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Curso de Toxicologia ANVISA - RENACIAT - OPAS – NUTES/UFRJ - ABRACIT 1 MÓDULO VIII Intoxicação por Drogas de Abuso Autor Roberto M. R. Rodrigues (CCI - São Paulo) Tutores Roberto M. R. Rodrigues (CCI - São Paulo) Carlos Fernando Collares (CCI - São Paulo) Embora possa parecer que a escalada do uso e surgimento de novas drogas psicoativas seja um apanágio dos tempos atuais, constata-se que o uso de substâncias psicoativas oriundas de plantas e animais parece ter ocorrido desde os primórdios do surgimento da espécie humana. A experimentação empírica com os elementos do seu ambiente rendeu a praticamente todos os povos primitivos um acervo considerável de substância psicoativas, que passaram a ser usadas para diversos fins. Entre o povo amazônico Kraô, por exemplo, pesquisadores brasileiros identificaram cerca de 400 plantas de uso medicinal, das quais uma grande parte (138), parece ter alguma ação sobre o sistema nervoso. A partir do século passado (década de 20), a psicofarmacologia reuniu os conhecimentos poderosos da química orgânica analítica e sintética, da farmacologia e da fisiologia, para buscar drogas cada vez mais específicas. A estes conhecimentos, posteriormente (década de 70) agregaram-se os da estereoquímica e da biologia molecular, que procurava conformações moleculares tridimensionais adequadas para determinados tipos de receptores de membrana, acelerando assim, enormemente, a velocidade de descoberta de novos compostos psicoativos. Objetivo Fornecer subsídios para uma melhor abordagem terapêutica do paciente vítima de intoxicação aguda por drogas de abuso, através de uma análise resumida dos principais fatores envolvidos: • Drogas mais comuns em nosso meio e sua epidemiologia. • Mecanismo de ação das drogas e seus efeitos sobre a economia. • Métodos diagnósticos e terapêuticos disponíveis. Terminologia - Droga: a origem etimológica da palavra é incerta. Entre as várias hipóteses avançadas, as mais plausíveis são as seguinte: origem do holandês droge vate “barris secos”, de onde se tirou droge como o conteúdo dos barris e que significa “produtos secos”; do persa droa “odor aromático”; do árabe durawa “bala de trigo”; ou do hebreu rakab “perfume”. Pode ser definida como “qualquer substância capaz de modificar a função dos organismos vivos, resultando em mudanças fisiológicas ou de comportamento”.

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Curso de Toxicologia ANVISA - RENACIAT - OPAS – NUTES/UFRJ - ABRACIT

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MÓDULO VIII Intoxicação por Drogas de Abuso Autor Roberto M. R. Rodrigues (CCI - São Paulo) Tutores Roberto M. R. Rodrigues (CCI - São Paulo) Carlos Fernando Collares (CCI - São Paulo)

Embora possa parecer que a escalada do uso e surgimento de novas drogas psicoativasseja um apanágio dos tempos atuais, constata-se que o uso de substâncias psicoativas oriundas de plantas e animais parece ter ocorrido desde os primórdios do surgimento da espécie humana.

A experimentação empírica com os elementos do seu ambiente rendeu a praticamente todos os povos primitivos um acervo considerável de substância psicoativas, que passaram a ser usadas para diversos fins. Entre o povo amazônico Kraô, por exemplo, pesquisadores brasileiros identificaram cerca de 400 plantas de uso medicinal, das quais uma grande parte (138), parece ter alguma ação sobre o sistema nervoso.

A partir do século passado (década de 20), a psicofarmacologia reuniu os conhecimentos poderosos da química orgânica analítica e sintética, da farmacologia e da fisiologia, para buscar drogas cada vez mais específicas. A estes conhecimentos, posteriormente (década de 70) agregaram-se os da estereoquímica e da biologia molecular, que procurava conformações moleculares tridimensionais adequadas para determinados tipos de receptores de membrana, acelerando assim, enormemente, a velocidade de descoberta de novos compostos psicoativos.

Objetivo

Fornecer subsídios para uma melhor abordagem terapêutica do paciente vítima de intoxicação aguda por drogas de abuso, através de uma análise resumida dos principais fatores envolvidos:

• Drogas mais comuns em nosso meio e sua epidemiologia. • Mecanismo de ação das drogas e seus efeitos sobre a economia. • Métodos diagnósticos e terapêuticos disponíveis.

Terminologia

- Droga: a origem etimológica da palavra é incerta. Entre as várias hipóteses avançadas, as mais plausíveis são as seguinte: origem do holandês droge vate “barris secos”, de onde se tirou droge como o conteúdo dos barris e que significa “produtos secos”; do persa droa “odor aromático”; do árabe durawa “bala de trigo”; ou do hebreu rakab “perfume”. Pode ser definida como “qualquer substância capaz de modificar a função dos organismos vivos, resultando em mudanças fisiológicas ou de comportamento”.

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- Medicamento: “Qualquer substância ou associação de substâncias contidas em um produto farmacêutico empregadas para modificar ou explorar sistemas fisiológicos ou estados patológicos em benefício do ser a que se administra” (OMS).

- Fármaco: do grego “pharmakon”, significa droga, remédio.

- Drogas de abuso: são drogas utilizadas socialmente e capazes de causar dependência.

- Tolerância: é o processo de adaptação biológica à presença contínua de uma determinada substância no organismo, ao qual ele responde com intensidade cada vez menor. Isto leva ao aumento da dosagem para que os mesmos efeitos possam aparecer.

- Farmacodependência: “Estado psíquico e, às vezes, físico, causado pela ação recíproca entre um organismo vivo e um fármaco, que se caracteriza por modificações do comportamento e por outras reações que compreendem sempre um impulso irreprimível de tomar o fármaco de forma contínua ou periódica, a fim de experimentar seus efeitos psíquicos e. em certos casos, evitar o mal-estar produzido pela sua privação” (OMS). Esta definição deve ser entendida com uma visão holística sobre o indivíduo, o fármaco e o contexto sócio-cultural onde se dá o encontro entre os dois.

Para ser diagnosticada, pelo menos três dos seguintes fatores devem estar presentes:

• sintomas de tolerância; • sintomas de abstinência; • desejo persistente ou tentativas infrutíferas de abandonar o uso; • gasto de tempo considerável no intuito de obter a substância; • uso da substância em grandes quantidades ou por períodos de tempo maiores que o desejado; • redução na atividade social, recreativa ou profissional, devido ao uso da substância; • uso continuado do fármaco, a despeito do conhecimento de suas implicações nocivas sociais, econômicas e à saúde.

- Síndrome de abstinência: conjunto de sinais e sintomas decorrentes da falta de uma determinada droga em um usuário dependente. Pode ser tão grave a ponto de colocar em risco a vida da pessoa, como é o caso da abstinência do álcool e da heroína.

- Overdose: termo da língua inglesa que denomina a exposição do organismo a altas doses de uma substância química qualquer.

- Intoxicação: é a manifestação dos efeitos nocivos, resultantes da interação de uma droga com o organismo, caracterizada por sinais e sintomas clínicos. Intoxicações agudas são aquelas decorrentes de exposição única ou repetida a drogas, num período de até 24 horas.

Classificação

As drogas podem ser classificadas de várias maneiras:

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1) Quanto ao aspecto legal

são classificadas como lícitas (ex.: fumo, bebidas alcoólicas etc.) e ilícitas (ex.: maconha, cocaína etc.). É interessante notar que esta classificação é mais cultural que científica, pois os valores sustentados pela sociedade influem nas idéias formadas sobre as drogas. Como exemplo, podemos citar que o uso do café no Império Russo (séc. XVIII) era punido com a mutilação das orelhas.

2) Classificação das drogas quanto ao seu uso pela sociedade

Designer drugs ou club drugs (drogas da noite): essas drogas têm como característica essencial o fato de terem sido modificadas em laboratório, com o intuito de potencializar ou criar efeitos psicoativos ou evitar efeitos indesejáveis. A disponibilidade e o barateamento tecnológico permitem, hoje, que tais drogas sejam sintetizadas com facilidade em laboratórios clandestinos domésticos. Começaram a ganhar notoriedade nos anos oitenta, a partir de seu consumo dentro dos dance clubs e das raves. Inicialmente associada exclusivamente ao ecstasy, a família das club drugs foi aumentando. Isso se deveu à recuperação de antigas substâncias, esquecidas ou em desuso, e ao surgimento de novas. As mais conhecidas em nosso meio são: LSD, GHB, quetamina, anfetaminas e metamfetaminas (ecstasy, DOB, etc.) e os nitritos (poppers).

Rape drugs (drogas facilitadoras de estupro): são produtos utilizados para facilitar qualquer tipo de atividade sexual não consentida, incluindo estupro. Sob a ação destas drogas, a pessoa torna-se fisicamente indefesa e não consegue lembrar o que aconteceu. São substâncias insípidas, inodoras e incolores, facilmente adicionadas a uma bebida, sem o conhecimento da vítima. Há pelo menos três tipos de rape drugs : GHB, flunitrazepan e quetamina. Têm sido utilizadas, também, para facilitar a prática de outros crimes, como o roubo. A denominação “boa noite, Cinderela” tem origem no uso dessas drogas para dopar vítimas em potencial de assalto ou abuso.

3) Quanto ao potencial de uso nocivo

Federal Drug Enforcement Administration (DEA)

Classe Substâncias

Classe I: nenhuma utilidade clínica Alto potencial de abuso e dependência

heroína alucinógenos (LSD, mescalina) maconha

Classe II: Baixa utilidade clínica Alto potencial de abuso e dependência

ópio ou morfina codeína opiáceos sintéticos barbitúricos anfetaminas e análogos cocaína fenciclidina (PCP)

Classe III: Alguma utilidade clínica Potencial moderado de abuso e dependência

paracetamol e codeína combinada esteróides anabolizantes

Classe IV: Grande utilidade clínica Potencial baixo de abuso e dependência

benzodiazepínicos fenobarbital

Classe V: Grande utilidade clínica Potencial muito baixo de abuso e dependência

misturas de narcóticos e atropina misturas diluídas de codeína

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4) Quanto à sua ação sobre o sistema nervoso central

• Depressores da atividade do sistema nervoso central:

• álcool • hipnóticos: barbitúricos, alguns benzodiazepínicos • ansiolíticos, principalmente os benzodiazepínicos • opiáceos e opióides, tais como morfina, heroína, codeína (xaropes), meperidina,

fentanil, etc. • substâncias voláteis de abuso, como solventes de colas e tintas, removedores,

lança-perfume etc.).

• Estimulantes da atividade do sistema nervoso central:

• sintéticos: o anfetaminas e análogos- anorexígenos, metanfetamina etc.

• de origem vegetal: o cocaína o efedrina

• Perturbadores da atividade do sistema nervoso central:

• de origem vegetal: o mescalina (cacto mexicano) o THC (maconha). o psilocibina (certos cogumelos) o lírio (trombeteira, zabumba ou saia branca)

• de origem sintética: o LSD-25 o ecstasy o quetamina o anticolinérgicos (Artane®, Bentyl®), fenilciclidina (PCP)

Algumas considerações mais específicas do trabalho dos Centros de Informação e Assistência Toxicológica (CIAT)

Os atendimentos realizados pelo Centro de Controle de Intoxicações de São Paulo (CCI-São Paulo) apontam para um predomínio das intoxicações por medicamentos, agrotóxicos e saneantes, ficando as drogas de abuso num patamar de 4% em média, do total de casos. Há um marcante predomínio de intoxicações no sexo masculino sobre o feminino e mais de 50% dos casos têm um pico de incidência na faixa de 20 a 29 anos.

O uso das “club drugs”, notadamente Ecstasy, mostra um aumento consistente em São Paulo, mas o álcool continua sendo o “grande vilão”, seguido pela cocaína e canabinóides. Não obstante, existe uma enorme subnotificação e falta de comprovação laboratorial dos casos.

