modulo ix tgd[1]
TRANSCRIPT
MÓDULO IX: TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO
Professoras: Marcia Doralina Alves
Taís Guareschi
Carga horária: 25 horas
INTRODUÇÃO
No módulo sobre o Atendimento Educacional Especializado vimos que a
Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva
(2008) prevê que alunos com deficiência, transtornos globais do
desenvolvimento e altas habilidades/superdotação são o público-alvo da
Educação Especial. Os alunos com transtornos globais do desenvolvimento são
descritos como sujeitos que apresentam ―um quadro de alterações no
desenvolvimento neuropsicomotor, comprometimento nas relações sociais, na
comunicação ou estereotipias motoras‖ (Brasil, 2008, p.2). Neste módulo
estudaremos os Transtornos Globais do Desenvolvimento, propondo ao
professor um olhar para além do diagnóstico a que são submetidos esses
alunos.
UNIDADE A – Alguns desdobramentos sobre a história dos Transtornos
Globais do Desenvolvimento e a perspectiva educacional
O primeiro relato sobre o tratamento dos transtornos do desenvolvimento
realizado com crianças data do ano de 1800, oferecido por Jean-Marc Gaspard
Itard, médico francês, pesquisador de temas sobre a gagueira, a educação oral
e a audição.
Itard dedicou-se ao tratamento de Victor, uma criança entre doze e quinze
anos, encontrada em um bosque da França (Aveyron) e diagnosticada por ele
como idiota. A idiotia era a grande categoria da época que abarcava todo o tipo
de deficiência mental. Hoje, talvez Victor fosse diagnosticado como psicótico.
Especialista na educação de surdos Itard resolveu tratar de Victor,
aplicando-lhe o método de tratamento moral, uma vez que esse método incidia
sobre as faculdades mentais. Basicamente o tratamento de Itard consistia em
educar Victor para o convívio social, humanizando-o.
Philippe Pinel, também renomado médico da época, ao examinar Victor,
sugeriu que o garoto fosse internado em um manicômio, pois se tratava de um
caso de idiotia. Itard não aceitou o prognóstico de Pinel, já que acreditava na
educabilidade do jovem paciente, ao dizer que Victor era idiota porque havia
sido abandonado, diferentemente de Pinel que postulava que o garoto tinha sido
abandonado porque era idiota. O pressuposto de Itard era de que a idiotia de
Victor era consequência das experiências na floresta entre animais, fora do
convívio humano.
Itard é persistente e assume a educação de Victor auxiliado por subsídios
do governo francês. O garoto é levado para fora da cidade onde fica sob os
cuidados da governanta, Madame Guerin.
Itard utiliza métodos de condicionamento, treinamentos de socialização,
jogos e brincadeiras sempre na tentativa de que Victor aprendesse a falar e
assim se relacionasse com as pessoas.
Todo o esforço de Itard acabou fracassando. O médico não conseguiu
humanizar Victor tampouco ensiná-lo a falar. Segundo relatos, Victor pronunciou
as palavras ―leite‖ e ―água‖, porém não as utilizava quando sentia necessidade,
e sim, quando as via.
Jean Itard foi o precursor na educação de crianças deficientes mentais e
deixou grandes contribuições para os educadores que vieram após. Pessoti
(1984) considera Itard como o fundador da Educação Especial, pois foi através
das suas pesquisas e investigações que ele desenvolveu métodos e programas
educativos. Depois de Itard, médicos e pedagogos se dedicaram aos deficientes,
usando seus métodos de adestramento.
Itard teve muitos méritos em seu trabalho, apesar das tentativas
frustradas de educar Victor. Chamou a atenção, por exemplo, para a questão
humanizante da educação e do investimento que devemos fazer, apostando na
capacidade dos sujeitos com necessidades especiais para que ocupem um lugar
onde possam falar em nome próprio.
É uma pena que dos ensinamentos de Itard tenha ficado somente a
técnica de adestramento e a visão médica que muitos profissionais ainda hoje
utilizam para se referirem às crianças com necessidades educacionais
especiais. Como nos diz Kupfer (1997, p. 55):
Para muitos educadores, o esforço humanizador de Itard cedeu lugar a esses esforços de adestramento, que desembocaram, na atualidade, em métodos educativos para crianças autistas que chegam ao absurdo de propor que não se fale com elas, já que isto as perturba, e de afirmar que o importante é ensiná-las a atravessar a rua, fechar botões, e ir ao banheiro sem perturbar os adultos. Assim, o ramo educativo da Psiquiatria Educativa veio desembocar nos métodos de adestramento que conhecemos.
Diante do que foi dito até aqui e procurando problematizar a questão da
inclusão de alunos com Transtornos Globais do Desenvolvimento, perguntamos:
seria possível incluir Victor na escola hoje?
Após a experiência de Itard, outras tentativas de tratar crianças com
deficiência mental se propagaram, apesar de muitas prestarem atendimentos
asilares com o objetivo de confinamento, os chamados ―depósitos‖ de crianças.
Centros médico-pedagógicos proliferaram e o binômio tratamento - educação
aparece na tentativa de cuidar das crianças com problemas graves.
É em setembro de 1969 que Maud Mannoni, psicanalista, nascida em
1923, funda a Escola Experimental de Bonneuil-sur-Marne, na França. A
fundação aconteceu juntamente com um pequeno número de psicanalistas e
estudantes. O objetivo da escola é possibilitar que crianças e adolescentes
excluídos possam usufruir de um ―lugar para viver‖, como é conhecida a escola
até hoje.
Mannoni, conforme Bernardino (2007) apontava a ausência de um lugar
de sujeito para aqueles que se encontravam nos locais que haviam sido criados
para eles. Ela entendia que os sujeitos nessas instituições deveriam ter o direito
de se mostrarem a partir das especificidades que lhes são próprias. Mannoni
acreditava que o ser humano deveria se posicionar no mundo de forma singular,
desejante, fazendo parte de uma história. Essas idéias, segundo Mannoni,
deveriam se estender a todas as crianças, independentemente da sua condição.
Mannoni preconizava que um sujeito só poderia usufruir de uma educação se
antes ele pudesse se posicionar de forma autônoma na vida.
Na esteira do pensamento de Mannoni, encontramos hoje em Maria
Cristina Machado Kupfer uma multiplicadora das suas idéias. Kupfer e toda a
equipe do Lugar de Vida, Centro de Educação Terapêutica em São Paulo
acolhem sujeitos com problemas na sua constituição psíquica , oferecendo a
eles, como diz Mannoni, um lugar para viverem a seu modo, com as suas
particularidades.
O Lugar de Vida, Centro de Educação Terapêutica, está pautado nos
pressupostos do conceito de Educação Terapêutica, entendendo que um
atendimento psicanalítico e educacional podem ser integrados.
A Educação Terapêutica no Lugar de Vida é concebida por toda a equipe
(educadores, psicanalistas, coordenadores de ateliês, médicos, fonoaudiólogos)
como uma prática articulada, visando a um só objetivo: o sujeito. Kupfer (2000,
p. 83) define a Educação Terapêutica como sendo:
―(...) um conjunto de práticas interdisciplinares de tratamento, com especial ênfase nas práticas educacionais, que visa à retomada do desenvolvimento global da criança ou à retomada da estruturação psíquica interrompida pela eclosão da psicose infantil, ou ainda, à sustentação do mínimo de sujeito que uma criança possa ter construído”.
Kupfer cunhou o termo Educação Terapêutica para intervir junto às
crianças com problemas do desenvolvimento, sejam elas psicóticas, autistas, ou
com problemas orgânicos associados a falhas na constituição subjetiva.
Dentre os tratamentos oferecidos, está o acompanhamento escolar,
subdividido em três modalidades: acompanhamento à distância da criança na
escola; acompanhamento de professores inclusivos (acreditam que o professor
também deve ser incluído, não somente o aluno) por meio de reuniões mensais
na sede do Lugar de Vida e a parceria orgânica com a escola. Nessa última
modalidade, o profissional vai regularmente à escola, permanece no pátio, entra
na classe, acompanha os movimentos, trabalha com a criança e ao lado da
professora quando necessário.
O Lugar de Vida, Centro de Educação Terapêutica, é uma das entidades
que, como já dissemos, caminha junto com os pressupostos de Mannoni, porém,
existem muitas outras espalhadas pelo mundo, como o Courtil, uma instituição
belga que acolhe crianças psicóticas, autistas e com neuroses graves, bem
como, Antenne 110, em Bruxelas, fundada em 1974.
Para finalizar esta unidade e sob inspiração das idéias de Mannoni, pode-
se dizer que os professores na escola poderão possibilitar encontros. Esses
acontecerão quando o professor deixar transparecer a marca de seu desejo,
fazendo com que os alunos sejam os destinatários dessas marcas. A figura do
professor poderá encarnar o lugar de parceiro, aquele que localiza no aluno um
saber, o qual será compartilhado entre ambos. A escola poderá funcionar como
um dispositivo educacional que facilitará encontros e acolhidas, acompanhando
os alunos nas suas andanças e construções.
Sugestões:
Para acessar o site do Lugar de Vida, consulte: www.lugardevida.com.br
Sugerimos também os filmes:
► O garoto selvagem de Aveyron, do diretor Françoise Truffaut de 1970.
► O enigma de Kaspar Hauser, do diretor, Werner Herzog.
UNIDADE B - Conceitos Fundamentais
Nesta unidade delinearemos conceitos fundamentais acerca dos
Transtornos Globais do Desenvolvimento. Iniciaremos a discussão
estabelecendo a diferença entre deficiência mental e doença mental. Em
seguida, abordaremos os transtornos que fazem parte da categoria tratada neste
módulo: Síndrome de Rett, Autismo, Transtorno Desintegrativo da Infância
(psicoses), Síndrome de Asperger e Transtornos Invasivos sem outra
especificação. A compreensão de cada um desses conceitos é importante para
sabermos a quais alunos está se referindo a Política Nacional de Educação
Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008). Porém, é preciso
salientar que cada aluno com Transtorno Global do Desenvolvimento que recebe
o Atendimento Educacional Especializado (AEE) terá suas especificidades e seu
modo particular de se relacionar com o saber, ou seja, terá seu próprio estilo
cognitivo1de aprendizagem. A partir disso, é importante considerarmos que,
apesar dos signos (manifestações) característicos de cada um desses quadros,
nós, professores, devemos lançar um olhar para além do diagnóstico, não
engessando o sujeito em um determinado transtorno. Sendo assim, se um aluno
possui o diagnóstico de autismo, por exemplo, saberemos que há certas
especificidades do quadro, mas também teremos que considerar o que esse
aluno traz de singular, aquilo que o diferencia de qualquer criança,
independentemente de ter um transtorno do desenvolvimento ou não. Assim,
evitaremos generalizações que aprisionam o sujeito em um diagnóstico: ―Ah ele
faz isso porque é autista‖, ―Ah, ele não consegue aprender isso porque é
psicótico‖. Vale lembrar que ―todas as crianças aprendem muito mais do que
sonha a nossa vã pedagogia‖ (KUPFER; PETRI, 2000, p.116). É com esse
olhar, para além de um diagnóstico ou quadro clínico, que propomos que você
inicie a leitura desta unidade.
B.1 – Diferenças entre Deficiência Mental e Doença Mental
Para iniciarmos a discussão sobre os conceitos fundamentais acerca dos
Transtornos Globais do Desenvolvimento, estabeleceremos a diferença entre
deficiência e doença mental. É fato que muitas vezes as pessoas com
1 Esse conceito foi tratado pelas autoras no módulo sobre o Atendimento Educacional Especializado.
transtornos globais do desenvolvimento são confundidas com pessoas com
deficiência mental; no entanto, há diferenças pontuais.
Para evidenciar essas diferenças, podemos nos reportar primeiramente à
Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva.
