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C ADERNOS S AÚDE C OLETIVA , R IO DE J ANEIRO , 13 (2): 545 - 566, 2005 – 545 D OCUMENTO H ISTÓRICO AS RELAÇÕES DINÂMICAS DA EPIDEMIOLOGIA COM A SOCIEDADE: A CONFERÊNCIA ROBERT CRUIKSHANK Milton Terris 1 (Tradução e notas biográficas: Diana Maul de Carvalho 2 ) 1. INTRODUÇÃO A Epidemiologia, estudo da saúde de populações humanas, é por definição uma ciência social. Sua teoria e prática têm sido profundamente influenciadas pela sociedade - por desenvolvimentos econômicos, sociais e políticos. Por outro lado, a epidemiologia tem se tornado uma força poderosa na evolução e transformação das populações humanas e sua organização social. Discutiremos aqui algumas dessas interrelações. 2. DOENÇAS INFECCIOSAS A questão básica da teoria epidemiológica no século XIX era a causa das doenças epidêmicas: miasma versus contágio. Esta questão não poderia ser resolvida na primeira metade do século porque o conhecimento científico era insuficiente. Ackerknecht, num artigo extraordinariamente esclarecedor sobre “O anticontagionismo entre 1821 e 1867” (1), destacou que “O contagionismo não era um mero problema teórico ou mesmo médico. O contagionismo tinha encontrado sua expressão material nas quarentenas e sua burocracia, e toda a discussão não era nunca uma discussão do contágio apenas, mas sempre do contágio e das quarentenas. As quarentenas significavam, para a classe rapidamente crescente dos comerciantes e industriais, uma fonte de perdas, uma limitação à expansão, uma arma do controle burocrático que eles não queriam mais tolerar, e esta classe estava muito naturalmente, com sua imprensa e deputados, seus recursos materiais, morais e políticos, por trás daqueles que mostravam que o fundamento científico da quarentena não existia, os quais, de qualquer jeito, eram geralmente filhos dessa mesma classe. O contagionismo se tornou, através de sua associação com as velhas forças burocráticas, suspeito para todos os liberais que tentavam reduzir a interferência do estado a um mínimo. Portanto os anticontagionistas não eram apenas cientistas, 1 “Agradecemos aos Editores do Journal of Public Health Policy, Anthony Robbins e Phyllis Freeman, por concederem autorização para publicação desta tradução.” 2 Professora Adjunta, Departamento de Medicina Preventiva, Faculdade de Medicina UFRJ.

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CA D E R N O S S A Ú D E C O L E T I V A , R I O D E J A N E I R O , 13 (2 ) : 545 - 566, 2005 – 545

D O C U M E N T O H I S T Ó R I C O

AS RELAÇÕES DINÂMICAS DA EPIDEMIOLOGIA COM A SOCIEDADE:A CONFERÊNCIA ROBERT CRUIKSHANK

Milton Terris1 (Tradução e notas biográficas: Diana Maul de Carvalho2)

1. INTRODUÇÃO

A Epidemiologia, estudo da saúde de populações humanas, é por definiçãouma ciência social. Sua teoria e prática têm sido profundamente influenciadaspela sociedade - por desenvolvimentos econômicos, sociais e políticos. Por outrolado, a epidemiologia tem se tornado uma força poderosa na evolução etransformação das populações humanas e sua organização social. Discutiremosaqui algumas dessas interrelações.

2. DOENÇAS INFECCIOSAS

A questão básica da teoria epidemiológica no século XIX era a causa dasdoenças epidêmicas: miasma versus contágio. Esta questão não poderia ser resolvidana primeira metade do século porque o conhecimento científico era insuficiente.Ackerknecht, num artigo extraordinariamente esclarecedor sobre “O anticontagionismoentre 1821 e 1867” (1), destacou que “O contagionismo não era um meroproblema teórico ou mesmo médico. O contagionismo tinha encontrado suaexpressão material nas quarentenas e sua burocracia, e toda a discussão não eranunca uma discussão do contágio apenas, mas sempre do contágio e das quarentenas. Asquarentenas significavam, para a classe rapidamente crescente dos comerciantes eindustriais, uma fonte de perdas, uma limitação à expansão, uma arma do controleburocrático que eles não queriam mais tolerar, e esta classe estava muitonaturalmente, com sua imprensa e deputados, seus recursos materiais, morais epolíticos, por trás daqueles que mostravam que o fundamento científico da quarentenanão existia, os quais, de qualquer jeito, eram geralmente filhos dessa mesma classe.O contagionismo se tornou, através de sua associação com as velhas forçasburocráticas, suspeito para todos os liberais que tentavam reduzir a interferênciado estado a um mínimo. Portanto os anticontagionistas não eram apenas cientistas,

1 “Agradecemos aos Editores do Journal of Public Health Policy, Anthony Robbins e Phyllis Freeman, porconcederem autorização para publicação desta tradução.”

2 Professora Adjunta, Departamento de Medicina Preventiva, Faculdade de Medicina UFRJ.

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eram reformadores, lutando pela liberdade do indivíduo e do comércio contra osgrilhões do despotismo e da reação. Este segundo aspecto do anticontagionismocontribuiu provavelmente não menos que seus aspectos científicos para queganhasse a maioria dos médicos que eram independentes do Estado.”

O pano de fundo político da discussão anticontagionista era óbvio. Osprincipais contagionistas- à exceção do professor e liberal Jacob Henle - eramoficiais da marinha ou do exército, de alta patente. Os principais anticontagionistas,por outro lado, eram conhecidos radicais ou liberais, e incluíam Rudolf Virchowna Alemanha e François Magendie na França. Como observou Ackerknecht,“Os anticontagionistas estavam motivados pelo novo espírito científico críticodo seu tempo....Não é por acidente que tantos deles eram cientistas de renome.Para eles esta era uma luta pela ciência, contra autoridades ultrapassadas emisticismos medievais; pela observação e pela pesquisa contra os sistemas ea especulação.”(1)

O grande pioneiro da patologia celular, o cientista pesquisador Rudolf Virchow,lutou nas barricadas em Berlim na revolução de 1848, liderou o PartidoProgressista em oposição a Bismarck no Reichstag, foi um dos fundadores domovimento de reforma da medicina na Alemanha, e contribuiu de formaimportante para a saúde pública e o desenvolvimento dos hospitais.

Virchow, juntamente com Max von Pettenkofer na Alemanha, François Méliere Louis René Villermé na França, e William P. Alison na Escócia, representa umaescola “sociológica” de anticontagionistas que consideravam a pobreza e adestituição como as fontes primárias das doenças (1,2). Alison, por exemplo, eracrítico da estreita teoria miasmática de Edwin Chadwick e seus consultores médicos,Neil Arnott, J.P.Kay e Southwood Smith. Alison considerava a reforma sanitáriadesejável e necessária mas não suficiente; precisava ser acompanhada por melhoriageral das condições de vida das classes mais baixas (2).

