ministÉrio pÚblico do estado de goiÁs · vedado expressamente pela lei geral das eleições....

30
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS 57ª Promotoria de Justiça de Goiânia Rua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/24 sala 332, Jardim Goiás, Goiânia-Goiás - CEP 74.805-100 e-mail: [email protected] 62 3243-8442 e 127 | www.mpgo.mp.br _____________________________________________________________________________________________________ AO JUÍZO DE DIREITO DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL DA COMARCA DE GOIÂNIA O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por sua Promotora de Justiça em substituição automática na 57ª Promotoria de Justiça de Goiânia, com suporte nos arts. 127, caput, e 129, II e III, da Constituição Federal, no art. 17, caput, da Lei 8.429/1992, nos arts. 1º, IV e VIII, e 5º, I, da Lei 7.347/1985, art. 25, IV, da Lei 8.625/1993, e art. 46, VI, da Lei Complementar Estadual 25/1998, vem perante Vossa Excelência propor AÇÃO CIVIL PÚBLICA por Ato de Improbidade Administrativa com pedido de tutela provisória

Upload: others

Post on 14-Feb-2020

3 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS57ª Promotoria de Justiça de GoiâniaRua 23, esq. com a Av. Fued José Sebba, Qd. 06, Lts. 15/24sala 332, Jardim Goiás, Goiânia-Goiás - CEP 74.805-100e-mail: [email protected] 3243-8442 e 127 | www.mpgo.mp.br

_____________________________________________________________________________________________________

AO JUÍZO DE DIREITO DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL DA

COMARCA DE GOIÂNIA

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por sua

Promotora de Justiça em substituição automática na 57ª Promotoria de Justiça de Goiânia,

com suporte nos arts. 127, caput, e 129, II e III, da Constituição Federal, no art. 17, caput,

da Lei 8.429/1992, nos arts. 1º, IV e VIII, e 5º, I, da Lei 7.347/1985, art. 25, IV, da Lei

8.625/1993, e art. 46, VI, da Lei Complementar Estadual 25/1998, vem perante Vossa

Excelência propor

AÇÃO CIVIL PÚBLICA

por Ato de Improbidade Administrativa

com pedido de tutela provisória

Page 2: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

em desfavor de:

MARCONI FERREIRA PERILLO JÚNIOR, brasileiro, casado, RG nº

1.314.602-DGPC/GO, CPF nº 035.538.218-09, domiciliado na Alameda Itu, nº

547, apt. 74, Edifício São João Del Rey, Cerqueira César, São Paulo/SP, CEP

01421-001; e

BRENCO COMPANHIA BRASILEIRA DE ENERGIA RENOVÁVEL –

EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL, pessoa jurídica de direito privado, inscrita

no CNPJ sob o nº 08.070.566/0012-54, com sede na Rodovia GO-341, Km 67 à

direita 13 km, Zona Rural, Mineiros-GO, CEP 75830-002; e

ESTADO DE GOIÁS, pessoa jurídica de direito público, representada por seu

Procurador-Geral, domiciliado na Praça Dr. Pedro Ludovico Teixeira, nº 132,

Centro, Goiânia/GO, CEP 74003-010, pelos fatos e fundamentos jurídicos a

seguir expostos.

I – DOS FATOS

I.1) O encaminhamento do projeto de lei nº 2012001256

No ano de 2012, na cidade de Goiânia, o ex-Governador do Estado de Goiás e

ora réu MARCONI FERREIRA PERILLO JÚNIOR deu causa à renúncia fiscal de

Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviços (ICMS) em desobediência ao

ordenamento legal vigente.

A renúncia de receita se deu por meio do encaminhamento de projeto de lei à

Assembleia Legislativa goiana que, como se tornou habitual em Goiás, aprovou as medidas

sem nada questionar.

Em 04 de abril de 2012, por meio do Ofício Mensagem nº 32/12, MARCONI

PERILLO encaminhou à Assembleia Legislativa do Estado de Goiás projeto de lei para

2/30A.C.S.

AdministradorMP
Realce
AdministradorMP
Realce
Page 3: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

alterar a redação do art. 3º da Lei 13.246/19981, autorizando o Chefe do Poder Executivo a

conceder crédito outorgado de ICMS aos industriais do setor alcooleiro enquadrados no

programa Fomentar e Produzir, em percentual a ser estabelecido em regulamento, mas tendo

como limite máximo o percentual de 60% sobre o saldo devedor do valor que seria obtido,

caso a responsabilidade pelo imposto nas operações com álcool anidro fosse do industrial.

Após tramitação e aprovação da Assembleia Legislativa do Estado de Goiás, o

aludido projeto de lei foi encaminhado e sancionado, dando origem à Lei nº 17.640, de 21 de

maio de 2012.

Na ocasião, MARCONI descumpriu o art. 14 da Lei Complementar Federal nº

101, de 4 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), pois o projeto de lei não atendeu

aos requisitos legais exigidos para concessão de benefícios fiscais2.

Ora, MARCONI não disse sequer o valor total da renúncia fiscal, tampouco

qual seria o impacto orçamentário-financeiro da benesse para os anos de 2012, 2013 e 2014.

Também não comprovou que o benefício fiscal previsto no projeto que resultou na Lei nº

17.640/2012 estava em conformidade com a LDO de 2012 (Lei nº 17.393/2011). Nenhum

mísero cálculo sobre adequação com a lei orçamentária acompanhou o citado projeto de lei

(confira a íntegra do PL nº 2012001256 anexado à presente petição inicial).

Além disso, o primeiro réu não indicou quais medidas (aumento de receita,

elevação de alíquotas, criação de tributos etc.), seriam tomadas para compensar a renúncia de

receita levada a efeito pela Lei Estadual 17.640/2012, o que demonstra que MARCONI se

portou como um administrador absolutamente irresponsável.

A Lei Estadual 17.640/2012 também não foi precedida de autorização

outorgada por convênio firmado entre os Estados e o Distrito Federal, como exige o art. 155,1 Anteriormente a essa alteração, o art. 3º da Lei 13.246/1998 previa como teto o percentual de 30%, conforme

redação da Lei 16.286/2008.2 a) estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar a vigência e nos dois

seguintes (art. 14, caput, da LRF); b) atender ao disposto na Lei de Diretrizes Orçamentárias (art. 14, caput);c) demonstração de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma doart. 12 da LRF, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da LDO (art.14, I); ou estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio doaumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração oucriação de tributo ou contribuição (art. 14, II).

3/30A.C.S.

Page 4: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

§ 2º, XII, “g”, da Constituição Federal e a Lei Complementar nº 24, de 7 de janeiro de 1975,

em casos de concessão de incentivo fiscal envolvendo ICMS. Portanto, a benesse veiculada

pela Lei Estadual 17.640/2012 viola o pacto federativo, pois dá azo à famigerada “guerra

fiscal”.

I.2) A edição de decretos concedendo benefícios fiscais

A partir da publicação da Lei 17.640/2012, MARCONI poderia tomar uma

entre três atitudes: a) manter os benefícios fiscais aos industriais do setor sucroalcooleiro em

30%; b) diminuir os créditos outorgados de ICMS até 0%; ou c) aumentar os benefícios

fiscais para os usineiros até 60%.

MARCONI executou a alternativa “c”. Veja-se.

A Gerência de Combustíveis da Secretaria de Estado da Economia, por meio do

Despacho nº 92/2019-GECOM-05557, informou que, após a Lei 17.640, de 21/05/2012, o ex-

Governador MARCONI PERILLO editou decretos fixando o percentual de crédito

outorgado sobre o saldo devedor do valor do ICMS que seria obtido, caso a responsabilidade

pelo imposto nas operações com álcool anidro fosse do industrial, quais sejam, Decreto nº

7.661, de 03 de julho de 20123, Decreto nº 7.668, de 10 de julho de 20124, e Decreto nº

8.148, de 14 de abril de 20145.

O Decreto nº 7.661, editado logo após a publicação da Lei 17.640/2012 e

vigente entre 1º/01/2012 e 30/06/2012, aumentou o crédito outorgado de 30% para 40%. O

Decreto nº 7.668, publicado uma semana após o decreto anterior e vigente entre 1º/07/2012 e3 “Art. 1º O inciso XXVI do art. 11 do Anexo IX do Decreto nº 4.852, de 29 de dezembro de 1997,

Regulamento do Código Tributário do Estado de Goiás -RCTE-, passa a vigorar com a seguinte alteração:“Art. 11 (…) XXVI – para o industrial do setor alcooleiro enquadrado nos Programas FOMENTAR ouPRODUZIR, o valor correspondente à aplicação do percentual de 40% (quarenta por cento) sobre o saldodevedor do valor do ICMS que seria obtido, caso a responsabilidade pelo imposto nas operações com álcoolanidro fosse do industrial, observado o seguinte (Lei nº 13.246/99, art. 3º, II): (...)