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Definição

A cocaína é um alcalóide branco, inodoro, cristalino, de sabor amargo, com propriedades anestésicas e vasoconstritoras, extraído das folhas da Erithroxylon coca e cujo nome químico é benzoilmetilecgonina. Esta planta é um arbusto nativo da América do Sul que pode atingir até 5 metros de altura e é imune às pragas. A planta começa a produzir após um ano e meio do plantio, podendo dar até cinco safras por ano e continuar economicamente ativa por quase 30 anos. É também conhecida como coca, neve ou epadú, este último nome tendo sido dado pelos índios brasileiros.

Padrões de uso

• Folhas de coca: mascadas junto com substância alcalinizante ou sob a forma de chá (forma tradicional de uso nos países Andinos), possui de 0,5 a 1,5% do alcalóide.

• Cloridrato de cocaína: cristal fino e branco (é conhecido como “pó” entre os usuários); pode ser utilizado por via nasal (aspirado, “cheirado”) ou venosa (“pico”). A concentração do alcalóide varia de 15 a 75%.

• Crack: nome popular para a forma em pedra, pouco solúvel em água e se torna volátil quando aquecido a 100ºC, sendo fumada em cachimbos rudimentares contendo 50 a 100 mg da droga. Recebeu este nome pelos sons produzidos pelos cristais quando queimados. Contém de 40 a 70% do alcalóide.

• Merla: nome popular para a forma em pasta da cocaína, pouco solúvel em água e se torna volátil quando aquecido próximo a 100°C, sendo também fumada em cachimbos. Contém de 40 a 71% do alcalóide.

• Bazuko: pasta obtida a partir da folha da coca, aos quais são adicionados: cal, querosene ou gasolina e ácido sulfúrico. Um produto ainda mais prejudicial à saúde, pois contém muitas impurezas tóxicas; é fumada em cigarros chamados "basukos". Contém de 40 a 90% do alcalóide.

Toxicidade

As doses tóxicas são muito variáveis e a toxicidade vai depender principalmente:

• da tolerância individual; • da via de administração (aspirada, fumada, injetada, body packers, body stuffers); • do uso concomitante de outros fármacos: interações com álcool (cocaetileno), heroína(speed ball) e outros agentes (inibidores da acetilcolinesterase).

Particularidades das apresentações

Os adulterantes frequentemente presentes na composição do pó de cocaína são o açúcar, a procaína, a cafeína, o pó de vidro, o pó de mármore, o pó de giz, o talco e o amido, anestésicos locais (responsáveis por lesões por vasoconstrição) e sais de baixo custo, como bicarbonato de sódio e sulfato de magnésio. Os teores de cocaína podem variar entre 15 a 90%.

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• O pó de vidro, pó de mármore, pós de giz, bicarbonato de sódio e pó de lâmpada fluorescente, que são os mais comuns, são letais. O amido e o talco causam lesões pulmonares, quando inalados.

• As misturas com produtos inativos servem para dar peso: lactose, talco, bórax, manitol (laxante) o qualquer outra coisa que se pareça com a cocaína e não tenha efeitos colaterais perceptíveis de maneira imediata.

• Para compensar a perda de potência nas adulterações, se adicionam também produtos ativos, que podem ser de duas classes: excitantes (anfetaminas em pó),para que a mistura tenha um efeito mais notável, e anestesiantes (novocaína, procaina ou benzocaína), para imitar um dos efeitos característicos da autêntica cocaína que é o de diminuir a sensibilidade da boca.

O adulterante mais comum do crack é o bicarbonato e os teores de cocaína nesta forma variam de 35 a 99%, dependendo do processo de obtenção.

Assim, é impossível determinar a dose segura de cocaína ou crack.

Toxicocinética

A droga é bem absorvida por todas as vias e, o início e duração da ação dependem da via de administração.

Nasal Venosa Fumada

Início da ação (em minutos) 5 1 0,1

Duração da ação (em minutos) 60 20 5

Meia-vida (em minutos) 30-60

A biotransformação se dá no fígado e pelas colinesterases plasmáticas, e a excreção é renal.

Seus quatro metabólitos principais são ativos:

• benzoilecgonina (detectada na urina até 30 dias) • ecgonina • ecgonina metil-éster (sem atividade vasoconstritora) • norcaina (potente vasoconstrictor)

Mecanismo de ação

1) Bloqueio da recaptura de catecolaminas (dopamina, norepinefrina, epinefrina e serotonina) nas terminações sinápticas pós-ganglionares e aumento de sua liberação em nível periférico (adrenais), levando ao acúmulo dessas catecolaminas nas membranas pós-sinápticas, com um aumento do estímulo dos receptores a, ß1 e ß2 adrenérgicos:

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α-adrenérgicos β 1-adrenérgicos β 2-adrenérgicos

hipertensão hipertensão hipotensão

vasoespasmo vasodilatação

taquicardia ventricular

fibrilação ventricular

O aumento de dopamina parece ser o responsável pela agitação psicomotora e a serotonina é responsável pelas alucinações, psicoses, anorexia e hipertermia.

2) Bloqueio dos canais de sódio levando:

• localmente, à anestesia das membranas axonais e vasoconstrição;

• no coração, se for utilizada em altas doses, a uma ação quinidina-like, podendo ocorrer alargamento do segmento QRS e prolongamento do segmento QT no eletrocardiograma, bradicardia e hipotensão.

3) Outros mecanismos:

• aumento de aminoácidos excitatórios do sistema nervoso central , tais como o glutamato e o aspartato, com hiperatividade do sistema nervoso central e patologias cardiovasculares.

• aumento da produção de endotelina e diminuição da produção de óxido nítrico, levando à vasoconstrição e aumento da adesividade plaquetária e da permeabilidade endotelial.

4) O uso crônico pode produzir focos de microfibrose miocárdica e miocardite, independentemente da presença de lesão coronária; e gerar também reações distônicas, acatisia e pseudo-parkinsonismo, pela depleção de receptores dopamina-1.

O uso da cocaína durante a gestação pode ser a razão de anomalias gestacionais e de desenvolvimento fetal e alguns quadros são mais freqüentes, como o aborto espontâneo, placenta prévia, retardo do crescimento intra-uterino e irritabilidade, tremores, distonia e hiperreflexia nos recém-nascidos.

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Quadro clínico

Ele se desenvolve em três etapas:

1) A 1ª. fase é de estimulação inicial:

• midríase, cefaléia, náuseas e vômitos • vertigem, tremores não intencionais (face, dedos), tiques • palidez • hipertensão arterial, taquicardia ou bradicardia, dor torácica • hipertermia • euforia, agitação, apreensão, inquietude, instabilidade emocional, pseudo-alucinações

2) A 2ª. fase corresponde a uma estimulação avançada:

• hipertensão arterial, taquicardia, arritmias ventriculares e, às vezes, hipotensão arterial por arritmia cardíaca • encefalopatia maligna, convulsões, estatus epileticus • dor abdominal • taquipnéia, dispnéia • hipertermia

3) A 3ª. fase se apresenta como uma depressão dos diversos sistemas do organismo:

• coma arreflexivo, arresponsivo • midríase fixa • paralisia flácida • instabilidade hemodinâmica • insuficiência renal (vasculite - rabdomiólise) • fibrilação ventricular ou assistolia • insuficiência respiratória, edema agudo pulmonar • cianose, respiração agônica, parada cardiorespiratória

Diagnóstico clínico

Em geral, trata-se de um paciente adulto jovem que desenvolve síndrome adrenérgica de curta duração, com:

• agitação psicomotora; • movimentos estereotipados; • dor torácica; • às vezes, ulceração de mucosa, podendo chegar à perfuração do septo nasal.

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Anamnese dirigida

a) O que foi usado? Questione! Drogas de rua são freqüentemente adulteradas, aumentando seu potencial para complicações (é freqüente o uso de adulterantes que podem por si só causar reações pulmonares ou sistêmicas). b) Por que via e por quanto tempo? c) Qual a quantidade utilizada e há quanto tempo (normalmente o paciente relata a quantidade que ele está habituado a usar). d) Quantos tempos após o uso iniciaram-se os sintomas? e) Há evidência de uma síndrome de abstinência1? Em caso de etilismo, a atividade da colinesterase plasmática pode estar diminuída. f) A paciente está grávida? Haverá níveis altos de progesterona que podem aumentar a atividade da n-demetilação hepática e, com isto, elevar os níveis da norcaína, que é mais vasoconstritora. g) Há dor torácica ou abdominal? h) Utilizou bebida alcoólica? O etilismo pode reduzir a atividade da colinesterase plasmática e seu uso associado à cocaína leva à formação in vivo de etil-benzilecgonina ou cocaetileno, que tem toxicidade muito maior, meia-vida mais longa eDL50

2 menor. i) Houve associação com medicamentos? Associações com antidepressivos tricíclicos, inibidores da monoaminoxidase - IMAO3, metildopamina e reserpina, podem ter efeitos severos devido à alteração do metabolismo da epinefrina e norepinefrina. A associação com a fluoxetina pode desencadear uma síndrome serotoninérgica4.

Diagnóstico laboratorial inespecífico

• Hemograma – mostra uma leucocitose freqüente • Eletrólitos – atenção para os níveis de cálcio, magnésio e potássio, pois sua

deficiência pode mimetizar uma intoxicação por cocaína • Glicemia – buscar uma hiperglicemia • Uréia e creatinina, que podem estar elevadas • Gasometria e pH, em busca de uma acidose • CPK, que se eleva nos casos de rabdomiólise • Urina I (mioglobinúria na rabdomiólise). • Rx de tórax e eletrocardiograma, em caso de dor torácica. • CK-MB, troponina, em caso de enfarte do miocárdio. • TC de crânio, punção lombar (pacientes com sintomas neurológicos

persistentes). • Rx de abdomem simples e com contraste se necessário (body packers). • Tomografia ou Ressonância Magnética. • Culturas de sangue e urina.

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Diagnóstico laboratorial específico

A cromatografia de camada delgada pode ser positiva para metabólitos da cocaína em urina, mais especificamente para a identificação da benzoilecgonina até 60 horas de exposição única e até 30 dias em pacientes que utilizam a cocaína de modo crônico. Podem ocorrer falsos positivos em presença de lidocaína (utilizada para facilitar a passagem de sonda vesical ou nasogástrica, p. ex.) e com o uso de droperidol e meperidina.

Exames para detecção de cocaína através de técnicas de antígeno/anticorpo ou espectrofotometria podem ser bem mais sensíveis, mas geralmente não são utilizados em urgência.

Diagnóstico diferencial

• Hipóxia por aspiração • Outras intoxicações isoladas ou associadas: anfetaminas, anticolinérgicos,

alucinógenos, fenciclidina, xantinas, álcool, etc. • Choque séptico • Emergências hipertensivas, enfarte agudo do miocárdio, angina, edema agudo

do pulmão • Hipoglicemia • Insolação • Síndrome de abstinência • Mania, esquizofrenia • Síndrome de serotoninérgica • Síndrome de tireotóxica5 • Cerebrite fúngica • Endocardite, sobretudo da válvula tricúspide, que é o caso mais comum, nos

usuários de cocaína injetável. • Colite isquêmica • Traumatismo crânio-encefálico

Tratamento

Nos casos menos graves, os sintomas de intoxicação por cocaína são, geralmente, de curta duração e respondem bem ao uso de benzodiazepínicos, em doses suficientes para normalizar o ritmo cardíaco e a pressão arterial. Pacientes assintomáticos, com sinais vitais e exames laboratoriais normais por mais de 12 horas, podem receber alta hospitalar.