Os reformadores sanitários ingleses, entre os quais destacavam-se EdwinChadwick e John Simon, eram defensores ardorosos da teoria miasmática comobase de suas atividades. Seus pontos de vista receberam sustentação estatísticacom os trabalhos de William Farr, que demonstrou que a mortalidade porcólera estava inversamente relacionada com a altitude em relação ao rio Tâmisa.Farr explicava esta relação nos termos da teoria miasmática; ele descreve as águasdo Tâmisa “águas sujas, turvas, escuras, de esgotos quase estagnados” e observaque “estas águas liberavam constantemente seus vapores contaminados sobre agrande cidade adormecida” (3). Como John Simon e outros miasmáticos, Farrconhecia o trabalho de Snow mas não o aceitava; só após o “experimento natural”de 1853-54, ele reconheceu a importância do suprimento de água. Mas mesmoassim continuou a interpretar os dados em termos da teoria miasmática (4).

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Por que Snow estava certo e Farr estava errado? Num artigo recente noInternational Journal of Epidemiology, Donald Cameron e Ian Jones afirmamque “Snow usa a estatística para ajudar a confirmar uma teoria que ele jádesenvolvera, para fornecer evidências comprobatórias que não poderiam serconvenientemente obtidas de outra forma. Ele não usou a estatística para queesta fornecesse a teoria, como fez Farr em sua demonstração da associação entrea incidência de cólera e a altura acima do nível do rio Tâmisa.....Snow utilizoutodo o seu conhecimento biológico, médico e social em suas pesquisas. Da medicinaele utilizou teorias e técnicas clínicas, patológicas, microscópicas e químicas e, éclaro, expressou esses conhecimentos de forma lógica e, quando apropriado, comanálises aritméticas.....Sua epidemiologia não tinha apenas um lado” (5).

Cameron e Jones consideram que a maioria dos epidemiologistas modernos“estão tão convencidos que há um método epidemiológico e que este é essencial-mente aritmético, probabilístico e empiricista, que perdem a dimensão dacontribuição de John Snow à ciência. Ao fazê-lo, trivializam esta contribuiçãocomo trivializam a epidemiologia. A contribuição de John Snow foi a de desenvolveruma teoria elegante, consistente interna e externamente, que dizia respeito aosmecanismos e processos envolvidos em todos os aspectos do objeto de estudo.Para fazer isto ele não se restringiu a qualquer método. Ele utilizou todos osconhecimentos e técnicas disponíveis naquele momento.”

Os argumentos de Cameron e Jones são interessantes. Mas não é verdadeque Farr tenha “utilizado a estatística para fornecer a teoria”. Pelo contrário, ateoria miasmática era a explicação dominante para as doenças epidêmicas em1849 e Farr estava apenas fornecendo comprovações para a teoria. A perguntapermanece : por que Farr escolheu a teoria errada?

Uma possivel explicação, a de que Farr não conhecesse a teoria dos germes,é eliminada pois Farr discutiu a exposição desta teoria por Henle em 1840, e arejeitou (6,7).

Outra explicação, coerente com a visão de Cameron e Jones, é indicada porMajor Greenwood: “ Não creio que como epidemiologista puro, Farr fosse tãobom como era como especialista em estatísticas vitais....Do ponto de vista dabiologia ele não via tão longe quanto Snow ou Budd.....Faltava-lhe conhecimentobásico; ele não havia, como Pasteur ou Henle, realizado qualquer trabalho depesquisa biológica ou química.... Farr não tinha profundidade matemática nemera um biólogo notável”(8).

A falta de formação biológica é uma fraqueza importante na pesquisaepidemiológica. Ela explica a curiosa resistência de eminentes estatísticos comoJoseph Berkson, J. Yerushalmy, e R.A.Fisher em aceitar o papel etiológico dofumo de cigarros de tabaco no câncer de pulmão; eles só conseguiam ver as

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questões estatísticas e estavam cegos para a plausibilidade dos mecanismosbiológicos envolvidos. Snow acertou porque baseou sua teoria da transmissãofecal-oral da cólera nas características biológicas da doença, bem como na suadistribuição pelas diferentes classes sociais e grupos ocupacionais da população, enas múltiplas situações de transmissão pessoa-pessoa. Snow combinou as abordagensbiológica, social e estatística da epidemiologia numa síntese notável que resolveua questão da cólera muito antes dos bacteriologistas confirmarem sua análise. Eleconseguiu isto porque, em suas próprias palavras: “há evidências suficientes, euacredito, nas páginas seguintes, para provar a maneira de transmissão da cóleraaqui defendida, independentemente da patologia da doença; mas foi considerando

sua patologia, que o modo de transmissão foi inicialmente explicado” (minha ênfase-M.T.).A descrição precisa da patologia da cólera por Snow, que “invariavelmente seinicia com o comprometimento do canal alimentar”, foi baseada em suas própriasobservações e nas descrições de outros; forneceu uma sólida base biológica parasua brilhante elucidação da epidemiologia da doença (9).

Durante os anos 50 e 60 do século XIX ocorreu um tremendo desenvolvimentoda ciência bacteriológica, culminando nos anos 70 com a comprovação definitivada teoria do germe que Snow tão claramente formulou um quarto de séculoantes (10). Esta não foi a primeira vez que a epidemiologia desbravou a trilha queas chamadas ciências básicas percorreriam com certo atraso; o Tratado sobre o

Escorbuto de Lind, foi publicado em 1753, um século e meio antes que fosseformulada e aceita uma teoria das doenças carenciais.

3. DOENÇAS NÃO-INFECCIOSAS

A vitória da teoria do germe anunciou os notáveis avanços da primeirarevolução epidemiológica: a conquista de muitas das doenças infecciosas. Amicrobiologia se tornou a mais importante ciência para a medicina, e a prevençãodas doenças infecciosas quase que a única preocupação da saúde pública.

A hegemonia da teoria do germe significava que todas as doenças deviam serexplicadas por ela, e que todos os esforços deviam ser feitos para encontrar oorganismo responsável por cada doença de origem desconhecida. Esta busca foiextraordinariamente profícua, mas suas limitações também começaram a ser cadavez mais evidentes. Muitas doenças não se encaixavam no molde microbiológico.Tentativas reiteradas não produziam resultado. A teoria do germe não erasuficiente; novas teorias da causalidade das doenças precisavam ser desenvolvidas.

Como mostrou K.Codell Carter, a história do beri-beri fornece um exemplodesse processo (11). William Anderson, um dos primeiros ocidentais a investigar oberi-beri no Japão, registrou em 1876 que a maioria dos médicos japonesesacreditavam que a doença era causada por alguma emanação venenosa do solo.

