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Todos os direitos estão reservados para a Editora In House.

Proibida a reprodução total ou parcial desta obra.

Editor responsável:

Capa e projeto gráfico:

Assistente de arte:

Assistentes:

Revisão gramatical:

Fotos do livro:

Márcio Martelli

Márcio Martelli

Guilherme Catalano e Caroline Ferretti

Ruth Rodrigues e Bruna Di Giacomo

Ivanira de Souza Lima Dadalt,

Valquíria Gesqui Malagoli e Renata Iacovino

Arquivos do autor

Publicado por:

Rua João Ferrara, 100 - Sala 13 - Jardim CicaJundiaí / SP - CEP 13.206-714

Fone / Fax: -(11) 4607-8747www.editorainhouse.com.br

[email protected]

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Índices para catálogo sistemático:1. Contos: Literatura brasileira 869.932. Poesia: Literatura brasileira 869.91

Martelli, MárcioMuito Mais / Márcio Martelli. --

Jundiaí, SP : In House, 2007.

ISBN 978-85-98354-34-7

1. Contos brasileiros 2. Poesia brasileiraI Martelli, Márcio..

CDD - 869.93- 869.91

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Hoje estou incumbido de falar do Márcio e de seu novo livro. É com imenso prazer quefaço isso, e é tão fácil falar de quem se ama!

Viajando pelas páginas, sonhando com as letras e lembrando velhas e nem tão velhascanções, pude me sentir dentro das linhas, com se fora o próprio autor, pairando por sobreum mundo, mundo este que somente existe no universo amoroso dos poetas.

Lendo estas páginas, retratos de tempos, lugares e canções, amei um pouquinho,sonhei um pouquinho, fui feliz um pouquinho... O conta-gotas do amor me proporcionou so-mente um pouquinho, mas foi o necessário, o suficiente para balançar os alicerces damemória.

Alguns lugares conheço, algumas das canções não esqueço e certos fatos retratadosfielmente pela pena apaixonada deste poeta, presenciei pessoalmente. A casa em quemorou e que foi por muitos anos o meu ancoradouro, o meu lugar no espaço, hoje ponto notempo, me transporta a um lugar no tempo que procuro sempre que preciso sorrir, ou quan-do preciso sonhar, e sonhar é imprescindível para viver!

O tempo passou, passará e o poeta amadureceu para o mundo. O mundodas letras agora é parte do seu mundo, acrescentando ao que já é.

Hoje ganhei este presente, comentar o incomentável, aquilo que somente se podesentir... Juro que estou tentando...

Hoje abri o meu melhor sorriso, embalei meu coração e cantei, cantei muito mesmo,eu tinha que falar do Márcio e seu novo livro. Tinha que me abastecer de emoções,

... Muito mesmo.Quem não o conhece, tem a oportunidade, nesta sua obra, de conhecê-lo ao menos

um pouquinho. Vai sorrir um pouquinho, chorar um pouquinho, vai ser feliz um pouquinho...Pra que mais?

Segue em frente... O tempo é nosso companheiro e nós ainda estamos aprendendo.Obrigado, Márcio. Paz.

Muito MaisMuito Mais

MuitoMais

Paz... paz... paz!Muita paz

Ronaldo Martelli

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Um livro cheio

de saudade...Márcio Martelli é muito mais do que possa

parecer, ainda que a frase pareça conhecida, repe-tida, revivida. Márcio veio ao encontro dos meusolhos e isso foi o suficiente para despertar a minha emoção:

“Eu nem sabia,mas a porta estava abertaquando você entrou.(...)Tenho a sua chave.Você tem o segredo do meu cofre,A minha senha de acesso.Por isso lhe peço:

Nunca deixe a porta aberta!”

Naquele momento ele estava começando atrazer a público seus textos e eu me deparava como que eu gostaria de ter escrito! Entre o Márcioque me foi apresentado, tempos depois, e o seu'jeito escritor' senti uma enorme distância. Mas otempo encarregou-se de confirmar que minhasensibilidade não se enganara. Um homem extre-mamente dinâmico e, ao mesmo tempo, tímido osuficiente para não se deixar ver, nas relações co-tidianas, como em seus poemas.

Pela Fresta -

Um livro cheiode saudade...

“Só sei de mim e olha que bem pouco. O sufi-ciente para não me revelar muito. Embora nemsempre funcione. O tempo tá passando e eu ficoaqui, só esperando ser chamado.”

Mas quem lida com palavras sabe da forçadelas e que palavra é vício doce que embala...Márcio veio ao mundo dos poetas loucos, amadose odiados, para sempre!

E Márcio foi se tornando um companheiro deletras. Passamos a trocar textos, a escrever, aomesmo tempo, um estimulado pelo outro, a noscomunicar via e-mail, com regularidade, para con-fidenciar tudo quanto ousamos dar à luz.

Desses partos noturnos alimenta-se uma fielcumplicidade literária, uma estimulante amizadeque, ao contrário de tolher egoisticamente, alça ooutro ao vôo, a novos rumos, a jornadas intensas,aos êxitos.

Idéias fervilham e assim, dia-a-dia, posso verMárcio escrevendo sobre tudo, sobre todos, sobrea vida, sobre si próprio, em temas dos mais varia-dos, mas costurados pelo sutil fio da sensibilidadede quem ousa despir a alma diante do mundo:

“E sei que mesmo em meio a mares turbu-lentos. Aportarei em porto confiável.”

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Com um modo especial de ir descrevendo omundo real e o mundo emocional, Márcio tocaprofundamente. Alguns de seus textos mostramum olhar peculiar sobre o mundo, um jeito própriode ser que se impõe com delicadeza, sem ferirquando se lê. Ao revés, a maioria de seus textosfaz com que se aprenda a deixar de lado o medo dechorar, pois é como se cada uma das palavrasrevivesse emoções vividas há bem pouco tempo.

Quando os primeiros alinhavos delineavamos contornos desse segundo livro, Márcio avisa-va-me que seria um livro cheio de saudade e eunão compreendia o motivo à época. Hoje, relendoos poemas e textos de , repito apenasque deles brota emoção, pura emoção. Quem conhece Lis, compreende:

“Você foi meu norte um diaE será sempre a minha bússola”

Não há nenhuma outra palavra, além de emo-ção, que possa traduzir o sentimento de quem lêum poema do qual verte vida em abundância:

“Saber que alguém o espera seja onde for, emque lugar for, em que época for. (...) Por isso,'espera-me no céu meu amor'.”

Márcio fala sobre um universo peculiar eíntimo, sem que se possa adivinhar que suas pala-vras alçarão vôo e mais tarde, por certo, servirãode ungüento precioso para aliviar a dor de quemtem coragem de sentir e se entregar ao amor, àvida, à dor, à saudade...

Muito Mais-

Saudade que se já existia, em definitivo seinstalou em todos nós com a partida de Alessan-dra, a irmã-amiga querida, e que nada, além daspalavras de Márcio, alivia.

“Deus ficou me guiandoE me mostrando os próximos passosPara que eu não pisasse em falsoEle também me enviou anjosQue com suas mensagensAliviaram um pouco a sua lembrança,Minha doce irmã,E o que eu posso pedir mais?”

Um outro Márcio agora se mostra a nós, maispleno que antes, mais marcado pelas agruras davida e, por isso mesmo, transbordando em novoscaminhos de criatividade inigualável, com maturi-dade e inteligência ensinando que a vida é para sermuito mais vivida e que nós podemos ser muitomais do que somos!

“Aliás, eu teria de parar o tempo. Será queconsigo isso? Se eu me esforçar bastante e meconcentrar... Será possível?”

Que saibamos beber, nesse livro cheio desaudade, a compreensão para as nossas almas, oalento para as despedidas e o sabor vibrante davida!

Susana Ferretti

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ApresentacoesAcredito que somente Deus guia os nossos caminhos. É Ele que mescla, por

razões somente Dele, alegrias, tristezas, sucessos, fracassos. Porém, acredito, tam-bém, com algumas ressalvas, que há certa interferência no destino de nossas vidas.

Assim, num certo dia, Deus foi o mensageiro incumbido de me aproximar do poetaMárcio Martelli, tendo como personagem central o seu primeiro livro: .

Muitos trechos me emocionaram, e em alguns deles, identifiquei passagens deminha vida como: . A partir daquele momento,começou uma amizade; iluminada e espiritual, acredito eu.

Agora, através do seu novo trabalho, Márcio revela seu surpreendente e incontestável talento. Em , ele alça vôos expressos, e colhe fragmentos de grandeternura, em primorosos versos emoldurando sua poesia.

Apesar de estar passando por um momento peculiar em seu existir, ele vem avan-çando em todas as direções, demonstrando assim sua maturidade emocional, e, sobre-tud0, seu mérito de grande ser humano.

E como bem disse, a nossa querida e saudosa Alessandra Pezzato: “Ler a obra demeu irmão é perceber, pouco a pouco, com a leitura de suas páginas, que o mundoainda existe pela força do poeta, aquele que não deixa morrer a esperança existente emtodos nós”.

Márcio, que Deus te ilumine .

Produtor e apresentador do programa

Para Sempre

Uma quinta-feira qualquer há trinta anos

-Muito Mais

Muito Mais

Estação CulturaOdair Cantamessa

Apresentacoes

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Muito Mais“ab imo pectore”

“Tempus fugit!”

é poesia e prosa impregnadas de pura emoção e profunda nostalgia, queirrompem iluminadas , em um fluir ágil e permanente, envolvendo-nos docomeço ao fim da leitura.

Em ritmo de confidência, o autor Márcio Martelli permite-nos compartilhar os secre-tos escaninhos de sua psique, desvendando um caleidoscópio de lembranças e vivências,que ele recria e reconstrói com singular habilidade.

O resgate do passado, através da memória afetiva, é uma forma de vida e ressur-reição, um anseio de eternidade, que assume o valor de advertência: . Equi-vale a um conselho de grande sabedoria. É como se ele nos recomendasse a fruição dabeleza incomparável do momento, por ser efêmero.

é fruto de uma real vocação literária. Surpreendente. Fecunda. Original.Muito Mais

Ivanira de Souza Lima Dadalt

Amigo Márcio,Li o e..., percebi a sua clareza em expor os seus pensamentos. A quanti-

dade de palavras que fluem, como se fossem uma cachoeira de palavras, na tentativa denão deixar escapar algum detalhe, por menor que seja, a fim de transmitir, em plenitude,seu sentimento.

As laudas que li de sua obra, transmitem o quanto você ama sua família, vive o espíritode irmandade, as lembranças do passado e sofre com as perdas ocorridas.

Interessante como você escreve sobre os seus conflitos profissionais, como num pas-se de mágica, você dá a volta e na reviravolta tudo se acerta.

É isso aí, Márcio! Sua escrita livre e sem amarras desperta e prende a curiosidade doleitor. Desejo aquele sucesso para .

Do amigo

Muito Mais

Muito MaisIwan Fleming Taibo

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Agradecimentos

Márcio Martelli

Pois é, estou lançando mais um livro. E eu não poderia fazê-lo se não fosse a ajuda de meusamigos que nunca me abandonaram. Passei por muitas mudanças em minha vida nesteúltimo ano, mudanças essas que me fazem, ao acordar toda manhã, perguntar a Deus serealmente aconteceram.

Mas mudanças fazem parte de nossa vida e eu continuarei seguindo a minha, acreditandona Sua palavra, e agradecendo, cada dia, por mais um dia vivido! Por esta razão, meuprimeiro agradecimento é ao Senhor, o único Mestre que sempre nos guiará.

Depois eu diria que este livro não existiria se não fosse a presença querida de Ivanira deSouza Lima Dadalt, Susana Ferretti, Valquíria Gesqui Malagoli e Renata Iacovino. Mulhe-res, sempre presentes em minha vida e que me fazem continuar com a minha missão.

Este livro é feito de muitas homenagens e de muitas saudades. A minha vida é uma grandesaudade. Por isso, dedico este livro a todas as pessoas que um dia fizeram parte de minhavida e que deixaram esse sentimento que nunca esquecerei.

Não posso me esquecer de minha família, presente em quase toda a obra. Foi para todosvocês, que eu amo muito, que fiz este livro. Para que se tornem imortais. Ruth, Fabiano,Sheila, Mariana, Fernandinho, Marina, Bruno, Jeferson, Pietra, Clara, Raul, Ronaldo,Marlei, Carla, Bruna, Júlia, Lisete e minha afilhada, Marina... minha vida nãoteria sentido sem vocês.

Um abraço especial para minha tia Ana, cheio de toda a ternura e amor que você sempredemonstrou para com todos nós. Você será sempre especial para mim.

Eu não queria finalizar com tristeza, e sim, com uma grande alegria repleta de saudades.Por isso, eu dedico este livro para minha irmã, que tão cedo nos deixou. Alê, este livro épara você! Espero que você goste muito... Muito Mais!

Rosângela,

Agradecimentos

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A velha casa

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Queria retornar no tempo, voltar para aquelacasa onde habito em pensamento. Somente pas-sar um tempo nela e apagar os medos, expulsandotodos os fantasmas que até hoje me perturbam opensar.

Então, eu andaria por toda a casa e esperariaa noite chegar. Fecharia as portas dos fundos quedavam para o quartinho, não teria medo, pois elassó se abririam ao meu toque e ninguém passariapor lá.

Fecharia depois a janela do meu quarto, masantes olharia para o limoeiro como que o desa-fiando... Ninguém subiria por ali também, neminvadiria a minha horta.

E iria para sala de estar, com aquele vidro quenunca fechava direito, e ninguém se incomodava,estava sempre aberto.

Acho que eu tinha medo daquela casa.Acho que eu ainda moro lá, apesar de todos

estes anos passados.Mas eu queria voltar lá e entrar mais uma vez

em seus cômodos, rever o quintal de minha infân-cia e apaziguar todas as memórias e descansar...descansar... O que passou somente ao tempopertence.

Eu fui feliz naquela casa, tive momentos depura felicidade dos quais nunca me esquecerei.

Naquela casa todos estavam presentes,

coisa que hoje não é mais possível. Lá, tivemosmuitos Natais e Anos-Novos e sempre havia umaniversário a se comemorar.

Havia alegria e muita ingenuidade. A vida semostrava tão simples que nós ali acreditávamosnisso. Na simplicidade do mundo.

Só que o tempo foi passando. Novas pessoaschegaram e compartilharam suas vidas com asnossas. Um novo tempo, uma nova era... e foi aíque tudo começou a mudar.

Já não tínhamos mais esta casa. Vivíamosem um outro local, outro planeta. Só que ainda es-távamos juntos e isso era o mais importante.

Dois anos se passaram e uma nova mudançase fez presente. E nesse novo local vivemos porquinze anos, até começarmos a nos separar.

Queria voltar para estes tempos e viver tudode novo. Enfrentar todas as dificuldades que vive-mos neste período, só que todos juntos.

Queria ouvir a sua risada que me dava tantoconforto e segurança, como se nada no mundo pu-desse me ferir naquela hora, como se eu fosse im-penetrável, como se eu mandasse no mundo.

E veríamos nossos filmes juntos, mesmo quevocê dormisse no meio já estou tão acostumadoa isso e não quisesse se levantar do sofá. Dividirvocê com meus irmãos e não ter ciúmes. Ser ape-nas bom. Ser apenas eu. Ser apenas você.

A velha casa outra vez

Muito Mais • Márcio Martelli

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outra vez

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Mas a vida acabou para você e nós ficamosaqui. Eu não tenho a sua força, nunca terei. Entãofico perdido achando que não construí nada, nãofiz nada e não sou nada.

E uma fé me move e leva-me adiante. Emesmo sem nada saber, acabo fazendo. Se é certoou errado, não sei. Um dia vou saber. Enquantoisso me sobram apenas as memórias e tudo aquiloque eu sempre quis fazer e não fiz. E nem sei por-que não fiz. Não sei...

