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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROCURADORIA ROCURADORIA DA DA R REPÚBLICA EPÚBLICA EM EM P P ATOS ATOS – PB – PB EXCELENTÍSSIMO JUIZ FEDERAL DA 14ª VARA FEDERAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DA PARAÍBA Procedimento Preparatório n. 1.24.003.000025/2018-23 O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por intermédio do órgão de execução oficiante na Procuradoria da República em Patos – PB, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, inscritas, respectivamente, nos arts. 127 e 129, inciso IX, da Constituição da República e nos arts. 1º, 2º, 5º, I, II, “d”, V, “a”, 6º, VII, “d” e 11 da LC n. 75/1993 e art. 5º, I, da Lei n. 7.347/1985, com fulcro no Procedimento Preparatório em anexo, vem oferecer AÇÃO CIVIL PÚBLICA AÇÃO CIVIL PÚBLICA com Pedido Liminar com Pedido Liminar em desfavor de 1. SISTEMA ITATIUNGA DE COMUNICAÇÃO LTDA, pessoa jurídica de direito privado, CNPJ n. 11.984.747/0001-48, nome fantasia “ Rádio Itatiunga”, situada na Praça Frei Martinho, n. 35, 1º Andar, Centro, Patos/PB, CEP 58.700-100; Av. Dr. Pedro Firmino, n. 55, Centro, Patos, PB, CEP 58700-070 (83) 3422-1753 – www.mpf.mp.br/pb

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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALMINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPPROCURADORIAROCURADORIA DADA R REPÚBLICAEPÚBLICA EMEM P PATOSATOS – PB – PB

EXCELENTÍSSIMO JUIZ FEDERAL DA 14ª VARA FEDERAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DAPARAÍBA

Procedimento Preparatório n. 1.24.003.000025/2018-23

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por intermédio do órgão de execuçãooficiante na Procuradoria da República em Patos – PB, no uso de suas atribuiçõesconstitucionais e legais, inscritas, respectivamente, nos arts. 127 e 129, inciso IX, daConstituição da República e nos arts. 1º, 2º, 5º, I, II, “d”, V, “a”, 6º, VII, “d” e 11 da LC n.75/1993 e art. 5º, I, da Lei n. 7.347/1985, com fulcro no Procedimento Preparatório emanexo, vem oferecer

AÇÃO CIVIL PÚBLICAAÇÃO CIVIL PÚBLICAcom Pedido Liminarcom Pedido Liminar

em desfavor de

1. SISTEMA ITATIUNGA DE COMUNICAÇÃO LTDA, pessoa jurídica dedireito privado, CNPJ n. 11.984.747/0001-48, nome fantasia “RádioItatiunga”, situada na Praça Frei Martinho, n. 35, 1º Andar, Centro,Patos/PB, CEP 58.700-100;

Av. Dr. Pedro Firmino, n. 55, Centro, Patos, PB, CEP 58700-070(83) 3422-1753 – www.mpf.mp.br/pb

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2. RÁDIO FM ITATIUNGA LTDA, pessoa jurídica de direito privado, CNPJ n.10.765.196/0001-69, situada na Praça Frei Martinho, n. 35, 1º Andar,Centro, Patos/PB, CEP 58.700-100, telefones 83 34214531 e 83 34214631,e-mail [email protected];

3. UNIÃO, pessoa jurídica de direito público interno, com representação naAvenida Maximiano Figueiredo, 404, Centro, João Pessoa – PB, CEP 58.013-470, na pessoa de seu representante legal; e

4. NABOR WANDERLEY DA NÓBREGA FILHO, brasileiro, DeputadoEstadual, Lorem ipsum vivamus quam quis commodo tellus in dui, portasuspendisse nam ad elementum adipiscing placerat. himenaeos ipsumfermentum augue fames class nunc est, hac quisque scelerisque euismodvarius fringilla nam, netus quis elit nisl lorem pellentesque. sociosquaenean euismod faucibus justo pharetra vel dictumst, potenticondimentum habitant dapibus ;

5. OLÍVIA MOTTA WANDERLEY DA NÓBREGA, brasileira, Lorem ipsumvivamus quam quis commodo tellus in dui, porta suspendisse nam adelementum adipiscing placerat. himenaeos ipsum fermentum augue famesclass nunc est, hac quisque scelerisque euismod varius fringilla nam, netusquis elit nisl lorem pellentesque

em razão dos fatos narrados a seguir.

1. Dos Fatos1. Dos Fatos

Trata-se de Procedimento Preparatório instaurado por representação dePhillipe Palmeira Monteiro Felipe, noticiando o funcionamento irregular da Rádio FMItatiunga LTDA, operando na frequência de FM 102,9. A ilegalidade narrada consistia nofato de a rádio pertencer ao Deputado Estadual Nabor Wanderley da Nóbrega Filho edeter outorga para exploração do serviço de radiodifusão na cidade de Patos, PB.

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A empresa foi originalmente constituída em 09 de junho de 1986 porMiguel Mota Victor, Rosalba Gomes da Nóbrega Mota Victor, Edvaldo Fernandes Mota,Francisca Gomes Araújo Mota e Edmilson Fernandes Mota. Posteriormente, em 18 dejaneiro de 1991, todas as cotas sociais foram transferidas para Edvaldo Fernandes Mota1,sua esposa Francisca Gomes de Araújo Mota2 e Nabor Wanderley (genro de Edvaldo eFrancisca Mota), então diretor administrativo. Com o falecimento de Edivaldo Mota em1993, a empresa permaneceu sob o controle de Nabor Wanderley e sua sogra, FranciscaMota, esta na qualidade de inventariante de Edivaldo Mota (fl. 14/58 e 106/107).

Posteriormente, em 15 de março de 2000, foi admitida na empresa a irmãde Nabor Wanderley, Helena Wanderley da Nóbrega Lima de Farias (fl. 28/30). Em 04de janeiro de 2005, na 4ª alteração contratual (fl. 22/26) e apenas quatro dias apóstomar posse como Prefeito de Patos, Nabor Wanderley transferiu a administração daRádio FM Itatiunga para sua irmã, Helena Wanderley, detentora de 2% das cotassociais.

Nas eleições de outubro de 2010, Nabor Wanderley fez eleger DeputadoFederal seu filho de 21 anos, Hugo Motta (reeleito em 2014) e, nas eleições de outubrode 2014, o próprio Nabor Wanderley foi eleito Deputado Estadual e assumiu o mandatopolítico em 01 de janeiro de 2015.

A Rádio FM Itatiunga, por sua vez, dispõe de outorga para operar serviçode radiodifusão desde a década de 1990, com renovação mais recente ocorrida por meioda Portaria n. 6.467 do Ministério das Comunicações, publicada no Diário Oficial daUnião em 24 de novembro de 2015.

Em 2016, o MPF instaurou investigação sobre o funcionamento irregularde rádios pertencentes a parlamentares federais (IC n. 1.24.000.002192/2016-77) e, em12 de setembro de 2017, começou a apresentar ações civis públicas contra deputados eempresas de radiodifusão que se enquadravam na vedação constitucional, iniciando como Deputado Federal Dr. Damião Feliciano (processo n. 0807488-39.2017.4.05.8200)3.

1 Edivaldo Motta foi Deputado Estadual entre 1967 e 1987 e Deputado Federal entre 1987 e 1992. Fonte:https://pt.wikipedia.org/wiki/Edivaldo_Motta [acesso em 25/06/18].

2 Francisca Motta foi Deputada Estadual por cinco mandatos consecutivos entre 1995 e 2012. Fonte:https://pt.wikipedia.org/wiki/Francisca_Motta [acesso em 25/06/18].

3 Notícia veiculada na mídia institucional do MPF: http://www.mpf.mp.br/pb/sala-de-imprensa/noticias-pb/mpf-pede-a-justica-cancelamento-de-concessoes-de-radios-de-deputado-

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Em 16 de agosto de 2017, Nabor Wanderley, por meio de alteração docontrato social, formalmente deixou a sociedade da Rádio FM Itatiunga e supostamentetransferiu onerosamente suas cotas sociais para a filha, Olívia Motta Wanderley daNóbrega, pelo valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Na mesma alteração, também foiadmitida na sociedade a ex-mulher de Nabor Wanderley, Ilana Araújo Mota, mãe deOlívia Mota, filha de Francisca Mota e cunhada de Helena Wanderley.

Essas datas indicam que entre 01 de janeiro de 2015 até 16 de agosto de2017, Nabor Wanderley inquestionavelmente foi sócio de empresa de radiodifusão, aqual teve, em 24 de novembro de 2015, a concessão do serviço público renovada peloMinistério das Comunicações. E mais: quando se retirou formalmente da sociedade,Nabor Wanderley transferiu suas cotas sociais a sua filha, Olívia Mota, admitindo nasociedade também sua ex-mulher, Ilana Mota – sociedade esta que ainda era constituídapor sua ex-sogra, Francisca Mota, e por sua irmã, Helena Wanderley.

A transferência das cotas de Nabor Wanderley para Olívia Motadocumentalmente ocorreu de forma onerosa, mas o valor apresentado (R$ 10.000,00)não corresponde ao valor de mercado de uma empresa que, na mesma alteração social,aumentou seu capital social para R$ 300.000,00. Os dez mil reais procuraram refletir ovalor da alteração contratual de 2005 e, nem naquela data pretérita, representava arealidade dos fatos, pois, sabidamente, trata-se da empresa de radiodifusão mais ouvidada região de Patos.

Com essa extensão da influência familiar da Família Mota na propriedade ena administração da Rádio FM Itatiunga, parece certo afirmar que a transferência dascotas de Nabor Wanderley para Olívia Mota foi um negócio jurídico simulado quepretendeu, sem perder o controle sobre a empresa, afastar nominalmente o parlamentarestadual da empresa, procurando evitar as consequências aqui pugnadas judicialmente.

Ainda que não fosse claro que Nabor Wanderley permanece até hoje,por meio de familiares (filha, irmã, ex-mulher e ex-sogra), no controle doempreendimento de radiodifusão, os documentos juntados aos autos demonstramdocumentalmente que, entre 01 de janeiro de 2015 até 16 de agosto de 2017, NaborWanderley inquestionavelmente foi sócio de empresa de radiodifusão, a qual teve, em24 de novembro de 2015, a concessão do serviço público renovada pelo Ministério das

federal-da-pb [acesso em 20 de junho de 2018].

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Comunicações.

O serviço de radiodifusão é uma das principais modalidades de imprensano Brasil, em razão de sua penetração no país atingir a todas as camadas sociais dapopulação. A difusão de informações através da imprensa, principalmente em um veículode tão amplo alcance, confere poderes de influenciar a opinião pública a quem querque detenha o controle desse meio de comunicação. É essa a constatação quejustifica a regulação estatal dos serviços de radiodifusão, a fim de que estes cumpramsua função na garantia de uma série de preceitos fundamentais, como as liberdades deexpressão e o direito à comunicação e à informação, os quais, por sua vez, servem desubstrato para muitos outros.

A manutenção da equidade de acesso à comunicação é particularmenteimportante durante o período eleitoral, quando a difusão de informações influencia aescolha de candidatos pelos cidadãos. A utilização indevida dos meios de comunicação,portanto, prejudica o volume e a quantidade de informação disponível sobre oscandidatos, prejudicando a capacidade de avaliação crítica dos eleitores e, assimviolando os princípios da soberania e do pluralismo político.

No caso da Rádio FM Itatiunga em Patos, canal de radiodifusão maisescutado da região, parece ser inegável a influência que ela desempenhou em favor daFamília Motta:

a) nas eleições de 2004 e 2008 em que Nabor Wanderley se elegeuPrefeito de Patos;

b) na eleição de 2010 em que Nabor Wanderley fez eleger DeputadoFederal o parlamentar mais jovem até então a ser alçado ao CongressoNacional, seu filho de 21 anos Hugo Motta4;

c) na eleição de 2014 em que Nabor Wanderley e seu filho Hugo Motta seelegeram, respectivamente, Deputado Estadual e Deputado Federal;

Corre-se, portanto, o risco de distorcer o processo democrático quandotitulares de mandato eletivo ou candidatos participarem do quadro de empresas

4 Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Hugo_Motta [acesso em 25/06/2018].

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de radiodifusão como sócios, assim como quando interessados diretos na vitóriade um candidato façam parte do quadro societário. A titularidade de empresa deradiodifusão permite a influência sobre a opinião pública em prol de sócios ouassociados que sejam candidatos ou titulares de cargo eletivo em detrimento de seusconcorrentes ou rivais políticos. O mesmo tipo de manipulação pode ocorrer quando oscandidatos forem apoiados pelos sócios ou associados de empresa de radiodifusão.

Tais fatos desencadeiam os efeitos jurídicos adiante apresentados.

2. Do Direito2. Do Direito55

2.1. Radiodifusão e Imprensa2.1. Radiodifusão e Imprensa

Os meios de radiodifusão fazem parte da imprensa e se sujeitam às normasconstitucionais que se referem a esta, tal qual os demais órgãos que a compõem (v.g.,jornais e revistas).

No Brasil, a radiodifusão é principal veículo de manifestação da imprensa,pois é meio de comunicação com maior poder de influência no país. Trata-se doúnico meio de comunicação de massa efetivamente universalizado. Para uma grandeparcela da população que não tem recursos para acessar fontes de informação eprodutos culturais de conteúdo diversificado, constitui a principal, senão a única, fontede entretenimento e informação.

Além de fonte de acesso, os veículos de radiodifusão são responsáveis pelaprodução de parcela relevante das notícias e produtos audiovisuais. Trata-se, ademais,de uma atividade prestada sobre o espectro de radiofrequências, um bem públicoescasso, que permite a veiculação de conteúdo por um número limitado de canais.

É indiscutível que quem controla um canal de radiodifusão exerce forte e

5 Os argumentos desenvolvidos neste item foram construídos com base em ARAÚJO, Bráulio SantosRabelo de. A inconstitucionalidade da participação de políticos como sócios ou associados de pessoasjurídicas prestadoras de radiodifusão. Revista Trimestral de Direito Público, v. 59, p. 146-182, 2013.

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nítido poder de influenciar a opinião pública, motivo pelo qual a imprensa é referida, emciência política, por vezes, como o "quarto poder":

Quarto Poder. Os meios de informação desempenham uma função determinante para apolitização da opinião pública e, nas democracias constitucionais, têm capacidade deexercer um controle crítico sobre os órgãos dos três poderes, legislativo, executivo ejudiciário. A imprensa independente, portanto, enquanto se posiciona em competiçãocooperativa com os órgãos do poder público, foi definida como o Quarto Poder (ZANONE,Valério. Quarto Poder. In: BOBBIO, Norberto, MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco.Dicionário de política. 1 ed. Vol. 1. Brasília: Universidade de Brasília, 1998, p. 1040).

O serviço de radiodifusão constitui importante veículo de comunicação e,de tal forma, sua adequada execução é essencial para a concretização de diversospreceitos fundamentais, notadamente a liberdade de expressão, o direito à informação, aproteção da normalidade e legitimidade das eleições e do exercício do mandato eletivo eos demais preceitos fundamentais decorrentes do princípio democrático.

Sendo assim, tais preceitos, em sua dimensão objetiva, são desrespeitadosquando o serviço de radiodifusão não é prestado de forma adequada, situação queocorre quando titulares de mandato eletivo figuram como sócios ou associados depessoas jurídicas que exploram referido serviço.

O potencial risco de que essas pessoas utilizem-se do serviço deradiodifusão para a defesa de seus interesses ou de terceiros, em prejuízo da escorreitatransmissão de informações, constitui grave afronta à Constituição brasileira, conformeserá demonstrado.