Esse documento estabelece três grupos de alunos como sendo público-alvo da
Educação Especial: alunos com deficiência, alunos com transtornos globais do
desenvolvimento e alunos com altas habilidades/superdotação.
Dentre os alunos com deficiência, estão os alunos com deficiência
mental; já os alunos com transtornos globais do desenvolvimento ―pertencem‖ a
outro grupo que, como vimos, define-se por apresentar ―um quadro de
alterações no desenvolvimento neuropsicomotor, comprometimento nas
relações sociais, na comunicação ou estereotipias motoras‖ (Brasil, 2008, p.2).
Sendo assim, os sujeitos com transtornos globais do desenvolvimento não
devem ser enquadrados como sujeitos com deficiência mental, apesar de essa
última poder estar associada aos quadros em determinados casos. É importante
salientar que alguns desses sujeitos podem ter inteligência acima da média.
Diante disso, propomos a diferenciação entre doença e deficiência
mental: na deficiência mental, ocorrem alterações nos processos de
desenvolvimento cognitivo, enquanto que as doenças mentais, como o autismo,
as psicoses e a síndrome de Asperger2, são definidas por falhas na estruturação
psíquica (PAULON; FREITAS; PINHO, 2005).
Kupfer (2001, p. 87) aborda essa diferença, tratando mais
especificamente da psicose infantil. Porém, podemos estender a fala da autora
também para a compreensão do autismo e da síndrome de Asperger:
Sua diferença não está (...) em seu funcionamento intelectual efetivamente rebaixado por determinantes genéticos, funcionais ou anatomopatológicos. São diferentes porque apresentam graves distúrbios de desenvolvimento e demonstram um funcionamento intelectual absolutamente atípico. Não são deficientes mentais verdadeiramente; podem enganar a primeira vista (...).
2 Vale destacar que a síndrome de Rett faz parte dos transtornos globais do desenvolvimento, mas não é
considerada uma doença mental. Por isso não fizemos referência a ela.
Portanto, os alunos com Transtornos Globais do Desenvolvimento não
são deficientes mentais, mas apresentam, segundo a autora, um funcionamento
intelectual atípico. Esse funcionamento atípico pode ser considerado como o
estilo cognitivo de esses sujeitos funcionarem tanto na escola quanto na vida.
Nesse sentido, queremos destacar um ponto relevante quanto à diferenciação
de doença e deficiência mental. Essa distinção nos é apresentada por PAULON;
FREITAS; PINHO (2005, p.32) ao dizerem que as doenças mentais na infância
―são passíveis de remissão‖, ao contrário da deficiência mental.
Os autores destacam que o fato de ser possível uma reversão em um
quadro de doença mental na infância faz com que pensemos que essas crianças
deveriam ter prioridade nos atendimentos terapêuticos. Transportando isso para
o universo escolar, podemos dizer que a escola se configuraria como uma
oportunidade para essas crianças avançarem no seu processo de subjetivação
através das trocas com os colegas e a partir daquilo que o professor pudesse
lhes oferecer. Portanto, a educação exerce papel fundamental, uma vez que,
conforme os autores acima, ―preservando e reforçando os laços sociais e as
experiências de aprendizagem, desde a primeira infância, é muito mais provável
que estas crianças consigam desenvolver sua capacidade intelectual‖. Com isso
podemos vislumbrar a importância da inclusão dessas crianças desde a
educação infantil.
B.2 – Delineando Conceitos
B.2.1 – Síndrome de Rett
A síndrome de Rett foi descrita pela primeira vez pelo médico austríaco
Andreas Rett em 1966, que denominou esse quadro de ―Atrofia Cerebral
Associada à Hiperamonemia‖. O estudo de Rett não se tornou muito conhecido
porque suas publicações foram na língua alemã. Essa síndrome passou a ser
mais conhecida com as pesquisas do médico Dr. Bengt Hagberg, que publicou
um artigo em inglês sobre essa doença, nomeando-a de síndrome de Rett.
Essa síndrome é uma doença neurológica que acomete principalmente
crianças do sexo feminino. Caracteriza-se pela perda progressiva das funções
neurológicas e motoras após um período de desenvolvimento aparentemente
normal nos primeiros meses de vida. Observa-se que, por volta dos seis a
dezoito meses, há uma estagnação do desenvolvimento e a criança perde
gradativamente as habilidades até então adquiridas.
Hoje sabemos que a síndrome de Rett é um quadro comprovadamente
genético. No ano de 1999, os primeiros estudos3 acerca da alteração genética
da síndrome foram publicados, identificando mutações no gene MECP2 no
cromossomo X (SCHWARTZMAN, 2003).
O DSM-IV-TR4 (2002, p.105) traz os seguintes critérios de diagnóstico
para a síndrome de Rett:
A. Todos os quesitos abaixo: (1) desenvolvimento pré-natal e perinatal aparentemente normal (2) desenvolvimento psicomotor aparentemente normal durante os primeiros cinco meses após o nascimento (3) circunferência craniana normal ao nascer B. Início de todas as seguintes características após o período de desenvolvimento normal: (1) desaceleração do crescimento craniano entre os 5 e os 48 meses de idade (2) perda de habilidades manuais voluntárias anteriormente adquiridas entre os 5 e os 30 meses de idade, com o desenvolvimento subseqüente de movimentos estereotipados das mãos (por ex., gestos como torcer ou lavar as mãos) (3) perda do envolvimento social ocorre precocemente no curso do transtorno (embora em geral a interação social se desenvolva posteriormente) (4) aparecimento de marcha ou movimentos do tronco fracamente coordenado (5) desenvolvimento das linguagens expressiva ou receptiva severamente prejudicado, com severo retardo psicomotor
3 Conforme Schwartzman (2003) esses estudos foram os seguintes:
1- Amir RE, Van den Veyver IB, Wan M, Tran CQ, Francke U, Zoghbi HY. Rett syndrome is caused by mutations in X-linked MECP2, encoding methyl-CpG-binding protein 2. Nat Genet 1999;23:185-8. 2- Wan M, Lee SS, Zhang X, Houwink-Manville I, Song HR, Amir RE, et al. Rett syndrome and beyond:recurrent spontaneous and familial MECP2 mutations at CpG hotspots. Am J Hum Genet 1999;65:1520-9. 4 Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV-TR) da Associação
Americana de Psiquiatria. ―TR‖ significa Tradução Revisada.
Como vimos, a criança com síndrome de Rett tem desenvolvimento pré-
natal e perinatal aparentemente normais, sendo que seu desenvolvimento
psicomotor ocorre dentro do esperado até por volta dos cinco meses. O
perímetro encefálico do bebê é normal ao nascer. Após esse período de
desenvolvimento normal, ocorre uma desaceleração no crescimento do crânio,
havendo uma microcefalia adquirida. Ocorre também a perda de habilidades
manuais e surgem estereotipais com as mãos. Além disso, a interação social
diminui e há um retardo psicomotor significativo.
Para compreendermos a evolução dessa doença trazemos os quatro
estágios da síndrome de Rett, estabelecidos por Hagberg e Witt-Engerstöm
(SCHWARTZMAN, 2003).
• Estagnação Precoce: esse primeiro estágio ocorre entre os seis e os dezoito
meses e se caracteriza pela estagnação no desenvolvimento da criança. Além
disso, há, nesse estágio, a desaceleração no crescimento do perímetro
encefálico e a redução na interação com as pessoas.
• Rapidamente destrutivo: como o nome sugere, há uma rápida regressão no
desenvolvimento, sendo que esse estágio ocorre entre um e três anos de idade.
De acordo com Schwartzman (2003, p. 111), nessa fase:
Uma rápida regressão psicomotora domina o quadro, com a presença de choro imotivado e períodos de extrema irritabilidade, comportamento tipo autista, perda da fala e aparecimento dos movimentos estereotipados das mãos, com subseqüente perda da sua função práxica; disfunções respiratórias (apnéias em vigília, episódios de hiperventilação e outras) e crises convulsivas começam a se manifestar. Em algumas crianças há perda da fala que já estava eventualmente presente. Distúrbios do sono são comuns.
É interessante destacarmos que a fala nos sujeitos com síndrome de Rett
é significativamente comprometida, quando não ausente (SCHWARTZMAN,
2003). Conforme o autor afirma na citação, algumas crianças perdem a fala que
haviam adquirido à medida que ocorre a regressão no desenvolvimento.
• Pseudo-Estacionário: ocorre entre os dois e os dez anos de idade. Esse
estágio é marcado pela melhora de alguns sintomas da síndrome, como, por
exemplo, a interação social. Assim, o contato social que diminui nos dois
primeiros estágios, com consequências autistizantes e de isolamento, é
retomado. Essa retomada é destacada no fragmento do DSM-IV-TR (2002,
p.105), citado anteriormente, em que consta: ―perda do envolvimento social
ocorre precocemente no curso do transtorno (embora a interação social se
desenvolva posteriormente)‖.
• Deterioração motora tardia: esse último estágio tem início por volta dos dez
anos de idade. Conforme Schwartzman (2003, p. 111), nesse quarto estágio
ocorre:
Lenta progressão dos déficits motores, com presença de escoliose e severa deficiência mental. (...) as poucas pacientes que ainda retêm a deambulação gradualmente terão prejuízos crescentes, acabando por ter que utilizar cadeiras de rodas.
Através da leitura da descrição desses quatro estágios, podemos ter uma
visão da evolução dos sintomas da síndrome de Rett. Além disso, conseguimos
perceber os signos presentes nesse quadro que o inserem na categoria dos
Transtornos Globais do Desenvolvimento: ―alterações no desenvolvimento
neuropsicomotor, comprometimento nas relações sociais, na comunicação ou
estereotipias motoras‖ (BRASIL, 2008, p.2)
Com base no que foi tratado até aqui, acreditamos que você tenha
conseguido compreender o que é a síndrome de Rett. Agora propomos o desafio
de ver o sujeito para além desses sintomas aqui descritos. Assim, se é
importante sabermos de que se trata essa síndrome, é fundamental
endereçarmos a esses sujeitos um olhar de aposta, considerando suas
especificidades.
No atendimento educacional especializado dos alunos com síndrome de
Rett, podemos usar recursos utilizados para a deficiência física, tendo em vista
os déficits motores, ou recursos para facilitar a comunicação, uma vez que a fala
é comprometida.
B.2.2 – Autismo
UMA PEQUENA INTRODUÇÃO SOBRE O AUTISMO
O autismo é um transtorno do desenvolvimento que causa certo fascínio e
desperta nosso interesse, basta analisarmos os inúmeros filmes e livros a
respeito do tema, ilustrando a vida e as curiosidades do mundo autista.
Algumas das representações que se têm a respeito desses sujeitos
dizem que são crianças que vivem num ―mundo próprio‖, despovoado de
personagens, ou seja, um mundo a que o outro não teria acesso. Um cenário
como esse nos remete à seguinte interrogação: um ser humano poderá viver
sem a presença do outro? E nós, poderíamos sobreviver fechando-nos para a
presença desse outro? Tais questionamentos nos fazem pensar se seria
possível vivermos de forma autônoma e num mundo particular.
Quando a criança ―dispensa‖ esse outro, imediatamente nos sentimos
confrontados e instigados a pensar sobre o que seja um sujeito vivendo sem a
intervenção de terceiros. Essa poderá ser uma das questões que despertam
nossa curiosidade e fascínio pelo autismo: a busca por nós mesmos através de
nossas crianças autistas.
Saindo um pouco do universo imaginário que envolve o autismo,
passemos a compreendê-lo através da história para adentrarmos no seu
conceito e nas implicações desse quadro no mundo da escola.
Antes de discorrermos sobre a temática do autismo, é preciso que
levemos em conta alguns aspectos importantes para sua compreensão.