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Nos casos moderados ou graves, deve-se fazer:

• Suporte vital – respiratório e cardiovascular • Agitação/convulsão: aporte de benzodiazepínicos ou barbitúricos. • Hipertermia: medidas físicas, como o uso de compressas frias e controle da

temperatura ambiente. • Hipotensão e choque: posição de Trendelemburg, infusão de cristalóides e

aminas vasoativas. Deve-se preferir a dopamina e, se não houver resposta, utilizar a norepinefrina.

• Rabdomiólise: administrar soro fisiológico a 0,9% para manter um volume urinário de 2-3 mL/kg/h. Monitorar eletrólitos, CK6, e função renal. Pode ser necessário o uso de diuréticos e alcalinização urinária.

Nos casos de síndrome coronariana aguda, hipertensão ou taquicardia, dois tipos de tratamento podem ser necessários

a) medicação de primeira linha:

• oxigênio • ácido acetil salicílico • benzodiazepínicos (classe IIa) – 5-10 mg por via endovenosa, a cada 5-10 min • Nitroglicerina (classe IIa) - 50 mg/250 mL, diluídos em soro glicosado a 5% e injetados por via endovenosa na dose de 5 a 100 µg/min

b) em pacientes refratários ao primeiro tratamento, se utilizará uma medicação de segunda linha:

• Fentolamina - 1 mg por via endovenosa, em bolus, seguido por 1 a 5 mg/min diluídos em soro glicosado a 5%. Este produto pode causar um aumento reflexo da freqüência e da contratilidade cardíaca. • Beta-bloqueadores não seletivos estão contra-indicados. • Esmolol ou metoprolol (ß1 seletivos) têm uso controverso, já que não podem levar à hipotensão - o esmolol é preferido, por ter uma meia-vida muito curta. • Nitroprussiato de sódio - 50 mg/500 mL diluídos em soro glicosado a 5% - 0,1 µg/kg/min. • A angioplastia primária, após comprovação de oclusão coronariana por arteriografia, tem preferência ao uso de trombolíticos.

Nos casos de taquicardia ventricular ou fibrilação ventricular, o tratamento compreenderá a administração de bicarbonato de sódio (classe IIa) e lidocaína (classe IIb). Os ß-bloqueadores não seletivos estão contra-indicados.

O tratamento dos body stuffer se fará através de lavagem gástrica e administração de carvão ativado e catártico salino

Para os body packer o tratamento abrangerá o aporte de carvão ativado a cada 4 horas em lavagem intestinal com solução de polietilenoglicol na dose de 2 L/h. Se houver aparição de sintomas a intervenção cirúrgica se fará imediatamente.

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O grupo de psicoestimulantes mais freqüente é o das anfetaminas. Isso inclui a dextroanfetamina (ou simplesmente, anfetamina), a metanfetamina e a fenmetrazina. A metildioxianfetamina ou MDA e a metilenodioximetanfetamina ou MDMA ("ecstasy") são de aparição mais recentemente.

Dados gerais

As amfetaminas foram sintetizadas pela primera vez por L. Edelano, em 1887. Mas até 1920, querendo achar um substituto sintético da efedrina, Gordon Alles descubriu que o composto original de Edeleano, o sulfato de amfetamina e su dextroisômero, ainda mais ativo, o sulfato dextroanfetamínico, possuiam a capacidade de estimular o sistema nervoso central. Em 1931 començaram a estudá-la em laborátorios farmacêuticos dos Estados Unidos e, cinco anos despois, durante a Lei Seca, Smith Kline e French, a empresa farmacêutica que adquiriu as patentes de Alles, a introduziu na prática médica sob a denominação comercial de Benzedrina® (“bennies”). Quase em seguida saiu no mercado seu isômero mais ativo, a dextroamfetamina comercializada como Dexedrina® (“dexies”). Despois de sua inclusão nas listas de Substâncias Controladas, ambos os tipos de amfetamina apareceram no mercado negro norteamericano sob as denominações relacionados con seus efeitos subjetivos tais como “speed” (velocidade) e “uppers“ (ativadores).

Estas substâncias são aminas simpatomiméticas, estimulantes cerebrais persistentes, dilatadoras dos brônquios, estimulantes do sistema respiratório, produzem aumento da pressão arterial e supressoras do apetite.

Mecanismo de ação

As anfetaminas são agonistas indiretos das sinapses adrenérgicas, dopaminérgicas e serotoninérgicas, por inibição competitiva do transporte dos neuromediadores implicados na sua ativação. Em grandes quantidades, pode também inibir a recaptura da serotonina e a ação da enzima monoaminoxidase7.

Existe certa similaridade estrutural das anfetaminas com a dopamina e a norepinefrina, portanto elas atuam como falso neurotransmissor nos receptores alfa e beta-adrenérgicos, o que produz um efeito similar nos axônios pós-sinápticos, mas que não passa pela ativação dos canais de cálcio, ou seja, sem que haja despolarização da membrana axonal.

Exemplos de anfetaminas e análogos

• Anfetaminas: metilfenidato (Ritalina®), anorexígenos (anfepromona, fenproporex, dietilpropiona etc). • Metanfetamina (“Speed”, “Ice”, Pervertin®). Sintetizada a partir da efedrina em 1893; foi muito utilizada pelos soldados durante a IIa Guerra Mundial. • MDMA: 3,4 metilenodioximetanfetamina – “Ecstasy”: sintetizada em 1912 e patenteada em 1914 pela Merck. Mais recentemente, esse produto começou a ser produzido para ter efeitos similares à anfetamina (estimulantes) e aos da mescalina (alucinógenos). O primeiro laboratório clandestino do Brasil foi descoberto em 2000.

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Vias de uso

Uso intravenoso, oral ou fumado, tanto para a droga pura, como misturada com outrosprodutos.

Quadro Clínico

Síndrome adrenérgica8 prolongada, com ilusões, paranóia, taquicardia, hipertensão, hipertermia, diaforese, hiperreflexia, midríase, convulsões, coma. A tolerância se instala rapidamente, o que leva os usuários a utilizar doses superiores àquelas que induzem a anorexia.

A síndrome de abstinência de anfetaminas se caracteriza por sinais e sintomas opostos aos induzidos pelo abuso, favorecendo o aparecimento de sono, fome intensa, exaustão e, às vezes, de depressão.

Diagnóstico

• Anamnese e exame físico. • Exame toxicológico (CCD – cromatografia em camada delgada) positivo.

Tratamento

• Medidas de descontaminação gastrintestinal, quando indicado. • Tratamento sintomático e de suporte: similar ao da intoxicação pela cocaína. • A acidificação urinária pode ser útil (contra-indicada em presença de rabdomiólise). • Atenção para: hipertermia, rabdomiólise e distúrbios do aparelho cardiovascular – acidente vascular cerebral e infarto do miocárdio.

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Toxicidade

As doses tóxicas são muito variáveis e dependem principalmente:

• Da tolerância individual. • Do uso concomitante de outros fármacos.

Porcentagem aproximada de etanol em alguns produtos:

Porcentagem aproximada de etanol em alguns produtos

Produto comercial Porcentagem

Produtos medicinais 0,3-70%

Cerveja 4 - 6%

Vinho 10-20%

Colutórios 15-78%

Loções pós-barba 15-80%

Rum, vodka 40-50%

Uísque e cachaça 40-50%

Perfumes 25-95%

Colônias 40-60%

Toxicocinética

O álcool é bem absorvido pelo trato digestivo (80% no intestino delgado e o restante noestômago) e, após absorção em jejum, seu pico plasmático ocorre em 30 a 90 minutos.Ele atravessa a barreira hematoencefálica e placentária.

Seu metabolismo é realizado no fígado, formando acetaldeído, graças à ação de enzimas hepáticas, das quais as mais envolvidas são a desidrogenase alcoólica, a catalase e o sistema oxidativo microssomal. A taxa de metabolismo está em torno de 13a 25 mg/dL/hora, podendo chegar a 50 mg/dL/hora em etilistas.

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Quadro clínico

A sintomatologia vai despender do nível sérico de etanol e da tolerância do paciente.

Alcoolemia Clínica

50 a 150 mg/dL Verborragia, reflexos diminuídos, visão borrada, excitação ou depressão mental.

150 a 300 mg/dL Ataxia, confusão mental, hipoglicemia (principalmente em crianças), logorréia.

300 a 500 mg/dL

Incoordenação acentuada, torpor, hipotermia, hipoglicemia (convulsões), distúrbios hidroeletrolíticos, com hiponatremia, hipercalcemia, hipomagnesemia, hipofosfatemia e acidose metabólica.

> 500 mg/dL Coma e falência respiratória e/ou circulatória podendo levar ao óbito.

Diagnóstico Laboratorial Inespecífico

Os principais exames a serem demandados são:

- hemograma - ionograma, incluindo cálcio e magnésio - glicemia , em busca de uma hipoglicemia - uréia e creatinina, para avaliar a função renal - gasometria e pH, que podem relevar uma acidose - RX de tórax, para eliminar uma broncoaspiração não diagnosticada - eletrocardiograma, em busca de arritmias cardíacas - transaminases, TP, TTPa9 e INR10, para avaliar a função hepática e uma cirrose associada - tomografia computadorizada de crânio, se houver a noção de traumatismo com sintomas neurológicos associados, já que está situação é freqüente.

Diagnóstico Laboratorial Específico

Ele comporta a dosagem sérica de etanol e metanol, e se faz pela colheita de 5 mL de sangue, em tubo com heparina, após boa assepsia do ponto de punção com água e sabão.

Diagnóstico diferencial

O diagnóstico diferencial deve eliminar um grande número de outras causas geradoras de sintomatologia análoga, tais como a hipóxia, outras intoxicações isoladas ou associadas (metanol, polietilenoglicol ou outros depressores do sistema nervoso central), sepse, hipoglicemia, encefalopatia hepática, acidente vascular cerebral, estado pós-convulsivo, traumatismo cranio-encefálico (quedas, espancamento) e síndrome de abstinência.

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É interessante notar que a intoxicação por metanol possui sintomas iniciais muito semelhantes aos da intoxicação por etanol - náuseas, vômitos, cefaléia, tontura, sonolência. Ocorre melhora temporária por um período de 12 a 24 horas, após o qual retornam os vômitos e uma sensação de mal estar, dor epigástrica, visão dupla ou borrada, diminuição dos campos visuais, midríase hiporreativa, hiperemia e/ou edema da papila óptica, e evolução para um quadro de agitação, acidose metabólica grave, hiperpnéia, choque, insuficiência renal, convulsões e coma.

Tratamento

O tratamento é baseado na correção dos sinais vitais, correção da sintomatologia e aporte de antagonistas:

• Assistência respiratória e oxigênio, se necessário. • Descontaminação por lavagem gástrica, em caso de ingestão recente (30-45

min.) de grande quantidade de álcool ou associação com outros produtos tóxicos. O aporte de carvão ativado não é eficiente, mas também pode ser útil no caso de associação com outros agentes tóxicos.

• Não induzir vômitos, para evitar uma broncoaspiração.. • Em caso de hipoglicemia, fornecer soro glicosado a 50% por via endovenosa,

exceto em caso de edema cerebral. • Se houver edema cerebral, administrar manitol endovenoso para aumentar a

diurese. • Em crianças, aportar, profilaticamente, soro glicosado a 25%, na dose de 2

mL/kg de peso. • Prevenir a encefalopatia de Wernicke fornecendo tiamina11 - 100 mg/L de soro

fisiológico ou glicosado ou 100 mg por via oral, 3vezes ao dia, e niacina12 (50 mg por via oral 4 vezes por dia ou 25 mg por via endovenosa 2-3 vezes por dia)

• Glicose 50% por via endovenosa (nunca antes da tiamina, porque pode precipitar a Síndrome de Wernicke). No adulto, 40 mL seguidos de soro glicosado a 5%.