Estou sozinho e sempre disse que era assimque eu queria que fosse. Mas me dá um certo me-do ficar envelhecendo sem ter ninguém ao lado,sem ter alguém a quem me dedicar. Alguém queprecise de mim, como eu, agora, preciso de você.

Sabe aquele abraço forte de feliz Ano Novo? Édisso que eu precisava agora. E também da suavoz consolando, do orgulho que eu sempre soubeque você tinha de mim.

Tudo o que eu não preciso agora é da minhaindiferença, de não mostrar o que eu realmentesentia.

É tão tarde agora.E me resta tão pouco tempo.

Eu me calo.

Eu estou aqui... Chorando...E com muitas saudades!

Eu não sei dizer nada por dizer...

Onde está você agora?

Abril de 2007

Muito Mais • Márcio Martelli

Dedicado à memória de meu pai Elyzeu e à minha família

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Eternamente

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Eternamente

Muito Mais • Márcio Martelli

Ele não sabe, mas eu bem seiEu sintoQue por detrás daquela portaOutras portas já se abriramE muitas outras janelas já escancararamA nossa almaPelos mais variados tempos

Talvez ele saiba e não queira me contarFaz-se de falso sábioPara que eu não o amole com mil perguntasPois ainda não é a hora das respostasE mais aindaEle quer que eu suba as montanhasPor mais íngremes que sejamSem temerSem pestanejarE se porventura eu cairEle estará ao meu ladoPara me levantar

Eu sei que ele sabeE disfarçadamente insistoInsinuo com indagações infantisE ele desconversaPois o que vale é o presenteO momento agoraE é aqui que devemos estarE viverNa paz de DeusPara sempre e amém!

Dedicado a meu irmão Ronaldo Martelli, eterno companheiro de outras vidase que atualmente optou por estar encarnado ao meu lado

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Muito Mais • Márcio Martelli

Para Lisete Pecoraro

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É impossível esquecerE eu quero lembrar-meSempre de vocêDo seu modo e maniasDa sua vozDo seu jeito meio diferentãoDe fazer as coisas assimDespojadamenteRindo altoBradando para quem quiser ouvir

Eu sou feliz!!E me matando de vergonhaFicando da cor da minha camisaSempre vermelhaDedos mágicosFigura ímpar que nunca encontrarei igualVocê foi meu norte um diaE será sempre a minha bússolaPois quando eu me percoEu recorro a vocêA grande companheiraQue assim, da sua maneiraSabe dizer coisasQue eu não saberiaSabe compreender as coisasDe um jeito que não compreendo...

“Estranho seria se eu não me apaixonasse por você”

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Se eu morresse amanha

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Muito Mais • Márcio Martelli

Sabe, eu pensei que iria morrer. E foi um sen-timento que se apossou de uma forma tão intensaque já não mais sabia o que fazer; se eu vivia tudorápida e loucamente ou se degustava o pouco quetinha acumulado com doses mais suculentas...

Tudo porque eu iria morrer a qualquer mo-mento e já não podia escolher coisas que normal-mente escolho: a viagem ainda a fazer, o novofilme do Harry Potter que vai estrear, os CD´s queainda não ouvi, nem mesmo os livros que não li...Parecem coisas tão bobas e insignificantes, masna hora não eram, pareciam até mesmo impres-cindíveis e já me via negociando com a morte algoassim: eu posso voltar de vez em quando só paraler, ouvir, viajar... essas coisas.

Foi então que me toquei que morrer implica-va em nunca mais tocar em você, vê-la ao me-nos fisicamente então pirei. Bateu um desespe-ro tão grande, mas tão grande, que precisei parartudo e meditar. Conversei com Deus e implorei queme deixasse mais um pouco, que eu melhorariacomo ser humano, que faria as coisas mais certas,que amaria mais a todo mundo, que não me im-portaria com o que falam de mim, que ignoraria asinvejas que sentem (e não entendo por que sen-tem isso), que viveria mais, que voltaria a correr,jogar vôlei, que veria os amigos que não vi nunca

Se eu morresse amanha-

mais, que visitaria a velha namorada, que amariamais, muito mais, mais, mais...

E me vi chorando como quem pede perdãopelas coisas que deixou de fazer, pelos lugares quenão viu e por todo o bem que evitei ou esqueci, ousei lá, eu nem mesmo sei ao certo o que escrevo,penso ou imagino.

E chorei muito, mesmo enquanto falava comvocê ao telefone. Saudades talvez, medo talvez.Medo de errar de novo, de desperdiçar a chanceque estava ganhando novamente, pois entendique Deus me dava o sinal positivo e me dizia: Euacredito em você, não me decepcione. E eu nãoconseguia traduzir isso em palavras que entende-ria, nem em atos. Ou seja, eu me encontrava per-dido novamente.

Lembrei-me nessa hora de meu pai, de meuavô, referências que tenho de quem já se foi e queainda vivem na minha lembrança. Queria muitosaber como eles estão, onde estão e como foitudo, a passagem, a chegada, a adaptação... Eutenho muito medo do que vou encontrar um diasabe lá onde, mas eu sei que vou chegar e vencer,como sempre venci.

Então, em um sonho eu desencarnei.Mas morri de verdade, senti a morte tão for-

te, mas tão forte que realmente pensei que havia

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Muito Mais • Márcio Martelli

morrido. Observava meu corpo sendo velado ealgumas pessoas ao lado. Não me recordo dorosto de ninguém, não sei quem estava lá. Só melembro de minhas mães: sim eu tenho duas mãese não me perguntem como. E elas me viram co-mo, se eu estava morto? , mas, sim, repito, elasme viram. Vieram até mim com os olhos mareja-dos e peguei suas mãos e coloquei-as uma sobre aoutra. Lembro-me de ter dito que a ligação entreelas era longa, de muitas vidas e vidas. Por queestavam juntas de novo? Isso não me foi permitidosaber, nem revelar.

Andei e fui ver meu corpo. Velei a mim mes-mo por instantes que me pareceram anos. Não viminha vida passando como um filme. Nem mepassou essa idéia pela cabeça. Ouvi, sim, a voz deum protetor falando comigo e me acalmando, dei-xando-me em paz.

É isso a morte afinal? pensei comigomesmo Onde estão os amigos e os familiaresque vêm me buscar? Ninguém liga para mim?

Fui ficando triste. Daí, ouvi a voz de meu avô evirei menino outra vez, mexendo nas suas coisasem seu quintal. Senti-me seguro, como quem diz:agora, sim, eu posso morrer, tem alguém que co-nheço ao meu lado que vai me levar para ondetenho de ir.

Foi quando ouvi:Chegou a hora!

E meu corpo espiritual começou a jornada.Fui sendo literalmente tragado e levado embora.Estava bem, estava muito bem, em paz, estavafeliz, nem me tocava que não iria mais ver minhas

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afilhadas, nem minha família, só queria ir, e ir, e ir...No meio do caminho, se é que ele tem meio,

lembrei-me de que não via nenhuma luz e por uminstante fiquei chocado. Cadê a luz? Cadê a luz?gritava.

A luz veio e de forma tão forte, mas tão forteque acordei num sobressalto. Abri meus olhos,olhei minha estante de livros, ouvi os sons da ma-nhã, os pássaros, os carros, a vida. Não sabia seestava vivo. Não sabia mais nada.

Poderia levantar e ir chamar alguém, mas omedo de que não me ouvissem era tão grande, queresolvi ficar na cama e esperar, esperar o dia raiarcom mais intensidade, o sol bater na minha janelae todo mundo despertar.

Na verdade eu queria me mostrar e verificarse me viam realmente. Aí, então, eu sossegaria econstataria a verdade: ainda estava vivo!

E foi assim que aconteceu, eu morri de ver-dade e senti a morte. E posso dizer que foi ótimo,que perdi o medo, mas que ainda me apavora dei-xar tudo isso aqui. Ainda não é a minha hora, enem o meu momento. Não tive a minha hora da es-trela, nem os meus quinze minutos de fama, comobem previu Andy Warhol.

Fiquei com isso na cabeça, consultei todosos dicionários de sonhos, tarô e tudo o mais. Eramtodos dúbios e diziam coisas boas e ruins sobreesta experiência.

Eu prefiro acreditar em minha intuição e se-guir em frente. Continuar a construir coisas boas eviver.

E ler tudo que eu quiser ler...

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Muito Mais • Márcio Martelli

E ouvir todas as músicas que puder...E viajar para todos os lugares do mundo e

fora dele...E beijar muito todos que amo...E olhar nos olhos e brincar com a vida...E esquecer-me das coisas ruins através das

quais a vida nos põe à prova, para nos testar mes-mo, eu diria.

E ignorar os maus e falsos amigos, rezandopara que enxerguem a verdade, mesmo que aindavejam por detrás dos véus da ignorância. Pois dis-to aqui a gente não leva nada, nada, nada...

E por mais apegado que seja a tudo isso, seique irei como vim, sem lenço, nem documento.Apenas com minha história de vida, das outras edesta daqui.

Pagarei altos preços por tudo? Sim, pagarei.Por isso minimizarei tudo e abolirei os excessos.

Continuarei errando? Sim, continuarei. Sou

humano e não conheço toda a verdade. Mas conti-nuarei agindo pelo coração, acho que assim erromenos.

Agora, se eu morresse mesmo amanhã, sóiria querer ver o sol se pondo de novo, na cidade deJundiaí. Sempre foi e sempre será o pôr-do-solmais lindo que já vi, não me importam as outraspaisagens deste mundo, importa-me onde estou eo que vivo. E aqui é onde viverei, nas tardes boni-tas ao pôr-do-sol, como diz Haydeé DumanginMojola. É como penso e pensarei.

Se eu morresse amanhã, deixaria saudades elevaria muitas, mas teria a certeza de ter amadomuito, muito mesmo. E pediria:

Não fiquem tristes por mim! Acendam asfogueiras e cantem com a voz interior. Eu estareisempre em vocês, como estarão sempre em mim.Sabem por quê? Continuarei vivo, pois a alma éimortal.

Se eu morresseamanha

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Esquadros

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Muito Mais • Márcio Martelli

Dedicado aos amigos que nunca esqueço

Esquadros

Sinto tanta falta de vocêsDos amigos do colégioDo time de voleibolDo caminho que percorriaDa minha casa até a escolaDo ônibus que pegavaSem necessidadeApenas por diversãoOnde estão todos vocêsQue eu não vejo mais?Em que jardim vocês moram?Que bairro, que rua, que CEPQue desconheço...Quanta falta vocês me fazem!Chego a chorar de saudadeDesse tempo passadoEnquanto eu ando pelo mundoE os meus amigosCadê?

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Almodóvar

Todo sobre mi madre

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Coisas de Almodóvar

Estou ouvindo uma canção espanhola que diz. Isso

mexe comigo, mexe com todas as coisas em que acredito.E me faz pensar que tudo tem um fim e que pode terminar.

.É tão bonito e ao mesmo tempo tão madrilenho, tão kitsch,

mas me toca, toca fundo, bem no meio de um sentimento quetodos almejam e querem ter.

Uau!!Que dizer sobre isso?Que é patético? Que é absurdo?É lindo!É lindo saber que alguém o espera seja onde for, em que

lugar for, em que época for.É, eu acho que sou romântico, que estou romântico, que te-

nho vontade de esperar e ser esperado.Por isso, .E se eu for antes, esperarei por ti.

“espera-meno céu, meu amor, meu coração, se você for primeiro...”

“Espera-me no céu, meu amor, que lá faremos nosso ninho”

“Espera-me no céu, porque nosso amor é tão grande.E eu te peço, me espera no céu.Entre nuvens de algodão faremos o nosso ninho”.

“espera-me no céu, meu amor”

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Destino

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Destino

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Bebo neste espelhoMinha imagem refletidaBela, disforme, incompreendidaSorvo em goles desmedidosE vou degustando cada milímetroOnde me vejo com olhos próprios

Não me reconheço, nem me denuncioApenas esbravejo quando vejoQue o que sou não é o que realmente pensoEntão paro.E no mínimo instante em que fico estáticoLonge do ninho e distante das horasVejo-me retratado fielmente

Sou aquilo de que sempre fugiA figura hermética e paterna dos meusQue se foram, mas que ainda estãoAprisionados dentro de mimEntão sufoco um gritoE em vão tento fugir de mim mesmo

Mas, como todo acordoQue fazemos nesta vida,Esta é a minha sinaE eu tento navegar por seus maresSem naufragar, nem ficar à derivaE sei que mesmo em meio a mares turbulentosAportarei em porto confiável

de mim mesmo

fugir

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Para minha inesquecível irmãzinha que se encontra no céu do Senhor

Alessandra

Abri todas as janelas da casaAbri todas as portasE gritei ao mundoQue você tinha ido embora

Eu não suportava maisGuardar essa dorQue embora ocultaDentro do quarto de dormirPermanecia doloridaA cada passoA cada respirarA cada momento...

Deixei que a água da chuvaMolhasse minha almaComo que recordandoQue até os anjos choraramA sua despedida

Conversei tanto com DeusPedi tanto a EleFiz todas as perguntasQue me fossem permitidas fazerMas não fui atendido desta vez

Deus ficou me guiandoE me mostrando os próximos passosPara que eu não pisasse em falsoEle também me enviou anjosQue com suas mensagensAliviaram um pouco a sua lembrança,Minha doce irmã,E o que eu posso pedir mais?

Eu posso dar meu dedoDe homem feitoPara que a sua filhinha Clara segureEnquanto descansa em seu berçoPedindo apenas carinho e atençãoApenas amorE me dando a força de que eu precisoPara seguir adianteE mesmo assimChoro de saudade

saudadesaudade

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Eu posso inventar históriasE brincadeiras para PietraQue você está no céuÉ um novo anjo do SenhorE que nos olhaCom seu olhar doceCheio de bondadeCheio de compaixãoA nos iluminar com o seu amor

O que eu não possoÉ fazê-la retornarÀ nossa vidaOu fazer voltar o tempoPara tê-la ainda conoscoNem que seja por um momentoMuito embora eu tenha tentado issoAjoelhado ao seu ladoE implorando:

Volta, volta, volta, volta...Sem obter resposta

Eu não posso barganhar com DeusEu não posso continuar achandoQue é injustoQue não podia ser assim

Eu não posso continuar pensandoQue você não se foiE que vou ligar para vocêE você vai me responderComo sempre fez

Ah! Não vou poder ouvir seus conselhosNem sua palavra ponderadaVou ter de me arriscarE vou errar muito mais

Ah! Não vamos mais brigarComo brigam dois irmãosNem vamos poder comentarSobre os livros, os filmes,As viagens, as meninas,Nossa vida, o trabalhoFofocar sobre o mundoPreparar surpresas para todosNada disso vamos fazer mais

A única coisa que vamos poder fazerÉ pensar um no outroEu aquiVocê aíEu sem poder vê-laVocê podendo nos verMas sem se mostrar

uma homenagemcheia de dor

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Ah, minha irmã!O tempo vai passarA vida vai continuarEu vou viver solitário sem vocêSuas filhas vão crescerEu vou chorar muitoSempre, sempreMas um dia eu prometoVou encontrá-la de novoVou contar tudo o que aconteceuNo dia em que você foi emboraQue o relógio parouQue a cidade parouQue os seus alunos pararamQue o seu escritor predileto parouPara enviar uma mensagemQue todo o mundo parouPara vê-la passar

E você foi passando“Como passa uma escola de samba que atravessa”E eu me perguntava“Onde estão meus tamborins?”Porque eu estava incompletoNão tinha mais chão

Quando olho agora para a vidaEu não vejo mais nadaEu perdi muitoMuitoMuito de mim mesmoE vai ser difícil recuperar

Por isso abri as janelasE griteiBerrei para o UniversoE as estrelas brilharam mais forteE a lua acendeu a cidadeE os ventos levantaram a noiteE o dia raiou mais uma vez

E o meu cotidiano continuouTristeInfelizIncompletoFaltou você em minha vida

Que falta você me faz!...

que falta

voce

me faz

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Para Susana Ferretti

um segundo

me bastaEm um segundo

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Eu diria que alguns segundos apenas me bastam. Chico diria basta um dia, um meio-dia. Para mimalguns segundos me transformam e revelam o que oculto estava dentro de mim. Se aparento um leão,tranformo-me em um carneirinho indefeso, esperando ser abatido. Se transpareço fraco e inocente, revelo overdadeiro demônio que mora aqui dentro. Como disse, para mim bastam-me alguns segundos.