4 “Art. 1º O percentual de que trata o caput do inciso XXVI do art. 11 do Anexo IX do Decreto nº 4.852, de 29de dezembro de 1997, Regulamento do Código Tributário do Estado de Goiás - RCTE-, passa a ser de 50%(cinquenta por cento), a partir de 1º de julho de 2012.”

5 “Art. 1º O art. 11 do Anexo IX do Decreto nº 4.852, de 29 de dezembro de 1997, Regulamento do CódigoTributário do Estado de Goiás - RCTE -, passa a vigorar com a seguinte alteração: Art. 11 (…) XXVI - para oindustrial do setor alcooleiro enquadrado nos Programas FOMENTAR ou PRODUZIR, o valorcorrespondente à aplicação do percentual de 60% (sessenta por cento) sobre o saldo devedor do valor doICMS que seria obtido, caso a responsabilidade pelo imposto nas operações com álcool anidro fosse doindustrial, observado o seguinte (Lei nº 13.246/99, art. 3º, II):” (NR) (...)”

4/30A.C.S.

Page 5: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

13/04/2014, alterou o percentual do benefício fiscal de 40% para 50%. Por fim, o Decreto nº

8.148, com vigência a partir de 14/04/2014, mas que alcançou o período iniciado em

1º/01/2013, alterou o crédito outorgado de ICMS de 50% para 60%, ou seja, o patamar

máximo permitido em lei.

Eis os valores totais do dano ao erário levado a efeito por MARCONI

(conforme Despacho nº 92/2019-GECOM-05557 da Gerência de Combustíveis da Secretaria

de Estado da Economia):

Ano Crédito outorgadoapropriado na escrita

fiscal

Estimativa do valorcorrespondente ao aumento do

percentual

2012 R$ 75.259.478,00 R$ 25.086.493,00

2013 R$ 125.961.675,00

R$ 225.586.547,0062014 R$ 199.249.564,00

2015 R$ 212.364.322,00

2016 R$ 316.300.586,00 R$ 158.150.293,00

2017 R$ 332.601.509,00 R$ 166.300.754,00

2018 R$ 251.137.818,00 R$ 125.568.909,00

TOTAL R$ 1.512.874.951,00 R$ 700.692.905,00

Portanto, ao editar os Decretos 7.661/2012, 7.668/2012 e 8.148/2014, que

majoraram os créditos outorgados para os industriais do setor sucroalcooleiro de 30% até

60%, MARCONI deu causa a um dano ao erário da ordem de R$ 700.692.905,00

(setecentos milhões, seiscentos e noventa e dois mil e novecentos e cinco reais).

Os Decretos 7.661/2012, 7.668/2012 e 8.148/2014 padecem dos mesmos vícios

de sua lei autorizadora (Lei 17.640/2012), quais sejam, violação ao art. 14 da LRF,

desrespeito à LDO, e violação ao art. 155, § 2º, XII, “g”, da Constituição Federal e à Lei

Complementar nº 24/1975, cuja argumentação foi explanada no tópico anterior.

Contudo, o Decreto 8.148/2014 possui um vício a mais: a violação ao art. 73, §

10, da Lei 9.504/19977, pois MARCONI concedeu benefício fiscal em ano eleitoral, o que é6 Período de 2013 a 2015 estimado em conjunto em função do efeito retroativo da norma que aumentou o

benefício e do parcelamento do aproveitamento da diferença dele decorrente.7 Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a

igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais: (…) § 10. No ano em que se realizareleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração

5/30A.C.S.

Page 6: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições.

I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882

Como dito em linhas pretéritas, os industriais do setor alcooleiro no Estado de

Goiás gozam de benefícios fiscais de ICMS nos termos do art. 3º, II, da Lei 13.246/1998,

tendo sido ainda mais agraciados a partir da Lei 17.640/2012 e dos Decretos 7.661/2012,

7.668/2012 e 8.148/2014.

Como se sabe, o benefício fiscal de crédito outorgado é calculado pela

aplicação de um percentual sobre o saldo devedor do valor do ICMS que seria obtido caso a

responsabilidade pelo imposto fosse do beneficiado. Portanto, quanto maior a alíquota do

tributo, maior o valor do crédito outorgado.

O valor da alíquota do ICMS aplicável nas operações internas com etanol

(hidratado ou anidro) é dada pelo art. 27, IX, “a”, do Código Tributário do Estado de Goiás.

Por meio da Lei 19.925, publicada no Suplemento do Diário Oficial do Estado de Goiás de

27/12/2017, a alíquota de ICMS para o álcool combustível a partir de 1º/01/2018 foi reduzida

de 29% para 23%.

Para o povo, isto é, para quem paga imposto, foi uma ótima medida, mas para

quem vive do capitalismo de estado foi péssimo. No caso, os industriais do setor alcooleiro

experimentaram diminuição de seus créditos outorgados a partir da Lei 19.925/2017.

A fim de privilegiar os industriais do setor alcooleiro e em pleno ano de

eleições gerais, em 09 de março de 2018 o então Governador MARCONI PERILLO enviou

o Ofício Mensagem nº 31/2018 para a Assembleia Legislativa com projeto de lei cujo objetivo

era restabelecer a alíquota de 29% de ICMS para o álcool combustível para o cálculo do

crédito outorgado, tudo de modo a aumentar o benefício fiscal em favor dos usineiros.

A proposta tinha a seguinte redação:

Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociaisautorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Públicopoderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa.

6/30A.C.S.

Page 7: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

Art. 1º O art. 3º da Lei nº 13.246, de 13 de janeiro de 1998, passa a vigorar com aseguinte alteração: “Art. 3º .....................................................……………………………………………....................................................................§ 4º Para efeito do cálculo do saldo devedor do valor do ICMS que seria obtido, deque trata a alínea “a” do inciso II do “caput” deste artigo, devem ser considerados osdébitos de ICMS relativos às saídas internas e interestaduais, com a utilização dasalíquotas respectivas, vigentes à data de publicação da Lei Complementar nº 160, de07 de agosto de 2017.”(NR)

Assim como na Lei 17.640/2012, o projeto de lei que originou a Lei

20.063/2018 resultou em renúncia fiscal de ICMS em desobediência ao art. 14 da Lei

Complementar 101, de 4 de maio de 2000.

Conforme informado pela Gerência de Combustíveis da Secretaria de Estado

da Economia (Despacho nº 92/2019-GECOM-05557):

A redução na alíquota das operações internas implicou em redução domontante de crédito outorgado do etanol anidro apropriado pelos industriais, vistoque a utilização de alíquota menor no cálculo dos débitos de ICMS relativos àsoperações internas (23%, ao invés de 29%) também reduziu o montante do saldodevedor do ICMS sobre o qual é calculado o benefício fiscal.

Neste contexto, o art. 1º da Lei 20.063/2018, ao acrescentar o § 4º do art. 3ºda Lei 13.246/1998, permitiu que, no cálculo do crédito outorgado do etanol anidroa ser aproveitado pelo industrial, seja utilizada a alíquota de 29% para as operaçõesinternas (alíquota vigente na data da publicação da Lei Complementar nº 160, de 07de agosto de 2017) ao invés da alíquota de 23% atualmente prevista na legislaçãoestadual.

Portanto, face à legislação estadual então vigente, a alteração promovida peloart. 1º da Lei 20.063/2018 representou um aumento no valor do crédito outorgado doetanol anidro concedido aos industriais do setor sucroalcooleiro.

O impacto do mencionado aumento nos períodos de JULHO A DEZEMBROde 2018, estimado a partir das informações da Escrita Fiscal Digital – EFD dosbeneficiados disponíveis da base de dados da SEFAZ/GO, e a sua projeção para umperíodo de 12 meses são os seguintes:

Mês Impacto

07/2018 R$ 5.142.686,00

08/2018 R$ 5.038.101,00

09/2018 R$ 5.118.992,00

10/2018 R$ 5.551.833,00

11/2018 R$ 4.946.123,00

12/2018 R$ 5.379.445,00

Total no período R$ 31.177.180,00

Média mensal: R$ 5.196.197,00

7/30A.C.S.

