto dos recursos hdricos no Brasil. So vrios os benefcios da gua de reuso proveniente de tratamento de esgotos na agricultura, podendo-se mencionar a possibilidade de substituio parcial de fertilizantes qumicos, com a diminuio do impacto ambiental, em funo da reduo da contaminao dos cursos dgua; um significativo aumento na produo, tanto qualitativo quanto quantitativo; alm da economia da quantidade de gua direcionada para a irrigao, que pode ser utilizada para fins mais nobres, como o abastecimento pblico. A reutilizao da gua, como tcnica desenvolvida em diferentes estgios de tratamento em funo de seu uso, procede de vrias maneiras. Como forma de afastar resduos lquidos, diversas comunidades lanam seus esgotos, muitas vezes no tratados, em corpos de guas superficiais, poluindo-os. Em seqncia, essa gua ento contaminada poder servir de fonte de abastecimento para comunidades a jusante, que iro captar a gua para diversos usos, retornando-as para os mesmos rios, formando assim o ciclo de reuso. Como exemplo tem-se a Bacia do Rio Verde Grande, integrante da Bacia do rio So Francisco, situada ao norte de Minas Gerais e em uma pequena poro do sudoeste da Bahia, onde se percebem a atuao de diferentes atores, usurios de gua, como indstrias, cidades, pequenos e grandes produtores rurais, que captam gua em diferentes trechos do rio e retornam as guas utilizadas para esse mesmo rio. Para garantir a manuteno dos nveis de qualidade de gua que um segmento de corpo dgua (trecho de rio) deve apresentar, preciso haver a efetivao do enquadramento, ou seja, cumprir medidas necessrias para manter a condio desse segmento em correspondncia com a sua classe, obedecendo a Resoluo

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CONAMA n 20, de 18 de junho de 1986. Essa normativa estabelece a classificao das guas com base nos usos preponderantes e prioritrios (sistema de classes de qualidade), estabelecendo nvel de qualidade (classes) a ser alcanado e/ou mantido em um trecho do corpo hdrico ao longo do tempo. O enquadramento dos corpos dgua deve estar baseado nos nveis de qualidade que deveriam possuir para atender s necessidades da comunidade. Por meio do reuso da gua, possvel, aps o tratamento conveniente de efluentes, descarreg-los de forma planejada nos corpos hdricos para que sejam utilizados sob controle a jusante na forma diluda, como por exemplo para irrigao de frutferas. Para isso, necessrio um controle de lanamento de efluentes nos vrios trechos do rio para satisfazer os requisitos de qualidade do reuso. Segundo BREGA FILHO & MANCUSO (2002), a prtica de reuso de gua no meio agrcola, alm de garantir a recarga do lenol fretico, serve para fertirrigao de diversas culturas, bem como para fins de dessedentao de animais. A utilizao de gua proveniente de reuso diferenciada para irrigao de plantas no comestveis (silvicultura, pastagens, fibras e sementes) e comestveis (nas formas cruas e cozidas), necessitando essas de um nvel maior de qualidade. Porm, conforme BEEKMAN (1996), grandes volumes de guas servidas podem ser utilizadas em categorias de reuso, como agricultura irrigada e recarga de aqferos, devendo-se atentar para suas limitaes sanitrias e ambientais de aplicao. Embora no Brasil j se esteja realizando a prtica de reuso em alguns estados, como principalmente em So Paulo, no existe nenhuma legislao especfica tratando da temtica. Porm, como indutores do incio do processo de

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regulamentao, grupos de trabalho e tcnicos do setor discutem e avaliam em diversos encontros e seminrios nacionais e internacionais a questo, estimulando para a institucionalizao da reciclagem e reuso sempre que possvel, para a promoo do tratamento e disposio de esgotos, evitando a poluio ambiental. Sendo assim, destaca-se tambm a necessidade de regulamentao e uso de instrumentos econmicos para o controle da qualidade da gua, com o propsito de aumentar a eficincia, reduzindo assim os custos sociais e gerando meios fiscais para o financiamento de aes de proteo ao meio ambiente. Em funo das relaes entre preo de um bem e sua quantidade, observa-se a importncia da cobrana pelo uso e/ou poluio dos recursos hdricos como instrumento de gesto a ser implementado para induzir o usurio e/ou poluidor a uma racionalizao no uso desse recurso, mantendo um equilbrio entre disponibilidades e demandas, alm da proteo ambiental. A efetiva aplicao do princpio poluidor-pagador deve ser considerada como forma de garantir a proteo ambiental, que, em linhas gerais, atribui ao poluidor custos pertinentes do combate poluio e de preservao do meio ambiente. No Brasil deve-se ainda trabalhar socialmente a cultura de reuso de gua, que apesar de ser uma prtica inconsciente utilizada h vrios anos (reuso no planejado), h preconceito quanto sua forma de utilizao por parte do pblico consumidor. Entretanto, embora o reuso da gua constitua a resposta escassez crescente dos recursos hdricos, sob o ponto de vista estritamente econmico, cabe indagar se,

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pelo ngulo ambiental e, portanto, do desenvolvimento sustentvel, esse mecanismo a melhor resposta que a sociedade pode oferecer no momento para a questo da escassez da gua. Diante disso, a abordagem objeto desta monografia assume duas dimenses fundamentais. A primeira diz respeito ao exame da tendncia formao e/ou fortalecimento do mercado de gua de reuso no Brasil, a partir de experincias que j se manifestam em algumas regies. A segunda relaciona-se postura que o setor pblico deve exercer frente questo, aspecto que se afigura extremamente importante numa fase ainda embrionria do processo e do mercado de gua de reuso. O presente trabalho, ao servir como consulta bibliogrfica e estmulo reflexo e anlise do tema, podendo contribuir na elaborao de propostas de instrumentos legais, demonstra a importncia da utilizao da tcnica de reuso de gua para irrigao, salientando a necessidade de regulamentao especfica, com os cuidados cabveis na proteo ambiental e conservao da qualidade da gua. Com base em experincias nacionais e internacionais, percebe-se que h uma tendncia de fortalecimento e expanso do mercado de gua de reuso no Brasil, para fins diversos, especialmente para a irrigao, cabendo ao setor pblico regulamentar e fiscalizar esse mercado, respeitando a legislao vigente sobre a matria, sobretudo no que diz respeito ao princpio poluidor-pagador.

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2 REFERENCIAL TERICO

2.1 Agricultura irrigada

Segundo FERNANDEZ & GARRIDO (2002), considera-se gua para a agricultura irrigada o volume desse recurso natural que no suprido naturalmente por meio de chuvas, necessrio aplicao artificial aos cultivos, de forma a otimizar o seu desenvolvimento biolgico. Por meio da irrigao, pode-se intensificar a produo agrcola, regularizando, ao longo do ano, as disponibilidades e os estoques de cultivares, uma vez que esta prtica permite uma produo na contra-estao. Alm disso, a agricultura irrigada reduz as incertezas, prevenindo o agente econmico (irrigante) contra a irregularidade das chuvas, anual e interanual. A atividade de irrigao a maior consumidora de gua entre os diversos usos desse recurso natural. Dentro dela, os consumos especficos variam bastante, a depender do mtodo de irrigao empregado. A natureza do solo, o tipo de requerimentos das diferentes culturas e os ndices de evaporao das regies so elementos importantes para se definir o consumo de gua para irrigao. A agricultura em geral experimentou grandes progressos ao longo das ltimas dcadas. A antiga idia de confronto entre a agricultura de sequeiro e a agricultura irrigada, vai cedendo espao, pouco a pouco, ao reconhecimento da existncia de uma agricultura em que a irrigao se insere de forma integrada nos diversos processos de produo. A agricultura irrigada vem se tornando, nos ltimos anos, uma das atividades econmicas mais importantes no Brasil. A

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irrigao e a drenagem dos campos irrigados so atividades que permitem compensar os efeitos negativos da m distribuio, espacial e temporal, das guas de precipitao. As vazes de retirada para os fins de irrigao so elevadas, da porque a poltica de recursos hdricos deve considerar, com especial cuidado, os movimentos desse setor usurio.