2.2. Controle da Programação e Violação da Liberdade de Expressão e2.2. Controle da Programação e Violação da Liberdade de Expressão edo Direito à Informaçãodo Direito à Informação

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu artigo 19, explicita

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que a liberdade de expressão é direito humano universal e que toda pessoa tem direito àliberdade de opinião e expressão. Este direito inclui a liberdade de, sem interferência, teropiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios eindependentemente de fronteiras. No mesmo sentido, o Pacto Internacional de DireitosCivis e Políticos (art. 19) e a Convenção Americana (art. 13) consagram a liberdade deexpressão como um direito essencial para garantir o livre fluxo de ideias e informações.

No Brasil, o art. 5º, inciso IX, da Constituição da República consagra aliberdade de expressão como direito fundamental ao prever que "é livre a expressão daatividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censuraou licença". Ainda, prevê o art. 220 que "a manifestação do pensamento, a criação, aexpressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquerrestrição, observado o disposto nesta Constituição".

Referidos dispositivos, ao conferirem proteção aos veículos utilizados paraa concretização da liberdade de expressão e de informação, dentre eles o serviço deradiodifusão, reconhecem sua extrema importância no cenário constitucional brasileiro.

A dimensão positiva e objetiva da liberdade de expressão e do direito àinformação, que consiste na garantia constitucional da existência de condiçõesequilibradas para que os cidadãos e a diversidade de grupos sociais possam secomunicar, implica o dever-poder do Estado de atuar positivamente sobre o sistemade comunicação, regulamentando-o e fiscalizando-o de modo a garantir aexistência dessas condições.

Infelizmente não é o que ocorre no presente caso, em que a União, aooutorgar a exploração do serviço de radiodifusão à pessoa jurídica que tem e teve emseus quadros societários titular de mandato eletivo, omitiu-se no dever-poder degarantir a prestação adequada do serviço de radiodifusão.

Isso porque pessoas jurídicas como as rés, controladas por detentores demandato parlamentar, podem limitar, na medida do interesse de seus sócios eassociados, a divulgação de opiniões e de informações, impedindo que os meios decomunicação cumpram seus deveres de divulgar todas as informações e pontos de vistasocialmente relevantes e de fiscalizar o exercício do poder público e as atividades dainiciativa privada.

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Por essas razões, o controle de concessões, autorizações e permissões deradiodifusão por pessoas jurídicas cujos sócios ou associados sejam titulares demandato parlamentar, viola a liberdade de expressão e o direito à informação.

2.3. Democracia, Cidadania, Pluralismo Político e Soberania Popular2.3. Democracia, Cidadania, Pluralismo Político e Soberania Popular

A democracia pressupõe que os cidadãos estejam aptos a avaliarcriticamente e escolher os candidatos. Não pode, como destacou o Ministro MenezesDireito no julgamento da ADPF 130, ser um mero processo de homologação dosdetentores de poder:

A democracia, para subsistir, depende de informação e não apenas do voto; este, muitasvezes, pode servir de mera chancela, objeto de manipulação. A democracia é valor queabre as portas à participação política, de votar e de ser votado, como garantia de que ovoto não é mera homologação do detentor do poder. Dito de outro modo: os regimestotalitários convivem com o voto, nunca com a liberdade de expressão (STF, ADPF 130,Rel. Min. Carlos Ayres Britto, Dje-Public 06.11.2009, p. 91)

A democracia pressupõe ainda que cidadãos tenham condições isonômicasde disputar as eleições. A dinâmica social produz normalmente desigualdades – há, defato, cidadãos com maior poder econômico ou que exercem função, cargo ou empregoque lhe conferem maior poder de influência no processo eleitoral ou no processopolítico. Não obstante, não pode o próprio Estado criar desigualdades ao favorecerdeterminados partidos ou políticos através da outorga de concessões, permissõese autorizações de um serviço público, em especial de um tão relevante como aradiodifusão. Tal prática viola os princípios da isonomia e do pluralismo político.

A restrição à divulgação de informações pela imprensa limita o volume deinformações dos candidatos disponíveis ao público. Prejudica assim a avaliação decandidatos, programas e governos e, consequentemente, a capacidade de escolha doseleitores no momento da eleição.

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De outra banda, o poder de influência conferido pela radiodifusão pode serutilizado pelas prestadoras de radiodifusão para o favorecimento pessoal de seus sóciosou associados ao longo do mandato eletivo e ao longo do processo eleitoral, v.g.,influenciando a opinião pública (i) a favor de seus sócios ou associados, se foremcandidatos, (ii) a favor de candidatos apoiados por seus sócios ou associados ou (iii)contra candidatos que façam oposição a seus sócios ou associados.

Assim, por impedir que a radiodifusão cumpra suas funções deimprensa (dentre as quais, a de fiscalizar o poder público e a iniciativa privada), porpermitir que as prestadoras de radiodifusão filtrem, restrinjam ou manipulem asinformações e a opinião pública na medida dos interesses de seus sócios ou associados, epor prejudicar o justo processo eleitoral, o controle de outorgas de radiodifusão porpessoas jurídicas que tenham, em seu quadro social, associados ou sócios detentores demandato eletivo é contrária à democracia, à cidadania, ao pluralismo político e àsoberania popular.

Viola também o artigo 13.3 da Convenção Americana Sobre DireitosHumanos, ratificada e promulgada pelo Brasil, que veda expressamente a atribuição deoutorgas públicas de rádio e televisão a políticos, ao estabelecer que:

Artigo 13.3. Não se pode restringir o direito de expressão por vias e meios indiretos, taiscomo o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de frequênciasradioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem porquaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de ideias eopiniões.

2.4. Vedação do art. 54, inciso I, alínea a, da CF/882.4. Vedação do art. 54, inciso I, alínea a, da CF/88

O art. 54, inciso I, alínea a, incide de duas formas proibindo a participaçãode congressistas federais (em dispositivo análogo ao constante do art. 56 da Constituiçãoda Paraíba para os deputados estaduais, adiante exposto) como sócios ou associados depessoas jurídicas prestadoras do serviço público de radiodifusão: (i) quando proíbe acelebração ou manutenção de "contrato com empresa concessionária de serviço público"

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e (ii) quando veda a celebração ou manutenção de "contrato com pessoa jurídica dedireito público".

2.4.1. Proibição de Celebração ou Manutenção de Contrato com Concessionária

O art. 54 prevê que os Deputados e Senadores “não poderão: I - desde aexpedição do diploma: a) firmar ou manter contrato com (...) empresa concessionária deserviço público, salvo quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes”. Ao proibir quedeputados e senadores firmem ou mantenham contrato com empresas concessionáriasde serviço público, o artigo 54, inciso I, alínea "a" proíbe que parlamentares sejam sóciosou associados de pessoas jurídicas concessionárias do serviço público de radiodifusão.

Assim o é em razão do potencial da radiodifusão de funcionar como órgãode imprensa, impondo-se assim que a vedação incida inevitavelmente em face dasempresas concessionárias que detenham em seus quadros sociais deputados esenadores, já que a esses é interditada a celebração e manutenção de contrato deconcessão de serviço público, como o é a radiodifusão (art. 21, XII, "a" e art. 223, CF).

Daí porque essa incompatibilidade parlamentar, quanto ao exercício daradiodifusão, tem também conexão e representa uma proteção ou dimensão substancialdo fundamento do pluralismo político e do princípio da liberdade de expressão,insculpidos no art. 1º, V, bem como art. 5º, IV, da Constituição Federal, que não devemconviver com a tutela de interesses eleitorais diretos ou indiretos do próprio detentor doveículo de comunicação.

Assim, torna-se claro que a) o serviço de radiodifusão constitui serviçopúblico passível de exploração direta pela União ou mediante concessão a particulares;b) a relação entre as pessoas jurídicas privadas concessionárias e seus sócios eassociados é de natureza contratual; e c) o contrato corporificador dessa relação nãoobedece a cláusulas contratuais uniformes, no sentido que assim deve ser entendido(contratos standart ou de adesão mecânica, sob a ótica fornecedor/consumidor).

O reconhecimento da natureza de serviço público do serviço deradiodifusão é patente segundo o que expressamente consta no texto da Constituição da

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República: “Artigo 21. Compete à União: (…) XII - explorar, diretamente ou medianteautorização, concessão ou permissão: a) os serviços de radiodifusão sonora, e de sons eimagens”.

Quanto à natureza contratual da relação entre os sócios e a sociedadeexploradora do serviço de radiodifusão, clara é a redação do artigo 981 do Código Civil:“Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir,com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dosresultados”.

Isso significa que a exceção do art. 54, inciso I, alínea "a" (consubstanciadana expressão "salvo quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes") não abarca ocontrato de sociedade, uma vez que destacada expressão refere-se apenas aos contratosde adesão de natureza consumerista, firmados entre congressistas e empresasprestadoras de serviços públicos6.

2.4.2. Proibição de Celebração ou Manutenção de Contrato com Pessoa Jurídica deDireito Público

O art. 54 estabelece que os Deputados e Senadores não poderão “I - desde

6 Nesse sentido o seguinte julgado: Eleições 2012. Registro de candidatura. Decisão regional.Indeferimento. Art. 1º , II , i , da LC nº 64 /90. Cláusulas uniformes. Não incidência. Desincompatibilização.Ausência. 1. O Tribunal Regional Eleitoral, soberano na análise do contexto fáticoprobatório, assentou queo contrato de permissão para a prestação de serviço público entre a Aneel e a Cooperativa de Distribuiçãoe Geração de Energia das Missões (Cermissões) submete-se a procedimento de licitação, nos termos do art.2º , IV , da Lei nº 8.987 /95, razão pela qual não se enquadra na ressalva relativa aos contratos decláusulas uniformes. 2. Diante disso, a Corte de origem concluiu que o candidato a vereador, o qual exerceo cargo de vicepresidente na citada entidade, estava inelegível, nos termos do art. 1º , inciso II , alínea i ,da LC nº 64 /90, por não ter se afastado de suas funções nos seis meses anteriores ao pleito. 3. Oagravante sustenta que o contrato seria de cláusulas uniformes. Todavia, a Corte de origem não explicitouas circunstâncias alusivas ao referido contrato, nem foram opostos embargos de declaração paraprovocar o exame da alegação de que tal instrumento contratual seria padronizado e de adesão, razãopela qual, para afastar a conclusão da Corte de origem, quanto à incidência da causa de inelegibilidade,seria necessário o reexame de fatos e provas, vedado em sede de recurso de natureza extraordinária, nostermos das Súmulas nº 7 do STJ e nº 279 do STF. Agravo regimental a que se nega provimento. (TSE,Pleno, maioria, AgR-REspe nº 170-02.2012.6.21.0052/RS, Relator Ministro HENRIQUE NEVES DASILVA. Data da Decisão: 25/04/2013. Data da Publicação: 04/06/2013).

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a expedição do diploma: a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direitopúblico (...), salvo quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes”. Ao proibir quedeputados e senadores firmem ou mantenham contrato com pessoa jurídica de direitopúblico, o artigo 54, inciso I, "a" proíbe que deputados e senadores sejam sócios depessoas jurídicas prestadoras de (ou que explorem) serviço público radiodifusão (art.21, XII, "a", CF).

Isto porque (i) o artigo 54, inciso I, "a" proíbe que deputados e senadorescelebrem ou mantenham contratos não apenas como pessoas físicas, mas também porintermédio de pessoas jurídicas das quais sejam sócios; (ii) as concessionárias epermissionárias de radiodifusão que possuem deputados e senadores como sóciosmantêm contrato com pessoa jurídica de direito público - o contrato de concessão e ocontrato de permissão de radiodifusão, celebrado com a União; e (iii) os contratos deprestação de serviços de radiodifusão não obedecem a cláusulas uniformes (contratosstandart ou de adesão mecânica, sob a ótica fornecedor/consumidor).

O entendimento de que o artigo 54, inciso I, "a" proíbe que deputados esenadores celebrem ou mantenham contratos não apenas como pessoas físicas, mastambém por intermédio de pessoas jurídicas das quais sejam sócios decorre dasfinalidades que essa norma pretende atender.

Os objetivos do artigo 54, inciso I, "a" são: (i) proteger a probidadeadministrativa e a normalidade e legitimidade das eleições e do exercício do mandatoeletivo contra influência do poder econômico ou abuso do exercício de função, cargo ouemprego na administração direta ou indireta, (ii) garantir a isenção e a independênciados membros do corpo legislativo, e (iii) impedir o favorecimento do parlamentar.

O serviço de radiodifusão, reitere-se, confere a quem o presta forte poderde influência, que pode ser utilizado para o favorecimento pessoal ao longo do exercíciodo mandato eletivo e ao longo do processo eleitoral. Esse é justamente o favorecimentoque o artigo 54 visa impedir.

Por isso, não é possível admitir que deputados e senadores possam elidir aproibição do artigo 54, I, "a" mediante o uso de pessoas jurídicas como intermediáriospara a celebração dos contratos vedados pelo preceito em questão. Interpretação comoessa revelaria burla ao que determinado no texto constitucional, tornando inócuo o

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comando moralizante, sob a perspectiva estatal, de tutela da democracia, do interessepúblico social. Ou seja, o desiderato constitucional ficaria sem efeito, impedido derealizar seus objetivos.

De mais a mais, os contratos mais relevantes com a Administraçãosomente podem ser celebrados por meio de pessoas jurídicas. É o caso, justamente, docontrato de prestação de serviços de radiodifusão, que não pode ser celebrado porpessoas físicas77. Admitir que a proibição de contratar prevista pelo artigo 54, inciso I, "a"alcança apenas os deputados e senadores como pessoas físicas e não as sociedades ouassociações das quais sejam sócios ou associados esvazia, portanto, o objeto da norma,pois retira de seu alcance justamente os contratos que a mesma visa atingir.

Conclui-se, destarte, que o artigo 54, I, "a" proíbe que deputados esenadores celebrem ou mantenham contratos com pessoa jurídica de direito público nãoapenas como pessoas físicas, mas também por intermédio de pessoas jurídicas das quaissejam sócios. Esse entendimento foi adotado pelo STF na Ação Penal 530 88, em que aMinistra Rosa Weber afirma: “Entendo que a concessão - ou a permissão - para aexploração de serviços de radiodifusão a parlamentar ou a empresa dirigida oupertencente a parlamentar viola as proibições constitucionais e legais acima examinadas".

Ademais, os contratos de concessão e de permissão de radiodifusão nãoobedecem a cláusulas uniformes. O fato de serem precedidos por licitação - que estipula,em seu edital, a minuta do contrato a ser celebrado pelo concorrente vencedor - não fazcom que esses contratos obedeçam a cláusulas uniformes, pois:

1) a minuta oferecida no edital de licitação é sempre incompleta; oparticular que contrata com a Administração formula, em suas propostas técnica e depreço, cláusulas contratuais essenciais à execução do serviço; o contrato final incorporaas cláusulas formuladas pelo particular vencedor da licitação; trata-se, portanto, decontrato individual, singular e determinado em conjunto pela Administração e peloparticular vencedor da licitação;

2) consequentemente, o processo de licitação não elimina o diálogo

7 Cf. artigo 7º do decreto 52.795/1963, artigo 7º da lei 9.612/1998, artigo 1º da lei 11.652/2008 e artigo8º do decreto 5.371/2005.

8 STF, AP 530, Rel. Min. Rosa Weber, Rel. p/ Acórdão Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em09.09.2014, Dje Public 17-11-2014, Republicação DJe Public 19.12.2014.

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negocial, apenas o parametriza99; a parametrização reduz, mas não elimina o risco deabuso de poder ou de função; e

3) o processo de licitação não elimina o risco de abuso de poder ou defunção pelo parlamentar ao longo do exercício do mandato eletivo e ao longo doprocesso eleitoral, uma vez que o parlamentar pode usar a emissora para se favorecer oupara prejudicar seus adversários.