Conforme Bosa (2002), há controvérsias com relação ao autismo nos
variados sistemas de classificação ou campos teóricos. Tal fato se dá em função
de que há um acúmulo de conhecimento produzido por pesquisadores em
diferentes partes do mundo, cada qual buscando características clínicas
específicas para os distintos transtornos mentais. Essas especificidades são
importantes para a compreensão das diversas terminologias encontradas na
literatura para o autismo.
O autismo é também conhecido como autismo clássico, síndrome
autística típica, transtorno autista, autismo da infância, autismo infantil, autismo
infantil precoce e autismo de Kanner. Também encontraremos a designação
autismo atípico que difere do autismo clássico, pois é um quadro que aparece
depois dos três anos e a criança poderá não apresentar déficits no âmbito das
interações sociais e na linguagem, bem como se observa a inexistência de
comportamentos repetitivos e estereotipados.
Em se tratando da terminologia do autismo, encontraremos também a
expressão espectro do autismo.
Para Schwartzman (2005), não há uma única classificação para o autismo
e, sim, um espectro de desordens autísticas, em que aparecem as mesmas
dificuldades em graus de comprometimento variáveis. Deter-nos-emos a seguir
no conceito de espectro do autismo, uma vez que essa terminologia é
frequentemente usada nos diversos campos do saber quando se trata da
temática dos transtornos globais do desenvolvimento.
O espectro do autismo diz respeito a uma condição que varia quanto à
apresentação clínica do quadro, ou seja, a forma como ele se apresenta em
cada criança, variando de caso para caso. A terminologia ―espectro‖ sugere que
as causas podem ser as mais variadas possíveis, fato esse que faz com que
pesquisadores do mundo todo ainda busquem identificar a etiologia precisa do
autismo. De acordo com Klin (2006), avanços na genética, neurobiologia e
neuroimagem estão ampliando nossa concepção sobre a natureza do autismo e
sobre a formação do cérebro desses indivíduos.
O espectro do autismo refere-se a sujeitos que podem variar quanto ao
grau de inteligência, indo de um comprometimento profundo à faixa das altas
habilidades. Alguns falam pouco, ao passo que outros falam muito. Muitos deles
usam maneirismos, estereotipias como, por exemplo, ficar rodando num lugar
só; outros usam essa energia para a busca intelectual de fatos e informações
sobre questões nada comuns.
Para resumir, pode-se dizer que o espectro do autismo envolve uma
patologia que varia amplamente em seu grau de seriedade, porém mantém em
comum certos sintomas característicos que são: a dificuldade de interação
social, de comunicação e comportamentos repetitivos e padronizados.
O espectro do autismo engloba o autismo, a síndrome de Asperger e o
transtorno invasivo do desenvolvimento sem outra especificação (TID-SOE).
AUTISMO: UM POUCO DE HISTÓRIA
O autismo é um campo controverso, na medida em que envolve
pesquisadores de diferentes áreas e correntes teóricas, falando a respeito da
temática.
Para a Neurologia, o autismo é um transtorno neurodesenvolvimental,
variando de gravidade, ou seja, de leve a grave, e sua determinação é
puramente orgânica.
Em termos psicanalíticos, pode-se dizer que no autismo houve a
impossibilidade de o agente materno supor e antecipar um sujeito no bebê. Isso
não quer dizer que essa mãe não tenha realizado sua função, mas que o bebê,
por algum motivo, não conseguiu absorver e reconhecer seus cuidados. Esse
descompasso na dinâmica mãe-bebê acarretará a não efetivação de um laço
afetivo, comprometendo a relação entre ambos, com isso, a possibilidade de a
criança desenvolver um quadro autístico. Sobre esse importante momento da
constituição do bebê, trataremos na introdução do tema referente aos
transtornos desintegrativos da infância.
Já para a Psiquiatria, o autismo é um distúrbio psicoafetivo ou uma
doença geneticamente determinada.
Como vimos, a compreensão do autismo requer uma análise em níveis
diversos, buscando suas interfaces ao longo do tempo e da história.
O termo autismo foi cunhado em 1911, por Paul Eugen Bleuler, psiquiatra
suíço, para descrever um dos sintomas da esquizofrenia no adulto. Segundo
Alberti (1999), para Bleuler, no autismo, o sujeito se encontra entre dois mundos,
o mundo autista e o mundo de relação com os outros seres humanos, sendo que
esses dois mundos são a realidade para ele. Para Bleuler, há níveis de abertura
e fechamento em relação ao mundo externo. Ao afastamento da realidade
Bleuler denominou autismo.
Leo Kanner, psiquiatra americano, tomou emprestado de Bleuler o termo
autismo e descreveu em 1943, pela primeira vez, onze casos de pacientes que,
segundo ele, padeciam de um distúrbio do contato afetivo, e que mais tarde ele
chamou de autistas.
Para Kanner, as crianças autistas apresentavam incapacidades e
impossibilidades, como por exemplo, de desenvolverem a comunicação e o
contato afetivo. Kanner enfatizou nessa época aspectos da deficiência e da falta
nas crianças autistas, aspectos negativos que ressoam nos nossos ouvidos e
são utilizados ainda hoje por muitos profissionais como sendo verdades
inquestionáveis.
Mais tarde, segundo Rocha (2001), Kanner revela-se fascinado com as
proezas dessas crianças que não condiziam com um mundo despovoado e
vazio como ele havia descrito anteriormente. Kanner também percebeu que elas
possuíam um bom vocabulário e excelente memória. Num texto publicado em
1946, Kanner diz então que não se pode afirmar a ausência de sentido da
linguagem nos autistas, indo na contramão do que havia dito anos atrás: que
essas crianças não tinham capacidade de desenvolver uma verdadeira
linguagem e não eram capazes de se comunicar. A conclusão a que chega
Kanner é que a linguagem dos autistas é metafórica e precisa ser traduzida.
A partir desse delineamento histórico, podemos compreender a criança
autista como um sujeito que ocupa um lugar na contemporaneidade e que
precisa ser ouvido nas suas singularidades. É um sujeito que às vezes se
mostra como um estrangeiro na escola, e que, parafraseando Kanner, merece
uma ―tradução‖. Diante disso, convidamos os profissionais que se dedicam a
trabalhar com alunos autistas a percorrerem conosco as trilhas que nos levam a
pensar na inclusão dessas crianças na escola, acreditando que, através do
Atendimento Educacional Especializado, poderemos dar aos alunos com
transtornos globais do desenvolvimento o lugar que merecem ocupar: de
sujeitos que demandam um saber tanto nosso quanto da escola.
DELINEANDO O CONCEITO DE AUTISMO
O autismo é um transtorno que associa algumas dificuldades da criança
em termos de interação social e comunicação, bem como um repertório restrito
de atividades e interesses (DSM IV-TR, 2002).
Leia-se ―repertório restrito‖ não como algo negativo que dá idéia de déficit,
mas como a forma encontrada pela criança de, por exemplo, através da
incessante repetição de uma atividade, fazer com que as coisas não mudem de
lugar, não sejam substituídas, o que poderia lhe causar ansiedade e confusão
pelo fato de não as encontrar no lugar em que deixou. Essa dificuldade poderá
ser entendida em função de que seu mundo simbólico e imaginativo é precário;
sendo assim, torna-se difícil para ela compreender que as coisas mudam de
lugar, mas continuam sendo as mesmas coisas; por esse motivo fala-se que os
autistas resistem a alterações na rotina.
De acordo com Fonseca (2009), os autistas são crianças que apresentam
atrasos na linguagem ou ausência no desenvolvimento da fala, o que às vezes
dificulta a manutenção de um diálogo. Os autistas poderão apresentar ecolalia
que é a repetição do que alguém acabou de dizer, incluindo palavras,
expressões ou diálogos.
A ecolalia deverá ser entendida como um importante processo na
tentativa de a criança começar a falar. É repetindo o que os outros dizem que a
criança começará a fazer um estoque de memória dos sons das palavras para
compreender o uso que é feito dessas palavras.
Em relação ao campo da fantasia, a imaginação também parece estar
comprometida, uma vez que as brincadeiras de faz-de-conta ou esconde-
esconde nos primeiros anos de vida encontram-se empobrecidas ou
inexistentes. Sabemos que essas brincadeiras são extremamente importantes,
pois são ferramentas de que a criança dispõe para elaborar conflitos,
dificuldades e medos próprios do processo de crescimento.
Uma característica interessante do pensamento autista é que são sujeitos
que não compreendem metáforas, ou seja, uma coisa não pode representar
outra coisa, ela tem um significado fechado, real, petrificado. Vejamos o exemplo
a seguir.
Antônio, um aluno autista que frequenta uma escola da rede pública de
Santa Maria-RS, andando pela sala de aula, esbarrou na lixeira e derrubou o
conteúdo da lata. A professora que já se encontrava incomodada com as
andanças de Antônio, ao ver a cena disse com certo rigor: ―Antônio, junta tudo!‖.
Imediatamente Antônio começou a juntar cada minúsculo pedaço de papel que
aos nossos olhos poderiam passar despercebidos. Vendo o comportamento e a
possível demora de Antônio na realização da tarefa, disse: ―Agora ele vai juntar
tudo‖. A professora esqueceu que para Antônio ―juntar tudo‖ significava
exatamente não deixar sequer um resquício de papel ou de qualquer outra coisa
que tivesse caído da lata, era literalmente: ―juntar tudo.‖
Sobre as relações sociais, crianças autistas poderão apresentar déficits
na interação com o outro que vão desde evitar o olhar e contato físico a uma
aproximação excessiva das pessoas. Mais adiante falaremos um pouco mais
sobre esse fato.
Outro aspecto importante a ressaltar é que as crianças autistas costumam
chamar-se pelo pronome ―tu‖, pois é assim que os outros a chamam; e chama
aos outros de ―eu‖, pois assim os outros chamam a si mesmos.
Movimentos repetitivos e estereotipados também são visíveis, como
bater insistentemente o apagador no quadro, permanecer por vários minutos
observando o ventilador de teto da sala-de-aula ou folhear compulsivamente as
páginas de uma revista. Os movimentos estereotipados poderão incluir o
balanceio de corpo e andar na ponta dos pés. Hoje se observa ainda o apego
por vídeos infantis ao passarem horas assistindo ao mesmo filme, usando o
controle remoto para repetir as partes que desejam ver. O mesmo acontece com
os CDs de músicas preferidas.
O AUTISMO NO DSM-IV-TR
O autismo aparece na quarta edição revisada do Manual Diagnóstico e
Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV), da Associação Americana de
Psiquiatria (1994) como um Transtorno Global do Desenvolvimento (TGD). Já na
décima edição do Código Internacional de Doenças (CID 10), o autismo aparece
no grupo dos Transtornos Invasivos do Desenvolvimento (TID). Tanto o CID 10
como o DSM são manuais internacionais que possibilitam que os profissionais
conversem entre si numa linguagem universal.
A expressão Transtornos Globais do Desenvolvimento se refere ao fato
de que múltiplas áreas do funcionamento são afetadas, principalmente a área da
interação social. Encontraremos também para designar a fenomenologia do
autismo, a terminologia Transtorno Invasivo do Desenvolvimento ou ainda
Transtorno Abrangente do Desenvolvimento. Essas são traduções para a
terminologia americana Pervasive Developmental Disorder. Para sermos fiéis à
Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva,
utilizaremos neste estudo a terminologia Transtornos Globais do
Desenvolvimento.
O DSM é um manual americano de diagnóstico que permite a
conversação entre profissionais de diferentes áreas sobre os transtornos
mentais. Apresenta a descrição e classificação dos fenômenos mentais através
de concepções neurobiológicas, não explicando os aspectos subjetivos
envolvidos nesses quadros, ou seja, a forma como cada sujeito autista vive as
suas dificuldades. É justamente aqui que queremos chamar a atenção para o
autismo, quando ele se apresenta na escola e quando esses aspectos
estruturais são menosprezados.
Sabemos da importância do diagnóstico como um balisador, um caminho
que nos dirá como cada sujeito vive sua condição e, dependendo da área em
que o profissional atuar, ele delimitará o tratamento e as intervenções
adequadas.