2.2 Oferta e demanda de gua

A oferta de gua no mundo tem relao estreita com a segurana alimentar, o estilo de vida das pessoas, o crescimento industrial e agrcola e a sustentabilidade ambiental. Conforme WMO (1997), o consumo mundial dgua cresceu mais de seis vezes entre 1900 e 1995 - mais que o dobro da taxa de crescimento da populao, e continua a crescer rapidamente com a elevao de consumo dos setores agrcola, industrial e residencial. Globalmente, embora as fontes hdricas sejam abundantes, elas so freqentemente mal distribudas na superfcie do planeta. Em algumas reas, as retiradas so to elevadas em comparao com a oferta, que a disponibilidade superficial de gua est sendo reduzida e os recursos subterrneos rapidamente esgotados. Tal situao tem causado srias limitaes para o desenvolvimento de vrias regies, restringindo o atendimento s necessidades humanas e degradando ecossistemas aquticos. Levantamentos realizados pela Organizao Meteorolgica Mundial (OMM) das Naes Unidas indicam que um tero da

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populao mundial vive em regies de moderado a alto stress hdrico, ou seja, com um nvel de consumo superior a 20% da sua disponibilidade dgua. As estatsticas da OMM demonstram que, nos prximos 30 anos, a situao global das reservas hdricas tende consideravelmente a piorar, caso no ocorram aes para melhoria da gesto da oferta e demanda de gua. Segundo WMO (1997), nesse mesmo cenrio, previsto uma elevao para dois teros dos habitantes do planeta vivendo em reas de moderado a alto stress hdrico. De acordo com pesquisas sobre a gua no mundo pelo International Water Management Institute (IWMI), devido ao rpido crescimento populacional e aumento da renda per capita, o uso de gua e consumo domstico total no mundo aumentar em 71% dos quais mais de 90% ser em pases em desenvolvimento. Melhorias em conservao e tecnologia diminuiro o uso de gua domstico per capita em pases desenvolvidos com o mais alto consumo de gua per capita. Em funo da relao entre escassez de gua e escassez de alimentos, conforme relatrio do IFPRI & IWMI (2002), projeta-se que em 2025 a escassez de gua causar perdas anuais globais de 350 milhes de toneladas (metric tons) da produo de alimento - ligeiramente mais que a produo de gros, anual, completa, dos Estados Unidos. Caso no se alterem polticas e prioridades, em vinte anos, no haver gua suficiente para as cidades, os domiclios, o ambiente natural ou cultivo de alimentos. A crescente competio por gua limitar severamente sua disponibilidade para a irrigao, que, por sua vez, restringir seriamente a produo de alimentos no mundo. O declnio na produo de alimentos poderia provocar a elevao absurda de preos, que resultaria em significativo aumento da desnutrio, j que muitos povos pobres, em pases em desenvolvimento, j gastam mais da metade de sua renda em alimento.

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Outro fator preocupante refere-se disposio do crescimento da populao, gerando aumento de demanda de gua. Conforme BROWN (2002), a maioria das 80 milhes de pessoas que so adicionadas populao mundial a cada ano, est sendo adicionada em pases que j sofrem escassez de gua. A recuperao de um equilbrio entre a oferta e a demanda da gua, em todo o mundo, pode agora depender da estabilizao populacional nos pases com dficit hdrico. Segundo ONYANGO (2002), quando chegar ao ano 2025, a retirada de gua para, principalmente usos domsticos, industriais e de pecuria, est projetada com um aumento de pelo menos 50%. O aumento limitar severamente a retirada de gua para irrigao, que aumentar a produo de alimentos, por sua vez, em apenas 4%. Cerca de 250 milhes de hectares so irrigados no mundo hoje, quase cinco vezes mais do que no incio do sculo XX. A irrigao tem ajudado a aumentar a produo dos campos agrcolas e estabilizar a produo e preos de alimentos. Mas o crescimento populacional apenas aumentar a demanda por mais gua para irrigao, visando atender as necessidades de produo de alimentos. Por meio do manejo inadequado da irrigao, percebe-se o rebaixamento nos lenis freticos, danificao do solo e reduo da qualidade da gua. Alm da escassez hdrica, que grave em diversas regies, deve-se considerar a questo da poluio concentrada e difusa de corpos hdricos. Processos de eutrofizao, metais pesados, acidificao, poluentes orgnicos e outros efluentes txicos degradam os corpos hdricos de reas densamente povoadas, comprometendo assim a qualidade da gua.

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Segundo BEEKMAN (1996), como a demanda pela gua continua a aumentar, o retorno das guas servidas e o seu reuso vem se tornando um componente importante no planejamento, desenvolvimento e utilizao dos recursos hdricos, tanto em regies ridas, como em regies midas. A utilizao das guas servidas para propsitos de uso no potvel, como na agricultura, representa um potencial a ser explorado em substituio utilizao de gua tratada e potvel. Por meio do planejamento integrado dos recursos guas naturais e guas servidas, a reutilizao pode propiciar suficiente flexibilidade para o atendimento das demandas de curto prazo, assim como, assegurar o aumento da garantia no suprimento de longo prazo. Assim, o reuso de gua para diversos fins, incluindo o da irrigao, surge ento como alternativa para aumentar a oferta de gua, garantindo economia do recurso e racionalizao do uso desse bem. Diversos pases j utilizam essa tecnologia e possuem regulamentao especfica na temtica. Porm o Brasil ainda est em fase embrionria na efetivao e regulamentao da tcnica, com grande potencial de crescimento.

2.3 Vantagens do reuso

Como j mencionado, o reuso apresenta diversas vantagens do ponto de vista econmico, social e ambiental. Segundo GUIDOLIN (2000), imprescindvel destacar o contedo dos elementos minerais presentes em efluentes urbanos brutos, destacando a presena de macronutrientes, como N, P e K, bem como de micronutrientes, como As, Cd, Cr, Hg, Mo, Ni, Pb, Se e Zn, alguns deles necessrios ao

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desenvolvimento vegetal e outros at fitotxicos. No que se refere aos patgenos, vetores de doenas ao ser humano, preciso destacar que o solo atua como redutor do perodo de sobrevivncia dos mesmos. Nesse aspecto, a Organizao Mundial de Sade (WHO) estabeleceu, em 1990, diretrizes sanitrias para o uso de efluentes urbanos em irrigao, tendo em vista a rpida expanso que essa atividade vem ocorrendo em diversos pases. Assim, a reutilizao de guas residurias, de uma maneira geral, e das domsticas, de forma particular, promove as seguintes vantagens: propicia o uso sustentvel dos recursos hdricos; minimiza a poluio hdrica nos mananciais; estimula o uso racional de guas de boa qualidade; permite evitar a tendncia de eroso do solo e controlar processos de desertificao, por meio da irrigao e fertilizao de cintures verdes; possibilita a economia de dispndios com fertilizantes e matria orgnica; provoca aumento da produtividade agrcola; gera aumento da produo de alimentos; e permite maximizar a infra-estrutura de abastecimento de gua e tratamento de esgotos pela utilizao mltipla da gua aduzida.

2.4 Formas de reuso de gua

Segundo BREGA FILHO & MANCUSO (2002), de uma maneira geral, o reuso da gua pode ocorrer de forma direta ou indireta, por meio de aes planejadas ou no planejadas.

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De acordo com a Organizao Mundial da Sade, WHO (1973), tem-se: Reuso indireto: ocorre quando a gua j usada, uma ou mais vezes para uso domstico ou industrial, descarregada nas guas superficiais ou subterrneas e utilizadas novamente a jusante, de forma diluda; Reuso direto: o uso planejado e deliberado de esgotos tratados para certas finalidades como irrigao, uso industrial, recarga de aqfero e gua potvel; Reciclagem interna: o reuso da gua internamente a instalaes industriais, tendo como objetivo a economia de gua e o controle da poluio. Essa mesma referncia diferencia o reuso indireto intencional do no intencional, estabelecendo que quando o reuso indireto decorre de descargas planejadas a montante, ou a recargas planejadas no aqfero subterrneo, ele designado reuso indireto intencional. Segundo LAVRADOR FILHO (1987), os termos planejado e no planejado referem-se ao fato do reuso ser resultante de uma ao consciente, subseqente descarga do efluente, ou do reuso ser apenas um subproduto no intencional dessa descarga. Dessa forma, tem-se a seguinte conceituao: Reuso planejado de gua: ocorre quando o reuso resultado de uma ao humana consciente, adiante do ponto de descarga do efluente a ser usado de forma direta ou indireta. O reuso planejado das guas pressupe a existncia de um sistema de tratamento de efluentes que atenda aos padres de qualidade requeridos pelo novo uso que se deseja fazer da gua. O reuso planejado pode ser denominado reuso intencional da gua.