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Kamehiro Takaki, o James Lind do beri-beri, era diretor do Hospital Naval deTóquio. Em 1882, as observações de Takaki o levaram a atribuir o beri-beri adeficiências alimentares. Ele persuadiu o cético almirantado japonês a empreendergrandes reformas na dieta dos marinheiros; introduziram mais carne fresca,legumes e verduras, e em algumas refeições a cevada substituía o arroz. Os efeitosforam incríveis: em 1882 ocorriam mais de 400 casos de beri-beri por cada 1000homens; em cinco anos a doença estava completamente eliminada.

Infelizmente, a visão de Takaki sobre a etiologia do beri-beri estava corretano geral mas falsa em pontos específicos. Seu conceito era de que “ uma grandedeficiência de substâncias nitrogenadas e um grande excesso de carbohidratos naalimentação, são as causas.” Esta hipótese não era sustentada pelos dadosepidemiológicos: aqueles que contraíam beri-beri com freqüência comiam mais e deum espectro maior de alimentos, inclusive proteinas, do que os que não adoeciam.A revisão do Lancet em 1887 a respeito do trabalho de Takaki, conclui que “opeso das evidências ainda está a favor da hipótese miasmática.”

Com o avanço da microbiologia, um grande número de pesquisadores procuroue achou o organismo responsável pelo beri-beri. Por exemplo, Glockner identificouuma ameba, Fajardo um hematozoário, Pereira um microorganismo esférico,Durham um estreptococo, Lacerda um ascomiceto polimorfo, Taylor um espirilo,Pekelharing e Winkler um estafilococo, Thomas o ancilóstomo duodenal, Nepveuum estreptobacilo, Rost um diplobacilo, e Dangerfield um micrococo aeróbico.Houve muitos outros (11). Desenvolveram-se as teorias mais variadas: HamiltonWright pensava que a porta de entrada era a boca e que o organismo produziauma toxina na extremidade pilórica do estômago; Herbert Durham acreditavaque o beri-beri era semelhante à difteria e se transmitia por fômites; e PatrickManson propôs uma toxina transmitida pelo ar, produzida por microorganismosfora do corpo. Em 1897, Spencer escreveu que restava pouca dúvida de que oberi-beri era uma doença causada por germes e que o microorganismo causadortinha uma ação especialmente tóxica para os nervos periféricos. Este continuou aser o ponto de vista dominante durante a primeira década do século XX; amaioria dos compêndios médicos de então tratavam o beri-beri como umadoença infecciosa.

Em 1897, Eijkman, um microbiologista que estudou com Robert Koch emBerlim, e que tinha sido enviado a Java em 1883 para encontrar o organismoresponsável pelo beri-beri, acidentalmente descobriu uma doença semelhante nosfrangos de seu laboratório. Ele não encontrou nenhum agente patogênico nosanimais, nem conseguiu infectar frangos sadios colocando-os em contato com osdoentes. Investigações mais minuciosas revelaram que os frangos com polyneuritisgallinarum, como Eijkman denominou a doença, tinham sido alimentados por algumas

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semanas com sobras de arroz cozido da cozinha do hospital em vez de sua dietahabitual de arroz cru. Ele também observou que o arroz do hospital era polidoao contrário da ração de frangos. Com algumas experiências ele pôde demonstrarque a ingesta de arroz polido era responsável pela polineurite dos frangos.

Um colega de Eijkman, A.G. Voderman, realizou então um inquérito em 27prisões em Java onde os prisioneiros eram alimentados com arroz integral comoa população local, e em 74 prisões onde era servido arroz polido. Os resultadosforam espantosos; entre os que comiam arroz integral somente 1 em 10000apresentava beri-beri, enquanto que entre os que comiam arroz polido, 1 em 39tinha a doença. Mais tarde, Braddon relatou que nos estados malaios, os chineses,que comiam arroz polido, tinham muito beri-beri; os tamil e os malaios quecomiam arroz integral, quase não conheciam a doença.

Farr interpretou o “experimento natural” de Snow nos termos da teoriamiasmática, e Braddon e Eijkman tentaram explicar seus achados epidemiológicospor formulações derivadas da teoria do germe. Braddon postulou que uma toxinaera produzida por microorganismos presentes no arroz polido, enquanto queEijkman achava que a toxina era produzida a partir do amido, possivelmente porum microorganismo presente no trato alimentar ou nos nervos, e que a casca doarroz integral evitava a produção da toxina ou a tornava inócua.

Trabalhos posteriores não confirmaram essas teorias, e em 1910 as váriaslinhas de pesquisa convergiam rapidamente para uma teoria de doenças carenciais.Enquanto que no encontro da Sociedade de Medicina Tropical e Higiene em 1909,a maioria era contrária à teoria carencial do beri-beri, no encontro de1911, o consenso havia mudado: praticamente, o único opositor desta teoria eraPatrick Manson. E, finalmente, em 1912 Casimir Funk reuniu os resultados dosestudos epidemiológicos, experiências com animais e investigações químicas, paraformular a nova teoria em seu artigo “ A Etiologia das Doenças por Deficiência”.Funk identificou um número dessas doenças incluindo beri-beri, escorbuto, pelagrae raquitismo, e afirmou que essas diferentes doenças eram devidas a deficiênciasdiversas. Funk também assinalou que haviam sido necessários vinte anos de trabalhocientífico para estabelecer que essas doenças eram causadas por falta de nutrientesessenciais. A teoria das doenças carenciais estava finalmente estabelecida.

Mas este não foi o fim da história. Em fevereiro de 1914, quando JosephGoldberger foi nomeado pelo Cirurgião Geral do Serviço de Saúde Pública dosEstados Unidos para investigar a pelagra, que atingira proporções epidêmicas nosestados do sul, o pensamento dominante nos Estados Unidos era de que a pelagraera uma doença infecciosa. Este ponto de vista se sustentava fortemente norelatório de 1911 da Comissão de Pelagra do Illinois, e no da Comissão Thompson-McFadden para Pelagra que trabalhou em Spartanburg, Carolina do Sul, e

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concluiu em 1913 que “(1) A suposição que a ingestão de milho, estragado ounão, é a causa essencial da pelagra, não é confirmada por nossos estudos; e (2) Apelagra é provavelmente uma doença infecciosa comunicável de pessoa a pessoapor meios até agora desconhecidos” (12).