Já na escola, o diagnóstico deverá ajudar o professor a compreender
como a criança funciona a partir de determinado quadro, porém, não deve ser
um limitador das suas funções, comportamentos, tampouco uma profecia que
não dará chances de o aluno aparecer nas suas particularidades.
É fundamental ir além dos itens descritos no DSM para o diagnóstico do
autismo, pois só assim enxergaremos cada aluno como um sujeito único na sua
forma de se apresentar no mundo, evitando o caráter redutível do diagnóstico.
Nesse sentido, precisamos apostar na capacidade de aprendizagem do aluno,
convidando-o a interagir no contexto em que se encontra, enfatizando a
construção de um sujeito psíquico, ou seja, um aluno que poderá desenvolver
sua capacidade simbólica e de linguagem para dizer, mesmo que com simples
gestos, o que quer de nós e da escola. Esse é o efeito de uma docência pautada
no sujeito, e não no diagnóstico.
Para exemplificar a aposta no sujeito e não no diagnóstico, traremos a
seguir, conforme Verotti; Callegari (2009), um pequeno trecho do depoimento de
uma professora à revista Nova Escola, ao se referir ao seu aluno autista:
(...) Ela sabia que precisaria inovar se quisesse que Matheus aprendesse. E o primeiro desafio era mantê-lo em sala. ―Passei a iniciar as aulas do lado de fora. Todos os dias eu cantava, lia histórias ou sugeria alguma atividade que estimulasse a alfabetização ou outro aprendizado‖, lembra. ―Era uma forma de ensinar o conteúdo, promover a integração entre as crianças e atrair o Matheus para a classe‖. Para lidar com as fugas repentinas para o bebedouro - onde Matheus se acalmava mexendo na água -, a professora ensinou-o a pedir para sair. Mostrava, a cada fuga, que ele podia bater com a caneca na carteira quando quisesse beber água. ―Um dia, ele bateu a caneca e permaneceu sentado, esperando a minha reação‖, conta a professora Helen. ―Percebi que ele tinha aprendido.‖
A professora Helen nos ensina que a aposta no sujeito é sempre a melhor
escolha e que a inclusão de alunos com autismo requer um olhar diferenciado,
na medida em que nos coloca o desafio de quebrar velhos conceitos a respeito
do processo-ensino aprendizagem. A professora convida-nos a uma constante
interrogação sobre quem é o sujeito autista e como trabalhar a partir do seu
estilo cognitivo de aprendizagem.
Um fato interessante e que merece destaque é o aumento da incidência
de diagnósticos de autismo. Tal evento relaciona-se ao fato de que o DSM-IV-
TR retirou a psicose infantil do seu manual, o que fez com que o autismo se
tornasse o carro chefe dos Transtornos Globais do Desenvolvimento. O reflexo
disso é que hoje muitas crianças são diagnosticadas como autistas, quando na
verdade poderão não fazer parte do quadro, causando um aumento dos
diagnósticos e, consequentemente, um aumento do número de autistas.
Sobre a prevalência do autismo (MARCELLI; COHEN, 2009) relatam que
é de cinco sujeitos para cada 10.000 nascimentos. Já FONSECA (2009) aponta
para uma incidência mais alta do que se poderia imaginar: de 57,9 a 67,5/10.000
para toda a categoria, ou seja, de cada 148 a 170 crianças, uma estaria dentro
do grupo dos Transtornos Globais do Desenvolvimento. Percebe-se com isso
que há disparidades quanto ao número de autistas hoje e, como dissemos
anteriormente, esse poderá ser um dos efeitos dos diferentes critérios
diagnósticos empregados para o autismo.
DIAGNÓSTICO
O autismo se revela antes dos três anos de idade, podendo apresentar
indícios já no primeiro ano de vida da criança, quando os pais percebem que a
linguagem não se desenvolveu. O diagnóstico poderá ser feito por médicos,
psiquiatras infantis e neuropediatras, buscando sempre a interdisciplinaridade
com psicólogos, professores e demais profissionais que se ocupam da criança.
Para a detecção do autismo alguns especialistas (ARAGÃO, 2005)
aplicam um questionário conhecido como CHAT (Checklist for autism in
todlers)5. É um instrumento que interroga sobre o jogo social, o jogo simbólico, o
5 CHAT: Lista de verificação de autismo em crianças entre 0 e 24 meses aplicada por pediatras.
apontamento protodeclarativo (o fato de o bebê apontar com o dedo objetos que
acha interessante) que permitiria detectar o autismo a partir dos 18 meses.
Aragão (2005) sugere alguns sinais de alerta para os médicos quando
estes se deparam com crianças que possam apresentar algum problema no
desenvolvimento:
• Ausência de balbucio aos 12 meses;
• Ausência de gesto de tipo apontar ou tchau com a mão aos 12 meses;
• Ausência de palavra aos 16 meses;
• Ausência de comunicação de duas palavras aos 24 meses;
• Qualquer perda de competência (de linguagem ou social) em qualquer
idade.
Outro aspecto a ressaltar e que poderá nos ajudar na detecção de
transtornos no desenvolvimento diz respeito à forma como as crianças com
suspeita de autismo respondem a sons como: aspirador de pó, liquidificador,
vozes altas, choro e barulho excessivo de crianças. Nesses momentos
costumam gritar e colocar as mãos nos ouvidos para se protegerem do barulho.
Sabe-se que o autista possui uma hipersensibilidade a sons (hiperacusia)
e ao toque humano (defensividade tátil), sendo assim, qualquer som um pouco
mais intenso poderá ferir enormemente seus ouvidos, causando sério
desconforto e agitação. Nesses momentos poderão usar de estereotipias como
o balanceio de corpo ou das mãos como forma de dizerem o quanto a situação
está difícil de ser compreendida e o quanto esse outro a está invadindo com seu
barulho e contato físico. São respostas a reações de angústia frente ao
desconhecido, bem como uma resposta à tentativa insistente do adulto de entrar
em contato com a criança.
Conforme Alberti (1999), é como se os sujeitos autistas fossem
perseguidos pela voz e pelo olhar do outro. Nesses casos, o mais apropriado
talvez seja que as abordemos de costas, escondendo-nos um pouco e
cantarolando, como se esse chamado fosse mais um barulho do que uma voz.
Segundo Jerusalinsky (2005, p. 57-58), os pais poderão suspeitar de um
quadro de autismo quando a criança apresentar os seguintes signos
(manifestações):
A criança parece surda, mas não é. Isso indica que ela registra
sons, mas é indiferente à voz humana. Nesses casos é importante
uma consulta ao pediatra, neuropediatra ou psiquiatra infantil para
um diagnóstico mais específico;
Se a criança está com doze meses e ainda não balbucia e há
ausência de gesto de tipo apontar ou dar tchau, ou se está com
dezesseis meses e não fala;
Se a criança evita olhar o rosto dos seres humanos e desvia o
contato olho no olho;
Se a criança com mais de cinco meses não reconhece a voz
melodiosa (―mamanhês‖) com que seus pais falam com ela
procurando-os com movimentos de cabeça ou se posicionando
melhor para vê-los ou ouvi-los;
Se a criança tem mais de oito meses e não sorri para agradar seus
pais e não demonstra ansiedade quando é tomada nos braços por
estranhos;
Se a criança apesar de estar com oito meses não reconhece seus
brinquedos e tampouco imita comportamentos tentando reproduzir
brincadeiras quando é solicitada, como por exemplo, bater
palminhas, fazer bolinhas de saliva, botar a língua, balançar a
cabeça, dançar.
Vale lembrar que esses signos, quando tomados isoladamente, não
perfazem o quadro do autismo, porém são signos de suspeita.
Trazendo mais uma vez as contribuições de Jerusalinsky (2008),
podemos observar aspectos relacionados ao brincar como um possível indicador
de dificuldades na constituição psíquica da criança.
Segundo o autor, é importante notarmos se a criança somente manipula
os objetos e brinquedos de forma mecânica ou interage com eles, montando
cenas, situações habituais que representem o cotidiano. Por exemplo: ao brincar
com pratinhos, xícaras e talheres ela encena uma situação de café da manhã
colocando café na xícara, mexendo o açúcar e oferecendo para o outro ou
simplesmente vira, remexe, manipula os objetos de forma estereotipada sem
objetivo algum? Esses são indícios que revelam inibições e pobreza expressiva
no brincar, denotando que algo não vai bem com sua estruturação.
Comportamentos expressos no brincar de crianças pequenas, como no
caso de alunos da educação infantil, poderão estar visíveis aos olhos do
professor, contribuindo para que de alguma forma a escola seja parceira na
prevenção de futuros problemas de desenvolvimento.
Vimos até aqui um pouco do histórico do autismo, a fim de
compreendermos o conceito e as raízes desse transtorno; conversamos a
respeito das manifestações do comportamento autista, buscando sempre ver o
aluno para além do reducionismo de um diagnóstico. Direcionando-nos agora
para o término dessa escrita sobre o autismo, gostaríamos de compartilhar
algumas reflexões sobre o papel da escola frente à inclusão de alunos com
autismo, e de todos aqueles alunos que se apresentam a partir de uma
subjetividade que lhes é própria:
• Que a escola se deixe interrogar pelo aluno com transtornos
globais do desenvolvimento para que, através das dúvidas surgidas pelo
caminho, ela possa se questionar sobre o que é educar e sobre quem é
esse aluno;
• Que a escola permita ao aluno inventar uma trajetória possível
para que ele possa falar de si através do desenho, da escrita ou da sua
―simples‖ presença em sala de aula, saindo assim do lugar de isolamento
e exclusão a que está submetido;
• Que a escola se deixe tomar pelas dúvidas e interrogações sobre
a inclusão de alunos com transtornos globais do desenvolvimento,
abalando supostas certezas sobre o processo ensino-aprendizagem
desses alunos.
Acreditamos que é no momento em que a escola pode se
interrogar sobre suas práticas que o novo aparece, não como efeito de
uma receita sobre como educar alunos com necessidades educacionais
especiais, mas, sim, como resultado de um passado que foi possível
elaborar a partir de questionamentos sobre o que é ensinar e o que é
aprender.
B.2.3 –Transtorno Desintegrativo da Infância (TDI)
O transtorno desintegrativo da infância (TDI) foi inicialmente descrito por
Theodore Heller, um educador austríaco, em 1908. Heller relatou o caso de seis
crianças que, após um desenvolvimento aparentemente normal nos quatro
primeiros anos de vida, apresentaram uma grave perda das habilidades de
interação social e comunicação.
Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Distúrbios Mentais (DSM-
IV-TR) 2002, o transtorno desintegrativo da infância é também conhecido como
Síndrome de Heller, Demência Infantil ou Psicose Desintegrativa. A atual
Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva
usa a terminologia transtorno desintegrativo da infância (psicoses) ao se referir
ao público alvo do Atendimento Educacional Especializado.
Para fins deste estudo, queremos fazer uma ressalva a respeito do texto
que vocês encontrarão a seguir.
Sem desmerecer a cientificidade do DSM-IV-TR, acreditamos que as
características apresentadas para o transtorno desintegrativo da infância
refletem uma visão mais pragmática e imediatista através de sinais e sintomas,
não levando em conta a forma como o sujeito vive sua condição. É, portanto,
uma classificação que merece ser estudada com cautela para que não se torne
mais um rótulo, empobrecendo a perspectiva do sujeito, impossibilitando a
leitura do professor sobre o aluno que se apresenta com esse diagnóstico na
escola.