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WESTERHOFF (1984) classifica reuso de gua em duas grandes categorias: potvel e no potvel. A seguir sero descritas as classificaes de interesse ao presente trabalho para devida compreenso. Reuso potvel direto: quando o esgoto recuperado, por meio de tratamento avanado, diretamente reutilizado no sistema de gua potvel. Reuso potvel indireto: caso em que o esgoto, aps o tratamento, disposto na coleo de guas superficiais ou subterrneas para diluio, purificao natural e subseqente captao, tratamento e finalmente utilizado como gua potvel. Reuso no potvel para fins agrcolas: embora quando se pratica esta modalidade de reuso via de regra haja, como subproduto, recarga do lenol subterrneo, o objetivo precpuo desta prtica a irrigao de plantas alimentcias, tais como rvores frutferas e cereais, e plantas no alimentcias tais como pastagens e forrageiras, alm de ser aplicvel para dessedentao de animais. Esse ltimo tipo de reuso no potvel para fins agrcolas classificado segundo o tipo de cultura que o utiliza, apresentando-se em dois grupos: Primeiro grupo: plantas no comestveis, como silvicultura, pastagens, fibras e sementes. Segundo grupo: plantas consumidas cozidas e cruas. HESPANHOL (1999) argumenta que a presena de organismos patognicos e de compostos orgnicos sintticos na grande maioria dos efluentes disponveis para reuso, principalmente naqueles oriundos de estaes de tratamento de esgotos de

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grandes conurbaes, caracterizam o reuso potvel como uma alternativa associada a riscos muito elevados, tornado-o praticamente inaceitvel. Alm disso, os custos dos sistemas de tratamento avanados que seriam necessrios, levariam inviabilidade econmico-financeira do abastecimento pblico, no havendo ainda, garantia de proteo adequada da sade dos consumidores. Sendo assim, a responsabilidade pela remoo de um determinado contaminante no deve ser atribuda a um nico processo ou operao.

2.5 Tipos de reuso e suas aplicaes

Conforme o GRUPO TCNICO DE REUSO DE GUA (2002), as modalidades ou tipos de reuso considerados prioritrios so os seguintes: agrcola; urbano para fins no potveis; industrial; recreao; recarga de aqferos; e aqicultura. Essas modalidades de reuso no so consideradas exclusivas, podendo mais de uma delas ser empregada simultaneamente em um mesmo municpio ou regio. Segundo o CIRRA - Centro Internacional de Referncia em Reuso de gua (2002), os tipos de reuso e suas aplicaes so os seguintes:

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Reuso agrcola: O setor agrcola utiliza, no Brasil, aproximadamente 70% do consumo total de gua. Essa demanda significativa, associada escassez de recursos hdricos leva a ponderar que as atividades agrcolas devem ser consideradas como prioritria em termos de reuso de efluentes tratados. Efluentes adequadamente tratados podem ser utilizados para aplicao em: Culturas de alimentos no processados comercialmente: irrigao superficial de qualquer cultura alimentcia, incluindo aquelas consumidas cruas; Culturas de alimentos processados comercialmente: irrigao superficial de pomares e vinhas; Culturas no alimentcias: irrigao de pastos, forragens, fibras e gros; Dessedentao de animais.

Reuso urbano: Na rea urbana os usos potenciais so: irrigao de campos de golfe e quadras esportivas, faixas verdes decorativas ao longo de ruas e estradas, gramados residenciais, viveiros de plantas ornamentais, parques e cemitrios, descarga em toaletes, lavagem de veculos, reserva de incndio, recreao, construo civil (compactao do solo, controle de poeira, lavagem de agregados, produo de concreto), limpeza de tubulaes, sistemas decorativos tais como espelhos dgua, chafarizes, fontes luminosas, entre outros.

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Reuso industrial: As atividades industriais no Brasil respondem por aproximadamente 20% do consumo de gua, sendo que, pelo menos 10% extrada diretamente de corpos dgua e mais da metade tratada de forma inadequada ou no recebe nenhuma forma de tratamento. O reuso e reciclagem na indstria constituem ferramentas de gesto fundamentais para a sustentabilidade da produo industrial. A prtica de reuso industrial pode ser extendida na produo de gua para caldeiras, em sistemas de resfriamento, em lavadores de gases e como gua de processos. Reuso no meio ambiente: Nesse caso, pode ser utilizado como em habitats naturais, estabelecimentos recreacionais, pesca e canoagem, formao de represas e lagos. Recarga de aqferos: A recarga artificial de aqferos com efluentes tratados pode ser empregada para finalidades diversas, incluindo o aumento de disponibilidade e armazenamento de gua, controle de salinizao em aqferos costeiros e controle de subsidncia de solos. Esta prtica pode ser relevante em alguns municpios, abastecidos por gua subterrnea, onde a recarga natural de aqferos vem sendo reduzida pelo aumento de reas impermeabilizadas.

2.6 Legislao relativa ao reuso de gua no Brasil

A partir da promulgao da Lei n 9.433/97, que institui a Poltica Nacional de Recursos Hdricos, dado um novo enfoque para a questo hdrica, a gesto do

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uso da gua por bacias hidrogrficas e o conceito do usurio pagador. A nfase legislativa incide na racionalizao do uso da gua, estabelecendo princpios e instrumentos para sua utilizao. Porm, pouca preocupao legislativa ocorreu para fixao de princpios e critrios para a reutilizao da gua no Brasil. Segundo HESPANHOL (2001), importncia especial ao reuso foi dada na Agenda 21, a qual recomendou aos pases participantes da ECO a implementao de polticas de gesto dirigidas para o uso e reciclagem de efluentes, integrando proteo de sade pblica de grupos de risco, com prticas ambientais adequadas. No captulo 21 - Gesto ambientalmente adequada de resduos lquidos e slidos, rea Programtica B - Maximizando o reuso e a reciclagem ambientalmente adequadas, estabelecido, como um dos objetivos bsicos: vitalizar e ampliar os sistemas nacionais de reuso e reciclagem de resduos. A prtica de uso de guas residurias tambm associada s seguintes reas programticas includas nos captulos 14 - Promovendo a agricultura sustentada e o desenvolvimento rural, e 18 - Proteo da qualidade das fontes de guas de abastecimento - Aplicao de mtodos adequados para o desenvolvimento, gesto e uso dos recursos hdricos, visando a disponibilidade de gua para a produo sustentada de alimentos e desenvolvimento rural sustentado e para a proteo dos recursos hdricos, qualidade da gua e dos ecossistemas aquticos. Conforme HESPANHOL (2001), embora no exista, no Brasil, nenhuma legislao relativa, j se dispe de uma primeira demonstrao de vontade poltica, direcionada para a institucionalizao do reuso. A Conferncia Interparlamentar sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente, realizada em

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Braslia, em dezembro de 1992, recomendou, sob o item Conservao e Gesto de Recursos para o Desenvolvimento, que se envidassem esforos, em mbito nacional, para institucionalizar a reciclagem e reuso sempre que possvel e promover o tratamento e a disposio de esgotos, de maneira a no poluir o meio ambiente. Com base em vrias referncias tericas, evidencia-se que no existe uma poltica estabelecida, arcabouo legal e institucional, ou parmetros estabelecidos para a prtica de reuso no Brasil. Porm, conforme FINK & SANTOS (2002), a legislao em vigor, ao instituir os fundamentos da gesto de recursos hdricos, cria condies jurdicas e econmicas para a hiptese do reuso de gua como forma de utilizao racional e de preservao ambiental.