Goldberger chegou a conclusões diametralmente opostas num curto espaçode tempo. Após rever a literatura e realizar observações preliminares em campo,ele concluiu em junho de 1914 que a pelagra não podia ser transmitida, que acausa estava na dieta, e que a prevenção consistia em “redução nos cereais,legumes e comidas enlatadas que entram com exagerada freqüência na dieta demuitas populações do sul e aumento do consumo de alimentos frescos, comocarne, ovos e leite.”(12)

Na introdução de Goldberger sobre a Pelagra, que editei em 1964, comentei que“este resultado é ainda mais notável porque se baseia quase totalmente numalinha de raciocínio a partir de tres fatos epidemiológicos bem conhecidos de seuscontemporâneos: (1) em instituições em que ocorriam muitos casos de pelagra,nunca ocorreram casos em enfermeiros ou atendentes; (2) a doença era essencial-mente rural; e (3) estava associada à pobreza.”(12) Não é certo que Goldbergerdesconhecesse o trabalho de Casimir Funk na época em que desenvolveu suahipótese. Num trabalho publicado em outubro de 1915 “A prevenção da pelagra:um teste dietético em prisioneiros”(13), ele menciona “a sugestão de Funk que apelagra é uma deficiência vitamínica, provocada pelo consumo de milho polido”,e cita nas referências o livro de Funk, Die Vitamine, publicado em 1914, e umartigo de Funk sobre pelagra, também publicado em 1914 (13). Sem denegrir ostrabalhos de Goldberger - pois Snow sobre a cólera e Goldberger sobre a pelagra são semdúvida grandes clássicos da epidemiologia - nós devemos reconhecer que ele nãoestava trabalhando num vácuo teórico. Por exemplo, no encontro da National

Association for the study of pellagra em Columbia, na Carolina do Sul, em 1912, F.M.Sandwith da Inglaterra e James W.Babcock da Carolina do Sul, levantaram adiscussão sobre as deficiências na dieta como causa da pelagra (14). É claro quetanto Goldberger como Snow devem muito aos predecessores que criaram asbases ideológicas de suas grandes descobertas.

Os contagionistas não desistiram sem luta. Em 1916, W.J.McNeal da ComissãoThompson-McFadden lançou um ataque sobre as experiências de Goldbergernas prisões com o artigo no Journal of the American Medical Association “Aalegada produção de pelagra por uma dieta não-balanceada”. Neste mesmo anoa referida Comissão apresentou seu relatório final, afirmando enfaticamente quea doença era infecciosa e que a única maneira eficiente de combatê-la era comsistemas adequados de esgotamento sanitário (15). Ao contrário de Snow,Goldberger recebeu apoio de lideranças da saúde pública, não apenas do

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Cirurgião-geral, Rupert Blue, mas também de David Edsall da Universidade deHarvard, Victor C. Vaughan da Universidade de Michigan, e William H. Welchda Universidade Johns Hopkins (16). O tempo até a aceitação foi bem mais curtopara a pelagra do que para a cólera.

Um hiato acontece então no desenvolvimento da epidemiologia das doençasnão-infecciosas. Em 1927, Wade Hampton Frost, professor de epidemiologia daEscola de Higiene da Universidade Johns Hopkins, definia epidemiologia como“a ciência dos fenômenos de massa nas doenças infecciosas”, ainda que reconhecesseque era “costume aplicar o termo também ao estudo de fenômenos de massa emdoenças não-infecciosas como o escorbuto, porém não se aplicava às chamadasdoenças constitucionais como arteriosclerose e nefrites”(17). Frost morreu em1938 e foi sucedido por Kenneth Maxcy; quando eu frequentei o curso básicode epidemiologia da Johns Hopkins em 1943, não se discutia escorbuto ou pelagra- Snow sobre a cólera, era leitura obrigatória, mas o trabalho que marcou época deGoldberger não era sequer mencionado- e o curso se limitava exclusivamente àsdoenças infecciosas.

No entanto, o estudo do câncer e outras doenças crônicas, já havia começadonos Estados Unidos. O povo de Massachusetts tinha “exigido com insistênciacrescente que ações fossem tomadas, e através de uma resolução do legislativoaprovada em 1926 o Departamento de Saúde Pública de Massachusetts se dedicoua um programa de controle do câncer”(18). George H. Bigelow e Herbert L.Lombard desse Departamento, realizaram extensas pesquisas, descritivas e analíticas,sobre a epidemiologia do câncer. Seu trabalho pioneiro Câncer e outras doenças

crônicas em Massachusetts publicado em 1933, inclui um dos primeiros estudoscaso-controle demonstrando a relação entre tabaco e câncer de boca (19). Esteestudo foi depois ampliado para incluir o câncer de pulmão, para o qual foidescrita a mesma relação em 1945 (20).

4. A MEDICINA SOCIAL NA INGLATERRA

Os acontecimentos na Grã-Bretanha foram um pouco diferentes. O maisimportante livro de epidemiologia britânico, Princípios de Epidemiologia e o Processo

Infeccioso, escrito por C.O.Stallybrass em 1931 (21), indicava pelo título suapreocupação total com as doenças infecciosas. Por outro lado, Major Greenwood,professor de epidemiologia e estatísticas vitais na London School of Hygiene andTropical Medicine, se afastou desta tradição em seu livro sobre Epidemias e Doenças

de Massa, uma Introdução ao Estudo da Epidemiologia publicado em 1935 (22). O últimocapítulo deste livro foi dedicado à epidemiologia do câncer, e incluía dados sobretendência secular, diferenças por classe social, a maior incidência de câncer demama em mulheres que nunca engravidaram e, ao contrário, a maior incidência

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de câncer de colo do útero em mulheres casadas que engravidaram pelo menosuma vez, não se observando relação com o número de gestações.

Em 1943, John A. Ryle, Professor Regius de Medicina em Cambridge,renunciou a seu cargo para se tornar o primeiro professor de medicina social naInglaterra aceitando a cadeira que acabava de ser criada na Universidade deOxford. Este evento de peso assinalou a passagem da epidemiologia das doençasinfecciosas para a das doenças não-infecciosas. Como afirmou Ryle “A saúdepública... tem estado fundamentalmente preocupada com as doenças transmissíveis,suas causas, distribuições, e prevenção. A medicina social se preocupa com todasas doenças prevalentes, incluindo a doença reumática do coração, úlcera péptica,doenças reumáticas crônicas, doença cardiovascular, câncer, psiconeuroses, eacidentes - que também têm sua epidemiologia e suas correlações com situaçõessociais e ocupacionais e devem eventualmente ser consideradas preveníveis emmaior ou menor grau”(23). O movimento da medicina social na Inglaterra, queRyle simbolizou e liderou, foi essencialmente um movimento na direção daepidemiologia das doenças não- infecciosas.