Ratificando mais uma vez a importância do DSM, porém tendo em vista a
necessidade de ampliarmos sua visão, traremos a seguir um pequeno aporte da
visão psicanalítica a respeito da psicose. Essa escolha diz respeito ao fato de
que a Psicanálise traz pontuais contribuições a respeito dos aspectos psíquicos
envolvidos no diagnóstico desses transtornos, bem como oferece
questionamentos que poderão nos auxiliar para uma visão abrangente da
psicose na escola. Vale lembrar ainda que, para a Psicanálise, a psicose infantil
é uma estrutura diferente do autismo e dos demais transtornos globais do
desenvolvimento tratados neste módulo.
A VISÃO DO DSM-IV-TR
A principal característica do transtorno desintegrativo da infância (TDI) é
surgir após um período de dois anos de desenvolvimento normal e aparecer
antes dos dez anos de idade. O TDI é acompanhado de uma regressão das
aquisições já adquiridas nas seguintes áreas:
Linguagem expressiva ou receptiva;
Habilidades sociais ou comportamento adaptativo;
Controle esfincteriano;
Jogos ou habilidades motoras
De acordo com Marcelli; Cohen (2009), no transtorno desintegrativo da
infância, a perda das aquisições afeta particularmente a comunicação e a
linguagem. O DSM-IV-TR enfatiza ainda que os indivíduos com esse transtorno
exibem os déficits sociais, comunicativos e de comportamento observados no
Transtorno Autista.
Quanto à prevalência, o TDI é um quadro muito raro e específico de
psicose e não se refere a todas as psicoses. O início do quadro se dá por volta
dos três ou quatro anos e os principais indícios de instalação do transtorno
incluem o aumento da irritabilidade e ansiedade, bem como a perda da fala e do
interesse pelo ambiente.
ALGUMAS REFLEXÕES DA PSICANÁLISE PARA O ENTENDIMENTO
DA PSICOSE INFANTIL
Para compreendermos a psicose infantil pelo viés da psicanálise, é
preciso que primeiramente falemos sobre como um sujeito se constitui, bem
como as falhas que poderão ocorrer nessa trajetória, caso ocorram impasses na
constituição.
Na visão psicanalítica, o sujeito se constitui, ou seja, não está ali desde o
início. Por isso se afirma que o bebê é um ―bolo de carne‖ ou, para usar a
definição de Lajonquière (2003), um acúmulo de partes: um monte de carne,
unhas e cabelos, que para vir a se constituir como sujeito precisa de um Outro
primordial6 (geralmente a mãe) que oferecerá à criança um lugar de existência.
Para que um bebê se constitua como sujeito, é preciso que a mãe ou
quem exerça essa função delimite a geografia do corpo da criança numa
espécie de mapeamento corporal através da fala, dos toques, dos carinhos. Um
exemplo disso é o deleite que a criança sente quando a mãe durante as trocas
,por exemplo, beija, aperta, abraça esse sujeitinho contornando cada segmento
do seu corpo através de um ―banho de palavras‖. É durante esse encontro que
um organismo que é inicialmente biológico passará a existir e ocupar um lugar
na família.
Esse é o momento inicial de constituição do sujeito, chamado tempo de
alienação, um tempo que é fundamental para que o bebê se constitua, sendo
tomado pelo desejo materno. Diz-se que a alienação é uma das operações de
causação do sujeito. O outro momento fundante do sujeito é o tempo da
separação (LAZNIK-PENOT, 1997).
Se a alienação é necessária para que o sujeito possa advir, é preciso,
também, que se opere a separação para que a criança possa se afastar do laço
6 Para BERNARDINO (2006, p. 31), “o bebê possui reflexos que só funcionam quando encontram
alguém para dar sentido – direção, significado, sensibilidade – a eles. (...) um Outro primordial que, com suas palavras, seu olhar e seus toques, marca-o com seu desejo, sua imagem. Só assim que um ―desenvolvimento‖ poderá se dar.‖
maciço que a liga à mãe, podendo viver como um sujeito separado dela. A
separação é operada pela função paterna.
A função paterna é exercida pelo pai ou por outra pessoa que ocupe esse
lugar, às vezes um tio, avô, ou até mesmo alguém que não tenha uma ligação
direta com a família, porém é alguém que a mãe admira e tem como referência
para si enquanto figura representativa da lei. É importante mencionar que a
função paterna é simbólica, ou seja, na falta de uma pessoa que a realize, essa
poderá ser exercida, por exemplo, pelo ator da novela da oito por quem a mãe
nutre certa admiração. Ela tomará as falas desse personagem e transformará
em lei os seus ditos toda a vez que se dirigir ao filho.
Com a entrada do pai na relação, o bebê sai da posição de único objeto
de desejo da mãe que em função disso passa a realizar as atividades
anteriormente exercidas, retomando sua vida. Esse geralmente é o momento em
que a mãe retorna ao trabalho, vai para a academia de ginástica, volta a se
enfeitar para o marido, etc. É um importante momento tanto para a mãe quanto
para o bebê.
E quando essa separação não acontece e a mãe toma essa criança para
si impedindo que o bebê também busque outras pessoas e experiências além
daquelas proporcionadas por ela? Podemos dizer que o pai (simbólico) não
conseguiu entrar nessa relação, operando a separação; dizemos que falhou a
função paterna. Nesse caso, mãe e filho formarão uma célula, permanecerão
fusionados e um quadro de psicose poderá se instalar.
Para tanto, na psicose, falha a função paterna, essa que porta a lei e
interdita o vínculo mãe-bebê, lançando o sujeito para a vida. A criança psicótica
fica então capturada aos desejos da mãe, não conseguindo dela se separar. Tal
situação fará com que a criança tenha grandes dificuldades de ocupar o lugar de
sujeito na vida.
Para ilustrarmos um dos efeitos da não instalação dessa função, traremos
a seguir um exemplo que reflete as falhas nesse processo quando observado na
escola.
Letícia, com diagnóstico de psicose e aluna de uma escola pública, não
conseguia permanecer em sala com seus colegas. Fugia para o parquinho e
ficava correndo entre os brinquedos. Gostava muito de ficar na sala da recepção
da escola até o dia em que encontrou o filho da diretora que trabalhava na
secretaria. Esse, ao vê-la fora da sala, falou em alto e bom tom que ela
retornasse imediatamente para junto de seus colegas e que aquele era o
momento de estar estudando. O rapaz a partir desse dia ocupou simbolicamente
para Letícia o lugar paterno, aquele que a interditava toda vez que ela ultrapassa
as regras da escola. Letícia fez outras investidas e muitas fugas se sucederam,
porém, a professora lembrava-lhe que o filho da diretora havia dito que ela não
poderia sair da sala à hora que quisesse. Aos poucos ela foi se organizando e
saindo menos da sala de aula.
Não se sabe por que Letícia tomou a figura do filho da diretora como o
representante da lei, o que sabemos é que às vezes essas crianças elegem um
personagem e passam a tê-lo como referência. Nesse caso, um feliz encontro
aconteceu entre Letícia e o filho da diretora. Este conseguiu ocupar o lugar da
lei, exercendo a função paterna: aquele que diz ―não‖ e organiza, de certa forma,
a vida escolar de Letícia.
B.2.4 – Síndrome de Asperger
A síndrome de Asperger foi descrita pela primeira vez pelo médico
pediatra vienense Hans Asperger, em 1944. Nesse estudo, Asperger descreveu
quatro casos clínicos que denominou de Psicopatia Autística. Essa descrição
aconteceu um ano após o trabalho de Kanner sobre o autismo. Asperger
realizou seu estudo sem conhecer o trabalho de Kanner. Na década de 50,
Asperger, tomando conhecimento do que Kanner havia proposto, reconheceu
certas semelhanças entre os casos descritos. Porém, em 1979 afirmou tratar-se
de dois quadros distintos (SCHWARTZMAN, 1991; ROBALLO, 2001).
O estudo de Asperger não se tornou muito conhecido por ter sido
publicado na língua alemã. Em 1981, quase quarenta anos após a primeira
publicação, Lorna Wing, psiquiatra britânica, publicou um trabalho
sistematizando o quadro, chamando-o de síndrome de Asperger. Apenas em
1994 essa síndrome foi reconhecida e incluída no DSM-IV.
Para iniciarmos nossa compreensão do que é a síndrome de Asperger, é
interessante pontuarmos que os sujeitos com essa síndrome podem ser
considerados autistas de alto nível.
Nos sujeitos com síndrome de Asperger, os signos autistas se
apresentam de forma mais moderada, mais sutil. São pessoas que possuem
interesse intenso em uma área do conhecimento, podendo ser atraídos por
rituais. São inteligentes (geniais em sua área de interesse), têm memória
privilegiada7, possuem particularidades na linguagem e dificuldades na interação
social. Em função dessas peculiaridades, as pessoas com síndrome de
Asperger são consideradas excêntricas, estranhas.
Acreditamos que a síndrome de Asperger é uma forma singular de estar
no mundo, é um modo de ser do sujeito. Lançando esse olhar, poderemos
perceber as especificidades desses sujeitos sem tentar adequá-los a um padrão
de normalidade estabelecido. Essa concepção irá permear toda a nossa
discussão sobre essa síndrome.
Para fins didáticos, destacaremos quatro pontos relevantes para
entendermos a síndrome de Asperger, sempre considerando que cada sujeito é
único e terá o seu próprio estilo cognitivo.
O primeiro ponto diz respeito às áreas de interesse especial. Esses
sujeitos possuem interesse em determinada área do conhecimento e se
especializam nela. Como exemplo, podemos citar o caso de uma criança que é
uma sumidade no conhecimento de animais pré-históricos. Essa criança sabe
tudo sobre dinossauros: de onde vieram, onde viviam, o tipo de DNA, se eram
7 Schwartzman (2009) relata o caso de um menino de Manaus em que fica evidente essa
capacidade de memorização. Esse garoto sabe de cor o mapa cartográfico de Manaus, desenhando todas as ruas da cidade e colocando, inclusive o nome das lojas e o número dos telefones.
carnívoros ou herbívoros, etc (SCHWARTZMAN, 2009). É possível citar ainda o
exemplo, do próprio Asperger, ao dizer que uma criança que revelava certo
fascínio por transportes, memorizou as linhas de bonde da cidade de Viena
(BAUER, 1995). É importante destacar que em alguns sujeitos a área de
interesse pode se modificar, sendo substituída por outra.
As pessoas com síndrome de Asperger possuem alguma capacidade
genial em um campo específico como, por exemplo, os números, os transportes,
a leitura ou a biologia de certos animais. Elas são capazes de entrar em contato
direto com o campo do saber sem a intermediação do outro (pais ou
professores). Assim, podem aprender a ler sozinhos ou aprender cálculos
matemáticos complexos por conta própria.
De acordo com Schwartzman (2009), a diferença entre os sujeitos com
síndrome de Asperger e os gênios é sutil, de forma que, quando são pequenos,
é difícil distingui-los de uma pessoa com altas habilidades/superdotação. O autor
cita os exemplos de duas pessoas conhecidas, Mozart e Santos Dumont, com
capacidade genial e comportamento excêntrico, porém com dificuldade na
interação social. Esses personagens poderiam ter sido diagnosticados como
portadores da síndrome de Asperger:
Não pretendo fazer um diagnóstico à distância, mas há alguns exemplos que vale a pena mencionar. Provavelmente, Mozart tinha um distúrbio de desenvolvimento que é típico dos portadores da síndrome de Asperger. Ele compôs a primeira obra importante aos cinco anos, o que é maravilhoso, mas não é normal. Além disso, tinha enormes dificuldades de relacionamento. Seu casamento foi um desastre e seu comportamento era absolutamente inadequado. Se analisarmos a vida de Santos Dumont, veremos que era um indivíduo isolado, com pouquíssimo relacionamento social e, como a maioria dos autistas, vestia sempre o mesmo tipo de roupa. Aliás, os autistas costumam manter a rotina de forma absolutamente rígida. Conheço
alguns que usam a mesma calça jeans durante cinco anos.
Os exemplos citados evidenciam além da genialidade, tratada no
primeiro ponto, o segundo aspecto que abordaremos nesse momento: a
dificuldade na interação social.