• Em crianças, glicose a 10% 2 mL/kg por via endovenosa em 5 a 10 minutos (fase aguda) e 6 a 8 mL/kg/min por via endovenosa (fase de manutenção)

• Em caso de convulsão, administrar diazepam: em adultos, 5 a 10 mg por via endovenosa, em bolus (podendo repetir se necessário até um máximo de 30 mg). Em crianças aportar 0,25 a 0,4 mg/kg/dose até um total de 10 mg/dose.

• Pode ser utilizado também o lorazepam, na dose de 4 a 8 mg no adulto e 0,05 a 0,10 mg/Kg em crianças.

• Choque, desidratação e acidose: aportar soluções isotônicas de cloreto ou bicarbonato de sódio.

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Complicações

1. Encefalopatia de Wernicke – síndrome aguda

Ela se deve à deficiência de tiamina ou vitamina B12 e tem um início abrupto, caracterizada pela tríade: - distúrbios oculares, com nistagmo, paralisia abducente bilateral, paralisias oculares até a oftalmoplegia total; - ataxia cerebelar, atingindo o tronco e membros inferiores, com marcha de base ampla e oscilante. - confusão mental, apresentando desorientação, sonolência, desatenção e baixa capacidade de resposta. Este quadro pode associar-se a sintomas de abstinência. A encefalopatia de Wernicke é considerada como emergência médica e a mortalidade dos casos está em torno de 17%.

2. Psicose de Korsakoff – síndrome crônica

Pode aparecer gradualmente, isolada ou associada à Encefalopatia de Wernicke, com sinais de falhas da memória de evocação, desorientação, falta de concentração, apatia e, por vezes, fabulação.

3. Síndrome de abstinência

Semelhante à dos outros sedativos hipnóticos. Pode ocorrer em 12 a 72 horas após o consumo, após modificação da forma de beber (redução da quantidade ou freqüência de consumo).

• Com níveis mínimos de dependência, aparecem náuseas, debilidade, ansiedade, transtornos do sono, tremores discretos (menos de um dia).

• Em grandes dependentes, têm-se náuseas e vômitos, fraqueza, sudorese, cãimbras, tremores (máximo em 24-48 horas), ansiedade, hiperreflexia, alucinações visuais ("alucinação alcoólica"), e crises epilépticas tônico-clônicas.

• Em fase mais avançada, nota-se agitação psicomotora e perda da consciência. • Pode evoluir para o delírium tremens por volta do terceiro dia, com hipertermia

e falência cardiovascular.

A síndrome de abstinência é autolimitada, ocorrendo recuperação em aproximadamente 5-7 dias caso não ocorra óbito. Ela também pode ocorrer em neonatos, mostrando déficits neurológicos permanentes e outras anormalidades de desenvolvimento.

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Tratamento da síndrome de abstinência:

• Restabelecer o controle inibitório, administrando agonistas GABA13, do tipo benzodiazepínicos de ação longa duração, como o diazepan.

• Nos casos refratários, aportar doses elevadas de barbitúricos, tais como o fenobarbital, que provocam a abertura direta dos canais de cloro.

• Corrigir fluidos, eletrólitos e deficiência de nutrientes. • Prevenir infecções. • Manter o paciente em lugar seguro e calmo evitando estímulos.

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Classificação

• Hidrocarbonetos: tolueno, xilol, benzeno, n-hexano, em colas, tintas, thiners, removedores “Cheirinho da Loló”: produto clandestino, a base de clorofórmio e éter.

• Lança-perfume: produto clandestino, a base de cloreto de etila. O termo vem sendo utilizado, cada vez mais, para designar também o “cheirinho da Loló”.

Toxicocinética

A absorção do clorofórmio é de 60-80% da quantidade inalada, e leva 90 min; para o éter, uma quantidade semelhante penetra no organismo em 20 min. Rapidamente distribuídos para o sangue, eles vão atingir o tecido adiposo, fígado, rins, pulmão e sistema nervoso central, atravessam a barreira placentária e geram sintomas em poucos segundos a alguns minutos. A duração dos efeitos é de aproximadamente 15-40 min. Para prolongar os efeitos, o usuário repete as inalações, várias vezes seguidas.

A excreção do clorofórmio se faz no ar exalado, principalmente, sob a forma de CO2; o restante é retido no tecido adiposo. O éter se elimina em 90% pela via pulmonar na sua forma inalterada; o restante é eliminado pelos rins, pele e glândulas sudoríparas.

Quadro clínico

Os efeitos locais se traduzem por irritação de pele e mucosas. Os efeitos sistêmicos agudos são semelhantes aos do álcool, com ação, principalmente, no sistema nervoso central, e sensibilização do músculo cardíaco às catecolaminas, podendo causar morte súbita por arritmia cardíaca.

a) Quadro agudo

Ele se divide em 4 fases:

• A primeira fase é a desejada, de excitação, e mostra euforia, perturbações auditivas e visuais, náuseas, espirros, tosse, salivação excessiva e rubor facial.

• A segunda fase é de depressão, com predominância central, associando confusão mental, desorientação, linguagem incompreensível, visão turva, agitação psicomotora, cefaléia, palidez e alucinações auditivas ou visuais.

• Na terceira fase, a depressão se aprofunda, com redução do estado de alerta, dificuldade para falar, aumento da depressão, incoordenação motora, marcha vacilante e reflexos diminuídos.

• A quarta fase se traduz por uma depressão tardia que pode chegar à inconsciência, hipotensão, relato de sonhos estranhos e convulsões.

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b) Quadro crônico

Nesta etapa surgem lesões medulares e alterações renais, hepáticas e dos nervos periféricos. Uma aplasia medular se instala, com diminuição de glóbulos brancos e vermelhos, sobretudo nas intoxicações por benzeno. O n-hexano produz uma neuropatia periférica, com degeneração progressiva, que causa transtornos de marcha, tipo "andar de pato", e paralisia.

Tratamento

Em caso de uso por inalação, é imprescindível afastar o paciente da exposição, manter as vias aéreas permeáveis, e prever oxigenação e ventilação mecânica, se necessárias.

Se houve contato com pele e mucosas, deve-se praticar uma descontaminação, lavandocom água corrente em abundância e sabão.

Nas intoxicações por ingestão, a descontaminação gastrintestinal deve ser praticada, sem indução de vômitos, devido ao risco de depressão súbita e broncoaspiração. A lavagem gástrica será recomendada unicamente quando houver ingestão de grandes quantidades ou associação com outros produtos sobre os quais ela é eficaz.

O tratamento do coma e das alterações cardiovasculares será feito com cuidado, sabendo-se que as aminas vasoativas podem facilitar arritmias cardíacas.

O monitoramento pelo eletrocardiograma será feito durante 4 a 6 h após a exposição e, em caso de taquicardia, deve-se aportar propranolol ou esmolol.

A remoção extracorpórea por diálise, hemoperfusão ou diurese forçada não é eficaz.

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Classificação

Opiáceos naturais: derivados do ópio que não sofreram nenhuma modificação (ópio, pó de ópio, morfina, codeína), diretamente extraídos do cálice da papoula.

Opiáceos semi-sintéticos: resultam de modificações parciais das substâncias naturais; ex: heroína.

Opiáceos sintéticos ou opióides: completamente sintéticos, fabricados em laboratório e de ação semelhante à dos opiáceos; ex: zipeprol, metadona, fentanil.

Toxicocinética

O início de ação se dá em 10 min, por via endovenosa, 10 a 15 min, após uso nasal (butorfanol, heroína) e em 30 a 45 min, por via intramuscular. A maioria do produto absorvido é metabolizada pelo fígado em compostos inativos e, alguns deles (propoxifeno, fentanila, e buprenorfina) que são mais lipossolúveis, podem ficar armazenados no tecido adiposo. A excreção é renal.

Quadro clínico

É caracterizado pela tríade clássica: miose, depressão respiratória e coma.

A administração de morfina, meperidina, pentazocina, difenoxilato ou propoxifeno pode suscitar o aparecimento de pupilas médias ou midriáticas.

Pode ocorrer hipotensão, bradicardia, edema pulmonar, hipo ou hipertermia e crises epilépticas (sobretudo com o propoxifeno).

Diagnóstico laboratorial

A identificação dos produtos deve ser feita por análise cromatográfica em camada delgada.

Tratamento

Medidas de descontaminação gastrintestinais, quando cabíveis. Assistência respiratória, suporte hemodinâmico e, em caso de significativa depressão dosistema nervoso central e/ou insuficiência respiratória, utilizar Naloxona®:

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• Dose de ataque em adultos - 0,1- 0,4mg, depois 2 mg e repetir a cada 5 a 10 minutos até 10 mg, se necessário. • Dose de ataque em crianças: 0,01 mg/kg até 2 mg. • Dose de manutenção: 2/3 da dose de ataque de hora em hora ou em infusão endovenosa contínua. • Na suspeita de uso habitual de opiáceos, é preferível administrar 0,1 a 0,4 mg por via endovenosa a cada 1 a 2 minutos, tentando evitar a síndrome de abstinência.

Síndrome de abstinência

O quadro clínico é semelhante ao de uma gripe severa, com dilatação pupilar, lacrimejamento, rinorréia, piloereção, bocejos, espirros, anorexia, náuseas e vômitos, e diarréia. Não há aparecimento de convulsões ou delirium.

O início da crise depende da meia-vida da droga: a heroína tem um pico sérico em 36-72h, podendo chegar até 7-10 dias; a metadona tem pico sérico em 72-96h, podendo aparecer em até 14 dias.

Tratamento

Substituição por um opióide de longa duração, como a buprenorfina ou a metadona, com diminuição gradativa da dose.

Administrar simpatolíticos de ação central (agonistas alfa-2-adrenérgicos atuando no cérebro), tal como a clonidina, que têm uma ação hipotensora por diminuição do tônus simpático da musculatura lisa dos vasos sangüíneos e de diminuição da freqüência cardíaca.

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Definição

A maconha (palavra de origem angolana) é uma das drogas mais antigas extraídas de plantas. Os registros mais remotos datam de 2 723 a.C. ela é obtida das folhas da extremidade florida do cânhamo (Cannabis sativa), uma planta arbustiva de origem asiática. A substância ativa está contida em todas as partes da planta e corresponde ao δ-9-tetrahidrocanabinol ou THC

Ela é conhecida como haxixe, no Oriente Médio e Norte da África, charas, no Extremo Oriente e marijuana, no México e Estados Unidos. No Brasil os termos populares mais usados são: baseado, fininho, bomba, fumo, erva, etc.

Algumas preparações surgidas recentemente receberam novos nomes: • Amp joint: maconha embebida em formaldeído, seca e posteriormente fumada. • Skunk: maconha de laboratório, cultivada em condições especiais, com finalidade de obter concentrações 7 a 10 vezes maiores de δ-9-THC, também chamada de "super maconha".

A única indicação terapêutica aprovada é restrita ao uso de δ-9-THC sintético como alternativa ao tratamento antiemético, quando pacientes portadores de câncer e submetidos à quimioterapia, não respondem adequadamente ao tratamento convencional. O δ-9-THC sintético é comercializado nos Estados Unidos com o nome comercial de Marinol®.

Mecanismo de ação

A ação do δ-9-THC no sistema nervoso central se traduz pela fixação sobre os receptores canabinóides presentes no cerebelo, hipocampo e córtex, que pertencem à família da proteína G . Os efeitos psíquicos são muito variáveis, dependendo de expectativas individuais, estado de espírito etc. e os funcionais, mesmo cardiovasculares ou respiratórios, não chegam a ameaçar a vida, mesmo em exposição a doses elevadas.