Esse movimento foi de certa forma, uma ressurreição da escola sociológicado século XIX, que incluíra médicos ilustres como Rudolf Virchow e Max vonPettenkofer na Alemanha, Louis René Villermé na França e William P. Alison naEscócia. Como já dito antes neste trabalho, estes médicos consideravam insuficientesas reformas sanitárias e afirmavam que a pobreza e a destituição eram as fontesprimárias das doenças. Seus pontos de vista divergiam radicalmente dos de EdwinChadwick e seus colegas, que foram descritos por Frances Smith em seu recentelivro A saúde do povo, 1830-1910, como se segue:

“Os novos homens, Southwood Smith, Chadwick, Dr.Neil Arnott e outroseconomistas políticos benthamitas, tinham se tornado no final dos 1830 absoluta-mente mecanicistas. Eles projetaram um círculo fechado de causação que evitava asquestões morais da privação e da redistribuição. Eles argumentavam que a ‘fonteda alta mortalidade nas cidades’ era ‘não devida à falta de comida e à grandemiséria....mas gerada por eflúvios venenosos’. Esta doutrina convenientementeestreita se tornou influente nos 100 anos seguintes e mais além”(24).

Que havia um forte sabor de interesse de classe e de preconceito no zêloreformista e humanitário de Chadwick e seus especialistas médicos fica claro apartir do relato de Michael Cullen dos pontos de vista de um dos membros dogrupo, J.P.Kay. Num dos primeiros trabalhos lidos perante a Sociedade deEstatística de Manchester o Dr.Kay assinalou sua antipatia pela antiga lei dospobres afirmando que a ajuda não deveria ser dada a não ser quando “encoragea virtude e o trabalho”. Kay argumentava em seu livro A Condição Moral e Física dasClasses Trabalhadoras que com a manutenção das leis do milho, uma redução das

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horas de trabalho significaria apenas uma redução dos salários; a resposta era olivre-comércio. Um sistema educacional também se fazia necessário para que ospobres fossem treinados no uso de seu tempo de lazer e entendessem a realidadede “sua posição política na sociedade, e os deveres que lhe são correspondentes”.Os males da desocupação, má higiene, agitação obreira, imprevidência e vícios,desapareceriam nesta sociedade mais moral (25).

Edwin Chadwick em seu Relatório sobre as Condições Sanitárias da População

Trabalhadora na Grã-Bretanha, expressou preocupação semelhante quando indicou“a importância das considerações morais e políticas, visto que os agentes físicosnocivos deprimem a saúde e o vigor da população, e agem como obstáculos paraa educação e a cultura moral; ao diminuir a duração da vida adulta das classestrabalhadoras, impedem o crescimento da aptidão produtiva, e diminuem aquantidade de experiência social e hábitos morais estáveis na comunidade:substituem uma população que acumula e preserva a instrução e é progressiva,por uma população jovem, inexperiente, ignorante, crédula, irritável, passional, eperigosa, tendo uma tendência perpétua à deterioração moral e física”(26).

A necessidade de reforma sanitária para que os trabalhadores vivessem osuficiente para atingir “hábitos morais estáveis” foi enfatizada por Chadwick.Comentando sôbre encontros de trabalhadores em Manchester ele observou que“o grosso da assembléia era constituida de garotos, quase não havendo homensmaduros entre eles. Os mais velhos e experientes, se afirmava, em geral nãoaprovavam as resoluções das reuniões que consideravam prejudiciais às classestrabalhadoras. Estes homens mais velhos, nos asseguravam seus empregadores,eram inteligentes, e percebiam que o capital, e o grande capital, não eram ocaminho de sua depressão, mas de seu sustento permanente e abundante. Eramgeralmente descritos como imunes às falácias anarquistas que faziam balançaressas assembléias selvagens e perigosas.”

Chadwick comentou que os mais velhos não somente reprovavam as “faláciasanarquistas”, como também “a loucura e injustiça dos sindicatos, que comprometiama tranqüilidade pública pela violência de greve após greve.” Eram os trabalhadoresmais jovens ‘meros garotos’, que eram furiosos, que não sabiam o que faziam”(27).

As declarações de Chadwick são consistentes com o fato embaraçoso de queele era o Secretário da Comissão da Lei dos Pobres, responsável pela infame Leidos Pobres de 1834, que se baseava nos seguintes princípios: (1)nenhuma pensãopara os sadios a não ser os recolhidos a uma casa de trabalho; (2) tal pensão deveser “menos desejável” que o pior modo de ganhar a vida do lado de fora; e (3)separação de maridos e mulheres para evitar procriação.

Assim, “estaria garantido o princípio de que a pensão não seria agradável,oferecendo-a somente dentro da casa do trabalho - a detestada ‘Bastilha’, como

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logo a chamaram os pobres - e além disso conservando os que aceitavam o’testeda casa de trabalho’ num ambiente contrito, com pouca comida, disciplina severa,e uma rígida segregação dos sexos que separava marido e mulher.” Chadwick, ogrande pioneiro da reforma sanitária, também se tornou “o homem mais odiadoda Inglaterra” por administrar “a nova Lei dos Pobres com uma falta de piedadeque provocou ampla revolta”(28).

William Farr não escapou desta contradição. John Eyler mostrou que “osescritos de Farr revelam uma verdadeira simpatia pelo sofrimento humano,ausente em Edwin Chadwick, e mais profissionalmente disfarçada em John Simon.”Em 1837, Farr escreveu que “mesmo sob nosso governo reformista, nosenvergonhamos em dizer que os pobres - os fracos - sempre menos capazes de sedefender têm sido, no caso da nova Lei dos Pobres, muito maltratados.” Noentanto, ele defendeu esta lei durante toda a sua vida. Nos anos `70 ele escreveuque “sem abuso”, a Lei dos Pobres “é um seguro de vida contra a morte porfome, e da propriedade contra agitações comunistas”(29).

As visões benthamitas dos reformadores britânicos do século dezenovecontrastam fortemente com as dos advogados da medicina social cem anos maistarde. Mudanças políticas profundas marcam a passagem deste século. Destacam-seentre elas a emergência dos trabalhistas como força política independente, tendocomo resultado que os intelectuais que no século passado tinham que escolherentre os Tory proprietários de terras e os Liberais de classe média, agoramtinham as alternativas dos Conservadores e dos Trabalhistas. O crescimentoconcomitante da ideologia trabalhista e socialista tanto entre os trabalhadorescomo entre os profissionais de classe média criou um clima intelectual depreocupação com as causas sociais dos problemas sociais. Foi este clima intelectualque produziu o movimento da medicina social, e por extensão, fez a epidemiologiase preocupar nas palavras de Sir John Ryle “com todas as doenças prevalentes....quetêm sua epidemiologia e sua correlação com condições sociais e ocupacionais edevem eventualmente ser consideradas preveníveis em maior ou menor grau”(23).

O elo de ligação entre a epidemiologia das doenças infecciosas e não-infecciosas na Grã-Bretanha foi Major Greenwood, professor de epidemiologia eestatística vital na London School of Hygiene; presidente da Sociedade Real deEstatística; autor com Bradford Hill, Topley e Wilson, do trabalho pioneiro sobreEpidemiologia Experimental (30) das doenças infecciosas; e autor de Epidemias e Doenças

de Massa, uma Introdução ao Estudo da Epidemiologia, o primeiro livro didático deepidemiologia que incluiu o estudo do câncer.

