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IV Seminário Nacional de Formação de Gestores e Educadores 1 MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO SECRETARIA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL BRASÍLIA -- DF 2007

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IV Seminário Nacional de Formação de Gestores e Educadores

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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃOSECRETARIA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL

BRASÍLIA -- DF2007

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Ministério da EducaçãoMinistério da EducaçãoMinistério da EducaçãoMinistério da EducaçãoMinistério da Educação

Secretaria de Educação EspecialSecretaria de Educação EspecialSecretaria de Educação EspecialSecretaria de Educação EspecialSecretaria de Educação Especial

Departamento de Políticas de Educação EspecialDepartamento de Políticas de Educação EspecialDepartamento de Políticas de Educação EspecialDepartamento de Políticas de Educação EspecialDepartamento de Políticas de Educação Especial

Coordenação Geral de Articulação da Política de InclusãoCoordenação Geral de Articulação da Política de InclusãoCoordenação Geral de Articulação da Política de InclusãoCoordenação Geral de Articulação da Política de InclusãoCoordenação Geral de Articulação da Política de Inclusão

Dados Internacionais da Catalogação na Publicação (CIP)Centro de Informação e Biblioteca em Educação (CIBEC)

Ensaios pedagógicos. Brasília: Ministério da Educação,Secretaria de Educação Especial, 2007.194 p.

ISBN: 978-85-60331-25-3

IV Seminário Nacional de Formação de Gestores e Educadores --Educação Inclusiva : direito à diversidade.

1. Educação inclusiva. 2. Inclusão educacional. I. Brasil.Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. II. Título.

CDU 376

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IV Seminário Nacional de Formação de Gestores e Educadores

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ApresentaçãoApresentaçãoApresentaçãoApresentaçãoApresentação

Ensaios PedagógicosEnsaios PedagógicosEnsaios PedagógicosEnsaios PedagógicosEnsaios Pedagógicos

A coletânea de textos que compõe os Ensaios Pedagógicos aqui apresentados é oresultado das palestras que pautaram o IV Seminário Nacional do Programa EducaçãoInclusiva: direito à diversidade, realizado pela Secretaria de Educação Especial doMinistério da Educação (MEC), envolvendo os 147 municípios-pólo do Programa, os 26Estados e o Distrito Federal no debate sobre a elaboração de uma política nacional deeducação especial na perspectiva da educação inclusiva.

Os Ensaios Pedagógicos refletem o contexto de redefinição das políticas públicas eafirmação de um sistema educacional inclusivo; um momento marcado pela ampliaçãoda pesquisa educacional que passa a reconhecer os limites e dificuldades para enfrentaros desafios colocados a partir de uma visão mais complexa. Assim, suas contribuiçõespermitem refletir sobre a realidade educacional e articular diferentes saberes em tornodas questões educacionais, como o trabalho docente, as práticas pedagógicas e as relaçõesentre os sujeitos envolvidos no processo de ensino e aprendizagem, bem como açõesque rompem com a visão reducionista de eqüidade e assumem o compromisso com avisão emancipatória de articulação do direito à igualdade e valorização das diferençasna escola.

Ao discorrer acerca do processo de discussão, construção e implementação daPolítica Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva, o artigoEducação Especial: a travessia na tempestade, das autoras Cláudia Pereira Dutra Cláudia Pereira Dutra Cláudia Pereira Dutra Cláudia Pereira Dutra Cláudia Pereira Dutra e Cláudia Cláudia Cláudia Cláudia CláudiaMaffini GriboskiMaffini GriboskiMaffini GriboskiMaffini GriboskiMaffini Griboski, situa-se em torno de três eixos: o movimento da educação inclusiva, anecessidade de configuração de uma nova política nacional de educação especial e asações e estratégias de implementação dessa proposta educacional articuladas pelaSecretaria de Educação Especial do Ministério da Educação. Permeado pela premissa dereconhecimento do direito à educação de qualidade e emancipadora para todos osalunos, o artigo explicita os princípios condutores da organização dos sistemas de ensinopara a transformação em sistemas educacionais inclusivos, problematizando osfundamentos integracionistas da Política Nacional de Educação Especial de 1994.O artigo diz que o momento atual de reconfiguração das ações político-organizacionaisda educação especial instaura um novo tempo de atuação coletiva, reafirmando aautonomia como finalidade da educação.

Denise de Oliveira AlvesDenise de Oliveira AlvesDenise de Oliveira AlvesDenise de Oliveira AlvesDenise de Oliveira Alves e Kátia Aparecida Marangon BarbosaKátia Aparecida Marangon BarbosaKátia Aparecida Marangon BarbosaKátia Aparecida Marangon BarbosaKátia Aparecida Marangon Barbosa, objetivando discutiras concepções advindas dos paradigmas de integração e inclusão na educação, no artigoPolítica Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva –problematizações conceituais, discorrem a respeito dos conceitos de educação especiale sua função no sistema de ensino, lançando princípios orientadores para a

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reinterpretação do atendimento educacional especializado, à luz dos pressupostos daeducação inclusiva. Na proposição teórica, as autoras indicam o movimento de inclusãocomo uma ruptura quanto aos paradigmas de educação especial anteriores e investemnessa concepção como possibilidade de transformar os sistemas de ensino em espaçosde aprendizagem e participação de todos os alunos, por meio do trabalho colaborativoentre profissionais da educação comum e profissionais da educação especial.

No artigo Educação Inclusiva: mais qualidade à educação, David RodriguesDavid RodriguesDavid RodriguesDavid RodriguesDavid Rodriguesquestiona o uso do termo “qualidade” como um valor normativo e absoluto, que ignoraos contextos educativos e, desse modo, as condições históricas em que se define oconceito. O autor traz à tona a importante relação entre a qualidade e a inclusão,chamando atenção para a valorização da prática educacional inclusiva e das turmasheterogêneas representativas da comunidade. Em contraposição à idéia de qualidadeassociada a critérios meritocráticos de competição e seleção, propõe inverter essa lógicadefinindo qualidade como “uma gama alargada de saberes, competências e atitudesque se reporte a diferentes atores, diferentes capacidades e a diferentes objetivos deaprendizagem”. Para contribuir com o debate no Brasil, aborda políticas públicas deeducação inclusiva, dando ênfase no fortalecimento da escola para responder aos diversosdesafios postos pela inclusão.

Em Berço das desigualdades, José PachecoJosé PachecoJosé PachecoJosé PachecoJosé Pacheco inspira-se na obra de SebastiãoSalgado, nas imagens de crianças vítimas das desigualdades, para afirmar que a “escola,concebida como berço de oportunidades ainda é um berço de desigualdades”. Assim,questiona no âmbito das políticas educacionais, as medidas avulsas para atender aquestões de natureza global, que ultrapassam as fronteiras da escola e da sala de aula.Também alerta as escolas para uma massificação que significa o tratamento aos desiguaiscomo se fossem iguais, que se confirma nos processos de exclusão e resistência a umapedagogia diferenciada; processos podem ser superados pelo potencial transformadordos professores.

O artigo A inclusão como dispositivo, de autoria de Marisa FMarisa FMarisa FMarisa FMarisa Faermann Eizirikaermann Eizirikaermann Eizirikaermann Eizirikaermann Eizirik, propõea análise da inclusão pelo seu avesso, ou seja, a exclusão. Segundo a autora, pensar ainclusão escolar como um projeto revolucionário, em processo de implantação, demandaa gestação de uma mentalidade inclusiva, constituinte de novas formas de subjetividade.A contextualização referenciada nos pressupostos de Michel Foucault indica três tópicosde análise: a inclusão como dispositivo; os dispositivos de poder; e o desafio da diferença.Na análise, a educação inclusiva é concebida como uma prática revolucionária, uma vezque desaloja poderes e saberes instituídos e conduz à articulação de estratégiastransformadoras, que não consistem em repetição, mas em inovação; em gestar o novo,o fazer educacional desconhecido a partir do embate com o tradicional, com oestabelecido.

Sob o título Sobre o especial na e o especial da educação – breves considerações,Maria TMaria TMaria TMaria TMaria Teresa Mantoaneresa Mantoaneresa Mantoaneresa Mantoaneresa Mantoan diferencia as expressões da e na educação, ensejando ampliar o

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debate para a tomada de posição quanto aos rumos que a educação brasileira deveseguir. A autora pontua que, seguindo os pressupostos fundadores da educação inclusiva,dentre esses, o princípio de uma escola para todos, o especial na educação refere-se aocomplemento da formação dos alunos com deficiência, ou seja, o atendimentoeducacional especializado, que deve assegurar o prosseguimento da escolarização nasescolas comuns, sem assumir a condição de substituir a escolarização. Por sua vez, oespecial da educação refere-se à ressignificação da escola comum no que tange aoatendimento às diferenças e à superação dos ditames modernos enrijecedores da práticaeducativa. De acordo com a autora, compreendendo o especial na e da educação especialsob o referencial do reconhecimento e valorização das diferenças, poderão ser construídosnovos pilares para a sustentação da escola.

Inserindo na discussão, Claudio Roberto Baptista Claudio Roberto Baptista Claudio Roberto Baptista Claudio Roberto Baptista Claudio Roberto Baptista apresenta reflexões no artigoPolítica e Educação Especial: quais interrogações e quais riscos quanto ao futuro da inclusãoescolar? As questões pontuadas discorrem sobre como provocar mudanças e qual a direçãopara que a educação inclusiva se consolide. Provoca todos para a tarefa do diálogo quenão simplifique os desafios postos para instituição da nova política anunciada e permitarealizar um movimento no movimento. Diante da intensidade das perguntas, chamaatenção para o envolvimento de outros setores para a viabilização do processo inclusivono ensino comum, que não se restringe a educação especial. Atento ao conceito de“necessidades educacionais especiais” que tem orientado a política educacional,considera os efeitos de abandonar o termo associado ao contexto e adotar parâmetros apartir da deficiência que podem valorizar o diagnóstico e acentuar os rótulos. Propõe umaprofundamento da dimensão pedagógica, função da sala de recursos e ação do professor,considerando o desafio de pensá-los de forma articulada a um projeto geral que valorizea inclusão.

No artigo, O currículo em grades: mais um desafio para a Educação Inclusiva,Soraia Napoleão FSoraia Napoleão FSoraia Napoleão FSoraia Napoleão FSoraia Napoleão Freitas reitas reitas reitas reitas e Antônio do Carlos do Nascimento Osório Antônio do Carlos do Nascimento Osório Antônio do Carlos do Nascimento Osório Antônio do Carlos do Nascimento Osório Antônio do Carlos do Nascimento Osório incentivam essareflexão, considerando que currículo pode ser um instrumento de compreensão eorganização do conhecimento fragmentado e disciplinar, consolidado por meio deestruturas reguladoras, fruto das relações de poder e dos conflitos culturais. Situandosuas referências no contexto da educação inclusiva e das mudanças na política deeducação especial, analisam a perspectiva curricular que tem o aluno como centro doprocesso de aprendizagem e sujeito do próprio conhecimento. Assim problematizamo currículo anunciado como redenção de justiça e cidadania, inserindo este no espaçodinâmico e contraditório das disputas e conflitos, não como receptáculo de conteúdos.Ao pensá-lo como eixo articulador das concepções macro e micro estrutural,aproximando as práticas pedagógicas e práticas sociais exercidas, são identificadas aspossibilidades de construção de um currículo crítico que não represente seletividadesocial e pedagógica.

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EEEEEduardo José Manziniduardo José Manziniduardo José Manziniduardo José Manziniduardo José Manzini, partindo da constatação da crescente presença de alunoscom deficiência nas classes comuns de ensino regular, incentivada por meio decampanhas sobre inclusão e pela legislação que respalda o direito ao trabalho, educaçãoe acessibilidade, escreve sobre a Formação continuada do professor para atender àEducação Inclusiva. Nesse contexto, destaca as leis que já influenciam os cursos deformação de professores, a inserção de disciplinas voltadas ao atendimento a alunoscom deficiência em vários currículos de pedagogia e as pesquisas que indicam avançona busca de preparação por parte dos docentes. Sobre a formação continuada, apontaque os planos de aula precisam ser revitalizados tornando possível o ensino reflexivo ea colaborativo, que a opção teórica que fundamenta a prática precisa ser compreendidapelo docente, de forma que possibilite conduzir, explicar, avaliar, reformular seu planode ensino, assim “criar condições para que o seu aluno consiga tomar posse do currículoque ele precisa”.

Soraia Napoleão de FSoraia Napoleão de FSoraia Napoleão de FSoraia Napoleão de FSoraia Napoleão de Freitas reitas reitas reitas reitas e Denise de Souza Fleith Denise de Souza Fleith Denise de Souza Fleith Denise de Souza Fleith Denise de Souza Fleith, contemplando a reflexãoacerca das diferentes manifestações presentes no contexto escolar, introduzem a temáticaEducação de alunos com características de altas habilidades/superdotação e a formaçãodocente sob a ótica da diversidade e da inclusão. Para as autoras, o movimento devalorização das diferenças sociais, emocionais, cognitivas, físicas e culturais e por umaeducação que atenda às necessidades dos alunos, implica modificar suas práticas, demodo a contemplar diferentes estilos e ritmos de aprendizagem, habilidades e interessesem sala de aula. Assim, a formação inicial e continuada de professores deve indicarrespostas compatíveis às propostas educacionais inclusivas, criando estratégias para ainclusão dos alunos superdotados que têm acesso à educação em classes comuns, porémnão encontram oportunidades educacionais adequadas aos seus interesses ecompetências. Relacionam a resistência à implementação de políticas nesta área ascompreensões equivocadas e estereotipadas acerca dos alunos com altas habilidades/superdotação, que desconsideram as importantes relações entre as característicasindividuais e os fatores socioculturais envolvidos nessa definição.

Maria Amélia AlmeidaMaria Amélia AlmeidaMaria Amélia AlmeidaMaria Amélia AlmeidaMaria Amélia Almeida, no artigo Da segregação à inclusão: o percurso feito peloBrasil em relação a outros países buscou pontuar os principais acontecimentos políticos,sociais e legais que marcaram o percurso brasileiro e mundial da educação especial emdireção à consolidação da proposta de educação inclusiva. O artigo demarca a relaçãoexistente as políticas públicas e os principais eventos sociais, e como esses definiram asações educacionais das pessoas com deficiência. Nos encaminhamentos finais, a autoraressalta que os sentimentos de insegurança, incerteza e desassossego, que poderãopermear a prática do professor no processo de implementação da Política Nacional deEducação Especial na perspectiva da educação inclusiva, podem transformar-se empossibilidades de mudança e transformação dos sistemas de ensino brasileiros.

Sob o título Inclusão de surdos: pela peça que encaixa nesse quebra-cabeça, RoniceRoniceRoniceRoniceRoniceMüller de QuadrosMüller de QuadrosMüller de QuadrosMüller de QuadrosMüller de Quadros, defende que no caso da inclusão dos surdos a peça que se encaixa

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na política é a garantia de uma educação de qualidade na língua de sinais. Diante daspolíticas públicas que defendem o direito dos alunos freqüentarem as escolas da suacomunidade, reforça que deverão ter condições escolares na “escola da esquina do seubairro”, o que impõe uma educação que assegure as questões lingüísticas. Considerandoas alternativas para eliminar as barreiras nas comunicações nas escolas com matrícula dealunos surdos, questiona a viabilidade econômica de disponibilizar intérpretes, bem comoas questões metodológicas que deixam a desejar. Ao concluir, manifesta que os surdosapesar de insatisfeitos com algumas propostas pedagógicas, estão interessados no sucessodas políticas educacionais, existindo, portanto, possibilidade de negociação eaproximação, em uma perspectiva que consolide os princípios da inclusão e a garantiados direitos humanos.

Outro importante enfoque estabelecido por Ricardo TRicardo TRicardo TRicardo TRicardo Tadeu Marques daadeu Marques daadeu Marques daadeu Marques daadeu Marques daFonsecaFonsecaFonsecaFonsecaFonseca, em seu artigo Os efeitos da 8ª Convenção Internacional da ONU e o acessoao mercado de trabalho para as pessoas com deficiência, situa a atuação do MinistérioPúblico para a inserção de pessoas com deficiência no mercado de trabalho e,paradoxalmente, as condições de exclusão e ausência de cidadania ainda presentes.Na análise registra a relação entre as transformações no mundo do trabalho, aglobalização, os avanços da tecnologia e a crise de valores humanos que marcamnosso tempo, destacando que as respostas à crise são geradas no seu interior pelaafirmação dos movimentos que emergem na defesa dos direitos humanos. Para asuperação das barreiras físicas e atitudinais que limitam a participação das pessoascom deficiência enfatiza a idéia de sociedade inclusiva, destacando a Convenção daONU aprovada em 2006, como instrumento jurídico importante para que os direitosjá construídos anteriormente sejam efetivamente aplicados às pessoas comdeficiência, dentre eles o direito ao trabalho.

A mobilização social e o protagonismo das pessoas com deficiência são debatidospor Martinha Clarete DutraMartinha Clarete DutraMartinha Clarete DutraMartinha Clarete DutraMartinha Clarete Dutra no texto Inclusão social da pessoa com deficiência: umaquestão de políticas públicas, no qual defende um movimento pedagógico das políticasvoltado às pessoas com deficiência, de forma que passem atender ao princípio dedesenvolvimento da autonomia, independência e emancipação da pessoa comdeficiência. Nesse percurso, alerta para o controle social que pode ser consolidado pormeio da atuação dos Conselhos de defesa de direitos das pessoas com deficiência,paritários e representativos, que têm competência para propor, avaliar e acompanhar asações para a inclusão e garantia dos direitos.

Na perspectiva contribuir para reduzir a distância existente entre a produção acadêmicae a realidade educacional, José Geraldo Silveira BuenoJosé Geraldo Silveira BuenoJosé Geraldo Silveira BuenoJosé Geraldo Silveira BuenoJosé Geraldo Silveira Bueno apresenta o artigo intituladoA produção discente do grupo de pesquisa Inclusão/Exclusão Escolar e Desigualdades Sociais,referente ao trabalho do grupo de pesquisa coordenado por ele na PUC/SP. Desse modo,explicita duas frentes de estudos, uma referente aos processos de escolarização e seletividadeescolar e outra sobre políticas e práticas de inclusão escolar; também ressalta as tendências

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da produção discente do Programa em um balanço que reflete as trajetórias investigativas dogrupo, voltadas aos processos de inclusão e exclusão escolar.

Conforme Dulce Barros de AlmeidaDulce Barros de AlmeidaDulce Barros de AlmeidaDulce Barros de AlmeidaDulce Barros de Almeida, apesar de importantes avanços alcançados, auniversidade brasileira tem sido marcada pela exclusão das camadas menos favorecidas,dentre elas as pessoas com deficiência. Buscando discutir tais questões, traz o artigoO papel da universidade diante da inclusão, identificando processos de massificação daeducação superior sem democratização do acesso. Ao mesmo tempo em que reafirma aresponsabilidade do Estado na política de educação superior, chama cada instituição areverter o quadro atual e desafia todos os educadores a refletir sobre as políticas decombate a exclusão e oportunidades oferecidas para que todos possam usufruir seusdireitos enquanto cidadãos. Para contribuir, faz um relato de ações efetivadas pelaFaculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás, avançadas em relação àinclusão escolar e a formação comprometida de modo a beneficiar pessoas marginalizadasdo processo educacional.

LLLLLuzia Lima-Rodrigues uzia Lima-Rodrigues uzia Lima-Rodrigues uzia Lima-Rodrigues uzia Lima-Rodrigues apresenta o artigo Percursos de Educação Inclusiva emPortugal: dez estudos de caso, que reflete as iniciativas do projeto realizado pelo Fórumde Estudos de Educação Inclusiva -- Universidade Técnica de Lisboa. O estudo buscouidentificar as representações/percepções da comunidade escolar relativas aos aspectosfacilitadores e às barreiras para a inclusão, relacionando-as com as perspectivas maisrecentes da inclusão. Assim, a autora descreve as etapas do projeto, incluindo a seleção,os instrumentos utilizados para caracterizar as escolas e para conhecer a opinião dosentrevistados, os procedimentos e a análise dos discursos. Conclui que as “boas práticas”não são as melhores práticas nem receitas perfeitas para a inclusão, mas o percursorealizado pelas escolas para se tornarem mais inclusivas.

A partir de um breve histórico que envolve a organização dos movimentos daspessoas com deficiência, fins da década 1970 e início dos anos 1980, Joiran MedeirosJoiran MedeirosJoiran MedeirosJoiran MedeirosJoiran Medeirosda Silvada Silvada Silvada Silvada Silva descreve sobre a Trajetória da Educação Especial no RN: da integração à inclusão,citando as lutas que alavancaram uma mudança de postura com relação às pessoas comdeficiência. Seu olhar volta-se para a importância da educação inclusiva na rede públicaestadual, processo iniciado em 1991 e considerado inovador por desativar as classesespeciais e efetuar a matrícula de todos os alunos nas classes comuns do ensino regular.Diante dos questionamentos da viabilidade da inclusão, destaca a criação da UniversidadeFederal do Rio Grande do Norte (UFRN), contribuindo na formação continuada deprofessores e o Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade que fortalece o trabalhoda Superintendência de Educação Especial na sustentação do processo de escolarizaçãodos alunos com necessidades educacionais especiais.

Na introdução do texto Educação Inclusiva: um processo em construção, MérciaMérciaMérciaMérciaMérciaMaria Melo dos SantosMaria Melo dos SantosMaria Melo dos SantosMaria Melo dos SantosMaria Melo dos Santos, lança a reflexão sobre o porquê pensar em uma política deinclusão e o significado de incluir, percebendo que falar de inclusão é também falarde exclusão. Buscando pensar em tais questões, se a escola persegue direito

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educacional de todos os alunos, faz um relato das ações da educação especial nomunicípio de Recife demonstrando que os avanços acontecem e que há uma gradativatransformação no sistema educacional. Ao considerar que a inclusão não diz respeitoapenas às pessoas com deficiência e que não basta o acesso físico na escola paramodificar a realidade excludente, a autora defende a necessidade de gerar serviçosde apoio para o processo inclusivo.

Para Rita VRita VRita VRita VRita Vieira de Fieira de Fieira de Fieira de Fieira de Figueiredoigueiredoigueiredoigueiredoigueiredo, em A construção da Escola Inclusiva: uma metapossível, transformar as escolas visando à inclusão e ao acesso de todos os alunos noensino regular exige investimento, especialmente na formação dos professores pararesponder a diversidade dos seus alunos e possibilitar uma mudança na cultura da escola.Essa nova organização da gestão e do ensino é abordada a partir de uma visão deredimensionamento da organização do tempo e do espaço educativo e do seu sistemade valores, que deve ser pautado no compromisso de toda a comunidade. Para ilustraresse processo, a autora traz o relato de uma professora que nos permite penetrar nocotidiano da sala de aula, ouvir sua voz e compartilhar uma experiência que englobouaspectos do planejamento, estratégias e apoios pedagógicos, da relação no grupo dealunos, da reflexão e formação docente e da contribuição do grupo de pesquisa daUniversidade Federal do Ceará.

A inclusão na educação infantil é o objeto do trabalho desenvolvido por MarildaMarildaMarildaMarildaMarildaMoraes Garcia BrunoMoraes Garcia BrunoMoraes Garcia BrunoMoraes Garcia BrunoMoraes Garcia Bruno, em A construção da Escola Inclusiva: uma análise das políticaspúblicas e da prática pedagógica no contexto da Educação Infantil. A perspectiva é enfocaro conceito de educação infantil como direito social, em contraposição ao assistencialismoque historicamente referendou as práticas nessa área, introduzindo concepções maisatuais sobre o espaço privilegiado da educação infantil para conviver com a diversidadecultural e social e combater a exclusão das crianças com deficiência. Ao discutir as políticaspúblicas analisa que as preocupações com a inclusão educacional de crianças comdeficiência são recentes no Brasil e que a integralidade dos direitos está longe de sergarantida. Ressalta que o atendimento educacional especializado deve iniciar na educaçãoinfantil, envolvendo a escola, a família e a comunidade; sendo à oferta limitada de vagase de professores com formação para lidar com a diversidade e atuar na educação infantil,um grande desafio a ser enfrentado.

Por fim, PPPPPatrícia Albino Galvão Patrícia Albino Galvão Patrícia Albino Galvão Patrícia Albino Galvão Patrícia Albino Galvão Pontes ontes ontes ontes ontes e Rebecca Monte Nunes BezerraRebecca Monte Nunes BezerraRebecca Monte Nunes BezerraRebecca Monte Nunes BezerraRebecca Monte Nunes Bezerra, no artigoA escola é para todos: o Ministério Público e a tutela do direito das pessoas com deficiênciaà educação, discorrem acerca dos direitos constitucionais das pessoas com deficiência,dentre esses, a educação. As autoras defendem a construção de uma sociedade e deuma escola inclusiva e problematizam as práticas educacionais realizadas em escolas eclasses especiais, considerando estas formas de exclusão social. Tendo como princípioque o convívio com a diversidade favorece a construção da cidadania, o artigo descreveas ações que o Ministério Público do Rio Grande do Norte, em parceria com a Empresade Correios e Telégrafos, articulou para a identificação das pessoas com deficiência que

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não freqüentavam a escola. Diante da realidade encontrada, as autoras pontuam asprovidências que foram implementadas para a promoção da inclusão educacional.

Espera-se que os textos compilados nessa produção possam qualificar o debatevisando, não a superação dos impasses subjacentes ao contexto de implementação daeducação inclusiva no Brasil, mas um aprofundamento que amplie a capacidade de diálogoe interação na construção de uma política renovada de educação especial inserida naproposta global de educação inclusiva.

Claudia Pereira Dutra

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SumárioSumárioSumárioSumárioSumário

Educação Especial: a travessia na tempestade ........................................................... 13Claudia Pereira Dutra e Cláudia Maffini Griboski

Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da EducaçãoInclusiva – problematizações conceituais .................................................................. 23Denise de Oliveira Alves e Kátia Aparecida Marangon Barbosa

Educação Inclusiva: mais qualidade à educação ....................................................... 29David Rodrigues

Berço das desigualdades ........................................................................................... 37José Pacheco

A Inclusão como dispositivo ...................................................................................... 39Marisa Faermann Eizirik

Sobre o especial na e o especial da educação -- breves considerações ..................... 49Maria Teresa Eglér Mantoan

Política e Educação Especial: quais interrogações e quais riscos quanto aofuturo da inclusão escolar? ........................................................................................ 55Claudio Roberto Baptista

O currículo em grades: mais um desafio para a Educação Inclusiva ........................... 63Soraia Napoleão Freitas e Antônio Carlos do Nascimento Osório

Formação continuada do professor para atender à Educação Inclusiva ................... 77Eduardo José Manzini

Educação de alunos com características de altas habilidades/superdotação e aformação docente sob a ótica da diversidade e da inclusão ...................................... 85Soraia Napoleão Freitas e Denise de Souza Fleith

Da segregação à inclusão: o percurso feito pelo Brasil em relação a outros países ..... 95Maria Amelia Almeida

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Inclusão de surdos: pela peça que encaixa nesse quebra-cabeça ............................ 105Ronice Müller de Quadros

Os efeitos da 8ª Convenção Internacional da ONU e o acesso ao mercado detrabalho para as pessoas com deficiência ................................................................ 109Ricardo Tadeu Marques da Fonseca

Inclusão social da pessoa com deficiência: uma questão de políticas públicas ........ 117Martinha Clarete Dutra

A produção discente do grupo de pesquisa Inclusão/Exclusão Escolar eDesigualdades Sociais ............................................................................................. 121José Geraldo Silveira Bueno

O papel da universidade diante da inclusão ........................................................... 133Dulce Barros de Almeida

Percursos de Educação Inclusiva em Portugal: dez estudos de caso ......................... 141Luzia Lima-Rodrigues e David Rodrigues

Trajetória da Educação Especial no RN: da integração à inclusão ............................ 149Joiran Medeiros da Silva

Educação Inclusiva: um processo em construção .................................................... 157Mércia Maria Melo dos Santos

A construção da Escola Inclusiva: uma meta possível .............................................. 163Rita Vieira de Figueiredo

A construção da Escola Inclusiva: uma análise das políticas públicas e da práticapedagógica no contexto da Educação Infantil ......................................................... 173Marilda Moraes Garcia Bruno

A escola é para todos: o Ministério Público e a tutela do direito das pessoas comdeficiência à educação ............................................................................................ 187Patrícia Albino Galvão Pontes e Rebecca Monte Nunes Bezerra

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Educação Especial: a travessia na tempestadeEducação Especial: a travessia na tempestadeEducação Especial: a travessia na tempestadeEducação Especial: a travessia na tempestadeEducação Especial: a travessia na tempestade

Claudia Pereira Dutra1

[email protected] Cláudia Maffini Griboski2

[email protected]

1 Da repetição ao movimento1 Da repetição ao movimento1 Da repetição ao movimento1 Da repetição ao movimento1 Da repetição ao movimento

(...) o presente tende a eternizar-se como monotonia da novidade programa emonocultura da diversidade reprimida ou tolerada, devorando tanto o passadocomo o futuro. É esta a nossa condição actual. Vivemos num tempo de repetição,e a aceleração da repetição produz simultaneamente uma sensação de vertigeme uma sensação de estagnação (SANTOS, 2006, p. 67).

Vivemos um processo de ampla discussão a respeito da Política Nacional deEducação Especial, que reflete um momento de efervescência no campo do debateacadêmico, das propostas pedagógicas e das políticas educacionais envolvendo a análiseda complexidade dos conceitos de inclusão e atendimento às necessidades educacionaisespeciais dos alunos no âmbito do sistema de ensino regular. Uma época que não maisse assenta em pressupostos, até pouco tempo vigentes, da defesa dos espaços segregadosde ensino, da repetição das dificuldades das escolas e sistemas de ensino, das suspeitassobre os riscos de mudança ou da conformidade com o que estava naturalizado.

Considerando o contexto histórico e político da produção desse movimento,passamos a chamá-lo de travessia na tempestade por estar configurado em um conjuntode reflexões situadas como conhecimentos e opções que se reconhecem e buscam umaintervenção sobre a realidade, gerando um processo de intensificação da açãotransformadora capaz de provocar deslocamento no pensamento normativo. Diante doque estava estabelecido como uma polarização entre chamados radicais e osautoproclamados responsáveis, ou seja, entre os defensores da inclusão incondicional eaqueles da inclusão sempre que possível, o campo da educação especial passa, de fato,a discutir o propósito da educação inclusiva e buscar sua implementação.

1 Secretária de Educação Especial – SEESP/MEC.2 Diretora de Políticas de Educação Especial – SEESP/MEC.

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Stainback (1990), enfatizando esse movimento de transformação, aponta os efeitosprejudiciais da exclusão e os benefícios que a inclusão traz para os alunos, os professores,para a vida das pessoas com deficiência e toda a sociedade:

Em geral, os locais segregados são prejudiciais porque alienam os alunos. Osalunos com deficiência recebem, afinal, pouca educação útil para a vida real, eos alunos sem deficiência experimentam fundamentalmente uma educaçãoque valoriza pouco a diversidade, a cooperação e o respeito por aqueles quesão diferentes. Em contraste, o ensino inclusivo proporciona às pessoas comdeficiência a oportunidade de adquirir habilidades para o trabalho e para a vidaem comunidade. Os alunos com deficiência aprendem como atuar e interagircom seus pares no mundo “real”. Igualmente importante, seus pares e tambémos professores aprendem como agir e interagir com eles (STAINBACK, 1999,p. 25).

No sistema educacional brasileiro, observa-se que nos últimos anos aconteceuma mudança desde a perspectiva dos pais, dos profissionais da educação e daorganização das escolas que cada vez mais estão atentos para uma reestruturaçãodo sistema educacional e a construção de uma escola inclusiva, agora entendidacomo um projeto coletivo. Consolida-se como premissa básica que o objetivo a seralcançado é uma educação inclusiva que não rejeite nenhum aluno, que reconheçatodos como sujeitos de direito à educação e mobilize os elementos necessários parasua autonomia, participação e aprendizagem, promovendo novos valores e práticaseducacionais.

A partir da reflexão acerca da concepção tradicional da educação, dos seus padrõesde homogeneidade e seletividade usados como referência para a organização de políticascurriculares que, muitas vezes, foram indiferentes à discriminação e aos preconceitospresentes no âmbito da escola, somos desafiados a construir caminhos que para, alémde garantir o acesso de todos à escola, levem a assumir a tarefa de reestruturar a educaçãoespecial, visando superar totalmente a idéia de uma modalidade que substitui àescolarização nas turmas comuns do ensino regular.

Sánchez (2005) afirma que a educação inclusiva centra-se em como apoiar asqualidades e as necessidades de cada um e de todos os alunos na escola:

Requer pensar na heterogeneidade do alunado como uma situação normal dogrupo/classe e pôr em macha um delineamento educativo que permita aosdocentes utilizar os diferentes níveis instrumentais e atitudinais como recursosintrapessoais e interpessoais que beneficiem todos os alunos (SÁNCHEZ, 2005,p.12).

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Nessa travessia, a perspectiva de criar as escolas inclusivas que respondam àsnecessidades de seus alunos exige uma revisão da Política Nacional de Educação Especial– 1994 que foi fruto da concepção integracionista, cujo modelo condicionava o acessonas classes comuns do ensino regular àqueles alunos considerados aptos ou adaptadosàs condições e ritmo de aprendizagem da turma. As novas diretrizes propostas devemultrapassar o modelo que incrementa as escolas e classes especiais, formando um sistemaseparado ao ensino regular e potencializar um projeto compartilhado de inclusão nasescolas públicas.

O debate tem se efetivado por meio dos Seminários do Programa EducaçãoInclusiva: direito à diversidade, envolvendo gestores dos 147 municípios-pólos eDirigentes Estaduais de Educação Especial dos 26 Estados e o Distrito Federal, daComissão formada com representantes da Federação Nacional das Apaes (Fenapae),da Federação Nacional das Pestalozzi (Fenasp), da Federação Nacional de Síndromede Down, da Federação Nacional de Educação de Surdos (Feneis), da União Brasileirade Cegos (UBC), dos dirigentes do Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines), doInstituto Benjamin Constant (IBC), da Coordenadoria Nacional de Integração da PessoaPortadora de Deficiência (Corde), do Conselho Nacional de Defesa dos Direitos dasPessoas Portadoras de Deficiência (Conade), do Ministério da Saúde (MS) e do Ministériodo Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), da Confederação Nacional deTrabalhadores de Educação (CNTE), do Conselho Nacional de Educação dos Estados(Consed), da União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e outrosfóruns com Instituições de Educação Superior vinculados a programas de educaçãoespecial e educação inclusiva. Para acompanhar esse processo de elaboração da novapolítica nacional de educação especial, foi instituído um Grupo de Trabalho, nomeadopela Portaria Ministerial nº 555/2007, composto por professores de instituições deeducação superior, coordenado pela Secretaria de Educação Especial.

Sem uma solução única e capaz de servir de modelo a todas as escolas, muitas sãoas questões colocadas pelos diferentes atores que fazem parte desse amplo espaço dereflexão que se forma em torno da construção da política nacional de educação especial.O interessante é perceber que todos já têm claro que esse é um processo que não temvolta, a sociedade exige a garantia dos seus direitos e as experiências de inclusãoeducacional já conseguem indicar as principais razões de se lutar por ela.

2 Por que uma nova política de educação especial?2 Por que uma nova política de educação especial?2 Por que uma nova política de educação especial?2 Por que uma nova política de educação especial?2 Por que uma nova política de educação especial?

Os fundamentos de uma nova política de educação especial na perspectiva daeducação inclusiva já estão colocados e apontam para uma reestruturação dos sistemasde ensino que permita à educação especial deixar de ser um lugar para onde a família oua escola encaminham o aluno e passa a integrar o projeto pedagógico das escolas. Dessaforma, a educação especial constitui-se como um campo de conhecimento e, no que se

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refere ao ensino, realiza o atendimento educacional especializado e a oferta do conjuntode serviços e recursos, presente nas relações curriculares que se estabelecem no universoda escola e dos sistemas de ensino.

As principais premissas que indicam as razões para a adoção de uma políticanacional de educação especial fundamentada nos princípios de educação inclusiva sereferem à força do movimento social que impulsiona a concepção e a construção deuma sociedade inclusiva; a perspectiva das políticas públicas que redireciona as açõespara sustentabilidade do processo de inclusão; e a ênfase nas práticas pedagógicas e degestão democrática que conduzem para a mudança da cultura da escola.

A primeira premissa diz respeito ao movimento da educação inclusiva que passa aexigir dos sistemas de ensino uma postura diante da exclusão educacional, tornandovisível à questão estrutural do sistema público de educação que por muitos anos nãoincorporou a inclusão como um princípio. Ao disseminar os princípios da inclusão, aodenunciar a discriminação de alunos com deficiência e ao afirmar que todos os alunosdevem estar na mesma escola tendo acesso ao currículo comum, o movimento social fazuma ressignificação do sentido dado à igualdade e às diferenças passando a reverter ofalso quadro de igualdade de oportunidades educacionais que envolvem a realidade daspessoas com deficiência.

A visibilidade do movimento pela inclusão, que se refere não apenas às pessoascom deficiência, impulsiona a valorização da diversidade como um fator de qualidadeda educação que tradicionalmente foi vista na escola sob o prisma negativo. A educaçãoinclusiva traz à tona a questão do direito de todos a educação e o atendimento àsnecessidades educacionais especiais dos alunos com deficiência, transtornos globaisdo desenvolvimento e altas habilidades/superdotação, enfatizando o acesso, aparticipação e a aprendizagem. Nessa visão, promover a participação e o respeito àsdiferenças significa enriquecer o processo educacional, reconhecendo a importânciado desenvolvimento das potencialidades, saberes, atitudes e competências de todosos alunos.

A segunda premissa diz respeito ao posicionamento do Ministério da Educaçãodesencadeando uma ação direta com gestores e educadores de todo o País, que passa aafirmar os referenciais da educação inclusiva e promover a articulação para a suaconcretização. A participação dos dirigentes de educação especial nos seminários e cursosde formação continuada tem sido embasada no conceito da emancipação dos sujeitos,que os faz protagonistas dessa transformação e não meros receptores de informaçõestécnicas ou metodologias de ensino. Assim, a mudança de postura da gestão educacionalno âmbito nacional, estadual e municipal diante dos desafios colocados pela inclusãotorna-se um dos elementos fundamentais desse processo.

A partir do diálogo e da colaboração entre todos os segmentos foi sendo alcançadoum grau elevado de pactuação em torno da proposta gestada que passa a sercompartilhada, possibilitando na sua realização agregar outros interlocutores e construir

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condições de autonomia. Nesse cenário, outro diálogo importante tem se efetivado comos órgãos consultivos diante da necessidade de alteração das diretrizes nacionais daeducação especial na educação básica para que possam incidir no âmbito da gestãoeducacional possibilitando ultrapassar os entraves postos nos documentos anterioresque permitem a manutenção dos pilares de sustentação da política de integração,contrariando os princípios de uma escola inclusiva.

A terceira premissa refere-se às novas práticas pedagógicas e de gestão que fazemda sala de aula e de toda a escola um ambiente democrático de descoberta e construçãodo conhecimento, permitindo refletir sobre o conjunto de mudanças que envolvem areestruturação dos sistemas de ensino que orientou para a escolarização de pessoas comdeficiência em espaços segregados e currículos adaptados. Ultrapassando a concepçãode deficiência como uma limitação do aluno que não estabelece a sua relação com asbarreiras presentes no ambiente, a escola passa a se constituir como um espaçopreferencial para o desenvolvimento de competências e o incentivo às diferentesmanifestações de ordem social, afetiva ou cognitiva, possibilitando aos alunos interagircom autonomia na sociedade.

A partir das experiências de educação inclusiva o ensino regular deixa de serconcebido como espaço de regulação da média dos alunos e a educação especial comoo lugar de acolhimento dos alunos considerados fora dos padrões estabelecidos pelaspráticas de conhecimento que repetem modelos homogeneizadores de ensino. A escola,pensada para todos os que dela foram excluídos e para aqueles que dentro dela sãoexcluídos, afirma a relação entre a inclusão escolar e a qualidade do processo educacionalao eliminar os preconceitos, ampliar valores e construir aprendizagens, beneficiando acomunidade inserida nesse contexto de convivência com as diferenças.

3 Implementação da Política Nacional de Educação Especial3 Implementação da Política Nacional de Educação Especial3 Implementação da Política Nacional de Educação Especial3 Implementação da Política Nacional de Educação Especial3 Implementação da Política Nacional de Educação Especial

O movimento em torno de implementação da Política Nacional de EducaçãoEspecial na perspectiva da educação inclusiva impulsiona as transformações para umredimensionamento da educação brasileira, que de fato seja para todos, que dê contade uma renovação que considere a diversidade humana, que tenha como meta eliminartodas as barreiras e possibilitar o acesso e a participação plena das pessoas com deficiência,transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação, construindouma sociedade inclusiva. No centro dessa discussão, está a sua relação com a formaçãodos professores, o atendimento educacional especializado e as condições deacessibilidade.

A reflexão acerca da formação de professores para a atuação na perspectiva daeducação inclusiva assume posição de destaque nas abordagens que propõemredimensionar o trabalho docente, ultrapassando a visão de um ensino e um espaço quese organiza com base na deficiência, passando a pensar uma educação geral que inicia

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por anular as formas excludentes de organização de sistemas paralelos de ensino eimpulsiona as transformações no âmbito da escola pública. A efetivação dessa propostatem proporcionado o diálogo entre diferentes posicionamentos quanto à necessidadede redimensionar a ação pedagógica e reinterpretar as funções dos profissionais que aliatuam.

A alteração na formação de professores representa muitos desafios ao mesmo tempoem que apresenta também possibilidades de desenvolvimento da competênciaprofissional do educador para atender as diferenças na escola. Esse contexto implicauma redefinição curricular que responda às necessidades de formação dos professoresdo ensino regular fundamentada na inclusão de todos os alunos e nas dimensõesfundamentais da diversidade e heterogeneidade. A formação para o atendimentoeducacional especializado implica o desenvolvimento dos conhecimentos específicosnas diferentes áreas do ensino especial, que de forma complementar ou suplementar àescolarização, se caracterizam como constituinte da formação integral do aluno e para oacesso ao currículo.

A formação na perspectiva da educação inclusiva exige dos professores uma buscaconstante de informações e revisão de suas práticas, consolidada a partir da participaçãoem cursos de formação continuada e desenvolvimento profissional. Esse processo conduza uma mudança de atitude, à aquisição de novas competências profissionais e aodesenvolvimento do trabalho compartilhado entre os docentes e outros profissionais daeducação, que contribua para a qualidade do ensino em toda a escola. Assim, é importanteque a formação docente contemple os conhecimentos acerca da aprendizagem e daconstrução do conhecimento, posicionando-se em favor de um projeto pedagógico quetenha presente um planejamento de atividades e um processo avaliativo que desenvolvaas potencialidades, a criatividade e a emancipação dos alunos.

A presença dos alunos com deficiência na escola comum faz com que aorganização da escola seja repensada no que se refere às tecnologias, recursos econhecimentos necessários para fazer avançar no desenvolvimento de um currículodinâmico e flexível que promova a aprendizagem de todos os alunos. Para tanto, umaquestão determinante na formação é a tomada de decisão do professor sobre asmetodologias e estratégias pedagógicas a serem utilizadas de modo a beneficiar oprocesso educacional inclusivo.

A formação de professores deve contemplar a dimensão da educação para todosno contexto das diferentes formas de aprender e de ensinar, interagindo por meio deestudos que levem adiante os pressupostos trazidos pela Convenção sobre os Direitosdas Pessoas com Deficiência, aprovada pela em 2006, de assegurar um sistema deeducação inclusiva em todos os níveis de ensino em ambientes que maximizem odesenvolvimento acadêmico e social, compatível com a meta de participação plenagarantindo o acesso ao ensino inclusivo, gratuito e de qualidade.

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A implementação da política de educação inclusiva traz no seu bojo o fortalecimentoda oferta do atendimento educacional especializado, trazendo clareza do seu significadopara a aprendizagem dos alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimentoe altas habilidades/superdotação. A concepção de atendimento educacional especializadoultrapassa o entendimento desse como atividade concernente à área da saúde ou comomera repetição de atividades pedagógicas, concebidas tradicionalmente como reforçoescolar, exigindo mudanças estruturais na escola comum que passa incorporar aoatendimento educacional especializado, envolvendo a realização de atividades quediferem daquelas do ensino comum, caracterizadas como fundamentais para odesenvolvimento pessoal do aluno e para sua autonomia no processo de escolarização.

Na atual discussão, a oferta do atendimento educacional especializado realizadoem todas as escolas é planejada com o objetivo de eliminar as barreiras encontradas noacesso à escolarização e de promover o desenvolvimento do aluno. Esse atendimentoestá configurado como um processo que se aprimora a partir das alternativas de interaçãoe envolvimento na proposta educacional e que se amplia conforme as necessidades dosalunos, centrando-se nas formas específicas de cada um posicionar-se, demonstrar seusinteresses e desejos na relação com o conhecimento.

Outro aspecto importante para a implementação da política nacional de educaçãoespecial diz respeito à disponibilidade nos sistemas de ensino de condições deacessibilidade. O uso das tecnologias trouxe possibilidades que vão desde a formaçãode professores para o uso de metodologias de ensino até a apropriação pelo aluno dosinstrumentos que viabilizam seu acesso ao currículo escolar, a informação e promovem asua independência. Cabe a escola, além da identificação dos recursos da comunidade,organizar e disponibilizar as diferentes formas de acessibilidade que facilitem odesenvolvimento do processo educacional, garantindo o acessibilidade a todos os espaçosda escola, nas comunicações, mobiliários, materiais didáticos e pedagógicos, favorecendoo estabelecimento das relações sociais.

4 Estratégias e ações4 Estratégias e ações4 Estratégias e ações4 Estratégias e ações4 Estratégias e ações

Como estratégia de transformação dos sistemas educacionais em sistemaseducacionais inclusivos teve início em 2003, o Programa Educação Inclusiva: direito àdiversidade, enfocando a formação de gestores e educadores e a afirmação da escolacomo espaço fundamental para a valorização da diversidade e garantia de cidadania.O programa visa à garantia do direito de acesso de todos à escolarização, aodesenvolvimento de projetos pedagógicos inclusivos, à organização do atendimentoeducacional especializado na rede pública e à criação de redes de apoio à inclusão. Com147 municípios-pólo, o Programa deflagrou uma ampla disseminação da formaçãodocente e a sensibilização da comunidade escolar para a implementação da política deeducação inclusiva.

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Além da formação, o Programa tem apoiado a implantação de salas de recursosmultifuncionais em escolas dos municípios-pólo e a distribuição de referenciaispedagógicos que muito têm contribuído para a organização do atendimentoeducacional especializado, os serviços e recursos específicos para ampliação dasatividades ofertadas aos alunos que visem atender as suas especificidades deaprendizagem dos alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento ealtas habilidades/superdotação.

O Programa, representando um marco na trajetória da educação especial, que tornaimperativo discutir a qualidade do atendimento educacional especializado, realiza oCurso de Formação de Professores para o Atendimento Educacional Especializado, namodalidade a distância, ofertado pela Universidade Federal do Ceará (UFC), formando1.470 professores nos municípios brasileiros. Os referenciais sobre o atendimentoeducacional especializado nas áreas da deficiência mental, visual, auditiva e física sãoutilizados a partir de uma metodologia de estudo de caso possibilitando que os professorescompartilhem suas vivências e discutam a sua prática profissional realizada nas salas derecursos multifuncionais da sua escola.

Ainda no contexto do Programa, tem se desenvolvido desde 2005, nas escolasindicadas pelos municípios-pólo, o Projeto Educar na Diversidade que se propõe atrabalhar nas escolas as práticas e culturas inclusivas. O MEC tem desenvolvido oficinasnacionais para formar os professores multiplicadores do material de formação docente.A formação compreende os eixos que vão desde a gestão da escola, a prática pedagógica,o planejamento de aulas inclusivas e a diversidade de gênero, raça, deficiência a partirde histórias que são analisadas pelos professores. Uma perspectiva que tem comopressuposto a valorização das diferenças na escola, que possibilita uma ressignificaçãoda forma de ver a pessoa com deficiência estigmatizada historicamente em razão de suascaracterísticas físicas, mentais ou sensoriais.

Em 2007, no contexto do Plano de Aceleração do Crescimento, o lançamento doPlano de Desenvolvimento da Educação (PDE) traz o foco para o desenvolvimentohumano e social e estabelece a educação como prioridade. O Plano de MetasCompromisso Todos pela Educação define-se como a conjugação de esforços dos EntesFederados, em colaboração com as famílias e a comunidade para a melhoria da qualidadeda educação básica.

As diretrizes do Plano indicam para a promoção da aprendizagem, da educaçãoinfantil e da alfabetização, da jornada ampliada, da matrícula do aluno na escola maispróxima da sua residência, da formação dos professores e o combate a repetência eevasão. Destacando-se, ainda, a garantia do acesso e da permanência nas classes comunsdo ensino regular e o atendimento às necessidades educacionais especiais dos alunosfortalecendo a inclusão nas escolas públicas.

Na educação especial, o PDE institui o Programa Nacional de Formação Continuadade Professores na Educação Especial com o objetivo de formar uma Rede Nacional para

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a oferta de cursos sobre o atendimento educacional especializado destinado aosprofessores da educação básica; o Programa de Implantação de Salas de RecursosMultifuncionais com o objetivo de organizar os recursos para o atendimento educacionalespecializado nas escolas públicas da rede regular de ensino; o Programa Incluir:Acessibilidade na Educação Superior com a finalidade de criar Núcleos de Acessibilidadenas Instituições Federais de Educação Superior para promoção do acesso e permanênciadas pessoas com deficiência e; o Programa de Acompanhamento e Monitoramento doacesso e permanência na escola das pessoas com deficiência beneficiárias do Benefíciode Prestação Continuada da Assistência Social (BPC), prioritariamente aquelas na faixaetária de zero a dezoito anos.

O Programa Nacional de Formação Continuada de Professores na EducaçãoEspecial, pautado nos pressupostos da educação inclusiva que qualifique a ação docentee garanta o efetivo direito à educação e à escola de qualidade, busca superar a carênciade formação de professores na área da educação especial e desconstituir as barreiras queimpedem ou restringem o acesso, a permanência, aprendizagem e participação dos alunosna escola. Os cursos de formação continuada de professores, na modalidade a distância,para o atendimento educacional especializado realizam-se no âmbito da extensão,aperfeiçoamento e especialização. A meta do Programa é formar, até 2011, vinte milprofessores por ano, configurando um movimento indispensável para efetivar as mudançase avançar na concepção da educação inclusiva. Nesse contexto, coloca-se o grande desafiode acompanhar o desenvolvimento do Programa e propor por meio da formaçãoalternativas para romper a fragmentação do trabalho escolar, tornando mais consistentea ação coletiva do professor que atua na sala de aula comum e do professor que realizao atendimento educacional especializado, no desenvolvimento do processo educacionaldos alunos.

Ao concluir essa reflexão acerca da política nacional de educação especial,compreende-se que a educação brasileira instaura um novo tempo onde a relação entretodos atores da escola reafirma a autonomia como a finalidade da educação. Umatransformação que se faz no movimento, que desafia vencer as contradições, incertezas,resistências e as práticas repetitivas que acabaram por manter um sistema educacionalsegregado e passa a fazer uma travessia para um sistema educacional que busca construiruma escola inclusiva e persiga a implementação das mudanças necessárias para umaeducação de qualidade.

ReferênciasReferênciasReferênciasReferênciasReferências

BRASIL. Legislação federal básica na área da pessoa portadora de deficiênciaLegislação federal básica na área da pessoa portadora de deficiênciaLegislação federal básica na área da pessoa portadora de deficiênciaLegislação federal básica na área da pessoa portadora de deficiênciaLegislação federal básica na área da pessoa portadora de deficiência. Brasília:Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Coordenadoria Nacional para a Integração daPessoa Portadora de Deficiência, 2007.

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SÁNCHEZ, P. A. A educação inclusiva: um meio de construir escolas para todos no séculoXXI. Revista InclusãoRevista InclusãoRevista InclusãoRevista InclusãoRevista Inclusão. Brasília, v. 1, n.1, out/2005, p. 7-18.

SANTOS, B. de S. A gramática do tempoA gramática do tempoA gramática do tempoA gramática do tempoA gramática do tempo: para uma nova cultura política. São Paulo:Cortez, 2006.

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Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da EducaçãoPolítica Nacional de Educação Especial na perspectiva da EducaçãoPolítica Nacional de Educação Especial na perspectiva da EducaçãoPolítica Nacional de Educação Especial na perspectiva da EducaçãoPolítica Nacional de Educação Especial na perspectiva da EducaçãoInclusiva – problematizações conceituaisInclusiva – problematizações conceituaisInclusiva – problematizações conceituaisInclusiva – problematizações conceituaisInclusiva – problematizações conceituais

Denise de Oliveira Alves1

[email protected]átia Aparecida Marangon Barbosa2

[email protected]

O contexto atual convida a comunidade escolar a repensar o papel da educaçãona sociedade e seu processo organizacional. Retornar a perguntas como “Qual a funçãoda escola?” “Como e para que se ensina e se aprende?” , as quais , num momento inicial,parecem simples em suas indagações, demonstram-se extremamente desafiantes quandonos propomos a respondê-las, tendo em vista a complexidade que envolve os processosde ensinar e aprender, bem como a construção de uma escola de qualidade para todosos alunos.

Tal dificuldade de resposta é justificada pela ambigüidade que a escolacontemporânea assume: ora aparelho ideológico do estado, reprodutora do sistema;ora como meio privilegiado de transformação social, capaz de desestruturar a hegemoniadominante e de promover a inclusão, por meio da democratização do acesso aoconhecimento e, conseqüentemente, da possibilidade de atuação e participação social.

Nesse entendimento, a educação especial na perspectiva da educação inclusivaproblematiza as práticas educacionais hegemônicas e passa a utilizar categoriasconceituais interligadas ao conceito de diferença, como possibilidade de compreendera relação eu/outro na dinâmica da constituição da identidade e subjetividade do sujeito.Essa concepção defende que o conhecimento e a convivência com a diferençapromoverão o desmantelamento das práticas rotuladoras, classificatórias daaprendizagem e dos preconceitos historicamente constituídos em relação à pessoa comdeficiência. Com isso, a função da escola, as concepções de conhecimento, ensino eaprendizagem precisam urgentemente ser revistas, uma vez que definem as açõeseducacionais que interferem diretamente no percurso escolar do aluno e na suaconstituição como sujeito pensante.

