modelos e tecnicas para projetar espaços de habitação

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Alexandre Kenchian Dissertacao

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  • UNIVERSIDADE DE SO PAULO

    FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO

    ALEXANDRE KENCHIAN

    EEssttuuddoo ddee MMooddeellooss ee TTccnniiccaass ppaarraa PPrroojjeettoo ee

    DDiimmeennssiioonnaammeennttoo ddooss EEssppaaooss ddaa HHaabbiittaaoo

    So Paulo

    2005

  • ALEXANDRE KENCHIAN

    Estudo de Modelos e Tcnicas para Projeto e

    Dimensionamento dos Espaos da Habitao

    Dissertao apresentada Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de So Paulo, para a obteno do grau de Mestre em Arquitetura. rea de Concentrao: Tecnologia da Arquitetura Orientador: Prof. Dr. Jos Jorge Boueri Filho

    So Paulo

    2005

  • AUTORIZO A REPRODUO E DIVULGAO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRNICO, PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE. ASSINATURA: e-mail: [email protected]

    Kenchian, Alexandre K33e Estudo de modelos e tcnicas para projeto e dimensionamento dos espaos da habitao / Alexandre Kenchian. --So Paulo, 2005. 306 p. : il. Dissertao (Mestrado rea de Concentrao: Tecnologia da Arquitetura) FAUUSP. Orientador: Jos Jorge Boueri Filho 1.Habitao 2.Ergonomia I.Ttulo

    CDU 711.58

  • Estudo de Modelos e Tcnicas para Projeto e Dimensionamento dos Espaos da Habitao

    Vazken e Lucas

    meu pai e meu filho

    ... de onde vim e para onde vou ...

    minha existncia se completa em vocs !

    A lexandre Kenchian FAU USP 2005

  • Estudo de Modelos e Tcnicas para Projeto e Dimensionamento dos Espaos da Habitao

    Agradecimentos

    Antes de todos, ao Deus Eterno: ...at aqui, tem me ajudado o SENHOR.

    Ao Prof. Dr. Jorge Boueri, pela acolhida ao seu grupo de pesquisa, acreditando no meu potencial e me conduzindo para o crescimento cientfico; tambm pela amizade e compreenso nos momentos difceis.

    Aos Professores Sylvio Sawaya e Moacyr Cordeiro, pela conduo de idias e incentivo no processo de qualificao.

    Ao Arquiteto Dr. Joo Branco Pedro, pela ateno e apoio no processo de definio e orientao.

    A todos os amigos do grupo de pesquisa e das disciplinas as quais acompanhei, em ateno espacial a Marcelo Mendona, Cludia Maria Lavieri Lapetina, Maria Valria Affonso Lopes, Selso Dal Belo, Joo Alberto Cantero, Andr Luiz Souza Barbosa, Renata Battistuzzi, Pablo Arturo Cspedes e Stefano Mega. Este trabalho de vocs tambm.

    todos das secretarias do Departamento de Tecnologia e da Ps Graduao da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, pelo atendimento cordial a mim dispensado.

    direo, funcionrios, professores e alunos amigos do Centro Federal de Educao Tecnolgica de So Paulo (CEFET-SP) e da Escola Tcnica Estadual Aristteles Ferreira, de Santos, pela convivncia entre vocs e pela disponibilidade oferecida para elaborao deste trabalho.

    Aos amigos de sempre Cludia Cardoso e Joo Adelino.

    Paulinha Siani, pelo carinho e ateno, e pela reviso deste trabalho.

    Em especial minha famlia: Garabed, uma referncia de metas a atingir, minha admirao. Karina, uma referncia de equilbrio, meu afeto.

    Araksi, minha me (i.m.), o que sou e o que tenho alcanado at aqui, devo a senhora, saudades...

    A lexandre Kenchian FAU USP 2005

  • Estudo de Modelos e Tcnicas para Projeto e Dimensionamento dos Espaos da Habitao

    Estas palavras, que hoje te ordeno, estaro no teu corao; tu as inculcars a teus filhos, e delas falars assentado em tua casa, e andando pelo caminho, e ao deitar-te e ao levantar-te.

    DEUTERONMIO 6: 6-7

    A lexandre Kenchian FAU USP 2005

  • Estudo de Modelos e Tcnicas para Projeto e Dimensionamento dos Espaos da Habitao

    RESUMO

    KENCHIAN, A. Estudo de Modelos e Tcnicas para Projeto e Dimensionamento dos Espaos da Habitao. 2005. 306 folhas Dissertao (Mestrado) Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de So Paulo, So Paulo, 2005.

    O objeto da pesquisa parte da premissa de se fazer um levantamento e reconhecimento de diferentes modelos e tcnicas, elaborados por vrios autores, a serem aplicados no dimensionamento dos espaos da habitao, quer seja na elaborao, quer seja na avaliao. Neles, so identificados e analisados os aspectos ergonmicos da apropriao para o homem desses espaos, destinados ao seu uso como moradia. Dentro da premissa apresentada, pretende-se conhecer as implicaes das dimenses humanas, considerando o prprio homem como referncia, na histria da arquitetura habitacional, a partir dos aspectos funcionais, simblicos, culturais e tnicos; e os requisitos de projeto que influem na ocupao e dimensionamento dos espaos da habitao, utilizando-se das tcnicas de pesquisa antropomtrica. Para tanto, so identificados e analisados os aspectos ergonmicos da apropriao desses espaos pelo homem, destinados ao seu uso como moradia. A pesquisa inicia em associar as dimenses humanas e os espaos edificados destinados habitao, atravs de uma viso histrica dos estudos que influram na arquitetura residencial, enquanto preocupao dimensional, baseada na figura humana. Apresenta conceitos e requisitos para uma habitao e investiga os modelos e tcnicas desenvolvidas para o dimensionamento dos espaos habitacionais onde so considerados aspectos ergonmicos, de modo a se fazer uma aplicao metodolgica desses modelos e tcnicas para anlise e dimensionamento de um projeto habitacional. Esta aplicao feita por meio da elaborao uma caracterizao ergonmica que consiste em analisar o usurio, as funes de uso e as atividades, os ambientes e espaos funcionais da habitao e o uso de mobilirio e equipamentos necessrios.

    Palavras-chave: Habitao. Dimensionamento. Ergonomia.

    A lexandre Kenchian FAU USP 2005

  • Estudo de Modelos e Tcnicas para Projeto e Dimensionamento dos Espaos da Habitao

    ABSTRACT

    KENCHIAN, A. Study of Models and Techniques for Project and Dimensioning of the Spaces of the House. 2005. 306 f. Dissertation (Master's degree) Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de So Paulo, So Paulo, 2005.

    The object of the research leaves from the premise of doing recognition of different models and techniques, elaborated by several authors, to be applied in the dimensioning of the spaces of the house, for its elaboration, or for its evaluation. In them, the ergonomic aspects of the appropriation for the man of those spaces, destined to his use as home are identified and analyzed. Inside of the presented premise, it intends to know the implications of the human dimensions, considering the man himself as reference, in the history of the habitations architecture, starting from the functional, symbolic, cultural and ethnic aspects; and the project requirements that influence on the occupation and dimensioning of the spaces of the house, using the techniques of anthropometric research. For that matter, the ergonomic aspects of the appropriation of those spaces by the man are identified and analyzed, for his use as home. The research begins in associating the human dimensions and the built spaces destined to the house, through a historical view of the studies that were influenced on the residential architecture, while dimensional concern, based on the human figure. It presents concepts and requirements for a house and it investigates the models and techniques developed for the dimensioning of the housing spaces where ergonomic aspects are considered, doing a methodological application of those models and techniques for analysis and dimensioning of a housing project. This application is made through the elaboration of an ergonomic characterization that consists of analyzing the user, the use functions and the activities, the functional spaces of the house and the use of necessary furniture and equipments.

    Keywords: House. Dimensioning. Ergonomics.

    A lexandre Kenchian FAU USP 2005

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    SUMRIO

    INTRODUO 9

    PARTE 1

    1. REFERNCIAS TEMPORAIS AO DIMENSIONAMENTO DA HABITAO 13

    1.1. OS PRIMRDIOS DA HABITAO 14

    1.2. O HOMEM E O ESPAO EDIFICADO 21

    1.3. A TRADICIONAL CASA JAPONESA 29

    1.4. O MODERNISMO E A HABITAO MNIMA 45

    1.5. LE CORBUSIER E O MODULOR 52

    1.6. O ADVENTO DA ERGONOMIA NA HABITAO 69

    1.7. APNDICES 84

    A) Do Tamanho do P ao Sistema Britnico de Medidas 85

    B) Primeiras Referncias 87

    C) A Matemtica e as Propores Humanas 90

    D) O Homem e a Arquitetura de Vitrvio 91

    E) Os Tratados de Arquitetura e o Dimensionamento da Escada 96

    F) A Arte de Projetar de Neufert 99

    G) Linha do Tempo de Referncias Dimensionais da Habitao 102

    A lexandre Kenchian FAU USP 2005

  • Estudo de Modelos e Tcnicas para Projeto e Dimensionamento dos Espaos da Habitao

    PARTE 2

    2. A ERGONOMIA APLICADA HABITAO 103

    2.1. NOES SOBRE HABITAO E ERGONOMIA 104

    2.2. OS MODELOS E TCNICAS DE DIMENSIONAMENTO 113

    O Mtodo Grfico, de Alexander Klein 118 O Modelo Ingls da HMSO para o Desenvolvimento Habitacional 133 O Ciclo Familiar, de Deilmann, Kirschenmann e Pfeiffer 180 Programas de Investigao sobre Habitao, do LNEC em Portugal 200

    2.3. REQUISITOS DOS MODELOS PARA UM PROJETO DE HABITAO 236

    2.4. CARACTERIZAO ERGONMICA DO PROJETO DA HABITAO 242

    2.5. ANEXOS 261

    A) A Lista de Conferncia do Modelo Ingls 262

    B) Modelos Realizados no Programa Habitacional 269

    C) Mtodo de Avaliao da Qualidade Arquitetnica Habitacional 277

    D) O Manual Tcnico da Caixa Econmica Federal 291

    E) Pesquisa: Como os Profissionais Dimensionam a Habitao 294

    CONSIDERAES FINAIS 297

    BIBLIOGRAFIA 301

    A lexandre Kenchian FAU USP 2005

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    INTRODUO

    Apresentao

    O presente trabalho de pesquisa inicia em associar as dimenses humanas e os espaos edificados destinados habitao, atravs de uma viso histrica dos estudos que influram na arquitetura residencial, enquanto preocupao dimensional, baseado na figura humana. Apresenta conceitos e requisitos para uma habitao e investiga os modelos e tcnicas desenvolvidas para o dimensionamento dos espaos habitacionais onde so considerados aspectos ergonmicos, de modo a se fazer uma aplicao metodolgica desses modelos e tcnicas para anlise e dimensionamento de um projeto habitacional. Esta aplicao feita por meio da elaborao uma caracterizao ergonmica que consiste em analisar o usurio, as funes de uso e as atividades, os ambientes e espaos funcionais da habitao e o uso de mobilirio e equipamentos necessrios.