2.7 Resoluo CONAMA n 20/1986 e os usos preponderantes da gua com suas classes

Com o objetivo de evitar a poluio e contaminao de qualquer espcie modificando os usos dos corpos dgua, institui-se a Resoluo CONAMA n 20, de 18 de junho de 1986, que estabelece nove classes de acordo com os usos preponderantes da gua no Territrio Nacional. Os efluentes somente podem ser descartados em corpos dgua se os seus parmetros caractersticos se situarem dentro do balizamento dado pela Resoluo CONAMA n 20/1986, para cada classe de corpo de gua. Segundo FERNANDEZ & GARRIDO (2002), atualmente, discute-se no meio tcnico a necessidade de essa Resoluo ser revista para melhor se adequar a

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realidades observadas em inmeras bacias do Brasil. Assinala-se, entretanto, que o seu texto um balizamento para que restries outras possam ser estabelecidas por comits de bacia, os quais, consideraro, por certo, as condicionantes inerentes s suas prprias regies. Sendo assim, medidas devem ser cumpridas para manter a condio de um segmento de corpo dgua em correspondncia com a sua classe. Esta Resoluo estabelece, por meio de vrios artigos, uma srie de limites e condies, sob os pontos de vista fsico, qumico e bioqumico, para as guas das diversas classes. So estabelecidos padres mnimos para os efluentes serem aceitos como descartes em corpos d gua. Para que eles possam ser lanados, direta ou indiretamente, preestabelecidas. Ainda segundo FERNANDEZ & GARRIDO (2002), como os efluentes lquidos podem ser oriundos das aglomeraes urbanas, dos distritos industriais, de plantas mineradoras e como retorno das guas de irrigao, a anlise das caractersticas fsicas de um efluente pode ser feita com base em alguns indicadores, como: slidos totais, temperatura, cor e odor, turbidez, demanda bioqumica de oxignio (DBO), demanda qumica de oxignio (DQO) e carbono orgnico total (COT). As classes especial, 1, 2, 3 e 4 so para as guas doces; as classes 5 e 6, para as guas salobras e, as classes 7 e 8, para as guas salinas, conforme TAB. 3. nos corpos dgua, devem obedecer s condies

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TABELA 3 Destinao dos corpos dgua conforme a Resoluo CONAMA n 20/1986DESTINAO CLASSES E 1 2 3 4 5 6 7 8 Abastecimento domstico sem prvia ou com simples x desinfeco Preservao do equilbrio natural das comunidades x aquticas Abastecimento domstico aps tratamento simplificado Proteo das comunidades aquticas Recreao de contato primrio Irrigao de hortalias que so consumidas cruas e de frutas que se desenvolvam rentes ao solo e que sejam ingeridas cruas sem remoo de pelcula Criao natural e/ou intensiva (aqicultura) de espcies destinadas alimentao humana Abastecimento domstico, aps tratamento convencional Irrigao de hortalias e plantas frutferas Criao natural e/ou intensiva (aqicultura) de espcies destinadas alimentao humana Irrigao de culturas arbreas, cerealferas e forrageiras Dessedentao de animais Navegao Harmonia paisagstica Usos menos exigentes Navegao comercial Recreao de contato secundrio x x x x x x x x x x x x x x x x x x x x x x x x x x x x x

FONTE - PEREIRA, 2002 NOTA - E: classe especial

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2.8 Categorias de reuso e suas limitaes sanitrias e ambientais de aplicao

As guas servidas podem ser usadas tambm na irrigao e na recarga de aqferos. Porm, conforme BEEKMAN (1996), grandes volumes dessas guas podem ser utilizadas em categorias de reuso (como agricultura irrigada e recarga de aqferos), devendo-se atentar para suas limitaes de aplicao, como por exemplo: Na categoria de reuso de guas servidas para a agricultura irrigada de culturas e olericultura, as limitaes se referem ao efeito da qualidade da gua, principalmente a salinizao dos solos, e a preocupao patognica (bactrias, vrus e parasitas) na sade pblica. Na categoria para irrigao de ambientes urbanos (parques, jardins, clubes, reas residenciais, cemitrios, cintures verdes e gramados), a limitao est relacionada com a contaminao das guas de superfcie e subterrnea devido gesto ineficiente e com restries na comercializao dos produtos agrcolas e aceitao de mercados. Na categoria de reuso para recarga de aqferos (guas subterrneas, intruso salina e controle da subsidncia), a limitao na aplicao diz respeito a traos de toxidade e seus efeitos nas guas de reuso, alm da possibilidade de existncia de slidos dissolvidos totais, metais pesados e patgenos nas guas de reuso.

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A reutilizao das guas considerada uma opo conservacionista para o aumento da disponibilidade dos recursos hdricos existentes e futuros, como alternativa ao crescente aumento da demanda.

2.9 Princpio do poluidor-pagador

Segundo FERNANDEZ & GARRIDO (2002), a cobrana pelo uso da gua um dos instrumentos mais importantes na gesto dos recursos hdricos. O instrumento da cobrana concorre para o equilbrio entre a oferta e a demanda desses recursos na bacia ou regio hidrogrfica. Alm de ser utilizada com a finalidade de racionalizar o uso, a cobrana pelo uso da gua atua, tambm, como mecanismo eficiente de redistribuir os custos sociais de forma mais eqitativa; para disciplinar a localizao dos usurios; promover o desenvolvimento regional integrado nas suas dimenses social e ambiental; e incentivar a melhoria nos nveis de qualidade dos efluentes lanados nos mananciais. Nesse sentido, com a tendncia de aumento do mercado de gua e estmulo prtica de reuso como alternativa de racionalizao do bem finito, cabe ressaltar o mecanismo de grande valia proteo ambiental do princpio poluidorpagador. Segundo ALBUQUERQUE (1999), esse princpio pode ser entendido como recurso econmico utilizado para que o poluir arque com os custos da atividade poluidora, ou seja, haja a internalizao dos efeitos externos (externalidades), passando assim a repercutir nos custos finais dos produtos e servios oriundos da atividade. Por outro ngulo busca-se fazer com que os agentes que originaram as externalidades assumam os custos impostos a outros agentes, produtores e/ou consumidores.

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2.10 Experincias internacionais de reuso de gua

O reuso de gua no um conceito novo e tem sido praticado em todo o mundo h muitos anos. Existem relatos da prtica de reuso na Grcia Antiga, com a disposio de esgotos e sua utilizao na irrigao. CGER, citado por FINK & SANTOS (2002), menciona que a Califrnia e a Flrida ocupam destaque entre os estados que possuem critrios especficos para o reuso potvel indireto planejado. A Califrnia tem antigos requisitos gerais para o reuso potvel indireto, datado de 1978, por meio da recarga de aqferos, os quais esto sendo atualizados para garantir que um aqfero que recebeu gua de reuso atenda ao padro de potabilidade e no exija tratamento posterior antes do consumo. O Estado ainda no desenvolveu critrios para uso reuso potvel indireto por meio do aumento da vazo de cursos dgua, embora exista uma proposta neste sentido. A Flrida exige que os distritos de gerenciamento das guas do Estado identifiquem quais reas tm ou tero abastecimento problemtico nos prximos 20 anos, devendo elaborar estudos de viabilidade para as ETEs localizadas nestas reas, prevendo o reuso de seus efluentes ou demonstrando que isto invivel por razes econmicas, ambientais ou tcnicas. Sendo julgado vivel, a descarga do efluente tratado nas guas superficiais ou em injees de poos profundos deve-se limitar gua de reposio necessria para os sistemas de reuso. No Arizona, o reuso potvel direto especificamente proibido, e a recarga de aqferos com efluentes tratados em ETEs uma operao fiscalizada por dois