Em conformidade com essa interpretação está a jurisprudência do STF -Ação Penal 5301010, conforme será melhor abordado mais à frente - e a jurisprudência doTribunal Superior Eleitoral que, desde 2002, é pacífica em afirmar que contratosprecedidos de licitação não obedecem a cláusulas uniformes. Trata-se do que o MinistroJoaquim Barbosa chama de "moderno entendimento" do TSE acerca da noção de

9 Se não houvesse processo negocial e a Administração impusesse todos os termos do contrato, preço etécnica inclusive, a licitação desfigurar-se-ia. Não haveria como escolher o vencedor nem selecionar aproposta mais vantajosa para a Administração pois não haveria distinção entre as propostas. Nessesentido, diz o Ministro Sepúlveda Pertence: "Ocorre que jamais poderão as cláusulas do edital esgotar oconteúdo total do contrato a celebrar, pois, do contrato, não teria objeto a licitação" (TSE, Acórdão n.12.679, Recurso n. 10.130/RO, Relator Ministro Sepúlveda Pertence, publicado em 21.09.1992, p. 10).

10 Cf. os seguintes acórdãos do TSE: (i) Acórdão n. 12.679, Recurso n. 10.130/RO, Relator MinistroSepúlveda Pertence, publicado em 21.09.1992; (ii) Acórdão n. 556, Recurso Ordinário n. 556/AC,Relator Ministro Sepúlveda Pertence, publicado em 20.09.2002; (iii) Acórdão n. 22.229, REspe n.22.229/PR, Relator Ministro Francisco Peçanha Martins, publicado em 03.09.2004; (iv) Acórdão n.22.239, REspe n. 22.239/PR, Relator Ministro Francisco Peçanha Martins, publicado em 03.09.2004; (v)Acórdão n. 22.240, REspe n. 22.240/PR, Relator Ministro Francisco Peçanha Martins, publicado em03.09.2004; (vi) Acórdão n. 21.966, AgR no REspe n. 21.966/CE, Relator Ministro Luiz Carlos Madeira,publicado em 08.09.2004; (vii) Acórdão n. 24.651, REspe n. 24.651/ES, Relator Ministro Luiz CarlosMadeira, publicado em 06.10.2004; e (viii) AgR no REspe n. 34.097/PA, Relator Ministro JoaquimBarbosa, publicado em 17.12.2008. Na principal decisão ("leading case") acerca da matéria (Recurso10.130), o Ministro relator Sepúlveda Pertence afirma: "Não obstante, a mim me parece que contratopor licitação e contrato de cláusulas uniformes - ao menos, no sentido em que utilizado na Constituição(art. 54, I, a) ou na regra de inelegibilidade -, são conceitos que lurlent de se trouver ensemble. Contratode cláusulas uniformes é o chamado contrato de adesão (...) No contrato por licitação, por conseguinte,não há jamais o que é o caráter específico do contrato de adesão: provir a totalidade do seu conteúdonormativo da oferta unilateral de uma das partes a que simplesmente adere globalmente o aceitante:ao contrário, o momento culminante do aperfeiçoamento do contrato administrativo formado mediantelicitação não é o de adesão do licitante às cláusulas préfixadas no edital, mas, sim o da aceitação pelaAdministração Pública de proposta selecionada como a melhor sobre as cláusulas abertas ao concursode ofertas."

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contrato de cláusulas uniformes1111. Dentre essas decisões do TSE, o RO 556 reconheceu,especificamente, que o contrato de prestação de serviços de radiodifusão, emboraprecedido de licitação, não obedece a cláusulas uniformes1212.

Em suma, considerando que: (i) o artigo 54, I, "a" estabelece que"deputados e senadores não poderão, desde a expedição do diploma, firmar ou mantercontrato com pessoa jurídica de direito público (...), salvo quando o contrato obedecer acláusulas uniformes"; (ii) esta regra alcança deputados e senadores atuando comopessoas físicas, bem como as pessoas jurídicas das quais os parlamentares participemcomo sócios; (iii) as concessionárias e permissionárias de radiodifusão mantêm contratocom pessoa jurídica de direito público (contrato de concessão e contrato de permissãode radiodifusão celebrados com a União); e (iv) os contratos de concessão e os contratosde permissão de serviços de radiodifusão não obedecem a cláusulas uniformes, conclui-se que deputados e senadores não podem, desde a expedição do diploma, ser sócios ouassociados de sociedades e associações prestadoras do serviço de radiodifusão.

2.5. Vedação do art. 54, inciso II, alínea a, da CF/882.5. Vedação do art. 54, inciso II, alínea a, da CF/88

O art. 54 prevê que os Deputados e Senadores não poderão “desde a posse:a) ser proprietários, controladores ou diretores de empresa que goze de favor decorrentede contrato com pessoa jurídica de direito público, ou nela exercer função remunerada”. Aspessoas jurídicas prestadoras de radiodifusão mantêm contrato - contrato de concessãoe contrato de permissão - com pessoa jurídica de direito público - a União. Resta entãoesclarecer o significado de "favor decorrente de contrato" referido pela Constituição.

A Constituição brasileira veda a concessão de favor pela Administração,assim entendido como concessão de vantagens, privilégios ou benefícios em razão depreferência pessoal ou do exercício de poder econômico ou de função. Isso é, favor comoparcialidade, arbítrio, favoritismo, discriminação. Quando celebra contratos comparticulares, a Administração deve atender às normas constitucionais daimpessoalidade, da moralidade e da isonomia. É por essa razão que a Administração

11 TSE, AgR no REspe n. 34.097/PA, Relator Ministro Joaquim Barbosa, publicado em 17.12.2008.12 TSE, Acórdão n. 556, Recurso Ordinário n. 556/AC, Relator Ministro Sepúlveda Pertence, publicado em

20.09.2002.

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deve se valer, em suas contratações, do processo de licitação (artigo 37, XXI da CF), cujoobjetivo é garantir a todos os administrados o ensejo de disputarem, em igualdade decondições, as contratações do governo, bem como permitir à Administração selecionar aproposta mais vantajosa, protegendo o interesse público e os recursos governamentais1313.

Face à impossibilidade da concessão de favor, na acepção acimamencionada, pela Administração em seus contratos, a proibição referida pelo artigo 54,II, "a" estende-se a todos os contratos celebrados pela Administração, pois conota obenefício auferido pelo particular em razão da celebração de todo e qualquer contratocom a Administração14.

Desse modo, tendo em vista que as pessoas jurídicas prestadoras doserviço de radiodifusão mantêm contrato - contrato de concessão e contrato depermissão - com pessoa jurídica de direito público - a União -, não podem congressistasfigurar como proprietários, controladores ou diretores dessas empresas.

Há outra interpretação possível para a expressão "favor decorrente decontrato". Apesar de proibir a concessão, pela Administração, de favor na acepção acimamencionada, a Constituição permite a concessão ou concede diretamente determinadosfavorecimentos a categorias de indivíduos, com o objetivo contribuir para aconcretização de direitos fundamentais ou para a realização dos objetivos

13 Cf. MELLO, Celso Antônio Bandeira de, Curso de Direito Administrativo, cit., p. 519; 526; artigo 3º da lei8.666/1993; artigo 14 da lei 8.987/1995.

14 Nesse sentido as lições de Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins “Portanto, não vislumbramos emque condições um contrato possa consubstanciar alguma sorte de privilégio que caracterize uma situaçãoespecial. O particular contratante com o Poder Público, certamente, deve ter-se submetido às normasgerais configuradoras do benefício, senão o contrato cairia no puro e simples arbítrio do Poder Públicoque teria resolvido a seu talante conferir tal privilégio a alguém. Esta eventualidade é insuscetível deocorrer juridicamente à luz do próprio direito constitucional. Em síntese, nenhum contratado podebeneficiar-se de favores, no sentido de que a manutenção dos privilégios assim entendidos pudesse derivarapenas da boa vontade do administrador. Destarte, excluindo tal inteligência, o que tornaria o preceitoinútil, só resta a de que o presente inciso quis colher todo aquele que contrata com a Administração,valendo a palavra favor, aí, não no sentido de 'graça', ou 'mercê', mas, sim, de puro benefício.(...) Por isso,o melhor entendimento para a expressão em pauta é de englobar todos aqueles que mantenham umvínculo contratual com a Administração. O cumprimento do contrato dá lugar a um sem-número depequenos conflitos, fazendo-se necessária a permanente negociação para o bom andamento do mesmonos termos do avençado. A teleologia do preceito é, portanto, esta: impedir que o deputado ou senador seaproveite do cargo para melhor vindicar os interesses da sua empresa, isto é, daquela em que seja ouproprietário ou controlador” (BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra. Comentários àConstituição do Brasil, V. 4, tomo I. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 227-228).

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constitucionais como os estabelecidos por seu artigo 3º. Exemplos de favorecimentosautorizados ou concedidos pela Constituição são (i) as imunidades fiscais (v.g. artigos149, §2º, I; 150, VI; 150, §2º; 153, §3º, III; 153, §4º, II; 155, §2º, X, "a", "b", "c" e "d"; 155,§3º; 184, §5º; e 195 §7º), (ii) a permissão para criação de isenções fiscais (v.g. artigos155, §2º, XII, "e" e "g"), (iii) os incentivos previstos pelo artigo 43, §2º, voltados a reduziras desigualdades regionais e (iv) o tratamento diferenciado e favorecido para asmicroempresas e para as empresas de pequeno porte, previsto pelos artigos 146, "d" e170, IX.

“Favor” aí tem a acepção de benefício, proveito ou vantagem que seconcede a alguém não em razão de preferência pessoal ou do exercício de podereconômico ou de função, mas em razão da busca pela concretização dos direitosfundamentais e dos objetivos constitucionais. Atende à norma da isonomia e aosobjetivos constitucionais, haja vista que a construção de uma sociedade livre, justa esolidária, o desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e a redução dasdesigualdades regionais, como pretende a Constituição (artigo 3º), exigem que se tratedesigualmente os desiguais.

Sob essa interpretação, a expressão "favor decorrente de contrato", nocontexto do artigo 54, II, "a", corresponde aos favorecimentos criados e permitidos pelaConstituição.

Também nessa hipótese enquadram-se as pessoas jurídicas prestadoras deradiodifusão. O artigo 155, §2º, X, "d" da Constituição lhes concede imunidade fiscalsobre o ICMS. O artigo 39 da Medida Provisória n. 2.228-1/2001 lhes concede isençãofiscal sobre a Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica -Condecine. Trata-se de favorecimentos previstos pelo ordenamento (Constituição emedida provisória), que decorrem da celebração de contrato (contrato de concessão econtrato de permissão) entre a prestadora de radiodifusão e a União. Conclui-se, assim,que deputados e senadores não podem ser proprietários e controladores de pessoasjurídicas prestadoras de radiodifusão, pois estas gozam de favor decorrente de contrato(imunidade de ICMS e isenção de Condecine decorrente de contrato de concessão ou decontrato de permissão de radiodifusão) celebrado com pessoa jurídica de direito público(a União).

As duas interpretações possíveis para o artigo 54, II, "a" conduzem àmesma conclusão: a de que a participação direta ou indireta de políticos titulares de

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mandato eletivo como sócios ou associados de pessoas jurídicas concessionárias,permissionárias ou autorizatárias de radiodifusão viola o artigo 54, II, "a" daConstituição.

2.6. Das normas da Constituição Estadual aplicáveis aos Deputados2.6. Das normas da Constituição Estadual aplicáveis aos DeputadosEstaduaisEstaduais

Nos moldes do que a Constituição Federal de 1988 estabeleceu para osDeputados Federais e Senadores da República no art. 54, a Constituição do Estado daParaíba, promulgada em 05 de outubro de 1989, ao tratar dos Deputados Estaduaispreviu:

Art. 56. Os Deputados Estaduais não poderão:

I - desde a expedição do diploma:

a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresapública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvoquando o contrato obedecer a cláusulas uniformes;

(…)

II - desde a posse:

a) ser proprietários, controladores ou diretores de empresa que goze de favor decorrentede contrato com pessoa jurídica de direito público, ou nela exercer função remunerada;

O texto das constituições não deixam dúvidas de que se tratam de normasidênticas, aproveitando-se tudo o que acima se falou para os Deputados Federais eSenadores ao regime jurídico dos Deputados Estaduais.

Inclusive ambos os regimes de sancionamento se assemelham, prevendo aConstituição Estadual que perderá o mandato de Deputado Estadual aquele que infringir

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qualquer das proibições do art. 56, decidindo assim a Assembleia Legislativa, por votosecreto e maioria absoluta, mediante provocação da Mesa ou de partido políticorepresentado na Assembleia, assegurada a ampla defesa.

2.7. Precedente da Ação Penal n. 530 do STF2.7. Precedente da Ação Penal n. 530 do STF

Na Ação Penal n. 530 o STF julgou caso em que Deputado Federal falsificouum contrato social de uma rádio justamente para contornar a proibição imposta peloartigo 54 à participação de congressistas como sócios de empresas de radiodifusão.

Como o julgamento desse crime estava diretamente relacionado àproibição imposta pelo artigo 54, o STF realizou - sem sombra de dúvida - ainterpretação do artigo 54 para a mesma hipótese discutida nesses autos. Nessesentido, disse a Ministra Rosa Weber: “O objetivo da falsidade seria contornar asproibições contidas no art. 54, I, "a", e II, "a", da Constituição Federal e no paragrafo únicodo art. 38 da Lei no 4.117/1962. Como a imputação esta relacionada com essas proibições,passo a sua analise antes de retornar aos fatos e provas”.

Nessa decisão, a Corte Suprema firmou entendimento de que os artigos 54,I, "a" e 54, II, "a" da Constituição contêm uma proibição clara que impede deputados esenadores de serem sócios de pessoas jurídicas titulares de concessão, permissão ouautorização de radiodifusão. Para o Ministro Luís Roberto Barroso, o objetivo destaproibição foi prevenir a reunião entre "poder político e controle sobre veículos decomunicação de massa, com os riscos decorrentes do abuso". Segundo a Ministra RosaWeber, "a proibição específica de que parlamentares detenham o controle sobre empresasde (...) de radiodifusão" visou evitar o "risco de que o veículo de comunicação, ao invés deservir para o livre debate e informação, fosse utilizado apenas em benefício doparlamentar, deturpando a esfera do discurso público".

Da leitura do referido Acórdão, da Ação Penal 530, tem-se a confirmação,pelo Supremo Tribunal Federal dos argumentos sustentados na presente ação, assimpontuados:

(i) os contratos de concessão e de permissão de serviços de radiodifusão

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não se enquadram na exceção prevista na parte final do artigo 54, I, "a", da Constituição(contratos que obedecem a cláusulas uniformes), pois não constituem contratos deadesão celebrados entre consumidor e empresa concessionária de serviços, tais comocontratos de fornecimento de água e luz, "cuja celebração jamais teria o condão deimplicar qualquer espécie de cooptação";

(ii) contratos precedidos de licitação, na modalidade de técnica e preço,não obedecem a cláusulas uniformes, pois "riscos de manipulação do resultado parafavorecimento de empresa controlada por parlamentar ou os riscos de utilização peloparlamentar de influência indevida no certame são mais do que óbvios"; "[o] objetivodas incompatibilidades do artigo 54 consiste exatamente em prevenir riscos e males daespécie"; "[não há] como qualificar um contrato como por adesão ou de cláusulasuniformes quando precedido por licitação, influindo essa na variação de aspectosrelevantes do pacto, como o preço e o objeto da prestação"; e

(iii) "não merece endosso, nessa perspectiva, a posição trazida aos autosem ofício do Ministério das Comunicações e em parecer da Câmara dos Deputados deque não haveria proibição para que parlamentar fosse proprietário de empresa titular deserviço radiodifusão (fls. 426-7, 1.008-9 e fls. 1.942-3)"; "ao contrário do ali preconizado,a proibição é clara".

A Suprema Corte confirma, ademais, a intenção de utilização da outorgapara fins políticos. Segundo a Ministra Rosa Weber, "tal distorção é, aliás, reconhecida, nocaso presente, pelo próprio acusado (...), quando afirma que resolveu participar daempresa de radiodifusão porque, por questões políticas, não teve mais espaço em empresasda espécie controladas por seus adversários políticos".