E esses segundos podem ser eternos, inesquecíveis. Diga uma coisa. Quantas vezes você pensou emalgo do tipo, se eu não tivesse ido, se eu não tivesse dito, se, se, se... apenas duas letras, apenas algunssegundos?

Em alguns segundos eu viro um palhaço que foge do verdadeiro motivo da reunião. Finjo-me doente,perco a voz, sinto-me gordo, indisposto, tenho verdadeiros ataques de rinite crônica, fico até sem ar. E sintotudo isso, o fingimento é tão grande que chega a doer. E dói na alma.

Isso porque me sinto fraco e não enfrento. Isso porque deveria desistir, eu que continuo e persisto. Issoporque eu já nem sei mais, apenas sei que sinto, e isso basta. "É só um meio-dia, onde se jura e desconjura ese instala a dor..."

Eu não quero ter dor de nada. E muito menos causar dor.Quero a orgia de um dia de sol me queimando a pele com seus raios incolores. E quero ver brotando o

meu sorriso de agradecimento ao Criador quando o vento bate no meu rosto. Quero o cheiro das floresnoturnas, a água da cachoeira. "E eu que não sei nada do mar..." Só sei de mim. Só sei de mim. Só sei demim.

Por isso, vou abrir a janela e berrar para quem quiser ouvir. Sou completamente insano e o que você tema ver com isso? Sou louco, sou louco, sou louco. E também sou feliz com a minha loucura. Porque ela éminha e é tudo o que eu tenho. “Você não tem um nome, eu tenho. Você é um rosto na multidão e eu sou ocentro das atenções”.

Prefiro ouvir, ver, sentir, agonizar e ser tudo isso do que não ser nada.Eu vivo e respiro. E tenho asas quando quero voar para bem longe, para muito longe, aonde ninguém

pode chegar. No meu mundo, tudo é possível. E lá, despudoradamente, sou quem sou. E não tenho vergonhadisso.

Em apenas alguns segundos me revelo.

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Devaneio

Devaneio

Olhar as estrelasE me perderNum brilho cadenteLembrando-me de vocêQue mora na luaUma outra ruaQue não é aquiNa minha cidade

Aonde você mora preciso chegarDe barco ou de fogueteFico esperando o tremDas nove horasAndando pelos trilhosQue sempre percorremos

É dia no Japão?É noite aquiE enquanto você dormeImpaciente ou tranqüilaEu me lembro de vocêE da sua pele de luarQue me hipnotizaEnquanto a estrela passaDefronte à minha janela.

olhar

imaginar

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Escrever supera

todas as expectativas

que ja tive na vida.

e deixar-me fluir no papel

sem ter medo, nem pudor.

e despir-Me e assim encarar

a tudo e a todos.

e um ato divino.

E, com certeza, tudo o que

escrevo e penso vem de Deus.

Escrever e uma oracao.

mesmo

-

-

-

-

- -

-

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Ainda que eu tenha de fazer muitas coisasCertas manias e preguiças nunca deixo de ladoTenho sempre de dormir longamentePara despertar esperto e fugazTenho de organizar o meu diaPara que todos o desorganizem depoisComo fazem sempre, todo diaEu vou fingir indignação, vou me revoltarMas no fundo, no fundo,Vou sorrir e fazerExatamente aquilo que querem que eu façaPois só assim sou felizSó assim eu sou eu mesmoGritando, esbravejandoSoltando os cachorros em cima de todosSe bem que a idade tem me trazidoUm pouco de calmaHoje eu só xingo depois de ter meia certezaCoisa que antes eu fazia sem pestanejarVou olhar para todos os meus afazeresE vou dizer que não dou contaVou fingir enfartoSentir palpitar o coraçãoFalta de ar, sono sem horaMas vou conseguir produzirSem me esforçar tantoPorque já estava ali, prontoApenas esperando o meu sinal

todo dia

do dia noite e

dia

Cotidiano

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Dizer que não possoNão posso o quê?Sentir piedadeDo quê?A roda da fortuna giraE eu estou aquiLouvando a santos e orixásO meu sucessoO meu fracassoSe te perdi foi por um trizSe não consegui te deixarFoi também por esse mesmo trizE já não sei maisAliás, nunca soubeE ainda resta a culpaE eu apenas te peço:

Perdão!�

Desculpas demais

“esse risco de sombra

em meus cílios”

Altos e baixos

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Para meus irmãos Fabiano e Alessandra

A saudade

Parada, quieta, sentada no canto da sala, ela ali está: a saudade. Ela me põe inquieto, fazendopensar em coisas que não gostaria de lembrar agora e que não quero relembrar.

Mas ela fica ali me olhando e fumando seu charuto Havana, fazendo círculos de fumaça no are sorrindo, marota, como quem me diz:

Ei, eu estou aqui, não há como me ignorar, eu faço parte da sua vida.Então eu paro tudo e desligo a televisão, o som, o computador e fecho todos os livros abertos.Encaro-a, desafiando-a. E como num duelo, colocamo-nos cada qual em sua posição. É nessa

hora que viro menino outra vez, novamente com as calças curtas e desenhando na carteira daescola.

A memória mais longe que tenho é de um palhacinho azul que arrastava pelos cantos por ondeia. Lembro-me de uma mureta em frente a minha casa onde me sentava e ficava a olhar a rua,vendo as pessoas que passavam, o movimento dos carros e a vida que ainda não entendia. E queaté hoje não entendo.

Lembro-me de uma Brasília branca, cujo dono era meu pai, e da primeira televisão em coresna rua em que morávamos: a nossa. Isso foi o que me disseram, não posso afirmar com totalexatidão.

Ah, as noites de junho e os fogos Caramuru, “os únicos que não dão xabú”, a vendinha do seuLucchini que ficava na garagem da casa dele e que só era aberta por ocasião das festas juninas!Quantos traques e bombinhas permearam a minha infância!E os busca-pés então? Será que hojealguma criança sabe o que é um busca-pé?

Um acontecimento engraçado e trágico aconteceu comigo, meus irmãos e um busca-pé.Estávamos no fundo do quintal e íamos acender o tal fogo de artifício. O Binho, o mais novo, vestiaum macacão jeans, moda na época, que estava um pouco folgado dos lados. Eu e a Dadá acende-mos o busca-pé que saiu como um tiro soltando suas estrelinhas. E não é que o danado entroudentro do macacão do Binho?

Foi aquela gritaria dele, que pulava mais do que um macaco. Eu e a Dadá corremos pegar amangueira e fomos apagar o fogo como dois bombeiros voluntários e encharcamos o coitadocom tanta água.

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O resultado foi que ele se queimou, ficou todo molhado e nós eu e Dadá ficamos convencendo-o a não contar para a mãe, senão era surra na certa. O que aconteceu depois eu não melembro. Só sei que junho nunca mais foi junho e os traques e bombinhas ficaram para trás. Osbalões são hoje proibidos, e acho que a infância não é mais a mesma.

Mesmo porque, qual criança hoje em dia sobe em árvore para pegar fruta? Alguém aqui jácomeu manga no pé?

Que beleza!... Na casa abandonada, a mangueira carregada, e nós furtivamente pulando omuro e nos fartando de tanto comer. Levávamos todas as mangas que podíamos carregar paracasa e todo mundo comia. Até entendo o ditado que diz que fruta roubada é mais gostosa.

Isso fez parte de minha infância, bem como as pipas que soltávamos no fundo do quintal.Chegava até a subir no telhado e ficar lá sentado, durante horas, observando o papagaiodançando no ar. Até que chegassem os inimigos, os meninos da rua de baixo que vinham cortar epegar para eles os nossos papagaios. Era uma guerra e cada dia um vencia, ou nós pegávamos osdeles ou eles, os nossos. Era uma diversão.

Não tinha internet, nem videocassete. DVD? O que é isso? Ser de outro planeta? Tinha o“Mutley, faça alguma coisa”... “Medalha, medalha,

medalha” e muito mais. Criança dormia cedo e nãopodia assistir à novela das dez horas.

Claro que eu enganava todo mundo e assim sendo, consegui assistir à novela einteirinha: uma vitória.

Depois crescemos, e a adolescência vai tornando-nos diferentes. Particularmente não gosteimuito, preferia a inocência de antes, as brincadeiras de antes, queria que tudo ficasse como eraantes. Mas não é essa a ordem do mundo.

A escola, o colégio, a faculdade, o trabalho, a família... tudo vai nos direcionando e nos dandoum destino a seguir. E nem sempre sabemos onde é que tudo isso vai dar. Apenas seguimos etentamos mudar tudo o que não apreciamos.

� ��

Manda-Chuva, A esquadrilha da fumaça, A corrida Maluca, Tom e Jerry, Popeye

, GabrielaSaramandaia

lembrancas-

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Poderia estar dormindo...Eu fico pensando naquilo que as pessoas estão fazendo agora...Se eu revelasse que neste exato momento em que escrevo estou a mais de trinta mil

pés... o que você me diria? Eu nem sequer imagino.Só sei que estou a caminho do imaginário, sentado nesta poltrona de avião,

escrevendo, enquanto todos dormem. Coisa de louco.Penso na minha casa, no que estão fazendo... dormindo, é claro, no Brasil são mais

ou menos quatro e meia da madrugada. Aqui, não tem hora.Nunca me passou pela cabeça estar escrevendo de tão perto do céu... Será que

posso tocar os anjos? Ou eles ainda pertencem a uma outra dimensão?Não há terra por aqui, apenas um mar escuro que observei da cabine de comando,

não há nem um sinal de vida, apenas um negro sem fim e um ponto ao longe, aindainvisível.

Há um Deus que comanda tudo isso? É, há um Deus, sim. E eu procuro este Deus atodo instante e O percebo na sua exatidão mais do que perfeita. E Ele está no leme. Euapenas obedeço.

O avião treme todo e me balança inteirinho. Fico mareado... no ar! Mas o que meimpede de parar tudo e atiçar-me ao sono dos inocentes? A minha teimosia de tentarescrever para depois ler, e me corrigir, e me copiar.

Sei que tudo pode parecer uma grande bobagem para outros, mas daqui a dois dias éNatal. Será Natal em todos os locais do mundo. Em casa, na China e no Paquistão. Eununca fui até o pólo norte, nem sei exatamente onde mora Papai Noel. Será que eleexiste mesmo, ou é mais um daqueles casos do tipo “Elvis não morreu”, será?

Se eu esbarrar com ele nas ruas, faço o pedido da Su, que quer muita paz e sossego.Eu quero festa, mas festa calma, balada leve. Quero mesmo poder trabalhar e descansardepois, sem nenhum problema para resolver, apenas coisas fáceis.

Será algo muito difícil de alcançar? Rogo a Deus que não, que tudo seja simples eeficaz. Como a vida nos contos de fada, pois o que quero realmente é o final feliz.

“E viveram felizes para sempre!”

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Preciso pensar

E compreender o motivo

Preciso deixar

fluir o acontecido

Para poder me entender

Só entao te

Entenderei

Ah, deixa-me pensar...!

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Time

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RecusaMas se eu esconder o que sinto não serei eu,serei uma outra pessoa oculta dentro de mim mesmo.E ela pode ser vingativa e má,ao contrário de meu outro euque é doce e inquieto.E se eu não esconder nada e for eu mesmo?Será que serei sarcástico ou um pouco vulgarpor discordar de tudoe desdenhar das coisas alheias?Sei que não concordo. Sei que não sou santo,mas aturar determinadas coisas é passar dos limites.Nem mais sei quem eu sou.Só sei que não sou bobo.Nem tolo.Sei que não sei quem serei amanhã.E nem quero imaginar o desfecho disso.

Era melhor não ir.

Por que eu?

nem

pensar

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Sou um touro indócilCom muitas manias e manhasImpaciente como todo taurinoE teimoso como a vida exige

Às vezes, acordo de bom humorE ouço as canções que Roberto fez"Só vou gostar de quem gosta de mim"Mas sempre dou crédito para quem merece

Noutras vezes sou eu mesmoPerfeccionista, exigente, turrão, impacienteQuerendo que tudo corra mais do que podeParando o tiquetaquear do tempo e fazendo coisasMais do que posso suportar

Nessas horas eu me compreendoE me entendo perfeitamenteEstou sozinho numa luta com final incertoE não vou desistir nunca. Jamais!

Mas existem ocasiões em que sou um doceBondoso, generoso, gentil e educadoMuitos me vêem assimEu não consigo, não vislumbro esse ser imaginário.Mas alguns, sim.

São esses alguns que trago no peitoQue defendo com unhas e dentesPois detesto a injustiça deste planoE os homens ignorantes desta Terra

Ontem eu ouvi um dizer assim"Você é muito importante para esta cidade"E tentei não voar muito neste comentário.Mas importantes mesmo são as pessoas que conheçoE com elas compactuo uma história.

É por todos vocês que vivo felizÉ por todos vocês que choro de saudadesPor meu pai, por meus amores e por meus amigosSem vocês eu não seria nada...

É, fazer 38 anos traz muita responsabilidade!

Taurino

05/05/68

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Para Flavia Cunha

Perfil

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Um canto

!@#$%

!@#$%

Por que é que escrevo, quando estou sozinho,Pensativo e imaginando coisasQue talvez não existamE que nunca irão surgir na minha vida?

Por que ligo este computadorE me plugo nas teclas deste programaE deixo-me transbordar em palavras que ferem,Agridem, machucam e, ao mesmo tempo, me acalmam?

Por que é que tem de ser assimE não de um modo mais brando, mais delicadoOu mais eu mesmo, do meu jeito: gritando palavrõesE mandando tudo para todos os lugares?

Porque assim, penso, não se resolve nada,Porque assim, dou a resposta esperada,Porque assim, acabo me revelando presa fácil,Porque assim, não sou eu!

Então me deixe ler o livro há tanto tempo guardadoE ver as imagens daquele filme que venho postergando,Ouvir os Cds que acumulam poeira na estanteE brincar de arrumar o quarto enchendo-o de poesia...

Word

ver o Buda

de Lantau

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Então me deixe ligar para você agoraDeixe lhe contar que chove lá foraE “aqui faz tanto frio”E que a minha poesia não se foi aindaComo pensávamos, como prevíamosE não contávamos...

Deixe...Deixe...Deixe-me levar você para subiras escadarias da Sacré-CoeurPara andar de pelo mar da ChinaVislumbrar o grande Buda de LantauE virar um mongeUm santoUm pecadorUm herege!Deixe...

ferry-boat

Se eu soubesse seu número de cor:Eu ligava!Se eu tivesse a certeza de que você atenderia:Eu procurava!Se sua resposta fosse afirmativa:Eu iria até você!E se você concordasse:Eu já nem sei...

Então deixe que o tempo decidaO que vai ficar é para sempreE o que já passou, já se foi ao longe.

Eu estou aqui, acuado,Num quarto de hotel esperando uma respostaUm e-mail qualquer que posso abrirEm qualquer lugar do planeta.

Eu vou até você onde estiver,Não me importam as distâncias,Nem os empecilhosEu tenho asas quando quero voar.E não há teto que me prenda.

Quero as esfinges,Quero os monumentos,Quero experimentar saboresDos mais diversos paladares.

Mas antes de tudoQuero descobrir onde você estáQue vai ser bem aíOnde eu vou morar.

resposta

esperada

asas para

voar...