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departamentos, o Arizona Department of Environmental Quality (ADEQ) e o Arizona Department of Water Resources (ADWR). No Texas, na medida em que o reuso das guas se torna mais comum, considerase natural que surjam mais e mais aspectos legislativos disciplinando esta prtica. Os tpicos legais de interesse abrangem mananciais e cursos dgua, aqferos profundos e superficiais e direitos de propriedade sobre usos teis da gua captada. A maior parte dos rios do Texas possui a vazo dominante proveniente do reuso, alguns em mais de 90%, especialmente na estao seca. A extenso da proteo legal para os usurios de jusante depende do manancial dos usurios de montante ser superficial ou subterrneo. Por exemplo, a cidade de Abilene, que depende de mananciais superficiais, est obrigada pelo Brazos River Authority a retornar 40% da vazo captada para o rio, sob a forma de efluente tratado, para compensar a perda dgua em um de seus reservatrios devido ao reuso. Segundo BEEKMAN (1996), uma das reaplicaes de gua com retorno expressivo est na utilizao das guas servidas do meio urbano para um segundo uso na agricultura. Apesar dessas guas serem consideradas poludas, as guas servidas contm nutrientes que beneficiam o solo. Em geral, o setor agrcola dispende vultuosos recursos em fertilizantes qumicos para compensar as necessidades das culturas em nitrognio, fsforo e potssio, que esto contidos em grandes quantidades nas guas servidas de origem urbana ou domstica. Estudos realizados na Califrnia, Israel e Portugal tm demonstrado que diversas culturas irrigadas com guas servidas requerem pouca ou nenhuma complementao adicional de fertilizantes qumicos ou orgnicos.

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Por meio da utilizao das guas de abastecimento por duas vezes - uma para uso domstico e novamente para irrigao - os poluentes em potencial tornamse fertilizantes importantes para o meio agrcola, incrementando a produo e produtividade agrcola e impedindo a poluio e contaminao dos rios e lagos, o que por sua vez, novamente propiciam uma fonte natural e limpa para o suprimento e abastecimento domstico. Essa concepo no recente, tendo sido aplicada em 1650 em Edinburgh, na Esccia, sendo posteriormente aplicada nos arredores de Londres, Manchester e outras cidades. Na Austrlia, essa tcnica comeou a ser aplicada em 1897, na Werribbee Farm, em Melbourne, e atualmente, aproximadamente 10.000 hectares de terras agrcolas so irrigadas com guas servidas, sendo o maior sistema em operao no mundo. Ainda segundo BEEKMAN (1996), nas ltimas dcadas, esta metodologia temse consagrado como uma forma econmica de controle da poluio, e simultaneamente, como uma opo importante para contrapor a escassez de guas. Atualmente, aproximadamente 500.000 hectares de terras agrcolas, em cerca de 15 pases, esto sendo irrigadas com guas servidas. Entre estes, Israel detm um dos mais ambiciosos programas de reutilizao de guas servidas tratadas, sendo que 70% das guas servidas do pas so reutilizadas para a irrigao de 19.000 hectares. No entanto, a utilizao de guas servidas em pases em desenvolvimento apresenta caractersticas sanitrias insatisfatrias, sendo, muitas vezes, aplicadas na forma in natura na agricultura. guas servidas de Santiago do Chile, que praticamente representam a vazo do rio Mapocho durante o perodo seco, irrigam cerca de 16.000 hectares de horticultura, destinados ao consumo dos mercados dos centros urbanos, o que resultou em febres tifides em meados

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da dcada de oitenta. Por isso, o controle sanitrio um fator essencial de extrema relevncia na utilizao dessa tcnica. Em complementao das experincias internacionais da prtica de reuso, segundo BEEKMAN (1998), as organizaes e instituies a seguir utilizam tecnologias de reciclagem e reuso: State of California, Office of Water Recycling, Sacramento, USA; Dames & Moore, Water Pollution Control Engineering Services, Washington, USA; World Health Organization, Geneva, Switzerland; American Water Works Association Research Foundation, Denver, USA. GUIDOLIN (2000) cita ainda o caso de Brunswick, na Alemanha, onde foi criada, desde 1952, uma associao de usurios para aproveitamento dos esgotos da cidade. O esgoto coletado na estao de tratamento e conduzido por gravidade por uma adutora at as estaes de bombeamento nas reas irrigadas por asperso. Em 20 anos de operao do sistema no foi constatado nenhum caso de infeco, o que demonstra que as medidas de segurana adotadas so suficientes. O uso de gua reciclada para fins agrcolas prximas a reas urbanas pode ser atrativo, pois assim os irrigantes visam receber grandes quantidades de gua reciclada em vez de gua pura de fontes convencionais. Outro caso mencionado o de San Petesburg, que opera um dos maiores sistemas de reuso, distribuindo gua reciclada para irrigao de reas domsticas, parques de condomnios, de escolas e campos de golf, alm de torres de ar condicionado e sistemas de proteo a incndios. Enquanto que em

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San Antonio, Texas, utilizam-se pivs centrais para aplicao de efluentes domsticos do municpio no permetro de irrigao de Salatrillo. Ainda, em Amman, Jordnia, onde a precipitao mdia de aproximadamente 100mm por ano, os esgotos so tratados em um sistema de lagoas de estabilizao e encaminhados barragem de King Tahial, onde, aps a diluio, so utilizados para irrigao.

2.11 Experincias nacionais de reuso de gua

Segundo informaes do JORNAL O ESTADO DE SO PAULO (2002), com o objetivo de implantar medidas para racionalizar a utilizao da gua, a cidade de So Paulo lanou um programa de reutilizao da gua, o gua de Reuso, que ir ajudar a reduzir a necessidade de racionamento. A meta tentar evitar o rodzio de gua na capital e na regio metropolitana, com uma reduo total de consumo de 20%. Em So Paulo cerca de 21,6 mil metros cbicos de gua potvel utilizada para a limpeza das ruas aps as 911 feiras livres semanais da cidade, uma quantidade de gua que poderia abastecer cerca de 1.544 residncias. Alm de considerar que a gua que sobra do tratamento de esgotos pode ser comercializada a um preo bem menor que o da gua potvel. O sistema de reuso, que comeou a ser desenvolvido h dois anos, poder proporcionar grande economia para So Paulo e amenizar o impacto de racionamento. O incentivo ao uso de gua reutilizvel para fins menos nobres diminuir gastos aos rgos pblicos enquanto que a gua tratada seria utilizada para fins mais nobres. O programa de reutilizao da gua oferece vantagens ambientais, sociais e econmicas.

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Outro caso que utiliza gua de reuso o do Parque de diverses Hopi Hari, em So Paulo, o qual possui dois poos profundos de gua que servem para o abastecimento do parque, com uma vazo mdia de 60 m3/h. Para a reutilizao de toda gua usada no parque h um moderno sistema de tratamento de efluentes que processado em uma estao compacta de tecnologia canadense, a primeira a ser instalada no pas, com uma pequena rea de 300 m2, processando o efluente em contineres fechados, reduzindo a rea ocupada e evitando problemas de odor. Todo esse processo automatizado e o esgoto tratado, j denominado gua de reuso, bombeado para um reservatrio no ponto mais alto do parque, sendo essa gua utilizada para fins sanitrios e de irrigao dos jardins. O Estado de So Paulo, por meio da atuao da SABESP e centros de pesquisa da USP, possui tambm experincias especficas de reuso de efluentes tratados na agricultura. Utilizam o reuso em agricultura irrigada de cultivos anuais, como milho e girassol, hidroponia em flores e irrigao de pastagens para produo de feno. Dentre outras iniciativas, a FIESP/CIESP lanou, em maro de 2002, a Agenda da Conformidade Ambiental da Indstria Paulista, que tem dentre seus projetos o Reuso de gua, que objetiva disponibilizar ao setor alternativas e tecnologias para a reduo e racionalizao do uso da gua nos processos produtivos. Conforme a REVISTA DA ASSOCIAO BRASILEIRA DE IRRIGAO E DRENAGEM (2001), na agroindstria j h o despertar para as potencialidades da gua residuria. Na Bacia de Campos, os grandes produtores da agroindstria aucareira j usam bem a tecnologia da reciclagem. Alm da vinhaa, a gua

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resultante do trabalho industrial na avicultura, suinocultura e bovinocultura torna-se fonte que poderia atender elevada demanda de irrigao, pois rica em nutrientes e contribui inclusive na economia de fertilizantes e adubo. O uso de guas residurias para irrigao de grande importncia tambm em termos de planejamento para proteo ambiental. Segundo GUIDOLIN (2000), outras experincias nacionais tm destaque na prtica do reuso, como a aplicao sistemtica de efluentes, que recebem tratamento primrio, na regio do Serid, no Rio Grande do Norte, para irrigao de capineiras nas vizinhanas da rea urbana, com maior destaque s sedes municipais de Santa Cruz, Campo Redondo, Caic, Currais Novos, Goianinha, Eduardo Gomes e Parelhas.