As crianças com síndrome de Asperger possuem dificuldades no
relacionamento com outras pessoas, havendo pouca efetividade nas interações.
Esses sujeitos possuem dificuldade em compreender as regras sociais e o ponto
de vista do outro, parecendo desajeitados no plano social. Segundo Bauer
(1995, p.4):
Eles parecem ter dificuldade para aprender a fazer ―conexões sociais‖. Gilbert descreveu isso como uma ―desordem de empatia‖, a inabilidade de efetivamente ―ler‖ as necessidades e as perspectivas dos outros e responder apropriadamente. Como resultado, crianças com AS tendem a ler errado as situações sociais e suas interações e suas respostas são frequentemente vistas como ―ímpares‖.
Schwartzman (2009) enfatiza que, apesar da dificuldade de interação
social, os sujeitos com síndrome de Asperger aprendem formas de interagir com
o outro através do intelecto. O autor relata um exemplo que esclarece essa
questão:
Tenho pacientes relativamente bem integrados socialmente. Outro dia, conversando com um rapaz que acompanho faz tempo, perguntei-lhe se tinha namorada. Ele me disse que já tinha tido três. Quis saber, então, como fazia para relacionar-se com essas moças. ―Olhe, Salomão, é muito simples. Comprei um livro de auto-ajuda e agora conheço algumas regras básicas de aproximação. Primeira regra: vista-se de acordo, isto é, ponha roupas que combinem. Regra dois: dirija-se a um shopping center. Ali, você anda pra lá e pra cá e, se vir uma menina bonita, chegue perto e peça o telefone. Se ela der o número, anote para não esquecer e vá embora. Regra três: não deixe de telefonar-lhe nas próximas 24 horas. Caso contrário, ela poderá não se lembrar mais de você.‖
Podemos perceber através desse caso que o sujeito encontrou uma
maneira de namorar, apesar da dificuldade na interação social. Ele elaborou
uma espécie de manual, utilizando para isso a leitura de um livro de auto-ajuda.
Pensamos que a estratégia utilizada pelo rapaz possa servir de inspiração para
os professores: quais estratégias, formas criativas de ensinar, podem ser
utilizadas, levando em consideração a singularidade em sala de aula?
O terceiro ponto que gostaríamos de destacar é a diferença na forma de
utilizar a linguagem. Os sujeitos com síndrome de Asperger, normalmente, não
possuem dificuldade no desenvolvimento da fala, mas é interessante
observarmos que existem algumas particularidades nesse aspecto. O
vocabulário utilizado pode ser inadequado devido ao rebuscamento exagerado.
Além disso, ―utilizam-se de certas palavras e expressões de modo estereotipado
e repetitivo. Sua fala é peculiar por alterações no ritmo, entonação, altura e
timbre. Tem-se a impressão de algum sotaque de língua estrangeira‖
(SCWARTZMAN, 1991, p.19).
A compreensão da linguagem também ocorre de forma singular, uma vez
que esses sujeitos possuem dificuldade em compreender metáforas ou
significados implícitos, interpretando tudo de forma literal. A frase ―vai chover
canivete‖, por exemplo, pode levá-los a se esconderem com medo de serem
atingidos por um canivete (SCHAWARTZMAN, 2009).
Schwartzman (2009) ilustra, através do relato abaixo, essa dificuldade de
compreensão:
Tenho um menino de 8 anos que pôs fogo no porão da casa. Quando viu a fumaça, saiu correndo, mas cruzou com o pai que lhe falou: ―Muito bem, veja só o que você fez‖. Passada a confusão, o menino perguntou -lhe se havia gostado do que tinha feito. O pai disse que não, pois ele poderia ter acabado com a casa. ―Por que você falou muito bem, então?‖, indagou o garoto. O pai que estava bem a par da dificuldade do filho explicou-lhe que, em português, a expressão ―muito bem‖ pode significar tanto ―muito bem‖, quanto ―muito mal‖. Meses mais tarde, esse garoto foi ao consultório e eu lhe pedi que fizesse um desenho. Era a época do desastre de 11 de setembro, e ele desenhou as duas torres e os aviões. Quando me mostrou o que havia feito eu disse ―Muito bem, João‖. Ao ouvir essas palavras, ele se levantou, pôs as mãos na cintura e quis saber a qual muito bem eu estava me referindo. Sua pergunta mostra que ele sabe que a expressão admite mais de um sentido, mas não a contextualiza.
Esse exemplo demonstra como a linguagem se apresenta de forma
singular nas pessoas com Asperger. O menino referido tem dificuldade em
compreender qual o sentido da expressão ―muito bem‖ utilizada em diferentes
contextos. Citaremos outro exemplo acontecido durante o atendimento
educacional especializado do aluno Rafael, com síndrome de Asperger.
Rafael tem 12 anos e frequenta a 6ª série de uma escola regular. Após
concluir uma pintura com tinta guache, a professora solicitou que ele lavasse os
pincéis. O aluno pegou o copo com água e os pincéis que estavam dentro para
serem lavados. Quando voltou, Rafael trouxe os pincéis agora limpos dentro do
copo com a mesma água suja de tinta. Assim, que viu o copo a professora
chegou a pensar que ele não havia lavado os pincéis, porém, logo após
percebeu o que havia ocorrido. Perguntou se Rafael havia lavado os pincéis; ele
disse que sim. Vendo que Rafael havia lavado os pincéis, porém não havia
colocado fora a água do copo solicitou que assim o fizesse. Em seu primeiro
pedido a professora não especificou que gostaria que Rafael lavasse os pincéis
e o copo, uma vez que considerou ser essa uma atitude óbvia. Para Rafael não
foi tão óbvio assim. Ele não havia entendido que deveria lavar os pincéis, jogar
fora a água e lavar o copo. Na semana seguinte, novamente trabalhando com
tinta, a professora solicitou que Rafael fosse ao banheiro e lavasse os pincéis.
Rafael já saindo da sala, voltou e perguntou: ―Lavar o copo também?‖ A
professora respondeu que sim.
Por fim, trataremos do quarto e último ponto acerca da síndrome de
Asperger: a descoordenação motora. Diversos autores destacam que esses
sujeitos podem ser desajeitados fisicamente, com andar ―duro‖ e dificuldade em
jogos que envolvem a coordenação motora ampla. Além disso, eles podem
apresentar dificuldade na motricidade fina, ocasionando problemas de caligrafia,
por exemplo.
É possível percebermos, através da discussão estabelecida até aqui, que
os sujeitos com síndrome de Asperger têm uma forma peculiar de estar no
mundo e lidar com situações que para nós parecem simples, como lavar alguns
pincéis. Esse fato deve ser considerado quando recebemos um aluno com
síndrome de Asperger em nossa escola.
No início do texto afirmamos que esses sujeitos podem ser atraídos por
rituais, por rotinas. É imprescindível que observemos no contexto escolar
quando alguma mudança na rotina causa ansiedade ou desconforto a esse
aluno. Podemos usar o diálogo como estratégia, conversando com o aluno sobre
alguma mudança futura ou sobre uma possível alteração na rotina.
Quanto à linguagem oral e compreensiva desse aluno, é importante que o
professor considere suas ―estranhezas‖, pois assim saberá como agir diante de
um aluno que sabe tudo a respeito de determinada área do conhecimento, mas
que pode ter dificuldade em compreender expressões como ―chover canivete‖,
―a casa caiu‖, ―estou com a corda no pescoço‖, ―recebi a mesada‖.
A área de interesse dos sujeitos com a síndrome de Asperger deve ser
considerada ponto chave no trabalho pedagógico. O professor pode partir do
conhecimento em que esses alunos se especializaram, ou seja, de sua
capacidade genial, acompanhando e ampliando as áreas de interesse.
As áreas de interesses podem ser trabalhadas de forma transversal com
os demais conteúdos curriculares estabelecidos pelo professor ou pelo próprio
aluno que fará as possíveis relações. Além disso, o aluno pode apresentar aos
colegas o conhecimento que possui em determinada área, suas descobertas e
novas conexões. Essa é uma forma de o espaço escolar se tornar
extremamente rico para todos os alunos, além de valorizar e dar lugar ao estilo
cognitivo dos alunos com síndrome de Asperger.
Para finalizar nossa discussão traremos uma reflexão de Rodriguez
(2006,p.185) acerca dos sujeitos com síndrome de Asperger:
Não compreendem metáforas, não aceitam mentiras, não fofocam, não entendem porque as pessoas cumprem e descumprem os acordos e regras com facilidade; podem reagir e conviver socialmente; são inteligentes com excelente memória; obstinados, dedicados e não percebem a desistência como algo possível; mas, podem ser abandonados, ridicularizados, ―perdidos‖ em suas habilidades, deixados sós em seus mundos.
Portanto, não deixemos de investir nesses alunos por serem ―diferentes‖
dos demais na escola. É fundamental que sigamos mais além, endereçando um
olhar de aposta, desafiando-os para o alcance de novos objetivos e conquistas.
B.2.5 – Transtornos Invasivos sem outra especificação
Esses transtornos surgem após um período de desenvolvimento normal,
ocorrendo regressão em habilidades já adquiridas pela criança, bem como o
aparecimento de signos autistas. Essa regressão acontece especialmente na
comunicação e na linguagem (COHEN; MARCELLI, 2009).
Para uma melhor compreensão dos transtornos, traremos os critérios
diagnósticos do DSM-IV-TR (2002):
Esta categoria deve ser usada quando existe um prejuízo severo e invasivo no desenvolvimento da interação social recíproca ou de habilidades de comunicação verbal ou não-verbal, ou quando comportamento, interesses e atividades estereotipados estão presentes, mas não são satisfeitos os critérios para um Transtorno Invasivo do Desenvolvimento específico, Esquizofrenia, Transtorno da Personalidade Esquizotípica ou Transtorno da Personalidade Esquiva. Esta categoria inclui, por ex., "Autismo Atípico" — apresentações que não satisfazem os critérios para Transtorno Autista em vista da idade tardia de seu início, apresentações com sintomatologia atípica, sintomatologia subliminar ou todas acima.
Como vimos, para o fechamento de um diagnóstico de Transtornos
Invasivos sem outra especificação, devem ser excluídas as hipóteses de
autismo, síndrome de Asperger, síndrome de Rett e transtorno desintegrativo da
infância (psicose), além de outros transtornos que foram citados acima.
UNIDADE C – As vicissitudes na inclusão de alunos com Transtornos
Globais do Desenvolvimento
Nesta unidade discorreremos acerca das vicissitudes, ou seja, os
caminhos que a inclusão dos alunos com Transtornos Globais do
Desenvolvimento poderá tomar, enriquecendo o texto com exemplos do
cotidiano da escola.
A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva é clara quando afirma que esses alunos, assim como os alunos com
deficiência e altas habilidades/superdotação, devem estar incluídos no sistema
regular de ensino, recebendo o atendimento educacional especializado (AEE) no
contra turno do ensino comum. Diante disso, propomo-nos a realizar algumas
reflexões que possam contribuir com o trabalho dos professores na escola, tanto
dos profissionais que realizam o AEE quanto dos professores do ensino regular
que recebem esses alunos.
Como vimos nas unidades anteriores, esses transtornos dificultam o
estabelecimento das relações sociais e a inserção desses sujeitos na vida.
Sendo assim, esses sujeitos se apresentam de forma singular no universo
escolar, com uma forma própria de estar no mundo. As singularidades desses
sujeitos, muitas vezes, podem angustiar o professor, podendo, no início, levá-lo
a crer que não saberá trabalhar com esses alunos ou mesmo que esses sujeitos
não se beneficiarão da escola.