Major Greenwood também foi membro fundador da Associação MédicaSocialista, organizada em 1930, que estava intimamente associada ao PartidoTrabalhista Britânico e que foi em grande parte responsável pela decisão daquele

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partido em criar o Serviço Nacional de Saúde. David Stark Murray, o notávelescocês que foi presidente da Associação Médica Socialista por quase 20 anos,rendeu tributo a Major Greenwood em sua história da AMS como o membrofundador que “foi uma incrível força na discussão da saúde pública e dos estudosestatísticos das doenças. Ele teve notável influência nas mudanças de atitude quelevaram à epidemiologia social”(31).

Sir Richard Doll1, um dos grandes pioneiros da epidemiologia das doençasnão-infecciosas, também teve papel relevante na Associação Médica Socialista.Na Conferência Anual da AMS em 1946, após Aneurin Bevan ter apresentado alei do Serviço Nacional de Saúde com concessões que a AMS consideravadesnecessárias, foi Richard Doll quem apresentou a resolução que foi aprovadapor unanimidade, aprovando a lei do Serviço Nacional de Saúde, aceitando aadministração tripartite do SNS como uma medida provisória, requisitando que alei facultasse a todos os clínicos gerais que quisessem, receber salários, e determinandoque fôsse acrescentado um serviço de medicina ocupacional (32).

David Stark Murray enfatiza em sua revisão histórica que durante o período1937-1942, a AMS “tinha muitos profissionais de renome ligados a seu trabalho.Major Greenwood e J.R.Marrack eram membros muito ativos e sempre haviaajuda de pessoas como John Ryle, J.M. MacIntosh, W. Nixon”(33).

Obviamente, o movimento da medicina social na Grã-Bretanha incluíaindivíduos com um amplo espectro de pontos de vista políticos e sociais. Noentanto não há dúvida que os desenvolvimentos políticos e intelectuais indicadosacima tiveram grande importância no crescimento da medicina social e daepidemiologia das doenças não-infecciosas no Reino Unido e provavelmente tambémnos Estados Unidos e outros países. Há muitos anos atrás num maravilhosoencontro da IEA na costa do Adriático, na Iugoslávia, J.A.H.Lee me expôs juntoa uma garrafa de Grk, o vinho local de cor âmbar, sua hipótese que os indivíduosenvolvidos com a medicina social no Reino Unido preenchiam pelo menos duasdas tres seguintes condições: (1) eram trabalhistas; (2) eram escoceses; e (3) tinhamfeito alguma outra coisa antes de se tornarem médicos. Na época ele me assegurouque sua hipótese permanecia válida quando testada; devo dizer que infelizmentenunca consegui ter o conhecimento biográfico necessário para testar sua validade.

5. A SEGUNDA REVOLUÇÃO EPIDEMIOLÓGICA

Uma dedicação conceitual às preocupações da medicina social com aepidemiologia das doenças não-infecciosas- com os efeitos das condições sociais,

1 registramos, com pesar, a morte de sir Richard Doll, em 24 de julho de 2005, aos92 anos. (N.T.)

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ambientais e ocupacionais sobre “todas as doenças prevalentes”- não era suficiente.Vitórias tinham que ser alcançadas. Ferramentas metodológicas precisavam serdesenvolvidas. As cidadelas do conservadorismo nas escolas médicas e nas escolasde saúde pública, precisavam ser conquistadas, e toda uma geração tinha que sertreinada nos novos conceitos e abordagens epidemiológicos.

Talvez o fato isolado mais importante para o triunfo da nova epidemiologia,tenha sido a controvérsia do fumo de cigarro-câncer de pulmão, que começouem 1950. Quase todo o arsenal metodológico da epidemiologia das doenças não-infecciosas foi desenvolvido durante as encarniçadas batalhas entre os Berksons eYerushalmys de um lado (para não mencionar os agentes pagos das fábricas detabaco), e os Cornfields e Lilienfelds do outro. As forças e fraquezas dos estudosretrospectivos e prospectivos, da observação e dos experimentos, foram elucidadasno curso destas disputas intelectuais. Além disso o papel fundamental daepidemiologia na conquista deste avanço científico obteve reconhecimento nacionale internacional. Fundos foram liberados para treinamento e pesquisa emepidemiologia. Nos Estados Unidos a substituição das cadeiras de epidemiologiaorientadas para as doenças infecciosas nas escolas de saúde pública, por represen-tantes desta nova corrente- um processo que levou várias décadas para secompletar- começou em Harvard em 1958 com a nomeação de Brian MacMahon,importado da Inglaterra onde trabalhava em medicina social com ThomasMcKeown em Birmingham. Surgem os primeiros livros didáticos de epidemiologiatratando basicamente de doenças não-infecciosas: Usos da Epidemiologia de Morris,na Inglaterra em 1957, e Métodos Epidemiológicos de MacMahon, Pugh e Ipsen, nosEstados Unidos em 1960.

A Sociedade de Medicina Social na Grã-Bretanha e a Associação Internacionalde Epidemiologia (IEA), organizadas nos anos ‘50, e a Sociedade para PesquisaEpidemiológica nos Estados Unidos organizada na década de ‘60 - associaçõesdevotadas primariamente à epidemiologia das doenças não-infecciosas - cresceramrapidamente em número de membros e em influência. Jovens foram atraídos emresposta ao crescimento de oportunidades para treinamento e pesquisa e à atraçãoda crescente lista de sucessos da nova epidemiologia, como a determinação dosefeitos da radiação sobre a saúde, o esclarecimento da etiologia da doençaisquêmica do coração, a demonstração do valor da fluoretação na prevenção dacárie dentária e o estabelecimento da relação entre fumo de cigarros e doençacrônica obstrutiva do pulmão.

A epidemiologia tornava todas as doenças e agravos território próprio.Libertados da limitação às doenças infecciosas, os epidemiologistas começaram aestudar vários tipos de câncer, diabetes, hipertensão, artrite, úlcera duodenal,cirrose hepática, doença mental, suicídio, acidentes e outros danos, doença

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ocupacional, os efeitos da poluição ambiental, e mesmo doenças iatrogênicas. Seatreveram mesmo a questionar procedimentos médicos bem estabelecidos comocirurgia radical para câncer de mama e tratamento cirúrgico do câncer de pulmão,submetendo frações cada vez maiores da terapêutica convencional à críticaepidemiológica para determinar seus efeitos sobre a evolução das doenças. Defato, os epidemiologistas ultrapassaram a doença para estudar a epidemiologia dasaúde, isto é, do vigor, vitalidade, e desempenho humanos, através de estudoscomo as recentes investigações sobre os efeitos da alimentação materna e infantilno crescimento físico e desempenho mental. E iniciaram agora a importantetarefa de submeter os métodos atuais de organização dos serviços de saúde àavaliação epidemiológica, determinando seus efeitos sobre o resultado, sobre asaúde dos pacientes.