Page 8: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

Mês Impacto

Projeção para 12 meses R$ 62.354.360,00

Considerando, portanto, a data de publicação da Lei 20.063 (D.O.E. de

10/07/2018), a data da propositura da presente ação e a média mensal do impacto calculada

pela Gerência de Combustíveis da Secretaria de Estado da Economia (vide quadro acima),

tem-se que a renúncia fiscal operada por MARCONI foi da ordem de R$ 93.531.546,00

(noventa e três milhões, quinhentos e trinta e um mil e quinhentos e quarenta e seis reais).

Na ocasião, MARCONI descumpriu o art. 14 da Lei Complementar Federal nº

101, de 4 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), pois o projeto de lei não atendeu

aos requisitos legais exigidos para concessão de benefícios fiscais8.

Ora, MARCONI não disse sequer o valor total da renúncia fiscal, tampouco

qual seria o impacto orçamentário-financeiro da benesse para os anos de 2018, 2019 e 2020.

Também não comprovou que o benefício fiscal previsto no projeto que resultou na Lei nº

20.063/2018 estava em conformidade com a LDO de 2018 (Lei nº 19.801/2017). Nenhum

mísero cálculo sobre adequação com a lei orçamentária acompanhou o citado projeto de lei

(confira a íntegra do PL nº 2018000882 anexado à presente petição inicial).

Além disso, o réu não indicou quais medidas (aumento de receita, elevação de

alíquotas, criação de tributos etc., seriam tomadas para compensar a renúncia de receita

levada a efeito pela Lei Estadual 20.063/2018, o que demonstra que MARCONI se portou

como um administrador absolutamente irresponsável.

A Lei Estadual 20.063/2018 também não foi precedida de autorização

outorgada por convênio firmado entre os Estados e o Distrito Federal, como exige o art. 155,

§ 2º, XII, “g”, da Constituição Federal e a Lei Complementar nº 24, de 7 de janeiro de 1975,

em casos de concessão de incentivo fiscal envolvendo ICMS. Portanto, a benesse veiculada

8 a) estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar a vigência e nos doisseguintes (art. 14, caput, da LRF); b) atender ao disposto na Lei de Diretrizes Orçamentárias (art. 14, caput);c) demonstração de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma doart. 12 da LRF, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da LDO (art.14, I); ou estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio doaumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração oucriação de tributo ou contribuição (art. 14, II).

8/30A.C.S.

Page 9: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

pela Lei Estadual 20.063/2018 viola o pacto federativo, pois dá azo à famigerada “guerra

fiscal”.

I.4) Omissão, valor do dano ao erário e benefício auferido pela BRENCO

Como dito acima, a partir da publicação da Lei 17.640/2012, MARCONI

poderia tomar uma entre três atitudes: a) manter os benefícios fiscais aos industriais do setor

sucroalcooleiro em 30%; b) diminuir ou até mesmo zerar os créditos outorgados de ICMS; ou

c) aumentar os benefícios fiscais para os usineiros até 60%.

De acordo com os dados informados pela Gerência de Combustíveis da

Secretaria de Estado da Economia, por meio do Despacho nº 92/2019-GECOM-05557, entre

2012 e 2018 o crédito outorgado apropriado na escrita fiscal pelos industriais do setor

alcooleiro alcançou o montante de R$ 1.512.874.951,00 (A).

Também de acordo com o Despacho nº 92/2019-GECOM-05557, desse total,

R$ 700.692.905,00 (B) decorrem dos aumentos de percentuais provocados pelos Decretos

7.661/2012, 7.668/2012 e 8.148/2014, isto é, 46,32% do montante total.

Por outro lado, a omissão de MARCONI ocasionou um dano ao erário da

ordem de R$ 812.182.046,00 (A - B = C), ou seja, 53,68% do total, pois o ex-Governador

deveria ter agido para extinguir os créditos outorgados de ICMS aos industriais do setor

sucroalcooleiro, pois a Lei 13.246/1998, desde sua redação original, sempre manteve a

concessão, majoração ou diminuição de benefícios fiscais como uma faculdade do Chefe do

Poder Executivo e não um dever.

Do montante total do dano ao erário provocado pelos incentivos fiscais de

ICMS outorgados aos industriais do setor alcooleiro a partir de 2012, isto é, R$

1.512.874.951,00, conforme informado pela Superintendência de Informações Fiscais da

Secretaria de Estado da Economia (Memorando nº 455/2019-SIF-15955), R$ 206.344.938,16

(duzentos e seis milhões, trezentos quarenta e quatro mil, novecentos e trinta e oito reais e

dezesseis centavos) foram em benefício da ré BRENCO COMPANHIA BRASILEIRA DE

ENERGIA RENOVÁVEL – EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL.

9/30A.C.S.

Page 10: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

A Secretaria de Estado da Economia, apesar de ter informado os valores

auferidos pela sociedade empresária ré a título de crédito outorgado de ICMS, com apoio no

Parecer GIAD-15961 nº 237/2019, negou acesso às escrituras fiscais digitais da segunda ré

sob a justificativa de sigilo fiscal. Apesar disso, a negativa de acesso às escrituras fiscais

digitais da BRENCO pela Superintendência de Informações Fiscais da Secretaria de Estado

da Economia não gerará maiores transtornos, notadamente por força do § 2º do art. 8º da Lei

Federal 7.347/19859 (Lei da Ação civil Pública).

Por fim, o dano ao erário pode ser assim resumido:

Valor do dano provocado pela Lei 20.063/2018 R$ 93.531.546,00

Valor do dano provocado por ação (Lei 17.640/2012 e Decretos 7.661, 7.668 e 8.148) R$ 700.692.905,00

Valor do dano provocado por omissão R$ 812.182.046,00

Valor do dano total (ação + omissão) R$ 1.512.874.951,00

Valor do dano que resultou em proveito da BRENCO (ação + omissão) R$ 206.344.938,16

Com efeito, a título de dano ao erário, interessa à presente ação o montante

concedido pelo Estado de Goiás em créditos outorgados de ICMS à BRENCO, isto é, R$

206.344.938,16 (duzentos e seis milhões, trezentos quarenta e quatro mil, novecentos e trinta

e oito reais e dezesseis centavos).

II – DO DIREITO

II.1) DA INCONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS Nº 17.640/2012 e 20.063/2018

II.1.1) Da violação ao art. 24, I e II, § 2º, e ao art. 163, I, da Constituição Federal:

O artigo 14 da Lei Complementar Federal 101, de 4 de maio de 2000 (Lei de

Responsabilidade Fiscal), preceitua:

9 Art. 8º Para instruir a inicial, o interessado poderá requerer às autoridades competentes as certidões einformações que julgar necessárias, a serem fornecidas no prazo de 15 (quinze) dias. (...) § 2º Somente noscasos em que a lei impuser sigilo, poderá ser negada certidão ou informação, hipótese em que a ação poderáser proposta desacompanhada daqueles documentos, cabendo ao juiz requisitá-los.

10/30A.C.S.

Page 11: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributáriada qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa doimpacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência enos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelomenos uma das seguintes condições:

I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa dereceita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas deresultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias;

II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado nocaput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas,ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

§ 1º A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido,concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação debase de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, eoutros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado.

§ 2º Se o ato de concessão ou ampliação do incentivo ou benefício de que trata ocaput deste artigo decorrer da condição contida no inciso II, o benefício só entraráem vigor quando implementadas as medidas referidas no mencionado inciso.

§ 3º O disposto neste artigo não se aplica:

I - às alterações das alíquotas dos impostos previstos nos incisos I, II, IV e V do art.153 da Constituição, na forma do seu § 1º;

II - ao cancelamento de débito cujo montante seja inferior ao dos respectivos custosde cobrança.

Como visto no art. 14 da LRF acima transcrito, qualquer ato que importe

renúncia de receita deve ser precedido de estudo e planejamento para que seja possível

identificar as consequências imediatas e futuras sobre a arrecadação e indicar as medidas de

compensação cabíveis.

Como dito em linhas volvidas, as Leis Estaduais 17.640/2012 e 20.063/2018,

não respeitaram as exigências do art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

A princípio, a violação de uma norma federal por uma legislação estadual

ensejaria mero vício de legalidade, todavia, não é do que se trata. Veja-se.

A Lei Complementar 101, de 04 de maio de 2000, foi editada pela União para

estabelecer normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal,

com amparo nos artigos 163 a 169 da Constituição Federal.

11/30A.C.S.

Page 12: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

Demais disso, a Lei de Responsabilidade Fiscal versa sobre orçamento e direito

financeiro, matérias de competência concorrente entre a União e os Estados, nos termos do

art. 24, I e II, da Constituição Federal. Como se sabe, nessas situações cabe à União fixar

normas gerais (art. 24, § 1º) e aos Estados resta a competência suplementar (art. 24, § 2º).