A educação inclusiva visa garantir os direitos constitucionais da pessoa comdeficiência, atentando principalmente para a escolarização com qualidade e a

1 Coordenadora Geral de Articulação da Política de Educação Inclusiva – Secretaria de Educação Especial (SEESP/MEC).2 Coordenadora Geral de Desenvolvimento da Educação Especial (SEESP/MEC).

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participação nas diferentes esferas sociais. Diante desses pressupostos, assume sua posiçãode resistência à educação elitizada e investe na promoção de uma educação que consideraa diversidade humana e a valorização das diferenças como recurso de aprendizagem.Seus pressupostos deflagram a descontinuidade dessa com relação ao modelo daintegração, pois a inclusão não procede da integração nem tão pouco resulta de seuaperfeiçoamento. Ao contrário, é construídas sobre outras bases epistemológicas queimplicam ruptura com os modelos anteriores. De acordo com Bachelard (2004, p. 40),“chega sempre uma hora em que não se tem mais interesse em procurar o novo sobre ostraços do antigo, em que o espírito científico não pode progredir senão criando novosmétodos”.

Assim, os complexos desafios do contexto educacional contemporâneo não podemmais ser compreendidos pelo olhar reducionista da modernidade, nem são passíveis deresolução pela elaboração de respostas simplistas. O movimento de educação inclusivapassa a questionar as práticas e concepções teóricas da educação especial, exigindo queos sistemas de ensino se organizem de forma diferenciada, investindo na flexibilidadecurricular, na dinamicidade pedagógica e na potencialidade de aprendizagem de todosos alunos.

Logo, a ruptura com as práticas educacionais integracionistas deve estaramparada por um processo de esclarecimento conceitual, definidor das concepçõese estratégias de organização escolar. Conforme pontua Mantoan, “a distinção entreintegração e inclusão é um bom começo para esclarecermos o processo detransformação das escolas, de modo que possam acolher indistintamente todos osalunos nos diferentes níveis de ensino” (2006, p. 18). Segundo a autora, a inclusãoescolar questiona as polít icas e organizações da educação especial e,contraditoriamente à integração, propõe que a inserção escolar seja realizada deforma radical, completa e sistemática. Com isso, a inclusão possibilita suprimir asubdivisão dos sistemas escolares em especial e comum, impulsionando a articulaçãodas práticas da educação especial com a escolarização comum, na busca dealternativas para a reestruturação dos sistemas de ensino.

Pode-se, analisando a realidade escolar à luz dos novos desenvolvimentosconceituais, inferir sobre as causas do esgotamento do modelo de integração: primeiro,por fundamentar-se no entendimento simplista de que espaços segregados ehomogeneizados pelo critério da deficiência constituem o lócus privilegiado deaprendizagem para alguns alunos; segundo, por sua especificidade organizacional quenão impulsiona o processo de revisão da escola como um todo, favorecendo para que amesma continuasse a se organizar apenas para alguns alunos, àqueles que, via-de-regra,muito pouco precisariam dela para aprender.

Os principais referenciais legais na área -- Política Nacional de Educação Especial(1994), a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) Lei nº 9.394/96 e asDiretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (2001) -- conceituam

Política Nacional de Educação Especial na perspectiva daEducação Inclusiva – problematizações conceituais

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a educação especial como uma modalidade de ensino que deve acontecer,preferencialmente, na classe comum do ensino regular. Pode-se inferir que, segundo essaperspectiva, o termo “preferencialmente” favorece o entendimento de que a escolarizaçãoda pessoa com deficiência pode ou não acontecer na escola comum.

O funcionamento da educação especial no sistema de ensino, tendo em vista essaprerrogativa, ocorreu de forma paralela, ou seja, a educação especial acabava por substituir,a escolarização comum ou, então, se instituíam práticas educativas nas quais o períodode participação em sala de aula, junto com os outros alunos, era reduzido, com o objetivode possibilitar o atendimento educacional especializado. Materializam tal concepção aspráticas escolares fragmentadoras do espaço e do tempo de aprendizagem, quepropunham que os alunos com deficiência acompanhassem somente parte do currículocomum e, na outra parte do seu tempo de escolarização, participassem de atendimentosespecializados, que eram caracterizados como momentos de reforço escolar ouatendimentos da saúde.

Logo, percebe-se que, seguindo essa orientação, a organização da educação especialse dava de forma desarticulada à educação comum, em espaços segregados e seguindoprincípios de redução curricular e restrições quanto à aprendizagem dos conteúdossistematizados.

Na configuração educacional inclusiva, o projeto pedagógico redefine seuspressupostos, investindo em conceitos orientadores como a gestão democrática, aparticipação e a autonomia. Nessa proposição, o currículo passa a ser problematizado,tendo como objetivo principal assegurar a especificidade pedagógica e o carátereducacional, não priorizado pela proposta integracionista de educação.

O modelo integracionista propunha o atendimento educacional especializadoentendido como a promoção de intervenções clínicas, pautadas basicamente na ofertade serviços relacionados à área da saúde, entendendo essas práticas como constituintesdo currículo. Esse entendimento, no que tange à organização pedagógica, defende aadaptação curricular, ou seja, o professor pré-define os conteúdos e conceitos que devemser aprendidos pelos alunos da educação especial, investindo em planejamentospedagógicos restritos, em métodos e estratégias de ensino limitadas e elaboradas comcentralidade na deficiência e não na possibilidade que cada aluno com deficiência temde aprender.

Por vez, a educação inclusiva propõe que todos os alunos devem ter acesso aosconhecimentos previstos na organização curricular da escola. Assim, o atendimentoeducacional especializado passa a ser reinterpretado, constituindo-se como meio paraque o aluno com deficiência possa acessar os conteúdos curriculares como todos osdemais alunos.

Na perspectiva da educação inclusiva, a educação especial deve se configurar comouma modalidade de ensino que assume o princípio da transversalidade. Tal pressupostodiz respeito ao fato da educação especial perpassar todos os níveis, etapas e modalidades

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de ensino, sendo intrinsecamente articulada à educação comum. O princípio datransversalidade reposiciona a educação especial que, por meio do atendimentoeducacional especializado, garante os recursos necessários à escolarização da pessoacom deficiência durante sua trajetória educacional.

Diante da proposição de uma nova Política Nacional da Educação Especial, oatendimento educacional especializado, presente nos marcos legais desde a ConstituiçãoBrasileira (1988), assume o papel de potencializar a utilização dos recursos e serviçosespeciais para que todos os alunos tenham acesso à escolarização nas classes comunsdo ensino regular, constituindo-se por um conjunto de estratégias, recursos e serviçosdisponibilizados e organizados de acordo com as necessidades dos alunos com deficiência,transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação.

O objetivo central desse atendimento passa a ser a promoção da acessibilidade aocurrículo escolar, tendo em vista a premissa de que a escola comum é o espaço privilegiadode aprendizagem para todos os alunos. Logo, o atendimento educacional especializadoviabiliza o acesso ao currículo e não pode jamais substituir a escolarização.

Nessa perspectiva, a educação especial, como campo de conhecimento, adquireoutra configuração, abarcando, na sua organização, o atendimento educacionalespecializado, a aquisição e produção de materiais, a formação docente e a orientação/acompanhamento à família.

No que tange ao atendimento ao aluno, o atendimento educacional especializadorefere-se à elaboração de estratégias e recursos para a aprendizagem da língua brasileirade sinais, da língua portuguesa na modalidade escrita como segunda língua, do sistemaBraille, soroban, orientação e mobilidade, para o desenvolvimento dos processos mentaissuperiores, para o enriquecimento curricular, entre outros.

Quanto à aquisição e produção de materiais, os eixos da educação inclusivaorientam a articulação dos sistemas federal, estadual e municipal de ensino na promoçãoda disponibilização de serviços, profissionais e recursos necessários para que o alunotenha condições de freqüentar e participar efetivamente do processo de escolarização.Sugere-se que a produção de materiais seja realizada na própria escola do aluno, produtode um trabalho conjunto entre o professor da sala de aula comum e o professor doatendimento educacional especializado e, quando necessário, que a produção do materiale as adequações nele necessárias sejam viabilizadas por meio de convênios ou parcerias.

A formação continuada de professores consiste no processo de instrumentalizaçãodo professor, que exige a interface entre os conhecimentos teóricos da área e a práticaeducativa. Sob esse prisma, a escola e seus alunos constituem-se em lócus de estudo doprofessor, uma vez que a sua prática e a sua realidade organizacional passam a serelementos de estudo. A pesquisa torna-se, então, estratégia de formação continuada epermea o fazer educacional do professor, visto que a investigação do cotidiano escolarpossibilita a análise investigativa da prática, favorecendo a capacidade de diagnóstico eintervenção fundamentada.

Política Nacional de Educação Especial na perspectiva daEducação Inclusiva – problematizações conceituais

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Por sua vez, a orientação/acompanhamento à família refere-se à necessáriacomunicação que deve haver entre a escola, o atendimento especializado e a família doaluno, buscando a inter-relação necessária para o prolongamento das ações educacionaispara o cotidiano do aluno.

Portanto, a reconfiguração da educação especial pressupõe um movimento dediscussão da organização da escola em seu aspecto global, questionando os fundamentosda prática educativa e reformulando sua atuação no sistema de ensino.

Como reflexões conclusivas (sempre provisórias), cabe ressaltar que a problematizaçãodos modelos de integração e inclusão, bem como as concepções de atendimento educacionalespecializado que advém de cada modelo, consolidam as bases para a superação dosprincípios integracionistas ainda presentes nas práticas educacionais direcionadas aosalunos com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação. Nesse sentido, a crítica aos limites da integração, ao mesmo tempo emque nos permite a percepção dos mecanismos de segragação inerentes a esse modelo deescola, paradoxalmente, fornece elementos para a construção de uma outra propostaeducacional, ancorada nos princípios da inclusão, desafiando-nos a combinar, comonos ensina Giroux (1997), “estratégias de oposição com estratégias de reconstrução” deuma nova ordem educacional.

A formulação da nova Política Nacional da Educação Especial na Perspectiva daEducação Inclusiva assenta-se nas proposições teóricas e no desenvolvimento conceitualatual, conjugados ao reconhecimento das respostas positivas dadas pelos sistemas deensino diante da demanda de uma escola para todos. Tal realidade testemunha onascimento de uma nova cultura, de um novo ethos educacional, configurando-se, nopresente, não como “porto seguro”, como apregoavam as teses positivistas, mas comocaminhos plenos de possibilidades e alternativas.

Na busca por estratégias organizacionais que promovam a educação inclusiva, adiscussão precisa ser aperfeiçoada pela ampliação do diálogo com as diferentesorganizações que se dedicam ao trabalho com essa modalidade de educação, osprofissionais nela inserida e as pessoas que utilizam tais recursos e serviços específicosdurante sua trajetória escolar.

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Educação Inclusiva: mais qualidade à educaçãoEducação Inclusiva: mais qualidade à educaçãoEducação Inclusiva: mais qualidade à educaçãoEducação Inclusiva: mais qualidade à educaçãoEducação Inclusiva: mais qualidade à educação

David Rodrigues1

[email protected]

“Hoje ouvi na rádio uma notícia que um cidadão qualquer tinha ganho um concurso na televisãoe, por conseqüência, tinha adquirido o título de ‘O Melhor Motorista’. A notícia não deu maisdetalhes e eu fiquei a pensar: o que é ser ‘o melhor motorista’? Será o que consegue andar maisrápido? (Em pista? Num terreno acidentado?) Será o que conhece o funcionamento da mecânicado carro? Será o que sabe controlar o carro em situaç ões de emergência? Será o que cumpre asregras de trânsito? Será um motorista prudente? Será o que conduz mais confortavelmente paraos passageiros? Talvez nenhum destes ‘bons motoristas’ consiga ser ‘o melhor’ em dois dessesitens… Bom, parece que as únicas pessoas que sabem o que é um bom motorista são osjurados desse concurso…”

1 Qualidade em Educação1 Qualidade em Educação1 Qualidade em Educação1 Qualidade em Educação1 Qualidade em Educação

O termo “qualidade” é largamente usado em Educação. Parece tão consensual queé profusamente usado tanto pelo discurso político como pelos próprios professores einvestigadores. Contudo, existem vários olhares sobre a qualidade e, em cada um, diversosconceitos.

Existe um olhar diacrónico sobre o que se considera qualidade. Ao longo da históriada Educação, “qualidade” tem assumido diferentes conceitos e significados. O que seconsiderava qualidade há 30 anos não é certamente o que se considera hoje.

Pode existir também um olhar sincrónico. Por exemplo no ano de 2007, “qualidade”pode ter significados diferentes em razão do lócus geográfico de que se fala e, sobretudo,em decorrência dos diferentes participantes no processo educativo. Será que quando sefala de qualidade o termo quer dizer o mesmo para pais, alunos, gestores, professores,políticos, etc.? Algumas acepções do conceito de “qualidade” aproximam-na da satisfaçãodo cliente. Resta perguntar, em Educação, quem é o cliente? Os pais? A sociedade? Osalunos? E se são vários, eles podem ser igualmente satisfeitos com o mesmo serviço? Adiversidade dos contextos educativos é tão grande que parece difícil falar de qualidadeem termos absolutos ou essenciais; teremos certamente que nos referir à qualidade comovalor relativo resultante da interação do processo educativo com diferentes condições

1 Doutor em Ciências da Motricidade Humana na área de Educação Especial e Reabilitação (UTL/FMH) Professor daUniversidade Técnica de Lisboa. Coordendor do Fórum de Estudos de Educação Inclusiva (www.fmh.url.pt/feei)

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ecológicas. Em maio de 2007, ao consultar o suplemento de Educação do jornal Folhade S. Paulo, em que era feito um amplo balanço da educação brasileira, ficou a dúvidasobre qual conceito de qualidade a educação brasileira seria analisada: vista como umaestrutura “atrasada” em razão de padrões dos países mais ricos do mundo ou como umaestrutura “avançada” em decorrência dos sensíveis progressos efetuados na última década?

A qualidade não é, pois, um termo que tenha valor normativo absoluto, por muitoque os discursos políticos e institucionais pareçam não ter dúvidas sobre isso. Osindicadores que se selecionam (e os outros que se ignoram), as formas e os momentosem que se avalia a qualidade são decisões políticas e, portanto, socialmente construídasem decorrência dos objetivos que se deseja alcançar em determinado contexto.A qualidade filia-se, assim, mais nas negociações e relações de poder que em um consensoinquestionável e “natural” (cf. Barroso, 1998).

Talvez devêssemos, implicando múltiplos fatores e dirigindo-se a diferentes“clientes”, usar o termo sempre no plural (“qualidades”) porque se trata de diferentesatores e de diferentes âmbitos a serem analisados.

A Inclusão, analisando os documentos produzidos por organizações internacionais(nomeadamente as Nações Unidas e a Organização das Nações Unidas para a Educação,a Ciência e a Cultura -- Unesco) bem como o impacto que tiveram nas legislações nacionaisde múltiplos países, tem de ser considerada como um dos fatores que atualmente évalorizado em termos de aferição da qualidade de um sistema educativo. Sobre a relaçãoentre Inclusão e qualidade, Nóvoa (2005) afirma que “(…) é preciso manter a tensão entrea qualidade e a equidade principalmente num período em que a situação econômicatende a valorizar a ‘qualidade total’ em lugar da ‘qualidade para todos’”.

O certo é que o termo “qualidade” tem sido mais associado a sistemas educacionaisseletivos, competitivos e “meritocráticos” que a sistemas mais universais e inclusivos. Hápouco tempo, em Portugal, a re-instalação de exames nacionais no fim de cada ciclo daescolaridade básica foi saudada por vários partidos como uma importante medida emfavor da qualidade da educação.

2 Qualidade e Educação Inclusiva2 Qualidade e Educação Inclusiva2 Qualidade e Educação Inclusiva2 Qualidade e Educação Inclusiva2 Qualidade e Educação Inclusiva

O tema central dessa conferência é a discussão da forma como a Educação Inclusivarelaciona-se com a qualidade.

O assunto não é pacífico porque, como vimos, o conceito comum de qualidadeencontra-se ligado à excelência acadêmica e ao desempenho de altos padrões de informaçãoe conhecimento. É uma qualidade que é concebida principalmente pelas competênciasacadêmicas que os alunos adquirem e aferida por processos comparativos transnacionais.Assim, a Inclusão na escola regular de alunos com alguns tipos de problemas pode serencarada como um contratempo para atingir tal “qualidade acadêmica”.

Educação Inclusiva: mais qualidade à educação

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Para muitos profissionais e mesmo para o senso comum, quanto mais heterogêneae mais diversa é uma classe ou uma escola, mais problemas haverá com o aproveitamentodos alunos e conseqüentemente menor será a qualidade atingida. Os argumentos sobreessa posição são que se gasta demasiada energia em tentar articular a diversidade e quese perde tempo com alunos com dificuldades, o qual poderia ser usado para fazer progrediralunos sem dificuldades, enfim, que a qualidade se encontra ligada à homogeneidadedos alunos.

Se adotarmos como parâmetro de qualidade um gama alargada de saberes,competências e atitudes, se usarmos um conceito lato de qualidade em que essa sereporte a diferentes actores, diferentes capacidades, a diferentes objetivos deaprendizagem, verificamos que a posição descrita antes, apesar da sua aparente solidez,é uma posição que só pode recrutar a seu favor a evidência ilusória do senso comum(LIMA-RODRIGUES et al. 2007). Senão, vejamos:

1. A percepção da diferença contribui para a construção da identidade e tem, porisso, papel determinante na aprendizagem. Não se pode construir uma identidadesenão em um ambiente diverso. Nunca agradeceremos o suficiente aos outrospor nos ajudarem a entender e a estruturar o que somos a partir da diferença queneles percebemos.

2. Quando olhamos a qualidade no contexto do currículo global da escola (mesmono sentido restrito de nível acadêmico), verificamos que não são sempre os mesmosalunos que têm dificuldades nas mesmas situações. Todos têm, portanto, umacontribuição para a qualidade global da turma e da escola com os seus insucessose os seus erros. Dessa forma, a qualidade assume-se no campo das heurísticas deensino e não no campo dos resultados. Uma educação de qualidade, nesseaspecto, será a que é capaz de dinamizar a aprendizagem em grupos de alunosque podem ter conforme os momentos, matérias e contextos, apresentar (todos!)dificuldades e proficiência.

3. Fazer depender a aprendizagem da interação direta e individual com o professoré um modelo desatualizado de ensino e aprendizagem. Os materiais, os colegas,os documentos, o meio, a pesquisa são contextos que devem ser acionados parapotenciar a aprendizagem de todos. Grandes teóricos da aprendizagem comoPiaget, Vigotsky e Brunner proporcionaram grandes contribuições paraconhecermos o quão indispensáveis à aprendizagem podem ser as mediações, osmateriais e os contextos. Só é possível responder a classes heterogêneas se forcriado, na sala de aula, um ambiente de trabalho em que o aluno disponha deautonomia e de meios de aprendizagem e de ensino que não se resumam àinteração direta com o professor.

4. As dificuldades de uns podem ser usadas como estratégias para outros. Sabemosque o “erro” tem uma função educacional importante se poder ser analizado,contextualizado e ter entendida a sua correção. É conhecido o exemplo das pessoas

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que têm problemas, por exemplo a matemática e que finalmente superam assuas dificuldades quando a começam a… ensinar. Um ambiente de aprendizagemrico e diversificado é proveitoso para quem ensina e para quem aprende.

5. Enfim, são as turmas heterogêneas e complexas as que proporcionam experiênciasaos alunos para viver, negociar e progredir em sociedades que são elas própriascomplexas e conflituais.

Assim, quando nos perguntamos se a Educação Inclusiva (EI) promove a qualidade,temos também de pensar nos alunos concretos e no seu processo de aprendizagem enão nas “ideias feitas” que formulamos sobre a homogeneidade. (Por falar nisso: jápensaram que sucesso desportivo teria uma equipe de futebol constituída pelos melhoresonze jogadores do mundo, mas... todos goleiros?)

Defendemos que existe uma relação próxima entre EI e qualidade. Não podehaver qualidade em uma escola que tanto persiga a homogeneidade que a afaste dacomposição que deve ter como a escola de todos os alunos da comunidade em que seinsere. Não pode haver inclusão se a preocupação da escola for nivelar (“normalizar”)o ensino para adequá-lo ao inexistente “aluno médio”. Uma educação que se reportea uma tipologia de alunos e que recorra a um leque restrito de experiências deaprendizagem irá prejudicar por falta de atenção e respostas alunos cujas motivações,necessidades, capacidades e socialização os afastam do ritmo da maioria dos seuscolegas (RODRIGUES, 2007).

Precisamos de progresso no conhecimento dos fatores que podem levar as escolasa serem mais inclusivas e, dessa forma, terem mais qualidade. Antes de tudo recolhendo,sistematizando, aproveitando tudo o que a escola já é capaz de fazer. Ainscow (2007)afirma que “as escolas sabem mais do que o que usam” e assim se todas as escolastiverem condições para usarem tudo o que podem e sabem fazer, ir-se-á verificar umenorme avanço.

No entanto, o que a escola sabe e tem não é certamente suficiente paraempreender esse processo de inovação: é fundamental que se apoiem as escolaspara serem capazes de assumir novos desafios. Só quem se sente apoiado ousa fazeralgo de diferente e de novo. Esse apoio significa que a escola deve estar convicta deque dispõe de meios humanos e materiais que lhe permita iniciar um processo deinovação. A EI é, em muitos aspectos, não uma evolução da escola integrativa masantes uma ruptura com a escola tradicional (RODRIGUES, 2006). Por isso, é precisoque as escolas que querem desenvolver uma política inclusiva sejam apoiadas e sesintam apoiadas para empreender projetos criativos, originais e de qualidade paraos alunos. A escola tem de se tornar uma organização mais coesa, mais confiante nosseus projetos e capaz de responder solidariamente aos desafios que se lhe deparam.Sem que a escola seja reforçada com mais e melhores recursos, a Inclusão pode tornar-seuma retórica temporária e superficial.

Educação Inclusiva: mais qualidade à educação

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Claro que essa empresa não é fácil: Conseguir a qualidade para todos os alunospor meio da Inclusão é uma tarefa muito mais árdua que construir uma aparente qualidadepara alguns alunos por meio do reforço de práticas uniformizadoras e complacentes coma exclusão.

A Inclusão é cúmplice da(s) qualidade(s). Não queremos uma inclusão que “sucateie”a escola: todos os alunos têm direito a serem estimulados ao nível máximo das suascapacidades. A diversidade deve ser encarada como uma exigência de qualidade nãocomo um folclore “para inglês ver”. Talvez pudéssemos desenvolver projetos educacionaissubordinados à idéia “reconhecer mais qualidade à diversidade e dar mais diversidade àqualidade”.

3 Políticas públicas e EI3 Políticas públicas e EI3 Políticas públicas e EI3 Políticas públicas e EI3 Políticas públicas e EI

O presente Seminário relaciona-se com a discussão ao nível nacional das políticasde Educação Especial e de EI no Brasil. Não esquecendo o meu “lugar de fala” como nãobrasileiro e como mero convidado, gostaria de deixar algumas reflexões genéricas colhidasda experiência do meu país e de outros a que tenho tido acesso e que, talvez, nessemomento de debate nacional, possam ter alguma pertinência.

Antes quero realçar a importância que tem o desenvolvimento da escola comoinstituição. Sem uma escola pública que ofereça formas de organização, de oportunidadesde aprendizagem, de diversificação do currículo de apoio à aprendizagem do aluno, etc.será muito difícil contextualizar a EI como uma ilha de qualidade em uma escola precária.Alguns aspectos dessa “escolarização essencial” (RODRIGUES, 2006) são bem conhecidose consensuais. Precisamos, por exemplo, de uma escola que funcione durante os doisturnos do dia, que tenha transporte e alimentação para os alunos, que funcione seminterrupções letivas que possam afetar o processo de aprendizagem, que possua umcorpo docente competente, estável e comprometido e salas de aula com um número dealunos razoável (o número muito difundido no Brasil de 35 (“no mínimo”) alunos porturma parece muito excessivo quando cotejado com outras realidades).

Por vezes, a Inclusão é vista como uma inevitabilidade modernista. Seria precisocriar escolas inclusivas porque é essa a tendência internacional e a que maisconsistentemente defende os interesses da qualidade educativa para o aluno comnecessidades educativas especiais. Entretanto, a Inclusão não deve ser feita a qualquerpreço (especialmente se esse preço for barato…). Assumir uma política pública de EducaçãoInclusiva implica necessariamente um investimento sustentado e prolongado em recursosque possam tornar a escola capaz de responder competentemente a diversos tipos dedesafios: o desafio da valorização da diferença, o da diversificação do currículo, doplaneamento educacional e o das heurísticas de ensino. Esse processo de fortalecimentoda escola implica certamente que nela se desenvolvam ações concretas de formaçãocontinuada.

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A inclusão não é uma conversão (para usar um termo religioso); é uma inovaçãoeducacional que, como todo processo de inovação, necessita de se desenvolver em umclima de confiança. Essa confiança advém do fato de a escola sentir que possui os meiospara enfrentar os desafios que a inclusão implica. Assim não é por meio de ações desensibilização ou de transmissão de aspectos teóricos que se cria essa confiança(RODRIGUES, 2007). Trata-se de desenvolver um processo de apoio situado nosproblemas concretos da escola.

Cada país encontrará face aos seus valores e práticas os melhores caminhos paradesenvolver uma escola de qualidade. O que procuramos discutir nesse texto é aimportância de fortalecer a escola pública por meio de políticas que apoiem os professoresna criação de respostas. A Inclusão não pode ser inevitável só porque é a única respostapossível; ela tem de se afirmar como sendo a melhor resposta possível, a que proporcionaa melhor qualidade educativa para as aprendizagens de todos os alunos. Dispomos deinvestigação e conhecimento que nos prova que, se a escola regular se comprometercom uma política de qualidade inclusiva, se torna vantajosa em relação às escolas especiais(cf: Humberto; Rodrigues, 2006).

Assim, em síntese, diríamos que há aspectos “intrínsecos” à escola que as políticaspúblicas devem incentivar e promover: o trabalho cooperativo, as lideranças dinâmicas,a promoção da relação entre as escolas e as famílias e as comunidades. Contudo, existemtambém fatores “extrínsecos”, isto é, aqueles que, por não serem objetos de políticas deapoio podem tornar ineficaz o esforço da escola: os recursos humanos e materiais, oapoio ao desenvolvimento profissional dos professores através de políticas que favoreçamo estabelecimento de parcerias de formação entre escolas de formação ou congéneres eas escolas que desenvolvem modelos inclusivos.

4 Para terminar…4 Para terminar…4 Para terminar…4 Para terminar…4 Para terminar…

Conheci no Brasil, no Estado de São Paulo, um menino chamado Igor. Esse meninotem paralisia cerebral e muita dificuldade em caminhar (ainda que caminhe) e dificuldadesna comunicação e na aprendizagem. Educado durante anos em uma Associação de Pais eAmigos de Excepcionais (Apae), foi sugerido à sua mãe que o matriculasse em uma escolaregular. As dificuldades foram muitas: logo na matrícula foi dito à Irma, mãe o Igor, que seela insistisse talvez a Apae pudesse recebê-lo de volta… a escola não tinha recursos paraatender a alunos “desses”. Foi dito, ainda, que como a escola não tinha recursos, ela deveriaficar com ele durante o dia na escola. “Como?” Disse a mãe. “Mas eu tenho de trabalhar…”.Duas semanas depois de Igor entrar na escola, a mãe foi chamada para lhe dizerem que oseu filho não poderia continuar lá porque os alunos tinham de mudar freqüentemente desala e o Igor, por causa das suas dificuldades de locomoção, demorava muito tempo achegar e quando chegava estava sempre atrasado. A mãe disse o que era óbvio: “Porque éque a escola não se organiza para que todas as aulas tenham lugar na mesma sala e assimdeixar de existir esse problema?”.

Educação Inclusiva: mais qualidade à educação

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Assim, de pequenas vitórias em pequenas vitórias, o Igor ficou firme na escola. No fimdo ano, o professor chamou a mãe para lhe dizer algo maravilhoso: que a escola “tinhaaprendido muito com o Igor”. E sabem o que mais? Um filme sobre dança com jovens, emque o Igor participava foi selecionado entre os 30 melhores filmes do mundo no 3º FestivalInternacional de Filmes sobre Deficiência realizado no Rio de Janeiro em agosto de 2007.O jornal da sua cidade natal, estourando de orgulho, titulava em página inteira“Jundiaienses entre os melhores do mundo” (Jornal de Jundiaí, 3 de julho de 2007, pág. 3).

“Melhores do mundo”? Pois claro que são, por causa a persistência da Irma, porcausa da persistência do Igor, por causa da humildade da sua escola em aprender comele, em lugar só pensar em o ensinar. E tudo isto acontece numa de uma sociedade quese deslumbra com quem chega ao cimo da montanha, mas cria todas as barreiras a quemquer calçar as botas para começar o caminho.

Esta me parece ser uma boa estória sobre o lado solar e lunar na Inclusão.

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Berço das desigualdadesBerço das desigualdadesBerço das desigualdadesBerço das desigualdadesBerço das desigualdades

José Pacheco1

[email protected]

Releio o Berço das desigualdades. A cada voltar de página desse livro de SebastiãoSalgado, novas imagens confirmam o título. As palavras de Cristóvão são tão concisasquanto discretas e não reduzem o impacto das fotografias que legendam.

O olhar penetrante das crianças “desiguais” invade-nos e faz-nos crer que, somentepor humana presunção, acreditaremos viver o tempo da História. Na verdade, habitamosa Proto-História do Homem. No tempo que nos coube em sorte viver, os homens dirimemos seus conflitos pelas armas. Matam em nome de um credo. Usurpam territórios emnome da paz. Edificam tribunais e prisões em nome da justiça. As frágeis e absurdasinstituições do nosso tempo são reflexos de uma humanização precária. E a instituiçãoEscola, concebida como berço de oportunidades, ainda é um “berço de desigualdades”.

O espaço público da Educação ultrapassou a exiguidade das paredes da sala deaula, mas muitos ainda não perceberam essa mutação. Por seu turno, as medidas políticasque visam reformar a instituição são centradas em vícios institucionais jamais questionados,e sempre medidas avulsas. Sucedem-se decretos e despachos, decorrentes das conclusõesde gongóricos relatórios produzidos por inúteis grupos de estudo. Acumulam-se noministério e nas universidades dispendiosos “estudos”, que não logram ir além de óbviase ressequidas “recomendações”.

Somemos à ineficácia dos políticos e “estudiosos” o papel nefasto dos opinionmakers, que, impunemente, vertem nos jornais a sua ignorância. Bem nos avisava HannahArendt: “tudo quanto é real ou autêntico é atacado pela força esmagadora da ‘tagarelice’que irresistivelmente emana do domínio público, determinando cada aspecto da vidaquotidiana, antecipando e aniquilando o sentido ou o sem-sentido de tudo”. E nãoesqueçamos a febre dos rankings. Guardo-os no ficheiro das anedotas sem piada.

Vivemos imersos em diferentes culturas, mas as medidas de política educativaaplicam-se, indiferenciadamente, em todos os países. As realidades brasileiras sãocondicionadas por influências transnacionais, em um projeto de modernidade ainda porcumprir. Aferimos o estado do nosso sistema educativo por meio de estudos comparativos,como se fosse possível reduzir a realidade a cifras, ou comparar o que é, diametralmente,diferente. As leis preconizam que se deve assegurar uma formação geral comum a todos,proporcionar aos alunos experiências que favoreçam a sua maturidade física e socioafetiva

1 Mestre em Educação da Criança pela Universidade do Porto/Portugal. Coordenador de vários projetos, destacando-se, entreeles, o projeto “Fazer a Ponte” (distinguido com o primeiro lugar do concurso “Experiências Inovadoras no Ensino”).

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e criar condições de promoção do sucesso escolar e educativo a todos os alunos. Porém,convivemos com o “insucesso educativo” como se a expressão não fosse, em si mesma,paradoxal. Como pode a palavra “educativo” ser adjetivo da palavra insucesso? Jovens portadores de desigualdades acorrem às escolas, por via de um processode massificação. Tratando os “desiguais” como se fossem iguais, “em pé de igualdade”,como geralmente acontece, não apenas mantemos a desigualdade, como a aumentamos.Não fora a dedicação e o anônimo esforço de muitos e bons profissionais da educação,há muito o neoliberalismo teria extinto a instituição Escola, como empresa falida. Ainda há quem resista e quem me confidencie vivências que confirmam processosde exclusão. Eu escrevo, denuncio. Posso fazê-lo, porque exponho fatos e não estouexposto a processos disciplinares, que ainda fazem calar muitas vozes. Como a do professorque me escreveu: “A tristeza vem quando me deparo com a realidade das nossas escolas”.Pergunto-me por que será que muitos professores resistem tanto a uma pedagogiadiferenciada, quando, para mim e para tantos outros professores, a sua pertinência é tãoóbvia. Foi a mesma voz que relatou um incidente crítico, que me custou a acertá-lo. A colega dá-me licença? -- E, sem aguardar resposta, a “colega” entrou na sala. É o que faz deixar vir para a escola esses marginais lá do bairro! Tínhamos umaescola tão bonita e, agora! -- E vai dar um sonoro par de tapas em um dos alunos “feios,porcos e maus”.

Grita um catraio da “fila dos bons”: Não foi esse que partiu o vidro, minha senhora!Ai não foi? Então, pronto! Já fica com ela, para quando fizer besteria!Na fila dos burros, onde vegeta o “desigual” contemplado com a bofetada, não há

quem saiba ler o “quadro da belezura”, no qual os caladinhos escrevem os seus nomes,no fim de cada aula. Nem o “quadro da feiura”, em que escrevem os seus nomes aquelesque não conseguem completar as suas tarefas escolares no tempo preestabelecido, ouque as terminam antes do tempo e usam o restante em ameno falatório. A fila dos“desiguais”, o “lixo da escola” -- foi a expressão que eu escutei em uma escola “igual”, hámuitos anos -- aguarda a hora do intervalo, espera o fim do dia, desespera.

Felizmente para os “desiguais”, nem todas as escolas são “iguais”. Creio na remissãodas escolas, porque creio no potencial transformador dos seus professores. E acreditoque a Escola resgatará o seu papel de “berço de oportunidades”.

Berço das desigualdades

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A Inclusão como dispositivoA Inclusão como dispositivoA Inclusão como dispositivoA Inclusão como dispositivoA Inclusão como dispositivo

Marisa Faermann Eizirik1

[email protected]

Todos trazemos em nós uma revolução. Fomos criados para construir pirâmidese versos, descobrir continentes e mundos, e caminhar, sempre, com um sacode interrogações na mão e uma caixa de possibilidades na outra.

Nizan Guanaes

Na discussão que tenho feito sobre a inclusão, como contra-face da exclusão, ascontribuições de Michel Foucault têm sido muito valiosas, partindo do entendimento deque pensar a inclusão como um dispositivo inserido em poderosas redes de saber/poder,em regimes de verdade que funcionam como sistemas de exclusão, que regulam edisciplinam as práticas sociais, as relações institucionais, a produção de subjetividade.Nessa perspectiva, vou desenvolver alguns tópicos que considero fundamentais comoferramentas para pensar a educação inclusiva como processo, acreditando que conceitossão ferramentas para pensar e agir sobre o mundo e que precisamos constituir umamentalidade inclusiva. Os tópicos são: a inclusão como dispositivo, o olhar – escutar –perceber; os dispositivos de poder, o desafio da diferença.2

1 A Inclusão como dispositivo1 A Inclusão como dispositivo1 A Inclusão como dispositivo1 A Inclusão como dispositivo1 A Inclusão como dispositivo

Até que ponto rupturas nos dispositivos de exclusão, dando abertura às experiênciasde inclusão, não estariam intrinsecamente ligados à produção de novas subjetividades,compreendendo subjetividade como um processo sempre provisório, a relação consigo,que se estabelece por meio de uma série de procedimentos que são propostos e prescritosaos indivíduos, em todas as civilizações, para fixar sua identidade, mantê-la ou transformá-la, em razão de um certo número de fins.3

1 Psicóloga, doutora em Educação/Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFGRS), professora e pesquisadora/UFRGS.2 Não tratarei mais profundamente as temáticas da diferença e da exclusão, dimensões que considero fundamentais para aanálise do processo de inclusão, pois já as terei abordado no artigo publicado pela Revista Inclusão (MEC) de outubro de 2007.3 Ler mais em EIZIRIK, Marisa F. Michel FMichel FMichel FMichel FMichel Foucault: um pensador do presenteoucault: um pensador do presenteoucault: um pensador do presenteoucault: um pensador do presenteoucault: um pensador do presente. Ijuí: Editora Unijuí, 2005, 2. ed.

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Será que não precisamos inventar uma subjetividade que possa lidar com oestranhamento, produzir estratégias e táticas em que as diferenças façam parte daexperiência, e não o mesmo, o igual, a repetição?

Poderemos tolerar, e mesmo experimentar, o sentimento de orfandade que advémda perda das certezas, da vertigem produzida pelas rupturas nos modelos preestabelecidos,do embate com a realidade que é turbulência, perturbação, desordem, convívio com adiferença, num equilíbrio sempre provisório, móvel, multifacetado, complexo?

Hoje vivemos uma revolução: a da inclusão. Inclusão como contra-face daexclusão. Revolução porque está produzindo um turbilhão de movimentos que invademtodas as áreas, entram pelos mecanismos legais e forçam a presença – nas empresas,nas escolas, nos lugares públicos, nas diferentes formas de cultura, lazer e diversão, nasexualidade.

Como vamos lidar com esse desafio? Como a escola está enfrentando a realidadede incluir em seu cotidiano, em seus processos de ensino regular, o aluno portador denecessidades educativas especiais? Essa necessidade vem não apenas dos instrumentoslegais, que visibiliza o movimento que atravessa a sociedade que, sacudida do torpor eda acomodação diante dos lugares separados, das possibilidades limitadas, dosimpedimentos, exige uma educação inclusiva.

A educação inclusiva é uma prática revolucionária e, como tal, desaloja poderes esaberes, produz necessidades e expectativas, induz a mudanças e aprendizagens, implicasofrimentos, frustrações, expectativas, mas também, prazer e alegria.

Um processo dessa natureza pode se assemelhar a uma guerra – metáfora queutilizo aqui – pois entendo que se trata de uma luta, um combate: contra as formas deolhar e atuar no mundo, contra o mesmo, o igual; contra o desejo de não se desacomodar;contra as prerrogativas de poder já estabelecidas e asseguradas; contra os nichos desaber consolidados.

2 Olhar2 Olhar2 Olhar2 Olhar2 Olhar, escutar, escutar, escutar, escutar, escutar, perceber, perceber, perceber, perceber, perceber

Uma das rupturas mais importantes que balança nosso mundo contemporâneo serefere à revolta em relação ao desejo de totalidade, aos universais englobantes,deterministas, reducionistas, instalados e fechados. Vivemos a complexidade do singular.Defendemos ardentemente nossa característica de sermos seres únicos, irrepetíveis.Experimentamos o desafio da diferença, que provoca desarranjos, rupturas, desordens,deslocamentos, revoluções. Revoluções são atos de movimento que não se dão no vazio,nem acontecem sem luta, sem resistência, sem jogo de oposições.

Imerso em contradições, “nosso” mundo ao mesmo tempo em que se revolta e serecusa ao fechado, ao dogmático, ao instalado, não gosta da revolta nem da crítica, pedea cada um para adaptar-se, submeter-se à comunicação e às imagens. Diz Badiou:4

A Inclusão como dispositivo

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É um mundo rápido e sem memória, em que as opiniões são frágeis eextremamente móveis. A única universalidade que conhece é a do dinheiro.Cada um defende sua particularidade. É um mundo obcecado pela segurança...onde é preciso calcular e proteger o seu futuro. É o mundo da carreira e darepetição. Um mundo onde o acaso é perigoso. Um mundo onde não devemosnos abandonar nos encontros.

Podemos praticar alguma forma de resistência “nesse” mundo?Ao desenvolver algumas idéias acerca das formas de pensar e conceber o mundo

de forma diferente, ou os riscos dessa aventura acredito, como Campbell,5 que “todosestamos procurando uma experiência de estar vivos, de modo que nossas experiênciasde vida... tenham ressonância no interior de nosso ser e de nossa realidade mais íntimos...”

Como realizar essa procura?Morin6 afirma que precisamos de um princípio de conhecimento que não somente

respeite, mas também revele o mistério das coisas. Para ele, as disciplinas separadasfragmentam o objeto do conhecimento complexo, conhecimento que fica aprisionado,na medida em que não se comunica, não se inter-relaciona, nem por complementaridadeou por oposição.

Em nosso mundo contemporâneo, temos uma visão excessiva, uma escutapolifônica, transparência absoluta. Tudo se mostra ao olhar, à escuta. Tudo parece omesmo, tudo é produzido para ser visto e ouvido. Não há mais véus nem mistérios.Estamos em permanente movimento, com a urgência da rapidez, da velocidade,pressionando e comprimindo nossas agendas, nossas experiências, nossos modos deviver. Com isso, achatamos a paisagem, que fica mais plana, nossa visão tem menorprofundidade, nossa audição se confunde em meio a uma multiplicidade de sons. Sob oimpacto da velocidade, perdemos a espessura.

Cardoso7 propõe uma interessante ruptura entre ver e olhar.

O ver, em geral, conota no vidente uma certa discrição e passividade ou, aomenos, alguma reserva. Nele, um olho dócil, quase desatento, parece deslizarsobre as coisas; e as espelha e registra, reflete e grava. Diríamos mesmo que aío olho se turva e se embaça, concentrando sua vida na película lustrosa dasuperfície, para fazer-se espelho...como se renunciasse à sua própria espessurae profundidade para reduzir-se a esta membrana sensível em que o mundoimprime seus relevos.

4 BADIOU, A. PPPPPara uma nova teoria do sujeito: conferências brasileirasara uma nova teoria do sujeito: conferências brasileirasara uma nova teoria do sujeito: conferências brasileirasara uma nova teoria do sujeito: conferências brasileirasara uma nova teoria do sujeito: conferências brasileiras. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 2002. p. 13.5 CAMPBELL, J. O poder do mitoO poder do mitoO poder do mitoO poder do mitoO poder do mito. São Paulo: Palas Athena, 1990. p. 5.6 MORIN, E. Ciência com consciênciaCiência com consciênciaCiência com consciênciaCiência com consciênciaCiência com consciência. Lisboa: Europa/América, s/d.7 CARDOSO, Sérgio. O olhar viajante (do etnólogo). In: NOVAES, A. et al. O olharO olharO olharO olharO olhar. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.p. 348.

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Com o olhar é diferente. Ele remete, de imediato à atividade e às virtudes dosujeito e atesta a cada passo nesta ação a espessura da sua interioridade. Eleperscruta e investiga, indaga a partir e para além do visto e parece originar-sesempre da necessidade de “ver de novo” (ou ver o novo), como intento de“olhar bem” Por isso é sempre direcionado e atento, tenso e alerta no seuimpulso inquiridor... Como se irrompesse sempre da profundidade aquosa emisteriosa do olho para interrogar e iluminar as dobras da paisagem...

Entre o ver o olhar é a própria configuração do mundo que se transforma. O ver éespontâneo, desprevenido , enquanto o olhar é intencional. A visão é totalizante enquantoo olhar é descontínuo, fragmentado, dilacerado. Rompe com a superfície lisa. “O impulsoinquiridor do olho nasce justamente da descontinuidade, desse inacabamento do mundo”.

Essas mesmas características se impõem ao escutar. Quanto podemos escutar ossons com um tom inquiridor, como procura, como instigador de possibilidades decompreender a realidade em suas múltiplas facetas?

Conceber o pensamento sob o signo da viagem, aconselhava Nietzsche,8 e não sobo signo da parada, seria fugir do imobilismo, da crença do inverno, que não suportaria ovento do degelo. Pensar é mudar. Trocar de pele, olhar diferentemente para o que seconhece, escutar diferentemente o que se pensa saber, como um viajante, um estrangeiro.

Viajar, porém, não é dado a todos. Há os acomodados, que transitam pelos espaçosconhecidos e ordenados. Recusam-se ao enfrentamento dos obstáculos, às angústiasdas desordens. Aos inquietos – curiosos ou insatisfeitos – o desconhecido instiga e desafia.“Desdenham o homogêneo e o contínuo; são sensíveis às diferenças e atentos aos limites.Afrontam obstáculos e vazios, são impelidos para o espaço aberto”.

Viagem, todavia, supõe distância e proximidade, tempo, espaço, inclusões,exclusões, potência e impotência, aventura e frustração; pressupõe, também, um entre,uma passagem, uma travessia.

As viagens são sempre “experiências de estranhamento, desarranjos nos territórios,fissuras e fendas, experiências desestruturantes, empreitadas no tempo”. Nesse sentimentode estranheza, de “alheamento” e distância, o mundo do viajante não se estreita, se abre,não se bloqueia, mas experimenta a vertigem da desestruturação, sempre, em algumamedida, marcada pela perda ou morte, de alguma verdade, certeza, convicção, preconceito.

O estranhamento proporcionado pelo olhar e a escuta viajantes não ocorrem emrelação apenas ao outro, mas também a nós próprios, pois acontecem desenraizamentos eaberturas para diversas e fecundas experiências de viver e aprender. Viagens em intensidade.

Isso implica, necessariamente, combate, lutas e enfrentamentos, o que descortinaa dimensão do poder.

8 Cf. LEBRUN, G. Passeios ao léuPasseios ao léuPasseios ao léuPasseios ao léuPasseios ao léu. Ensaios. São Paulo, Brasiliense, 1983.

A Inclusão como dispositivo

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3 Os dispositivos de poder3 Os dispositivos de poder3 Os dispositivos de poder3 Os dispositivos de poder3 Os dispositivos de poder

Ao introduzir a força como dimensão histórica da luta, do combate, no exercíciodas diferentes formas de relação entre sujeitos e instituições, Foucault9 destaca que o“poder não se dá, nem se troca, nem se retoma. Ele se exerce. Só existe em ato. A forçanão está nunca no singular, ela está em relação com outras forças”. O poder é um exercício,“uma ação sobre a ação dos outros, sobre ações atuais e eventuais, futuras ou presentes(...) é um conjunto de ações sobre ações possíveis (...) tendo o pressuposto inalienável daliberdade”. Liberdade compreendida como o infindável questionamento da experiência,que ocorre por meio das ações e opções de acordo com um campo de possibilidades.

Os campos institucionais são atravessados por relações de poder, por dispositivosque são máquinas invisíveis, quase mudas e cegas, porém são elas que fazem ver e falar,10

e, também, não ver e calar. Eles se inscrevem em um campo de possíveis e de interditose se traduzem e se implantam como modos de existência. As formas de saber e as forçasque constituem o poder atuam articuladas, formando uma malha fina, microfísica, quepercorre todo o tecido social.11

Há dois conjuntos de mecanimos de poder: -- disciplinares, que atingem corpo,indivíduos, e instituições; -- reguladores, que advém do Estado, das leis, e da população.12

Esses poderes não estão no mesmo nível, não se excluem. São articulados um ao outro.• Produzem formas de pensar.• Induzem comportamentos.• Constroem práticas.O elemento que circula entre poder disciplinar e o regulamentador é a norma.

Qual é discurso e poder da norma?13 Eliminar, segregar, fragmentar, fazer cisuras, normalizara sociedade.

Excluir faz parte dos códigos de existência. Historicamente, os processos de exclusãoacompanham a vida social, institucional, pessoal e até mesmo íntima. Muitas ediferenciadas são as formas de exclusão, sejam como apartheid social, racial, religioso,de gênero, de estado mental, civil ou econômico, para citar algumas.14

9 FOUCAULT, M. O sujeito e o poder. In: RABINOW, P.; DREYFUS, H. Michel FMichel FMichel FMichel FMichel Foucault, uma trajetória filosófica: (para alémoucault, uma trajetória filosófica: (para alémoucault, uma trajetória filosófica: (para alémoucault, uma trajetória filosófica: (para alémoucault, uma trajetória filosófica: (para alémdo estruturalismo e da hermenêutica)do estruturalismo e da hermenêutica)do estruturalismo e da hermenêutica)do estruturalismo e da hermenêutica)do estruturalismo e da hermenêutica). Rio de Janeiro: Forense Universitária,1995.10 Ler mais em DELEUZE, G. O que és un dispositivo? In: BALBIER, et al. Michel Foucault Filósofo. Barcelona, Gedisa, 1990:155-163.11 FOUCAULT, M. Microfísica do poderMicrofísica do poderMicrofísica do poderMicrofísica do poderMicrofísica do poder. Machado, Roberto (Org.). Rio de Janeiro: Graal, 1986.FOUCAULT, M. Les Anormaux -- Cours au Collège de France, 1974-75. Paris, Gallimard/Seuil, 1999. p. 44-48. In: FOUCAULT,M. A verdade as formas jurídicasA verdade as formas jurídicasA verdade as formas jurídicasA verdade as formas jurídicasA verdade as formas jurídicas. Rio de Janeiro: Nau: PUC, 1996.12 FOUCAULT, M. Em defesa da SociedadeEm defesa da SociedadeEm defesa da SociedadeEm defesa da SociedadeEm defesa da Sociedade. São Paulo: Martins Fontes, 1999.13 Ler mais em CANGUILHEM, G. O normal e o patológicoO normal e o patológicoO normal e o patológicoO normal e o patológicoO normal e o patológico. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2000.14 Ler mais em EIZIRIK, M. F. Por que a diferença incomoda tanto? In: EIZIRIK, M. F. Educação e escola: a aventuraEducação e escola: a aventuraEducação e escola: a aventuraEducação e escola: a aventuraEducação e escola: a aventurainstitucionalinstitucionalinstitucionalinstitucionalinstitucional. Porto Alegre: Editora AGE, 2001.

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A sociedade e as instituições desenvolvem mecanismos de separação, rotulação,localização -- de pessoas, grupos, idéias. Esses mecanismos são poderosos produtores deverdades e de ações, que regulam a vida das pessoas. Ao fazer isso, porém, produzemuma complexidade enorme de outros tantos movimentos, atravessado que é o camposocial por forças de várias ordens, naturezas e intensidades.

O que está em jogo é determinar quais são, em seus mecanismos, em seus efeitos,em suas relações, esses diferentes dispositivos de poder que se exercem, em diferentesníveis da sociedade, em campos e com extensões tão variadas.

Importa fazer a análise do poder, dos jogos de exclusão, dos regimes de verdadeque separam e deixam fora do sistema grandes contigentes de pessoas, pela exclusão dotrabalho, da família, do discurso, da participação plena na sociedade.

É preciso atingir a consciência das pessoas e as instituições, simultaneamente, bemali, onde ambas se suportam, na criação de ideologias, e na sua cristalização, amparadasem fortes instrumentos de poder que, ao mesmo tempo que criam, são também mantidose sustentados pelos mesmos mecanismos.

4 O desafio da diferença4 O desafio da diferença4 O desafio da diferença4 O desafio da diferença4 O desafio da diferença

Não seria a educação inclusiva um projeto revolucionário, que precisaria “decifraras dissimetrias, os desequilíbrios, as injustiças, as violências, que funcionam apesar daordem das leis, sob a ordem das leis, através das ordens das leis e graças a elas”15

Não seria necessária uma certa desordem para instalar novas ordens de sentido?É importante definir o conceito de desordem que não é uma noção simétrica da ordem.Compreende a idéia de álea, contendo também as idéias de agitação ou de dispersão equando se trata de um ser vivo, as idéias de ruído e de erro. É a desordem que permite anão predição, a indeterminação, desvios e flutuações, abrindo o espaço para atransformação. Nesse aspecto, Morin chama a atenção para a necessidade de proteger odesvio, apesar das forças institucionais o reprimirem a todo o custo. Acredita ser necessáriotolerar e favorecer os desvios no seio dos programas e instituições, a fim de criar umcampo intelectual aberto, no qual se debatem e se combatem teorias e visões de mundo.

Crise, então, para Morin, significa progressão de incertezas; mas isso não significaconfusão, ou que estejamos perdidos nela. Crise quer dizer que perdemos a evoluçãolinear, o devir pré-programado, o futuro autorizado, mas ganhamos um complexo deidéias críticas.

Sabemos que as evoluções podem significar regressões, e desenvolvimentos podemtrazer subdesenvolvimentos, pois evolução implica rupturas e transformações radicais,

15 Foucault, M. Em defesa da sociedadeEm defesa da sociedadeEm defesa da sociedadeEm defesa da sociedadeEm defesa da sociedade. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

A Inclusão como dispositivo

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das quais conhecemos, muitas vezes, os perigos e nem sempre sabemos qual seu cursoou sua finalização.

Apontar essas rupturas sísmicas, subterrâneas; trazer à luz e discutir os antagonismosfundamentais, abrir caminhos para a transformação e a metamorfose são os objetivos daconcepção epistemológica da complexidade, que defende a possibilidade de criaçãoadvinda da perda da ilusão da infalibilidade, de certeza do progresso.

Trata-se de uma racionalidade que integra os paradoxos do movimento, da liberdade,da diferença e integrando-os convida a um convívio com a pluralidade, mas essa entendidacomo criação, como uma proposta de uma visão de ciência, de mundo, de sociedade, desujeito. Criação que pressupõe uma ação que, consciente dos riscos, possa enfrentá-loscom ousadia, humildade e coragem, nas mil encruzilhadas da hesitação e da dúvida.

A autonomia é enfatizada, acompanhada da exigência de responsabilidade,inteligência e criatividade, exigindo a participação de todos e de cada um no jogo dacomplexidade. Nesse jogo, seria preciso, mais que nunca, compreender a lógica sinfônica,como já foi dito, do inesperado, da surpresa, e onde a incerteza é um ingrediente básicopara dialogar com o mistério do mundo.

Esse mistério, esse jogo, essa lógica precisam penetrar na ordem das relações,provocando deslocamentos para novos núcleos de sentido, buscando emergências deoutras ordens, onde o risco e a aventura sejam companheiros efetivos dos caminhos de(con)viver com a complexidade.

Quais os elementos que estão na raiz da questão da diferença?16

• a (re) descoberta da finitude constitutiva da vida.• a necessidade de conviver com a alteridade e os abalos inevitáveis no auto-

conhecimento e na auto-estima.• o exercício da sensibilidade, o desenvolvimento da escuta e o acolhimento à

pluralidade.• a experiência de olhar a diversidade do mundo com diferentes lentes, enfrentando

suas contradições e paradoxos.• o abalo narcisista que significa a ruptura da imagem idealizada, e a necessidade

de reformulá-la, trazendo em seu bojo simbólicas formas de nascer e de morrer.Não será o narcisismo a fragilidade para aceitar a diferença?Talvez pudéssemos exercitar a estrangereidade em nossas práticas cotidianas, que

é própria de quem não é do lugar, acabou de chegar, pode ver e escutar o que, os que láestão, não são capazes de perceber – como acontece quando experimentamos algo pelaprimeira vez, com frescor, originalidade, entusiasmo, encantamento.