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Nem

Nem que tenhaDe sair daqui agoraE mesmo sem rumo certoChegar a um localOnde possa me despir inteiroEu vou dizer o que pensoVou cantar o que assovioE relembrar o passado

Nem que tenhaDe sofrer mais um pouquinhoMesmo sem ter razãoNem por quêEu vou me torturarPor horas seguidasE chamar a sua atençãoTalvez assim você se compadeça

Nem que me atrase novamenteE perca o início da tramaEu vou me revelar eDesvendar todo o seu íntimoFazendo-a de boba a cada toqueTornando meu algo que é seuE assim descubro aquilo queEu tanto procuravaVocê!

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No meu colo repousa a ânsia de viverQuero tudo e quero jáPara que quando ela acordeEu seja coroado reiUm rei sem súditosSem reinoE sem ninguémPor que hei de querer tudo assim?São suficientes trinta, quarenta anosDe espera?Não quero fingirQuero terSem precisar esperarE se for efêmeraAi, meu Deus,Esperarei pela única e verdadeira resposta

Por quanto tempo não seiO tempo que precisarNem que eu não esteja mais aquiNem que tenha de acordarPara me atentarO que eu sempre tiveO que sempre soubeNo meu colo também estãoA dúvida e a incertezaMas permanecem despertasQuero acreditarQue é meu e acredito“Que todos os ais são meusE é toda essa a minha verdadeFoi por vontade de Deus”E foi o que eu consegui conquistarEu preciso esperar!

o mundo pede calma

um pouco

maisALMA

Paciencia

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Hoje eu quero ficar so

Agora eu estou cansadoE não vou prestar atenção em mais nadaSe possível não quero nem ouvir o ventoQuero me deitar e relaxarDormir em segundosComo quem tomou um LexotanE ficou a viajar por outros ares

Bem, eu gostaria de não ser importunadoNem com as bobeirices do meu pensamentoCoisas sem nexo, besteiras mesmoComo diria Marina,Bobagens, meu filho, bobagens

Me deixe em paz que eu ficarei felizNem quero que o celular toqueAliás, nem quero seus toques em meu corpoQuero ficar sóVocê me entende?

E não fique impacienteQue eu não deixei de desejar vocêApenas desejo a mim mesmoQual um Narciso mirando sua face no leito do rioPreciso deste amor-próprioSenão vou me descompor

Amanhã, tudo volta ao normalO homem que fui (hoje) já era (amanhã)Serei um novo euAbrirei sorrisosDirigirei meu carroComo quem dirige pela primeira vezNem saberei o que é uma buzinaNem ligarei para os pontos na carteira

Vou ligar o controle remotoDo meu pensamentoDeixar no moto-contínuoEsboçar um sorriso eternoE deixar a vida me levarE nunca será tão fácil viver!

!@#$%

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quase tudoE-mail surpresa

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Olha, eu acho que depois dos trinta são poucas as coisas que nos fazem sentir comoadolescentes. Talvez comprar um carro novo, uma nova paixão, uma viagem a Paris...

Pois é. Mas existem outras coisas que nos fazem ficar bobos e rindo à-toa. Receber ume-mail de Danuza Leão é uma delas.

Meio como quem não quer nada, mandei-lhe um e-mail falando sobre o seu livro, que amei, equais as impressões que me causaram.

Escrevi muito, o que é normal. Falei de amigos, da vida e da sensação gostosa que foi lerQuase tudo. Falei quase tudo o que se passou pela minha cabeça.

Agradeci o livro e como um fã, que nem sei se sou, falei que iria encontrá-la na Bienal. E, porfim, enviei o tal e-mail e me esqueci dele.

No dia seguinte, estava lá na minha caixa postal: Danuza Leão. Quase tive um troço e, nervo-so, abri o e-mail e fiquei abobalhado. Ela me respondeu. Parecia que tudo era novo outra vez e mevi no colégio mostrando aos colegas o troféu almejado.

Foi bom. É bom. Despertou dentro de mim um adolescente tardio e mal posso esperar paraque na Bienal eu a encontre e ganhe um autógrafo. Mas como ela mesmo disse: identifique-se,que eu não sou adivinha!...

Pode deixar, Danuza, eu me identificarei!

Notas do autor:

1. Eu realmente me encontrei com ela na Bienal e foi muito legal. Ela disse que se lembravado e-mail e me agradeceu. Se ela disse a verdade, eu não sei, mas que ela foi muito simpática,isso garanto. Ah... ela autografou o meu livro e também tirou uma foto comigo! Coisas deadolescente...

2. Antes de publicar este livro, eu enviei este texto a ela que me respondeu assim:

A-do-rei seu e-mail, Márcio. Foi uma delícia, me senti o máximo, bj, Danuza

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Jura secreta

só uma

palav

nao diz

Eu preciso lhe contarCoisas que vi e não viviAndo por mil caminhosÀ beira-marEsperando um sinal seuUm tiro de canhãoUm pássaro a voar no céu

Sei que não passo de um amor antigoE que nada mais tem importânciaEntão, um brinde ao que não foi ditoE permanece inacessívelNa memória do tempo

Eu poderia ter-lhe ditoE assim ficado ao seu ladoPor quanto tempo mais?Seria demais?

Ou então não ter me arrependidoDe não ter vivido nadaSentido nadaQue nada faz sentido...

A avenida pulsanteSeu sorriso de meninaPerdida, esperando um abraçoPedindo-me um beijo de amorE eu sem saber nadaPerdido, com medo de descobrirAquilo que eu já sabia

Eu ainda vou encontrá-la...Not

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Calling you

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telle

Cal

ling

you

Ouco voce me chamando

Mas nao enxergo seus olhos

Sinto o gosto da sua boca

Mas nao posso provar

O frescor dos seus beijos

Sua alma me chama

Mas a minha nao escuta

Estou tentando achar a saida

Mas nenhuma porta se abre

Eu nao saio

Voce nao entra

Vivo numa imensidao de anseios

E na eternidade desta hora

e que consigo gritar o seu nome!

43

!@#$%

!@#$%

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Impressoes

Tenho a impressão de que...o mundo espera muito de mimtodos me odeiamtodos me adoramme querem longe daquiestou sobrandotenho muito pouco tempoo tempo acabounão sei nada sobre nadasei tudo e nada mais seiestou com uma fome danadacomi demais no almoçoesta roupa está péssimaestou sujo por dentropassei perfume demaiseu deveria ter ficado quieto

Tenho a impressão de que agora já foiInês é mortae terei de agüentartodas as conseqüências do meu ato.

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Dia d

e a

ula

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Dia d

e a

ula

Acordar de manhãEspreguiçar lentamenteOlhar para a cama e se deixarSeduzir mais uma vezSó mais dez minutosSó mais cincoTô atrasado!Calçar as meias e os sapatosPôr toda a roupa

Por que não posso dormir vestido?Seria tão mais fácil!Fiz isso uma vezLevei uma bronca da mãe

Daí tomar caféEscovar os dentesPegar o materialO dinheirinho minguado do lancheE sair: pé ante péPegar o ônibus ou ir andando?Seria um dinheirinho a maisQue iria sobrarVer as horasAcho que dá tempoSão vinte minutos apenasVou andarCruzar com outros colegasBater papo

Xi, hoje tem prova!E eu, para variar, não estudei

Comer uma aulaE ficar escondido estudandoTodo mundo faz issoSentar-me na carteiraAbrir o cadernoCopiar toda a liçãoE fazer todos os exercíciosFísica eu não entendo até hojeNem sei para que serveFrações, equações de 2º grauAinda sei a fórmula de corMas de nada me ajuda

Português, sim, isso valeuÉ minha ferramenta de trabalhoMas o que fazer com todasAs aulas de geometria?

Hora de ir emboraArrumar tudo e esperar o sinalA pé ou de ônibus?Olha a Lisete me esperandoVamos juntos proseandoAssim colocamos em diaTudo o que aconteceuNesta manhã

Éramos todos muitos felizes.

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Dedi

cado

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LamentoDespeço-me de você agoraPorque já passou a nossa horaE o momento é outro.

Despeço-me de vocêPois já não sintoQualquer coisa que sejaAlém de um amor finito.

Despeço-me de vocêPara não prolongar mais o tempoÉ muito tarde para ter esperançaDesse amor tão lindo vividoE que hoje renasce na lembrança.

Despeço-me de você porque não possoMais olhar em seus olhosBeijar seus lábiosNem me entregar de corpo e alma.

Despeço-me de você pois não mais me possuiNão é o meu donoE nem sou eu escravo de seus atos.

Despeço-me de você agoraMas ainda não quero irQuero ficar aqui mais uma temporadaOuvindo suas risadasAté que um outro chegue e ocupeO lugarQue até então era meu!

tanto que aprendi de amornada m

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CalendárioVirei a página do calendárioMais um mês, um diaE mais um momento que se desembaraçou.Dei um passo e libertei os fantasmasQue me aprisionavamNa cela mais escuraDeste não-mundo que não vemos.Passei por eles invisívelE enxerguei as amarras que me prendiamDesmaterializei-as com o olharE com toda a força de minha fé.Não olhei para trásNem queroApenas quero crerE sei que crer é a soluçãoÉ inabalável e imprescindível

Virei a páginaE um outro mês se mostrou desafianteE esse meu outro euSorriu meio sem graçaComo que dizendo:

Tenho fé e vou conseguir.E a foto da folhinha concorda sorrindo.

Tenho certeza que sim!

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o sol brilha por si

desafios

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Alma

sua

invisível

alma

deixa eu tocar

ImpalpávelImpenetrávelIntransponívelForteForteForteOnde souMaisMaisEu mesmoPedaço de DeusParte do UniversoSéculosPresente aquiHojeAmanhãSempreAlma

soulin

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Viagem de carro

quero

chegar

Onde?

a c

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e c

hama

Um pé de florUm galhoDe uma árvoreQue brotou amareloLilás, cor-de-rosaColorindo o diaPela janela do carroNa pista expressa

O menino olhaE diz: Que lindo!�

Seu pai e sua mãePensando a mesma coisaSobre as floresSobre as coresSobre as árvoresSobre o péPlanta de florColoridaQue nasceuFlorindo

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Um pouquinho da vida

Tenho tentado ser tantas coisas: pai, irmão, marido, amante, amigo, namorado... e nofinal das contas, noves fora, não sou nada, não tenho nada e até acho que tudo foi em vão.Sabe aquela famosa frase “nadou, nadou e morreu na praia”? É assim que me sinto, como sehouvesse lutado tanto, combatido tantos inimigos e, no findar, acabando na estaca zero.

Porque eu acho que o mundo é um acumulado de coisas boas e ruins que se reúnem nostrazendo vitórias e derrotas. E para vencer é necessário perder. E às vezes acredito ser aderrota uma grande vitória.

Só que, humano que sou, apenas desejo vencer. Então vem a seqüência das lutas eafazeres. E, quando dou por mim, estou cansado e me perguntando: Valeu a pena???

Então o sol nasce todo dia, e eu me levanto e começo tudo de novo. Penso em fazerdiferente, criando novas regras, mas taurino que sou e essa é a minha cruz, não me permitoas mudanças e rumino, rumino, até me esgotar. Não tenho nunca a sede saciada e sempreespero a próxima dose.

Talvez eu devesse parar.Ou então pensar e refletirDevo mudar ou continuar assim?E, se continuar, não vou reclamar?

Talvez eu devesse ignorar tudoE sublimar todo o conteúdoNunca dizer que desta água não bebereiE levar a vida como um aprendizPerguntando somenteNão tomando a dianteiraDeixar que me levemEu que sempre guio

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(Beto Guedes)

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Talvez assim eu me cansasse menosPorém acho que não seria felizMas o que é a felicidade afinal?É o sucesso?É a glória?

A felicidade é Deus sorrindo dentro de meu coração. São as portas se abrindo e um solde primavera arrepiando todos os pêlos do corpo. São as águas de março fechando o verão esou eu esperando pela janela do apartamento, quarto andar. É um desejando paz. Éum riso espontâneo. Um sono chegando e um despertar descansado.

Acho que tudo isso faz a vida valer a pena. E é assim que serei, vivendo para mim e paraquem merece. Serei feliz. Serei muito feliz. Eu sou feliz: assim!

e-mail

o medo de amar

é o medo

de ser livre

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Rosa de Hiroshima

nao sei

dizer

-Já pensei tantoQue nem ouso mais falarO que penseiEntão aja!Então não seiO que fazerO que dizerComo agirDando dinheiro nas esquinasOfertando sopas aos oprimidosAs crianças mudas e telepáticasE eu aqui andando num carrãoPenso: eu falhei?E logo vem a respostaNum raio de solÉ quando vem a notíciaAo abrir a página da internetOnde mora o amor?Localize no mapa a solidariedadeE a compaixão

Pense nas mesmas crianças acimaNo Vietnã, em Bagdá, Saravejo e BrasilTudo está aquiNas rosas de hoje em diaNo desesperoNa desesperançaNo despertar de cada diaE no crepúsculo que insisteEm pôr medoComo se a vidaNão tivesseMais solução

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nada por dizer

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o escandalo^Not

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Não me diga nadaEsconda as provasE diga que tudo é uma loucuraDa minha cabeçaQue você ainda me amaQue é meu o seu corpoGrite!Cante aquela músicaDe que eu tanto gostoAquelas das marcas de batomE do beijo enlouquecidoE não deixe transparecer nadaVerifique tudoFinja-se surpresaE me cubra de carinhosAmasse minhas roupasAtire longe os meus sapatosSinta saudades do meu cheiro

Diga que não vive sem mimApenas digaApenas deixe parecer assimApenas me calePara que eu não enlouqueçaE quebre tudo por aquiDeixe-me extasiadoE me enganeSufocando-me a almaInebrie-me e conduza-mePara que eu durma em seus braçosDepois de tudoNão me conte!Que eu nunca vou querer saber!

(Chico Buarque)

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Yesterday

-

Era meninoE ouvia no rádioTodos os sonsImaginava-me eternoSábio e senhor do mundoApenas sonhavaLembro-me com clarezaDos medosDas ruasDo tédioDa solidãoDe tudoEu era ontemMenos felizEu sou hojeMenos infelizSerei amanhãUm dia plenoE repletoDe surpresas!

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amanha vai ser outro dia

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Tentativa va-

-

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!@#$%

!@#$% O medo tomou conta de mim

Olhou-me nos olhos e me possuiu

Enquanto calado eu permanecia

E ele ria, ria e ria

E eu nada fazia

Enquanto ele me possuia

O medo domado

Num olhar parado

Meu grito surdo

E o medo de lado

que Fugia apavorado

De eu nao ter

Sentido nada

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Tempo de esperancaOutra noite espero chegar a nossa horaEnquanto vejo o tempo esvaziar o ar noturnoSoprando, soprandoAté chegar a manhã.

Outra noite leio os poemas feitos de madrugada,Uma outra jornada, entre o que vivoE o que gostaria de viverMas que me sustenta e me absorve completamente.

Uma outra noite espero sua chegadaVestida de branco, qual nadaComo se fosse uma caravelaA deslizar, deslizar... no meu mar.

E nesse dia ficarei rindoOlhando sua face, seu corpo: lindo!E tentarei dispensar os maus hábitosA má sorte e o mau humor.

Ficarei imaginando como um poetaPode escrever versos loucosSobre um amor quase perfeito(Porque amor perfeito não existe)E que deixa saudades de um no outro

Implorarei que não se vá aindaEspere, que a tarde findaUm mês a mais, um ano talvezNão se apresse, nem se vá de repente.

Outra hora será motivo de despedidaSerá o tempo de regressarem as nausQue em outros mares foram navegarAgora não! Fique comigo!

Quando mais tarde chegar o momentoMe pegue desatentoMe deixe esperando ao relentoA sua volta quando a maré baixar.