In casu, a Lei de Responsabilidade Fiscal (art. 14) trouxe uma série de

exigências para que medidas de renúncia fiscal sejam válidas, de modo a não comprometer as

finanças dos entes públicos. Entretanto, as Leis Estaduais 17.640/2012 e 20.063/2018

ignoraram essas balizas de responsabilidade na gestão fiscal, o que importa em violação ao

art. 24, § 2º, e art. 163 da Constituição Federal.

Nesse passo, quando lei estadual dispõe contrariamente ou ignora normas

próprias de lei nacional, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal considera direta a

violação ao modelo de repartição de competência legislativa traçado pela Constituição, ainda

que tal análise pressuponha o prévio confronto de leis de caráter infraconstitucional.

Assim, a edição, por determinado Estado-membro, de lei que contrarie,

frontalmente, critérios mínimos legitimamente veiculados, em sede de normas gerais, pela

União Federal ofende, de modo direto, o texto da Constituição (ADI 2903, Relator(a): Min.

CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 01/12/2005, DJe-177 DIVULG 18-09-2008

PUBLIC 19-09-2008 EMENT VOL-02333-01 PP-00064 RTJ VOL-00206-01 PP-00134).

No mesmo sentido: RE 960486 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO

BARROSO, Primeira Turma, julgado em 21/06/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-159

DIVULG 29-07-2016 PUBLIC 01-08-2016.

Especificamente sobre violação da LRF por norma estadual, o Supremo

Tribunal Federal possui precedente paradigmático, verbis:

CONSTITUCIONAL E FINANCEIRO. ART. 50, DA LEI 1.005/15, DO ESTADODE RORAIMA. FIXAÇÃO DE DIRETRIZES ORÇAMENTÁRIAS LOCAISPARA O EXERCÍCIO DE 2016. MODIFICAÇÃO DOS LIMITES DE GASTOSCOM PESSOAL DOS PODERES EXECUTIVO E LEGISLATIVO. SUPERAÇÃODO TETO PREVISTO NA LEGISLAÇÃO FEDERAL, NESTE ÚLTIMO CASO.PLAUSÍVEL USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO (ART.169, DA CF). RISCO DE PREJUÍZO AO ERÁRIO LOCAL COM A VIGÊNCIA

12/30A.C.S.

Page 13: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

DA NORMA. CAUTELAR PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. Leis orçamentárias que materializem atos de aplicação primária da ConstituiçãoFederal podem ser submetidas a controle de constitucionalidade em processosobjetivos. Precedentes.2. A incompatibilidade entre os termos do dispositivo impugnado e os padrõesda lei de responsabilidade fiscal (Lei Federal Complementar 101/00) não seresume a uma crise de legalidade. Traduz, em verdade, um problema deenvergadura maior, a envolver a indevida apropriação de competências daUnião, em especial a de conceber limites de despesas com pessoal ativo e inativo(art. 169, caput, da CF), controvérsia que comporta solução na via da açãodireta de inconstitucionalidade.3. Os limites traçados pela lei de responsabilidade para os gastos com pessoal ativo einativo nos Estados, Distrito Federal e Municípios valem como referência nacional aser respeitada por todos os entes federativos, que ficam incontornavelmentevinculados aos parâmetros máximos de valor nela previstos.4. Ao contemplar um limite de gastos mais generoso para o Poder Legislativo local,o dispositivo impugnado se indispôs abertamente com os parâmetros normativos dalei de responsabilidade fiscal, e com isso, se sobrepôs à autoridade da União paradispor no tema, pelo que fica caracterizada a lesão ao art. 169, caput, da CF.5. Liminar referendada pelo Plenário para suspender, com efeitos “ex nunc” (art. 11,§ 1º, da Lei 9.868/99, até o julgamento final desta ação, a eficácia da expressão“Poder Legislativo 4,5%”, do art. 50 da Lei estadual 1.005/2015.(ADI 5449 MC-Ref, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgadoem 10/03/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-077 DIVULG 20-04-2016PUBLIC 22-04-2016)

No mesmo sentido: ADI 5814, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO,

julgado em 07/05/2018, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-089 DIVULG

08/05/2018 PUBLIC 09/05/2018.

Portanto, as Leis Estaduais 17.640/2012 e 20.063/2018, ao concederem crédito

outorgado de ICMS (1) sem estimarem o impacto orçamentário-financeiro da benesse, (2)

sem demonstrarem a previsão da renúncia de receita na lei orçamentária e (3) sem preverem

medidas de compensação, violaram os requisitos legitimamente erigidos pela União em sede

de norma geral (art. 14 da LRF), o que ao fim e ao cabo acarreta em violação ao art. 24, I e

II, § 2º, e art. 163, I, da Constituição Federal.

II.1.2) Da violação ao art. 155, § 2º, XII, “g”, da Constituição Federal:

Mas não é só. Ao realizar concessão unilateral de crédito outorgado de ICMS

sem amparo em convênio interestadual, as Leis 17.640/2012 e 20.063/2018 vulneraram,

ainda, o art. 155, § 2º, XII, “g”, da Constituição Federal, verbis:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (…)

13/30A.C.S.

Page 14: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviçosde transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que asoperações e as prestações se iniciem no exterior; (…)§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (…)XII - cabe à lei complementar: (…)g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal,isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.

A ausência de convênio aprovado pelo Conselho Nacional de Política

Fazendária (CONFAZ), órgão integrado por representantes de todos os Estados e o Distrito

Federal, torna a legislação concessiva de benefício fiscal de ICMS inconstitucional, conforme

pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, verbis:

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE OPERAÇÃO DECIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS. ICMS. BENEFÍCIOSFISCAIS. NECESSIDADE DE AMPARO EM CONVÊNIO INTERESTADUAL.ART. 155, XII, G DA CONSTITUIÇÃO. Nos termos da orientação consolidada poresta Corte, a concessão de benefícios fiscais do ICMS depende de prévia aprovaçãoem convênio interestadual, como forma de evitar o que se convencionou chamar deguerra fiscal. Interpretação do art. 155, XII, g da Constituição. São inconstitucionaisos arts. 6º, no que se refere a “benefícios fiscais” e “financeiros-fiscais”, 7º e 8º daLei Complementar estadual 93/2001, por permitirem a concessão de incentivos ebenefícios atrelados ao ICMS sem amparo em convênio interestadual. Ação direta deinconstitucionalidade julgada parcialmente procedente.(ADI 3794, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, julgado em01/06/2011, DJe-146 DIVULG 29-07-2011 PUBLIC 01-08-2011 EMENT VOL-02556-01 PP-00014)

No mesmo sentido: ADI 4276, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno,

julgado em 20/08/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-181 DIVULG 17-09-2014 PUBLIC

18-09-2014; ADI 3702, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em

01/06/2011, DJe-166 DIVULG 29-08-2011 PUBLIC 30-08-2011 EMENT VOL-02576-01

PP-00078 RTJ VOL-00227-01 PP-00114; ADI 2376, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO,

Tribunal Pleno, julgado em 01/06/2011, DJe-125 DIVULG 30-06-2011 PUBLIC 01-07-2011

EMENT VOL-02555-01 PP-00006.

II.1.3) Da não incidência da Lei Complementar nº 160/2017:

Como já explicitado anteriormente, para a concessão de benefícios fiscais

envolvendo o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) a Constituição

Federal exige em seu art. 155, § 2º, XII, “g” a realização de convênio aprovado pelos Estados

e Distrito Federal.

14/30A.C.S.

Page 15: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

Sucede que diversos Estados concediam benefícios fiscais (redução de base de

cálculo, crédito outorgado, remissão, anistia, etc) de ICMS unilateralmente, sem submeter ao

escrutínio dos demais Estados e Distrito Federal, o que provocou uma competição entre as

unidades federadas para saber quem atraía mais investimentos.

Como não poderia deixar de ser, a discussão dessa guerra fiscal foi parar no

Poder Judiciário, o que aumentou sensivelmente a insegurança jurídica dos beneficiados.

Provocado por meio de ADI’s propostas pelos governadores dos Estados prejudicados, o

Supremo Tribunal Federal passou a declarar a inconstitucionalidade de diversas leis estaduais

por violação ao art. 155, § 2º, XII, “g”, da Constituição.

Com receio de decisões do STF com efeitos ex tunc e das dramáticas

consequências que daí adviriam, iniciaram-se as tratativas para resolver a guerra fiscal sem

necessitar do Poder Judiciário.

Após 3 (três) anos de tramitação, foi aprovada pelo Congresso Nacional a Lei

Complementar nº 160, de 7 de agosto de 2017, a qual tem a pretensão de pôr um ponto final

na guerra fiscal travada entre os Estados e o Distrito Federal.