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Toxicocinética

A absorção se dá por via respiratória, em minutos, e oral, em 1 a 4h, e mais lentamente, por via digestiva, sobretudo quando há presença de alimentos no tubo gastrintestinal. A meia-vida é de 28 h, nas pessoas dependentes, e de 57 h em não-dependentes, com um armazenamento em tecido adiposo. Após metabolismo hepático e, secundariamente em outros tecidos, como os pulmões, o subproduto principal é o 11-hidroxi-THC, que se encontra em quantidades significativas no sangue e pode ser detectado laboratorialmente em até 1 semana a mais de 3 meses. A excreção dos diferentes metabólitos do TCH pode ser freada por uma provável circulação entero-hepática.

Quadro clínico

Sintomas cardiovasculares e respiratórios podem aparecer, com taquicardia relacionada à dose, vasodilatação da conjuntiva ocular, hipotensão postural e lipotímia,complicações agudas em portadores de cardiopatias e usuários muito jovens, irritação de vias aéreas superiores, bronquite e enfisema, câncer de orofaringe e pulmão.

Os sinais psíquicos dependem da expectativa do usuário, sua experiência prévia e "estado de espírito" no momento da absorção e incluem relaxamento, diminuição da ansiedade, euforia, hilaridade espontânea, aumento do apetite, prejuízo da memória de curto prazo, alteração da percepção espaço-tempo, aumento subjetivo da percepçãosensorial, exacerbação de transtornos "neuróticos" e "psicóticos" pré-existentes.

Tratamento

Ele se baseia essencialmente na descontaminação, tratamento sintomático e suporte. É necessário informar que os sintomas desaparecem em aproximadamente 8 horas (exceto, na absorção de produtos concentrados), e que o risco de overdose letal é mínimo (não há registro de óbitos por maconha e derivados exclusivamente).

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Estes produtos incluem várias substâncias que têm, em comum, sua ação anticolinérgica. Alguns exemplos são:

• Medicamentos: anti-histamínicos, antiespasmódicos, antiparkinsonianos (biperideno, triexifenidil).

• Plantas: “lírio”, ou trombeteira, zabumba, dama da noite (Datura sp).

Quadro clínico

A sintomatologia é a da síndrome anticolinérgica típica14, mostrando mucosas secas, rubor facial, hipertermia, hipertensão, delírios e alucinações, midríase, arritmias cardíacas e convulsões.

Tratamento

As medidas de descontaminação gastrintestinais devem ser aplicadas quando cabíveis, mas o tratamento é essencialemente sintomático e de suporte. Estas drogas não desenvolvem tolerância no organismo e não há descrição de síndrome de abstinência15 após a parada de uso contínuo.

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Drogas da Noite, “designer drugs” ou “club drugs” são termos usado para designar certo número de drogas que têm como característica essencial o fato de terem sido modificadas em laboratório, com o intuito de potencializar ou criar efeitos psicoativos ou evitar efeitos indesejáveis. A disponibilidade e o barateamento tecnológico permite hoje que tais drogas sejam sintetizadas com facilidade em laboratórios clandestinos domésticos. Começaram a ganhar notoriedade nos anos oitenta, a partir de seu consumo dentro dos dance clubs e das raves. Inicialmente associada exclusivamente ao ecstasy, a família das club drugs foi aumentando. Isso se deveu à recuperação de antigas substâncias, esquecidas ou em desuso, e ao surgimento de novas. As mais conhecidas em nosso meio são:

• Anfetaminas e Metamfetaminas:

o Ecstasy ou MDMA (metilenodioximetanfetamina), “pílula do amor” o Speed (crystal, ice) o Cápsula do vento (DOB)

• GHB ou ecstasy líquido. • Quetamina: special K, kit kat • Phencyclidine (fenciclidina): PCP • Dietilamina do ácido lisérgico: LSD ou ácido ou doce ou ponto • Phencyclidine (fenciclidina): PCP • Nitritos (Poppers)

1. Ecstasy

As anfetaminas e análogos agem por bloqueio do mecanismo de recaptação das catecolaminas no terminal sináptico. Seu uso pode ser endovenoso, oral ou por inalação de fumaça, isoladamente ou associadas a outras drogas.

Elas são:

• Anfetaminas: metilfenidato (Ritalina®), anorexígenos como a anfepromona, o femproporex e a dietilpropiona etc. • Metanfetaminas, como speed, ice, pervertin, sintetizada a partir da efedrina em 1919,no Japão, e amplamente usada pelos soldados durante a II Guerra Mundial. • MDMA: a 3,4 metilenodioximetanfetamina, que pertence à família das fenilaminas e é atualmente conhecida como ecstasy, foi sintetizada em 1912, na Alemanha, e patenteada em 1914 pela Merck, para uso médico como anorexígeno, e em seguida, como vasoconstritor, estimulante e no tratamento do estresse pós-traumático (atentado, estupro), como facilitador da psicanálise. A partir de 1990 é utilizada como droga recreativa por ter efeitos similares às anfetaminas (estimulantes) e aos da mescalina (alucinógenos). Em 2000, descobriu-se o primeiro laboratório clandestino no Brasil.

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Em 1977, a MDMA era usada no tratamento auxiliar da psicoterapia nos EUA, mas logo depois, começa também seu uso recreacional. Nos anos 90, no Brasil, foi incorporada a “moda” do consumo recreacional e, em 2000 descobriu-se o primeiro laboratório clandestino de ecstasy.

Atualmente, ele é utilizado na busca de seus efeitos similares aos das anfetaminas (estimulantes) e da mescalina (alucinógeno).

Ano Quantidade de comprimidos apreendidos

2001 1.909

2002 56.655

2003 70.859

Vias de uso e dose

O ecstasy é ingerido em comprimidos ou misturado em bebidas e geralmente, ocorre poliabuso, sendo o produto associado, intencionalmente, a álcool, inalantes, maconha, LSD, cocaína ou sildenafil (Viagra®).

Os comprimidos podem conter desde 0 até 100% de MDMA, com uma dose típica de 50 a 150 mg. A adulteração é muito comum e se faz com LSD, efedrina, pseudoefedrina, cafeína, paracetamol, quetamina ou outras anfetaminas, como a MDEA ou 3,4 metileno-dioxi-etil-anfetamina, a MBDB ou 2-metilamina-1-(3,4-matilenodioxi-fenil-N-metilbutanamina), a MDA ou 3,4-metileno dioxianfetamina, a 2-CB ou a-desmetil bromo anfetamina, a DOB ou 4-bromo-2,5-dimetoxiamfetamina, a dextrometorfam, a para-metoxiamfetamina e outros.

A menor dose conhecida que causou óbito foi de 150 mg de MDMA, e estava associada à ingestão de álcool.

Toxicocinética

O pico plasmático do ecstasy se dá após mais ou menos 2 horas, com distribuição a todos os compartimentos, inclusive o encéfalo. O metabolismo se faz através do complexo do citocromo P 45016 2D6 que limita a meia-vida do ecstasy a em torno de 8h. A quase a totalidade do produto é eliminada em menos de 40 h, por via renal. A acidificação das urinas aumenta a excreção. Um de seus metabólitos, o 3,4-metileno dioxianfetamina, permanece ativo até sua eliminação.

O MDMA atravessa a barreira placentária.

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Mecanismo de ação

Inicialmente, o ecstasy aumenta a disponibilidade das monoaminas fisiológicas - serotonina, noradrenalina e talvez dopamina-, no axônio terminal. Ele também atua como agonista pós-sináptico nas vias serotoninérgicas e nos receptores adrenérgicos α2.

Porém, após algumas horas do uso, ele provoca a auto-oxidação da serotonina e de seus metabólitos, a inibição da triptofano-hidroxilase, uma alteração nos sítios de recaptação da serotonina e uma neurodegeneração de áreas que regulam a atividade serotoninérgicas. Resulta daí uma sintomatologia de depleção em serotonina, associando distúrbios do sono, depressão e mecanismos de amplificação dolorosa.

Quadro clínico

O ecstasy é responsável por um aumento da energia do indivíduo, da sociabilidade e, segundo descrição dos usuários, da disposição sexual, mas gera, concomitantemente, uma síndrome serotoninérgica17, com ansiedade, a sensação de pânico, agitação, delírios, cefaléia e sede intensa, hipertensão, taquicardia, hipertermia, sudorese profusa, hiperatividade e secreção inapropriada de hormônio antidiurético com hemodiluição e hiponatremia que levam a convulsões e edema cerebral e são responsáveis pela falência respiratória e circulatória. Especial atenção deve ser dada ao risco de hipertermia e rabdomiólise, com mioglobinúria e insuficiência renal aguda. Pode ocorrer hepatite fulminante por fenômeno de idiossincrasia.

Diagnóstico

Ele se baseia essencialmente no histórico do paciente e no exame físico. O exame toxicológico laboratorial se faz pela identificação do produto através da cromatografia em camada delgada.

Tratamento

A descontaminação gastrintestinal deve ser praticada, quando indicada, assim como a assistência ventilatória. Devido à hipersecreção de ADH, a hidratação e a reposição adequada de eletrólitos são imprescindíveis. A hipertermia deve ser tratada com medidas físicas.

Em caso de convulsões e de agitação intensa, administrar benzodiazepínicos, e promover o relaxamento muscular aportando dantrolene. Deve-se evitar neurolépticos einibidores da recaptação da serotonina que arriscam de precipitar uma síndrome serotoninérgica.

A arritmia cardíaca é tratada por metoprolol ou esmolol e, se houver hipertensão arterial grave, administra-se fentolaminas ou nitroprussiato.

A acidificação urinária pode ser útil, mas é contra-indicada em caso de rabdomiólise.

A avaliação laboratorial requer hemogramas seriados, dosagem de eletrólitos, enzimas

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hepáticas e avaliação da função renal, através da dosagem da uréia e da creatinina sangüíneas.

2. GHB Sinonímia

O ácido gama-hidroxibutírico, dito incorretamente “ecstasy líquido” ou GHB ou G, é obtido pela mistura da gama-butilactona (GBL) com uma base (soda cáustica), e constitui um produto menos tóxico que seu precursor, apesar de ter efeitos equivalentes.

Definição

Trata-se de um líquido inodoro, levemente salgado e amargo, encontrado em pequenas garrafas, mas também em cápsulas e em pó.

Ele existe, naturalmente no sistema nervoso central de mamíferos e tem uma estrutura similar ao neurotransmissor GABA ou ácido γ-aminobutírico. Foi sintetizado na França, durante a busca de um análogo do

GABA, capaz de atravessar a barreira hemato-encefálica. Ganhou popularidade na década de 80 por provocar alterações no estado mental, realçar o efeito do etanol e por uma possível estimulação da produção de hormônio de crescimento. Investigado como agente anestésico e estimulante da produção do hormônio do crescimento, foi abandonado devido aos seus efeitos colaterais, que compreendem contrações musculares involuntárias, delírio, depressão respiratória e convulsões.

Recentemente, em 2002, o GHB foi aprovado pelo Federal Drug Agency americano para o tratamento da narcolepsia. No Brasil, ele classificado como substância psicotrópica e inserido na lista B1, sob o número 33.

Ele é produzido ilicitamente e permanece sendo freqüentemente usado, ou individualmente ou em assaltos e estupros. Seu uso vem aumentando em todo o Brasil.

O GHB possui alguns congêneres como a γ-butirolactona e o 1-4 butanediol, solventes industriais utilizados na limpeza de CDs, impressoras, etc.

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Mecanismo de ação

Os receptores GABA só existem no sistema nervoso central, e principalmente no hipocampo. O GHB liga-se fracamente aos receptores GABAB e diminui os níveis de atividade do sistema nervoso; esta ativação modula os sistemas dopaminérgicos18 e serotoninérgicos19. O GHB provoca, ainda, a liberação de opióides endógenos.

Toxicocinética

Sua absorção oral é rápida, com início de ação em 15 a 30 min e pico plasmático em 25 a 45 min.