    O objeto da pesquisa para esta dissertao de Mestrado parte da premissa de se fazer um levantamento e reconhecimento de diferentes modelos e tcnicas, produzidos por vrios autores, a serem aplicados no dimensionamento dos espaos da habitao, quer seja na elaborao, quer seja na avaliao. Neles, so identificados e analisados os aspectos ergonmicos da apropriao para o homem desses espaos, destinados ao seu uso como moradia.

    Dentro da premissa apresentada, pretende-se conhecer as implicaes das dimenses humanas, considerando o prprio homem como referncia, na histria da arquitetura habitacional, a partir dos aspectos funcionais, simblicos, culturais e tnicos, e como requisitos de projeto que influem na ocupao e dimensionamento desses espaos da habitao, utilizando-se das tcnicas de pesquisa antropomtrica. Para tanto, so identificados e analisados os aspectos ergonmicos da apropriao para o homem desses espaos, destinados ao seu uso como moradia.

    Justificativa da Pesquisa

    A importncia do estudo de modelos e tcnicas para anlise e dimensionamento dos espaos edificados da habitao, buscando relacionar-se com as dimenses humanas, visa oferecer aos estudos para um projeto habitacional, quer seja para uma residncia isolada, quer seja para empreendimentos imobilirios, parmetros adequados de dimensionamento a fim de propiciar qualidade no seu uso ao melhor nvel que se possa alcanar; ou pelo menos, garantir exigncias mnimas de conforto e satisfao ambiental para o usurio desse espao destinado moradia.

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    Os motivos de os profissionais de arquitetura estarem utilizando incorretamente, ou mesmo nem utilizando, as tcnicas de elaborao e avaliao dimensional nos projetos, teriam suas diversas hipteses, que podem ser consideradas de forma isolada, ou em conjunto.

    Uma das hipteses que o estudo do espao dimensional ainda seria um conhecimento incipiente, quando em termos quantitativos, e pouco difundido nas escolas de arquitetura, ainda que com poucas excees, onde os cursos de arquitetura no teriam sido levados a considerar os aspectos dimensionais dos espaos edificados. Por outro lado, tal preocupao j se verifica nas ltimas edies dos manuais de arquitetura na aplicao de dados antropomtricos na produo arquitetnica, como por exemplo em especial a 17a e ltima edio em portugus, de 2004, da clssica obra de Ernst Neufert, Arte de Projetar em Arquitetura.

    Assim, como ponto de partida para compreender a abordagem desta pesquisa dentro de um espectro mais amplo, a preocupao com a qualidade do espao edificado para habitao baseado em seu usurio, o homem, deve ir de encontro ao interesse da produo industrializada e racional desses espaos edificados.

    Conforme Deilmann, et. al. (1980), a busca no atendimento a grande demanda por moradia leva a recursos com o intuito de se baratear custos na construo, objetivando o atendimento a esta demanda. Por outro lado, a carncia de espaos para ocupao imobiliria dentro dos grandes aglomerados urbanos leva a um maior aproveitamento e conseqente adensamento das moradias nesses escassos espaos urbanos. Com isso, percebe-se uma pequena reduo das dimenses das habitaes, e uma tendncia de concentrao e aumento de unidades permitidas por superfcie.

    Sendo assim, o enfoque da pesquisa de encontrar parmetros dimensionais adequados, a partir do estudo da antropometria aplicada aos espaos da habitao, para a elaborao de uma caracterizao ergonmica, na forma de diretrizes para um projeto de habitao.

    Pretende-se que essas diretrizes possam ser utilizadas na aplicao em empreendimentos habitacionais, na produo de moradias em qualquer escala, com a inteno de adotar esses parmetros dimensionais baseados nas dimenses humanas, associando aspectos qualitativos de conforto e satisfao ambiental do usurio em seus espaos otimizao e racionalizao de uma tecnologia industrializada.

    Portanto, a anlise e dimensionamento dos espaos, a partir do estudo de modelos e tcnicas reconhecidos e metodologicamente estudados, em edificaes direcionadas a habitao, traz melhores insumos tcnicos aos profissionais de arquitetura em seus projetos, abrindo possibilidades para a obteno de uma melhor qualidade para essa moradia projetada.

    A lexandre Kenchian FAU USP 2005

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    Por fim, como argumento para esta pesquisa, tem-se percebido junto ao meio acadmico e profissional (como pode ser demonstrado ao final deste trabalho), que critrios tcnicos de dimensionamento no tm sido de domnio dos profissionais envolvidos na produo dos espaos habitacionais, onde se pode constatar, com uma breve investigao junto a eles, que o dimensionamento desses espaos vm sendo feito de maneira subjetiva, e por vezes inadequada, utilizando-se, na maioria dos casos, basicamente de dados referentes s legislaes vigentes e do mercado imobilirio.

    Ainda, os cursos de graduao em arquitetura, em geral, no se preocupam especificamente em direcionar os estudos para a ergonomia aplicada arquitetura, atravs de procedimentos, baseados nesses modelos e tcnicas, de dimensionamento dos espaos da habitao.

    As possveis falhas durante o curso de graduao fazem com que o arquiteto tenha como base de sua atividade profissional fundamentos que beiram o intuitivo, cujos critrios para o dimensionamento, que necessariamente devem ser tcnicos, se permitem questionveis quanto qualidade pretendida ao final pelos agentes empreendedores e principalmente pelos usurios das habitaes.

    Contribuies Acadmicas e Prticas da Pesquisa

    A compreenso do tema proposto para esta dissertao de Mestrado traz contribuies aos procedimentos de elaborao dos espaos arquitetnicos, principalmente os destinados habitao, onde, como resultados dessa investigao, pode-se propiciar junto ao meio acadmico, e tambm junto produo prtica no mercado formal da construo civil, elementos que atendam melhor s exigncias de qualidade de vida do ser humano, no que se refere moradia.

    Assim, em termos acadmicos, como contribuio desta pesquisa tem-se a instrumentalizao do profissional arquiteto, desde a sua formao acadmica, no uso de parmetros de dimensionamento adequados, partindo do estudo da ergonomia na arquitetura, para serem aplicados na elaborao do projeto dos espaos da habitao, propiciando aspectos qualitativos de conforto e satisfao ambiental a esses espaos.

    E em termos prticos, prope-se a avaliao dos empreendimentos imobilirios, observando os aspectos qualitativos dos espaos das habitaes produzidas, oferecendo uma melhor compreenso e alternativas de melhor definio e ocupao dos espaos da habitao, atravs do estudo de modelos e tcnicas de dimensionamento, onde a busca no conforto e na satisfao ambiental pelo seu usurio morador seja um valor agregado ao imvel.

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    Organizao do Trabalho

    O presente trabalho de dissertao de Mestrado est organizado em duas partes distintas e complementares de pesquisa.

    A Parte 1 apresenta as referncias temporais ao dimensionamento da habitao, atravs da abordagem, no transcorrer da histria da civilizao at aos dias atuais, da relao do homem com a sua moradia e de estudos das medidas humanas como elemento dimensional definidor dos espaos da habitao. Apresenta apndices com alguns aspectos histricos da apropriao do corpo humano como unidade de medida aplicada ao espao edificado, e um quadro sintico dos fatos histricos relacionados ao tema desta dissertao.

    A Parte 2 apresenta estudos de aplicao da ergonomia aos espaos da habitao, de maneira estruturada e sistematizada por meio dos modelos e tcnicas de dimensionamento. Discorre sobre conceitos de habitao e ergonomia, e apresenta requisitos e uma caracterizao ergonmica para o projeto da habitao. Em anexo apresenta os instrumentos de aplicao de alguns dos modelos apresentados, na forma de questionrios de avaliao, modelos exemplificativos e regras de dimensionamento, alm de dados de uma pesquisa onde foram levantadas informaes junto aos profissionais de arquitetura sobre o uso desses modelos apresentados.

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    PARTE 1

    REFERNCIAS TEMPORAIS AO DIMENSIONAMENTO DA HABITAO

    1.1. OS PRIMRDIOS DA HABITAO

    1.2. O HOMEM E O ESPAO EDIFICADO

    1.3. A TRADICIONAL CASA JAPONESA

    1.4. O MODERNISMO E A HABITAO MNIMA

    1.5. LE CORBUSIER E O MODULOR

    1.6. O ADVENTO DA ERGONOMIA NA HABITAO

    1.7. APNDICES

    A) DO TAMANHO DO P AO SISTEMA BRITNICO DE MEDIDAS

    B) PRIMEIRAS REFERNCIAS

    C) A MATEMTICA E AS PROPORES HUMANAS

    D) O HOMEM E A ARQUITETURA DE VITRVIO

    E) OS TRATADOS DE ARQUITETURA E O DIMENSIONAMENTO DA ESCADA

    F) A ARTE DE PROJETAR DE NEUFERT

    G) LINHA DO TEMPO DE REFERNCIAS DIMENSIONAIS DA HABITAO

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    1.1. OS PRIMRDIOS DA HABITAO

    Ao se buscar referncias quanto relao entre o homem e o espao edificado desde seus primrdios, pouco pode ser apresentado. Lewis Mumford, em sua obra sobre a histria das cidades, ao analisar as runas urbanas na regio da antiga Mesopotmia apresenta uma indicao bastante reveladora. Comenta ele:

    As evidncias relativas ao tamanho e densidade das moradias so igualmente do acaso; e mesmo ulteriores escavaes [feitas em Ur-Uruk, que floresceu por volta de 2.000 a.C.] podem no possibilitar a apresentao de dados nos quais se mostra muita confiana, j que muito depende da densidade por aposento, se quisermos distinguir uma decente habitao de um cortio. A respeito dessas matrias, no parece provvel que venham a surgir outros dados. (...) O que mais significativo nesses dados sua notvel constncia, por um perodo de cerca de cinco mil anos. 1

    Mumford ainda compara, no mesmo trecho, em relao s dimenses, casas pequenas de dois pavimentos e rea em torno de 120 m, encontradas em Mohenjo-Daro, na ndia, no terceiro milnio a.C. com uma modesta residncia encontrada na Grcia, cerca de 200 anos a.C. Indica ainda no ser descabido inseri-las no ambiente da East End de Londres no sculo XVIII, ou num conjunto residencial modelo encontrado em Long Island, Estados Unidos, j no Sculo XX.