As representações acerca desses alunos são, em sua maioria,
depreciativas, enfatizando o que eles supostamente não fazem. Cavalcanti;
Rocha (2001, p.26) revelam as representações mais propagadas acerca do
autismo:
A figura sombria de uma criança de costas sob uma redoma de vidro (...), assim como os pequenos desenhos de crianças tapando os olhos e os ouvidos com as mãos (...), as crianças são descritas como sujeitos que não falam não se comunicam, não brincam, não estabelecem relações com as pessoas, isoladas em seus mundos enigmáticos e despovoados.
É notório que essas representações estão associadas à idéia de
impossibilidade, enfatizando o que o sujeito com autismo supostamente não
pode, não consegue, não faz. As autoras citam, ainda, metáforas utilizadas por
diversos autores ao se referirem a esses alunos: ―Fortalezas Vazias‖,
―Carapaças‖, ―Conchas‖ ou ―Tomadas Desligadas‖. Todas essas representações
reforçam a idéia de déficit.
Com relação aos sujeitos psicóticos, evidentemente a realidade não é
diferente. Yañez (2001, p.193) apresenta as frequentes queixas com relação à
criança psicótica: ―‗parece estar desligada‘, ‗fica colada na gente‘, ‗ não brinca,
desmonta e destrói todos os brinquedos‘, ‗não obedece às ordens‘ (...)‖.
A fim de refletirmos sobre essas representações de impossibilidade, é
interessante pensarmos acerca da interrogação de Teresa Campello
apresentada por Cavalcanti; Rocha (2001, p.39): ―O que essas crianças têm?
Vocês só falam o que elas não têm‖. De fato dá-se ênfase ao que psicóticos e
autistas não conseguem realizar. Evidentemente que isso irá influenciar o
processo de ensino, uma vez que diante dessas ―incapacidades‖ o professor
acaba desacreditando da capacidade de aprendizagem desses alunos.
Jerusalinsky (2001) discorre acerca da antecipação do fracasso, quando
os pais têm um filho com uma patologia orgânica. Sabe-se que a suposição de
sujeito é determinante para que esse sujeito possa advir. Assim, segundo o
autor:
O que se espera, o que se imagina do futuro de uma criança, é posto em jogo em cada uma das demandas que lhe são supostas e que lhe são dirigidas. Por isso, as mesmas podem ser silenciadas quando se supõe que o bebê é incapaz de produzi-las ou a elas responder. E assim, tal incapacidade pode acabar se cumprindo no bebê- mesmo que não haja nada da patologia orgânica que assim o determine – por efeito das expectativas engendradas desde o imaginário parental (p.39).
A partir das afirmações de Jerusalinskyi, é possível pensar essa questão
no contexto educacional. A incapacidade de aprender pode acabar se cumprindo
no aluno, assim como no bebê, se o professor não conseguir supor naquele
sujeito, independentemente de sua singularidade, alguém capaz de aprender.
Assim, se o professor antecipar o fracasso, o aluno poderá responder colando-
se à imagem daquele que não aprende, a fim de assegurar esse lugar no qual é
reconhecido pelo professor.
É bom ressaltar que os alunos com transtornos globais do
desenvolvimento desenvolvem a capacidade de aprendizagem. Kupfer; Petri
(2000) ressaltam que as crianças com autismo e psicose possuem ―ilhas de
inteligência‖ preservadas. A essas ilhas de inteligência é preciso dar sentido,
para que não desapareçam nem virem estereotipias. Segundo as autoras, a
escola é fundamental para o crescimento ou para a conservação das
capacidades cognitivas que essas crianças já adquiriram.
É possível irmos mais além e pensar que a instituição escolar poderá ter
valor terapêutico para esses sujeitos. Assim, de acordo com Kupfer (2001, p.91),
a escola oferece mais do que uma oportunidade de aprender:
Como alternativa ao Outro desregrado, a escola entendida como discurso social, oferece à criança uma ordenação, oferece as leis que regem as relações entre os humanos, que regem o simbólico, para delas a criança tomar o que puder. Aposta-se com isso no poder subjetivante dos diferentes discursos que são postos em circulação no interior do campo social (...).
É precisamente por produzir efeitos subjetivantes, oferecendo leis,
ordenação, que ir à escola tem valor terapêutico para crianças com impasses
subjetivos. Portanto, a escola desempenha um papel importante na vida dessas
crianças, podendo contribuir para a retomada da estruturação perdida pelo
sujeito.
Além disso, segundo Kupfer (2001), a escola oferece um lugar social.
Toda criança vai à escola, de forma que o significante criança está ligado ao
significante escola. Na escola o aluno recebe, conforme a autora, o ―carimbo de
criança‖. Essa designação de lugar social é importante para essas crianças com
dificuldades em estabelecer laço social.
Jerusalinsky (2004, p.150) também ressalta a importância do significante
escola para essas crianças:
(...) a escola não é socialmente um depósito como o hospital psiquiátrico, a escola é um lugar para entrar e sair, é um lugar de trânsito. Além do mais, do ponto de vista da representação social, a escola é uma instituição normal da sociedade, por onde circula, em certa proporção, a normalidade social. Portanto alguém que frequenta a escola se sente geralmente mais reconhecido socialmente do aquele que não frequenta. É assim que muitos de nossos psicóticos púberes ou adolescentes reclamam que querem ir à escola como seus irmãos, precisamente porque isso funcionaria para eles como um signo de reconhecimento de serem capazes de circular, numa certa proporção, pela norma social. E efetivamente isso acaba tendo um efeito terapêutico (...).
O fato de os alunos com psicose ou autismo frequentarem a escola
produz efeitos terapêuticos e subjetivantes para a criança com Transtornos
Globais do Desenvolvimento, evidenciando a importância da escolarização. Em
face a isso, é importante que o professor invista na capacidade de aprender
desses alunos, lançando um olhar que os retire da solidão em que muitos se
encontram.
A fala de uma professora da rede pública de Santa Maria-RS, que
trabalha com alunos autistas e psicóticos, demonstra o quanto podemos nos
surpreender com esses sujeitos: ―O Mauricio chegou, eu lembro que ele era o
que tinha mais características, porque o Vagner conversa contigo, se relaciona.
Mas com o Mauricio eu me surpreendia quando eu dava ordens para ele e ele
atendia. Ver que ele progrediu de certa maneira e isso me surpreende bastante.
Me surpreendia, porque eu não esperava, como ele não tem linguagem oral,
fala, tu imagina que ele não vai te entender, também. Só que ele demonstrou
que ele me entende. Ele faz as coisas que eu peço. E isso é bem interessante.
Até quando a gente trabalha com jogos, que ele consegue fazer a atividade que
tu imagina que ele não vai conseguir. Nesse sentido eu me surpreendi”.
O depoimento dessa professora evidencia que o professor que trabalha
com esses alunos deve estar disposto a reconhecer e valorizar a singularidade e
uma forma de aprender não padronizada. O exemplo da professora Hellen
citado na Unidade B, que trabalhou com todos os alunos do lado de fora da sala
de aula até que Matheus conseguisse entrar, ilustra bem essa questão.
Colli et al discorrem acerca da importância de o professor investir nesses alunos, desejando que eles aprendam:
A escolarização destas crianças precisa estar lastreada no desejo do professor, pois este, ao apontar seu desejo para o aprendizado da criança, supõe nela um sujeito também desejante e, portanto, capaz de aprender. Desta disposição da subjetividade é que poderão surgir as curiosidades que abrirão acesso ao sujeito em aprendizagem. (Colli et al, 1997, p. 40).
Com base nos pressupostos teóricos apresentados neste módulo,
passaremos agora a refletir sobre atividades pedagógicas que podem ser
desenvolvidas no AEE. Evidentemente, essas reflexões não se configuram como
receitas, mas, sim, como sugestões baseadas em estudos teóricos, vivências
das autoras e de outros professores. Assim, a partir dos exemplos citados aqui,
muitos outros poderão surgir, uma vez que cada aluno é singular e tem
interesses que lhe são peculiares.
Um primeiro ponto que pode ser pensado no trabalho com esses alunos
diz respeito às estereotipias. O professor precisa estar atento às manifestações
estereotipadas desses sujeitos, buscando dar significado a elas. Por exemplo:
na sala de aula, a professora passava o conteúdo no quadro e os alunos
copiavam quando Mauricio, um menino autista, levanta-se, vai até o quadro e
bate o apagador insistentemente no quadro. A professora olha para ele e diz:
―Quer apagar Mauricio? Não dá para apagar ainda, agora é hora de copiar‖.
Ouvindo isso o aluno retorna para sua classe. Esse ―bater no quadro‖ poderia ter
sido considerado uma estereotipia típica do autismo, no entanto a professora
deu um significado àquele ato e isso fez toda a diferença, pois ao invés de
permanecer batendo o apagador, Mauricio retornou a sua classe.
Na mesma escola citada anteriormente, Antônio, um aluno autista,
caminha pela sala de aula e pela escola, colocando todo tipo de papel na boca,
chegando, por vezes, a engoli-lo. O que fazer diante dessa situação? Como dar
sentido a isso? Aqui poderíamos pensar em uma atividade pedagógica que
utilizasse o papel, objeto de interesse de Antônio. Que tal propormos uma
atividade com papel machê? Por coincidência, o termo papel machê vem do
francês ―papier mâché‖ que significa papel mastigado. O papel machê é uma
espécie de massa de modelar com a qual podemos fazer diversas esculturas.
Para fazer o papel machê, utilizamos papel picado, cola branca e água. A
técnica desse papel para modelagem consiste no seguinte:
- picar o papel, pode ser jornal, em pedaços pequenos, deixando de molho na
água por algumas horas. Se a criança não consegue ainda picar o papel com
tesoura, ela poderá rasgá-lo em pequenos pedaços;
- triturar bem os pedaços de papel e, quando estiver bem triturado, espremer até
tirar toda a água;
- por fim, colocar em um recipiente o papel triturado e acrescentar cola branca
até transformá-lo em uma massa adequada para a modelagem. Se
adicionarmos um pouco de detergente líquido, a massa ficará mais fácil de ser
trabalhada. Com essa técnica simples, a criança terá o prazer de manipular e
produzir a massa. A modelagem é o segundo passo da atividade. Basta, então,
usar a criatividade e buscar com a criança formas a serem esculpidas. Essa
atividade pode ser realizada tanto na sala de recursos multifuncionais quanto na
sala de aula regular com toda a turma. Quem sabe outras atividades com papel
surjam, como a dobradura, por exemplo?
Um segundo ponto sobre o qual podemos refletir no trabalho com os
alunos com transtornos globais do desenvolvimento diz respeito à resistência a
alterações na rotina. O professor pode usar o diálogo como ferramenta quando
alguma alteração for feita, explicando desde o início que algo no ambiente
mudará ou que sofreu alterações. É preciso que o professor dê sentido à
mudança, ouça e compreenda a angústia de seu aluno.
A escuta atenta e a compreensão da angústia do aluno por parte do
professor podem ser exemplificadas através do relato de atividade realizado com
uma aluna psicótica na sala de recursos.
Transcorridos aproximadamente dois meses do ano letivo, os alunos da
sala de recursos tiveram que mudar de sala, em função de questões
organizacionais da escola. Valquiria8 não gostou da troca e começou a repetir
durante a aula: ―Vamos lá no outro colégio‖, ―Nós vamos voltar lá‖ (colégio
significava sala de aula). Nenhuma explicação conseguiu diminuir a angústia de
Valquiria, tampouco as atividades apresentadas pela professora atrairam sua
atenção. Essa troca repentina pareceu desestruturar a aluna. A fim de resolver o
impasse, sugeriu-se que ela escrevesse um bilhete para a diretora da escola,
pedindo para que os alunos (além de Valquíria haviam outros alunos) pudessem
voltar para a antiga sala. Valquiria concordou. Assim, junto com a professora,
Valquíria escreveu e assinou o bilhete abaixo:
8 A referência ao primeiro nome dos alunos foi autorizada pela família.
Quando a professora iniciou a escrita do bilhete dizendo em voz alta:
―gostaríamos de trocar de sala com a professora Heloisa‖, Valquiria
complementou: ―e colocar a mesa no lugar‖. A mesa havia sido trocada de lugar
pela professora que agora estava na antiga sala. O bilhete foi deixado sobre a
mesa da diretora. Após, foi explicado a Valquiria que a resposta viria somente na
semana seguinte, pois a diretora não se encontrava na escola.