16 EIZIRIK, M. F. Por que a diferença incomoda tanto? In: EIZIRIK, M. F. Educação e escola: a aventura institucionalEducação e escola: a aventura institucionalEducação e escola: a aventura institucionalEducação e escola: a aventura institucionalEducação e escola: a aventura institucional. PortoAlegre: AGE, 2001. p. 37-57.

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Há um desconforto com esse estrangeiro que é ao mesmo tempo íntimo e secreto,duplo e opaco, destituído de forma, que inspira horror e que queremos ver fora, mas queretorna, constantemente, como fantasma, estranha presença do que nos é tão familiar etão (in)visível.

Uma possibilidade seria misturar múltiplas experiências, criar algum caminho novoou uma nova forma de pensar. Quem sabe embarcar numa viagem como a realizada porDante em A Divina Comédia: “É preciso olhar com os olhos bem abertos e poder voltara perguntar-nos tudo, questionarmos tudo”.

Isso significa a construção de uma estética da aprendizagem, buscando na raizetimológica aesthesis, ou seja, sensibilidade, uma força motriz revitalizante para pensare agir nesse campo, em que ensinar e aprender exigem que olhemos, escutemos,percebamos nossas realidades por meio de múltiplas lentes, em um exercício permanentee excitante, como é a própria vida.

O que faz andar a estrada? É o sonho. Enquanto a gente sonhar, a estradapermanecerá viva. É para isso que servem os caminhos, para nos fazeremparentes do futuro.

Mia Couto, Terra Sonâmbula

ReferênciasReferênciasReferênciasReferênciasReferências

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A Inclusão como dispositivo

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Sobre o especial Sobre o especial Sobre o especial Sobre o especial Sobre o especial nanananana e o especial e o especial e o especial e o especial e o especial dadadadada educação educação educação educação educação ------ breves considerações- breves considerações- breves considerações- breves considerações- breves considerações

Maria Teresa Eglér Mantoan1

[email protected]

“Não fora um conjunto de equívocos, imprecisões, dissonâncias entre ospropósitos de uma escola para todos e sua operacionalização, teríamos,certamente, avançado muito mais na direção da inclusão escolar.Esses percalços devem-se a questões de ordem conceitual e organizacional eentre elas podemos identificar o que chamamos de indiferenciação entre oespecial na educação e o especial da educação.Não se trata aqui de jogar com as palavras, mas de se expor o que é pertinentea cada uma dessas situações, que podem interferir decisivamente para que oensino especial e o ensino regular tomem rumos compatíveis ou não com ospropósitos da escola inclusiva.”

O especial na educação escolar compreende os serviços oferecidos pela EducaçãoEspecial ao ensino escolar. Esses serviços preparavam alunos com deficiência para umapossível integração em turmas das escolas comuns e/ou substituíam o ensino regular,quando não havia condições de esses alunos serem encaminhados às escolas comuns.Há ainda muitos resquícios desse entendimento do especial na educação, que justificama manutenção das classes especiais e escolas especiais.

Como campo de conhecimento, a Educação Especial continua inalterada, na suaconcepção, buscando o entendimento do processo educacional de alunos com deficiênciae com altas habilidades. A concepção modifica-se, no entanto, quando se trata dapresença da Educação Especial, como modalidade, no ensino escolar. Presente em todasas etapas dos níveis básico e superior de ensino, ela passa a ser complemento da formaçãode alunos com deficiência, perdendo sua condição de substituir o ensino comum,curricular em escolas e classes especiais.

O atendimento educacional especializado (AEE) constitui esse complemento, queé assegurado aos alunos que dele necessitarem. Para freqüentá-lo, os alunos comdeficiência em idade de cursar o Ensino Fundamental e as demais etapas do ensino

1 Doutora em educação pela Universidade Estadual de Campinas; Coordenadora do Laboratório de Estudos e Pesquisas emEnsino e Diversidade (LEPED) do Departamento de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); autora devárias obras com o tema inclusão; e professora da graduação e do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação--- Unicamp.

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básico devem, obrigatoriamente, estar matriculados e freqüentando as turmas de suafaixa etária, nas escolas comuns.

No Capítulo III, Da Educação, da Cultura e do Desporto, artigo 205 a Constituiçãodiz, em seu art. 208, que o dever do Estado com a educação será efetivado mediante agarantia de: [...]”atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência,preferencialmente na rede regular de ensino”.

O direito ao atendimento educacional especializado (AEE) está igualmente previstonos artigos 58, 59 e 60 da Lei nº 9.394/96 – LDBEN e, para não ferir a Constituição, aousar o termo Educação Especial, deve fazê-lo, segundo sua nova interpretação, com baseno que a Constituição inovou, ao prever o “atendimento educacional especializado enão mais a Educação Especial”, como constava das legislações anteriores.

A Educação Especial, quando presente no ensino escolar, de acordo com essa novaconcepção, atinge necessariamente a escola comum em seus fundamentos e práticas.

De fato, se os alunos com deficiência passam a realizar seus estudos em escolascomuns, esse alunos, assim como outros que foram excluídos das escolas comuns,constituem uma forte pressão para que o ensino comum seja revisto em suas bases teórico-metodológicas e em sua organização pedagógica.

É certo também que os alunos com deficiência são a grande preocupação dosprofessores, gestores das escolas comuns para que elas se tornem inclusivas, mas sabemosque a maior parte dos alunos que fracassa na escola são aqueles que não vêm do ensinoespecial, mas que possivelmente acabarão nele!

Na perspectiva de um ensino para todos, o especial na educação assegura oprosseguimento dos estudos de alunos com deficiência, nas escolas comuns, por meiodo atendimento educacional especializado, que provê meios de que esses alunosnecessitam para eliminar/reduzir barreiras que suas deficiências impõem em maior oumenor grau ao aproveitamento escolar, nas turmas comuns de ensino regular. O AEE,contudo, não tem poderes para avaliar/definir quem está ou não em condições de cursaro ensino comum. O direito de todos à educação incumbe-se do acesso e permanênciade todos os alunos, com e sem deficiência, às escolas comuns.

O que entendemos como especial da educação provém dos princípios da inclusãoescolar e provoca uma re-significação da educação comum, no seu sentido mais pleno.Reconhece-se o especial da educação quando a escola atende às diferenças, nas salasde aula, sem discriminá-las, sem estabelecer regras específicas para se planejar, para avaliaro desempenho de alguns de seus alunos (currículos adaptados, atividades facilitadas,avaliações especiais da aprendizagem). O especial refere-se ao conjunto de condiçõesque qualificam as escolas para a inclusão escolar, como propõem a nossa ConstituiçãoFederal de 1988 e a Declaração de Salamanca e é depreendido do acolhimento detodos os alunos, indistinta e espontaneamente, da atenção das escolas ao que podeproduzir situações de exclusão e suas implicações, como o fracasso escolar, a evasão eoutras.

Sobre o especial na e o especial da educação -- breves considerações

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Mudanças que estão sendo implementadas em sistemas públicos e particulares deensino visando à inclusão continuam, na maioria das vezes, entendendo o especial daeducação, a partir de marcos teóricos que não conseguem superar os preceitosigualitaristas e universalistas da Modernidade.

Esses marcos apregoam a disciplinarização, a padronização, a precaução contra aincoerência, a indeterminação, a indefinição e tudo o mais que possa desestabilizar asescolas, insistindo em manter a sua ânsia pelo lógico, pela negação das condições queproduzem as diferenças. A orientação é incompatível com o especial da educação inclusiva.

Temos dificuldade de incluir todos nas escolas, porque a multiplicidade incontrolávele infinita das suas diferenças inviabiliza o cálculo, a definição desses sujeitos e não seenquadra na cultura de igualdade das escolas.

A diferença é difícil de ser recusada, de ser negada, desvalorizada e o especial daeducação e o especial na educação que não conseguem assimilá-la, em um quadrointerpretativo includente, reproduzem o igualitarismo essencialista, em que se a exclusãose perpetua. Há, então, de se mudar de quadro referencial e definir o especial da e naeducação com base no reconhecimento e valorização das diferenças, demolindo os pilaresnos quais a escola tem se firmado até agora.

A igualdade abstrata não propiciou a garantia de relações justas nas escolas.A igualdade de oportunidades, que tem sido a marca das políticas igualitárias edemocráticas no âmbito educacional, também não consegue resolver o problema dasdiferenças nas escolas, pois elas escapam ao que essa proposta propõe, diante dasdesigualdades naturais e sociais.

Em sua obra Teoria da Justiça, Rawls (2002) opõe-se às declarações de direito domundo moderno, que igualaram os homens em seu instante de nascimento eestabeleceram o mérito e o esforço de cada um, como medida de acesso e uso de bens,recursos disponíveis e mobilidade social. Para esse filósofo político, a liberdade civil comsuas desigualdades sociais e a igualdade de oportunidades com suas desigualdadesnaturais são arbitrárias do ponto de vista moral; ele propôs uma política da diferença,estabelecendo a identificação das diferenças como uma nova medida da igualdade.Ele assim pronunciou-se:

[...] Assim, somos levados ao princípio da diferença, se desejamos montar osistema social de modo que ninguém ganhe ou perca devido ao seu lugararbitrário na distribuição de dotes naturais ou à sua posição inicial na sociedadesem dar ou receber benefícios compensatórios em troca (p. 108).

O referido autor, caminhando na mesma direção das propostas escolares inclusivas,defende que a distribuição natural de talentos ou a posição social que cada indivíduo

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ocupa não são justas, nem injustas. O que as torna justas ou não são as maneiras pelasquais as instituições (no caso, as educacionais) fazem uso delas. Ele sugere, então, umaigualdade democrática, que combina o princípio da igualdade de oportunidades com oprincípio da diferença (idem, ibid., p. 79).

A sugestão de Rawls tem opositores, por ser contra à noção de mérito. Para osque lutam por uma escola verdadeiramente inclusiva, na mesma linha argumentativade Rawls (idem, ibid.), o merecimento não parece aplicar-se devidamente aos que jánascem em uma situação privilegiada socialmente, aos que já tiveram a oportunidadede se desenvolver, a partir das melhores condições de vida e de aproveitamento desuas potencialidades; o mérito deve ser proporcional ao ponto de partida de cadaum.

Rawls (idem, ibid.), ao combinar os dois princípios, reconhece que as desigualdadesnaturais e sociais são imerecidas e precisam ser reparadas e compensadas, e o princípioda diferença é o que garante essa reparação, visando à igualdade.

O autor ressalta ainda que a igualdade de oportunidades é perversa, quando garanteo acesso, por exemplo, à escola comum, de pessoas com alguma deficiência de nascimentoou de pessoas que não têm a mesma possibilidade das demais de passar pelo processoeducacional em toda a sua extensão, por problemas alheios aos seus esforços. Entretanto,não lhes assegura a permanência e o prosseguimento da escolaridade em todos os níveisde ensino.

Mais um motivo para se firmar a necessidade de repensar e de romper com omodelo educacional elitista de nossas escolas e de reconhecer a igualdade de aprendercomo ponto de partida, e as diferenças no aprendizado, como processo e ponto dechegada.

Joseph Jacotot2 traz um olhar original sobre a igualdade, que se emaranha nasquestões de direito, de política, de promessas constitucionais. Para esse professor deidéias extravagantes para a sua época e para a atualidade, a igualdade não seria alcançadaa partir da desigualdade, como se espera atingi-la, até hoje, nas escolas; acreditava emuma outra igualdade, a igualdade de inteligências. Jacotot defendia o ser humano comoser cognoscente, capaz de aprender, de conhecer e defendia essa capacidade de todasubmissão – uma inteligência não pode submeter uma outra. Em uma palavra, aemancipação da inteligência proviria dessa igualdade de capacidade de aprender, quevem antes de tudo, que é ponto de partida para qualquer tipo ou nível de aprendizageme não o seu resultado!!!

2 Educador que viveu de 1770 a 1840. Foi trazido do esquecimento da história da pedagogia do século XIX por Rancière eoutros filósofos que se propõem a entender a educação pelo seu avesso.

Sobre o especial na e o especial da educação -- breves considerações

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O professor, portanto, não deveria negar essa capacidade, esse “lugar do saber”que é anterior a qualquer aprendizagem e que cada aluno tem de ocupar no seu percursoeducacional. Não reconhecendo a emancipação intelectual nessa perspectivarevolucionária, estaríamos ferindo o princípio de igualdade intelectual e, assim,embrutecendo esse aluno com um ensino explicativo e limitador, que o assujeita à verdadedo mestre, sem contestações.

Rancière (2002) relembra os ensinamentos de Jacotot, quando diz:

Há desigualdade nas manifestações da inteligência, segundo a energia mais oumenos grande que a vontade comunica à inteligência para descobrir e combinarrelações novas, mas não há hierarquia de capacidade intelectual (p.49).

As grandes lições desse mestre são mais um argumento em favor da necessidadede combinar igualdade com as diferenças e de nos distanciarmos dos que se apegamunicamente à cultura da igualdade de oportunidades liberal e do mérito para defender aescola do seu caráter excludente, que bane os que por desigualdades significativas denascimento e/ou desigualdades sociais não conseguem preencher os requisitos de umpadrão de aluno previamente estipulado.

A escola insiste em afirmar que os alunos são diferentes quando se matriculamem uma série escolar, mas o objetivo escolar, no fim desse período letivo, é que elesse igualem em conhecimentos a um padrão que é estabelecido para aquela série,caso contrário serão excluídos por repetência ou passarão a freqüentar os grupos dereforço e de aceleração da aprendizagem e outros programas embrutecedores dainteligência.

A indiferença às diferenças está acabando, passando da moda. Nada mais desfocadoda realidade atual do que ignorá-las e isolá-las em categorias genéricas, típicas danecessidade moderna de agrupar os iguais, de organizar pela abstração de umacaracterística qualquer, inventada, e atribuída de fora.

Os alunos jamais deverão ser desvalorizados e inferiorizados pelas suas diferenças,seja nas escolas comuns, como nas especiais. Esses espaços educacionais não podemcontinuar sendo lugares da discriminação, do esquecimento, que é o ponto final dosque seguem a rota da proposta da eliminação das ambivalências com que as diferençasafrontam a Modernidade.

A intenção de destacar o especial na e da educação, nesse texto, é a nossacontribuição para esquentar o debate e a oportunidade de firmarmos uma posição diantedos rumos a serem tomados pela nossa educação nesses tempos de (in) decisão e deinquietude.

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As mudanças propostas pelas novas políticas educacionais para o ensino regular eespecial ensejam a recolocação de questões, o reencontro das dúvidas, o confronto denossas pretensões com as incertezas, com a incompletude, com a instabilidade doconhecido.

Enfrentar idéias, posicionamentos, situações novas, que exigem desprendimento edesconfiança de todo saber que nos nutriu e com o convencionalismo de nossasconcepções e práticas, não é fácil, mas possível!

ReferênciasReferênciasReferênciasReferênciasReferências

RANCIÈRE, Jacques. O mestre ignoranteO mestre ignoranteO mestre ignoranteO mestre ignoranteO mestre ignorante. Cico lições sobre a emancipação intelectual.Belo Horizonte: Autêntica, 2002.

RAWLS, John. Uma teoria da justiçaUma teoria da justiçaUma teoria da justiçaUma teoria da justiçaUma teoria da justiça. 2ª edição. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

Sobre o especial na e o especial da educação -- breves considerações

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Política e Educação Especial: quais interrogações e quais riscos quantoPolítica e Educação Especial: quais interrogações e quais riscos quantoPolítica e Educação Especial: quais interrogações e quais riscos quantoPolítica e Educação Especial: quais interrogações e quais riscos quantoPolítica e Educação Especial: quais interrogações e quais riscos quantoao futuro da inclusão escolar?ao futuro da inclusão escolar?ao futuro da inclusão escolar?ao futuro da inclusão escolar?ao futuro da inclusão escolar?

Claudio Roberto BAPTISTA1

[email protected]

As reflexões que integram o presente texto partem de algumas premissas queprecisam ser destacadas para que se torne compreensível o ponto de vista de quemescreve. As intensas mudanças que têm caracterizado a educação especial contemporâneaencontram resistências que perpassam vários âmbitos constitutivos da nossa vida emcomum. Do plano legislativo à prática cotidiana. Das diretrizes curriculares às sensaçõesevocadas diante daqueles que insistentemente chamamos “diferentes”. Da ausência deresponsabilidade anunciada (“isso não nos diz respeito”) ao movimento de circunscrevero fenômeno da inclusão em um circuito delimitado da educação especial (“isso é comvocês!”).

Como reagir a esse estado atual? Como provocar mudanças, e em que direção,para que a perspectiva inclusiva se consolide? Essas parecem ser perguntas que orientamas ações que têm nos reunido como interessados. Há uma percepção de uma parcelados profissionais envolvidos com a educação especial de que o avanço oportunizadopelos dispositivos legais, para favorecer a inclusão escolar, estaria estagnado e queseria o momento de colocar em discussão esses dispositivos. Essa perspectiva poderiaproduzir efeitos quanto à mudança no plano das leis que orientam a escolarização?Certamente sim. Essa perspectiva poderia associar essas mudanças legais às alteraçõesque constituiriam a escola brasileira como uma escola inclusiva? Esse é nosso grandedesafio.

Dentre os tantos pontos de partida para essas questões, temos um: a definição deuma Política Nacional e as responsabilidades dos gestores em seus diferentes níveis. Nessesentido, a Secretaria de Educação Especial do MEC tem provocado instâncias integrantesda sociedade brasileira para instituir um movimento de revisão do texto que constitui aPolítica Nacional de Educação Especial. Ou melhor, de proposição de uma nova Políticade Educação Especial. Para tanto, alguns pesquisadores da área, dentre os quais meincluo, integram uma comissão assessora que tem trabalhado na busca de palavras e nainteração com interlocutores. Substancialmente, é esse nosso trabalho: buscar palavrase dialogar. Não é pouco, considerando o universo deslizante das palavras, seus equívocos,

1 Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). www.ufrgs.br/faced/pos

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seus múltiplos sentidos, suas armadilhas... Não é pouco, considerando que o diálogo éuma tarefa árdua que nós perseguimos sempre, ensinamos a nossos alunos que esta é averdadeira direção do ato educativo, mas apenas raramente somos capazes de instituirdiálogos.

Pretendo, considerando essa meta, com esse texto, apresentar o ponto de vista deque falo; abordar brevemente os sentidos e as direções desse movimento de instituiçãode uma Política Nacional de Educação Especial; refletir sobre algumas armadilhas queidentifico associadas à nossa tendência de simplificar os desafios e acreditardemasiadamente na potência daquilo que se anuncia como novo. Abordarei de formaconjunta os dois primeiros itens para depois ocupar-me do terceiro e, então, buscar umfechamento reflexivo.

1 Pontos de partida1 Pontos de partida1 Pontos de partida1 Pontos de partida1 Pontos de partida

Represento um grupo de pesquisa (Nepie2 -- UFRGS) da área da educaçãoespecial que tem se ocupado na análise da política nos seus desdobramentos emtermos de uma política do cotidiano, investigando as relações entre o discurso políticoe as práticas educativas como constituidores de sujeitos. Minha disposição, portanto,de integrar um grupo que se ocupa das palavras e do diálogo é intensa, porémreconheço que a riqueza desses encontros está na possibilidade de nos deixarinterpelar, sem pretensão alguma de uma coesão que impeça a identificação dasdiferenças que nos constituem.

Até o presente momento, podemos dizer, a respeito da instituição de uma “novapolítica de educação especial”, que o sentido de provocar movimento pode ser vistocomo aquele de valorizar a política “instituinte”, para resgatar um termo tão caro àpedagogia institucional (MEIRIEU, 2002; BAPTISTA, 2004). Essa reconfiguraçãoviabiliza-se por meio de uma ampliação de interlocutores que têm diferentes canais deinserção social e institucional, como ocorre com pesquisadores, gestores, educadoresem diferentes níveis. Pode ser compreendida como uma ação política de fazer comque a tarefa de escrita coletiva de um texto seja uma oportunidade de construção,pelas palavras e pelo diálogo, de uma perspectiva que se encontra anunciada, porém,como destaquei nas premissas iniciais, tão carente de pontos de afirmação. Desse modo,talvez tenha maior importância nossa oportunidade de confrontar nossas opiniões erever nossos pontos de vista que a inscrição da palavra que se assume como “a política”.Pensar desse modo é reconhecer que o texto ao qual chegaremos será necessariamente

Política e Educação Especial: quais interrogações e quais riscosquanto ao futuro da inclusão escolar?

2 Núcleo de Estudos em Políticas de Inclusão Escolar (Niepie): www.ufrgs.br/faced/pesquisa/nepie

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parcial e, provavelmente, contraditório em certos aspectos, mas que vale a pena investirna política como essa ação de “ocupar-se das coisas públicas”(ROSSO, 1998). Assumiresse ponto de vista é também entender-se como partícipe de um movimento quecongrega planos muito diferenciados e complexos que estão em mutabilidade contínua.Por isso, como ocorre com nossa ação de docentes, fazemos movimento no movimento,pois cada aluno que muda com a experiência educativa nada tem de estático e plácido.Se pretendemos movimento, na política, devemos ser capazes de fazer movimento nomovimento.

2 Direções e tensões na instituição de uma política de educação especial2 Direções e tensões na instituição de uma política de educação especial2 Direções e tensões na instituição de uma política de educação especial2 Direções e tensões na instituição de uma política de educação especial2 Direções e tensões na instituição de uma política de educação especial

Temos discutido insistentemente as vantagens de uma educação que acolha a todasas crianças, independentemente de suas características e de suas limitações. Porém, essedebate tem se restringido aos responsáveis pela educação especial. Essa afirmação valetanto para o plano acadêmico (quem investiga os processos inclusivos?) quanto paraaquele da gestão (quem se ocupa da inclusão nas redes de ensino?). Em ambos os casos,nossa resposta tende a ser: aqueles “da educação especial”. Diante de umaintencionalidade de intensificação da inclusão como diretriz, identifico como necessáriopara a elaboração de uma Política Nacional de Educação Especial o envolvimento desetores não específicos da área, a começar pelos gestores nacionais que são responsáveispela educação chamada regular. Quanto mais nos resignarmos diante da ação que seanuncia dirigida à inclusão, tendo como partícipes os responsáveis pela educação especial,mais teremos seus efeitos no cotidiano das escolas, em razão da não-implementação demudanças que deveriam ocorrer no ensino comum para dar viabilidade a processosinclusivos. Não serão apenas os responsáveis pela educação especial a indicar como oensino comum deverá ser modificado para dar conta da escolarização de alunos comdeficiência ou com necessidades educativas especiais. Essas indicações podem ter sentidoquando se referem ao plano dos estudos, da pesquisa, mas os gestores, comresponsabilidades diretas na vida dos sistemas de ensino, deverão ser mobilizados nasdiferentes áreas que constituem a escolarização e não apenas os setores específicos ligadosà educação especial. Esse, segundo acredito, é um fenômeno que acaba se reproduzindodo Ministério da Educação às mais remotas escolas rurais. Insisto: quem se ocupa deinclusão escolar? Quais as nossas habilidades e oportunidades de diálogo com osresponsáveis pelo ensino comum? Quais as responsabilidades assumidas por gestores eprofessores do ensino comum na direção de uma política de inclusão escolar? Em geral,as iniciativas de investigação (TEZZARI, 2006; BAPTISTA; DORNELES, 2004) têm mostradoque continua havendo uma responsabilidade circunscrita: quem se ocupa de inclusão é,na melhor das hipóteses, o responsável pelo setor de educação especial das secretarias,o professor especializado, o professor de sala de recursos; mas também pode ocorrer acompreensão de que quem se ocupa é a instituição especializada que se “transforma”

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em pólo assessor, com a difícil tarefa de “tradução” de práticas típicas da educação especialpara o contexto do ensino comum. Quanto mais distante do ensino comum estiver oresponsável, mais intenso será o abismo entre o conhecimento específico pedagógico e apossibilidade de uma ação planejada pelos docentes. Talvez essa seja nossa urgêncianúmero um: admitir que essa cisão é prejudicial aos processos inclusivos e que é algoque evoca nossa responsabilidade compartilhada. Todos compactuamos, por meio danossa naturalidade ou da nossa ausência de iniciativa, com uma lógica que mantém asfragmentações na escola. Resta saber quais são nossas capacidades articuladoras, nãoapenas para fazer com que a relação profissional do educador especializado se tornemais sintônica com a ação do colega do ensino comum, mas para fazer com que osgestores que não são da educação especial passem a se ocupar de fenômenos que dizemrespeito à inclusão escolar. Nosso diálogo e nosso movimento de assunção deresponsabilidades começam na escolha das palavras para o possível diálogo. É dessaspalavras que desejo me ocupar a seguir.

3 O ato de escolher palavras3 O ato de escolher palavras3 O ato de escolher palavras3 O ato de escolher palavras3 O ato de escolher palavras

No início desse texto, afirmei que a palavra é o terreno da possibilidade de diálogo e,igualmente, o terreno de muitos equívocos em decorrência do caráter deslizante dossentidos. A psicanálise nos ensinou que não existe a palavra livre desse risco, assim comoo fizeram autores como Vigotsky e Bateson. No entanto, penso ser interessante uma açãoreflexiva que consiga antecipar alguns riscos. O que ocorreu nas últimas duas décadas foi avalorização de um termo que, embora conceitualmente muito diferente de “deficiência”,passou a substituir essa palavra na educação especial: necessidades educativas oueducacionais especiais. Esse conceito, muito mais amplo, por envolver também alunosque apresentam dificuldades acentuadas de aprendizagem, tem sido o conceitopredominante em nível internacional e orientador das políticas educacionais no Brasil. Asvantagens dirigidas ao conceito estariam ligadas à sua capacidade de envolver o contexto,pois a produção das chamadas dificuldades de aprendizagem, todos sabemos, tem noscontextos de referência dos alunos uma forte dimensão constitutiva. A escola contribuipara que as crianças tenham dificuldades, até mesmo acentuadas, de aprendizagem. Quantoaos efeitos desse conceito na organização dos sistemas de ensino, podemos identificar umesforço de identificação de um continuum entre o aluno do ensino comum, o aluno doensino comum que demanda algum apoio pedagógico (laboratório de aprendizagem ouoficinas) e o aluno do ensino comum que demanda o atendimento especializado oferecidoem salas de recursos por educadores com formação em educação especial.

Em outra direção, temos acompanhado a emergência de críticas de muitos estudiososda área quanto à generalização do termo “necessidades educativas especiais”, para terse tornado muito amplo e envolver alunos que não necessariamente precisariam doatendimento educacional especializado.

Política e Educação Especial: quais interrogações e quais riscosquanto ao futuro da inclusão escolar?

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Em alguns documentos internacionais, a conceituação envolve crianças que vivemem condições de desvantagem que podem contribuir para que haja dificuldades na escolaou que têm suas dificuldades associadas às dimensões culturais ou lingüísticas. Assim,pode-se dizer que, pela imprecisão do diagnóstico, poderíamos ter crianças identificadascomo alunos com necessidades especiais sem que o fossem. Esse fenômeno não é exclusivodo atual momento histórico e nem desse conceito. Devemos retomar essa questão.Reconheço uma disposição por parte de vários setores responsáveis pela atual discussãosobre a política de educação especial, para propor que abandonemos o conceito“necessidades educacionais especiais” e passemos a identificar o aluno da educaçãoespecial como aquele com deficiência, com altas habilidades e com transtornos globaisde desenvolvimento.

Quais os efeitos de uma decisão dessa natureza para a política brasileira relativaà educação especial? O ponto de partida que identifico como organizador de minhaleitura é: não existe conceito que nos livre dos problemas, pois estamos em umterritório que, para além das palavras, tem representado a “periferia” (BAPTISTA,2006). A educação especial, a educação popular, a educação de jovens e adultos sãocampos de conhecimento e atuação que têm tido uma posição secundária quandonos referimos às políticas (considere-se os recursos econômicos o número deatendimentos, a emergência de elementos de divulgação). Reafirmo, portanto, queseria uma ilusão a crença de que reduziríamos os problemas da educação especial,restringindo o conceito e abandonando um termo considerado “vago”. Nãoresolveremos nossos problemas com base nessa restrição por dois motivos específicosque merecem muita atenção.

Primeiro, porque a idéia de que, ao restringir, garantiremos o atendimentoespecializado a quem de fato necessita é falsa. Falsa quando consideramos o númerode oferta de vagas comparado ao universo de pessoas que seriam o contingentepotencial da educação especial. A oferta extremamente reduzida foi analisada porOdeh (2000), em estudo que mostrava como, contraditoriamente ao que se pensa,os alunos com necessidades especiais já se encontram matriculados no ensino comume não se beneficiam de serviços de apoio. Esse movimento que a autora chama de“integração não-planejada” tem suas vantagens e seu lado perverso. A vantagem seriaa não-identificação do aluno, permitindo que o mesmo tenha a chance de tentar aescolarização, ainda que em uma escola que não está devidamente preparada paraessa tarefa. O lado perverso é aquele que, em razão do tipo de escola que temos(não da ausência de identificação do aluno), o que ocorre freqüentemente é aprodução de sujeitos não escolarizados e que acabam abandonando a escola, comum forte sentimento de que o “erro” estaria nele (“eu não fui feito para essaexperiência”).

O que fazer? Em quais situações seria compreensível que se defendesse a restriçãoconceitual, com ênfase em alguns grupos de sujeitos? A primeira questão a ser respondida

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é relativa à definição. Para esse debate, escolho um grupo de sujeitos que têm nodiagnóstico um tema polêmico, o que não é verdade para todos os quadros dedeficiência. No entanto, esses sujeitos têm sido aqueles que constituem o maiorcontingente de alunos da educação especial.3 Refiro-me ao aluno com deficiênciamental. A quem cabe definir o aluno com deficiência mental? Quem se ocupará dadiferenciação entre esse aluno e aquele com dificuldades de aprendizagem?Historicamente, apesar de termos freqüentemente evocado a responsabilidade de“equipes multidisciplinares”, sabemos que duas áreas têm sido responsáveis por essaidentificação: a psicologia e a medicina. Na última década, com base na ênfase aoconceito necessidades educativas especiais, o trabalho do educador especializadotem sido valorizado na identificação inicial do aluno. Apesar disso, nossos indicadoresnuméricos, como mostra o censo escolar do Instituto Nacional de Estudos e PesquisasEducacionais (Inep), continuam sendo pautados nas categorias associadas àdeficiência. Portanto, há ao menos dois planos diferenciados de consideração dosujeito: um mais genérico para indicar de quem devemos nos ocupar e outro maisrestritivo, que é acionado no momento de quantificar esses alunos. Como fortaleceruma tendência de valorização do diagnóstico inicial realizado pelos educadoresespecializados e, contemporaneamente, defender o retorno a parâmetros maisrestritivos associados à deficiência? No caso da deficiência mental, esse movimentoterá como efeito a valorização da ação profissional dos psicólogos e dos médicospara efetuar a identificação ou para decidir sobre a avaliação inicial desse sujeito.O recurso à área da saúde ocorre ainda hoje, mesmo tendo como parâmetro asnecessidades especiais e mesmo em redes de ensino nas quais o educadorespecializado tem seu trabalho extremante valorizado. Creio que essa tendênciadeverá se acentuar. O que faremos com nosso esforço histórico para garantir umaavaliação contextualizadora e a ocorrência de oportunidades que, muitas vezes, sãofavorecidas pela ausência de um rótulo explícito como “deficiente mental”? Quais osriscos de, apesar de nossa boa intenção atual, contribuirmos para uma valorizaçãode uma concepção biologizante na avaliação desses alunos? Se houve, durante muitotempo, o processo de diagnóstico de deficiência mental imposto a alunos comdificuldades de aprendizagem, que garantias temos de que essa não será a direçãoprovável com a revalorização desses conceitos no plano da política? Não tenho essasrespostas, mas sinto-me na obrigação de destacar esse risco. Resta a tarefa de nossacontínua “busca pelas palavras”.

3 De acordo com o Censo escolar do Inep/2006, os alunos com deficiência mental correspondem a aproximadamente 40% dototal de alunos da educação especial. Caso consideremos as possíveis relações desse grupo de sujeitos com o segundocontingente numérico (14% -- condutas típicas), a tendência seria de aumento do número total de alunos com essa deficiência.Esclareço que apesar de serem grupos distintos, ambos têm a indefinição de parâmetros identificadores como característicase, além disso, há sobreposições entre os dois grupos.

Política e Educação Especial: quais interrogações e quais riscosquanto ao futuro da inclusão escolar?

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4 4 4 4 4 A dimensão pedagógicaA dimensão pedagógicaA dimensão pedagógicaA dimensão pedagógicaA dimensão pedagógica

No que se refere à dimensão pedagógica do debate atual sobre a Política Nacionalde Educação Especial, penso que merecem atenção dois pontos que nos auxiliam apensar os sujeitos e os espaços da educação.

Quanto aos sujeitos, tenho observado a predominância de uma referência aoconceito de “pessoa” nos debates atuais sobre a “nova política”. Apesar de reconhecer aimportância do termo o qual teve seu lugar de destaque na Constituição de 1988 – aConstituição chamada Cidadã --, entendo que uma política de educação deveria focalizarum personagem mais definido e dar ênfase ao “aluno”. Esse foi o termo enfatizado pelaLei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) de 1996.

Quanto aos espaços educacionais, considero que as diretrizes da atual política,além de assegurarem o ensino comum como espaço de todos os alunos, deveriam indicaro privilégio da dimensão pedagógica associada a dispositivos didáticos como a sala derecursos e como a ação do professor especializado na condição de “professor de apoio”.Devemos nos interrogar sobre as metas da implementação desses dispositivos e sobresuas relações com o projeto político-pedagógico da rede de ensino em questão. A salade recursos é um dispositivo potente nos processos inclusivos em razão de sua atuaçãocomplementar, porém não avançaremos no uso desse espaço se não houver uminvestimento na sua qualificação pedagógica, o que tem precária relação com a concepçãodessa sala como um espaço físico diferenciado, com materiais típicos do ensinoespecializado, podendo resultar em uma espécie de microclínica no interior da escola.Nosso desafio, portanto, é pensar dispositivos que estejam articulados a um projeto geralque valorize os processos inclusivos.

5 Para concluir5 Para concluir5 Para concluir5 Para concluir5 Para concluir

Considero que vivemos um momento privilegiado e desafiador. Temos acesso àsinformações; temos disposições legais que já indicavam uma diretriz “inclusiva” que agoratende a se intensificar; temos conhecimento acumulado sobre a prática pedagógica. Noentanto, temos também desafios associados às dimensões de nossa tarefa histórica depensar a educação no Brasil, em paralelo com as demais prioridades nacionais. Aodebatermos a Política Nacional de Educação Especial, a dinâmica de um diálogo pluralpode ser um bom indício. Contudo, é importante que não tenhamos tantas ilusões.Ainda há muito a fazer. Trata-se de valorizar um processo de escolhas de palavras e defortalecer a ação dirigida aos contextos em movimento, o que deveria nos implicar aindamais. Penso que um dos efeitos desejáveis desse momento histórico seria aquele deintensificar a responsabilização dos gestores estaduais e municipais, visto que a EducaçãoBásica é um âmbito de responsabilidade prioritária desses gestores. Assim, devemoscontinuar nossa busca pelas palavras, apostando no diálogo como estratégia e como

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meta de nosso trabalho. Considero que nossa ação deva buscar a ampliação dosimplicados nesse processo, reduzindo a centralização da responsabilidade pela inclusãona educação especial; deva intensificar a dimensão pedagógica ao pensarmos osdispositivos que pretendemos colocar em ação; deva ser pautada na cautela com relaçãoà escolha reflexiva de palavras, reconhecendo a complexidade dessa tarefa.

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O currículo em grades: mais um desafio para a Educação InclusivaO currículo em grades: mais um desafio para a Educação InclusivaO currículo em grades: mais um desafio para a Educação InclusivaO currículo em grades: mais um desafio para a Educação InclusivaO currículo em grades: mais um desafio para a Educação Inclusiva

Soraia Napoleão Freitas1

[email protected]ônio Carlos do Nascimento Osório2

osó[email protected]

Trata-se, em suma, de interrogar o caso de uma sociedade que desde há maisde um século se fustiga ruidosamente por sua hipocrisia, fala profilaxamentede seu próprio silêncio, obstina-se em detalhar o que não diz, denuncia poderesque exerce e promete liberar-se das leis que fazem funcionar (FOUCAULT,1988, p.14).

O presente artigo tem como objetivo incentivar reflexões acerca do currículo, comoum dos instrumentos que se dimensiona e se adequa de diferentes maneiras, “ditas”pedagógicas, em lidar com o conhecimento de forma disciplinar, fragmentada eredistribuída, por interesses e valores, os quais se alojam por meio de dois pilaresconsolidados como dispositivos reguladores.

O primeiro pilar estrutura-se a partir de uma análise sócio-histórica que permitaentender o currículo como fruto de relações de poder, coordenado por interesseseconômicos dominantes, que utilizam os mesmos mecanismos de repressão, de controlee de domínio, chegando até o aluno. O segundo tem suas origens nos conflitos de ordemcultural, no valor pelo qual se define um currículo e se postula imperativos disciplinares,metodológicos, avaliativos, como “prescrições de prudência” em regras de imanência, devariações contínuas e de polivalência. Tudo isso se encaminha para uma melhorsegregação, quando enunciamos um currículo que deveria dar conta de alunos comdeficiência, transtornos globais do desenvolvimento e alunos com superdotação/altashabilidades.

1 Professora Associada I, do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), RioGrande do Sul. Líder do Grupo de Pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq):“Educação Especial: interação e inclusão social”. Coordenadora do Programa de Apoio à Pesquisa em Educação Especial(Proesp)/MEC/Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) da UFSM.2 Professor Associado I, do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS),da Linha de Pesquisa “Educação e Trabalho”, e Coordenador dos Grupos de Estudos/CNPq: “Educação, trabalho e formaçãoprofissional” e “Investigação acadêmica nos referenciais foucaultianos”. Coordenador do Programa de Apoio à Pesquisa emEducação Especial Proesp/MEC/Capes da UFMS.

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Essas polêmicas históricas e sociais ganham sentido no momento que se discute ese encaminha uma política para a educação especial, a partir dos pressupostos de queela é definida como um conjunto de ações que perpassa os níveis e modalidades deensino, nos modelos normativos estruturantes no País, compreendendo o atendimentoeducacional especializado, os serviços e recursos específicos que favorecem a interaçãoentre as características pessoais dos alunos com deficiência, transtornos globais dodesenvolvimento e altas habilidades e o contexto familiar e social, promovendoaprendizagem a partir das condições individuais de cada aluno. Com isso, assume-se ocompromisso social, agora não mais só teoricamente, de que o aluno é o centro daaprendizagem e o sujeito do próprio conhecimento.

Assenta-se, então, a perspectiva da educação inclusiva que se fundamenta em rupturasnas estratégias e tecnologias do poder, inerentes a uma sociedade organizada pela exclusão,constituindo-se em uma proposta de organização do sistema educacional que reconheceo direito de todos de compartilhar de um mesmo espaço pedagógico, promovendo aigualdade, valorizando as diferenças, potencializando a participação dos alunos no currículo(comum) da escola e garantindo sua aprendizagem de acordo com suas condiçõesindividuais. É a ruptura da homogeneização dos sujeitos, da uniformidade do saber.

O currículo, nesse contexto de enfrentamento, continua sendo um desafiofundamental e contraditório para os educadores e, ao mesmo tempo, os limites e aspossibilidades de uma real mudança educacional, assentada na perspectiva de que todospodem aprender, mas não por aquilo que os “outros querem” que o aluno aprenda, massim pelo que “possa” aprender, a partir de suas condições cognitivas.

Ao enunciarmos a expressão “currículo”, associada à escolaridade de forma geral(educação infantil, ensino fundamental, médio, superior, profissional) ou específica (educaçãoespecial, educação de jovens e adultos), no contexto, emergem sempre as questões deordem social: o fracasso escolar e os limites daquilo que se pensa sobre o “ato de educar”e o que efetivamente se “pratica” na realidade escolar. Há um isolamento entre os reaisfatores que interferem na prática pedagógica. Em um princípio geral, analisa-se a questãoeducacional em um espaço reduzido aos muros da instituição escolar ou a quem se destina,fragmentando em especificidades, distanciando-se cada vez mais do que é educação emsua totalidade. Isso permite melhor controle daquilo que se prática como pedagógico.

Se, por um lado, é difícil estabelecer as razões e os motivos, à distância entre o“pensar” e “fazer”, o currículo concebido como um elemento pedagógico é o segundogrande distanciamento. O currículo deve estar sempre voltado à dinamicidade histórica deum mundo que tem registrado como regras gerais a complexidade, o ambíguo e o imprevisto.Por outro, é fácil localizar os diferentes momentos em que o currículo foi utilizado comomeio tático de desmobilização e controle, do ponto de vista de ser responsabilizadopela preparação para melhoria de condições humanas.

A promessa de uma educação igual para todos geralmente provém de gruposdominantes para amansar e justificar a maioria da população, dimensionando o currículocomo elemento responsável para uma melhor cidadania. Entretanto, é importanteelucidar que essa possibilidade currículo/cidadania, em uma perspectiva emancipatória,

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pode permitir entender que o “conhecimento” e “poder” não estão disponíveis a todos.Ao contrário, são duramente disputados ou, na maioria das vezes, negados, fazendoessa contradição parte integrante da dinamicidade dialética da história do atopedagógico e, ao mesmo tempo, torna-se, pelos educadores, um elementoreivindicatório da categoria.

É a partir dessas idéias, à distância, conversando, concordando ou discordando,que os autores desse artigo, com experiências diferenciadas, mas tendo um mesmo ideal,entendendo algumas contradições, conflitos e fragilidades da educação brasileira seaproximam, buscando articular as noções de algumas concepções teóricas emetodológicas sobre o de currículo e suas relações de poder na institucionalização nasdiferentes práticas da pedagogia, entendida como ciência que deveria dar suporte,buscando desvendar a formação de “saber” e tentando escapar de velha discussão teoria/prática. O elo é o currículo e a educação especial, não em suas especificidades, mascomo parte de um todo na rede de domínio e saber. Nossas preocupações com o currículosão acrescidas das dificuldades que os envolvidos com a educação sentem ao tentardirigi-lo em um processo de aprendizagem que vise a um exercício mais adequado àcidadania e diretamente à melhoria das condições de vida.

Não existem aqui preocupações de dirimir polêmicas, pelo contrário, nossapretensão é oferecer maneiras passíveis de reflexões e provocar inquietações, em umprisma teórico e metodológico pertinente em dimensionar o currículo em uma perspectivade efetividade social, que enseje um exercício mais adequado à cidadania. Lida-se comdiferentes tendências, na tentativa de evidenciar os diferentes “olhares” sobre o currículo.

O que nos motiva é que, culturalmente, a idéia de currículo está repleta deirregularidades e estranhezas, daí sempre suas concepções, na maioria das situações,serem relativizadas, marcadas historicamente por contradições e incoerências, deixandoevidente que quando falamos de currículo, pensamos em disciplinas, conteúdos,atividades, metodologias avaliações de uma forma isolada do processo aprendizagem,mais distante ainda do exercício da cidadania.

Para lidar com nosso propósito, organizamos esse artigo em dois eixos interligadosno conjunto das inter-relações enunciadas. O primeiro refere-se ao “Currículo”, em quetentamos situá-lo em dimensões conjunturais, preservando as práticas sociais epedagógicas, referendadas por alguns princípios teóricos e metodológicos, afirmandoalgumas correlações que não se limitam aos “fazeres escolares” e que normalmente sãodesconsideradas pelos educadores e pela própria sociedade. O segundo eixo busca refletiro “Currículo em uma compreensão pedagógica centrada na educação especial”, emborasaibamos que isso se configure em uma particularidade, apenas para efeitos decomplementações de idéias, porque o currículo, como instrumento de controle social,nunca teve especificidades para qualquer grupo de alunos. A condição do aluno soma erespalda a idéia da segregação, de impossibilidade do professor, da escola e da própriasociedade.

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Em um cenário mais amplo, o Estado Brasil encontra-se, hoje, em fase de transiçãoe de renegociação frente à nova ordem econômica mundial, gerindo a crise de identidadenacional oriunda das diferentes “crises” institucionais, encabeçadas pela ausência dedefinições e omissão de compromissos do próprio Estado, como unidade integradorados diferentes conflitos de ordem socioeconômica.

Esse fato agrava-se quando, no momento atual, “o fenômeno de escolarizaçãoem massa” é algo que se propaga e existe certo consenso de associá-lo como fatorpreponderante, não só para o progresso utópico de sociedade igual para todos, mas,acima de tudo, da crença positiva que isso deverá produzir indivíduos capazes.

Martins (1992), quando se referiu ao termo educação, também nos possibilitouentender um outro ângulo conceptivo do currículo, como sendo um elemento que assumecaracterísticas de um “meio” para o ser humano se deslocar em determinado caminho,não envolvendo uma determinação rígida imposta, mas supondo uma aplicabilidadenecessária às relações sociais, culturais e de poder.

Hamilton e Gibbons (1980, p.15 apud GOODSON) destacam outra condiçãodiante dessa realidade: a importância da compreensão das expressões “classe e currículo”,por elas terem adentrado o vocabulário educacional em um momento de transformaçãoem que a escolarização passou a ser vista como uma “atividade de massa”. Isso explica,em parte, porque uma classe especial.

Nessa perspectiva, o campo pedagógico torna-se novamente um referencial ricodessa situação conflitiva. É possível, pinçando a questão da educação especial, considerarcomo uma possibilidade de diferentes enfoques. Tem sido freqüente examiná-la no ângulode que o governo, o Estado ou a sociedade e os movimentos sociais permitem, concedem,impedem ou limitam.

Essas posições, muitas vezes antagônicas, deixam a sociedade e seus indivíduos,na condição de sujeitados aos conflitos dessas representações e de sua construção social,(controle direto) de qualquer um de seus segmentos, como objeto de interesses políticosdifusos.

A mediação dessa contradição só poderá ser garantida após a definição decomprometimentos coletivos que explicitem um novo caminho, que dêem uma concretavisibilidade social capaz de ser entendida, assimilada e defendida conscientemente portodos os segmentos da sociedade, não só pelo poder estatal, mas por todos que se dizemcomprometidos. A princípio, esses todos têm os mesmos propósitos: reserva de domínio.

Dessa realidade “passada”, “presente” e, quem sabe, “futura”, váriosreordenamentos são postos como elementos de mediação e com característicasapaziguadoras entre os poderes constituídos e as necessidades da sociedade, não, comisso, que algum desses poderes organizativos detenham o monopólio do poder. Nossapreocupação passa a ser a perspectiva curricular diante de uma totalidade de relaçõesque são sociais e culturais, como elemento mediador da sociedade entre a transformaçãoe o processo de conhecimento do aluno.

O currículo em grades: mais um desafio para a Educação Inclusiva

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A educação é uma das necessidades constituídas – uma “invenção histórica”gestada desde o século XVIII, na Europa, como um condicionante estratégico, visandoapaziguar emergências sociais. Por conta disso, não basta conhecer suas origens, é precisorepensar permanentemente sua representação social na sociedade contemporânea.É necessário, portanto, atualizá-la, estar em pauta constantemente.

Indiscutivelmente, o momento atual é configurado positivamente pelo provisórioparadigmático, requerendo mudanças de atitudes de todos os sujeitos sociais que, atéentão, se postaram como comprometidos com uma transformação social.

No caso da educação, cobra-se tardiamente seu princípio, seus significados devalidade, enquanto uma formação escolar, sinalizando as possibilidades concretas nosdomínios de conhecimentos, não mais restritos às especificidades de um determinadosaber, de uma determinada teoria ou do mundo do trabalho, mas, essencialmente, quaissão as condições de aprendizagem de cada aluno. Nem “todos” deverão saber as mesmascoisas. Nem “todos” deverão ter as mesmas habilidades, mas todos deverão serescolarizados, independentes do grau de conhecimento adquirido. Embora a exigênciaseja o contrário.

Da forma que se configura, o currículo nos remete ao conceito de dispositivo,como uma das “estratégias de relações de força que sustentam saber e por eles sãosustentados” (FOUCAULT, 2000, p. 246). Portanto, o currículo presta-se a cumprirdeterminada urgência social, não querendo, com isso, resolver a problemática em si,mas, muito pelo contrário, agravando os próprios compromissos a que se destina,principalmente aquele cujo respeito se relaciona à diversidade social ou à inclusão escolar.

Assim, é importante mencionar que o currículo como elemento de inserção social,na medida do possível, diante desses contextos enunciados, deve desenvolver uma reflexãovoltada para uma dinamicidade do processo de escolarização, tendo como foco central a“prática pedagógica” como o único campo verdadeiro e real do “fazer educacional”.

Por essa razão, a preocupação não apenas com a gestão da escola na perspectivada educação inclusiva, mas na interligação entre as concepções que fundamentam asações organizacionais da estrutura educacional, das políticas afirmativas, da instituiçãoescolar, da organização do trabalho da sala de aula e da aprendizagem do aluno, tendoo currículo como eixo articulador.

Dessa forma, macro e microestrutural, talvez seja possível avançar sobre as questõesnão só relacionadas às práticas pedagógicas, mas também às práticas sociais exercidas,ao buscar compreender a necessidade de configurar outras relações entre o “domínio dosaber” (conhecimento científico) e o domínio do “saber fazer” (conhecimento prático) naorganização curricular, na atuação com os alunos com deficiência, transtornos globaisdo desenvolvimento e alunos com superdotação/altas habilidades, marginalizados pelasuas características pessoais. Elas se alojam nos preconceitos sociais, considerados comodesvalorizados, pois fogem aos padrões de uma regularidade valorativa de cunho cultural,do “belo” e do “bonito”.

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As possibilidades desse início de aproximação indicam para um exercício decompreensão curricular, como um dos movimentos que tende a não se limitar ao ato deidentificar o “estruturante” (pedagógico) ou a “estrutura” (currículo), muito menosinterpretar, em termos de um “sistema” de campo específico, de forma isolada de outrasdinâmicas contextuais, não descartando, assim, sua vinculação às demais tendênciasoriundas do movimento positivista, não se limitando, com isso, a uma organização pontualde determinado saber, mas, sim sua compreensão exercida como mecanismo de domínioe controle.

Em traços gerais, o currículo, compreendido como campo de conhecimento e deverdade, só pode ser explicitado a partir de uma leitura diferenciada sobre a realidadesocial e escolar. Esse princípio de “ver a realidade” em contextos distintos e com “olharesdiferenciados”, mas interligados entre si, caracteriza-se em uma perspectiva que se delineiacom três princípios: o primeiro, “reduzir um determinado tipo de realidade a outro”(sociedade/escola); o segundo, “a realidade verdadeira” nunca é expressa (a organizaçãocurricular); e o terceiro, a natureza do verdadeiro transparece já no cuidado que põe aescapar. A que servem as disciplinas de um currículo? Para que serve o aluno?

As tentativas de desvelar esses princípios sempre foram no universo pedagógico, oque é um equívoco, procurando integrar o primeiro com o segundo, sem nada sacrificardas suas propriedades e relações inerentes, ou seja, uma sucessão regulada de certonúmero de operações estruturais, nunca desvelando o aluno como sujeito de seu processode aprendizagem. O aluno sempre foi visto como alguém que não sabe, por isso deve irà escola para aprender? Se for, o quê?

Tradicionalmente, o termo currículo evoca a solidariedade entre os elementos deum todo burocrático sem a presença do aluno, correspondendo às idéias de “arquitetura”,“organismo”, “organização”, sem distinguir o essencial do acessório, porém, essa idéiahoje está esgotada. É necessário que os componentes curriculares se tornem com-preensíveis em razão do todo, incluindo o aluno como sujeito social, independentementede seus limites e possibilidades de conhecimento.

O currículo não detém qualquer especificidade, mas representa as confluênciasde um universo de contradições de toda a ordem social, fruto de uma realidadedinâmica, com fonte de variações e de transformações, possíveis, sim, de se tornareminteligíveis aos fenômenos socioculturais e pedagógicos. É necessário, então, rupturasde modelos arcaicos de currículo, partindo do princípio que o aluno já tem umaexperiência cultural.

Contudo, o currículo não se esgota na referência ao caráter sistemático de umobjeto como uma totalidade irredutível ou a soma das partes. Portanto, o currículo nãoé apenas um conjunto de disciplinas e atividades escolares como sistema fechado. Nãohá lugar para termos absolutos. Há simplesmente relações de dependência mútua, valoresrelativos, negativos e opositivos. Diante disso, não existe um currículo adaptado. Ocurrículo é ou não é um currículo? Sua categorização ou adjetivação permite uma

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segregação respaldada pelos próprios responsáveis pelo aluno, ou seja, pela própriasociedade.

Importa, sobretudo, reconhecer entre as relações pedagógicas, seletivas ediscriminatórias, não tanto aquilo por que se assemelham, mas aquilo por que sediferenciam, deduzido o eixo semântico (ou eixos semânticos), ordenando e valorizandoas diferenças, de tal modo que os conjuntos considerados surjam como variantes unsdos outros; e o conjunto desses, como o produto de uma combinatória, que garanta umsignificado real à diversidade ou à diferença, abrindo, assim, para as possibilidades deuma inclusão, acima de tudo, social.

Assim, ao contrário de diversas acepções, o currículo não pode ser definido porconteúdos, mas somente como um sistema de leis lógicas que caracteriza a suaespecificidade, que é o fundamento da inteligibilidade e comunicabilidade humana. Assim,o currículo é, portanto, mais um sistema simbólico, demarcado como burocrático eperverso, um instrumento segregador.

Lévi-Strauss (1970, p. 54) afirma que é “da natureza da sociedade” que ela seexprima simbolicamente, nos seus costumes e instituições, e que as condutasindividuais nunca são simbólicas por si mesmas. Elas são os elementos, a partirdos quais os sistemas simbólicos, que sempre serão coletivos, se constroem.Sobrepõem-se, pois, à ordem do real e à do imaginário, uma terceira, a do simbólico.O sentido do que é um currículo não está nas expressões, mas nas relações que taisexpressões estabelecem.

O conhecimento do uno e do semelhante é substituído pelo conhecimentorelacional; a semelhança não existe em si: é apenas um caso particular da diferença; asignificação é, pois, diferencial.

O currículo, portanto, não conduz à supressão do sentido. As “grades” curriculares,assim como os parâmetros curriculares e os temas transversais, não se situam nassignificações imediatamente perceptíveis. No entanto, não esgota a integralidade dosentido: no limite, há sempre um excesso de significação irredutível e de caráterreacionário, descomprometido.