    F igura 01 Cidade de Ur-Uruk (cerca de 2.000 a.C. )

    Fonte: http://www.crystalix.com/meso.html.

    1 Mumford, Lewis A Cidade na Histria, 1 Volume Belo Horizonte, Editora Itatiaia, 1965

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    Logo, quando se estuda a habitao no perodo pr-histrico, desde o incio da civilizao a cerca de 6.000 anos atrs, de fato muito pouco pode ser constatado.2 As habitaes pr-urbanas no apresentam maiores preocupaes quanto ao dimensionamento dos espaos alm dos definidos pelas necessidades de sobrevivncia, como para se estabelecer um nmero de pessoas necessrias para o preparo de alimentos dentro do ambiente domstico.

    Nesse perodo, as habitaes primitivas tinham suas formas e medidas estabelecidas basicamente em decorrncia dos materiais, pouco diversificados, disponveis para sua construo. Eram simples e atendiam s necessidades bsicas dos seus habitantes, de proteo, abrigo, descanso e guarda de alimentos e objetos. Seus habitantes eram caadores primitivos de tribos nmades, que migravam procura de novas fontes de comida; tm um estilo de vida que representa uma cultura do perodo da Idade da Pedra Antiga, entre 8.000 a.C. e 1.500 a.C., e que, em muitos casos, sobrevive at hoje.

    Contudo, alm da limitao dos materiais, podemos deduzir que essas habitaes primitivas tinham como referncia na definio do dimensionamento do seu espao o corpo humano, com suas medidas mnimas necessrias para o abrigo do homem e para sua mobilidade dentro desse espao.

    Assim, algumas indicaes podem ser observadas, como, por exemplo, no caso das alturas dos abrigos transitrios na frica, assim como as tendas dos mongis da sia Central.

    F igura 02 Habi tao trans i tr ia do pigmeu afr icano

    Fonte: Schoenauer (2000), op.cit.

    2 Os dados a seguir constam em: Schoenauer, Norbert 6.000 Years of Housing New York, Norton and Company, 2000

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    Em funo do material utilizado, feitas de estrutura rudimentar de galhos e folhas de rvores, estas habitaes tinham aproximadamente 1,20 metro de altura; o que no caso dos pigmeus africanos, pela estatura de 1,30 metro, parecia ser conveniente. Estas habitaes transitrias na frica, em formato circular, tinham funo especfica de proteo e guarda de objetos e alimentos, ocupando um ambiente nico de cerca de 5 m de rea. As habitaes dos mongis, tambm circulares, de 3 a 6 metros de dimetro, e sem divises internas, eram feitas de modo a formar trelias que podiam ser facilmente dobradas e transportadas, e tinham a funo de proteo contra intempries.

    As habitaes dos esquims, assim como dos ndios americanos, apresentam uma outra caracterstica de habitao pr-urbana, de temporrias peridicas irregulares, sendo seus habitantes caadores e coletores vivendo em grupos de organizao social e ambiente rico, o que permitia estabelecer num mesmo stio por um longo perodo, sem a necessidade de constante mudana de habitao. Suas construes eram em elementos circulares, variando entre domo e cnico.

    Os iglus, como so chamados, dos esquims eram compostos por mdulos circulares em forma de domo ligados por tneis, construdos com blocos de gelo, e por causa da forma e do material utilizado eram baixos, com altura de at 2 metros; porm, tinham rea suficiente para atender a uma famlia, com aproximadamente 30 m, com ambientes para estar e descanso, e para guarda de alimentos.

    F igura 03 Inuit Ig loo Habitao dos esquims

    Fonte: Schoenauer (2000), op.cit.

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    As pequenas habitaes dos indgenas das plancies da Amrica do Norte eram cabanas de estrutura estvel, formada por troncos de rvore dispostos de forma cnica e amarrados em seu vrtice, e tinham sua cobertura feita de peles de animais. Pelo seu formato cnico, podiam alcanar altura suficiente para um homem de p, e tinham ambiente nico, de rea aproximada de 7 m, suficiente para proteo, descanso e para alimentar-se.

    F igura 04 Tungus Habi tao dos indgenas das p lanc ies

    Fonte: Schoenauer (2000), op.cit.

    Os indgenas da Amrica do Sul, da regio amaznica como os Wai-Wai e os Yanomami, de outra forma, viviam em comunidades, e suas habitaes refletiam esse carter comunitrio. Suas habitaes eram grandes estruturas comuns, circulares, ovais ou retangulares, com cobertura de palha em forma cnica sobre estrutura de troncos de madeira, o que permitia maiores alturas, pela amplido dos espaos.

    F igura 05 Maloca dos indgenas da Amaznia

    Fonte: Schoenauer (2000), op.cit.

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    O ambiente era nico, onde os pilares dividiam os espaos de cada famlia e a parte central era reservada para cultos religiosos, alm do uso bsico de proteo, descanso e alimentao. Tinha rea aproximada entre 100 m e 200 m, chegando at 550 m, como no caso das malocas.

    Ainda no que se refere s habitaes pr-urbanas, caracteriza-se por habitaes temporrias regulares as encontradas por tribos ou grupos nmades que acompanhavam seus moradores durante as longas viagens que faziam em busca de condies propcias a agricultura e criao de animais. As habitaes, na sua maioria, eram tendas portteis, usadas para proteo contra intempries, como variaes bruscas de temperatura, fortes ventos e chuvas, sendo abrigo para famlias ou grupos familiares e para os animais. Tinham dimenses que variavam de 7 a 78 m, conforme a funo de abrigo, e por causa dos materiais empregados, mastros de galhos e troncos cobertos com palhas ou folhas, eram baixas, por vezes no comportando uma pessoa em p.

    Dessas tribos nmades, alm dos mongis da sia Central, destacam-se os bedunos e os pastores tuareg das plancies ridas do deserto do Saara. Um dado relevante pode ser verificado nas tendas do povo tuareg, que em seu ambiente de dormir, tinham uma espcie de cama apoiada em varas, construda cerca de 38 centmetros do solo, e que ocupava a maior parte da rea do ambiente, onde ali a famlia podia sentar e dormir. Essa medida, at hoje adotada, nitidamente relacionada com o corpo humano.

    O surgimento de cidades, como Ur, entre os rios Tigre e Eufrates, na antiga Mesopotmia, Shangai, na China, ambas no perodo de 2.400 a.C., e Mohenjo-Daro, na ndia, s margens do rio Indus, ainda no perodo entre 3250 a 2750 a.C., deram uma nova conformao s habitaes, caracterizadas como urbanas, onde os espaos, pelo carter sedentrio de seus moradores e pelo uso de materiais estveis como a pedra e o tijolo, tiveram suas funes e dimenses estabelecidas de forma permanentemente definida. As moradias encontradas eram dispostas no espao urbano aglutinadas entre si, de maneira concentrada, formando com as zonas comerciais e institucionais, como os templos e edifcios administrativos, a estrutura organizadora das cidades das antigas civilizaes.

    Em Ur, pelo exemplo identificado no perodo Larza, entre 1900 e 1800 a.C., os espaos das casas tinham formas retangulares, no tinham funes definidas, e eram dispostos em torno de um ptio interno descoberto, que fazia a separao entre o espao pblico e o privado. As casas tinham reas aproximadas de 230 m, com maior ambiente tendo 15 m. Na mesma regio, mas j nos anos 687 a 637 a.C., do Imprio Babilnio e Assrio, verificam-se poucas diferenas nas moradias, com um isolamento maior entre a rea ntima e a entrada, e ambientes com usos definidos e reas maiores, de 16 a 34 m, com o total da casa tendo at a 750 m.

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    No Egito, norte da frica, observa-se outras caractersticas nas moradias, como no exemplo encontrado em Deir Medina, em 1540 a.C., como a planta modular com ptios internos e ambientes de at 15 m de rea, a unificao em uma mesma edificao de duas ou trs casas, dentro de um mesmo padro, e a variao de nveis dentro da mesma moradia.

    F igura 06 Casa t ipo em Deir Medina - Egito

    Fonte: Schoenauer (2000), op.cit.

    Na Grcia, no perodo que se inicia em 900 a.C. e teve seu apogeu com Atenas no sculo IV a.C., as caractersticas de uma sociedade urbana culturalmente rica criou uma excepcional concepo de casa, com peculiaridades nos costumes familiares que determinavam a ocupao dos espaos. As habitaes urbanas eram pequenas, onde se vivia e trabalhava, com ambientes voltados a ptios internos, tendo arcos como elementos construtivos, marcante na distribuio desses. Tinha a diviso de ambientes para o sul, para atividades dirias, pela presena do sol, e para o norte, para atividades noturnas; e ambientes destinados apenas s mulheres.

    F igura 07 P lanta da casa em Atenas

    Fonte: Schoenauer (2000), op.cit.

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    No perodo do Imprio Romano, assim como sua civilizao, as habitaes eram baseadas na cultura grega, inserindo conceitos como o uso de eixos e construes em ngulos retos. Atravs do exemplo encontrado em Pompia, ao sul da pennsula Itlica, no sculo IV a.C., as casas seguiam o padro de adensamento urbano, com elementos da cultura etrusca, como o trio, para funes pblicas, associados ao ptio, da cultura grega, para funes privativas. Os ambientes tinham reas menores, de cerca de 10 m, em volta de ptios maiores de at 80 m.

    F igura 08 P lanta da casa em Pompia

    Fonte: Schoenauer (2000), op.cit.

    Atravs da observao das tipologias das habitaes urbanas encontradas nas cidades das antigas civilizaes, e conforme atestou Mumford, estas tinham caractersticas, no exatamente construtivas e funcionais, mas principalmente dimensionais, bastante similares e prximas das verificadas ao longo da Histria at aos dias atuais nas residncias isoladas construdas na civilizao ocidental. Esta similaridade dimensional pode ser percebida por meio das ilustraes, onde, desde ento e ainda que intuitivas, as mesmas preocupaes, da definio dimensional dos espaos e elementos arquitetnicos, como a largura dos acessos, altura dos ambientes, desnveis, entre tantos, todas elas so adequadas s medidas corporais do homem, usurio desses espaos.

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    1.2. O HOMEM E O ESPAO EDIFICADO

    uma afirmao elementar, mas fundamental, estabelecer que a arquitetura faz uso de medidas para a definio e elaborao de seus espaos e elementos construtivos.

    Os primeiros sistemas de medidas conhecidos, e utilizados na arquitetura, foram feitos a partir das partes do corpo humano. Parecia ser conveniente porque qualquer pessoa carregava-o em si mesma. Comumente, as variaes de tamanho das pessoas levavam a erros. Assim, comprimentos padronizados foram estabelecidos e gravados em pedaos de madeira.