Veja-se, a propósito, os seguintes trechos da ementa, do voto da MinistraRosa Weber e do voto do Ministro Roberto Barroso:

Ementa: (...) 3. Condenação pelo crime de falso. Restou provada a falsidade do contratosocial da radiodifusão Dinâmica, sendo o primeiro acusado o verdadeiro controlador. Comefeito, o denunciado omitiu esta condição por ser parlamentar federal, diante da vedaçãoprevista no art. 54 da Constituição Federal e no art. 38, §1º, da Lei nº 4.117/62. (…)

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VOTO A Senhora Ministra Rosa Weber: () O objetivo da falsidade seria contornar asproibições contidas no art. 54, I, "a", e II, "a", da Constituição Federal e no parágrafo únicodo art. 38 da Lei nº 4.117/1962. Como a imputação está relacionada com essas proibições,passo à sua análise antes de retornar aos fatos e provas. O art. 54, I, "a" e II, "a", daConstituição Federal dispõe: "Art. 54. Os Deputados e Senadores não poderão: I - desde aexpedição do diploma: a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direitopúblico, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresaconcessionária de serviço público, salvo quando o contrato obedecer a cláusulasuniformes; (…) II - desde a posse: a) ser proprietários, controladores ou diretores deempresa que goze de favor decorrente de contrato com pessoa jurídica de direito público,ou nela exercer função remunerada; (…)" As proibições do art. 54, ditasincompatibilidades parlamentares, têm longa tradição no nosso Direito. (…) Asincompatibilidades servem a bons propósitos. Primeiro, garantem o exercícioindependente do mandato parlamentar, dificultando a cooptação de deputados esenadores pelo Poder Executivo, dele não podendo obter benesses ou favores. Segundo,têm efeito moralizador pois obstam que o parlamentar, utilizando seu prestígio, busquetais benesses e favores. (…) Democracia não consiste apenas na submissão dosgovernantes a aprovação em sufrágios periódicos. Sem que haja liberdade de expressão ede crítica às políticas públicas, direito à informação e ampla possibilidade de debate detodos os temas relevantes para a formação da opinião pública, não há verdadeirademocracia. (…) Para garantir esse espaço livre para o debate público, não é suficientecoibir a censura, mas é necessário igualmente evitar distorções provenientes de indevidouso do poder econômico ou político. (…) Nessa perspectiva é que deve ser entendida aproibição específica de que parlamentares detenham o controle sobre empresas decomunicação, como de radiodifusão. Há um risco óbvio na concentração de poder políticocom controle sobre meios de comunicação de massa. Sem a proibição, haveria um risco deque o veículo de comunicação, ao invés de servir para o livre debate e informação, fosseutilizado apenas em benefício do parlamentar, deturpando a esfera do discurso público.Dependendo ainda a concessão, a permissão ou a autorização para a exploração doserviço de comunicação de massa, de aprovação do Congresso, como prevê o art. 223, §1º,da Constituição Federal, haveria igualmente um risco de desvio nas outorgas,concentrando-as nas mãos de poucos e prevenindo que adversários políticos dosparlamentares lograssem o mesmo acesso. (…) Entendo que a concessão - ou a permissão- para a exploração de serviços de radiodifusão a parlamentar ou a empresa dirigida oupertencente a parlamentar viola as proibições constitucionais e legais acima examinadas.Em primeiro lugar, os incisos I, "a", e II, "a", do art. 54 da Constituição. Não importa onomen iuris pelo qual o serviço foi repassado ao parlamentar ou à empresa por elecontrolada, se concessão, permissão ou autorização. Viola a proibição constitucionalqualquer outorga ao parlamentar de benefício extravagante por parte da AdministraçãoPública direta ou indireta. No caso, o serviço foi outorgado por meio de instrumentodenominado "contrato de adesão de permissão celebrado entre a União e a empresa deRadiodifusão" (fls. 400-405). Por outro lado, evidente é que este contrato não se enquadrana exceção permitida na parte final do art. 54, I, "a", da Constituição Federal. A exceção emquestão visa a contemplar contratos por adesão ou de cláusulas uniformes, cujacelebração jamais teria o condão de implicar qualquer espécie de cooptação . Assim, por

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exemplo, contratos de fornecimento de água e luz entre consumidor e empresaconcessionária de serviços da espécie. No presente feito, a obtenção da outorga por meiode prévia licitação, na modalidade de técnica e preço, é suficiente para afastar qualquerhipótese de enquadramento do contrato na exceção prevista. Com efeito, no certame, osconcorrentes apresentaram propostas diferenciadas de técnica e de preço, sendo vitoriosaa empresa controlada pelos acusados e desbancados quatro concorrentes. Os riscos demanipulação do resultado para favorecimento de empresa controlada por parlamentar ouos riscos de utilização pelo parlamentar de influência indevida no certame são mais doque óbvios. O objetivo das incompatibilidades do art. 54 consiste exatamente em prevenirriscos e males da espécie. Não há como qualificar um contrato como por adesão ou decláusulas uniformes quando precedido por licitação, influindo essa na variação deaspectos relevantes do pacto, como o preço e o objeto da prestação. (…) Não mereceendosso, nessa perspectiva, a posição trazida aos autos em ofício do Ministério dasComunicações e em parecer da Câmara dos Deputados de que não haveria proibição paraque parlamentar fosse proprietário de empresa titular de serviço radiodifusão (fls. 426-7,1.008-9 e fls. 1.942-3). Ao contrário do ali preconizado, a proibição é clara. (…) Assim,incidindo no caso as proibições do art. 54, I, "a", e II, "a", da Constituição Federal e doparágrafo único do art. 38 da Lei nº 4.117/1962, era e é vedado ao parlamentar ouempresa por este controlada receber do Governo Federal a outorga de serviço deradiodifusão sonora. (…)

VOTO O Ministro Luís Roberto Barroso (Revisor) (…) 6. Quanto ao mérito, nos termos dasnormas proibitivas invocadas, previstas nos arts. 54 da Constituição e art. 38, § 1º, da Leinº 4.117/62, é vedado ao parlamentar ou empresa por este controlada receber doGoverno Federal a outorga de serviço de radiodifusão sonora. O que se pretendeu prevenirfoi a reunião de poder político e controle sobre veículos de comunicação de massa, com osriscos decorrentes do abuso. (…) Quanto às consequências, o crime em análise causou aafetação do regular funcionamento da esfera de debate público essencial à democracia. Omotivo, igualmente, é de alta reprovabilidade, uma vez que o falso visou burlar proibiçõesconstitucionais e legais, entre elas, as incompatibilidades parlamentares. (STF, AP 530,Rel. Min. Rosa Weber, Rel. p/ Acórdão Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em09.09.2014, DJe Public 17-11-2014, Republicação Dje Public 19.12.2014) - sem destaqueno original.

Feita essa análise, a Suprema Corte concluiu, de forma clara - e emconformidade com a hipótese, a fundamentação legal e o pedido desta ação - que osartigos 54, I, "a" e II, "a" Constituição proíbem que deputados e senadores sejam sóciosde empresas de radiodifusão.

Essa foi também a conclusão do Desembargador Federal Relator Johonsom

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Di Salvo, no julgamento do AI n. 0002889-43.2016.4.03.0000/SP, referente ao pedidoliminar de uma ação Civil Pública com o mesmo objeto, proposta perante a JustiçaFederal de São Paulo, cujo trecho transcrevo:

O próprio STF já conheceu do tema, ainda que sob outro prisma (o da falsidade ideológicacometida por parlamentar que - para ocultar a propriedade de emissora de rádio - omitiusua condição diante da vedação prevista no art. 54 da Constituição Federal e no art. 38,§1, da Lei n. 4.117/62) quando do julgamento da AP 530, Relatora: Min. ROSA WEBER,Relator p/ Acórdão Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 09/09/2014.(…) Nesse precioso julgamento a então Relatora analisou as incompatibilidades previstasno art. 54 do Texto Magno e averbou: "não importa o nomen iuris pela qual o serviço foirepassado ao parlamentar ou à empresa por ele controlada, se concessão, permissão ouautorização. Viola a proibição constitucional qualquer outorga ao parlamentar de benefícioextravagante por parte da Administração Pública direta ou indireta". E analisando aproibição - que também se encontra na Lei de Telecomunicações - concluiu a Ministraque: "a proibição legal visa a impedir é a utilização de poder político para obtenção daoutorga do serviço de radiodifusão, com o abuso desse serviço para atendimento aosinteresses políticos, em prejuízo da liberdade de esfera de debate público". A respeito dasassertivas da Relatora não houve qualquer divergência entre os Ministros do STF naocasião (grifo nosso).

A partir da decisão da AP 530, firmou-se entendimento claro de que oartigo 54 proíbe a participação de congressistas no quadro societário de empresas quefirmem ou mantenham contratos com pessoas jurídicas de Direito Público ou comconcessionárias de serviço público. No mais, vale dizer que a AP 530 e o AI no 0002889-43.2016.4.03.0000/SP, não são os únicos precedentes que sustentam a fundamentaçãolegal e os pedidos formulados nesta Ação Civil Pública.

No julgamento do AI nº 0002888-58.2016.4.03.0000/SP, proferido nosautos de ação civil pública contra a participação de Deputado Federal como sócio deempresas de radiodifusão (caso análogo ao desta ação), a Desembargadora do TRF-3Marli Ferreira afirmou a inconstitucionalidade da participação de congressistas comosócios de empresas de radiodifusão. Lê-se na decisão:

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A vedação constitucional é expressa e inafastável, emprestando em decorrênciaverossimilhança nas alegações deduzidas em sede do presente agravo de instrumento.Está-se diante de incompatibilidade prevista no texto constitucional, gerando verdadeiroenvolvimento de interesses subalternos, entre o sócio proprietário de empresaconcessionária de rádio e televisão - no caso sócio majoritário - com membro integrantede função do Estado encarregada de exercer o controle legislativo dessas concessões,autorizações e permissões. Com efeito, a Constituição Federal determina que até mesmo aalteração de controle societários de tais empresas seja comunicada ao CongressoNacional (art. 222, § 5º) e mais ainda, o que atesta a gravidade da situação descrita nosautos, a Lei Maior afirma competir ao Poder Executivo a outorga e renovação daconcessão, permissão e autorização para o serviço de radiodifusão sonora e de sons eimagens (art. 223, "caput"), e que o Congresso Nacional apreciará o ato no prazo do art.64, §§ 2º e 4º, a contar do recebimento da mensagem (§1º), asseverando ainda no §2º domesmo dispositivo legal que "a não renovação da concessão ou permissão dependerá deaprovação de, no mínimo, dois quintos do Congresso Nacional, em votação nominal. Ora, éfato público e notório que vários parlamentares detêm por interpostas pessoas jurídicas aconcessão, permissão ou autorização para o funcionamento dessas empresas, o que alémde imoral é vedado pelo ordenamento jurídico. É de se perguntar se na declaração debens apresentada quando da posse, constou essa ilegalidade às escancaras, pois seria ocaso, pois de além de responder por ação penal, ser responsabilizado por improbidadeadministrativa. Não pode haver decisão judicial contrária ao texto constitucional, que é acarta política da sociedade democrática brasileira. Aliás, as empresas em mãos doscongressistas alinhados no proibitivo constitucional constituem um risco para a própriatransparência e lisura do pleito eleitoral, na medida em que pode o eventual candidato serfavorecido por ter em mãos a indigitada concessão. Favorecer raciocínio inverso seriaconceder ao parlamentar ser o "controle" de seus próprios interesses, de seu próprionegócio jurídico. É também público e notório que 1 (um) em cada 5 (cinco)parlamentares seriam membros da própria CCTCI e sócios de concessão pública no setor.Não é possível que o órgão incumbido da defesa dos interesses da sociedade seja coartadonessa busca pela legalidade, moralidade e transparência, mesmo que a ilegal atuação seabrigue sob o manto de pessoa jurídica criada em evidente fraude à lei. Ante o exposto,concedo a antecipação da tutela recursal requerida, para os fins previstos nos itens "a" e"b" da inicial.

No julgamento da Apelação n. 102.771.5/0-001515, o Tribunal de Justiça deSão Paulo decidiu que, em virtude das incompatibilidades negociais previstas pelosartigos 54, I, "a" e 54, II, "a" da Constituição, empresa que possui políticos titulares demandato eletivo como sócios não pode participar de licitação pública, nem pode firmar

15 TJSP, Apelação n. 102.771.5/0-00/Guarulhos, Relator Desembargador William Marinho, julgamento em27.01.2000, data de registro 28.02.2000.

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ou manter contratos com a Administração. A decisão sustentou ainda que (i) o artigo 54alcança a Administração, proibindo-a de celebrar os contratos vedados por esse preceitoconstitucional, e (ii) contrato precedido de licitação não obedece a cláusulas uniformes.Eis os trechos relevantes da decisão:

MANDADO DE SEGURANÇA - LICITAÇÃO - ADMISSIBILIDADE - DEPUTADO EVEREADOR SÓCIOS DA CONCORRENTE - RESTRIÇÃO CONSTITUCIONAL (CF, ART. 54,I, "A" E II, "A" E LOM, ART. 18, I, E II, "A") - INCOMPATIBILIDADES NEGOCIAIS -SUBSISTÊNCIA DA SENTENÇA CONCESSIVA DA ORDEM - RECURSOS, VOLUNTÁRIOS EOFICIAL, NÃO PROVIDOS. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - ESGOTAMENTODAS VIAS ADMINISTRATIVAS - MATÉRIA SUJEITA AO CRIVO DO JUDICIÁRIO (CF, ART.5O, XXXV) - PRELIMINAR, REJEITADA. (…) 3) No mérito, a sentença deu soluçãoadequada. Há restrições às sociedades comerciais de negociar com o Poder Público,quando seus sócios são membros do Poder Legislativo. Assim preceitua a Constituição:Art. 54 - Os Deputados e Senadores não poderão: I - desde a expedição do diploma: a)firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, salvo quando o contratoobedecer a cláusulas uniformes; (omissis) II - desde a posse: a) ser proprietários deempresa que goze de favor decorrente de contrato com pessoa jurídica de direito público,ou nela exercer função remunerada: (omissis). Ora, a sociedade PAUPEDRA - Pedreiras,Pavimentações e Construções Ltda. possui entre seus sócios, FAUSTO MARTELLO,vereador e Presidente da Câmara de Guarulhos e, FAUSTO MIGUEL MARTELLO, DeputadoFederal. Logo, não poderia concorrer à licitação promovida pela Prefeitura Municipal deGuarulhos, para fornecimento de areia, em face das restrições constitucionais apontadas.A lei da licitação também contém princípios éticos que tornam incompatível a habilitaçãoda referida sociedade. 4) Afigura-se inoperante o argumento da apelante de que, naespécie havendo o contrato de conter "cláusulas uniformes", e não gozando ela dequalquer tipo de favorecimento, nada obsta seja credenciada à participação do examelicitatório, em questão. É que, no caso, o edital estabelece condições igualitárias deconcorrência, não estando expressamente estatuído que as cláusulas do contrato deadjudicação obedecerá cláusulas uniformes a toda e qualquer contratação desta natureza.Na verdade, as cláusulas serão estabelecidas de conformidade com a gama de diretrizesfixada no edital de convocação. 5) Insubsistente, também, se apresenta o argumento deque a restrição só vinga na hipótese da empresa gozar de favor decorrente de contratoadministrativo. Olvida, no entanto, que, para o enquadramento à restrição basta sejaremunerado o parlamentar, como sócio-cotista da sociedade interessada. 6) As sançõesprevistas no art. 55 da Constituição Federal não têm o condão de impedir a contratação,uma vez que não diz expressamente que as mesmas excluem quaisquer outraspenalidades. Sendo assim, o legislador constituinte deixa claro que o descumprimento doart. 54 acarreta também a perda de mandato eletivo, configurando-se falta de decoroparlamentar. Por todas essas razões, impugna-se a concessão da ordem rogada, paraexcluir do certame licitatório, a apelante, por estar sujeita às restrições constitucionais,

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em comento, impondo-se a subsistência da sentença concessiva da segurança rogada.