A mencionada lei complementar trouxe a possibilidade de convalidação,

mediante convênio do CONFAZ, dos benefícios fiscais outorgados em desacordo com o art.

155, § 2º, XII, “g”, da Constituição Federal e com o art. 14 da Lei Complementar nº

101/2000, desde que sua instituição tenha ocorrido até 8 de agosto de 2017, isto é, a data da

publicação da citada lei complementar.

Tendo em conta, pois, que a Lei Estadual 20.063 foi publicada no Diário

Oficial do Estado de Goiás de 10/07/2018, o benefício fiscal (crédito outorgado) por ela

previsto foi feito ao arrepio do art. 14 da LRF e do art. 155, § 2º, XII, “g”, da Constituição

Federal e não pode ser convalidado pela Lei Complementar nº 160/2017.

Em segundo lugar, mesmo se a Lei Complementar nº 160, de 7 de agosto de

2017, contemplasse, em tese, a Lei Estadual nº 17.640/2012, isso não seria capaz de afastar a

15/30A.C.S.

Page 16: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

inconstitucionalidade do diploma legal goiano.

As Leis 17.640/2012 e 20.063/2018 foram editadas em franca violação ao art.

155, § 2º, XII, “g”, art. 24, I e II, § 2º, e art. 163, I, da Constituição Federal. Não existe no

Brasil a figura da “constitucionalidade superveniente”, portanto, o que nasce inconstitucional

será sempre inconstitucional, até mesmo se o parâmetro da Constituição Federal for alterado

por emenda. No caso em tela, as normas paramétricas da Constituição Federal sequer foram

alteradas, o que reforça o argumento de nulidade das leis estaduais que concederam crédito

outorgado aos industriais do setor alcooleiro.

Confira-se o entendimento do Supremo Tribunal Federal:

Ação Direta de Inconstitucionalidade. PGR. Lei nº 12.398/98-Paraná. Decretoestadual nº 721/99. Edição da EC nº 41/03. Substancial alteração do parâmetro decontrole. Não ocorrência de prejuízo. Contribuição dos inativos.Inconstitucionalidade sob a EC nº 20/98. Precedentes. 1. Em nosso ordenamento jurídico, não se admite a figura daconstitucionalidade superveniente. Mais relevante do que a atualidade doparâmetro de controle é a constatação de que a inconstitucionalidade persiste eé atual, ainda que se refira a dispositivos da Constituição Federal que não seencontram mais em vigor. Caso contrário, ficaria sensivelmente enfraquecida aprópria regra que proíbe a convalidação.2. A jurisdição constitucional brasileira não deve deixar às instâncias ordinárias asolução de problemas que podem, de maneira mais eficiente, eficaz e segura, serresolvidos em sede de controle concentrado de normas.3. A Lei estadual nº 12.398/98, que criou a contribuição dos inativos no Estado doParaná, por ser inconstitucional ao tempo de sua edição, não poderia serconvalidada pela Emenda Constitucional nº 41/03. E, se a norma não foiconvalidada, isso significa que a sua inconstitucionalidade persiste e é atual,ainda que se refira a dispositivos da Constituição Federal que não se encontrammais em vigor, alterados que foram pela Emenda Constitucional nº 41/03.Superada a preliminar de prejudicialidade da ação, fixando o entendimento de,analisada a situação concreta, não se assentar o prejuízo das ações em curso, paraevitar situações em que uma lei que nasceu claramente inconstitucional volte aproduzir, em tese, seus efeitos, uma vez revogada as medidas cautelares concedidasjá há dez anos.4. No mérito, é pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que éinconstitucional a incidência, sob a égide da EC nº 20/98, de contribuiçãoprevidenciária sobre os proventos dos servidores públicos inativos e dospensionistas, como previu a Lei nº 12.398/98 do Estado do Paraná (cf. ADI nº2.010/DF-MC, Relator o Ministro Celso de Mello, DJ de 12/4/02; e RE nº408.824/RS-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Eros Grau, DJ de 25/4/08). 5.Ação direta julgada procedente.(ADI 2189, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em15/09/2010, DJe-247 DIVULG 15-12-2010 PUBLIC 16-12-2010 EMENT VOL-02452-01 PP-00040)

No mesmo sentido: ADI 2158, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal

16/30A.C.S.

Page 17: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

Pleno, julgado em 15/09/2010, DJe-247 DIVULG 15-12-2010 PUBLIC 16-12-2010 EMENT

VOL-02452-01 PP-00010 RTJ VOL-00219-01 PP-00143 RT v. 100, n. 906, 2011, p. 410-426

RSJADV abr., 2011, p. 40-49; RE 474267, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal

Pleno, julgado em 06/11/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-055 DIVULG 19-03-2014

PUBLIC 20-03-2014; RE 439796, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno,

julgado em 06/11/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO

DJe-051 DIVULG 14-03-2014 PUBLIC 17-03-2014; RE 346084, Relator(a): Min. ILMAR

GALVÃO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em

09/11/2005, DJ 01-09-2006 PP-00019 EMENT VOL-02245-06 PP-01170.

Por esses motivos, as Leis Estaduais 17.640/2012 e 20.063/2018, devem ser

declaradas inconstitucionais incidentalmente nesta ação civil pública por ato de improbidade

administrativa, posto que vulneram o art. 155, § 2º, XII, “g”, art. 24, I e II, § 2º, e art. 163, I,

da Constituição Federal.

II.2) DA CONCESSÃO DE BENEFÍCIO FISCAL EM ANO ELEITORAL

Além do exposto, tem-se que a Lei Estadual nº 20.063/2018 e o Decreto nº

8.148/2014 foram editados em ano eleitoral, o que é expressamente vedado pelo artigo 73, §

10, da Lei nº 9.504/1997, que assim dispõe:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutastendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitoseleitorais: (…)§ 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens,valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos decalamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizadosem lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que oMinistério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeirae administrativa.

Tal vedação se dá em razão de a conduta de conceder benefícios a contribuintes

tender a afetar a igualdade de oportunidades entre os candidatos nos pleitos.

Pois bem. Sobre a concessão de benefícios fiscais em ano eleitoral, o Tribunal

Superior Eleitoral se manifestou nos seguintes termos:

17/30A.C.S.

Page 18: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

DÍVIDA ATIVA DO MUNICÍPIO - BENEFÍCIOS FISCAIS - ANO DASELEIÇÕES. A norma do § 10 do artigo 73 a Lei nº 9.504/1997 é obstáculo a ter-se,no ano das eleições, o implemento de benefício fiscal referente à dívida ativa doMunicípio bem como o encaminhamento à Câmara de Vereadores de projeto de lei,no aludido período, objetivando a previsão normativa voltada a favorecerinadimplentes.(Consulta nº 153169, Acórdão, Relator(a) Min. Marco Aurélio Mendes De FariasMello, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 207, Data 28/09/2011,Página 81)

Ressalta-se que não é necessária, para configuração da conduta vedada pela

Legislação Eleitoral, a caracterização da potencialidade lesiva dos atos e nem a influência

destes no resultado da eleição, bastando que esteja plenamente comprovada a efetivação do

ato.

Neste sentido, decidiu o TSE:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. CONDUTA VEDADA.DISTRIBUIÇÃO DE BENS, VALORES E BENEFÍCIOS EM PERÍODOVEDADO. RESSALVA DO ART. 73, § 10, DA LEI Nº 9.504/97. AUTORIZAÇÃOEM LEI E EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA NO EXERCÍCIO ANTERIOR.REQUISITOS. MULTA. RAZOABILIDADE. AGRAVOS PARCIALMENTEPROVIDOS.1. A instituição de programa social mediante decreto, ou por meio de lei, mas semexecução orçamentária no ano anterior ao ano eleitoral não atende à ressalvaprevista no art. 73, § 10, da Lei nº 9.504/97.2. Para a configuração da conduta vedada do art. 73, § 10, da Lei nº 9.504/97 não épreciso demonstrar caráter eleitoreiro ou promoção pessoal do agente público,bastando a prática do ato ilícito. Precedente.[...](Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 36026, Acórdão de31/03/2011, Relator(a) Min. ALDIR GUIMARÃES PASSARINHO JUNIOR,Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 84, Data 05/05/2011, Página47)

II.3) DOS ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA:

O art. 73 da Lei Complementar 101, de 4 de maio de 2000, preceitua:

Art. 73. As infrações dos dispositivos desta Lei Complementar serão punidassegundo o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); a Lei nº1.079, de 10 de abril de 1950; o Decreto-Lei nº 201, de 27 de fevereiro de 1967; aLei nº 8.429, de 2 de junho de 1992; e demais normas da legislação pertinente.