    3 Os padres de dimensionamento derivaram desses valores incorporados dos elementos humanos, e quando aplicados nas artes e na arquitetura receberam proporo e harmonia relacionada com a escala humana.

    Mesmo com estudos e descobertas que fascinam o homem desde as remotas pocas sobre as descobertas matemticas da proporcionalidade do corpo humano, e sobre o uso das dimenses humanas na arquitetura, pouco foi feito de modo a estudar as relaes de tais propores e dimenses do homem com o espao que ele ocupa e utiliza em suas atividades bsicas do viver, com o intuito de propiciar qualidade a esse espao edificado, com conforto, segurana e satisfao ambiental para o seu usurio.

    Os antigos eram familiarizados com a geometria esttica, que vinha dos seres inanimados, como os cristais, e com a geometria dinmica, dos seres vivos, com as plantas, os animais e o homem. Mas, a no ser mais recentemente, com o surgimento da Ergonomia como a engenharia das configuraes do homem, pouco alm das tentativas de Vitrvio, relacionando tecnicamente o corpo humano com o sistema de medidas empregado pelos gregos nos projetos dos templos, foi feito nesse sentido.

    Por outro lado, a histria da Humanidade apresenta, desde os primrdios das habitaes h mais de 6.000 anos, em vrios momentos, e locais distintos, exemplos em que o homem, intuitivamente, apropriava-se das medidas corporais para definir os espaos e dimenses de suas edificaes. Referncias diretas apresentam-se nos textos bblicos, onde, na construo do Templo de Salomo, o sistema de medidas era diretamente retirado do corpo humano. Tambm os romanos basearam-se no passo de seu legionrio para medir as distncias por eles percorridas, tornando-se unidade de medida tambm para as construes.4

    3 Ver APNDICE: A. Do Tamanho do P ao Sistema Britnico de Medidas 4 Ver APNDICE: B. Primeiras Referncias

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    Dentre as preocupaes em estudar matematicamente as propores humanas, interessante observar a presena constante de um conceito matemtico, denominado de Seo urea, nome dado, no sculo XIX, proporo derivada das divises de uma linha, chamada por Euclides, em 300 a.C., de razo mdia e extrema.5

    A observao mais fascinante sobre a Seo urea est associada diretamente com a figura humana, onde h uma relao proporcional de trs medidas do corpo humano: a estatura, ou a altura do p ao topo da cabea; a altura do p ao umbigo; e a altura a partir do umbigo at ao topo da cabea. Esta relao se aproxima da razo mdia e extrema de Euclides.6

    F igura 09 As propores do corpo humano, def in idas pela Seo urea

    Fonte: Panero (2002), op.cit.

    A primeira referncia ao estudo das propores humanas encontrada no tratado sobre arquitetura de Marco Vitrvio Polio, que viveu em Roma no sculo I a.C., onde ele indica medidas equivalentes para a altura e a envergadura do homem, e relaciona cada parte do corpo humano como proporcional ao todo, e atribui a pintores e escultores de sua poca o conhecimento dessas propores para realizarem suas obras com perfeio.7

    Posteriormente, baseado na descrio do homem padro de Vitrvio, Leonardo da Vinci (1452-1519) criou seu famoso desenho, LUomo di Vitruvio, sobre a figura humana, que serviu de ilustrao ao trabalho de seu amigo Luca Pacioli (1445-1517), matemtico italiano, que escreveu sobre a Seo urea num tratado chamado Divina Proportione. 5 Ver APNDICE: C. A Matemtica e as Propores Humanas 6 Panero, Julius; Zelnik, Martin Dimensionamento Humano para Espaos Interiores - Barcelona, Gustavo Gili, 2002 7 Ver APNDICE: D. O Homem e a Arquitetura de Vitrvio

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    F igura 10 L Uomo di Vi t ruv io, de Leonardo da Vinci

    Fonte: http://en.wikipedia.org

    Outros estudiosos se inclinaram ao tema das propores humanas, porm sem trazer novidade alm das apresentadas por Vitrvio. Por exemplo, ainda na Idade Mdia, o monge Dionsio escreveu que a estatura do corpo humano equivaleria a nove vezes a altura da cabea.

    Durante a Renascena, a partir do sculo XV, o italiano Cennino Cennini (1370-1440), descreveu o comprimento de um homem como igual a sua largura com os braos estendidos; enquanto Albrecht Drer (1471-1528), com um senso agudo de observao para detalhes realsticos, desenvolveu um sistema racional de propores corporais, determinando divises em trechos a partir da altura do homem.8

    Mais frente, no sculo XVIII, atravs de estudos de Linne, Buffon e White, inaugura-se a cincia denominada Antropometria Racial, que demonstra a diferena nas propores do corpo humano de raas diversas. Em meados do sculo XIX, o matemtico belga Quetlet conduziu a primeira pesquisa, em larga escala, das dimenses do corpo humano, para determinar as diferenas em indivduos e grupos; sendo considerado o pioneiro neste campo, publicando, em 1870, o trabalho intitulado Anthropometrie. A ele credita-se a criao do termo antropometria, assim como a fundao e formalizao desta cincia.9

    8 Neufert, Peter; Neff, Ludwig Casa, Apartamento, Jardim - So Paulo, Gustavo Gili, 1999 9 Boueri, Filho, Jos Jorge Antropometria Aplicada Arquitetura, Urbanismo e Desenho Industrial, Manual de Estudo, - Volume I So Paulo, FAU USP, 3 edio, 1999

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    Nesse mesmo sculo, em Paris fundada a Escola de Antropologia, por Broca, o que influenciou significativamente as pesquisas tericas e tcnicas de medio do corpo humano, como os trabalhos de Humphrey, que mediu vrios ossos do corpo humano, e os do arquiteto John Gibson e do escultor Joseph Bonomi, que escreveram um tratado sobre propores humanas, redesenhando a figura vitruviana.10 Bonomi chegou a inventar uma mquina para medir as propores do corpo humano, o anthropometer, em 1875.

    F igura 11 F igura v i t ruv iana de Gibson e Bonomi

    Fonte: Panero (2002), op.cit.

    J no sculo XX, Le Corbusier reacendeu o interesse no padro vitruviano, com a elaborao do Modulor, um instrumento de medidas modulares em srie, aplicveis arquitetura, onde se baseia nas propores do corpo humano, associadas Seo urea.

    F igura 12 Croquis de Le Corbusier sobre o Modulor

    Fonte: Le Corbusier (1961)

    10 Panero (2002), op.cit.

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    interessante observar que muitos dos estudiosos das propores humanas eram ligados arquitetura, de Vitrvio a Le Corbusier, onde se nota nitidamente a relao entre as dimenses do homem e do espao edificado e por ele ocupado.

    Porm, historicamente, a preocupao bsica da Humanidade com a figura humana sempre fora mais esttica, mais envolvida com propores que com medidas e funes absolutas. Mesmo Vitrvio associava um estilo arquitetnico relacionado com a figura do deus ou deusa correspondente a cada templo grego. Assim, ao templo de Marte, o deus da guerra, um estilo austero, drico; enquanto que o estilo corntio, cheio de graa e decorado com frondosos ramos de folhas e flores, correspondia a natureza delicada e flexvel de Vnus, a deusa do amor.11

    Como j percebido na Renascena, aonde chegou a ser empregado de maneira consciente nos projetos arquitetnicos, a influncia das propores harmnicas da Seo urea na arquitetura, assim como nas dimenses humanas, se mostra de maneira impressionante, apresentando-se superior a qualquer outra proporo, onde at atualmente experincias indicam a preferncia da maior parte das pessoas pelas propores mais prximas da razo mdia e extrema de Euclides.

    Nesse perodo, surge a tradio de produzir-se tratados de arquitetura, onde so lanados conceitos de estilos e descries de elementos arquitetnicos conduzidos por arquitetos e artistas, como Alberti e Giorgio Martini, para desenvolver tcnicas novas de construo, inclusive baseados nessas propores, a fim de estabelecer parmetros de equilbrio da composio e harmonia na simetria para a arquitetura clssica.

    F igura 13 Desenhos de Giorgio Mart ini , sculo XV

    Fonte: http://usuarios.iponet.es/casinada/arteolog/235.htm

    11 Vitrvio Polio, Marco Vitrvio da Arquitetura, So Paulo, - Editora Hucitec/Annablume, 2002 - Livro Primeiro, cap. II

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    Entretanto, interessante observar que uma das poucas preocupaes em se adequar as dimenses dos espaos e elementos edificados ao corpo humano est no clculo e dimensionamento de escadas, atribudas ao arquiteto francs Jacques-Franois Blondel (1705-1774), com uma frmula at hoje consagrada para esta funo, onde verifica-se na medida de um passo as relaes de altura e largura de um degrau.12

    Paralela a cultura ocidental, desenvolvia-se no Extremo Oriente, por mais de trs sculos, todo um conceito de dimensionamento de espaos edificados a partir de um sistema de medidas derivadas de elementos do corpo humano, configuradas na arquitetura tradicional da casa japonesa. Tem caractersticas e aspectos muito singulares que o distinguem da arquitetura ocidental, a comear pelo tipo fsico do homem japons, de propores diferentes do ocidental. Ainda, a concepo dos espaos, a flexibilidade das funes dos ambientes, a modulao das medidas e o uso diferenciado dos materiais preservaram um equilbrio nico entre forma, espao e funo. A sntese dos sistemas dimensionais da arquitetura tradicional da casa japonesa foi obtida apenas em 1890 com a necessidade de padronizao, aps tentativas frustradas, durante a grande reforma do Imperador Meiji.

    J no sculo XX, as primeiras preocupaes referentes ao dimensionamento humano voltado arquitetura surgem junto com o movimento moderno, atravs do conceito de Habitao Mnima, que foi tema central do II Congresso Internacional de Arquitetura Moderna (CIAM), realizado em 1929, em Frankfurt, na Alemanha, reunindo diversos arquitetos europeus que comeavam a trabalhar com mtodos novos, similares entre si, na produo de moradias populares.

    Antes disso, o conceito de Habitao Mnima teve como premissa dentro do movimento moderno a situao em que se encontrava principalmente a Alemanha aps a I Guerra Mundial, com um grande dficit habitacional, o que fez surgir ali os ideais da chamada Nova Arquitetura, que tiveram como expoentes Walter Gropius e Ernst May. Buscavam atender a essa demanda com aspectos racionais, no processo produtivo das moradias, a serem feitas industrialmente em larga escala; e funcionais, na otimizao dos espaos, elementos e equipamentos destinados s atividades em uma habitao.