Uma outra noiteUma outra horaQuando o mar estiver calmoQuando o céu estiver azul-claroSe for de noite, se for de diaSorrindo, trovejandoCantando os versos tristes que lhe fizEsperando os barcosCorrendo atrasadaLembre-se de mimEstarei no papel escrevendoA nossa história para que não se percaO passado, o presenteDesse outro diaDesse outro instanteDessa nossa vida!

-

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Quando me beija, arrepioQuando me toca, desatinoQuando me envolve, inebrioQuando me afaga, entonteçoQuando me tira a roupa, enlouqueçoQuando chama meu nome, esqueçoE, quando grita por mim, desfaleço

Quando a porta se abre, alegro-meQuando me chama para jantar, surpreendo-E, se me presenteia, assim do nada, rio sem jeitoPorque acho que não mereço, e disfarçoMas eu mereço, sim, transpareço

Se me ligar à noite, durmo bemSe me contar o que fez de dia, escutoE, se falar que se lembrou de mim, não acreditoMas finjo acreditar e gargalho sem pararRetribuo com a mesma doseE provo de todo o seu corpoBanhando-o em champagnePara depois o despir dos pudoresBeijo sem pararAté perder o fôlegoAté perder as forçasAté desmaiarmosDe tanto prazer!...

me

Amantes

No seu corpo é que encontro...

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infinita

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Reencontro

Você me encontrouE fingindo que não doíaDemonstrou frieza e falsa segurançaTentou me seduzir novamenteE eu quase que caí neste jogoMas me esquivei

Eu não me controloNem vocêEu sei que parece estupidezMas eu queria ver vocêMirar seus olhos azuisE, embora dissesse:

Não quero!Beijar seus lábiosE possuir sua almaTornar-me senhor dos seus desejosE brincar novamenteDo jogo do “eu não sei”

Mas, não,Eu desliguei da tomadaTodos os sentimentosQue poderiam surgirE me despluguei da sua vidaEu, realmente, não quero mais vocêMuito embora meu corpoAinda deseje o seu

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Bem-me-quer

Pétala por pétalaDaquela florBem-me-querMal me querSimplicidade totalCantar uma cançãoDe Caetano ou de ChicoSem desafinar uma só notaSentir o aroma do jardimE aguar todos os canteirosMuda por mudaPé ante péCaladoSilenciosoUm mundo invisível

E se descobrir sóDesabafarChorar sem piedade de si mesmoSentir-se unoE desabrocharRecebendo toda a luzDa manhã solarCalmamente...Mansamente...

Ela me quer!Ela me quer!E sair dançando ao relento!

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Explicacoes--

E quer saber o que mais?Eu me perdiEu me encontreiE não disse nada a ninguémSó a mim pertenceSó a mim modificouPor que lhe diria?Para que se assustasseOu risse de mim...

O meu despertarHá muito que se iniciouE eu vi o fogo-fátuoPasseando pelas florestasVi o colorido das labaredasE me escondiPor entre as árvoresÀ espreita.

À luz da lua eu li o seu livroE me encanteiSofriChoreiE foi então que compreendiQue o meu caminhar não tem destinoÉ livre e soltoPodendo chegar ou não ao céuEntão me apavoroNão saber onde vai darÉ para mim uma triste sinaEu que tanto planejo.

Mas eu quero tambémSentir o gosto do acasoNo ocaso dos seus olhosQue não me guiamApenas me desejamE eu ignoroPorque sou livreE tenho medo do compromissoQuero me perder por aíE chegar antes do amanhecerMas chegar inteiro para o dia seguinteE esperar vir o outroO outroO outroO outro... dia!natural

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Autoflagelo

Um açoiteUm mote para decisõesUm destino que talvez não seja o meuNem o seu, nem o de ninguémTalvez seja um destino não descobertoE as naus ainda não o alcançaram.

No horizonte vejo as velas içadasE os marinheiros com as boas-novas:

Terra à vista!!!Uma descobertaUm novo rumoAlgo que mereça ser explorado.

Mas que maldição me será reservadaQuando a lua cobrir o céuE quando as cobertas ocultaremTodos os véus que se abremPelas escotilhas?

Ando pelo convésAndo com a luz da lua me guiando os passosSou sua face ocultaSou seus segredosE tenho medo.

Medo de me perderem minhas próprias decisõesE de me dirigir cegamente ao abismoQue é a minha própria vidaEu não tenho mais poder sobre elaE também perdi o poder sobre tudo o mais.

Que destino ou maldiçãoÉ este que trago no peitoQue me tortura sabiamente a almaE que me desvirtuaE que se estabeleceTomando a forma de um ser?

"Que estranha forma de vida,Vive este meu coração"Que menteQue reprimeQue torturaQue apavoraE que continua...

Indeciso!

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o poeta é um fingidor

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Ciranda do amor

Primeiro eu amei minha mãeQue amava meu pai que me amavaDaí amei meus irmãosQue também me amamE que amam seus amores e seus filhosE eles me amam também!Minhas sobrinhas são amadas por mimSobrinho eu só tenho um e também o amo

Amores, tive váriosE os amei como amo o amorDo presente que me presenteia com o seu amorAvós, primos, tios e tiasAmei a todosHoje, uns mais que a outrosDe alguns nem me lembro mais, sumiram no tempoMas sei que os amei um dia e também fui amadoHoje restam as lembranças deste amor

Ainda hei de amar quemNem sequer chegouNova sobrinha clareando o horizonteNetos, sobrinhos-netos, cunhadosE novos amores, por que não?

Amo o meu cachorro que a mim me amaSem pedir nada ou quase nadaAo contrário de mim que sou exigente demaisExijo do amor tudo o que ele exige de mimE amo intensamente todas asMil maneiras de se amar alguém

Eu me amo e amo a DeusQue também me ama, tenho certeza dissoSeria o amor o elixir da felicidade?Eu não sei, só sei que Amar é um verbo intransitivoJá dizia Mário de AndradeE, para finalizar em grande estilo, Vinicius de MoraesUm poeta que sempre amarei“Eu sei que vou te amar,por toda a minha vida eu vou te amar”.eu t

e a

mo

amor

i love you

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Divagando sobre

meu aniversário

Daqui a alguns minutos completarei 38 anos. Uma bobagem, qualquer um pensaria assim.Particularmente não sei o que penso. Se é bom ou se é ruim, se vai ser diferente ou se vaicontinuar tudo igual.

Agora, comemoro com um presente que me dei. Só sei comemorar assim. Quando estoutriste ou feliz, dou-me um presente. Então ouço a música tocando.

Por que somos tão sentimentais? É apenas mais um dia na nossa vida e vai passar tãorápido como passaram todos os outros dias. Mas, não. Nós insistimos que este é um diadiferente.

Dia de lembrar, de planejar, de eliminar coisas e sentimentos, ideais frustrados e mirar ofuturo. Que futuro?

Não sei quanto tempo mais vou viver: um ano, dez anos, vinte ou trinta? Não posso prever.Sei que exatamente agora completo mais um ciclo, e o que passou, passou.

Visito minha coleção de amigos e romances. São tão poucos... Na verdade, foram muitos,poucos restaram. Não precisamos de muitos para sermos felizes. Precisamos de sinceridade,e isso é raro de se achar.

Já dei inúmeras voltas por este mundo e, se me perguntassem hoje, onde eu gostaria deestar, eu diria que: aqui! Todos nós voltamos para onde nascemos e crescemos e, se NovaIorque, Londres, Barcelona um dia foram um sonho de consumo, hoje não passam de umálbum de recordações.

Aqui onde estou posso ser eu mesmo. E posso me arriscar, pois o tombo é pequeno. Foradaqui eu perco esta máscara e não sou identificado. Porém não tenho medo.

Se aos quinze eu quis morar no Rio, aos trinta em Madrid, aos trinta e cinco em Paris,acredite, hoje eu quero ficar em Jundiaí.

Em Jundiaí, conheço as ruas e os sinais que se abrem e fecham na hora em que devopassar. Aqui sou triste e feliz. E não é essa a chave para a felicidade?

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Talvez daqui a uns cinco ou dez anos eu vá morar junto ao mar. Respirar a maresia, olhar asondas que vêm e vão. Pescar com toda a paciência que conseguir juntar e pintar os céus dolitoral.

Já me imaginei, no final de minha vida, morando numa cidadezinha litorânea da Itália,assistindo a filmes de diretores consagrados e ouvindo óperas e concertos em praça pública.

Hoje, continuo pensando na praia, mas aqui pertinho mesmo, Itanhaém, Boiçucanga...nada muito longe, nem muito agitado. Os filmes também continuam nos planos. Juntei a elesos milhares de livros, CDs e DVDs que acumulei. Posso não ouvir óperas, mas também nãoquero ficar ouvindo axé, sertanojos e outras patuscadas. Quero harmonia, um banquinho, umviolão, essas coisas tolas.

Tudo isso daqui a um tempo.Por hoje, quero descansar. Agora quero mesmo é dormir e acordar sadio, inteiro e com

muita disposição para uma sexta-feira, cinco de maio, cheia de alegrias. Quero receber muitostelefonemas. Quero sentir-me querido por quem me quer bem. São poucos, mas são especiais.

Tenho agora 38 anos.

“O tempo não pára e no entanto ele nunca envelhece. Aquele que conhece o jogo, do fogodas coisas que são. É o sol, é a estrada, é o tempo, é o pé e é o chão*...”

E tenho ainda muito para ver.E viver.

eu vi um menino correndo

eu vi o tempo...

* , Caetano VelosoForça estranha

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Olhos nos olhos

Eu não acredito que fiz isso:Que magoei vocêQue machuquei vocêE fiz você chorarNão, eu não sabia de nadaNem as conseqüências deste amor

Eu não sou nadaQuando olho para mim mesmoVejo você, de novo, sorrindoChegando de um local qualquerSonhando com um aconchegoUma paz que conhecemos

E eu tentei perder tudo issoQuis jogar para o altoAquilo que era meuSomente meuE seuArrependi-mePedi perdão

Mas ainda me dói a mágoa causadaE me autoflagelo a cada instanteEu tentei serEu que já era antes mesmo de saberToda a históriaEntão resta-me viver sem dorAo seu ladoConfiante e sem medoE tentar encontrar novamenteAquela paz que nos levaA nenhum lugar

para

ser feliz

e passar

bem

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(Chico Buarque)

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ArrependimentoDiante de uma perda irreparávelProstrei-me ao juízo finalAbri todas as gavetas e delas fui retirando as provasRemexendo em coisas que julgava esquecidasFazendo doer o meu coração feridoEu que sempre machucoE não tenho noção da dimensão da ferida.

Somente defronte a essa despedidaÉ que entendo o que é fazer sofrerE peço perdão pelo imperdoávelJulgando-me um caso perdidoUma paixão há muito descartada

Somente ao ver as portas escancaradasÉ que me deparo com o erroE fico sufocadoAtordoadoPensando em como pude agir assim

E é intensoE é dolorosoE é inevitável

atrás d

a p

orta

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Então suplico e digo coisas amenasDigo que vai tudo mudarQue tudo vai ser diferenteQue nada mudouNem mesmo eu mudeiSó mudou o nosso amor

Agora diante dessa perdaRelembro o passadoImagino o futuroE não olho, deveria, para o presenteTento me ver sem vocêE você sem mimPerdi mesmo você?

Você nunca me pertenceu!Isso eu sempre soubeMas nunca entendiEssa sede de posse que tínhamos

Posso andar sem vocêMas talvez não chegue láChegarei a outros portosComerei em outros restaurantesAssistirei aos filmes que estava acostumado a ver

Mas e você?Você vai continuar o que sempre viveuAntes de eu chegarVai virar as madrugadasTelefonar para os amigosE vai viver, bem como eu.

Mas, agora, diante dessa inevitável verdadePodemos fazer algo novoPodemos adiar e tentarPodemos esquecerMerecemos?Queremos?Deixar tudo de ladoVer o sol nascerUm outro diaUma nova manhãUm renascerQuem sabe?

espio

o futuro

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Sem limites

Nem sempre o amor que temosé o que queremos.Desejamos sentir o que é proibido,como uma paixão intensaque chega e sacode as nossas pernas,bamboleando-nos,e deixando-nos sem ar.

Mas o que é uma paixãosenão um lapso de nossa realidade,tão linda, mas que não enxergamos?

Tornamo-nos cegose apalpando as paredes do apartamentoandamos na escuridão de nossas almas.Nós que amamose que desejamos não mais amaroutrem.

Mas amamose, às vezes, entregamo-nos a esse ofício de amar.E ficamos contrariados.E nos decepcionamoscom tudo o que há de vir junto com esse ato.É incerto amar assim?

Qual a loucura que o destino me propõe agoraneste exato momentoem que a vida me chamapara viver?Para quem?Para mim?É correto amar assim?

o seu amor

é uma mentira

que a minha

vaidade quer

exagerado

jogado aos

seus pés

(Cazuza)

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Ufa...!

Esperei esta resposta o dia todo e agora rioJustamente quando ia desligar o computador...Ela apareceu!Não fique triste, não...Não vale a pena!

Só vale a pena ficar alegre,Cantar a harmonia desarmoniosa do cotidiano.Nenhuma alma é pequenaNem mesmo aquelas que imaginamos ser

São almas perdidasE que vão se reencontrar um dia.Eu fico por aqui ouvindo a música dos pássarosE fique tranqüila, nada me foi revelado.

Acho que sou meio louco em escreverFazendo poesia desritmadaMisturando vida real e fantasia

Sim, sou louco e poetaAbro as janelas do apartamentoPara que entrem rajadas de silêncioPara me ensurdecerem

Estou farto destas vozes gritandoDentro de mimQuero as fogueiras, quero as verdadesQuero ler os livros queimadosEm plena Inquisição

Sou um bruxoSou um heregeSou o que não se pode serMas antes de tudo: sou homemE não tenho medoDe ninguém.

:><::><

:

:><:

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Sinal fechado

Tudo q

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O mesmo jeitoA mesma vozMas você não é mais a mesmaEmbora a sua juventude permaneçaSerá que eu ainda a conheço?Ou será que os sonhos envelhecem?Sobre o que vou falar?Casou? Tem filhos?Por onde andou?Bagdá ou Singapura?Indonésia... ahhhhEstive por aíPela vidaApanhei mas batiLevei soco e pontapéDei flores e fiz oferendasServi chá com cicutaE me arrependi depoisMas não de tudoDe algumas coisas talvezMas não de serO que souMas me fale de vocêEu preciso saber da sua vidaÉ a minha ânsia de viverAlimento-me das histórias que ouçoPara viver e reviverA vida que sempre quis para mim.

(Beto

Guedes)

Para a inesquecível amiga Sílvia Ribeiro

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Vento no litoral

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faco isso para esquecer-

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Quando quero descansarOu me lembrar de vocêApesar de toda a distânciaQue nos separaEu ligo meu carro e saio a rodarE mesmo quandoA cidade se acendeEu não paroSofro caladoBuzino pelas ruasOuço o ecoar das vozesDos apartamentosSigo o ventoAté descer a serraPasso a me lembrar de vocêAqui!Chego a vislumbrar vocêAqui!E a tenhoAqui!Então ando no marDeixo a água chegar até meus joelhosE jogo flores para IemanjáGrito ao céuE para quem quiser me ouvirEu estou aqui!

(Renato Russo)

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Well, well, wellTarde da noite, madrugada vaziaRepleta de pensamentosE fome de ver o dia surgindo

Para poder acabar meu trabalhoE iniciar outro que vem na filaSatisfazer a vontade loucaDe ganhar a vida por uns poucos vinténs.

Tarde da noite, madrugada complexaDesejo de ver um DVD de comédiaE desligar o computador.