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3 MATERIAL E MTODOS

3.1 Descrio:

Para desenvolver o presente trabalho, a metodologia adotada teve como base pesquisas bibliogrficas nacionais e internacionais na temtica de reuso de gua. Foram utilizadas tambm informaes obtidas na internet em sites de fontes de alta confiabilidade, buscando referncias, conceitos, instrumentos legais existentes relacionados temtica e experincias nacionais e internacionais na tcnica de reciclagem de gua. No Brasil, dada atualidade do tema de reuso de gua para irrigao, foram consideradas, como material complementar de pesquisa, esclarecimentos obtidos com especialistas na rea de reuso da gua, seja por meio de discusso pessoal, seja por troca de e-mails.

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4 RESULTADOS E DISCUSSO

Por meio da pesquisa bibliogrfica, associada aos esclarecimentos adquiridos de especialistas do setor hdrico, direcionados ao objetivo e questes propostas do presente trabalho, foi possvel destacar importantes resultados e consideraes referentes temtica de reuso da gua para irrigao, como sero discutidos a seguir.

4.1 Relao entre escassez de gua e escassez de alimentos

O reuso como forma de propiciar a racionalizao do uso da gua tem relao intrnseca com a produo de alimentos. A escassez de gua contribui para o dficit na colheita de gros, que estar interferindo no preo dos alimentos e em conseqncia na qualidade de vida das populaes. Assim, medida que o dficit hdrico se expande, haver aumento dos dficits de alimentos.

4.2 Benefcios agregados da prtica de reuso

Por meio da prtica de reuso, pode-se mencionar diversos benefcios agregados, relacionados com artigos da Lei n 9.433, como explicitados no termo de referncia para elaborao de propostas de resoluo relativa aos aspectos polticos, institucionais e legais do reuso, do Grupo de Trabalho Reuso do CNRH (2002): efluentes ou guas de segunda qualidade so partes integrantes

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dos recursos nacionais e podero ser utilizados de forma benfica para usos mltiplos; o reuso evita a descarga de efluentes em corpos hdricos; a utilizao de efluentes tratados para fins benficos se constitui em prtica de racionalizao e de preservao; e o reuso promove o planejamento, regulao e controle do uso, preservao e recuperao dos recursos hdricos. Deve-se tambm agregar a contribuio para o aumento da produo e produtividade agrcola, gerado com o uso de guas de reuso, por apresentarem nutrientes benficos s plantas.

4.3 A legislao hdrica e ambiental no Brasil e o reuso de gua

Diante do perfil de escassez e comprometimento da qualidade da gua nas diversas localidades, urge a criao de instrumentos que estimulem o desenvolvimento de novas tecnologias capazes de garantir economia desse recurso natural e a racionalizao do uso da gua. Nesse sentido, o reuso est relacionado com o enfoque desses instrumentos, sendo uma hiptese para atingir metas de racionalizao. A Lei n 6.938/81, de 31/08, que institui a Poltica Nacional do Meio Ambiente (PNMA), estabelece, como princpios norteadores das aes governamentais para o meio ambiente, incentivos ao estudo e pesquisa de tecnologias orientadas para o uso nacional e a proteo dos recursos ambientais, alm da racionalizao do uso da gua. A Lei define ainda os objetivos a serem atingidos, incluindo o desenvolvimento de pesquisas e de tecnologias nacionais orientadas para o uso racional de recursos ambientais e a preservao e restaurao dos recursos ambientais com vistas sua utilizao racional e

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disponibilidade permanente, concorrendo para a manuteno do equilbrio ecolgico propcio vida. A Lei n 9.433/97, de 08/01, que institui a Poltica Nacional de Recursos Hdricos (PNRH), tambm oferece fundamentos jurdicos para a racionalizao do uso da gua, e conseqentemente condicionantes legais para o reuso da gua, alternativa vivel na preservao e conservao ambiental. A Lei tem como um de seus objetivos a utilizao racional e integrada dos recursos hdricos, com vistas ao desenvolvimento sustentvel. Define tambm, como contedo mnimo dos planos de recursos hdricos, as metas de racionalizao de uso, aumento da quantidade e melhoria da qualidade dos recursos hdricos disponveis. J com relao cobrana, tem com o objetivo incentivar a racionalizao do uso da gua. Por meio das consideraes anteriores, percebe-se que, tanto na legislao ambiental, quanto na hdrica, salienta-se para a busca de formas de racionalizao da gua, permitindo assim considerar como precedentes para a definio de uma legislao que trate o reuso, alternativa de uso racional da gua para diversos fins, incluindo o agrcola, de forma mais especfica.

4.4 Relao entre o reuso de gua para irrigao e a classificao de corpos de gua com base nos usos preponderantes e prioritrios da Resoluo CONAMA n 20, de 18/06/86

Essa normativa estabelece a classificao das guas com base nos usos preponderantes e prioritrios (sistema de classes de qualidade), estabelecendo

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nvel de qualidade (classes) a ser alcanado e/ou mantido em um trecho do corpo hdrico ao longo do tempo. Esse instrumento usado pela PNRH de classificao das guas tem relao com o reuso de gua, j que esse tipo de gua pode ser considerado como classe inferior, alm desse tipo de gua servir como medida de definio do nvel de qualidade, segundo os usos preponderantes. Como um dos objetivos da classificao das guas diminuir os custos de combate poluio das guas, mediante aes preventivas permanentes, o reuso pode ser considerado como uma dessas aes. A determinao da possibilidade de usos menos exigentes outro objetivo da classificao, no qual o reuso pode se enquadrar. Por meio dessa Resoluo, as guas so divididas em trs categorias: doces, salinas e salobras. Suas subdivises so feitas em nove classes: cinco para guas doces (classe especial, classes 1, 2, 3 e 4); duas para guas salinas (classes 5 e 6); e duas para guas salobras (classes 7 e 8). As classes as quais poderiam ser utilizadas para reuso so as classes 1, 2, 3 e 4. A classe especial das guas doces, por serem guas naturais para uso primrio inicial, ainda no utilizadas e no aproveitadas, no dever ser indicada para reuso. Essa classe especial possui alto nvel de qualidade. Ao classificar as guas, a Resoluo indica e determina os usos preponderantes, definindo, conseqentemente, o suposto reuso do tipo indireto, pois, quando as guas so reutilizadas, pressupe-se sua captao em cursos dgua de domnio pblico.

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Cabe ressaltar que os efluentes no podero conferir ao corpo receptor caractersticas em desacordo com o seu enquadramento de classe. Sendo assim, obedecendo aos parmetros fsico-bio-qumicos definidos para cada classe na Resoluo mencionada, no caso especfico de reuso de gua para irrigao, tem-se que: as guas de classe 1 poderiam ser utilizadas para reuso indireto na irrigao de hortalias que so consumidas cruas e de frutas que se desenvolvam rentes ao solo e que sejam ingeridas cruas sem remoo de pelcula; as guas de classe 2 poderiam ser utilizadas para reuso indireto na irrigao de hortalias e plantas frutferas; as guas de classe 3 poderiam ser utilizadas para reuso indireto na irrigao de culturas arbreas, cerealferas e forrageiras; as guas de classe 4 poderiam ser utilizadas para reuso indireto na harmonizao paisagstica.

4.5 Aplicao do princpio poluidor-pagador

Um dos instrumentos da PNRH que poder estimular o reuso de gua como forma de minimizao de passivo ambiental a cobrana pelo uso da gua, por meio do princpio usurio-pagador. E uma das formas de favorecer tecnologias que permitem o descarte final de menor quantidade de efluentes a aplicao da regra do poluidor-pagador.