    Por conta do evento do II CIAM, e a partir de ento, tornaram-se conhecidos pesquisas importantes no estudo da relao entre o homem e o espao construdo, como as de Alexander Klein, com seu Mtodo Grfico, e de Ernst Neufert, com a compilao, em seu manual prtico, de milhares de dados dimensionais necessrios a um projeto arquitetnico.13

    12 Ver APNDICE: E. Os Tratados de Arquitetura e o Dimensionamento da Escada 13 Ver APNDICE: F. A Arte de Projetar de Neufert

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    Por fim, os estudos feitos por Le Corbusier a partir da dcada de 40, pretenderam construir uma escala de proporcionalidades e defender com ela a noo de normalizao e modulao para a arquitetura, com base na escala humana, atravs do Modulor, um instrumento de medidas baseado nas dimenses do corpo humano e nas propores da Seo urea.

    F igura 14 Modulor e a Arquitetura

    Fonte: Le Corbusier (1961)

    O objetivo de Le Corbusier era propor uma nova normalizao do sistema de medidas, com base na estrutura de um homem ideal, a serem aplicveis ao objeto arquitetnico, estabelecendo uma unidade de composio segundo uma relao harmnica de acordo com esse sistema de medidas, surgindo naturalmente o equilbrio entre todos os elementos e componentes que compem a forma.

    A Ergonomia, como estudo cientfico da adequao do homem ao espao em que ele se encontra, surge no sculo XX, limitando-se a abordar a atividade humana no trabalho, especificamente no setor militar e industrial. Aps a dcada de 50, a atuao da Ergonomia comea a se estender a outros setores, como o sistema de trfego e transporte, produtos de consumo, atividades recreativas e a habitao. Nesse perodo instalado nos Estados Unidos o escritrio de Desenho Industrial de Henry Dreyfuss, que atua no campo da antropometria aplicada aos produtos, e tambm arquitetura. Sua equipe continua desenvolvendo pesquisas nesse campo, apresentando publicaes de relevante interesse at os anos 90.

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    Na dcada de 60 surgem trabalhos voltados aos espaos de atividades nas habitaes, como o de uma equipe de projetistas do governo ingls, que elabora uma srie de boletins com o objetivo de informar e orientar sobre os problemas freqentes nos projetos residenciais, levando em considerao as atividades e aspiraes das pessoas em relao moradia; e o de Nuno Portas, em Portugal, que analisa a aplicabilidade da antropometria no estudo das normas da habitao.

    F igura 15 Exemplos de Layout do Modelo Ingls

    Fonte: HMSO - Design Bulletin 24 Spaces in the Home - 1972

    Na mesma linha, a partir dos anos 70, editam-se manuais voltados a estudantes e profissionais de arquitetura, assim como a produtores e usurios das habitaes, onde se apresentam padres de dimensionamento dos espaos arquitetnicos.

    Assim, ntida a constatao de que, alm do corpo humano usado como unidade de medida e de referncia de escala e proporo da edificao, tambm o conhecimento da dinmica de movimento e comportamento do homem, e no somente de suas dimenses, imprescindvel ao projeto arquitetnico, na busca de uma melhor relao entre o edifcio e aquele que far uso do espao edificado.

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    1.3. A TRADICIONAL CASA JAPONESA

    A arquitetura tradicional da casa japonesa,14 um fenmeno impressionante ocorrido por mais de trs sculos, tem aspectos particulares que a distingue, apresentando-a como bastante apropriada a servir de modelo e influncia para o projeto das casas contemporneas, como:

    - a ordem modular de sistema e forma;

    - a flexibilidade das divises espaciais e funes dos ambientes;

    - a composio dos pisos por esteiras (tatamis);

    - a diversidade expressiva dentro de uma padronizao compreendida; e

    - a qualidade integrada das formas.

    Uma anlise do papel da casa japonesa pode levar a atribuir maior importncia que um mero registro, porque a arquitetura residencial japonesa, atravs de sua evoluo, tem preservado um equilbrio nico entre forma, espao e construo. De fato, o modelo construtivo da casa japonesa apresenta um essencial componente do espao como origem maior da forma. Acentua-se que sua arquitetura atingida principalmente atravs de seus significados construtivos, sendo que a disposio dos mobilirios derivada do esquema construtivo.

    A descrio de apenas uma das casas abrange a totalidade da arquitetura residencial japonesa, tanto como espao, dimensionamento, sistema e detalhes construtivos, tornando-se um fenmeno nico na histria da arquitetura. Tal fato decorre da tradio da sociedade feudal, onde os procedimentos, dimensionamento e detalhes construtivos eram escritos em pergaminhos e mantidos pelos mestres carpinteiros.

    No perodo da dinastia Tokugawa (1600-1867), esses conhecimentos foram impressos em blocos de madeira, permitindo a difuso dos mesmos, o que propiciou uma troca de novos mtodos. Como vrias medidas surgiram, logo se viu a necessidade de padronizar o sistema de medidas, porm tentativas frustradas apenas agravavam os problemas e cada categoria ia adotando seu padro. O dimensionamento apresentado nessas regras no era absoluto, mas modulado pela distncia e seo das colunas. Com a padronizao destes, o dimensionamento dos detalhes construtivos das casas foram ento facilmente fixados. Essa padronizao s foi obtida, em 1890, com a grande reforma do Imperador Meiji.

    14 Todo este captulo sobre a casa japonesa est referenciada nos livros de Heinrich (Heino) Engel: The Japanese House A Tradition for Contemporary Architecture, de 1983, e Measure and Construction of the Japanese House, de 1987 ambos Rutland, Vermont / Tkio, Japan, Charles E. Tuttle Company,

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    O modelo de dimensionamento japons derivado, como no resto do mundo, de elementos do corpo humano como unidades de medida, buscando adotar mdulos padronizados em suas edificaes. Surgiu com a necessidade de humanizao dos espaos interiores, buscando associar o desenvolvimento tcnico-cientfico com o desenvolvimento tico, artstico e espiritual.

    O Dimensionamento da Figura Humana Japonesa

    Na arquitetura residencial japonesa, as condies sociais impuseram nas classes comuns o mximo de limitao e restrio de espao nas edificaes sem equivalentes na arquitetura ocidental. De fato, a relao entre homem e dimensionamento arquitetnico to imensamente prximo que pode se dizer serem idnticos.

    Isto resulta uma forte inter-relao entre o homem japons e a sua casa, o que justifica porque as casas japonesas parecem ser pequenas, como que encolhidas, em comparao com as casas ocidentais; sendo esta diferena tanto quanto pode indicar a relao entre a figura humana japonesa e a ocidental (o tipo caucasiano).

    O tipo fsico do homem japons o mongolide, onde a relao com a figura total, a cabea mais larga e os membros mais curtos. Diferencia-se principalmente do ocidental, de tipo fsico caucasiano, como medidas que se refletem importantes no dimensionamento arquitetnico, como se observa: na altura mdia de cerca de 7,4 polegadas (18,8 cm) menor que o ocidental; na altura do corpo entre 6,5 e 7 vezes a altura da cabea, enquanto que o ocidental tem relao de altura entre 7,5 e 8 vezes a altura da cabea; e na altura das pernas (gancho) menor que a meia altura do corpo, enquanto que o ocidental tem a altura das pernas igual meia altura do corpo.

    F igura 16 Comparao da f igura humana Japonesa e Ocidenta l

    Fonte: Engel (1987), op.cit.

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    Decorrente da medida anterior, as pernas e braos so menores, proporcionais a altura do corpo pequeno, em comparao com o ocidental. Por outro lado, no dorso, que tem aproximadamente a mesma altura do ocidental, ou seja, sentados numa mesma base, o nvel dos olhos para ambos aproximadamente o mesmo.

    A partir do tipo fsico japons estabeleceram-se as medidas padronizadas, derivadas dos elementos do corpo humano, onde temos como unidade bsica o shaku, que equivale a 1 p, e as outras medidas corporais relacionadas a este.

    Tabela 01 A f igura humana como padro para unidades de medida

    unidade de medida referncia ao corpo humano proporo 1 shaku 1 p 1 hiro envergadura dos braos abertos 6 shaku 1 po 1 passada (passo duplo) 6 shaku 1 ata envergadura da mo (palmo aberto) 2/3 shaku 1 tsuka 1 palmo (fechado) 1/3 shaku

    Fonte: Engel (1987), op.cit.

    F igura 17 A f igura humana como padro para unidades de medida

    Fonte: Engel (1987), op.cit.

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    O Dimensionamento da Casa Japonesa

    Com a padronizao alcanada em 1890, teve incio a utilizao do Sistema Mtrico. Contudo as construes de residncias ainda so controladas pelo sistema tradicional japons, onde a unidade bsica o shaku, quase idntico ao p ingls. A estrutura das escalas dimensionais fora trazida da China, e sua subdiviso original era constantemente decimal. Em comparao, temos os trs sistemas: o Japons, o Ingls e o Mtrico, relacionados, como se segue:

    Tabela 02 Comparat ivo dos s i s temas Japons, Ingls e Mtr ico

    Sistema Japons Sistema Ingls Sistema Mtrico 1 shaku (10,0 sun) 0,994 foot (11,93 inch) 0,303 metro (303 mm) 1,01 shaku (10,1 sun) 1 foot (12,00 inch) 0,305 metro (305 mm) 3,30 shaku (33,0 sun) 3,28 foot (39,37 inch) 1 metro (1000 mm)

    Fonte: Engel (1987), op.cit.

    Antes disso, na segunda metade do perodo da Idade Mdia no Japo, surgira uma outra unidade de medida, denominada ken, e que designava o intervalo entre duas colunas para qualquer estrutura de madeira de uma construo, variando no tamanho. De qualquer modo, ele veio a ser padronizado para a arquitetura residencial, e foi usado como unidade de medida nas cidades.

    Depois de vrias transformaes, a unidade ken definiu-se como mdulo nico de projeto, apesar de aplicado essencialmente em dois mtodos diferentes: o mtodo kyo-ma e o mtodo inaka-ma. Ambos os mtodos so ainda hoje utilizados no dimensionamento na arquitetura residencial japonesa, com maior prevalncia para o segundo, incorporado como unidade oficial no sistema japons de medidas.

    A razo primria para esse desenvolvimento est na ntima relao da unidade ken vida cotidiana, associada s dimenses humanas e ainda praticamente em uso. A relao entre as unidades shaku e ken, partindo do corpo humano e transferindo arquitetura residencial, est na comparao entre 1 ken = 6 shaku = 1 hiro, onde se pode associar a distncia entre eixos de colunas (ken) envergadura dos braos abertos de um homem japons (hiro). Medidas de maior grandeza, como o ri, o cho, e o jo, so aplicadas basicamente em topografia e planejamento urbano, mas, como as construes das cidades sistematicamente esto sujeitas s quadras, ruas e casas, tais medidas afetam um simples lote residencial, e indiretamente, as casas.