Portanto, havendo violação aos comandos da Lei de Responsabilidade Fiscal é

18/30A.C.S.

Page 19: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

de rigor a incidência da Lei 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa).

No caso, a violação ao art. 14 da Lei Complementar 101, de 4 de maio de 2000,

enseja a prática de ato de improbidade administrativa, conforme magistério de Waldo Fazzio

Júnior, verbis:

A Lei nº 8.429/92 relaciona, a título de exemplos de ato lesivo ao erário, diversascondutas significativas do que a Lei Complementar nº 101/00 chama de gestãoirresponsável. É a gestão que, sobre romper com a legalidade, arranha a moralidadee a eficiência. (…)A questão é que, sempre que gasta e se compromete financeiramente, o PoderPúblico está aplicando a lei. Sem a lei não pode gastar nem se comprometer. Quem ofaz por ele, ainda que culposamente, pratica ato de improbidade administrativa,previsto no art. 10, se houver prejuízo para o erário. Se inocorrer o prejuízo público,sempre terá violado diretamente o princípio da legalidade, realizando operaçãofinanceira que sabia contrária ao direito positivo, razão pela qual pode se inserir naprevisão genérica do art. 11, caput.(FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Improbidade Administrativa. 4ª ed., São Paulo: Atlas,2016, p. 229-231)

A jurisprudência também tem entendido que a violação ao art. 14 da LRF

enseja a prática de ato de improbidade administrativa:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA Improbidade administrativa Concessão de ampliação deincentivo ou beneficio de natureza tributária da qual decorreu renuncia de receita -Não atendimento aos requisitos dispostos na Lei de Responsabilidade Fiscal (art. 14,da LC 101/00) - Conduta que, por si só, caracteriza ato de improbidadeadministrativa - Proporcionalidade das sanções aplicadas - Sentença mantida - Recurso nãoprovido.(TJSP; Apelação 0007528-27.2009.8.26.0081; Relator (a): Rebouças de Carvalho;Órgão Julgador: 9ª Câmara de Direito Público; Foro de Adamantina - 2ª. VaraJudicial; Data do Julgamento: 13/11/2013; Data de Registro: 18/11/2013)

EMBARGOS INFRINGENTES - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - EX-PREFEITOMUNICIPAL - CONCESSÃO DE BENEFÍCIOS FISCAIS SEM AUTORIZAÇÃOLEGAL - NEGLIGÊNCIA NA ARRECADAÇÃO E RENÚNCIA ILEGAL DERECEITA TRIBUTÁRIA - LESÃO AO ERÁRIO - CONDUTA CULPOSA - ART.10, INCISOS VII E X, DA LEI Nº 8.429/92 - EMBARGOS ACOLHIDOS. Se oadministrador público concede benefícios fiscais sem observar os requisitosprevistos tanto na Constituição Federal (art. 150, § 6º) quanto na Lei deResponsabilidade Fiscal (art. 14), em especial ao não elaborar uma lei específica queregule exclusivamente sobre esta matéria, ele age de forma negligente - omitindo-seno cumprimento de uma determinação legal - ao arrecadar os tributos sob suaresponsabilidade, deixando de exigir o recolhimento integral dos valores devidossem a correspondente previsão dos mecanismos de compensação financeira. Oconjunto probatório caracteriza patente improbidade administrativa, com perfeitasubsunção da conduta culposa do embargante nos incisos VII e X, do art. 10, daLIA, uma vez que se trata de ato ímprobo que causa prejuízo ao erário. (TJMG - Embargos Infringentes 1.0106.01.000973-1/003, Relator(a): Des.(a)Edilson Olímpio Fernandes, 6ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 06/11/2012,

19/30A.C.S.

Page 20: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

publicação da súmula em 19/11/2012)

A expedição do Decreto nº 8.148 em 14/04/2014 e o envio do projeto de lei nº

2018000882 em 09/03/2018 se deu em violação ao art. 73, § 10, da Lei 9.504/199710, o que

acarreta a prática de ato de improbidade administrativa, conforme entendimento do E.

Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, verbis:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADEADMINISTRATIVA. LITISCONSÓRCIO. VEREADORES. DESNECESSIDADE.BENEFÍCIO CONCEDIDO EM ANO ELEITORAL. ILEGALIDADE. ATOÍMPROBO CARACTERIZADO. MULTA CIVIL. 1- Considerando que osvereadores não contribuíram para a prática do ato ímprobo, conquanto a concessãodos benefícios ou incentivos de natureza tributária deve se dar por meio de leimunicipal de iniciativa exclusiva do chefe do executivo municipal, não há se falarem formação de litisconsórcio. 2- Conforme disposto no art. 73 da lei n. 9.504/1997,é proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte daadministração pública. 3- Tendo ocorrido o sorteio de um veículo para quem pagasseem dia o IPTU em pleno ano eleitoral, comprovado está a afronta ao princípio dalegalidade e da moralidade, conquanto a legislação é taxativa quanto à proibição deconcessão do benefício no período referido, impondo-se a condenação do agentepúblico pela prática de ato ímprobo. 4- Resta pertinente a manutenção de multa civilaplicada (três vezes o valor da última remuneração), por se encontrar dentro darazoabilidade e proporcionalidade, bem como em observância à legislação vigente.Acolhido parecer da Procuradoria Geral de Justiça. APELAÇÃO CONHECIDA EDESPROVIDA.(TJGO, APELAÇÃO CÍVEL 23375-60.2013.8.09.0127, Rel. DES. WALTERCARLOS LEMES, 3ª CÂMARA CÍVEL, julgado em 19/01/2016, DJe 1962 de03/02/2016)

No mesmo sentido, isto é, impingindo de improbidade administrativa as

condutas vedadas pelo art. 73 da Lei 9.504/1997, confiram-se outros julgados: TJGO,

Apelação (CPC) 0276675-25.2016.8.09.0069, Rel. MARCUS DA COSTA FERREIRA, 5ª

Câmara Cível, julgado em 01/07/2019, DJe de 01/07/2019; TJGO, Apelação (CPC) 0165752-

03.2009.8.09.0157, Rel. LEOBINO VALENTE CHAVES, 3ª Câmara Cível, julgado em

11/09/2017, DJe de 11/09/2017.

Ante o exposto, o réu MARCONI PERILLO incorreu na prática dos atos de

improbidade administrativa descritos no artigo 10, caput, incisos VII e X, e artigo 11, caput,

I, todos da Lei Federal 8.429/1992, in verbis:

10 Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar aigualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais: (…) § 10. No ano em que se realizareleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da AdministraçãoPública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociaisautorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Públicopoderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa.

20/30A.C.S.

Page 21: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

Art. 10 - Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erárioqualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio,apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidadesreferidas no art. 1º desta lei, e notadamente:(...)VII - conceder benefício administrativo ou fiscal sem a observância dasformalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie;(…)X - agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que dizrespeito à conservação do patrimônio público;

Art. 11 - Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípiosda administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres dehonestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daqueleprevisto, na regra de competência;

Por sua vez, a BRENCO se beneficiou de modo direto dos atos de

improbidade administrativa perpetrados pelo réu agente público, enquadrando-se nos mesmos

dispositivos acima mencionados, por força do que dispõe o art. 3º da Lei 8.429/1992:

Art. 3º - As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que,mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato deimprobidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.

Assim, imperiosa é a condenação dos réus nas sanções previstas no artigo 12,

incisos II e III da Lei 8.429/1992.

Considerando a ocorrência de lesão ao patrimônio público, os réus sujeitar-se-

ão, ainda, ao art. 5º da Lei 8.429/92, ou seja, à obrigação de ressarcimento do dano (“Art. 5°

Ocorrendo lesão ao patrimônio público por ação ou omissão, dolosa ou culposa, do agente

ou de terceiro, dar-se-á o integral ressarcimento do dano.”).

II.4) DA TUTELA PROVISÓRIA

II.4.1) DA TUTELA DE EVIDÊNCIA

Para concretização de parte da providência jurisdicional pedida, calcada no art.

5º da Lei Federal 8.429/1992, afigura-se imprescindível a concessão de tutela provisória de

evidência consistente no bloqueio de bens dos réus, forte no que dispõem o art. 37, § 4º, da

21/30A.C.S.

Page 22: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

Constituição Federal, art. 7º da Lei 8.429/1992 c/c arts. 294, caput, 297, 311, II e IV, do

CPC/2015.