Essa decisão foi examinada pelo STF no REXT 370.018/SP, de relatoria daMinistra Cármen Lúcia, julgado em 20.11.2008. Apesar de negar seguimento ao recurso,a Ministra afirmou, quanto ao mérito, que nada havia a "reformar ou a se corrigir nasdecisões anteriormente exaradas pelos órgãos do Poder Judiciário" e que "a prestação dajurisdição foi cumprida nos termos da legislação vigente":

3. O Recorrente assevera que o Tribunal a quo teria desobedecido o art. 37, inc. XXI e dadointerpretação incorreta ao art. 54, da Constituição da República. Argumenta que a "...o art.54 da Constituição Federal contém vedação dirigida única e exclusivamente a senadores edeputados. Ou seja, existe uma restrição de direito aos titulares de mandato legislativo.Trata-se de comando interditório dirigido às pessoas físicas que se ocupam das tarefaslegislativas. Por tal razão, é juridicamente impossível o pedido de afastamento deuma pessoa jurídica de certame licitatório, fulcrada na referida normaconstitucional" (fl. 410). Pede o provimento do recurso "reformando-se o entendimentodo E. Tribunal a quo e garantindo-se à recorrente o direito de contratar com o PoderPúblico, uma vez que nenhuma pessoa jurídica pode ser afastada de uma licitação pelosimples fato de ter em seu quadro societário, sem sequer funções gerenciais, membros dopoder legislativo, sob pena de violação dos arts. 54 e 37, XXXI da Constituição Federal" (fl.416). Apreciada a matéria trazida na espécie, DECIDO. (…) 5. De se elucidar, inicialmente,o caso que se tem em juízo. O Município de Guarulhos iniciou procedimento licitatório,em 1998, na modalidade concorrência pública do tipo menor preço, para o fornecimentode areia (Concorrência n. 03/98-SF6 - fl. 35). Recorrente e recorrida habilitaram-se para ocertame. Entretanto, conquanto a ora Recorrente tenha sido habilitada, a ora Recorridaquestionou administrativamente tal admissão, acabando por impetrar o mandado desegurança - origem do presente recurso - com o fim de afastar a empresa, ao argumentode que dela faziam parte, como seus proprietários, o Presidente da Câmara Municipal deGuarulhos e seu filho, Deputado Federal. Firmou-se a ora Recorrida em que talafastamento era mister em face do art. 18, incs. I e II, al. a, da Lei Orgânica do Municípiode Guarulhos, do art. 9º da Lei n. 8.666/93 e, ainda, do art. 54, inc. I, al. a, da Constituiçãoda República. Concedida a ordem de segurança pedida, interpôs-se apelação, na qual seproferiu a decisão contra a qual se insurge, pelo extraordinário, a ora Recorrente, quecompareceu inicialmente na ação como litisconsorte. 7. A análise dos autos patenteianão se dotar de razão jurídica a ora Recorrente, nada havendo a reformar ou a secorrigir nas decisões anteriormente exaradas pelos órgãos do Poder Judiciário. 8.Quanto ao art. 37, inc. XXI, da Constituição brasileira, não conheço do recurso, porcarência do necessário prequestionamento. (…) 11. De se concluir, pois, não haver o

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que prover judicialmente, uma vez que a prestação da jurisdição foi cumprida nostermos da legislação vigente. 12. Pelo exposto, nego seguimento a este recurso (art.557, caput, do Código de Processo Civil e art. 21, § 1º, do Regimento Interno do SupremoTribunal Federal).

No julgamento da Apelação Cível 2006.011311-61616, o Tribunal de Justiça deSanta Catarina anulou, com efeitos ex tunc, contrato administrativo celebrado comempresa que possui deputado federal como sócio cotista em razão da vedação previstapelo artigo 54, I, "a", condenou os responsáveis por improbidade administrativa eordenou a devolução dos valores recebidos em virtude do contrato. Lê-se na ementa:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA - ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - LICITAÇÃO - DESVIODE FINALIDADE - ANULAÇÃO DOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS - EFEITOS EXTUNC - DEVOLUÇÃO INTEGRAL DOS VALORES PERCEBIDOS - POSSIBILIDADE - MÁ-FÉCOMPROVADA - OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E MORALIDADE -ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA DO MUNICÍPIO – INOCORRÊNCIA. O princípio da vedaçãodo locupletamento ilícito, cujo teor tem suas raízes na eqüidade e na ética, não pode serinvocado por quem celebrou avença com a Município violando os preceitos maiscomezinhos da Administração Pública, agindo, por conseguinte, imbuído de comprovadamá-fé. Nessa última hipótese, a devolução integral dos valores percebidos em virtude docontrato é medida que se impõe, já que a anulação do acordo opera efeitos ex tunc.Vislumbrar outro norte seria tornar legítimo o constante descumprimento dos princípiosda juridicidade e da moralidade, fazendo com que sejam sistematicamente suscitados ospossíveis benefícios auferidos pelo ente público, o que relegaria a infringência dos vetoresbásicos da probidade a plano secundário. AÇÃO CIVIL PÚBLICA - IMPROBIDADEADMINISTRATIVA - DEPUTADO FEDERAL - SÓCIOCOTISTA - EMPRESA QUE FIRMACONTRATO COM PODER PÚBLICO - AVENÇA DESTITUÍDA DE CARÁTER UNIFORME -INCOMPATIBILIDADE NEGOCIAL - INCIDÊNCIA - DICÇÃO DO ART. 54, I, "a", DA CARTAMAGNA. Consoante pontifica o art. 54, I, "a", da Lei Maior, a incompatibilidade negocial sereveste de utilidade para permitir que a legislatura seja levada a efeito sem percalços,embaraços e tropeços. Evita, portanto, que a condição do parlamentar e, mormente, a suaforça política, influencie na celebração de contratos com o Poder Público. Destarte, nãohaveria lógica cingir o comando proibitivo exclusivamente aos sócios com poderes degerência, uma vez que, assim como os administradores, os cotistas auferem lucros com aprosperidade da pessoa jurídica da qual fazem parte.

16 TJSC, Apelação Cível n. 2006.011311-6, de Pomerode, rel. Des. Volnei Carlin, Primeira Câmara deDireito Público, julgamento em 11.06.2007, DJe 251 de 20.07.2007.

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No mesmo sentido, a decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sulna Apelação n. 70018961870 condenou parlamentares e agentes públicos porimprobidade administrativa, por violação ao disposto no artigo 54 da Constituição, emrazão da contratação, pelo Poder Público, de empresas que possuíam políticos titularesde mandato eletivo como sócios. Lê-se na ementa da decisão:

APELAÇÃO CÍVEL. LICITAÇÃO E CONTRATO ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DAMORALIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 11, CAPUT, DA LEI Nº 8.249/92.INCONTROVERSOS OS FATOS IMPUTADOS AOS DEMANDADOS. INEXISTÊNCIA DEPREJUÍZO AO ERÁRIO. INOBSERVÂNCIA DE PRINCÍPIO REGENTE DA ADMINISTRAÇÃOPÚBLICA. AÇÃO DOLOSA. CONTRATAÇÃO COM O PODER PÚBLICO VEDADA ADETENTOR DE MANDATO DE VEREADOR. ART. 43 DA LEI ORGÂNICA E ART. 54 DACONSTITUIÇÃO FEDERAL. MÁ-FÉ CARACTERIZADA. EVIDENTE OBTENÇÃO DEBENEFÍCIO PRÓPRIO DOS DEMANDADOS. PENALIDADE DE MULTA ARBITRADA EMCONSONÂNCIA COM OS CRITÉRIOS LEGAIS E DE PROPORCIONALIDADE ERAZOABILIDADE DIANTE DA GRAVIDADE DAS CONDUTAS. APELO IMPROVIDO.1717

2.8. Do Cancelamento da Outorga da Rádio FM Itatiunga 2.8. Do Cancelamento da Outorga da Rádio FM Itatiunga

Ao reconhecer determinadas atividades econômicas como serviçospúblicos, o Estado as retira do domínio econômico privado, assumindo-as sob suatitularidade, e lhes atribui uma disciplina jurídica peculiar (o regime jurídico de direitopúblico), nos termos do que prevê o artigo 175 da Constituição 1818. O setor privado podeassumir a prestação desses serviços, não obstante, nesse caso, a autonomia privada élimitada pelas exigências constitucionais e infraconstitucionais voltadas a garantir oatendimento do interesse público e que constituem o regime jurídico de direito publico

17 TJRS, Apelação n. 70018961870/Seberi, Relator Desembargador Luiz Felipe Silveira Difini, DJ21.02.2008, grifo nosso.

18 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 28ª ed. São Paulo: Malheiros,2011, p. 678-679.

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aplicável ao serviço em questão.

O regime jurídico da concessão, permissão ou autorização de radiodifusãosubmete-se à observância da legalidade administrativa. Logo, Administração econcessionário ou permissionário privado devem, por obrigação, fazer tudo o quanto aConstituição e as normas infraconstitucionais lhes determinem fazer. Daí a obrigação daempresa concessionária, permissionário ou autorizatária de radiodifusão de observar asnormas constitucionais estabelecidas pelos artigos 54, I, "a" e 54, II, "a" da Constituição.

A Administração Pública submete-se à legalidade estrita. Ao contrário dosparticulares, que podem fazer tudo quanto a lei não lhes proíba, a Administração só podefazer o que a lei lhe autorize. Por isso, os atos e contratos administrativos estão sujeitos arígido controle de legalidade, realizado pela Administração e pelo Poder Judiciário.

Os atos administrativos que importam em violação da Constituição ou dalei são nulos por ilicitude de seu objeto. Como aponta Oswaldo Aranha Bandeira de Melloo ato administrativo é nulo "quanto ao objeto, se ilícito ou impossível por ofensa frontalà lei, ou nele se verifique o exercício de direito de modo abusivo"1919.

Outrossim, o artigo 2º da lei 5.717/1965 determina que:

Art. 2º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigoanterior, nos casos de: (...)

c) ilegalidade do objeto; (...)

Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as seguintesnormas: (...)

c) a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação delei, regulamento ou outro ato normativo.

19 MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. Princípios gerais de direito administrativo. 3 ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p.655.

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Da mesma forma, os contratos administrativos não podem violar asnormas constitucionais ou infraconstitucionais, sob pena de nulidade, quando a ilicitudeocorre em sua origem, ou de desfazimento, quando a ilicitude ocorre ao longo de suavigência. Maria Sylvia Zanella di Pietro afirma que "em se tratando de ilegalidadeverificada nos contratos de que é parte, a Administração tem também o poder de declarara sua nulidade, com efeito retroativo, impedindo os efeitos jurídicos que elasordinariamente deveriam produzir, além de desconstituir os já produzidos"2020. Nessesentido, o artigo 59 da Lei 8.666 determina que: “A declaração de nulidade do contratoadministrativo opera retroativamente impedindo os efeitos jurídicos que ele,ordinariamente, deveria produzir, além de desconstituir os já produzidos”.

Celso Antônio Bandeira de Mello ressalta que os atos e contratos viciadospor ilegalidade de objeto decorrente da violação de normas constitucionais einfraconstitucionais não podem ser objeto de convalidação. Diz o autor: “São nulos:a) os atos que a lei assim os declare; b) os atos em que é racionalmente impossível aconvalidação, pois, se o mesmo conteúdo (vale dizer, o mesmo ato) fosse novamenteproduzido, seria reproduzida a invalidade anterior. Sirvam de exemplo: os atos deconteúdo (objeto) ilícito; os praticados com desvio de poder; os praticados com falta demotivo vinculado; os praticados com falta de causa”2121. No mesmo sentido, Maria SylviaZanella di Pietro afirma que o "objeto ou conteúdo ilegal não pode ser objeto deconvalidação"2222.

Dada a impossibilidade de convalidação, a consequência dos atos econtratos administrativos viciados por ilegalidade é a sua extinção. Como apontaCelso Antônio Bandeira de Mello, a extinção pode ocorrer (i) mediante a invalidação,que é a retirada de um ato que em sua origem "fora praticado em desconformidade coma ordem jurídica"2323 ou (ii) mediante cassação (ou cancelamento), quando "odestinatário descumpriu condições que deveriam permanecer atendidas a fim de podercontinuar desfrutando da situação jurídica"2424.

20 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 26ª ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 284.21 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, cit., p. 482.22 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo, cit., p. 257..23 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, cit., p. 451.24 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, cit., p. 451.

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Daí a conclusão de que (i) a outorga e a renovação de concessões,permissões e autorizações de radiodifusão pelo Poder Executivo, e (ii) a aprovaçãodessas outorgas ou renovações pelo Poder Legislativo2525 para pessoas jurídicas quepossuem deputados ou senadores entre seus sócios, diretos ou indiretos, constitui atoadministrativo nulo desde a sua origem, pois viola os artigos 54, I, "a" e 54, II, "a" daConstituição.

Cabe salientar que a proibição da renovação de outorgas nulas desde aorigem ou que tenham se tornado ilícitas durante o curso do prazo, além de decorrer dosprincípios e regras gerais do Direito Público, também é expressamente vedada por lei. Oparágrafo único do artigo 67 da lei 4.117/1962 determina que "o direito de renovaçãodecorre do cumprimento pela empresa, de seu contrato de concessão ou permissão, dasexigências legais e regulamentares (...) a que se obrigou, e de persistirem a possibilidadetécnica e o interesse público em sua existência"2626.

Da mesma forma, empresa concessionária, permissionária ou autorizatáriade radiodifusão que, ao longo da outorga, admite como sócio deputado ou senador,comete a mesma inconstitucionalidade, passando a descumprir norma que deveriapermanecer atendida para que continuasse desfrutando de sua outorga de radiodifusão,dando, assim, fundamento ao cancelamento (cassação) da concessão, permissão ouautorização.

O ilícito em questão é de "alta reprovabilidade", como reconheceu o Min.Roberto Barroso na Ação Penal 530, julgada pelo STF, pois constitui contratação daAdministração proibida pela Constituição que, ademais, afeta "o regular funcionamentoda esfera de debate público essencial à democracia"2727.

25 A outorga de concessões, permissões e autorizações de radiodifusão é um processo complexo, composto pelo ato deoutorga, pelo Poder Executivo, e pelo ato de aprovação da outorga, pelo Poder Legislativo. Essa disciplina é conferidapelo artigo 223 da Constituição.

26 Diz o artigo: "Art. 67. A perempção da concessão ou autorização será declarada pelo Presidente da República,precedendo parecer do Conselho Nacional de Telecomunicações, se a concessionária ou permissionária decair dodireito à renovação. Parágrafo único. O direito a renovação decorre do cumprimento pela empresa, de seu contratode concessão ou permissão, das exigências legais e regulamentares, bem como das finalidades educacionais,culturais e morais a que se obrigou, e de persistirem a possibilidade técnica e o interesse público em sua existência."

27 Palavras do Min. Roberto Barroso em seu voto na Ação Penal 530, julgada pelo STF (STF, AP 530, Rel. Min. RosaWeber, Rel. p/ Acórdão Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em 09.09.2014, DJe Public 17.11.2014,Republicação DJe Public 19.12.2014).

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A alta reprovabilidade é a mesma nos dois casos: (i) quando a empresapossui parlamentar em seu quadro de sócios no ato da outorga ou renovação de suaconcessão ou permissão, ou (ii) quando a empresa admite parlamentar como sócio aolongo do período da outorga. No primeiro caso, trata-se de pessoa jurídica que celebracom a Administração contrato proibido pela Constituição. Daí a nulidade desde o início.No segundo caso, trata-se de empresa que, ao admitir parlamentar como sócio,descumpre norma que deveria permanecer atendida para que continuasse desfrutandode seu contrato. Daí a necessidade de cancelar o contrato dessa empresa, que, ao deixarde cumprir os requisitos exigidos pelo ordenamento, tornou-se proibida de mantercontrato com a Administração.