    Assim, o Sistema Japons de Medidas estabelece as seguintes relaes:

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    Tabela 03 O S istema Japons de Medidas

    unidade relao equivalente Ingls equivalente Mtrico 1 ri 36 cho = 2160 ken 12884,4 foot (2,44 mile) 3927,165 m 1 cho 60 ken = 36 jo 357,9 foot 109.087 m 1 jo 10 shaku 9,94 foot 3,03 m 1 ken 6 shaku 5,97 foot 1,818 m 1 shaku 10 sun 11,93 inch 303,02 mm 1 sun 10 bu 1,19 inch 30,3 mm 1 bu 10 rin 0,12 inch 3,03 mm

    Fonte: Engel (1987), op.cit.

    Enquanto que para medidas lineares o sistema japons tem valores exatos, o mesmo no se aplica para medidas de rea, notadamente imprecisas. Duas unidades so usadas para indicar as reas dos ambientes, porm nenhuma delas expressa medidas exatas.

    A unidade de rea jo (diferente da unidade linear jo) utilizada atualmente como sendo a rea definida por uma esteira (tatami). Por ser dependente do padro unitrio ken, com seus dois mtodos de projeto, a unidade de rea jo varia, no somente pelo tamanho diferente de seus ambientes, como tambm pelo uso destinado aos ambientes. Por conta disso, a rea indicada pelo nmero de esteiras que cobre o ambiente, por exemplo, 3, 4, 4, 6, 8, ou 10 jo. Assim, a nica identificao correta de jo relaciona-se s esteiras, que podem ter medidas variando entre 6,5 x 3,25 e 5,8 x 2,9 shaku (aproximadamente entre 1,54 e 2,00 m, ou 16,8 e 21,1 sq.ft.).

    A outra unidade de rea para dimensionamento dos ambientes o tsubo. Sendo a rea correspondente ao quadrado de ken, tambm varia conforme os dois mtodos de projeto relacionados ao mdulo ken. Mais ainda, desde que o valor ken, de 6 shaku, seja equivalente distncia entre eixos de colunas, a medida de rea tsubo somente fornece a soma da rea marcada pela grade construtiva do mdulo ken. Isto no significa a rea de piso, porque as paredes esto locadas nos eixos da grade construtiva, com a espessura destas ocupando a rea da grade, e subtraindo da rea de piso.

    Enquanto a medida tsubo usada indiscriminadamente tanto para reas interiores quanto para exteriores de lotes residenciais, no so calculadas as diferenas dos tamanhos e mtodos de aplicao do mdulo ken, nem a discrepncia entre distncias construtivas e larguras abertas. O tamanho atual da medida tsubo pode variar entre 6,0 x 6,0 e 6,5 x 6,5 shaku (entre 3,3 e 3,9 m, ou 36,0 e 42,3 sq.ft.), conforme o mtodo empregado.

    Assim, so as unidades de medidas que so manifestadas e influenciadas nas construes japonesas, de onde surgiram, sendo certamente as medidas shaku e ken as unidades mais importantes, e que merecem melhor exame.

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    A histria da casa japonesa a histria do mdulo ken. O que a arquitetura contempornea at agora tem se empenhado to sem sucesso, no Japo emergiu coerentemente: uma unidade universalmente aplicada em ambientes e em edifcios, uma distncia padro para a construo e a economia, um mdulo para ordem esttica, uma medida de sexta parte fracionada num sistema decimal, um comprimento relacionado a propores humanas, at mesmo um elo entre a cidade e o planejamento domstico. Ainda que outras foras pudessem contribuir para sua evoluo, o mdulo ken principalmente a faanha do carpinteiro. Nenhuma outra caracterstica na casa japonesa adequada para melhor demonstrar a habilidade do mestre na total extenso de sua profisso.

    O ideograma chins para ken significa distncia ou intervalo, e originalmente representa a maior distncia entre colunas na construo da casa. Sua padronizao foi baseada em consideraes econmico-construtivas, assim como na exigncia espacial exata do homem. Definitivamente, no foram envolvidas consideraes esttico-visuais.

    Logicamente, a tpica distncia entre colunas foi a medida decisiva, e ento provvel que a medida ken tenha vindo como uma dimenso independente da construo residencial, e no como mltiplo de uma possvel unidade de comprimento menor.

    F igura 18 Exemplo de apl icao do mdulo ken na estrutura

    Fonte: Engel (1987), op.cit.

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    Conforme esta medida ken tenha sido aplicada predominantemente nas cidades, h uma teoria baseada no fato que registros antigos sempre se referem ao kyo-ma ken, que literalmente significa distncia entre colunas no dimensionamento urbano.

    Aparentemente, esta indicao da medida ken fora feita para distinguir da empregada fora das cidades, onde a construo residencial no era ainda uma questo de ofcio particular e organizado, e tambm o desenho da casa no era limitado por ruas ou quadras rgidas e padronizadas. Ainda, a distncia entre coluna do mdulo ken, que inicialmente variava entre 6 e 7 ps, foi estabelecida em 6 ps. A distncia construtiva varivel do mdulo ken tornou-se uma medida exata.

    Nesse mesmo tempo, uma unidade ken diferente surgiu fora das cidades, o do dimensionamento inaka-ma, que a distncia entre colunas no dimensionamento da zona rural. No h evidncias de como as diferenas de medidas entre os dimensionamentos kyo-ma e inaka-ma surgiram, mas muito provvel que em reas fora de influncia das cidades organizadas, um sistema independente de desenho evoluiu de modo diferente do que em uma malha urbana. Os prdios em zonas rurais no eram ajustados por planos das cidades, nem sujeitos a regras convencionais e estticas das corporaes, e ainda pde se desenvolver estritamente atravs de linhas prtico-econmicas. Assim, temos dois valores para a unidade ken: no dimensionamento kyo-ma (original) de 6,5 shaku (1,970 mm = 6,5 foot); e no dimensionamento inaka-ma, de 6,0 shaku (1,818 mm = 6,0 foot).

    Certamente, uma unidade ken de 6 shaku do dimensionamento inaka-ma, com divises em meios e quartos, era uma medida padro mais prtica para o desenho e o arranjo construtivo que a do dimensionamento kyo-ma. A seqncia de subdivises decimais permitia uma multidivisibilidade em 2, 3 e 4 partes (a largura dos ambientes usualmente 2 ken, ou 12 shaku), sem sacrificar os mritos do sistema decimal. Mais ainda, a relao ntima entre viver e construir repercutiu numa completa adoo desse dimensionamento arquitetnico na vida diria.

    A diferena nas duas medidas ken tem outras consideraes. Depois de ambas distncias construtivas padro estabelecerem por si mesmo como medidas exatas, o uso da esteira de piso rgido gradualmente veio a ser comum por entre as classes baixas. Desde que a esteira fosse pr-fabricada, e provavelmente trazida junto com a mudana de domiclio, foi necessrio padronizar a rea de piso ao invs do intervalo da estrutura.

    No mtodo kyo-ma de desenho, o sistema de medir distncia entre colunas do mdulo ken, de eixo a eixo, foi reconfigurado, e o espao entre colunas foi determinado pelo tamanho da esteira padro, com medidas que originalmente tinham sido sujeitas distncia regular entre eixo de colunas.

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    Enquanto o mdulo ken do mtodo inaka-ma mantinha sua congruncia com as distncias construtivas, nesse tempo, a medida ken do mtodo kyo-ma no era to constante, mas variava dependendo da largura interna do ambiente determinado pelo nmero de esteiras. Devido a esta transformao, as duas medidas ken vieram a indicar sistemas particulares de planos tcnicos.

    Com isso, a medida ken determinou um desenvolvimento um tanto complicado: a transmutao e diferenciao de uma distncia entre colunas varivel para duas diferentes mas exatas medidas, em mdulo esttico num caso e em comprimento oficial noutro.

    A dissoluo do significado original do mdulo ken como a atual distncia entre colunas, e finalmente, a emergncia de dois essenciais e diferentes mtodos de desenho no anula a regra do ken como medida absoluta. Estas transformaes, ento, so fonte de muitas interpretaes erradas do significado arquitetnico do mdulo ken. Em tempos diferentes, significou coisas diferentes, tanto no passado como no presente, e em diferentes reas no Japo.

    Quando a esteira, o tatami, tornou-se indispensvel, tambm se tornou um artigo comercial no momento em que outras mercadorias, que foram feitas antes, requereram tambm um tamanho exato. Esta fixao pelo tamanho tambm fora necessrio porque era costumeiro entre os ocupantes e proprietrios das casas de levarem com eles suas esteiras, quando se mudavam para uma outra residncia. Naturalmente, as esteiras tinham que ser bem ajustadas aos novos domiclios. Portanto, quando a esteira tinha que ter um tamanho universal, o tatami foi padronizado. Isto para dizer que, quando a esteira tornou-se cobertura para toda a rea de piso, o seu tamanho padro viria a controlar a intercolunidade.

    Deste modo, parece apropriado considerar kyo-ma no mais um dimensionamento ou sistema de medida com unidades definidas, mas um mtodo de projetar e de decidir a distncia exata entre colunas. Tanto quanto este mtodo em si, as distncias construtivas resultantes so no mais do que mltiplos ou fraes do padro ken de 6,5 shaku, mas tambm mostram numa mesma estrutura desvios que impedem a identificao do ken no dimensionamento kyo-ma como comprimento fixo.

    Assim, o ken em kyo-ma novamente recuperou o significado original como intervalo entre colunas, sendo a distncia, contudo, medida de face a face de duas colunas, ao invs da medida de eixo a eixo das colunas.

    O tamanho da esteira no mtodo kyo-ma foi derivado das dimenses da esteira dos tamanhos dos ambientes mais freqentemente usadas. Eram salas de 6 ou 8 esteiras, com um lado maior de distncia de centro entre colunas de 2 ken no dimensionamento kyo-ma (2 x 6,5 = 13,0 shaku).

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    Com uma seo de coluna padro de 0,4 shaku (4 sun = 121 mm = 4,8 in) o comprimento resultante da esteira padro ficou 12,6 shaku, com largura livre de 2 ken. O comprimento de uma esteira a metade: 6,3 shaku. A esteira padro do mtodo kyo-ma: 6,3 x 3,15 shaku.