O aluno está marcado pela excentricidade: o eixo dos significantes não coincidecom o eixo dos significados. Representam um tipo de sujeito, enquanto o produzem: osujeito não está, afinal, no centro de si mesmo. Mesmo assim, explicita-se que o alunonão é o centro da aprendizagem. Ele é periférico ao poder das relações pedagógicas,independentemente de suas condições pessoais. Portanto, independe do simbólico-cultural do sujeito.

Por seu turno, Foucault (1988), a par de uma arqueologia do saber, na qual osprocedimentos da “continuidade” e “totalidade” históricas são objetos de percucientecrítica, elabora uma genealogia do poder, procurando desmontar esses mecanismos edescrever os diversos dispositivos de domínio ou de repressão.

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É nessa contradição sutil e pervertida que adentra a educação inclusiva, combase fundamentalmente no respeito às diferenças, passando a considerar o currículocomo uma organização essencialmente centrada em uma atitude política do educador,constituída por nexos entre o conhecimento e o saber, não como um controle, mascomo possibilidades.

Observamos que, pinçando alguns autores, de diferentes tendências teóricas,em comum, está a necessidade de buscar alternativas curriculares que explicitem umreal sentido da escolaridade ou, quem sabe, da própria educação, embora o sentido daescolaridade esteja demarcado pela própria construção da história das sociedades,associada aos poderes explícitos e implícitos, concedidos ou não, de questões de ordempolíticas, sociais, econômicas e pedagógicas.

Silva (2000, p. 64) revela a necessidade dos educadores trabalharem naperspectiva da construção de um currículo crítico, ou seja, um currículo que permitacompreender a natureza relacional dos processos sociais, que rompa com a tradição dosenso comum de “fetichizar” a vida social e esconder as relações que as constituem ecomplementa:

[...] é o próprio conhecimento e o próprio currículo que devem ser vistoscomo produtos de relações sociais. O conhecimento e o currículo nãosão coisas, como a noção de “conteúdos” – tão entranhada no sensocomum educacional – nos leva a crer. O conhecimento e o currículocorporificam relações sociais. Isso significa não apenas ressaltar seu caráterde produção, de criação, mas, sobretudo, seu caráter social. Eles sãoproduzidos e criados através de relações sociais particulares entre grupossociais interessados.

Nesse entendimento, conhecimento e currículo são produções sociais, marcadospelas relações e pelos interesses que configuram as noções e intenções políticas marcadaspor um imaginário social.

Silva (2000) esclarece que compreender as relações sociais como um dispositivopedagógico permite um triplo movimento: primeiro, possibilita inserir a educação e ocurrículo na moldura de suas conexões com as relações sociais mais amplas, com relaçõesde classe, gênero, raça, dentre outros dispositivos seletivos. Segundo, permite estabelecerum dos objetivos centrais de uma pedagogia e um currículo, ou seja, de ter em vista ocaráter constituído e relacional do conhecimento trabalhado e produzido no currículo.Terceiro, o conhecimento e o currículo devem ser vistos como construções e produtos derelações sociais, particulares e históricas, possibilitando vê-los como artefatos históricose sociais.

O currículo em grades: mais um desafio para a Educação Inclusiva

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Osório (2000, p. 104) destaca que os currículos praticados pelos diferentes níveise modalidades da educação nacional “poderiam/podem” ser caracterizados como“generalizados/generalizantes”. Eram/são normalmente constituídos em uma arquiteturacomposta por nomes de disciplinas e distribuição de hora/aula pelas séries (ou ciclos) epelo estabelecimento de conteúdos, geralmente, correspondentes a índices de livros ouinteresses pessoais dos professores, tentando demarcar seus poderes e necessidades desuperação.

Logo, o currículo concebido como um conjunto de disciplinas e de atividadesescolares ditas significantes, é burocrático e reducionista. Só é possível entendê-lo comofruto das relações sociais dominantes, tendo clareza de que essas relações são,essencialmente, dinâmicas de poder, normalmente individuais, embora carreguem umaidéia coletivizada.

Assim, se entendermos o currículo como caminho que desejamos que nossosalunos percorram, independentes de suas condições cognitivas, mas a partir de suaspossibilidade individuais, estaremos rompendo com uma tradição histórica e social dopróprio currículo, presente até os dias atuais. São “grades” arrancadas. Em decorrênciadessa realidade, o currículo envolve concepções teóricas e operacionais desde suas origensditas pedagógicas, nesse particular:

[...] o currículo ficou reduzido simbolicamente a um mero “corredor” depassagem para o percurso necessário à obtenção de um certificado ou diploma– “critério de exigência formal” – ou um depósito escolar para justificar-se asegregação social pela instituição pedagógica, criando as categorias de“aprovados” e “reprovados”, ou pior, os que têm condições de “aprender” eos que “não aprendem”, sem explicitar as razões, as causas e os critérios de talsituação (OSÓRIO, 2000, p. 115).

Diante disso, o currículo até hoje tem sido um instrumento de seletividade socialpedagógica. Ele classifica os indivíduos a partir de critérios implícitos e explícitos deeducação, tendo como estratégia elementos subjetivos ou descontextualizados dos reaispropósitos da educação, mas que servem aos diferentes interesses da sociedade e daprópria escola.

Perrenoud (2001) informa que o currículo constitui uma ferramenta mantenedoradas relações de poder na sociedade, difundida na organização escolar e afirma que elepode-se apresentar como uma das formas de fabricar as desigualdades escolares,padronizando caminhos de aprendizagens ao escolher programas elitizados oudesvinculados dos interesses ou da realidade do aluno, reforçando o distanciamentoentre uns e outros alunos.

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Contraditórios a essa sedimentação curricular, surgem os discursos de inclusão,pressupondo que a escola e o currículo que está posto funcionem perfeitamente, o queé um crime social, pois a escola que está posta é segregativa, eliminatória, portanto,discriminatória. No momento atual, exige-se um outro espaço pedagógico que atenda a“todos” aqueles que querem viver possibilidades de aprendizagem, nem que sejadiferenciada, mas respeitada, independentemente de condições sociais, de ser ou nãodeficiente, menino ou menina, jovem ou idoso, pobre ou rico.

Logo, o currículo precisa ser repensado, em seus diferentes contextos sociais,culturais e educacionais em níveis e modalidade de ensino, para que possam serformuladas e encontradas soluções compatíveis com a urgente necessidade de melhoriadas propostas educativas de nossas escolas, para, então, podermos falar de uma educaçãopara todos – utopia milenar.

Emerge, nessa perspectiva, o entrelaçamento, nesse caso, entre a educação gerale a educação especial, de forma que sustente uma proposta de educação para todos,tanto nas suas dimensões relacionadas às políticas públicas (mas essencialmente queintervenha diretamente nas práticas pedagógicas) quanto das possibilidades e das açõespara que o processo de inclusão educacional seja implementado. O que talvez seja umdos maiores desafios educacionais.

Esse fato implica pensar nas relações entre os alicerces da educação geral e daeducação especial, em rupturas necessárias e determinantes para uma possívelressignificação do que é uma escola e, portanto, um currículo pensado e exercitadopara uma transformação social, não como uma correção ou adequação a valoresculturais e sociais impostos.

Assim, a educação das pessoas com deficiência, no contexto do ensino regularou em formas de atendimento especializado, exige uma atitude política dos professores,independentemente dos aparatos reguladores ou incentivos políticos gerais. É necessáriorever não só seus referenciais teórico-metodológicos, mas se perguntar para que temservido a educação? Indiscutivelmente, é necessário um enfrentamento dos discursosproduzidos até então, ideativos de uma pedagogia da exclusão. A diferença é umarealidade objetiva e a educação precisa ser pensada como um fenômeno concreto, umaatitude pedagógica emancipatória.

Ferreira (1995) considera que a educação especial vive um importante momento,pois está inserida em um contexto favorável para ampliar reformas na educação geral,com vistas a assegurar uma educação de qualidade aos alunos com deficiência, garantindo,dessa forma, a possibilidade de se começar a pensar no sucesso escolar,independentemente de quem é o aluno, com ou sem diferenças.

A educação inclusiva deve ser vista, portanto, como uma parcela das conquistas,ainda restrita e imaginária, de inclusão social, figurando ao lado de definições relativas apolíticas de distribuição de renda, de emprego, de moradia, de transporte e,principalmente, da própria educação.

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Sob esse ângulo, a educação tem, como finalidade primordial, favorecer a todoso acesso ao conhecimento historicamente produzido pela humanidade e mediando osalunos, a capacidade de eles utilizarem esse conhecimento, tanto para a produção denovos saberes, como para o exercício da cidadania, respeitando a diversidade cultural esuas características pessoais.

Visto a relevância e a complexidade da estruturação e aplicação das estratégiasde ensino para a viabilização de uma aprendizagem que respeite as diferenças e secaracterize como uma atitude política do professor, é imprescindível discutir a respeitodo currículo, das concepções de ensino e aprendizagem, de avaliação/terminalidade quepermeiam a estruturação de novas práticas pedagógicas.

Tal necessidade justifica-se tendo em vista a possibilidade da promoção deestratégias de aprendizagem desafiadoras e estimulantes, processo facilitado pelaarticulação de um currículo permeado por conteúdos de interesse e possibilidades dosalunos, a partir de suas experiências de vida. Sob esse prisma, a avaliação tambémprecisa ser transformada, superando seu papel tradicionalmente difundido de práticade seleção e exclusão escolar, mas articulando-se de forma diferenciada, de modo apermitir que os processos avaliativos sirvam de estruturadores dos elementos que darãocontinuidade ao fazer pedagógico.

Nesse sentido, pensa-se que os elementos fundantes da prática pedagógica –planejamento, currículo e avaliação – precisam ser utilizados como mediadores paraacolher e desenvolver as potencialidades do aluno, considerando suas diferentescapacidades cognitivas, considerando uma prática pedagógica que permita a todos oacesso ao conhecimento.

Perrenoud (2001, p. 21) discorre sobre como a escola faz para fabricar sucessos efracassos. Para aprofundar sua reflexão, o autor distingue três mecanismos comple-mentares:

1) o currículo, ou o caminho que desejamos que os alunos percorram(necessidade de considerar que nem todos os alunos partem do mesmo pontoe não dispõe dos mesmos recursos para avançar);2) ajuda que o professor proporciona para que cada aluno possa percorrer ocaminho (surge o problema da indiferença às diferenças, a ajuda padronizadapromoverá a chegada dos mais bem preparados enquanto os demais nãoatingirão os objetivos);3) modo de avaliação (contribui expressivamente para minimizar ou dramatizaras desigualdades de aprendizagem, ou ainda, “a avaliação cria suas própriasdesigualdades, quando inclina a estimativa das competências a favor dos bonsou de crianças socialmente favorecidas; mesmo sendo eqüitativa, ela fabricadesigualdade por meio da realidade dos desvios)”.

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Sob esse prisma, diferenciar, na prática pedagógica, deve ser organizar as intençõese as atividades, de modo que cada aluno seja confrontado constantemente ou ao menoscom bastante freqüência com as situações didáticas mais fecundas para ele, ou ainda,individualizar as informações e as explicações dadas pelo professor, as atividades e otrabalho dos alunos em sala de aula e em casa, a observação e a avaliação. Nas palavrasdo mesmo autor:

O desejo de diferenciação acrescenta outra dificuldade à busca dessasatividades: o sentido de uma atividade ou de uma situação varia de uma criançapara outra, segundo sua personalidade, suas aspirações, seus interesses, seucapital cultural, sua relação com o jogo e com o trabalho. Assim, é precisodiferenciar as atividades globais ou os papéis individuais no contexto das mesmaspara que cada um encontre nelas um sentido e a oportunidade de aprendizagenstambém significativas (PERRENOUD, 2001, p. 36).

É necessário atentar que, diferenciar pedagogicamente, ou seja, individualizar ospercursos de aprendizagem não significa, em nenhum momento, desprezar a interaçãoentre os indivíduos. A relação entre os pares exerce papel fundamental na aprendizagemdos educandos e o confronto das diferentes capacidades cognitivas entre aluno/aluno ealuno/professor é que facilitam a problematização das situações e o compartilhamentode conhecimentos.

Assim, discutir sobre a elaboração das mediações que os professores formulampara trabalhar com a diversidade dos alunos em sala de aula, considerando as diferentescapacidades cognitivas na prática educativa, pode revelar pressupostos que indicam osfatores que agravam o fracasso escolar e auxiliar da transformação dos aspectospedagógicos.

Nesse sentido, essa discussão demonstra preocupação não apenas com o queos professores pensam sobre o ensino e a consideração das diferentes capacidadescognitivas dos alunos nesse processo, mas também com a ação de ensinar e sua relaçãocom as concepções sobre esse ensinar. Dessa forma, poderá ser possível avançar sobreas questões pedagógicas, à medida que se buscar compreender as relações existentesentre o domínio do saber (conhecimento científico) e o domínio do saber fazer(conhecimento prático).

Propor-se a atuar pedagogicamente na concepção de educação inclusiva significapensar a diferença de um campo político, no qual experiências culturais, comunitárias epráticas sociais são colocadas como integrantes da produção dessas diferenças. Logo,colocar a diferença em um âmbito político exige outras posturas e fundamentações legaise requer que todas as instâncias sociais construam práticas que respeitem a dignidadehumana e promovam a ética nas relações.

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O processo de inclusão deve ser compreendido como um processo interativoe dinâmico, resultante da influência mútua de múltiplos fatores (RODRIGUES, 1998).A característica dinâmica do processo verifica-se na medida em que esse procurasistematicamente novos equilíbrios, novas formulações em razão da mutabilidade dosambientes em que se processa. Estar incluído não é um valor estabelecido e adquirido:é, sobretudo, possuir e dominar alguns instrumentos que permitam novas relações coma comunidade escolar.

Sob esse aspecto, a responsabilidade da inclusão não se limita a alunos comdeficiência, mas destina-se a todos eles, amparados pela comunidade escolar, e representauma oportunidade, um objetivo para que a escola não caminhe para um grupo de pessoashomogêneas, como ocorreu milenarmente. Assim, se a sociedade quer assegurar o direitoà educação e à igualdade de oportunidades terá de refletir sobre as condições de acesso,acessibilidade e de sucesso que é capaz de propiciar aos seus alunos.

A influência dessa atitude pedagógica de reconstruir um novo sentido para ocurrículo, a partir das necessidades que o momento histórico exige, tendo como eixo oaluno, deverá gerar transformações não só pedagógicas, mas da própria sociedade, oque implica deter, com clareza, o próprio sentido de realidade ou, até mesmo, a totalidadedos fenômenos observados, mas indiscutivelmente o próprio sentido da aprendizagemvoltada para o aluno.

É a partir da prática pedagógica que se reconstrói a teoria, o saber escolar e adiversidade social, tendo como pano de fundo as diferentes relações individual/coletiva e vice-versa. É um novo fazer pedagógico que se explícita em uma novarelação de conhecimento, realidade e verdade. É o currículo a partir das necessidadesdos alunos.

Todavia, essa nova postura de conceber o currículo tem um local determinadopara uma ação exeqüível: a escola, que é fruto das contradições sociais, as mais diversaspossíveis, que comprometem, em muito, seus objetivos, desvirtuando suas atribuiçõesinstitucionais. Isso representa uma contradição, mesmo assim ela é um espaço empotencial de resistência, uma possibilidade concreta de mudanças iniciais da conjunturaem que vivemos, pois ela ainda continua sendo uma instituição de processo de construção.É uma abertura não preconceituosa, mas efetivamente comprometida com umatransformação social, com responsabilidade e compromisso.

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Formação continuada do professor para atender à Formação continuada do professor para atender à Formação continuada do professor para atender à Formação continuada do professor para atender à Formação continuada do professor para atender à EEEEEducaçãoducaçãoducaçãoducaçãoducaçãoIIIIInclusivanclusivanclusivanclusivanclusiva

Eduardo José Manzini1

[email protected]

1 Introdução1 Introdução1 Introdução1 Introdução1 Introdução

A presença de alunos com deficiência em salas de aulas de ensino comum é hojeuma realidade cada vez mais constante. Desde a promulgação das Leis de Diretrizes deBases da Educação Nacional (BRASIL, 1996), que indicou o atendimento do aluno comdeficiência preferencialmente nas salas de ensino comum, pôde-se verificar não só orespaldo legal para essa ação política, mas uma série de empreendimentos para sensibilizarfamiliares, professores e alunos em relação à chegada de alunos com deficiência paraconviverem com seus pares.

Uma série de campanhas, principalmente executadas por meio de rádio e televisão,cujo poder de formação de opinião é bem conhecido, começou a divulgar os direitos àinclusão de pessoas com deficiência. Tais campanhas, projetadas por órgãos do governo,como o Ministério do Trabalho, Educação e Ministério da Justiça, dentre outros,contemplaram posição afirmativa sobre a inclusão social e educacional de pessoas comdeficiência. Nessas campanhas, foram veiculados temas como acessibilidade, direito àeducação e direito ao trabalho.

Algumas dessas campanhas foram patrocinadas por associações, como a Associaçãode Síndrome de Down, que demonstrava várias situações de empregos de jovens comSíndrome de Down que acabavam por mexer com o estigma e preconceito que,porventura, estivesse presente na audiência.

Essa fase de sensibilização foi precedida, e seguida, por várias leis na tentativa degarantir os direitos das pessoas com deficiência para conviverem, ao mesmo tempo e nomesmo espaço, com pessoas sem deficiência. Essas leis incidem em muitas instâncias,como, por exemplo, no direito ao trabalho, educação e direito a acessibilidade.

Em termos de direitos ao trabalho, foram promulgadas, já há oito anos, as Leis nº8.112 e nº 8.213 (BRASIL, 1999a; 1999b) que, respectivamente, definem em até 20% opercentual de vagas em concursos públicos e que determinam uma cota de vagas para apessoa com deficiência, que varia de 2% a 5%, junto às empresas privadas que possuemmais de 100 funcionários.

1 Docente do Programa de Pós-graduação em Educação e do Departamento de Educação Especial da Universidade Estadual Paulista(Unesp), Campus de Marília, São Paulo.

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Como salientaram Tanaka e Manzini (2005), a partir dessas leis foi possível observaruma oferta crescente de vagas para pessoas com deficiência nas empresas, veiculada,principalmente, por meio da mídia, despertando a ilusória idéia de que, finalmente, omercado de trabalho estava receptivo a essa população. Com certeza, muitas empresasforam multadas por não atender à lei e, atualmente, há uma discussão sobre a exigêncialegal para a redução do número de funcionários (menor que 100) para obrigar às empresasa contratar empregados com deficiência. Isso parece ser interessante para ampliar ainclusão social, que deveria ocorrer via trabalho (MANZINI, 1989).

Em termos promoção de condições de acessibilidade, houve uma série de leis(BRASIL, 2005a,b,c,d,e) e normas (ABNT, 1994) na tentativa de garantir vários direitos epromover a acessibilidade em transporte, acesso a estabelecimentos públicos, emcomunicação, em serviços de atendimento, em estruturas físicas e arquitetônicas.

Em termos de educação, algumas leis já influenciam diretamente nos cursos deformação de profissionais e professores, como exemplo, a Portaria Ministerial do MEC, nº3.284 de 7/11/2003 (BRASIL, 2005e), que indicou as condições necessárias para o processode autorização e credenciamento de cursos, que incidiu sobre a necessidade de adequaçãodas condições de espaço e equipamentos das instituições do ensino superior, para atenderà demanda de alunos com deficiência nas faculdades e universidades.

Mais especificamente sobre a pessoa surda, a Lei nº 10.436 de 24/4/2002 (BRASIL,2005b) obriga o ensino da Língua Brasileira de Sinais (Libras) nos Cursos de Fonoaudiologiae Magistério, em nível médio e superior. Essa legislação é ainda reforçada pela a Lei nº5.296 de 02/12/2004 (BRASIL, 2005f), que indicou a presença do interprete em Librasnas instituições do ensino superior a partir de dezembro de 2005 e indicou também,que, no prazo de três anos, 23% dos cursos das instituições deverão apresentar a Librascomo disciplina curricular, iniciando-se nos cursos de Educação Especial, Fonoaudiologiae Pedagogia, ampliando-se, gradativamente, para as demais licenciaturas.

Já é possível vislumbrar, em vários currículos de cursos de pedagogia, a inserção dedisciplinas que objetivam promover a formação do futuro professor no atendimento aalunos com deficiência em situações de ensino comum. Isso tem ocorrido maisrapidamente em faculdades particulares que estão modificando o perfil dos cursos nadireção da inclusão.

Assim, atualmente, ao optar pela carreira docente, implicitamente, o futuro professorjá está obrigado -- segundo Lei nº 7.853 de 24/10/1989 (BRASIL, 2005d), que dispõesobre discriminação e crime -- a atender alunos com ou sem deficiência, não sendo maisa população de alunos com deficiência somente da alçada do professor especializado.

Dessa forma, a inclusão do aluno com deficiência no ensino regular deve serentendido como um processo legal, como um processo que envolve a sensibilizaçãoda sociedade quanto aos direitos desses alunos e, principalmente, no caso da educação,é um processo que visa garantir a formação do futuro professor para atender ao alunocom deficiência.

Formação continuada do professor para atender à educação inclusiva

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A partir dessas considerações iniciais, poder-se-ia questionar:

1) estariam todos os professores preparados para atender a alunos com deficiência?2) como ficaria, diante da temática inclusão, os professores que já estão atuando

em escolas e que não possuem formação para atender a alunos com deficiência?3) como essa formação para atender a alunos com deficiência em sala do ensino

comum poderia, efetivamente, ocorrer?

2 Preparação do professor em uma abordagem inclusiva: educação continuada2 Preparação do professor em uma abordagem inclusiva: educação continuada2 Preparação do professor em uma abordagem inclusiva: educação continuada2 Preparação do professor em uma abordagem inclusiva: educação continuada2 Preparação do professor em uma abordagem inclusiva: educação continuada

As pesquisas indicam que o principal argumento que dificulta o processo de inclusãoescolar se refere à não-preparação dos professores. Esses relatos já estão disponíveis hámais de 20 anos no Brasil. O segundo dado, que as pesquisas que trabalham com otema formação de professores indicam, é que o professor apresenta um medo inicial aosaber que vai receber um aluno com deficiência e esse sentimento se atenua com opassar das semanas e meses (MONTEIRO; MANZINI, 2005; MONTEIRO, 2006).

Em boa parte dos casos estudados sobre inclusão de alunos com deficiência noensino regular, os professores tentam buscar alguma forma para preparar-se diante donovo. Alguns deles indicam, posteriormente ao receberem alunos com deficiência, quenem necessitaram desse preparo adicional. Outros revelam que as formas de preparaçãoprofissional vão desde a busca de apoio interno na escola até serviços que estão foradela, como cursos adicionais.

Parece claro, retornando ao ponto sobre a preparação do professor, que a preparaçãopara o trabalho de ensino não termina com o curso de graduação. Ou seja, a preparação éum processo dinâmico e contínuo. Hoje, em várias áreas de atuação profissional, apreparação após a graduação é uma regra. Isso ocorre com dentistas, médicos, engenheiros,fonoaudiólogos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, psicólogos. Contudo, esseidealismo ainda não está totalmente presente na formação dos profissionais da educação.Esse fato pode ser interpretado em dois sentidos. Por um lado, ainda é uma profissão combaixa remuneração que dificulta o investimento e, por outro, o próprio profissional aindanão concebe esse investimento como importante fator de desenvolvimento profissional(fala dos próprios pedagogos que participam de cursos, como, por exemplo, deespecialização), ou seja, esse parece ser um componente cultural que está presente.

Em várias situações de formação continuada de professores -- cursos financiadospor governo federal e municipal -- foi possível observar o descompromisso de uma parcelados professores em participar, assiduamente, nos horários estabelecidos e usufruíremtotalmente das condições apresentadas pelos setores administrativos dos órgãosgovernamentais. Em uma dessas ocasiões, foi possível vivenciar a intervenção de umadas promotoras do evento, discutindo esse fato com o grupo de professores, que ocorreuno início de um encontro do programa da Secretaria de Educação Especial (SEESP-MEC)sobre formação de educadores e gestores em uma abordagem inclusiva.

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Apesar de a remuneração do profissional da educação ser abaixo do mérito, não épossível desconsiderar os investimentos iniciados nos últimos dez anos em relação àformação continuada do professor para receber, em suas salas de aulas do ensino comum,alunos com deficiência. Esse investimento tem sido estimulado por alguns municípios,estados e governo federal. Principalmente em nível federal, houve um aumentoconsiderável de publicações impressas e acessíveis, on line, tratando do assunto ensinodo aluno com deficiência. O que se pode discutir é o alcance, em termos de demandanecessária, para atender a todos os professores.

Nesse sentido, hoje, já é possível coletar relatos de professores que se considerampreparados para atender a algumas categorias de deficiência.

Um segundo ponto de discussão refere-se ao tipo de formação continuada. Aopesquisar a literatura da área, pode-se classificar a formação continuada do professorpara atender à educação inclusiva em, pelo menos, quatro caminhos: 1) a formaçãocontinuada por meio de cursos, extra-sala de aula; 2) a formação continuada em serviço,com ênfase na preparação direta, por meio de supervisão; 3) a formação, com informaçõescoletadas na sala de aula, e discutidas com o professor, chamada de educação reflexiva;e 4) a formação com auxílio de um profissional externo à escola, chamada de colaborativa.

A formação por meio de cursos pode ocorrer em congressos, eventos e cursos deespecialização. Na última década, no Brasil, houve uma grande proliferação de eventosque tratam de educação inclusiva, quer como eventos específicos ou cuja temática ainclusão esteja embutida em grandes eventos na área de educação. Também houveproliferação de cursos de especialização e, mais recentemente, cursos à distância. Umasegunda modalidade, ainda alicerçada por meio de cursos ou conjunto de palestras, queparece ser mais proveitosa, dirige-se aos programas contínuos, como os promovidos peloSEESP, do qual participam os municípios pólos ou como os promovidos pela Secretariade Educação, via Departamento de Educação Especial, da Cidade de Curitiba, Paraná.Esse tipo de formação envolve um grupo grande (mais de 100) ou médio de pessoas (50),que se encontra, periodicamente, para receber informação e para, em grupos de trabalho,constituir os alicerces para as ações inclusivas. Porém, os conteúdos discutidos podemnão chegar até a sala de aula. Para que isso ocorra, são necessárias ações políticas etécnicas dos grupos que administram à educação nas localidades onde os professores egestores trabalham, principalmente, ações que envolvam a avaliação e o acompanhamentodos programas em situações reais de ensino, ou seja, dentro da sala de aula.

As outras três formas de educação continuada são localizadas em uma escola oupequeno grupo de escolas e envolvem, ou um único professor, ou um pequeno grupo deprofessores. Na supervisão direta, um professor ou outro profissional mais experiente noassunto, auxilia e apóia o professor do ensino comum, que tem alunos com deficiência,em sua sala de aula. Esse apoio ocorre em situações pontuais e específicas dentro da salade aula. Esse deveria, até mesmo, ser um dos papeis do professor especializado numaconcepção de inclusão (MELLO, 2003).

Formação continuada do professor para atender à educação inclusiva

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Na forma reflexiva do professor, o caminho é discutir as experiências dos professorespara promover as trocas de procedimentos que deram certos, em salas de aulas, bemcomo levar o professor a refletir sobre os procedimentos que ainda não havia observadoaté então. Isso pode ocorrer entre um professor e um promotor de reflexão ou empequenos grupos de professores (ADAMUZ, 2002; MELLO, 2003; LEITE, 1997; 2003).

No intitulado ensino colaborativo, atualmente, em prática no Brasil e sendorealizado em vários Estados da Federação, geralmente, um pesquisador em educação,externo à escola, adentra a ela e busca formar um elo de colaboração com os profissionaisna escola na tentativa de discutir, refletir e resolver possíveis problemas ou dificuldadesoriundas do processo de ensino e aprendizagem em sala de aula (JESUS; BAPTISTA;VICTOR, 2006).

3 Dificuldades e necessidades para o estabelecimento de uma educação3 Dificuldades e necessidades para o estabelecimento de uma educação3 Dificuldades e necessidades para o estabelecimento de uma educação3 Dificuldades e necessidades para o estabelecimento de uma educação3 Dificuldades e necessidades para o estabelecimento de uma educaçãocontinuada: predisposição do professorcontinuada: predisposição do professorcontinuada: predisposição do professorcontinuada: predisposição do professorcontinuada: predisposição do professor, planejamento e base teórica, planejamento e base teórica, planejamento e base teórica, planejamento e base teórica, planejamento e base teórica

As vivências da prática profissional têm indicado que, nas três últimas modalidades,aqui intituladas como supervisão, ensino reflexivo e colaborativo, a predisposição doprofessor em participar é imprescindível para que as ações em sala de aula possam fluir ese estabelecer como mudanças e transformações de estruturas, tanto administrativas comode ensino.

Principalmente nas abordagens de ensino sob supervisão, ensino colaborativo ereflexivo, é imprescindível de o professor possuir, em seu poder, uma programação de ensinopreestabelecida e que possa ser contemplada a outros, externos a sala de aula. Ou seja,um planejamento que possa ser visualizado, pré-avaliado e materializado nos planos deaula. Nossa realidade tem demonstrado que, em várias situações de ensino, os planos deaula estão dentro das gavetas, esquecidos e abandonados. Dessa forma, um agente externotem pouca chance de, efetivamente, promover a reflexão e colaboração. O planejamentodo professor é um instrumento imprescindível para que a inclusão ocorra. Os interpretesde Libras necessitam desse planejamento para servir de referência na identificação dovocabulário a ser traduzido; os professores especializados precisam saber da programaçãopara ajustarem o auxílio e supervisão; os agentes externos colaborativos necessitam doplanejamento para não interpretarem ou realizarem uma leitura equivocada da práticapedagógica do professor; as agentes, de acordo com uma abordagem reflexiva, necessitamdo planejamento para promover a reflexão, que deve nortear-se pelos conteúdos e ações,algumas das quais já preestabelecidas nos planos de aula.

Uma outra dificuldade em promover as ações no âmbito da educação continuadarefere-se, ainda, à dificuldade de compreensão conceitual sobre aquilo que se faz naprática, ou seja, qual teoria estaria embasando e explicando a prática pedagógica doprofessor. Essa tem sido, na prática de educação continuada, um dos conteúdos a seremdiscutidos.

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Esse parece ser um dos pontos importantes para a profissão docente: em qual teoriaaportar a própria prática pedagógica? como explicar aquilo que é feito pedagogicamenteem sala de aula ao ensinar português, matemática ou ao trabalhar com alfabetização?

Sem dúvida, o objeto de trabalho do professor é o ensino. Assim, o professor deveriater bastante claro uma opção teórica para promover o processo de ensino e aprendizagem.Uma base teórica sobre ensino e aprendizagem é fundamental para a educação de alunoscom ou sem deficiência.

Exatamente por esses argumentos que a educação continuada é uma necessidade.A preparação não pode ser entendida como algo absoluto a ser alcançado, mas umprocesso de formação, contínua e dinâmica. Sem dúvida, essa formação é necessáriapara o ensino numa abordagem inclusiva.

Um professor bem preparado é aquele que tem claro e definido, na prática e nateoria, como conduzir o processo de ensino, como explicar a aprendizagem, como avaliare reformular seu plano de ensino frente ao planejamento preestabelecido. Não se tratar,portanto, de adequar o currículo, mas como criar condições para que o seu aluno consigatomar posse do currículo que ele precisa.

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Educação de alunos com características de altas habilidades/Educação de alunos com características de altas habilidades/Educação de alunos com características de altas habilidades/Educação de alunos com características de altas habilidades/Educação de alunos com características de altas habilidades/superdotação e a formação docente sob a ótica da diversidade e dasuperdotação e a formação docente sob a ótica da diversidade e dasuperdotação e a formação docente sob a ótica da diversidade e dasuperdotação e a formação docente sob a ótica da diversidade e dasuperdotação e a formação docente sob a ótica da diversidade e dainclusãoinclusãoinclusãoinclusãoinclusão

Soraia Napoleão Freitas1

[email protected] de Souza Fleith2

[email protected]

Uma das metas de uma sociedade democrática é a de garantir espaços sociaise educacionais que possibilitem o convívio harmonioso na diversidade. Conforme expressono Documento Subsidiário à Política de Inclusão do Ministério da Educação (BRASIL,2005), “a capacidade que uma cultura tem de lidar com as heterogeneidades que acompõem tornou-se uma espécie de critério de avaliação de seu estágio evolutivo,especialmente em tempos de fundamentalismos e intolerâncias de todas as ordens comoeste em que vivemos” p. 7). Assim, a construção das práticas de inclusão social eeducacional deve ser vista como um processo essencial para determinação dos rumos deuma sociedade.

No contexto escolar, avança o movimento de valorização das diferençassociais, emocionais, cognitivas, físicas e culturais e de busca por um processoeducativo inclusivo e de qualidade que atenda às necessidades dos alunos.Entretanto, Mitjáns Martinez (2005) chama atenção para o perigo de se adotaruma concepção restrita e simplista de inclusão educacional. Anache (2005) explicaque “não é colocando um aluno na escola do ensino regular que se garantirá aefetivação de sua educação” (p. 131). Segundo Mitjáns Martinez, a idéia de inclusãoimplica criar condições de aprendizagem e desenvolvimento para todos os alunos.Para isso, é preciso, inicialmente, refletir sobre as concepções e representaçõesvigentes no contexto escolar acerca da inclusão e de quem é o aluno a ser incluído.Na verdade, implica discutir os conceitos de normalidade/anormalidade e dediferença/semelhança.

1 Professora Drª. do Departamento de Educação Especial da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Líder do Grupo dePesquisa CNPq Educação Especial: interação e inclusão social, Coordenadora do Programa de Apoio à Pesquisa em EducaçãoEspecial Proesp/MEC/Capes da UFSM. E-mail: [email protected] Professora Dra. do Programa de Pós-Graduação em Processos de Desenvolvimento Humano e Saúde do Instituto dePsicologia da Universidade de Brasília. Pesquisadora do CNPq. E-mail: [email protected]

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Trabalhar sob a ótica da inclusão exige, ainda, dos educadores repensar e modificarsuas práticas de forma a contemplar diferentes estilos e ritmos de aprendizagem,habilidades e interesses em sala de aula. Mantoan (1997) conclui que “a inclusão éum motivo para que a escola se modernize e os professores aperfeiçoem suas práticas”(p. 17).

Dessa forma, articular as temáticas “formação docente, diversidade e inclusão”torna-se uma tarefa desafiadora quando a sociedade e o sistema escolar buscam meiosde garantir a todos os alunos o cumprimento dos seus direitos e deveres previstosconstitucionalmente. A responsabilidade pela inclusão de alunos com necessidadeseducacionais especiais é de toda a comunidade escolar e representa uma oportunidadepara que a escola questione e modifique suas práticas padronizadas e homogeneizadoras.Assim, se a sociedade quer assegurar o direito à educação e à igualdade de oportunidadesterá de refletir sobre as condições de acesso e de sucesso que é capaz de dar aos seusalunos.

Logo, entendemos que a formação inicial dos professores precisa também serrepensada em seus diferentes níveis, para que soluções compatíveis com a urgentenecessidade de melhoria das propostas educativas de nossas escolas possam serformuladas e encontradas. Sob esse prisma, é no entrelaçamento entre a educação gerale a educação especial que se encontra a base para a proposta de educação para todos,tanto nas suas dimensões relacionadas às políticas públicas, da formação de professorese das práticas pedagógicas, quanto das possibilidades e das ações para que o processode inclusão educacional da pessoa com necessidades educacionais especiais sejaimplementado. Desse modo, a educação dessas pessoas, seja no contexto do ensinoregular ou em formas de atendimento especializado, permite aos professores rever seusreferenciais teórico-metodológicos e os incentiva, diante do enfrentamento das diferençasde seus alunos, a buscar por uma formação continuada.

Tendo em vista a relevância e a complexidade da estruturação e implementaçãodas estratégias de ensino para a viabilização de uma aprendizagem que respeite asdiferenças e se caracterize como inclusiva, é imprescindível que o processo formativodocente considere as especificidades dos alunos com altas habilidades/superdotação.Segundo Delou (2007), a maioria dos alunos superdotados não são identificados emsala de aula. Estar matriculado garante o acesso ao ensino regular, mas para que alunoscom altas habilidades/superdotação sejam incluídos é preciso mais. É fundamental nesteprocesso de inclusão um professor especializado que seja sensível às necessidades destealuno e crie oportunidades educacionais mais avançadas e desafiadoras condizentescom seu ritmo de aprendizagem, interesses e competências.

No Brasil, além de terem pouca visibilidade, os superdotados constituem aindaum grupo que é pouco compreendido. Observa-se, até mesmo, resistência àimplementação de programas ou serviços de atendimento ao superdotado, fruto deuma série de idéias errôneas sobre este aluno. Segundo Alencar e Fleith (2006),

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Uma dessas idéias é a supervalorização de fatores genéticos, colocando-se emsegundo plano o papel do ambiente para o desenvolvimento de habilidades ecompetências. Tal idéia seria responsável pela consideração do superdotado comoum privilegiado, que apresentaria recursos intelectuais inatos superiores,considerando-se injusto e antidemocrático oferecer-lhe mais privilégios sob a formade participação em programas educacionais especiais, nos quais os demais alunosseriam excluídos. Observa-se também resistência a propostas de implementaçãode programas especiais para o superdotado, com o argumento de que seria umabsurdo investir nesta área, quando se tem um contingente significativo deanalfabetos e portadores de necessidades educacionais especiais, nas áreas visual,auditiva ou física, que permanecem sem um atendimento especializado (p. 53).

Além de uma compreensão inadequada acerca das necessidades do aluno com altashabilidades/superdotação, a falta de informação acerca de suas características leva-os, muitasvezes, a serem identificados equivocadamente como autista, hiperativo ou portador dealgum distúrbio de aprendizagem, como déficit de atenção, ou de problemas de condutacomportamental (ALENCAR; VIRGOLIM, 1999; BAUM, OWEN; DIXON, 1991;HARTNETT, NELSON; RINN, 2004; MONTGOMERY, 2003). Embora não seja possívelestabelecer um perfil único de aluno superdotado, algumas características são maiscomumente encontradas nesse grupo (veja Quadro 1).

Quadro 1. Características do aluno com altas habilidades/superdotação

Alto grau de curiosidade.Boa memória.Atenção concentrada.Persistência.Independência e autonomia.Interesse por áreas e tópicos diversos.Facilidade de aprendizagem.Criatividade e imaginação.Iniciativa.Liderança.Vocabulário avançado para sua idade cronológica.Riqueza de expressão verbal (elaboração e fluência de idéias).Habilidade para considerar pontos de vistas de outras pessoas.Facilidade para interagir com crianças mais velhas ou com adultos.Habilidade para lidar com idéias abstratas.Habilidade para perceber discrepâncias entre idéias e pontos de vista.Interesse por livros e outras fontes de conhecimento.Alto nível de energia.Originalidade para resolver problemas.

Fonte: Alencar; Fleith, 2001.

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Acredita-se, ainda, que o aluno superdotado apresenta um excelente desempenhoacadêmico em todas as disciplinas curriculares. Na realidade, a baixa motivação, o tédioe ausência de desafios na vida escolar podem gerar falta de compromisso, desinteresse epouco envolvimento com as atividades de sala de aula. Além disso, o aluno com altashabilidades é visto como uma ameaça à autoridade dos professores, que se sentemintimidados pelo questionamento, perguntas e críticas desse aluno.

Predomina ainda em nossa sociedade o estereótipo do indivíduo superdotadocomo excêntrico, instável emocionalmente e isolado socialmente. Entretanto, estudostêm revelado maior estabilidade emocional e ajustamento social por parte do alunocom altas habilidades (ALENCAR; FLEITH, 2001). Entretanto, isso não significa afirmarque os alunos com um potencial superior são “imunes” a qualquer desajuste emocionalou social. É importante esclarecer, contudo, que não é a superdotação que “provocará”tais desajustes, mas a maneira como ocorre a interação entre esse indivíduo e o ambiente;ou seja, em que extensão suas necessidades estão em sintonia com as oportunidadesoferecidas ao longo de sua vida.

Nessa perspectiva, atender às necessidades singulares dos alunos com altashabilidades/superdotados significa considerar os fatores socioculturais e a história decada um, bem como suas características pessoais. Trata-se de garantir condições deaprendizagem a todos os alunos, tanto por meio de incrementos na intervençãopedagógica quanto de medidas extras que atendam às necessidades individuais.A atenção à diversidade, segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1999a),deve concretizar-se em medidas que levem em consideração não só o que o alunodispõe, mas seus interesses e motivações.

Tradicionalmente, a pessoa com altas habilidades/superdotação é vista como maisinteligente em relação a uma média. Na sociedade ocidental, o conceito de inteligênciafundamenta-se no pensar, no abstrair e na possibilidade de processar a informação. Essaconcepção, marcadamente influenciada pela produção e competição implantada pelosistema capitalista, valoriza as destrezas, os conhecimentos e o raciocínio. Entretanto, emoutras culturas ou mesmo dentro de subgrupos da cultura ocidental, a ênfase pode estarem aspectos menos intelectivos como o sentimento, a criação artística, dentre outros.

A definição de quem são as pessoas com altas habilidades/superdotação envolve oentendimento de conceitos de inteligência, e esse não possui aceitação universal, assimcomo o conceito de altas habilidades (PÉREZ, 2006). Alencar e Fleith (2001) destacamque a “superdotação é um conceito ou constructo psicológico a ser inferido a partir deuma constelação de traços ou características de uma pessoa” (p. 52).

A Política Nacional de Educação Especial (BRASIL, 1994) considera portadores dealtas habilidades/superdotados aqueles que apresentam desempenho acima da médiaou potencialidade elevada em aspectos isolados ou combinados de áreas comocapacidade intelectual, aptidão acadêmica, pensamento criador, capacidade de liderança,talento especial para artes cênicas, plásticas, musicais e habilidades psicomotoras.

Educação de alunos com características de altas habilidades/superdotaçãoe a formação docente sob a ótica da diversidade e da inclusão

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A Lei nº 9.394/96 (LDBEN), no capítulo de Educação Especial (BRASIL, 1996, p.22) estava assumindo que:

PESSOA PORTADORA DE NECESSIDADES ESPECIAIS: É a que apresenta, emcaráter permanente ou temporário, algum tipo de deficiência física, sensorial,cognitiva, múltipla, condutas típicas ou altas habilidades, necessitando, porisso, de recursos especializados para desenvolver mais amplamente o seupotencial e/ou superar ou minimizar suas dificuldades. No contexto escolar,costumam ser chamadas de pessoas portadoras de necessidades educativasespeciais.

Nela já se incorporava o termo altas habilidades, utilizado pelo Conselho Europeupara Altas Habilidades, que o Ministério de Educação passou a adotar no caso dossuperdotados.

A LDBEN (BRASIL, 1996, p. 14-5) inclui os alunos com altas habilidades/superdotados, ao prever o seu atendimento no inciso II do Artigo 59, que trata da“aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados” e,no inciso IV, que garante a educação especial para o trabalho também “[...] para aquelesque apresentam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora”,assim como já o fizera a Política Nacional de Educação.

Nos Parâmetros Curriculares Nacionais: Adaptações Curriculares (BRASIL, 1999b,p. 23), a expressão necessidades educacionais especiais refere-se às necessidades decrianças e jovens decorrentes de sua elevada capacidade ou de suas dificuldades paraaprender e que essas necessidades estão associadas “portanto, a dificuldades deaprendizagem, não necessariamente vinculada a deficiência(s)”. O Parecer CNE/CEB nº17 (BRASIL, 2001) reconhece os alunos com altas habilidades/superdotados, como umdos segmentos da comunidade discriminados e à margem do sistema educacional:

É o caso dos superdotados, portadores de altas habilidades, “brilhantes” etalentosos que, devido a necessidades e motivações específicas – incluindo anão aceitação da rigidez curricular e de aspectos do cotidiano escolar – sãotidos por muitos como trabalhosos e indisciplinados, deixando de receber osserviços especiais de que necessitam, como, por exemplo, o enriquecimentoe aprofundamento curricular. Assim, esses alunos muitas vezes abandonam osistema educacional, inclusive por dificuldades de relacionamento (p. 19).

A Resolução nº 02/01, que institui as Diretrizes Nacionais para a Educação Especialna Educação Básica, fundamentada no Parecer nº 17/01, afirma que a ação da educação

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especial se amplia, passando a abranger não apenas as dificuldades de aprendizagemrelacionadas a condições, disfunções, limitações e deficiências, mas também aquelasnão vinculadas a uma causa orgânica específica. Muitas vezes, em razão de dificuldadescognitivas, psicomotoras e de comportamento, alunos são freqüentemente negligenciadosou mesmo excluídos dos apoios escolares.

Nesse contexto, assume-se que todo e qualquer aluno pode apresentar, ao longode sua aprendizagem, alguma necessidade educacional especial, temporária oupermanente. De acordo com a Resolução nº 02/01, alunos com altas habilidades sãoaqueles que, durante o processo educacional, grande facilidade de aprendizagem queos leve a dominar rapidamente conceitos, procedimentos e atitudes. A diretriz com baseno artigo nº 59 da LDB/96 expressa ser necessário assegurar currículos, métodos, técnicas,recursos educativos e organização, específicos para atender às necessidades doseducandos com necessidades especiais.

Para atendimento às necessidades educacionais do aluno superdotado,recomendam-se práticas que possibilitem a esse aluno (ALENCAR; FLEITH, 2001):

(1) Desenvolver ao máximo seus talentos e habilidades.(2) Ter uma existência feliz e de realização.(3) Fortalecer um autoconceito positivo.(4) Ampliar suas áreas de experiência.(5) Desenvolver uma autoconsciência social.(6) Apresentar uma produtividade criativa.

Nesse sentido, práticas de enriquecimento curricular e aceleração de ensino têmsido indicadas na literatura como umas das mais apropriadas para atender aos alunoscom altas habilidades. O enriquecimento curricular diz respeito a oportunidades deexperiências de aprendizagem diversas das que o currículo normalmente apresenta.Conforme esclarecem Alencar e Fleith (2001), “o enriquecimento consiste em solicitarao aluno o desenvolvimento de projetos originais em determinadas áreas deconhecimento. Ele pode ser levado a efeito tanto na própria sala de aula como atravésde atividades extracurriculares” (p. 133).

A aceleração de ensino, por sua vez, implica cumprir o programa escolar em menostempo, procedimento que pode ser implementado de muitas formas. Como bem explicamSabatella e Cupertino (2007):

O conceito de aceleração pode ser traduzido em várias práticas, que variam desaltar séries até a flexibilização do currículo para que etapas possam sercumpridas em tempo menor que o estabelecido. Ela também pode ocorrerpor um aumento do ritmo do ensino-aprendizagem, proporcionandooportunidades mais compactas para abranger os conteúdos da grade curricular

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em menos tempo, com atividades durante as férias, períodos de contra-turno,cursos à distância ou obtendo créditos em exames especiais, que possibilitemdispensa de algumas disciplinas (p. 73).

Portanto, planejar alternativas de atendimento ao aluno com altas habilidades,que atinjam suas reais necessidades e expectativas dos pais e correspondam à filosofiaeducacional das escolas, sem entrar em conflito com o ensino regular, é um trabalho quedeve ser executado com habilidade e critério3. Um ponto importante a ser destacado éque o professor no cotidiano escolar precisa reconhecer e responder às necessidadesdiversificadas de seus alunos, bem como, acomodar diferentes potencialidades, estilos eritmos de aprendizagem, assegurando, com isso, uma educação de qualidade. Porém, sóa formação do professor não é o suficiente para o estímulo da criatividade e dasinteligências individuais dos alunos, pois, além da ação docente em sala de aula existemoutros fatores que devem ser considerados, como o currículo apropriado e flexibilizadoque conduzirá a práticas pedagógicas realmente heterogêneas.

O professor da escola inclusiva deve avançar em direção à diversidade, deixar deser mero executor de currículos e programas predeterminados, para se transformar emresponsável pela escolha de atividades, conteúdos ou experiências mais adequadas aodesenvolvimento das capacidades fundamentais dos seus alunos, tendo em conta suasnecessidades. Conhecer, portanto, as características individuais dos alunos comcaracterísticas de altas habilidades/superdotação e as diferentes formas de manifestaçãode suas singularidades é condição para que se estabeleça o vínculo necessário entre oensino e a aprendizagem. Evidentemente não é tarefa do professor estabelecerdiagnósticos, mas uma postura de observação que lhe permita identificar as preferênciase facilidades de cada um, assim como suas limitações.

O trabalho docente, por meio do estímulo das habilidades cognitivas, dacriatividade e da motivação em sala de aula, pode ser um instrumento para a flexibilizaçãodo currículo nas séries iniciais do ensino fundamental, uma vez que não é difícil reconhecera relevância do estímulo à capacidade criadora discente no âmbito da educação escolar,nem o seu papel e importância para o desenvolvimento cultural do aluno. Nessedesenvolvimento cultural, a memória, a fantasia e a imaginação são funções psicológicascomplexas e dialeticamente inter-relacionadas.

3 Para obter uma descrição detalhada das práticas educacionais de atendimento ao superdotado, consulte a série A construçãode práticas educacionais para alunos com altas habilidades/superdotação, publicado pela Secretaria de Educação Especial doMEC (2007).

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Faz-se necessário que os professores e as escolas se convençam da necessidade eda viabilidade de transformação da sua prática, para que busquem construir condiçõesadequadas ao trabalho de inclusão de todos os alunos. A ausência de tal convicçãoimpede a construção de um currículo suficientemente amplo e adequado para atenderàs necessidades desses alunos e da sociedade e impede, também, a redefinição de critériosde agrupamento de alunos, de avaliação de rendimento e de valorização de conquistas.Com base na complexidade do ato educativo, consideramos necessárias transformaçõesnas propostas formativas de professores, tanto em sua dimensão teórica como prática,promovendo e facilitando o uso de metodologias e estratégias didáticas que gerem modosde pensamento e ação próprios a profissionais críticos e reflexivos, capazes de trabalharcoletivamente.

O princípio fundamental da escola ou ensino inclusivo é que todos os alunos, sempreque possível, aprendam juntos, independentemente de suas dificuldades ou talentos,deficiência, origem socieconômica ou origem cultural em escolas e salas de aula, ondetodas as necessidades são satisfeitas. Stainback e Stainback (1999) diz que “para conseguirrealizar o ensino inclusivo, os professores em geral e especializados, bem como os recursos,devem aliar-se em um esforço unificado ao consistente” (p. 25).

A inclusão reforça a prática de que as diferenças são aceitas e respeitadas. No entanto,para que isso aconteça realmente, são necessárias mudanças sociais, bem como um esforçomútuo de todos os incluídos na prática inclusiva. Incluir e garantir uma educação dequalidade para todos é, atualmente, o fator mais importante na redefinição dos currículosescolares, desafiando a coragem das escolas em assumir um sistema educacional “especial”para todos os alunos. É nesse contexto que as atuais políticas públicas de educação seinserem.

A perspectiva de educação para todos constitui um grande desafio, pois a realidadeindica uma numerosa parcela de excluídos do sistema educacional, sem possibilidadede acesso à escolarização. Vale lembrar que:

Incluir não significa apenas colocar no próprio ninho o estranho que vem defora, seqüestrando-o de sua vida plena; ao contrário, requer um sair de si e irao seu encontro, ofertando-lhe aquilo de que, efetivamente necessita. Incluirsignifica ouvir e responder àquilo que um outro pede pela sua própria voz.(TUNES; BARTHOLO, 2006, p. 147).

Enfrentar esse desafio é condição essencial para atender à expectativa dedemocratização da educação, em nosso país, e às aspirações de todos que almejam seudesenvolvimento e progresso.

Educação de alunos com características de altas habilidades/superdotaçãoe a formação docente sob a ótica da diversidade e da inclusão

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Da segregação à inclusão: o percurso feito pelo Brasil em relação aDa segregação à inclusão: o percurso feito pelo Brasil em relação aDa segregação à inclusão: o percurso feito pelo Brasil em relação aDa segregação à inclusão: o percurso feito pelo Brasil em relação aDa segregação à inclusão: o percurso feito pelo Brasil em relação aoutros paísesoutros paísesoutros paísesoutros paísesoutros países

Maria Amelia Almeida1

[email protected]

No decorrer da história da humanidade, vamos perceber que as pessoas comdeficiência têm sido vulneráveis a práticas de infantilismo e de segregação. Em muitos países,essas práticas, de alguma forma, estavam relacionadas com o medo da sociedade de que“tais defeitos” pudessem comprometer a raça humana (BRADDOCK; PARRISH, 2002).

De acordo com Hardman, Drew e Egan (2005), na segunda metade do séculoXVIII, reformas humanitárias indicaram uma era de otimismo em relação ao tratamentoe, eventual cura daqueles que se desviavam da norma. No entanto, ainda segundo essesautores, quando o “desvio” não era curado e continuava sendo um problema socialpreocupante, muitos profissionais se convenceram de que era necessário esterilizar esegregar um grande número desses “degenerados mentais e sociais”. Em alguns países,algumas leis apresentavam orientações para esterilização de pessoas com deficiênciamental e/ou epilepsia e criminosos. Além do mais, muitas pessoas eram forçadas a deixaremas suas comunidades para receberem “cuidados especiais” em ambientes isolados dasociedade. Esses lugares se tornaram conhecidos como “instituições” e receberamdiferentes nomes, como: escola residencial, hospital, colônia, asilo... Essas instituiçõesforam estabelecidas para oferecer treinamento e alguma forma de educação em umambiente protetor, no qual passariam as suas vidas.

Nos anos 1900, muitas tentativas de “ressignificação” dessas instituições foram feitas.Por exemplo, no início dos anos 1950, nos Estados Unidos a Associação Americana dePsiquiatria envidou todos os esforços para inspecionar e qualificar tais instituições. Essetrabalho resultou em uma chamada geral de atenção ao público sobre a falta deintervenções terapêuticas e das condições deploráveis que se encontravam os residentes(BLATT; KAPLAN, 1974; WOLFENBERGER, 1975). Talvez em resposta a esses dados, ospais de crianças com deficiência nos Estados Unidos começam a se organizarem e afundarem organizações de proteção às pessoas com deficiência, como por exemplo UnitedCerebral Palsy (UCP), National Association for Retarded Children (NARC).

1 Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Educação Especial da Universidade Federal de São Carlos. Atua nas áreasde Comunicação Alternativa e Ampliada, Currículo Funcional, Ensino e Consultoria Colaborativa para a Inclusão, Inclusão dePessoas com Deficiência no Mercado de Trabalho.