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Por meio do princpio do poluidor-pagador, estabelece-se que ao poluidor devem ser imputados os custos necessrios do combate poluio, custos esses definidos pelo Poder Pblico para manter o meio ambiente em estado aceitvel, bem como promovendo a sua melhoria. A preveno do dano ambiental a conduta mais adequada, porm caso no seja possvel, a reparao deve ser cumprida, apesar de em certos casos mais graves, no ser possvel nem aferir esse dano. O princpio poluidor-pagador no apenas um princpio de compensao de danos causados pela poluio, pois deve incluir tambm os custos da proteo ambiental, quaisquer que eles sejam, considerando custos de preveno, reparao e represso do dano ao meio ambiente.

4.6 Reflexo das experincias de reuso em outros pases

Percebe-se, analisando as experincias internacionais abordadas no item resultados e discusso, que em alguns pases e regies j se estabeleceram mercados de gua, incluindo a gua de reuso, destinada para fins especficos, a exemplo da irrigao, usos industriais, entre outros. Nesses casos, o reuso da gua pode ser encarado como uma resposta crescente escassez desse recurso. No caso da irrigao, experincias internacionais relacionando o tipo de irrigao e gua de reuso podem ser estudadas, aproveitadas ou adaptadas para a realidade brasileira. Como exemplo tem-se a irrigao irrestrita, ou seja, sem restrio de culturas ou mtodos de irrigao, para a qual exigem-se critrios mais rigorosos de qualidades de efluentes; e restrita, que envolve a seleo de

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culturas ou restrio de mtodos de irrigao, associados aos quais admite-se a utilizao de efluentes de qualidade menos exigente. Sendo assim, em anlise mais global, nota-se que a prtica de reuso no uma tcnica nova, visto que diversos pases j a utilizam, possuindo seus critrios e polticas prprias para o tema. Dada a utilizao do reuso da gua para diversos fins, incluindo a irrigao, nos diferentes pases, percebe-se que h a tendncia de difuso dessa tcnica em outros pases cuja escassez de gua j uma realidade em algumas regies, como o caso do Brasil.

4.7 Cultura de reuso e educao ambiental

Atualmente, a idia de utilizar um volume de gua para diversos fins no muito aceita nos diferentes pblicos consumidores desse bem, apesar de a reciclagem j ser uma prtica antiga. Porm, a tendncia de mudana desse comportamento, visto que a necessidade da prtica de reuso uma realidade para a racionalizao do bem natural finito, gua. A cultura para a prtica do reuso ainda um fator que dificulta a expanso dessa tcnica, podendo-se fazer desenvolver programas e projetos de educao ambiental que trabalhem melhor o conceito, funes e utilidades desse tipo de prtica.

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A mudana de comportamento envolve iniciativas e programas de educao ambiental e capacitao, que podem contribuir com o processo de conscientizao e internalizao da importncia dessa tcnica de reuso.

4.8 gua como fator econmico de desenvolvimento social

Decises polticas e as aes de milhes de indivduos determinam diretrizes fundamentais de longo prazo sobre o suprimento e demanda de gua e alimentos. Sendo assim, cabe ressaltar a importncia que se deve dar ao envolvimento de atores sociais, considerando indivduos, setores e comunidades, na tomada de decises, desde a fase de formulao de resolues legais at a aplicao da prtica de reuso. Esse enfoque garantir o valor da gua como fator econmico de desenvolvimento social. Nesse sentido, cabe ressaltar o importante papel da responsabilidade social na definio de hbitos e costumes utilizados na prtica de uso e reuso de gua por cada cidado, podendo influenciar assim no processo de desenvolvimento econmico e social de um pas.

4.9 Consideraes finais

A poluio dos mananciais, comprometendo o nvel das guas de forma qualitativa, restringe o uso para abastecimento humano, animal, e at mesmo industrial, limitando o seu uso para irrigao e pesca, alm de inviabilizar o seu uso para lazer, esporte e recreao.

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Em anlise quantitativa, racionalizar o uso da gua um fator essencial para que ela possa satisfazer as mltiplas necessidades do homem. O reuso de gua faz parte de uma atividade mais abrangente, que o uso racional e eficiente da gua, o qual compreende tambm o controle de perdas e desperdcios, e a minimizao da produo de efluentes e do consumo de gua. Os esgotos tratados tm um papel fundamental no planejamento e na gesto sustentvel dos recursos hdricos como um substituto para o uso de guas destinadas a fins agrcolas e de irrigao, entre outros. Ao liberar as fontes de gua de boa qualidade para abastecimento pblico e outros usos prioritrios, o uso de esgotos contribui para a conservao dos recursos e acrescenta uma dimenso econmica ao planejamento dos recursos hdricos. A implantao de sistemas de reuso e reciclagem de gua, desde que possuam viabilidade tcnica e econmica, implica em significativos benefcios ambientais, seja por aumentar a oferta de gua potvel e disponvel nos mananciais, seja por aumentar os nveis de tratamento dos efluentes lquidos, diminuindo os lanamentos nos corpos dgua. importante ressaltar que alm dos benefcios ambientais, a implantao de sistemas de reuso apresenta tambm significativos impactos positivos em termos sociais e econmicos. O efluente tratado, resultando na gua de reuso, pode ser utilizado na agricultura, barateando o custo da gua e aumentando a produtividade. O uso dessa tcnica resulta na economia de adubo e aumento da produtividade da cultura, pois a gua tratada carrega matria orgnica, essencial ao desenvolvimento das plantas. Alm de considerar que o sistema solomicroorganismos-plantas tende a estabilizar o esgoto sanitrio, bem como de proteger os corpos dgua a jusante e fornecer nutrientes s plantas.

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Porm cuidados e medidas devem ser tomadas e definidas para evitar os riscos associados prtica do reuso na irrigao, como contaminao da gua por bactrias, vrus, protozorios, micro-poluentes orgnicos e inorgnicos e metais pesados. De acordo com a Organizao Mundial da Sade (OMS), as doenas diarricas so responsveis por mais de 3 milhes de morte a cada ano. Assim, preciso estabelecer bases cientficas, polticas, institucionais e legais para o desenvolvimento de padres e cdigos de prtica nacional de reuso na agricultura de maneira sustentada, ecologicamente compatvel e isenta de riscos sade pblica. Apesar de no Brasil no existir uma legislao que trata especificamente o tema do reuso de gua, percebe-se que a prpria legislao da Poltica Nacional de Recursos Hdricos cria condies jurdicas e econmicas para a alternativa do reuso de gua como forma de uso racional e de preservao do meio ambiente. No Brasil, a prtica de reuso de esgotos tratados para irrigao constitui-se em um procedimento no institucionalizado e tem se desenvolvido sem planejamento ou controle. Na maioria das vezes inconsciente por parte do usurio, que utiliza guas altamente poludas de crregos e rios adjacentes para irrigao de hortalias e outros vegetais, ignorando que esteja exercendo uma prtica danosa sade pblica dos consumidores e provocando impactos ambientais negativos. Assim, apesar de j existir atividade de reuso de gua com fins agrcolas em certas regies do Brasil, a qual exercida de maneira informal e sem as salvaguardas ambientais e de sade pblica adequadas, torna-se necessrio institucionalizar, regulamentar e promover o setor por meio da criao de estruturas de gesto, preparao de legislao, disseminao de

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informao, e do desenvolvimento de tecnologias compatveis com as condies tcnicas, culturais e scio-econmicas brasileiras. O envolvimento da sociedade como forma de garantir a participao social e comunitria fator essencial para a definio de uma poltica de reuso eficiente e condizente com a realidade brasileira. Dado o reuso como sendo um tema multisetorial, que envolve as reas ambiental, hdrica, social e de sade, necessita-se alm de uma boa articulao dos rgos envolvidos nesses diferentes setores e a sociedade, com responsabilidades bem definidas, um adequado estabelecimento de aspectos tcnicos de tratamento, de bio-segurana, sade, proteo ambiental e informao ao pblico em geral. O reuso, ressaltando especificamente o do tipo agrcola, deve obedecer a padres mnimos fsicos, qumicos e microbiolgicos que garantam a segurana agroalimentar das comunidades. Esses padres j esto em parte definidos na Resoluo CONAMA n 20, devendo, porm, serem ampliados como forma de assegurar a confiabilidade dessa tcnica por seus usurios. Com base na discusso apresentada, percebe-se a necessidade de definio, para o caso do reuso, incluindo a irrigao, de aspectos polticos, arranjos institucionais, arcabouo legal e diretrizes para a prtica do reuso da gua no Brasil. Cabe tambm ao setor pblico, em conjunto com a sociedade, determinar iniciativas de planejamento e fiscalizao do reuso em nvel nacional e de bacia hidrogrfica.