    A pr-fabricao da esteira padro e seu uso por todas os ambientes de diferentes tamanhos trouxeram ento o uso prvio de mltiplos ou fraes do ken de 6,5 shaku. A padronizao da distncia construtiva entre eixos finalmente abriu caminho para a padronizao do vo livre entre colunas. evidente que a distncia entre eixos de colunas corresponde para o padro de dimensionamento kyo-ma apenas em ambientes para 6 ou 8 esteiras, isto , com comprimento de 2 ken, enquanto todas os outros apresentam diferenas, mesmo desprezveis. Assim temos distncias entre eixos de colunas, no mtodo kyo-ma para largura do ambiente:

    Tabela 04 Dis tncias entre e ixos, no Mtodo kyo-ma

    1 esteira (6,30 + 0,40) / 1 6,70 shaku 1 esteiras (9,45 + 0,40) / 1,5 6,57 shaku 2 esteiras (*) (12,60 + 0,40) / 2 6,50 shaku 2 esteiras (15,75 + 0,40) / 2,5 6,46 shaku 3 esteiras (18,90 + 0,40) / 3 6,43 shaku 4 esteiras (25,20 + 0,40) / 4 6,40 shaku (*) este o ken original do dimensionamento kyo-ma

    Fonte: Engel (1987), op.cit.

    Com a padronizao do vo livre entre colunas, todo o dimensionamento construtivo pelo centro do elemento estrutural no mais vlido. E, como a tcnica de construo artesanal, variaes desprezveis no so problemas como para uma produo mecanizada, resolvendo-se sem trabalho ou material adicional.

    Dificuldades, contudo, surgem em determinar medidas padro necessrias pr-fabricao de painis deslizantes entre as colunas. Mesmo com a padronizao da largura livre do ambiente, discrepncias nas distncias entre colunas podem ocorrer em certos casos. Os elementos deslizantes para abertura de paredes eram pr-fabricados apenas nos casos mais comuns, e eram manufaturados em separado para cada casa, onde a padronizao para a largura livre do ambiente no necessariamente garantia padronizao simples dos painis entre colunas.

    Outro problema de discrepncia resulta quando dois ambientes pequenos so opostos a uma sala maior. Na prtica, ou as esteiras dos dois ambientes pequenos determinam as paredes externas, e a diferena resultante na sala maior compensada por tbuas de madeiras adicionais; ou as esteiras da sala maior determinam as paredes externas, exigindo medidas especiais para as esteiras dos dois ambientes menores.

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    O mtodo kyo-ma, ento, constitui projeto de elementos construtivos em torno de uma unidade padronizada para o interior do ambiente, a esteira, o tatami. As desvantagens so bvias, de projeto e dimensionamento sistemtico da estrutura. Contudo, o fato de estar ainda sendo usado, prova que a vantagem econmica obtida por padronizar unidades internas, e geralmente nos tamanhos dos ambientes maiores, tem excedido todas as outras deficincias, superadas apenas por mtodos artesanais.

    F igura 19 Mtodo kyo-ma para dimensionamento dos ambientes

    Fonte: Engel (1987), op.cit.

    Ao contrrio da distncia entre colunas inconsistente do mtodo kyo-ma, a intercolunidade do mtodo inaka-ma estritamente baseada numa malha quadrada de 1 ken (6 shaku), e no dependem internamente do tamanho da esteira ou dos painis. Conseqentemente, todas as distncias construtivas so ainda um mltiplo ou frao de 6 shaku. Contudo, como a unidade de ken (3 shaku), funcionalmente, levemente to pequeno para espaos mnimos, como varandas, corredores, banheiros, freqentemente a razo direta para o ken , sem hesitao, abandonado e em seu lugar, distncias como 3,5 e 4 shaku so usadas.

    A adoo do sistema de malhas tem na padronizao, em termos de comprimento possvel, um denominador comum para ambientes mnimos, os quais podem ento ser de uma medida comum maior. Ambientes maiores podem se sujeitar s medidas dos menores, e no o oposto. Aparece o ken de 6 shaku como padro de economia de material e praticamente de melhor adequao espacial.

    Do ponto de vista da arquitetura contempornea com sua padronizao, a consciente tolerncia com respeito a uma ordem semi-imposta significante. Isto mostra que a mais exclusiva padronizao que a arquitetura produziu ainda no preenche completamente todas as necessidades de estrutura, funo, economia e esttica.

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    Demonstra que os requisitos do homem, do material e das tcnicas so muitas vezes opostos para cada um e que o padro estabelece a otimizao do compromisso entre eles. Contradiz a opinio que a construo econmica necessariamente satisfaz os requisitos de uso ou que o consentimento desses requisitos produzem beleza.

    Evidentemente, o arquiteto-construtor japons, o carpinteiro, seguiu esse compromisso natural de projeto modular, se no conscientemente, pelo menos instintivamente. Ainda que baseado seu plano essencialmente na malha ken, seu conhecimento das duas tcnicas de projeto e construo de edifcios qualificou-o a saber precisamente em qual caso ele teria que desviar da malha modular.

    Enquanto que no mtodo kyo-ma h apenas uma esteira padro, de dimenses 6,5 x 3,25 shaku, da qual no corresponde com a distncia construtiva entre eixos, no mtodo inaka-ma existem muitos padres de tamanho de esteira: a esteira norma mede 3 x 6 shaku (909 x 1818 mm = 3 x 6 ft) com dimenses derivadas diretamente da distncia entre eixos das colunas, e com muitos tipos variveis que so menores para compensar as diferenas da parede externa. Como a largura das colunas, nas casas em geral, sempre de 4 sun (121 mm = 4,8 in), o desvio dos tipos variveis da esteira norma a largura de coluna ou 2 sun (60 mm = 2,4 in), ou seja, o comprimento reduzido para 5,80 shaku e a largura para 2,80 shaku.

    A ilustrao do mtodo inaka-ma mostra no menos que 5 tipos variveis de esteira, alguns necessrios em adio esteira norma, para cobrir exatamente qualquer rea de piso sem elementos adicionais.

    Entre estes, somente dois tamanhos so usados em ambientes de 3 esteiras, um espao comparativamente raro nas casas em geral. Outro tipo aparece apenas quando ambientes de 4 esteiras arranjado de maneira no usual de metade de esteira no lado externo. Apenas dois tipos variveis de esteiras so usualmente necessrios, em adio esteira norma. Estes trs tipos de esteiras, ento, so padronizados e usualmente postos em estoque.

    Ainda, em outra parte do Japo, onde o mtodo inaka-ma foi aplicado, a esteira norma no mede 3 x 6 shaku, mas 5,80 x 2,80 shaku. No h padres adicionais de esteiras em uso. Conseqentemente, para ambientes de 3, 4 e 4 esteiras, tamanhos especiais, menores que a esteira padro so necessrios.

    Tambm, ambientes de 6 esteiras ainda requerem, em adio esteira norma, um tamanho especial, enquanto que ambientes de 8 esteiras so cobertos somente com esteiras norma. Se um ambiente excede a largura de 2 ken, os espaos deixados entre as bordas das esteiras e as parties so preenchidos por tbuas pequenas de madeira.

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    O mtodo inaka-ma, ento, constitui de projeto sobre um sistema de malha quadrada de 1 ken (6 shaku), em que a linha de centro da construo ou partio corresponde com a linha da malha. A esteira, tatami, sendo um elemento de largura do vo do ambiente, incondicionalmente subordinada a este sistema. Mesmo com o conjunto de esteiras de tamanho padro, a prtica presente do fabricante de esteiras de pegar as medidas da estrutura completa da casa antes de deliberar sobre as unidades de uma simples esteira. Apesar de toda padronizao, diferenas e imprecises devido tcnica artesanal so inevitveis, e requerem tratamento especial.

    F igura 20 Mtodo Inaka-ma para dimensionamento dos ambientes

    Fonte: Engel (1987), op.cit.

    O projeto, no mtodo inaka-ma, uma fcil arranjo de unidades de espao padronizado sobre a malha ken, e na essncia no diferente do projeto modular contemporneo. Ainda, na casa japonesa, mesmo embora o projeto manual seja limitado apenas pelo plano do piso, a coordenao modular atual muito mais compreensiva. Aprofunda os detalhes e sistemas, o material e a substncia espiritual do edifcio, e num processo secular, coordena as medidas de mercado e a produo industrial. Desvios deste elaborado sistema so facilmente complementados no sistema artesanal a seu tempo, mas no o so sob uma padronizao condicionada mecanicamente, da sociedade industrial.

    A esteira de piso, chamada de tatami, uma esteira de palha de arroz rija e firmemente embalada, de 1,5 a 2 sun (45 a 60 mm = 1,8 a 2,4 in.) de espessura e aproximadamente de 3 x 6 ps (910 x 1820 mm) de tamanho. uma das mais distintas e instrutivas criaes na casa japonesa, ainda que muito mal interpretada.

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    Originalmente, apenas uma capa de piso porttil para acomodar duas pessoas sentadas ou uma deitada, o tatami com o tempo se transformou no prprio piso. Conseqentemente, estando sujeito ao sistema estrutural para o fechamento do ambiente, perdeu sua direta e original dependncia pela escala humana. Ainda, por sua medida ser regida pelo valor do vo entre colunas, no poderia funcionar como unidade de medida construtiva, porque para o vigamento do telhado ou do piso, apenas as distncias de eixo a eixo entre colunas eram importantes.

    Contudo, somente o tamanho da esteira foi padronizado, o que determinou em uma parte do Japo a regulamentao da distncia entre colunas pelo seu vo livre. Ainda, o que controla as maiores propores a distncia resultante de eixo a eixo entre colunas, e no mais o tamanho do tatami. Em outra parte do Japo o tatami permaneceu estritamente dominado pelas distncias do padro estrutural por meio de esteiras de vrios tamanhos num mesmo ambiente.

    Tabela 05 Tamanhos de este i ras ( tatamis)

    kyo-ma tatami 6,50 x 3,25 shaku 196,96 x 98,48 cm

    chukyo-ma tatami 6,30 x 3,15 shaku 190,90 x 95,45 cm

    edo-ma tatami 5,80 x 2,90 shaku 175,75 x 87,87 cm

    inaka-ma tatami a 5,60 x 2,80 shaku 169,69 x 84,84 cm b 5,60 x 3,00 shaku 169,69 x 90,90 cm c 5,80 x 2,80 shaku 175,75 x 84,84 cm d 5,80 x 3,00 shaku 175,75 x 90,90 cm e 6,00 x 2,80 shaku 181,81 x 84,84 cm n (norma) 6,00 x 3,00 shaku 181,81 x 90,90 cm x (metade de n) 3,00 x 3,00 shaku 90,90 x 90,90 cm y (metade de e) 3,00 x 2,80 shaku 90,90 x 84,84 cm

    Fonte: Engel (1987), op.cit.