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É importante ressaltar, que nos anos 1800, na época do império, foram criados noBrasil dois importantes institutos, hoje denominados Instituto Benjamim Constant eInstituto Nacional de Educação de Surdos . Porém tais institutos escolares foram criadospara atender às demandas educacionais de seus residentes. Segundo Jannuzzi (2004, p.12), o “Imperial Instituto para Meninos Cegos, nome dado ao Instituto Benjamin Constantpor ocasião de sua criação, “destinava-se ao ensino primário e alguns ramos do secundário,ensino de educação moral e religiosa, de música, de ofícios fabris e trabalhos manuais”.Ainda segundo Jannuzzi (2004, p. 14) “essas duas instituições para deficientes foramintermediadas por vultos importantes da época , que procuravam transmitir ensinamentosespecializados aceitos como fundamentais para esse alunado”. Portanto, a criação dessasduas instituições nada se assemelha à criação das instituições que descrevemosanteriormente. Pelo contrário, seus objetivos era o de oferecer o que de melhor havia emtermos de Educação para surdos e cegos naquela época.

No fim da década de 1950, do outro lado do mundo, em 1959, o “PrincípioNormalização” era Promulgado na Dinamarca por sugestão de Bank-Mikkelsen (1969),que tinha como principal objetivo: “Deixar a pessoa com deficiência mental obter umaexistência o mais próximo possível do normal”. Esse princípio “revolucionou” o mundoe o atendimento das pessoas com deficiência mental, principalmente, em ambientessegregados da sociedade passa a ser questionado, da mesma forma que aconteceu nosUSA no início dos anos 1950.

Nessa mesma ocasião, em 1961, aprova-se no Brasil a Lei nº 4.024/61 – Lei deDiretrizes e Bases da Educação Nacional (20 de dezembro de 1961), que em seus Artigos2 e 88 , estabelecia:

“A educação é direito de todos e será dada no lar e na escola”.“A educação de excepcionais deve, no que for possível, enquadrar-se no sistema

geral de ensino, afim de integrá-los na comunidade”(BRASIL, Lei nº 4024/61).Diante de tudo o que estava acontecendo em outros países, em que se discutia se

as pessoas com deficiência podiam ou não “obter uma existência o mais próximo possíveldo normal” (BANK-MIKKELSEN, 1969) em nosso país era aprovada uma lei que permitiaàs crianças com deficiência serem educadas no sistema geral de ensino. Talvez o problemamaior dessa lei foi afirmar que a educação das crianças com deficiência “deveria” e nãoo “teria” que enquadra-se no sistema geral de ensino. Ou seja, a expressão “no que forpossível”, acabou por manter as crianças com deficiência fora da rede comum de ensino,uma vez que “muitos” concluíram “que não era possível” educá-las nas escolas comunsde ensino com isso muitas escolas especiais continuaram sendo criadas.

Em outros países, os questionamentos sobre a educação de crianças com deficiênciaem ambientes segregados continuava sendo questionado. Assim é que, em 1968, LloydDunn, lança nos Estados Unidos uma publicação a qual questiona, de forma muitoincisiva, os serviços de Educação Especial para alunos com deficiência mental leve.Também na Escandinávia, dez anos após ser promulgado, finalmente o “Princípio de

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Normalização” foi sistematizado na Dinamarca e colocado na literatura por Nirge nocapítulo da monografia: “Mudando os padrões dos serviços residenciais para deficientesmentais” (KUGEL; WOLFENSBERGER, 1969). Essa publicação causou uma granderevolução em vários países e o trabalho com os alunos com deficiência mental passou aser totalmente reformulado.

Nesse mesmo ano, em 1969, foi aprovada uma nova Constituição Brasileira, queafirmava:

“O direito à educação deve ser igual a todos” e “O ensino de 1º grau obrigatóriopara todos, dos sete aos 14 anos, gratuito, nos estabelecimentos de ensino” (BRASIL,1969).

Podemos, então deduzir que como a lei proclamava que a Educação era direito detodos os brasileiros na faixa etária de 7 a 14 anos, subentende-se que esse direito estendia-se também a todos os alunos que apresentassem deficiência, transtornos, superdotação.

Um ano após a aprovação da Constituição (BRASIL, 1969), a Espanha aprovavasua Lei Geral da Educação de 1970, que previa que “a educação dos surdos-mudos ecegos poderia ser realizada tanto nas escolas especiais quanto nas escolas regulares”. Ouseja, após séculos de segregação, a uma lei educacional espanhola concede, pelo menos,aos alunos surdos e cegos, o direito de estudarem nas escolas comum da rede de ensino,direito esse garantido no Brasil desde 1961 pela Lei nº 4.024/61 (GONZÁLES, 2007).

Em 1971, o Brasil aprovou mais uma Lei de Educação, a Lei nº 5.692/71 (11 deagosto de 1971), que em seu Artigo 9º estabelecia que: “Os alunos que apresentemdeficiências físicas e mentais, que se encontrem em atraso considerável quanto à idaderegular de matrícula e os superdotados deverão receber tratamento especial, de acordocom as normas fixadas pelos competentes Conselhos de Educação. Será que em relaçãoaos alunos especiais, a Lei nº 5.692/71, foi um progresso ou retrocesso se comparadacom a Lei 4.024?

Como competia aos Conselhos de Educação fixarem normas em relação à educaçãodesses alunos, dois pareceres importantes surgiram:

Em 1972 foi aprovado o Parecer CFE nº 848/72 do Conselheiro Valnir Chagas, queestabelecia: “Os excepcionais estão incluídos na obrigatoriedade escolar dos sete aos14 anos, com direitos a que levem em conta as suas características individuais prolongandoo ensino gratuito até o limite da real educabilidade de cada aluno e 1974 foi aprovado oParecer 1.682/74, da Conselheira Terezinha Saraiva, que estabelecia que “Oacompanhamento e a avaliação dos deficientes deverão constituir processo contínuo etrabalho cooperativo, abrangendo aspectos relativos à capacidade intelectual, interesses,atitudes,competência social, aproveitamento escolar”.

Esses dois pareceres, à época, foram muito importantes para os alunos superdotados,com deficiência e outros transtorno, pois enquanto o primeiro incluía esses alunos naobrigatoriedade escolar dos 7 aos 14 anos, ou outro estabelecia que o acompanhamentoe a avaliação dos “deficientes” deveriam constituir um processo contínuo. Porém, o que

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houve com o parecer da Conselheira Terezinha Saraiva, que ainda hoje, a todomomento, nos deparamos com jovens e adultos com deficiência mental que nãoaprenderam a ler e a escrever e muito menos estão preparados para o trabalho? Seráque nunca foram avaliados no percurso de sua vida escolar que não estavamaprendendo? Ou será que pelo fato do parecer do Conselheiro Valnir Chagas “prolongaro ensino gratuito até o limite real de sua educabilidade” fez com que se acreditasseque não era preciso investir tão fortemente na sua educabilidade, visto que “teriammais tempo” para aprender?

Assim, enquanto no Brasil, as leis vinham garantindo a educação de alunos especiaisna rede comum de ensino desde 1961, é somente em 1975 que Portugal e EstadosUnidos garantem uma educação menos segregada para esses alunos. Dessa forma, emPortugal “são criadas as primeiras equipes de Ensino Especial que tinham por objetivopromover a integração familiar, social e escolar das crianças e jovens portadores dedeficiências sensoriais ou motoras, com capacidade de acompanhar o currículo escolar”(LIMA-RODRIGUES et al. 2007). Posteriormente, esse apoio à integração incorporoutambém as crianças com deficiência mental, segundo os mesmos autores. Nesse mesmoano, nos Estados Unidos da América do Norte foi aprovada a Lei nº 94.142 – Educaçãopara Todas as Crianças Excepcionais – que assegurava às crianças com necessidadesespeciais o direito à “Educação pública, gratuita e apropriada a todas as criançasexcepcionais de 3 a 21 anos em ambientes o menos segregado possível”. Assim, umanova terminologia entra na área de Educação Especial:

1. “Mainstreaming”, situação que garante às crianças “excepcionais”: (a) matrículanas escolas com seus pares normais; (b) garantia de serviços especiais enquanto estiveremmatriculadas em classes regulares; (c) oportunidade de interagir o máximo possível comseus pares em ambientes não segregados”;

2. Processo de “desegregação”, que consiste na retirada das “pessoas comnecessidades especiais” dos ambientes segregados (escolas especiais, instituiçõesresidenciais).

3. Processo de “desinstitucionalização”, que consistiu na retirada das “pessoas comnecessidades especiais”, que viveram toda as suas vidas em instituições segregadas dasociedade e devolução das mesmas às suas respectivas famílias ou colocando-as em“casas lares” em bairros residenciais.

Todas essas leis, tanto as brasileiras, quanto as portuguesas, espanhola, americana,favoreceram mais a integração escolar e educativa, que segundo Blanco (1998) significouum processo de inserção da pessoa deficiente preparada para conviver em sociedade secaracterizando como um movimento de luta por direitos com o objetivo de incorporar àescola comum crianças com deficiência que freqüentaram sistemas segregados de ensinopor muitos anos.

Em 1986 Portugal publica a nova Lei de Bases do Sistema Educativo (nº 46/86 de14/10/1986), que proclama nos artigos 17º e 18º “igualdade de oportunidade e o direito

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de todas as crianças à educação, independentemente das suas características físicas,sociais e étnicas. A Educação Especial é definida como modalidade integrada no sistemageral de educação, prestando apoio às estruturas regulares de ensino, de acordo com asnecessidades de cada aluno. Prevê o ensino em instituições especiais quando o tipo e ograu de deficiência da criança exigir” (FELGUEIRAS, 1994).

Nesse mesmo ano, nos Estados Unidos da América, a Lei 94.142 de 1975denominada “Educação para todas as crianças excepcionais” foi renomeada para “AtoEducacional para Indivíduos com Deficiência” – IDEA (HEWARD, 2006), que tem comoprincipais garantias:

1. Rejeição zero. As escolas devem aceitar todas as crianças com necessidadesespeciais. Este princípio deve ser aplicado independente da natureza e severidadeda deficiência.

2. Todos os alunos com deficiência são elegíveis a uma educação pública, gratuitae de qualidade.

3. As escolas devem utilizar-se de identificação e avaliação não discriminatóriaenvolvendo métodos multidisciplinares para determinar se a criança tem umadeficiência e, se tiver, indicar no tipo de atendimento educacional especializadoque vai precisar.

4. As crianças devem ser educadas com outras crianças não deficientes emambientes não segregados e só podem ser removidas para classes ou escolasseparadas apenas quando a severidade de sua deficiência não permitir querecebam educação apropriada em classes da educação geral.

5. As escolas devem garantir os direitos das crianças com deficiência e de seus pais.6. A participação dos pais e dos filhos com deficiência (quando possível) nos

processos de decisões. As escolas devem colaborar com pais e aluno comdeficiência no planejamento e implementação dos serviços de EducaçãoEspecial.

Apesar dos avanços, essas leis continuam garantindo a integração dos alunos comespeciais nas escolas da rede comum de ensino.

Em 1988, é aprovada no Brasil a nova Constituição Brasileira, cujo Artigo 208 prevêcomo dever do Estado:

“Atendimento educacional especializado aos portadores de deficiênciapreferencialmente na rede regular de ensino”. Ou seja, o “preferencialmente” acabousendo uma espécie de sinônimo do “no que for possível”, estabelecido na Lei nº 4.024de 1961.

Um ano depois da aprovação da nova Constituição foi aprovada a Lei nº 7.853(24/10/89), que estabelece “normas gerais para o pleno exercício dos direitos individuaise sociais das pessoas portadoras de deficiência e sua efetiva integração social”. O Inciso1 do artigo 2º define as medidas a serem tomadas pelos órgãos da administração diretae indireta na área de Educação:

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1. Inclusão da Educação Especial no sistema educacional como modalidadeeducativa;

2. A inserção, no referido sistema educacional, das escolas especiais, privadas epúblicas;

3. Oferta, obrigatória e gratuita, da Educação Especial em estabelecimentos públicosde ensino;

4. Oferecimento obrigatório de programas de Educação Especial a nível pré-escolare escolar, em unidades hospitalares e congêneres nas quais estejam internados,por prazo igual ou superior a um ano, educandos portadores de deficiência;

5. O acesso de alunos portadores de deficiência aos benefícios conferidos aos demaiseducandos, até mesmo material escolar, merenda escolar e bolsa estudo;

6. Matrícula compulsória em cursos regulares de estabelecimentos públicos eparticulares de pessoas portadoras de deficiência capazes de se integrarem nosistema regular de ensino.

Logo em seguida, também foi aprovada a Lei nº 8.069 (1990), que é o Estatuto daCriança e do Adolescente, que em seu Artigo 54 estabelece que é “Dever do Estadoassegurar à criança e ao adolescente atendimento educacional especializado aosportadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino”.

Nesse mesmo ano, no período de 5 a 9 de março de 1990, ocorreu a Conferênciade Jomtien, na Tailândia, ocasião em que foi aprovada a Declaração Mundial sobreEducação para Todos, que afirma: “As necessidades básicas de aprendizagem das pessoasportadoras de deficiências requerem atenção especial. É preciso tomar medidas quegarantam a igualdade de acesso à educação aos portadores de todo e qualquer tipo dedeficiência, como parte integrante do sistema educativo”.

Quatro anos depois, em 1994, a Declaração de Salamanca é proclamada na Espanhada qual foram signatários mais de 80 países e preconiza:

1. Direito fundamental da criança à educação;2. Os sistemas educacionais devem levar em conta a vasta diversidade;3. As pessoas com necessidades especiais devem ter acesso à rede regular de ensino;4. As escolas regulares devem ter orientação inclusiva;Nesse mesmo ano, foi publicada no Brasil a Política Nacional de Educação Especial,

que traz algumas definições de integração. Em 1996, foi aprovada no Brasil mais uma educacional, a Lei nº 9.394/96 – Lei de

Diretrizes e Bases da Educacional Nacional (20/12/1996) e da mesma forma que aConstituição de 1988, também preconiza “Atendimento educacional especializadogratuito aos educandos com necessidades especiais, preferencialmente na rede regularde ensino” (Artigo 4.III). Mais uma vez, o “preferencialmente” está presente em mais umalei brasileira.

O Capítulo V é dedicado à Educação Especial:Artigo 58: Define o que é Educação Especial para efeitos legais da lei.

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Artigo 59: Estabelece o que os sistemas de ensino assegurarão aos educandos comnecessidades especiais.

Artigo 60: Reafirma que é de responsabilidade do poder público a ampliação doatendimento aos alunos com necessidades especiais na própria rede pública de ensinoregular, independentemente das instituições caracterizadas para fins de apoio técnico efinanceiro, pelos órgãos normativos dos sistemas de ensino.

Em 1997, Portugal aprovou o Despacho Conjunto nº 106 (01/07/97) que indicapara um sistema educativo único, englobando simultaneamente, a educação regular e aespecial, centrando-se na inclusão de todos os alunos.

Em 2001, foi aprovado no Brasil o documento Diretrizes Nacionais para a EducaçãoEspecial na Educação Básica que indica que “a educação especial de ver ocorrer nasescolas públicas e privadas da rede regular de ensino, com base nos princípios da escolainclusiva” (página 42). Mais adiante, o documento torna claro que “Extraordinariamente,os serviços de educação especial podem ser oferecidos em classes especiais, escolasespeciais, classes hospitalares e em ambientes domiciliares” (página 42). Mais uma vez,as chances de inclusão dos alunos especiais na rede comum de ensino ficam diminuídas,uma vez que o termo “extraordinariamente”, talvez da mesma forma que o“preferencialmente” ou “no que for possível” abrem a possibilidade para que todos osalunos com deficiência se enquadrem nesses serviços.

Em 2005, em Portugal o Despacho nº 106 é reformulado pelo Despacho nº 10856/05 (13/05/05) onde refere como função principal dos recursos e apoios educativosespecializados , a construção de uma “Escola Inclusiva”, que promova a “Inclusão sócio-educativa”dos alunos Necessidades Educacionais Especiais (LIMA-RODRIGUES et al.2007).

Da mesma forma que em Portugal, o Brasil também se preocupa com a construçãode uma “Escola Inclusiva” que também possa promover a inclusão de todos os alunoscom deficiência, transtornos globais de desenvolvimento, altas habilidades/superdotação.Para tanto, está sendo construído no Brasil o documento: “Política Nacional de EducaçãoEspecial na Perspectiva da Educação Inclusiva”, que tem sido apresentado em várioseventos e em diferentes ocasiões com os vários segmentos da sociedade na tentativa deuma ampla discussão.

Ao encerrar esse trabalho, gostaria de resgatar o que a pesquisadora Marisa FaermannEizirik nos disse no “IV Seminário Nacional de Formação de Gestores e Educadores”realizado em Florianópolis em setembro de 2007 acerca dos incômodos que a diferençatraz e “ousar” fazer uma comparação com o documento da nova Política Nacional deEducação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva que poderá trazer sensações de:estranhamento, proximidade, sofrimento, insegurança, incerteza, desassossego,desconforto, mudança. O mais importante de todos esses incômodos é a “mudança”que eles podem provocar. Vamos então acreditar que, finalmente, após 46 anos deaprovação de documentos que indicam a possibilidade de alunos com deficiência,

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transtornos globais de desenvolvimento, altas habilidades/superdotação serem atendidosnas escolas de ensino comum, esse documento provoque no Brasil a verdadeira“mudança” que tanto ensejamos!

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Inclusão de surdos: pela peça que encaixa nesse quebra-cabeçaInclusão de surdos: pela peça que encaixa nesse quebra-cabeçaInclusão de surdos: pela peça que encaixa nesse quebra-cabeçaInclusão de surdos: pela peça que encaixa nesse quebra-cabeçaInclusão de surdos: pela peça que encaixa nesse quebra-cabeça

Ronice Müller de Quadros11111

[email protected]

“Contrário ao modo como muitos definem surdez – isto é, como umimpedimento auditivo – pessoas surdas definem-se em termos culturais elingüísticos.”

Wrigley, 1996, p. 13.

Inclusão depende das diferentes possíveis traduções que se aplicam às práticaspolíticas na educação. A tradução feita nesse artigo no caso específico dos surdosbrasileiros é no sentido de garantir uma educação com qualidade na língua de sinaisem que seja privilegiada a experiência visual com pares surdos. O espaço em que issopode se tornar realidade depende da realidade local, mas definitivamente a opção daescola pública deve ser garantida. Vejam que educação de surdos tem sido motivo dedebate em vários países, pois é uma das peças do quebra-cabeça da Educação Inclusivaque não se encaixa. Ela não se encaixa porque a peça que serviria nesse quebra-cabeçade modo como vem sendo traduzida deveria ter outra forma. Nesse artigo, serãoapresentadas as formas dessas peças e propostas algumas alternativas, considerando arealidade das políticas públicas de educação e os sonhos dos surdos para possibilitarum espaço de negociação.

A educação de surdos na perspectiva das políticas públicas estão voltadas para agarantia de acesso e permanência do aluno surdo nas escolas regulares de ensino.Entende-se “dentro da rede regular de ensino” que o aluno surdo deverá ter condiçõesescolares na escola da esquina do seu bairro. No entanto, ao mesmo tempo, com alegislação vigente garantindo o direito lingüístico ao surdo de ter acesso aos conhecimentosescolares na língua de sinais, esse “dentro da rede regular na escola da esquina de seubairro” impõe uma construção de uma educação que garanta as questões lingüísticasimpostas. Imaginem ter aulas em uma língua que não é a língua falada na escola emqualquer escola em que haja, pelo menos, um surdo matriculado. Os próprios articuladores

1 Ronice Muller de Quadros é Doutora em Letras (ênfase em Lingüística), Pedagoga e Interprete de Língua de Sinais Brasileira,atua como professora e pesquisadora na Universidade Federal de Santa Catarina. Outros artigos e discussões a respeito daeducação de surdos e a língua de sinais podem ser acessados na sua página: www.ronice.ced.ufsc.br . As pesquisas relacionadascom esse artigo recebem apoio financeiro da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)Programa de Educação Especial.

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que encabeçam as políticas públicas de educação chegam à conclusão de que isso seriaextremamente dispendioso e acabaria criando situações garantidas por lei, mas sem seremconcretizadas.

O poder público cria, então, algumas estratégias para manter a idéia de que aeducação de surdos deva ser disponibilizada no ensino regular. Uma delas seria a deoferecer o intérprete de língua de sinais onde houver surdos matriculados. De qualquermaneira, a distância entre o prescrito e o executado, em alguns estados brasileiros, estáfazendo com que os próprios surdos ou seus familiares estejam acionando judicialmenteo estado, exigindo o ensino na língua de sinais brasileira. Assim, vemos os efeitos dapolítica de Educação Inclusiva, mesmo que ainda as escolas deparem-se com a inexistênciade intérpretes de língua de sinais para atender à demanda imposta por essa políticaeducacional.

Alguns mecanismos já vêm sendo criados e algumas instituições de ensino começama formar esse profissional. Atualmente, foi aprovado o Curso de Letras Libras Bachareladona Universidade Federal de Santa Catarina que graduará profissionais para assumiremtal demanda. Além dessa ação, há várias iniciativas de instituições de ensino para formarintérpretes de língua de sinais em nível de pós-graduação.

Algumas pesquisas começam a despontar no país apresentando resultados sobreas funções desse profissional no espaço escolar e o que tem sido reportado é que, apesardo intérprete romper uma barreira comunicativa na rede regular de ensino, as questõesmetodológicas deixam a desejar, ignorando aspectos culturais e sociais que fazem partedo processo educacional deixando, muitas vezes, a criança surda à margem da escola(LACERDA, 2000a, 2000b). Assim, estamos diante de um impasse, uma vez que asorientações das políticas públicas são para garantir o acesso ao conhecimento na rederegular de ensino por meio da língua de sinais brasileira com o intérprete de língua desinais.

A peça do quebra-cabeça das políticas públicas, no entanto, não é a peça que ossurdos projetam. A educação de surdos na perspectiva dos surdos é norteada pelareivindicação de uma escola pública de qualidade em língua de sinais com professoresbilíngües e professores surdos. Os movimentos surdos criticam a manutenção dos surdosnos espaços das escolas que estão estruturadas para ensinar e aprender em portuguêscom alunos que crescem ouvindo e falando essa língua, ou seja, as proposições sãocontrárias às propostas de inclusão nessa perspectiva. Os movimentos surdos clamampor inclusão em uma outra perspectiva. Dá para se perceber que os surdos entendeminclusão como garantia dos direitos de terem acesso à educação de fato consolidadasem princípios pedagógicos que estejam adequados aos surdos. As proposiçõesultrapassam as questões lingüísticas, incluindo aspectos sociais, culturais, políticos eeducacionais (QUADROS, 2003). Nesse sentido, os surdos sonham com espaços emque a língua de sinais seja a língua de instrução em um ambiente cultural e social que

Inclusão de surdos: pela peça que encaixa nesse quebra-cabeça

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favoreça o fortalecimento das heranças surdas para consolidação de um grupo que sediferencia a partir da experiência visual.

A escola que os surdos querem e a escola que o sistema apresenta ainda não sãoconvergentes. A peça que os surdos apresentam não se encaixa na forma como as escolaspúblicas estão organizadas. A educação no país ainda reflete os princípios da política deintegração traduzidos como a colocação de surdos na rede regular que ensina na línguaportuguesa. Esse é o grande entrave do processo inclusivo dos surdos na educação,impondo um desafio para as propostas governamentais, no sentido de garantir os direitosdos surdos.

A implementação de uma política de inclusão deve estar acompanhada dodiálogo com os movimentos surdos, que apesar de insatisfeitos, estão interessadosno sucesso da educação de surdos. A partir dessa iniciativa, podemos processar umaaproximação entre o “querer” e o fazer na educação instaurando um espaço denegociação. Esse espaço de negociação permitira a reorganização de todas as peçasdo quebra-cabeças ou, até mesmo, a criação de outros quebra cabeças que garantamuma educação com qualidade aos surdos brasileiros. A peça do quebra-cabeça dossurdos não apresenta o formato para se encaixar no quebra-cabeça da escola queestá aí. No entanto, existe a possibilidade de negociação para tornar essa peça maispróxima à peça que se espera por parte dos que definem como a educação deve ser,em uma perspectiva que consolida os princípios da inclusão e a garantia dos direitoshumanos.

Para concluir tal trabalho, escolhi as palavras de Miranda (2001), que por meioda sua experiência visual, conseguiu captar brilhantemente a importância dasinterações entre os surdos como decisivas na construção da subjetividade e identidadedos surdos:

Considerando que a cultura surda mostra uma nostalgia curiosa em relação auma “comunidade imaginária”e que é barbaramente ou profundamentetransformada, senão destruída no contato com a cultura hegemônica, ela agecomo reguladora da formação da identidade surda, que se reaviva novamenteno encontro surdo-surdoencontro surdo-surdoencontro surdo-surdoencontro surdo-surdoencontro surdo-surdo. Este encontro é um elemento chave para o modode produção cultural ou de identidade, pois implica num impacto na “vidainterior”, e lembra da centralidade da cultura na construção da subjetividadedo sujeito surdo e na construção da identidade como pessoa e como agentepessoal.

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Inclusão de surdos: pela peça que encaixa nesse quebra-cabeça

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Os efeitos da 8ª Convenção Internacional da ONU e o acesso aoOs efeitos da 8ª Convenção Internacional da ONU e o acesso aoOs efeitos da 8ª Convenção Internacional da ONU e o acesso aoOs efeitos da 8ª Convenção Internacional da ONU e o acesso aoOs efeitos da 8ª Convenção Internacional da ONU e o acesso aomercado de trabalho para as pessoas com deficiênciamercado de trabalho para as pessoas com deficiênciamercado de trabalho para as pessoas com deficiênciamercado de trabalho para as pessoas com deficiênciamercado de trabalho para as pessoas com deficiência

Ricardo Tadeu Marques da Fonseca1

[email protected]

1 Da igualdade formal à igualdade real1 Da igualdade formal à igualdade real1 Da igualdade formal à igualdade real1 Da igualdade formal à igualdade real1 Da igualdade formal à igualdade real

A atuação do Ministério Público do Trabalho demostrou a importância do esforçoem prol da inserção das pessoas com deficiência no trabalho. A lei brasileira, por estímuloconstitucional, estabelece ação afirmativa categórica nesse sentido, fixando cotas dereserva de vagas, tanto na esfera pública, quanto na privada. De outra parte, a condiçãode exclusão das pessoas com deficiência do convívio social é milenar e reveladora doquão distante estão essas pessoas de condições mínimas de cidadania erigidas desde oprincípio da cultura ocidental.

O direito de livre expressão, de ir e vir, de votar e ser votado, bem como os direitossociais de educação, habitação, trabalho, saúde estão, até certo ponto, conquistados,apesar das ameaças e insuficiências constantes em relação ao povo. O grupo das pessoascom deficiência, no entanto, não usufrui desses direitos por causa da inadequação dopróprio Direito e das estruturas físicas nas cidades e nas empresas para lhes permitir afruição dessas liberdades e conquistas. A par disso, assinale-se que os direitos sociais e aspróprias liberdades individuais vêm sendo francamente agredidas, não só no terceiromundo, como nos países do capitalismo central. A doutrina de segurança nacional, oTribunal de Guantânamo, a polícia mundial norte-americana e a pretensa hegemoniaideológica da globalização econômica trazem riscos concretos à permanência dos direitoshumanos, submetidos que podem ficar ao poder econômico e das armas.

A compreensão da importância da História como instrumento de validação dacorrelação de forças e da origem e destino da vida em sociedade impeliu à discussão quese trava nesse trabalho. Como se falar em emprego especial para pessoas com deficiênciase o próprio emprego se encontra estruturalmente ameaçado? É justa essa preferência?São as questões que emergem ao se analisar as ações afirmativas de que se cuidam.A História, porém, fornece elementos suficientes para que se compreenda que astransformações que se travam no mundo do trabalho, em razão da tecnologia e da

1Procurador Regional do Ministério Público do Trabalho – 9ª Região, Especialista e Mestre em Direito do Trabalho pelaUniversidade de São Paulo (Usp) e Doutor pela Universidade Federal do Paraná.

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globalização econômica, incitam mudanças na forma da prestação de serviços, massubstancialmente não a alteram, pois, apesar das inovações expressas naterceirização, no teletrabalho e na prestação autônoma de serviço, dos quais vêmse servindo as empresas, a partir da política do downsizing e da reengenharia, queestiveram muito em voga nos anos 1980 e 1990, o Direito do Trabalho mantém-seíntegro. Seus princípios oferecem respostas firmes, visto que dizem respeito àdignidade da pessoa e ao fato de que ela, a dignidade, está fora do mercado.O naufrágio das políticas econômicas neoliberais que acenavam com a pujançados Tigres Asiáticos, como argumento para justificar a precarização do trabalho,evidenciou-se ante a constatação de que a perda de poder de consumo da classetrabalhadora acaba por impedir a própria evolução do mercado e de que as pessoasnão se conformam com imposições econômicas sobre valores humanos que selapidaram a partir da modernidade. Veja-se, por exemplo, a rejeição do povo francêsà lei do primeiro emprego.

A crise desses valores só encontra resposta neles mesmos a partir dadinamização daquelas promessas do século XVIII e XIX para que assumam dimensõescoletivas amplas e se aperfeiçoem para abarcar a diversidade humana, que não éburguesa ou proletária, tão somente. Perpassa a luta de classes, sem desprezá-la,mas reafirma novos valores que vão sendo incorporados pelo conhecimentoacumulado e aprendido, até mesmo, pela luta de classes. A afirmação das minoriasfez a diferença depois da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948.Revolucionou o Direito Constitucional, reafirmando-o a partir de princípios comforça de norma, princípios que humanizaram o Direito, dirigido às pessoas, parasua dignidade. Dessa forma, o trabalho das pessoas com deficiência e as açõesafirmativas que o garantem não são contrários ao clamor de justiça universal,confirmam-no na medida em que esse grupo traz a tona, com suas reivindicações,questões de inclusão social que aperfeiçoam os direito humanos, a partir dachamada igualdade real entre as pessoas; tão real que se reforça nas diferenças edelas emerge.

A ignorância generalizada sobre as competências das pessoas com deficiênciaimpede-lhes o acesso às condições mínimas de cidadania, como se afirmou. Sufoca-lheso excesso de proteção assistencial e familiar. A despeito disso, rompem o véu milenar deopressão estética, cultural e comportamental e brandem bandeiras até entãodesconhecidas e que fortalecem as lutas de todas as minorias, fazendo com que o discursoeconomicista se coloque no seu lugar, uma vez que as condições humanas, que seevidenciam a partir das limitações ínsitas a toda a humanidade, também emprestam aalavanca que permite a superação de fronteiras físicas, sociais, políticas e tecnológicas.Cada vez que se cria um novo equipamento tecnológico ou se supera uma barreira cultural,as pessoas todas ganham espaço em sociedade e as pessoas com deficiência, antesestigmatizadas, não mais se limitam, pois se verifica que a limitação não está nelas e sim

Os efeitos da 8ª Convenção Internacional da ONU e o acessoao mercado de trabalho para as pessoas com deficiência

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na capacidade da humanidade em lhe propiciar oportunidades. Essa é a importância daidéia de sociedade inclusiva: a igualdade na incorporação da diferença.

O Direito do Trabalho veio como o primeiro instrumento jurídico que tratou daigualdade substancial, visto que o confronto direto entre capital e trabalho evidenciou ainsuficiência da mera afirmação formal de que todos são iguais perante à lei. Suas basesaxiológicas possibilitaram o lançamento dos alicerces das ações afirmativas que são asmesmas, na medida em que as confirmam e reproduzem, voltadas agora para gruposmenores, cuja projeção corta verticalmente as forças em conflito. Ele foi a ação afirmativapossível naquele momento, uma vez que o processo de lapidação dos direitos humanosnão permitia outra percepção. De qualquer modo, os instrumentos que forjaram o Direitodo Trabalho são os mesmos que aqui se aplicam para defender as ações afirmativas emprol das pessoas com deficiência.

Nesse trabalho, analisa-se, portanto, a origem do Direito do Trabalho, sua inclusãonas constituições, o novo Direito Constitucional que valoriza a dignidade da pessoa,justamente para se verificar as razões que, a partir dos anos 1980, viabilizaram o DireitoInternacional em prol das pessoas com deficiência, bem como as normas de açãoafirmativa que vieram pelo Judiciário, nos países da Comonn Law, e pelas leis, nos paísesdo Direito codificado. A própria construção do conceito de igualdade formal à igualdadesubstancial, à igualdade real acompanha a implementação de formas de combate àdiscriminação, discriminando, até mesmo, positivamente, determinados grupos que foramhistoricamente excluídos do acesso à cidadania. As mulheres, os negros e os índios, porexemplo, ocuparam seu espaço apenas a partir do fim do século XIX e início do XX,depois de muita violência que contra eles se perpetrou. A violência contra as pessoascom deficiência era calada, caridosa, mas tão veemente quanto à escravidão dos negros,ou à espoliação da terra dos índios, ou à submissão que se impôs às mulheres. Nenhumdos direitos humanos universais o são, efetivamente, mas a concretização de sua existênciase faz a partir das novas demandas da História, que são provocadas pela ação políticaconstante.

O Direito pode ser um instrumento de opressão ou libertação, dependendo daforma que seja utilizado. É o que se vê com o novo Direito Civil que busca novas fronteirasque transcendem o patrimonialismo patriarcal que o gerou e que se dirigem à defesa dadignidade da pessoa, da sua personalidade. O Direito Civil passa a se nutrir de valoresconstitucionais, plurais, em prol da dignidade da pessoa, tal como fizera o Direito doTrabalho, desde de sua origem. O novo Direito do Trabalho, por seu turno, colhe, doDireito Civil contemporâneo, novos elementos que o revalidam. Enquanto se fala naprivatização das relações laborais, todavia, defende-se a publicização das relações civis ede consumo. As regras que protegem as pessoas com deficiência, por sua vez, evidenciama necessidade de ambos, o Direito do Trabalho e o Direito Civil, todos balizados emprincípios constitucionais que estão acima do mercado. Esse é o impulso que mobilizouesse estudo, de vez que a vivência desse Membro do Ministério Público do Trabalho e

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cidadão com deficiência propiciou elementos pessoais e profissionais que aqui se fundeme oferecem recursos que atestam o que até aqui se disse e se procurará demonstrardoravante.

2 Convenções da Organização Internacional do T2 Convenções da Organização Internacional do T2 Convenções da Organização Internacional do T2 Convenções da Organização Internacional do T2 Convenções da Organização Internacional do Trabalhorabalhorabalhorabalhorabalho

Convém, agora, expor-se o conteúdo da Convenção nº 111,2 de 1958, ratificadapelo Brasil por meio do Decreto Legislativo nº 62.150, de 19/01/68, adotada na 42ªConferência Geral da OIT, que fixa critérios gerais sobre discriminação no trabalho.

Em seu preâmbulo, a Convenção em apreço toma por referência axiológica aDeclaração de Filadélfia3 para sublinhar que todos os seres humanos, sem distinção deraça, de crença ou de sexo, têm direito a perseguir seu bem-estar material e seudesenvolvimento espiritual em condições de liberdade e dignidade, de segurançaeconômica e em igualdade de oportunidades. Regula, destarte, os critérios de combate àdiscriminação no trabalho em catorze artigos. Define o termo discriminação (art. 1º),para fins de aplicação de seus dispositivos, da seguinte forma:

a) qualquer distinção, exclusão ou preferência baseada em motivos de raça,cor, sexo, religião, opinião política, ascendência nacional ou origem social quetenha por efeito anular ou alterar a igualdade de oportunidades ou de tratamentono emprego e na ocupação; b) qualquer outra distinção, exclusão ou preferênciaque tenha por efeito anular ou alterar a igualdade de oportunidades ou detratamento no emprego ou ocupação que poderá ser especificada pelo Membrointeressado mediante prévia consulta às organizações representativas deempregadores e trabalhadores, quando estas organizações existam, e a outrosorganismos apropriados.4

2 OIT, Convenios y recomendaciones... op. cit., p. 1037-1040.3 2"Em maio de 1944, a Conferência Internacional do Trabalho – a Assembléia-Geral da Organização – reunida em Filadélfia, nosEstados Unidos, aprovou uma declaração relativa aos fins e objetivos da OIT, conhecida pela Declaração de Filadélfia. Em umaépoca do pós-guerra e da reconstrução, a Declaração reafirma os princípios orientadores da OIT, nos quais se deveria inspirara política dos países-membros. São esses princípios os seguintes: o trabalho não é uma mercadoria; a liberdade de expressão ede associação é uma condição indispensável para um progresso constante; a pobreza, onde quer que exista, constitui um perigopara a prosperidade de todos; todos os seres humanos, qualquer que seja a sua raça, a sua crença ou o seu sexo, têm direito deefetuar o seu progresso material e o seu desenvolvimento espiritual em liberdade e com dignidade, com segurança econômicae com oportunidades iguais” (Disponível em: <http://www.ilo.org/public/portugue/region/eurpro/lisbon/html/oit.htm>. Acessoem: 14 de setembro de 2004).4 OIT – Organização Internacional do Trabalho. Convenios y recomendaciones internacionales del trabajo – 1919-1984 –adoptados por la Conferencia Internacional del Trabajo, p. 1037.

Os efeitos da 8ª Convenção Internacional da ONU e o acessoao mercado de trabalho para as pessoas com deficiência

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Exclui da esfera da discriminação qualquer exigência concernente à qualificaçãoprofissional específica a determinados postos de trabalho. Exorta os membros signatários(arts. 2º e 3º) a adotarem políticas públicas, em parceria com representantes de empregadorese trabalhadores, com o fito de proporcionar igualdade de oportunidades para empregos eocupações, eliminando, assim, qualquer forma de discriminação a esse respeito. Excluem docampo da discriminação (arts. 4º e 5º) medidas adotadas em face de pessoas que exerçamatividades prejudiciais ao Estado, assim como medidas de proteção que se adotem em outrasconvenções ou recomendações da OIT, além de outras (medidas) decorrentes de consultasprévias a organizações de empregados e empregadores em favor de pessoas, cuja situaçãoacarrete necessidade de compensação em face de discriminação notória, como o sexo, adeficiência, os encargos de família ou o nível social ou cultural. Estabelece critérios para a suavigência (arts. 6º a 10º), determinando, para tal, um lapso de tempo de doze meses após aratificação por parte de, pelo menos, dois membros e, em cada país, doze meses após oregistro da respectiva ratificação pelo Diretor-Geral da OIT, o qual deve sempre ser comunicadodas ratificações e comunicar a todos os membros o universo das ratificações ocorridas, paraque a Convenção se faça obrigatória em todo o território do país-membro. A denúncia daConvenção poderá ser feita após dez anos da sua entrada em vigor. Finalmente (arts. 11 a14), cuida dos procedimentos de revisão e de divulgação internacional de suas normas.

A Convenção nº 159, de 1983, assume importância primordial, de vez querepresenta a posição mais atual do organismo internacional em comento e será, por isso,verificada. O seu princípio basilar esteia-se na garantia de um emprego adequado e dapossibilidade de integração ou reintegração das pessoas com deficiência nas sociedades.

Em razão das condições práticas e das possibilidades nacionais, todo Estado que aratificar deve formular e aplicar uma política nacional sobre readaptação profissional eemprego de pessoas com deficiência e garantir que as medidas, efetivamente, beneficiemas pessoas com deficiência de todas as categorias. Essa política deve ter base no princípioda igualdade de oportunidades entre os trabalhadores com deficiência, de um ou deoutro sexo, e os demais trabalhadores (sem excluir a possibilidade de que se tomemmedidas positivas especiais em favor daqueles). A Convenção dispõe a obrigatoriedadeda consulta às organizações representativas de empregadores e de trabalhadores, assimcomo as que representam as pessoas com deficiência, acerca da aplicação dessa mesmapolítica. As pessoas com deficiência devem dispor de serviços de orientação, de formação,de colocação, de emprego ou de outras finalidades, bem adaptados as suas necessidades.Tais serviços devem promover-se igualmente nas zonas rurais e nas comunidadesapartadas. O Convênio dispõe, além disso, medidas em favor do desenvolvimento daformação e da disponibilidade de assessores especializados.5

5 OIT – Organização Internacional do Trabalho. Resúmenes de normas internacionales del trabajo, p. 29.

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3 Convenção Internacional de direitos da pessoa com deficiência da ONU3 Convenção Internacional de direitos da pessoa com deficiência da ONU3 Convenção Internacional de direitos da pessoa com deficiência da ONU3 Convenção Internacional de direitos da pessoa com deficiência da ONU3 Convenção Internacional de direitos da pessoa com deficiência da ONU

Inicialmente, faz-se mister um comentário sobre o contexto em que se insere aimportante ocorrência de dezembro de 2006, que revelou a adoção, pela AssembléiaGeral das Nações Unidas, do 8º documento internacional de Direitos Humanosproduzido pela própria ONU, qual seja a Convenção Internacional de Direitos da Pessoacom Deficiência. A leitura do preâmbulo, que a muitos pareceria supérflua, é na verdadefundamental para a compreensão do alcance do texto da norma internacional e para acompreensão da circunstância política que o gerou.

A produção normativa da Organização das Nações Unidas iniciou-se após a SegundaGuerra, logo após a fundação do próprio organismo internacional e o registro daquelasnormas é reiterado no preâmbulo aqui comentado. Assim é que o item “d” do preâmbuloenumera-os, o que se reiterará para facilitar a argumentação. São os seguintes: PactoInternacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, o Pacto Internacional dosDireitos Civis e Políticos, a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas asFormas de Discriminação Racial, a Convenção sobre todas as Formas de Discriminaçãocontra a Mulher, a Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis,Desumanos ou Degradantes, a Convenção sobre os Direitos da Criança e a ConvençãoInternacional para Proteção dos Trabalhadores Migrantes e suas Famílias.

Também à guisa de reforço argumentativo, retomam-se alguns itens do preâmbulo,os das letras “a”, “b” e “c” para sublinhar, dessa feita, que a principal força motriz daatuação da ONU é a preservação da dignidade inerente da família humana e da pazmundial, bem como a relevância dos direitos e liberdades atinentes aos pactosinternacionais patrocinados pela Organização das Nações Unidas; tudo para garantira universalidade, a indivisibilidade, a interdependência e a inter-relação dos DireitoHumanos. O direito ao trabalho é um Direito Humano universal assegurado desde aDeclaração Universal dos Direitos do Homem, de 1789. Esse direito só se realizaplenamente, porém, com a implementação de outros inerentes à liberdade, à educação,à moradia, à alimentação, à saúde, à habilitação e reabilitação, por exemplo. Trata-seda mencionada inter-relação e interdependência dos Direitos Humanos, que são, porisso mesmo, indivisíveis. Não há liberdade sem igualdade, tampouco essa sem aquelae ambas jamais prosperarão se medidas relativas à fraternidade humana não seimplementarem.

No entanto, observa-se que há Convenções voltadas a minorias ou a gruposvulneráveis como mulheres, crianças, negros, imigrantes, etc. É que logo se percebeu queuma lei votada pela maioria pode oprimir minorias, tal como ocorreu com a eleição deHitler e as leis por ele propostas. Desse modo, a função da Convenção em comento é ade assegurar todos os Direitos Humanos a esse grupo vulnerável, as pessoas comdeficiência, que em razão de barreiras físicas e atitudinais, não alcançou, até o presente,direitos mínimos inerentes às liberdades e à dignidade humana.

Os efeitos da 8ª Convenção Internacional da ONU e o acessoao mercado de trabalho para as pessoas com deficiência

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O direito ao trabalho está contido no artigo 27 da Convenção, cujo teor,sinteticamente é o de assegurar a liberdade de escolha de trabalho, adaptação física eatitudinal dos locais de trabalho, formação profissional, justo salário em condição deigualdade com qualquer outro cidadão, condições seguras e saudáveis de trabalho,sindicalização, garantia de livre iniciativa no trabalho autônomo, empresarial oucooperativado, ações afirmativas de promoção de acesso ao emprego privado ou público,garantia de progressão profissional e preservação do emprego, habilitação e reabilitaçãoprofissional, proteção contra o trabalho forçado ou escravo, etc.

Como se vê, o dispositivo é bastante amplo mas de abrangência exemplar, e não épossível cogitar de se abandonar qualquer das disposições nele contidas. Com efeito,essas diretrizes foram estabelecidas, a princípio, em diversas Convenções da OrganizaçãoInternacional do Trabalho, organismo pertencente à ONU e mais antigo que a própriaONU, visto que fundado em 1919, logo após a Primeira Guerra Mundial. São asConvenções nº 105, contra o trabalho forçado, nº 111 contra qualquer discriminaçãono trabalho e acima de todas, a Convenção nº 159 de 1983, cuja temática é o trabalhoda pessoa com deficiência. Desse modo, não se verifica nenhuma inovação especial nocampo laboral no que diz respeito aos direitos das pessoas com deficiência. Isso do pontode vista jurídico. A grande inovação parece ser o fato de que a ONU adotou a Convençãoem prol das pessoas com deficiência, nela agrupando tudo que já se havia construído emConvenções anteriores da própria ONU e, no particular, pela OIT.

Em síntese, a legislação brasileira em favor da pessoa com deficiência no trabalho éa seguinte: artigo 7º, XXXI, da Constituição Federal, que proíbe discriminação paraadmissão e remuneração em razão de deficiência; o artigo 37, também da Constituição,que no inciso VIII garante reserva de vagas na Administração Direta e Indireta, além dalegislação ordinária expressa pela Lei nº 7.853/89, que assegura no artigo 2º uma políticapública de acesso ao emprego público e privado; a Lei nº 8.112/90, que estabelece areserva de 5% a 20% dos cargos da Administração Direta e Indireta a pessoas comdeficiência; a Lei nº 8.213/91, que no artigo 93 fixa cotas de 2% a 5% de emprego parapessoas habilitadas ou reabilitadas nas empresas com mais de 100 empregados e,finalmente, o Decreto nº 3.298/99 que regulamenta as leis anteriores, além do Decretonº 5.296/04 que regulamenta as Leis nº 10.048 e nº 10.098 ambas de 2000, para otransporte público adaptado e remoção de barreiras arquitetônicas.

Verifica-se assim, com essa pequena síntese, que o Brasil está caminhando par epasso com a Convenção, mas a importância da ratificação é fundamental para que sesupere a flagrante fragilidade da eficácia das normas acima enumeradas, fragilidade quese deve a problemas inúmeros, como o próprio benefício de prestação continuada quedesestimula o emprego em prol de uma política assistencial exacerbada, como a falta defiscalização, por déficit material e humano, a falta de sanção nas leis, que não prevêempenas, a concentração de direitos em demasia em normas de caráter meramenteregulamentar, como os Decretos nº 3.298 e nº 5.296 e etc.

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A Convenção, assim, universaliza o direito das pessoas com deficiência e, aocontrário do que alguns pensam, não significa um gueto institucional. É sim, sem sombrade dúvida, um instrumento jurídico adequado para que direitos nunca antes aplicadossejam efetivamente estendidos às pessoas com deficiência. É um instrumento jurídicocerto para que os Direitos Humanos universais se viabilizem para esse grupo específico epara que eles se afirmem como um bem universal. Embora o Brasil tenha auferido méritoscom sua política de emprego para pessoas com deficiência, visto que desde 2000, desdea edição do Decreto nº 3.298 em dezembro de 1999, pôde-se estimar a contratação decerca de 100 mil pessoas com deficiência por empresas e pela Administração Direta eIndireta, segundo observações empíricas que decorrem de estatísticas do Ministério doTrabalho. Muito há de se fazer, até mesmo aperfeiçoarem-se os métodos estatísticos deavaliação, pois há pessoas com deficiência em demasia que ainda não tiveram chancesreais e isso deve ser superado.

Os efeitos da 8ª Convenção Internacional da ONU e o acessoao mercado de trabalho para as pessoas com deficiência

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Inclusão social da pessoa com deficiência: uma questão de políticasInclusão social da pessoa com deficiência: uma questão de políticasInclusão social da pessoa com deficiência: uma questão de políticasInclusão social da pessoa com deficiência: uma questão de políticasInclusão social da pessoa com deficiência: uma questão de políticaspúblicaspúblicaspúblicaspúblicaspúblicas

Martinha Clarete Dutra1

[email protected]

Políticas públicas são ações governamentais que visam à resolução de problemascoletivos. Conforme Azanha (1998, p.102), um “problema nacional”, como problemagovernamental, só existe a partir de uma percepção coletiva. O autor lembra que aconsciência não cria a realidade, mas essa pode ser determinante para gerar pressãosocial, que, por sua vez, pode, a partir da concepção coletiva, transformar um fato emum problema de governo.

Ser caracterizado como um problema governamental é pressuposto primordialpara desencadear o processo de definição e elaboração de uma política.

Esse processo deve transpor o espaço restrito dos gabinetes tanto do executivo,quanto do legislativo. Os segmentos sociais interessados devem atuar, diretamente, naconstrução desse novo paradigma.

Quando o tema em pauta é a inclusão social da pessoa com deficiência, não sepode negar o longo período de segregação social vivido por tais pessoas.

Para pessoas com deficiência, a conquista de direitos vem ocorrendo por meio daorganização social, pelo fim da tutela e pelo protagonismo histórico de cada um de nós,fortalecido pelo movimento de controle social das políticas públicas.

Como “as definições são sempre encarnadas, isto é, indivíduos concretos e gruposde indivíduos servem como definidores da realidade [...] é preciso entender a organizaçãosocial que permite aos definidores fazerem suas definições” (BERGER; LUCKMAN, 1990,p. 157).

Nesse sentido, vivemos um momento histórico fecundo. Percebe-se uma tomadade posição da sociedade civil que, ao rever o conceito de democracia participativa,estabelece diálogo franco com o poder público na tentativade construir juntos açõescapazes de gerar autonomia e sepultar a concepção de que toda pessoa com deficiênciadeve ser tutelada por profissionais, amigos e familiares.

Nessa esteira, surgem os Conselhos de defesa de direitos da pessoa com deficiênciana década de 1990.

1 Mestre em Políticas de Educação. Universidade Norte do Paraná (Unopar).

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A maior responsabilidade de tais órgãos concentra-se no poder de mobilizaçãosocial no momento de definição, elaboração e controle social das políticas públicas deatenção ao segmento da população que representa.

Por sua vez, os gestores públicos, ao estabelecer comunicação direta com asociedade civil, desenvolvem um novo aprendizado, inédito em nossa cultura. “Nadasobre nós, sem nós”. Ao definir uma política relativa à pessoa com deficiência, caberá aosetor competente, debater com os segmentos interessados as principais diretrizes da ação.A partir desse debate, de forma conjunta, dar-se-á a elaboração da política.

A mudança de paradigma, tratando-se da pessoa com deficiência, reside no fatode que tais pessoas foram, historicamente, consideradas incapazes para tomar quaisquerdecisões em sua vida. Como estarão habilitadas a se tornar definidoras e agentes decontrole de políticas públicas?

Sem esse pedagógico movimento, não haverá legitimidade na ação. Toda políticapública deve ter por princípio o desenvolvimento da autonomia, independência,emancipação das pessoas com deficiência. Esse é o tripé em que os conselhos de direitosda pessoa com deficiência vêm se consolidando.

Os conselhos são mecanismos de defesa de direitos e promoção da cidadania.Órgãos, fundamentalmente, responsáveis pela articulação desse segmento social,

tanto no momento de definição e elaboração de políticas, quanto no exercício efetivodo controle social dessas medidas.

Por isso, a importância de ser paritário e representativo.Preferencialmente, à pessoa com deficiência, caberá o protagonismo do processo

de discussão das políticas relativas a essa população.Conselho é uma instância superior de deliberação colegiada, de natureza

permanente.Seu primordial objetivo é assegurar às pessoas com deficiência o pleno exercício

dos direitos individuais e sociais.Suas principais atribuições e competências são: propor, acompanhar e avaliar as

políticas relativas aos direitos da pessoa com deficiência, com capacidade de interiorizaçãodas ações, dispondo de autonomia administrativa e financeira; acompanhar e avaliar osplanos, programas e projetos da política municipal, estadual e nacional para inclusão dapessoa com deficiência e propor as providências necessárias à sua completa implantaçãoe ao seu adequado desenvolvimento, até mesmo as pertinentes a recursos financeiros eas de caráter legislativo; acompanhar o planejamento e avaliar a execução das políticasmunicipais, estaduais e municipais da acessibilidade à educação, saúde, trabalho,assistência social, transporte, cultura, turismo, desporto, lazer, urbanismo e outras relativasà pessoa com deficiência; acompanhar a elaboração e a execução da propostaorçamentária da esfera de governo a que se vincula, sugerindo as modificações necessáriasà consecução das políticas para inclusão da pessoa com deficiência; zelar pela efetivaçãodo sistema descentralizado e participativo de defesa dos direitos da pessoa com

Inclusão social da pessoa com deficiência: uma questão depolíticas públicas

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deficiência; propor a elaboração de estudos e pesquisas que visem à melhoria daqualidade de vida da pessoa com deficiência; propor e incentivar a realização decampanhas que visem à prevenção de deficiências e à promoção dos direitos da pessoacom deficiência; acompanhar, mediante relatórios de gestão, o desempenho dosprogramas e projetos da política municipal, estadual ou nacional para inclusão da pessoacom deficiência; manifestar-se, de acordo com os limites de sua atuação, acerca daadministração e condução de trabalhos de prevenção, habilitação, reabilitação e inclusãosocial de entidade particular ou pública, quando houver notícia de irregularidade,expedindo, quando entender cabível, recomendação ao representante legal da entidade;avaliar anualmente o desenvolvimento da política Estadual/Municipal/Nacional deatendimento especializado à pessoa com deficiência de acordo com a legislação emvigor, visando à sua plena adequação. Desse modo, todos os municípios e Estadosbrasileiros devem constituir um Conselho de direitos da pessoa com deficiência,interlocutores legítimos entre a sociedade civil e o poder público.

A construção de uma sociedade para todos deve ser feita a várias mãos, de formaparticipativa e compartilhada.

“O êxito consiste em ter êxito. Não em ter situação de êxito. Condição de paláciotoda terra larga tem. Mas, onde estará o palácio se não o construirmos?” Fernando Pessoa.

ReferênciasReferênciasReferênciasReferênciasReferências

AZANHA, José Mario. Planos e políticas de educação no Brasil: alguns pontos parareflexão. In: MENESES, J. G de C.; BARROS, R. S. M.; NUNES, R. A. C. Estrutura eEstrutura eEstrutura eEstrutura eEstrutura efuncionamento da educação básicafuncionamento da educação básicafuncionamento da educação básicafuncionamento da educação básicafuncionamento da educação básica: leituras. 2. ed. São Paulo: Thomson, 1998.