Na semana seguinte a diretora respondeu:
E assim foi feito! Após a leitura da resposta da diretora, Valquíria
concordou com a troca para a sala mais próxima da sua antiga sala. A angústia
da aluna diminuiu e neste dia foi possível desenvolvermos atividades em nossa
nova sala, agora um espaço dedicado à escuta das demandas de Valquíria e
dos demais alunos que por lá passarem.
Outro exemplo vivido na sala de recursos com a aluna Valquíria e seu
colega Vilian reflete a importância da escrita enquanto uma ferramenta que
poderá ser usada para permitir que alunos com dificuldades na sua constituição
psíquica possam começar a esboçar um lugar de sujeitos.
Para iniciar a aula, a professora pedia aos alunos que assinassem uma
lista de presenças. Abaixo segue uma lista, em que a aluna Valquiria escrevia
seu nome: as letras ―V‖ e ―N‖que aparecem no desenho. Como Vilian pegava a
caneta e fazia riscos, Valquiria o orientava: ―não risca, faz o nome‖, ―não risca,
escreve‖. Nesse dia, o aluno esboçou o ―N‖, conforme aparece na lista.
Numa manhã, quando a professora entrou na sala após buscar o material
para iniciar o trabalho, Valquíria que escrevia no quadro disse: ―Olha o que eu
fiz!‖. Havia um ―Y‖ e um ―Q‖ escritos no quadro. Quando a professora admirada
olhou para ela, esta falou: ―Não conta pra ninguém‖. Em outra oportunidade a
mesma aluna ao escrever alguns rabiscos no quadro falou em voz alta: ―Taís, eu
estou aqui!‖.
Segue outro exemplo interessante que mostra como o registro do
simbólico é falho nessas crianças e quanto nós, professores, podemos contribuir
para que uma ampliação dessa função aconteça, a fim de que os alunos saiam
um pouco do campo do real que lhes é peculiar. Tal ampliação terá importante
papel no momento da aprendizagem da escrita ou da matemática quando eles
precisam imaginar, hipotetizar situações para que essa aprendizagem aconteça.
Em uma produção de uma maquete da cidade, várias caixas de alimentos
foram utilizadas para simbolizar casas e outras construções. Assim uma caixa
transformou-se em igreja, outra em prefeitura, uma bandeja tranformou-se em
praça, etc. Valquiria colou uma caixa de caldo de galinha na maquete. A
professora perguntou: ―o que é isso?‖. A essa pergunta Valquiria respondeu: ―É
uma caixa de caldo de galinha, não tá vendo?‖. Na semana seguinte, a
professora propôs que os alunos relembrassem o que produziram na maquete.
Valquiria lembrou de tudo: da prefeitura, da igreja, da praça, do banco. Quando
a professora perguntou sobre a caixa do caldo de galinha ela responde: ―É uma
caixa de caldo de galinha, eu já te disse!‖. Valquíria suspirou impacientemente
como quem diz: quantas vezes vou ter que falar o óbvio?
Todos esses exemplos e muitos outros podem ser desenvolvidos no AEE
na sala de recursos. O tema da atividade poderá variar de acordo com os
interesses do aluno. Poderemos desenvolver, por exemplo, atividades com
música, escrita, argila, papel machê como no caso do Antonio.
Materiais como a massa de modelar ou argila permitem unificar a
fragmentação da imagem corporal dos alunos com problemas no
desenvolvimento. Bonecas de pano que podem ser cortadas e recosturadas
também proporcionam essa unificação. Linha e barbante usados nas
brincadeiras ajudam a ―amarrar‖ e simbolizar esse corpo que parece não se
adequar ao ambiente.
Vimos até aqui que o professor do AEE poderá proporcionar momentos
para que o aluno possa, através do brincar, retomar a função simbólica que ficou
adormecida em função das dificuldades encontradas pelo sujeito para se
constituir. O professor do AEE deve trabalhar em conjunto com o professor do
ensino regular para que juntos possam estabelecer estratégias de ensino e
atividades que irão ao encontro do desejo de seus alunos. O professor que
estiver disposto a trabalhar de uma forma diferente, levando em consideração
que cada sujeito tem sua forma peculiar de estar no mundo, com certeza
aprenderá muito.
Para finalizar, sugerimos a leitura de duas reportagens, disponíveis nos
links abaixo, que relatam o trabalho da professora Hellen, citada anteriormente.
Essa professora se mostrou disponível para um trabalho diferenciado que
pudesse atender às especificidades de Matheus, seu aluno.
http://revistaescola.abril.com.br/avulsas/inclusao_matheus_aprende_escrever.sh
tml
http://revistaescola.abril.com.br/avulsas/inclusao_matheus_aprende_emocoes.s
html
Sugestões de filmes que trazem a temática dos Transtornos Globais do
Desenvolvimento:
► O Enigma das Cartas, do diretor Michael Lessac (1993);
► Código para o Inferno, do diretor Harold Becker (1998);
► Rain Man, do diretor Barry Levinson (1988).
Referências Bilbiográficas
ALBERTI, S. Autismo e esquizofrenia na clínica da esquize. Rio de Janeiro:
Marca d‘Água , 1999.
ARAGÃO, R. O. Transtornos mentais: detecção e prevenção na criança e no
adolescente. In: Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, v.
VIII, nº 3. São Paulo, 2005.
ASSOCIAÇÃO AMERICANA DE PSIQUIATRIA. DSM-IV-TR: Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 4.ed.rev. Porto Alegre: Artmed, 2002.
BAUER, S. Síndrome de Asperger - Ao longo da vida. Disponível em:
http://gopher.udel.edu/bkirby/asperger/bauerport.html. Acesso em julho de 2009.
BERNARDINO, L.M.F. A abordagem psicanalítica do desenvolvimento infantil e
suas vicissitudes. In: BERNARDINO, L.M.F. (org.) O que a psicanálise pode
ensinar sobre a criança, sujeito em constituição. São Paulo: Escuta, 2006,
p.19-41.
_______________. A contribuição da psicanálise para a atuação no campo da
educação especial. In: Estilos da Clínica: Revista sobre a Infância. São Paulo:
IPUSP, v. XII, nº 22, 1º semestre, 2008, p.48-67.
BOSA, C.; BAPTISTA C. R. Autismo e educação. Porto Alegre: Artmed, 2002.
BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes Operacionais da Educação
Especial para o Atendimento Educacional Especializado (AEE) na
Educação Básica. Brasília, MEC/SEESP, 2008.
BRASIL. Ministério da Educação. Política Nacional de Educação Especial na
perspectiva da Educação Inclusiva. In: Secretaria de Educação
Especial/Ministério da Educação. Inclusão: Revista da Educação Especial. V.4,
n.1. Brasília, MEC/SEESP, 2008.
CARVALHO, R.E. Temas em educação especial. Rio de Janeiro: WVA, 1998.
CAVALCANTI, A. E.; ROCHA, P. S. Autismo. São Paulo: Casa do Psicólogo,
2001.
CHEMAMA, R. Dicionário de psicanálise. Tradução de Francisco Franke
Settineri. Porto Alegre: Artmed, 2002.
COLLI, Fernando et al. Começando uma travessia pelo Ponte. In: Estilos da
Clínica: Revista sobre a Infância. São Paulo: IPUSP, ano II, nº 2, 2º semestre,
1997, p. 139-144.
FONSECA, V.R.J.R. O autismo e a proposta psicanalítica. In: Revista Mente e
Cérebro, Col. Memória da Psicanálise: Melanie Klein, nº 4, 2ª ed., São Paulo:
2009.
JERUSALINSKY, A. Autismo. Revista Correio da APPOA, Nº 141, Porto
Alegre, 2005.
_______________. Considerações acerca da avaliação psicanalítica de crianças
de três anos. In: LERNER, R.; KUPFER, M. C. M. Psicanálise com crianças:
clínica e pesquisa. São Paulo: Escuta p. 129, 2008.
_______________. Escolarização de crianças psicóticas. In: JERUSALINSKY, A
et al. Psicanálise e desenvolvimento infantil. 3.ed. Porto Alegre: Artes e
Ofícios, 2004, p.126-154.
JERUSALINSKY, J. Quando o que se antecipa é o fracasso...prevenção
secundária e estimulação precoce. In: CAMAROTTI, M.do.C. (org.).
Atendimento ao bebê: uma abordagem interdisciplinar. São Paulo: Casa do
Psicólogo, 2001, p.35-42.
KLIN, A. Autismo e síndrome de Asperger. In: Revista Brasileira de
Psiquiatria, Vol. 28, Supl. I p. 10, 2006.
KUPFER, M. C. M. Educação para o futuro: psicanálise e educação. 2.ed.São
Paulo: Escuta, 2001.
_______________. Educação Terapêutica: o que a psicanálise deve pedir à
educação. In: Estilos da Clínica: Revista sobre a Infância. São Paulo: IPUSP, v.
II, nº 2, 2º semestre, 1997, p.53-61.
KUPFER, M. C. M.; PETRI, R. ―Por que ensinar a quem não aprende?‖. In:
Estilos da Clínica: Revista sobre a Infância. São Paulo: IPUSP, v. V, nº 9, 2º
semestre, 2000, p.109-117.
LAJONQUIÈRE, L. De Piaget a Freud: para repensar as aprendizagens. A
(psico) pedagogia entre o conhecimento e o saber. 12. ed. Rio de Janeiro:
Vozes, 2003.
LAZNIK-PENOT, M.C.. Rumo à palavra: três crianças autistas em psicanálise.
São Paulo: Escuta, 1997.
MARCELLI, D.; COHEN, D. Infância e psicopatologia. 7.ed. Porto Alegre:
Artmed, 2009.
PAULON, S.M.; FREITAS, L.B. de L.; PINHO, G.S. Documento subsidiário à
política de inclusão. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação
Especial, 2005, 48p.
PESSOTTI, I. Deficiência mental: da superstição à ciência. São Paulo: Ed. Da
Universidade de São Paulo, 1984.
ROBALLO, S. O outro lado da síndrome de Asperger. 2001. 142 f.
Dissertação (Mestrado em Psicologia)- Universidade Católica de Brasília,
Brasília, 2001.
RODRIGUEZ, R.de C.M.C. Interculturalidade do universo autista (síndrome
de Asperger) e o estranhamento docente. 2006. 198 f. Tese (Doutorado em
Educação)- Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2006.
SCHWARTZMAN, J. S. Síndrome de Rett. Rev. Bras. Psiquiatr. [online]. 2003,
vol.25, n.2, pp. 110-113. ISSN 1516-4446. doi: 10.1590/S1516-
44462003000200012.
_______________. Entrevista - Autismo I. Disponível em:
http://drauziovarella.ig.com.br/entrevistas/autismo.asp. Acesso em 12 de julho de
2009.
_______________. Entrevista - Autismo II. Disponível em:
http://drauziovarella.ig.com.br/entrevistas/autismo.asp. Acesso em 12 de julho de
2009.
_______________. Síndrome de Asperger. In: Temas sobre desenvolvimento,
ano 1, nº2, set-out, 1991, p.19-21.
VEROTTI, D.T.; CALLEGARI, J. A inclusão que ensina. In: Revista Nova
Escola. São Paulo: Editora Abril, Edição Especial nº 24, 2009, p. 8-15.
YAÑEZ, Zulema Angeles Garcia. Aspectos instrumentais na psicose: reflexões
para uma educação inclusiva. In: Escritos da criança. Porto Alegre: Centro
Lydia Coriat, 2001, nº 6, p.193-220.