Assim relaxo e me desconectoDormindo antes de acabar o filmeDeixar o pensamento curiosoPara saber o final inimaginável

Tarde da noite, madrugada silenciosaSó o som dos meus risosAo ler o de uma amigaQue sonâmbula como eu perambula sem sono

Imagino seus risos e sua ânsia de viverDe descobrir onde estãoGuardadas as taças deE entornar o vinho bacante pelo corpo todoE se descobrir, revelando-se louca e embriagada

Tarde da noite, madrugada caladaEu escrevendo poemas como se fosse nadaE me despedindo na próxima estrofe

Vamos guardar estes versosQuem sabe um dia eles possam revelarO pouco que sabemos de nós mesmosAs bobagens que julgamos tão importantesE o pouco tempo que temos para viver

Tarde da noite....O dia amanhece...

e-mail

pro secco

fecho os

olhos de

saudade

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Um conto para o Natal

Como em todo Natal, eu voltava de São Paulo para a casa de minha família sempre no dia24 de dezembro, véspera da data mais importante do ano para a maioria das pessoas. Tempode ganhar e dar presentes. Pelo menos era assim que eu sempre via o Natal. Mas naquele anoalgo mudou a minha opinião, e eu nem sei dizer o que realmente aconteceu, mas foi mais oumenos assim...

Eu havia trabalhado até o meio-dia. Saí da empresa e fui para um shopping da região, ondeconsegui comprar mais alguns presentinhos de última hora. Nunca se sabe quem virá à noite.

Ao me dirigir ao meu carro um pensamento me aporrinhava o tempo todo: “por que tantospresentes?”, “será que não há algo mais importante do que isso?”. Bem, eu ignorei e segui aminha vida.

No trânsito eu observava os e a pressa das pessoas em chegar a casa maiscedo. Talvez para fazerem os preparativos da noite, ou arrumar a árvore, ou então fazerem maiscompras.

Fui seguindo, eu e meu carro, no percurso costumeiro. Ruas, avenidas, carros, decora-ções natalinas e semáforos. E foi num sinal vermelho, ao lado de uma praça, que tudo se desen-cadeou.

As crianças estavam todas lá, fazendo malabarismos, mágicas, limpando vidro doscarros e outras sem fazer absolutamente nada. Algumas mal saíram das fraldas, outras noauge da adolescência.

Por instinto eu fechei a minha janela. Lembrei-me do guri que assaltou a minha irmã ecunhado quando a minha sobrinha tinha apenas três meses. Levou apenas dinheiro para ele,mas dos que estavam no carro, levou embora a inocência de que isso nunca acontece-ria comeles. Por sorte, ninguém se machucou. Dinheiro vai, dinheiro vem.

Voltando às crianças, a minha vontade era de abrir as portas do carro, colocá-las dentrodele e levá-las para comer no , que eu ainda acho que é o grande sonho delas.Mas eu não fiz nada.

outdoors

Mc Donald´s

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Logo hoje, pensei, que não tenho nenhuma balinha para poder ofertar. Nem ao menos umchiclete.

A adolescente grávida, uma barriga enorme, desfilava correndo atrás das outras meni-nas. Uma criança esperando outra criança, pensei. As crianças, sujas e ramelentas que chora-vam de fome. Então, lembrei-me da Madonna, seu bebê africano adotado e o mundo todo criti-cando.

Não dá vontade de adotar a todas elas?Será que é tão impossível oferecer um mundo mais digno para essas crianças?E o que eu fiz?Eu não tinha feito nada até então. Mas dentro de mim a alma chorava e pedia perdão ao

universo. Afinal, eu também falhei, estava fazendo compras em um , desperdi-çando tempo e dinheiro em coisas fúteis que talvez nem fossem usadas.

Ousei abrir a minha janela. Se elas me assaltassem, levariam os presentes que comprara,e daí?

Surpreendi-me ao ouvir o menino me perguntar se eu tinha alguma coisa para ele comer.Meus olhos encheram-se de lágrimas. Estacionei o meu carro, desci dele e fui para o meio dascrianças. Lá eu ouvi as suas histórias. Algumas eram mentirosas, eu sei. Elas não iriam deixaresta oportunidade passar em branco e florearam o mais que puderam para eu me comoverainda mais.

Mas eu lia a história de cada uma, através de seus olhos. Os olhos diziam tudo o que aboca não conseguia pronunciar. Umas, desconfiadas, me olhavam meio de lado, achando queeu era da polícia, da Febem ou seja lá o que for. Outras queriam sentar no meu colo e ganharapenas um carinho.

Eu contei quantas elas eram. E estava rodeado por quinze crianças ali naquela praça.Perguntei onde moravam, elas desconversavam. Perguntei dos seus pais, elas não diziam.Lembrei-me de Chico Buarque e o , da Igreja da Candelária e dos milhões demeninos de rua desse Brasil.

Vocês estão com fome?A resposta foi um uníssono sim.Então eu disse que nós iríamos fazer uma ceia de Natal ali, naquela praça. Muitos olhos

brilharam. Muitas não acreditaram. Perguntei o que elas gostariam de comer. Um foi aresposta (está vendo como eu estava certo?).

shopping center

Brejo da cruz

Big Mac

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Foi aí que eu tive a idéia de levá-las para a lanchonete. Mas pensei melhor e achei demuita responsabilidade fazer isso. Eu nem conhecia aquelas crianças, que naquele momentoestavam elétricas. Acalmei-as e disse que iria comprar a nossa ceia.

Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhh....!!!!Foi esse o coro que ouvi, como quem dizia, esse não volta mais aqui. Mas eu as tran-

qüilizei e afirmei que voltava, e com a nossa ceia; que elas deviam limpar um pedaço da praçapois iríamos cear ali. Pedi uns 40 minutos de tempo e deixei as crianças com um brilho deses-perado nos olhos, como se eu fosse o último Noel e todas as esperanças delas estivessemdepositadas em mim.

Entrei no carro e corri para o . Dentro da lanchonete chamei o gerente e expliquei omeu caso, falei das crianças, dos sonhos delas e da vontade delas de comer um . Naverdade, eu queria algum brinde para elas, um brinquedinho, desses que eles dão nos lanches.Apenas isso.

De repente, eu ouço atrás de mim uma voz de uma senhora dizendo que eu era um anjo.Não, minha senhora, eu não sou, não. Se fosse, eu teria tentado fazer alguma coisa antes. Elame disse que a hora certa era o momento presente, e isso me encheu de um sentimento quenunca havia sentido.

O gerente me fala:Que tal trazermos essas crianças para cá e fazermos uma festa para elas? Hoje o movi-

mento é fraco e logo fecharemos. Podemos perder mais uma horinha e dedicar a elas.Sério?

Ótimo! Eu pago os lanches e as bebidas.Eu também quero ajudar, falou a senhora.

E, sem que eu percebesse, virou um grande movimento.Quando vi, eu estava chegando na praça com mais cinco carros. As crianças me olha-ram

desconfiadas e até tentaram fugir. Mas eu gritei e falei:Ei, sou eu. Eu voltei e tenho uma grande surpresa!

Quando eu contei para elas sobre onde iriam, elas pulavam de alegria, gritavam e algumasaté choravam. Nós as colocamos todas elas nos carros e rumamos para a lanchonete. Tudoisso em menos de meia hora.

Ao chegarmos à lanchonete, todos os funcionários nos esperavam do lado de fora. Elessaudaram as crianças, levaram-nas para lavarem as mãos, deram brindes, chapeuzinhos,

McBig Mac

Sério. Eu cedo o espaço, dou alguns brinquedos que tenho aqui.

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bexigas e acomodaram todas em seus lugares.Lá elas comeram o seu lanche favorito, beberam refrigerante, ganharam brinquedos e,

pasmem! A tal senhora que havia falado comigo chegou com algumas amigas, com sacolas debrinquedos e roupas usadas.

A alegria foi geral. O Natal estava mesmo acontecendo ali. E com coisas tão simples. Eumirava os olhos daqueles meninos e agora, sim, eu via a criança que lhes fora roubada emergirem cada olhar. Muitas me olhavam e diziam obrigado, mas não com a boca e, sim, com a alma.

E eu não fiz nada. Nem duas horas durou este evento que não tinha sido planejado. E quan-tas pessoas apareceram do nada!

Não disse que você era um anjo? a senhora tornava a repetir.Mas eu não sou!Você sabe o que é um anjo, meu filho?Sei, eles têm asas...Nada disso. Os anjos são mensageiros de Deus. E você trouxe uma mensagem dele

para nós. E todos nós ouvimos e agora estamos em comunhão com o Divino. Graças a você.Eu chorava. As crianças vinham me abraçar.

Tio, brigado!É, sim, tio, brigadu!Valeu, véio!

E foi assim que tudo aconteceu.Essas crianças, eu nunca mais as vi. Aliás, eu nem sei se elas são reais. Voltei àquela

praça muitas e muitas vezes, e nada delas. Seriam elas anjos também? Porque o que elas mederam foi muito maior do que eu ofertei. Elas me devolveram a capacidade de acreditar e amarao próximo. Será que elas têm noção disso?

Só sei que agora neste Natal que se aproxima, não vou comprar mais presentes de últimahora, nem vou ficar me enchendo com as bobagens que oferecem nesta época.

Hoje o meu Natal mudou. Mudou de endereço. Hoje é Natal no meu coração. E todo dia édia de Natal. E sempre que posso ofereço um pedaço desse meu Natal para os outros. E mesinto bem. Sinto-me em comunhão com uma força que me eleva e me faz chegar lá. Lá onde é omeu lugar. Lá onde tudo tem a sua hora. Lá onde a beleza é ainda mais bela, e todas as criançastêm o seu próprio Papai Noel.

Amém!

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Revelacao--

São véusDe mistérioDe seduçãoQue me embaçam a visãoE nada revelamSão como as brumas de AvalonQue se afastam ao toque de MorganaComo a gôndola que cruzaOs estreitos canais de VenezaComo a neblina da pistaQuando volto para casa de madrugadaE descubro quão misteriosa é a vidaSão sinaisSinais de Deus para mimIndicando-me o caminhoQue devo seguir sem medoSem pararNem olhar para trásE eu me arriscoPé ante pé, sou humanoE vou retirando os véus calmamenteComo quem limpa a poeira da estanteE vou descobrindo que há um tempoPara tudoE tudo páraE tudo se revelaEntre os translúcidos véusQue envolvem o meu ser.

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Donas de casa

desesperadas

Um anjo veio me dizer que você estava triste e, quando olhei em seus olhos, constatei averdade. Você não estava triste, estava infeliz.

Então chorei com você e falei dos céus que já habitei e também dos infernos. Disse-lheque tudo passa e que o tempo ainda continua sendo o melhor de todos os remédios. E você mefala da sua solidão, das escolhas que acabou tendo de fazer, porque trilha um caminho real ementiras nele não entram.

Pensei o quão duro deve ser trilhar somente por linhas retas, pois gosto de me aventurar,às vezes, por atalhos. Nem sempre me arrependo, mas não gosto de me enganar.

Estar sozinho não significa ser só, implica diretrizes que definem aquilo que esperamos davida. Eu espero tanta coisa...

Talvez por isso a deixo fluir bem devagarinho e, quando sinto necessidade, piso no acele-rador. É muito engraçado viver assim, à mercê do vento, mas assim a vida me leva.

Voltando a você e sua melancolia... O que foi que aconteceu? Não a entendem? Nãoquerem a sua companhia? Não falam a sua língua? Não a escutam?

. Seja bem vinda ao clube!Deixei há muito tempo de me importar com isso. Eu tranco as portas hoje em dia. Coloquei

um bina no meu telefone e só atendo quem eu quero.Isso tem me custado momentos de infelicidade, mas também tem me dado muitos

prazeres. Hoje mesmo vi um filme genial. Violento, muito violento. Tão violento que nem pensoem me aventurar a sair debaixo desse edredom quentinho e espiar lá fora. Violento, masinteligente. Transformador.

Welcome -

Para todas as Lisetes, Renatas, Susanas e Valquírias desta vida

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O bem. O mal. Essa luta incessante acaba sempre nos pondo em total loucura. Mas tenhode confessar: eu queria ter visto esse filme com alguém. Queria poder discuti-lo, debatê-lo edescobrir outras impressões.

Então eu liguei a TV. Sinal aberto mesmo e assisti ao noticiário. O filme estava lá. Aviolência que julguei tão longe estava lá, a poucos quilômetros de distância de meu quintal.Fechei-me. Tranquei-me com um cadeado, acendi velas e meditei, tal qual um Buda tentandodesviar a minha mente deste mundo inóspito.

Daí, pensei em você.Foi quando o anjo me revelou sua tristeza e tentei alegrá-la sem nem ao menos saber

como. Resolvi escrever. Dei mil voltas por tudo o que se passava em minha cabeça e acabeiescrevendo sobre o nada, sobre o que não sei se sinto realmente ou se estou acordado oudormindo.

E o anjo voou.De minha janela eu o vejo tocando sua trombeta na torre da igreja da Vila Arens. Ele não

sabe que eu o observo toda vez que subo na cobertura do prédio, por isso fico bem quietinho.Raia o dia, chega a tarde, a noite vem e, a qualquer hora, ele está lá. Diria até que me

desafiando, não fosse ele um anjo e eu mero mortal.Aliás, os anjos são imortais?Não há um ditado que diz que, quando uma criança morre, ela vira anjo? E o que dizer

deste bebê que conseguiu sair ileso de um carro totalmente amassado e triturado entre doiscaminhões? Seria este bebê um anjo também?

Tudo isso porque você está triste. E o que a faria feliz? Será que posso dar-lhe a felicidade?Acho que não. Eu só posso ser seu amigo e preocupar-me com você, sorrir com você, dar-

lhe o amor e o carinho que só um amigo pode dar. E chorar com você. E sorrir com você. Ver opôr-do-sol de Jundiaí que nesta época de outono é lindo e nos emocionarmos juntos. Olharpara trás, cuspir nos pseudo-inimigos e morrer de dar risada. Correr até a próxima esquina,trocar poéticos e sacudir toda a poeira que ficou acumulada no corpo. Dar a volta porcima. Isso eu posso fazer com você. E você comigo.

Ande até o espelho, abra um sorriso, levante os braços alternadamente, pense numacanção agitada e saia cantando, dançando, pulando, “e vai rolar a festa, vai rolar...”

e-mails

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Para voce

Na verdade eu não a ouço, eu me alimento.Não da sua dor, mas da sua sensibilidadeQue me inspira, que me dá vontade de voarDe querer mudar o rumo da vidaDe fazer com que minha voz alcanceSei lá o que ou quem...Sou poetaE quando me assumi assimA vida tomou um rumo diferenteEu vejo o mundo com olhos que são somente MEUSE o que posso fazer?Você acha que vou mudar o mundo?Nem sonhando!Você acha que o mundo vai me mudar?Nem sonhando!Eu já tentei ser igual a todosAchei terrível!Eu tento ser eu mesmo quase que cem por centoÉ melhorzinho...Embora ninguém entendaEmbora eu fique sozinhoDe vez em quandoHá um bom tempo que não estou sóE isso é muito legal.E não pense que a poesia faz parte dessa vidaEla não faz!E é exatamente por issoQue essa vida é tão fascinante!

Para Susana Ferretti

na m

adrugadanoturno

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38 anos

O olhar percorre o quartoPaira sobre os livros na estanteBusca um sinal preciso

A mente infiltra-se cada vez maisNo corpo e tenta direcionarPara não pensar

O pensamento insiste em escreverCoisas que nem imaginoE só sei o final

Não adiantaÉ o meu aniversário e estou ansiosoPelas novas batalhas e pelo presentePelo futuro que vivereiEu que sou nadaPorém hoje: sou rei!

"Eu quero uma lua plena

Eu quero sentir a noite

Eu quero enxergar as luzes

que os seus olhos nao me tem deixado ver

AGORA EU VOU VIVER...”

-

(Ana Carolina)

V

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Acorda, é Primavera!