BERGER, Peter L.; LUCKAMNN, Thomas. A construção social da realidadeA construção social da realidadeA construção social da realidadeA construção social da realidadeA construção social da realidade: tratado deSociologia do conhecimento. 8. ed. Petrópolis: Vozes, 1990.

COHEN, E; FRANCO, R. AAAAAvaliação de projetos sociaisvaliação de projetos sociaisvaliação de projetos sociaisvaliação de projetos sociaisvaliação de projetos sociais. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 2004.

JÖNSSON, T. Inclusive educationInclusive educationInclusive educationInclusive educationInclusive education. Hyderabad: UN Interregional Programme for DisabledPeople, [s.l.] 1994. 160 p.

SASSAKI, Romeu Kassumi. InclusãoInclusãoInclusãoInclusãoInclusão: construindo uma sociedade para todos. Rio deJaneiro: WVA, 1997.

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A produção discente do grupo de pesquisa Inclusão/Exclusão EscolarA produção discente do grupo de pesquisa Inclusão/Exclusão EscolarA produção discente do grupo de pesquisa Inclusão/Exclusão EscolarA produção discente do grupo de pesquisa Inclusão/Exclusão EscolarA produção discente do grupo de pesquisa Inclusão/Exclusão Escolare Desigualdades Sociaise Desigualdades Sociaise Desigualdades Sociaise Desigualdades Sociaise Desigualdades Sociais

José Geraldo Silveira Bueno1

[email protected]

1 Introdução1 Introdução1 Introdução1 Introdução1 Introdução

Queria agradecer ao honroso convite para participar do IV Seminário Nacionalde Formação de Gestores e Educadores, organizado pela Secretaria de EducaçãoEspecial do MEC, evento muito significativo para os rumos das políticas educacionaise, ao mesmo tempo, desculpar-me diante desse público por não ter para relatarnenhuma experiência de êxito de inclusão escolar, que constitui o grande eixo desseencontro.

E não a tenho exatamente porque já faz muitos anos que não estou mais na linhade frente da educação, pois desde 1993 concentrei toda a minha energia na formaçãode mestres e doutores do Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: História,Política, Sociedade, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

Como não tinha para relatar qualquer experiência desse tipo, pensei inicialmenteem declinar do convite, não por qualquer desconsideração sobre a importância do evento,mas porque não tinha praticamente nada a apresentar para o público que presumiacompor o encontro e, portanto, frustrar as expectativas tanto de seus organizadores quantodos participantes.

Entretanto, na perspectiva de evitar a ampliação de um fosso que já existe entre aprodução acadêmica e a realidade educacional, resolvi aceitar o convite e apresentaraos senhores o que temos produzido de investigações envolvendo a relação entreprocessos de escolarização e deficiências/necessidades educacionais especiais, esperando,de alguma forma, que ele possa oferecer alguma contribuição para os presentes.

Nesse sentido, dividi minha apresentação em dois tópicos: o primeiro procuraexplicitar como o grupo de pesquisa que coordeno na PUC/SP se organizou e queperspectiva de investigação o norteia; o segundo tópico apresenta um balanço inicialdas dissertações e teses produzidas por mestrandos e doutorandos incorporados a ele.

1 Doutor em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Atualmente é professor titular da PUC/São Paulo,no Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: História, Política, Sociedade.

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2 O Grupo de Pesquisa Inclusão/exclusão escolar e processos de escolarização2 O Grupo de Pesquisa Inclusão/exclusão escolar e processos de escolarização2 O Grupo de Pesquisa Inclusão/exclusão escolar e processos de escolarização2 O Grupo de Pesquisa Inclusão/exclusão escolar e processos de escolarização2 O Grupo de Pesquisa Inclusão/exclusão escolar e processos de escolarização

Desde a última reformulação do Programa realizada em 1997, a sua organizaçãoacadêmica tem se pautado pela centralização de professores, alunos e colaboradoresexternos em grupos de pesquisa cuja característica comum reside no fato de seremrelativamente largos em termos de seu escopo, mas com foco em determinadas temáticascomuns a todos os seus membros.

Assim, desde 1997, mas com iniciativas precursoras desde 1993 (quando iniciamoso processo de reformulação acadêmica que redundou as nova estrutura a partir de1997), um conjunto de quatro professores desenvolveu estudos e pesquisas ao abrigode amplo grupo de pesquisa denominado “Escola: entre saberes, professores e alunos”,norteados por eixo que persegue as relações entre escola e cultura, com aporteprivilegiado das Ciências Sociais, especialmente das vertentes críticas da sociologia daeducação.

Com o desenvolvimento de estudos sob esse amplo espectro, fomos nosaproximando gradativamente de focos mais precisos, à busca de aprofundamentosespecíficos em estudos mais delimitados. Tudo isso redundou, em 2006, em umdesmembramento do amplo projeto em três outros, com menor escopo, mas com maiorconcentração temática.

É nessa direção que o grupo denominado “Inclusão/exclusão escolar e desigualdadessociais” foi criado, tendo por finalidade incorporar professores, alunos e pesquisadoresvoltados a estudos e investigações sobre os processos de inclusão e exclusão escolar,com base em referências teóricas da sociologia da educação, tais como Bourdieu (1982,1998, 2004), Charlot (1996, 2000, 2001), Lahire (1997, 2002) Enguita (1998), Paugam(1996), Nogueira, Romanelli e Zago (2003).

Nosso intuito é de que os estudos nele realizados possam contribuir como referênciapara análises dos processos de escolarização, tanto no que se refere ao seu caráter deseleção e classificação social, quanto o de promotor de possibilidades de acesso aosbens culturais necessários à inserção social.

É essa face dupla do caráter da escola brasileira, especialmente da escola básica,que tem constituído nossas duas frentes para estudos e investigações:

- processos de escolarização e seletividade escolar; e- políticas e práticas de inclusão escolar.De acordo com esse escopo, têm recebido atenção especial as políticas e práticas

de escolarização de crianças com deficiências e/ou necessidades educacionais especiais,por entendermos que elas constituem uma das expressões, muito peculiar, dessacontradição entre a democratização do acesso e permanência e os processos de seleçãoe de exclusão de alunos na escola brasileira.

Para tanto, além de estudos e pesquisas desenvolvidos pelos docentes epesquisadores participantes do grupo, temos produzido um número relativamente

A produção discente do grupo de pesquisa Inclusão/ExclusãoEscolar e Desigualdades Sociais

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significativo de dissertações de mestrado e teses de doutorado sobre a relação entredeficiência/necessidades educacionais especiais e processos de escolarização.

Para esse evento, vou realizar pequeno e preliminar balanço sobre as tendênciasda nossa produção discente por considerar que ela é a expressão mais evidente doscaminhos que estamos procurando construir em nossas trajetórias de investigação.

Assim, apresento em seguida um pequeno balanço dessa produção, englobandoas dissertações e teses defendidas e em andamento, no período entre 1996 e 2007, pormeio dos seguintes indicadores:

- distribuição entre dissertações de mestrado e tese de doutorado;- distribuição anual;- distribuição por orientador;- distribuição por tema específico; e- distribuição por tipo de deficiência/necessidades educacionais especiais.

3 As tendências da produção discente do Programa3 As tendências da produção discente do Programa3 As tendências da produção discente do Programa3 As tendências da produção discente do Programa3 As tendências da produção discente do Programa

A distribuição entre a dissertações e teses do programa que se voltam para a análisede relação entre deficiência/necessidades educacionais especiais estão apresentadas naTabela 1.

Tabela 1Dissertações e teses sobre processos de escolarização e deficiênfia/necessidades

educacionais especiais defendidas e em andamentoPEPG em EHPS-PUC/SP (1996/2007)

Pelos dados apresentados, pode-se verificar que, apesar do maior número dedissertações de mestrado, a quantidade de teses de doutorado é significativa, ainda maisse considerarmos que o prazo para defesa dessa última (4 anos) é muito superior ao dasdissertações (2,5 anos, no máximo).

Dados autor, 2007.

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Além disso, pode-se observar, também, que a tendência parece ser de manutenção deteses envolvendo a escolarização de alunos com deficiência/necessidade educacional especial,pois o número de produções em andamento no presente ano sinaliza para isso (4 produções).2

A Tabela 2 apresenta a distribuição anual dessa produção.

Tabela 2Distribuição anual das dissertações e teses de educação especial

PEPG em EHPS-PUC/SP (1996/2007)

(*) Quatro dessas cinco produções estão em andamento com previsão de defesa até 09/07.

O fato de não ter ocorrido defesas de teses doutorado e de dissertações de mestradoentre os anos de 1997 e 2000 pode ser explicado pela pouca divulgação do abrigo deorientações voltadas à educação especial, visto que o Programa não possui uma linhaespecífica sobre esse campo, mas procura incorporá-lo no conjunto de grupos e linhasde pesquisa que desenvolve.

Tanto no mestrado quanto no doutorado, a distribuição é relativamente equilibra-da entre os anos que compõem o período, mas a do doutorado é um pouco mais evi-dente, uma vez que no primeiro ela oscila entre nenhuma e quatro produções anuais,enquanto que no segundo varia entre uma e três produções anuais.

Apesar de em alguns anos não ocorrer defesas de mestrado (2001 e 2002) ou dedoutorado (1996 e 2002), verifica-se que, em termos globais, não existe um ano que nãotenha havido uma defesa, pelo menos, de tese ou de dissertação.

A distribuição das produções por orientador está apresentada na Tabela 3.

2 Nesse trabalho, estão as dissertações e teses defendidas e aquelas com previsão de defesa até o fim do presente ano, emboraexistam algumas em andamento cuja previsão de defesa ultrapassam esse limite. Como não existe garantia total de que todosos alunos cheguem a termo, resolvi não incluí-las.

A produção discente do grupo de pesquisa Inclusão/ExclusãoEscolar e Desigualdades Sociais

Dados autor, 2007.

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Tabela 3Distribuição por orientador das dissertações e teses de educação especial

PEPG em EHPS-PUC/SP (1996/2007)

A grande concentração de orientações em um professor explica-se pela sua trajetó-ria pregressa no campo da educação especial, mas o mais significativo é o fato de queprofessores não oriundos dessa área passarem a incorporar alunos com interesse nessetema, exatamente por integrarem o grupo de pesquisa e por participarem ativamente deinterlocução qualificada dentro do próprio grupo.

É interessante destacar, também, que, das quatro produções orientadas por pesqui-sadores que não são especialistas da educação especial, três delas são teses de doutorado,em razão da vasta experiência e renomada competência dos professores envolvidos.

Na Tabela 4, encontramos os dados sobre os temas das dissertações e teses.

Tabela 4Dissertações e teses por temas de pesquisa PEPG em EHPS-PUC/SP (1996/2007)

Dados autor, 2007.

Dados autor, 2007.

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Dois campos temáticos foram os mais incidentes (trajetórias escolares e práticaspedagógicas), somando mais de 62% de toda a produção, enquanto os demais forambem menos aquinhoados.

Isso revela a ênfase que o grupo de pesquisa tem dado a análises das práticas peda-gógicas envolvendo alunos com deficiência/necessidades educacionais especiais desen-volvidas em escolas, bem como tem procurado avaliar concretamente os resultados daescolarização a que esses alunos foram submetidos, por meio de suas trajetórias deescolarização.

Cabe ressaltar, no entanto que, enquanto houve uma distribuição equâmine entreas dissertações e teses que trataram das trajetórias escolares, com relação às práticaspedagógicas, o número de dissertações foi bem superior ao de teses.

Sobre os demais temas específicos, é interessante verificar que houve uma distri-buição bastante equilibrada entre dissertações e teses, mas é digno de nota indicar que,com relação ao tema formação docente, não houve nenhuma dissertação defendida,mas apenas uma tese de doutorado.

Os dados sobre o tipo de deficiência/necessidades educacionais especiais aborda-do por essa produção estão contidos na Tabela 5.

Tabela 5Dissertações e teses por tipos de deficiência/necessidades educacionais especiais

PEPG em EHPS-PUC/SP (1996/2007)

Verifica-se, em primeiro lugar, que as maiores incidências residem em produçõesque trataram a questão de duas formas: não especificando o tipo de deficiência ou en-globando diversos tipos, e que foram aqui caracterizadas pela denominação “geral”.

Além dessas, dois tipos de deficiência mereceram mais atenção: a deficiência men-tal e a auditiva, também com sete produções cada.

A produção discente do grupo de pesquisa Inclusão/ExclusãoEscolar e Desigualdades Sociais

Dados autor, 2007.

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IV Seminário Nacional de Formação de Gestores e Educadores

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As demais deficiências/necessidades educacionais especiais foram muito poucoinvestigadas (uma produção cada), cabendo ressaltar o fato de que o campo da "altashabilidades" foi o único, entre os três, que foi objeto de tese de doutorado.

Além disso, enquanto as produções e teses sobre as deficiências mental e auditivativeram uma distribuição relativamente equilibrada, na categoria "geral" houve umamaior incidência de dissertações de mestrado.

Esse foi o pequeno balanço sobre a produção docente do Programa com foco na rela-ção entre processos de escolarização e deficiência/necessidades educativas especiais e quemostram as principais tendências de nossos estudos que podem ser assim sintetizadas:

- distribuição relativamente equilibrada tanto em relação às dissertações e teses,quando aos anos de defesa;

- grande concentração em um orientador, com participação bem menor dos de-mais envolvidos no grupo;

- privilegiamento das trajetórias escolares e práticas pedagógicas como temas es-pecíficos das investigações; e

- concentração em investigações que tratam das deficiências/necessidades edu-cacionais especiais em geral, bem como da deficiência mental e auditiva e pou-ca ênfase em estudos sobre a deficiência visual, física e altas habilidades.

Com essa apresentação, espero ter dado um breve panorama sobre as nossas traje-tórias de investigação e que não pretendem ser a única possível nem a mais qualificada,mas apenas uma das possibilidades no campo da pesquisa educacional, que, a nossojuízo, deve ser plural e diversificada.

A fim de oferecer indicações que possam ser de algum interesse aos participantes,apresentamos a bibliografia que tem sido mais utilizada por nosso Grupo, bem como orol de dissertações e teses produzidas e em andamento.

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ANEXOANEXOANEXOANEXOANEXO

ROL DAS DISSERTROL DAS DISSERTROL DAS DISSERTROL DAS DISSERTROL DAS DISSERTAÇÕES E TESES DEFENDIDAS E EM ANDAMENTAÇÕES E TESES DEFENDIDAS E EM ANDAMENTAÇÕES E TESES DEFENDIDAS E EM ANDAMENTAÇÕES E TESES DEFENDIDAS E EM ANDAMENTAÇÕES E TESES DEFENDIDAS E EM ANDAMENTOOOOO1996/20071996/20071996/20071996/20071996/2007

ConcluídasConcluídasConcluídasConcluídasConcluídas

Dissertações de MestradoDissertações de MestradoDissertações de MestradoDissertações de MestradoDissertações de Mestrado

CUKIERKORN, Mônica Moreira de Oliveira Braga. A escolaridade especial do deficienteA escolaridade especial do deficienteA escolaridade especial do deficienteA escolaridade especial do deficienteA escolaridade especial do deficienteauditivoauditivoauditivoauditivoauditivo: estudo crítico sobre os procedimentos didáticos especiais. Ano de defesa: 1996.Orientador: Jose Geraldo Silveira Bueno.

SILVA, Fabiany de Cássia Tavares. O jogo como procedimento didático no ensino doO jogo como procedimento didático no ensino doO jogo como procedimento didático no ensino doO jogo como procedimento didático no ensino doO jogo como procedimento didático no ensino dodeficiente mentaldeficiente mentaldeficiente mentaldeficiente mentaldeficiente mental. Ano de defesa: 1996. Orientador: Jose Geraldo Silveira Bueno.

MARTINS, José Luiz Germano. Educação inclusiva:Educação inclusiva:Educação inclusiva:Educação inclusiva:Educação inclusiva: formação de grupamentos afetivos,intelectuais e recreativos entre deficiente mental incluído em escola regular e seu grupode pares. Ano de Defesa: 2007. Orientador: José Geraldo Silveira Bueno.

SANTOS, Roseli Albino dos. A trajetória escolar de alunos atendidos em classes especiaisA trajetória escolar de alunos atendidos em classes especiaisA trajetória escolar de alunos atendidos em classes especiaisA trajetória escolar de alunos atendidos em classes especiaisA trajetória escolar de alunos atendidos em classes especiaisda rede estadual paulistada rede estadual paulistada rede estadual paulistada rede estadual paulistada rede estadual paulista. Ano de defesa: 2002. Orientador: Jose Geraldo Silveira Bueno.

MOREIRA, Cláudia da Silva Moreira. A trajetória escolar de portadores de deficiênciaA trajetória escolar de portadores de deficiênciaA trajetória escolar de portadores de deficiênciaA trajetória escolar de portadores de deficiênciaA trajetória escolar de portadores de deficiênciavisual no ensino regularvisual no ensino regularvisual no ensino regularvisual no ensino regularvisual no ensino regular, atendidos em sala de recursos, atendidos em sala de recursos, atendidos em sala de recursos, atendidos em sala de recursos, atendidos em sala de recursos. Ano de defesa: 2002. Orientador:Jose Geraldo Silveira Bueno.

SANTOS, Wanderley José Pereira dos. Do ensino médio à universidadeDo ensino médio à universidadeDo ensino médio à universidadeDo ensino médio à universidadeDo ensino médio à universidade: a trajetória dealunos surdos formados em escola especial. Ano de defesa: 2002. Orientador: Jose Ge-raldo Silveira Bueno.

ILLIANO, Fernanda Cortez. TTTTTrajetória curricular de uma escola de surdosrajetória curricular de uma escola de surdosrajetória curricular de uma escola de surdosrajetória curricular de uma escola de surdosrajetória curricular de uma escola de surdos: entre a esco-la regular e as demandas do alunado. Ano de defesa: 2002. Orientador: Jose GeraldoSilveira Bueno.

XAVIER, Alexandre Guedes Pereira. Ano de defesa: 2004. Deficiência e trabalhoDeficiência e trabalhoDeficiência e trabalhoDeficiência e trabalhoDeficiência e trabalho: umaanatomia política. Orientador: Jose Geraldo Silveira Bueno.

SIQUEIRA, Benigna Alves. A inclusão de crianças deficientes no ensino regularA inclusão de crianças deficientes no ensino regularA inclusão de crianças deficientes no ensino regularA inclusão de crianças deficientes no ensino regularA inclusão de crianças deficientes no ensino regular: limitese possibilidades de participação em sala de aula. Ano de defesa: 2004. Orientador: JoseGeraldo Silveira Bueno.

A produção discente do grupo de pesquisa Inclusão/ExclusãoEscolar e Desigualdades Sociais

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SOUZA, Alberto Alves de. A progressão escolar de alunos deficientes em classes co-A progressão escolar de alunos deficientes em classes co-A progressão escolar de alunos deficientes em classes co-A progressão escolar de alunos deficientes em classes co-A progressão escolar de alunos deficientes em classes co-munsmunsmunsmunsmuns. Ano de defesa: 2005. Orientador: Marcos Cezar de Freitas.

VIANA, Edson Alves. A trajetória de escolarização e acesso à profissão docente de pro-A trajetória de escolarização e acesso à profissão docente de pro-A trajetória de escolarização e acesso à profissão docente de pro-A trajetória de escolarização e acesso à profissão docente de pro-A trajetória de escolarização e acesso à profissão docente de pro-fessores deficientes no ensino público de São Paulofessores deficientes no ensino público de São Paulofessores deficientes no ensino público de São Paulofessores deficientes no ensino público de São Paulofessores deficientes no ensino público de São Paulo. Ano de defesa: 2006. Orientador:José Geraldo Silveira Bueno.

DANTAS, Mauriza de Moura. Surdos. Práticas cotidianas de ensino da língua escrita emSurdos. Práticas cotidianas de ensino da língua escrita emSurdos. Práticas cotidianas de ensino da língua escrita emSurdos. Práticas cotidianas de ensino da língua escrita emSurdos. Práticas cotidianas de ensino da língua escrita emclasse especial para surdosclasse especial para surdosclasse especial para surdosclasse especial para surdosclasse especial para surdos. Ano de defesa: 2006. Orientador: José Geraldo Silveira Bueno.

TTTTTeses de Doutoradoeses de Doutoradoeses de Doutoradoeses de Doutoradoeses de Doutorado

DELOU, Cristina Maria Carvalho. Sucesso e fracasso escolar de alunos consideradosSucesso e fracasso escolar de alunos consideradosSucesso e fracasso escolar de alunos consideradosSucesso e fracasso escolar de alunos consideradosSucesso e fracasso escolar de alunos consideradossuperdotadossuperdotadossuperdotadossuperdotadossuperdotados: um estudo sobre a trajetória escolar de alunos que receberam atendi-mento em salas de recursos de escolas da rede pública de ensino. Ano de defesa: 2001.Orientador: Jose Geraldo Silveira Bueno

SILVA, Fabiany de Cássia Tavares. As relações entre ensino, aprendizagem e deficiência men-As relações entre ensino, aprendizagem e deficiência men-As relações entre ensino, aprendizagem e deficiência men-As relações entre ensino, aprendizagem e deficiência men-As relações entre ensino, aprendizagem e deficiência men-taltaltaltaltal: desenhando a cultura escolar. Ano de defesa: 2003. Orientador: Alda Junqueira Marin.

MICHELS, Maria Helena. A formação de professores de educação especial na UFSCA formação de professores de educação especial na UFSCA formação de professores de educação especial na UFSCA formação de professores de educação especial na UFSCA formação de professores de educação especial na UFSC(1998-2001)(1998-2001)(1998-2001)(1998-2001)(1998-2001): ambigüidades estruturais e a reiteração do modelo médico-psicológico.Ano de defesa: 2004. Orientador: Jose Geraldo Silveira Bueno.

LUNARDI, Geovana Maria. Nas trilhas da exclusãoNas trilhas da exclusãoNas trilhas da exclusãoNas trilhas da exclusãoNas trilhas da exclusão: as práticas curriculares da escola noatendimento às diferenças dos alunos. Ano de defesa: 2005. I: Maria das Mercês FerreiraSampaio.

OLIVEIRA, Mércia Aparecida da Cunha. Práticas de professores em salas de aula comPráticas de professores em salas de aula comPráticas de professores em salas de aula comPráticas de professores em salas de aula comPráticas de professores em salas de aula comalunos incluídosalunos incluídosalunos incluídosalunos incluídosalunos incluídos. Ano de defesa: 2005. Orientador: Alda Junqueira Marin.

CUKIERKORN, Mônica Moreira de Oliveira Braga. As trajetórias escolares de deficien-As trajetórias escolares de deficien-As trajetórias escolares de deficien-As trajetórias escolares de deficien-As trajetórias escolares de deficien-tes auditivos na rede pública municipal de São Paulotes auditivos na rede pública municipal de São Paulotes auditivos na rede pública municipal de São Paulotes auditivos na rede pública municipal de São Paulotes auditivos na rede pública municipal de São Paulo. Ano de defesa: 2005. Orientador:Jose Geraldo Silveira Bueno.

DALLABRIDA, Adarzilse Mazzuco. As famílias com filhos deficientes e a escolha daAs famílias com filhos deficientes e a escolha daAs famílias com filhos deficientes e a escolha daAs famílias com filhos deficientes e a escolha daAs famílias com filhos deficientes e a escolha daescolaescolaescolaescolaescola: o caso do Colégio Coração de Jesus. Ano de defesa: 2006. Orientador: Jose Ge-raldo Silveira Bueno.

SANTOS, Roseli Albino dos. Processos de escolarização e deficiênciaProcessos de escolarização e deficiênciaProcessos de escolarização e deficiênciaProcessos de escolarização e deficiênciaProcessos de escolarização e deficiência: trajetórias escola-res singulares de ex-alunos de classe especial para deficientes mentais. Ano de defesa:2006. Orientador: Jose Geraldo Silveira Bueno.

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Em andamentoEm andamentoEm andamentoEm andamentoEm andamento

Dissertações de MestradoDissertações de MestradoDissertações de MestradoDissertações de MestradoDissertações de Mestrado

CHAMBAL, Luís Alfredo. Os processos de escolarização dos alunos com necessidadesOs processos de escolarização dos alunos com necessidadesOs processos de escolarização dos alunos com necessidadesOs processos de escolarização dos alunos com necessidadesOs processos de escolarização dos alunos com necessidadeseducativas especiais em Moçambiqueeducativas especiais em Moçambiqueeducativas especiais em Moçambiqueeducativas especiais em Moçambiqueeducativas especiais em Moçambique. Ano de defesa: 2007. Orientador: José GeraldoSilveira Bueno

LYKOROPOULOS. Cristiana BeatriceCristiana BeatriceCristiana BeatriceCristiana BeatriceCristiana Beatrice. Inclusão escolar de alunos deficientes: da implan-tação das políticas à realização pelas escolas. Previsão de defesa: 2007. Orientador: JoséGeraldo Silveira Bueno

PASSOS. Viviane Saladino. A expectativa de mães de crianças com paralisia cerebralA expectativa de mães de crianças com paralisia cerebralA expectativa de mães de crianças com paralisia cerebralA expectativa de mães de crianças com paralisia cerebralA expectativa de mães de crianças com paralisia cerebralgrave frente à escolarizaçãograve frente à escolarizaçãograve frente à escolarizaçãograve frente à escolarizaçãograve frente à escolarização. Previsão de defesa: 2007. Orientador: José Geraldo SilveiraBueno

TTTTTese de Doutoradoese de Doutoradoese de Doutoradoese de Doutoradoese de Doutorado

MENDONÇA, Suelene Regina Donola. TTTTTrajetórias escolares e sociais de alunos surdos:rajetórias escolares e sociais de alunos surdos:rajetórias escolares e sociais de alunos surdos:rajetórias escolares e sociais de alunos surdos:rajetórias escolares e sociais de alunos surdos:entre as marcas da deficiência e a origem social. Previsão de defesa: 2007. Orientador:José Geraldo Silveira Bueno

A produção discente do grupo de pesquisa Inclusão/ExclusãoEscolar e Desigualdades Sociais

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O papel da universidade diante da inclusãoO papel da universidade diante da inclusãoO papel da universidade diante da inclusãoO papel da universidade diante da inclusãoO papel da universidade diante da inclusão

Dulce Barros de Almeida1

[email protected]

A universidade brasileira, apesar de todas as reformas e avanços alcançados aolongo de sua história, ainda tem sido marcada pela exclusão de alunos que não satisfazemàs suas exigências e, por conseguinte, alunos com algum tipo de deficiência ou acometidopor alguma síndrome.

A reforma da universidade em qualquer época tem sido um evento co-naturalà essência de uma instituição que necessita sobreviver às contradições doavanço das forças produtivas e das novas relações sociais e de trabalho(SGUISSARD, 2004, p. 648).

As justificativas, que camuflam a realidade, têm como foco mais a pessoa que aprópria universidade que foi construída e concebida em um modelo elitista em ummomento histórico em que poucos tinham acesso ou mesmo possibilidades deadentrá-la, haja vista a sociedade vigente e, conseqüentemente, a formação inadequadaou inexistente proporcionada às camadas menos favorecidas, incluindo nessa categoria,as pessoas com deficiência.

Ressalta-se ainda que, se houve uma expansão considerável da oferta de educaçãosuperior no Brasil nos últimos 40 anos, isso deve-se basicamente à proliferação dasinstituições privadas que, com algumas exceções, conseguiram reverter o sentido do bempúblico para o sentido do bem rentável.

Houve, considerando que a partir da década de 1990 e início do atual século, amassificação das universidades ocasionada, sobretudo pela expansão dessas instituiçõesprivadas de ensino superior, não se pode afirmar que houve a democratização de acesso.Para Peixoto (2006, p. 6), “A democratização ocorre quando há ampliação do acesso,mas com as condições para um funcionamento que garante a qualidade.”

Nessa linha de pensamento, recorremos à Boaventura Souza Santos ao afirmar que:

1 Doutora em Educação pela Universidade Estadual de Campinas. Atualmente é professora adjunta da Faculdade de Educaçãoda Universidade Federal de Goiás, tanto na graduação quanto no Programa de Pós-Graduação

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Em vez de democratização, houve a massificação e depois, já no período pós-massificação, uma forte segmentação do ensino superior com práticas de autênticodumping social de diplomas, sem que nenhuma medida eficaz tenha sido tomada(SANTOS, 2004, p. 67).

Entretanto, não obstante às reformas e à expansão, por quais passaram asuniversidades em razão de exigências econômicas, não se pode deixar de cobrar doEstado o seu papel de mantenedor responsável por uma política na qual a universidadecontinue sendo considerada um bem público e direito de cidadania, pois é ele (Estado)o maior responsável no que se refere à sua oferta e subvenção.

No presente trabalho, concebe-se como universidade, de responsabilidadedo Estado, aquela instituição que por ser realidade histórica e social, compreende oseu espaço enquanto lócus de resistência diante de modelos impostos, senteconstantemente desafiada a cumprir o seu papel em uma sociedade que se querdemocratizar e, portanto, ao mesmo tempo em que preserva e socializa, produzconhecimento e cria cultura.

Em que mudamos? Até que ponto pode-se afirmar que a universidade, hoje, comobem público e espaço de produção e construção do conhecimento, tem sido aberta atodos que dela necessitam? E, se há limitações nesse sentido, como fica a formação inicialdas pessoas que se sentem excluídas no que diz respeito, principalmente, à participaçãono desenvolvimento sustentável do país?

Se a própria universidade (mesmo em se tratando de instituição privada)contribui com a banalização do processo de formação do docente e do pesquisadorao privilegiar o lucro financeiro determinado pelo mercado (mercantilização doconhecimento) em detrimento a uma formação sólida que prima pela produção dosaber, sem levar em consideração o seu papel no que diz respeito à transformaçãosocial, no entendimento de uma parcela considerável de docentes, tal como na dofilósofo Adão Peixoto vinculado à Faculdade de Educação da Universidade Federal deGoiás (FE/UFG):

A universidade só se constitui enquanto tal se submeter constantemente seufazer ao crivo da reflexão, da crítica, da dúvida, para repensar, avaliar,experimentar e transformar sua ação com vistas a aperfeiçoar suas atividades ea contribuir para a construção de uma sociedade mais solidária (PEIXOTO,2006, p. 8).

E quanto aos professores universitários, vinculados à educação, como contribuircom a reversão de um modelo de universidade excludente, ainda que seja parte dele?Enfim, não se pode entender que a exclusão social, naturalizada no País, é de

O papel da universidade diante da inclusão

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responsabilidade apenas da universidade, entretanto há de se reconhecer a sua co-participação em todo esse processo excludente, pois como instituição social, agregadaao modelo vigente, há limitações quanto à democratização de acesso.

Segundo Boaventura Souza Santos citado por Pires (2004), para reconquistar alegitimidade perdida, a universidade pública terá de reforçar sua responsabilidade social,estabelecer um relacionamento sinergético com a escola pública, melhorar as condiçõesde acesso, dar maior atenção à extensão, aprender a atuar em rede, adotar procedimentosparticipativos de avaliação e rever mecanismos internos e externos de democratização,entre outros.

Assim, apesar de não haver desconhecimento das iniciativas do atual governona questão da ampliação e democratização do acesso à universidade, que até entãofoi reduzido e elitizado, na tentativa de se mudar o perfil do aluno ingressante, sejapor meio da introdução do Programa de Quotas ou do Programa Universidade paraTodos (Prouni), cada instituto que compõe o eixo universitário tem sua parcela deresponsabilidade de se tentar reverter o quadro atual, sobretudo as Faculdades deEducação (FE) que se constituem em foco de formação docente das universidadesbrasileiras.

Concordamos com o Professor Benno Sander (2007, p. 1), Presidente da AssociaçãoNacional de Política e Administração da Educação (Anpae), ao afirmar que

A formação dos profissionais da educação é tarefa primordial da universidade ede suas faculdades e centros de educação e cursos de licenciatura. Estreitamenteassociada à docência universitária está a pesquisa científica, protogonizada pelosprogramas de pós-graduação e voltada para a construção e difusão do conheci-mento em matéria de políticas públicas e gestão da educação.

Assim, institucionalmente, cabe a todos os educadores, a partir da construção doProjeto Político Pedagógico (PPP) da instituição a que pertence, a reflexão quanto à políticade combate à exclusão implementada e o que tem sido oferecido de oportunidadespara que todas as pessoas possam usufruir dos seus direitos e assim se constituírem defato como cidadãos emancipados.

Nesse sentido, a Universidade Federal de Goiás reconhece que o trabalho quevem sendo desenvolvido se apresenta ainda de forma fragmentada, haja vista as açõesdos diversos institutos/faculdades que são realizadas por iniciativa própria sem se constituirem um propósito único institucional, ou seja, o de incluir qualquer aluno que necessiteda promoção adequada à acessibilidade

Entretanto, há o reconhecimento de que a Faculdade de Educação (FE/UFG), emespecífico, tem se preocupado com a qualidade de ensino proporcionada, tanto naformação inicial quanto na formação continuada dos professores, a partir do entendimento

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de que essa formação será revertida, basicamente para alunos da Educação Básica e quepoderá beneficiar pessoas até então, marginalizadas e excluídas do processo educacional.

Assim, ao se tomar algumas posições e agir pontualmente,

[...] reafirma a docência como a base da identidade do pedagogo e propõe-sea formar professores que compreendam as complexas relações entre a educaçãoe a sociedade, pensem e realizem a existência humana, pessoal e coletiva, eo trabalho pedagógico com vistas à transformação da realidade social, à superaçãodos processos de exploração e dominação, à construção da igualdade, dademocracia, da ética e da solidariedade (UFG/FE/PPP, 2003, p. 14).

Com essa concepção, consolidada, mas fruto de enfrentamentos e resistênciasainda nos anos de 1980, a FE/UFG tem tentado contribuir, de forma séria e comprometida,na reversão desse quadro de exclusão ainda presente na educação brasileira.

Em resumo, serão apresentadas algumas ações da FE/UFG, hoje, de caráter maisinstitucional, que têm representado avanços em relação à questão da inclusão escolar:

• Inserção de conteúdos específicos sobre a Educação Especial e a EducaçãoInclusiva nos Planos de Curso de disciplinas vinculadas aos estágiosobrigatórios;

• Execução de “Projetos de Extensão -- Prática de Ensino e Formação Continuadade Professores” em escolas-campo, estaduais especiais e inclusivas, envolvendo,principalemente, reflexões quanto à prática pedagógica desenvolvida;

• Realização de Cursos de Especialização, com disciplinas específicas sobrea Educação Especial e Inclusiva, tendo como conseqüência diversasproduções monográficas;

• Realização de Grupo de Estudo, sistematizado, no interior da FE/UFG jáno ano de 1998, envolvendo diversas instituições públicas e privadas parase compreender melhor a educação especial na perspectiva da educaçãoinclusiva – totalizando 140 horas;

• Realização de mesas-redondas, comunicações orais e minicursos sobrepessoas com deficiência e inclusão escolar nos Simpósios da Faculdade deEducação/UFG que ocorrem anualmente;

• Publicações específicas, objetivando a divulgação e sensibilização dacomunidade em geral sobre questões pertinentes à Educação Especial eInclusiva na Faculdade de Educação ou no interior da UFG, tais como emJornais e na Revista INTER-AÇÃO nº 31, julho/dezembro, 2006, tendocomo tema Educação Inclusiva, com artigos de autores de reconhecimentolocal e nacional;

O papel da universidade diante da inclusão

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• Atendimento às solicitações de diversas instituições públicas e privadas einstituições representativas das pessoas com deficiência, para proferirpalestras em congressos, encontros, fóruns, cursos, seminários, simpósios,reuniões e grupos de estudos entre outros, tanto em âmbito local, regional,quanto nacional;

• Produção, publicação e apresentação de trabalhos para trocas deexperiências sobre à Educação Especial e Inclusiva nos espaçosproporcionados pelos Encontros Nacionais de Didática e Prática de Ensinotais como no IX ENDIPE em Águas de Lindóia/SP/1998; no X ENDIPE noRio de Janeiro/RJ/2000; no XI ENDIPE em Goiânia/GO/2002; no XII ENDIPEem Curitiba/PR/2004 e no XIII ENDIPE em Recife/PE/2006;

• Participação junto às Pró-Reitorias de Extensão, Comunitária, Graduação,Pesquisa e Pós-Graduação, em discussões, encaminhamentos e tomadade decisões quanto à acessibilidade de pessoas com necessidadeseducativas especiais no interior da UFG, internamente e em âmbito maisamplo, seja socializando informações, seja produzindo projetos;

• Participação no Fórum Nacional de Educação Especial das Instituições deEnsino Superior, sob a coordenação da UFMS, com apoio da Secretaria deEducação Especial (Seesp/MEC), realizados no fim dos anos de 1990 e iníciodos anos 2000;

• Participação no Grupo de Pesquisa do “Laboratório de Estudos e Pesquisasem Ensino e Diversidade” (Leped/FE/Unicamp), sob a coordenação da Profª.Drª. Maria Teresa Eglér Mantoan, desde março de 1999;

• Participação na produção de vídeo sobre “Direitos humanos e cotidiano”para se discutir questões específicas sobre as pessoas com deficiência à luzdos direitos humanos, produzido pelo Curso de Radio e TV da UFG, com120 minutos de duração, em VHS/NTSC nos anos de 1990;

• Participação efetiva desde 1996 em congressos, cursos, seminários, fórunse encontros entre outros, de âmbito regional, nacional e internacional,para se discutir os novos rumos da educação especial frente aos desafiosda inclusão escolar, como parte da política da FE/UFG em apoiar e incentivara qualificação docente;

• Desenvolvimento do Projeto de Extensão – Curso de Formação Continuadade Professores da Rede Pública de Ensino em Braille e Sorobã – 2002/2003 – 60 h – envolvendo três turmas compostas por um total de 120alunos/professores;

• Introdução da disciplina “Educação e Diversidade” no Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da FE/UFG a partir de 2005, vinculada àLinha de Pesquisa – Formação e Profissionalização Docente;

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• Introdução da disciplina “Noções Básicas de Libras”, por meio de concursopúblico para professor substituto, como parte dos Núcleos-Livres,componentes curriculares obrigatórios dos cursos da UFG, por força doDecreto nº 5.626 de 22/12/2005;

• Acompanhamento e orientação de mestrandos e doutorandos quedesenvolvem pesquisas na área de Educação Especial/Inclusiva por meiodo PPGE da FE/UFG a partir do ano de 2004;

• Desenvolvimento do Projeto de Pesquisa intitulado “A educação especial/inclusiva no contexto dos programas de pós-graduação: estudo e análiseinterinstitucional”, com início em março de 2006 e encerramento em 30/06/2007, financiado pelo Proesp/Capes;

• Desenvolvimento do subprojeto intitulado “A produção acadêmica sobrea formação de professores para a educação inclusiva” vinculado ao projetomaior “A produção acadêmica sobre professores: estudo interinstitucionalda Região Centro-Oeste” do Núcleo de Formação de Professores – Nufop/FE/UFG – 2004/2006;

• Coordenação do Exame Nacional de Certificação de Proficiência em Librase de Certificação de Proficiência em Tradução e Interpretação de Libras/Língua Portuguesa/Libras, denominado Prolibras, ocorrido na própria FE/UFG no presente ano;

• Participação em encontros promovidos pela Secretaria de EducaçãoEspecial – Seesp/MEC no ano de 2006 e no decorrer do presente ano,originando produtos tais como artigos de revistas e livros;

• Participação em bancas de qualificação e defesa de dissertação de mestradoe tese de doutorado em universidades públicas e privadas em Goiás e emoutros Estados;

• Parecerista de artigos com temas sobre a Educação Especial e EducaçãoInclusiva para instituições públicas ou privadas, em diversos estadosbrasileiros;

• Publicação em revistas, jornais, livros, anais de eventos nacionais einternacionais, com temas referentes à Educação Especial e à InclusãoEscolar objetivando a socialização e intercâmbios diversos;

• Lançamento do livro “Educação: diversidade e inclusão em debate”, sob anossa organização e prefaciado pela Profª Drª Teresa Eglér Mantoan, nopresente ano, tendo como autores mestrandos e doutorandos do Programade Pós-Graduação da FE/UFG;

• Introdução da disciplina/Núcleo Livre – Educação Especial e Inclusão Escolarna FE, com o objetivo de atender às solicitações dos alunos da UFG, apartir do 2º semestre/2007;

O papel da universidade diante da inclusão

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• Introdução da disciplina “Inclusão Educacional” no Curso de Especialização– Tecnologias Aplicadas ao Ensino de Biologia/UFG, com início previstopara o 2º semestre/2007;

• Participação na Mesa Redonda: “Crianças com necessidades especiais” --IX Congresso Nacional de Pediatria – Região Centro- Oeste, promovidopela Faculdade de Medicina da UFG, a ser realizado no período de 8 a 12de outubro de 2007, no Centro de Convenções de Goiânia(GO).

Enfim, a FE/UFG reconhece o seu papel diante dos desafios postos pela sociedadebrasileira e, apesar das resistências e enfrentamentos constantes, tem assumido o seupapel de formador, voltado para uma educação de qualidade para todos e acredita quecom esses exemplos de ações e posicionamentos poderá possibilitar uma formação maisética e, em conseqüência, poderá contribuir com a construção de uma sociedade maisjusta, cooperativa e solidária, por entender o compromisso da educação com a formaçãohumana, priorizando os valores éticos, a sensibilidade, a criatividade e o espírito críticoque são aspectos fundamentais na formação de qualquer pessoa.

“Nossa capacidade de alcançar a unidade na diversidade será a beleza e o teste denossa civilização” Gandhi

ReferênciasReferênciasReferênciasReferênciasReferências

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O papel da universidade diante da inclusão

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Percusos de Educação Inclusiva em Portugal: dez estudos de casoPercusos de Educação Inclusiva em Portugal: dez estudos de casoPercusos de Educação Inclusiva em Portugal: dez estudos de casoPercusos de Educação Inclusiva em Portugal: dez estudos de casoPercusos de Educação Inclusiva em Portugal: dez estudos de caso

Luzia Lima-Rodrigues1

[email protected] Rodrigues2

[email protected]

1 Introdução1 Introdução1 Introdução1 Introdução1 Introdução

O projecto Boas Práticas em Educação Inclusiva (BPEI), que deu origem ao livroPercursos de Educação Inclusiva em Portugal: dez estudos de caso (LIMA-RODRIGUES atal., 2007), surgiu a partir de uma iniciativa da Equipe de Investigação do Fórum de Estudosde Educação Inclusiva (FEEI) – Departamento de Educação Especial e Reabilitação daFaculdade de Motricidade Humana da Universidade Técnica de Lisboa.

O objetivo principal do estudo foi identificar e conhecer as representações/percepçõesde vários intervenientes da comunidade educativa, relativamente aos aspectos facilitadores(“boas práticas”) e às “barreiras” à Inclusão existentes em cada uma das escolas estudadas.Decorrente desse objetivo, tivemos a preocupação de relacionar tais representações/percepções com as mais recentes perspectivas sobre Inclusão, veiculadas pela literaturacientífica nacional e internacional. Assim, tentamos encontrar e descrever exemplos de“boas práticas” em Inclusão, ocorridos de Norte a Sul de Portugal, em Escolas do 1º Ciclodo Ensino Básico (1º CEB – equivalente à 2ª e 3ª série do Ensino Fundamental, no Brasil).

O Projecto BPEI foi composto de duas vertentes relacionadas entre si: i) a realizaçãode formações sobre a temática em análise e ii) a realização de uma investigação de âmbitonacional, envolvendo duas escolas de cada uma das cinco Direções Regionais de Educaçãodo Continente português, perfazendo um total de dez escolas.

No que diz respeito à formação, foram realizados minicursos sobre conceitos epráticas bem-sucedidas de Inclusão, referenciadas na literatura nacional e internacional.Na vertente da investigação, foram realizados dez estudos de caso a partir de documentosda escola e de entrevistas efectuadas aos diversos intervenientes educativos (representantedo conselho executivo, professor do ensino regular, professor de apoio educativo eencarregados de educação de um aluno com e de um aluno sem NecessidadesEducacionais Especiais – NEE).

1 Professora Doutora, Faculdade de Motricidade Humana. Fórum de Estudos de Educação Inclusiva/Portugal.2 Professor Doutor, Faculdade de Motricidade Humana. Fórum de Estudos de Educação Inclusiva/Portugal.

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Com o estudo desses casos, pretendemos conhecer quais os aspectos facilitadorese as estratégias adotadas pelas escolas para superarem as “barreiras” à Inclusão, bemcomo perceber quais as “barreiras” ainda existentes, segundo a representação/percepçãodos entrevistados. Paralelamente, foi feita uma recolha de dados estruturais e documentais,para a caracterização das escolas.

Sob a coordenação e organização da Professora Doutora Luzia Lima-Rodrigues e asupervisão do Professor Doutor David Rodrigues, o Projecto BPEI contou com duas equipesde trabalho:

– a “Equipe de Investigadores do FEEI”, composta por Mestres na área daEducação Especial e da Saúde, delineou os processos de formação e deinvestigação, realizou as entrevistas, a respectiva análise e discussão dos dadose elaborou o documento final para a publicação do estudo; e

– a “Equipe de Investigadores Estagiários do Instituto Piaget de Almada”,composta por alunos finalistas (2006-2007) das Licenciaturas em “MotricidadeHumana” (Instituto Superior de Estudos Interculturais e Transdisciplinares – ISEIT)e “Professores do Ensino Básico – 1º Ciclo” (Escola Superior de Educação – ESE),que colaborou com a Equipe de Investigadores.

2 Seleção das escolas2 Seleção das escolas2 Seleção das escolas2 Seleção das escolas2 Seleção das escolas

Para conhecer exemplos de “boas práticas” em Educação Inclusiva em Portugal,seria importante encontrar potenciais escolas distribuídas por todo o país e situadastanto em áreas urbanas como em áreas rurais ou da periferia dos grandes centros urbanos.O Projecto estudou casos situados nos diversos contextos, considerados sociologicamentepadrão (rural e urbano), onde se inserem “as escolas portuguesas”.

O critério subjacente à seleção das escolas foi a existência de uma turma ondeestivesse incluído, no ano letivo de 2005-2006, um aluno com NEE de CarácterProlongado, acompanhado por um Professor de Apoio Educativo. As entrevistasrealizadas incidiram sobre os intervenientes educativos vinculados à referida turma,nomeadamente:

– Professor do Ensino Regular.– Professor de Apoio Educativo.– Encarregado de Educação de um aluno com NEE.– Encarregado de Educação de um aluno sem NEE.– Representante do Conselho Executivo.

Percusos de Educação Inclusiva em Portugal: dez estudos de caso

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3 Instrumentos3 Instrumentos3 Instrumentos3 Instrumentos3 Instrumentos

Para caracterizar as escolasPara caracterizar as escolasPara caracterizar as escolasPara caracterizar as escolasPara caracterizar as escolas, foi criado o Guião (roteiro) de Recolha de DadosEstruturais, utilizado para o levantamento dos dados necessários. Foi feita também aanálise de conteúdo dos seguintes documentos: Projeto Educativo do Agrupamento;Projeto Curricular; Regulamento Interno e Projeto Curricular de Turma. Embora não tenhasido solicitado pela equipe de investigação, foram também disponibilizados, em algunscasos, o Projecto Curricular do 1º Ciclo do Ensino Básico, o Plano Anual de Atividadesdo Agrupamento e ainda “outra documentação”.

PPPPPara conhecer a opinião dos intervenientesara conhecer a opinião dos intervenientesara conhecer a opinião dos intervenientesara conhecer a opinião dos intervenientesara conhecer a opinião dos intervenientes educativoseducativoseducativoseducativoseducativos sobre “boas práticas” e“barreiras” à Inclusão, foram construídos três roteiros de entrevistas, para: i) orepresentante do conselho executivo, ii) os professores do ensino regular e de apoioeducativo, e iii) os encarregados de educação de um aluno com e de um aluno sem NEE.A análise de conteúdo das entrevistas foi realizada por meio de um quadro, com categoriascriadas a priori, com base nos conceitos de diversos autores (AINSCOW, 2007; BOOTH;AINSCOW, 2002; EGGERTSDÓTTIR, R.; MARINÓSSON, G., 2005; FLORIAN, 2007,2003; LIMA, 2005; LINDSAY, 2003; LIPSKY; GARTNER, 1998; MARCHESI, 2005;RODRIGUES 2001, 2003, 2006a, 2006b; RODRIGUES, KREBS; FREITAS, 2005;TILSTONE, FLORIAN; ROSE, 2003). À posteriori, a partir dos temas emergentes, surgiramas categorias: “Processo de Inclusão” (relacionada com as “barreiras” identificadas nodecurso de tornar aquela escola mais Inclusiva) e “Percepção e Atitudes” (relacionadacom a opinião do interveniente sobre “Inclusão”, com a aceitação dos alunos portadoresde deficiência e demais “diferenças” e com a “opinião sobre a escola”). Assim, a análisedas entrevistas foi realizada seguindo uma metodologia de análise de conteúdo e emconformidade com as seguintes categorias e subcategorias:

CACACACACATEGORIASTEGORIASTEGORIASTEGORIASTEGORIAS SUBCASUBCASUBCASUBCASUBCATEGORIAS (e/ou indicadores)TEGORIAS (e/ou indicadores)TEGORIAS (e/ou indicadores)TEGORIAS (e/ou indicadores)TEGORIAS (e/ou indicadores)

1 Preparação para a escolarização • Preparação dos alunos (Há preparação dosalunos para o processo de inclusão do futurocolega?)• Preparação dos professores e agenteseducativos (Há preparação para o processode inclusão do futuro aluno?)• Equipamentos da escola (Há aquisição/adequação dos equipamentos e materiais deapoio, antes do ingresso do aluno com NEEna escola?)

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2 Currículo e planos educ. individuais • Planeamento para grupos heterogéneos (Háplaneamento para grupos heterogéneos?)• Adaptações curriculares individualizadas(Há adaptações curriculares individualizadaspara os alunos?)• Participação dos encarregados de educaçãoe de outros técnicos (Há participação dosencarregados de educação e de outros téc-nicos na elaboração dos planos curricularesindividuais?)

3 Prática de sala de aula • Estratégias e objetivos de avaliação (Háestratégias e objetivos diferenciados deavaliação?)• Equipa de intervenção (Há colaboraçãoentre professores e entre professores e outrostécnicos?)• Organização e ambiente de sala de aula(Há adequação da organização e do ambientede sala de aula?)• Estratégias de ensino (Há estratégias indivi-dualizadas?)• Interação entre os alunos (Há uma intera-ção entre os alunos planeada pelos profes-sores?)

4 Colaboração e coordenação • Colaboração e coordenação dentro daescola (Há? Que tipos de iniciativas foramidentificadas?)• Colaboração e coordenação entre a escolae outros serviços (Há? Que tipos de iniciativasforam identificadas?)• Colaboração entre a escola e a família (Há?Que tipos de iniciativas foram identificadas?)

5 Serviços de apoio • Participação dos especialistas (Há partici-pação ativa e efetiva dos especialistas nasactividades da escola?)• Prestação do apoio (Quais são as modali-dades e locais de apoio?)

Percusos de Educação Inclusiva em Portugal: dez estudos de caso

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• Serviços externos presentes na escola (Hátransferência de serviços externos para dentroda escola?)• Recursos humanos (Há recursos humanossuficientes?)• Recursos materiais/financiamento (Há recur-sos materiais e financiamento suficientes?)

6 Desenvolvimento profissional • Desenvolvimento profissional na escola (Háactividades de desenvolvimento profissionalocorridas dentro da escola?)• Parcerias (Há parcerias para atividades dedesenvolvimento profissional?)• Conteúdos (Há e quais são os conteúdosdo desenvolvimento profissional centradosem problemas concretos?)

7 Avaliação e reflexão • Avaliação e reflexão da escola (Há pro-cessos de avaliação/reflexão sobre o trabalhoefectuado?)

8 Processo de inclusão • Quais foram as barreiras e as boas práticasidentificadas no decorrer do processo detornar a escola mais inclusiva?

9 Percepção e atitudes • Opinião sobre “Inclusão”.• Opinião sobre a aceitação dos alunos por-tadores de deficiência e demais “diferenças”.• Opinião sobre a Escola.

Por fim, cabe ressaltar que todos os instrumentos utilizados no estudo foramsubmetidos à apreciação da Comissão Nacional de Proteção de Dados e consideradosisentos de notificação.

4 Procedimentos4 Procedimentos4 Procedimentos4 Procedimentos4 Procedimentos

Efetuados os contatos iniciais com os órgãos de gestão de cada escola e, após a suadisponibilidade e receptividade, procedeu-se à formalização do pedido, por escrito.

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Posteriormente, os contactos visaram: i) apresentar mais detalhadamente os objetivosdo projeto e os procedimentos gerais para a recolha de dados, ii) agendar previamentetodas as entrevistas a serem realizadas, e iii) encaminhar, antecipadamente, o “Guião deRecolha de Dados Estruturais”.

Quando da visita dos membros da Equipa de Investigação do FEEI às escolas para arealização das entrevistas, eram também recolhidos os dados estruturais, a fim de evitaruma possível dispersão de informações.

As entrevistas, realizadas pelos membros da Equipe de Investigadores do FEEI, foramgravadas em áudio, transcritas integralmente pelos membros da Equipe de InvestigadoresEstagiários do Instituto Piaget de Almada, e encontram-se disponíveis para consulta nosarquivos do FEEI.

5 Caracterização das escolas e análise dos discursos5 Caracterização das escolas e análise dos discursos5 Caracterização das escolas e análise dos discursos5 Caracterização das escolas e análise dos discursos5 Caracterização das escolas e análise dos discursos

A caracterização de cada uma das dez escolas foi realizada a partir da análise dosvários documentos facultados pelos respectivos Conselhos Executivos, bem como dosdados estruturais recolhidos.

Uma vez transcritas as entrevistas, efetuamos uma análise detalhada do conteúdodas mesmas, cujos dados foram sistematizados em um total de 160 quadros, tabelas ememorandos. Foi a partir desses dados sistematizados que elaboramos a “análise dosdiscursos” dos diversos intervenientes. São análises que colocam em evidência os aspectosmais relevantes e significativos encontrados em cada uma das Categorias/Indicadores de“Boas Práticas”/Factores Facilitadores à aprendizagem e participação. Tratam-se de dadosde opinião que surgem exclusivamente das representações/percepções dos intervenienteseducativos sobre as práticas pedagógicas e vivências educativas de uma determinadaescola, inserida em uma comunidade educativa.

O estudo de cada caso é finalizado com uma discussão reflexiva e crítica dos dadosemergentes, tentando compreender quais foram as soluções encontradas por cada escola,o que Ainscow (2005) chama de “alavancas para a mudança”.