É preciso ter presente que a decretação de indisponibilidade de bens inaudita

altera pars em Ações de Improbidade Administrativa não viola o art. 17, § 7º, da Lei

8.429/1992, podendo ser deferida antes mesmo da notificação prévia, conforme entendimento,

pacífico, do Superior Tribunal de Justiça (REsp 862.679/PR, Rel. Ministro MAURO

CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/09/2010, DJe 04/10/2010).

A possibilidade de concessão de tutela provisória de evidência inaudita alter

pars foi consagrada no art. 9º, parágrafo único, II, e art. 311, parágrafo único, do CPC, razão

por que não há nenhum óbice para o deferimento da medida pleiteada pelo autor sem a ouvida

dos réus.

Por outro lado, é cediço que as medidas antecipatórias, em regra, exigem, para

a sua concessão, o cumprimento de dois requisitos: o fumus boni iuris (plausibilidade do

direito alegado) e o periculum in mora (fundado receio de que a outra parte, antes do

julgamento da lide, cause ao seu direito lesão grave ou de difícil reparação).

No caso da medida de indisponibilidade de bens, prevista no art. 7º da Lei

8.429/1992, não se vislumbra uma típica tutela de urgência, mas sim uma tutela de

evidência, uma vez que o periculum in mora não é oriundo da intenção do agente dilapidar

seu patrimônio e, sim, da gravidade dos fatos e do montante do prejuízo causado ao erário, o

que atinge toda a coletividade. O próprio legislador dispensa a demonstração do perigo de

dano, em vista da redação imperativa da Constituição Federal (art. 37, § 4º) e da própria Lei

de Improbidade Administrativa (art. 7º).

Releva observar que para o deferimento da indisponibilidade de bens em Ações

de Improbidade Administrativa não é preciso demonstrar que o réu esteja dilapidando seu

patrimônio ou na iminência de fazê-lo, uma vez que o periculum in mora encontra-se

implícito no art. 37, § 4º, da Constituição Federal e no art. 7º da Lei 8.429/1992.

Depois de muitos julgados, o Superior Tribunal de Justiça, conforme

22/30A.C.S.

Page 23: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

noticiado no Informativo STJ n.º 547, de 8 de outubro de 2014, por meio de sua PRIMEIRA

SEÇÃO, que congrega as duas Turmas de Direito Público da Corte, em processo submetido

ao rito dos recursos repetitivos (art. 543-C, CPC/1973 e art. 1.036 e ss do CPC), pacificou o

tema em aresto paradigmático (REsp 1366721/BA, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES

MAIA FILHO, Rel. p/ Acórdão Ministro OG FERNANDES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado

em 26/02/2014, DJe 19/09/2014).

No que interessa para a presente ação, a tutela provisória de evidência é

regulada pelo art. 311, II e parágrafo único, do CPC11.

As alegações de fato do Ministério Público estão embasadas em provas

documentais produzidas em sede de inquérito civil, o qual é composto por documentos

oficiais encaminhados pelo Ministério Público de Contas do TCE-GO, Assembleia Legislativa

do Estado de Goiás e Secretaria de Estado da Economia.

Ademais, há tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça em recurso

repetitivo sobre indisponibilidade de bens em ações fundadas na Lei Federal 8.429/1992

(REsp 1.366.721/BA).

Bem por isso, estão preenchidos os requisitos previstos no art. 311, II e

parágrafo único, do CPC para concessão liminar de bloqueio de bens dos réus.

Outrossim, o fumus boni iuris se encontra presente, notadamente nos fatos e

fundamentos jurídicos esgrimidos nesta petição inicial, embasados, inclusive, em cópia

integral de processos legislativos, nos quais é possível perceber que o réu MARCONI

PERILLO não instruiu os projetos de lei que culminaram nas Leis 17.640/2012 e

20.063/2018 com qualquer estimativa de impacto orçamentário-financeiro ou mesmo previsão

de medidas de compensação para fazer frente a renúncia fiscal operada.

É cediço que a indisponibilidade de bens deve recair sobre o patrimônio de

modo suficiente não só a garantir o integral ressarcimento do prejuízo ao erário, mas11 Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de

risco ao resultado útil do processo, quando: (…) II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenasdocumentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante; (…)Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente.

23/30A.C.S.

Page 24: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

também, considerando o valor de possível multa civil como sanção autônoma. Bem por isso,

devem ser bloqueados tantos bens quantos forem bastantes para dar cabo da execução

em caso de procedência da ação.

Considerando o art. 12, caput, II, da Lei 8.429/1992, estão os réus sujeitos,

dentre as demais cominações estabelecidas por lei, ao pagamento de multa civil de até duas

vezes o valor do dano.

Assim, a determinação de bloqueio de bens dos réus se impõe, porquanto

constatada a presença dos requisitos legais autorizadores. Os bens a serem indisponibilizados

são:

RÉUS Valor a título de dano aoerário

Valor a título de multa(2x o valor do dano)

Marconi Ferreira Perilo JúniorR$ 206.344.938,16

R$ 412.689.876,32

Brenco Cia. Bras. de Energia Renovável R$ 412.689.876,32

TOTAL R$ 206.344.938,16 R$ 825.379.752,64

TOTAL A SER BLOQUEADO R$ 1.031.724.690,80

A indisponibilidade deve se dar em contas bancárias e/ou aplicações

financeiras dos réus, sendo as constrições realizadas por meio do sistema BacenJud 2.0,

porquanto possível o uso da penhora on line de forma acautelatória e não somente na fase de

execução/cumprimento de sentença, o que inegavelmente geraria efetividade ao processo,

evitando-se a dilapidação do patrimônio dos réus e garantindo-se o perdimento de bens em

favor do Estado de Goiás ao final da ação.

Caso o bloqueio de valores acima referido não alcançar o montante total,

requer seja decretada a indisponibilidade de bens imóveis e veículos dos réus , com

expedição de comunicado eletrônico à Central Nacional de Indisponibilidade de Bens – CNIB

(www.indisponibilidade.org.br), nos termos do Provimento CNJ n.º 39/2014, para averbação

na matrícula dos imóveis cuja propriedade lhes pertença, bem como o bloqueio de veículos

registrados em nome dos réus por meio do sistema RENAJUD.

Frise-se que o art. 835, I, do CPC/2015 dispõe que a penhora recairá

24/30A.C.S.

Page 25: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

preferencialmente sobre o dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição

financeira, sendo desnecessário buscar outros bens antes de se efetuar o bloqueio via

BacenJud, conforme restou definido pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça ao

julgar o REsp 1.112.943/MA, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, julgado em 15/09/2010,

DJe 23/11/2010 (Informativo STJ n.º 447, de 13 a 17 de setembro de 2010).

É necessário registrar que o bloqueio de bens aqui pleiteado não se afigura

como antecipação de aplicação de sanções aos réus, mas tão somente meio de assegurar o

resultado útil do processo, instaurado em defesa do patrimônio público e dos princípios da

Administração Pública.

II.4.2) DA TUTELA DE URGÊNCIA

O art. 300 do CPC prevê que a tutela de urgência será concedida quando

houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao

resultado útil do processo.

A probabilidade do direito restou demonstrada na presente petição, ocasião em

que o Ministério Público demonstrou que as Leis Estaduais 17.640/2012 e 20.063/2018 e os

Decretos 7.661/2012, 7.668/2012 e 8.148/2014 vulneram o art. 14 da Lei de Responsabilidade

Fiscal, o art. 73, § 10, da Lei 9.504/1997, e o art. 155, § 2º, XII, “g”, art. 24, I e II, § 2º, e art.

163, I, da Constituição Federal.

O perigo de dano está presente, pois, de acordo com a Gerência de

Combustíveis da Secretaria de Estado da Economia (Despacho nº 92/2019-GECOM-05557),

somente a Lei 20.063/2018 gera um prejuízo mensal médio ao Estado de Goiás da ordem de

R$ 5.196.197,00 (cinco milhões, cento e noventa e seis mil, cento e noventa e sete reais).

Se for considerado todo o arcabouço legislativo que permite a concessão de

créditos outorgados para os industriais do setor alcooleiro (ainda de acordo com o Despacho

nº 92/2019-GECOM-05557 da Gerência de Combustíveis da Secretaria de Estado da

Economia) o valor do dano em 7 (sete) anos perfaz o montante de R$ 1.512.874.951,00, o que

dá uma média mensal de R$ 18.010.416,08 (dezoito milhões, dez mil, quatrocentos e

25/30A.C.S.

Page 26: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

dezesseis reais e oito centavos).

Portanto, a necessidade de impedir novas ocorrências de dano ao erário é

urgente.