    Todavia, o tatami, ou para usar uma leitura alternativa para o ideograma, o jo tornou-se padro para designar o tamanho do ambiente, por exemplo, uma sala de 3 jo, 4 jo, 6 jo, etc. A adoo melhor deste padro de grandeza de dimensionamento automaticamente limitou o nmero de possibilidades de tamanho dos ambientes.

    No exemplo particular da cobertura, o nmero de esteiras determina ainda proporo, mas importante notar que o tatami nunca, nem virtualmente, funcionou como mdulo em qualquer tipo de casa japonesa, como freqentemente assumido. A variedade de tamanhos padronizados existentes de tatami prova mais do que qualquer coisa a sua inadequao como mdulo.

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    O tatami, to distinto quanto a prpria casa japonesa, funcionou como o elemento moderador e unificador dos contrastes de arquitetura e deste modo , pela sua natureza, um produto de comprometimento entre a escala humana e a estrutural, entre as ordens vertical e horizontal, e entre as necessidades climticas e de hbitos. Como tal, no cumpre a demanda de nenhum deles completamente, e conseqentemente, mltiplo em seus significados. Esta natureza indistinta do tatami tambm explica a freqente falsa interpretao da qual sujeita.

    O tatami, tendo sido originado como um implemento para servir apenas um modo de vida particular, logo que surgiu na forma presente, comeou a influenciar as maneiras de viver de seus usurios. A organizao do espao funcional, como tradicionalmente feito pela prpria famlia japonesa, atravs do arranjo de unidades espaciais padronizadas numa malha bidimensional, usa a esteira como uma unidade ordinria. primariamente concebido com o estabelecimento de um simples modelo de circulao, influenciada por consideraes de relaes do lugar, de orientao do espao, e possivelmente separao da zona social de todo espao privado. Enquanto espaos utilitrios como banheiro e cozinha so distintos na finalidade e na forma, a similaridade fsica de todo ambiente de estar tem trazido tona crenas errneas que a funo do espao de estar japons indefinido e deste modo altervel vontade.

    O fato, entretanto, que cada ambiente tem um nome distinto relacionado com sua maior finalidade, e que seu uso, enquanto mltiplo, bem definido. As casas menores combinam vrias funes em um ou dois cmodos. Como na prtica ocidental, quanto maior a casa, mais distinta a utilizao dos espaos de estar individual.

    A designao dos ambientes, contudo, dificultada na traduo em linguagem ocidental, em que no h palavras equivalentes para descrever ambientes de dupla ou tripla funo, nem so as designaes japonesas distintas o suficiente. Por vez, o melhor que os nomes permitem apenas um indcio da finalidade original do ambiente, mas raramente explica qualquer uso posterior. Estes nomes so tradicionalmente mantidos a despeito do fato que o uso do ambiente mudou e at variou de lugar para lugar, tudo contribuindo para dificultar na busca de nomes descritivos para cada ambiente.

    O projeto da casa japonesa peculiar em muitos modos, sendo inter relacionadas muito intimamente com o modo de viver, onde o projeto arquitetnico sempre abrange, em todo alcance, dos fatores que compreendem a vida humana fsica e espiritual. Ainda, as distines de meras tcnicas de projeto so notveis e suficientemente importantes para justificar uma meno particular. Eles mostram que ainda o mtodo de projeto por si s produz caractersticas na arquitetura.

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    Projetar numa base de malha, sem dvida, tem sido instrumental na produo de um estrito plano retangular. Ainda, o retngulo de fato a geometria lgica da rea de piso, assim como a nica forma que possibilita uma livre adio de unidades individuais de ambientes, que se tornam resultantes de uma outra forma retangular, e ao mesmo tempo proporciona a base para a mais simples e econmica construo. Realmente, para desviar-se do modelo retangular necessita-se de razes sensatas e vlidas, e o projetista japons, embora em certa instncia parta da exata malha padro ken de 6 shaku, ainda ocasionalmente usa de formas curvas, aparentemente sem achar alguma razo para buscar por outra forma no plano do terreno diferente da retangular.

    F igura 21 Casa Japonesa

    Modelo de planta e fachadas de uma casa para 8 ou 9 pessoas

    Fonte: Engel (1987), op.cit.

    Assim, unidades padronizadas de ambientes so substitudos to facilmente quanto so conectados ao longo do sistema de malha do ken, no que facilita o padro de projeto de unidades escalonadas de ambientes, notados nas construes japonesas; porque cada uma das unidades, sendo ajustadas malha, nunca perde sua coeso com outras unidades a despeito da total liberdade de implantao.

    Por outro lado, o sistema estrutural, sem dvida, tem tambm contribudo para fazer possvel uma disposio casual do ambiente. A carga do telhado transmitida por uma pesada viga mestra (1 ken no centro) para fortes elementos longitudinais que tem vo mximo de 3 ken, uma distncia raramente exigida nas casas comuns. Mais ainda, vigas de apoio adicionais podem ser usadas sem conseqncias visual-construtivas desvantajosas pelo teto suspenso e pela boa altura construtiva. Assim, a disposio de colunas de apoio feita livremente e segue a organizao do ambiente, antes que a necessidade construtiva.

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    Ambiente somado a ambiente, uma seqncia de demarcaes de simples espaos sem distino de comeo ou fim, constituindo, no por finalidade, apenas um estado de crescimento orgnico. O projeto nunca realmente completo, nem a construo da casa em si. Com o crescimento de uma ou outra criana ou pela prosperidade, um outro ambiente simplesmente adicionado ao longo de qualquer espao remanescente do lote; e a casa, como seu projeto, torna-se dinmica.

    Problemas de circulao no aparecem como nas casas ocidentais, pois como regra, o ambiente provido de varandas tipo corredor para o lado externo, podendo servir como um corredor interno. Apesar do progresso, em algumas casas, podendo cobrir todo o terreno e podendo alcanar comprimento considervel, o corredor como mera circulao, no sentido ocidental, no se faz necessrio. Aqui novamente, um modo particular de viver produz um mtodo distinto de projeto, que por sua vez, ento, possibilita um contnuo crescimento orgnico da edificao, que no pode ser to simplesmente alcanado sob as diferentes condies de viver e morar ocidentais.

    Os mesmos fatores atualmente permitem tambm o deslocamento escalonado de contigidade de ambientes, porque no h corredores que exigem uma formao linear de ambientes contguos. Esse modelo escalonado usado tanto quanto o lote permite e muito preferido visto que tambm propicia a oportunidade de ver o lado externo da prpria casa pelo seu lado interno. Este foi sem duvida um fator determinante, em muitos casos, do arranjo da maioria das casas. Mas a maior importncia arquitetnica o fato que criou espaos externos vinculados e marcados por duas paredes externas perpendiculares.

    Esta disposio, ento, caracterstica do projeto japons: a adio de espaos individuais com valores iguais, sem acento, objetivo ou finalidade particular do espao. Unidades espaciais, ainda que distintas entre elas, no sentido de projeto, no so graduadas entre maior ou menor, ou entre externo e interno. Antes, os elementos de marcao espacial encerram espaos internos e externos, resultando numa seqncia de espaos definidos ntidos, to diferentes da separao rgida interna-externa da arquitetura tradicional ocidental e da dissoluo amorfa das distintas casas-jardim na arquitetura residencial contempornea.

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    1.4. O MODERNISMO E A HABITAO MNIMA

    Na virada do sculo XIX para o sculo XX, os arquitetos, influenciados pelo desenvolvimento da Segunda Revoluo Industrial, envolveram-se com materiais e com questes tcnicas e espaciais relacionadas com a indstria, a fim de tornar mais humana a arquitetura originria da industrializao.

    Antes disso, a maioria das edificaes comerciais e industriais eram realizadas por engenheiros, devido ao desinteresse dos arquitetos que entendiam que a produo em srie, com uso de tecnologia e industrializados, eram destitudos de arte, beleza e emoo humana.

    Com o fim da I Guerra Mundial, uma nova ordem prefigurava na arquitetura, principalmente na Alemanha devastada, onde surgiu o que, no perodo entre guerras, chamado de Neues Bauen, ou Nova Arquitetura, em que a relao homem-mquina tomava importncia, com preocupaes com a racionalizao, a funcionalidade e a humanizao dos espaos.15

    O perodo da Nova Arquitetura foi precursor no estudo e na pesquisa dos problemas que envolvem projetos funcionais e sistemas construtivos racionais aplicados arquitetura, com aplicaes principalmente na habitao de carter social. Caracterizou-se pelas causas tcnicas e sociais, envolvendo a arte e a tcnica de bem construir, e diferenciando-se por estabelecer novas metas e abraar novas causas, como as sociais, jamais verificadas em nenhum outro perodo, at ento, da histria da arquitetura.

    Com isso, a partir de 1923, assiste-se a uma retomada da construo, sem inovaes tecnolgicas marcantes e segundo formas que privilegiavam as habitaes individuais, isoladas ou em conjunto. Entre 1926 e 1930, ocorre a produo em massa das habitaes, segundo mtodos industriais e de pesquisas de formas para as habitaes adaptadas s necessidades das camadas populares.16

    nesse perodo que arquitetos como Walter Gropius, com a Bauhaus, e Ernst May, arquiteto chefe da prefeitura de Frankfurt, preconizavam o racionalismo, na produo de centenas de apartamentos no lugar de vilas particulares. Casas boas, no para ricos, mas para operrios, que respondiam no a princpios estticos, mas sim a dados objetivos, visando tambm ao pobre uma condio satisfatria de existncia.

    15 Kopp, Anatole Quando o Moderno No Era um Estilo e Sim uma Causa - So Paulo, Livraria Nobel/EDUSP, 1990 16 Kopp (1990), op.cit.

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    O arquiteto Hannes Mayer, sucessor de Gropius na direo da Bauhaus, definia a arquitetura no mais como a arte de construir, mas uma cincia da construo. Para ele:

    Construir no uma questo de sentimento, mas de conhecimento. Construir no , conseqentemente, um ato de composio sentimental. Construir um ato refletido de organizao. O arquiteto o organizador das cincias da construo. O arquiteto no um cientista no sentido restrito. Se construir organizar, a arquitetura, que uma cincia da construo s pode desenvolver-se em uma sociedade organizada e planificada. Ainda, O edifcio socialista no belo nem feio; ele completo ou incompleto, vlido ou no vlido. O resultado de um processo organizacional no depende de um julgamento esttico. 17

    Por esse racionalismo expresso, as caractersticas principais percebidas na Neues Bauen constituam-se na normalizao, tipificao, e padronizao, dentro de uma organizao e planificao socialista da construo, em que a reduo progressiva do nmero de elementos padronizados (espaos, elementos, aparelhos) um ndice de socializao da vida das massas.

    D