6 À Guisa da conclusão6 À Guisa da conclusão6 À Guisa da conclusão6 À Guisa da conclusão6 À Guisa da conclusão

Apresentadas as conclusões do trabalho, ressaltamos que “boas práticas” emEducação Inclusiva não são “as melhores práticas existentes”, nem a receita perfeita paratodos os males das escolas. São, tal como as encontrámos nos dez estudos de casorealizados, os percursos trilhados pelas escolas na intenção de se tornarem mais inclusivas.Não há prática, nem escola, nem sociedade, nem Inclusão perfeitas. Há, sim, aquilo quede melhor as escolas podem (e sabem) fazer, diante das barreiras à aprendizagem eparticipação que enfrentam.

Percusos de Educação Inclusiva em Portugal: dez estudos de caso

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É bem verdade que encontramos casos de escolas, como bem apresentado noprefácio do Professor Mel Ainscow, que sabem mais do que o que usam. Ou seja,parafraseando Vygotsky, deparamo-nos com escolas cujo “desenvolvimento potencial”estava bem distante do “desenvolvimento real”. Com isso, constatamos que não são sóos recursos que garantem um bom percurso inclusivo. “Não se faz Inclusão com meiadúzia de tostões”, dizia-nos um dos entrevistados – com o qual concordamos plenamente.Entretanto, as escolas com mais barreiras à aprendizagem e participação que encontrámos,nem sempre sofriam escassez de recursos materiais ou humanos. Careciam sim derentabilizar os recursos existentes para potencializar “boas práticas”.

Apesar disso, verificamos que (segundo a nossa própria percepção e os resultadosda investigação que, intensamente, realizamos durante dois anos) a Inclusão em Portugal,até ao ano letivo de 2005-2006, seguia um caminho com dificuldades, seguramentecom necessidade de ajustes mas, mesmo assim, com grande potencial e com resultadospositivos concretos. A avaliação desse processo é, certamente, essencial para informar asmudanças de política que é necessário realizar. Acreditamos que as mudanças devemtambém alicerçar-se sobre o conhecimento da realidade que a investigação implica.

Esperamos que os novos modelos que se estão a implementar na área da Inclusãopossam contar com estudos desse tipo: estudos que permitam discutir, com uma basefortemente ancorada na prática, os valores que pretendemos desenvolver na EducaçãoInclusiva.

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Percusos de Educação Inclusiva em Portugal: dez estudos de caso

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TTTTTrajetória da Educação Especial no RN: da integração à inclusãorajetória da Educação Especial no RN: da integração à inclusãorajetória da Educação Especial no RN: da integração à inclusãorajetória da Educação Especial no RN: da integração à inclusãorajetória da Educação Especial no RN: da integração à inclusão

Joiran Medeiros da Silva1

[email protected]

“A inclusão é o privilégio de conviver com as diferenças”

Maria Teresa Eglér Mantoan, 2005

1 Um breve histórico1 Um breve histórico1 Um breve histórico1 Um breve histórico1 Um breve histórico

Até fins dos anos 1970, a questão da deficiência no Brasil sempre foi encaminhadapelos técnicos, professores ou responsáveis considerados “especialistas” na área. A metaprincipal desses grupos era o atendimento assistencialista e segregador das pessoas comdeficiência nas diversas instituições educacionais públicas e privadas.

Em 1979, acompanhando um movimento mundial deflagrado pela Organizaçãodas Nações Unidas (ONU) ao instituir para 1981 o Ano Internacional das PessoasDeficientes (AIPD), alguns grupos organizados dirigidos por pessoas de várias áreas dedeficiência começaram a se reunir para preparar seus segmentos. Como conseqüência,em 1980, em Brasília (DF), aconteceu o I Encontro Nacional de Entidades de Pessoascom Deficiência que contou com a presença de cerca de mil participantes,representantes de cegos, surdos, deficientes físicos e hansenianos, vindos de todo oBrasil.

Nesse encontro, o Rio Grande do Norte foi representado pela recém-criadaAssociação de Deficientes Físicos do RN, fruto de um trabalho conjunto entre a ComissãoEstadual do Ano Internacional das Pessoas com Deficiência, instituída pelo Governo doEstado e segmentos de pessoas com deficiência.

Aprovou-se a primeira pauta de lutas do grupo, criou-se a primeira entidaderepresentativa – Coalisão Nacional –, englobando todas as áreas, e definiu-se apolítica a ser adotada no ano seguinte, o AIPD. Dentre outras políticas sociais, oRN priorizou o acesso à educação com o lema “Plena Participação e Igualdade”,difundido pelo AIPD.

1 Professor Especialista em Educação, Subcoordenador de Educação Especial do RN – Seec/Suesp.

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Na oportunidade, setores da educação do estado, com assento na ComissãoEstadual do Ano Internacional das Pessoas com Deficiência (Ceaipd), preparam em 1981e 1982 o I e o II Encontro da Participação e Igualdade, em que se discutiu a plenaparticipação dos deficientes na sociedade.

Paralelamente ao surgimento de várias entidades representativas das pessoas comdeficiência e, pode-se dizer, como uma das conseqüências de suas reivindicações, ogoverno brasileiro começava a se estruturar de forma a criar uma política em favor dessesegmento social. Em 1987, o então Presidente cria por decreto a Coordenadoria Nacionalpara a Integração das Pessoas Portadoras de Deficiência (Corde), recriada pelo Congressoem outubro de 1989 pela Lei nº 7.853.

Esta lei não só incumbe o Ministério Público da defesa dos interesses da pessoacom deficiência, mas também define como crime a discriminação. Nesse instante histórico,a Corde Estadual e a Secretaria Estadual de Educação, por meio da Subcoordenadoriade Educação Especial (Suesp) e o Ministério Público do RN, iniciam uma série de palestras,cursos, oficinas e apresentações de teatro de bonecos, visando informar e formareducadores e entidades civis organizadas, quanto à criminalização do preconceito e àsbarreiras arquitetônicas, principalmente no tocante ao Artigo 8º que preceitua puniçãocom reclusão e multa para quem “recusar, suspender, procrastinar, cancelar ou fazercessar, sem justa causa, a inscrição de aluno em estabelecimento de ensino de qualquercurso ou grau, público ou privado, por motivos derivados da deficiência que porta”.

A constituição brasileira de 1988 traz uma mudança de postura em relação às pessoascom deficiência. O paternalismo é tema que dá lugar à equiparação de oportunidades. Atutela, substituída pela plena cidadania. Esses novos paradigmas estão calcados nosdireitos da pessoa humana que pressupõem a cidadania, como o direito de ser tratadopelos outros como semelhante. Essas são premissas básicas para a inclusão da pessoacom deficiência porque é direito de todos fazer parte da sociedade, participando deforma direta e efetiva.

2 A importância da educação inclusiva na rede pública estadual do RN: um2 A importância da educação inclusiva na rede pública estadual do RN: um2 A importância da educação inclusiva na rede pública estadual do RN: um2 A importância da educação inclusiva na rede pública estadual do RN: um2 A importância da educação inclusiva na rede pública estadual do RN: umnovo olhar que faz a diferençanovo olhar que faz a diferençanovo olhar que faz a diferençanovo olhar que faz a diferençanovo olhar que faz a diferença

No início dos anos 1990, sob a influência dos ditames constitucionais e, diante dasnovas incumbências do Ministério Público na garantia de uma escola para todos, aeducação inclusiva no Brasil passou a ser objeto de discussões, análises, reflexões epreocupações de professores e pesquisadores da área no que tange a atuação da escolapública. Essas discussões foram sendo assumidas pelos que respondiam pela EducaçãoEspecial, no Ministério da Educação (MEC), por meio da Secretaria de Educação Especial,cuja opção pela construção de um sistema educacional pautado na educação inclusivavinha se desenhando em resposta à Declaração Mundial de Educação para Todos, emJomtien, Tailândia, 1990 e, posteriormente, em 1994, na Espanha, por ocasião da

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Conferência Mundial sobre as Necessidades Educacionais Especiais: Acesso e Qualidade,mais conhecida como Declaração de Salamanca.

Em 1991, em consonância com os postulados do Direito à Educação para Todos, aRede Pública Estadual de Ensino do RN, por meio da Subcoordenadoria de EducaçãoEspecial, inicia seu processo de inclusão escolar defendendo a diversidade dos gruposhumanos independentemente de sua deficiência.

O projeto na época foi considerado inovador e revolucionário, configurando-senos primeiros passos para a revisão e o redimensionamento da prática pedagógica dacomunidade escolar. Dele, constaram o desmonte das classes especiais e o remanejamentodos alunos para o Ensino Regular, efetuando-se a matrícula de todas as crianças dasséries iniciais de escolarização, em classes comuns. Rompe-se com a visão de integraçãoestruturada a cerca de vinte anos no fazer da Educação Especial do Estado, tendo basena reinterpretação dos conceitos integradores. Nesse sentido, as palavras de Mantoan(2005) reforça nossa análise quando diz:

A diversidade humana está sendo cada vez mais reconhecida, valorizada econsiderada como condição primeira para a implementação de arrojados projetossociais e educacionais. É nessas e em outras ocasiões similares que constatamoso peso e a importância da diversidade como meio pelo qual aprendemos maissobre nós mesmos e sobre os outros. A intenção de incluir todos os alunos nasescolas comuns implica que reconheçamos as diferenças e a multiplicidadede saberes e das condições sobre as quais o conhecimento é aplicado. E detransitar por novos caminhos, estabelecendo teias de relações entre o que seconhece e o que se há de conhecer, nos encontros e nas infinitas combinaçõesentre os conteúdos disciplinares.

Esses novos caminhos de respeito às diferenças defendidos pela professora MariaTeresa Mantoan provocaram inúmeras resistências em todo sistema educacional doEstado. As escolas por meio de seu corpo de educadores e gestores questionavam aviabilidade da prática educacional inclusiva, pois não acreditavam que assim o alunoviesse a “aprender”, nem eles viessem a “ensinar”, por desconhecimento de como “lidar”com essas pessoas. Por sua vez, alegavam falta de condições de trabalho; salários baixos;elevado número de alunos por salas; inadequação física das escolas; falta de um programade formação continuada para capacitar as equipes escolares, entre outras. Todos osquestionamentos são bastante procedentes, uma vez que, ainda que seja importante oesforço dos diversos organismos públicos e particulares, em realizar cursos para atenderàs necessidades de formação, orientação e fundamentação dos educadores, essasatividades revestem-se de eventos descontínuos de curta duração e sem o necessáriocontrole social de sua aplicabilidade na escola, destino fim da ação de capacitação.

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Em 1998, cria-se na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) umabase de pesquisas e estudos sobre a Educação de Pessoas com Necessidades Especiais,sob a coordenação de professores do departamento de educação e participação decisivade técnicos e professores da área de Educação Especial da Secretaria de Educação doEstado e do Município de Natal, além de alunos da pós-graduação em educação e dagraduação (bolsistas de iniciação científica).

Essa base muito contribuiu e ainda vem contribuindo com o aperfeiçoamentodo processo de formação continuada dos professores, ajudando a reduzirpreconceitos ainda existentes, principalmente no tocante a possibilidade de sucessoobtida na relação ensino/aprendizagem das pessoas com necessidades educacionaisespeciais.

Constatados esses entraves e diante de novos paradigmas de inclusão escolar, aSecretaria Estadual de Educação, por meio de sua Subcoordenadoria de Educação Especial(Suesp), juntamente com outros atores municipais e instituições privadas de atendimentoeducacional especializado e o Conselho Estadual de Educação – RN, em 1996, formalizauma proposta de regulamentação dos princípios normativos e legais pela Resolução nº01/96. Essa resolução configura-se em um dos marcos da garantia ao acesso e àpermanência com qualidade de todos os alunos na Rede de Ensino Regular do Estadodo RN, visto que prever ações de formação continuada do professor, e aquisição deequipamentos para as escolas, ao mesmo tempo em que encoraja a prática pedagógicados diversos atores envolvidos, junto ao aluno recém-chegado.

O Rio Grande do Norte, desde o início da década de 1990, do século XX, temtrabalhado na direção de um ensino inclusivo, compreendido como a “prática da inclusãode todos -- independentemente de seu talento, deficiência, origem cultural – em escolase salas de aula provedoras, nas quais todas as necessidades dos alunos são satisfeitas”(STAINBACK, 1999, p. 21).

Em 2003, o Rio Grande do Norte, aderiu ao Programa de Educação Inclusiva: direitoà diversidade, lançado pelo MEC, que surge como política pública de desenvolvimentode sistemas educacionais inclusivos em 144 municípios-pólo, em todos os estadosbrasileiros, e no Distrito Federal.

O foco dessa política recai na possibilidade real de se conviver com as diferençashumanas, em uma atmosfera de aprendizagem e respeito ao caráter heterogêneo esingular, peculiares à natureza humana, portanto rechaçando práticas educacionaisexcludentes.

O fim gradual das práticas educacionais excludentes do passado proporciona atodos os alunos uma oportunidade igual para terem suas necessidadeseducacionais satisfeitas dentro da educação regular. O distanciamento dasegregação facilita a unificação da educação regular e especial em um sistemaúnico. Apesar dos obstáculos, a expansão do movimento da inclusão, em direção

Trajetória da Educação Especial no RN: da integração à inclusão

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a uma reforma educacional mais ampla, é um sinal visível de que as escolase a sociedade vão continuar camihando rumo a práticas cada vez mais inclusivas(STAINBACK; STAINBACK, 1999, p. 44).

33333 Instâncias de sustentação às escolas no desenvolvimento dos serviços e açõesInstâncias de sustentação às escolas no desenvolvimento dos serviços e açõesInstâncias de sustentação às escolas no desenvolvimento dos serviços e açõesInstâncias de sustentação às escolas no desenvolvimento dos serviços e açõesInstâncias de sustentação às escolas no desenvolvimento dos serviços e açõesque favoreçam a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiaisque favoreçam a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiaisque favoreçam a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiaisque favoreçam a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiaisque favoreçam a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais

No contexto de um processo sempre evolutivo de práticas educacionais inclusivase, tendo como suporte o Programa de Educação Inclusiva: direito à diversidade, em 2003,a Suesp direciona seu trabalho, para fortalecer e aperfeiçoar as instâncias de sustentaçãoao processo de escolarização das pessoas com necessidades educacionais especiais, nasclasses comuns da Rede Regular de Ensino, por meio dos seguintes serviços e açõeseducacionais:

••••• Equipe de assessoramento técnico pedagógicoEquipe de assessoramento técnico pedagógicoEquipe de assessoramento técnico pedagógicoEquipe de assessoramento técnico pedagógicoEquipe de assessoramento técnico pedagógico a professores, equipe técnicadas escolas, técnicos das coordenações de Educação Especial das 16 (dezesseis)Diretorias Regionais de Ensino (Direds), sediadas nos municípios do RN,universidades públicas e privadas, organizações não-governamentais, prefeiturasmunicipais e famílias com orientação nas áreas de Educação Especial;

••••• Serviço de intinerância: Serviço de intinerância: Serviço de intinerância: Serviço de intinerância: Serviço de intinerância: consiste no assessoramento às escolas com o objetivode garantir o processo de escolarização de alunos com necessidades educacionaisespeciais, orientando as equipes técnicas e as famílias quanto às possibilidadesde aprendizagem efetiva, além de registrar e analisar dados mediante produçãode relatórios individuais e coletivos, encaminhar alunos aos serviços de apoioespecializado, caso necessário, promover a formação continuada em serviço daprópria equipe e aos demais docentes lotados nas escolas da rede. A equipe écomposta por 24 (vinte e quatro) professores, revezando-se nos três turnos,atendendo escolas no município de Natal (RN) e na grande Natal.

3.1 Apoio pedagógico especializado3.1 Apoio pedagógico especializado3.1 Apoio pedagógico especializado3.1 Apoio pedagógico especializado3.1 Apoio pedagógico especializado

••••• Centros de educação especial: Centros de educação especial: Centros de educação especial: Centros de educação especial: Centros de educação especial: centro de atendimento especializado nas áreaspedagógica, psicológica, psicopedagógica, psicomotora, fonoaudiológica e artes,com unidades em Natal (510 alunos), Mossoró (100 alunos), Areia Branca (72alunos), Santa Cruz (90 alunos) e Apodi (129 alunos), desenvolvendo atividadesde apoio ao processo de escolarização nas classes comuns da rede regular deensino.

••••• Centro de apoio pedagógico para atendimento às pessoas com deficiência visualCentro de apoio pedagógico para atendimento às pessoas com deficiência visualCentro de apoio pedagógico para atendimento às pessoas com deficiência visualCentro de apoio pedagógico para atendimento às pessoas com deficiência visualCentro de apoio pedagógico para atendimento às pessoas com deficiência visual------ Profª Lapissara Aguiar – CAP/RN: - Profª Lapissara Aguiar – CAP/RN: - Profª Lapissara Aguiar – CAP/RN: - Profª Lapissara Aguiar – CAP/RN: - Profª Lapissara Aguiar – CAP/RN: projeto instituído pela Secretaria de

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Educação Especial do Ministério da Educação (Seesp/MEC), em parceria comos estados, visando oferecer subsídios aos sistemas de ensino para oatendimento aos educandos com deficiência visual. Esse Centro garante àspessoas cegas e às pessoas de baixa visão (visão subnormal) o acesso aoconteúdo programático desenvolvido na escola de Ensino Regular, por meioda produção do material didático pedagógico em braille e sua transcrição paraa escrita comum, até mesmo assessorando em provas, testes de concursos,vestibulares, entre outros. Esse serviço é destinado, prioritariamente, a alunoscegos ou de baixa visão matriculados na Rede Pública Estadual desde aEducação Infantil a Superior. O CAP no RN possui unidades em três municípios:Natal, Mossoró e Currais Novos.

••••• Centro estadual de capacitação de educadores e de atendimento às pessoasCentro estadual de capacitação de educadores e de atendimento às pessoasCentro estadual de capacitação de educadores e de atendimento às pessoasCentro estadual de capacitação de educadores e de atendimento às pessoasCentro estadual de capacitação de educadores e de atendimento às pessoascom surdez:com surdez:com surdez:com surdez:com surdez: projeto instituído pela Secretaria de Educação Especial do Ministérioda Educação, em parceria com os estados, visando oferecer subsídios aos sistemasde ensino para o atendimento aos educandos com deficiência auditiva e surdos.Esse Centro capacita e orienta profissionais da educação da rede regular deensino, assegurando o princípio da igualdade e da oportunidade naescolarização, bem como oferece apoio pedagógico aos educandos surdos eorientação as suas famílias. O CAS no RN possui unidades em dois municípios:Natal e Mossoró.

••••• Núcleo de altas habilidades/superdotação:Núcleo de altas habilidades/superdotação:Núcleo de altas habilidades/superdotação:Núcleo de altas habilidades/superdotação:Núcleo de altas habilidades/superdotação: projeto instituído pela Secretaria deEducação Especial do Ministério da Educação, em parceria com os estados,visando oferecer subsídios aos sistemas de ensino para o atendimento a alunoscom nível de aprendizagem escolar acima da média, de sua faixa etária, série e/ou habilidades específicas, tais como pintura, dança, música, esporte e outras.Esse Núcleo encontra-se em fase de implantação de seu atendimento, contandocom uma equipe interdisciplinar já capacitada pelo MEC/Seesp.

••••• Salas de Apoio PSalas de Apoio PSalas de Apoio PSalas de Apoio PSalas de Apoio Pedagógico Especializada (Sapes): edagógico Especializada (Sapes): edagógico Especializada (Sapes): edagógico Especializada (Sapes): edagógico Especializada (Sapes): Apoio Pedagógico oferecidono espaço escolar para alunos com necessidades educacionais especiais, emturno contrário ao de sua aula. Esse Apoio funciona em 10 (dez) escolas da redepública estadual em Natal e 38 (trinta e oito) salas de apoio distribuídas nasDireds.

••••• Oficinas de linguagem:Oficinas de linguagem:Oficinas de linguagem:Oficinas de linguagem:Oficinas de linguagem: Serviço pedagógico oferecido aos educandos queapresentam dificuldades na área da comunicação e expressão: oral e escrita.

3.2 Eliminação de barreiras físicas e ambientais nas escolas3.2 Eliminação de barreiras físicas e ambientais nas escolas3.2 Eliminação de barreiras físicas e ambientais nas escolas3.2 Eliminação de barreiras físicas e ambientais nas escolas3.2 Eliminação de barreiras físicas e ambientais nas escolas

••••• Acessibilidade física e ambiental das escolas:Acessibilidade física e ambiental das escolas:Acessibilidade física e ambiental das escolas:Acessibilidade física e ambiental das escolas:Acessibilidade física e ambiental das escolas: a Secretaria Estadual de Educaçãoe Cultura (Seec/RN) tem buscado eliminar as barreiras arquitetônicas e ambientaisdas escolas, por meio de reformas nos seus prédios e construção de novos

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estabelecimentos já adaptados. Boa parte dessas intervenções são feitas comrecursos próprios do estado e, outras, via projeto MEC/FNDE/Seesp.

••••• Equipamentos e materiais pedagógicos para as escolas: Equipamentos e materiais pedagógicos para as escolas: Equipamentos e materiais pedagógicos para as escolas: Equipamentos e materiais pedagógicos para as escolas: Equipamentos e materiais pedagógicos para as escolas: aquisição deequipamentos, materiais e mobiliários escolares fundamentais para odesenvolvimento das atividades pedagógicas, em classes comuns do EnsinoRegular, nos Centros Especializados, Salas de Apoio Pedagógico e/ou Salas deRecursos Multifuncionais. Algumas dessas aquisições são com recursos própriosdo estado e, outras, via projetos MEC/FNDE/Seesp.

••••• TTTTTransporte Escolar Adaptado: ransporte Escolar Adaptado: ransporte Escolar Adaptado: ransporte Escolar Adaptado: ransporte Escolar Adaptado: A Seec/RN, mesmo sabendo que as frotas detransportes públicos devem garantir o direito de ir e vir de todas as pessoas,adquiriu com recursos próprios, em 2005, 3 (três) microônibus adaptados apessoas com deficiências motoras graves, com o objetivo de garantir seu acessoe permanência na escola e em atendimentos especializados oferecidos porinstituições/associações não governamentais, em dois turnos diários.

3.3 Programa de formação continuada3.3 Programa de formação continuada3.3 Programa de formação continuada3.3 Programa de formação continuada3.3 Programa de formação continuada

Realização de cursos de capacitação para professores, equipes técnicas dasescolas estaduais, coordenações de educação especial nas Direds, centros de apoioespecializados, salas de apoio pedagógico e organizações não-governamentais deatendimento especializado, com o objetivo de compartilhar saberes quefundamentem a prática pedagógica dos educadores, favorecendo assim, aaprendizagem dos alunos com necessidades educacionais especiais em classes comunsdo Ensino Regular.

4 Refletindo sempre para não concluir4 Refletindo sempre para não concluir4 Refletindo sempre para não concluir4 Refletindo sempre para não concluir4 Refletindo sempre para não concluir

É notório que avançamos muito na garantia dos direitos fundamentais da pessoahumana. A educação como um direito social para todos reveste-se em um passoimportante para a conquista e usufruto de outros direitos. Entre eles, o direito das pessoascom necessidades educacionais especiais conviverem com qualidade em uma escolaverdadeiramente inclusiva. Esse é nosso sonho, essa é a nossa busca.

Bem sabemos que essa conquista exige uma mudança de foco, causa-nosperplexidades por que desmonta com a seletividade social, com a seriaçãocompartimentalizada do conhecimento e com nossas prisões ideológicas eracionalistas.

Incluir a todos sem exceção é um exercício doloroso, é um aprendizado que exigecrescimento pessoal e proporciona uma identidade social saudável, rica e humana. É poressas e outras teses que acreditamos na escola como um espaço privilegiado de trocas

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democráticas, de saberes compartilhados e de respeito as múltiplas culturas que formamseu mosaico.

Como todo o processo exige, estamos sempre refletindo sobre nossas práticas,removendo novas barreiras, articulando frentes para novos desafios e essencialmenteacreditando que é possível aprender na diferença para sermos diversos.

ReferênciasReferênciasReferênciasReferênciasReferências

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COSTA, Disiane de Fatima Araujo da. PPPPPortadores de deficiência ortadores de deficiência ortadores de deficiência ortadores de deficiência ortadores de deficiência ------ inclusão de alunos- inclusão de alunos- inclusão de alunos- inclusão de alunos- inclusão de alunosnas classes comuns da rede regular de ensinonas classes comuns da rede regular de ensinonas classes comuns da rede regular de ensinonas classes comuns da rede regular de ensinonas classes comuns da rede regular de ensino: abordagem de direitos e processos deefetivação. 2. ed. Natal/RN: Efe Três D, 2006.

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Trajetória da Educação Especial no RN: da integração à inclusão

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Educação Inclusiva: um processo em construçãoEducação Inclusiva: um processo em construçãoEducação Inclusiva: um processo em construçãoEducação Inclusiva: um processo em construçãoEducação Inclusiva: um processo em construção

Mércia Maria Melo dos Santos1

[email protected]

Por que precisamos pensar em uma política de inclusão?É possível refletir no que significa incluir? Há tantos excluídos que talvez fosse mais

fácil falar de exclusão.A inclusão muitas vezes ainda nos parece complexa, difusa, inviável, improvável...A inclusão é um processo dinâmico, envolvente, participativo, educativo e

profundamente social. Por meio dela, aprendemos a vivermos juntos uns com os outrosnas nossas diferenças, nos enriquecendo e, ao mesmo tempo, desenvolvendo valoresmais humanos de respeito e aceitação do outro.

Observamos que aceitamos melhor o sentido de diferenças quando elas não afetamo compartilhar dos nossos direitos com aqueles que não consideramos nossos pares.Assim, como fica essa tal diferença expressa na presença de deficiências sejam elas físicas,mentais, sensoriais, comportamentais, etc?

As diferenças são construídas histórica, social e politicamente. As diferenças sãosempre diferenças e existem independentemente da autorização, da aceitação e dorespeito por elas.

Como pessoas vivemos em diferentes espaços sociais. Como fica a presença depessoas com deficiências/diferentes nas várias instituições sociais? E na escola?

1 A escola persegue o direito de todos?1 A escola persegue o direito de todos?1 A escola persegue o direito de todos?1 A escola persegue o direito de todos?1 A escola persegue o direito de todos?

Atualmente, já parece que há um entendimento sobre ela como um direito detodos, mas como fica a qualidade dessa educação?

Ter acesso à escola não é tarefa tão fácil, melhorou nos últimos anos e até podemosobservar grande avanços.

No entanto, como fica a educação de todos em um espaço que sempre foi tãoseletivo, elitista e excludente? Podemos acrescentar que diante de um olhar mais atrás,já encontramos palpáveis mudanças.

1 Professora Especialista. Gerente de Educação Especial. Secretaria de Educação, Esporte e Lazer – Prefeitura do Recife.

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Graças às leis e às iniciativas do poder público é possível observar que documentosinternacionais são assinados com o firme propósito de implantar uma política pública deeducação para todos. Também se trabalha na direção da inclusão, para romper com asdiscriminações, as exclusões, com as barreiras que impedem milhares de crianças e jovense adultos terem acesso à escola.

Em um país com tanta desigualdade, a primeira providência é trabalhar para educaro povo para a necessidade de romper com marcas dolorosas de uma história de exclusãologo, a escola é o foco de ação governamental nesse sentido.

Fazem-se necessárias também outras ações políticas e, para tanto, se utilizar dealguns recursos e de reformas em políticas focalizadas.

A Educação Especial no Município de Recife, com base na política de inclusãosocial da Rede, vem procurando desenvolver ações que atendam e amplie o direitoeducacional dos alunos com necessidades especiais, desde a educação infantil, ensinofundamental, educação de jovens e adultos até o ensino médio. O Censo Educacionalde 2000 constatou que existiam 706 alunos com necessidades educacionais especiaisinclusos nas escolas municipais do Recife e que de 2000 a 2004 esse percentual cresceu71,9%. Temos 111 escolas que possuem alunos inclusos. O atendimento nas crechesmunicipais cresceu 200% em quatro anos.

2 Os avanços acontecem2 Os avanços acontecem2 Os avanços acontecem2 Os avanços acontecem2 Os avanços acontecem

Hoje, contamos com 1.164 alunos especiais participando das Escolas da RedeMunicipal de Recife, nas mais variadas áreas:

Inclusão em creche – Condutas típicas. Creche Municipal VInclusão em creche – Condutas típicas. Creche Municipal VInclusão em creche – Condutas típicas. Creche Municipal VInclusão em creche – Condutas típicas. Creche Municipal VInclusão em creche – Condutas típicas. Creche Municipal Vovô Arturovô Arturovô Arturovô Arturovô Artur

Educação Inclusiva: um processo em construção

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IV Seminário Nacional de Formação de Gestores e Educadores

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• Altas habilidades;• Baixa visão;• Cegueira;• Deficiência física;• Paralisia cerebral;• Deficiência mental;• Múltiplas deficiências;• Pessoas com surdez;• Surdocegueira;• Síndromes; e• Transtornos invasivos do desenvolvimento.

3 Educação é um direito de todos?3 Educação é um direito de todos?3 Educação é um direito de todos?3 Educação é um direito de todos?3 Educação é um direito de todos?

Enquanto uns defendem que a escola é o espaço de conhecimento, socialização,domínio de habilidades para a vida futura, outros defendem que a escola é um espaçode favorecimento para o desenvolvimento social, das habilidades, para a ruptura deestereótipos e fortalecimento da socialização.

Vemos uma gradativa transformação no sistema educacional inclusivo e um focoespecífico para aqueles que são vulneráveis à marginalização e exclusão. A EducaçãoInclusiva diz respeito à capacidade de atender a todos, até mesmo aos superdotados.

Grupo de leituras do complexoGrupo de leituras do complexoGrupo de leituras do complexoGrupo de leituras do complexoGrupo de leituras do complexo Estudos sobre leituras do complexoEstudos sobre leituras do complexoEstudos sobre leituras do complexoEstudos sobre leituras do complexoEstudos sobre leituras do complexoPPPPParceria NAAH/S/Psicologiaarceria NAAH/S/Psicologiaarceria NAAH/S/Psicologiaarceria NAAH/S/Psicologiaarceria NAAH/S/Psicologia

Cognitiva Cognitiva Cognitiva Cognitiva Cognitiva ------ UFPE- UFPE- UFPE- UFPE- UFPE

Oficina de músicaOficina de músicaOficina de músicaOficina de músicaOficina de música

Aluno com baixa visão em classe regular e deficiência físicaAluno com baixa visão em classe regular e deficiência físicaAluno com baixa visão em classe regular e deficiência físicaAluno com baixa visão em classe regular e deficiência físicaAluno com baixa visão em classe regular e deficiência físicaEscola Municipal Reitor João AlfredoEscola Municipal Reitor João AlfredoEscola Municipal Reitor João AlfredoEscola Municipal Reitor João AlfredoEscola Municipal Reitor João Alfredo

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Entendemos também que Educação Inclusiva não se refere somente às pessoascom deficiência, assim o atendimento complementar para aqueles que apresentam AltasHabilidades precisa ser concretizado para que os potencias existentes não sejamdesperdiçados.

É possível reinventar a escola com o objetivo de atender toda a diversidade humana.

4 Mas não basta a inclusão física4 Mas não basta a inclusão física4 Mas não basta a inclusão física4 Mas não basta a inclusão física4 Mas não basta a inclusão física

Como fazer? Pensa-se que a tarefa é mais árdua do que ela se apresenta nos textoslegais uma vez que entre o legal, o legítimo, há o afetivo que não pode e não deve serdesconsiderado.

É possível modificar essa realidade excludente? Faz-se necessário tomar esse projetode escola para todos nas mãos de cada um, sem delegar ao outro o que é deresponsabilidade nossa.

Precisam ser gerados serviços de apoio para um processo inclusivo, pressupondouma ação coletiva que modifique a essência do sistema educacional. Não é possíveldiscriminar aqueles que não aprendem como os outros, olhando a diversidade humanaexistente em cada comunidade escolar. O aluno e família fazem parte do processoeducacional e é necessário que todos sejam participantes desse mesmo processo.

A Escola Inclusiva precisa valorizar a diversidade como um recurso valioso para avida escolar e para o desenvolvimento de todos.

O desenvolvimento físico deve ser também perseguido quando visamos à totalidadedo ser humano, daí a necessidade de um investimento de corpo para um desenvolvimentointegral do aluno.

Natação adaptada no Sport Clube do RecifeNatação adaptada no Sport Clube do RecifeNatação adaptada no Sport Clube do RecifeNatação adaptada no Sport Clube do RecifeNatação adaptada no Sport Clube do Recife

Educação Inclusiva: um processo em construção

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Natação adaptada no Sport Clube do RecifeNatação adaptada no Sport Clube do RecifeNatação adaptada no Sport Clube do RecifeNatação adaptada no Sport Clube do RecifeNatação adaptada no Sport Clube do Recife Projeto Judô para Vida no Sport Clube do RecifeProjeto Judô para Vida no Sport Clube do RecifeProjeto Judô para Vida no Sport Clube do RecifeProjeto Judô para Vida no Sport Clube do RecifeProjeto Judô para Vida no Sport Clube do Recife

XXII Jogos Escolares das Escolas Municipais do RecifeXXII Jogos Escolares das Escolas Municipais do RecifeXXII Jogos Escolares das Escolas Municipais do RecifeXXII Jogos Escolares das Escolas Municipais do RecifeXXII Jogos Escolares das Escolas Municipais do Recife

5 Serviços de apoio5 Serviços de apoio5 Serviços de apoio5 Serviços de apoio5 Serviços de apoio

Para funcionar como facilitador nesse processo de inclusão se faz necessária umaequipe interdisciplinar bem articulada, competente para trabalhar com os recursoshumanos e materiais envolvidos nas escolas.

Os professores especializados precisam envolver toda comunidade escolar e tambémas famílias para que esses alunos tenham espaço aberto na sociedade.

Contamos em Recife com Professor Especializado, Salas de Apoio PedagógicoEspecializado (Sapes), os Centros de Apoio Pedagógico (CAPs) e Classe Especial, nas escolasregulares da rede de Ensino.

Não basta implantar os serviços, é preciso trabalhar em um projeto de reconstruçãoconstante para que a escola exerça o seu papel social.

As mudanças são necessárias para que os serviços não mantenham a dicotomiaentre regular/comum e especial, perpassando por uma revisão curricular e avaliação do

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desempenho escolar. A gestão escolar e o envolvimento da comunidade poderão estarorganizados na elaboração do projeto pedagógico inclusivo da escola.

A Educação Inclusiva é bastante abrangente e vai além das primeiras séries, passandopor todas as etapas do aprendizado, atingindo também a Educação de Jovens e Adultos,contando até mesmo com a profissionalização dos mesmos.

Logo, devemos lutar pela reorganização e reestruturação de nossas escolas ecombater toda forma de discriminação, universalizando o acesso à educação para todos,respeitando as necessidades individuais.

Seja a Educação Inclusiva uma prática de vida escolar e social na qual possa atenderde forma racional, responsável e responsiva às necessidades de seus cidadãos.

É inegável que precisamos continuar caminhando para superar preconceitos esegregação, isso é um desafio que depende de um esforço coletivo: do governo, dasociedade, professores, gestores, alunos, família e todos que estão envolvidos no processoda educação.

É necessário que a Educação Inclusiva esteja alicerçada na democracia e naautonomia.

ReferênciasReferênciasReferênciasReferênciasReferências

JERUSALINSKY, A. Psicanálise e desenvolvimento infantilPsicanálise e desenvolvimento infantilPsicanálise e desenvolvimento infantilPsicanálise e desenvolvimento infantilPsicanálise e desenvolvimento infantil. Porto Alegre: Artes e Ofícios,2000.MEC. Educação inclusiva, documento subsidiário à política de inclusãoEducação inclusiva, documento subsidiário à política de inclusãoEducação inclusiva, documento subsidiário à política de inclusãoEducação inclusiva, documento subsidiário à política de inclusãoEducação inclusiva, documento subsidiário à política de inclusão. Brasília:Secretaria de Educação Especial, 2007.

MONTOYA, A.O.D. PPPPPiaget e a criança faveladaiaget e a criança faveladaiaget e a criança faveladaiaget e a criança faveladaiaget e a criança favelada: epistemologia genética, diagnóstico esoluções. Petrópolis: Vozes, 1996.

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Educação Inclusiva: um processo em construção

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A construção da Escola Inclusiva: uma meta possívelA construção da Escola Inclusiva: uma meta possívelA construção da Escola Inclusiva: uma meta possívelA construção da Escola Inclusiva: uma meta possívelA construção da Escola Inclusiva: uma meta possível

Rita Vieira de Figueiredo1

[email protected]

Para transformar a nossa escola em uma escola que acolhe e inclui todas as crianças,é preciso que os gestores escolares e os dirigentes educacionais tenham consciência daurgência em se fazer investimentos de natureza diversas nas nossas redes de ensino. Noentanto, inicio meu discurso sobre a construção da Escola Inclusiva refletindo sobre umdesses investimentos: a formação do professor. Gosto de pensar na formação deprofessores (inspirada no poema de Guimarães Rosa) sob a perspectiva de que o belo davida é essa possibilidade de que todos nós somos inacabáveis, estamos sempre mudando,afinando (acertando) e desafinando (errando). Essa talvez seja a Verdade Maior e oaprendizado da própria existência, da própria vida.

O permanente movimento na sociedade humana implica o redimensionamentode papéis das agências ou instituições sociais e dos profissionais que as integram. Nessecontexto, a formação de professores passa por uma redefinição das competências e dasprincipais funções a eles atribuídas. A formação inicial, bem como a formação continuadade professores visando à inclusão de todos os alunos e o acesso deles ao ensino escolar,precisa levar em conta princípios de base que os instrumentalizem para a organizaçãodo ensino e a gestão da classe, bem como princípios éticos, políticos e filosóficos quepermitam a esses profissionais compreenderem o papel deles e da escola diante do desafiode formar uma nova geração capaz de responder as demandas do nosso século. No queconsiste a educação, o cotidiano da escola e da sala de aula exige que o professor sejacapaz de organizar as situações de aprendizagem considerando a diversidade de seusalunos. Essa nova competência implica a organização dos tempos e dos espaços deaprendizagem, nos agrupamentos dos alunos e nos tipos de atividades para elesplanejadas. Dentre outros aspectos do ensino e da gestão da classe, oferecer umavariedade e uma sequenciação organizada de atividades, facilita a possibilidade de realizarum programa educativo adaptado às necessidades reais dos alunos para que possamadquirir e consolidar suas aprendizagens. Nessa perspectiva de ensino, o professor situa-secomo mediador, considerando aspectos tais como: atenção às diferenças dos alunos; a

1 Professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Ceará. Doutora (Ph.D) em psicopedagogia pela UniversitéLaval, Québec, Canada.

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importância de oferecer diferentes situações de aprendizagem; a organização dos alunosde forma que possibilite interações em diferentes níveis, de acordo com os propósitoseducativos (grupo-classe, grupos pequenos, grupos maiores, grupos fixos).

Para ser capaz de se situar em uma nova organização de ensino e de gestão daclasse o professor precisa redimensionar seu sistema de crenças e valores. Dentre asdiversas crenças que respaldam as práticas pedagógicas, ainda é muito forte a idéia decontrole, especialmente no que se refere ao espaço da sala de aula. As mesas e ascadeiras ainda são organizadas de forma que todos dirijam o olhar para a professora,que, na maioria das vezes, está na frente dando as orientações do que os alunos devemfazer e, quase sempre, utilizando o quadro. Os materiais didáticos pedagógicos nãoficam ao alcance das crianças, a professora controla o material e a forma como espaçoé organizado.

De acordo com Soares e Figueiredo (2007), o espaço é realmente um elementoessencial da abordagem educacional; É preciso revisitar essa noção de espaço educativo:o espaço em torno da escola; espaço hospitaleiro e acolhedor; espaço apropriado paradiferentes idades e níveis de desenvolvimento; espaço organizado e espaço ativo; espaçoque documenta; espaço que ensina. Compreender esse espaço é compreender uma gamade possibilidades partindo da prática educativa dos professores.

Para organizar situações de ensino e o espaço da sala de aula com o intuito quetodos os alunos possam ter acesso a todas as oportunidades educacionais e sociaisoferecidas pela instituição escolar, gestores e professores devem ter consciência de que oensino tradicional deverá ser substituído por uma pedagogia de atenção à diversidade.

O paradigma de escola que inclui, remete à reflexão de conceitos relativos àdiversidade e à diferença. É importante assinalar -- embora pareça óbvio -- que diversidadee diferenças são manifestações eminentemente humanas, elas resultam das diferençasraciais e culturais, e também das respostas dos indivíduos relativamente à educação nassalas de aula. A diversidade é tão natural quanto a própria vida. Essa diversidade é formadapelo conjunto de singularidades, mas também pelas semelhanças, que une o tecido dasrelações sociais. Entretanto, parece que, na tentativa de garantir a promoção da igualdade,a escola está confundindo diferenças com desigualdades. Aquelas são inerentes aohumano enquanto estas são socialmente produzidas. As diferenças enriquecem, ampliam,são desejáveis porque a identificação/diferenciação, contribuem para o crescimento. Asdesigualdades, ao contrário, produzem inferioridade.

A escola, para se tornar inclusiva, deve acolher todos os seus alunos,independentemente de suas condições sociais, emocionais, físicas, intelectuais,lingüísticas, entre outras. Ela deve ter como princípio básico desenvolver umapedagogia capaz de educar e incluir a todos, aqueles com necessidades educacionaisespeciais, e também os que apresentam dificuldades temporárias ou permanentesna escola, pois a inclusão não se aplica apenas aos alunos que apresentam algumtipo de deficiência.

A construção da Escola Inclusiva: uma meta possível

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Na compreensão de Booth e Ainscow (2000), a inclusão e a exclusão exprimem-sepor três dimensões inter-relacionadas. São elas: política inclusiva, cultura inclusiva epráticas inclusivas. A primeira refere-se à inclusão como o centro do desenvolvimento ede transformação da escola, permeando todas as ações que visem à melhoria daaprendizagem e à participação de todos os alunos. Com efeito, são consideradas comoapoio às atividades que ampliem e fortaleçam a capacidade da escola de responder, deforma eficaz, à diversidade dos seus alunos. Esse aspecto deve ser uma meta primordialdos gestores educacionais

A dimensão da cultura inclusiva traz a possibilidade de se criar na escola umacomunidade acolhedora e colaboradora, em que todos sejam respeitados e valorizados.A comunidade inclusiva é a base para que todos os alunos obtenham êxito em suasaprendizagens.

A dimensão das práticas educativas reflete as duas já apresentadas: a políticae a cultural. Esse aspecto assegura que todas as atividades, tanto as de sala de aulacomo as extra-escolares, promovam a participação e o engajamento de todos osalunos, considerando os seus conhecimentos e as suas vivências dentro ou fora doâmbito escolar. Nessa perspectiva, o ensino e os apoios se integram, a fim depromover, gerir e suprir barreiras nas aprendizagens, bem como nas dificuldadesde participação efetiva do todos os alunos nas práticas pedagógicas. De acordocom Booth e Ainscow (2000), a mudança necessária para tornar a escola inclusivatransita pelas três dimensões. Desse modo, é o desenvolvimento de uma culturainclusiva que possibilita mudanças na política e, conseqüentemente, nas práticaspedagógicas. Assim, é fundamental olhar para escola na sua totalidade e articularas práticas educativas e intervenções no interior da escola na óptica dessasdimensões.

Para que o respeito a diversidade se efetive nas práticas educativas se faz necessárioum clima global sensível, que possibilite melhorar a situação de cada membro dacomunidade educativa, pautada no compromisso e nas atitudes, em que alunos, gestorese professor se percebam partícipes de uma comunidade em que possam encontrar apoiomútuo.

No percurso da inclusão os professores irão ampliar e elaborar suas competênciase habilidades a partir das experiências que já têm. A formação continuada considera aformulação dos conhecimentos do professor, sua prática pedagógica, seu contexto social,sua história de vida, suas singularidades e os demais fatores que o conduziram a umaprática pedagógica acolhedora.

Nessa perspectiva, os professores também são aprendentes. Leva-se em conta adiversidade e as diferenças que compõem o corpo docente da escola. É nesse lugar queo professor avança no modo de produzir a sua ação e, assim, vai transformando a suaprática. De acordo com Soares e Figueiredo (2007),

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2 O texto completo está publicado no Encontro de Pesquisa Educacional do Norte Nordeste (EPENN), Maceió, julho, 2007.

Para transformar a escola é importante considerar o ponto de vista de cadaprofessor, respeitar as diferenças de percursos, pois, apesar destes profissionaiscompartilharem experiências semelhantes, cada um reage de acordo com ascaracterísticas de sua personalidade, seus recursos intelectuais, emocionais,afetivos, seu estilo de aprendizagem, crenças, experiências pessoais eprofissionais, entre outras. É importante ter uma escuta da prática pedagógicadestes profissionais, criar situações para que possam refletir sobre o que significaaquela forma de atuar em sala de aula. Portanto, não se pode esperar que, naformação dos professores, todos desenvolvam no mesmo ritmo e no mesmonível todas as competências necessárias ao trabalho profissional.

Com bases nos princípios da escola inclusiva, a formação dos professores só poderáacontecer inscrita no espaço coletivo, que possibilitará uma mudança de cultura na escola,criando mecanismos para o desenvolvimento de uma cultura colaboradora, em que areflexão sobre o próprio trabalho pedagógico seja um de seus componentes. Assim, educarna diversidade implica também vias formativas, que contemplam aspectos: teóricos epráticos que refletem nas bases atitudinais de todos os profissionais da escola. A atençãoao princípio da diversidade assegura que todos os alunos possam dividir um espaço deaprendizagem, de interação e cooperação, no qual professores, alunos, adultos, crianças efamílias possam conviver com semelhanças e diferenças, o que legitima o contexto dadiversidade. O sentimentos dos professores nesse processo de construção de uma práticainclusiva é vivido de forma bastante peculiar por cada um deles que se mobiliza para essaexperiência. Para ilustrar esse processo, permito-me apresentar aqui um texto escrito poruma professora da rede municipal de Fortaleza que embarcou no desafio de transformaçãoda sua prática pedagógica. Finalizo minhas reflexões desejando que a voz a dessa professorapossa ser porta-voz de tantas outras que, no anonimato do cotidiano, lutam para transformara escola brasileira em uma escola de qualidade para todas as nossas crianças.

Relato da experiência: a voz da professoraRelato da experiência: a voz da professoraRelato da experiência: a voz da professoraRelato da experiência: a voz da professoraRelato da experiência: a voz da professora22222

Bem vindo à Holanda 1987 por Emily Perl Knisley

“Ter um bebê é como planejar uma fabulosa viagem de férias para a Itália!Você compra um monte de guias, conhece a moeda local, faz um curso de

A construção da Escola Inclusiva: uma meta possível

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línguas, em fim faz planos maravilhosos! O Coliseu. O Davi de Michelangelo.As gôndolas de Veneza. É tudo muito excitante. Após meses de antecipação,finalmente chega o grande dia! Você arruma as malas e embarca. Algumashoras depois você aterrissa. O comissário de bordo chega e diz: – “Bemvindo à Holanda!”. –“Holanda!?!” diz você –“o que quer dizer comHolanda!?!? Eu escolhi Itália! Eu deveria ter chegado à Itália. Toda minhavida eu sonhei em conhecer a Itália”. Mas houve uma mudança de planode vôo. Eles aterrissaram na Holanda e é lá que você deve ficar. A coisamais importante é que eles não te levam a um lugar horrível, desagradável,cheio de pestilência, a fome e doença. É apenas um lugar diferente. Logovocê deve sair e comprar novos guias. Deve aprender uma nova linguagem.E você irá encontrar um novo grupo de pessoas que nunca encontrou antes.É apenas um lugar diferente. É mais baixo e menos ensolarado que a Itália.Mas, após alguns minutos, você poderá respirar fundo e olhar ao redor...E começar a notar que a Holanda tem moinhos de vento, tulipas e atéRembrants e Van Goghs. Mas, todos que você conhece estão ocupadosindo e vindo da Itália... E estão sempre comentando sobre o tempomaravilhoso que passaram lá. E você dirá: “Sim, lá era onde deveria estar.Era tudo o que eu havia planejado”. Porém... Se você passar a sua vidaremoendo o fato de não haver chegado à Itália nunca estará livre paraapreciar as coisas belas e muito especiais... Sobre a Holanda”.

Sou professora de Educação Infantil há 16 anos e venho por meio desse relatodescrever um pouco sobre como foi receber uma criança com Síndrome de Down naminha sala de aula. Gostaria de comentar primeiramente que esse trecho, que utilizocomo abertura dessa escrita, exemplifica um pouco o meu sentimento como educadora,ao receber pela primeira vez em minha sala de aula uma criança com Síndrome de Down.Quando li esse texto, percebi que eu me sentia como essa mãe que estava à espera deuma criança normal. Como educadora, eu realmente havia me preparado para fazer essaviagem à Itália e estive lá durante muito tempo da minha história como professora, mas,de repente houve uma mudança no plano de vôo e eu aterrissei em outro país. Eu mesenti assim no momento em que eu recebi a Emanuela, aluna de 8 anos, em minha salade 1ª série do ensino fundamental regular.

Logo que soube que uma criança com deficiência mental viria para minha sala,senti-me muito insegura e ansiosa (as pessoas temem o que não conhecem ou o queainda não vivenciaram, isso é fato!). Eu não acreditava que alunos com deficiênciaconseguiriam aprender e pensava que ter uma criança com deficiência mental em classepoderia, no máximo, trabalhar sua linguagem oral, socialização e coordenação motoraampla e fina. Quando muito, acreditava nos benefícios para a própria pessoa comdeficiência sem, contudo, pensar que esses benefícios poderiam ocorrer para os demaisalunos e para os adultos que compunham o corpo de profissionais da escola, até mesmopara mim, como pessoa e como educadora. Foi necessário rever meus conceitos e

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práticas. Sempre levei em conta as diferenças na aprendizagem de todos os meusalunos, reconhecia que cada um aprende de uma forma e em um ritmo próprio. Adiferença foi agora tomar consciência disso na prática. A Emanuela me fez ver isso!

A socialização de Emanuela com o grupo não poderia ter sido melhor. A alunachegou ao mês de agosto, começo do segundo semestre do ano letivo de 2006. Percebique logo no início, ao seguir com ela na fila até a sala de aula, muitas pessoas nos olhavamcom curiosidade. Algumas mães chegaram a me perguntar: Você é a professora daquelameninazinha?!

As crianças de sala a acolheram com alegria e a perceberam fisicamente como outracriança qualquer. Emanuela interagiu desde o começo muito bem com os colegas,participando dos momentos de rodinha, no qual se expressava livremente sobre osassuntos abordados na aula. Ela sempre se coloca e fala suas opiniões.

A inclusão vem gerando tolerância e aprendizagem para os que estão diariamentena escola e para a comunidade em geral. A chegada dessa aluna provocou uma grandereflexão em todos da escola. Durante processo de adaptação de Emanuela, em algunsmomentos, o grupo cobrou dela o cumprimento de regras que foram estabelecidas noinício do ano, afinal, o grupo já constituído e consciente das regras estabelecidas, nãoaceitava o descumprimento dessas regras. Em uma conversa com a pesquisadora quevem acompanhando o processo de inclusão da Emanuela na escola, discuti sobre esseaspecto e a sua indicação foi a de que eu deveria agir com a circunstância da mesmaforma como conduziria com qualquer outra criança. Então, percebi a necessidade deconversarmos sobre o assunto na sala, com a presença da Emanuela, pois era uma novaintegrante que deveria estar a par dos combinados de convivência desse grupo que agorafazia parte. As regras passaram a ser lidas diariamente, o que anteriormente a sua entrada,não era mais necessário, exceto ocorresse alguma transgressão, uma vez que o grupo jáas tinha internalizado.

No decorrer de algumas atividades desenvolvidas em sala, percebi que o grupoverbalizava a forma com que ela participava e realizava algumas produções, por exemplo:o nível do seu desenho, de sua evolução escrita, a velocidade com que realizava as tarefaspropostas, a dificuldade de percepção que manifestava em algumas situações... Essacircunstância percebida por mim na sala de aula, me despertou para a necessidade detrazer uma discussão sobre as diferenças na sala de aula a fim de fomentar o respeito e avalorização destas diferenças. Como no início do ano tínhamos trabalhado o assuntocorpo humano, decidi rever esse conteúdo, agora em uma perspectiva inclusiva.Observamos e discutimos sobre as características físicas das pessoas: peso, altura, cor dapele, cabelo, olhos, sobre os sentimentos de tristeza, alegria, sobre gostos etc. Assim,juntos percebemos que todos são diferentes, pensam diferentes, agem diferentes, e quedevemos respeitar essas diferenças humanas. Muitas histórias (poesia, músicas, literaturainfantil) que tratavam sobre esse assunto foram contadas, desenhadas, copiadas e/oureescritas em grupo.

A construção da Escola Inclusiva: uma meta possível

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Em relação ao planejamento pedagógico para as aulas, no início, eu fazia comosempre fiz, não tinha nenhuma alteração maior, mas com a chegada de Emanuela, emalguns momentos, eu senti cada vez mais a necessidade de, em alguns momentos, utilizarestratégias que promovessem o seu aprendizado, mas não sabia quais. Hoje, acrescentojá desde o planejamento, atividades e/ou estratégias que utilizarei com ela, caso ela nãoacompanhe o ritmo do grupo ou as proposições feitas. Outros alunos se beneficiaramenormemente dessas mesmas estratégias e apoios ofertados.

Nessa caminhada para Educação Inclusiva tive o total apoio da pesquisadora dauniversidade Federal do Ceará que me acompanha e que ali faz um trabalho sobre aatenção à diversidade e a construção de uma escola inclusiva, acolhedora e deaprendizagem para todos os alunos. Assim, no dia-a-dia, fui impelida a me tornar umaprofessora-pesquisadora sobre a deficiência e fui buscando estratégias escolares eprocedimentos didáticos mais adequadas para trabalhar com a Emanuela e com a minhaturma toda. Algumas dessas estratégias fracassaram, não surtiam o efeito esperado, outraseu percebia que se adequavam mais, que ela respondia melhor, que ocasionavam melhorenvolvimento da aluna e, portanto, cumpriam sua função pedagógica de fazê-la avançarna construção de conhecimentos, da consolidação de novas aprendizagens, fazendo-aavançar no plano do desenvolvimento global. Fui fazendo opções por procedimentosque lhe proporcionassem mais autonomia e interação com o grupo. A cada dia aprendoum pouco mais com ela, observando-a, utilizando novas estratégias que possam de algumaforma favorecer cada vez mais o seu desenvolvimento social e cognitivo.