A meia-vida de eliminação é dose dependente e está em torno de 20 a 53 min. O metabolismo se dá por diferentes vias:

a) GHB: a degradação ocorre no tecido cerebral por conversão em semialdeído succínico (SSA) e metabolização pelo ciclo de Krebs. A eliminação se dá quase inteiramente na forma de metabólitos. b) GBL: é rapidamente hidrolizado no sangue em GHB. c) 1,4 butanodiol (1,4 BD): se o GHB tem a particularidade de resultar de uma reação química reversível de GBL em GHB, o GHB pode ser o contaminante de um outro precursor, o 1,4 butanodiol, batisado « BD » ou « BDO ». Este é oxidado pela álcool-desidrogenase em gama-hidroxibutiraldeído que, por sua vez, é transformado pela aldeído-desidrogenase em GHB. Tanto o 1,4 BD como o álcool, competem pela álcool-desidrogenase, sendo que o álcool tem uma afinidade muito maior, o que pode levar a uma toxicidade prolongada no caso do uso concomitante das duas substâncias.

Quadro clínico e Toxicidade

Dose para tratamento da narcolepsia varia de 25 a 50 mg/Kg. A sua dosagem é difícil de ser estimada, face à variação de concentração em diferentes lotes, o que facilmente pode conduzir a superdosagens.

A intensidade de efeitos é dose dependente e associada à co-ingestão de outras drogas.

• 10 mg/kg -> à relaxamento muscular. • 20-30 mg/kg -> à induz euforia ou até mesmo sono.. • > 60 mg/kg -> à hipotermia, vômitos, confusão mental, bradicardia, tontura, hiperssalivação, hipotonia, depressão respiratória, amnésia, sono profundo ou coma por 1 a 5 horas. Raramente convulsões tônico-clônicas, mais comum é mioclonia. A dose letal é estimada em 5-15 vezes maior.

O efeito do GHB é bifásico. Como o álcool, o GHB absorvido em pequena dose suspende a inibição social, mas. À medida que a dose aumenta, a euforia desaparece e os efeitos sedativos aparecem em primeiro plano. O produto não tem propriedades afrodisíacas reais, mas provoca uma desinibição sexual devido ao efeito sedativo.

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O GHB produz uma depressão profunda, mas reversível do metabolismo cerebral, aumenta as concentrações de dopamina, induz uma hipotermia pela diminuição da produção de calor e aumento da perda periférica pela pele, diminui a eficácia cardíaca pela redução do pulso e do volume sistólico. No cérebro, o produto aumenta a secreção de acetilcolina e afeta as taxas de metabolismo da serotonina. Seu mecanismode ação exato é pouco conhecido.

A ingestão concomitante de etanol e 1,4 BD, levando a uma inibição competitiva pela álcool-desidrogenase, retarda a metabolização do 1-4 BD e causa uma depressão inicial do nível de consciência seguido por uma melhora quando o etanol é metabolizado. Logo em seguida, a evolução se faz para o coma, com a disponibilização da álcool-desidrogenase.

Diagnóstico

O diagnóstico se faz pela anamnese detalhada e o exame físico do paciente.

Tratamento

O 4-metilpirazole (Fomepizole®) é proposto como antídoto para o 1,4 butanodiol, pela inibição que causa sobre a álcool-desidrogenase, bloqueando a formação de metabólitos tóxicos. No entanto, este produto não interfere na ação do GBL e do GHB.

O tratamento sintomático e as medidas de suporte provocam uma melhoria em 1 a 5 h.

3. DOB ou 2,5-dimetoxi-4-bromo-amfetamina (“cápsula do vento”) Definição

Primeiramente sintetizada por Alexander Shulgin (EUA), em 1967. É uma feniletilamina, derivada da anfetamina, à qual

se acrescentou um átomo de bromo. Este elemento químico é o responsável por potencializar o efeito da droga e por aumentar o tempo de ação.

É denominada de “cápsula do vento” pela sua aparência comercial, constituída de uma cápsula transparente com capacidade para 500 mg, mas que

contém apenas de 1 a 1,5 mg da substância.

Sinonímia

DOB ou 2,5-dimetoxi-4-bromo-amfetamina, “cápsula do vento”, “cápsula do medo”, bromo.

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Toxicocinética

O produto tem um início de ação em 1 a 3 h, os efeitos durando de 4 a 10 h em função da quantidade absorvida. Essa demora no aparecimento dos efeitos faz com que os usuários a considerem erroneamente como um “ecstasy leve”. As doses habituais são de 1 a 3 mg e a meia-vida é de 12 h.

Quadro clínico e Toxicidade

Seu efeito é bastante semelhante ao LSD (ver na seção específica). Além do efeito estimulante inicial, esta droga causa alucinações intensas, o que a torna bastante diferente do MDMA (ecstasy). Em altas doses o DOB produz uma perda de memória, acessos irracionais de violência e um risco de auto-mutilação. O espasmo vascular dos membros inferiores leva à gangrena. Ocorrem também náuseas, vômitos, diarréia e sintomas de pânico e de confusão mental.

Diagnóstico

Ele se baseia essencialmente na anamnese e no exame físico do paciente. Especial atenção deve ser dada aos pacientes agitados e apresentando alucinações após ter tomado aquilo que pensa ser ecstasy.

Tratamento

O tratamento é sintomático e requer medidas de suporte das funções vitais.

4. LSD

O LSD-25 ou dietilamida do ácido lisérgico, que também recebe as apelações populares de “ácido”, “doce”, “ponto” etc., é uma substância sintética, produzida em laboratório e descoberta em 1938, pelo cientista suíço Albert Hofmann, do Laboratório Sandoz, que teve a absorção cutânea acidental de uma pequena quantidade da droga. Ela foi usada com sucesso em psiquiatria.

Formas de Apresentação

O LSD é comercializado em cartelas picotadas similares a um mata-borrão. Cada pequeno quadrado picotado recebe uma gota de LSD. Eles podem ser consumidos inteiros, divididos ao meio ou em quartos. Há ainda apresentações gelatinosas, em forma de pontos, etc. O consumo se dá pela via sublingual de 20 a 80 µg por dose.

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Mecanismo de ação e cinética

O LDS age por ação antagonista e agonista parcial da serotonina. O início do efeito se dá aproximadamente 30 a 60 min após a ingestão e duram em torno de 12h. O pico sérico é atingido 5h após a absorção; o metabolismo é hepático ea excreção se dá por via urinária e pelas fezes.

Quadro clínico

Os efeitos psicológicos dependem da expectativa do usuário e do ambiente físico que o cerca. Há alterações na percepção, principalmente de caráter visual e auditivo, além de aceleração e desorganização do pensamento, com idéias soltas e perda do foco do pensamento. O humor torna-se lábil, podendo variar de situações de grande euforia a quadros de extremo mal-estar, marcados por tristeza e medo. Falhas na avaliação da realidade por vezes podem produzir sintomas paranóides (idéias de perseguição), usualmente momentâneos e restritos ao período da intoxicação. Apesar da denominação, os alucinógenos raramente produzem alucinações (imagem sem objeto), mas sim ilusões (distorções perceptivas de um objeto real). Tais ilusões (visuais, auditivas, táteis) tendem a se misturar, num fenômeno denominado sinestesia20. Já foi descrito o efeito flash-back, isto é, semanas ou meses após o uso da droga, os sintomasmentais podem voltar, mesmo que a pessoa não tenha mais consumido a droga.

Tratamento

O tratamento é essencialmente sintomático e de suporte.

5. FENCICLIDINA (PCP) Definição

A fenciclidina foi sintetizada pelos laboratórios Parke & Davis em 1959, sendo depois comercializada como agente anestésico e analgésico para uso em Medicina e Veterinária. O seu uso em humanos foi interrompido em 1965 devido aos seus efeitos alucinatórios e neurotóxicos. Apareceu como droga de rua nos anos 70.

O produto utilizado é um cloridrato e apresenta-se sob a forma de pó branco, com sabor amargo, condicionado em cápsulas ou sob a forma de um líquido amarelado. Pode ser fumado, inalado, ingerido ou injetado.

Sinonímia

Conhecido como angel dust ou pó de anjo, krystal, ice ou peace pill.

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Mecanismo de ação

A fenciclidina é um anestésico dissociativo com propriedades simpatomiméticas e alucinógenas. Estimula os receptores α-adrenérgicos, potencializando os efeitos da norepinefrina, epinefrina e serotonina. Ele se fixa em um sítio localizado no interior do canal do receptor do glutamato, necessitando, para tanto, que o canal esteja aberto.

Toxicocinética

Não é indicado para uso humano, mas utilizado como tranqüilizante ou anestésico em Medicina Veterinária.

Como droga de abuso, ele é fumado em cigarro, mas também pode ser aspirado, ingerido ou injetado. Frequentemente a forma fumada é associada à maconha e recebe o nome de “supergrass”. Rapidamente absorvido, sua ação é descrita pelos fumantes como “come on” em 2 a 5 min, “high” em 15 a 30 min e “loaded” em 4 a 6 h. O tempo referido para a volta a normalidade é de 24 a 48 horas.

O metabolismo se dá no fígado, por hidroxilação primária, e a excreção é renal.

Quadro clínico e Toxicidade

Em baixas doses, de 1 a 5 mg, o produto induz uma sensação de embriaguez, acompanhada de relaxamento, sensação de desligamento da realidade, incoordenação motora e dificuldade de concentração e de comunicação. Os efeitos psicotrópicos compreendem distorções temporo-espaciais e despersonalização. Letargia, desorientação, alucinações e inconsciência são relatadas com doses de 1 a 3 mg por via inalatória, 2 a 6 mg por via oral e 1 a 3 mg por via endovenosa.

Em fortes doses, de 5 to 10 mg, ela provoca paranóia, angústia, agressividade e experiência de morte eminente, catalepsia, crises delirantes agudas e coma.

Os efeitos físicos compreendem uma hipertensão arterial, distúrbios do ritmo cardíaco e da freqüência respiratória, náuseas e vômitos, disartria e ataxia.

Em longo prazo a fenciclidina provoca uma tolerância e causa dependência, associados a alterações permanentes de locução, anxiedade e depressão. OS efeitos buscados podem transformar-se em bad trip ou, até mesmos, provocar flash-back às vezes vários meses após a última dose.

A overdose, acima de 20 mg, causa convulsões e pode levar ao coma.

Diagnóstico

Ele se baseia na anamnese dirigida e no exame físico do paciente. A análise toxicológica, laboratorial permite a identificação da fenciclidina por cromatografia em camada delgada.

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Tratamento

Ele é basicamente sintomático e de manutenção das funções vitais. A descontaminação gastrintestinal é eficaz na ingestão recente e, principalmente em caso de associação com outros produtos absorvidos por via digestiva.

6. POPPERS (nitritos) Definição

Poppers é o termo vulgar utilizado para denominar vários alquil-nitritos, tais como o amil, o butil ou o isobutil-nitrito, utilizados com fins recreacionais por via inalatória. Estas substâncias são voláteis, encontradas tanto em medicamentos, principalmente o nitrito de amila utilizado como antídoto da intoxicação por cianeto, e alguns anti-anginosos. O uso como droga de abuso existe desde os anos 70.

Sinonímia

Poppers, nitritos.

Mecanismo de ação

Os efeitos fisiológicos são a conseqüência de sua transformação em nitratos, produzido durante a degradação dos alquil-nitritos no organismo. Estes são potentes vasodilatadores.

Toxicocinética

A absorção por via inalatória é rápida e, após distribuição, o metabolismo hidrolisa o nitrito em íon nitrato. A excreção se dá por via renal, 40% eliminando-se na forma intacta e o resto sob a forma de derivados hidrossolúveis.