Esse segundo é o caso da outorga de radiofusão impugnada por esta açãocivil pública. A concessão da Rádio Itatiunga data de 1990, período posterior àlegislação que trata da realização de licitações para a outorga de concessões de serviçosde radiodifusão. Segundo informações do site do Tribunal Superior Eleitoral, NaborWanderley foi eleito deputado estadual no pleito de 2014, de modo que atuou naAssembleia Legislativa da Paraíba a partir de janeiro de 2015 a 2018. Ainda, segundodocumento da Junta Comercial do Estado da Paraíba, Nabor Wanderley fez parte doquadro societário da Rádio Itatiunga até agosto de 2017.

Quando Nabor Wanderley passou a exercer o cargo de deputado estadual(2015), a empresa de radiodifusão deixou de cumprir os requisitos constitucionais paraa obtenção da permissão de exploração do serviço. Dessa maneira, a renovação conferidapela portaria n. 6467/2015, publicada no DOU em 25 de setembro de 2015, estavaeivada de ilegalidade no momento de sua prática, já que nesse período o sócio NaborWanderley exercia mandato de Deputado Estadual, configurando-se assim a violação doartigo 56 da Constituição Estadual (em norma análoga ao art. 54 da CF) e consequentenulidade do ato administrativo.

No caso da Rádio Itatiunga, a outorga original, assim como o decretolegislativo de aprovação, datam de 1990. A outorga autorizada dessa rádio se tornouirregular em 2015, quando o réu Nabor Wanderley passou a exercer mandatoeletivo na Assembleia Legislativa da Paraíba, e deveria, portanto, ter sido cancelada àépoca, pela ilegalidade decorrente do não preenchimento dos requisitos do atoadministrativo. Não foi o que ocorreu e a exploração de serviço de radiodifusão pelaempresa continua até os dias atuais, com a “saída” de Nabor Wanderley da sociedade,somente em agosto de 2017.

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Nabor Wanderley, que desde 2015 até os dias atuais, exerce mandatoeletivo de Deputado Estadual, “retirou-se” do Sistema Itatiunga de Comunicação Ltda noano de 2017, transferindo suas cotas a sua filha, Olívia Mota. Como se demonstraráabaixo, trata-se de hipótese de simulação de negócio jurídico, persistindo, assim, ocontrole de fato de um titular de mandato eletivo sobre a exploração do serviço deradiodifusão até os dias atuais.

Ainda que se tratasse de negócio jurídico legítimo, a mudança no quadrosocietário não altera o fato de que a rádio operou ilicitamente, controlada por um titularde mandato eletivo, dos anos 2015 a 2017. Nesse período, a outorga deveria ter sidocancelada por perda dos requisitos de legalidade do ato administrativo e uma novalicitação de exploração de serviço de radiodifusão deveria ter sido realizada.

A pena de cancelamento deve, portanto, ser aplicada, pois os atos ilícitoscometidos pela empresa e pelo Deputado Estadual desde o ano de 2015 tornaram ilícitasas outorgas, ferindo a legalidade e os princípios da licitação pública que operacionalizamo estabelecimento de contratos com o poder público. Essa ilegalidade preexistente vedaa possibilidade de renovação das mesmas outorgas, de modo que as renovações deoutorgas realizadas em 2015 estão inquinadas de vício desde a origem e são, portanto,nulas de pleno direito.

Diante da persistência de tal ilegalidade por quase quatro anos (2015-2018), afigura-se premente a necessidade de cancelamento das outorgas e realização denova licitação para que a exploração de serviço de radiodifusão esteja em conformidadecom as normas do ordenamento jurídico vigente.

Além da violação à Constituição, deve-se considerar o enriquecimentoilícito obtido pelas empresas e pelo Deputado, equivalente a todo o lucro obtido com aexploração da atividade mediante outorgas ilícitas, assim como suas últimas renovações,por violação ao artigo 56 da Constituição Estadual.

2.9. Da Simulação na Transferência das Cotas Sociais2.9. Da Simulação na Transferência das Cotas Sociais

Como se asseverou na narrativa fática (ponto 1), em 16 de agosto de 2017,

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Nabor Wanderley, por meio de alteração do contrato social, formalmente deixou asociedade da Rádio FM Itatiunga, supostamente transferindo onerosamente suas cotassociais para sua filha, Olívia Motta Wanderley da Nóbrega, pelo valor de R$ 10.000,00(dez mil reais). Na mesma alteração, também foi admitida na sociedade a ex-mulher deNabor Wanderley, Ilana Araújo Mota, mãe de Olívia Mota, filha de Francisca Mota ecunhada de Helena Wanderley.

A transferência das cotas de Nabor Wanderley para Olívia Motadocumentalmente ocorreu de forma onerosa, mas o valor apresentado (R$ 10.000,00)não corresponde ao valor de mercado de uma empresa que, na mesma alteração social,aumentou seu capital social para R$ 300.000,00. Os dez mil reais procuraram refletir ovalor da alteração contratual de 2005 e, nem naquela data pretérita, representava arealidade dos fatos, pois, sabidamente, trata-se da empresa de radiodifusão mais ouvidada região de Patos.

Com essa extensão da influência familiar da Família Mota na propriedade ena administração da Rádio FM Itatiunga, parece certo afirmar que a transferência dascotas de Nabor Wanderley para Olívia Mota foi um negócio jurídico simulado quepretendeu, sem perder o controle sobre a empresa, afastar nominalmente o parlamentarestadual da empresa, procurando evitar as consequências aqui pugnadas judicialmente.

Ocorre simulação quando "há um desacordo entre a vontade declarada oumanifestada e a vontade interna", "uma discrepância entre a vontade e a declaração;entre a essência e a aparência"28. A simulação pode ser (i) absoluta quando, as partesaparentemente celebram um negócio jurídico, mas, na essência, não desejam negócioalgum, ou (ii) relativa, quando as partes almejam celebrar um negócio jurídico distintodaquele celebrado na aparência29. Em ambos os casos, trata-se de um vício derepercussão social - equiparável à fraude contra credores - no qual as partes contraentescombinam-se para iludir terceiros, trazendo prejuízo à ordem pública30.

Em razão de sua gravidade e da ofensa à ordem pública, o Código Civildetermina que os negócios jurídicos simulados são nulos. Diz o artigo 167 do Código:

28 TARTUCE, Fávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil vol. 4: direito das coisas. 5ª ed. Rio de Janeiro:Forense; São Paulo: Método, 2013, p. 398.

29 Cf. TARTUCE, Fávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil vol. 4: direito das coisas, cit., p. 401.30 Cf. TARTUCE, Fávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil vol. 4: direito das coisas, cit., p. 398.

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Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válidofor na substância e na forma.

§ 1º Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:

I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quaisrealmente se conferem, ou transmitem;

II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira;

III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.

§ 2º Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraentes do negóciojurídico simulado.

A operação societária que desembocou na saída do Deputado NaborWanderley da Nóbrega Filho de sua condição de sócio da Rádio Itatiunga FM teve comoobjetivo deliberado omitir a sua participação societária mediante a transferência dasquotas para sua filha.

Tem-se aí uma simulação absoluta: as operações societárias quedesembocaram na retirada do Deputado da condição de sócio da empresa deradiodifusão constituem negócios jurídicos simulados, ao passo que a vontade daspartes contraentes foi não o de celebrar negócio jurídico algum, mas sim de manter aparticipação societária nas mãos de quem estava antes e encobrir este fato perante osórgãos oficiais.

É corriqueiro que negócios simulados envolvam a figura de descendentes,cônjuges e outros parentes de alguma das partes, fato que garante à parte a possibilidadede evadir-se de consequências jurídicas decorrentes da propriedade e, ao mesmo tempo,continuar no controle fático dos bens envolvidos. Tão corriqueira é essa prática que oCódigo Civil de 2002, em seu art. 496, considera anulável a venda de ascendente adescendente realizada sem a anuência do cônjuge ou de outros descendentes. Embora

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esse tipo de fraude seja mais comum na seara dos direitos sucessório e de família, elatambém pode ser útil para outros fins escusos, como a ocultação de participação ilegalem quadro societário ou ocultação de bens para fins de não declaração à Justiça Eleitoral.

É observável, ainda, que os valores das operações que desembocaram natransferência de titularidade são irrisórios, consistindo em partes menores do capitalsocial completo. Além disso, os valores dessas cotas, assim como do capital social comoum todo, são bastante desproporcionais em relação ao valor de mercado das cotassocietárias, tomando-se como referência os rendimentos prováveis de uma rádio dealcance regional.

A entrada de Olívia Mota Wanderley da Nóbrega na sociedade se deuapenas para substituir o nome de Nabor Wanderley da Nóbrega Filho nos documentosoficiais, servindo para manter a Família Motta no controle societário da rádio,permitindo que Nabor Wanderley possa se beneficiar de seu funcionamento.

Essa operação societária aproxima ainda mais a situação tratada nestaAção Civil Pública do caso julgado pelo STF na Ação Penal 530. No caso julgado pelo STF,o que ocorreu foi justamente uma simulação, operada mediante a falsificação dedocumento societário, para ocultar a participação societária de Deputado Federal emempresa de radiodifusão, em virtude da proibição prevista pelo artigo 54 daConstituição. Diz a ementa: “Restou provada a falsidade do contrato social daRadiodifusão Dinâmica, sendo o primeiro acusado o verdadeiro controlador. Com efeito, odenunciado omitiu esta condição por ser parlamentar federal, diante da vedação previstano art. 54 da Constituição Federal e no art. 38, §1º, da Lei nº 4.117/62”.

O mesmo que ocorreu lá está acontecendo aqui - simulação de alteraçõessocietárias para ocultar a participação de Deputado Estadual em empresas deradiodifusão com o intuito de contornar a vedação prevista pelo art. 56 da ConstituiçãoEstadual.

A transferência de ações representativas do capital da concessionária oupermissionária é uma operação qualificada pela legislação de radiodifusão comotransferência indireta de outorga31. A transferência foi registrada da Junta Comercial

31 Diz o artigo 89, § 2º do Decreto 52.795/1963, que estipula o Regulamento dos Serviços deRadiodifusão: “Art. 89. (...) § 2º: Dá-se a transferência indireta quando a maioria das cotas ou açõesrepresentativas do capital é transferida de um para outro grupo de cotistas ou acionistas que passa a

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do Estado da Paraíba, embora não tenha sido encontrado qualquer registro da anuênciaprévia do órgão executivo responsável, o Ministério das Comunicações.

Como se passa a demonstrar, a operação de transferência indireta daoutorga da Rádio Itatiunga: a) é nula de pleno direito, por falta de qualquer indício deautorização prévia do Poder Executivo, nos termos do artigo 38, "c", da Lei 4.117/1962,166, V, do Código Civil, e 90 do Decreto 52.795/1963; b) é nula de pleno direito pois,apesar de permitida por lei, a transferência direta ou indireta de outorga de radiodifusãoé inconstitucional, por violar a exigência constitucional de prévia licitação para a outorgado serviço, o caráter extra commercium do serviço público e por ensejar enriquecimentoilícito aos particulares que lucram com a negociação de outorgas públicas.

O art. 89, § 2º do Decreto 52.795/1963 prevê que se dá a transferênciaindireta quando a maioria das cotas ou ações representativas do capital é transferida deum para outro grupo de cotistas ou acionistas que passa a deter o mando da sociedade.Ocorre que a validade da transferência depende da prévia autorização do PoderExecutivo, sem qual a operação é nula de pleno direito. Isso é o que afirmamexpressamente os artigos 38, "c" da Lei 4.117/1962 (Código Brasileiro deTelecomunicações) e o artigo 90 do Decreto 52.795/1963 (Regulamento dos Serviços deRadiodifusão):

Lei 4.117/1962

Art. 38. Nas concessões, permissões ou autorizações para explorar serviços deradiodifusão, serão observados, além de outros requisitos, os seguintes preceitos ecláusulas:

c) a alteração de objetivos sociais, a alteração de controle societário das empresas e atransferência da concessão, permissão ou autorização dependem, para suavalidade, de prévia anuência do órgão competente do Poder Executivo;

Decreto 52.795/1963

Art. 90. Nenhuma transferência, direta ou indireta de concessão ou permissão, poderá seefetivar sem prévia autorização do Governo Federal, sendo nula, de pleno direito,qualquer transferência efetivada sem observância desse requisito.

deter o mando da sociedade”.

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Ao determinar que a autorização do Poder Executivo deve ser prévia, émais do que claro que essa autorização deve ocorrer antes de realizada a operação detransferência de quotas. A consequência da ausência da anuência governamental é anulidade, de pleno direito da transferência. Daí a conclusão de que a autorização doPoder Executivo não é mera formalidade, mero procedimento burocrático, mas simcondição de validade da transferência; solenidade essencial que, caso descumprida,torna nulo o negócio jurídico, nos termos dos artigos supramencionados e do artigo 166,incisos V do Código Civil (“É nulo o negócio jurídico quando (…) for preterida algumasolenidade que a lei considere essencial para a sua validade”).

No caso, a alegada transferência indireta da outorga do Sistema Itatiungade Comunicação Ltda, mediante a transferência ações representativas do capital pelascotas sociais a outro sócio, não ocorreu conforme determina a lei, tendo em vista aausência de autorização por parte do Poder Executivo.

Ressalte-se, ainda, que, apesar de permitida pela Lei 4.117/62 e peloDecreto 52.795/63, a transferência indireta de outorga de radiodifusão éinconstitucional32.

As atividades econômicas reconhecidas como serviços públicos não fazemparte da esfera do comércio privado. Constituem res extra commercium - serviçosinegociáveis, integrantes do domínio econômico público e titularizados pelo Estado. Porisso, quando os serviços públicos são concedidos ou permitidos à iniciativa privada, oque se transfere é a execução do serviço e não a sua titularidade, que permanece com oEstado. Em razão desse regime jurídico, os concessionários e permissionários nãoexercem qualquer disponibilidade sobre os serviços públicos, que é a todo tempomantida pelo Estado. Não podem negociá-los, isto é, não podem comercializar a posiçãode delegatários de serviços públicos.

Como aponta Fábio Konder Comparato 33:

32 A exposição a seguir relativa à inconstitucionalidade da transferência direta e indireta de outorgas deradiodifusão toma como base o artigo: ARAÚJO, Bráulio Santos Rabelo de. A transferência de outorgasde radiodifusão e a comercialização de tempo de programação. RDA – Revista de Direito Administrativo,Rio de Janeiro, v. 268, p. 249-292, jan./abr. 2015.

33 COMPARATO, Fábio Konder. Parecer sobre ato, formal ou informal, de cessão ou arrendamento a

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Não há nem pode haver alienação de funções públicas a particulares. Os concessionáriosde serviço público (...) atuam em nome próprio, mas em razão de competência alheia. Odireito de prestar serviço público em virtude de concessão administrativa não é um bempatrimonial suscetível de negociação pelo concessionário no mercado. Não se trata de umbem in commercio. O concessionário de serviço público não pode, de forma alguma,arrendar ou alienar a terceiro sua posição de delegatário do Poder Público.