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5 CONCLUSES

Com o aumento da demanda de gua e reduo da oferta, gerando escassez de gua e conseqente escassez de alimentos, o reuso de gua para irrigao surge como uma possvel soluo para a racionalizao desse bem e preservao ambiental. Este trabalho fornece material de consulta aos profissionais da rea de agricultura irrigada, tcnicos que trabalham com a questo do reuso de gua para os diversos fins, incluindo principalmente a irrigao, e os diferentes atores sociais envolvidos na gesto dos recursos hdricos de bacias hidrogrficas. Como consulta bibliogrfica, a discusso deste trabalho demonstra a importncia da utilizao da tcnica de reuso de gua para irrigao como forma de otimizar esse bem finito, salientando para a necessidade de regulamentao especfica do tema, com os cuidados cabveis na proteo ao meio ambiente e na conservao do nvel da qualidade de gua, sem ameaa sade pblica. Dada a inovao do tema de reuso de gua para irrigao no Brasil, considerando ainda no existir regulamentao especfica na temtica, estando ainda em fase inicial de formulao de propostas de resolues legais, a finalidade da discusso estimular a reflexo e anlise do tema, possibilitando fornecer subsdios para agregar consideraes a propostas de trabalho e/ou de instrumentos legais. A tendncia atual de se considerar a gua residuria tratada como um recurso hdrico a ser utilizado para diversos fins, incluindo a irrigao. A utilizao da

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gua de reuso significa um aumento na oferta de gua para vrios fins, liberando os recursos hdricos disponveis para utilizao em outros usos onde h maior exigncia de qualidade, tais como o abastecimento humano. Assim, o uso racional, o controle de perdas e o reuso da gua so to importantes quanto a construo de reservatrios, de poos ou outras obras hidrulicas, pois significam, tambm, aumento na oferta desse escasso bem, que pode ser aproveitado tambm na agricultura irrigada. Por meio da prtica do reuso, pode-se perceber as vrias vantagens do ponto de vista de planejamento integrado de recursos hdricos, como o controle da poluio e proteo de mananciais de gua potvel e o aumento da produtividade agrcola. Cabe salientar que no Brasil j existem vrias iniciativas de reuso no potvel de gua, como no setor industrial, alm da prtica inconsciente (reuso no planejado) em outros setores, como no setor agrcola. Porm, apesar de no existir no Brasil uma legislao especfica tratando do tema de reuso de gua, nota-se que a prpria legislao da Poltica Nacional de Recursos Hdricos cria fundamentos jurdicos e condicionantes legais para o reuso de gua. Os conhecimentos internacional e nacional de reuso, associados a atitudes prudentes de aplicao com novos estudos e pesquisas sendo desenvolvidos, estimulam a implementao da tcnica com competncia. Considerando o fato de o reuso j estar sendo praticado em algumas localidades do Brasil, e analisando a realidade de no existir uma legislao especfica estabelecendo uma poltica de gesto associada ao reuso, com arcabouo legal e

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institucional e parmetros definidos, conclui-se pela necessidade iminente de regulamentao e institucionalizao da prtica de reuso no Brasil. Sendo assim, preciso se definir uma poltica de reuso, estabelecendo critrios para sua implementao em nvel federal e de bacias hidrogrficas, alm da necessidade de desenvolver uma base legal especfica, com a definio de normas, instrumentos de gesto, padres, critrios de fiscalizao e monitoramento e cdigos de prticas, bem como delinear o arcabouo institucional, de forma articulada e participativa. Iniciativas dessa natureza j esto sendo tomadas com a criao e atuao do Grupo Tcnico de Reuso, no mbito da Cmara Tcnica de Cincia e Tecnologia, no Conselho Nacional de Recursos Hdricos, por meio da discusso e definio de propostas que institucionalizam esses instrumentos. Assim, ao analisar e comparar o objetivo proposto deste trabalho com os argumentos de pesquisas bibliogrficas e troca de opinies tcnicas, agregados discusso do tema, observa-se que a hiptese sugerida e defendida confirmada ao longo do trabalho, por meio da anlise da tendncia nacional e internacional observada para a prtica de reuso na irrigao, bem como a necessidade de regulamentao do processo. Com base em consultas bibliogrficas e discusses com especialistas na rea de reuso, conclui-se que, apesar de no existir uma legislao especfica sobre reuso, h uma tendncia de fortalecimento e expanso do mercado de gua de reuso no Brasil, para fins diversos, como a irrigao. Nesse sentido, o setor pblico deve assumir uma postura que garanta a regulamentao e fiscalizao desse mercado, por meio de uma gesto participativa, possibilitando ento que a

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prtica de reuso seja um adequado instrumento de gesto dos recursos hdricos no Brasil. Assim, o reuso tender a se consolidar em um instrumento de gesto eficiente, induzindo a um uso racional da gua e propiciando o aumento da oferta, reduo das demandas e diminuio da poluio ambiental. O estabelecimento de diretrizes claras, a definio de polticas e instrumentos legais e normativos pertinentes especficos, uma eficiente articulao dos setores correlatos, a regulao, monitoramento e superviso da prtica e de tecnologias adequadas, com a garantia de uma gesto participativa dos atores sociais envolvidos em todas fases do processo decisrio, alm de iniciativas de educao ambiental, tendem a nortear e consolidar a prtica de reuso de gua no Brasil de forma sustentvel.

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REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

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ANEXO DE TABELAS

TABELA 1 - Disponibilidade hdrica no territrio brasileiro + contribuio da Bacia Amaznica do territrio alm fronteira (Ano 2001) ......................................................................... 01 TABELA 2 - Produo hdrica no Brasil e no mundo ...................................................................... 02 TABELA 3 - Destinao dos corpos dgua conforme a Resoluo CONAMA n 20/1986 ........... 22

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GLOSSRIO

A montante

Localizadas rio acima, em regies de subida das guas nos corpos hdricos.

Comunidades a jusante Comunidades que esto localizadas a vazante, rio abaixo, em regies de descida das guas nos corpos hdricos. Eutrofizao Processo de degradao que sofrem os lagos e outros corpos de gua quando excessivamente enriquecidos de nutrientes, limitando a atividade biolgica. o sistema de aplicao de fertilizantes lquidos ou solveis em gua, por meio do sistema de irrigao. Tcnica de produzir vegetais por meio de um sistema que utiliza somente gua e nutrientes. Processo muito difundido como alternativa de produo vegetal para pequenas reas. Todo impacto ambiental que pode ser contabilizado como perda financeira a curto, mdio ou longo prazo pela propriedade que gera o impacto. o aproveitamento de guas previamente utilizadas, uma ou mais vezes, em alguma atividade humana, para suprir as necessidades de outros usos benficos, inclusive o original. Pode ser direto ou indireto, bem como decorrer de aes planejadas ou no planejadas (LAVRADOR FILHO, 1987). o reuso interno da gua, antes de sua descarga em um sistema geral de tratamento ou outro local de disposio, para servir como fonte suplementar de abastecimento do uso original. um caso particular de reuso direto. Est baseado nas necessidades mnimas de gua per capita para manter uma qualidade de vida adequada em regies moderadamente desenvolvidas situadas em zonas ridas (BEEKMAN, 1995). Resduo proveniente do tratamento da cana, com potencial para ser reciclado.

Fertirrigao Hidroponia

Passivo ambiental

Reuso de gua

Reciclagem de gua

Stress hdrico

Vinhaa

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