Quadro clínico e Toxicidade

O efeito imediato dos poppers é uma breve sensação vertiginosa e estimulante, devido às propriedades vasodilatadoras do produto e o aumento do consumo de oxigênio, que explicam, em parte, a diminuição das sensações inibidoras. Rapidamente aparece uma euforia, acompanhada de sensação de calor, aceleração do ritmo cardíaco, aumento da duração da ereção, amplificação das sensações ligadas ao orgasmo, um atraso da ejaculação e, por vezes, sintomas psicodélicos. Estes efeitos lhe dão a reputação de afrodisíaco. Mas, ao mesmo tempo se instalam placas eritematosas na pele, vertigens, dores de cabeça violentas, aumento da pressão interna dos olhos que se traduz por uma visão borrada, palpitações, hipotensão postural, síncope e taquicardia devido à vasoconstrição reflexa.

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A duração dos efeitos no organismo é, em geral, de 5 min, mas como eles são fugazes e intensos, o usuário passa a consumir a droga com freqüência.

• Em dose elevada, o poppers pode criar uma depressão respiratória e alterar o septo nasal. • O consumo regular provoca metemoglobinemia grave e depleção de vitamina B12, distúrbios de ereção, eritemas, edema da face, queimaduras por contato direto da pele com o frasco e formação de crostas amareladas em torno das narinas. • A associação de poppers com outras substâncias psicotrópicas aumenta os efeitos indesejáveis e a tomada simultânea de poppers e Viagra® pode ser letal, devido à hipotensão severa e a redução da perfusão coronária com risco de enfarte por potencialização dos efeitos vasodilatadores.

Diagnóstico

Ele se baseia na anamnese dirigida e no exame físico do paciente. A análise toxicológica, laboratorial permite a identificação da fenciclidina por cromatografia em camada delgada.

Tratamento

Ele é basicamente sintomático e de manutenção das funções vitais. A descontaminação gastrintestinal é eficaz nas associações com outros produtos absorvidos por via digestiva.

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“Rape Drugs” é o termo usado para designar certo número de drogas que tem como característica comum, o fato de deixarem indefesas as pessoas que as utilizam. São geralmente inodoras, incolores e sem sabor, facilmente adicionadas a uma bebida, sem o conhecimento da vítima. Há pelo menos três tipos de rape drugs : GHB, Flunitrazepan e Quetamina. Têm sido utilizadas também para ajudar na prática de outros crimes, como roubo. O Termo “Boa Noite Cinderela” tem origem no uso dessas drogas para dopar vítimas em potencial de assalto ou abuso. Essas drogas também sãobastante difundidas entre jovens freqüentadores de festas “raves”.

As principais substâncias encontradas no Brasil são:

• Benzodiazepínicos: flunitrazepam (Rohypnol®). • GHB ou ecstasy líquido. • Quetamina: special K, kit kat

1. Flunitrazepam

Produto do grupo dos benzodiazepínicos fluorados, o flunitrazepan, conhecido no comércio sob o nome Rohypnol®. Sua comercialização está autorizada em muitos países, inclusive europeus, como regulador dos distúrbios do sono, mas é proibido na América do Norte. Ele é usado como “rape drug”.

Toxicocinética

Após a administração oral, puro ou misturado em bebidas sua absorção é quase total. Ele tem um início de ação rápido, em 30 min, com pico plasmático em 2 horas. Só 10%a 15% são metabolizados durante sua primeira passagem pelo fígado, resultando numa biodisponibilidade de 85%, mas o produto é quase totalmente transformado antes de sua excreção (2% eliminado pela urina sob forma intacta). Os principais metabólitos ativos são 7-amino-flunitrazepam e o N-dimetil-flunitrazepam e ambos são eliminados pelos rins após glicuroconjugação. A meia-vida de eliminação do metabólito ativo N-dimetil-flunitrazepam é de 23 a 33 horas.

Da dose administrada por via endovenosa, 50% são eliminados entre 16 e 35 h. Potencialização pelo álcool e outros depressores do sistema nervoso central.

Quadro clínico e toxidade

Seu mecanismo de ação se deve à sua alta capacidade de fixar-se em sítios específicos do sistema nervoso central (receptor GABA - benzodiazepínico), facilitando e potencializando o efeito inibitório mediado pelo ácido gama-aminobutírico (GABA). Suaafinidade guarda estreita relação com sua potência neurodepressora.

A dose terapêutica para adultos é de 0,5 a 1 mg; e, em casos excepcionais, pode ser elevada a 2 mg. Em idosos, administra-se 0,5 mg e, em circunstâncias especiais, a dose pode ser elevada para 1 mg.

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Há relato de óbito em adulto, com uma ingesta de 28 mg.

A dose tóxica estimada em crianças é de 0,1mg/Kg (Jager et al, 1984)”. Em doses elevadas, o flunitrazepam causa amnésia anterógrada severa (perda da memória recente secundária ao efeito da droga), desorientação, confusão, perda de

consciência, hipotensão, perda do controle muscular, depressão respiratória e, mais raramente, coma e morte. Diagnóstico

Ele se baseia na anamnese detalhada e no exame físico. O diagnóstico laboratorial se faz por busca de benzodiazepínico em cromatografia em camada delgada, que constitui um teste rápido.

Tratamento

Como acontece com muitos produtos tóxicos, o tratamento é sintomático e requer medidas de suporte. Caso raro, os benzodiazepínicos têm um antídoto específico que é o flumazenil (Lanexat®), comercializado em ampolas de 5 mL com 0,5 mg (0,1 mg/mL) de produto ativo. As doses são, para crianças - 0,01 mg/kg, a cada 30 segundos, até haver recuperação da consciência ou até atingir um total de 1 mg e, para adultos, 0,3 mg, a cada 30 segundos, com um máximo de 5 mg. A dose de manutençãoé de 0,2 a 1 mg/h em infusão contínua.

2. Quetamina Definição

A quetamina é um derivado da fenciclidina (PCP), criada em 1962 para ser usada como anestésico dissociativo para uso humano (cirurgias rápidas) e, principalmente, veterinário. Começou a ter funções recreativas nos anos 70 devido a seus efeitos alucinógenos. Atualmente está integrada no contexto de festas rave e como “rape drug”. Ela é encontrada sob a forma de pó branco, líquido ou tablete, podendo ser consumida por via oral, inalada ou venosa.

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Sinonímia

Hidrocloridrato de Quetamina: Special K, Vitamina K, Kit Kat, Super cid, Ketalar®, Ketaset®.

Atua nos receptores colinérgicos do SNC (bloqueio neuro-muscular) e nos receptores opióides (Analgesia).

Farmacocinética

Início de ação: EV- de 30 a 40 segundos, IM - de 3 a 8 minutos, inalada – de 5 a 15 minutos e oral – de 5 a 30 minutos.

Duração da ação: Os efeitos primários da quetamina duram aproximadamente entre 30 a 45 minutos quando injetada, 45 a 60 minutos quando inalada, e entre 1 e 2 horas quando ingerida oralmente.

A metabolização se dá por via citocromo P-450 gerando metabólitos ativos. A excreção se dá por via renal como metabólitos conjugados. Meia-vida de 2 h, efeitos agudos por +/- 3h.

Quadro clínico e toxidade

Dose anestésica: 2 a 10 mg/kg. As doses recreacionais variam de 30 a 300 mg. A dosagem para a quetamina inalada varia amplamente de 15 a 200 mg. Quando administrada IM, a dosagem varia geralmente entre 25 e125 mg. O uso oral normalmente demanda maior quantidade, entre 75 a 300 mg. A dose letal mínima não está bem estabelecida. Há relatos de óbitos com doses de 900 a 1000 mg.

Baixas doses à Dissociação: alucinações, ilusões, desrealização, despersonalização, desaceleração do tempo, estado onírico, percepções extracorporais, atenção, aprendizagem e memória ficam prejudicados.

Doses maiores: vômitos, distúrbios da fala, amnésia, taquicardia, hipertensão, midríase, agitação, delirium, intensa dissociação (K-hole, K-Land), experiências “near-death”, hipotermia, Distúrbios visuais e flash-backs.

Em casos mais graves, depressão respiratória, apnéia, convulsões, rabdomiólise.

Diagnóstico

Anamnese e exame físico Toxicológico: CCD positivo para PCP (Fenciclidina).

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Tratamento

Medidas de descontaminação G.I. quando indicado. Tratamento sintomático e suporte ventilatório se necessários.

Mecanismo de ação

Antagonista não competitivo do receptor glutamatergico N-Metil-D-Aspartato (NMDA). Induz anestesia sem depressão respiratória. Inibe recaptação de noradrenalina, dopamina, serotonina.

Atua nos receptores colinérgicos do SNC (bloqueio neuro-muscular) e nos receptores opióides (Analgesia).

Farmacocinética

Início de ação: EV- de 30 a 40 segundos, IM - de 3 a 8 minutos, inalada – de 5 a 15 minutos e oral – de 5 a 30 minutos.

Duração da ação: Os efeitos primários da quetamina duram aproximadamente entre 30 a 45 minutos quando injetada, 45 a 60 minutos quando inalada, e entre 1 e 2 horas quando ingerida oralmente.

A metabolização se dá por via citocromo P-450 gerando metabólitos ativos. A excreção se dá por via renal como metabólitos conjugados. Meia-vida de 2 h, efeitos agudos por +/- 3h.

Quadro clínico e toxidade

Dose anestésica: 2 a 10 mg/kg. As doses recreacionais variam de 30 a 300 mg. A dosagem para a quetamina inalada varia amplamente de 15 a 200 mg. Quando administrada IM, a dosagem varia geralmente entre 25 e125 mg. O uso oral normalmente demanda maior quantidade, entre 75 a 300 mg. A dose letal mínima não está bem estabelecida. Há relatos de óbitos com doses de 900 a 1000 mg.

Baixas doses à Dissociação: alucinações, ilusões, desrealização, despersonalização, desaceleração do tempo, estado onírico, percepções extracorporais, atenção, aprendizagem e memória ficam prejudicados.

Doses maiores: vômitos, distúrbios da fala, amnésia, taquicardia, hipertensão, midríase, agitação, delirium, intensa dissociação (K-hole, K-Land), experiências “near-death”, hipotermia, Distúrbios visuais e flash-backs. Em casos mais graves, depressão respiratória, apnéia, convulsões, rabdomiólise.

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Diagnóstico

Anamnese e exame físico Toxicológico: CCD positivo para PCP (Fenciclidina)

Tratamento

Medidas de descontaminação G.I. quando indicado. Tratamento sintomático e suporte ventilatório se necessários.

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Os programas de prevenção às drogas buscam evitar o primeiro contato com as substâncias e ajudar os usuários a largar a dependência por meio de tratamento, reabilitação e reintegração social. Em 1998 na Sessão Especial da Assembléia Geral da ONU sobre o problema mundial das drogas, os países reconheceram que reduzir a demanda de drogas seria um pilar essencial no combate global ao uso e tráfico de drogas ilícitas. Os países se comprometeram em reduzir significativamente tanto a oferta como a demanda de drogas até 2008, como foi expresso na Declaração Política sobre os Princípios da Redução da Demanda de Drogas (arquivo PDF em inglês).

A prevenção de novas ocorrências também se dá através de uma avaliação clínica, exames subsidiários, medidas de suporte e específicas adequadas e de um efetivo seguimento clínico e da saúde mental.