No mesmo sentido, após observar que os serviços públicos são res extracommercium (inegociáveis e inamovivelmente sediados na esfera pública), Celso AntônioBandeira de Mello sustenta que34:

Só as pessoas de natureza pública podem ser titulares, ter como próprias as atividadespúblicas. Um particular jamais poderá reter (seja pelo tempo que for) em suasmãos, como senhor, um serviço público. Por isso, o que se transfere para oconcessionário - diversamente do que ocorre no caso das autarquias - é tão-só esimplesmente o exercício da atividade pública. (…) O Poder Público, em razão de suasfunções, tem sempre disponibilidade sobre o serviço público e sobre a utilização de umbem público; inversamente, o particular jamais pode tê-la, pois está envolvido naquestão um bem extra comercium. O contrato jamais seria via idônea para propiciar aum administrado senhoria, conquanto parcial, sobre um interesse público, seja no querespeita à forma de satisfazê-lo, seja no que atina ao prazo de duração de vínculoversando sobre ele. (…) Não seria possível que o interesse público ficasse vergado aointeresse particular. Daí o sem-sentido de recorrer-se à teoria do contrato em certoscasos35.

terceiros de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens, efetuado por um concessionário .Outubro de 2009, p. 3-4, itálicos e grifos do autor. Disponível em:<http://observatoriodaimprensa.com.br/imprensa-em-questao/ed673-omissao-do-congresso-desprezo-dos-concessionarios/>. Acesso em: 07.07.2016.

34 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Ed. Malheiros, 26ªedição, 2008, p. 718; 625, grifo nosso, itálicos do autor.

35 No mesmo sentido, veja-se ainda MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. Natureza jurídica da concessãode serviço público, Revista da Faculdade de Direito de Porto Alegre. Porto Alegre, ano III, nº 1, vol. II, p.859-899, 1951., p. 867; ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. 6ª ed. São Paulo:Malheiros, 2004, p. 161-162.

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Ora, se os serviços públicos são res extra commercium e os particulares queos prestam não podem comercializar sua posição de delegatários, pois sobre ela nãoexercem qualquer disponibilidade, então as concessões e permissões de radiodifusãonão podem ser comercializadas mediante a transferência direta ou indireta deoutorgas.

Além disso, note-se que o setor privado pode assumir a prestação deserviços públicos mediante concessão e permissão, desde que sempre precedidas delicitação, como determina o artigo 175 e o inciso XXI do artigo 37 da Constituição.

Os objetivos da licitação são garantir a todos os administrados apossibilidade de disputar, em igualdade de condições, as contratações do Poder Público,bem como permitir aos entes públicos a seleção da proposta mais vantajosa36. De umlado, a concorrência para a seleção da proposta mais vantajosa protege o interesse e osrecursos públicos e promove a eficiência da atividade administrativa37. De outro, aabertura dos contratos do Estado à concorrência pública atende às normas da isonomia38

(por proporcionar a todos a possibilidade de disputar os contratos públicos emigualdade de condições e por tratar isonomicamente os participantes da licitação) e daimpessoalidade39 (por evitar qualquer favorecimento, parcialidade, discriminação,arbítrio ou favoritismo impertinente em benefício de determinado indivíduo, garantindoassim tratamento neutro a todos os administrados)40.

Da exigência constitucional de prévia licitação decorre o caráter pessoaldas concessões e permissões de serviços públicos41 e a conclusão de que as outorgas não

36 Cf. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, cit., p. 530; artigo 3º da Lei nº8.666/1993; artigo 14 da Lei nº 8.987/1995.

37 Cf. artigo 37, caput, da Constituição.38 Cf. artigo 5º, caput, da Constituição e artigo 3º da Lei nº 8.666/1993.39 Cf. artigo 37, caput, da Constituição e artigo 3º da Lei nº 8.666/1993.40 Cf. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, cit., p. 530-531; 536.41 Como observa Fábio Konder Comparato, “(...) a relação de concessão de serviço público é

personalíssima. O Estado confia a prestação do serviço a certa e determinada pessoa ou entidade,considerada a mais apta, em confronto com todas as concorrentes, a prestar um serviço adequado aopleno atendimento dos usuários”. Cf. COMPARATO, Fábio Konder. Parecer sobre ato, formal ou informal,de cessão ou arrendamento a terceiros de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens, efetuadopor um concessionário, cit., p. 4, grifo nosso. No mesmo sentido, veja-se também MELLO, Oswaldo

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podem ser transferidas direta ou indiretamente. Isso não apenas porque as concessões epermissões são celebradas em função das características pessoais dos candidatos quevenceram o certame, mas, principalmente, porque o que permite a outorga daexecução de um serviço público a uma determinada pessoa e não a outra é arealização da licitação.

Não se pode atribuir a qualquer particular o benefício de prestar umserviço público sem a realização prévia de procedimento que enseje a todos apossibilidade de disputar isonomicamente a contratação pública. A realização delicitação para uma determinada contratação específica não autoriza o repasse direto ouindireto dessa contratação a terceiros sem a realização de um novo certame.

Para logo se vê, portanto, que a transferência direta e indireta deoutorgas de radiodifusão é inconstitucional e ilegal. Descumpre a exigênciaconstitucional de prévia licitação42 e a norma da isonomia43, pois permite o controle deoutorgas por terceiros que não participaram de licitação e impede que os administradostenham igual chance de contratar com o Poder Público. Afronta a norma daimpessoalidade44, por permitir que os particulares titulares de concessões e permissõesescolham, segundo sua própria conveniência e arbítrio, quem terá o benefício decontrolar outorgas de um serviço público tão relevante e rentável como a radiodifusão.Viola o caráter extra commercium do serviço público de radiodifusão e do bem públicoconstituído pelo espectro de radiofrequências45 e enseja, nessa medida, oenriquecimento ilícito dos que transferem as outorgas46. Causa, ainda, prejuízo aoscofres públicos, pois priva o poder concedente de receber os pagamentos que lhe seriamdevidos por conta de uma nova outorga das concessões e permissões transferidas pelosparticulares. E prejudica, por fim, a pluralidade e diversidade do setor, na medida em queimpede a distribuição de outorgas a outras instituições tanto da radiodifusão privada,

Aranha Bandeira de. Natureza jurídica da concessão de serviço público, cit., p. 872; DI PIETRO, MariaSylvia Zanella. Direito Administrativo. 26ª ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 277.

42 Cf. artigos 37, XXI, e 175 da Constituição e artigo 2º da Lei nº 8.666/1993.43 Cf. artigo 5º, caput, da Constituição e artigo 3º da Lei nº 8.666/1993.44 Cf. artigo 37, caput, da Constituição, e artigo 3º da Lei nº 8.666/1993.45 Nos termos do artigo 157 da Lei nº 9.472/1997, “[o] espectro de radiofreqüências é um recurso

limitado, constituindo-se em bem público, administrado pela Agência”.46 A transferência pode gerar lucros consideráveis para os concessionários e permissionários mediante a

comercialização de outorgas por valores superiores aos que foram pagos no momento da licitação.

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quanto da radiodifusão pública e comunitária. Tudo isso em afronta à norma daeficiência da Administração47 na gestão do serviço público de rádio e TV.

Em suma, as transferências diretas e indiretas de outorgas de radiodifusãoviolam a Constituição e as leis aplicáveis ao serviço. O artigo 38, "c" da Lei nº 4.117/1962e os artigos 89 e 90 do Decreto nº 52.795/1963, que permitem as transferências, sãoinconstitucionais e ilegais.

Na jurisprudência, há uma série de precedentes que afirmam ainconstitucionalidade da transferência direta e indireta de concessões e permissões deserviços públicos, ainda que mediante a prévia anuência do poder concedente.

Em caso relativo a serviço de transporte público alternativo no DistritoFederal, o Superior Tribunal de Justiça afirmou a inconstitucionalidade da transferênciada permissão do serviço a herdeiros, prevista expressamente pelo Decreto Distrital nº17.045/1995, em razão do caráter intuitu personae da outorga e de violação à exigênciaconstitucional de prévia licitação48.

Em decisão que impediu a Caixa Econômica Federal de autorizartransferência de permissão de agência lotérica, o Tribunal Regional Federal da 4ª Regiãosustentou que "ninguém está apto a 'vender' uma casa lotérica", pois "[a] permissão deserviço público é intuitu personae e dependente de licitação", e não outorga nada alémdo que o direito de explorar o serviço. Concluiu, então, que o ingresso de terceiro quenão se sujeitou à licitação importa em burla ao procedimento licitatório49.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro declarou a inconstitucionalidade deduas leis municipais que permitiam a transferência direta e indireta de concessões epermissões de serviços públicos mediante prévia anuência do poder concedente, porviolação das regras constitucional e legal que exigem licitação e dos princípios datransparência e da moralidade50. Na decisão da Representação por Inconstitucionalidade

47 Cf. artigo 37, caput, da Constituição, e artigo 3º da Lei nº 8.666/1993.48 TRF4, AG 2003.04.01.041101-0, Terceira Turma, Rel. Des. Luiz Carlos de Castro Lugon, data do

julgamento 16.12.2003, DJ 21.01.2004.49 TRF4, AG 2003.04.01.041101-0, Terceira Turma, Rel. Des. Luiz Carlos de Castro Lugon, data do

julgamento 16.12.2003, DJ 21.01.2004.50 Na Representação por Inconstitucionalidade 15/2001, o TJRJ declarou a inconstitucionalidade de

artigos da Lei nº 1.462/1999, do Município de Cabo Frio, que permitiam “a transferência de concessão

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11/2001, o TJRJ ressaltou que "[a] prévia anuência do Poder concedente (...), por si só,não afasta a regra impositiva da exigibilidade de licitação". Segundo o Tribunal, aindaque a anuência "informe a presunção de regularidade dos atos administrativos", anecessidade de licitação se impõe, pois se destina "não só às partes envolvidas, ou seja,ao Poder concedente e ao concessionário, mas a toda a coletividade e aos que tenham acondição de prestar os mesmos serviços de forma mais adequada, visando o interessepúblico". O interesse público, observou a Corte, "não se subsume apenas à vontade doente estatal, mas decorre do atendimento a princípios gerais superiores, previstos nasnormas constitucionais"51.

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal declarou a inconstitucionalidadede duas leis distritais que autorizavam a transferência de permissões para a execução doserviço de táxi por violação à impessoalidade, à igualdade, à legalidade, à moralidade, aointeresse público, à eficiência da Administração Pública e à regra da obrigatoriedade delicitação52.

ou do controle societário da concessionária ou permissionária” de serviços e de obras públicasmediante anuência do poder concedente (TJRJ, Representação por Inconstitucionalidade 15/2001, Rel.Des. Marcus Faver, data de julgamento 19.12.2001). Na Representação por Inconstitucionalidade11/2001, o TJRJ declarou a inconstitucionalidade de artigos da Lei nº 1.859/2000, do Município deMaricá, que permitiam a transferência de concessão de serviços de transportes públicos medianteanuência do poder concedente (TJRJ, Representação por Inconstitucionalidade 11/2001, Processo0032763-21.2001.8.19.0000, Rel. Des. Roberto Wider, data de julgamento 16.09.2002, DJ 13.02.2003).

51 Veja-se, por todos, TJRJ, Representação por Inconstitucionalidade 11/2001, Processo 0032763-21.2001.8.19.0000, Rel. Des. Roberto Wider, data de julgamento 16.09.2002, DJ 13.02.2003.

52 Segundo o TJDFT: “A possibilidade de transferência direta da permissão, sem licitação, frustra osdemais interessados em contratar, impedindo-os de concorrer à prestação de serviço público,implicando em verdadeira barreira à livre concorrência, violando diretamente a isonomia, o princípioda competitividade, a impessoalidade e, por conseguinte, o interesse público, uma vez que a finalidadeda licitação consiste justamente em selecionar a proposta mais vantajosa para o bem-estar coletivo, e aeficiência, já que atende o interesse de poucos, não obtendo a presteza, a segurança e a eficiêncianecessária ao atendimento comum” (TJDFT, Acórdão n. 369470, ADI 20090020005137, Rel. Des. FlávioBostirola, Conselho Especial, data de julgamento 16.06.2009, publicado no DJE 04.10.2011).As leis que tiveram artigos declarados inconstitucionais foram a Lei Distrital nº 4.056/2007 e LeiDistrital nº 2.496/1999. As decisões em questão são as seguintes: (i) TJDFT, Acórdão n. 369470, ADI20090020005137, Rel. Des. Flávio Bostirola, Conselho Especial, data de julgamento 16.06.2009,publicado no DJE 04.10.2011; e (ii) TJDFT, Acórdão n. 300673, ADI 20050020103191, Rel. Des. Vaz deMello, Conselho Especial, data de julgamento 29.01.2008, publicado no DJE 11.07.2008. No mesmosentido, veja-se (i) TJDFT, Acórdão n. 688692, AGI 20130020096723, Rel. Des. João Egmont, 5ª TurmaCível, data de julgamento 20.06.2013, publicado no DJE: 03.07.2013; e (ii) TJDFT, Acórdão n.195786,20030020112779MSG, Des. Rel. Lécio Resende, Conselho Especial, data de julgamento 11.05.2004,publicado no DJU 10/08/2004.

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Mencione-se, ainda, outras decisões similares afirmando ainconstitucionalidade da transferência de concessões e permissões: (i) TJPR, IDI336996-0/03, Rel. Des. Paulo Habith, Órgão Especial, data do julgamento 03.09.2012; (ii)TJMG, Agravo de Instrumento-Cv 1.0301.12.001956-9/001, Rel. Des. Peixoto Henriques,7ª Câmara Cível, julgamento em 05.11.2013, publicação da súmula em 08.11.2013; (iii)TJMG, Apelação Cível 1.0024.12.301169-4/002, Rel. Des. Corrêa Junior, 6ª CÂMARACÍVEL, julgamento em 08.10.2013, publicação da súmula em 18.10.2013; e (iv) TJSC,Apelação Cível n. 1997.001062-1, de Criciúma, Rel. Des. Trindade dos Santos, j.04.05.1999.

No Supremo Tribunal Federal, tramita a ADI 2946, proposta pelaProcuradoria Geral da República, requerendo a declaração da inconstitucionalidade doartigo 27 da Lei nº 8.987/1995 que, assim como a lei 4.117/1962, autoriza atransferência de concessões de serviços públicos mediante a prévia anuência do poderconcedente. Em sua petição inicial, a PGR53 observa que a autorização legal àtransferência direta e indireta de outorgas faz com que "a fraude ao sistema da licitaçãopública atinja raias de literal imoralidade", vez que permite "a uma determinadaempresa especializar-se em 'vencer concorrências públicas', repassando-as, em seguida,para empresas realmente interessadas no serviço"54. Em seu parecer, favorável àprocedência da ação, a PGR55 sustenta que tanto a "transferência da concessão" quanto a"transferência do controle societário da concessionária", viabilizadas pela "simplesanuência do poder público", permitem a contemplação de "quem se furtou ao certame",violando a regra constitucional segundo a qual "toda prestação de serviço público" nãopromovida diretamente pelo poder público deve ocorrer "sempre através de licitação".

Em suma, as transferências diretas e indiretas de concessões e permissõesde radiodifusão são inconstitucionais, levando à nulidade da transferência do SistemaItatiunga de Comunicação Ltda. Entretanto, caso este Douto Juízo entenda de maneira

53 PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA – PGR; FONTELES, Cláudio. Petição Inicial da Ação Direta deInconstitucionalidade nº 2946. Brasília, 23 jul. 2003, p. 5. Disponível em:<http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=368957#2%20-%20Peticao%20inicial>. Acesso em: 12.08.2014.

54 Há indícios de que esse comércio de contratos públicos já ocorre no setor de radiodifusão. Veja-seLOBATO, Elvira. Comércio ilegal de rádio e TV funciona sem repressão, cit.

55 PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA – PGR; FONTELES, Cláudio. Parecer nº 1343, relativo à AçãoDireta de Inconstitucionalidade nº 2946. Brasília, 11 fev. 2004, p. 3. Disponível em:<http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=2147534>. Acesso em: 31.08.2014.

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diversa, considerando que os dispositivos legais que autorizam a transferência sãoconstitucionais, reiteramos que, mesmo assim, a transferência do Sistema Itatiunga deComunicação Ltda. é nula por ausência de qualquer indício de anuência prévia do PoderExecutivo, bem como por existir sérios indícios de se trata de uma transferênciasimulada, conforme destacado acima.