Acorda, é primavera, ela diziaE eu acordava com um cheiro de florEla colocava perfume em toda a casaE mesmo sem nenhum vaso de plantaA casa floria toda manhã

Acorda, é primavera, ela repetiaE eu me espreitava por detrás da portaEnquanto ela se banhava cantandoMúsicas fáceis de se cantarE eu acompanhava assoviando

Acorda, é primaveraE eu continuo pensandoComo pode ser primavera o ano todoSe a neve cai lá foraE eu aqui dentro morro de frio

Acorda, é primaveraE eu ignorei seus chamadosLiguei o som no mais alto volumeNão tirei o pijama surradoE continuei o meu dia-a-dia tumultuado

Não é mais primaveraNão escuto mais o seu chamadoNem mesmo quando perfumo toda a salaNem mesmo quando canto no banheiro

Cadê minha primaveraQue aos poucos foi indo embora?E eu fui deixando, pois não tinha idéiaDe que a casa perfumadaFazia parte desta minha jornada

quando

entrar

setembro...me c

hama

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-

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!@#$%

!@#$%

Uma despedida e um recomeco.

A vida e assim.

Sempre vai chover quando faz sol.

E sempre vai fazer sol

quando acabar a tempestade.

as vezes faz os dois ao mesmo tempo.

Para mostrar que tudo pode acontecer,

que tudo e possivel.

Que o telefone vai sempre tocar.

Cabe a nos decidirmos

se vamos ou nao atender.

E nem sempre estamos a fim.

Mas atendemos.

Fazemos o protocolo social.

Damos risadinhas insanas.

E pensamos na letra do Chico que diz:

"amanha vai ser outro dia...

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E por que hoje

nao pode ser amanha?

Porque nos falta coragem.Coragem para admitir para nós mesmosQue erramos.E medo de consertar.Medo de reiniciar.Medo de ficarmos sozinhos.De achar que não conseguiremos caminhar.Mas entenda uma coisa:O fardo nunca é tão pesado que você não possa carregar.Deus nunca abandona ninguém.Mesmo que você se ache só.Olhe ao seu lado.Veja os sinais.Preste atenção a eles.Veja o dia que nasce.Ele sempre nasce, não é mesmo?Mesmo que um devaste muitos lugares.Ele sempre nasce.

tsunami

- -

um e-mail para voce

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E o dia sempre vai lembrar-lhe que"amanhã vai ser outro dia"E todos os dias serão iguais aos outros.Com felicidade, com tristeza e com decepções.Cabe a nós mesmos mudarmos isso.Com a coragem que julgamos não ter.Com a determinação que achamosQue perdemos um dia.E com a certeza e decisão que queremos mudar.Raul Seixas diz assim:

Mas a parte de que eu mais gosto é:

Mais ou menos assim.Ele fala tudo o que você está sentindo agora.O que eu sinto.O que todo mundo sente.Mas nem todo mundo percebe.As pessoas apenas ouvem uma música do RaulE saem cantando por aí.Eu não.

"Veja, não me diga que a canção está perdidaTenha fé em Deus, tenha fé na vidaTENTE OUTRA VEZ"

"Levante suas mãos sedentas e recomece a andarNão pense que a cabeça agüenta se você pararHá uma voz que canta, uma voz que dançaUma voz que gira, bailando no ar...”

Eu vejo vida ali,Vejo desejo, vejo Deus, vejo os sinais.Penso no que ele passou para escrever aquilo.Nos erros que cometemosE que cometeremos.Serão muitos ainda.Senão não estaríamos aqui.Você precisou faltar a minha festaPara escrever isso.Precisava?Não podia ter escrito antes?Não, você, assim como eu, procurou um motivoPara expressar sua dor e sua alegria.

Eu apenas digo:

Eu tentei.Tem dado certo.Mudei tudo.Sou feliz.Sou triste.O telefone toca.Nem sempre.Mas eu tenho os .Tenho alguns amigos.E tenho o dom de escrever...SEJA FELIZ!

TENTE OUTRA VEZ!NÃO ME DIGA QUEA CANÇÃO ESTÁ PERDIDA.TENHA FÉ EM DEUSTENHA FÉ NA VIDATENTE OUTRA VEZ.

e-mails

tente outra vez

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Pedaco de mim-

Uma parte de mim se foiE uma outra parte quer se acharTão forte e tão inteiraQue se acredita una e imortal

Mas aquela parte perdidaMe faz voltar ao passadoUm tempo impensávelNum local que desconheçoMas que me acolhe e me acarinha

Pudera a parte que me sobrouSubir as montanhasQue sempre quis escalarPara chegar a nenhum lugarQuem sabe uma parte aindaConheça o riso e a alegriaE ensine ao resto como recuperá-laPorque eu perdi os motivosE não encontro mais as chavesQue também se foramOu se perderam da minha vida

Eu não sei explicarPor que a parte que era lúcidaSe tornou sozinha e indefesaE a parte que era somente amorSe tornou tristeza

Já não tenho mais dorJá não tenho mais nadaNem vontade de tentarNem perguntas a fazerA minha parte que tanto queria saberTambém partiuRestou a parte saudosaDe tudo o que viveuQue se juntou à parte poetaPara escrever e se lamuriarDe tudo o que se passou

Parte de mim ainda crêE sabe que tem de acreditarQue tem de lutar e auxiliarMas existe uma parte que não sabeMais o que fazerE apenas esperaAcontecer...

metade

amputada

de mim leva a

os t

eus s

inais

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Espelho

A flor cheirosaDespetaladaCor-de-rosaMargaridaQue girassolE se esparrama na relvaE enfeita o vasoE inebria a casaEm que a moça moraE tanto deseja

Que ela (flor)Se torna a moçaO que a moça tanto almejaÉ ser a flor desejadaNa sua naturalBeleza.

mire meus olhosmareja

dos

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Olhinhos de coruja

Uma voz macia,Um gesto doce, carinhoso,Um toque angelicalE a sabedoria de uma santa protetoraAssim é Ivanira, a grande mestra,Professora de todos que conheço,Desde minha irmã a meus amigosE pessoas que conheço no meu dia-a-dia

Todos na cidade passaram por suas liçõesOrações coordenadas e subordinadasLiteratura comparada e gramáticaAnálise sintática e morfológicaPalavras paroxítonas, metáforasCrases, flexões verbais de toda ordemSe ela ensinou, ninguém se esquece

Particularmente eu a conheci um pouco tardeNum tempo em que a escolaEra apenas uma boa memória de meninoFoi então que aprendi com elaO amor ao próximo e a caridadeIvanira chegou de repente e me afirmou:

Você também foi meu aluno!E eu não consegui corrigi-laApenas concordei e nunca a desmentiAfinal eu a conhecia pelos outrosQue a idolatravam e amavam

Para a grande mestra Ivanira e seu companheiro Odélcio Dadalt

com c

arinho

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Aprendi a amar Ivanira por elesE era meu desejo ser seu alunoDesejo que se concretizouQuando homem feito estouE não freqüento mais nenhuma escola

Ela chegou de repente, com seus olhinhos de corujaExalando sabedoria, paciência e bondadeReconquistou-me no ato e tornei-me um aluno aplicadoE me vangloriei disso,Pois enquanto meus colegas dividiam a sua atençãoEu a tinha somente para mim

Ela me incentivou a escrever e a descobrirO escritor que escondido dentro de mim moravaTrouxe-me para a fraternidade do larLocal de que tanto se orgulha de fazer parteE que Anália Franco tanto fez por acontecer

Para ela conto coisas que não contaria a ninguémPois ela sabe como me orientar a seguir o caminho corretoCom ela aprendi a confiar e também a crer ainda mais no Criador

Por isso, professora Ivanira, perdoe-me se a enganeiOu melhor, omiti-lhe um fatoEu sempre quis ser seu alunoE, muito embora não tenha sido no colégio,Acabei sendo abençoado por Deus,Tornando-me seu amigo

Que Deus lhe dê vida longa e felizPorque nós, seus eternos alunos, precisamos muito de vocêDa sua grande sabedoria e do seu imenso amor!

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A santidade do mundoUm dia, li em um poema que o mundo era santoOnde se encontra essa santidadeQue meus olhos não conseguem ver?Nas crianças fazendo seus malabarismos nas ruas?No bebê que chora encolhido dentro de um saco de papelLutando contra a morte dentro de um lago?Nos papéis que nossos políticos desempenhamNa luta pelo poder?Nos papas que no decorrer da HistóriaMataram, humilharam, desprezaramE acabaram com a vida de milhares de pessoas?Não, minha cara, o mundo nunca foi santo.

Santos somos nós que nos preocupamos com o mundoE temos dor de cabeça e de consciênciaQuando vemos uma criança na rua pedindo esmolaE nada podemos fazer, a não ser rezar por elaE pedir que Deus, esse sim, a ampare.

Somos nós que não fazemos nada erradoE tentamos ser felizes com o que temosCom o amor que temosCom a vida que escolhemosSim, porque tudo é uma escolha nossaEscolhemos ser felizes ou tristesOu felizes com alguma tristeza.A vida é um acumulado de momentosBons e ruins que se revelam a cada dia.

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Se pecamos, pecamos conscientes de nosso pecadoSomos felizes pecandoO homem inventou o pecado para controlar os seus próprios atosNão foi Deus quem o criou.Para Deus o que importa é a felicidadeE ser feliz é estar feliz consigo mesmo.Com a vida e com a consciência de que não podemos ter tudo o que amamosE, sim, que devemos amar tudo o que temos!

Eu não sou santo!Mas também não me sinto um herege.Não serei queimado nas fogueiras - essa fase já passou!Nem serei canonizado.Sou um homem simples, com escrita simplesE nada rebuscada.Busco um caminho que merece ser exploradoÀ minha vontade, quando eu bem quiser.É errado???Ou será que é certo demais??Essa resposta ninguém nunca teráE posso escalar os mais altos cumes deste planetaQue a minha voz só será ouvida por mim mesmoO meu ecoA palavra que volta para dentro de mim.Eu sou a minha própria solidão.Eu me escondo quando quero ser o que eu sou.Eu sou.E sempre serei.

ninguém

pode

calar

dentro

em mim...

essa chama

que nao vai passar-(Maysa)

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Sua estupidezEu sou assim mesmoCego por naturezaE não corro perigoApenas ando por ruas e avenidasA procurar por vocêQue não me entendeQue não entende nadaQue não me procura

Tudo vai malE eu acredito que a genteAinda vai se verQue tudo é questão de tempoQue a vida pulsa em nossas veias

Mas eu não ligoEu canto e escrevo estas linhasApenas para não me esquecerDe mimDe vocêLigue o rádio(Toca a nossa canção)E vivaEsperandoUm novo amanhecer

olh

a

voce tem todas as^coisas

Not

a do

aut

or:

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ouvi

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Car

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(Roberto e Erasmo Carlos)

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Modinha

Simplesmente uma fagulhaDo pensamento divinoA vidaTão banal, tão simplesUma chamaQue se acendeQue se apagaE sou assim tão descartável?E farei falta a alguém?Terei alguma despedida?Fiz a diferença?Eu fiz a diferençaComo todos fazem a suaPequenoGiganteNesse mundo de meu DeusOnde faço eu mesmoO meu caminhoE as minha escolhas

Mas tudo continuaO sol nasceO dia nasceA coroa do rei está postaNa cabeça de outro homemO antecessor foi depostoE o que mudou?O passado que já passouO presente, esse mudouO futuro continua igualQuero pagar para verE quero assistir de camaroteÀ vida que segue seu rumoE se prepara novamentePara tudo se repetirN

ota

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utor

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A beleza da vida

Tenho pensado muito nos textos que escrevo e nos que leio e me atraem. Chego à con-clusão de que, em sua maioria, eles são todos saudosistas e deprimentes. Pensei comigomesmo: isso não é meio insano?

Querer estar e ficar triste lendo coisas que eu ou outros escrevem? Não consigo compre-ender isso. O que estamos buscando para nossas vidas? Lembranças de onde éramos felizes,de momentos inesquecíveis que nunca desaparecem de nosso pensamento?

E chego à conclusão de que estamos todos buscando a beleza da vida. Mas uma beleza queainda está por vir, durante várias e várias vezes, nos mais diversos momentos de nossa vida.

E o que é a beleza da vida para você, leitor?Para mim é estar bem comigo e com o mundo, sem me importar com o que pensam os

outros, sem prejudicar ninguém, amando e sendo amado pelas pessoas que realmente impor-tam para mim. Mas é muito fácil falar e muito difícil vivenciar isso, porque nós nospreocupamos com tudo; com o que falam e pensam de nós, com a roupa que iremos vestir nafesta da semana que virá, com a imagem que iremos passar e tantas outras coisas mais.

Não seria mais simples esquecermos tudo isso e vivermos na simplicidade?Nós realmente precisamos de tudo o que temos?Nós usamos tudo o que possuímos?A maioria de nós compra bens que nem sequer sabe para que servem. Compramos porque

todo mundo tem, todo mundo só fala nisso, todo mundo diz que é muito importante e impres-cindível para a vida moderna.

E eu pergunto: será mesmo?, eu acho que o computador é essencial, é minha ferramenta de trabalho. Mas você, que

tem um computador na sua casa, sabe realmente usá-lo? Ou você tem um passo a passo quelhe diz qual botão apertar naquele momento? E se um dia perder aquele papel, não saberá nemmais ligar o aparelho?

Conheço muita gente assim.Eu sou assim também.

Ok

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Quantos e tantos livros, , possuo e que nunca vou ler, ver ou ouvir. Tenho umaassinatura da tv a cabo a que nunca assisto, ou seja, tenho apenas por ter, só para dizer quetenho. Não é uma bobagem isso?

Vou mudar.Vou analisar o que importa, cancelar o que não uso, doar os livros que nunca lerei e pensar

mais antes de fazer qualquer coisa.Será que essa é uma solução?As coisas boas da vida, além de tudo o que já citei, são poder brincar com minhas afilhadas

enquanto elas ainda são bebês e não conhecem o mundo como ele realmente é. Poder praticaratos de caridade, como já disse, doar o que não preciso e receber de volta um sorriso defelicidade, um olhar espantado do tipo, “era isso o que eu sempre quis...” E pensar que estavajogado lá em casa...

A beleza da vida é também proporcionar momentos de felicidade aos outros. Não importaquem eles sejam, se são nossos conhecidos ou não. Apenas que eles estejam precisando eque aproveitem tudo, fazendo bom uso do que ganharam.

E para vocês leitores, o que são as coisas boas da vida? Eu gostaria muito de saber. Escre-vam-me, contem-me. Quero saber se estou no rumo certo, quero novas idéias.

Mas, antes de tudo, quero ser feliz. Quero fazer a coisa certa. Quero a beleza da vida se eurealmente merecê-la. E isso, quem sabe é só Deus

CDs DVDs

eu quero a sorte

de um amor tranquilo

com sabor de fruta mordida(Cazuza)

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!@#$%

!@#$%

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Luz LuzLu

zAs estrelas tantas

Tantas sao as estrelas-

-E la no meio

Brilha

A sua estrela

A estrela brilhante

A Que brilha

No meio de tantas

Estrelas

De tanto brilho

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AprendendoSabe que ele me fez acreditar novamente? Estava tão descrente, tão decepcionado. E

a minha maior decepção era comigo mesmo. Acreditei que tinha falhado. E, de repente,num turbilhão de emoções, leio a notícia da Praça de Maio, e tudo vem à tona. Renasci.

Tudo porque eu vi Bono recepcionando as mães desesperançosas daArgentina. Desesperançosas? Nunca! Elas têm mais esperança que todos nós juntos.Elas lutam por algo que não tem volta. E lutam para que não mais aconteça tudo de novo,com seus netos, comigo e com você.

E ele estava lá cumprindo um papel que a princípio não é seu. Mas que certamente é,sim, e com todo o respeito devia ser de todos nós, famosos ou não, felizes ou não. Nósdeveríamos lutar pela felicidade, pela justiça por que tanto clamamos, embora nadafaçamos para mudar. Deixamos tudo como está, apenas reclamamos, apenas... apenas!