Nas minhas observações, tendo o foco sobre a Emanuela, a busca era identificarsuas potencialidades e suas necessidades, além da seleção das formas de apoio quepoderiam melhor ajudá-la a superar as dificuldades. Percebi que ela participava dassituações recreativas com mais satisfação. A partir dessa constatação, passei a planejarmais atividades corporais e artísticas, para o grupo, visando principalmente a Emanuela.Assim, explorava cada vez mais as atividades que desenvolvessem percepções,coordenação motora, seqüência de movimentos, ritmos, etc. Emanuela executava essasatividades de forma mais lenta, mas sempre chegava ao objetivo proposto. Em todas assituações de sala, eu procurava estar sempre ao seu lado, estimulando-a e orientando-ano que fosse necessário para que ela concluísse a tarefa.

Percebi também o quanto à turma toda ganhava com a sua presença; vi também aimportância de não priorizar somente à aprendizagem dos conteúdos educacionais emdetrimento da aprendizagem da vida. Comecei a perceber suas respostas em diversosmomentos da roda (momento principal em que socializamos os assuntos estudados,conversamos, ouvimos histórias, cantamos, rezamos) e a identificar que Emanuelademonstrava coerência em relação ao assunto. Eu sempre estava estimulando-a a falar:Emanuela demonstra um vocabulário rico em palavras, mesmo algumas sendopronunciadas com dificuldades.

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Nas atividades que tinham como objetivo favorecer a escrita e a leitura, Emanuela aprincípio, não se interessava muito, sempre que solicitada a participar juntamente comseu grupo demonstrava inquietação e desinteresse, não concluindo a atividade. Passei aficar mais perto dela, interferindo, perguntando, estimulando e parabenizando pelosseus progressos e mostrando a turma o que ela realizava (faço isso comumente com osalunos do grupo). Observei seu nível de escrita e a planejei situações didáticas objetivandointerações com crianças de outros níveis, fazendo agrupamentos, favorecendo a cooperaçãoe oportunizando a troca de conhecimentos entre todos. Emanuela encontra-se no nível pré-silábico, mas já identifica boa parte das letras do alfabeto e associa as letras aos nomesdos colegas de sala. Ela ainda não reconhece o valor sonoro das palavras e sua escrita érepresentada utilizando sempre as letras do seu nome. Percebo ultimamente que elaampliou o seu interesse pelas atividades que envolvem linguagem escrita, já manifestavontade de estar em contato com livros de histórias, se interessa pelas leituras, desenha,faz recontos, mesmo ainda sem atribuir uma seqüência de fatos, ou produzir escritasconvencionais.

Em relação à matemática, os objetivos de trabalho foram sempre desenvolvidos pormeio de uma atividade recreativa ou jogo de regras, por isso não tive a necessidade derever estratégias nesta área, pois Emanuela participa com interesse dos objetivos propostos.Nunca aprendi tão verdadeiramente sobre o que representava a palavra processo.

A cada dia percebo que cada criança tem características, interesses, capacidades enecessidades de aprendizagem que lhe são próprias. Vale ressaltar que qualquer criançamesmo aquelas ditas normais, podem em qualquer período de sua escolarização, enfrentardificuldades para aprender ou para ser aceita na comunidade escolar. Essas dificuldadesde aprendizagem surgem no dia-a-dia da escola e todas as mudanças geradas para superartal situação e as tentativas de responder às necessidades de aprendizagem das crianças,são formas de inclusão. Assim, começo a perceber que a inclusão não depende dediagnósticos médicos ou da identificação de categorias de deficiências, na qual muitomais se discrimina o sujeito por suas características individuais do que se caminha parauma compreensão das diferenças. Cada vez mais percebo que a inclusão é umposicionamento que cria oportunidades para todos os alunos aprenderem por meio douso de estratégias diversificadas de ensino.

Aprendi ainda que lidar pedagogicamente com essas crianças não se restringe apenasà participação em formações especializadas ou cursos de capacitações voltados para asdeficiências, pois é primordialmente à reflexão sobre a prática em sala de aula que devese somar ao conhecimento científico. Sei da necessidade e da importância de se buscarmais e mais conhecimentos sobre o tema inclusão. Relembrando o texto lido,anteriormente citado, acredito que a mudança do meu vôo me levou a perceber queneste lugar diferente também há muitas coisas semelhantes, boas e especiais. Aprendinesse percurso que são de singularidades e de diferenças que nos constituímos comohumanos!

A construção da Escola Inclusiva: uma meta possível

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IV Seminário Nacional de Formação de Gestores e Educadores

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Os sistemas de ensino e os programas curriculares deveriam se organizar de modoque levassem em conta todas as diferentes características e necessidades das crianças. Asescolas deveriam apresentar um meio mais eficaz para combater as atitudesdiscriminatórias em relação a qualquer condição diferenciada de seus alunos, criandocomunidades verdadeiramente acolhedoras em busca de construir uma sociedade maisjusta e tolerante e, assim, alcançar a educação para todos.

Agradeço a toda equipe do grupo de pesquisa Gestão da Aprendizagem naDiversidade, coordenado pela professora Rita Vieira de Figueiredo da Universidade Federaldo Ceara, que tem contribuído para essa discussão, pela presença de pessoas comnecessidades educacionais especiais nas turmas da educação comum, que vem mostrandoa todos nós educadores, às escolas e à sociedade em geral a necessidade já antiga detransformar concepções e práticas para atender a todos os alunos, sem discriminação dequalquer natureza. Trata-se sem dúvida de uma proposta justa, eminentemente humanae de legalidade jurídica, que garante a todos o direito de aprender a aprender, aprendera fazer, aprender a ser e a aprender a conviver... nas diferenças.

Adriana Freire, hoje, educadora inclusiva!

ReferênciasReferênciasReferênciasReferênciasReferências

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A construção da Escola Inclusiva: uma análise das políticas públicasA construção da Escola Inclusiva: uma análise das políticas públicasA construção da Escola Inclusiva: uma análise das políticas públicasA construção da Escola Inclusiva: uma análise das políticas públicasA construção da Escola Inclusiva: uma análise das políticas públicase da prática pedagógica no contexto da Educação Infantile da prática pedagógica no contexto da Educação Infantile da prática pedagógica no contexto da Educação Infantile da prática pedagógica no contexto da Educação Infantile da prática pedagógica no contexto da Educação Infantil

Marilda Moraes Garcia Bruno1

[email protected]

1 Introdução1 Introdução1 Introdução1 Introdução1 Introdução

O conceito de educação infantil como direito social é relativamente recente noideário da política brasileira. Constituiu-se com a luta dos movimentos sociais no fimda década de 1980, a partir da Constituição Federal de 1988, quando foi asseguradoo direito e a garantia de acesso a todas as crianças a creches e pré-escolas nas suascomunidades. A educação infantil foi concebida como dever do Estado e opção dafamília.

Até esse período, a política vigente para a infância era de cunho social eassistencialista. A creche, sem fins educativos, tinha como meta compensar as carências,o abandono, a pobreza e outras mazelas sociais. As crianças de 0-6 anos eram atendidasem creches mantidas por instituições sociais e comunitárias, tendo em vista minimizar osriscos sociais pelas ações eminentemente centradas no cuidar. Essa política assistencialnão se destinava a todas as crianças, apenas ao atendimento de crianças sem deficiências.

O processo de legitimação da exclusão desse grupo social pode ser entendido,conforme Bourdieu (1999, p.193), como diferentes tipos de “gratificações econômicas esimbólicas correspondentes às diferentes formas desta relação que se define o grau emque se enfatiza objetivamente a pertinência ou a exclusão”.

Esse processo de relação excludente e assistencialista começa a ser superado pelosprincípios socioantropológicos e éticos da educação infantil como direito social garantidona Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB)/1996. Essa legislação concebea educação infantil como a primeira etapa da educação básica nacional, com metas eobjetivos voltados não só para o cuidar como também para o educar.

Por esse viés sociocultural e democrático, a educação infantil torna-se espaçoprivilegiado para lidar com a diversidade, diferenças culturais, sociais, bem como paracombater a situação de desigualdade e exclusão em que viviam as crianças com deficiência.

1 Doutora em Educação pela UNESP/Marília/SP, Professora da Faculdade de Educação e Programa de Pós-Graduação da UFGD;Coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Inclusiva Gepei.

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Passados mais de dez anos da promulgação dessa legislação, torna-se importante analisara viabilização de programas e estratégias utilizadas para a implementação da política deinclusão na educação infantil.

Esse ensaio tratará inicialmente de discutir a inclusão na Educação Infantil a partirdo contexto político nacional, focalizando o discurso, o texto, as estratégias, ascontradições e os desafios presentes nesse campo. A seguir, serão apresentadas algumascontribuições de estudos e pesquisas que nos sinalizam como se desenvolve aoperacionalização da proposta de inclusão nos Centros de Educação Infantil. Por fim,retratará a prática de inclusão explicitada por meio das experiências, dos dadosestatísticos, de pensamentos e ações manifestos pelas singularidades e interesses dosdiferentes atores sociais que elaboram as políticas públicas.

2 A política pública de inclusão no contexto da educação infantil: o discurso e2 A política pública de inclusão no contexto da educação infantil: o discurso e2 A política pública de inclusão no contexto da educação infantil: o discurso e2 A política pública de inclusão no contexto da educação infantil: o discurso e2 A política pública de inclusão no contexto da educação infantil: o discurso eo textoo textoo textoo textoo texto

Esse estudo parte do princípio de que as políticas públicas são ações complexasinvisíveis, em constante modificação e transformação. A política, conforme Palumbo (1994,p. 350), “é um processo, uma série histórica de interações, ações e comportamentos demuitos participantes”. O autor comenta que uma proposta política não pode serobservada, tocada ou sentida. Ela tem de ser inferida a partir da série de ações ecomportamentos intencionais de muitas agências e funcionários governamentaisresponsáveis pela sua implementação ao longo do tempo.

Por esse caminho, proponho-me a analisar as políticas públicas para a inclusãoeducacional na educação infantil, as leis, os programas, os referenciais curriculares e asestratégias educacionais, verificando as possíveis interdependências e relacionamentosno seu processo de elaboração e implementação.

A preocupação com a inclusão de crianças com deficiência no cenário educacionalbrasileiro é recente. Surgiu com o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) criado pelaLei nº 8.069/1990. Esse documento trata da proteção integral da criança e estabelece odireito à educação como prioritário para o pleno desenvolvimento humano e preparopara o exercício da cidadania. Assegura a todas as crianças “a igualdade de condiçõespara o acesso e permanência na escola, o direito de ser respeitado por seus professores eo acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência.”(Art. 35).

A política nacional de educação inclusiva assume as recomendações da Declaraçãode Jomtien (Tailândia, 1990) e da Declaração de Salamanca (1994), a qual enfatiza queo êxito da escola inclusiva depende: da identificação precoce, da avaliação, daestimulação de crianças com necessidades educativas especiais, desde as primeiras idades,e da preparação para a escola como forma de impedir condições incapacitantes.

Seguindo esses princípios, a Política Nacional de Educação Infantil (1994) concretiza-sepor meio da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB)/1996, que assegura a conquista

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democrática da igualdade de direitos em relação à educação infantil, concebe-a como aprimeira etapa da educação básica, que tem por finalidade o desenvolvimento integralde “todas” as crianças, do nascimento aos seis anos (art. 58), até mesmo as comnecessidades educacionais especiais.

Assim a LDB trouxe, como responsabilidade dos sistemas municipais de educação,a estruturação e a organização de creches (0-3 anos) e pré-escolas (4-6 anos), hoje cincoanos, mediante apoio financeiro e técnico dos estados e da União.

Para a implementação dessa proposta, foi elaborado o Referencial CurricularNacional para a Educação Infantil (Brasil, 1998), que enfatizava como eixo do projetopedagógico a diversidade, a interação, a comunicação, o brincar, a socialização das criançaspor meio de sua participação nas diversificadas práticas sociais, sem discriminação deespécie alguma. A recomendação para a inclusão de crianças com necessidadeseducacionais especiais foi feita nesse documento de forma ligeira e superficial.

De forma um pouco mais abrangente, o Plano Nacional de Educação (2001) orientaa ampliação do atendimento educacional na educação infantil, de programas de detecçãoprecoce para identificação das alterações no processo de desenvolvimento e de medidasde prevenção na área da deficiência visual e auditiva. As Diretrizes Nacionais de EducaçãoEspecial na Educação Básica (2001) colocam como desafio para os sistemas estaduais,municipais e comunidades escolares construírem uma educação que atenda à diversidadee às necessidades educacionais especiais de todos os seus alunos.No que concerne àEducação Infantil, esse documento não aprofunda questões de âmbito político, deorganização do sistema e da elaboração de projetos pedagógicos.

Cabe pontuar que os Planos Municipais de Educação, nessa última década, têm seesforçado para ampliar o atendimento dos Centros de Educação Infantil em muitosmunicípios brasileiros. Não obstante, os direitos adquiridos tanto pelas crianças das classespopulares quanto pelas crianças com deficiências estão longe de serem garantidos na suaintegralidade. Observa-se a falta de diretrizes políticas específicas para essa população,ausência de articulação e integração entre os níveis responsáveis pela elaboração eimplementação dessas políticas e, principalmente, a falta de previsão de recursos financeirospara a expansão da rede de educação e a baixa qualidade dos projetos educativos.

Dados levantados (MEC/INEP, 2002) apresentavam indicadores de que apenas13,47% das crianças brasileiras tinham acesso a creches nas suas comunidades. Bobbio(1999), ao discutir as teorias democráticas e pluralistas da sociedade, pondera que oestado alarga a participação do poder político estreitamente ligado ao poder econômico.Enfatiza que o poder e a democracia não estão nas instituições do governo local, masnos grupos menores, formais e informais. “É nessas comunidades, na capacidade de seformar rapidamente sob a pressão das necessidades imediatas que reside o verdadeiroespírito da democracia” (p.17). Esse teórico reconhece a importância dos grupos, dosdiferentes interesses de uma sociedade complexa, da luta pelo poder, do jogo de forças,e dos conflitos entre o momento de força e o momento de consenso.

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Nesse sentido, tornou-se consenso desde as Diretrizes Nacionais de EducaçãoEspecial na Educação Básica (2001) que o atendimento educacional especializado deveiniciar-se em creches e pré-escolas, mediante ações conjuntas da escola, da família e dacomunidade. No entanto, o que se observa no mundo fático é que os programas deintervenção precoce (0-3 anos) ocorrem em instituições especializadas, muitas delasdestituídas dos princípios da educação inclusiva.

Embora o avanço conceitual da legislação, enfrentam-se, na prática, três grandesdesafios para a inclusão na educação infantil. Primeiro, a limitação de ofertas de vagasna faixa etária de 0-5 anos em creches e pré-escolas; crianças pobres e deficientesfreqüentam creches comunitárias, sem espaço e tempo adequados para o brincar e oaprender. O segundo, é a falta de professores com formação para lidar com a diversidade,com as especificidades das crianças pequeninas e com as necessidades educacionaisespeciais. Em terceiro plano, nem por isso menos importante, os profissionaiscapacitados na área da educação especial, que raramente são habilitados no campoda educação infantil.

Em relação às políticas de educação infantil, Kramer (2006, p. 802) pondera que osdireitos das crianças “consideradas cidadãs foram conquistados legalmente sem que exista,no entanto, dotação orçamentária que viabilize a consolidação desse direito na prática”.Ela indica para a necessidade de consolidação de um projeto educativo para a infância,com a exigência de formação de profissionais para educação infantil, assim como oreconhecimento de sua condição de professores.

Observa-se na prática, principalmente nas regiões periféricas dos grandes centrosurbanos e nas cidades do interior, que o atendimento ocorre em creches comunitáriasna esfera da assistência. Os profissionais que atuam nessa faixa etária, tanto professorescomo recreadores, não têm formação no campo das especificidades da infância e doconhecimento pedagógico que lhes permita trabalhar com os conceitos deinterculturalidade, flexibilidade, adequação curricular e educação bilíngüe.

Pesquisadores de orientação sociológica pós-moderna como Ball e Bowe (1992)nos ajudam a refletir sobre a distância existente entre a política pública e a práticana área educacional. Esses autores enfatizam a natureza complexa e controversa dapolítica educacional, explicam a diferença entre a política como texto e política comodiscurso. A primeira diz respeito a representações codificadas de maneira complexa,terá leituras diferenciadas de acordo com a pluralidade de leitores. Os textos sãoprodutos de múltiplas agendas e influências e sua formulação envolve intenções enegociações dentro do Estado e no processo de formulação da política. Nesseprocesso, apenas algumas influências e agendas são reconhecidas como legítimas ealgumas vozes são ouvidas.

No Brasil, o discurso da política de inclusão social e educacional surgiu no governoneoliberal e foi ampliado pelo atual governo de cunho socialista e pluralista. Entretanto,as agendas de ambos os governos não aprofundaram o debate sobre os meios, os fins

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e as estratégias para a implementação da política de ampliação da rede de educaçãoinfantil. Assim, os discursos ampliam-se, generalizam-se e contraditoriamente,distanciam-se dos fundamentos e princípios que os balizaram: assegurar a igualdadede oportunidades, o direito à diferença e a escola de qualidade para todos desde onascimento.

O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Brasileira (Fundeb)/2007,regulamentado pela Lei nº 11.494/2007, traz como promessa contemplar investimentospara educação integral da criança desde o nascimento. Parece-nos que não priorizaespecificamente esse nível de ensino, pois os recursos serão destinados na mesmaproporção que aos demais níveis e modalidades de educação. O que traz de novo é oinvestimento na formação continuada de professores e o incentivo à pesquisa no campoda educação infantil.

Ball (1994) discute que as políticas deveriam ser analisadas em termos de seusimpactos nas relações e nas interações com as desigualdades existentes. Os efeitos geraisda política tornam-se evidentes quando aspectos específicos de mudanças e um conjuntode respostas são observados na prática. Sugere que a análise da política deve envolver oconjunto de proposta, as questões mais amplas, as políticas locais e as amostras depesquisas.

Seguindo essa tendência analítica das políticas sociais passemos a apreciar o quedizem os estudos e pesquisas sobre o processo de inclusão de crianças com deficiênciana educação infantil.

3 Programas e estratégias para a inclusão na educação infantil: o que falam os3 Programas e estratégias para a inclusão na educação infantil: o que falam os3 Programas e estratégias para a inclusão na educação infantil: o que falam os3 Programas e estratégias para a inclusão na educação infantil: o que falam os3 Programas e estratégias para a inclusão na educação infantil: o que falam osestudos e pesquisasestudos e pesquisasestudos e pesquisasestudos e pesquisasestudos e pesquisas

A análise discursiva das políticas de educação infantil indica avanço significativono que diz respeito ao caráter de proteção, acesso, universalização e redistribuiçãodas políticas educacionais sociais, atribuindo maior responsabilidade aos municípiosquanto à expansão, estruturação e implementação de sistemas educacionaisinclusivos.

Dados de avaliação do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais AnísioTeixeira (INEP, 2003) indicam que a ampliação de creches foi de 7,3% e na pré-escola ocrescimento foi na ordem de 3,7%. Entretanto, para cumprir as metas do Plano Nacionalde Educação seria necessário, no mínimo, quadruplicar esses dados. Há grandes capitaisbrasileiras com índice menor de 10% da população infantil com acesso a creches e pré-escolas.

Estratégia consistente para a implementação de políticas de inclusão educacionalfoi o Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade (MEC/Seesp, 2003). Programaconcebido como um novo tempo, destina-se a apoiar estados e municípios na tarefa dereorientar as escolas para que se tornem inclusivas e de qualidade. Conforme Alves e

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Barbosa(2006), esse programa materializa a política pública de desenvolvimento desistemas educacionais inclusivos em 147 municípios-pólos em todos os estados brasileirose no Distrito Federal.

Tive a oportunidade de participar como mediadora de grupos de discussão eformação de gestores e professores em alguns municípios, o que me permite avaliar essaimportante iniciativa. Entendo que essa ação constitui-se como o início do debate acercada diversidade cultural, dos direitos sociais; serviu para desmistificar conceitos, combaterpreconceitos, trabalhar com os marcos legais e sensibilizar gestores e educadores para ocompromisso com a escola inclusiva.

Outra medida política favorável à implementação da escola inclusiva diz respeitoao Programa Pró-libras, o projeto Educação de Surdos, com materiais para estudo adistância e a criação do sistema de suporte por meio da organização de salas de recursosmultifuncionais destinadas ao atendimento educacional especializado no contexto daescola.

No âmbito da educação infantil, foram elaborados pelo MEC/Secretaria Nacionalde Educação Especial, em parceria com universidades, especialista e instituiçõesespecializadas, o documento Saberes e Práticas da Inclusão (2003) com o objetivo deapoiar as creches e pré-escolas com informações sobre as necessidades educacionaisespeciais, estratégias didático-metodológicas específicas, recursos especiais e condiçõesde acessibilidades para responder às necessidades dessa população.

Esses programas e estratégias governamentais para a implementação eoperacionalização da política de inclusão foram medidas adotadas no âmbito do EnsinoFundamental. As capacitações ocorreram na maior parte dos municípios-pólos,envolvendo profissionais que atuam a partir das séries iniciais de escolarização. O debatesobre a política e a prática pedagógica nos centros de educação infantil está ainda porser efetivado.

Em virtude desse fato, verifica-se que os documentos sobre a inclusão na educaçãoinfantil não têm chegado aos Centros de Educação Infantil. São poucos os municípiosque realizaram discussões, capacitações e estudos sobre os princípios e fundamentos dainclusão e construíram propostas para a inclusão nesse nível de ensino.

Laplane (2006), em estudo sobre as condições para a implementação de políticasde Educação Inclusiva no Brasil, questiona sobre a dificuldade de implementar políticasde Educação Inclusiva em nosso país; enfatiza a larga brecha entre as políticas e as práticas.Entende que a contradição no âmbito educacional remete às condições sociais amplas eà tendência excludente da dinâmica social (2006, p. 710).

Essa relação do discurso político com a prática envolve, de acordo com Bowe e Ball(1992), identificar processos de resistências, acomodações, subterfúgios entre osprofissionais e o delineamento de conflitos e diferentes interesses na esfera da práticacotidiana.

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Pesquisa realizada em todos os estados brasileiros (Bueno et al. 2003) verificouque há uma ênfase em relação à organização de serviços destinados a educandos comdeficiência no ensino regular. Entretanto, não há indicação em relação a integração entrea educação especial e o ensino regular.

Pesquisas sobre as práticas educativas no contexto da educação infantil são poucas emnosso meio. Tetzchner et al. (2005) estudam a inclusão de crianças com deficiência enecessidades de comunicação suplementar e alternativa na educação pré-escolar; mostraramos benefícios que os ambientes e as práticas inclusivas podem acarretar para crianças queestão desenvolvendo a comunicação. Concluem que ambientes segregados e escolas especiaisnão têm influência positiva no desenvolvimento de linguagem dessa população.

Estudos de Bruno (1999, 2003) sobre a prática pedagógica evidenciaram a ausênciade discussão sobre a construção de espaços inclusivos nos Centros de Educação Infantil;há falta de escuta e acolhida dos pais e crianças com deficiência, de reflexões sobre asatitudes, posturas e adequação da prática pedagógica para o atendimento dasnecessidades educacionais especiais. A autora defendeu o atendimento educacionalespecializado com programas de intervenção precoce centrados na família e voltadospara a inclusão das crianças desde cedo em creches, mediante ação compartilhada entreos serviços de educação especial e os Centros de Educação Infantil.

Monte (2006) estudou a inclusão de crianças com deficiência mental a partir dasconcepções e perspectivas de educadoras de creches do Distrito Federal, as quais não seperceberam como agentes de mudança em direção à inclusão, mas como expectadorasque dependem de fatores externos, como por exemplo, vontade política, financiamentoda educação e formação para atuar com crianças com necessidades educacionaisespeciais. Das creches pesquisadas, quarenta e cinco educadoras indicaram que estãodistantes de terem condições de oferecer atendimento educacional inclusivo e deresponder de forma efetiva às necessidades educacionais especiais das crianças, cujoatendimento ainda é muito inspiente.

Laplane (2006) discute as propostas centradas nos aspectos práticos da inclusão:formação, o repertório de ensino e sentimentos dos professores em relação aos alunoscom necessidades especiais. Enfoca a complexidade, limites e possibilidades dessa tarefa;sugere ser mais produtivo discutir a questão no terreno das práticas educativas que difundirum discurso ingenuamente otimista que proclama a celebração da diversidade, semoferecer ao educador elementos necessários para situar-se na realidade que irá enfrentar(2006, p. 711).

Os resultados de pesquisas sobre a inclusão de crianças com deficiência visual naeducação infantil, na Bahia, realizado por Galvão (2004) e Araújo (2007) revelam algunsobstáculos: ausência de vagas para crianças com deficiência nas regiões periféricas,formação insuficiente do professor da sala regular, condições precárias das escolas,inadequação do material didático e pedagógico, indiferença do professor edesconhecimento quanto às condições perceptivas dessas crianças.

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Para a criança surda, a educação bilíngüe desde cedo é prioritária; o acesso à línguade sinais permite que “desfrutem da possibilidade de adentrar o mundo da linguagemcom todas as suas nuances”(QUADROS; SCHMIEDT, 2006, p. 20). As autoras ponderamque isso depende da escola, de decisões político-pedagógicas; em cada estado brasileirohá diferentes proposta, há escolas com professores que desconhecem libras, não têmestrutura, recursos humanos para garantir aos alunos surdos o direito à educação, àcomunicação e à informação.

Parece-nos que essas questões até aqui levantadas não dependem apenas da escola.Torna-se, então, necessário retomarmos as questões sobre a formulação das políticaspúblicas. Bowe e Ball (1992) discutem três contextos principais de elaboração daspolíticas: o contexto da influência, o contexto da produção do texto e o contexto daprática. Esses contextos estão relacionados, apresentam arenas, lugares, grupos deinteresses e cada um deles envolve disputas e embates.

As pesquisas apresentadas deixam transparecer que os gestores, professores e paisde crianças com necessidades educacionais especiais, embora não excluídos do processode elaboração do texto da política, ainda não se articularam no contexto para o debatesobre as barreiras, os desafios e as perspectivas para a implementação de ações, tendoem vista a melhoria das condições estruturais e a qualidade da prática pedagógica nosCentros de Educação Infantil.

4 O contexto da prática: experiências exitosas e desafios4 O contexto da prática: experiências exitosas e desafios4 O contexto da prática: experiências exitosas e desafios4 O contexto da prática: experiências exitosas e desafios4 O contexto da prática: experiências exitosas e desafios

A educação de qualidade com a construção de um currículo voltado paradiversidade cultural e atendimento às necessidades específicas e educacionais especiaisé o grande desafio que enfrentam os Centros de Educação Infantil em nosso meio.O Brasil, não obstante os dados levantados nas pesquisas, já apresenta experiênciaspontuais, bem-sucedidas de inclusão de crianças com deficiência em vários estadosda federação.

Dados da evolução da educação especial no Brasil levantados pelo Censo EscolarSecretaria Nacional de Educação Especial MEC/INEP/2007 indicam que a política deinclusão de alunos com deficiência avançou no período de 1998-2006, em um percentualde 193% das matrículas em classes comuns do ensino regular.

Nesse mesmo período, as matrículas em escolas especiais tiveram um crescimentode 56%, com índice de 89% dos municípios brasileiros que ofertam atendimento naeducação especial.

Esse avanço não se observa no âmbito da educação infantil; 80% das matrículas decrianças com deficiência ocorrem em creches e pré-escolas de Instituições Especializadas(MEC/INEP/2003). Levanta-se a hipótese de que com as atuais relações sociais e políticasvigentes (dependência das famílias e do poder público das instituições filantrópicas) aexclusão social, especialmente dos grupos mais vulneráveis, tende a reforçar políticas

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assistencialistas e privatizantes, limitando de forma significativa as possibilidades dasescolas públicas (FERREIRA, 2006, p.109).

Persistindo a contradição, o Censo MEC/INEP/2007 evidencia o mesmo quadro deexclusão: são 370.530 matriculas de crianças na educação infantil na faixa etária de 0-4anos, das quais apenas 3.845 estão matriculadas em classes regulares e 30.279 em escolase classes especiais (88,7%). Na pré-escola, há um total de 78.864 de matrículas, sendoque 57.804 (73,3%) encontram-se em escolas ou classes especiais e 21.060 em escolasregulares.

Os dados revelam a ausência de políticas específicas e diretrizes para a inclusão decrianças com necessidades educacionais especiais nessa etapa de ensino. O vazio deixadopelos diferentes níveis de governo abre a brecha para o fortalecimento das escolas especiaisque se constituem, principalmente no interior do país, nas únicas possibilidades deeducação e atendimento educacional especializado para as crianças com deficiência.

Cabe refletirmos com Ball, Bowe, 1992 e Mainardes, 2006, que os discursos políticossão construídos e as políticas públicas são iniciadas no contexto de influência, ou seja,onde os grupos de interesses disputam para influenciar a definição das finalidades sociaisda educação e do que significa ser educado. Os atores do contexto de influência são asredes sociais dentro e em torno de partidos políticos, do governo e do legislativo. Osautores enfatizam que é nesse contexto que os conceitos ganham legitimidade e formamum discurso de base para a política. Indicam ainda os meios de comunicação, as comissõese grupos representativos como lugares de articulação e de influência.

Esse quadro pode ser revertido com a disposição política e mediante a participaçãodas universidades na formação inicial e continuada de professores para a construção dainclusão nos Centros de Educação Infantil.Várias universidades brasileiras já desenvolvemações de extensão voltadas à formação de professores do ensino fundamental.

Essa discussão precisa acontecer no âmbito da educação infantil, tendo em vista amelhoria da qualidade de formação humana e social do professor, conseqüentemente,das crianças desde pequenas. Nesse sentido, a UFGD reviu o seu projeto políticopedagógico e oferece as disciplinas voltadas à diversidade e à inclusão educacional:Currículo e Diversidade Cultural, Educação Indígena, Fundamentos da Educação Inclusiva,Educação Especial nas quais enfatiza o estudo das necessidades específicas e educacionaisespeciais e introdução aos estudos de Libras. Realiza, por meio do Grupo de Estudos ePesquisa em Educação Inclusiva da UFGD, seminários, colóquios, oficinas de trabalho eestudos com grupos focais envolvendo gestores, coordenadores, professores, pais,acadêmicos de Pedagogia e Licenciatura Indigena para a discussão sobre asintencionalidades, a dimensão epistemológica e prática com reflexões críticas sobre asatitudes, posturas, saberes, práticas pedagógicas e, principalmente, sobre as ações paraimplementação da política de inclusão na educação infantil.

Esses estudos levam em consideração que os profissionais que atuam nocontexto da prática não enfrentam os textos políticos como leitores ingênuos. Eles

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vêm com suas histórias, experiências, valores e propósitos (...) Políticas serão interpretadasdiferentemente, uma vez que histórias, experiências, valores, propósitos e interesses sãodiversos. A questão é que autores dos textos políticos não podem controlar os significadosde seus textos. Partes podem ser rejeitadas, selecionadas, ignoradas, deliberadamentemal entendidas, réplicas podem ser superficiais. Além disso, interpretação é uma questãode disputa (BALL; BOWE, 1992, p. 22). Essas são as contradições no âmbito da educaçãoinfantil que precisam ser superadas.

Um bom começo nesse sentido são as ações do Governo Estadual de Santa Catarinaque promoveu a reestruturação da Política de Educação de Surdos, com providênciastécnico-administrativas para implementar o ensino da língua de sinais mediante a presençade professor intérprete em escolas -- pólos na educação básica. Propôs a contratação deinstrutores de língua de sinais para atuarem na condução do processo de aquisição delínguas de sinais pelos surdos da educação infantil e séries iniciais (QUADROS, 2006,p.145). Cabe ao governo oferecer a oportunidade, ao cidadão e sua família decidirempela escolha da língua e da forma de comunicação.

5 Considerações finais5 Considerações finais5 Considerações finais5 Considerações finais5 Considerações finais

A educação infantil como direito social e legitimação da cidadania pelo acesso aoconhecimento, participação e produção da cultura, é prática ainda não proporcionada atodas as crianças brasileiras, sejam elas com necessidades educacionais especiais ou não.

As políticas públicas de educação infantil no Brasil constituem-se em fronteirasindefinidas: transfere-se a responsabilidade às instituições assistenciais e comunidadepara organizarem programas educacionais voltados à realidade social e às necessidadesda infância.

Essa indefinição amplia o número de crianças com deficiência, principalmente nasregiões periféricas e nas pequenas cidades, sem creches e pré-escolas, cujas famíliastrabalhadoras ou desempregadas necessitam de Centros de Educação Infantil quegarantam o acesso ao conhecimento, à aprendizagem, espaços lúdicos, experiênciasculturais, para que exerçam a função educativa e complementar ao papel da família.

As pesquisas e os dados analisados sinalizam que as diretrizes políticas para ainclusão escolar são mais efetivas em relação ao ensino fundamental do que em relaçãoà educação infantil. Nesse campo, o discurso é vago, nebuloso, inconsistente, pois permiteque o sistema de educação infantil transfira a responsabilidade pelo atendimento emcreches e pré-escolas às instituições especializadas, muitas delas com o perfil segregadore assistencialista.

Tenho pontuado a importância das escolas especiais para a oferta do atendimentoeducacional especializado, defendido o redimensionamento do papel da escola especiale das salas especiais, que deveriam funcionar como sistema de apoio, suporte às famíliase à inclusão escolar (BRUNO, 1999, 2000, 2003).

A construção da Escola Inclusiva: uma análise das políticas públicas eda prática pedagógica no contexto da Educação Infantil

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Compreendo a educação em uma perspectiva sociocultural (BRONFENBRENNER,1996; JOHNSON, 2006) em uma interação face a face, a partir de uma perspectivarelacional, isto é, valorizando o como as pessoas interagem entre si, se comunicam; comoos discursos se articulam, as propostas e programas se organizam; como os atores dapolítica interagem com o ambiente e com a cultura na qual estão imersos.

O grande desafio que se impõe à Educação Inclusiva é o reconhecimento do outro,de suas possibilidades, das necessidades específicas, das educacionais especiais, dasdiferenças culturais, dos códigos lingüísticos e da experiência social. Respeitar as diferençasna educação infantil significa, sobretudo, oferecer espaço e tempo adequados e própriospara a infância, com experiências coletivas, espaços organizados para aprendizagem pormeio do lúdico, do movimento; do uso de múltiplas linguagens, das diferentes formas deexpressão, arte, cultura como forma de conhecer.

A pedagogia para a infância, democrática, de qualidade para acolher a diversidadee atender às necessidades educacionais especiais, depende das relações socioculturaismais amplas, das intenções, ações políticas concretas e das contradições da prática: dosinteresses e do jogo de poder entre os envolvidos. Depende, ainda, no meu entender,das interações e relações que o grupo estabelece entre si, das negociações, dos projetos,das metas, dos planos, da formação de professores e, principalmente, de como acomunidade escolar se aproxima e enfrenta os conflitos sociais.

Finalizo compactuando com Kramer (2006) na defesa de uma pedagogia da infância:o tempo da infância é o tempo de aprender e de aprender com as crianças, “numaperspectiva de educação em que o outro é visto como um eu em que está em pauta asolidariedade, o respeito às diferenças e o combate à indiferença e à desigualdade” (2006,p. 811).

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A escola é para todos: o Ministério Público e a tutela do direito dasA escola é para todos: o Ministério Público e a tutela do direito dasA escola é para todos: o Ministério Público e a tutela do direito dasA escola é para todos: o Ministério Público e a tutela do direito dasA escola é para todos: o Ministério Público e a tutela do direito daspessoas com deficiência à educaçãopessoas com deficiência à educaçãopessoas com deficiência à educaçãopessoas com deficiência à educaçãopessoas com deficiência à educação

Patrícia Albino Galvão Pontes1

Patrí[email protected] Monte Nunes Bezerra2

[email protected]

A escola atual tem um grande desafio: garantir o acesso a todos os indivíduos. Esta

é a escola de todos, na qual nenhum aluno é excluído e todos fazem efetivamente partedo sistema educacional de ensino.

A educação é o primeiro dos direitos sociais a ser elencado pela nossa ConstituiçãoFederal.3 Assim, em razão da fundamentalidade desse direito, não é possível admitir queele seja negado a qualquer pessoa, independentemente do motivo.

A Constituição Federal, em seu art. 3º, IV, afirma que um dos objetivos da RepúblicaFederativa do Brasil é a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça,sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, dispondo, ainda, em seuartigo 5º, XLI que qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdadesfundamentais será punida na forma da lei.

Nesse particular, a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas asFormas de Discriminação contra as Pessoas com Deficiência (Convenção da Guatemala)4

traz a impossibilidade de tratamento desigual com base na deficiência, definindo adiscriminação como “toda diferenciação, exclusão ou restrição baseada em deficiência,antecedente de deficiência, conseqüência de deficiência anterior ou percepção dedeficiência presente ou passada, que tenha o efeito ou propósito de impedir ou anularo reconhecimento, gozo ou exercício por parte das demais pessoas portadoras dedeficiência de seus direitos humanos e suas liberdades fundamentais”(art. I, 2, “a”, daConvenção de Guatemala).

1 Promotora de Justiça da Comarca de Macaíba (RN) e Coordenadora do Centro de Apoio Operacional às Promotorias deDefesa da Pessoa com Deficiência, do Idoso, das Comunidades Indígenas e das Minorias Étnicas do Ministério Público doEstado do Rio Grande do Norte.2 Promotora de Justiça da Comarca de Natal (RN), Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte.3 Art. 6º da Constituição Federal: “São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, aprevidência social, a proteção à maternidade e à infância; a assistência social aos desamparados, na forma desta Constituição”.4 Esta Convenção foi ratificada no Brasil pelo Decreto Legislativo nº 198, de 13 de junho de 2001, e promulgado pelo Decretonº 3.956, de 8 de outubro de 2001, da Presidência da República, fazendo parte, portanto, do ordenamento jurídico brasileiro.

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Desse modo, admitir que a criança tenha apenas acesso ao atendimento educacionalespecializado, seja ele prestado em uma escola especial, seja em escola regular, significaconceder tratamento diferenciado unicamente em razão da deficiência, excluindo oexercício do direito fundamental à educação. Trata-se, portanto, de prática discriminatóriae, conseqüentemente, vedada por nosso ordenamento jurídico brasileiro.

A segregação das pessoas com deficiência em escolas especiais ou em classesespeciais, ainda que nas escolas regulares, é uma forma de exclusão social violandofrontalmente os princípios da dignidade da pessoa humana, da cidadania e da igualdade.Toda forma de preconceito é indigna e afronta todas as noções que se possa ter sobreJustiça.

A Constituição Federal de 1988 reconhece a importância do direito fundamental àeducação ao prescrevê-lo, em seu artigo 205, como um direito de todas as pessoas,visando ao seu pleno desenvolvimento, ao seu preparo para o exercício da cidadania e àsua qualificação para o trabalho.5

Portanto, não há margem no texto constitucional para se admitir a possibilidadede exclusão de qualquer pessoa do sistema educacional. É um direito básico da pessoahumana o de fazer parte da sociedade (direito dirigido a todas as pessoas em decorrênciada igualdade), direito que significa não apenas a cidadania garantida no papel, mas a suaefetiva participação, sem ter de ser isolada ou privada do convívio social.

O convívio social, por natureza, é plural. É importante reconhecer que a sociedadeé feita de diferentes, pois o normal é a diversidade. A luta não é para que todos sejamconsiderados iguais, mas para que todos tenham igualdade de oportunidades.

Uma sociedade inclusiva é benéfica para todas as pessoas. O convívio com adiversidade favorece a construção da cidadania. Dessa forma, serão formados adultosconscientes, pois aqueles que, na infância, desfrutaram da presença de crianças eadolescentes com deficiência em sua escola, não duvidarão da capacidade dessas pessoase, com certeza, quando adultos, estimularão a inclusão de todos em um mesmo ambiente(seja escola, trabalho, lazer...). Essa é a forma mais eficaz de combate ao preconceito.

Há de se ressaltar que a educação não visa unicamente à transmissão dos conteúdoscurriculares. O artigo 205 da Constituição Federal deixa claro o seu intuito ao declararcomo objetivos de tal direito o pleno desenvolvimento da pessoa, a sua preparação parao exercício da cidadania e a sua qualificação para o trabalho.

A educação tem um alcance muito mais abrangente que a transmissão de conteúdos.Ela visa desenvolver plenamente os indivíduos e formar cidadãos. Dessa forma, todos

5 Art. 205: A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade,visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

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podem ser beneficiados pela educação, até mesmo aqueles que apresentem dificuldadesem assimilar as noções de matemática ou física, por exemplo, em razão de possuir umadeficiência mental. Assim, retirar de alguém tal direito é simplesmente anular as chancesdo seu desenvolvimento como pessoa e como cidadão.

É importante se garantir que todos os alunos estudem juntos, que freqüentem omesmo espaço escolar e participem de todas as atividades culturais e sociais da escola.

Em algumas situações, pode ocorrer que o aluno com deficiência, além de freqüentara sala de aula de sua escola, também necessite de atendimento educacional especializado,visando ao seu melhor desenvolvimento e aprimoramento de suas habilidades. Nesseaspecto, garante a Constituição Federal, em seu artigo 208, inciso III, que esse atendimentodeve ser oferecido preferencialmente na rede regular de ensino, e é importante ressaltarque a preferência estabelecida pela Constituição Federal refere-se ao atendimentoeducacional especializado e não à educação da pessoa com deficiência.

O atendimento educacional especializado não se constitui em um sistema paralelode ensino com níveis e etapas próprias. Com efeito, a Lei de Diretrizes e Bases da EducaçãoNacional define tal atendimento como uma modalidade educacional que perpassa portodos os níveis escolares, desde a educação infantil até o ensino superior. Dessa forma, oreferido atendimento diferencia-se substancialmente da escolarização, devendo seroferecido em horário diverso do dessa, justamente para possibilitar que os alunos nelaatendidos possam freqüentar as turmas de ensino regular, não podendo o mesmofuncionar como um substitutivo da educação escolar.

Tal modalidade educacional deve ser entendida como um instrumento, umcomplemento que deve estar sempre presente na Educação Básica e Superior para osalunos que dela necessitarem, visando à melhoria da qualidade das respostas educativasque a escola pode oferecer e à conseqüente facilitação do processo de aprendizagem.Como exemplo, podemos citar o ensino do sistema Braile, da LIBRAS, do Português parao surdo, entre outros.

Assim a efetiva inclusão do aluno com deficiência implica possibilitar o acesso aoensino e não apenas à escola. Portanto, não basta a simples inserção dos alunos comdeficiência nas escolas regulares. Há de se proporcionar o acesso pleno à sala de aularegular e às demais atividades oferecidas pela escola, favorecendo o acesso total aoconhecimento.

Para tanto, é imprescindível garantir a quebra das barreiras arquitetônicas existentesna edificação escolar (e não somente na sua entrada), a existência de intérprete e deprofessor de língua de sinais, a oferta de material didático em Braille, ensino do Braille,entre outras ações. É importante, também, que todos os alunos, mesmo aqueles quenão possuem deficiência, se beneficiem desse conhecimento do aprendizado em línguade sinais e escrita e leitura do Braille, a fim de facilitar a comunicação entre todos.É tempo de mudar as escolas, as atitudes, os pensamentos, o ambiente como um todo.Inclusão significa transformação. Sem esse redimensionamento no atual panorama escolar,

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poder-se-á falar em outra coisa, mas não de inclusão. Mittler (2003) acredita que o maiorobstáculo para a mudança está dentro de nós mesmos, seja nas nossas atitudes, seja nosnossos medos.

Os professores precisam conscientizar-se de que o seu papel é educar os seus alunos,mas não os que ele escolhe, mas sim os que a ele chegam. Os diretores, também, têm deassumir a sua função, cobrando do Poder Executivo os suportes necessários para aconcretização desse novo paradigma educacional. As Secretarias de Educação têm deincluir em suas prioridades a formação continuada dos docentes, pois não se desejatransferir o desafio unicamente para o professor. Esse desafio é de todos.

Do mesmo modo, os pais precisam reivindicar o Direito à Educação de seus filhos,sem se conformarem com as rejeições praticadas. Todos têm de se envolver nesse processo,que não é fácil, diga-se de passagem, mas que é necessário e irreversível.

Diante de tudo isso, o Ministério Público também deve assumir uma postura bastanteativa nessa área, e é ele também responsável pela inclusão educacional. A ele cabe,entre tantas outras ações, a de verificar se as escolas estão adotando uma política inclusiva,exigindo a adoção das medidas necessárias para o sucesso desta empreitada.

A Constituição Federal de 1988 conferiu uma nova feição ao Ministério Público,na medida em que o incumbiu da defesa dos direitos sociais e individuais indisponíveis,instrumentalizando o Promotor de Justiça de mecanismos efetivos de exigibilidade dessesdireitos.

Portanto, o Ministério Público tem importante papel nesse processo detransformação. Cabe a este órgão a verificação das condições de acessibilidade das escolaspúblicas e particulares, instaurando inquérito civil contra o Município ou Estado e contrao proprietário, a fim de assegurar o pleno acesso a todas as pessoas. Dessa forma, após avistoria técnica por profissional habilitado, pode-se celebrar o Termo de Ajustamento deConduta onde o representante legal do estabelecimento de ensino assume o compromissode ajustar a sua conduta às normas legais, concedendo-se prazos para a execução dasadaptações. Caso o responsável não aceite assinar o mencionado Termo, caberá aoPromotor de Justiça o ajuizamento de ação civil pública para restaurar o direito violado.

Ao atuar pela garantia da implementação da educação inclusiva, deve o MinistérioPúblico exigir que seja assegurada uma escola para todas as pessoas, respeitando eatendendo as diferenças existentes. Assim, além da acessibilidade, deve-se exigir ooferecimento de material didático adaptado, a capacitação permanente dos professorese demais profissionais envolvidos no processo educacional, o oferecimento de serviçosde apoio especializados, entre outros.

O Ministério Público do Rio Grande do Norte, reconhecendo a importância dessatutela, desde o ano de 2003, adotou como meta institucional a inclusão educacionaldas pessoas com deficiência na rede regular de ensino. Os Promotores de Justiça de todoo Estado expediram recomendações às Secretarias de Educação para que elas adotassemuma política de educação inclusiva.

A escola é para todos: o Ministério Público e a tutela do direito daspessoas com deficiência à educação

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Porém, não bastava impedir a recusa da matrícula ou garantir a acessibilidade, erapreciso levar à escola as crianças e adolescentes que ainda estavam excluídos do sistemade ensino. Contudo, como encontrá-las para que lhes fosse assegurado o direito à educação?

Com esse intuito, foi firmada uma parceria com a Empresa Brasileira de Correios eTelégrafos, por meio da qual os carteiros da Capital do Estado, ao percorrerem os seusbairros de atuação, procuravam identificar se existiam pessoas com deficiência que nãofreqüentavam ou nunca freqüentaram a Escola, preenchendo um formulário previamentefornecido pelo Ministério Público.

Tais formulários, após preenchidos pelos carteiros, eram enviados para asPromotorias de Justiça e as famílias eram chamadas para uma audiência a fim deperquirir os reais motivos da exclusão escolar, oportunidade em que se teve, muitasvezes, o conhecimento de que a ausência da escola por parte de algumas crianças eadolescentes era motivada por puro desconhecimento do direito daqueles à educação.Além disso, foram identificados alguns casos de crime de recusa de matrícula, bemcomo de carência de material didático adaptado e de ajudas técnicas disponibilizados,de precário fornecimento de órteses pelo Poder Público e do próprio serviço de saúde,entre outros.

Assim, diante da situação encontrada, o Promotor de Justiça tomava uma ou maisdas seguintes providências: 1) encaminhamento da criança ou adolescente com deficiênciaà escola mais próxima de sua residência; 2) expedição de recomendação ao diretor daEscola para o recebimento de determinada aluno com deficiência; 3) encaminhamentoà Secretaria Estadual de Educação para que, por intermédio da Coordenação da EducaçãoEspecial, providenciasse e acompanhasse o processo de inclusão escolar da criança ouadolescente, indicando, ainda, quais as ajudas técnicas necessárias ou o atendimentoeducacional especial que melhor se apresentava para contribuir com o desenvolvimentopessoal do aluno; e 4) abertura de processo criminal contra eventuais diretores ouprofessores que tivessem recusado a matrícula das referidas pessoas, entre outras.

Em relação à falta de acessibilidade nas escolas, foi firmada uma parceria com oFundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), que financiou o pagamento de umaArquiteta, a qual realizou vistorias e emitiu laudos em relação a todas as escolas públicase privadas, até mesmo pré-escolas, em alguns municípios de nosso Estado, em um totalaproximado de 550 (quinhentos e cinqüenta) edificações escolares.

De posse dos laudos, os Promotores de Justiça passaram a firmar os termos deajustamento de conduta com os representantes legais dos estabelecimentos de ensino, a fimde torná-los totalmente acessíveis a todas as pessoas, no menor espaço de tempo possível.

Tais ações vêm sendo implementadas em vários municípios do Rio Grande do Norte,se aperfeiçoando nas parcerias realizadas, como é o caso do envolvimento de Agentesde Saúde -- pertencentes ao Programa Saúde da Família -- que, ao realizarem suas visitasdomiciliares, identificam as pessoas com deficiência que estão fora da escola,encaminhando as informações ao Promotor de Justiça da respectiva localidade.

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Também foi celebrada, posteriormente, uma parceria que persiste ainda hojecom o Centro de Reabilitação Infantil, órgão ligado à Secretaria de Saúde PúblicaEstadual, responsável pelo atendimento de crianças e adolescentes com deficiênciade todo o Rio Grande do Norte, o qual também se incumbiu da identificação daquelesque estão fora da rede regular de ensino, realizada nas ocasiões em que são aquelesatendidos.

Em razão das recomendações às Secretarias de Educação, esse assunto precisou serdebatido junto aos professores e diretores de escolas. Assim, os Membros do MinistérioPúblico passaram a ministrar palestras para a comunidade escolar para tratar dos aspectoslegais da inclusão educacional, ocasiões em que eram relatados fatos e procedimentosinclusivos de sucesso e divulgados alguns programas federais e estaduais existentes,estimulando-se a prática da inclusão escolar e divulgando-se o direito de todos àeducação.

Outra ação preventiva adotada consistiu na celebração de ajustamento de condutacom o órgão responsável pela expedição de alvarás de construção e reforma e da cartade “habite-se”, para somente serem aprovados para construção os projetos querespeitassem totalmente as normas de acessibilidade. Assim, evita-se a construção oureforma de edificações ou espaços urbanos de forma inacessível.

Uma medida que foi adotada pela Secretaria Estadual de Educação, que setransformou em regra para as escolas estaduais do Rio Grande do Norte, foi a realizaçãode matrícula antecipada para os alunos com deficiência, precedendo o período damatrícula comum. Apesar de se instituir um período diferenciado para esses alunos, nãose trata o referido ato de discriminação, sendo oferecido à pessoa com deficiência maisuma oportunidade de divulgação do seu direito à educação (uma vez que a matrículaantecipada é precedida de ampla divulgação), podendo aquela optar por matricular-seno período comum de matrícula, disputando as vagas existentes. A matrícula antecipadapossibilita à escola saber, com antecedência, que receberá um aluno com algum tipo dedeficiência e, com isso, obter mais tempo para se adaptar, a fim de inseri-loadequadamente. Entretanto, vale ressaltar, mais uma vez, que se trata a matrículaantecipada de uma faculdade e não uma imposição ao aluno com deficiência, sendoilegal a proibição de inscrição em estabelecimento regular de ensino no período comumpara todos os outros alunos, porque já expirou o prazo concedido antecipadamente.

Com tais ações, pode-se observar um aumento significativo de inclusão de alunoscom deficiência na escola comum da rede regular de ensino.

As críticas à inclusão na educação consistem no despreparo da escola atual e dosprofessores para aderirem a este novo sistema. Assim, alguns pregam a chamada “inclusãoresponsável”, o que significa, na prática, a exclusão de alguns alunos do sistemaeducacional, por meio da escolha feita pelos diretores e professores de quem nele podese integrar. A Constituição Federal, quando prescreve o direito à educação, não conferea ninguém o poder de decidir quem dela poderá desfrutar.

A escola é para todos: o Ministério Público e a tutela do direito daspessoas com deficiência à educação

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A despeito dessa forma de agir, há de se considerar a missão constitucional daescola, tendo a mesma de assumir o seu papel e encontrar as respostas educativas paraas necessidades de todos os alunos passando, necessariamente, por uma reconceituaçãodo que seja fracasso escolar. Fracasso segundo o que? Tendo como referência as atitudesde quem? Conforme os padrões previamente determinados, desconsiderando aspeculiaridades e a diversidade na sala de aula?

As dificuldades de aprendizagem são inerentes ao processo escolar. Sempre existirame sempre existirão, independentemente do aluno possuir ou não alguma deficiência.Nesta nova perspectiva, remete-se o problema não ao aluno, mas à escola a fim de queesta ofereça o suporte necessário para o alcance do aprendizado.

Mantoan (2005) afirma que o movimento inclusivo nas escolas, por mais que sejaainda muito contestado pelo caráter ameaçador de toda e qualquer mudança, é irreversívele convence a todos pela sua lógica e pela ética de seu posicionamento social.

Um mundo inclusivo não é apenas possível, ele é saudável e necessário para todasas pessoas. Assim, apesar da reversão do quadro atual ser lenta, ela é plenamente viável.As barreiras e as dificuldades existem, mas não podem afastar, em hipótese alguma, avalidade e necessidade do processo.

E o Ministério Público, como órgão encarregado de zelar pela efetividade dos direitosconsagrados à pessoa com deficiência, assume, nesse contexto, o papel de agentetransformador, com o fim de tornar a sociedade inclusiva e elevar a referida parcela dapopulação à condição de cidadã, garantindo a plenitude de sua dignidade humana.

ReferênciasReferênciasReferênciasReferênciasReferências

MANTOAN, Maria Teresa Eglér. Caminhos pedagógicos da inclusãoCaminhos pedagógicos da inclusãoCaminhos pedagógicos da inclusãoCaminhos pedagógicos da inclusãoCaminhos pedagógicos da inclusão. Disponível em:<http://www.educacaoonline.pro.br/art caminhos pedagogicos da inclusao.asp>. Acessoem: 10 ago. 2005.

MITTLER, Peter. Educação inclusivaEducação inclusivaEducação inclusivaEducação inclusivaEducação inclusiva. Contextos Sociais. Traduzido por Windyz BrazãoFerreira. Porto Alegre: Artmed, 2003.

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