Assim, em razão da violação ao art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal, art.

73, § 10, da Lei 9.504/1997, e art. 155, § 2º, XII, “g”, art. 24, I e II, § 2º, e art. 163, I, da

Constituição Federal, a tutela provisória de urgência deve ser concedida, na forma

preconizada pelo art. 1.059 do CPC, para o fim de suspender os efeitos das Leis Estaduais

17.640/2012 e 20.063/2018 e dos Decretos 7.661/2012, 7.668/2012 e 8.148/2014, retornando

ao patamar máximo de 30% previsto no art. 3º, II, “a”, da Lei 13.246/1998, com redação dada

pela Lei 16.286/2008.

II.5) DO DANO MORAL DIFUSO E COLETIVO:

A previsão de responsabilização por danos morais coletivos encontra guarida,

dentre outros diplomas legais, na Lei 7.347/85, in verbis:

Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, asações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados: (…) IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo.

Art. 3º A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou ocumprimento de obrigação de fazer ou não fazer.

Além da expressa previsão legal, a doutrina advoga que “os valores da

coletividade não se confundem com os valores de cada um dos indivíduos que a compõem,

admitindo-se, assim, que um determinado fato possa abalar a imagem e a moral coletivas,

independentemente dos danos individualmente suportados”.12

Ademais, “o dano moral (lesão a direito personalíssimo) não se confunde com

a dor, com o abalo psicológico, com o sofrimento da vítima, sendo estes apenas os efeitos da

ofensa. Por isso é perfeitamente possível entender a proteção dos direitos da personalidade

para os direitos difusos e coletivos, a exemplo do que já é feito em relação às pessoas12 ANDRADE, Adriano; MASSON, Cleber; ANDRADE, Landolfo. Interesses Difusos e Coletivos

Esquematizado. 7ª ed., São Paulo: Método, 2017, p. 461.

26/30A.C.S.

Page 27: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

jurídicas, passíveis de sofrerem dano moral”.13

Emerson Garcia leciona:

A Lei n. 8.429/1992, como temos defendido, não se destina unicamente à proteçãodo erário, concebido como o patrimônio econômico dos sujeitos passivos dos atos deimprobidade, devendo alcançar, igualmente, o patrimônio público em sua acepçãomais ampla, incluindo o patrimônio moral. Danos ao patrimônio histórico e cultural,bem como ao meio ambiente, afora o prejuízo de ordem econômica, mensurávelcom a valoração do custo estimado para a recomposição do status quo, causamevidente comoção no meio social, sendo passíveis de caracterizar um dano moralcoletivo, o qual encontra previsão expressa no art. 1º da Lei n. 7.347/1985, com aredação dada pela Lei n. 8.884/1994.(…) deve-se observar que o patrimônio público, de natureza moral ou patrimonial,em verdade, pertence à própria coletividade, o que, ipso facto, demonstra quequalquer dano causado àquele erige-se como dano causado a esta. Assim, ao se falarnum dano dessa natureza, apesar da separação das partes que atingem a pessoajurídica lesada e a coletividade, não se está instituindo uma verdadeira dicotomiaentre os sujeitos passivos do ilícito, mas, unicamente, individualizando uma parcelado dano experimentado pelo verdadeiro titular do bem jurídico, o povo.(GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. 8ª ed.,São Paulo: Saraiva, 2014, p. 655-656)

Com apoio nesse entendimento, o Superior Tribunal de Justiça tem admitido

sistematicamente a possibilidade de responsabilização por dano moral coletivo, sua função

punitiva e a legitimidade do Ministério Público para pleiteá-la em sede de ação civil pública.14

Importante frisar que há forte tendência no STJ e na doutrina em eleger dois

requisitos para a configuração do dano moral coletivo: a) razoável significância do fato

transgressor e b) repulsa social.15 In casu, esses requisitos estão presentes.

A significância do fato transgressor está presente, porquanto esta ação civil

pública por ato de improbidade administrativa está a sindicar um dano ao erário de R$

206.344.938,16.

A repulsa social também é evidente, pois enquanto o réu MARCONI

PERILLO concedia benefícios fiscais sem qualquer critério razoável, abrindo mão de boa

13 Ibidem, p. 436.14 REsp 1057274/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/12/2009, DJe

26/02/2010; REsp 1221756/RJ, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em02/02/2012, DJe 10/02/2012; AgRg no REsp 1003126/PB, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES,PRIMEIRA TURMA, julgado em 01/03/2011, DJe 10/05/2011;

15 Ibidem, p. 437.

27/30A.C.S.

Page 28: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

parte dos tributos de responsabilidade do Estado de Goiás, a população goiana via o Estado

mergulhar no mais profundo caos financeiro.

Com efeito, a gestão do último governo foi de tal modo ruinosa que a folha de

pagamento do mês de dezembro de 2018 dos servidores públicos do Poder Executivo foi

quitada em meados de setembro de 2019 pela atual Administração. A dívida deixada para o

sucessor é da ordem de R$ 3,4 bilhões.

Bem por isso, conceder remissão e anistia de créditos de ICMS em favor da

BRENCO em um momento de crise financeira como o que se vive no país é uma afronta à

sociedade.

Desse modo, presentes os requisitos aptos à configuração do dano moral

coletivo, resta quantificar o valor a título de reparação.

Para tanto, deve-se observar os princípios da razoabilidade e

proporcionalidade, assim como sua função compensatória, no sentido de reparar ou, ao

menos, reduzir os danos extrapatrimoniais suportados pela coletividade; sancionatória,

impondo uma punição pela conduta lesiva e antijurídica; e, ainda, pedagógica,

desestimulando-o a reincidir na prática do ato ilícito.

Assim, tendo em vista a gravidade da conduta praticada pelos réus, bem

como o abalo provocado à confiança e crédito do Estado e das instituições públicas, a

comoção social causada, em razão do elevado grau de torpeza da conduta dos réus, e

mais, considerando que deve a indenização pelo dano moral difuso e coletivo ser fixada em

montante que represente uma significativa perda patrimonial aos réus, a fim de cumprir seu

papel indenizatório e inibitório de comportamentos lesivos, postula seja ela fixada em

montante não inferior a R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais).

Por fim, os valores devem ser recolhidos ao fundo a que alude o art. 13 da Lei

Federal 7.347/1985.

28/30A.C.S.

Page 29: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

III – DO PEDIDO

Ante o exposto, o Ministério Público requer:

a) o deferimento da tutela provisória de evidência inaudita altera pars;

b) o deferimento da tutela provisória de urgência na forma preconizada pelo

art. 1.059 do Código de Processo Civil;

c) que V. Exa., nos termos do art. 8º, § 2º, da Lei 7.347/1985, requisite à

Secretária de Estado da Economia cópia de escritas fiscais digitais da BRENCO

COMPANHIA BRASILEIRA DE ENERGIA RENOVÁVEL que permitiram à

Superintendência de Informações Fiscais da Secretaria de Estado da Economia encontrar os

valores mencionados no Memorando nº 455/2019-SIF-15955;

d) a notificação pessoal dos réus, nos termos do artigo 17, § 7º, da Lei

Federal 8.429/1992;

e) nos termos do art. 319, VII, do CPC/2015, o autor opta pela não

realização de audiência de conciliação ou mediação;

f) o recebimento da inicial, nos termos do artigo 17, § 9º, da Lei de

Improbidade Administrativa e posterior citação dos réus;

g) a procedência do pedido para:

g.1) anular, com efeitos ex tunc, os Decretos 7.661/2012, 7.668/2012 e

8.148/2014;

g.2) em razão da prática dos atos de improbidade administrativa

tipificados no art. 10, caput, VII e X, art. 11, caput, I, e art. 3º da Lei

Federal 8.429/1992, condenar os réus nas sanções do artigo 12, II e

III, da Lei Federal 8.429/1992;

h) a condenação dos réus ao pagamento de custas e emolumentos

processuais e ônus de sucumbência;

i) a juntada de documentos extraídos do inquérito civil nº 53/18 (registro

Atena nº 201800311894), bem como a produção de todas as provas legalmente admitidas;

Valor da causa: R$ 1.031.724.690,80 (um bilhão, trinta e um milhões,

29/30A.C.S.

Page 30: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS · vedado expressamente pela Lei Geral das Eleições. I.3) O encaminhamento do projeto de lei nº 2018000882 Como dito em linhas pretéritas,

setecentos e vinte e quatro mil, seiscentos e noventa reais e oitenta centavos).

Pede deferimento.

Goiânia, 12 de dezembro de 2019.

Villis MarraPromotora de Justiça

- em substituição automática -

30/30A.C.S.