1 A existência de uma síndrome de abstinência de cocaína é hoje cientificamente aceita. As manifestações clínicas, embora ainda controvertidas e mal definidas, sobretudo em relação à duração, incluem cansaço e sono intensos, aumento do apetite, irritabilidade, ansiedade, depressão, anedonia (incapacidade de obter prazer nas atividades em que antes se obtinha), distúrbios do sono (insônia ou hipersonia) e retardamento psicomotor e fissura pela droga. Estas manifestações desaparecem progressivamente em algumas semanas. 2 É a razão entre a dose requerida para produzir efeito letal em 50% da população de animais de laboratório utilizados no teste de toxicidade e a dose que produz o efeito farmacológico desejado em 50% dessa mesma população estudada. Um índice terapêutico baixo reflete em um nível terapêutico próximo ao nível tóxico. 3 A monoaminoxidase é uma enzima produzida pelas mitocôndrias celulares que destrói ou permite a recaptura das moléculas de dopamina, noradrenalina, adrenalina e serotonina pelas vesículas dos axonas pré-sinápticos. 4 O início das manifestações clínicas pode ocorrer horas a dias após a exposição ao(s) agente(s) causal(is). A tríade clássica das manifestações clínicas inclui: • alterações do estado mental - ansiedade, agitação, confusão, inquietação, hipomania, alucinações e

coma • alterações motoras - tremores, mioclonias, hipertonia principalmente dos membros inferiores,

hiperreflexia e incoordenação • alterações autonômicas - febre, sudorese, náusea, vômitos, diarréia e hipertensão

Complicações agudas - coma, convulsões, rabdomiólise e coagulação intravascular disseminada (CIVD). A combinação das manifestações é extremamente variável entre casos individuais. 5 A crise tireotóxica é um estado clínico grave, resultante da exacerbação abrupta do funcionamento da tireóide, acompanhado de descompensação de um ou mais órgãos. O quadro clínico mais freqüente mostra: • febre – geralmente superior a 38,5°C • taquicardia desproporcional à febre • disfunções gastrintestinais - náuseas, vômitos, diarréia e em casos graves, icterícia • anormalidades neurológicas - da confusão à apatia e o coma • hipertensão • seguidas de hipotensão e choque Apesar de ser rara, o diagnóstico precoce e o tratamento agressivo são necessários para evitar o desfecho fatal, que ocorre em 10% a 75% dos pacientes hospitalizados. 6 A creatinoquinase ou creatinofosfoquinase é uma enzima que desempenha importante papel regulador no metabolismo intracelular dos tecidos contráteis, em células musculares lisas e estriadas e no tecido cerebral, catalisando o caminho metabólico creatina-creatinina. Ela é formada por moléculas diméricas compostas de subunidades M e B e existem na forma de isoenzimas MM, MB e BB. Um aumento acima dos níveis séricos normais indica trauma em células com alto teor de CPK. O fracionamento e medição de três isoenzimas distintas de CPK - CK-BB (ou CK1), CK-MB (ou CK2) e CK-MM (ou CK3) - substituíram o uso de níveis de CPK total, permitindo a localização da destruição tecidular.

A CK-BB, raramente vista no soro normal, é a mais prevalente no tecido cerebral. A CK-MM predomina no músculo esquelético.

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A CK-MB se encontra no músculo cardíaco, mas as lesões cardíacas liberam as duas isoenzimas CK-MM e CK-MB no soro. 7 A monoaminoxidase é uma enzima produzida pelas mitocôndrias celulares que destrói ou permite a recaptura das moléculas de dopamina, noradrenalina, adrenalina e serotonina pelas vesículas dos axonas pré-sinápticos. 8 A síndrome adrenérgica reproduz os efeitos de um grupo de hormônios, ditos catecolaminas, representados pela epinefrina e a norepinefrina (adrenalina e noradrenalina). Ambas são derivadas de monoaminas e agem sobre receptores acoplados à proteína G do sistema nervoso simpático. A síndrome alfa-adrenérgica resulta da estimulação de receptores alfa-adrenérgicos e se caracteriza por vasoconstrição e hipertensão, acompanhadas de bradicardia reflexa, midríase, cefaléia e, excepcionalmente, hemorragia intracraniana. Arritmias ventriculares, convulsões, infarto do miocárdio e insuficiência renal aguda são descritos. A síndrome beta-adrenérgica é secundária à estimulação de receptores beta-adrenérgicos e resulta em um quadro clínico caracterizado por taquicardia, hipocalemia e taquiarritmias, acompanhadas de hiperglicemia, tremor, sudorese, confusão mental e hiper ou hipotensão. Convulsões, rabdomiólise e insuficiência renal aguda também têm sido relatadas. 9 No processo de hemostasia, logo após a lesão vascular, ocorre uma vasoconstrição reflexa local que reduz instantaneamente o fluxo de sangue no local. Em seguida, as plaquetas interagem com o local da lesão, formando o tampão plaquetário primário (fase primária da hemostasia). Este tampão inicialmente é frouxo, porém, geralmente satisfatório para o controle da hemorragia se a lesão vascular for pequena. A ativação da cascata da coagulação resulta na formação de fibrina que estabiliza o tampão plaquetário primário, promovendo a formação do coágulo. Ela compreende a via intrínseca e a via extrínseca, que convergem numa via comum a qual resulta na formação do complexo ativador da protrombina. Este complexo, em presença de quantidade suficiente de Ca++, promove a conversão da protrombina em trombina. A trombina converte o fibrinogênio em monômeros de fibrina, em cuja malha são envolvidos as plaquetas, as células sangüíneas e o plasma, para formar o coágulo, caracterizando a fase secundária da hemostasia O tempo de protrombina (TP) ou tempo de Quick, é usado para avaliar as vias extrínseca (fator de coagulação VII) e comum (fatores X, V, II e I), enquanto o tempo de tromboplastina parcial ativada (TTPa) é usado para monitorar as vias intrínseca (fatores XII, XI, IX e VIII) e comum. Valores normais TP = 1,0 a 14,6 s TTPa ≤ 1,20 s 10 Na década de 80, visando diminuir os problemas causados pela variabilidade na sensibilidade dos reagentes e estabelecer uma padronização do tempo de protrombina no controle do uso de anticoagulante oral, foi desenvolvido e instituído pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em colaboração com o Comitê Internacional de Trombose e Hemostasia (CITH) e a Comissão Internacional de Padronização em Hematologia (CIPH), o emprego da Relação Internacional Normalizada (INR)

Valor normal do INR = 0,91 a 1,25 11 A tiamina é uma coenzima das reações de dês carboxilação e transacetolação, da conversão de piruvato em acetil-CoA (ciclo de Krebs) e da via das pentoses-fosfato e, assim, tem um papel essencial na respiração celular e no metabolismo de açúcares, gorduras e proteínas. Ela está presente, em maior quantidade, nos órgãos onde o catabolismo é mais acentuado, como músculos estriados, coração e fígado, fornecendo energia para as células. Também é importante na biossíntese de neurotransmissores (acetilcolina, entre outros) e na preservação da bainha de mielina dos nervos. A deficiência em tiamina pode gerar quadros patológicos como o beribéri, ou a encefalopatia de Wernicke, a síndrome de Korsakoff e a polineuropatia de origem alcoólica. Dado que o metabolismo normal dos carboidratos requer o consumo de tiamina, tem-se observado repetidas vezes que a administração de glicose pode precipitar os sintomas agudos de deficiência em tiamina em pessoas com desequilíbrio nutricional. 12 A niacina é uma vitamina hidrossolúvel composta do ácido nicotínico e de nicotinamida, que origina duas coenzimas importantes do ciclo de Krebs, o NAD+ e o NADP+, e participa de numerosas funções metabólicas celulares, em particular, dos carboidratos, lipídios e proteínas. Ela tem um papel importante na formação de hemácias, circulação sangüínea, redução da taxa de colesterol e triglicerídeos, funcionamento do aparelho digestivo e síntese do estrogênio, progesterona, testosterona e insulina. Sua carência é responsável pela pelagra que se traduz por uma confusão mental progressiva, com rigidez extrapiramidal importante, vômitos e, sobretudo, diarréia crônica, e uma dermatite avermelhada, com fotossensibilidade e hiperpigmentação, desidratação e descamação cutânea. A desnutrição complexa criada pelo alcoolismo crônico reproduz esta doença carencial. a associação da niacina com a vitamina B12 permite um metabolismo acelerado do álcool e a regressão dos sinais de carência.

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13 GABA - o receptor do ácido gama-aminobutírico transmembranoso se localiza na sinapse neuronal e é constituído por cinco unidades protéicas agrupadas de modo a delimitar um poro, permeável aos íons cloro quando ativado. A molécula de GABA endógena se fixa ao seu receptor específico, modifica a forma da proteína e faz com que o poro se abra. Os íons de cloro que se encontram em concentração extracelular superior à intracelular passam para o interior do axônio seguindo o gradiente eletroquímico, e hiperpolarizam a célula. O efeito final é de inibição da passagem do influxo nervoso. Os barbitúricos, alguns esteróides, os benzodiazepínicos e outras substâncias têm efeitos semelhantes sobre receptores GABA. Existem três tipos de receptores GABA: - GABAA e GABAC – receptores de canais iônicos de íons cloro, ativados por ligantes ou mediadores. - GABAB – receptores acoplados a uma proteína G intracelular, que agem aumentando a condutância de um canal associado ao íon potássio. 14 Conjunto de sinais e sintomas resultantes de uma inibição dos receptores muscarínicos da acetilcolina. A síndrome se caracteriza pela associação de:

anomalias da função neurológica central: alterações mentais, desorientação, tremores, fala descoordenada, delírio, alucinações, agitação, excitação psicomotora com agressividade, falência respiratória, sonolência e coma sintomas periféricos: hipertermia, mucosas secas, pele quente, hiperemia por vasodilatação periférica, taquicardia diminuição da motilidade intestinal podendo chegar ao estado de íleo paralítico, e retenção urinária.

Rabdomiólise, choque cardiogênico e parada respiratória ocorrem excepcionalmente. 15 Conjunto de sinais e sintomas decorrentes da falta de drogas em usuários dependentes. 16 O citocromo P450 é um sistema de enzimas microsomiais da família das hemoproteínas, compostas de uma parte protéica (apoproteína) e um grupo hemoprostético. Localizam-se nas membranas do retículo endoplasmático dos hepatócitos, onde catalisam reações de oxidação de numerosas substâncias, graças à sua capacidade de transferência de elétrons. É também encontrado nas glândulas, nos testículos, no aparelho digestivo, e nas supra-renais, tanto nas mitocôndrias destas células, como no retículo endoplasmático liso encarregado da síntese de esteróides. O citocromo P450 2D6 ou CYP2D6 é uma das enzimas hepáticas mais importantes desse sistema complexo. 17 O início das manifestações clínicas pode ocorrer horas a dias após a exposição ao(s) agente(s) causal(is). A tríade clássica das manifestações clínicas inclui: • alterações do estado mental - ansiedade, agitação, confusão, inquietação, hipomania, alucinações e

coma • alterações motoras - tremores, mioclonias, hipertonia principalmente dos membros inferiores,

hiperreflexia e incoordenação • alterações autonômicas - febre, sudorese, náusea, vômitos, diarréia e hipertensão

Complicações agudas - coma, convulsões, rabdomiólise e coagulação intravascular disseminada (CIVD). A combinação das manifestações é extremamente variável entre casos individuais. 18 A síndrome dopaminérgica se traduz por efeitos psicomotores, às vezes intensos, induzidos direta ou indiretamente por drogas de abuso, e dominados por uma agitação psicomotora com manifestações psicóticas paranoides e movimentos estereotipados como os tiques e o bruxismo, anomalias cardiovasculares como hipertensão, taquicardias, disritmias e espasmos coronarianos, e aumento da freqüência respiratória. 19 O início das manifestações clínicas pode ocorrer horas a dias após a exposição ao(s) agente(s) causal(is). A tríade clássica das manifestações clínicas inclui: alterações do estado mental - ansiedade, agitação, confusão, inquietação, hipomania, alucinações e coma alterações motoras - tremores, mioclonias, hipertonia principalmente dos membros inferiores, hiperreflexia e incoordenação alterações autonômicas - febre, sudorese, náusea, vômitos, diarréia e hipertensão Complicações agudas - coma, convulsões, rabdomiólise e coagulação intravascular disseminada (CIVD). A combinação das manifestações é extremamente variável entre casos individuais. 20 Condição neurológica na qual dois ou mais sentidos se associam.