Não quero com isso fazer uma apologia ao irlandês Bono, nem fã dele eu sou. Curto,sim, a música do U2 porque é boa e me cativa, mas fã mesmo não sou. Sou fã, sim, dosatos do vocalista Bono em favor da paz e da igualdade de direitos, da conscientizaçãopolítica que ele tem e da informação que busca sobre cada país que visita. Isso é ser umastro do , isso é ser uma estrela de máxima grandeza.

Saber usar a notoriedade que se tem em busca de algo maior deveria ser a meta detodo ser humano que atinge esse . E sem fazer propaganda disso!

Manter creches, instituições, fazer doações é importante também, mas a palavra dealguém do porte de Bono para as pessoas é como se fosse uma lei. Seus atos políticos emfavor da humanidade servem de exemplo para que mais pessoas sigam seu ideal e lutempor um mundo melhor.

A espiritualidade de cada ser humano deve ser sempre mantida em primeiro lugar.Devemos ser fiéis a nosso propósito inicial, a nossa programação, àquilo por que volta-mos à Terra, e àquilo por que deveríamos estar nos empenhando.

Mas como dar um passo e nos desvencilharmos de todas as amarras que nos pren-dem ao nosso ?

na internet

rock

status

ego

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Fazendo e agindo com a verdade, lutando pela verdade. Acreditando que o ato podemudar tudo, pode fazer diferença e não nos importando com aquele que pensa estarlutando, mas no fim está mesmo buscando algo pessoal. Estamos aqui para lutar pelahumanidade e não por nós mesmos.

Nós podemos não ser um Bono, nem ter uma banda de , podemos nem mesmoser presidentes de nações, astros de Hollywood, mas basta acreditar que sendo apenasnós mesmos a ajuda virá, vai acontecer, tudo pode mudar.

Não precisamos fazer , uma vez que não somos artistas, mas podemospromovê-los em prol do próximo. É difícil? Mas não é impossível.

Vamos deixar a máscara egocêntrica de lado e batalhar por algo em que acreditamose que pode mover montanhas. O pagamento é um sorriso de criança, é uma lágrima deuma mãe que perdeu o seu filho, é a esperança e a certeza de que nada foi em vão.

E mesmo que não tenha lágrimas, nem sorrisos dos outros, chore você mesmoagradecendo, sorria você, mesmo diante do espelho. Acredite em você. Só assim omundo tem jeito.

Nem eu, Bono, nem eu…

. Obrigado.

rock,

,shows

Thanks

I still haven t found

what i m a looking for...

somos responsáveis

por tudo o que

cativamos

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e-m

ail

Estou ficando

Viciado nestes e-mails

Nesta conversa sem pe

Nem cabeca

Desta voz sem dono

Destas palavras

Sem expressao

Sem mirar os olhos

Sem desvendar

O que ha por detras

De cada verbo

De cada virgula

E de cada suspiro...

-

-

-

-

-

-

99

BAte-papoele

tro

nic

o

v

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Manha emocionada-

Nem tenho tanto assim para dizerPensar ou contarMas me empenho em escreverAquilo que meus olhos lêemE meu coração senteAo ler as páginas de um diário eletrônico.

Nós temos mesmoQue ignorar tudo o que acontece ao nosso redor?

Ele não dispensa nadaEle olha tudoE participaMesmo numa manhã ensolaradaComo essa.

E por que é queEu não saio dessa pose?EstagnadoPensativoJulgando-me um imperadorSem reino, sem posses,Sem direito algum de julgar

Talvez eu ache que é precisoQue algo aconteçaE mude esse panorama

Por que então não deixar como está?O mundo vai continuar mesmoSe eu não estiver presente

Mas pode ficar diferenteSe eu estiver láOnde tudo aconteceE onde posso estar para modificar...

Leio o arquivo e me emocionaAs mães da Praça de MaioNão pararam, elas continuaramO show continuouMesmo com a guerraMesmo com a chuvaMesmo com a fome

E o que eu reivindico?Mais saúde?Mais dinheiro?

Deveria reivindicar mais féPorque assimTudo aconteceria...

Para Bono Vox

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No dentistaEstou calmo agora, mas não queria estar. Tenho tanto o que fazer que me pergunto onde irei arrumar

tempo para tudo. Aliás, eu teria de parar o tempo. Será que consigo isso? Se eu me esforçar bastante eme concentrar... Será possível?

Não, na verdade acho que não estou tão calmo assim. Ainda estou esperando um telefonema quenão vem, aqui nesta ante-sala do consultório do dentista.

E, enquanto espero, as mulheres, que também aguardam, não param um segundo sequer de falardos problemas odontológicos, de todos os que conhecem, como se fossem da área epudessem solucionar tudo num piscar de olhos. Eu? Eu fico escrevendo e tentando me concentrar noque vou fazer depois daqui.

Vou ao shopping center pôr a carta no correio? Ou vou para casa ler ?Fico na dúvida sobre o próximo passo. Na verdade, eu queria ir para casa descansar, tomar meu

Häagen Dazs delicioso e acumular calorias neste corpo emprestado, que, por muito tempo, ainda serámeu.

E nada de chegar a minha vez.A música mal sintonizada no rádio começa a me dar dor de cabeça. Tem algo pior do que emissora

mal sintonizada? Tem, sim: refrigerante sem gás!Ainda bem que estou abolindo o refrigerante do meu cardápio diário. Final de semana, quem sabe,

talvez... O fato é que logo, logo, minha boca vai estar encharcada de um líqüido pastoso que serve paraclarear os dentes. Coisa chata de fazer, mas com resultados bem interessantes.

Estética, pura estética! E nos dias atuais é mais do que necessário. Preciso treinar um novo sorriso;não muito escancarado, para não dar tanto nas vistas. Nada exagerado, apenas um sorriso branco...Risos.

No final, acabei relaxando um pouco ao escrever estas idéias.A sintonia do rádio continua péssima. As mulheres ainda falam pelos cotovelos. Não param. Agora

mesmo elas debatem e se dizem . Vai entender... e eu só ouvindo.“E eu que não sei nada do mar...”Só sei de mim e olhe que sei bem pouco. O suficiente para não me revelar muito. Embora nem

sempre funcione. O tempo está passando, e eu fico aqui, apenas aguardando a minha vez.

experts

e-mails

rally bikers

“O tempo passou na janela e só Carolina nao viu...”-

(Chico Buarque)

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ando pelo mundo

e de todos os lugares

que visito

roubo paisagens

que passam

a fazer parte

de minha alma cigana

alma ciganaa

nd

arilh

o

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meu coração se aquieta

minha alma pequena

se torna sua

meu espírito perambula

pelo seu céu e faz

acrobacias aéreas

nas suas ruas

sou tão pequeno perto de você

um artista errante

você, meu apogeu

Paris

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grande labirinto de vias

e imagens imortalizadas

nesta alma cigana

digitais que me revelam

o fogo escondido

o pecado

o pecador

e a ousadia

de ser quem é

a grande prostituta

de cujos braços

não sairei jamais

imagens

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toca o sino e sobe as escadas

num trotar só e uníssono

não uses o funicular, usa o pé

dá asas à tua imaginação

imagina o Sacré-Couer

e pinta um quadro

imortaliza esta imagem

os telhados da cidade

a revolução francesa

o legado da história

certamente, um dia,

já viveste por aqui

escadas

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quando as luzes anunciam a noite

Paris se magnifica

candelabros se acendem

e as portas do imaginário se iludem

é festa, é alegria

nostalgia que não tem fim

Cidade Luz que alumia

a alma do viajante

o coração do cigano

o vento do norte

não permita Deus que eu vá desta vida

sem novamente

vislumbrar-te, Paris

lumiar

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o sorriso enigmático faz fila

para ser admirado

coisa de louco e japonês

profetas do turismo exacerbado

milhões de códigos

que nunca serão decifrados

Da Vinci, Michelangelo,

Botticelli, Vênus de Milo

um braço só

mil guerreiros orientais

pós-modernismo

realeza

pobreza

códigosme dê a razão disso tudo

me explique os senões e os porquês

boquiaberto, sôfrego,

cansado, muito cansado,

porém maravilhado

de toda essa beleza do Louvre

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vi você na esquina

Galerias Lafayette

compras e mais compras

batalhas intermináveis

a cabeça de Maria Antonieta

ah! não consigo acompanhar

tanta coisa nesta cidade

tanto para se ver

muito para se lembrar

cenas de cinema

romances de amor

e muita poesia

cenas

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rodopiar e se perder

cambalear até

quase cair no chão

andar por aí

mapa sem fim

trilhas e caminhos

que levam a qualquer lugar

qualquer país

rota ou destino

certo ou incerto

você está aqui

mas sua mente não

estações seu corpo está alerta

mas sua alma voa

no compasso deste dia

horas intermináveis

sonho impossível

lembranças de séculos

que se perderam

e que agora renascem

para sempre dentro de você

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festival de cores

can can can can can

mulheres multifacetadas

num Moulin Rouge de sonhos

e imagens rodopiando

tal qual um Dom Quixote

que desesperado se perdeu

de seu Sancho Pança

numa esquina qualquer

ou atrás de um moinho

transformando seus desejos

em realidade nua e crua

cabaré

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Fellini e o cinema

e La Nave Va

junto com ela Quasímodo

tropeça ao limpar suas gárgulas

e seus vitrais inesquecíveis

um coral de arrepiar a alma

de quem passa

de quem andou por aí

a bela da tarde

Jules e Jim

um triângulo incestuoso

a arte, o profano e a religião

tão moderna e medieval

nave como descobri-la

em meio a tantos segredos,

pedindo-lhe abrigo,

soluçando aos pés da cruz?

Notre-Dame, rogai por nós!

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Panteão de deuses e semideuses

onde a mais bela Diva

floreia em “mi” um solo fatal

Ó sole mio magnífico

La donna é mobile

Minerva julga os pobres mortais

que somos nós

eu e você

na mais completa desarmonia

deste canto profano

neste cair de tarde

de angelical beleza

apreciando um coral vindo dos céus

ópera

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eu só entendo a beleza

do sorriso da Mona Lisa

quando percebo que ela

não está sorrindo

e, sim, mentindo para nós

a arte nos torna alienados

fazendo-nos perder a razão

eu não entendo a arte

eu somente entendo

Renoir, Monet, Manet, Rembrandt,

Rafaello Sanzio e

Michelangelo Buonarroti

aprecio a beleza das formas

e a sutileza dos grandes mestres

arte

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Para eu parar de me doer

Se lembra das fogueiras

À Alessandra Cristina Rodrigues de Oliveira Pezzato (in memorian)

Como faço para eliminar a dorA dor que não cessaQue vai e que voltaA qualquer momentoSem pedir licençaSem medir conseqüênciasE me pega assim, de repente?

Como fazer para não doerO meu corpo, a minha cabeçaPara estancar as lágrimas que insistemEm brotar dos meus olhosCada vez que paro e pensoEm tudo e no que aconteceu?

Como faço para voltar a respirarA ser como eu eraA viver como viviaA sentir aquilo que sempre sentia?

Como fazer para acordar todo diaTrabalhar e criar novas idéiasProjetos de vidaSe tudo se interrompeQuando penso em vocêE no tanto que você queriaQue tudo desse certoQue tudo florescesseComo já floresceA cada amanhecer?

Como não pensar mais...Como esquecer e seguir em frente...Como não tropeçar no caminho...Eu não sei comoApenas sigo tateando e mirandoA luz que se acende ao longeChamando-mePedindo-meImplorando-meE dizendo:A vida continua...

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Faz frio lá foraFaz frio aqui dentroOnde você mora?E por que não estou ao seu lado?Noite de julhoCoração aos pedaçosAs lágrimas querendo sairO grito aprisionadoUm sufoco algemadoO medo de que tudo issoSeja verdadeE não apenas um sonho sofridoUm pesadelo

Noite de julhoNo hotel escrevendo solitárioAs pessoas indo e vindoO pulsar das horasA recusa em voltar para casaNessa noite de julhoEm que aprisionado estouÀ espera do inesperadoQue já aconteceuEnquanto sofro calado

Noite de julhoÀ Alessandra Cristina Rodrigues de Oliveira Pezzato (in memorian)

Se lembra dos baloes-

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Epílogo

Foram muitas as lembranças que permearam o projeto deste livro, e eu não poderiadeixar de citar que minha alma foi totalmente entregue a . Não sei se um diaconseguirei escrever um livro como este, nem ao menos sei se escreverei mais.

Agora, só penso em viver meu momento.Quero curtir mais esta vida e me libertar daquilo de que não gosto. Não sou mais o

mesmo e só me dei conta disso ontem, quando, ao sair de uma peça de teatro, fiqueiperambulando pelas alamedas de um .

Sempre me vi menino, não consigo conceber a idéia de que terei quarenta anos, nopróximo ano. Não me visto como um homem de quarenta. Não tenho a sua postura, nem osseus modos, nem nada. Pelo menos era o que eu achava.

Porém hoje eu consigo falar: tenho quarenta anos. Mesmo sem tê-los de verdade. Queriae quero ter quarenta, cinqüenta, sessenta... E quero andar pelas ruas do mesmo modo comohoje ando. Quero cumprimentar as pessoas e apertar as suas mãos, beijar suas faces. Querocontinuar apaixonado pela vida ou, ao menos, pelo que me restou dela. Quero entendermais, mesmo que eu não aceite.

Lembro-me de que enquanto andava pelo , um sentimento muitoestranho tomou conta de mim, e eu vi a vida pulsando ao meu lado; vi jovens com suasroupas de marca, rindo e andando sem parar, alheios à minha dor, como se eu não estivesseali. E realmente, eu não estava.

Passei parte de minha vida fingindo ser quem achava que gostariam que eu fosse. Agoravou viver. Só que não vou planejar mais nada. Não vou mais organizar o meu dia-a-dia e nemmais vou vê-lo ser desorganizado por todos. Vou atender ao telefone quando quiser. Voupedir mais desculpas e perdões. Vou perdoar. Vou pedir piedade. E vou tentar não maischorar.

Hoje, o que mais quero é arrumar a minha estante e doar a quem possa interessar,diversos livros, que sei que não lerei jamais. Farei isso também com alguns . Depois, vouler os livros que selecionei, um a um.

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Daí, talvez, volte a escrever.E confesso que tentarei somente escrever coisas alegres, basta de dor e solidão. Talvez

eu consiga, talvez não. Vou apenas olhar mais uma vez para a saudade e dizer: Até breve!Sei que o meu tempo está se esgotando, mas também sei que somente irei na hora certa.Por ora, tenho muito o que fazer por aqui, E também terei muito o que fazer quando me for.

foi um grande presente que ganhei do Universo. Neste livro, tenteihomenagear e lembrar-me de pessoas muito queridas. Não deu para falar de todos, porque olivro foi criando o seu próprio ritmo e exigindo de mim aquilo que lhe cabia. Fui apenasobedecendo... só obedecendo.

Se me perguntarem, hoje, quando sairá o próximo, direi que não sei se haverá mais um.Talvez aconteçam mais dez ou vinte. Só que hoje, minha vontade é de apenas continuar coma minha missão.

Então, só quero acordar pela manhã, abrir a janela e aspirar o ar gelado que invade oquarto. Quero depois colocar um diferente e ficar ouvindo, às vezes prestando atenção,outras, apenas divagando pelos céus deste meu Brasil.

Daí, quero curtir minhas sobrinhas e minha família. Quero ver todos felizes, acreditandona vida, crendo em Deus e vivendo em paz.

Só depois é que vou cuidar de mim. Sempre fui assim: em primeiro lugar, os outros,depois eu. E é assim que sou feliz e me realizo. É assim que permaneço em paz. É isso que euquero muito.

Muito mais.

Agosto de 2007

Este livro é inteiramente dedicado à memória de minha doce irmãzinha AlessandraCristina. Dadá, este livro é para você. Para sempre! Eu nunca vou esquecê-la... Fique comDeus!

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