Os epidemiologistas foram bem sucedidos em fornecer aos trabalhadores dasaúde pública poderosas armas para prevenção de muitas das principais causas dedoença, incapacidade e morte. Isto já se reflete na queda de 25% na mortalidadeajustada para idade, por doença isquêmica do coração, no Canadá e nos EstadosUnidos durante a década de ‘70, e na queda de 30% no Canadá e de 38% nosEstados Unidos na mortalidade ajustada para idade, da doença cerebrovascular,na mesma década. Também se reflete na queda da mortalidade por cirrose hepáticano Reino Unido - de 10/100.000 em 1914 à taxa atual de menos de 4/100.000(34) e, mais recentemente, na queda da taxa de mortalidade por cirrose em Cubade 10/100.000 em 1964 para menos de 6/100.000 em 1978.

Estas reduções não se limitam à mortalidade; também ocorrem na morbidade,isto é, na doença e na incapacidade. O declínio sem precedentes na mortalidadepor doença cerebrovascular nos anos ‘70 não ocorreu por avanços no tratamentopois não houve avanços notáveis neste aspecto. Claramente a queda se deve àmaior atenção do público e dos profissionais, resultando em melhor detecção decasos de hipertensão, aumento do uso de drogas anti-hipertensivas, e manutençãomais efetiva do tratamento e controle da hipertensão. Isto significa prevençãoprimária da doença cerebrovascular; não só a mortalidade foi afetada comotambém a incidência.

De forma semelhante, a prevenção primária foi a principal responsável pelodeclínio de 25% na mortalidade por doença isquêmica do coração na Américado Norte nos anos ‘70. Considerando-se que 60 a 67% das mortes por infarto domiocárdio ocorrem fora do hospital (35,36), e que melhorias nos procedimentosterapêuticos clínicos e cirúrgicos têm apenas efeito discreto na sobrevida (37-40),o tratamento não pode ser considerado como principal responsável pelo declínio.Pelo contrário, todas as evidências indicam que mudanças nos fatores de riscoforam o elemento mais importante neste declínio sem precedentes (37,41-43).

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Nem podemos considerar as notáveis reduções na mortalidade por cirrose hepáticana Grã-Bretanha e em Cuba como reflexos de avanços terapêuticos que naverdade foram mínimos. Durante o mesmo período o Canadá e os EstadosUnidos, que esperaríamos usufruir mais de avanços terapêuticos, não apresen-taram qualquer redução na mortalidade; a taxa de mortalidade por cirrose estáestacionária nos Estados Unidos, e tem subido a níveis alarmantes no Canadá.

Nos anos vindouros diminuiremos não só a mortalidade por doenças infecciosas- ainda as principais causas de doença e morte em escala mundial - e doençacerebrovascular, doença isquêmica do coração, e cirrose hepática, como tambémpor acidentes, envenenamentos e violências; por câncer de pulmão e outros tiposcausados por uso de tabaco, álcool, e outros carcinogênicos do meio ambiente eocupacionais; e por doença pulmonar crônica causada por fumo de cigarro e pelaexposição ocupacional de mineiros, trabalhadores da indústria têxtil e outros,expostos a poeiras. Também conseguiremos reduzir a mortalidade por várias outrasdoenças causadas por substâncias químicas e outros riscos ocupacionais e do meioambiente. Estas vitórias serão alcançadas pela prevenção primária, por métodos que, aocontrário dos cuidados clínicos, reduzem a incidência bem como a mortalidade. Tambémfaremos uso adequado de programas de triagem para identificar câncer de mama edo colo uterino no estágio pré-sintomático evitando assim a doença bem como a morte.

Para implementar os programas para evitar estas importantes causas de doença,incapacidade e morte, serão necessárias campanhas contínuas e bem financiadas,lideradas por órgãos governamentais de saúde em níveis locais, municipais,estaduais e no nível nacional. “Bem financiadas”, no entanto, significa apenasuma fração pequena dos muitos bilhões de dólares que são agora utilizados parao tratamento destas doenças evitáveis.

Implementar tais programas não é apenas uma questão de atingir um nível desaúde mais alto, mas de atingir eqüidade na saúde. Tal como a proposta de sistemasnacionais de atenção médica tem por objetivo garantir a eqüidade no acesso a estaatenção, este objetivo também deve ser perseguido na ação mais fundamental paramelhorar os níveis de saúde. Os dados disponíveis indicam que a mudança de estilode vida tem sido mais efetiva nos grupos mais educados, que agora fumam menos,bebem menos, são menos obesos, e fazem mais exercícios (44). É essencial, portan-to, que todos os esforços sejam dirigidos para atingir os grupos menos favorecidos,que constituem a maioria da população, para que seja possivel assegurar a todos ocumprimento do compromisso de Alma-Ata de “Saúde para todos até o ano 2000”.

6. O IMPACTO NA SOCIEDADE

A implementação da segunda revolução epidemiológica necessitará demudanças importantes na agricultura e na indústria. Grandes reduções ocorrerão

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na produção de tabaco, vinho, cerveja, bebidas destiladas, leite integral e queijo,manteiga, ovos, óleos e gorduras saturadas, carnes gordas, e drogas perigosas. Osprocessos de manufatura serão muito modificados para minimizar doenças e danosocupacionais bem como danos ao meio ambiente resultantes da poluição do ar,do solo e das águas. A prevenção efetiva de danos será baseada numa grandevariedade de mudanças e controles ambientais em relação às moradias, veículos,estradas, e armamentos. Evitar a epidemia final - a destruição militar de nossoplaneta por bombas nucleares - exigirá o fim da Guerra Fria, acordos para aprogressiva eliminação de armas nucleares, e redução drástica de toda a produçãomilitar. A International Epidemiological Association tem especial responsabilidadesobre estas questões. É deplorável que entre os mais de 1500 membros da IEAem dezembro de 1982, estivessem apenas 33 oriundos dos 14 países socialistasque representam 1/3 da população mundial. Apesar de nosso cabeçalho trazer onome da Associação em seis linguas - ingles, frances, chines, russo, árabe e espanhol- não havia nenhum membro da União Soviética ou da República Popular daChina. Urge corrigir esta anomalia e fazer nossa própria contribuição para oentendimento internacional e a paz do mundo trazendo nossos colegas dos paísessocialistas para participar plenamente de nossos encontros científicos e atividades.

As questões de saúde pública do nosso tempo permeiam todos os aspectos denossa economia e sociedade. Não são apenas assuntos de políticas de saúde, vistosàs vezes como periféricos mas questões básicas da política econômica e social queos governos devem enfrentar e decidir. Os trabalhadores da saúde pública - e osepidemiologistas em primeiro lugar - têm portanto a responsabilidade de instruirtanto os povos como os governos de nosso planeta sobre a natureza e extensãodos riscos sociais e ambientais para a vida e a saúde dos homens e sobre asmedidas necessárias ao seu controle. Esta não é uma tarefa fácil pois inevitavel-mente enfrentaremos a oposição de poderosos interesses estabelecidos.