Por fim, note-se que a transferência indireta da outorga de radiodifusão doSistema Itatiunga de Comunicação Ltda. enseja enriquecimento ilícito aos quotistasalienantes. Isso porque a outorga foi obtida em 1990, quando ainda não havia legislaçãoprevendo a necessidade de licitação para a outorga do serviço.

Trata-se de situação regulatória inconstitucional que vigeu na década de1990 no setor de radiodifusão. A despeito da exigência de licitação para outorga deserviços públicos feita pela Constituição de 1988, o procedimento de licitação e anecessidade de pagamento pela outorga só foram introduzidos no setor de radiodifusãopelo Decreto nº 1.720, de 28.11.1995. Logo, inúmeras outorgas do serviço feitas nadécada de 1990 não observaram a exigência constitucional de licitação.

A inconstitucionalidade da própria outorga, por falta de licitação, impede atransferência indireta onerosa da outorga, sob pena de enriquecimento ilícito. Afinal, osparticulares não podem obter lucro com a um ato inconstitucional.

Diante de todo o exposto, resta evidente que a transferência das quotasdetidas pelo Deputado Nabor Wanderley e demais sócios do Sistema Itatiunga deComunicação constitui um negócio jurídico nulo de pleno direito em razão da falta deanuência prévia do Poder Executivo e da inconstitucionalidade da transferência indiretada outorga de radiodifusão, da ausência de licitação para obtenção do serviço, doenriquecimento ilícito obtido com a operação, e da possível simulação do negóciojurídico pelo parentesco dos negociantes.

2.10. Sobre o art. 38, parágrafo único, da Lei n. 4.117/622.10. Sobre o art. 38, parágrafo único, da Lei n. 4.117/62

O Ministério das Comunicações afirma que "adota oficialmente" oentendimento de que o art. 54 da CF não proíbe a participação de congressistas como

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sócio de empresas de radiodifusão, com base, supostamente, no art. 38, parágrafo único,da Lei n. 4.117/62: “Não poderá exercer a função de diretor ou gerente de concessionária,permissionária ou autorizada de serviço de radiodifusão quem esteja no gozo deimunidade parlamentar ou de foro especial”.

Tal entendimento está profundamente equivocado, pois, como sedemonstrou, os artigos 54, I, "a" e 54, II, "a", da CF/88 proíbem a participação decongressistas como sócios de empresas de radiodifusão. O disposto em lei federal - seja alei 4.117/1962 ou qualquer outra lei infraconstitucional - não infirma nem tem o condãode afastar a proibição clara prevista pela Constituição.

Ademais, a interpretação adotada "oficialmente" pelo Ministério dasComunicações vai contra entendimento firmado pelo STF no julgamento da Ação Penal530, ocasião em que expressamente se consignou que "não merece endosso a posiçãotrazida aos autos em ofício do Ministério das Comunicações":

Em primeiro lugar, os incisos I, "a", e II, "a", do art. 54 da Constituição. Não importa onomen iuris pelo qual o serviço foi repassado ao parlamentar ou à empresa por elecontrolada, se concessão, permissão ou autorização. Viola a proibição constitucionalqualquer outorga ao parlamentar de benefício extravagante por parte da AdministraçãoPública direta ou indireta. (…) O que a lei pretendeu prevenir, como visto, foi a perigosareunião de poder político e controle sobre veículos de comunicação de massa, com osriscos inerentes de abuso e desvio. Não há como interpretar a lei no sentido de quevoltada a quem realiza as pequenas tarefas de gestão do cotidiano da empresa deradiodifusão, olvidando-se do controlador do empreendimento. O que a proibição legalvisa a impedir é a utilização do poder político para obtenção da outorga do serviço deradiodifusão, com o abuso desse serviço para atendimento aos interesses políticos, emprejuízo da liberdade de esfera de debate público. Não merece endosso, nessaperspectiva, a posição trazida aos autos em ofício do Ministério das Comunicações e emparecer da Câmara dos Deputados de que não haveria proibição para que parlamentarfosse proprietário de empresa titular de serviço radiodifusão (fls. 426-7, 1.008-9 e fls.1.942-3). Ao contrário do ali preconizado, a proibição é clara. Não fosse a proibição clarae não fosse a interpretação distorcida proveniente dos próprios beneficiários dadistorção, seria até o caso de reconhecer eventual erro de proibição por parte dosacusados. Entretanto, reconhecer erro de proibição, nas circunstâncias, equivaleria apremiar a interpretação distorcida e os próprios responsáveis por ela. Assim, incidindono caso as proibições do art. 54, I, "a", e II, "a", da Constituição Federal e do parágrafoúnico do art. 38 da Lei nº 4.117/1962, era e é vedado ao parlamentar ou empresa por

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este controlada receber do Governo Federal a outorga de serviço de radiodifusão sonora.

3.3. Da Tutela Antecipada De UrgênciaDa Tutela Antecipada De Urgência

A readequação da concessão pública de radiodifusão aos parâmetrosestabelecidos pela Constituição é medida necessária e urgente, tendo em vista que oprovimento tão somente ao final da ação permitirá a persistência de sua exploração emmoldes inadequados, dando espaço a abusos e irregularidades cometidos pelos réus.

Prevê o art. 300 do Código de Processo Civil, verbis: “A tutela de urgênciaserá concedida quando houver elementos que evidenciem a possibilidade do direito e operigo de dano ou risco ao resultado útil do processo”. O instituto da tutela de urgênciapermite a realização imediata do direito, ante os males da morosidade do processo.Dessa forma, desde que presente a probabilidade do direito invocado, ou a suaverossimilhança, a tutela jurisdicional será adiantada quando houver o periculum inmora, ou seja, o fundado receio de dano ou risco ao resultado útil do processo.

No caso em tela, os requisitos exigidos pelo diploma processual para odeferimento da tutela antecipada encontram-se devidamente preenchidos. Identificam-se, no presente caso, a verossimilhança do direito e o receio de dano irreparável.

A verossimilhança reside num juízo de probabilidade, resultante da análisedos motivos que lhe são favoráveis e dos que lhe são desfavoráveis. Se os motivosfavoráveis são superiores aos desfavoráveis, tal juízo aumenta. A prova tida porinequívoca é aquela aferível de plano. A prova inequívoca decorre do procedimentoadministrativo que instrui a presente ação, contendo provas materiais dos fatosnarrados ao longo desta petição inicial. A existência de verossimilhança mostra-se clara,conforme a argumentação e os fatos expostos e a documentação anexa.

O receio de dano irreparável, por sua vez, encontra-se consubstanciado norisco de que seja dada continuidade à exploração irregular do serviço de radiodifusãopela ré, em violação aos preceitos constitucionais já destacados, principalmente dianteda consideração de que as eleições de 2018 já estão bastante próximas e que, no atual

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cenário de instabilidade política do país, o controle de veículos midiáticos se tornouainda mais importante.

Ademais, conforme acompanhamento do panorama político regional, tantoNabor Wanderley quanto seu filho Hugo Motta serão candidatos à reeleição,respectivamente, para Deputado Estadual e Deputado Federal, em outubro próximo.

O Supremo já reconheceu a interpretação do art. 54 da Constituição aquiarguida no bojo do julgamento da Ação Penal AP 530 e a tutela antecipada é necessáriapara fazer cessar uma ilegalidade que já perdura por anos, bem como para impedir que aviolação de um conjunto de preceitos constitucionais seja perpetuada.

A jurisprudência pátria já reconhece a urgência da concessão da tutelapara esse tipo de caso, a exemplo da Justiça Federal do Paraná, que, no bojo do Agravo deInstrumento 0012093-34.2017.4.01.0000, concedeu a antecipação dos efeitos da tutelarequerida pelo Ministério Público Federal:

Ademais, da simples leitura da alteração contratual em referência, verifica-se que oquadro de sócios da mencionada empresa é constituído por membros outros da famíliados promovidos nominados, sendo de se destacar que o próprio Jader FontenelleBarbalho, embora excluído da sociedade empresarial, continua a representar a suasubstituta - Giovanna Centeno Barbalho -, conforme assentado na Cláusula Segunda doreferido documento, a demonstrar, em princípio, a ocorrência de possível manobra paraocultar o nome dos reais controladores da sobredita empresa de radiodifusão. No mais,não obstante os fundamentos contidos na decisão agravada, vejo presentes, na espécie, ospressupostos do art. 1019, I, do CPC, a autorizar a concessão da almejada antecipação datutela recursal, mormente em face do comando proibitivo da norma do artigo 54, incisosI, a, e II, a, da Carta Política Federal, com a possibilidade, em tese, de sofrer a sançãoprevista no artigo 55, I, do Texto Fundamental, nos termos do § 2º do referido artigo 55constitucional, enquanto no exercício do seu mandato, que assim dispõem: Art. 54. OsDeputados e Senadores não poderão: I - desde a expedição do diploma: a) firmar oumanter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública,sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvoquando o contrato obedecer a cláusulas uniformes; b) aceitar ou exercer cargo, função ouemprego remunerado, inclusive os de que sejam demissíveis "ad nutum", nas entidadesconstantes da alínea anterior; II - desde a posse: a) ser proprietários, controladores oudiretores de empresa que goze de favor decorrente de contrato com pessoa jurídica dedireito público, ou nela exercer função remunerada; b) ocupar cargo ou função de que

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sejam demissíveis "ad nutum", nas entidades referidas no inciso I, a; c) patrocinar causaem que seja interessada qualquer das entidades a que se refere o inciso I, a; d) sertitulares de mais de um cargo ou mandato público eletivo. Art. 55. Perderá o mandato oDeputado ou Senador: I - que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigoanterior; () § 2º Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pelaCâmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por maioria absoluta, medianteprovocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no CongressoNacional, assegurada ampla defesa. Acerca da aplicação dos dispositivos constitucionaisacima referidas, confira se precedente jurisprudencial do colendo Supremo TribunalFederal, que, a despeito de ter sido proferido no bojo de ação penal em que se apurou aresponsabilidade de parlamentar pelos crimes de falsidade ideológica e de uso dedocumento falso, teve por suporte fático, justamente, a vedação constitucional emreferência, in verbis: DIREITO PENAL. CRIMES DE FALSIDADE IDEOLÓGICA E DE USO DEDOCUMENTO FALSO. 1. Admite-se a possibilidade de que a denúncia anônima sirva paradeflagrar uma investigação policial, desde que esta seja seguida da devida apuração dosfatos nela noticiados. Precedente citado. 2. Não há nulidade automática na tomada dedeclarações sem a advertência do direito ao silêncio, salvo quando demonstrada aausência do caráter voluntário do ato. Ademais, a presença de defensor durante ointerrogatório do investigado ou acusado corrobora a higidez do ato. Precedente citado.3. Condenação pelo crime de falso. Restou provada a falsidade do contrato social daradiodifusão Dinâmica, sendo o primeiro acusado o verdadeiro controlador. Com efeito, odenunciado omitiu esta condição por ser parlamentar federal, diante da vedação previstano art. 54 da Constituição Federal e no art. 38, § 1º, da Lei nº 4.117/62. 4. De acordo coma jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, o crimede uso, quando cometido pelo próprio agente que falsificou o documento, configura "postfactum" não punível, vale dizer, é mero exaurimento do crime de falso. Impossibilidade decondenação pelo crime previsto no art. 304 do Código Penal. 5. A alteração do contratosocial não constitui novo crime, já que a finalidade do agente já havia sido atingidaquando da primeira falsificação do contrato social. 6. O contrato social não pode serequiparado a documento público, que é criado por funcionário público, no desempenhodas suas atividades, em conformidade com as formalidades previstas em lei. 7. Extinçãoda punibilidade dos acusados, em face da prescrição da pretensão punitiva, baseada naspenas em concreto, restando prejudicada a condenação (AP 530, Relator (a): Min. ROSAWEBER, Relator (a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em09/09/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-225 DIVULG 14-11-2014 PUBLIC 17-11-2014REPUBLICAÇÃO: DJe-250 DIVULG 18-12-2014 PUBLIC 19-12-2014). Com estasconsiderações, defiro o pedido de antecipação da tutela recursal, para determinar aimediata suspensão da execução do serviço de radiodifusão sonora da requerida RádioClube do Pará PRC-5 Ltda, devendo a União Federal se abster de conceder-lhe novasoutorgas de serviço de radiodifusão, até o pronunciamento definitivo da Turmajulgadora. (Agravo de Instrumento n. 0012093-34.2017.4.01.0000, Tribunal RegionalFederal da 1ª Região, Des. Federal Souza Prudente, julgado em 31 de maio de 2017,Publicado no Caderno Jucidial do TRF-1 de 2 de junho de 2017).

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No mesmo sentido, a decisão do TRF-1:

Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pelo Ministério Público Federal contradecisão que, em ação civil pública, indeferiu a antecipação de tutela cujo objeto era asuspensão da execução do serviço de radiodifusão sonora da Rádio Cultura FM SantosLtda., da Sociedade Rádio Cultura São Vicente Ltda. E da Empresa de Comunicação PRMLtda, bem como a não concessão de novas outorgas de serviços de radiodifusão, em razãode Paulo Roberto Gomes Mansur, deputado federal, figurar em seu quadro societário. []Ora, é fato público e notório que vários parlamntares detém, por interpostas pessoasjurídicas a concessão, permissão ou autorização para o funcionamento dessas empresas, oque além de imoral é vedado pelo ordenamento jurídico. [] Não pode haver decisãojudicial contrária ao texto constitucional, que é a carta política da sociedade democráticabrasileira. Aliás, as empresas em mãos dos congressistas alinhados no proibitivoconstitucional, constituem um risco para a própria transparência e lisura do pleitoeleitoral, na medida em que pode o eventual candidato ser favorecido por ter em mãos aindigitada concessão. Favorecer raciocínio inverso seria conceder ao parlamentar ser o"controler" de seus próprios interesses, de seu próprio negócio jurídico. É tambémpúblico e notório que ' (um) em cada 5 (cinco) parlamentares seriam membros da própriaCCTCI e sócios de concessão pública no setor. [] Ante o exposto, concedo a antecipação datutela recursal requerida, para os fins previstos nos itens "a" e "b" da incial. (Agravo deInstrumento 0002888-58.2016.4.03.0000/SP, Relatora Desembargadora Marli Ferreira,julgado no dia 07 de abril de 2016).

Assim, para que o provimento jurisdicional buscado nestes autos possuautilidade e efetividade, necessária a concessão de tutela antecipada para que: (i) sejasuspensa a execução do serviço de radiodifusão sonora da Rádio Itatiunga FM; e (ii) aUnião se abstenha de conceder novas outorgas de serviço de radiodifusão aos réus, aindaque por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócia.

4. Dos Pedidos4. Dos Pedidos

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Assim, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL requer a Vossa Excelência:

a) a concessão de tutela de urgência para que (i) seja suspensa a execuçãodo serviço de radiodifusão sonora da Rádio Itatiunga FM; e (ii) a União seabstenha de conceder novas outorgas de serviço de radiodifusão aos réus,ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócia;

b) a citação dos réus, sob pena de revelia;

c) o cancelamento (ou não renovação caso já esteja vencida) dos serviçosde radiofusão sonora outorgado à Rádio Itatiunga FM;

d) condenação da União, por intermédio do Ministério das Comunicações,na obrigação de fazer consistente em relicitar os serviços de radiodifusãooutorgado à Rádio Itatiunga FM;

e) a condenação da União (Ministério das Comunicações) a se abster deconceder aos réus renovação ou futuras outorgas para exploração doserviço de radiodifusão, ainda que por intermédio de pessoa jurídica daqual seja sócia;

f) a condenação dos requeridos nos ônus da sucumbência.

Protesta ratificar o alegado por todas as provas em direito admitidas.

Dá-se à causa o valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais).

Patos, data de validação no sistema Pje.

(assinado digitalmente)TIAGO MISAEL DE J. MARTINSTIAGO MISAEL DE J. MARTINS

Procurador da RepúblicaProcurador da República

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