Se tivermos sucesso - e sucessos recentes na campanha contra o fumo e naredução da doença isquêmica do coração e da doença cérebro-vascular indicamque teremos sucesso - reduziremos muito as doenças na população e a necessidade decuidados médicos. Entraremos também numa nova era na história da humanidade.Assim como a primeira revolução epidemiológica causou grande mudança nacomposição etária da população, a combinação da segunda revoluçãoepidemiológica e a continuação do controle de nascimentos está gerando umasegunda revolução demográfica. A tendência será de inversão da pirâmidepopulacional com aumento dos grupos mais velhos e contração das faixasde menos idade.

Podemos antever uma proporção cada vez maior de velhos saudáveis, idososque não estão doentes ou incapacitados por doenças evitáveis como doença

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coronariana, cancer, acidente vascular cerebral, doença pulmonar obstrutivacrônica, cirrose hepática, e acidentes. James Fries, da Universidade de Stanford,avalia que a duração natural da vida humana é de aproximadamente 85 anoscom variações individuais quase totalmente dentro da faixa de 70 a 100 anos.Numa frase notável ele descreve as tendências atuais como de “compressão damorbidade” a uma fração cada vez menor do tempo de vida (45). De fato, nãosomente estamos adicionando anos à vida mas “vida aos anos”.

Esta tendência também pode ser verdadeira para a doença mental. A projeçãopessimista de que o envelhecimento da população ocasionará um aumentoda doença mental não considera o fato de que muito da doença mental eincompetência dos idosos é resultante da aterosclerose cerebral. A prevenção daesclerose cerebral, coronariana, e de outros locais, pode emergir como um dosresultados mais importantes das atuais medidas de prevenção.

Mudanças sociais profundas ocorrerão como conseqüência da segundarevolução epidemiológica. A força de trabalho se tornará mais velha e experiente;isto será coerente com uma economia baseada mais no conhecimento científico eproficiência técnica do que no trabalho manual. A aposentadoria compulsória auma determinada idade perderá o sentido.

Os idosos no futuro não apenas viverão mais mas suas doenças e incapacidadesse reduzirão muito, sua competência mental estará mais conservada, sua vitalidadee capacidade de trabalho estarão mantidas, e eles não serão de forma alguma umpeso econômico para a população trabalhadora. De fato, eles serão parte vitaldesta população e será nossa tarefa construir uma economia na qual osvelhos possam dar sua máxima contribuição à sociedade na produção debens, serviços, e cultura.

Nos séculos XVIII e XIX muitos dos intelectos mais promissores morreramprecocemente por doenças ou violência - Burns, Shelley, Keats, Byron, Heine,Mozart, Schubert, Chopin, Pushkin, Lermontov, Gericault, Balzac - e outros, emtodos os países. Hoje eles vivem para uma vida longa e produtiva como os trêsgrandes Pablos: Casals, Picasso e Neruda - e, se me perdoarem um exemplo demeu próprio país entre as centenas de todo o mundo - o arquiteto Frank LloydWright. De 1928 a 1935 apenas dois edifícios foram construídos sendo desenhadospor ele. Mas em 1935, aos 68 anos de idade, ele construiu Fallingwater, umaestrutura fantástica ancorada em pedra e recortada sobre uma queda d‘água.Nos 23 anos seguintes, até sua morte aos 91 anos de idade, ele criou mais de 180edifícios incluindo vários de seus mais originais e famosos trabalhos (46).

A implementação plena dos achados de nossas pesquisas epidemiológicastornará mais próxima a previsão de Stephen Smith, fundador da AssociaçãoAmericana de Saúde Pública, em seu discurso no primeiro Encontro Anual da

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Associação em 1873: “A ciência que cultivamos, e para cuja promoção foiorganizada esta Associação, descartando as tradições do passado e os ensinamentosde falsas filosofias, interpreta as leis estabelecidas para guiar e controlar a existênciado homem na terra pelas demonstrações exatas de uma fisiologia verdadeira. Estaciência da vida revela o fato estupendo de que o homem nasce para a saúde e alongevidade, que a doença é anormal, e a morte a não ser de velhice é acidental,e que ambas são evitáveis por ações humanas” (47).

Nós somos a geração da segunda revolução epidemiológica. Há um estado deespírito nos epidemiologistas hoje - e nos clínicos, patologistas, e outros cientistasque se uniram a nossas fileiras - que é notável por seu élan, excitação e vitalidade.Empolgados pela filosofia humanista que está no coração da saúde públicaprecisamos garantir que nossas descobertas se traduzam numa prática para obem estar de toda a humanidade no menor tempo possivel. Assim fazendo criaremoso que será, sem dúvida, uma nova Idade de Ouro da saúde pública.

Registro: Este artigo foi apresentado como a Conferência Robert Cruikshank durante oDécimo Encontro Científico da International Epidemiological Association, Vancouver,Canadá, 20 de agosto de 1984.

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A S R E L A Ç Õ E S D I N Â M I C A S D A E P I D E M I O L O G I A C O M A S O C I E D A D E :A C O N F E R Ê N C I A R O B E R T C R U I K S H A N K

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B I O G R A F I A M I L T O N T E R R I S 1

Milton Terris, fundador da National Association for Public Health Policy eda Society for Epidemiological Research dos Estados Unidos, e que foi presidentede ambas, e fundador e editor desde 1980 do Journal of Public Health Policy,morreu em 3 de outubro de 2002 aos 87 anos em sua casa em South Burlington,estado de Vermont. Nascido em Nova York, ele tinha um diploma de bacharel daColumbia University, formou-se em Medicina na New York University, e eramestre em saúde pública pela Universidade Johns Hopkins. Foi presidente daAmerican Public Health Association.

Milton Terris era um sanitarista e epidemiologista internacionalmente conhecidoe uma liderança na área de saúde pública. Através de seu trabalho comopesquisador, professor, escritor, editor de revistas especializadas e ativista político,exerceu uma poderosa influência no desenvolvimento da saúde pública em muitospaíses. Ele lutou por uma “Segunda Revolução Epidemiológica” que promovessea prevenção da doença cardiovascular, câncer, doença pulmonar crônica, e partosprematuros. Sua ênfase na prevenção o tornou um crítico dos sistemas de saúdede muitos países, cujos enormes gastos com a assistência médica deixam poucosrecursos para a prevenção. Através de artigos, aulas e conferências, destacou o

1 Estas notas foram elaboradas com consulta aos necrológios do Journal of Public HealthPolicy e da Canadian Public Health Association, por ocasião da morte de Milton Terris.